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Secção V- Remissão
Secção VI-Confusão
1. Confusão
2. Regime
1. Noção
O contrato-promessa está regulado nos artigos 410 a 413, mas é necessário ter em conta
outras disposições, como o sinal e a antecipação dos artigos 440 a 442, e a execução
específica, em concreto o art.830º.
A ideia subjacente ao contrato-promessa vem logo identificada no art.410º. Estamos
perante uma situação contratual, na qual alguém se obriga a celebrar outro contrato. Há,
assim, duas situações jurídicas distintas: o contrato-promessa, e a obrigação de celebrar o
contrato prometido. Esta obrigação não é uma mera obrigação de negociar: é uma
obrigação de contratar. As negociações foram anteriores à celebração do
contrato-promessa, não se negoceia qualquer regra após a celebração.
a) Equiparação, excepções
- Regras que pela razão de ser não sejam extensíveis ao contrato-promessa: Estas
são situações do caso concreto. Se determinadas regras, pela sua natureza, não
são aplicáveis ao contrato-promessa, não o seram. São casos como as regras
pensadas para a execução do contrato definitivo (ex: art.879º, nos contratos de
compra e venda, o vendedor é obrigado a entregar a coisa, e o comprador a pagar o
preço.)
Pode, segundo o art.412º, haver transmissão dos direitos e das obrigações resultantes da
celebração do contrato-promessa. Este é um princípio comum de uma relação contratual,
seja promessa ou qualquer outra. É o princípio da livre transmissibilidade.
b) Sinal
O sinal está regulado no artigo 442º. O regime do sinal dá-nos uma indicação tradicional,
em que se antecipava o montante indemnizatório. Aquele que presta o sinal, em caso de
incumprimento, vai perdê-lo; aquele que o recebe, se incumprir, tem que o devolver em
dobro, como nos diz o nº2. Assim, o montante do sinal é o montante indemnizatório.
O nº4 do artigo 442º diz que, na ausência de estipulação em contrário, não há lugar a
qualquer outra indemnização, em caso de perda de sinal. Ou seja, em princípio, não
havendo acordo em contrário, o valor de sinal é o montante devido.
Contudo, as alterações dos anos 1980 vem abrir uma outra via, relativamente a certos
casos. O nº2 do art.442º passa a dizer, na sua segunda parte, que “se houve tradição da
coisa a que se refere o contrato-prometido, o seu valor, ou o do direito a transmitir ou a
constituir sobre ela, determinado objectivamente, à data do não cumprimento da promessa,
com dedução do preço convencionado, devendo ainda ser-lhe restituído o sinal e a parte do
preço que tenha pago.”. A razão desta alteração foi a desvalorização económica que se
vivia na época, que fazia com que o valor do sinal face a esta perdesse relêvo. Podia
portanto acontecer que no caso de valorização ou desvalorização brutal, compensa-se
incumprir o contrato e pagar o sinal em dobro, ou simplesmente perdê-lo.
O que sucederia então neste caso, seria o seguinte. Havendo tradição da coisa, em vez da
restituição em dobro do sinal, o promitente comprador pode optar por exigir o valor
(atualizado) da coisa, deduzindo-se o valor acordado originalmente, e adicionando-se o
valor do sinal.
Face a esta situação, permite-se que o promitente vendedor e incumpridor se oponha,
apresentando-se disponível para cumprir (442º nº3). É a chamada exceção de
cumprimento. Já conhecemos a exceção de não cumprimento, onde uma das partes, face
ao incumprimento da outra parte, não cumpre também com a sua. Neste caso, funciona de
maneira diferente: uma das partes preparava-se para incumprir, mas perante a reação da
outra parte, decide cumprir.
Esta questão é complexa, já que a lei diz que a excepção de cumprimento não é possível
no caso do art.808º (perda do interesse do credor). Para explicar esta questão, deve se
adiantar uma parte da matéria Basicamente, o incumprimento pode ser separado em dois
tipos: incumprimento definitivo e mora. Nos casos de mora, ainda é possível realizar o
cumprimento, este está simplesmente atrasado. O incumprimento definitivo é já, como diz o
nome, definitivo. Esta remissão diz-nos que o promitente faltoso, que invoca a exceção de
cumprimento, só o poderá fazer se a situação se qualificar como mora. Ou seja, temos
sempre de ver qual é a sua situação, o art.808º dá-nos algumas pistas em relação ao como
de o fazer. Deve se ver se o cumprimento do contrato definitivo ainda é materialmente
possível, e, sendo esse o caso, se há interesse objetivo do promitente fiel no seu
cumprimento. Se o incumpridor tiver vendido o bem objeto do contrato-promessa, não se
pode oferecer para cumprir o contrato-promessa, porque o incumprimento é materialmente
impossível. Mais complicado é a questão do interesse objetivo, que, como diz, o artigo, tem
que ser apreciada objetivamente. Quando é que se pode dizer que não existe interesse? É
complicado saber.
4. Execução específica
Está regulada nos arts.827º e ss., sendo que a norma do art.830º é específica dos
contratos-promessa.
Perante um contrato promessa que foi incumprido, permite-se que o contraente fiel recorra
a execução específica. Esta corresponde a uma decisão judicial, que produz os efeitos da
declaração negocial em falta.
Existem, contudo, limitações à execução específica. Da parte final do nº1 do art.830º,
consta que “sempre que a isso não se oponha a natureza da obrigação assumida.”. Há
determinados contratos-promessa que, pela sua natureza, não permitem a execução
específica, por terem uma natureza pessoal (como acontece com os contratos-promessa de
trabalho, ou de casamento):
As partes podem, no próprio contrato-promessa, afastar a possibilidade de execução
específica, menos nos casos do art.830 nº3.
A execução específica não pode ser um meio de colidir com outros mecanismos que
normalmente estariam vedados, ou seja, não se pode conseguir pela execução específica
algo que não seria possível realizar pelo contrato prometido (ex. A promete vender uma
casa a B, e entretanto vende-a a C. O B não pode recorrer à execução específica, porque a
casa está agora na esfera jurídica de C, e uma transferência para a de B seria uma
transferência de um bem alheio.)
Permite-se que o faltoso ponha limitações à execução específica, como nos diz a segunda
parte do nº3 do art.830º, ao pedir que seja tido em conta o regime da alteração de
circunstâncias. Permite-se assim que quem esteja em mora a invoque.
O nº4, permite o recurso ao mecanismo da expurgação de hipoteca, do art.713º.
A relação entre o sinal e a execução específica, é que vão funcionar como opções para o
promitente fiel.
Em princípio, quando se recorre ao sinal, afasta-se a possibilidade de execução específica.
Mas se o promitente fiel optar pela execução específica, e esta não tiver êxito, pode recorrer
ao sinal.
Como já vimos, ao recorrer ao sinal, o promitente fiel está, implicitamente, a resolver o
contrato, pelo que não vai poder recorrer posteriormente à execução específica.
Isto levanta um problema, quando o promitente fiel invoca a indemnização decorrente da
valorização, e o faltoso invoca a exceção de cumprimento, e depois não a cumpre. Aqui,
mesmo depois de recorrer ao sinal (dentro da valorização), o promitente fiel vai poder
recorrer à execução específica.
5. Eficácia real
Secção III
Pacto de Preferência
1. Noção
O Pacto de preferência vem identificado nos arts.414º e ss. Desta secção, é possível retirar
duas perplexidades. Primeiro, o Código Civil refere-se a “pactos de preferência”, no plural, o
que se explica por razões históricas, por o pacto ter encontrado em várias situações a
atribuição de preferência. Depois, parece, pelo art.414º, que o pacto de preferência está
circunscrito à compra e venda. Contudo, o legislador esclarece no art.423º que este regime
é extensível a outros contratos compatíveis, como seria por exemplo o contrato de
preferência de arrendamento.
O art.1091º é também importante, já que tutela a preferência do arrendatário.
O pacto de preferência será assim “a convenção, pela qual alguém assume a obrigação de
dar preferência a outrem na venda de determinada coisa”.
2. Modalidades
Existem dois tipos de pactos de preferência: os pactos de preferência convencionais
(acordados), e os pactos de preferência legais (previstos na lei, como o do arrendatário).
Os pactos de preferência convencionais pressupõem, assim, a vontade de dois sujeitos, no
sentido de um dar preferência, e de outro ter direito de preferência. Dentro das preferências
convencionais, deve-se ainda distinguir entre pactos convencionais meramente
obrigacionais, e pactos convencionais reais (com eficácia erga omnes, nos termos do
art.421º).
Na relação entre preferência legal e convencional, o legislador estabelece uma relação de
hierarquia, no art.422º. Determina que o direito convencional de preferência não prevalece
contra o legal, pelo que o direito de preferência legal prevalece sobre o convencional. Não
existe qualquer hierarquia entre um direito de preferência convencional obrigacional ou real.
Preferências convencionais:
Este regime é particularmente relevante, porque também se vai aplicar às preferências
legais (isto nas partes em que não houve negociação entre as partes, em que não haja
interferência da autonomia privada.).
Ou seja, este regime, dos arts.416º a 418º, é também aplicável às preferências legais, e
portanto o essencial do regime é aplicável a toda e qualquer preferência.
Alguns aspectos são contudo de aplicação exclusiva às preferências convencionais, como
acontece por exemplo com as exigências de forma (as preferências legais, como são
formadas pela lei, não têm forma).
A regra, quanto à forma, vem no art.415º, que nos remete para o nº2 do art.410º. Esta é
uma das similitudes com o contrato-promessa. Isto quer dizer que o pacto não carece da
mesma forma exigida para o contrato futuro, por isso se o contrato que vier a ser realizado,
ao abrigo da preferência,não carecer de forma especial, este também não carece. Mas se o
contrato carecer de forma especial, o pacto de preferência terá que ser assinado pelas
partes e celebrado por escrito. Importa sublinhar que a remissão para o nº3 do art.410º já
não existe. Também não existe para o nº1, o que quer dizer que não existe uma remissão
para o princípio da equiparação. No caso de uma lacuna, pode acontecer uma aplicação do
princípio de equiparação por analogia.
3. Regime
O art.416º diz-nos que o obrigado à preferência, se quiser vender a coisa, deve comunicar
ao titular do direito o projeto de venda e as cláusulas do respectivo contrato.
É importante esclarecer que o obrigado à preferência não está obrigado a vender,
simplesmente deve, no caso de querer vender, dar preferência ao titular do direito de
preferência.
A grande dificuldade prende-se no que é que deve ser comunicado. A obrigação não gera
um dever de enviar uma proposta de venda, no sentido de convite (sem a correta
identificação de todos os elementos). O que resulta deste artigo é que é preciso ser-se
concreto na comunicação, esta deve conter uma pré-formulação dos termos da venda do
bem.
Mas a grande dúvida prende-se ainda com outra questão: deve, na comunicação, ser
identificado o terceiro interessado? Isto tem sido alvo de discussão na jurisprudência e na
doutrina. O Professor ROMANO MARTINEZ e jurisprudência têm defendido que a lei não
exige a identificação do terceiro, e que não é sequer obrigatório que exista uma negociação,
já que o obrigado pode estar simplesmente a realizar um projeto de venda. O Professor
adiciona ainda que pode ser conveniente não se saber quem é o interessado, e que não
existe qualquer título que justifique a sua identificação.
A posição contrária, que indica que é preciso que conste do projeto a identificação do
terceiro, tem surgido essencialmente num caso concreto: o da preferência no arrendamento.
Nos termos do art.1091º, o senhorio, querendo vender o seu imóvel arrendado, tem que
comunicar ao arrendatário o projeto de venda e as cláusulas do respectivo contrato. Os
seguidores desta posição justificam isto dizendo que, uma vez vendido o imóvel, dá-se uma
transmissão de posição contratual, em que o adquirente ocupa automaticamente a posição
de senhorio, e portanto o inquilino passa a ter um novo senhorio. E isto é importante
porque, o novo senhorio, pode ter certos projetos relativamente ao imóvel, que impliquem o
fim do arrendamento (como acontece com uma empresa que compra um prédio para o
transformar em hotel, por exemplo). Ou seja, o inquilino poderia pensar duas vezes em
avançar para a compra, em função de quem seria o seu novo senhorio.
Contudo, o Professor defende que não se pode ir além da letra de lei, ou seja, não se pode
fazer uma interpretação da palavra “projeto”, de maneira a que esta inclua o interessado.
Para além disso, identificar o interessado pode se revelar como inócuo, já que se pode
tratar, por exemplo, de um contrato por pessoa a nomear. Esta identificação não resulta
portanto da lei.
4. Incumprimento
a) Regime Geral
Importa ainda ter em conta o regime do incumprimento. Este é o regime geral do art.798º e
ss., mas tem algumas especificidades.
O incumprimento pode acontecer por não se ter enviado a comunicação, ou esta ser
insuficiente, etc… No caso de uma nova negociação com o terceiro, deve ser feita nova
comunicação.
Perante a violação, para além do regime geral, existe a figura da ação de preferência. Neste
aspecto, importa ter em conta a tradição histórica do pacto de preferência
(comparativamente ao contrato-promessa), já que este mostra um desenvolvimento próprio,
ou seja, o incumprimento do pacto de preferência tem uma previsão jurídica bem mais
desenvolvida do que aquela que acontece com o contrato-promessa.
No âmbito do pacto de preferência, temos que ter em conta, primeiro, a hierarquia do
art.422º. Aquele que é titular de preferência convencional, só a exercerá na medida em que
o titular de preferência legal não tenha querido. Obrigado comunica assim primeiro ao titular
da preferência legal, e apenas depois ao titular da preferência convencional.
Perante o incumprimento de qualquer preferência, seja legal ou convencional, há um
incumprimento.
b) Ação de preferência
Porém, para as preferências legais, existe um regime especial, tendo em conta que se o
obrigado a tiver incumprido, o legislador confere ao titular do direito a designada ação de
preferência, prevista no art.1410º.
Havendo preferência legal, e sendo esta incumprida, confere-se ao titular do direito a
possibilidade de ação de preferência. Através da ação, vai-se conseguir o efeito útil, ou
seja, o obrigado à preferência que a incumpriu e vendeu a terceiro, ao ter vendido, vai
permitir que o titular do direito, através da ação de preferência, consiga que o bem lhe seja
transferido, e por isso é que o titular deve depositar o preço.
Imaginando que A não deu preferência ao titular B, e vendeu o bem objeto do pacto de
preferência a C por 10. B exerce a ação, e a transmissão de A para C deixa de valer,
passando o bem a integrar o patrimônio de B, e os 10 depositados por este seguem para C.
E nos casos de preferência convencional? Se esta for meramente obrigacional, só terá
eficácia inter partes, e não produzirá efeitos em relação a terceiros, pelo que teremos uma
mera obrigação de indemnizar, nos termos gerais dos arts.798º e ss.
Se, pelo contrário, for um pacto de preferência com eficácia real (art.421º), verificados os
aspectos formais do art.413º, há eficácia erga omnes, e é aplicável o art.1410º.
Esta lógica do art.421º pode-nos fazer pensar se esta não será a melhor solução para o
problema do incumprimento do contrato-promessa com eficácia real.
1. Noção
A relação emergente do contrato a favor de terceiro resulta de uma lógica triangular, entre
as partes e o terceiro. Nesta triangulação, encontramos 3 relações jurídicas: a relação base
(entre promitente e o promissário, é o contrato celebrado entre estes), a relação de
execução (entre promitente e terceiro: promitente obriga-se a realizar uma prestação a um
terceiro, a efetivar a prestação), e a relação de valuta (entre promissário e terceiro, é o facto
que justifica a atribuição do benefício).
Há quem indique que o contrato a favor de terceiro tem a sua origem na relação jurídica de
seguro. Vamos imaginar um contrato de seguro de vida: A, celebra com segurador um
contrato de seguro de vida, no qual determina que o beneficiário desse contrato será B, seu
conjûge. Portanto, A é o promissário, o segurador é o promitente, e B é terceiro, estando a
relação de valuta no casamento entre A e B.
2. Regime
Os problemas de regime têm a ver com esta particularidade. Para que serve a adesão do
art.447º, no caso dos contratos a favor de terceiro próprios, se não é necessária aceitação?
A adesão não é propriamente uma aceitação, a promessa vale por si. Simplesmente quer
dizer que o terceiro o pode rejeitar, já que ninguém é obrigado a aceitar um benefício.
Mas para que serve e aderir? Serve para impedir a revogação por parte do promitente,
como resulta do art.448º. A partir do momento em que o terceiro adere, vai dificultar a
capacidade revogatória do acordo base.
Este contrato pode ser feito em favor de pessoas determinadas ou não (como acontece nos
seguros automóvel), e para cumprir depois da morte ou não.
O art.450º diz nos que nas relações entre o promissário e as pessoas estranhas ao
benefício existe algumas particularidades. Estabelece que pode acontecer que existam
terceiros que fiquem prejudicados pelo benefício a um outro terceiro, e não a ele.
Vamos imaginar a situação de um contrato em que um promissário, pai, designa um filho
como terceiro, sendo que tem mais dois. Isto poderia permitir que se defraudasse o regime
sucessório, que é exatamente o que o art.450º vem evitar. Assim, o que foi prestado pelo
promissário ao promitente pode ser objeto de colação, de imputação, de impugnação
pauliana, etc… Mas já não o que foi prestado pelo promitente ao terceiro.
Secção V
Contrato Pessoa a Nomear
1. Noção
Encontra-se regulado nos artigos 452º e ss. Esta figura pode suscitar alguma perplexidade,
porque pode parecer que o objetivo deste contrato é não se dar a entender quem é a
verdadeira parte no contrato, de modo a alcançar algum objetivo fraudulento. O fisco, por
exemplo, parte de pressuposto que esta cláusula tem uma natureza fraudulenta. Mas
importa descartar esta conclusão, já que qualquer figura do direito das obrigações pode ser
utilizada ilicitamente.
Olhando para o art.452º, vemos que é possível que uma das partes reserve o direito de
nomear um terceiro, que vem adquirir os direitos e assumir as obrigações do contrato
celebrado. Ou seja, uma das partes, diz logo no momento da celebração do contrato que
pretende identificar um terceiro para assumir a posição de parte, sem a identificar.
É normal que se questione a necessidade e a lógica desta figura. Pode acontecer em várias
situações, como um famoso colecionador de carros que, de maneira e não ver o preço
inflacionado perante seu interesse, pede a alguém para celebrar o contrato e depois o
nomear. A lógica não é, por exemplo, muito diferente da da representação (sendo que aqui,
obviamente, não se exercem tais poderes).
É importante, contudo, sublinhar que quem negoceia não o faz em nome de terceiro.
Pode haver casos em que não se sabe ainda quem é o terceiro, em que há uma assunção
do risco por parte de quem negoceia.
2. Regime
Secção I
Cessão de créditos
1. Noção
A cessão de créditos está nos artigos 577 e seguintes. Estamos a tratar de um transmissão
do crédito, o credor em que medida pode transferir a sua posição creditícia para outro?
Temos então o antigo credor que é o cedente, e o novo credor designado cessionário.
Numa relação obrigacional podemos ter esta possibilidade de transmissão.
2. Modalidades e pressupostos
A cessão de créditos está regulada nos arts.577º e ss. É uma transmissão de crédito, e
então vamos ter dois credores, o antigo e o novo. O antigo credor é designado como
cedente, e o novo como cessionário.
A transmissão é maioritariamente de origem convencional, isto é, o crédito é cedido por
acordo. Há, contudo, casos de cessão legal, ou resultantes de uma situação judicial.
Tendo como foco as transmissões convencionais, temos em primeiro lugar, como
pressuposto, um acordo entre o cedente e o cessionário. Mas ainda antes é necessário a
existência de uma obrigação, visto que o acordo entre os credores resulta desta.
É também pressuposto que o crédito seja transmissível, já que existem algumas limitações
estabelecidas pelo legislador (como os casos do art.579º), e casos de impedimento
convencional (em que as partes originais do contrato acordam que o crédito não pode ser
transmitido). Excluindo estas situações, vigora o princípio da livre transmissibilidade, não
carecendo do consentimento do devedor.
3. Regime
Quanto ao regime da cessão de créditos, o legislador, no art.578º, diz que o regime é
definido em função do negócio que lhe serve como base. O negócio entre os dois credores,
entenda-se. No fundo, o legislador quer dizer que, havendo uma transmissão de crédito, há
um fundamento base, ou seja, quer explicar que ninguém transmite um crédito sem uma
razão. Por exemplo, uma empresa (A) fornece leite a um supermercado (B), sendo que
este normalmente paga 90 dias depois; A fica credora durante 90 dias, mas pode precisar
do dinheiro no imediato, e portanto vende o crédito a uma empresa de factoring (C) ; no dia
em que A entregou o leite ao B, passou a ser seu credor, tendo vendido o crédito a C, e
recebeu o dinheiro corresponde de C, que 90 dias vai receber de B, a quem se comunicou a
compra; o negócio entre A e C é uma compra e venda, e portanto aplica-se o regime desta.
A cessão de créditos acaba por ser a figura principal da transmissão de crédito. Esta cessão
não tem efeitos retroativos.
Secção II
Subrogação
1. Regime
A subrogação está prevista nos arts.589º e ss. Existe uma proximidade com a figura da
cessão de créditos, havendo até uma remissão para esta, no art.594º.
O que distingue então estas duas figuras? Na cessão de créditos não há o cumprimento da
obrigação “original”, enquanto que na subrogação se pressupõe a realização da prestação:
a prestação foi cumprida, e ao ser cumprida, dá-se a subrogação. Isto é peculiar, porque
normalmente o efeito do cumprimento seria a extinção, mas aqui, temos ao invés uma
transmissão.
A figura do direito de regresso tem grande proximidade com a subrogação, já que no âmbito
das obrigações solidárias, vai ter um efeito substitutivo, em que o devedor solidário que
pagou a prestação na totalidade, fica com direito de regresso sobre os demais.
É de facto uma situação algo similar, já que também temos uma ocupação da posição de
crédito.
3. Modalidades e requisitos
Secção III
Assunção de Dívida
1. Noção
A assunção de dívida vem prevista no art.595º. Está contida numa secção que se chama
“transmissão singular da dívida”, ou seja, está associada a dívida, e não ao crédito.
A cessão de créditos é, nos arts.595º e ss., representada como a possibilidade do devedor
transmitir a sua posição passiva. Existe, desde logo, uma grande diferença em relação à
transmissão , já que aqui o credor pode não ter confiança no novo credor, enquanto que o
contrário não acontece. Isto quer dizer que na assunção de dívida, já não se aplica a regra
da livre transmissibilidade, exigindo-se então o consentimento do credor.
Olhando para o art.595º, identificamos dois tipos de assunção de dívida: ou por contrato
entre o antigo devedor e o novo devedor ratificado pelo credor, ou por contrato entre novo
devedor (assuntor) e credor. Esta segunda é uma figura menos comum, em que a
transmissão não é feita pelo sujeito devedor presente, mas pelo credor, e pode ser feita
com ou sem consentimento do antigo devedor.
2. Modalidades
- A assunção liberatória: Prevista no art.595º nº2 1a parte. Aqui, o antigo devedor fica
liberado. Só aqui há uma verdadeira transmissão. A assunção só é liberatória
quando existe uma declaração expressa do credor nesse sentido.
3. Regime
A assunção implica a retificação por parte do credor. Sem o assentimento deste, não há
transmissão.
A figura da assunção, explicada nestes termos, levanta particulares dúvidas na
determinação da sua natureza (saber se esta tem uma natureza abstrata ou causal).
O problema é discutido em particular com base no art.597º, mas também é importante o
art.598º.
O art.597º diz-nos que se tivermos uma declaração de invalidade do contrato de
transmissão, havendo exoneração, renasce a obrigação do exonerado, mas consideram-se
extintas as garantias. Ou seja, imaginando que o credor retificou o contrato celebrado entre
o antigo e o novo credor, e mais tarde se verifica a sua invalidade: renasce a obrigação do
exonerado (isto é, o antigo devedor que tinha deixado de o ser se fosse liberatória, volta a
sê-lo), mas consideram-se extintas as garantias prestadas por terceiros. Isto determina que
o negócio da assunção é desligado do negócio de transmissão? Parte da doutrina, como
MENEZES CORDEIRO, entende que sim, e usa este argumento para defender a natureza
abstrata da assunção.
Depois, o art.598º diz que não havendo convenção, o novo devedor não tem o direito de
opor ao credor os meios de defesa baseados nas relações entre ele e o antigo devedor. No
fundo, o que este artigo diz é que o que foi acordado no negócio entre os dois devedores
não é oponível na transmissão, o que mostra um certo afastamento.
Contudo, o Prof. ROMANO MARTINEZ defende que como a regra no nosso sistema jurídico
é uma regra causal, por norma os contratos têm uma justificação causal, e que portanto
estes artigos não são suficientes para assumir a natureza abstrata da transmissão.
Secção IV
Cessão da posição contratual
1. Noção
2. Requisitos
3. Regime
Quanto ao regime, o art.425º tem uma norma similar à cessão de créditos, já que este é
definido em função do tipo de negócio que lhe serve de base.
Ou seja, o contrato entre o cedente e o cessionário tem subjacente um outro negócio
(frequentemente uma compra e venda). A venda de uma posição é uma trespasse.
Devem-se distinguir três relações: a relação cedente-cessionário (determinado pelo acordo
base, como diz o art.425º), a relação cedente-cedido (o que transmitiu e o que continua, é a
relação que se estabeleceu ao início, e que valerá até a data de produção de efeitos da
cessão, ou seja, o contrato entre A e B que depois vendeu a C mantém a sua produção de
efeitos desde a data que se celebrou até a data da produção de efeitos da cessão, o que é
um aspeto relevante na distinção da figura do contrato da pessoa a nomear, que tem
eficácia retroativa.), e a relação cessionário-cedido (começa à data da produção de efeitos
da cessão).
4. Natureza
CAPÍTULO VI
CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES
1. Conceito e importância
2. Princípios gerais
a) Princípio da boa fé
Vem logo explicitado no art.762º. A boa fé não vincula só o devedor, o credor também deve
estar de boa fé ao exercer o seu direito. A boa fé aqui é em sentido objetivo, como regra de
conduta, impõe se um padrão médio ao devedor e ao credor. Deve-se realçar que, no que
toca ao princípio da boa fé, há uma certa tendência de objetivação, na medida em que
existe uma maior preocupação com aquilo que é o padrão normal do que com a situação
particular do devedor. Aliás, a presunção de culpa do art.799º é prova disso. Em poucas
situações se tenta verificar qual foi a situação concreta do devedor.
b) Princípio da pontualidade
Pontualidade não só no sentido de cumprir na data, visto que o art.762º fala em “prestação
a que está vinculado”. Quer isto dizer que o cumprimento deve ser feito nos termos
estipulados, ou seja, este princípio respeita também o conteúdo e os aspetos materiais da
obrigação.O art.406º, onde também se funda este princípio, diz-nos que o contrato deve ser
pontualmente cumprido, o que quer no fundo dizer que tem que ser cumprido ponto por
ponto (por exemplo: se eu prometer vender um automóvel com 5 lugares, e o entrego no dia
acordado, não estou a cumprir pontualmente se este apenas tiver 4 lugares.).
c) Princípio da integralidade
Há ainda alguns aspetos que importa ter em conta, visto que podem parecer contrariar
regras vistas em TGCD.
Primeiro, o problema da capacidade, do art.764º. Segundo este artigo, o devedor incapaz
pode cumprir, e o credor incapaz pode receber. Isto explica-se pelo facto de o que está em
causa ser a capacidade para realizar a prestação, e para a receber, e não a capacidade de
vinculação (que foi o visto em TGCD). Aqui, a constituição da obrigação já aconteceu. O
devedor e o credor podem ser incapazes, mas muito provavelmente a obrigação foi
constituída através de um representante legal, ou de outro meio similar. Isso, pode haver
cumprimento por partes de incapazes, porque é um mero ato de administração e não de
disposição. O credor, ao receber, funciona como um mero receptor, já que recebe a
prestação para a entregar de imediato ao representação.
4. Legitimidade para efetuar a prestação
Outra particularidade tem a ver com a legitimidade. Prevista nos arts.765º e 767º, fala da
legitimidade para prestar e para receber. O princípio que consta do art.767º é que a
prestação pode ser realizada tanto pelo devedor como pelo terceiro, visto que, em princípio,
será irrelevante para o credor quem realiza a prestação (o que releva é o efeito do
cumprimento, e não o modo como se realizou). Contudo, esta regra só vale nas prestações
fungíveis: nestas, por o serem, a identificação de quem a realiza é irrelevante. Se, pelo
contrário, a prestação for infungível, deve ser realizada diretamente pelo devedor, visto que
a prestação tem um intuitus persona subjacente (ex: se alguém contrata um pintor, não lhe
será indiferente se em vez deste, o quadro for pintado por um amigo). O devedor tem
legitimidade para realizar a prestação, mas essa legitimidade vai se aferir também no que
respeita à disponibilidade da prestação, ou seja, a legitimidade não será determinada
unicamente em função do sujeito (e da fungibilidade); será também aferida em relação à
prestação, e é determinada em função da disponibilidade. Se o devedor está adstrito à
entrega de um carro, não terá legitimidade para entregar um carro que não esteja na sua
esfera jurídica, por exemplo.
6. Lugar do cumprimento
Quanto ao lugar do cumprimento, esta matéria vem regulada nos arts.772º e ss. O
legislador indica um princípio geral, mas esta indicação é algo enganadora, porque é um
princípio geral que, na maioria dos casos, não se aplica, já que esta norma diz que a
prestação deve ser efetuada no domicílio do devedor, e assim partiria-se do princípio que,
caso nada fosse estipulado, a prestação seria feita em casa do devedor. Contudo, isto não
acontece, já que tendo em conta as situações consagradas nos arts.773º e 774º, este
princípio acaba por ser reduzido a poucos casos.
Primeiro, porque se estivermos perante a entrega de coisa móvel, como diz o art.773º, a
obrigação deve ser cumprida no lugar onde se encontrava quando foi concluído o contrato,
ou seja, perante estas situações, o local será este. Contudo, muitas vezes existem
cláusulas que determinam o local do cumprimento, e este podia ainda ser determinado
pelos usos (ex: um automóvel comprado no stand ainda está a ser produzido numa fábrica
na China, claro que o local de realização da prestação não será na China. Há um uso que
determina que será o lugar onde se deu a negociação, apesar de esta não ser a regra, visto
que nenhuma das partes estava a pensar nesta regra).
Depois, o art.774º diz-nos que, sendo a obrigação pecuniária, deve ser efetuada no
domicílio que o credor tem a data do cumprimento. Ou seja, o princípio geral vai ter um
campo de aplicação quase residual.
7. Tempo do cumprimento
Depois, temos o problema do tempo do cumprimento. Está previsto nos arts.777º e ss., e
deve-se desde logo fazer uma extinção tripartida do prazo: temos o momento da
constituição da obrigação, da exigibilidade, e do vencimento:
Estes momentos são relevantes, visto que há uma distinção importante a ter em conta entre
obrigações puras e obrigações a prazo.
No fundo, podemos ter obrigações nas quais as partes não identificaram qualquer data para
o vencimento, que são as obrigações puras. A estas aplicamos o art.777º, pelo qual o
credor tem direito a exigir a prestação a todo o tempo, a partir da constituição da obrigação:
constituída a obrigação, imediatamente temos a exigibilidade, porque não temos prazo. O
credor exige através de um ato designado interpelação, em que interpela o devedor, e
através dessa interpelação exige o cumprimento. A interpelação é o envio da fatura, é a
realização da exigibilidade, e nessa interpelação, o credor determina até quando o devedor
deve pagar (ou seja, a data do vencimento). Pode ser imediato. Se o credor não fixar esse
prazo, caberá ao tribunal fixá-lo.
Temos depois as obrigações a prazo, onde se fixa os prazos tanto da exigibilidade como do
vencimento. Ou seja, se uma obrigação é para cumprir dia 31, o credor não poderá (em
princípio) exigir antecipadamente, e não precisa também, nesse dia 31, de interpelar o
devedor, já que é uma obrigação com prazo certo. Atenção que o prazo de exigibilidade
pode também ser um prazo incerto (por exemplo, quando o navio que traz a mercadoria da
China atracar, dá-se a exigibilidade). Em princípio, o prazo é estabelecido em favor do
devedor, mas nada obsta a que seja estabelecido em favor do credor. Mas como resulta
resulta do art.780º, este pode perder o benefício do prazo, se se verificarem os
pressupostos aí previsto, que permitem uma antecipação da exigibilidade.
Olhando mais em detalhe para estas figuras, sabemos então que, como resulta do art.777º,
havendo uma obrigação pura, o credor pode exigir a realização da prestação a todo o
tempo, e o devedor pode realizar quando quiser (mesmo sem interpelação). Deve se fazer a
distinção entre obrigações puras verdadeiramente puras, e as obrigações que, pela sua
natureza, têm um prazo natural. Isto acontece quando temos prestações que não são de
realização imediata (como a construção de uma casa, ou o pintar de um quadro). Previstas
no art.777º nº2, aqui é nos dito que se pode “tornar necessário o estabelecimento de um
prazo”. Cabe às partes acordarem um prazo, mas caso não consigam chegar a um
consenso, caberá ao tribunal esta fixação. Neste caso estamos a encarregar o tribunal de
algo que não é verdadeiramente a sua competência (é lhe pedido que determine um prazo
razoável para casos como a construção de uma casa, o que pressupõe que fique munido de
conhecimentos técnicos de realização de obra).
Já dentro das obrigações com prazo, temos nova distinção importante: com prazo certo ou
com prazo incerto. Numa situação de prazo certo, o prazo que se prevê é o prazo de
vencimento, ou seja, quer dizer que no dia estipulado deve ser efetuado o cumprimento.
Se pelo o contrário estivermos perante uma situação de prazo incerto, não existe um
automatismo no vencimento. Voltando ao exemplo do navio, como não se sabe exatamente
quando é que este vai atracar, o resulta do atracamento é a exigibilidade (e não o
vencimento), a partir do qual o credor poderá interpelar o devedor, e apenas após esta
interpelação se dá o vencimento (sendo que a interpelação, normalmente, fixa o dia ou o
prazo para se realizar o pagamento, ou seja, a data exata do vencimento).
b) Benefício do prazo
Este prazo é normalmente estabelecido em favor do devedor, o que quer dizer que no caso
de uma obrigação a prazo, o credor não poderá interpelar o devedor antes da data (ou do
acontecimento) prevista, mas que o devedor poderá, se assim desejar, exonerar-se antes
do prazo, sendo que o credor tem que aceitar.
Já não será assim se o prazo for estabelecido em favor do credor, visto que este benefício
do prazo pode ser perdido, segundo o art.780º, no caso do devedor se tornar insolvente ou
de haver uma diminuição das garantias que tenham sido prestadas; no fundo, o que está
aqui subjacente é uma menor credibilidade da posição jurídica do devedor, o credor perde
confiança no devedor, e passa a haver uma posição menos garantística para o credor.
Imaginando que o vencimento se dá a 30 de Junho, se hoje, dia 10 de Abril, o devedor for
insolvente (ainda que não declarada), perde o benefício do prazo, e o credor passa a ter o
direito de exigir a realização da prestação, nos termos do art.780ºnº2, havendo assim uma
antecipação da exigibilidade, pela qual o credor pode interpelar o devedor, de forma a que
se dê o vencimento.
O art.781º traz-nos uma situação algo complexa: A deve 1000 a B, que deviam ser pagos
em 10 prestações mensais de 100. O que este artigo nos diz é que se falta o pagamento de
uma destas prestações, há uma perda de confiança, e, segundo o legislador, “importa o
vencimento” das restantes prestações. Há assim uma antecipação do vencimento das
outras prestações, ou seja, imaginando que A falha o pagamento da quarta prestação,
imediatamente se vencem todas as outras. Sendo um vencimento, não se pressupõe uma
interpelação. Esta formulação é criticada por alguns autores, que dizem que o legislador
quis dizer “exigibilidade” e não “vencimento”, utilizando como argumento a formulação do
art.934º. Haverá um lapso? O Professor RM diz que não, que a revisão ministerial alterou
de facto a formulação que vinha do projeto, mas fê-lo propositadamente. Diz ainda que
retirar a palavra “exigibilidade” do art.781º seria forçar as regras gerais de interpretação,
visto que não tem correspondente com o texto da lei.
Ainda dentro da questão do prazo, poderá haver situações em que este está dependente do
arbítrio do devedor, nos termos do art.778º. Aqui estipula-se no fundo que o devedor
cumprirá quando puder, mas caso este faleça, o cumprimento será imediatamente exigível
aos seus herdeiros.
8. Imputação do cumprimento
9. Prova de cumprimento
CAPÍTULO VII
CAUSAS DE EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES ALÉM DO CUMPRIMENTO
Secção I
Dação em cumprimento
1. Noção
2. Dação em cumprimento
No primeiro caso, o devedor está adstrito a uma prestação mas realiza outra. Isto
normalmente violaria o princípio da pontualidade, por isso é que só é possível na medida
em que o credor dê o seu assentimento (ex: em vez de 1000, o credor aceita receber um
relógio). Esta hipótese assenta então num acordo entre as partes. Embora a dação não seja
em si uma compra e venda, existem alguns aspetos desta a ter em conta, como as regras
do art.838º e 839º. No fundo, voltando ao exemplo, podemos imaginar que em vez da
entrega dos 1000 euros, teria havido um contrato subjacente de compra e venda, em que o
devedor entrega o relógio, recebe 1000 euros, e depois entrega-os ao credor. O art.838º
diz-nos ainda que “o credor a quem for feita a dação em cumprimento goza de garantia
pelos vícios da coisa ou do direito transmitido”, ou seja, pegando novamente no exemplo,
vamos imaginar que afinal o relógio era uma mera imitação e não justifica o valor, o
mecanismo de invalidade aplicável será o da compra e venda. Na dação em cumprimento
não interessa verificar se o valor da prestação alternativa vale mais ou menos do que a
original, já que há uma aceitação do credor, é uma manifestação da autonomia privada, há
um acordo. Ora, na dação pro-solvendo isso não acontece.
3. Dação pro-solvendo
Na dação pro-solvendo, também temos a entrega de uma prestação diferente, que também
carece de aceitação por parte do credor, contudo, e como resulta do regime do art.840º, o
efeito extintivo só ocorre na medida em que o credor fique satisfeito com o valor do bem
entregue. Voltando ao exemplo, sendo uma dação pro-solvendo, há uma aceitação do
credor, mas a extinção da obrigação fica condicionada nos seguintes termos: o credor vai
normalmente vender aquele relógio, e verificar se consegue apurar esses 1000; se apenas
conseguir 800, o que resulta do regime da dação pro-solvendo é que a dívida subsiste por
200. O art.840º não fala do caso do valor do bem entregue ser superior à prestação original,
mas parece que o excesso deve ser devolvido, já que a ideia do pro solvendo é que a
prestação não deve nem beneficiar, nem prejudicar o credor.
Secção II
Consignação em Depósito
1. Noção
A consignação em depósito está prevista no art.841º. O devedor está adstrito a realizar uma
prestação e não pôde fazer, ou porque o credor não aceitou, ou porque o credor estava em
mora, ou porque não estava disponível para a receber, etc… No fundo, a causa do não
cumprimento está na esfera do credor, foi este que inviabilizou a realização da prestação
(não sendo necessário que haja culpa): A consignação é facultativa. A consignação pode
ser efetuada junto de um terceiro, como diz o art.842º, sendo que o terceiro é
frequentemente um banco (visto que muitas vezes a prestação é dinheiro).
Esta figura tem algum impacto prático em determinadas áreas contratuais (como no
arrendamento, onde pode haver divergências inquilino-arrendatário).
2. Requisitos
- Ter a obrigação por objeto uma prestação de coisa, podendo ser uma quantia
pecuniária, ou uma coisa de qualquer outra natureza art.916ºnº1 CPC: logicamente,
as prestações de facto positivo (ações) são insusceptíveis de depósito, e as
prestações de facto negativo (omissões) não necessitam da colaboração do credor.
- não ser possível ao devedor realizar a prestação por um motivo relativo ao credor
art.841º nº1: aqui discriminam-se duas situações, a impossibilidade não imputável
ao devedor de ele realizar a prestação ou de o fazer com segurança por qualquer
motivo relacionado com a pessoa do credor; e a mora do credor (a recusa do credor
em receber a prestação ou em praticar os atos necessários ao cumprimento
art.813º).
3. Efeitos
Quanto à consignação como meio de extinção das obrigações, o efeito extintivo não é
imediato, até porque frequentemente há um litígio, e por isso o efeito de extinção não pode
funcionar no preciso momento.
A extinção pode ocorrer de duas formas: ou o credor aceita a prestação, ou há uma decisão
judicial (em que o tribunal entende qual o valor a pagar). Em qualquer uma destas
hipóteses, o efeito extinsivo retroage à data da consignação.
Secção III
Depósito
1. Noção
É uma figura paradigmática, e tem um efeito particularmente relevante, já que é uma das
figuras em que está ainda subjacente um meio de autotutela. Aquele que recorre a esta via
consegue, de algum modo, consegue a tutela do seu direito sem recorrer aos tribunais.
2. Requisitos
Permite-se que por esta figura, prevista nos arts.847º e ss., haja extinção da obrigação,
desde que haja reciprocidade (ou seja, credor e devedor são simultaneamente partes noutra
relação jurídica, em que se invertem as posições), ou seja, imaginando que A deve 100 a B,
e B deve 75 a A, o que resulta deste mecanismo é que não é suposta que B efetue o
pagamento de 75, mais vale não pagar e ficar credor somente de 25. Mas para isso, como
resulta do art.847º, é necessário que para além da reciprocidade, que estejamos na fase da
exigibilidade: se a dívida já se constituiu mas não é exigível, não se pode recorrer à
compensação. Ainda relativamente à exigibilidade, importa referir que o art.847º nº1 al.a)
diz “crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou
dilatória, de direito material”, o que significa que não pode ser imposta exceção contra quem
invoca a compensação, sendo esta assim inevocável. Outro pressuposto é a fungibilidade, é
necessário que sejam dívidas que se possam comparar, pôr em pé de igualdade, razão pela
qual a figura da compensação fica praticamente circunscrita à dívidas pecuniárias.
3. Regime
Secção IV
Novação
1. Noção
A novação era mais útil antes de existir figuras como a cessão de créditos ou a assunção de
dívida, acaba por não ter o mesmo impacto prático que tinha antes. Isto essencialmente
porque a novação, do art.857º tem duas vertentes: a novação subjetiva, que pressupõe que
a obrigação é substituída por outra, mas que para além da substituição de objeto, também
um dos sujeitos é substituído; e a novação objetiva, que implica unicamente a modificação
do objeto, mantendo-se os sujeitos
2. Regime
Secção V
Remissão
1. Noção e Regime
Prevista nos art.863º e ss., corresponde a um perdão de dívida. Esta figura tem natureza
contratual, não é uma decisão unilateral, carece de aceitação por parte do devedor.
Esta matéria da remissão tem especial relevo no âmbito da pluralidade de devedor, na
medida em que o credor pode remitir a dívida de um dos devedores, pelo que temos de
saber se essa quota é eliminada totalmente do valor que o credor vai receber, ou se deve
ser pago pelos outros devedores.
Se a remissão for concedida apenas a algumas ou a alguma parte (remissão in personam),
os efeitos serão distintos consoante o regime específico de pluralidade das partes na
relação obrigacional aplicável. Se o regime for o da conjunção ou parciariedade, o que
sucede é que se extinguem as frações da obrigação em relação às partes em relações as
quais ocorre a remissão, não sendo afetada a obrigação quanto aos restantes sujeitos. Se o
regime aplicável for o da solidariedade passiva, a dívida do devedor remitido extingue-se,
mantendo-se a dos restantes devedores, que ficam, porém, liberados pela parte relativa ao
devedor exonerado (art.864º nº1).
Secção VI
Confusão
1. Noção
Prevista nos arts.868º, acontece quando se reúne na mesma posição a figura do credor e
do devedor.
2. Regime
Se por qualquer motivo (sucessório, transmissão etc…) isto acontecer, a dívida extingue-se
por confusão. Este problema tem particular relevo e dificuldade na medida em que há
pluralidade de sujeitos: havendo vários devedores, a dívida deixa de ter contitularidade, e o
devedor passa a ser credor.
CAPÍTULO VIII
CESSAÇÃO DO VÍNCULO CONTRATUAL
Secção I
Caducidade
1. Noção e causas
Secção II
Revogação
1. Noção
2. Efeitos e forma
Em princípio, não carece de forma especial, ainda que possa haver casos em que o
legislador prevê determinada forma (como a revogação do contrato de trabalho, em que se
exige forma escrita, para que o trabalhador se consciencialize).
Quando as partes revogam o contrato, fixam também qual o efeito extintivo (tanto pode ser
retroativo, como para o futuro, como a contar desde há dois dias, etc…).
Secção III
Denúncia
1. Noção
2. Modalidades
Há duas modalidades de denúncia: primeiro, a denúncia nos casos em que temos contrato
com renovação automática, ou seja, se não houver denúncia, o vínculo renova-se
automaticamente (como os contratos de arrendamento ou os seguros, que se renovam
automaticamente ao menos que alguém diga alguma coisa), é a declaração pela qual se
impede a renovação, em que há denúncia como oposição à renovação; depois, temos a
denúncia dos contratos que não têm prazo fixado.
Em qualquer dos casos a denúncia é ad noctum, ou seja, não carece de justificação. Basta
que seja manifestada, e exige-se em regra que o seja com aviso prévio. Em princípio, não
carece de forma especial.
Secção IV
Resolução
1. Noção
É a figura prevista como paradigmática pelo legislador, prevista nos arts.432º e ss. Este
determina em que termos pode haver resolução.
A resolução é um modo de extinção que decorre de uma declaração unilateral, que vem
extinguir o vínculo contratual.
Esta declaração pode ter dois fundamentos: ou é um fundamento legal (resolução legal), ou
é um fundamento convencional (resolução convencional).
A resolução convencional é mais simples, porque as partes acordaram os termos nos quais
esta seria possível.
A resolução legal pressupõe um fundamento (uma justa causa), um motivo plausível, que
pode ser: o incumprimento definitivo (art.801º); uma quebra do equilíbrio contratual (contrato
foi celebrado atendendo a certo equilíbrio que entretanto quebrou, como a alteração de
circunstâncias); ou a resolução atípica (normalmente a razão é o arrependimento, como as
devoluções nos negócios de compra e venda, que não tem consequências legais).
2. Efeitos e forma
A resolução efetiva-se por mera declaração, dirigida à outra parte, não carecendo de
intervenção judicial, nos termos do art.436º.
A extinção dá-se com a recepção, e tem efeito retroativo, à imagem do que acontece com a
invalidade. Aliás, o legislador até aproxima a resolução à invalidade, na medida em que no
art.433º prevê que se aplique as regras da invalidade (289º) ao que não estiver
especialmente regulado.
Contudo, se o contrato for de execução continuada, só opera do momento da extinção para
a frente.
A tutela de terceiros, prevista no art.435º, difere do que resulta de uma invalidade. Também
o facto da resolução se efetivar pela mera declaração de uma parte à outra faz com que
seja diferente da invalidade, nos termos do art.436º.
As situações de resolução não têm como consequência, em princípio, o dever de
indemnizar.
- Há quem diga que é uma cláusula rebus sic stantibus, ou seja, que é quase como
um cláusula implícita, em que as partes nada disseram, mas é como se tivessem
dito que o contrato é para se cumprir, desde que tudo se mantenha igual. Isto
interfere, contudo, de alguma forma com a segurança contratual, já que podem
existir uma multiplicidade de situações em que as circunstâncias deixam de ser
exatamente as mesmas.
- A doutrina vem admitir uma segunda hipótese; a teoria da pressuposição. Aqui, só
se admitiria a manutenção do vínculo na pressuposição da manutenção dos
elementos essenciais. O problema estará depois na discussão do que é ou não
fundamental.
- Uma terceira perspectiva, que tem vindo a ser utilizada mais no direito público, é a
teoria da imprevisão. Aqui admite-se a resolução ou modificação sempre que
houvesse um imprevisto (que não é igual a uma alteração simples).
- que tenha havido uma alteração anormal sobre estas circunstâncias: o que isto quer
dizer é que deve haver uma quebra na sequência normal dos acontecimentos, algo
que não se enquadra naquilo que seria a sequência normal. O legislador usa o
termo “anormal” e não “imprevisível” para que não se acha que foi adotada a tese da
imprevisão. É um problema de quebra da normalidade, não de imprevisão (ex. crise
de 2008 era de alguma forma previsível, mas não deixa de ser anormal,
relativamente àquilo que era a consequência dos acontecimentos até então).
- Tem que haver lesão para uma das partes: uma das partes deve sair prejudicada, e
o prejuízo não pode ser enquadrável naquele contrato. Se o contrato já era,
normalmente, desequilibrado, não há que a atender à aplicação deste instituto.
- É, por último, necessário que essa lesão não esteja coberta pelos riscos próprios do
contrato: os contratos têm um risco natural, e esse risco habitual não é posto em
causa.
Secção I
Impossibilidade de cumprimento e mora não imputáveis ao devedor
A impossibilidade pode ser objetiva art.790º (isto é, relaciona-se com a prestação, com o
objeto) ou subjetiva art.791º (a regra é que está relacionado com o devedor, mas também
pode estar relacionado com o credor ou com um terceiro indispensável). A impossibilidade
subjetiva é feita para os casos em que a prestação é infungível.
Pode ser imputável ou não imputável.
Pode também ser definitiva ou temporária, nos termos do art.792º.
Pode ainda ser total ou parcial, segundo o art.793º. A impossibilidade é total quando afeta a
totalidade da prestação,e é parcial quando afeta apenas uma parte desta. Aqui, o devedor
poderá realizar apenas a parcela realizável da prestação, é uma exceção ao princípio da
integralidade, mas o credor pode recusar essa realização, desde que justificadamente, nos
termos do nº2 do mesmo artigo.
A impossibilidade pode, por último, ser absoluta ou relativa. Esta é a distinção mais
complexa: para que a impossibilidade possa ser identificada neste parâmetro de institutos
que estamos a analisar, deve ter um caráter absoluto, porque se há uma mera dificuldade
(impossibilidade relativa) na realização da prestação, não há uma verdadeira
impossibilidade. O problema é exatamente distinguir absoluto de relativo. A impossibilidade
será absoluta quando a prestação deixa de existir, mas também o poderá ser na medida em
que a prestação é realizável, mas é incrivelmente difícil de realizar (como o exemplo
clássico do anel no rio, ou do galgo afegão); aqui, atendendo às regras da boa fé, a
impossibilidade relativa deve ser equiparada a impossibilidade absoluta.
2. Efeitos
a) Extinção da obrigação
Quanto aos efeitos da impossibilidade, o devedor que não cumpriu por impossibilidade fica,
segundo o art.790º, desvinculado, porque a obrigação extingue-se (é contudo necessário
apurar se esta impossibilidade é ou não imputável, porque se o for, gera a obrigação de
indemnizar).
b) Commodum da representação
A segunda consequência é a do commodum da representação, do art.794º. Este é um
mecanismo de substituição: a prestação torna-se impossível, mas vamos tentar
salvaguardar a posição do credor relativamente a uma posição de compensação. Não
estamos, para já, a falar de situações de imputabilidade. O commodum surge nas situações
não imputáveis, e visa minimizar o risco do credor, podendo este substituir-se ao devedor e
ressarcir-se, na medida em que o devedor receba qualquer vantagem dessa impossibilidade
(ex: devedor deve entregar um quadro que deixa de existir, e recebe uma indemnização do
seguro. Parte ou a totalidade dessa indemnização irá para o credor, por efeito do 794º).
c) Efeitos na contraprestação
Nos casos de relações sinalagmáticas (como um contrato compra e venda, em que não só
um direito de crédito), deve-se aplicar o art.795º nº1 (nas situações não imputáveis). O que
resulta deste preceito é que o devedor, ao não realizar a prestação, faz com que o credor
fique desobrigado na realização da contraprestação. Se o credor tiver pago de forma
antecipada, tem direito a ser restituído, com base no enriquecimento sem causa. O preço
pode ser pago, mas por ser a contraprestação de uma prestação impossível, extingue-se
também.
Olhando para a relação entre os arts.795º e 796º, sabemos já que toda a matéria dos
arts.790º e ss. assenta em questões de risco, é no fundo o modo de repartição do risco, que
determina que face à não execução da prestação por impossibilidade da mesma, o risco
deve ser repartido entre devedor e credor.
O risco que vimos no art.795º é um risco da relação prestacional, naquilo que corresponde
ao exercício dos direitos e à realização das prestações obrigacionais. Já no art.796º, temos
um problema de risco relativo ao objeto da prestação, onde se determina que quem suporta
o risco relativo ao objeto da prestação é o adquirente, ou seja, quem tem a titularidade do
direito. Há portanto uma certa similitude com o que vimos até agora, onde o risco recai
sobre o credor. Concluímos assim que, quem for titular de uma posição jurídica ativa, seja
um crédito (art.795º), seja por exemplo um direito real (art.796º), é quem vai suportar o
risco.
Esta regra do risco ser suportado pelo titular é perceptível se nos recordarmos que, no
nosso sistema jurídico, e como estabelece o art.408º, o direito se transfere pelo mero efeito
do contrato. Assim, dá-se logo a transferência da propriedade (isto num caso de compra e
venda), sendo o novo proprietário o adquirente.
Esta última solução é a que mais se aproxima duma solução equilibrada que atende à
justiça do caso concreto.
4. Mora do credor
Prevista nos arts.813 e ss., temos um caso em que o incumprimento é imputável ao credor.
Não é necessariamente por culpa, tendo em conta que o art.813º fala simplesmente em
“Motivo não justificado”, assim são meras situações em que a prestação não é realizada por
motivos que estão na esfera do credor, e para os quais o credor não tem um fundamento
para não ter aceite a prestação.
Em caso de mora do credor, a obrigação mantém-se, não se extingue. Haverá uma
diferente repartição do risco, com base no art.815º? Não necessariamente, mas importa
saber que a mora faz recair sobre o credor o risco do incumprimento (desde que não haja
dolo do devedor), quando este já o tinha, o que é algo estranho. Dir-se-á então que esta
norma de nada serve, mas importa ter em conta que o princípio geral diz que o risco corre
por conta do credor, mas há casos que isso não acontece. Se estiver na esfera do devedor,
aí sim há uma inversão.
Haverá consequências negativas para o credor que não aceite a realização? O art.816º
fala-nos numa indemnização tão só pelas maiores despesas que o devedor esteja obrigado
a fazer.
Até quando se mantém a obrigação? O devedor pode, em princípio, fixar um prazo para o
credor aceitar. Isto porque, embora não exista propriamente um direito do devedor a
cumprir, há casos em que interesse em fazê-lo (por exemplo, um arquiteto tem interesse em
realizar uma obra, porque quer metê-la no seu currículo). Para além disso, não faz sentido
que o devedor fique eternamente vinculado à realização da prestação, pelo que se admite
uma aplicação analógica do art.808 nº1, na parte da fixação de um prazo razoável. Não
aceite a realização da prestação dentro deste prazo, há não um incumprimento definitivo (já
que este está pensado para o incumprimento do devedor) mas sim uma extinção da
obrigação, acompanha pela indemnização do art.816º.
Secção II
Falta de cumprimento imputável ao devedor
1. Aspetos gerais
É a situação normal: o devedor, por culpa sua, não realiza o pagamento, sendo-lhe assim
imputável o incumprimento.
Estas situação está prevista nos arts.798º e ss. Sendo que estamos a falar de prestações
obrigacionais, já conhecemos os princípios da sua realização (pontualmente, integralmente,
etc), e perante a violação destes, haverá também um incumprimento sob forma de
cumprimento defeituoso.
O art.798º funciona mais ou menos em espelho com o art.483º: temos um facto (que pode
ser uma omissão no caso de um incumprimento, ou uma ação no caso do cumprimento
defeituoso), culpa (falta culposa), ilicitude (porque ao dizer-se que há uma falta de
cumprimento, é porque o devedor estava adstrito a este e não o fez), dano (prejuízo), e
nexo de causalidade (prejuízo é causado).
Temos uma presunção de culpa nesta responsabilidade, como nos diz o art.799º, que
especifica também que a consequência do cumprimento defeituoso é a mesma que a do
incumprimento.
O art.800º diz ainda que pode haver responsabilidade sem culpa.
Também as situações de culpa in contrahendo e de culpa post pactum finitum se
enquadram no âmbito da responsabilidade obrigacional, assim como o contrato em favor de
terceiros. No fundo, para saber se a responsabilidade é obrigacional ou genérica, importa
saber se estamos perante um dever específico: em caso positivo, haverá responsabilidade
obrigacional.
O direito das obrigações pressupõe uma ligação estreita com o mecanismo processual de
realização da prestação.
Vamos abordar as normas dos arts.817º e ss., que tratam dos casos de realização coactiva
da prestação. Ainda que esta matéria seja parcialmente de Direito Substantivo, e por isso
está no CC, é também em parte matéria de Direito Adjetivo. Sabemos já que estes efeitos
coativos, em que se obriga o devedor a cumprir, passam pela intervenção judicial. Contudo,
prevêem-se também algumas situações de autotutela.
Outro caso em que se consegue o efeito útil por via judicial, é o da execução específica do
contrato-promessa, em que deixa de ser necessária a declaração de vontade do faltoso.
d) Resolução; remissão
Temos ainda a já vista resolução, do art.436º, que não carece de declaração judicial.
3. Impossibilidade culposa de cumprimento
O não cumprimento pressupõe pressupõe que o devedor não realizou a prestação, mas não
a realizou porque não se disponibilizou para o fazer. Importa ter em conta os casos em que
não realizou a prestação por esta ser impossível. Já vimos que quando uma prestação se
torna impossível, não deve ser realizada, e que não assentando em culpa do devedor, não
gera dever de indemnizar. Por isso mesmo, o legislador faz uma distinção entre o
mecanismos que analisamos nos arts.790º e ss., em que está em causa a impossibilidade
não imputável, e o que encontramos nos arts.801º e ss. A epígrafe também aqui fala em
impossibilidade, mas agora culposa.
Se a impossibilidade for culposa, a prestação continuará a não ser exigível (porque não
deixa de ser impossível), e haverá incumprimento com consequência indemnizatória,
aplicando-se o art.801º.
Um ponto muito importante é que a impossibilidade culposa, no fundo, acaba por ser o
regime comum do não cumprimento: poderá haver, por exemplo, incumprimento definitivo,
que não tem a sua base numa impossibilidade, mas ao qual se aplica na mesma o art.801º.
Este acaba assim por ter uma âmbito de aplicação mais amplo do que a mera
impossibilidade; as outras situações de incumprimento definitivo obedeceram a este
regime.
a) Mora
Já falámos da mora imputável ao credor, vamos agora falar da mora imputável ao devedor,
prevista no art.804º e ss. A imputabilidade, como vimos no art.799º, presume-se.
O momento de constituição da mora encontra-se previsto no art.805º. Daqui, resulta que a
mora se constitui no momento do vencimento da prestação, isto, verificado o vencimento e
não havendo cumprimento, temos mora. Há presunção de culpa, mas não há presunção de
vencimento, portanto cabe ao credor provar que houve (normalmente prova que houve
interpelação, sendo que há certos casos em que há uma moratória entre o momento da
interpelação e o momento do vencimento, apesar da regra ser que o vencimento é
automático após interpelação). A mora é assim o incumprimento temporal.
Quanto aos efeitos da mora; perpétuas obligationes. O devedor continua a ser devedor, e o
credor continua a poder exigir, o vínculo mantém-se até que haja qualquer forma de
impossibilidade ou de incumprimento definitivo. O devedor deverá realizar a prestação
assim que conseguir, mais o valor da indemnização. A indemnização em causa é uma
indemnização de responsabilidade contratual, e é por isso fixada nos termos dos arts.562º e
ss. Há contudo uma exceção: sendo a obrigação uma obrigação pecuniária, será fixada em
juros, nos termos do art.806º; é a chamada indemnização moratória. Assim, deixa de ser
necessário apurar se houve dano ou não, qual o valor do prejuízo, etc...
Outra consequência é que o devedor fica adstrito a indemnizar o credor pelas
consequências resultantes da mora. Isto está já desenvolvido no parágrafo anterior.
E por último, há uma assunção do risco pelo credor.
A mora extingue-se de três formas diferentes:
- Por acordo das partes: As partes podem acordar em deferir para momento posterior
o vencimento da obrigação, com a correspondente extinção da mora. Este acordo
tem a designação de moratória, podendo ser ou não estabelecido com eficácia
retroativa (no primeiro caso, não há qualquer indemnização; no segundo, há a
indemnização devida até ao momento do acordo).
b) Incumprimento definitivo
Generalidades:
Pressupostos:
- Nexo de causalidade: art.798º refere que o devedor só responde pelos danos que
causa ao credor.
c) Cumprimento defeituoso
1. Garantia geral
a) Declaração de nulidade
O primeiro dos meios de conservação da garantia patrimonial que a lei atribui aos credores
é a declaração de nulidade (art.605º), que consiste na faculdade de os credores, se nisso
tiverem interesse, poderem vir invocar em tribunal a nulidade dos atos praticados pelo
devedor (como, por exemplo, no caso de negócios simulados celebrados no intuito de
defraudar os credores, art. 240º).
A lei esclarece que a declaração de nulidade aproveita, não apenas ao credor que a haja
invocado, mas também a todos os demais (art.605º nº2).
Esta restituição far-se-á naturalmente ao património do devedor, em benefício de todos os
credores, pelo que o credor que invocou a nulidade não adquire, por esse motivo, qualquer
preferência no pagamento.
b) A ação sub-rogatória
A ação sub-rogatória encontra-se prevista nos arts.606º e ss. A ação sub-rogatória tem sido
classificada como ação sub-rogatória direta ou indireta.
A ação referida nos arts.606º e ss. é a ação sub-rogatória indireta. Consiste esta num meio
de conservação de garantia geral, representado pela possibilidade que os credores têm de
exercerem contra terceiro os direitos de conteúdo patrimonial que competem ao devedor,
mas que não atribui qualquer preferência no pagamento a que ela recorram, uma vez que é
exercida em proveito de todos os credores (art.609º).
Já a ação sub-rogatória direta tem natureza diferente, consistindo na possibilidade conferida
a algum ou alguns credores de exercerem em proveito próprio os direitos que competem ao
devedor, para obterem imediatamente a satisfação dos seus créditos, o que lhes atribui
preferência no pagamento sobre os restantes credores. Não se trata, por isso, de um meio
de conservação da garantia geral, sendo apenas conferida em situações particulares.
A lei qualifica ainda a situação prevista no art.2067º como sub-rogação: os credores de
alguém que repudia uma herança, em prejuízo destes, podem aceitá-la em seu nome, nos
termos previstos nos arts.606º e ss. No entanto, há diferenças substanciais entre esta figura
e a sub-rogação: na primeira está-se perante uma destruição dos efeitos de um ato (o
repúdio) que o devedor praticou. A segunda é a de que a sub-rogação neste caso não
produz a reversão dos bens ao património do devedor, já que a lei determina que, pagos os
credores do repudiante, o remanescente da herança não aproveita a ele, mas aos herdeiros
imediatos (art.2067º nº3).
Conforme se deduz a contrario d o art.608º, a ação sub-rogatória pode ser exercida tanto
judicial como extrajudicialmente. Neste segundo caso, é necessária a citação do devedor
para a ação, verificando-se assim uma situação de litisconsórcio necessário passivo, cuja
preterição acarreta a ilegitimidade do réu.
O autor da sub-rogação não adquire qualquer vantagem especial pelo facto de a ela ter
recorrido, sendo a sua atuação exercida em benefício de todos os outros credores.
c) Impugnação Pauliana
Generalidades:
A lei prevê nos arts.610º e ss. a impugnação pauliana pelo credor dos atos do devedor que
o possam prejudicar. Esta figura é destinada a permitir aos credores reagir contra os atos
do devedor que se apresentarem como lesivo da garantia geral. Essa reação é admissível
quer em relação à primeira alienação pelo devedor (art.610º e ss), quer em relação a
alienações subsequentes efectuadas pelo adquirente dos bens (art.613º).
No fundo, serve para reagir ou para impedir que o devedor efetue doações, ou para impedir
que este efetue atos onerosos com o objetivo de defraudar o ou os credores (de má fé).
Nos termos dos arts.610º e ss., a impugnação pauliana tem os seguintes pressupostos:
- Que o crédito seja anterior ao ato, ou sendo posterior, ter sido ele dolosamente
praticado com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor: Se se puder
concluir que, apesar de através de um ato anterior ao crédito, o devedor visou
dolosamente com o ato impedir a satisfação do direito do futuro credor,
justificar-se-á a concessão da impugnação pauliana, para reprimir a fraude ao
credor.
Relativamente à circunstância de o crédito ainda não ser exigível, a lei estabelece
que tal não obsta ao exercício da impugnação (art.614º nº1), sendo assim a questão
da anterioridade do crédito considerada como dizendo respeito à sua constituição e
não à sua exigibilidade.
Já relativamente ao crédito sujeito a condição suspensiva, exclui-se a impugnação,
admitindo-se apenas que, verificados os seus requisitos, o credor possa exigir a
prestação de caução (art.614º nº2).
- Que o ato seja de natureza gratuita ou, sendo oneroso, ocorra má fé tanto do
alienante como do adquirente: quando o ato é de natureza gratuita, a lei entende
que os interesses em causa num ato gratuito não podem prevalecer contra os
direitos do credor.
Quando a alienação é a título oneroso, a impugnação pauliana só pode proceder, se
o devedor e o terceiro adquirente tiverem agido de má fé (consilium fraudis),
considerando a lei como má fé a consciência do prejuízo que o ato causa ao credor
(art.612º nº2). MENEZES LEITÃO defende que o conceito de má fé deve abranger
tanto os casos de dolo como de negligência consciente em relação à verificação do
prejuízo.
Relativamente ao tipo de prejuízo em questão, ele deve ser entendido como a
impossibilidade prática de satisfação do crédito, admitindo-se assim a existência de
má fé, sempre que haja consciência ou intenção dessa impossibilidade.
Quer a má fé do alienante, quer a do adquirente, terão que ser provadas pelo credor,
para que a impugnação pauliana possa ser julgada procedente.
- Que, no caso de a nova transmissão ser a título oneroso, ocorra má fé, tanto do
alienante como do posterior adquirente.
Regime:
Em relação ao credor, os efeitos da impugnação pauliana encontram-se referidos no
art.616º. Um aspecto importante do regime em causa é o de que “os seus efeitos
aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido (art.616ºnº4) e que,
consequentemente, com a impugnação pauliana, não há qualquer retorno dos bens ao
património do devedor.
Julgada procedente a impugnação pauliana, o art.616º nº2 determina que o credor que a
ela recorre tem direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, podendo
executá-los no património do obrigado à restituição (art.818º).
O seu direito tem um conteúdo distinto, consoante o adquirente esteja de boa ou de má fé.
Se estiver de boa fé, apenas responde “na medida do seu enriquecimento” (art.616ºnº3); se
estiver de má fé, é responsável pelo valor dos bens que tenha alienado, bem como dos que
tenham perecido ou se hajam deteriorado por caso fortuito, a menos que consiga provar
que tal deterioração acontecesse também no poder do devedor (616º nº2).
O direito do credor contra o adquirente não se destina meramente a permitir a conservação
do património do devedor, afectado pela alienação, uma vez que nessa hipótese ficaria
naturalmente sujeita ao regime do concurso de credores nesse património, o que não
acontece, como nos diz já referido art.616º nº4. Há sim a atribuição ao credor de uma
pretensão direta contra o terceiro, fundada na aquisição de bens por este ao devedor e no
prejuízo que essa aquisição representou para o credor em virtude da consequente
diminuição da sua garantia patrimonial (se A deve a B, e doa um imóvel a C, logicamente
as garantias patrimoniais de B são afetadas). Entendida nestes termos, parece claro que
essa pretensão tem por fonte o enriquecimento sem causa por desconsideração de
património.
Os efeitos na relação entre o devedor e o terceiro estão no art.617º. Ocorre uma situação
de responsabilidade do devedor perante o terceiro, em virtude de o credor ter, em
consequência da ação do devedor lesiva da garantia patrimonial, adquirido sobre o terceiro
um direito à restituição dos bens na medida do seu interesse.
O art.617 nº1 determina que essa responsabilidade varia consoante o ato seja gratuito ou
oneroso. Se for gratuito, o devedor só é responsável perante o terceiro nos termos do
disposto em matéria de doações (art.957º); se for oneroso, o terceiro tem direito de exigir do
devedor aquilo com que este se enriqueceu (através do mecanismo do enriquecimento sem
causa por pagamento de dívidas alheias).
Do art.617º nº2 consta que a satisfação do direito do credor tem primazia sobre a satisfação
do direito do terceiro contra o devedor, pelo que, só após a satisfação daquele é que poderá
vir a ser exercido este.
Se vem a ocorrer a satisfação do direito de crédito, seja por cumprimento, seja por outra
causa de extinção das obrigações, quer resulte do devedor, quer de terceiro, é manifesto
que o credor perde o direito à impugnação pauliana.
Esse direito também se perderá se o devedor vier a adquirir novos bens, suficientes para
assegurar a garantia patrimonial do crédito, uma vez que neste caso qualquer dos réus
estará em condições de efetuar a prova a que se refere o art.611º.
Por último, o art.618º estabelece um prazo de caducidade de 5 anos para o direito à
impugnação pauliana, a contar da data do acto impugnável.
d) Arresto
O arresto de bens de devedor, previsto nos arts.619º e ss. (e 391º e ss. CPC), consiste
numa apreensão judicial de bens, semelhante à da penhora, e sujeita, aliás, às mesmas
regras.
O arresto pode ser requerido sempre que o credor tenha justo receio de perda da garantia
patrimonial do seu crédito (art.619º nº1). Basta, por isso, que exista um risco de o devedor ir
proceder à ocultação, alienação ou dissipação dos seus bens ou que se verifiquem
quaisquer outras circunstâncias que indiciem a possibilidade de futuro desaparecimento dos
bens que constituem a garantia patrimonial do crédito.
O credor pode requerer judicialmente que seja decretado o arresto, sem audiência do
devedor (art.393º nº1 CPC).
Se tiver sido requerido em mais bens do que os suficientes para a segurança normal do
crédito, reduzir-se-á a garantia aos justos limites (art.393ºnº2 CPC), não podendo em caso
algum o devedor ser privado dos rendimentos estritamente indispensáveis aos seus
rendimentos e da sua família (art.393ºnº3 CPC).
Se o arresto for julgado injustificado ou caducar, o requerente é responsável pelos danos
causados ao arrestado, quando não tenha agido com a prudência normal (art.621º). O
requerente do arresto pode até ser logo obrigado a prestar caução pelo tribunal (art.620º).
Decretado o arresto, os bens ficam apreendidos para garantia do cumprimento da
obrigação, como se tivessem sido penhorados, o que implica a ineficácia em relação ao
requerente dos actos de disposição dos bens arrestados (arts.622º nº1 e 819º) e a
atribuição de preferência sobre os mesmos bens, a partir da data do arresto (art.622º nº2 e
822 ºnº2).
Generalidades:
Prevista nos arts.831º e ss reforça a posição dos credores que nela são envolvidos, pelo
que constitui igualmente uma garantia especial dos obrigações.
A cessão de bens aos credores representa um exercício consensual da responsabilidade
patrimonial do devedor, já que através dela o devedor permite aos credores o exercício de
poderes de administração e disposição do seu património por forma a obterem o pagamento
dos seus créditos, sem terem que recorrer à ação executiva.
Forma:
A cessão de bens aos credores é sujeita a forma especial, já que o art.832º nº1 determina
que ela seja realizada por escrito, esclarecendo ainda que está sujeita à forma exigida para
a validade da transmissão dos bens nela compreendidos (ex: se a cessão envolver bens
imóveis, deverá necessariamente constar de escritura pública).
Para além disso, a cessão deve ser registada sempre que envolva bens sujeitos a registo
art.832ºnº2.
Objeto:
O art.831º refere que pode consistir em todo o património do devedor, ou apenas em parte
dele, o que implica que o objeto do negócio terá que corresponder a uma universalidade
patrimonial, e não a bens determinados. Se o negócio for limitado a bens considerados
individualmente, a situação corresponderá a uma dação pro solvendo.
Efeitos:
Extinção:
A cessão de bens aos credores pode extinguir-se pelas formas gerais de extinção dos
contratos. Nesta sede, aparecem no entanto reguladas especificamente o cumprimento e a
possibilidade de desistência unilateral.
Em relação ao cumprimento, ele naturalmente apenas ocorrerá com a liquidação do
património e pagamentos aos credores, só nessa altura se verificando a liberação do
devedor (art.835º).
A lei prevê ainda a possibilidade de o devedor desistir a todo o tempo da cessão. No
entanto, essa desistência não tem efeito retroativo (art.836º), ou seja, a desistência não
afeta quaisquer atos de administração ou disposição dos bens cedidos,que entretanto os
credores tenham praticado.
4. Garantias especiais
a) Prestação de caução
A caução de fonte judicial aparece referida nos arts.107º, 620º, 707º, 1898º, 2236º e 2246º.
Já a caução de fonte negocial surge sempre que as partes a estipulem, ao abrigo da sua
autonomia privada.
Estas formas de caução obedecem a requisitos menos exigentes do que a anterior, já que o
art.624º nº1 admite a sua prestação por meio de qualquer garantia, real ou pessoal.
Caso a pessoa obrigada à caução não a venha efetivamente a prestar, o credor tem o
direito a requerer o registo de hipoteca sobre os bens do devedor, ou outra cautela idónea,
salvo se for diferente a solução especialmente fixada na lei, limitando-se, no entanto, a
garantia aos bens suficientes para assegurar o direito do credor art.625º.
Pode ainda ocorrer que a caução, após prestada, se torne insuficiente ou imprópria, por
causa não imputável ao credor. Neste caso, a lei atribui-lhe o direito de exigir que esta seja
reforçada, ou que seja prestada outra forma de caução (art.626º).
5. Garantias pessoais
a) Fiança
Generalidades:
A fiança apresenta-se como a garantia pessoal típica, sendo regulada nos arts.627º a 655º.
No art.627ºnº1 refere-se que “o fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando
pessoalmente obrigado perante o credor”, sendo assim o fiador um garante da obrigação
com o seu património pessoal.
A fiança é, por isso, uma garantia pessoal, através da qual um terceiro assegura a
realização de uma obrigação do devedor, responsabilizando-se pessoalmente com o seu
património por esse cumprimento perante o credor.
Normalmente, a fiança abrange todo o património do devedor, embora possa por limitação
convencional ser restringida a alguns dos seus bens (art.602º).
A fiança resulta sempre ou de um contrato entre o fiador e o credor, ou de um contrato entre
o fiador e o devedor que, nesse caso, revestirá a natureza de um contrato a favor de
terceiro (já que o fiador compromete-se, perante o devedor a realizar uma prestação ao
credor, o que preenche os requisitos do art.443º).
Poderá eventualmente também resultar de um contrato plurilateral entre as partes.
Forma:
Conforme acima se referiu, por força da regra da acessoriedade, “a fiança tem o conteúdo
da obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do
devedor” art.634º. Daqui resulta que o credor pode exercer perante o fiador os mesmos
direitos que tem perante o devedor.
Dispõe o art.637º que o fiador pode exercer perante o credor, para além dos meios de
defesa que lhe são próprios, as excepções que competem ao devedor, salvo se forem
incompatíveis com a sua obrigação.
Uma questão especialmente regulada na lei diz respeito à eficácia perante o fiador do caso
julgado entre o credor e o devedor. Determina-se que esse caso julgado não é oponível ao
fiador, mas pode ser invocado por este em seu benefício, salvo se respeitar a circunstâncias
pessoais do devedor, mas não o prejudica o caso julgado desfavorável (art.635ºnº2).
Quando temos interrupção, suspensão ou renúncia da obrigação principal, esta não se
estende à obrigação do fiador (art.637º), ou seja, aqui não se adota o princípio da
acessoriedade.
Como já se referiu, o fiador pode ainda gozar do benefício da excussão, quer em relação ao
património do devedor (art.638º), quer em relação a bens onerados com garantia real
anterior à fiança (art.639º). O benefício de excussão é contudo excluído se o fiador a ele
tiver renunciado, o que acontece designadamente se assumir a obrigação de principal
pagador (art.640º a)). Por ser relativo apenas à fase executiva, o benefício de excussão não
impede que o credor instaure imediatamente ação judicial contra o fiador. Efectivamente, o
art.641º nº1, determina que mesmo havendo benefício de excussão, o credor tem sempre a
possibilidade de demandar o fiador isolada ou conjuntamente com o devedor, por forma a
obter um título executivo contra qualquer dos dois. Caso seja demandado sozinho, o fiador
tem sempre a possibilidade de chamar o devedor à demanda (o não chamamento importa
para o fiador a renúncia ao benefício 641ºnº2).
É ainda permitido ao fiador recusar o cumprimento enquanto o direito do credor puder ser
satisfeito por compensação com um crédito do devedor ou este tiver a possibilidade de se
valer da compensação com uma dívida do credor (art.642ºnº1).
Para além disso, também é lícito ao fiador recusar o cumprimento enquanto o devedor tiver
a possibilidade de impugnar o negócio (art.642ºnº2).
A lei prevê deveres específicos de aviso entre devedor e fiador, por forma a evitar que o
cumprimento por um acabe por lesar o outro:
- Em relação ao fiador, o art.645º nº1 dispõe que “o fiador que cumprir a obrigação
deve avisar do cumprimento o devedor, sob pena de perder o seu direito contra este
no caso de o devedor, por erro, efetuar de novo a prestação.”. Nesse caso, no
entanto, o fiador poderá repetir do credor a prestação realizada, como se fosse
indevida art.645ºnº2 (ou seja, credor devolve a prestação ao fiador).
A lei admite que o fiador possa exigir a sua liberação ou a prestação de caução, no art.648º.
As hipóteses legalmente previstas correspondem a situações em que o fiador vê
aumentarem os riscos de ser demandado em virtude da prestação da fiança (als. a) e b)),
ou se torna mais difícil o exercício da sub-rogação contra o devedor (al.c)) ou a vinculação
do fiador se tornar excessiva, ou por ultrapassar o evento ou estender-se para além do
prazo em que o devedor deveria proceder à sua exoneração (al.d)) ou ainda por vigorar em
termos indefinidos ou muito prolongados (al.e)).
Nestes casos, torna-se razoável que o fiador adquira contra o devedor o direito a obter a
sua liberação ou a prestação de caução, para garantia do seu direito à eventual
sub-rogação.
A liberação ocorrerá naturalmente com o cumprimento da obrigação do devedor perante o
credor ou com qualquer outra forma alternativa de satisfação do direito deste.
Pluralidade de fiadores:
Extinção da fiança:
b) Subfiança
c) A retrofiança
A retrofiança consiste numa fiança destinada a garantir o eventual crédito que o fiador
venha a adquirir sobre o devedor em consequência da sub-rogação legal que se opera,
caso venha a satisfazer essa obrigação (arts.644º e 592º).
Efectivamente, o fiador pode, para prestar fiança, exigir que lhe seja prestada uma garantia
adicional relativa ao crédito em que ficará investido no caso de vir ser chamado a cumprir a
sua obrigação. A retrofiança desempenha essa função, vindo um terceiro a prestar ao fiador
uma fiança relativa à obrigação do devedor resultante da sub-rogação. Assim, o retrofiador
não assume qualquer vinculação perante o primitivo credor, mas apenas perante o fiador, e
apenas na hipótese de ele vir a ser sub-rogado no crédito sobre o devedor.
É sujeita ao regime geral dos arts.627º e ss.
d) O mandato de crédito
e) A garantia autónoma
Generalidades:
Esta garantia ocorre quando determinada entidade (normalmente uma instituição bancária
ou financeira) vem garantir pessoalmente a satisfação de uma obrigação assumida por
terceiro, independentemente da validade ou eficácia desta obrigação e dos meios de defesa
que a ela possam ser opostos.
A garantia bancária distingue-se da fiança, na medida em que a obrigação do garante não
se molda sobre a obrigação principal, quer quanto ao seu objeto, quer quanto aos
pressupostos da sua exigibilidade, instituindo antes uma obrigação própria e autónoma, em
tudo distinta do devedor.
A garantia autónoma é assim um negócio causal não acessório, cuja distinção da fiança
reside precisamente na ausência da acessoriedade.
Modalidades:
Forma:
Regime:
À semelhança do que sucede com a fiança, a garantia autónoma institui uma relação
triangular, em que é possível distinguir uma relação de cobertura, entre o garantido, dador
de ordem, e o garante, no âmbito da qual este se compromete, normalmente mediante
remuneração, a prestar a garantia; uma relação de atribuição, entre o dador de ordem e o
beneficiário da garantia, que justifica a sua concessão, e finalmente, uma relação de
execução, entre o garante e o beneficiário da garantia, que consiste precisamente na
prestação da garantia.
No âmbito da relação de cobertura, há um compromisso entre o garante e o garantido pelo
qual aquele se compromete a emitir uma garantia a favor da pessoa que venha a ser
designada por este, exigindo como contrapartida o pagamento de uma comissão, ao
mesmo tempo que o garantido se compromete, além de pagar essa comissão, a reembolsar
imediatamente o garante, caso este venha a ter que efectivamente efectuar ao beneficiário
da garantia a prestação a que se comprometeu.
No âmbito da relação de atribuição, existe um negócio específico entre o dador de ordem e
o beneficiário da garantia, que justifica que a garantia venha a ser prestada.
Já na relação de execução, o garante vincula-se a prestar ao beneficiário a garantia nos
termos exactos em que se obrigou perante o dador da ordem. Nesta relação torna-se
necessário distinguir entre garantia autónoma simples e a garantia à primeira solicitação. Na
simples, o garante compromete-se a realizar ao beneficiário a prestação pecuniária objeto
da garantia, independentemente das vicissitudes da obrigação principal e das excepções
que a este pudessem ser opostas. Na garantia autónoma à primeira solicitação, a obrigação
do garante é estabelecida automaticamente perante a primeira exigência de cumprimento
por parte do beneficiário, sendo vedado ao garante opor quaisquer excepções a essa
exigência de cumprimento, a qual deve satisfazer de imediato, desde que estejam a ser
respeitados os termos estipulados para a exigência da garantia. Aqui-se estabelece a
distinção entre a garantia com ou sem justificação documental. Se é estabelecida com
justificação documental, não basta que o credor formule ao garante a exigência da garantia,
sendo necessário que essa exigência seja comprovada documentalmente com a
demonstração de que ocorreu o facto que determina a exigência da garantia. Se for sem,
basta ao credor formular pura e simplesmente a exigência da garantia.
Após a efetivação da garantia, fica naturalmente o garante sub-rogado nos direitos que o
beneficiário tinha contra o garantido, nos termos do art.592º.
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