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TEORIA GERAL DOS CONTRATOS

CONCEITO E TIPOS DE CONTRATOS

Contratos são acordos de vontades entre pelo menos duas partes, podendo ser
bilaterais (envolvendo duas partes) ou plurilaterais (com mais de duas partes). Um
exemplo de contrato bilateral é a compra e venda, enquanto um contrato unilateral é a
doação.
DEFINIÇÃO SEGUNDO CLÓVIS BEVILÁQUA

Clóvis Beviláqua define contrato como "um acordo de vontades para o fim de adquirir,
resguardar, modificar ou extinguir relações jurídicas."

A FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS

A função social dos contratos, derivada do princípio da socialidade, limita a autonomia


da vontade com base em princípios éticos como a boa-fé e a probidade.

Por exemplo, o artigo 421 do Código Civil estabelece que "a liberdade contratual será
exercida nos limites da função social do contrato."

O artigo 422 do Código Civil enfatiza que "os contratantes são obrigados a observar os
princípios de probidade e boa-fé, tanto na conclusão como na execução do contrato."

EXEMPLO DE CONTRATO QUE ENVOLVE FUNÇÃO SOCIAL

Imagine um contrato de locação em que o locador e o locatário concordam com os


termos do aluguel. Se o locador, agindo com má-fé, tenta modificar unilateralmente os
termos do contrato, isso viola a função social do contrato e a boa-fé objetiva, e o
locatário pode recorrer à justiça para proteger seus direitos.

PRINCÍPIOS DE CONTRATOS

Além da função social, os contratos são regidos por princípios como a autonomia da
vontade, a supremacia da ordem pública e o consensualismo. Estes princípios ajudam
a moldar a forma como os contratos são interpretados e aplicados.

PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA E O ABUSO DE DIREITO: VENIRE


CONTRA FACTUM PROPRIUM
A doutrina do venire contra factum proprium (ou "vir contra o próprio ato") implica que
uma pessoa não deve agir de forma contraditória, indo contra seus próprios atos ou
declarações prévias.

Um exemplo desse princípio é a Súmula 370 do STJ, que determina que "caracteriza
dano moral a apresentação antecipada do cheque pré-datado."

Esse princípio se baseia na proteção da confiança e na lealdade nas relações


contratuais.

PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA E O ABUSO DE DIREITO: SUPRESSIO


E SURRECTIO

Os princípios da supressio e surrectio dizem respeito à perda de um direito pelo não


exercício durante um período de tempo ou à criação de novos direitos devido a um
comportamento continuado.
Um exemplo de supressio ocorre quando um locatário costumava pagar o aluguel de
uma certa forma e, após um período, o locador exige um método diferente de
pagamento.

Já a surrectio pode ser exemplificada quando um comportamento contínuo de uma


das partes gera um novo direito, como o direito de receber o aluguel em um local
diferente do originalmente acordado.

PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA E O ABUSO DE DIREITO: TU QUOQUE

O princípio do tu quoque ("você também") estipula que uma pessoa não pode exigir o
cumprimento de um direito se ela própria não cumpriu seus deveres sob o contrato.

Por exemplo, se um devedor não pagou suas obrigações contratuais e tenta cobrar
uma dívida do credor, isso configura o tu quoque, uma vez que o devedor não agiu de
boa-fé cumprindo suas obrigações.

PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA E O ABUSO DE DIREITO: DUTY TO


MITIGATE THE LOSS

O duty to mitigate the loss (dever de mitigar as perdas) impõe à parte prejudicada a
obrigação de agir para minimizar seus próprios danos após um incidente. Isso é
aplicável em situações em que uma das partes sofre uma perda devido a ações da
outra parte.

Por exemplo, se um locatário percebe um vazamento de água em seu imóvel alugado,


ele deve tomar medidas razoáveis para consertar o problema e evitar danos
adicionais, em vez de permitir que o vazamento cause danos significativos.
PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE DOS CONTRATOS

Os contratos geralmente têm efeito apenas entre as partes envolvidas. No entanto, em


situações excepcionais, os contratos podem afetar terceiros quando há uma
estipulação em favor dessas partes.

Um exemplo é um contrato de seguro de vida em que os beneficiários do segurado


podem exigir o pagamento do seguro, embora não sejam as partes diretamente
envolvidas no contrato.

PRINCÍPIO DA REVISÃO DOS CONTRATOS OU DA ONEROSIDADE


EXCESSIVA

A onerosidade excessiva ocorre quando o cumprimento do contrato se torna


excessivamente oneroso para uma das partes devido a eventos imprevisíveis e
extraordinários. Nesse caso, a parte afetada pode buscar a revisão do contrato ou até
mesmo a resolução.

Isso pode ser exemplificado em contratos de longo prazo quando uma mudança
drástica nas circunstâncias torna a execução do contrato desvantajosa para uma das
partes.

PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO

Em situações em que o interesse público está em jogo, o interesse das partes


individuais pode ser subordinado ao interesse coletivo. Isso é notável em contratos
envolvendo serviços públicos e regulamentação governamental.

Por exemplo, em um contrato de concessão de serviços públicos, como a concessão


de uma rodovia, o interesse público em manter o acesso à rodovia é primordial.

FORMAÇÃO DOS CONTRATOS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002


Fases Pré-Contratuais

Primeira Fase - Negociações Preliminares ou Fase de Puntuazione


(pontuação):

 Envolve conversas prévias onde as partes pontuam o que será contratado.


 Exemplos incluem a celebração de cartas de intenções ou acordos de
cavalheiros.
 Esta fase não é regulamentada pelo Código Civil de 2002 e não tem força
vinculativa.
 A quebra da boa-fé objetiva nesta fase pode levar a responsabilidade civil pré-
contratual, de acordo com a tese majoritária da responsabilidade civil aquiliana.

Segunda Fase - Proposta ou Policitação ou Oblação (Arts. 427 a 435, CC):


 Marca o início efetivo da formação do contrato, através da declaração/proposta
do proponente/policitante e sua aceitação pelo aceitante/oblato.
 A proposta é uma declaração receptícia de vontade que deve ser séria,
concreta e baseada na boa-fé objetiva.
 A proposta vincula o proponente, iniciando a formação do contrato mesmo sem
a entrega efetiva do objeto, exceto em casos excepcionais listados no artigo
427 do Código Civil.
 O artigo 427 estabelece que "a proposta de contrato obriga o proponente, se o
contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das
circunstâncias do caso."
 Os termos da proposta podem excluí-la de obrigatoriedade.
 Em razão da natureza do negócio, a proposta pode não ser obrigatória.
 Circunstâncias específicas também podem tornar a proposta não vinculante.

Terceira Fase - Contrato Preliminar (Art. 462, CC):

 O contrato preliminar, também conhecido como pactum de contrahendo ou


contrato promessa, tem por objetivo garantir a celebração de um contrato
definitivo no futuro.
 É um contrato provisório e temporário, usado quando as partes têm interesse
mútuo em um negócio jurídico, mas desejam adiar a celebração do contrato
definitivo por um motivo momentâneo.
 Possui os mesmos requisitos essenciais do contrato definitivo, exceto quanto à
forma.

Nota: Contratos preliminares não devem ser confundidos com acordos provisórios,
minutas, cartas de intenção ou negociações preliminares, pois possuem natureza e
requisitos distintos.

EFEITOS DOS CONTRATOS: VÍCIO REDIBITÓRIO E EVICÇÃO

O Código Civil (CC) e os Tipos de Vício:

O Código Civil protege o adquirente contra dois tipos de vício: o vício redibitório
e o vício que conduz à evicção.

VÍCIO OCULTO OU VÍCIO REDIBITÓRIO (Arts. 441 a 446, CC):


Noções Introdutórias
Definição de Vício: Vício é sinônimo de defeito grave que desvaloriza a coisa
ou a torna imprópria para o uso a que se destina, atentando contra os
princípios de probidade e boa-fé.

Vício Redibitório como Garantia Legal: O vício redibitório é uma garantia


implícita imposta nos contratos comutativos e ao alienante, tornando-o
responsável pela integridade, fruição e funcionamento da coisa.

Diferença entre Vício Oculto e Aparente: O vício oculto não é facilmente


perceptível, ao contrário do vício aparente, que é visível. A diligência é
importante para distingui-los.

Requisitos para Reclamar de um Vício Oculto:

1. Defeito material da coisa.


2. Aquisição da coisa por contrato comutativo ou doação onerosa (não se
aplica a contratos aleatórios).
3. Vício oculto, existente antes do contrato, mas que se manifesta
posteriormente.
4. O vício torna a coisa inútil ou diminui seu valor (não se aplica a vícios
mínimos).

Diferença entre Vício Redibitório e Erro:

O vício redibitório é um defeito na coisa, enquanto o erro é um defeito no


consentimento.

Reclamação do Vício Redibitório:

O adquirente pode optar por uma ação redibitória (resolução do contrato) ou


uma ação estimatória (abatimento do preço, independente da extensão do
defeito).

Boa-fé e Responsabilidade do Alienante:

O alienante responde pelo vício, mesmo se o adquirente estiver de boa-fé.


Responsabilidade civil do alienante por perdas e danos depende de ele
conhecer o vício.
Cláusulas em contratos para afastar a garantia do vício podem ser
consideradas nulas.

Prazos para Ajuizamento das Ações:

Ação redibitória: 30 dias para bens móveis e um ano para bens imóveis após a
entrega efetiva.
Prazo para bens com vício tardio começa quando o adquirente tem
conhecimento, com limite de 180 dias para bens móveis e 1 ano para bens
imóveis.
Cláusula de garantia pode interromper prazos, desde que o adquirente
denuncie o defeito ao alienante nos 30 dias seguintes ao seu descobrimento.

EVICÇÃO (Arts. 447 a 457, CC): Noções Introdutórias

Evicção envolve a perda da posse ou propriedade de um bem adquirido devido


a um defeito jurídico anterior à alienação.

Direitos do Evicto:

O evicto pode pleitear a restituição integral do preço pago, indenização por


frutos perdidos, indenização por despesas e prejuízos diretos, custas judiciais e
honorários advocatícios.

DA EXTINÇÃO DO CONTRATO (Art. 472 a Art. 480)

Conceito:

 De fato, como o próprio ciclo da vida, o contrato nasce, desenvolve-se e


"morre" (extingue-se), por diversas modalidades.

 Pontes de Miranda demonstrou que o contrato é fonte de uma relação


jurídica chamada "relação jurídica contratual". A relação jurídica
contratual é a eficácia do contrato, por essa razão, quando se fala em
extinção dos contratos, na maioria das vezes, se está fazendo menção
à extinção da relação jurídica contratual.

 A doutrina de Orlando Gomes estabeleceu a seguinte classificação das


formas de extinção dos contratos:
1. Extinção normal dos contratos (morte natural).
2. Causas anômalas de extinção dos contratos, divididas em:
a) Fatos anteriores à celebração.

b) Fatos posteriores à celebração.

CLASSIFICAÇÃO DAS FORMAS DE EXTINÇÃO DO CONTRATO:

EXTINÇÃO NATURAL DO CONTRATO:

 A extinção natural do contrato ocorre quando a relação contratual se


dissolve pela verificação de uma circunstância prevista pelas partes e
considerada razoavelmente esperada.
 O cumprimento do contrato é a forma mais óbvia de extinção natural,
pois ocorre quando as obrigações do contrato são cumpridas,
extinguindo a relação contratual.
Exemplo: Em um contrato de venda de um bem móvel, quando o preço é pago
e a coisa é entregue, a obrigação é cumprida, e a relação contratual é extinta.

FORMAS DA EXTINÇÃO NATURAL DO CONTRATO:

1. Cumprimento do contrato ou exaustão do seu objeto:

 O contrato é feito para ser cumprido, e o cumprimento da prestação


extingue o contrato, independentemente da possibilidade de repetição
da prestação.
Exemplo: Um contrato de prestação de serviços, como um músico que toca seu
contrabaixo em uma banda de rock em um único dia. Mesmo que ele possa
prestar novos serviços, a relação contratual da primeira prestação é extinta
com seu cumprimento.

1.1 Verificação de fatores eficaciais:

 As partes de um contrato podem estabelecer elementos limitadores da


duração do contrato, prevendo sua extinção.
Exemplos de fatores eficaciais:
a) Vencimento do termo: O contrato pode ser estipulado com um prazo
definido, e sua extinção ocorre automaticamente no vencimento do termo.
b) Implemento de condição resolutiva: O contrato pode estar sujeito à
ocorrência de um evento futuro e incerto, e sua extinção ocorre quando esse
evento se concretiza.

CAUSAS ANTERIORES OU CONTEMPORÂNEAS À FORMAÇÃO DO


CONTRATO:

Nulidade ou anulabilidade:

A ocorrência de nulidade, seja absoluta ou relativa, no contrato é uma hipótese


que pode anteceder a celebração, mas a extinção ocorre pelo reconhecimento
judicial da nulidade ou anulabilidade, desfazendo-se qualquer vínculo
contratual existente entre as partes.

Redibição:

A redibição refere-se à extinção do contrato devido à existência de um vício


redibitório, que é um defeito oculto que diminui o valor ou prejudica a utilização
da coisa recebida por força de um contrato comutativo. A redibição pode gerar
a extinção do contrato ou a revisão de suas prestações, com abatimento do
preço.

Direito de arrependimento:
O direito de arrependimento permite que as partes se desfaçam do contrato em
um período de carência, desde que seja expressamente previsto no contrato. O
contrato pode estabelecer arras penitenciais para compensar o exercício do
direito de arrependimento.

CAUSAS SUPERVENIENTES À FORMAÇÃO DO CONTRATO:

Resilição:

A resilição refere-se à extinção do contrato por iniciativa de uma ou ambas as


partes. Ela pode ser bilateral (distrato) ou unilateral, desde que a lei a permita
expressa ou implicitamente.

Resolução:

A resolução ocorre devido ao descumprimento das obrigações contratadas por


uma das partes. Pode ser provocada pela parte lesada pelo descumprimento e
levar ao desfazimento da relação contratual. A resolução é eficaz mediante
interpelação judicial.

Morte:

A morte de uma das partes é causa de dissolução do contrato em avenças


personalíssimas, contraídas em função da pessoa do contratante (intuitu
personae). Em outros casos, as obrigações contratuais e direitos
correspondentes podem ser transmitidos aos herdeiros do contratante falecido.

Caso fortuito ou força maior:

O caso fortuito e a força maior são eventos imprevisíveis que, quando ocorrem,
podem levar à extinção do contrato. Não há diferença pragmática entre esses
institutos, ambos resultam na dissolução do contrato sem ônus às partes.

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