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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

DOS CONTRATOS
TÍTULO I
TEORIA GERAL DOS CONTRATOS
CAPÍTULO I
NOÇÃO GERAL DE CONTRATO

1- CONCEITO
Contrato é fonte de obrigação. Os fatos humanos que o CC 2002 considera
geradores de obrigação são:

a) Contratos
b) Declarações unilaterais de vontade
c) Atos ilícitos dolosos ou culposos

Contrato é o acordo de vontades que tem por fim criar, modificar ou extinguir
direitos. Constitui o mais expressivo modelo de negócio jurídico bilateral. Trata-se, pois,
de ato jurídico bilateral (ou plurilateral), dependente de pelo menos duas declarações de
vontade, cujo objetivo é a criação, a alteração ou até mesmo a extinção de direitos e
deveres. Nesse contexto, é ato jurídico em sentido amplo, em que há o elemento norteador
da vontade humana que pretende um objetivo de cunho patrimonial (constitui negócio
jurídico por excelência).

2- CONDIÇÕES DE VALIDADE
Os requisitos ou condições de validade são de duas espécies:

a) DE ORDEM GERAL, comum a todos os atos e negócios jurídicos, como a:

I) Capacidade do agente: os negócios são nulos ou anuláveis se a incapacidade


for absoluta ou relativa e não suprida pela assistência ou representação.

II) Objeto lícito, possível, determinável ou determinado: o objeto será lícito


quando não atentar contra a lei, moral ou os bons costumes. A impossibilidade
que vicia o negócio pode ser física ou jurídica. O negócio deve ter objeto
determinado ou ao menos determinável, sob pena de nulidade.

III) Forma prescrita ou não defesa em lei. Em regra, a forma é livre, a não ser
nos casos em que a lei determina uma forma específica para dar mais segurança
ao negócio.

b) DE ORDEM ESPECIAL, específico dos contratos: o consentimento recíproco


ou acordo de vontades. Deve ser livre e espontâneo, sob pena de ter sua validade
afetada pelos vícios do negócio (coação, dolo, lesão etc.). A manifestação pode
ser tácita quando a lei não exigir que seja expressa.

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IMPORTANTE!!! Como contrato é um acordo de vontades, NÃO se admite a


existência de contrato consigo mesmo. Maria Helena Diniz aponta, como elemento
essencial para a formação do contrato, a alteridade, que possui natureza estrutural, e se
constitui pela presença de pelo menos duas pessoas quando da constituição da relação
contratual. Seria vedada, assim, a autocontratação. O que há, na realidade, são contratos
que se assemelham a contrato dessa natureza, como ocorre no cumprimento de mandato
em causa própria. Para Flávio Tartuce, mesmo em tais hipóteses (aparentemente
autorizadas pelo disposto no art. 117 do CC), a presença de duas pessoas continua sendo
essencial para a validade do contrato, uma vez que a outorga de poderes para celebração
de contrato consigo mesmo pressupõe a prévia celebração do contrato de mandato, por
exemplo, entre duas partes diferentes para que, em uma segunda relação contratual, o
representante realize o negócio em causa própria (a alteridade é, portanto, meramente
aparente).

Art. 117. Salvo se o permitir a lei ou o representado, é anulável o


negócio jurídico que o representante, no seu interesse ou por conta de
outrem, celebrar consigo mesmo.

3- PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO CONTRATO


Os mais importantes princípios do direito contratual são:

a) Princípio da AUTONOMIA DA VONTADE (atualmente denominado


AUTONOMIA PRIVADA): Significa ampla liberdade de contratar. Têm as
partes a faculdade de celebrar ou não contratos, sem qualquer interferência do
Estado. Podem celebrar contratos nominados ou também inominados. A doutrina
estabelece distinção entre liberdade de contratar (significando a liberdade para
escolha da pessoa ou das pessoas com as quais o negócio será celebrado) e
liberdade contratual (traduzindo a autonomia relacionada ao conteúdo do negócio
jurídico).

b) Princípio da SUPREMACIA DA ORDEM PÚBLICA: Limita o da autonomia


da vontade, dando prevalência ao interesse da ordem pública.

Obs.: Dirigismo contratual. Intervenção estatal no contrato, limitando a autonomia


privada, para garantir a supremacia do interesse público.

c) Princípio do CONSENSUALISMO: Decorre da moderna concepção de que o


contrato resulta do consenso, do acordo de vontades, independentemente da
entrega de coisa.

Ex.: A compra e venda torna-se obrigatória desde que as partes acordem no objeto e no
preço, independentemente da entrega da coisa.

Os contratos são em regras consensuais. Alguns poucos, contudo, são reais,


porque somente se aperfeiçoam com a entrega do objeto, subsequente ao acordo de
vontades. Ex.: Depósito, comodato, mútuo etc.

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d) Princípio da RELATIVIDADE DOS CONTRATOS: Funda-se na ideia de que


os efeitos dos contratos só se produzem em relação às partes, não afetando
terceiros, salvo algumas exceções, tais como:

Ex.: Contrato com pessoa a declarar: tal contrato, regulado a partir do art. 467 do CC,
traduz a hipótese em que, no momento da conclusão do contrato, uma das partes ressalva
a faculdade de indicar terceiro que deve adquirir os direitos e assumir as obrigações
contratuais. Nesse contrato há uma cláusula declarando que quem vai assumir o ônus do
contrato é outra pessoa, que não os contraentes. Tal figura é muito comum no contrato
preliminar.

Ex.: Estipulação em favor de terceiro: a exemplo do seguro de vida. Na estipulação


em favor de terceiro o terceiro é destinatário do bônus do contrato, podendo exigir o seu
adimplemento.

Ex.: Promessa de fato de terceiro: regulada nos artigos 439 e 440 do CC, representa a
figura negocial pela qual determinada pessoa promete que uma determinada conduta
seja praticada por outrem, sob pena de responsabilização civil.

IMPORTANTE!!! TUTELA EXTERNA DO CRÉDITO ou teoria do terceiro


cúmplice.

A TEORIA DO TERCEIRO CÚMPLICE decorre da interferência ilícita do


terceiro em negócios jurídicos alheios, por meio da indução ao inadimplemento.

Segundo a doutrina da eficácia externa das obrigações (teoria do terceiro


cúmplice), admite-se, além de um efeito interno das obrigações, dirigido contra o
devedor, um efeito externo, traduzido no dever imposto ao restante das pessoas de
respeitar o direito do credor, ou seja, de não impedir ou dificultar o cumprimento da
obrigação. Segundo o enunciado 21 do CJF/STJ, aprovado na I Jornada de Direito Civil:
“A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui
cláusula geral, a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em
relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito”.

A função social do contrato dá substrato à teoria da tutela externa do crédito,


permitindo a responsabilização, a título extracontratual, do terceiro que participa
juntamente com o devedor, por meio da celebração de um contrato sucessivo e
incompatível com aquele anteriormente celebrado, da lesão a um crédito alheio. Tal
contrato, porque celebrado pelo terceiro que tinha ciência da sua incompatibilidade
(material ou jurídica) com um contrato anterior, configura hipótese de abuso de direito,
especificamente de abuso da liberdade de contratar, a ser coibida com fundamento no art.
421 (a liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato –
Redação dada pela Lei 13.874/19).

No Código Civil Brasileiro essa teoria encontra previsão expressa no art. 608, o
qual dispõe que "aquele que aliciar pessoas obrigadas em contrato escrito a prestar
serviço a outrem pagará a este a importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste
desfeito, houvesse de caber durante dois anos".

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Ex.: Caso Zeca Pagodinho x Nova Schin x AMBEV. No contrato entre Zeca e Nova
Schin, a AMBEV se intrometeu, violando o primeiro contrato. A AMBEV, terceiro que
interferiu no contrato, será responsabilizada, mesmo se isso ocorrer após o fim do
contrato, porque a boa-fé vale antes, durante e após o contrato (dever anexo).

e) Princípio da OBRIGATORIEDADE DOS CONTRATOS: Representa a força


vinculante das convenções. Pelo princípio da autonomia da vontade, ninguém é
obrigado a contratar. Os que o fizerem, porém, sendo o contrato válido e eficaz,
devem cumpri-lo.

Tem por fundamentos: 1) necessidade de segurança nos negócios e 2)


intangibilidade ou imutabilidade do contrato, uma vez que o acordo de vontade faz lei
entre as partes (pacta sunt servanda), não podendo ser alterado nem mesmo pelo juiz.
Qualquer modificação deve ser bilateral. Esse princípio tem como limite a escusa por
caso fortuito ou força maior, situações que autorizam a relativização do que restou
ajustado.

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso


fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles
responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato
necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

f) Princípio da REVISÃO DOS CONTRATOS ou da ONEROSIDADE


EXCESSIVA: opõe-se ao princípio da obrigatoriedade, pois permite aos
contratantes recorrerem ao judiciário para obter alteração da convenção, se a
prestação se tornar excessivamente onerosa em virtude de acontecimentos
extraordinários E imprevisíveis. Constitui aplicação da antiga cláusula rebus sic
stantibus e da teoria da imprevisão.
Da Resolução por ONEROSIDADE EXCESSIVA

Art. 478. Nos contratos de EXECUÇÃO CONTINUADA OU


DIFERIDA, se a prestação de uma das partes se tornar
excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em
virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o
devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a
decretar retroagirão à data da citação.

Art. 479. A resolução poderá (DEVERÁ) ser evitada, oferecendo-se o


réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato.

Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das


partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado
o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.

IMPORTANTE!!! Cláusula rebus sic stantibus: Consiste basicamente na presunção


segundo a qual, nos CONTRATOS COMUTATIVOS, de TRATO SUCESSIVO ou
DE EXECUÇÃO DIFERIDA, há existência implícita (não expressa) de uma cláusula
pela qual a obrigatoriedade de seu cumprimento pressupõe a inalterabilidade de
situação de fato. Se esta, no entanto, modificar-se em razão de acontecimentos
extraordinários, que tornem excessivamente oneroso para o devedor o seu adimplemento,
poderá este requerer ao juiz que o isente da obrigação parcial ou totalmente.

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No Brasil recebeu o nome de TEORIA DA IMPREVISÃO, pois inclui como


requisito a imprevisibilidade. Portanto, não é suficiente que o fato seja extraordinário
para justificar a alteração contratual. Passou a ser exigível também que fosse imprevisível.

A teoria da imprevisão é a doutrina que sustenta a possibilidade de revisão ou


resolução de contrato, caso acontecimento superveniente e imprevisível,
desequilibrando a base econômica do negócio, imponha a uma das partes onerosidade
excessiva.

Percebe-se que a teoria da imprevisão vai ao encontro da função social do


contrato.

IMPORTANTE!!! A APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO tem como


requisitos:

a) vigência de um contrato comutativo (em que as partes conhecem


previamente as prestações e obrigações assumidas) e de execução diferida (em ato
único, porém postergada no tempo) ou de trato sucessivo (em atos sucessivos,
parcelados),
b) ocorrência superveniente de fato extraordinário e imprevisível,
c) considerável alteração da situação de fato existente no momento da
execução, em confronto com a que existia por ocasião da celebração e
d) onerosidade excessiva para um dos contratantes e vantagem excessiva para
o outro.

IMPORTANTE!!! Em regra, a teoria da imprevisão não é aplicável aos contratos


aleatórios, porque estes envolvem um risco já assumido pelas partes, salvo se o evento
imprevisível decorrer de fatores estranhos ao risco próprio do contrato.

#Qual é a diferença entre lesão e teoria da imprevisão?


A lesão é um defeito invalidante do negócio jurídico, caracterizado por um
desequilíbrio prestacional que acompanha o surgimento do próprio negócio; já na
teoria da imprevisão, não se cuida de invalidar o negócio, mas sim, revisá-lo ou resolvê-
lo, caso a avença haja se desequilibrado após a sua conclusão (o fato é superveniente).

IMPORTANTÍSSIMO!!!! No DIREITO DO CONSUMIDOR NÃO se aplica a


teoria da imprevisão. Aplica-se, na seara consumerista, a TEORIA DO
ROMPIMENTO DA BASE OBJETIVA DO NEGÓCIO JURÍDICO, porque no
CDC, para favorecer o consumidor, o legislador não exigiu a imprevisibilidade do
acontecimento (art. 6º, V, do CDC).

IMPORTANTE: A teoria da imprevisão é de origem francesa (surgida após a 1ª Guerra


Mundial), ostentando natureza subjetiva. Exige a imprevisibilidade e
extraordinariedade do fato superveniente. Exige, por fim, extrema vantagem para o
credor. A teoria do rompimento da base objetiva do negócio jurídico, por outro lado,
surgiu na Alemanha (também no pós 1ª Guerra Mundial), ostentando natureza objetiva,
uma vez que dispensa a imprevisibilidade e o caráter extraordinário dos fatos
supervenientes. Somente exige um fato superveniente que rompa a base objetiva do
negócio, dispensando, também, a existência de extrema vantagem para o credor.

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g) Princípio da BOA-FÉ OBJETIVA: é uma cláusula geral, de natureza


principiológica, impositiva de eticidade nas relações jurídicas. A boa-fé objetiva
é uma regra de conteúdo ético e exigibilidade jurídica. Trata-se de uma cláusula
geral do direito (de todos os ramos). Traduz exigência de conduta leal dos
contratantes, daí se originando deveres anexos ou laterais de conduta, que são
ínsitos a qualquer negócio jurídico, não havendo sequer a necessidade de
previsão no instrumento negocial, a exemplo do: dever de cuidado em relação à
outra parte negocial; dever de respeito; dever de informar a outra parte sobre o
conteúdo do negócio; dever de agir conforme a confiança depositada; dever de
lealdade e probidade; dever de cooperação ou colaboração; dever de agir com
honestidade; dever de agir conforme a razoabilidade, a equidade e a boa razão.
A quebra dos deveres anexos gera a violação positiva do contrato, com
responsabilização civil objetiva daquele que desrespeita a boa-fé objetiva.

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão


do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-
fé (antes, durante e depois do contrato).

Guarda relação com o princípio segundo o qual ninguém pode beneficiar-se da


própria torpeza.

IMPORTANTE!!! Decorre do princípio da boa-fé a exigência de que as partes se


comportem de forma correta não só durante as tratativas, como também durante a
formação e o cumprimento do contrato.

FUNÇÕES da boa-fé objetiva:

I) Função interpretativa: a boa-fé auxilia o juiz a interpretar o contrato. Quando o juiz


interpreta um contrato, ele deve extrair eticidade.

Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a


boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

II) Função de controle (vedação ao abuso de direito) e vedação ao Venire contra


factum proprium, vedação de que a parte exerça uma posição jurídica em contradição
com o comportamento assumido anteriormente. Além disso, a boa-fé serve também para
limitar os direitos das partes, em hipóteses em que tal exercício viole o postulado da
boa-fé, considerado um standard jurídico (um padrão de comportamento considerado
ético). Aqui a boa-fé pode ser utilizada como meio de defesa, em situações de ação
judicial injustamente ajuizada por uma das partes contratantes.

Enunciado 362 IV Jornada de Direito Civil,


“a vedação do comportamento contraditório funda-se na proteção da
confiança, tal como se extrai dos artigos 187 e 422 CC”

III) Função constitutiva de deveres anexos ou de proteção: a boa-fé normatiza


deveres anexos, presentes implicitamente em qualquer contrato, cujo descumprimento
também gera responsabilidade civil objetiva. São deveres invisíveis.

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Obs.: Esses deveres anexos decorrentes da boa-fé objetiva são tão relevantes que o
enunciado 24 da primeira jornada de direito civil estabeleceu que, em caso de
descumprimento, a responsabilidade civil é objetiva.

São deveres anexos decorrentes da boa-fé objetiva: dever de guarda dos


automóveis nos estacionamentos das lojas; dever do advogado de dar ao seu cliente
ciência do risco do processo; dever de sigilo; dever de informação (é imperativo ético-
jurídico prestar as informações devidas ao outro contratante, sob pena de
responsabilidade civil), a proibição do venire contra factum proprium, o duty to mitigate
the loss entre outros.

IMPORTANTE!!! O descumprimento desses deveres anexos é denominado pela


doutrina de violação POSITIVA do contrato (ou adimplemento ruim).

O princípio da boa-fé se projeta também na fase pós-contratual e pré-


contratual.

Obs.: Fase pré-contratual (ou de puntuação, ou punctação) são as negociações


preliminares, a redação da minuta. Nessa fase também se aplica a boa-fé.

IMPORTANTE!!! “Leading case”: CICA versus agricultores de tomate do RS. Todos


os anos os agricultores plantavam tomates e depois assinavam contrato. Em determinado
ano, a empresa se negou a assinar. A jurisprudência do RS entendeu que houve quebra
da boa-fé pré-contratual, porquanto havia justa expectativa de celebrar o contrato.

Obs.: Fase pós-contratual. Após a execução do contrato também deve existir boa-fé.
Ex.: Zeca pagodinho x Nova Schin x AMBEV.

IMPORTANTE: Não se pode confundir boa-fé objetiva com boa-fé subjetiva. A boa-
fé subjetiva não é um princípio, mas sim um estado psicológico. Para examinara a boa-
fé subjetiva, deve-se analisar se a pessoa pensava, sinceramente, que agia ou não de
acordo com o direito (é examinado se a pessoa tinha boas ou más intenções).

h) Princípio da FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO: é uma cláusula geral


(ordem ao juiz para complementá-la no caso concreto, preencher essa cláusula geral
à luz do caso concreto).

IMPORTANTE!!! As cláusulas gerais são exemplo de como o efeito irradiador dos


direitos fundamentais se dá. Por meio das cláusulas gerais os direitos fundamentais
se aplicam às relações entre os particulares (eficácia horizontal indireta dos
direitos fundamentais).

IMPORTANTE: Flávio Tartuce sustenta que as cláusulas gerais podem ser


conceituadas como janelas abertas deixadas pelo legislador para preenchimento pelo
aplicador do Direito, caso a caso. São exemplos: a função social do contrato, a função
social da propriedade, a boa-fé, os bons costumes, as atividades de risco. As cláusulas
gerais têm um sentido dinâmico, o que as diferencia dos conceitos legais
indeterminados, construções estáticas que constam da lei sem definição. Assim, pode-
se afirmar que quando o aplicador do Direito cumpre a tarefa de dar sentido a um
conceito legal indeterminado, passará ele a constituir uma cláusula geral.

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O CC/02 traz uma cláusula expressa para a função social do contrato

Art. 421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social
do contrato. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019);
Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o
princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão
contratual. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

A função social é uma contenção da liberdade contratual, é uma limitação à


autonomia da vontade (dirigismo contratual).

Por ser uma cláusula geral, é extremamente aberta.

A doutrina especializada na função social costuma afirmar que esse princípio se


projeta em dois níveis: intrínseco e extrínseco ao contrato (ou seja, dentro e fora da
relação contratual). Há, portanto, uma dupla eficácia do princípio da função social do
contrato: eficácia interna e eficácia externa.

No nível intrínseco/interno, a função social determina equilíbrio e lealdade no


contrato (ligação com o princípio da boa-fé objetiva e da equivalência material). São
cinco aspectos principais: Proteção dos vulneráveis contratuais (a exemplo da proteção
do CDC outorgada ao consumidor); Vedação da onerosidade excessiva ou desequilíbrio
contratual (efeito gangorra); Proteção da dignidade humana e dos direitos da
personalidade no contrato; Nulidade das cláusulas antissociais (tidas como abusivas);
Tendência de conservação contratual, sendo a extinção do contrato a última medida a
ser adotada. Exemplos de providências relativas ao nível intrínseco: Redução de uma
multa abusiva (ver REsp 476649/SP - o STJ, aplicando a função social, determinou que
no caso da mora no pagamento da mensalidade escolar cabe multa não de 10%, mas de
2%).

No nível extrínseco, significa que todo contrato deve respeitar valores sociais
constitucionalmente tutelados. Existem dois aspectos principais: Proteção dos direitos
coletivos e difusos (a exemplo da função socioambiental do contrato); Tutela externa do
crédito (possibilidade de o contrato gerar efeitos perante terceiros ou de condutas de
terceiros repercutirem no contrato). Exemplos de providências relativas ao nível
extrínseco: Contrato deve respeitar o meio ambiente; Empresa “A” resolve contratar
uma empresa de publicidade, a empresa B. Internamente, o contrato estava perfeito e
adequado. Ocorre, porém, que o objeto do contrato era publicidade enganosa. Trata-se
de contrato que viola a sua função social, no aspecto externo.
Súmula: 302 - STJ É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde
que limita no tempo a internação hospitalar do segurado. (FERE A
FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO)

4- CONCEITOS FUNDAMENTAIS RELATIVOS AOS PRINCÍPIOS


DA FUNÇÃO SOCIAL E DA BOA-FÉ OBJETIVA
IMPORTANTÍSSIMO!!!!

1) DUTY TO MITIGATE THE LOSS: conceito norte americano que traduz a regra de
que a parte, na relação obrigacional, deve atuar em respeito à boa-fé para atenuar
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o dano evitável. Trata do dever imposto ao credor de mitigar suas perdas, ou seja, o
próprio prejuízo. A vítima tem o dever, portanto, de fazer tudo o que pode para atenuar
o dano. Se a parte que teve a oportunidade de atuar não atuou, não ganha indenização
pelos danos que não evitou. Segundo o enunciado 169 do CJF/STJ, aprovado na III
Jornada de Direito Civil, “o princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o
agravamento do próprio prejuízo”. A ilustrar, pode ser citada a situação de
inadimplemento em contrato bancário, ocasião em que, segundo a figura parcelar da
boa-fé objetiva, não poderia a instituição financeira permanecer inerte, aguardando que,
diante da alta taxa de juros prevista no instrumento contratual, a dívida atinja montantes
astronômicos.

2) VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM (teoria dos atos próprios): Significa


que, em respeito à boa-fé e à confiança, proíbe-se comportamento contraditório (a
supressio e a surrectio encontram fundamento no venire contra factum proprium).
Determinada pessoa não pode exercer um direito próprio contrariando um
comportamento anterior, devendo ser mantida a confiança e o dever de lealdade,
decorrentes da boa-fé objetiva. O conceito mantém relação com a tese dos atos próprios.
A pessoa não pode, pois, adotar dois comportamentos incompatíveis entre si (mesmo
que formalmente lícito).

Ex.: STF – Marido celebrou compromisso de compra e venda sem anuência da esposa.
A esposa, entretanto, informou em uma ação que concordou tacitamente com a venda.
Dezessete anos após a sua celebração pretendeu anular o negócio, o que foi afastado
pela presença dos comportamentos contraditórios entre si.

3) CLÁUSULA DE ESTOPPEL: é uma aplicação do venire contra factum proprium


aos Estados soberanos nas relações internacionais. Ex.: Caso da Bolívia, que estatizou
subsidiárias da Petrobras, mesmo depois de ter, durante anos, incentivado a presença de
Petrobras.

4) TU QUOQUE: a frase completa é “tu quoque brute, mi fille” (até tu, Brutus, meu
filho). É o conceito que, à luz especialmente do princípio da confiança, impede, na
relação contratual que a parte seja surpreendida, uma vez que a surpresa viola a
confiança (Julio César se surpreendeu ao ver que seu filho Brutus o esfaqueava).
Significa que um contratante que violou uma norma jurídica não poderá, sem a
caracterização do abuso de direito, aproveitar-se dessa situação anteriormente criada
pelo desrespeito. Desse modo, está vedado que alguém faça contra o outro o que não
faria contra si mesmo (regra de ouro). A ilustrar o conceito parcelar, pode-se citar o
entendimento que reputou não poder o contratante deixar de cumprir o contrato, com
base na exceção do contrato não cumprido, se dá causa ao inadimplemento da parte
contrária.

5) SUPRESSIO E SURRECTIO: a supressio significa a supressão, por renúncia tácita,


de um direito ou de uma posição jurídica, pelo seu não exercício com o passar dos
tempos (a exemplo do disposto no art. 330 do CC). A ilustrar, tem-se a situação em que,
caso tenha sido previsto no instrumento obrigacional o benefício da obrigação portável
(cujo pagamento dever ser realizado no domicílio do credor), e tendo o devedor o
costume de pagar no seu próprio domicílio de forma reiterada, sem qualquer
manifestação do credor, a obrigação passará a ser considerada quesível (aquela cujo
pagamento deve ocorrer no domicílio do devedor). Ao mesmo tempo em que o credor

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perde um direito por essa supressão, surge um direito a favor do devedor, por meio da
surrectio, direito este que não existia juridicamente até então, mas que decorre da
efetividade social, de acordo com os costumes. Supressio e surrectio constituem duas
faces da mesma moeda.

5- PACTOS SUCESSÓRIOS

Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva, consoante dispõe o
art. 426 do CC (proibição ao pacta corvina).

O nosso ordenamento só admite duas formas de sucessão causa mortis: a legítima


e a testamentária. Somente a partilha inter vivos pode ser considerada exceção a essa
norma.

6- FORMAÇÃO DO CONTRATO

Passada a fase de puntuação (negociações preliminares) ➔ uma das partes faz


a proposta à outra parte (quem faz a proposta é chamado de proponente ou policitante;
a outra parte é o aceitante ou oblato) ➔ o oblato aceita ➔ o encontro da proposta e
da aceitação é o coração do contrato.

IMPORTANTE!!! A fase de negociações preliminares não está prevista no Código


Civil de 2002, sendo anterior à formalização da proposta. Justamente por não estar
regulamentado no Código Civil, não se pode dizer que o debate prévio vincula as partes,
como ocorre com a proposta ou policitação. Desse modo, não haveria
responsabilidade por perdas e danos em caso de desinteresse. Entretanto, é possível
a responsabilização pela aplicação do princípio da boa-fé objetiva, se ficar demonstrada
deliberada intenção, com a falsa manifestação de interesse, de causar dano ao outro
contratante. E o fundamento de tal responsabilidade não é o descumprimento contratual,
mas sim a prática de abuso de direito (art. 187 do Código Civil), expressão da função de
controle da boa-fé objetiva. A responsabilidade, no caso, será OBJETIVA. Em suma,
deve-se concluir que a fase de puntuação gera deveres às partes, pois em alguns casos,
diante da confiança depositada, a quebra desses deveres pode gerar a responsabilização
civil.

Obs.: No CDC vigora o princípio da vinculação com maior efetividade do que no CC.

No CC, existem situações em que a proposta deixa de ser obrigatória (artigos


427 e 428) e para o seu adequado entendimento faz-se necessário entender a diferença
entre a formação do contrato entre presentes e ausentes.

Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente (REGRA),


se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio,
ou das circunstâncias do caso (EXCEÇAO).

Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta:


I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente
aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por
telefone ou por meio de comunicação semelhante;
II - se, feita sem prazo a pessoa ausente, tiver decorrido tempo
suficiente para chegar a resposta ao conhecimento do proponente;

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III - se, feita a pessoa ausente, não tiver sido expedida a resposta
dentro do prazo dado;
IV - se, antes dela, ou simultaneamente, chegar ao conhecimento
da outra parte a retratação do proponente.

Então, a proposta, como regra, obriga o proponente. Tal regra comporta uma
série de exceções.

IMPORTANTE!!! No CDC o efeito vinculativo da proposta é muito mais forte do


que no CC, pois normalmente se dirige a pessoas indeterminadas. A recusa indevida
de dar cumprimento à proposta dá ensejo à execução específica (CDC art. 35), podendo
o consumidor optar, em seu lugar, por aceitar outro produto, rescindir o contrato e pedir
perdas e danos.

- Pessoas presentes: são aquelas que mantêm contato imediato e simultâneo (também no
telefone, por meio de dispositivos de mensagens instantâneas. Tem que haver
simultaneidade).

- Pessoas ausentes: não há imediatidade (ex.: carta e e-mail).

Dispõe o art. 429 do CC:

Art. 429. A oferta ao público equivale a proposta quando encerra os


requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das
circunstâncias ou dos usos.
Parágrafo único. Pode revogar-se a oferta pela mesma via de sua
divulgação, desde que ressalvada esta faculdade na oferta realizada.

6.1 FORMAÇÃO DOS CONTRATOS ENTRE AUSENTES

Entre presentes, os contratos reputam-se concluídos no momento da aceitação.

Entre ausentes, o contrato deve ser reputado como concluído a partir do momento
em que a aceitação for expedida (art. 434 do CC). Dessa maneira, conclui Flávio Tartuce
que o Código Civil em vigor, assim como o anterior, continua adotando a teoria da
agnição – ou da informação –, na subteoria da expedição, como regra geral.

Entretanto, tal regra comporta exceções, sendo certo que o Código Civil ainda
adota a teoria da agnição, na subteoria da recepção, pela qual o contrato é formado
quando a proposta é aceita e recebida a resposta pelo proponente. Essa teoria deve ser
aplicada nos seguintes casos: a) se antes da aceitação ou com ela chegar ao proponente a
retratação do aceitante; b) se o proponente se houver comprometido a esperar resposta,
hipótese em que as partes convencionaram a aplicação da subteoria da recepção; c) se a
resposta não chegar no prazo convencionado (outra hipótese em que houve convenção
entre as partes da aplicação da subteoria da recepção).

Há divergência doutrinária, no entanto, a respeito do momento da conclusão do


negócio.

Existem duas correntes:

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

1ª - Corrente da cognição: sustenta que o contrato só se forma quando o proponente/


policitante toma conhecimento da resposta (não defender essa).

2ª - Corrente da agnição: dispensa que o proponente/policitante tome conhecimento da


resposta. Subdivide-se em:

a) teoria da declaração propriamente dita: o contrato se forma quando o


aceitante declara que aceitou, intimamente (teoria fraca).

b) teoria da expedição: o contrato se forma não quando a resposta é declarada,


mas sim quando a resposta é expedida.

c) teoria da recepção**: o contrato só se forma quando a resposta é recebida


pelo proponente. Ex.: no protocolo da empresa.

Parte da doutrina, capitaneada por Bevilaqcua, sustenta a teoria da expedição.

Outros entendem que a teoria da recepção é a melhor (Carlos Roberto Gonçalves


e Pablo). O enunciado 173 da III Jornada de Direito Civil consagrou essa teoria para a
contratação eletrônica.

Os art. 433 e 434 indicam a corrente da recepção:

Art. 433. Considera-se inexistente a aceitação, se antes dela ou com


ela chegar ao proponente a retratação do aceitante.

Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a


aceitação é expedida, exceto:
I - no caso do artigo antecedente;
II - se o proponente se houver comprometido a esperar resposta;
III - se ela não chegar no prazo convencionado.

IMPORTANTE!!! Interpretando o art. 434, I c/c o art. 433, podemos concluir que, em
verdade, o contrato não se forma quando a aceitação é expedida, mas sim quando é
recebida sem arrependimento do aceitante.

Obs.: Se o CC tivesse realmente adotado a teoria da expedição de forma absoluta, o art.


433 não poderia existir, pois, uma vez aceita a proposta e expedida a resposta, o contrato
já estaria perfeito, inadmitindo retratação unilateral sem perdas e danos à outra parte.

IMPORTANTE: Por tais comandos legais, é correto afirmar que o Código Civil de 2002
adotou tanto a teoria da expedição quanto a da recepção, sendo a primeira regra e a
segunda exceção, de acordo com a própria organização da matéria no Código Civil em
vigor.

7- LUGAR DA CELEBRAÇÃO

Considera-se celebrado o contrato no lugar em que foi proposto (art. 435).

Art. 435. Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi


proposto.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Ex.: Estou em Vitória e faço, por e-mail, uma proposta de contrato de promessa de
locação da casa de João em Diamantina, para o carnaval. João responde aceitando a
proposta. Considera-se celebrado o contrato de promessa de locação aqui em Vitória,
onde foi PROPOSTO.

8- IMPOSSIBILIDADE DA PRESTAÇÃO

Resolve-se a obrigação quando se torna impossível seu cumprimento (art. 106


CC), uma vez que ninguém pode ser obrigado a fazer o impossível. A resolução só ocorre,
porém, se a impossibilidade for absoluta, isto é, alcançar todas as pessoas.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

CAPÍTULO II
CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS

1- QUANTO AOS EFEITOS


1.1. UNILATERAIS, BILATERAIS E PLURILATERAIS.

Unilaterais são os contratos que criam obrigações unicamente para uma das
partes, como a doação pura por exemplo.

Bilaterais são os que geram obrigações para ambos os contratantes, como, por
exemplo, a compra e venda. Os contratantes são simultânea e reciprocamente credores e
devedores uns dos outros, produzindo o negócio direitos e deveres para ambos os
envolvidos, de forma proporcional. Contêm obrigações recíprocas, por isso denominados
de sinalagmáticos.

Plurilaterais são os contratos que envolvem várias pessoas, trazendo direitos e


deveres para todos os envolvidos, na mesma proporção. Ex.: seguro de vida em grupo e
o consórcio.

Obs.: Essa classificação (unilaterais e bilaterais) não é feita sob o prisma da formação
dos contratos (quantidade de pessoas), mas sim sobre quais pessoas recaem os efeitos
que acarretam!!!! Os que geram obrigações recíprocas são bilaterais e os que geram
obrigações unicamente para um dos contratantes são unilaterais.

IMPORTANTE!!! Contrato bilateral imperfeito é contrato unilateral na origem que,


por circunstância acidental, ocorrida no curso da execução, gera alguma obrigação para
o contratante que não se comprometera.

1.2 DISPOSIÇÃO SOBRE OS CONTRATOS BILATERAIS

Preceitua o art. 476 do CC.

Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes


de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do
outro.

É uma aplicação da regra do tu quoque.

Trata-se de uma defesa indireta de mérito que uma parte, cobrada em sua
prestação, opõe à outra que ainda não cumpriu a sua prestação (exceptio non adimplenti
contractus).

Quando as prestações forem sucessivas, não pode ser oposta pela parte a que caiba
a prestação inicial. Se ambas se mostram inadimplentes, impõe-se a resolução do contrato,
com restituição das partes ao estado anterior.

#Se uma parte cumpriu com defeito sua prestação, a outra pode opor a exceção de
contrato não cumprido?

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Sim. Trata-se, na hipótese, contudo, da exceptio non rite adimpleti contractus.

IMPORTANTÍSSIMO!!! #Pode haver renúncia à exceptio?


Sim, é possível renunciar à exceptio. Trata-se da chamada CLÁUSULA SOLVE
ET REPETE. A cláusula solve et repete excepciona a exceptio non adimpleti contractus
(exceção do contrato não cumprido).

A cláusula solve et repete, que significa “pague e depois reclame”, é uma


renúncia à exceção de contrato não cumprido (artigos 476 e 477 do Código Civil),
uma vez que, se convencionada, o contratante estará renunciando à defesa, podendo ser
compelido a pagar, independentemente do cumprimento da primeira prestação. Essa
cláusula é comum na lei de licitações nos contratos administrativos, em que se tem as
cláusulas de exorbitância que visam proteger a Administração Pública, e, por conseguinte,
a coletividade.

Em alguns contratos, a cláusula solve et repete não tem validade, como por
exemplos, nos casos previstos nos artigos 424 do Código Civil e 51 do Código de Defesa
do Consumidor.

Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem
a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do
negócio.

Lembrar!!! Nas relações de consumo deve ser evitada, em razão da cominação da


nulidade de toda cláusula que coloque o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51
CDC).

IMPORTANTE!!! Contra o estado, durante os primeiros 90 dias de inadimplemento


da Administração Pública, é utilizada a cláusula solve et repete.

O CC prevê uma garantia de execução da OBRIGAÇÃO À PRAZO, nos


seguintes termos.

Art. 477. Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das


partes contratantes diminuição em seu patrimônio capaz de
comprometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou, pode
a outra recusar-se à prestação que lhe incumbe, até que aquela
satisfaça a que lhe compete ou dê garantia bastante de satisfazê-la.

Procura-se acautelar os interesses daquele que deve pagar em primeiro lugar,


protegendo-o contra alterações da situação patrimonial do outro contratante.

O art. 475 admite o reconhecimento do inadimplemento como condição


resolutiva.

Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução


do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em
qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.

Obs.: Por isso se diz que todo contrato bilateral contém uma CLÁUSULA
RESOLUTIVA TÁCITA (inadimplemento).

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Verifica-se do exposto que o contratante pontual pode, ante o inadimplemento


do outro, a seu critério, tomar três atitudes: a) permanecer inerte e defender-se, caso
acionado, com a exceção do contrato não cumprido, b) pleitear a resolução do
contrato, com perdas e danos, provando o prejuízo sofrido e c) exigir o cumprimento
contratual, quando possível a execução específica.

1.2.1 Distrato e quitação

Distrato é o acordo de vontades que tem por fim extinguir um contrato


anteriormente celebrado (desfazimento do contrato por manifestação volitiva das partes).
Trata-se, pois, de resilição bilateral.
Art. 472. O distrato faz-se pela mesma forma exigida para o contrato.

IMPORTANTE: A resilição é tida como dissolução do contrato por vontade das partes.
Receberá o nome de denúncia, quando unilateral, e distrato, quando bilateral. A
resolução, por sua vez, é nomenclatura alusiva à extinção do contrato por
descumprimento, ou seja, inadimplemento. Doutrina tradicional reserva o termo rescisão
às hipóteses de invalidade do contrato (vícios nulificantes ou anuláveis).

O distrato deve obedecer a mesma forma do contrato a ser desfeito, quando


este tiver forma especial, mas não quando esta for livre. Os efeitos do distrato são ex
nunc, não se desfazendo os anteriormente produzidos.

A quitação vale, porém, qualquer que seja a sua forma. Não precisa obedecer a
mesma forma do contrato. Entretanto, o art. 320 CC exige que a quitação tenha a
assinatura do credor, devendo assim ser escrita.

1.3 CONTRATOS GRATUITOS (BENÉFICOS) E ONEROSOS

Gratuitos ou benéficos são os contratos em que apenas uma das partes aufere
benefício ou vantagem. Uma das partes é onerada, proporcionando à outra uma vantagem
sem qualquer contraprestação. Deve ser observada a norma do art. 114 do CC, que
enuncia a interpretação restritiva dos negócios benéficos. Ex.: Doações puras.

Nos onerosos ambos os contratantes obtêm proveito, ao qual corresponde um


sacrifício. Ambas as partes assumem deveres obrigacionais, havendo um direito subjetivo
de exigi-lo. Ex.: Compra e venda. Ambos buscam um proveito ao qual corresponde um
sacrifício.

IMPORTANTE: Como decorrência lógica da estrutura contratual, em regra, o contrato


oneroso é bilateral, e o gratuito é unilateral. Mas pode haver exceção, como é o caso do
contrato de mútuo de dinheiro sujeito a juros (mútuo feneratício), pelo qual além da
obrigação de restituir a quantia emprestada (contrato unilateral), devem ser pagos os juros
(contrato oneroso).

A doutrina distingue os gratuitos propriamente ditos dos contratos


desinteressados. Aqueles acarretam uma diminuição patrimonial a uma das partes
(doação pura), enquanto estes não produzem esse efeito, malgrado beneficiem a outra
parte (mútuo, comodato).

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1.4 CONTRATOS COMUTATIVOS E ALEATÓRIOS

Os contratos onerosos se se subdividem em comutativos e aleatórios.

COMUTATIVOS são os de prestações certas e determinadas. As partes


podem antever as vantagens e os sacrifícios, que geralmente se equivalem, decorrente
de sua celebração, porque não envolvem nenhum risco.

ALEATÓRIOS são os que se caracterizam pela incerteza para ambas as partes.


A prestação de uma das partes não é conhecida com exatidão no momento da celebração
do negócio jurídico pelo fato de depender da sorte, da álea, que é um fator desconhecido.
Os contratos de jogo, aposta e seguro são aleatórios por natureza, porque o risco lhe é
peculiar. É que a perda e o lucro dependem de um fato futuro e imprevisível.

Os contratos tipicamente comutativos, que se tornam aleatórios em razão de


certas circunstâncias, denominam-se acidentalmente aleatórios e são de duas espécies:

✓ Venda de coisas futuras e


✓ Venda de coisas existentes, mas exposta a risco.

Nos que tem por objeto coisas futuras, o risco pode referir-se:

a) À própria existência da coisa (emptio spei, venda da esperança, probabilidade de as


coisas ou fatos existirem)

Art. 458. Se o contrato for aleatório, por dizer respeito a coisas ou fatos
futuros, cujo risco de não virem a existir um dos contratantes assuma,
terá o outro direito de receber integralmente o que lhe foi
prometido, desde que de sua parte não tenha havido dolo ou culpa,
ainda que nada do avençado venha a existir.

b) À sua quantidade (emptio rei speratae, ou venda da esperança com coisa esperada).
Art. 459. Se for aleatório, por serem objeto dele coisas futuras,
tomando o adquirente a si o risco de virem a existir em qualquer
quantidade, terá também direito o alienante a todo o preço, desde
que de sua parte não tiver concorrido culpa, ainda que a coisa
venha a existir em quantidade inferior à esperada.
Parágrafo único. Mas, se da coisa nada vier a existir, alienação não
haverá, e o alienante restituirá o preço recebido.

Se vier a existir alguma quantidade, por menor que seja, o contrato deve ser
cumprido, tendo o vendedor o direito a todo preço ajustado.

A venda de coisa já existente, mas sujeita a perecimento ou depreciação é


disciplinada no art. 460 CC.
Art. 460. Se for aleatório o contrato, por se referir a coisas existentes,
mas expostas a risco, assumido pelo adquirente, terá igualmente
direito o alienante a todo o preço, posto que a coisa já não existisse,
em parte, ou de todo, no dia do contrato.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

É válida mesmo que a coisa já tenha perecido na data do contrato. Se,


contudo, o alienante sabia do perecimento, a alienação pode ser anulada como dolosa pelo
lesado. Ex.: Venda de mercadoria que está sendo transportada por navio, em que o
comprador assume o risco.
Art. 461. A alienação aleatória a que se refere o artigo antecedente
poderá ser anulada como dolosa pelo prejudicado, se provar que o
outro contratante não ignorava a CONSUMAÇÃO do risco, a que
no contrato se considerava exposta a coisa.

2- QUANTO À FORMAÇÃO
Podem ser paritários, de adesão ou contrato-tipo.

Paritários são os contratos do tipo tradicional, em que as partes discutem


livremente as condições, porque se encontram em pé de igualdade (par a par – gré a gré).
O conteúdo é plenamente discutido entre as partes.

De adesão são os que NÃO permitem essa liberdade (acima), devido a


preponderância da vontade de um dos contratantes, que elabora todas cláusulas. O outro
adere ao modelo previamente confeccionado, não podendo modificá-lo. O CC resguarda
a posição do aderente. O estipulante impõe o conteúdo negocial, restando ao aderente
aceitar ou não o conteúdo do negócio.

Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou


contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao
aderente.

Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que


estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da
natureza do negócio.

O CDC conceitua o contrato de adesão da seguinte forma:


Art. 54. CONTRATO DE ADESÃO é aquele cujas cláusulas
tenham sido aprovadas pela AUTORIDADE COMPETENTE ou
ESTABELECIDAS UNILATERALMENTE PELO
FORNECEDOR de produtos ou serviços, sem que o consumidor
possa discutir ou modificar SUBSTANCIALMENTE seu
conteúdo.
§ 1° A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza
de adesão do contrato.
§ 2° Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, desde
que a alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se
o disposto no § 2° do artigo anterior.
§ 3o Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros
e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será
inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo
consumidor.
§ 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do
consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua
imediata e fácil compreensão.

Contrato-tipo (de massa ou por formulários): aproxima-se do contrato de adesão,


porque é apresentado em fórmula impressa ou datilografada, mas dele difere porque

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

admite discussão sobre o seu conteúdo. Em geral são deixados espaços em branco, a
serem preenchidos pelo concurso de vontade.

3- QUANTO AO MOMENTO

Podem ser de execução instantânea, diferida e de trato sucessivo.

De EXECUÇÃO INSTANTÂNEA são os que se consumam num só ato, sendo


cumpridos imediatamente após a sua celebração. Tem aperfeiçoamento e
cumprimento imediato. Ex.: Compra e venda à vista.

De EXECUÇÃO DIFERIDA são os que devem ser cumpridos também num


só ato, mas em momento futuro. Ex.: compra e venda pactuada com pagamento por
cheque pré ou pós-datado.

De EXECUÇÃO CONTINUADA OU DE TRATO SUCESSIVO são os que


se cumprem por meio de atos reiterados. Tem o cumprimento previsto de forma
sucessiva ou periódica no tempo.

4- QUANTO AO AGENTE
Podem ser personalíssimos ou impessoais.

Personalíssimos ou intuito personae são os celebrados em atenção às qualidades


pessoais de um dos contratantes. A pessoa do contratante é elemento determinante da
conclusão do contrato. O obrigado não pode se fazer substituir por outrem, pois suas
qualidades tiveram influência decisiva no consentimento do outro contratante. As
obrigações personalíssimas são intransmissíveis aos sucessores. Ex.: contrato de fiança,
uma vez que a condição de fiador não se transmite aos herdeiros, mas somente as
obrigações vencidas e não pagas enquanto era vivo o fiador e até os limites da herança.

Contratos impessoais são aqueles cuja prestação pode ser cumprida,


indiferentemente, pelo obrigado ou por terceiro. O importante é que seja executada, pois
seu objeto não requer qualidades especiais do devedor.

5- QUANTO AO MODO
Podem ser principais, acessórios ou derivados (sub-contratos).

Principais são os que têm existência própria e não dependem da existência de


qualquer outro.

Acessório são os que têm existência subordinada a do contrato principal. Ex.:


Fiança, cláusula penal etc. Diante do princípio da gravitação jurídica, pelo qual o
acessório segue o principal, tudo o que ocorre no contrato principal repercute no
acessório. Assim, sendo nulo o contrato principal, nulo será o acessório. Todavia, deve
ficar claro que o que ocorre no contrato acessório não repercute no principal.

Derivados ou subcontratos são os que tem por objeto direitos estabelecidos em


outro contrato, denominado básico ou principal. Ex. Sublocação e subempreitada.
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Coligados denotam a situação em que, em regra, existe uma independência entre


os negócios jurídicos cujos efeitos estão interligados. Embora distintos, estão ligados por
uma cláusula acessória, implícita ou explícita. Mantém-se a individualidade dos
contratos, mas as vicissitudes de um podem influir sobre o outro. Trata-se de espécie
intermediária entre os contratos principais e os acessórios. Ex.: Celebrados dois contratos
coligados, um principal e outro secundário, o primeiro tendo por objeto um lote com casa
de moradia, e o segundo versando sobre dois lotes contíguos, para área de lazer, a falta
de pagamento integral do preço desse segundo contrato pode levar à sua resolução,
conservando-se o principal, cujo preço foi integralmente pago.

6- QUANTO À FORMA
Podem ser solenes, não solenes, formais e informais.

Solenes são os que exigem solenidade pública (a exemplo do art. 108 do CC, que
exige escritura pública para alienação de imóveis com valor superior a trinta vezes o
maior salário mínimo vigente). Quando esta é da substância do ato, diz-se que é ad
solemnitatem.

Formais são aqueles que exigem qualquer formalidade, caso da forma escrita.
Ex.: o contrato de fiança deve ser celebrado por escrito (art. 819 do CC).

Não solenes são os que dispensam a lavratura de escritura pública em tabelionato


de notas.

Informais são aqueles em que basta o consentimento para sua formação,


independentemente da entrega da coisa e da observância de determinada forma. Não
exigem, pois, qualquer formalidade. São a regra geral, uma vez que o artigo 107 do CC
consagra o princípio da liberdade das formas.

7- QUANTO AO OBJETO
Podem ser preliminares ou definitivos.

Preliminares, pactum de contrahendo, ou pré-contrato. São o que têm por


objeto a celebração de um contrato definitivo. Têm, portanto, um único objeto. Quando
este é um imóvel, é denominado promessa de compra e venda, se irretratável e
irrevogável. Quando gera obrigação para apenas uma das partes, chama-se opção. Ex.:
Opção de compra e opção de venda.

Lembrar!!! O contrato de compra e venda é um contrato preliminar, mas não é um


contrato acessório (é principal).

Definitivos são os contratos que têm objetos diversos, de acordo com a natureza
de cada um.

O CC regula o contrato preliminar nos arts. 462 a 466:


Art. 462. O contrato preliminar, EXCETO quanto à forma, deve
conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Art. 463. Concluído o contrato preliminar, com observância do


disposto no artigo antecedente, e desde que dele não conste cláusula de
arrependimento, qualquer das partes terá o direito de exigir a
celebração do definitivo, assinando prazo à outra para que o efetive.
Parágrafo único. O contrato preliminar deverá ser levado ao registro
competente.

8- QUANTO À DESIGNAÇÃO
Podem ser:

a) Nominados, tidos como aqueles que têm designação própria. Inominados, por
sua vez, são os que não têm.

b) Típicos, tidos como aqueles regulados pela lei, ou seja, os que têm na lei seu perfil
traçado (estatuto legal suficiente). Atípicos, por outro lado, são os que resultam
de um acordo de vontades, não tendo suas características e requisitos regulados
na lei.
Art. 425. É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas
as normas gerais fixadas neste Código.

O contrato também pode ser misto. Resulta da combinação de um contrato típico


com cláusulas criadas pela vontade dos contratantes. O contrato coligado não se
confunde com o misto, pois constitui uma pluralidade, em que vários contratos celebrados
pelas partes se apresentam interligados. Ex.: Contratos de posto de gasolina.

9 – QUANTO AO MOMENTO DO APERFEIÇOAMENTO


Podem ser:

Consensuais, tidos como aqueles que tem aperfeiçoamento pela simples


manifestação de vontade das partes envolvidas.

Reais, que se aperfeiçoam com a entrega da coisa (traditio rei), de um contratante


para o outro. Ex.: comodato, mútuo, contrato estimatório e depósito. Nessas figuras, antes
da entrega da coisa tem-se apenas uma promessa de contratar e não um contrato perfeito
e acabado.

10 - CONTRATO COM PESSOA A DECLARAR

No momento da CONCLUSÃO do contrato, pode uma das partes reservar-se a


faculdade de indicar a pessoa que deve adquirir os direitos e assumir as obrigações dele
decorrentes.
Art. 467. No MOMENTO DA CONCLUSÃO do contrato, pode
uma das partes reservar-se a faculdade de indicar a pessoa que deve
adquirir os direitos e assumir as obrigações dele decorrentes.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

É comum nos compromissos de compra e venda de imóveis, nos quais o


promissário comprador reserva-se a opção de receber a escritura definitiva ou indicar
terceiro para nela figurar como adquirente.

É regulado pelos seguintes artigos:


Art. 468. Essa indicação deve ser comunicada à outra parte no prazo
de cinco dias da conclusão do contrato, se outro não tiver sido
estipulado.
Parágrafo único. A aceitação da pessoa nomeada não será eficaz se
não se revestir da mesma forma que as partes usaram para o contrato.

Art. 469. A pessoa, nomeada de conformidade com os artigos


antecedentes, adquire os direitos e assume as obrigações decorrentes
do contrato, a partir do momento em que este foi celebrado.

Art. 470. O contrato será eficaz somente entre os contratantes


originários:
I - se não houver indicação de pessoa, ou se o nomeado se recusar
a aceitá-la;
II - se a pessoa nomeada era insolvente, e a outra pessoa o
desconhecia no momento da indicação.

Art. 471. Se a pessoa a nomear era incapaz ou insolvente no


momento da nomeação, o contrato produzirá seus efeitos entre os
contratantes originários.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

CAPÍTULO III
DA ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO

Ocorre quando uma pessoa convenciona com outra que esta concederá uma
vantagem ou um benefício em favor de terceiro, que não é parte do contrato. Constitui
EXCEÇÃO ao princípio da relatividade dos contratos.

Figuram três personagens: o estipulante, o promitente e o beneficiário. A


capacidade só é exigida em relação aos dois primeiros, de sorte que qualquer pessoa
pode ser beneficiária.

Tem natureza jurídica de contrato sui generis, porque a prestação é realizada


em benefício de quem não participa da avença. Ex.: Seguro de vida.

O terceiro deve ser determinável, podendo ser futuro, como a prole eventual. A
gratuidade do benefício é essencial, não podendo ser imposta contraprestação ao terceiro.

Regulado pelos seguintes dispositivos:


Art. 436. O que estipula em favor de terceiro pode exigir o
cumprimento da obrigação.
Parágrafo único. Ao terceiro, em favor de quem se estipulou a
obrigação, também é permitido exigi-la, ficando, todavia, sujeito às
condições e normas do contrato, se a ele anuir, e o estipulante não o
inovar nos termos do art. 438.

Art. 437. Se ao terceiro, em favor de quem se fez o contrato, se deixar


o direito de reclamar-lhe a execução, não poderá o estipulante exonerar
o devedor.

Art. 438. O estipulante pode reservar-se o direito de substituir o


terceiro designado no contrato, independentemente da sua
anuência e da do outro contratante.
Parágrafo único. A substituição pode ser feita por ato entre vivos ou
por disposição de última vontade.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

CAPÍTULO IV
DA PROMESSA DE FATO DE TERCEIRO

Caracteriza-se quando uma pessoa se compromete com outra a obter prestação de


fato de um terceiro.

Art. 439. Aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá


por perdas e danos, quando este o não executar.
Parágrafo único. Tal responsabilidade não existirá se o terceiro for o
cônjuge do promitente, dependendo da sua anuência o ato a ser
praticado, e desde que, pelo regime do casamento, a indenização, de
algum modo, venha a recair sobre os seus bens.

Trata-se de obrigação de fazer que, não sendo executada, resolve-se em perdas e


danos. Aquele que promete fato de terceiro assemelha-se ao fiador, que assegura a
prestação prometida. Não subsistirá a responsabilidade se o terceiro se comprometeu e
depois não cumpriu a prestação, ou se este for cônjuge do promitente, nas condições
mencionadas no art. 439, parágrafo único, do CC.
Art. 440. Nenhuma obrigação haverá para quem se comprometer
por outrem, se este, depois de se ter obrigado, faltar à prestação.

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CAPÍTULO V
DOS VÍCIOS REDIBITÓRIOS

1- CONCEITO

VÍCIO REDIBITÓRIO é o defeito oculto em virtude de coisa recebida em


contrato comutativo, que diminui o valor da coisa ou prejudica a sua utilização.
Trata-se de vício NÃO aparente. Há uma garantia legal contra os vícios redibitórios
nos contratos bilaterais (sinalagmáticos), onerosos e comutativos, caso da compra e
venda. Devem ainda ser incluídas as doações onerosas, conforme preceitua o art. 441,
parágrafo único, do CC, caso da doação remuneratória e da doação modal ou com
encargo. No que diz respeito aos contratos aleatórios, admite-se a alegação de vício
redibitório quanto aos seus elementos comutativos, predeterminados. É o que dispõe o
enunciado 583 do CJF/STJ, aprovado na VII Jornada de Direito Civil: “O art. 441 do
Código Civil deve ser interpretado no sentido de abranger também os contratos
aleatórios, desde que não abranja os elementos aleatórios do contrato”.
Art. 441. A coisa recebida em virtude de CONTRATO
COMUTATIVO pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos,
que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam
o valor.
Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo às doações
onerosas.

Art. 442. Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art. 441),


pode o adquirente reclamar abatimento no preço.

O fundamento jurídico do vício redibitório encontra-se no princípio da


garantia, segundo o qual todo alienante deve assegurar, ao adquirente, a título
oneroso, o uso da coisa por ele adquirida e para os fins a que é destinada.

IMPORTANTE!!! A ignorância do vício pelo alienante não o exime de


responsabilidade, salvo se esta foi expressamente excluída de comum acordo. Se os
conhecia, além de restituir o que recebeu, responderá também por perdas e danos.
Art. 443. Se o alienante conhecia o vício ou defeito da coisa,
restituirá o que recebeu com perdas e danos; se o não conhecia,
tão-somente restituirá o valor recebido, mais as despesas do
contrato.

De acordo com o art. 444, “a responsabilidade do alienante subsiste ainda que


a coisa pereça em poder do alienatário, se perecer por vício oculto, já existente ao
tempo da tradição.”

IMPORTANTE!!! O vício redibitório é o defeito na coisa (objeto), ao passo que o


erro traduz um vício psicológico na vontade do declarante (vício em relação ao
consentimento). O vício redibitório opera no plano da eficácia do contrato (implica
resolução ou abatimento do preço), enquanto o erro opera no plano da validade (implica
anulabilidade do contrato).

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Obs.: Diferentemente do que fez com a evicção, o CC não previu a garantia do vício
redibitório no caso da realização de hasta pública.

2- AÇÕES EDILÍCIAS

Ações edilícias são as ações de que dispõe o adquirente da coisa com vício
redibitório. Existem duas espécies de ações edilícias:

a) AÇÃO REDIBITÓRIA: o autor pede o desfazimento do contrato, rejeitando a


coisa.

b) AÇÃO QUANTI MINORIS ou AÇÃO ESTIMATÓRIA: o autor fica com a coisa


defeituosa e pede o abatimento do preço, proporcional ao vício.

IMPORTANTE!!! O alienante só paga perdas e danos se sabia do defeito da coisa e


de má-fé silenciou-se (é uma sanção pela quebra da boa-fé, da eticidade). Em não
conhecendo o vício ou defeito da coisa, restituirá o alienante o que recebeu, além de
ressarcir as despesas contratuais (art. 443 do CC).

IMPORTANTE: O saneamento de vício redibitório limitador do uso, gozo e fruição


da área de terraço na cobertura de imóvel objeto de negócio jurídico de compra e venda
– que garante o seu uso de acordo com a destinação e impede a diminuição do valor –,
afasta o pleito de abatimento do preço. STJ. 4ª Turma. REsp 1478254-RJ, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, julgado em 8/8/2017 (Info 610). No entanto, é possível que ele
pleiteie e receba indenização pelos danos materiais decorrentes do período em que
acabou ficando impedido de exercer seu direito de uso, gozo e fruição da laje (só não
terá direito ao abatimento do preço com fundamento no vício redibitório).

Obs.: Não confundir os prazos do CDC (30 para serviços e produtos não duráveis,
ou 90 para serviços e produtos duráveis) com os prazos do CC (art. 445: Garantia
legal).

Art. 445. O adquirente DECAI (prazo decadencial) do direito de


obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de TRINTA
DIAS se a coisa for MÓVEL, e de UM ANO se for IMÓVEL,
contado da entrega efetiva; se já estava na posse, o prazo conta-se
da alienação, reduzido à metade.
§ 1º Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais
tarde, o prazo contar-se-á do momento em que dele tiver ciência,
até o prazo máximo de cento e oitenta dias, em se tratando de bens
móveis; e de um ano, para os imóveis.

30 dias → coisa móvel → 15 dias se já estava na posse

1 ano → coisa imóvel → 6 meses se já estava na posse

IMPORTANTE!!! Se o adquirente já estava na posse do bem, o CC reduz os prazos


pela metade, porque pressupõe que o adquirente já tinha condições para perceber o
vício redibitório.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

IMPORTANTE!!! Segundo o art. 445, §1º, do CC, nas hipóteses em que o vício, por
sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo decadencial conta-se da data
da ciência do vício:

180 dias → móvel

1 ano → imóvel

IMPORTANTE: A interpretação que se dá à hipótese em que o vício, por sua


natureza, só puder ser conhecido mais tarde, indica que o prazo contar-se-á do
momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de 180 dias, em se tratando
de bens móveis, e de um ano, para os imóveis.

Enunciado 174 CJF/STJ: “Em se tratando de vício oculto, o adquirente tem os


prazos do caput do art. 445 para obter redibição ou abatimento do preço, desde que os
vícios se revelem nos prazos estabelecidos no parágrafo primeiro, fluindo, entretanto,
a partir do conhecimento do defeito”.

IMPORTANTE: “O prazo decadencial para o exercício da pretensão redibitória ou


de abatimento de preço de bem móvel é de 30 dias (art. 445 do CC). Caso o vício, por
sua natureza, somente possa ser conhecido mais tarde, o §1º do art. 445 estabelece, em
se tratando de coisa móvel, o prazo máximo de 180 dias para que se revele, correndo o
prazo decadencial de 30 dias a partir de sua ciência” (STJ, REsp 1.095.882/SP, 4ª
Turma, rel. Min. Isabel Gallotti, DJe 19.12.2014).

#Durante o prazo de vigência da garantia contratual a garantia legal fica


paralisada ou também se consuma?
Nesse caso, o CDC segue o CC por analogia, uma vez que, nos termos do art.
446: o prazo de garantia legal fica paralisado até o fim do prazo contratual.
Art. 446. Não correrão os prazos do artigo antecedente na
constância de cláusula de garantia; mas o adquirente deve denunciar
o defeito ao alienante nos trinta dias seguintes ao seu descobrimento,
sob pena de decadência.

Obs.: À luz do princípio da boa-fé, e em respeito ao dever de informação, o adquirente


deve comunicar o alienante sobre o defeito manifestado no prazo de 30 dias, sob pena
de decadência da sua garantia (legal e convencional).

Obs.: No caso de coisas vendidas conjuntamente, o defeito oculto de uma não


autoriza a rejeição de todas (art. 503 CC).

Art. 503. Nas coisas vendidas conjuntamente, o defeito oculto de uma


NÃO autoriza a rejeição de todas.

IMPORTANTE!!! A entrega de coisa diversa da contratada não configura vício


redibitório, mas inadimplemento contratual, respondendo o devedor por perdas e danos.
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e
danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais
regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

3- REQUISITOS

O CC tem como requisitos para a ocorrência do vício redibitório:

a) Que a coisa tenha sido recebida em virtude de contrato comutativo, ou de


doação onerosa, ou remuneratória.
b) Que os defeitos sejam ocultos, não se configurando quando facilmente
detectáveis mediante comum e rápido exame ou diligência normal.
c) Que existam ao tempo da alienação e que perdurem até o momento da
reclamação, não respondendo o alienante pelos supervenientes.
d) Que sejam desconhecidos do adquirente.
e) Que sejam graves a ponto de prejudicar o uso da coisa o de diminuir-lhe o
valor.

4- DISCIPLINA NO CDC
O CDC considera vício redibitório tanto os defeitos ocultos como também os
aparentes ou de fácil constatação. Os prazos são decadenciais.
Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil
constatação caduca em:
I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos
não duráveis;
II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de
produtos duráveis.
§ 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega
efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.
§ 2° OBSTAM a decadência:
I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor
perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa
correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;
III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.
§ 3° Tratando-se de vício OCULTO, o prazo decadencial inicia-se
no momento em que ficar evidenciado o defeito.

De acordo com o art. 18, §§1º e 2º, do CDC:


§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode
o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas
condições de uso;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada,
sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço.
§ 2° Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do
prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a
sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a
cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de
manifestação expressa do consumidor.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

CAPÍTULO VI
DA EVICÇÃO

1- CONCEITO E FUNDAMENTO JURÍDICO


A evicção se opera quando o adquirente da coisa vem a perder a posse ou a
propriedade da coisa adquirida em virtude de ato judicial ou administrativo que
reconhece direito anterior de outrem. A responsabilidade pela evicção decorre da lei,
não dependendo, pois, de previsão contratual expressa.

Ex.: Cidadão compra um carro de determinada empresa e, três meses depois, é


surpreendido em blitz policial que atesta o fato de que o veículo pertence a terceiro, vítima
de roubo. O cidadão perde a posse e a propriedade da coisa em virtude do reconhecimento
administrativo de direito anterior do terceiro. Sofrendo a perda, o adquirente
responsabilizará o alienante.

Quem sofre a perda é chamado de evicto (adquirente). Quem prova o direito


anterior é o evictor (terceiro). O alienante é aquele que transfere a coisa viciada, de forma
onerosa, sendo responsável pela indenização.

Obs.: Lembrar da denunciação da lide.

Dispõe o art. 447 do CC:


Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção.
Subsiste esta garantia AINDA QUE A AQUISIÇÃO SE TENHA
REALIZADO EM HASTA PÚBLICA. (imóvel = praça; móvel =
leilão).

Lembrar!!! O alienante responde pela evicção AINDA QUE A AQUISIÇÃO SE


TENHA REALIZADO EM HASTA PÚBLICA (novidade do Código Civil de 2002).
O mesmo não ocorre em relação ao vício redibitório (não há responsabilização por
vício redibitório nas hipóteses de hasta pública).

IMPORTANTE!!! Se a aquisição de determinado bem se dá em hasta pública e


posteriormente há a perda por evicção, deve o adquirente responsabilizar o devedor de
cujo patrimônio o bem saiu.

Todavia, uma parcela da doutrina (Araken de Assis) sustenta que, se o devedor


não puder ser responsabilizado (ex.: for insolvente), a responsabilidade poderá recair no
credor, que teve seu crédito satisfeito. Se o credor não puder ser responsabilizado, a
responsabilidade é do Estado, que permitiu a hasta (Pablo Stolze não concorda com essa
última parte).

#Que direitos assistem ao adquirente evicto?


O evicto demandará o alienante. Nessa demanda, o evicto tem direito à restituição
integral do que pagou; à indenização dos frutos que teve que restituir; despesas do
contrato e prejuízos que diretamente resultem da evicção (danos emergentes,

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

despesas de escritura e registro e lucros cessantes; além de danos imateriais ou


morais); honorários advocatícios e custas judiciais (art. 450).
Art. 450. Salvo estipulação em contrário, tem direito o evicto, além
da restituição integral do preço ou das quantias que pagou:
I - à indenização dos frutos que tiver sido obrigado a restituir;
II - à indenização pelas despesas dos contratos e pelos prejuízos que
diretamente resultarem da evicção;
III - às custas judiciais e aos honorários do advogado por ele
constituído.
Parágrafo único. O preço, seja a evicção total ou parcial, será o do
valor da coisa, na época em que se evenceu, e proporcional ao
desfalque sofrido, no caso de evicção parcial.

Dispõem ainda os arts. 451, 452, 453, 454 do CC:


Art. 451. Subsiste para o alienante esta obrigação, ainda que a
coisa alienada esteja deteriorada, exceto havendo dolo do
adquirente.

Art. 452. Se o adquirente tiver auferido vantagens das deteriorações, e


não tiver sido condenado a indenizá-las, o valor das vantagens será
deduzido da quantia que lhe houver de dar o alienante.

Art. 453. As benfeitorias necessárias ou úteis, não abonadas ao que


sofreu a evicção, serão pagas pelo alienante.

Art. 454. Se as benfeitorias abonadas ao que sofreu a evicção tiverem


sido feitas pelo alienante, o valor delas será levado em conta na
restituição devida.

#É possível a exclusão da garantia da evicção?


Sim, desde que feita de forma expressa (cláusula de non praestaenda evictione ou
cláusula de irresponsabilidade pela evicção), não se presumindo tal exclusão em hipótese
alguma. Todavia, mesmo excluída a responsabilidade pela evicção, se esta ocorrer, o
alienante responde pelo preço da coisa. Isso se o evicto não sabia do risco da evicção ou,
informado do risco, não o assumiu (art. 449 do CC). Ex.: Suponha que um indivíduo
compre um prédio de uma pessoa e nesse contrato exista uma cláusula que exclui a
garantia da evicção. O CC admite a exclusão da garantia da evicção em duas hipóteses:
(1) na exclusão legal - art. 448 c/c 457 (hipótese em que o adquirente sabia que a coisa
era alheia ou litigiosa), e (2) na exclusão convencional - art. 448 c/c 449.

Art. 448. Podem as partes, por cláusula expressa, reforçar,


diminuir ou excluir a responsabilidade pela evicção.

Art. 449. Não obstante a cláusula que exclui a garantia contra a


evicção, se esta se der, tem direito o evicto a receber (PELO MENOS)
o preço que pagou pela coisa evicta, se não soube do risco da
evicção, ou, dele informado, não o assumiu.

Art. 457. Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia


que a coisa era alheia ou litigiosa (lei excluindo a evicção).

Obs.: A despeito de traduzir aparente violação ao princípio da função social do contrato,


o CC admite a exclusão convencional da responsabilidade pela evicção. No entanto, caso
a cláusula apenas exclua a garantia, terá o evicto direito ao preço que pagou (só isso).
Por outro lado, se souber do risco de perda ou o assumir, não terá direito a nada.
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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

IMPORTANTE!!! Na esfera do direito do consumidor, a exclusão do direito de que


a evicção resulta é clausula abusiva, NULA de pleno direito.

Prescreve o art. 455: “Se parcial, mas considerável, for a evicção, poderá o evicto
optar entre a rescisão do contrato e a restituição da parte do preço correspondente ao
desfalque sofrido. Se não for considerável, caberá somente direito a indenização.”

E de acordo com o art. 450, parágrafo único, do CC: “o preço, seja a evicção total
ou parcial, será o do valor da coisa, na época em que se evenceu, e proporcional ao
desfalque sofrido, no caso de evicção parcial.” Desse modo, o preço será calculado pelo
valor do tempo da sentença judicial ou decisão administrativa que ocasionou a
evicção, e não pelo do tempo da celebração do contrato.

2- REQUISITOS DA EVICÇÃO
São os seguintes:

a) PERDA total ou parcial da propriedade, posse ou uso da coisa.


b) ONEROSIDADE da aquisição.
c) Ignorância, pelo adquirente, da litigiosidade da coisa.
Art. 457. Não pode o adquirente demandar pela evicção, se sabia
que a coisa era alheia ou litigiosa.

d) Anterioridade do direito do evictor. O alienante só responde pela perda


decorrente de causa já existente ao tempo da alienação. Se a causa da perda é
posterior, nenhuma responsabilidade lhe cabe. Ex.: Desapropriação.

IMPORTANTE!!! Entendia-se que, se não fosse feita a denunciação da lide, o


adquirente não poderia mais exercer o direito decorrente da evicção, pois o art. 456
vedaria a ação autônoma de evicção por quem foi parte no processo em que ela ocorreu.
Nada obstante, o dispositivo referenciado (art. 456 do CC) foi expressamente revogado
pelo CPC/2015. Dessa forma, prevaleceu a orientação no sentido de que é plenamente
possível exercer o direito decorrente da evicção em da ação autônoma, como
indenização pela prática de verdadeiro ilícito, fundada no princípio que veda o
enriquecimento sem causa. Nesse contexto, o art. 125, §1º, do CPC/15 assevera
expressamente que: “O direito regressivo será exercido por ação autônoma quando a
denunciação da lide for indeferida, deixar de ser promovida ou não for permitida”.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

CAPÍTULO VII
DA EXTINÇÃO DO CONTRATO

1- MODO NORMAL DE EXTINÇÃO


A extinção dá-se, em regra, pela execução (adimplemento), seja instantânea,
diferida ou continuada. Comprova-se o pagamento pela quitação fornecida pelo credor.

2- EXTINÇÃO SEM CUMPRIMENTO


Algumas causas são anteriores ou contemporâneas à formação do contrato, outras
são supervenientes.

2.1 CAUSAS ANTERIORES OU CONTEMPORÂNEAS

a) Não preenchimento de seus requisitos subjetivos (capacidade das partes e livre


consentimento), objetivos (objeto lícito, possível, determinável ou determinado)
e formais (forma prescrita em lei), que afetam sua validade acarretando nulidade
absoluta ou relativa. a.1) nulidade absoluta ou relativa: a primeira (absoluta)
decorre da violação de norma de ordem pública e impede que o contrato produza
efeitos desde a sua formação (ex tunc). A nulidade relativa (anulabilidade)
advém da imperfeição da vontade: ou decorre de um relativamente incapaz não
assistido, ou contém algum dos defeitos do negócio jurídico (erro, dolo, coação
etc.). Como pode ser sanada e até mesmo não arguida no prazo prescricional, não
se extinguirá o contrato enquanto não se mover a ação que a decrete, sendo ex
nunc os efeitos da sentença.

b) Cláusula resolutiva. Pode ser expressa, quando convencionada para a hipótese


de inadimplemento, ou tácita (inadimplemento). A primeira se opera de pleno
direito; a tácita depende de interpelação judicial e é subentendida em todo contrato
bilateral.

Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução


do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em
qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.

c) Direito de arrependimento. Quando previsto, autoriza qualquer das partes a


rescindir o ajuste, sujeitando-se à perda do sinal ou à sua devolução em dobro
(arras ou sinal).
Art. 420. Se no contrato for estipulado o direito de arrependimento
para qualquer das partes, as arras ou sinal terão função unicamente
indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em benefício da
outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em
ambos os casos NÃO haverá direito a indenização suplementar.

Obs.: O ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL do contrato, todavia, tem sido


reconhecido pela doutrina como impedimento à resolução unilateral do contrato.

#Em que consiste a TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL?

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

NÃO prevista formalmente no Código Civil de 2002, mas consubstanciada nos


princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato, da vedação ao abuso de
direito e ao enriquecimento sem causa, a TEORIA DO ADIMPLEMENTO
SUBSTANCIAL sustenta que não se deve considerar resolvida a obrigação quando
a atividade do devedor, embora não tenha sido perfeita ou não atingido plenamente
o fim proposto, aproxima-se consideravelmente do seu resultado final. Logo, se a
parte devedora cumpriu quase tudo que estava previsto no contrato, a parte credora não
terá direito à resolução, uma vez que o desfazimento do vínculo, quando ínfimo o
inadimplemento, traduziria medida exagerada, desproporcional, injusta e violadora da
boa-fé objetiva. A teoria do adimplemento substancial pode, inclusive, obstar a utilização
da exceção do contrato não cumprido. Com efeito, segundo o enunciado 24 CJF/STJ,
aprovado na I Jornada de Direito Civil, cabe a alegação da exceção do contrato não
cumprido nos contratos empresariais, inclusive nos negócios coligados, salvo quando a
obrigação inadimplida for de escassa importância.

O adimplemento substancial tem sido aplicado, com frequência, nos contratos


de seguro, não permitindo a resolução do vínculo contratual se houver o cumprimento
significativo da obrigação assumida. Conforme as peculiaridades do caso, a teoria do
adimplemento substancial atua como um instrumento de equidade diante da situação
fático-jurídica, permitindo soluções razoáveis e sensatas.

São três os requisitos para aplicação da teoria do adimplemento substancial:

a) a existência de expectativas legítimas geradas pelo comportamento das partes;


b) o pagamento faltante há de ser ínfimo em se considerando o total do negócio;
c) deve ser possível a conservação da eficácia do negócio sem prejuízo ao direito do
credor de pleitear a quantia devida pelos meios ordinários.
(STJ, REsp 1581505/SC, Quarta Turma, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira,
j. 18.08.2016).

IMPORTANTE: A teoria do adimplemento substancial não tem incidência nos


vínculos jurídicos familiares, revelando-se inadequada para solver controvérsias
relacionadas a obrigações de natureza alimentar. STJ. 4ª Turma. HC 439973-MG,
Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. Acd. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em
16/08/2018 (Info 632).

IMPORTANTE: Não se aplica a teoria do adimplemento substancial aos contratos


de alienação fiduciária em garantia regidos pelo Decreto-Lei 911/69. STJ. 2ª Seção.
REsp 1622555-MG, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. para acórdão Min. Marco Aurélio
Bellizze, julgado em 22/2/2017 (Info 599).

2.2 CAUSAS SUPERVENIENTES À FORMAÇÃO DO CONTRATO

a) Resolução: traduz a dissolução do contrato por inadimplemento (art. 474 e 475 do


CC). Resolução é instituto que decorre do inadimplemento contratual. Pode se dar
por inexecução voluntária (culposa), inexecução involuntária (caso fortuito ou força
maior) ou pela onerosidade excessiva (proveniente de acontecimento extraordinário e
imprevisível).

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Em todo contrato bilateral existe sempre implícita uma cláusula resolutiva


(art. 474 do CC), prevendo que se uma das partes for inadimplente, a outra poderá
resolver o contrato. A cláusula resolutiva tácita, portanto, decore da lei e gera a
resolução do contrato em razão de evento futuro e incerto, geralmente relacionado
ao inadimplemento. Como essa cláusula decorre de lei, necessita de interpelação
judicial para gerar efeitos jurídicos. Diferencia-se da cláusula resolutiva expressa, cuja
previsão, na hipótese de inadimplemento, conduz à resolução automática do contrato (a
cláusula resolutiva expressa opera de pleno direito, dispensando interpelação judicial).

b) Rescisão: a doutrina clássica (Francesco Messineo e Orlando Gomes) sustenta que o


termo rescisão somente deve ser empregado para caracterizar a invalidade do contrato por
lesão ou estado de perigo (ou vícios outros que tornam nulo ou anulável o contrato). Essa
linha não foi adotada no Brasil. Aqui, consagrou-se a idéia que rescisão pode ser
empregada no mesmo sentido de inexecução por inadimplemento.

c) Resilição: consiste no desfazimento do contrato por simples manifestação de vontade,


independentemente de inadimplemento. É uma faculdade das partes (traduz direito
potestativo).

c.1) Bilateral: art. 472 - Trata-se do distrato, que é o acordo de vontade que tem
por fim extinguir um contrato anteriormente celebrado.

c.2) Unilateral: art. 473 - Trata-se da denúncia, que deve ser seguida de um aviso
prévio. A resilição unilateral independe de pronunciamento judicial e produz
efeitos ex nunc, não retroagindo. Em regra, a resilição unilateral não gera
responsabilização civil da parte que exerce esse direito potestativo. No sentido:
“a simples resilição do contrato, a exemplo do que ocorre com o mero
inadimplemento contratual, não é suficiente para caracterizar danos morais”
(STJ, REsp 1.630.665/BA, Terceira Turma, rel. Min. Moura Ribeiro, j.
23.05.2017). A resilição unilateral, pelo que consta do art. 473 do CC, só é
prevista em hipóteses excepcionais, como, por exemplo, na locação, na
prestação de serviços, no mandato, no comodato, no depósito, na doação, na
fiança, operando-se mediante denúncia notificada à outra parte.

d) Morte de um dos contratantes: tal fato SÓ acarretará a resolução dos contratos


personalíssimos (intuito personae).

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TÍTULO II
DOS CONTRATOS EM ESPÉCIE
CAPÍTULO I
DA COMPRA E VENDA
SEÇÃO I
DISPOSIÇÕES GERAIS

1- INTRODUÇÃO
É o contrato pelo qual alguém (o vendedor) se obriga a transferir ao comprador
o domínio de coisa móvel ou imóvel mediante uma remuneração, denominada preço.
Portanto, trata-se de contrato translativo, mas que por si só não gera a transmissão de
propriedade.

Logo, a compra e venda assume um caráter puramente obrigacional. Vale


dizer, a compra e venda, por si só, não transfere a propriedade. O contrato de
compra e venda não gera a aquisição de propriedade (que depende de registro, em
se tratando de propriedade de imóvel, ou tradição, em se tratando de bem móvel).
Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se
obriga (caráter obrigacional) a transferir o domínio de certa coisa,
e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.

2- NATUREZA JURÍDICA
a) bilateral ou sinalagmático: implica em obrigações assumidas por ambas as partes.
b) oneroso: gera vantagem e sacrifício patrimonial para ambas as partes.
c) comutativo: já sabem as partes de antemão as vantagens que irão obter
(diferentemente dos casos de contratos aleatórios).

Obs.: Eventualmente, incidirá o elemento álea ou sorte, podendo a compra e venda


assumir a forma de contrato aleatório, envolvendo riscos, a exemplo da venda de coisas
futuras quanto à existência (art. 458 do CC) e venda de coisa existente, mas exposta a
risco (art. 460 do CC).

d) Não solene/consensual (regra): se aperfeiçoa com o acordo de vontades, não


depende da efetiva entrega da coisa.
Art. 482. A compra e venda, quando pura, considerar-se-á
obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e
no preço.

Obs.: A entrega da coisa ou o registro do negócio no Cartório de Registro de Imóveis,


como apontado, não tem qualquer relação com o seu aperfeiçoamento e sim com o
cumprimento do contrato, com a eficácia do negócio jurídico, particularmente com a
aquisição da propriedade pelo comprador.

3- ELEMENTOS ESSENCIAIS

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

São três: consentimento, preço e objeto

Obs.: A forma, em regra, não é elemento essencial em um contrato de compra e venda.

3.1 CONSENTIMENTO:

Deve ser consentimento livre e desembaraçado, sob pena de ser anulável (erro,
dolo, coação, lesão e estado de perigo). A ação anulatória deve ser intentada em quatro
anos (prazo decadencial).

Deve recair sobre a coisa e o preço. Requer capacidade das partes. As


incapacidades dos arts. 3º e 4º do CC são supridas pela representação, assistência e pela
autorização do juiz.

Quando se tratar de bem imóvel do incapaz ou nascituro, não basta a vontade do


representante/assistente, devendo haver, também, homologação do juiz (art. 1.691 do
CC).

IMPORTANTE: Não se pode esquecer das regras especiais de legitimação, como a


que consta no art. 1.647, I, do CC, que trata da necessidade de outorga conjugal
para a venda de bens imóveis a terceiros. Não havendo tal outorga (uxória ou marital),
a compra e venda será anulável (art. 1.649 do CC), desde que proposta ação anulatória
pelo cônjuge no prazo decadencial de dois anos, contados da dissolução da sociedade
conjugal. A referida outorga é dispensável se o regime entre os cônjuges for o da
separação absoluta de bens. No que se refere à aplicação da exigência para os casos
de companheiro em união estável, existe precedente do STJ assinalando que a
regra do art. 1.647, I, do CC pode ser aplicada à união estável, desde que tenha
sido dada publicidade aos eventuais adquirentes a respeito da existência dessa
união estável (se, no CRI em que está inscrito o bem haja averbação de que o
proprietário do imóvel vive em união estável. Por outro lado, se não houver essa
averbação no registro imobiliário e se não existir nenhuma outra prova de que o
adquirente do apartamento estava de má-fé, deve-se presumir que o comprador
estava de boa-fé, preservando, assim, a alienação realizada, em nome da segurança
jurídica e da proteção ao terceiro de boa-fé. STJ. 3ª Turma. REsp 1424275-MT, Rel.
Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 4/12/2014 (Info 554).

IMPORTANTE: No que toca ao consentimento do cônjuge para compra e venda entre


ascendente e descendente (art. 496 do CC), prevalece na doutrina que não há
necessidade de autorização do companheiro para os referidos atos (outorga
convivencial). Segundo a doutrina, o art. 496 do CC é norma restritiva de direitos,
que não pode ser aplicada por analogia aos casos de união estável.

3.1.1 Limitações à Compra e Venda

1ª) A compra e venda entre ascendente e descendente: depende de consentimento


dos demais herdeiros, sob pena de ser anulável (NÃO é antecipação de herança
porque o patrimônio é recomposto).

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Art. 496. É ANULÁVEL a venda de ascendente a descendente,


salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante
expressamente houverem consentido.
Parágrafo único. Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do
cônjuge se o regime de bens for o da separação obrigatória.

#Qual é o prazo da ação de anulabilidade?


Art. 179 CC. O prazo é decadencial e é de dois anos, contados do
conhecimento (actio nata).

Obs.: Em se tratando de doação de ascendente a descendente, não há necessidade


de consentimento dos outros descendentes, uma vez que a doação de ascendente a
descendente é considerada antecipação de herança (salvo expressa disposição de que
aquilo sai da parte disponível), razão pela qual o descendente deverá trazer à colação o
bem quando o ascendente falecer. No caso de compra e venda, o descendente/comprador
não precisará trazer à colação o bem quando do óbito do ascendente. Em sendo assim,
a fim de evitar que esta venda traduza simulação em prejuízo dos outros descendentes,
revela-se indispensável a fiscalização e anuência.

IMPORTANTE: A restrição encartada no art. 496 do CC abrange tanto a venda


de bens imóveis quanto móveis (diferentemente do que ocorre em relação ao art. 1.647,
I, do CC, que estabelece a necessidade de outorga uxória apenas para alienação de bens
imóveis). Ademais, não há necessidade de autorização do companheiro para os referidos
atos (outorga convivencial). Segundo a doutrina, o art. 496 é uma norma restritiva de
direitos, que não pode ser aplicada por analogia aos casos de união estável (em
relação à venda de imóveis por pessoa casada, a outorga uxória pode ser exigida do
companheiro em união estável caso haja sido dada publicidade à existência de união
estável no registro do imóvel – que revela a ciência do adquirente).

IMPORTANTE: É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros


descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido (art. 496 do
CC). O prazo para anular a venda direta entre ascendente e descendente é de 2 anos, a
contar da conclusão do ato (art. 179 do CC). A venda de bem entre ascendente e
descendente, por meio de interposta pessoa (“laranja”), também é ato jurídico
anulável, devendo ser aplicado o mesmo prazo decadencial de 2 anos previsto no
art. 179 do CC. Isso porque a venda por interposta pessoa não é outra coisa que
não a tentativa reprovável de contornar-se a exigência da concordância dos demais
descendentes e também do cônjuge. Em outras palavras, é apenas uma tentativa de se
eximir da regra do art. 496 do CC, razão pela qual deverá ser aplicado o mesmo prazo
decadencial de 2 anos. STJ. 3ª Turma. REsp 1679501-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 10/03/2020 (Info 667).

IMPORTANTE: Se a pessoa somente foi reconhecida como filha após a alienação ter
acontecido, ela não poderá pleitear a anulação com base no art. 496 do Código Civil.
Dessa forma, o reconhecimento de paternidade post mortem não invalida a alteração de
contrato social com a transferência de todas as cotas societárias realizada pelo genitor a
outro descendente. STJ. 4ª Turma. REsp 1356431-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgado em 8/8/2017 (Info 611).

IMPORTANTE: Para que a venda de ascendente para descendente seja anulada (art.
496 do CC), é imprescindível que o autor da ação anulatória comprove, no caso

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

concreto, a efetiva ocorrência de prejuízo aos herdeiros necessários, não se admitindo a


alegação de prejuízo presumido. Isso porque este negócio jurídico não é nulo (nulidade
absoluta), mas sim meramente anulável (nulidade relativa). Logo, não é possível ao
magistrado reconhecer a procedência do pedido no âmbito de ação anulatória da venda
de ascendente a descendente com base apenas em presunção de prejuízo decorrente do
fato de o autor da ação anulatória ser absolutamente incapaz quando da celebração do
negócio por seus pais e irmão. STJ. 4ª Turma. REsp 1211531-MS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 5/2/2013 (Info 514).

2ª) Compra e venda entre marido e mulher: É possível quanto aos bens excluídos
da comunhão desde que não ocorra simulação, fraude contra credores ou fraude à
execução. Ou seja, os bens pertencentes ao patrimônio comum não podem ser objeto de
compra e venda entre marido e mulher. Se um bem que já fizer parte da comunhão for
vendido, a venda é nula, por impossibilidade do objeto (art. 166, II, do CC).

Art. 499. É LÍCITA a compra e venda entre cônjuges, com relação a


bens excluídos da comunhão.

Obs.: Inadmissível a doação entre cônjuges casados no regime de separação legal


ou obrigatória, por desvirtuar as suas características e finalidades.

3ª) Venda de bens por pessoa casada: O art. 1.647 do CC estabelece a necessidade de
outorga conjugal (uxória ou marital). Essa necessidade se dá apenas em relação a
bens IMÓVEIS (seja para venda, seja para alienação, seja para doação). Quando a
compra e venda se faz sem o consentimento, torna-se anulável (o prazo da ação
anulatória é de dois anos, contados do término da sociedade conjugal).

IMPORTANTE!!! A conduta contraditória do cônjuge, que tacitamente autoriza a


venda do bem, e posteriormente reclama a anulação da alienação esbarra na proibição
do venire contra factum proprium (proibição de comportamento contraditório), por
traduzir abuso de direito.

IMPORTANTE: Para a 3ª Turma do STJ, a regra do art. 1.647, I, do CC, pode ser
aplicada à união estável, desde que tenha sido dada publicidade aos eventuais
adquirentes a respeito da existência dessa união estável. STJ. 3ª Turma. REsp 1424275-
MT, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 4/12/2014 (Info 554).

Lembrar!!! Em se tratando de bem móvel, não é necessário o consentimento.

4ª) Compra e venda da parte indivisa de bem condominial: Não pode um condômino
em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro condômino a quiser, tanto
por tanto (em igualdade de condições). O condômino a que não se der conhecimento da
venda poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o
requerer no prazo de 180 dias, sob pena de decadência. Como resta claro pela leitura do
art. 504 do CC, a restrição tem aplicação em casos de negócios jurídicos celebrados por
um dos condôminos com terceiros, em detrimento do direito de outros condôminos. Não
incide, portanto, para vendas entre os próprios condôminos. A venda da fração ideal de
cada condômino só depende do dono. Os demais condôminos têm direito de preferência
(ação de preempção ajuizada no prazo decadencial de 180 dias a contar da data em que
teve ciência da alienação). Se esse direito não for respeitado, dá ensejo à adjudicação
compulsória.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Art. 504. Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua


parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O
condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá,
depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o
requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.
Parágrafo único. Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver
benfeitorias de maior valor e, na falta de benfeitorias, o de quinhão
maior. Se as partes forem iguais, haverão a parte vendida os
comproprietários, que a quiserem, depositando previamente o preço.

Obs.: Aplica-se essa regra apenas ao condomínio tradicional e não ao edilício. Mas se o
apartamento pertencer a outras pessoas, estas devem ser notificadas para exercer sua
preferência legal.

IMPORTANTE!!! Se a coisa é divisível, nada impede que o condômino venda sua


parte a estranho, sem dar preferência aos consortes, pois os consortes poderão requerer,
após a alienação, a divisão da coisa.

5ª) Aquisição de bens por pessoa encarregada de zelar pelos interesses do vendedor.
Art. 497. Sob pena de nulidade, não podem ser comprados, ainda que
em hasta pública:
I - pelos tutores, curadores, testamenteiros e administradores, os bens
confiados à sua guarda ou administração;
II - pelos servidores públicos, em geral, os bens ou direitos da pessoa
jurídica a que servirem, ou que estejam sob sua administração direta ou
indireta;
III - pelos juízes, secretários de tribunais, arbitradores, peritos e outros
serventuários ou auxiliares da justiça, os bens ou direitos sobre que se
litigar em tribunal, juízo ou conselho, no lugar onde servirem, ou a que
se estender a sua autoridade;
IV - pelos leiloeiros e seus prepostos, os bens de cuja venda estejam
encarregados.
Parágrafo único. As proibições deste artigo estendem-se à cessão de
crédito.

3.2 PREÇO

Deve ser determinável ou determinado e em moeda nacional corrente, pelo


valor nominal, conforme o art. 315 do CC (princípio do nominalismo). O que não se
tolera é a indeterminabilidade absoluta.

O preço deve ser apreciável em dinheiro (se não for em dinheiro caracterizará
troca/permuta).

Pode ocorrer de ter sido ajustado um preço em dinheiro, mas o vendedor (credor)
aceita receber coisa diversa, ocorrendo a DAÇÃO EM PAGAMENTO (isso não
desnatura a compra e venda).

EXCEÇÃO: O preço, em regra, não pode ser fixado expressamente em moeda


estrangeira ou em ouro, sob pena de nulidade absoluta do contrato (art. 318 do CC).
Exceção deve ser feita para a compra e venda internacional, nos termos do Decreto-lei
857/1969.

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IMPORTANTE!!! NÃO SE ADMITE que o preço fique submetido ao arbítrio


exclusivo de UMA DAS PARTES (sendo nula essa compra e venda).

O CC permite que se indique um TERCEIRO para que ele fixe o preço.

É permitido que o preço esteja sujeito a variações de taxa de mercado, bolsa de


valores etc. (arts. 486 e 487).

Se não estabelecido critério para sua fixação, entende-se que as partes se


sujeitaram ao preço corrente nas vendas habituais do vendedor (art. 488).

IMPORTANTE!!! Quando for relação de consumo, o preço deve ser estipulado de


forma clara.

O preço na compra e venda deve ser real, sério, de verdade. Apesar disso, não é
elemento do contrato de compra e venda que o preço seja justo. Nesse caso, se o preço
for excessivamente oneroso, o ordenamento confere as seguintes soluções:

✓ Pode caber anulação do contrato por lesão ou por estado de perigo.


✓ Se o preço se tornar excessivamente oneroso no decorrer do contrato, cabe
revisão ou resolução do contrato (teoria da imprevisão, art. 478 CC).

3.3 OBJETO

É a coisa vendida.

O objeto do contrato de compra e venda pode ser bem móvel ou imóvel;


corpóreo ou incorpóreo (hipótese em que a alienação receberá o nome de cessão);
atuais ou futuros.

Deve atender a determinados requisitos:

a) Existência: é nula a venda de coisa inexistente. A lei se contenta com a existência


potencial da coisa como, por exemplo, venda de safra futura. O objeto do contrato de
compra e venda pode ser bem móvel ou imóvel; corpóreo ou incorpóreo (chama-se
cessão); atuais ou futuros.

b) Individuação: o objeto da compra e venda há de ser determinado, ou suscetível de


determinação no momento da execução. Admite-se, assim, a venda alternativa, cuja
indeterminação do objeto cessa com a concentração, e a venda de coisa incerta indicada
ao menos pelo gênero e quantidade.

c) Disponibilidade: a coisa deve encontrar-se disponível, não pode estar fora do


comércio. É possível até mesmo compra e venda de coisa litigiosa (457 do CC).

IMPORTANTE!!! Quando se trata de compra e venda de bem litigioso, não é


possível que o adquirente alegue evicção, porque tem ciência da possibilidade de
perda desse bem.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Obs.: A coisa deve ser de propriedade do vendedor, sob pena de caracterização de venda
a non domino (art. 1.268, §1º), realizada por aquele que não é seu dono. Na venda a
non domino, a eficácia do negócio jurídico fica submetida à posterior aquisição da coisa
pelo vendedor.

3.3.1. Não Pode Ser Objeto De Compra E Venda

a) Herança de pessoa viva (proibição de pacta corvina/pacto sucessório).

EXCEÇÃO: partilha em vida, quando se tratar de herdeiros maiores, capazes e


estando todos de acordo (art. 2.018 do CC)

b) Bens personalíssimos

c) Bens gravados com cláusulas restritivas (1.911 do CC).

4- EFEITOS DA COMPRA E VENDA


Tem como principais efeitos gerar obrigações recíprocas para os contratantes
e acarretar a responsabilidade do vendedor pelos vícios redibitórios e pela evicção.

Tem como efeitos secundários:

a) A responsabilidade pelo risco:


Art. 492. Até o momento da tradição, os riscos da coisa correm por
conta do vendedor (res perit domino), e os do preço por conta do
comprador.
§ 1o Todavia, os casos fortuitos, ocorrentes no ato de contar, marcar ou
assinalar coisas, que comumente se recebem, contando, pesando,
medindo ou assinalando, e que já tiverem sido postas à disposição do
comprador, correrão por conta deste.
§ 2o Correrão também por conta do comprador os riscos das referidas
coisas, se estiver em mora de as receber, quando postas à sua
disposição no tempo, lugar e pelo modo ajustados.

b) A repartição das despesas:

Art. 490. Salvo cláusula em contrário, ficarão as despesas de escritura


e registro a cargo do comprador, e a cargo do vendedor as da
tradição.

c) Direito de reter a coisa ou preço: cabe ao comprador o primeiro passo, pagar


o preço. Antes disso o vendedor não é obrigado a entregar a coisa.
Art. 491. Não sendo a venda a crédito, o vendedor não é obrigado a
entregar a coisa antes de receber o preço.

Obs.: A regra do art. 495 do CC é semelhante àquela prevista no art. 477 do CC, sendo
a do art. 495 mais rigorosa, pois exige a INSOLVÊNCIA do vendedor (a regra do
art. 495 é aplicada à compra e venda). Ambas têm como objetivo dar segurança ao
comprador (se a situação for inversa, também ao devedor).

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Art. 495. Não obstante o prazo ajustado para o pagamento, se antes da


tradição o comprador cair em insolvência, poderá o vendedor
sobrestar na entrega da coisa, até que o comprador lhe dê caução de
pagar no tempo ajustado. (aplicada a COMPRA E VENDA)

Art. 477. Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das


partes contratantes diminuição em seu patrimônio capaz de
comprometer ou tornar duvidosa a prestação pela qual se obrigou, pode
a outra recusar-se à prestação que lhe incumbe, até que aquela satisfaça
a que lhe compete ou dê garantia bastante de satisfazê-la. (aplicada
aos CONTRATOS EM GERAL)

IMPORTANTE!!! Perda ou deterioração da coisa. A regra é de que a coisa perece


para o dono (res perit domino). Lembrando que o domínio só se transfere com a tradição
ou registro. Assim, se já houve a tradição/registro, quem perde é o comprador. Se não
houve a tradição/registro, quem perde é o vendedor.

IMPORTANTE!!! Evicção e Vício Redibitório. Se as partes quiserem, podem


afastar as regras da evicção e do vicio redibitório, por cláusula expressa. Além de
afastar, as partes podem reforçar, ou ainda diminuir as garantias.

Lembrar!!! Cláusula SOLVE ET REPETE. A cláusula solve et repete, que significa


“pague e depois reclame”, é uma RENÚNCIA À EXCEÇÃO DE CONTRATO NÃO
CUMPRIDO (artigos 476 e 477 do Código Civil), uma vez que, se convencionada, o
contratante estará renunciando à defesa, podendo ser compelido a pagar,
independentemente do cumprimento da primeira prestação. Essa cláusula é comum na
lei de licitações nos contratos administrativos, em que se tem as cláusulas de
exorbitância que visam proteger a Administração Pública, e, por conseguinte, a
coletividade.

5- VENDAS ESPECIAIS
a) Venda por amostra (ou protótipo): Prevista no art. 484 do CC. É uma categoria
especial de compra e venda. Por ela, o comprador não vê a coisa, adquirindo-a com base
em amostra ou protótipo (é a compra por catálogo, por internet). Nessa modalidade de
compra e venda o vendedor assegura a qualidade da coisa. Assegura, pois, que a coisa
que será recebida terá as mesmas características da amostra. Havendo contradição
entre a amostra e a coisa, prevalece a amostra. Em suma, a venda por amostra, que
funciona como cláusula tácita, tem eficácia suspensiva, não ocorrendo o
aperfeiçoamento do negócio até ulterior tradição, com a qualidade esperada. Se os bens
não forem entregues conforme o modelo, amostra ou protótipo, poderá o contrato de
compra e venda ser desfeito (condição resolutiva). As questões envolvem o plano da
eficácia do contrato (terceiro degrau da Escada Ponteana).
Art. 484. Se a venda se realizar à vista de amostras, protótipos ou
modelos, entender-se-á que o vendedor assegura ter a coisa as
qualidades que a elas correspondem.
Parágrafo único. Prevalece a amostra, o protótipo ou o modelo, se
houver contradição ou diferença com a maneira pela qual se descreveu
a coisa no contrato.

b) Venda ad corpus e venda ad mensuram (por extensão): Somente aplicável na


compra e venda de IMÓVEIS. Na venda ad corpus, o imóvel é adquirido como um

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

todo (ex.: Chácara Vista Linda), sendo apenas enunciativa a referência às suas
dimensões, que não tem influência na fixação do preço. Na venda ad mensuram, o preço
é estipulado com base nas dimensões do imóvel, de forma que, se a área não corresponde
às dimensões dadas, cabe ação ex empto ou ex vendito para exigir a complementação
da área. Se esta não for possível, cabe o ajuizamento da ação redibitória (objetivando
a resolução do contrato) ou quanti minoris (objetivando o abatimento proporcional
do preço).
Art. 500. Se, na venda de um imóvel, se estipular o preço por medida
de extensão, ou se determinar a respectiva área, e esta não
corresponder, em qualquer dos casos, às dimensões dadas, o comprador
terá o direito de exigir o complemento da área, e, não sendo isso
possível, o de reclamar a resolução do contrato ou abatimento
proporcional ao preço.
§ 1o Presume-se que a referência às dimensões foi simplesmente
enunciativa, quando a diferença encontrada não exceder de UM
VIGÉSIMO da área total enunciada, ressalvado ao comprador o
direito de provar que, em tais circunstâncias, não teria realizado o
negócio.
§ 2o Se em vez de falta houver excesso, e o vendedor provar que tinha
motivos para ignorar a medida exata da área vendida, caberá ao
comprador, à sua escolha, completar o valor correspondente ao preço
ou devolver o excesso.
§ 3o Não haverá complemento de área, nem devolução de excesso,
se o imóvel for vendido como coisa certa e discriminada, tendo sido
apenas enunciativa a referência às suas dimensões, ainda que não
conste, de modo expresso, ter sido a venda ad corpus.

Art. 501. Decai do direito de propor as ações previstas no artigo


antecedente o vendedor ou o comprador que não o fizer no prazo de
um ano, a contar do registro do título.
Parágrafo único. Se houver atraso na imissão de posse no imóvel,
atribuível ao alienante, a partir dela fluirá o prazo de decadência.

Obs.: Na venda por extensão (ad mensuram), a diferença não superior a 1/20 da área
total é irrelevante (admite-se uma variação de área de até 1/20, existindo uma presunção
relativa de que tal variação é tolerável pelo comprador).

6- DAS CLÁUSULAS ESPECIAIS À COMPRA E VENDA


São cláusulas auxiliares ao contrato de compra e venda.

O CC autoriza a inserção de determinadas cláusulas para regular situações


essenciais. São elas:

a) RETROVENDA: Constitui um pacto inserido no contrato de compra e venda pelo


qual o vendedor reserva-se o direito de reaver o imóvel que está sendo alienado, dentro
de certo prazo, restituindo o preço e reembolsando todas as despesas feitas pelo
comprador no período de resgate, desde que previamente ajustadas (art. 505 do CC).
Tais despesas incluem as benfeitorias necessárias. Portanto, é a cláusula através da
qual o vendedor resguarda para si o direito de comprar o bem IMÓVEL de volta,
no prazo máximo de 3 anos. Durante esse prazo, o vendedor pode a qualquer tempo
recuperar o bem, pagando tanto por tanto. Essa cláusula deve ser expressa, porque ela
é oponível a terceiros (quer dizer, se o comprador já vendeu a coisa para outra pessoa,

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o vendedor pode ir atrás da coisa com quem quer que esteja). Dentro do prazo da
retrovenda, o que o comprador tem é propriedade resolúvel. A retrovenda se
caracteriza como condição resolutiva expressa.

b) PREFERÊNCIA, PRELAÇÃO CONVENCIONAL OU PREEMPÇÃO


(preferência convencional): é a cláusula que obriga o comprador do bem móvel ou
imóvel a dar preferência àquele que lhe vendeu, por meio de notificação judicial
ou extrajudicial, na eventualidade de querer vender a coisa. Se a cláusula de
preempção estiver registrada, o vendedor tem oponibilidade erga omnes (o vendedor
pode ir buscar seu direito de preferência com quem quer que esteja).

Obs.: No condomínio a preferência não precisa estar no contrato (preferência legal).

c) RESERVA DE DOMÍNIO: é modalidade especial de venda de coisa móvel, em que


o vendedor tem a própria coisa vendida como garantia do recebimento do preço. Só a
posse direta é transferida ao adquirente. A propriedade permanece com o alienante
e só é transferida ao comprador após o recebimento integral do preço. Trata-se,
portanto, de hipótese de propriedade resolúvel (propriedade resolúvel condicional do
vendedor, cuja solução depende de evento futuro e incerto), que só se consolidará para
o adquirente após o pagamento integral do preço. Não pode ser objeto de venda com
reserva de domínio a coisa insuscetível de caracterização perfeita, para estremá-la de
outras congêneres.
Art. 521. Na venda de coisa móvel, pode o vendedor reservar para si
a propriedade, até que o preço esteja integralmente pago.

IMPORTANTE: A mora do comprador, na ação ajuizada pelo vendedor com o intuito


de recuperação da coisa vendida com cláusula de reserva de domínio, pode ser
comprovada por meio de notificação extrajudicial enviada pelo Cartório de Títulos e
Documentos (RTD). Assim, em caso de cláusula de reserva de domínio, existem três
formas pelas quais o vendedor (credor) poderá comprovar a mora do comprador
(devedor): a) mediante protesto do título; b) por meio de interpelação judicial; c) por
notificação extrajudicial enviada pelo Cartório de Títulos e Documentos. STJ. 3ª Turma.
REsp 1629000-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 28/3/2017 (Info 601).

d) VENDA A CONTENTO: é cláusula que subordina os efeitos da compra e venda


a uma CONDIÇÃO SUSPENSIVA (evento futuro e incerto). Essa condição é o
agrado do comprador. Trata-se de uma condição suspensiva, qual seja: a confirmação
do agrado da coisa (art. 510 do CC).
Art. 509. A venda feita a contento do comprador entende-se realizada
sob CONDIÇÃO SUSPENSIVA, ainda que a coisa lhe tenha sido
entregue; e não se reputará perfeita, enquanto o adquirente não
manifestar seu agrado.

Art. 510. Também a venda sujeita a prova presume-se feita sob a


condição suspensiva de que a coisa tenha as qualidades asseguradas
pelo vendedor e seja idônea para o fim a que se destina.

e) Pacto de melhor comprador: cláusula por meio da qual o vendedor guarda para si
o direito de desfazer a compra e venda, no prazo máximo de um ano, se encontrar um
melhor comprador. Essa cláusula especial não encontra previsão no CC.

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CAPÍTULO IV
DA DOAÇÃO

1- CONCEITO
É transferência de patrimônio por liberalidade. Pela doação, o doador transfere
do seu patrimônio bens ou vantagens para o donatário, sem a presença de qualquer
remuneração. Tem natureza contratual, sendo contrato benévolo, unilateral e gratuito. É
necessário o animus donandi, ou seja, intenção de fazer uma liberalidade, transferindo
bens, acarretando uma diminuição do patrimônio do doador. É ato inter vivos (art.538).
Art. 538. Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por
liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de
outra.

Obs.: Transplante de órgãos não se submete ao contrato de doação.

2- CARACTERÍSTICAS
a) Benéfico (lembrar que o contrato benéfico e a renúncia são objeto de interpretação
restritiva – art. 114). Em relação à doação modal ou com encargo, há polêmica. Isso
porque há quem entenda que o contrato é bilateral, uma vez que o encargo é um dever a
ser cumprido pelo donatário. Todavia, entende-se que o contrato é unilateral imperfeito,
porquanto o encargo não constitui uma contraprestação, um dever jurídico a fazer com
que o contrato seja sinalagmático. Constitui sim um ônus, que, não atendido, traz
consequências ao donatário.

b) Unilateral

Obs.: A doação com encargo é contrato unilateral imperfeito (Flávio Tartuce). Há


doutrina sustentando a natureza de contrato bilateral.

c) Gratuito

Obs.: A doação com encargo ostenta a natureza de contrato oneroso, mesmo para quem
o vislumbra como unilateral imperfeito.

d) Solene e consensual (precisa ser celebrado por escrito!!!)

Consensual porque se aperfeiçoa com o acordo de vontades, independentemente


da entrega da coisa.

Obs.: A doação manual é real, não solene. O art. 541, parágrafo único, do CC
estabelece que, quando se tratar de bens móveis de pequeno valor, a doação não depende
de solenidade, sendo que a tradição aperfeiçoa a doação.
Art. 541. A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento
particular.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Parágrafo único. A doação verbal será válida, se, versando sobre


bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a
tradição.

#O que é pequeno valor?


REsp 155240/RJ - o STJ fixou entendimento de que doação de pequeno valor
depende do patrimônio de quem está doando.

IMPORTANTE!!! Como contrato benéfico que é, o doador, em regra, NÃO


responde pela evicção nem pelo vício redibitório.

Lembrar!!! Evicção e vício redibitório são garantias relativas a contratos


comutativos/onerosos.

EXCEÇÃO: o doador responde por evicção e vício redibitório: (a) nas doações para
casamento com pessoa determinada e (b) nas doações remuneratórias.

3- PROMESSA DE DOAÇÃO
Discute-se muito em sede doutrinária e jurisprudencial a viabilidade jurídica da
promessa de doação, ou seja, a possibilidade de haver contrato preliminar unilateral que
vise a uma liberalidade futura. Flávio Tartuce não vê óbice na aceitação de tal promessa,
uma vez que não há no ordenamento jurídico qualquer dispositivo que a vede, não
contrariando esta figura negocial qualquer princípio de ordem pública, como, por
exemplo, o da função social dos contratos. Adotando em parte tal premissa, na VI
Jornada de Direito Civil, foi aprovado o enunciado 549: “a promessa de doação no
âmbito da transação constitui obrigação positiva e perde o caráter de liberalidade
previsto no art. 538 do Código Civil”. O futuro beneficiário é investido no direito de
exigir o cumprimento da promessa de doação da coisa, pois a intenção de praticar a
liberalidade manifestou-se no momento da sua celebração. Parece prevalecer, no âmbito
do STJ, a resposta afirmativa quanto à possibilidade de se exigir o cumprimento da
promessa de doação (STJ, REsp 1.355.007/SP, Terceira Turma, rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, j. 27.06.2017).

4- ESPÉCIES DE DOAÇÃO

a) Pura e simples (típica): é aquela em que o doador não impõe nenhuma restrição ou
encargo ao beneficiário, nem subordina a eficácia do contrato a qualquer condição.

b) Doação onerosa (doação modal) é a doação com encargo. Dá-se sempre que o
doador crava a doação com uma cláusula em seu favor, em favor de terceiro ou da
coletividade.

Obs.: Se o donatário não cumpre o encargo, é admissível ação de execução de encargo.


Se a execução for frustrada, cabe revogação da doação.
Art. 553. O donatário é obrigado a cumprir os encargos da doação,
caso forem a benefício do doador, de terceiro, ou do interesse geral.
Parágrafo único. Se desta última espécie for o encargo, o Ministério
Público poderá exigir sua execução, depois da morte do doador, se
este não tiver feito.

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c) Doação remuneratória é aquela feita em retribuição a serviços prestados pelo


donatário, mas cuja prestação não pode ser exigida pelo último. Isso porque, caso
fosse exigível, a retribuição deveria ser realizada por meio do pagamento, uma das
formas de extinção das obrigações. Em regra, não constitui ato de liberalidade, havendo
remuneração por uma prestação de serviços executada pelo donatário. Somente haverá
liberalidade no que exceder o valor do serviço prestado, conforme dispõe o art. 540 do
CC, cabendo análise caso a caso.

Obs.: Essa doação permite a alegação de evicção e vício redibitório (por se tratar de
forma de doação onerosa). Não se revogam por ingratidão as doações puramente
remuneratórias (art. 564, I, do CC). As doações remuneratórias de serviços feitos ao
ascendente não estão sujeitas a colação (art. 2.011 do CC).

IMPORTANTE: A doação remuneratória é aquela na qual a coisa é doada como forma


de recompensa por um serviço prestado pelo donatário. A doação remuneratória deve
respeitar os limites impostos pelo legislador. O Código Civil proíbe a doação universal
(doação de todos os bens do doador sem que seja a ele resguardado o mínimo
existencial) e a doação inoficiosa (aquela que ocorre em prejuízo à legítima dos
herdeiros necessários). O fato de a doação ser remuneratória não a isenta de respeitar
essas limitações. Assim, a doação remuneratória não pode se constituir em uma doação
universal nem em uma doação inoficiosa. STJ. 3ª Turma. REsp 1.708.951-SE, Rel. Min.
Nancy Andrighi, julgado em 14/05/2019 (Info 648).

d) Doação contemplativa (art. 540) é uma doação que contempla o merecimento do


donatário. Quando o doador menciona o motivo da liberalidade (amizade etc.). Não
perde o caráter de liberalidade (caráter de doação pura e simples) caso se descubra que
o donatário não a mereça. Não há qualquer consequência prática dessa denominação.
Art. 540. A doação feita em contemplação do merecimento do
donatário não perde o caráter de liberalidade, como não o perde a
doação remuneratória, ou a gravada, no excedente ao valor dos serviços
remunerados ou ao encargo imposto.

e) Doação feita ao nascituro: valerá sendo aceita pelo seu representante legal (art. 542
do CC). A aceitação por parte do representante legal do nascituro está no plano da
validade do contrato. Além disso, a eficácia do contrato depende do nascimento com
vida do donatário, havendo uma doação condicional, segundo a posição prevalecente.

f) Em forma de subvenção periódica: trata- se de uma pensão como favor pessoal ao


donatário. É doação de trato sucessivo, em que o doador estipula rendas a favor do
donatário. Em hipótese alguma poderá ultrapassar a vida do donatário, sendo eventual
cláusula nesse sentido revestida por nulidade virtual (art. 166, VII, do CC).

Art. 545. A doação em forma de subvenção periódica ao


beneficiado extingue-se morrendo o doador, salvo se este outra
coisa dispuser, mas não poderá ultrapassar a vida do donatário.

g) Doação em favor de entidade futura (art. 554 do CC). A lei possibilita a doação a
uma pessoa jurídica que ainda não exista, condicionando a sua eficácia à regular
constituição da entidade, nos termos do art. 554 do CC em vigor. Essa doação caduca
se a entidade não for constituída no prazo de dois anos (trata-se de prazo decadencial).

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Há, na espécie, uma doação sob condição suspensiva, pois o negócio fica pendente até
a regularização da empresa.

h) Doação de ascendente para descendente e doação entre cônjuges. Importa em


adiantamento do que cabe aos descendentes (ou cônjuges) em herança (é adiantamento
da legítima). Os bens deverão ser colacionados no processo de inventário por aquele que
os recebeu, sob pena de o herdeiro perder o direito que tem sobre a coisa (arts. 1.992 a
1.996 do CC). Todavia, é possível que o doador dispense essa colação (art. 2.006 do
CC)

Obs.: Decorre disso que toda doação de ascendente para descendente deverá ser
colacionada. Se não for, caracterizará bens sonegados e isso gera a perda do direito do
herdeiro sobre aquele bem.

i) Doação conjuntiva (art. 551 do CC) é a doação que beneficia duas ou mais
pessoas. Conta com a presença de dois ou mais donatários. Incide, em regra, presunção
relativa de divisão igualitária da coisa em quotas iguais entre os donatários. Entretanto,
o instrumento contratual poderá trazer previsão em contrário. Por regra, não há direito
de acrescer entre os donatários na doação conjuntiva. Dessa forma, falecendo um deles,
sua quota será transmitida diretamente a seus sucessores e não ao outro donatário. Mas
o direito de acrescer pode estar previsto no contrato (direito de acrescer convencional)
ou na lei (direito de acrescer legal). O art. 551, parágrafo único, do CC enuncia uma
hipótese de direito de acrescer legal (quando donatários forem marido e mulher).

j) Doação com cláusula de reversão (art. 547 do CC) é aquela em que o doador estipula
que os bens doados voltem ao seu patrimônio se sobreviver ao donatário. Trata-se esta
cláusula de uma condição resolutiva expressa, demonstrando o intento do doador de
beneficiar somente o donatário e não os seus sucessores, sendo, portanto, uma cláusula
intuitu personae que veda a doação sucessiva. O pacto de reversão só tem eficácia se o
doador sobreviver ao donatário. Se falecer antes deste, a condição não ocorre e os bens
doados incorporam-se ao patrimônio do donatário definitivamente, podendo transmitir-
se, aos seus próprios herdeiros, com a sua morte. Deve ser expressa.

5- RESTRIÇÕES LEGAIS
a) Doação pelo devedor já insolvente, ou por ele reduzido a insolvência: configura
fraude contra credores. Sua validade será impugnada por meio de ação pauliana.

b) Doação da parte inoficiosa (doação inoficiosa): é aquela que invade a legítima dos
herdeiros necessários, sendo vedada pelo ordenamento jurídico. O excesso na doação
(invasão da legítima) é apurado levando-se em conta o valor do patrimônio do doador ao
tempo da doação, e não o patrimônio estimado no momento da abertura da sucessão do
doador (STJ. 2ª Seção. AR 3493-PE, Rel. Min. Massami Uyeda, Rel. p/ Acórdão Ministro
Luis Felipe Salomão, julgado em 12/12/2012 - Info 512). A doutrina costuma utilizar a
seguinte frase para explicar essa situação jurídica: o posterior empobrecimento do doador
não anula as doações feitas quando ainda era homem rico. A ação cabível para se obter a
anulação da doação inoficiosa é a ação de querela inoficiosa (ação de redução), que
poderá ser proposta apenas pelos herdeiros necessários do doador, sujeitando-se ao prazo
prescricional de 10 anos (prazo geral do CC), segundo posição do STJ (REsp 1.321.998,
Terceira Turma, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 07.08.2014).

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Art. 549. NULA é também a doação quanto à parte que exceder à de


que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em
testamento.

IMPORTANTE: Mesmo que o herdeiro necessário tenha cedido sua parte na herança,
ele terá legitimidade para a ação de anulação? SIM. O herdeiro que cede seus direitos
hereditários continua tendo legitimidade para pleitear a declaração de nulidade de doação
inoficiosa realizada pelo autor da herança em benefício de terceiros. STJ. 3ª Turma. REsp
1361983-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/3/2014 (Info 539).

c) Doação de todos os seus bens (doação universal):


Art. 548. É NULA a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou
renda suficiente para a subsistência do doador.

A nulidade recai sobre a totalidade dos bens. Não haverá restrição se o doador
preservar alguma fonte de renda ou reservar para si o usufruto de determinados bens.

d) Doação de cônjuge adúltero a seu cúmplice:

Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser


anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois
anos depois de dissolvida a sociedade conjugal.

IMPORTANTE!!! Essa doação não é nula, mas sim anulável pelo outro cônjuge ou
por seus herdeiros necessários. Não pode ser declarada de ofício pelo juiz.

Obs.: Cúmplice seria a pessoa que manteve relação sexual eventual com o doador, não
apenas o concubino. Flávio Tartuce, criticando a redação do dispositivo, sustenta que
sua aplicação somente será possível se o doador não viver em união estável com o
donatário, havendo uma doação a concubino (concubinato impuro), de bem comum, na
vigência do casamento.

6- ELEMENTOS DA DOAÇÃO
Os elementos são: sujeito, objeto, consentimento e forma.

a) Sujeito:

Só se admite doação por quem tem capacidade.

IMPORTANTE!!! O incapaz não pode doar nem representado ou assistido. Os pais


não podem doar o patrimônio de seus filhos, salvo mediante autorização do juiz (art.
1.691 do CC).

#É válida a doação que o falido fez antes da falência?


As doações feitas dentro do termo legal da falência (dois anos da sentença) são
absolutamente ineficazes (art. 129 da Lei de Falências). Em relação às doações
anteriores ao termo legal da falência, a ineficácia é relativa (mais de dois anos antes da
sentença de falência), nos termos do art. 130 da Lei de Falências.

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#Pessoa casada pode fazer doação?


Cônjuges podem realizar doação desde que tenham o consentimento do outro
cônjuge (art. 1.647, IV), salvo no regime de separação absoluta de bens.

IMPORTANTE!!! A doação sem a autorização do cônjuge, quando não suprida pelo


juiz, é anulável, no prazo de dois anos do fim do casamento (Cuidado! A conduta do
cônjuge pode gerar supressio e proibição do venire contra factum proprium, a exemplo
da hipótese em que se confere autorização tácita ou em que se queda inerte o cônjuge,
para, posteriormente, vislumbrando desvantagem com o negócio, arguir sua
anulabilidade).

Obs.: Se o casamento se dá no regime de participação final nos aquestos, o pacto


antenupcial poderá dispensar a vênia conjugal. Tal situação deve restar expressa no
pacto antenupcial.

b) Objeto:

É possível doar todo e qualquer bem economicamente apreciável (móvel ou


imóvel; singular ou universal; corpóreo ou incorpóreo...).

IMPORTANTE!!! É possível a doação de bens incorpóreos (ex.: direito autoral,


marca...). Quando se tratar de bem incorpóreo, o contrato recebe a denominação
de “cessão”.

Obs.: É possível até mesmo doação em prestações periódicas. Em não havendo prazo
previsto no instrumento contratual, extingue-se com a morte do doador. O prazo máximo
que se pode prever é até a morte do donatário, sendo que, se o doador morrer antes do
donatário, quem paga é o espólio.

Art. 545. A doação em forma de subvenção periódica ao beneficiado


extingue-se morrendo o doador, salvo se este outra coisa dispuser,
mas não poderá ultrapassar a vida do donatário.

IMPORTANTE!!! Mesmo tendo natureza alimentícia, não se admite prisão civil do


devedor de alimentos fixados sob a rubrica de doação em forma de subvenção
periódica. SÓ É POSSÍVEL A PRISÃO CIVIL EM SE TRATANDO DE
ALIMENTOS FAMILIARES (a norma que prevê a prisão civil, dada sua natureza,
não pode ser objeto de analogia ou interpretação extensiva).

c) Consentimento:

O mútuo consentimento é a aceitação. A doação exige aceitação para que se


aperfeiçoe.

A aceitação pode ser expressa, tácita, presumida ou ficta.

Aceitação tácita é a comportamental (conduta que sugere e se compatibiliza com


a aceitação). Aceitação presumida é aquela prevista no art. 539 do CC, quando há prazo
estipulado e o donatário permanece silente.

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Art. 539. O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se


aceita ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo,
não faça, dentro dele, a declaração, entender-se-á que aceitou, se a
doação não for sujeita a encargo.

Portanto, se a doação for modal ou com encargo e o donatário permanecer


silente, o silêncio será presumido como não aceitação da doação.

Doação ficta é a feita ao donatário absolutamente incapaz, uma vez que, se o


donatário é incapaz, não poderá manifestar aceitação, presumindo-se, daí, caso não haja
encargo, que aceitou.

IMPORTANTE!!! A doação para casamento com pessoa determinada dispensa


aceitação, porque a aceitação é o próprio casamento.
Art. 546. A doação feita em contemplação de casamento futuro com
certa e determinada pessoa, quer pelos nubentes entre si, quer por
terceiro a um deles, a ambos, ou aos filhos que, de futuro, houverem
um do outro, não pode ser impugnada por falta de aceitação, e só
ficará sem efeito se o casamento não se realizar.

LEMBRAR!!! Nessa modalidade de doação o doador responde pela evicção e pelos


vícios redibitórios!!

d) Forma:

O contrato de doação exige FORMA ESCRITA (pública ou particular). No


entanto, para além da forma escrita, a doação admite forma verbal quando for doação
manual (se versar sobre bens móveis e de pequeno valor, sendo seguida incontinenti da
tradição), nos termos do art. 541, parágrafo único, do CC.

7- REVOGAÇÃO DA DOAÇÃO

a) Casos comuns a todos os contratos: tendo natureza contratual, a doação pode


contaminar-se de todos os vícios do negócio jurídico, sendo desfeita por ação
anulatória. Pode ser declarada nula como os demais contratos e ainda em razão
da existência de vícios que lhe são peculiares (arts. 548 e 549 do CC).

b) Por descumprimento do encargo.


Art. 562. A doação onerosa pode ser revogada por inexecução do
encargo, se o donatário incorrer em mora. Não havendo prazo para o
cumprimento, o doador poderá notificar judicialmente o donatário,
assinando-lhe prazo razoável para que cumpra a obrigação assumida.

IMPORTANTE: A inexecução do encargo assumido pelo donatário em face do doador


como condição para a celebração da doação onerosa poderá ensejar a sua revogação. Não
previsto prazo determinado para o cumprimento da contraprestação, o doador,
mediante notificação judicial ou extrajudicial, pode constituir em mora o donatário,
fixando-lhe prazo para a execução do encargo. Restando este inerte (“parado”), opera-
se a revogação da doação. Apesar do art. 562 do CC falar em notificação judicial,
admite-se também a notificação extrajudicial com base no art. 397, parágrafo único

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do CC, sendo excesso de formalismo exigir a notificação judicial. STJ. 3ª Turma. REsp
1622377/MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/12/2018.

c) Por ingratidão do donatário: Só se admite nas doações puras. Envolve matéria


de ordem pública. Tanto assim que o art. 556 do CC veda a renúncia antecipada ou
prévia ao direito de revogar a liberalidade por ingratidão do donatário (art. 556).
Art. 555. A doação pode ser revogada por ingratidão do donatário,
ou por inexecução do encargo.

Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações:


I - se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu
crime de homicídio doloso contra ele;
II - se cometeu contra ele ofensa física;
III - se o injuriou gravemente ou o caluniou;
IV - se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de
que este necessitava.

Art. 558. Pode ocorrer também a revogação quando o ofendido,


nos casos do artigo anterior, for o cônjuge, ascendente,
descendente, ainda que adotivo, ou irmão do doador.

IMPORTANTE: “o conceito jurídico de ingratidão constante do art. 557 do CC é


aberto, não se encerrando em molduras tipificadas previamente em lei (...)”. Ao final o
acórdão concluiu que a injúria a que se refere o dispositivo envolve também o campo da
moral, podendo ser “revelada por meio de tratamento inadequado, tais como o descaso,
a indiferença e a omissão de socorro às necessidades elementares do doador, situações
suficientemente aptas a provocar a revogação do ato unilateral em virtude da ingratidão
dos donatários” (STJ, REsp 1.593.857/MG, Terceira Turma, rel. Min. Ricardo Villas
Bôas Cueva, j. 14.06.2016).

Enunciado 33 CJF/STJ: “o Código Civil vigente estabeleceu um novo sistema para a


revogação da doação por ingratidão, pois o rol legal do art. 557 deixou de ser taxativo,
admitindo outras hipóteses”.

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CAPÍTULO V
DA LOCAÇÃO DE COISAS

1- CONCEITO
Locação de coisas é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a ceder à outra,
por TEMPO DETERMINADO OU NÃO, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante
certa retribuição, denominada aluguel.
Art. 565. Na locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à
outra, por TEMPO DETERMINADO OU NÃO, o uso e gozo de
coisa não fungível, mediante certa retribuição.

2- CARACTERÍSTICAS

a) Bilateral/sinalagmático: envolve prestações recíprocas.


b) Oneroso: ambas as partes obtêm proveito.
c) Consensual: aperfeiçoa-se com o acordo de vontades.
d) Comutativo: as partes já sabem quais são as prestações.
e) Não solene: não é necessária escritura pública.
f) Informal: a forma é livre (não é necessária forma escrita, como regra geral).
g) De trato sucessivo: o cumprimento se protrai no tempo na maioria das hipóteses
fáticas.

3- ELEMENTOS ESSENCIAIS
a) Objeto: pode ser coisa móvel ou imóvel. O bem móvel deve ser INFUNGÍVEL,
uma vez que, se for fungível temos um contrato de mútuo. Admite-se, no entanto
a locação de coisa móvel fungível quando o seu uso tenha sido cedido para
ornamentação (ad pompam vel ostentationem).

b) Preço: denominado aluguel ou remuneração, é essencial para sua configuração,


pois haverá comodato e não locação, se o uso e gozo da coisa forem cedidos a
título gratuito. Será fixado pelas partes, ou mediante arbitramento, ou ainda fixado
por lei. O pagamento, em regra, é feito em dinheiro, mas nada impede que se faça
de outra forma.

c) Consentimento: o consentimento poderá ser expresso ou tácito. É capaz de locar


quem tem poderes de administração.

Obs.: Não se exige que seja o proprietário do bem para locar.

4- OBRIGAÇÕES DO LOCADOR
São as especificadas no art. 566 CC:
Art. 566. O locador é obrigado:

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I - a entregar ao locatário a coisa alugada, com suas pertenças, em


estado de servir ao uso a que se destina, e a mantê-la nesse estado,
pelo tempo do contrato, salvo cláusula expressa em contrário;
II - a garantir-lhe, durante o tempo do contrato, o uso pacífico da
coisa.

5- OBRIGAÇÕES DO LOCATÁRIO
Previstas no art. 569 CC.
Art. 569. O locatário é obrigado:
I - a servir-se da coisa alugada para os usos convencionados ou
presumidos, conforme a natureza dela e as circunstâncias, bem como
tratá-la com o mesmo cuidado como se sua fosse;
II - a pagar pontualmente o aluguel nos prazos ajustados, e, em falta de
ajuste, segundo o costume do lugar;
III - a levar ao conhecimento do locador as turbações de terceiros, que
se pretendam fundadas em direito;
IV - a restituir a coisa, finda a locação, no estado em que a recebeu,
salvas as deteriorações naturais ao uso regular.

6- DISPOSIÇÕES COMPLEMENTARES

Art. 567. Se, durante a locação, se deteriorar a coisa alugada, sem


culpa do locatário, a este caberá pedir redução proporcional do
aluguel, ou resolver o contrato, caso já não sirva a coisa para o fim a
que se destinava.

Art. 568. O locador resguardará o locatário dos embaraços e turbações


de terceiros, que tenham ou pretendam ter direitos sobre a coisa
alugada, e responderá pelos seus vícios, ou defeitos, anteriores à
locação.

Art. 570. Se o locatário empregar a coisa em uso diverso do ajustado,


ou do a que se destina, ou se ela se danificar por abuso do locatário,
poderá o locador, além de rescindir o contrato, exigir perdas e danos.

Art. 571. Havendo prazo estipulado à duração do contrato, antes do


vencimento não poderá o locador reaver a coisa alugada, senão
ressarcindo ao locatário as perdas e danos resultantes, nem o locatário
devolvê-la ao locador, senão pagando, proporcionalmente, a multa
prevista no contrato.
Parágrafo único. O locatário gozará do direito de retenção,
enquanto não for ressarcido.

Art. 572. Se a obrigação de pagar o aluguel pelo tempo que faltar


constituir indenização excessiva, será facultado ao juiz fixá-la em bases
razoáveis.

Art. 573. A locação por tempo determinado cessa de pleno direito


findo o prazo estipulado, independentemente de notificação ou aviso.

Art. 574. Se, findo o prazo, o locatário continuar na posse da coisa


alugada, sem oposição do locador, presumir-se-á prorrogada a locação
pelo mesmo aluguel, mas SEM prazo determinado.

Art. 575. Se, notificado o locatário, não restituir a coisa, pagará,


enquanto a tiver em seu poder, o aluguel que o locador arbitrar, e

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responderá pelo dano que ela venha a sofrer, embora proveniente de


caso fortuito.
Parágrafo único. Se o aluguel arbitrado for manifestamente excessivo,
poderá o juiz reduzi-lo, mas tendo sempre em conta o seu caráter de
penalidade.

Art. 577. Morrendo o locador ou o locatário, transfere-se aos seus


herdeiros a locação por tempo determinado.

Art. 578. Salvo disposição em contrário, o locatário goza do direito


de retenção, no caso de benfeitorias necessárias, ou no de
benfeitorias úteis, se estas houverem sido feitas com expresso
consentimento do locador.

7- LOCAÇÃO DE PRÉDIOS
O CC 2002 trata da locação de bens móveis e imóveis. Em relação aos últimos,
a atual codificação rege as locações imobiliárias que não estão sujeitas à Lei 8.245/91
(Lei de Locações). Esta lei trata da locação de imóveis urbanos, levando em conta a
destinação do imóvel. Em sendo assim, se o imóvel for destinado para a residência,
indústria, comércio ou prestação de serviços, será regido pela lei especial. O art. 1º,
parágrafo único, da Lei de Locações proclama continuarem regidos pelo CC as locações
de imóveis de propriedade da União, Estados e Municípios, das vagas de garagem
autônomas, de espaço destinado a publicidade, de apart-hoteis, hotéis residências ou
equiparados, e o arrendamento mercantil. As normas do CC têm aplicação restrita a
estes imóveis.

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CAPÍTULO VI
DO EMPRÉSTIMO
SEÇÃO I
DO COMODATO

1- CONCEITO
O contrato de empréstimo pode ser conceituado como sendo o negócio jurídico
pelo qual uma pessoa entrega uma coisa a outra, de forma gratuita, obrigando-se esta a
devolver a coisa emprestada ou outra de mesma espécie e quantidade. O negócio em
análise é exemplo claro de contrato unilateral e gratuito, abrangendo duas espécies: o
comodato e o mútuo. O comodato é, portanto, espécie do gênero empréstimo.
Comodato é o empréstimo gratuito de coisas NÃO fungíveis. Perfaz-se com a
tradição do objeto (contrato real). O fato de o comodato se aperfeiçoar com a entrega
da coisa emprestada desloca a tradição do plano da eficácia – terceiro degrau da Escada
Ponteana – para o plano da validade – segundo degrau. O comodato é, dessa forma, o
empréstimo para uso (enquanto o mútuo é empréstimo para consumo).

Art. 579. O comodato é o empréstimo gratuito de coisas NÃO


fungíveis. Perfaz-se com a TRADIÇÃO do objeto. (contrato
REAL)

2- CARACTERÍSTICAS
Três são suas características essenciais:

a) A gratuidade: decorre de sua própria natureza, pois se confundiria com a locação se


fosse oneroso.

Obs.: Não desnatura o comodato o fato de o comodatário de um apartamento


responsabilizar-se pelo pagamento das despesas condominiais e dos impostos.

b) A infungibilidade: o comodato implica a restituição da mesma coisa recebida em


empréstimo. Se a coisa for fungível ou consumível, haverá mútuo. A coisa pode ser
móvel ou imóvel.

Obs.: Bens de ornamentação, embora fungíveis, permitem o comodato.

c) Tradição: a necessidade da tradição para o aperfeiçoamento o torna um


CONTRATO REAL. Desdobra-se a posse, de modo que o comodatário passa a ter a
posse direta e o comodante a posse indireta.

Obs.: Tanto o possuidor direto como o indireto tem direito à proteção possessória contra
terceiros, e, também, um contra o outro.

O comodato é também, contrato unilateral, benéfico, temporário e NÃO


SOLENE.

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É unilateral porque, aperfeiçoando-se com a tradição, gera obrigações apenas


para o comodatário.

O comodato é apontado como negócio temporário, fixado com prazo determinado


ou indeterminado. Se o contrato não tiver prazo convencional (prazo indeterminado), será
presumido para o uso concedido, ou seja, sendo por tempo indeterminado, presume-se
por tempo necessário à utilização da coisa para o fim a que destinava. Nessa hipótese, não
pode o comodante, salvo necessidade imprevista e urgente reconhecida pelo juiz,
suspender o uso e gozo da coisa emprestada (regra que também vale para o contrato
celebrado com prazo determinado).

Art. 581. Se o comodato NÃO tiver prazo convencional, presumir-se-


lhe-á o necessário para o uso concedido; não podendo o comodante,
salvo necessidade imprevista e urgente, reconhecida pelo juiz,
suspender o uso e gozo da coisa emprestada, antes de findo o prazo
convencional, ou o que se determine pelo uso outorgado.

É contrato NÃO SOLENE E INFORMAL. A lei não exige forma para sua
validade, podendo ser feito até verbalmente.

EXCEÇÃO: (art. 580 do CC) – comodato de bens pertencentes a pessoas que estão sob
tutela ou curatela depende de autorização especial do juiz.

A parte que empresta a coisa é denominada comodante, enquanto a que recebe é


o comodatário. Flávio Tartuce afirma se tratar de contrato intuitu personae, baseado na
fidúcia, na confiança do comodante em relação ao comodatário.

IMPORTANTE!!! O comodante não precisa ser o dono do bem para fazer comodato,
bastando, para tanto, ter o uso e o gozo do bem (Ex.: Usufrutuário, enfiteuta).

3- OBRIGAÇÕES DO COMODATÁRIO
a) Conservar a coisa como se fosse sua

- Não pode o comodatário firmar sub comodato.


- Responde pelas benfeitorias necessárias, com direito de ser ressarcido
(art. 584 do CC).
- Responde pelas benfeitorias úteis, sem direito de ressarcimento.
- Na hipótese de catástrofe, o comodatário deve, antes de salvar as coisas
suas, salvar as coisas do comodante.

b) Usar a coisa de forma adequada

- Uso adequado da coisa (art. 582 do CC):

Art. 582. O comodatário é obrigado a conservar, como se sua própria


fora, a coisa emprestada, não podendo usá-la senão de acordo com o
contrato ou a natureza dela, sob pena de responder por perdas e danos.

c) Dever de restituir a coisa ao fim do contrato

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

- Se não restituir, caracteriza-se o esbulho (admitida ação de reintegração


de posse - STF).
- A partir do momento em que se constitui em mora, o comodatário deve
pagar aluguel, sem prejuízo das perdas e danos.
Art. 582. 2ª parte. O comodatário constituído em mora, além de por
ela responder, pagará, até restituí-la, o aluguel da coisa que for
arbitrado pelo comodante.

IMPORTANTE: Havendo pluralidade de comodatários haverá responsabilidade


solidária entre eles (art. 585 do CC). A hipótese é de responsabilidade passiva de origem
legal, no que se refere ao conteúdo do contrato. Anote-se que se a coisa se perder por
culpa de um dos devedores, todos responderão pelo seu valor, mas pelas perdas e danos
somente responde o comodatário culpado (art. 279 do CC).

IMPORTANTE: Se o comodatário se negar a restituir o bem emprestado, ele ficará


obrigado ao pagamento de um “aluguel-pena”, arbitrado unilateralmente pelo
comodante. O valor arbitrado pelo comodante não precisa ser igual à média do mercado
locativo. Segundo o STJ, o valor do aluguel-pena pode ser até o dobro do valor do
mercado. STJ. 3ª Turma. REsp 1175848-PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino.
Julgado em 18/9/2012.

4- OBRIGAÇÕES DO COMODANTE
a) Aguardar o término do contrato para ter a coisa de volta.

b) Não embaraçar o uso da coisa.

Obs.: Excepcionalmente se impõe a obrigação de indenizar despesas extraordinárias


(STJ).

5- EXTINÇÃO DO COMODATO
a) Pelo advento do termo convencionado ou pela utilização da coisa de acordo com
a finalidade para que foi emprestada.
b) Pela resolução, em caso de descumprimento pelo comodatário de suas
obrigações.
c) Por sentença, a pedido do comodante, provada a necessidade imprevista e
urgente.
d) Pela morte do comodatário, apenas se o comodato foi celebrado intuito personae.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

SEÇÃO II
DO MÚTUO

1- CONCEITO
O mútuo é o empréstimo de COISAS FUNGÍVEIS, pela qual o mutuário
obriga-se a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero,
qualidade e quantidade. É empréstimo para consumo. Trata-se, em regra, de contrato
unilateral e gratuito, exceção feita para o mútuo oneroso. O exemplo típico envolve o
empréstimo de dinheiro, uma vez que o mútuo somente terá como objeto bens móveis,
pois somente esses podem ser fungíveis (art. 85 do CC).
Art. 586. O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis. O mutuário é
obrigado a restituir ao mutuante o que dele recebeu em coisa do mesmo
gênero, qualidade e quantidade.

Pelo mútuo, o mutuante TRANSFERE O DOMÍNIO da coisa emprestada ao


mutuário. Logo, como a coisa é transferida a outrem e consumida, sendo devolvida outra
de mesmo gênero, qualidade e quantidade, o contrato é translativo da propriedade.

Por conta deste, que se torna proprietário, correm todos os riscos dela desde a
tradição.
Art. 587. Este empréstimo TRANSFERE O DOMÍNIO da coisa
emprestada ao mutuário, por cuja conta correm todos os riscos dela
desde a tradição.

É empréstimo para consumo, pois o mutuário não é obrigado a devolver o


mesmo bem, do qual se torna dono, mas sim coisa da mesma espécie.

2- DIFERENÇAS ENTRE MÚTUO E COMODATO


a) Mútuo é empréstimo para consumo, enquanto o comodato é para uso.
b) Tem por objeto coisas fungíveis, enquanto o comodato coisas infungíveis.
c) O mutuário desobriga-se restituindo coisa da mesma espécie, qualidade e
quantidade, mas o comodatário só se exonera restituindo a própria coisa
emprestada.
d) Acarreta a transferência do domínio, o que não ocorre no comodato.
e) Permite a alienação da coisa emprestada, ao passo que ao comodatário é proibido
transferir a coisa a terceiro.

3- CARACTERÍSTICAS
a) Contrato REAL: aperfeiçoa-se com a entrega da coisa emprestada.
b) É tratado pelo Código Civil como CONTRATO GRATUITO, embora
empréstimo de dinheiro seja em regra oneroso, com estipulação de juros, sendo
por isso denominado mútuo feneratício.
c) É contrato unilateral, porque, entregue a coisa, quando se aperfeiçoa, as
obrigações recaem somente sobre o mutuário.
d) É contrato NÃO SOLENE E INFORMAL (de forma livre).

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

e) É contrato temporário, pois será doação se for perpétuo.

4- DISPOSIÇÕES COMPLEMENTARES

Como o mútuo transfere o domínio da coisa, o mutuante deve ser proprietário


(diferente do comodato) daquilo que empresta e ter capacidade para dispor da coisa.

De acordo com o art. 588 do CC, o mútuo feito a pessoa menor, sem prévia
autorização daquele sob cuja guarda estiver, não pode ser reavido nem do mutuário, nem
de seus fiadores. Trata-se, portanto, de caso de ineficácia do negócio, pois a obrigação é
natural ou incompleta: a dívida existe, mas não há a correspondente responsabilidade
(“Schuld sem Haftung”).

O art. 589 do CC prescreve as exceções ao disposto no art. 588 do CC.

Art. 589. Cessa a disposição do artigo antecedente:


I - se a pessoa, de cuja autorização necessitava o mutuário para contrair
o empréstimo, o ratificar posteriormente;
II - se o menor, estando ausente essa pessoa, se viu obrigado a contrair
o empréstimo para os seus alimentos habituais;
III - se o menor tiver bens ganhos com o seu trabalho. Mas, em tal caso,
a execução do credor não lhes poderá ultrapassar as forças;
IV - se o empréstimo reverteu em benefício do menor;
V - se o menor obteve o empréstimo maliciosamente.

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CAPÍTULO IX
DO DEPÓSITO

1- CONCEITO
É o contrato pelo qual um dos contratantes (depositário) recebe um objeto móvel
e corpóreo, para guardar, até que o depositante o reclame. A sua principal finalidade é a
GUARDA da coisa alheia. De acordo com a manifestação de vontade, o depósito pode
ser classificado em voluntário ou necessário (ou obrigatório), subdividindo-se este último
em legal e miserável.

Art. 627. Pelo contrato de depósito recebe o depositário um objeto


móvel, para guardar, até que o depositante o reclame.

2- CARACTERÍSTICAS
a) É CONTRATO REAL (exige a tradição).
b) Temporário.
c) Gratuito, exceto se houver convenção em contrário; se resultante de atividade
negocial; ou se o depositário o praticar por profissão.
Art. 628. O contrato de depósito é gratuito, exceto se houver
convenção em contrário, se resultante de atividade negocial ou se o
depositário o praticar por profissão.
Parágrafo único. Se o depósito for oneroso e a retribuição do
depositário não constar de lei, nem resultar de ajuste, será determinada
pelos usos do lugar, e, na falta destes, por arbitramento.

d) Unilateral (aperfeiçoa-se com a entrega da coisa, após a qual restarão obrigações


só para o depositário). Quando assalariado, ou seja, quando praticado por
atividade ou profissão do depositário, é bilateral.
e) Gera a obrigação de restituir.
f) O objeto deve ser coisa MÓVEL corpórea.

IMPORTANTE!!! No comodato, o comodatário recebe a coisa para seu uso,


enquanto no depósito a recebe para guardá-la. Para usá-la necessita de expressa
permissão do depositante.
Art. 640. Sob pena de responder por perdas e danos, não poderá o
depositário, sem licença expressa do depositante, servir-se da coisa
depositada, nem a dar em depósito a outrem.
Parágrafo único. Se o depositário, devidamente autorizado, confiar a
coisa em depósito a terceiro, será responsável se agiu com culpa na
escolha deste.

3- ESPÉCIES
a) Voluntário: resulta do acordo de vontades.

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b) Necessário: é o que independe da vontade das partes, por resultar de fatos


imprevistos e irremovíveis. Divide-se em depósito legal, miserável e dos
hospedeiros.

O depósito legal se faz em desempenho de obrigação legal.


Art. 647. É depósito necessário:
I - o que se faz em desempenho de obrigação legal;

O depósito miserável é o que se efetua por ocasião de alguma calamidade pública.

Art. 647. É depósito necessário:


II - o que se efetua por ocasião de alguma calamidade, como o incêndio,
a inundação, o naufrágio ou o saque.

O depósito dos hospedeiros é o depósito de bagagem dos hóspedes que a lei


equipara ao depósito legal.
Art. 649. Aos depósitos previstos no artigo antecedente é equiparado
o das bagagens dos viajantes ou hóspedes nas hospedarias onde
estiverem.
Parágrafo único. Os hospedeiros responderão como depositários,
assim como pelos furtos e roubos que perpetrarem as pessoas
empregadas ou admitidas nos seus estabelecimentos.

c) Regular: é o que recai sobre coisa infungível, que deve ser restituída.

d) Irregular: envolve bens fungíveis, como o dinheiro, obrigando-se o depositário


a restituir coisa do mesmo gênero, qualidade e quantidade.

e) Judicial: é o que se verifica por ordem judicial, com o intuito de preservar a


incolumidade de coisa litigiosa, até que se decida a causa.
Art. 635. Ao depositário será facultado, outrossim, requerer depósito
judicial da coisa, quando, por motivo plausível, não a possa guardar, e
o depositante não queira recebê-la.

4- OBRIGAÇÕES DO DEPOSITÁRIO
a) Guardar e conservar a coisa depositada com o cuidado e diligência que costuma
ter com o que lhe pertence.
Art. 629. O depositário é obrigado a ter na guarda e conservação da
coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe
pertence, bem como a restituí-la, com todos os frutos e acrescidos,
quando o exija o depositante.

b) Restituir a coisa, com seus frutos e acrescidos, quando o exija o depositante, ainda
que o contrato fixe prazo para restituição.

Obs.: Não estará obrigado a fazê-lo se tiver direito de retenção pelo valor das despesas e
prejuízos advindos do depósito.
Art. 644. O depositário poderá reter o depósito até que se lhe pague a
retribuição devida, o líquido valor das despesas, ou dos prejuízos a que

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

se refere o artigo anterior, provando imediatamente esses prejuízos ou


essas despesas.
Parágrafo único. Se essas dívidas, despesas ou prejuízos não forem
provados suficientemente, ou forem ilíquidos, o depositário poderá
exigir caução idônea do depositante ou, na falta desta, a remoção da
coisa para o Depósito Público, até que se liquidem.

5- PRISÃO DO DEPOSITÁRIO INFIEL


A CF proíbe a prisão por dívida civil, mas ressalva a do devedor de pensão
alimentícia e a do depositário infiel (art. 5º LXVII). Por sua vez, o art. 652 CC sujeita a
prisão do último a não ultrapassar um ano. Todavia, o STF pôs fim à prisão civil do
depositário infiel, tanto nas hipóteses de contrato como nas de depósito e de
alienação fiduciária.

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CAPÍTULO X
DO MANDATO

1- CONCEITO
Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para em seu
nome, praticar atos ou administrar interesses. Trata-se de negócio jurídico de
representação.

Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem


poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A
procuração é o instrumento do mandato.

2- PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS

É a ideia de representação que o distingue da locação de serviços e da comissão


mercantil. Por essa razão, os atos do mandatário vinculam o mandante, se dentro dos
poderes outorgados.

Art. 679. Ainda que o mandatário contrarie as instruções do


mandante, se não exceder os limites do mandato, ficará o
mandante obrigado para com aqueles com quem o seu procurador
contratou; mas terá contra este ação pelas perdas e danos
resultantes da inobservância das instruções.

Os atos praticados além do contrato de mandato só vinculam o mandante se


posteriormente por ele ratificados.
Art. 665. O mandatário que exceder os poderes do mandato, ou
proceder contra eles, será considerado mero gestor de negócios,
enquanto o mandante lhe não ratificar os atos.

3- ESPÉCIES DE REPRESENTANTES
a) legais (pais, tutores e curadores)
b) judiciais (nomeados pelo juiz)
c) convencionais (recebem procuração para agir em nome do mandante)

4- NATUREZA JURÍDICA
a) é contrato, porque depende de aceitação, que pode ser expressa ou tácita (pelo começo
de execução).

Art. 659. A aceitação do mandato pode ser tácita, e resulta do começo


de execução.

b) é consensual (aperfeiçoa-se com o consenso).

c) personalíssimo ou intuito personae (baseia-se na confiança).

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

d) é NÃO SOLENE e INFORMAL, por dispensar, como regra, escritura pública, e ser
admitido o mandato tácito e o verbal.
Art. 656. O mandato pode ser EXPRESSO ou TÁCITO, VERBAL
ou ESCRITO.

e) em regra GRATUITO, exceto quando outorgado a quem exerce a profissão de


mandatário, quando se presume oneroso.
Art. 658. O mandato presume-se gratuito quando não houver sido
estipulada retribuição, exceto se o seu objeto corresponder ao daqueles
que o mandatário trata por ofício ou profissão lucrativa.

f) em regra unilateral, porque gera obrigações somente para o mandatário, podendo se


classificar como bilateral imperfeito (pode gerar obrigação de pagar perdas e danos
sofridos pelo mandatário e pode assumir feição onerosa, quando praticado por ofício ou
profissão lucrativa, hipótese em que assumirá a feição de bilateralidade). Toda vez que se
convenciona a remuneração, passa a ser contrato bilateral e oneroso.

5- PESSOAS QUE PODEM RECEBER MANDATO


Sendo um contrato, o mandato reclama consentimento das partes, exigindo
capacidade do mandante e do mandatário.

Toda pessoa capaz é apta para outorgar o mandato mediante instrumento


particular (procuração).
Art. 654. Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração
mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a
assinatura do outorgante.
§ 1o O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi
passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o
objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes
conferidos.
§ 2o O terceiro com quem o mandatário tratar poderá exigir que a
procuração traga a firma reconhecida.

Os menores púberes (maiores de 16 anos) assistidos firmam procuração junto com


seus assistentes, por instrumento público se for ad negotia. A ad judicia pode ser
outorgada por instrumento particular (art. 105 do CPC/15).

IMPORTANTE!!! O maior de 16 anos e menor de 18 anos não emancipado PODE


SER MANDATÁRIO, mas o mandante não tem ação contra ele, senão de
conformidade com as regras gerais, aplicáveis às obrigações contraídas por menores (art.
666 do CC).

6- REQUISITOS DA PROCURAÇÃO
Encontram-se no §1º do art. 654 do CC:

Art. 654.
§ 1o O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde
foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes


conferidos.

IMPORTANTE: Em regra, o mandato só confere poderes que o mandatário administre


os bens do mandante: art. 661. O mandato em termos gerais só confere poderes de
administração. Para que o mandatário possa dispor, alienar ou gravar o patrimônio do
mandante, exige-se a confecção de instrumento de procuração com poderes expressos e
especiais. É o que prevê o § 1º do art. 661: “Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar
outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de
poderes especiais e expressos.” A outorga de poderes de alienação de “quaisquer imóveis
em todo o território nacional” não supre o requisito de especialidade exigido pelo art. 661,
§ 1º do CC, que exige referência e determinação dos bens concretamente mencionados na
procuração. STJ. 3ª Turma. REsp 1814643-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em
22/10/2019 (Info 660).

A outorga do mandato está sujeita à forma exigida por lei para o ato ser praticado.
Assim, a procuração outorgada para a venda de imóvel cujo valor supere o montante
correspondente a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país (art. 108 do CC)
deve observar a forma pública.

Art. 657. A outorga do mandato está sujeita à forma exigida por lei
para o ato a ser praticado. Não se admite mandato verbal quando o
ato deva ser celebrado por escrito.

Lembrar!!! Pode existir contrato de mandato verbal. Mandato é contrato informal.

IMPORTANTE!!! O substabelecimento PODE ser feito por instrumento particular,


ainda que a procuração tenha sido outorgada por instrumento público.
Art. 655. Ainda quando se outorgue mandato por instrumento
público, pode substabelecer-se mediante instrumento particular.

7- ESPÉCIES
a) expresso ou tácito (a aceitação do encargo decorre da prática de atos que a presumem,
a exemplo do início da execução do ato), VERBAL ou escrito.
b) gratuito ou remunerado.
c) ad negotia (conferida para a prática de administração de negócios em geral) e ad
judicia (a outorgada para o foro, autorizando o procurado a propor ações e praticar atos
judiciais em geral).
d) em termos gerais (só confere poderes para a prática de atos de administração) e com
poderes especiais (os que ultrapassam a administração ordinária, como hipotecar,
transigir etc.).
e) conjunto (os poderes são outorgados aos mandatários para que estes atuem de forma
conjunta), solidário (os mandatários nomeados podem agir de forma isolada,
independentemente da ordem de nomeação, cada um atuando como se fosse um único
mandatário), sucessivo (um mandatário só poderá agir na falta do outro, sendo designado
de acordo com a ordem prevista no contrato) e fracionário (a ação de cada mandatário
está delimitada no instrumento, devendo cada qual agir em seu setor).
Art. 672. Sendo dois ou mais os mandatários nomeados no mesmo
instrumento, qualquer deles poderá exercer os poderes outorgados, se

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

não forem expressamente declarados conjuntos, nem especificamente


designados para atos diferentes, ou subordinados a atos sucessivos. Se
os mandatários forem declarados conjuntos, não terá eficácia o ato
praticado sem interferência de todos, salvo havendo ratificação,
que retroagirá à data do ato.

f) especial a um ou mais atos determinados ou geral a todos do mandante.


Art. 660. O mandato pode ser especial a um ou mais negócios
determinadamente, ou geral a todos os do mandante.

8- OBRIGAÇÕES DO MANDATÁRIO

a) Agir em nome do mandante, dentro dos poderes conferidos na procuração.

Art. 665. O mandatário que exceder os poderes do mandato, ou


proceder contra eles, será considerado mero gestor de negócios,
enquanto o mandante lhe não ratificar os atos.

b) Aplicar toda sua diligência habitual na execução do contrato e indenizar qualquer


prejuízo causado por culpa sua.

c) Prestar contas de sua gerência ao mandante, transferindo-lhe as vantagens provenientes


do mandato.
Art. 668. O mandatário é obrigado a dar contas de sua gerência ao
mandante, transferindo-lhe as vantagens provenientes do mandato, por
qualquer título que seja.

d) Apresentar o instrumento do mandato às pessoas com quem tratar em nome do


mandante.

e) Concluir o negócio já começado, embora ciente da morte, interdição ou mudança de


estado do mandante, se houver perigo na demora.
Art. 674. Embora ciente da morte, interdição ou mudança de estado do
mandante, deve o mandatário concluir o negócio já começado, se
houver perigo na demora.

IMPORTANTE: O advogado substabelecente somente irá responder por ato ilícito


cometido pelo advogado substabelecido se ficar evidenciado que, no momento da
escolha, a despeito de possuir inequívoca ciência acerca da inidoneidade do aludido
causídico, ainda assim o elegeu para o desempenho do mandato. STJ. 3ª Turma. REsp
1742246-ES, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 19/03/2019 (Info 644).

IMPORTANTE: Reconhecido o abuso de mandato por desacerto contratual, em razão


de o advogado ter repassado valores a menor para seu mandatário, o marco inicial dos
juros moratórios é a data da citação. O termo inicial dos juros moratórios deve ser
determinado a partir da natureza da relação jurídica mantida entre as partes. No caso,
tratando-se de mandato, a relação jurídica tem natureza contratual, sendo o termo inicial
dos juros moratórios a data da citação (art. 405 do CC). STJ. 3ª Turma. REsp 1403005-
MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 6/4/2017 (Info 602).

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9- OBRIGAÇÕES DO MANDANTE

a) Satisfazer as obrigações assumidas pelo mandatário dentro dos poderes conferidos no


mandato.
Art. 675. O mandante é obrigado a satisfazer todas as obrigações
contraídas pelo mandatário, na conformidade do mandato conferido,
e adiantar a importância das despesas necessárias à execução dele,
quando o mandatário lhe pedir.

b) Reembolsar as despesas efetuadas pelo mandatário.


c) Pagar-lhe a remuneração ajustada.
d) Indenizá-lo dos prejuízos experimentados na execução do mandato.
10- EXTINÇÃO DO MANDATO

a) Pela revogação (pelo mandante) ou renúncia (pelo mandatário).


b) Pela morte ou interdição de uma das partes (por se tratar de contrato
personalíssimo). Não se admite mandato para ter execução depois da morte do mandante,
a não ser por meio de testamento. Prevê o art. 689 do CC:
Art. 689. São válidos, a respeito dos contratantes de boa-fé, os atos
com estes ajustados em nome do mandante pelo mandatário, enquanto
este ignorar a morte daquele ou a extinção do mandato, por
qualquer outra causa.

c) Pela mudança de estado. Ex.: Pai que representa filho absolutamente incapaz, quando
este se torna relativamente incapaz, devendo a outorga agora ser feita pelo filho.
d) Pelo término do prazo ou pela conclusão do negócio. Quando a procuração é dada
com data certa de vigência ou para um negócio determinado.

11- IRREVOGABILIDADE DO MANDATO

a) Quando contiver cláusula de irrevogabilidade.


b) Quando a cláusula de irrevogabilidade for condição de um negócio bilateral, ou tiver
sido estipulada no exclusivo interesse do mandatário.
c) Quando conferido com a cláusula “em causa própria” (o mandante outorga poderes
para que o mandatário atue em seu próprio nome). O mandato em “causa própria” é
irrevogável.
d) Quando contenha poderes de cumprimento ou confirmação de negócios encetados
(aqueles já celebrados e efetivados pelo mandatário), aos quais se ache vinculado.

IMPORTANTE: Não é possível a estipulação de multa no contrato de honorários para


as hipóteses de renúncia ou revogação unilateral do mandato do advogado,
independentemente de motivação, respeitado o direito de recebimento dos honorários
proporcionais ao serviço prestado. É direito do advogado renunciar ou da parte
revogar o mandato a qualquer momento e sem necessidade de declinar as razões.
Isso porque a relação entre advogado e cliente é pautada pela confiança, fidúcia,
sendo um contrato personalíssimo (intuitu personae). Apesar de o advogado não poder
exigir multa pelo fato de o contratante ter revogado o mandato, ele poderá cobrar o valor
dos honorários advocatícios na proporção dos serviços que já foram prestados. Cláusula
penal em contratos advocatícios: • é lícita para situações de mora e/ou inadimplemento
(ex.: multa pelo atraso no pagamento dos honorários). • não é permitida para as hipóteses

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

de renúncia ou revogação do mandato (ex.: multa pelo fato de o cliente ter decidido
revogar o mandato e constituir outro advogado). STJ. 4ª Turma. REsp 1346171-PR, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/10/2016 (Info 593).

IMPORTANTE: É inválida a doação realizada por meio de procurador se o instrumento


procuratório concedido pelo proprietário do bem não mencionar o donatário, sendo
insuficiente a declaração de poderes gerais na procuração. STJ. 4ª Turma. REsp 1575048-
SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 23/2/2016 (Info 577).

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CAPÍTULO VIII
DA EMPREITADA

1- CARACTERÍSTICAS
A grande diferença entre o contrato de empreitada e o contrato de prestação de
serviços é que a empreitada é contrato de prestação de serviços em que se ajusta a
obrigação de fazer ou mandar fazer obra específica, mediante determinada
remuneração. Ou seja, o empreiteiro assume a obrigação de realização de obra
específica. A empreitada, diferentemente da prestação de serviços, não autoriza a
fiscalização e direção do serviço pelo dono da obra. O dono da obra não pode fiscalizar
e dirigir os serviços, já que ele contratou um resultado pronto. O empreiteiro assume o
resultado. Por isso, a fiscalização cabe ao próprio empreiteiro. E os riscos vão correr por
conta do empreiteiro.

A empreitada é contrato bilateral (gera obrigações para ambas as partes),


consensual (aperfeiçoa-se com o acordo de vontades, independe da tradição),
comutativo (cada parte vê de antemão os ônus e vantagens do contrato), oneroso e
informal.

2- ESPÉCIES
Existem, segundo Flácio Tartuce, três tipos de empreitada no direito brasileiro,
retiradas do art. 610 do CC:

• Empreitada sob administração: É aquela em que o empreiteiro apenas


administra as pessoas contratadas pelo dono da obra, que também fornece
os materiais.

• Empreitada de Lavor ou Empreitada de Mão de Obra: É aquela em que


o empreiteiro fornece a mão de obra, contratando as pessoas que irão
executar a obra. Os materiais, contudo, são fornecidos pelo dono da obra.

• Empreitada Mista ou de Lavor e Materiais: É aquela em que o


empreiteiro fornece tanto a mão de obra quanto os materiais,
comprometendo-se a executar a obra inteira. Nesse caso, o empreiteiro
assume obrigação de resultado perante o dono da obra. A obrigação de
fornecer materiais não pode ser presumida (art. 610, §1º, do CC),
resultando da lei ou da vontade das partes.

Essa diferenciação é relevante no que toca aos riscos do contrato. Dispõem os arts.
611, 612 e 613 do CC:

Art. 611. Quando o empreiteiro fornece os materiais (empreitada


mista) correm por sua conta os riscos até o momento da entrega da obra,
a contento de quem a encomendou, se este não estiver em mora de
receber. Mas se estiver, por sua conta correrão os riscos.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Art. 612. Se o empreiteiro só forneceu mão-de-obra, todos os riscos em


que não tiver culpa correrão por conta do dono (empreitada de lavor).

Art. 613. Sendo a empreitada unicamente de lavor (art. 610), se a


coisa perecer antes de entregue, sem mora do dono nem culpa do
empreiteiro, este perderá a retribuição, se não provar que a perda
resultou de defeito dos materiais e que em tempo reclamara contra
a sua quantidade ou qualidade.

IMPORTANTE!!! Não se pode confundir o contrato de empreitada com o de elaboração


de um simples projeto de obra, assumido por um engenheiro ou arquiteto. Dessa forma,
dispõe o art. 610, §2º, do CC que o contrato para elaboração de um projeto não implica a
obrigação de executá-lo, ou de lhe fiscalizar a execução. Na prática, portanto, a pessoa
que elabora o projeto não é a mesma que desenvolve ou “toca a obra”, em regra. Isso
reforça a tese de que a própria empreitada não pode ser presumida. Nas hipóteses em que
um profissional executa esse projeto, haverá uma prestação de serviço, que pode ou não
ser caracterizada como relação de consumo ou relação de emprego.

3- RESPONSABILIDADE CIVIL
Essa diferenciação também é importante para fins de responsabilidade civil. Se
a empreitada é de lavor, o empreiteiro assume a responsabilidade apenas de realizar o
serviço com o material que lhe foi entregue e terá direito à remuneração.

O empreiteiro tem direito de retenção se não houver o pagamento. Pode o


empreiteiro, portanto, reter a entrega da obra até que lhe seja pago. Se a empreitada é de
lavor, sua responsabilidade é reduzida, mas, em se tratando de empreitada mista,
amplia-se a responsabilidade porque responde o empreiteiro pelo trabalho e pelo
material.
Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras
construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução
responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez
e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do
solo.

O dispositivo trata do empreiteiro misto (empreitada de lavor e mão de obra).


O prazo irredutível de cinco anos é o prazo de garantia. Pode ser maior. Só não pode
ser menor. O Código Civil está afirmando que o empreiteiro misto (aquele de lavor e
material) responde pelo prazo mínimo de cinco anos (prazo de garantia) pela solidez e
segurança do trabalho. O STJ vem entendendo que segurança e solidez é um conceito
amplo, lato.

Parágrafo único. Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da


obra que não propuser a ação (redibitória ou estimatória) contra o
empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao aparecimento do
vício ou defeito.

Este é um prazo de decadência. O dispositivo aduz que, durante o prazo mínimo


de cinco anos, que é o prazo de garantia, o empreiteiro responde pela segurança e solidez
da obra em sentido amplo (envolve, por exemplo, um vazamento intermitente). Surgindo
o defeito dentro do prazo de cinco anos, o dono da obra dispõe de 180 dias, contados

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

da data do conhecimento para promover a ação (ação redibitória para devolver o bem
ou estimatória, para obter abatimento do preço).

#Mas, se o defeito apareceu depois de 5 anos e compromete a SEGURANÇA OU


SOLIDEZ, a exemplo do Palace II, que ruiu, significa que os proprietários
suportarão os prejuízos? Não. Nesse caso, em sendo revelado o defeito depois de
cinco anos, o dono da obra vai dispor de um prazo de dez anos, se o contrato for civil
ou cinco anos se o contrato for de consumo (há acórdãos sustentando a incidência
do prazo decenal, uma vez que o CDC não pode prejudicar o consumidor), prazo
prescricional para cobrar a reparação do dano. Ou seja, para que o dono da obra
pleiteie perdas e danos em decorrência de alguma conduta lesiva provocada pelo
empreiteiro, deve ser aplicado o art. 205 do CC (prazo prescricional de 10 anos), diante
da natureza contratual da relação jurídica; ou mesmo o art. 27 do CDC (prazo
prescricional de 5 anos), havendo relação jurídica de consumo. Se o defeito apareceu
dentro dos cinco anos de garantia, pode o contratante desfazer o negócio. Mas se o defeito
apareceu depois de cinco anos, aplica-se o prazo prescricional comum.

Mas e se dentro do prazo de cinco anos aparecer o defeito, mas a parte não quer
desfazer o negócio? Terá a parte, nesse caso, o prazo de cinco ou dez anos, conforme o
caso, para promover a ação indenizatória, a ação de reparação de dano. Observe que os
180 dias é somente para o desfazimento do negócio. Então, são 180 dias dentro de cinco
anos para resolução (redibição) do negócio. Se não quer desfazer o negócio, cinco ou dez
para promover a ação indenizatória, bem como se o defeito apareceu depois do prazo de
garantia. Essa é a responsabilidade do empreiteiro.

IMPORTANTE: No que concerne ao prazo para se pleitear indenização por


descumprimento contratual que ocasiona prejuízos (responsabilidade civil
contratual), Flávio Tartuce realça a posição do STJ no sentido da aplicação do prazo
de 10 anos, previsto no art. 205 do CC. Com efeito, o entendimento mais recente do
STJ está assentado na premissa de que: A pretensão indenizatória decorrente do
inadimplemento contratual sujeita-se ao prazo prescricional decenal (art. 205 do
Código Civil), se não houver previsão legal de prazo diferenciado. STJ. Corte
Especial. EREsp 1.281.594-SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Rel. Acd. Min. Felix
Fischer, julgado em 15/05/2019 (Info 649). Observe que se trata da posição da Corte
Especial do STJ.

4- EXTINÇÃO
Extingue o contrato de empreitada nos seguintes casos:

a) Execução da obra
b) Morte do empreiteiro, se o contrato foi celebrado intuitu personae.
Art. 626. Não se extingue o contrato de empreitada pela morte de
qualquer das partes, salvo se ajustado em consideração às qualidades
pessoais do empreiteiro.

c) Resilição unilateral
d) Distrato
e) Resolução por inexecução contratual
f) Falência do empreiteiro

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g) Desapropriação
h) Impossibilidade de prestação em razão de força maior ou caso fortuito.

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CAPÍTULO XIV
DO TRANSPORTE (arts. 730 a 756 do CC)

1- CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

Alguém (o transportador) se obriga, mediante uma determinada remuneração, a


transportar, de um local para outro, pessoas ou coisas, por meio terrestre (rodoviário e
ferroviário), aquático (marítimo, fluvial e lacustre) ou aéreo.

Aquele que realiza o transporte é o transportador, a pessoa transportada é o


passageiro ou viajante, enquanto a pessoa que entrega a coisa a ser transportada é o
expedidor.

O que identifica o contrato é uma obrigação de resultado por parte do


transportador, diante da cláusula de incolumidade de levar a pessoa/coisa ao destino com
segurança.

Preenchidos os requisitos dos arts. 2º e 3º (do CDC), aplica-se então o CDC.


Também não se exclui a aplicação de leis específicas, como o Código Brasileiro de
Aeronáutica (Lei 7.565/1986).

O contrato de transporte é bilateral (sinalagmático), consensual (aperfeiçoa-se


com a manifestação de vontade dos contraentes, independentemente da entrega da coisa
ou do embarque do passageiro) e comutativo.

Na maioria das vezes, constitui-se em um típico contrato de adesão, por não estar
presente a plena discussão de suas cláusulas.

É um contrato informal e não solene, não se exigindo escritura pública nem a


forma escrita.

2- REGRAS GERAIS DO TRANSPORTE NO CC/2002

O transporte exercido em virtude de autorização, permissão ou concessão, rege-


se pelas normas regulamentares e pelo que foi estabelecido naqueles atos, sem prejuízo
do disposto no CC.

Haverá aplicação concomitante das normas de Direito Administrativo,


particularmente aquelas relacionadas à concessão de serviço público, com as normas
previstas no CC.

O serviço público também é considerado um serviço de consumo (art. 22,


CDC). Ex.: Haverá relação de consumo entre passageiro e empresa privada prestadora de
serviço público de transporte (STJ, REsp 226.286/RJ).

Além dessa relação com o D. Administrativo, o CC consagra uma relação com o


D. Internacional. Segundo o art. 732 do CC, serão aplicadas as normas previstas na
legislação especial e em tratados e convenções internacionais ao contrato de transporte,

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

desde que não contrariem o que diz o CC. Ex.: no caso de transporte aéreo, pode ser
aplicado o Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei 7.565/86), desde que não entre em
conflito com o CC.

IMPORTANTE!!! Como é cediço, o art. 6º, VI, do CDC, consagra o princípio da


reparação integral dos danos, impedindo tarifações da indenização. Nada obstante, STF
e STJ já sedimentaram orientação no sentido de que: É possível a limitação, por
legislação internacional especial, do direito do passageiro à indenização por danos
materiais decorrentes de extravio de bagagem. STJ. 3ª Turma. REsp 673048-RS, Rel.
Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 08/05/2018 (Info 626). Nos termos do art. 178
da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da
responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as
Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de
Defesa do Consumidor. STF. Plenário. RE 636331/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes e ARE
766618/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em 25/05/2017 (repercussão geral) (Info
866).

IMPORTANTE!!! O art. 733 do CC trata do transporte cumulativo, ou seja, aquele em


que vários transportadores se obrigam a cumprir o contrato por um determinado percurso.
O art. 756 do CC dispõe que no transporte cumulativo todos os transportadores
respondem SOLIDARIAMENTE, tanto no caso do transporte de coisas como de
pessoas. Havendo danos a coisas/pessoas, há responsabilidade objetiva, pois a
obrigação de cada transportador é de resultado (cláusula de incolumidade).

Havendo dano resultante do atraso ou da interrupção da viagem, este será


determinado em razão da totalidade do percurso, diante da indivisibilidade da obrigação
dos transportadores (733, § 1º, do CC).

Ocorrendo a substituição de um transportador por outro nessa mesma forma de


contratação, a responsabilidade solidária também será estendida ao substituto. A
doutrina chama de contratação de subtransporte (art. 733, § 2º, do CC).

IMPORTANTE: A alteração substancial e unilateral do contrato firmado de


transporte aéreo para terrestre impede a utilização da excludente de fortuito
externo para eximir a empresa de transporte aéreo da responsabilidade civil por
danos causados por roubo ao ônibus. STJ. 3ª Turma. REsp 1728068-SP, Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze, julgado em 05/06/2018 (Info 627).

3- DO TRANSPORTE DE PESSOAS – arts. 734 a 742

É aquele pelo qual o transportador se obriga a levar uma pessoa (passageiro) e


sua bagagem até o destino, com total segurança, mantendo incólume os seus aspectos
físicos e patrimoniais, mediante o pagamento do preço, denominado passagem.

A partir do momento em que um indivíduo acena para um veículo de transporte


público, o contrato já teve início, diante da oferta permanente em que se encontra o
veículo. A responsabilidade do transportador começa quando o passageiro adentra
no veículo.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Obs.: Via de regra, a responsabilidade se configura uma vez iniciada a execução do


contrato.

IMPORTANTÍSSIMO!!! A responsabilidade contratual do transportador pressupõe a


formação de um contrato de transporte, de modo que se AFASTA ESSA
RESPONSABILIDADE QUANDO SE TRATA DE PASSAGEIRO
CLANDESTINO.

A obrigação assumida pelo transportador é sempre de resultado


(responsabilidade objetiva). O art. 734 do CC fala apenas em força maior como
excludente. Entretanto, a doutrina e a jurisprudência consideram caso fortuito e força
maior como sinônimos.

IMPORTANTE!!! É NULA a cláusula de não indenizar inserida nesse tipo de contrato


(Súmula 161 do STF).

STF Súmula nº 161 - Em contrato de transporte, é inoperante a


cláusula de não indenizar.

Não é obrigatória ao consumidor-passageiro a declaração do valor da


bagagem, que pode ser solicitada pelo transportador apenas visando a facilitar a prova
do prejuízo sofrido em eventual demanda. Não sendo feita a referida declaração, torna-se
difícil comprovar o que está dentro da bagagem. Pode o consumidor utilizar-se da
inversão do ônus da prova, quando configurada relação de consumo (STJ, REsp
696.408/MT).

IMPORTANTÍSSIMO!!! A responsabilidade contratual do transportador por


acidente com passageiros não é elidida por culpa de terceiro contra qual tem ação
regressiva (Art. 735 CC).

Esse dispositivo serve para responsabilizar as empresas aéreas por acidentes que
causam a morte de passageiros, mesmo havendo culpa exclusiva de terceiros, tendo
apenas ação regressiva contra os responsáveis pelo acidente. Nesse ponto, a aplicação do
CC é mais favorável que a do CDC, porque este consagra a culpa exclusiva de terceiro
como excludente de responsabilidade na prestação de serviços (art. 14, §3º, II, CDC).

IMPORTANTE!!! A carona não se subordina às normas do contrato de transporte,


não havendo responsabilidade contratual objetiva. Pode haver, contudo, responsabilidade
extracontratual subjetiva.

Art. 736. Não se subordina às normas do contrato de transporte o feito


gratuitamente, por amizade ou cortesia.
Parágrafo único. Não se considera gratuito o transporte quando,
embora feito sem remuneração, o transportador auferir vantagens
indiretas.

Súmula 145, STJ – No transporte desinteressado, de simples cortesia,


o transportador só será civilmente responsável por danos causados ao
transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

A parte final desta súmula deve ser revista, porque a responsabilidade surge
presente com a culpa em qualquer grau, ou seja, o grau de culpa só influencia no valor da
indenização.

IMPORTANTE!!! O transporte não é considerado gratuito quando trouxer ao


transportador vantagens indiretas (ex.: pagamento do combustível ou do pedágio por
aquele que é transportado e, também, os programas de milhagem ou de pontuação em
companhias aéreas). E, não sendo gratuito, a responsabilidade volta a ser contratual
OBJETIVA.

O transportador está sujeito aos horários e itinerários previstos, sob pena de


responder por perdas e danos, salvo motivo de força maior. É o dever de pontualidade.
Fundamenta indenização no caso de atraso que faz com que o passageiro perca um
compromisso remunerado que tinha no destino.

IMPORTANTE: Na hipótese de atraso de voo, não se admite a configuração do dano


moral in re ipsa. STJ. 3ª Turma. REsp 1.584.465-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado
em 13/11/2018 (Info 638). As circunstâncias que envolvem o caso concreto servirão para
que o juiz analise se houve ou não o dano moral, a exemplo: da real duração do atraso; se
a companhia aérea ofertou alternativas para melhor atender aos passageiros; se foi
oferecido suporte material quando o atraso for considerável; se o passageiro, devido ao
atraso da aeronave, acabou por perder compromisso inadiável no destino.

A pessoa transportada deve sujeitar-se às normas estabelecidas pelo transportador,


constante no bilhete ou afixadas à vista dos usuários, abstendo-se da prática de quaisquer
atos que causem incômodo ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o veículo, dificultem
ou impeçam a execução normal de serviço. Trata-se, pois, dos deveres do passageiro. Se
os prepostos da transportadora perceberem que o passageiro, por exemplo, encontra-se
bêbado ou drogado, oferece riscos à viagem, podem impedi-lo de entrar no meio de
transporte.

IMPORTANTE!!! Se o prejuízo sofrido por pessoa transportada for atribuível à


transgressão de normas pelo próprio passageiro, o juiz reduzirá equitativamente a
indenização, na medida em que a vítima houver concorrido para a ocorrência do dano.
Aplica a teoria da causalidade adequada, pela qual a indenização deve ser adequada
às condutas dos envolvidos (Enunciado 47). A culpa ou fato concorrente da vítima
também pode ser discutida em casos de responsabilidade objetiva, visando atenuar a
responsabilidade do agente, diminuindo o valor de indenização.

Art. 739. O transportador não pode recusar passageiros, salvo os casos


previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde
do interessado o justificarem.

Veloso entende que esse artigo é exemplificativo, devendo ser incluídas outras
situações, como a do passageiro com trajes indecentes, ou completamente embriagado ou
drogado etc.

Art. 740. O passageiro tem direito a rescindir o contrato de transporte


antes de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da
passagem, desde que feita a comunicação ao transportador em tempo
de ser renegociada.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

§ 1o Ao passageiro é facultado desistir do transporte, mesmo depois de


iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor
correspondente ao trecho não utilizado, desde que provado que outra
pessoa haja sido transportada em seu lugar.
§ 2o Não terá direito ao reembolso do valor da passagem o usuário que
deixar de embarcar, salvo se provado que outra pessoa foi transportada
em seu lugar, caso em que lhe será restituído o valor do bilhete não
utilizado.
§ 3o Nas hipóteses previstas neste artigo, o transportador terá direito de
reter até cinco por cento da importância a ser restituída ao passageiro, a
título de multa compensatória.

Esse dispositivo acima trata do caso de resilição unilateral do contrato pelo


passageiro. Este será possível antes da viagem, desde que feita a comunicação ao
transportador em tempo de a passagem poder ser renegociada. Depois de iniciada a
viagem, é facultado ao passageiro desistir do transporte, tendo direito à restituição do
valor correspondente ao trecho não utilizado, desde que fique provado que outra pessoa
haja sido transportada em seu lugar no percurso faltante. Entretanto, se o usuário não
embarcar, não terá direito, por regra, ao reembolso do valor da passagem, salvo se
também provar que outra pessoa foi transportada em seu lugar.

Nas hipóteses de resilição unilateral o transportador terá direito a retenção de até


5% da importância a ser restituída ao passageiro, a título de multa compensatória. Pode-
se aplicar a redução equitativa da multa.

Art. 741. Interrompendo-se a viagem por qualquer motivo alheio à


vontade do transportador, ainda que em conseqüência de evento
imprevisível, fica ele obrigado a concluir o transporte contratado
em outro veículo da mesma categoria, ou, com a anuência do
passageiro, por modalidade diferente, à sua custa, correndo também por
sua conta as despesas de estada e alimentação do usuário, durante a
espera de novo transporte.

Se, por exemplo, o ônibus quebra por problemas no motor, a empresa


transportadora será obrigada a disponibilizar outro meio para concluir o transporte e, não
sendo isso possível de imediato, deve arcar com todas as despesas de estadia e
alimentação.

Art. 742. O transportador, uma vez executado o transporte, tem direito


de retenção sobre a bagagem de passageiro e outros objetos
pessoais deste, para garantir-se do pagamento do valor da passagem
que não tiver sido feito no início ou durante o percurso.

O art. 742 consagra, a favor do transportador, o direito de retenção sobre a


bagagem de passageiro e outros objetos pessoais deste, para garantir-se o pagamento do
valor da passagem que não tiver sido feito no início ou durante o percurso. Não se trata
de um penhor legal, mas somente de um direito pessoal colocado à disposição da parte
contratual.

4- DO TRANSPORTE DE COISAS – arts. 743 a 756


Pelo contrato de transporte de coisas, o expedidor (ou remetente) entrega bens
corpóreos ou mercadorias ao transportador, para que o último os leve até um destinatário,
com pontualidade ou segurança. O destinatário pode ser o próprio expedidor.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

A remuneração devida ao transportador é chamada frete.

O transportador assume obrigação de resultado (responsabilidade objetiva).

A coisa, entregue ao transportador, deve necessariamente estar caracterizada pela


sua natureza, valor, peso e quantidade, e o que mais for necessário para que não se
confunda com outros. Ademais, o destinatário deve ser indicado ao menos pelo nome e
endereço.

Ao receber a coisa, o transportador emitirá conhecimento com a menção dos dados


que a identifiquem, obedecido ao disposto em lei especial. Trata-se do conhecimento de
frete ou de carga, que comprova o recebimento da coisa e a obrigação de transportá-la.
Esse documento é um título de crédito atípico, inominado ou impróprio, devendo ser
aplicadas a ele as regras do CC.

O transportador poderá exigir que o remetente lhe entregue a relação discriminada


das coisas a serem transportadas, assinada e em duas vias. (art. 744, parágrafo único, do
CC).

Art. 745. Em caso de informação inexata ou falsa descrição no


documento a que se refere o artigo antecedente, será o transportador
indenizado pelo prejuízo que sofrer, devendo a ação respectiva ser
ajuizada no prazo de cento e vinte dias, a contar daquele ato, sob pena
de decadência.

Esse artigo apresenta problema técnico, pois conflita com a tese de Agnelo A.
Filho, adotada pelo CC sobre prescrição e decadência. Esse clássico jurista relacionou o
prazo de prescrição a ações condenatórias e os prazos decadenciais a ações constitutivas
positivas ou negativas. Ora, a ação indenizatória referenciada no art. 745 do CC é
condenatória, não se justificando o prazo decadencial que nele consta. Trata-se de um
descuido do legislador, eis que sua intenção foi concentrar todos os prazos de prescrição
nos arts. 205 e 206 do CC. Aqui a regra é quebrada de forma atécnica. Tartuce concorda
com Nery Jr no sentido de que, apesar de a lei referenciar que o prazo é decadencial,
trata-se, na verdade, de prazo prescricional.

Art. 746. Poderá o transportador recusar a coisa cuja embalagem seja


inadequada, bem como a que possa pôr em risco a saúde das pessoas,
ou danificar o veículo e outros bens.

Art. 747. O transportador deverá obrigatoriamente recusar a coisa cujo


transporte ou comercialização não sejam permitidos, ou que venha
desacompanhada dos documentos exigidos por lei ou regulamento.

Trata-se de dever legal imposto ao transportador, exigindo-se a licitude das coisas


a serem transportadas, sob pena de sua responsabilização nos âmbitos civil, criminal e
administrativo.

Art. 749. O transportador conduzirá a coisa ao seu destino, tomando


todas as cautelas necessárias para mantê-la em bom estado e entregá-la
no prazo ajustado ou previsto.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Traz a cláusula de incolumidade, fundamentado a responsabilidade objetiva do


transportador. A cláusula de não indenizar é nula (Súmula 161, STF).
Art. 750. A responsabilidade do transportador, limitada ao valor
constante do conhecimento, começa no momento em que ele, ou seus
prepostos, recebem a coisa; termina quando é entregue ao destinatário,
ou depositada em juízo, se aquele não for encontrado.

Art. 752. Desembarcadas as mercadorias, o transportador não é


obrigado a dar aviso ao destinatário, se assim não foi convencionado,
dependendo também de ajuste a entrega a domicílio, e devem constar
do conhecimento de embarque as cláusulas de aviso ou de entrega a
domicílio.

Esse artigo conflita com o dever anexo de informar, decorrente do princípio da


boa-fé objetiva, presente em todo e qualquer tipo de contrato.

Se o transporte não puder ser feito ou sofrer longa interrupção, em razão de


obstrução de vias, conflitos armados, manifestações, suspensão do tráfego, entre outras
causas, o transportador solicitará, de imediato, instruções do remetente sobre como agir.
Ao contrário do dispositivo anterior, este traz o dever anexo de informar. Se esse
impedimento perdurar, sem culpa do transportador, poderá o transportador depositar a
coisa em juízo, ou posteriormente vendê-la, obedecidos os preceitos legais e
regulamentares ou os costumes.

No entanto, se o impedimento decorrer de responsabilidade do transportador, este


poderá depositar a coisa por sua conta e risco, podendo ser vendida a coisa somente se
for perecível.

Se o transportador mantiver a coisa depositada em seus próprios armazéns,


continuará a responder pela guarda e conservação, sendo-lhe devida, porém, uma
remuneração pela custódia. Haverá uma coligação de contratos decorrente de lei
(transporte + depósito), aplicando-se as regras de ambos.

Art. 754. As mercadorias devem ser entregues ao destinatário, ou a


quem apresentar o conhecimento endossado, devendo aquele que as
receber conferi-las e apresentar as reclamações que tiver, sob pena de
decadência dos direitos.
Parágrafo único. No caso de perda parcial ou de avaria não perceptível
à primeira vista, o destinatário conserva a sua ação contra o
transportador, desde que denuncie o dano em dez dias a contar da
entrega.

Tartuce e Nery entendem que mais uma vez houve equívoco do legislador no
caput do dispositivo e o prazo é, na verdade, prescricional, tendo em vista tratar-se de
ação indenizatória. Em virtude de o prazo ser exíguo (10 dias), deve-se entender que o
prazo será, em regra, prescricional de 10 anos, à vista da mais recente orientação do STJ
quanto ao prazo prescricional do art. 205 do CC aplicável às pretensões indenizatórias
decorrentes de relações contratuais, ou de 5 anos (art. 27, CDC).

Art. 755. Havendo dúvida acerca de quem seja o destinatário, o


transportador deve depositar a mercadoria em juízo, se não lhe for
possível obter instruções do remetente; se a demora puder ocasionar a

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

deterioração da coisa, o transportador deverá vendê-la, depositando o


saldo em juízo.

A lei refere-se ao saldo, pois cabe ao transportador deduzir o valor das despesas
de armazenagem e frete, se ainda não foram pagas.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

CAPÍTULO XV
DO SEGURO
(artigos 757 a 802 do CC)

1- CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio,


a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa/coisa, contra riscos
predeterminados.

Natureza jurídica: é um contrato bilateral (sinalagma), oneroso (pela presença da


remuneração, denominada prêmio, a ser pago pelo segurado ao segurador), consensual e
aleatório, pois o risco é fator determinante do negócio em decorrência da possibilidade
de ocorrência do sinistro, evento futuro e incerto com o qual o contrato mantém relação.

Obs.: Há corrente doutrinária que sustenta que o seguro é comutativo, pois o risco poderia
ser determinado por cálculo atuariais e por trazer a ideia de garantia. Tartuce discorda,
porque entende que a tese da comutatividade pode ser alegada por empresas seguradoras
para auferir vantagens excessivas frente aos consumidores, particularmente com o intuito
de obter a rescisão unilateral do contrato.

Na grande maioria dos casos, o seguro constitui um contrato de adesão. O


enunciado 370 da Jornada de Direito Civil enuncia que a determinação dos riscos deve
ser analisada à luz da função social dos contratos, da boa-fé objetiva e da proteção da
dignidade humana, não podendo colocar o segurado aderente em situação de extrema
desvantagem ou onerosidade excessiva.

IMPORTANTE!!! O seguro também constitui, via de regra, um CONTRATO DE


CONSUMO (art. 3º, §2º, CDC). Isso inclui o seguro de dano e o de vida, tratados pelo
CC. Também abrange o contrato de seguro-saúde, que tem como objeto a cobertura de
serviços médicos-hospitalares pela seguradora, mediante o pagamento de um prêmio pelo
segurado (Súmula 469, STJ). Em relação ao último, subsume-se ainda a Lei 9.656/1998,
que é especial a respeito do tema.

2- REGRAS GERAIS DO SEGURO NO CC

Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o


pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado,
relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados.
Parágrafo único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como
segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada.

O segurador só pode ser entidade legalmente autorizada para tal fim. A atividade
do segurador deve ser exercida, no contexto da norma, por sociedades anônimas, mútuas
ou cooperativas (estes terão por objeto somente os seguros agrícolas), mediante
autorização do Governo Federal, estando a matéria disciplinada pela Lei 8.177/1991 e
pelos Decretos-lei 73/1966 e 2.063/1940.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Art. 758. O contrato de seguro prova-se com a exibição da apólice ou


do bilhete do seguro, e, na falta deles, por documento comprobatório
do pagamento do respectivo prêmio.

No que toca à prova do contrato em questão, esta se dá por meio da apólice ou


bilhete do seguro (art. 758 do CC). Na falta deles, o contrato pode ser provado por
documento comprobatório do pagamento do respectivo prêmio, ou seja, a forma é livre
(art. 107, CC).

Art. 759. A emissão da apólice deverá ser precedida de proposta escrita


com a declaração dos elementos essenciais do interesse a ser garantido
e do risco.

Art. 760. A apólice ou o bilhete de seguro serão nominativos, à


ordem ou ao portador, e mencionarão os riscos assumidos, o início e
o fim de sua validade, o limite da garantia e o prêmio devido, e, quando
for o caso, o nome do segurado e o do beneficiário.
Parágrafo único. No seguro de pessoas, a apólice ou o bilhete NÃO
podem ser ao portador.

A apólice é o instrumento do contrato de seguro, contendo as regras gerais do


negócio celebrado e devendo a sua emissão ser precedida de proposta escrita com a
declaração dos elementos essenciais do interesse a ser garantido e do risco (art. 759 do
CC). Já o bilhete constitui um instrumento simplificado do negócio, pelo qual se pode
contratar o seguro.

Características das apólices ou bilhetes mencionadas no art. 760 do CC:

✓ Apólice ou bilhete nominativo: mencionam o nome do segurador, do segurado,


de representante do último ou de terceiro beneficiário, sendo transmissíveis por
meio de cessão civil ou mesmo por alienação.
✓ Apólice ou bilhete à ordem: são transmissíveis por endosso em preto, datado e
assinado pelo endossante e o endossatário, conforme art. 785, §2º, CC.
✓ Apólice ou bilhete ao portador: são transmissíveis por tradição simples ao
detentor da apólice, não sendo admitidas em alguns casos, como no seguro de vida
(art. 760, §único, CC).

Art. 761. Quando o risco for assumido em co-seguro, a apólice indicará


o segurador que administrará o contrato e representará os demais, para
todos os seus efeitos.

Trata do cosseguro, quando os riscos de um seguro direto são assumidos por várias
seguradoras. Em tais casos, a apólice indicará a seguradora que administrará o contrato e
representará os demais, para todos os seus efeitos (seguradora líder). O cosseguro não
se confunde com o resseguro, hipótese em que uma seguradora contrata outra seguradora
(resseguradora), temendo os riscos do contrato anterior, aplicando-se as mesmas regras
previstas para o contrato regular.

Art. 762. Nulo será o contrato para garantia de risco proveniente de ato
doloso do segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de
outro.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

O CC veda expressamente o golpe de seguro (art. 762 do CC). O vício atinge a


validade do contrato, sendo caso de nulidade textual (art. 166, VI), atingindo todo o
contrato. Não pode ser invocado o princípio da conservação contratual em hipótese
alguma. Em um Código que privilegia a boa-fé objetiva, não poderia ser diferente.

Art. 763. Não terá direito a indenização o segurado que estiver em mora
no pagamento do prêmio, se ocorrer o sinistro antes de sua purgação.

Deve ser interpretado de acordo com a TESE DO ADIMPLEMENTO


SUBSTANCIAL, conforme consta no Enunciado 371 do CJF/STJ (“A mora do segurado,
sendo de escassa importância, não autoriza a resolução do contrato, por atentar ao
princípio da boa-fé objetiva”). Ex.: se o segurado pagar o contrato por cerca de 10 anos
e estando em mora em apenas uma parcela do contrato, se o sinistro vier a ocorrer, não
deve ser excluído totalmente o direito à indenização, admitindo-se, no máximo, um
pequeno abatimento no capital segurado, pela prestação não paga.

IMPORTANTE!!! Enunciado 376 do CJF/STJ: “Para efeito do art. 763 do CC, a


resolução do contrato depende de prévia interpelação”. Não é aceita a extinção
automática do contrato de seguro, pela simples mora. Tal posição é PACÍFICA no STJ
(tendo restado consolidada no enunciado de Súmula 616-STJ), devendo haver uma
notificação anterior da seguradora para que o segurado realize o pagamento dos
prêmios atrasados, podendo, apenas posteriormente, extinguir o contrato.

Súmula 616-STJ: “A indenização securitária é devida quando ausente a


comunicação prévia do segurado acerca do atraso no pagamento do prêmio, por
constituir requisito essencial para a suspensão ou resolução do contrato de seguro”. STJ.
2ª Seção. Aprovada em 23/05/2018, DJe 28/05/2018.

Art. 764. Salvo disposição especial, o fato de se não ter verificado o


risco, em previsão do qual se faz o seguro, não exime o segurado de
pagar o prêmio.

O prêmio deve ser pago pelo segurado em qualquer caso, havendo ou não o
sinistro (demonstra a aleatoriedade do contrato de seguro).

A quebra dos deveres anexos no contrato de seguro gera a violação positiva do


contrato e a responsabilização independentemente de culpa daquele que o descumpriu.

O STJ entendeu que a empresa seguradora que nega o pagamento de indenização


sem qualquer fundamento desrespeita a boa-fé objetiva, diante de uma expectativa
gerada.

Art. 765. O segurado e o segurador são obrigados a guardar na


conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade,
tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele
concernentes.

Art. 766. Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer


declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na
aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito à garantia,
além de ficar obrigado ao prêmio vencido.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Parágrafo único. Se a inexatidão ou omissão nas declarações não


resultar de má-fé do segurado, o segurador terá direito a resolver o
contrato, ou a cobrar, mesmo após o sinistro, a diferença do prêmio.

Ex.: A jurisprudência entende que constitui violação a esse dever (art. 766 do CC) o fato
de o segurado não informar uma doença preexistente e celebrar o contrato de seguro-
saúde, para se ver coberto. Por lógico, há desrespeito ao dever anexo de informar.
Porém, deve se observar o previsto no Enunciado 372 do CJF/STJ: “Em caso de
negativa de cobertura securitária por doença preexistente, cabe à seguradora
comprovar que o segurado tinha conhecimento inequívoca daquela”. Isso porque a boa-
fé objetiva do segurado consumidor é presumida.

Súmula 609-STJ: “A recusa de cobertura securitária, sob a alegação de doença


preexistente, é ilícita se não houve a exigência de exames médicos prévios à contratação
ou a demonstração de má-fé do segurado”. STJ. 2ª Seção. Aprovada em 11/04/2018, DJe
17/04/2018.

Art. 767. No seguro à conta de outrem, o segurador pode opor ao


segurado quaisquer defesas que tenha contra o estipulante, por
descumprimento das normas de conclusão do contrato, ou de
pagamento do prêmio.

Em havendo estipulação em favor de terceiro (arts. 436 a 438), a seguradora


poderá utilizar-se de qualquer defesa que tinha contra o segurado em face deste terceiro.
A regra em questão constitui uma exceção ao princípio da relatividade dos efeitos
contratuais, pois a seguradora poderá discutir o negócio jurídico com quem não é parte
no contrato (efeitos externos).
Art. 768. O segurado perderá o direito à garantia se agravar
intencionalmente o risco objeto do contrato.

Não se pode presumir a má-fé do segurado, principalmente se o contrato for de


consumo, pois, a boa-fé do consumidor é sempre presumida (art. 4º, III, CDC).

IMPORTANTÍSSIMO!!! Tema dos mais controvertidos se refere à embriaguez do


segurado, havendo acidente de trânsito. A dúvida que surge é se essa embriaguez, por si
só, afasta o dever da seguradora de pagar a indenização. O STJ possuía julgados em
ambos os sentidos, ou seja, que a embriaguez afastava esse dever e, em outros, que não
afastava. Prevaleceu, contudo, o entendimento no sentido de que: Não é devida a
indenização securitária decorrente de contrato de seguro de automóvel quando o
causador do sinistro (condutor do veículo segurado) estiver em estado de
embriaguez, salvo se o segurado demonstrar que o infortúnio ocorreria
independentemente dessa circunstância. STJ. 3ª Turma. REsp 1.485.717-SP, Rel. Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 22/11/2016 (Info 594).

IMPORTANTÍSSIMO!!! No contrato de seguro de automóvel, é lícita a cláusula que


exclui a cobertura securitária para o caso de o acidente de trânsito (sinistro) ter sido
causado em decorrência da embriaguez do segurado. No entanto, esta cláusula é
ineficaz perante terceiros (garantia de responsabilidade civil). Isso significa que,
mesmo que contrato preveja a exclusão da cobertura em caso de embriaguez do
segurado, a seguradora será obrigada a indenizar a vítima (terceiro) caso o acidente
tenha sido causado pelo segurado embriagado. Em outras palavras, não se pode

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

invocar essa cláusula contra a vítima. Depois de indenizar a vítima, a seguradora poderá
exigir seu direito de regresso contra o segurado (causador do dano). A garantia de
responsabilidade civil não visa apenas proteger o interesse econômico do segurado tendo,
também como objetivo preservar o interesse dos terceiros prejudicados. O seguro de
responsabilidade civil se transmudou após a edição do Código Civil de 2002, de forma
que deixou de ser apenas uma forma de reembolsar as indenizações pagas pelo segurado
e passou a ser também um meio de proteção das vítimas, prestigiando, assim, a sua função
social. É inidônea a exclusão da cobertura de responsabilidade civil no seguro de
automóvel quando o motorista dirige em estado de embriaguez, visto que somente
prejudicaria a vítima já penalizada, o que esvaziaria a finalidade e a função social dessa
garantia, de proteção dos interesses dos terceiros prejudicados à indenização, ao lado da
proteção patrimonial do segurado. STJ. 3ª Turma. REsp 1738247-SC, Rel. Min. Ricardo
Villas Bôas Cueva, julgado em 27/11/2018 (Info 639).

Conclusão diversa é alcançada no que se refere ao contrato de seguro de vida, em


relação ao qual a jurisprudência rechaça a pretensão de afastamento de indenização pela
constatação de embriaguez.

Súmula 620-STJ: “A embriaguez do segurado não exime a seguradora do


pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida”. STJ. 2ª Seção.
Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

IMPORTANTE: É vedada a exclusão de cobertura do seguro de vida na hipótese de


sinistro ou acidente decorrente de atos praticados pelo segurado em estado de embriaguez.
Tal cláusula é abusiva, com base nos arts. 3º, § 2º, e 51, IV, do CDC. STJ. 2ª Seção.
EREsp 973725-SP, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado Do TRF 5ª
Região), julgado em 25/04/2018 (Info 625).

IMPORTANTE!!! O STJ tem entendido que a prática de assalto a mão armada pelo
segurado, que venha morrer, acarreta a perda do direito a indenização, em razão do
descumprimento da obrigação de abster-se de tudo quanto pudesse aumentar os riscos.
No sentido: É indevida a indenização relativa ao seguro obrigatório – DPVAT, na
hipótese em que o acidente de trânsito que vitimou o segurado tenha ocorrido no momento
de prática de ilícito penal doloso. STJ. 3ª Turma. REsp 1661120-RS, Rel. Min. Nancy
Andrighi, julgado em 9/5/2017 (Info 604).

STJ Súmula 465 - Ressalvada a hipótese de efetivo agravamento do


risco, a seguradora NÃO se exime do dever de indenizar em razão da
transferência do veículo sem a sua prévia comunicação.

Art. 769. O segurado é obrigado a comunicar ao segurador, logo que


saiba, todo incidente suscetível de agravar consideravelmente o risco
coberto, sob pena de perder o direito à garantia, se provar que silenciou
de má-fé.
§ 1o O segurador, desde que o faça nos quinze dias seguintes ao
recebimento do aviso da agravação do risco sem culpa do segurado,
poderá dar-lhe ciência, por escrito, de sua decisão de RESOLVER
O CONTRATO.
§ 2o A resolução só será eficaz trinta dias após a notificação, devendo
ser restituída pelo segurador a diferença do prêmio.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

Os §§1º e 2º do art. 769 do CC mencionam as expressões resolver e resolução,


quando o certo seria falar em resilir e resilição, no caso, uma resilição unilateral, nos
termos do art. 473. Em havendo dúvidas, tais regras deverão ser interpretadas da maneira
mais favorável ao consumidor (art. 47, CDC) ou ao aderente (art. 423, CC).

Art. 770. Salvo disposição em contrário, a diminuição do risco no curso


do contrato não acarreta a redução do prêmio estipulado; mas, se a
redução do risco for considerável, o segurado poderá exigir a revisão
do prêmio, ou a resolução do contrato.

Não é exigido um fato imprevisível ou extraordinário, mas a simples desproporção


negocial, nos moldes do art. 6º, V, do CDC.

Art. 771. Sob pena de perder o direito à indenização, o segurado


participará o sinistro ao segurador, logo que o saiba, e tomará as
providências imediatas para minorar-lhe as conseqüências.
Parágrafo único. Correm à conta do segurador, até o limite fixado no
contrato, as despesas de salvamento conseqüente ao sinistro.

IMPORTANTE!!! Esse artigo, ao mesmo tempo em que traz o dever de informar o


sinistro por parte do segurado, consagra o DEVER DE MITIGAÇÃO DA PERDA
(duty to mitigate the loss) por parte do credor, relacionado com a boa-fé objetiva. A
consequência do desrespeito a esse dever é a perda pelo segurado do direito à indenização
devida, não importando se pagou o prêmio de forma integral.

IMPORTANTE: O art. 771 do CC determina que o segurado deverá comunicar


imediatamente à seguradora quando ocorrer algum sinistro envolvendo o veículo, já que
isso possibilita que esta tome medidas que possam amenizar os prejuízos da realização
do risco, bem como a sua propagação. Esse dispositivo legal prevê que, se não houver
esta comunicação imediata, o segurado perderá o direito à indenização. Vale ressaltar,
no entanto, que, para que ocorra a sanção prevista no art. 771 do CC, é necessário
que fique demonstrada a ocorrência de uma omissão dolosa do segurado, que beire
a má-fé, ou culpa grave e que, com isso, prejudique, de forma desproporcional, a
atuação da seguradora. Assim, se o segurado demorou três dias para comunicar à
seguradora que o veículo foi roubado porque foi ameaçado pelo criminoso, ele não
perderá o direito de ser indenizado já que, neste caso, não poderia ser dele exigido
comportamento diverso. Resumindo: o segurado que, devido às ameaças de morte feitas
pelo criminoso a ele e à sua família, deixou de comunicar prontamente o roubo do seu
veículo à seguradora não perde o direito à indenização securitária (art. 771 do CC). STJ.
3ª Turma. REsp 1404908-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em
2/8/2016 (Info 590).

Art. 772. A mora do segurador em pagar o sinistro obriga à atualização


monetária da indenização devida segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, sem prejuízo dos juros moratórios.

Sem prejuízo disso, havendo mora, a seguradora passará a responder por caso
fortuito e força maior, nos termos do art. 399.

Art. 773. O segurador que, ao tempo do contrato, sabe estar passado o


risco de que o segurado se pretende cobrir, e, não obstante, expede a
apólice, pagará em dobro o prêmio estipulado.

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Ex.: aceita seguro contra naufrágio embora saiba que o navio já atracou em segurança.
Art. 774. A recondução tácita do contrato pelo mesmo prazo, mediante
expressa cláusula contratual, não poderá operar mais de uma vez.

Em suma, cessado o risco, não pode mais o ser cobrado o prêmio, pois a álea é
elemento essencial do contrato. O segurador que emite a apólice age com intuito de
enriquecimento sem causa, o que justifica o pagamento do valor do prêmio em dobro.
Como consequência, o contrato deve ser tido como nulo (art. 166, VI, do CC).

Quanto à cláusula de recondução tácita do contrato pelo mesmo prazo, ou seja, a


previsão de seu prolongamento nas mesmas condições antes contratadas, essa não poderá
operar por mais de uma vez (art. 774 do CC). O CDC proíbe prática semelhante no art.
39. A nulidade deve atingir somente a renovação sucessiva, não a primeira renovação.

Art. 775. Os agentes autorizados do segurador presumem-se seus


representantes para todos os atos relativos aos contratos que
agenciarem.

A conduta dos representantes, caso dos corretores, vincula o segurador. Ex.: a


hipótese de publicidade veiculada pela qual determinada empresa de seguro-saúde
divulga que não há prazo de carência para internação. Essa informação prestada vincula
o prestador de serviços, conforme vem entendendo a jurisprudência.

Art. 776. O segurador é obrigado a pagar em dinheiro o prejuízo


resultante do risco assumido, salvo se convencionada a reposição da
coisa.

A regra é que o pagamento da indenização seja feito em dinheiro, mas as partes


podem convencionar a reposição da coisa, por força da autonomia contratual.

Obs.: Súmula 188 STF: “O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano,
pelo que efetivamente pagou, até o limite previsto no contrato de seguro” (sub-rogação).

3- DO SEGURO DE DANO – arts. 778 a 788

Art. 778. Nos seguros de dano, a garantia prometida não pode


ultrapassar o valor do interesse segurado no momento da conclusão do
contrato, sob pena do disposto no art. 766, e sem prejuízo da ação penal
que no caso couber.

Art. 779. O risco do seguro compreenderá todos os prejuízos


resultantes ou conseqüentes, como sejam os estragos ocasionados para
evitar o sinistro, minorar o dano, ou salvar a coisa.

É norma cogente, não admitindo previsão em contrário.

Art. 780. A vigência da garantia, no seguro de coisas transportadas,


começa no momento em que são pelo transportador recebidas, e cessa
com a sua entrega ao destinatário.

A hipótese é de contratos coligados ou de contratos conexos (seguro + transporte),


fazendo com que a obrigação da seguradora seja de resultado.

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Art. 781. A indenização não pode ultrapassar o valor do interesse


segurado no momento do sinistro, e, em hipótese alguma, o limite
máximo da garantia fixado na apólice, salvo em caso de mora do
segurador.

Ex.: Alguém celebra um contrato de seguro para proteger um veículo. Quando da


celebração do contrato, o veículo, novo, valia 50 mil. Dois anos após a celebração do
contrato, quando o veículo vale 30 mil, é roubado (sinistro). Esse último será o valor
devido pela seguradora, devendo ser observado o valor de mercado. Para tanto, é aplicada
a Tabela Fipe. A única hipótese em que se admite o pagamento de indenização
superior ao valor que consta da apólice é no caso de mora da seguradora.

IMPORTANTE: A indenização securitária decorrente de contrato de seguro de


automóvel deve corresponder, no caso de perda total, ao valor médio de mercado do bem
(tabela FIPE) apurado na data do sinistro ou na data do efetivo pagamento (liquidação do
sinistro)? Na data do sinistro. Isso porque o Código Civil de 2002 adotou, para os
seguros de dano, o princípio indenitário, de modo que a indenização securitária deve
corresponder ao valor real dos bens perdidos, destruídos ou danificados que o
segurado possuía logo antes da ocorrência do sinistro. O seguro não é um contrato
lucrativo, mas de indenização, devendo ser afastado, por um lado, o enriquecimento
injusto do segurado e, por outro, o estado de prejuízo. Nos termos do art. 781 do CC, a
indenização no contrato de seguro possui alguns parâmetros e limites, não podendo
ultrapassar o valor do bem (ou interesse segurado) no momento do sinistro nem
podendo exceder o limite máximo da garantia fixado na apólice, salvo mora do
segurador. É abusiva a cláusula contratual do seguro de automóvel que impõe o
cálculo da indenização securitária com base no valor médio de mercado do bem
vigente na data de liquidação do sinistro, pois onera desproporcionalmente o
segurado, colocando-o em situação de desvantagem exagerada, indo de encontro ao
princípio indenitário. Como cediço, os veículos automotores sofrem, com o passar do
tempo, depreciação econômica, e quanto maior o lapso entre o sinistro e o dia do efetivo
pagamento, menor será a recomposição do patrimônio garantido. A cláusula do contrato
de seguro de automóvel a qual adota, na ocorrência de perda total, o valor médio de
mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização securitária deve
observar a tabela vigente na data do sinistro e não a data do efetivo pagamento (liquidação
do sinistro). STJ. 3ª Turma. REsp 1546163/GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
julgado em 05/05/2016.

Art. 782. O segurado que, na vigência do contrato, pretender obter novo


seguro sobre o mesmo interesse, e contra o mesmo risco junto a outro
segurador, deve previamente comunicar sua intenção por escrito ao
primeiro, indicando a soma por que pretende segurar-se, a fim de se
comprovar a obediência ao disposto no art. 778.

Uma determinada coisa pode ser segurada mais de uma vez. Porém, o segurado
que pretender obter novo seguro sobre o mesmo interesse e contra o mesmo risco junto à
outra seguradora, deve previamente comunicar sua intenção por escrito à primeira,
indicando a soma pela qual pretende segurar-se. Se alguém tem um veículo que vale 50
mil e quer segurá-lo contra riscos futuros, poderá até celebrar dois contratos de seguro,
com seguradoras distintas (cumulação de seguros ou seguro duplo), desde que o valor das
indenizações somadas não supere o valor do bem. Se presente uma cumulação exagerada,
será caso de resolução do segundo contrato, cumulando-se as regras dos arts. 778 e 766

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do CC. As normas pretendem evitar que alguém utiliza o contrato de seguro para
enriquecer sem justa causa.

Art. 783. Salvo disposição em contrário, o seguro de um interesse por


menos do que valha acarreta a redução proporcional da indenização, no
caso de sinistro parcial.

Autoriza o seguro parcial, ou seja, o seguro de um interesse por menos do que ele
valha, salvo estipulação em contrário no contrato. Nesse caso, ocorrendo o sinistro
parcial, a indenização a ser paga também deverá ser reduzida proporcionalmente, por
meio do que se denomina cláusula de rateio. Ex.: alguém celebra um contrato de seguro
contra incêndio de um imóvel cujo valor é 100 mil. O valor da indenização pactuado é 50
mil (seguro parcial). Ocorrendo o incêndio, mas gerando um prejuízo de apenas 10 mil,
com a redução proporcional o valor a ser pago pela seguradora será de 5 mil.

Art. 784. Não se inclui na garantia o sinistro provocado por vício


intrínseco da coisa segurada, não declarado pelo segurado.
Parágrafo único. Entende-se por vício intrínseco o defeito próprio da
coisa, que se não encontra normalmente em outras da mesma espécie.

No tocante à garantia, esta não inclui o sinistro provocado por vício intrínseco da
coisa segurada e não declarado pelo segurado quando da celebração do contrato. O vício
intrínseco, denominado vício próprio ou vício corpóreo, é aquele defeito próprio da coisa,
que não se encontra normalmente em outras da mesma espécie. Ex.: se um carro segurado
apresenta sério problema de freios, vício de fabricação, fazendo com que ocorra o
acidente, não há que se falar em responsabilidade da seguradora. A responsabilidade é
dos fornecedores do produto, nos termos do CDC.

Art. 785. Salvo disposição em contrário, admite-se a transferência do


contrato a terceiro com a alienação ou cessão do interesse segurado.
§ 1o Se o instrumento contratual é nominativo, a transferência só produz
efeitos em relação ao segurador mediante aviso escrito assinado pelo
cedente e pelo cessionário.
§ 2o A apólice ou o bilhete à ordem só se transfere por endosso em preto,
datado e assinado pelo endossante e pelo endossatário.

Em regra, o contrato de seguro de dano não é personalíssimo, admitindo-se a


transferência do contrato a terceiro com a alienação ou cessão do interesse segurado. O
segurado pode ceder o contrato a outrem, sem necessidade de autorização da seguradora.
Porém, é possível estabelecer no contrato cláusula proibitiva da cessão.

Em relação ao art. 785, §1º, do CC, o efeito é similar à cessão de crédito, devendo
ser notificado o cedido (segurador).

Analisando o art. 785, §2º, do CC: o endosso em preto ou nominativo é aquele


em que há menção expressa pelo endossante de quem seja o endossatário.
Art. 786. Paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites
do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao
segurado contra o autor do dano.
§ 1o Salvo dolo, a sub-rogação não tem lugar se o dano foi causado pelo
cônjuge do segurado, seus descendentes ou ascendentes, consangüíneos
ou afins.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

§ 2o É ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga, em


prejuízo do segurador, os direitos a que se refere este artigo.

IMPORTANTE!!! Súmula 188 do STF + art. 786 do CC: Essa regra não se aplica ao
seguro de pessoas por força do disposto no art. 800 do CC – “No seguro de pessoas o
segurador não pode sub-rogar-se nos direitos e ações do segurado, ou do beneficiário,
contra o causador do sinistro”.

STF Súmula nº 188 - O segurador tem ação regressiva contra o


causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto
no contrato de seguro (NÃO SE APLICA AO SEGURO DE
PESSOAS).

Obs.: Súmulas do STF aplicáveis ao art. 786 do CC.

STF Súmula nº 151 - Prescreve em um ano a ação do segurador sub-


rogado para haver indenização por extravio ou perda de carga
transportada por navio.

STF Súmula nº 257 - São cabíveis honorários de advogado na ação


regressiva do segurador contra o causador do dano.

Art. 787. No seguro de responsabilidade civil, o segurador garante o


pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro.
§ 1o Tão logo saiba o segurado das conseqüências de ato seu, suscetível
de lhe acarretar a responsabilidade incluída na garantia, comunicará o
fato ao segurador (dever anexo de informar).
§ 2o É defeso ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou
confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado,
ou indenizá-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador.
§ 3o Intentada a ação contra o segurado, dará este ciência da lide ao
segurador.
§ 4o Subsistirá a responsabilidade do segurado perante o terceiro, se o
segurador for insolvente.

O seguro de responsabilidade civil é uma importante modalidade de seguro de


dano (art. 787 do CC). Por meio desse contrato, a seguradora compromete-se a cobrir os
danos causados por atos ilícitos cometidos pelo segurado a terceiro. O desrespeito ao
dever de informar decorrente da boa-fé objetiva do §1º do dispositivo é motivo para não
pagamento da indenização.

Para Tartuce, o §2º do art. 787 do CC (coíbe ao segurado reconhecer sua


responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou
indenizá-lo diretamente sem a anuência expressa do segurador) conflita com outras regras
do CC e do CDC. Sendo o contrato de adesão ou de consumo, há como afastar essa regra,
pois a parte contratual está renunciando a um direito que lhe é inerente, havendo
infringência ao princípio da função social do contrato nesses casos.

IMPORTANTE: Em regra, mesmo que o proprietário do veículo segurado tenha dado


termo de quitação ou renúncia ao causador do sinistro, a seguradora continuará tendo
direito de ajuizar ação regressiva contra o autor do dano e de ser ressarcida pelas despesas
que efetuou com o reparo ou substituição do bem sinistrado. Ex.: o segurado combina
com o causador do dano que este irá pagar apenas o valor da franquia do seguro, em troca
de um termo de quitação. A seguradora paga, então, os prejuízos e poderá cobrar do

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

causador do dano porque ela tem direito à sub-rogação por força de lei (art. 786, CC) e
este acordo não é eficaz perante ela (art. 786, § 2º). Exceção: a seguradora não terá direito
de regresso contra o autor do dano caso este demonstre que indenizou realmente o
segurado pelos prejuízos sofridos, na justa expectativa de que estivesse quitando,
integralmente, os danos provocados por sua conduta. Neste caso, protege-se o terceiro de
boa-fé e a seguradora poderá cobrar do segurado com base na proibição do
enriquecimento ilícito. Ex: o causador do dano paga todas as despesas do segurado e
recebe um termo de quitação; de má-fé, o segurado, mesmo já tendo sido indenizado,
aciona o seguro para consertar seu carro. Se a seguradora ajuizar ação regressiva contra
o causador do dano, ele poderá provar que pagou integralmente as despesas e, neste caso,
a ação será julgada improcedente. Protege-se a boa-fé do terceiro. STJ. 3ª Turma. REsp
1533886-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/9/2016 (Info 591).

Ainda no caso de seguro de responsabilidade civil, intentada a ação contra o


segurado, dará este ciência da lide ao segurador. A ciência é feita por meio da
denunciação da lide. Todavia, essa denunciação da lide não é obrigatória, sendo
reconhecido o direito de regresso contra a seguradora, por parte do segurado, por meio
de ação específica (art. 125, §1º, do CPC/15).

Art. 788. Nos seguros de responsabilidade legalmente obrigatórios, a


indenização por sinistro será paga pelo segurador diretamente ao
terceiro prejudicado.
Parágrafo único. Demandado em ação direta pela vítima do dano, o
segurador não poderá opor a exceção de contrato não cumprido pelo
segurado, sem promover a citação deste para integrar o contraditório.

Existem seguros de responsabilidade civil que são obrigatórios, caso, por


exemplo, do DPVAT (seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos
automotores via terrestre). Nestes, a indenização por sinistro será paga pelo segurador
diretamente ao terceiro prejudicado (art. 788 do CC).

STJ Súmula nº 246 - O valor do seguro obrigatório deve ser deduzido


da indenização judicialmente fixada.

STJ Súmula nº 257 - A falta de pagamento do prêmio do seguro


obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de
Vias Terrestres (DPVAT) não é motivo para a recusa do pagamento da
indenização.

4- DO SEGURO DE PESSOA – arts. 789 a 802


Art. 789. Nos seguros de pessoas, o capital segurado é livremente
estipulado pelo proponente, que pode contratar mais de um seguro
sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou diversos seguradores.

Art. 790. No seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a


declarar, sob pena de falsidade, o seu interesse pela preservação da vida
do segurado.
Parágrafo único. Até prova em contrário, presume-se o interesse,
quando o segurado é cônjuge, ascendente ou descendente do
proponente.

É possível a celebração de vários seguros, sem limite, pois não há como mensurar
o preço da vida de uma pessoa natural.

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William Bossaneli Araújo – Atualizado por Leopoldo Martins Moreira Neto e Carlos Eduardo da Silva Limonge – maio 2020

No seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a declarar, sob pena de


falsidade, o seu interesse pela preservação da vida do segurado (art. 790 do CC).
Entretanto, até prova em contrário, presume-se o interesse quando o segurado for cônjuge,
ascendente ou descendente do proponente.

Art. 791. Se o segurado não renunciar à faculdade, ou se o seguro não


tiver como causa declarada a garantia de alguma obrigação, é lícita a
substituição do beneficiário, por ato entre vivos ou de última
vontade.
Parágrafo único. O segurador, que não for cientificado oportunamente
da substituição, desobrigar-se-á pagando o capital segurado ao antigo
beneficiário.

O contrato de seguro de pessoa pode instituir um terceiro beneficiário, que


receberá a indenização, por exemplo, em caso de morte do segurado (art. 791 do CC).

Art. 792. Na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por


qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será
pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante
aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária.
Parágrafo único. Na falta das pessoas indicadas neste artigo, serão
beneficiários os que provarem que a morte do segurado os privou dos
meios necessários à subsistência.

Como a norma é especial para o contrato de seguro, deve ser respeitada, não se
aplicando a ordem de sucessão legítima.

Art. 793. É válida a instituição do companheiro como beneficiário,


se ao tempo do contrato o segurado era separado judicialmente, ou
já se encontrava separado de fato.

Está em sintonia com a proteção constitucional da união estável.

Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de


morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado,
nem se considera herança para todos os efeitos de direito.

Isso porque o valor da indenização deverá ser revertido ao beneficiário, não


aos herdeiros ou ao espólio do segurado falecido.
Art. 795. É NULA, no seguro de pessoa, qualquer transação para
pagamento reduzido do capital segurado.

Art. 796. O prêmio, no seguro de vida, será convencionado por prazo


limitado, ou por toda a vida do segurado.
Parágrafo único. Em qualquer hipótese, no seguro individual, o
segurador não terá ação para cobrar o prêmio vencido, cuja falta de
pagamento, nos prazos previstos, acarretará, conforme se estipular, a
resolução do contrato, com a restituição da reserva já formada, ou a
redução do capital garantido proporcionalmente ao prêmio pago.

No tocante ao prêmio a ser pago pelo segurado no seguro de vida, este será
convencionado por prazo limitado ou por toda a vida (autonomia privada) – art. 796 do
CC.

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IMPORTANTE: Em regra, é válida a cláusula de reajuste por faixa etária em contrato


de seguro de vida. Essa cláusula somente não será válida nos casos em que o contrato já
tenha previsto alguma outra técnica de compensação do “desvio de risco” dos segurados
idosos, como nos casos de constituição de reserva técnica para esse fim, a exemplo dos
seguros de vida sob regime da capitalização (em vez da repartição simples). STJ. 4ª
Turma. AgInt no AREsp 632992/RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em
19/03/2019. STJ. 3ª Turma. REsp 1816750-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino,
julgado em 26/11/2019 (Info 663).

Art. 797. No seguro de vida para o caso de morte, é lícito estipular-se


um prazo de carência, durante o qual o segurador não responde pela
ocorrência do sinistro.
Parágrafo único. No caso deste artigo o segurador é obrigado a
devolver ao beneficiário o montante da reserva técnica já formada.

Nessas hipóteses, ocorrendo o sinistro, o segurador é obrigado a devolver ao


beneficiário o montante da reserva técnica formada. Essa reserva técnica é constituída
pelos valores pagos pelo segurado, para garantir eventual cumprimento do contrato pela
seguradora.

Art. 798. O beneficiário não tem direito ao capital estipulado


quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência
inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso,
observado o disposto no parágrafo único do artigo antecedente.
Parágrafo único. Ressalvada a hipótese prevista neste artigo, é nula a
cláusula contratual que exclui o pagamento do capital por suicídio do
segurado.

Súmula 610-STJ: “O suicídio não é coberto nos dois primeiros anos de vigência
do contrato de seguro de vida, ressalvado o direito do beneficiário à devolução do
montante da reserva técnica formada”. STJ. 2ª Seção. Aprovada em 25/04/2018, DJe
07/05/2018 (Info 624)

IMPORTANTE PRA CARALHO!!! STJ 564 – DIREITO CIVIL. DEVOLUÇÃO


DA RESERVA TÉCNICA EM SEGURO DE VIDA NO CASO DE SUICÍDIO
PREMEDITADO.

No seguro de vida, se o segurado se suicidar, a seguradora continua tendo obrigação


de pagar a indenização?

• Se o suicídio ocorreu ANTES dos dois primeiros anos do contrato: NÃO.

O beneficiário não terá direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida


nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato ou nos dois primeiros anos
depois de o contrato ter sido reiniciado (recondução) depois de um tempo suspenso
(art. 798 do CC). Obs.: o beneficiário não terá direito à indenização, mas receberá o
valor da reserva técnica já formada, ou seja, terá direito à quantia que o segurado
pagou a título de prêmio para a seguradora. A seguradora será obrigada a devolver
ao beneficiário o montante da reserva técnica já formada MESMO QUE FIQUE
PROVADO que o segurado premeditou o suicídio.

• Se o suicídio ocorreu DEPOIS dos dois primeiros anos do contrato: SIM.

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Se o suicídio ocorrer depois dos dois primeiros anos do contrato, será devida a
indenização ainda que exista cláusula expressa em contrário. Obs.: é nula a cláusula
contratual que exclua a indenização da seguradora em caso de suicídio ocorrido
depois dos dois primeiros anos do contrato (art. 798, parágrafo único). Assim, se o
suicídio ocorre depois dos dois primeiros anos, é devida a indenização ainda que
exista cláusula expressa dizendo que a seguradora não deve indenizar.

Atenção: estão SUPERADAS a Súmula 105 do STF, a Súmula 61 do STJ e o


Enunciado 187 da Jornada de Direito Civil. STJ. 2ª Seção. REsp 1.334.005-GO, Rel.
originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min. Maria Isabel Gallotti,
julgado em 8/4/2015.

IMPORTANTE: No seguro de vida, se o segurado se suicidar, a seguradora continua


tendo obrigação de pagar a indenização? 1) Entendimento ANTERIOR (até 08/04/2015)
(Súmulas 105 do STF e 61 do STJ): O critério era o da premeditação: • Se o suicídio foi
premeditado: NÃO • Se o suicídio não foi premeditado: SIM 2) Entendimento ATUAL
(Súmula 610 do STJ): O critério passou a ser o meramente temporal: • Suicídio nos dois
primeiros anos: SEM direito à indenização. • Suicídio após os dois primeiros anos: TEM
direito à indenização. Caso concreto: segurado cometeu suicídio antes de terminarem os
dois primeiros anos do contrato. Ficou demonstrado que o suicídio não foi premeditado.
Assim, pelo entendimento anterior, o beneficiário do seguro teria direito à indenização
(porque o suicídio não foi premeditado). Por outro lado, pelo entendimento atual, o filho
de João não teria direito à indenização (porque o suicídio ocorreu nos dois primeiros anos
do contrato). O beneficiário ajuizou a ação contra a seguradora quando ainda vigorava o
entendimento anterior do STJ, tendo, inclusive, obtido uma sentença favorável. Ocorre
que, quando o processo chegou ao STJ por meio de recurso, o entendimento já havia
mudado. Neste caso, o STJ afirmou que, mesmo tendo havido alteração da jurisprudência,
deveria ser aplicado o entendimento anterior. STJ. 3ª Turma. REsp 1721716-PR, Rel.
Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/12/2019 (Info 662). A nova orientação
jurisprudencial não pode ser aplicada retroativamente, ou seja, não pode incidir
para os litígios surgidos antes de sua definição. Aplica-se aqui a doutrina da
superação prospectiva da jurisprudência (em inglês, denominada de doutrina da
prospective overruling) ou, ainda, chamada simplesmente de modulação dos efeitos.
O CPC/2015 previu, como uma de suas grandes novidades, a previsão de precedentes
obrigatórios e a superação prospectiva dos precedentes (art. 927, §3º).

Art. 799. O segurador não pode eximir-se ao pagamento do seguro,


AINDA QUE DA APÓLICE CONSTE A RESTRIÇÃO, se a morte
ou a incapacidade do segurado provier da utilização de meio de
transporte mais arriscado, da prestação de serviço militar, da prática de
esporte, ou de atos de humanidade em auxílio de outrem.

Ex.: Morrer pulando de paraquedas a 10 mil metros de altura NÃO afasta o dever de
indenizar da seguradora.

Art. 800. Nos seguros de pessoas, o segurador não pode sub-rogar-


se nos direitos e ações do segurado, ou do beneficiário, contra o
causador do sinistro.

Esse artigo afasta a aplicação da Súmula 188 do STF para os casos de seguros de
pessoas.

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STF Súmula nº 188 - O segurador tem ação regressiva contra o


causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto
no contrato de seguro.

Art. 801. O seguro de pessoas pode ser estipulado por pessoa natural
ou jurídica em proveito de grupo que a ela, de qualquer modo, se
vincule.
§ 1o O estipulante não representa o segurador perante o grupo
segurado, e é o único responsável, para com o segurador, pelo
cumprimento de todas as obrigações contratuais.
§ 2o A modificação da apólice em vigor dependerá da anuência
expressa de segurados que representem três quartos do grupo.

É o que se denomina seguro de vida em grupo.

IMPORTANTE: No seguro de vida em grupo, não há abusividade na cláusula que


permite a não renovação do contrato ou a renovação condicionada a reajuste por faixa
etária. É válida a cláusula contratual que confere a prerrogativa de a seguradora optar por
não renovar o contrato de seguro de vida em grupo. Também é válida a cláusula contratual
que preveja a possibilidade de alteração da cobertura contratada e de reajuste por
implemento de idade, mediante prévia comunicação, quando da formalização da
estipulação da nova apólice. Em outras palavras, no contrato de seguro de vida em grupo,
não há abusividade no reajuste por implemento de idade quando da formalização da nova
apólice. Tais cláusulas são decorrentes da própria natureza do contrato. STJ. 4ª Turma.
REsp 1769111-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/12/2019 (Info 665).

Art. 802. Não se compreende nas disposições desta Seção a garantia do


reembolso de despesas hospitalares ou de tratamento médico, nem o
custeio das despesas de luto e de funeral do segurado.

Não se aplicam as regras previstas para o seguro de pessoas tratadas no CC 2002


à garantia do reembolso de despesas hospitalares ou de tratamento médico, nem custeio
das despesas de luto e de funeral do seguro. Os valores de despesas hospitalares ou de
tratamento médico não são considerados seguro de pessoas, mas sim, objeto de contrato
de seguro de dano.

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