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TEORIA GERAL
DOS CONTRATOS
Introdução
No contexto das trocas, em razão de as partes contratantes nem sem-
pre conseguirem, apenas pelo uso do contrato principal, a garantia do
cumprimento da obrigação, é necessário utilizar outros instrumentos
que servirão de salvaguarda a eventual inadimplemento. Esse resguardo
ao cumprimento do negócio jurídico pode ser alcançado por meio de
contratos de caução ou de garantia.
Neste capítulo, você vai ler sobre a fiança, examinando as suas no-
ções gerais e os seus efeitos, bem como a jurisprudência dos tribunais
superiores sobre esse contrato.
Conceito
O art. 818 do Código Civil dispõe sobre o contrato de fiança: “Art. 818 Pelo con-
trato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida
pelo devedor, caso este não a cumpra” (BRASIL, 2002, documento on-line).
Embora o foco deste capítulo seja a fiança convencional, tratada pelo art.
818 do Código Civil, a fiança poderá estar expressa em lei, a chamada fiança
legal, assim como poderá ser imposta judicialmente a chamada fiança judicial
(PEREIRA, 2018).
Segundo Gonçalves (2010, p. 554), a fiança é “[...] o contrato pelo qual uma
pessoa se obriga a pagar ao credor o que a este deve um terceiro. Alguém
estranho à relação obrigacional originária, chamado de fiador, obriga-se
perante o credor, garantindo com o seu patrimônio a satisfação do crédito
deste, caso não o solva o credor”.
Partes
Pode parecer, em um primeiro momento, que o contrato de fiança se opera entre
o devedor da obrigação principal e o fiador, garantidor dessa obrigação, mas o
contrato de fiança ocorre, verdadeiramente, entre o credor da obrigação principal
e o fiador dessa obrigação. Corrobora essa afirmação o art. 820 do Código Civil,
que determina que a fiança, sendo contrato firmado entre credor e fiador, pode
ser prestada, inclusive, sem o consentimento ou, mesmo, contra a vontade do
devedor: “Art. 820 Pode-se estipular a fiança, ainda que sem consentimento do
devedor ou contra a sua vontade” (BRASIL, 2002, documento on-line).
A fiança tem natureza jurídica de negócio jurídico bilateral, pois é contrato, com a
peculiaridade de ser um negócio jurídico acessório e subsidiário.
Características
Segundo Gonçalves (2010) e Pereira (2017), as características da fiança são:
Requisitos da fiança
Partindo da ideia de que o contrato de fiança é realizado entre o fiador e o credor,
cumpre apresentar os requisitos subjetivos, objetivos e formais necessários à
realização do contrato.
Subjetivos
Quanto aos sujeitos ou às partes, há alguns requisitos a serem observados.
Inicialmente, a capacidade civil. A capacidade para prestar fiança é a mesma
Fiança 5
exigida para contratar. O sujeito tem de ser capaz e poder dispor, livremente,
dos seus bens. Exceto nos casamentos cujo regime seja o da separação absoluta
de bens, nenhum dos cônjuges poderá prestar fiança sem o consentimento do
outro (art. 1.647, III, do Código Civil) (BRASIL, 2002). Vale ainda mencionar
o art. 820 do Código Civil: “Art. 820 Pode-se estipular a fiança, ainda que
sem consentimento do devedor ou contra a sua vontade” (BRASIL, 2002,
documento on-line).
Embora não seja normal a contratação de fiança sem o consentimento ou
contra a vontade do devedor, pois, em regra, é o próprio devedor que apre-
senta o fiador ao credor, nada impede que o contrato seja realizado sem o seu
conhecimento. Assim, o contrato de fiança entabulado entre credor e fiador
resulta em uma garantia baseada na confiança do cumprimento da obrigação
— que ao fim e ao cabo é a razão de existir a fiança e, além disso, em nada
prejudica o devedor principal.
No intuito de proteger o credor, assiste-lhe o direito de recusar fiadores que
não apresentem idoneidade ou patrimônio compatível com a obrigação a ser
garantida. Ademais, o art. 826 do Código Civil determina: “Art. 826 O fiador
se tornar insolvente ou incapaz, poderá o credor exigir que seja substituído”.
Essa exigência, por lógico, será cabível nos casos em que a fiança tenha
sido estipulada com a ciência e concordância do devedor (BRASIL, 2002). Há
a possibilidade de se estipular mais de um fiador para a mesma dívida, que
serão todos cofiadores, ou ainda de se estipular um fiador do fiador, chamado
de abonador no direito português. Nessa situação, o fiador do fiador garantirá
o cumprimento da obrigação quando nem o devedor principal, nem o primeiro
fiador designado conseguirem cumprir a obrigação (GONÇALVES, 2010).
Objetivos
A fiança pode ser prestada em qualquer espécie de obrigação (dar, fazer ou
não fazer), contudo, sua eficácia ficará condicionada à validade da obrigação
principal. Assim, se nula a obrigação principal, nula será a fiança; se inexigível
a obrigação principal, inexigível será a fiança. A fiança poderá ter como objeto,
inclusive, assegurar dívida futura, mas sua exigibilidade ficará na dependência
de a dívida tornar-se certa e líquida (PEREIRA, 2017).
Como mencionado, não tendo sido a garantia prestada especificamente até
determinado valor e data, a fiança compreenderá todos os acessórios da dívida
principal, incluindo despesas judiciais, desde a citação do fiador, consoante
art. 822 do Código Civil (BRASIL, 2002).
6 Fiança
Formais
Em virtude de se tratar de contrato unilateral e gratuito, a fiança não admitirá
interpretações extensivas quanto à sua prestação e sua extensão, quão menos
poderá ser verbal. O art. 819 do Código Civil corrobora com o afirmado
quando diz: “Art. 819 A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação
extensiva” (BRASIL, 2002, documento on-line).
Por outro lado, não exige solenidade para sua realização, podendo originar-
-se de contrato paritário ou, mesmo, de contrato firmado por adesão.
Não devemos confundir fiança com aval. A fiança é contrato cabível nas mais variadas
obrigações. O aval é garantia típica dos títulos de crédito. O aval também configura
garantia pessoal, mas não é contrato, é declaração unilateral, instituto do direito cam-
biário. A responsabilidade do avalista é sempre solidária.
A fiança é contrato, é garantia pessoal ampla compatível com qualquer espécie
de obrigação (convencional, legal e judicial). A responsabilidade do fiador pode, ou
não, ser solidária, mas, em regra, respeita o benefício de ordem (primeiro, busca-se
o cumprimento pelo devedor principal, somente depois, pelo fiador) (GONÇALVES,
2010; PEREIRA, 2017).
Efeitos da fiança
Quando aceita prestar fiança, o fiador assume o compromisso de cumprir a
obrigação, caso o devedor não o faça. Embora a relação contratual se concretize
entre fiador e credor, os efeitos da fiança vão além da relação entre essas partes
e atingem também o devedor. Inicialmente, cumpre apresentar os efeitos da
fiança nas relações entre fiador e credor, para depois apresentar os efeitos da
fiança entre fiador e devedor, como segue.
Art. 827 O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir,
até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor.
Parágrafo único. O fiador que alegar o benefício de ordem, a que se refere
este artigo, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres
e desembargados, quantos bastem para solver o débito (BRASIL, 2002, do-
cumento on-line).
Art. 831 O fiador que pagar integralmente a dívida fica sub-rogado nos di-
reitos do credor; mas só poderá demandar a cada um dos outros fiadores pela
respectiva quota.
Parágrafo único. A parte do fiador insolvente distribuir-se-á pelos outros
(BRASIL, 2002, documento on-line).
Extinção da fiança
A fiança se extingue como o cumprimento da obrigação principal (GAGLIANO;
PAMPLONA FILHO, 2008, p. 620-621):
Fiança na jurisprudência
Para enriquecer o conhecimento sobre o tema, é apropriado colacionar a forma
como os tribunais superiores tratam dos temas tangentes ao contrato de fiança.
Como esse intuito, apresentaremos alguns julgados que fazem relação com
as noções apresentadas neste capítulo.
10 Fiança
Art. 1.647 Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode,
sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
[...]
III — prestar fiança ou aval (BRASIL, 2002, documento on-line);
BRASIL. Lei Federal nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/Leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 28 ago. 2018.
BRASIL. Lei nº. 8.245, de 18 de outubro de 1991. Dispõe sobre as locações dos imóveis
urbanos e os procedimentos a elas pertinentes. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 21
out. 1991. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8245.htm>.
Acesso em: 28 ago. 2018.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. Agravo Interno no Agravo em
recurso especial nº. 1252047/SP, Relator Ministro Luis Felipe Salomão. Diário da Justiça
Eletrônico, Brasília, DF, 23 abr. 2018b. Disponível em: <http://portaljustica.com.br/acor-
dao/2112211>. Acesso em: 28 ago. 2018.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. Agravo Interno no Agravo em
recurso especial nº. 1564430/DF, Relator Ministro Antônio Carlos Ferreira. Diário da
Justiça Eletrônico, Brasília, DF, 25 abr. 2018c. Disponível em: <http://www.portaljustica.
com.br/acordao/2112199>. Acesso em: 28 ago. 2018.
14 Fiança
Leitura recomendada
LÔBO, P. Direito Civil: contratos. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
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