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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA FACULDADE DE

DIREITO “PROF. JACY DE ASSIS”

Disciplina: Direito dos Contratos Prof. Carlos José Cordeiro


2a Série de Questões (AARE - 4º Módulo – setembro/2021)

Gabriela Oliveira França Braga (11921DIR010)


Jovana Mendes Vilela Prado (11921DIR029)
Laila Maria Franco Oliveira (11921DIR027)

Questão 01: Tradicionalmente, o conceito de contrato indica que ele representa o acordo de
vontades estabelecido com a finalidade de produzir efeitos jurídicos. Neste sentido, buscando
resguardar a segurança jurídica inerente aos negócios jurídicos, a celebração de contrato
atípico, fora do rol contido da legislação, não é lícita, pois as partes não dispõem da liberdade
de celebrar negócios não expressamente regulamentados por lei.

A assertiva está correta ou incorreta? Explique, mencionando, inclusive, o fundamento


jurídico da resposta.

A assertiva acima está incorreta. O contrato deve ser conceituado como um negócio
jurídico, bilateral ou plurilateral, apresentando dois polos (credor e devedor), sendo que uma
mesma pessoa pode estar presente em ambos. Os requisitos envolvem a vontade, em
conformidade com a lei, podendo criar, modificar e extinguir direitos. Dessa forma, o
conceito apresentado pela afirmativa está correto em relação à conceituação do termo
contratual. Todavia, o erro é apresentado na segunda parte da assertiva ao afirmar que
contratos atípicos são considerados ilícitos, o que será desenvolvido a seguir.

Um dos princípios apresentados pelo Direito dos Contratos é a Autonomia da


Vontade, que dispõe acerca da liberdade de contratar caso seja da vontade do indivíduo, com
quem o mesmo desejar firmar contrato e de acordo com sua necessidade. Entretanto, essas
liberdades possuem restrições de acordo com a legislação, como pode-se observar na
obrigatoriedade de contribuição do Seguro DPVAT caso você seja proprietário de automóvel.
Assim, não é possível observar a liberdade de contratar caso queira, considerando a
obrigatoriedade do pagamento do mesmo. Desta maneira, percebe-se que o Princípio da
Autonomia da Vontade demonstra a importância da vontade para o estabelecimento de uma
relação contratual observando o previsto em lei, permitindo que as partes envolvidas tenham
autonomia e liberdade para acordar de acordo com suas razões e vontades.

Conforme exposto anteriormente, a obrigação contratual tem como fonte a vontade


das partes no limite do previsto nas codificações. O Código Civil de 2002 estabelece no artigo
425: “É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste
Código.” Percebe-se o erro da questão ao afirmar que contratos atípicos, ou seja, aqueles
cujos características não estão previstas no código são considerados ilícitos. Os contratos
atípicos podem ser celebrados desde que sejam observados os requisitos de existência e
validade, podendo esmiuçar de forma clara e objetivo os direitos e deveres dos envolvidos
para evitar futuras controvérsias acerca do estabelecido contratualmente. Ademais, o objeto
em questão deve ser determinável, economicamente viável, lícito e possível.

Questão 02: Lúcia celebrou contrato de conta poupança com determinada instituição
financeira. Ao receber a sua via do contrato ao qual aderiu, percebeu certas ambiguidades e
contradições em cláusulas que diziam respeito às tarifas bancárias. De acordo com a teoria
contratual, é correto afirmar, neste caso, que: (após a escolha das opções, justifique-as)

a) as mencionadas cláusulas contratuais devem ser interpretadas mais favoravelmente a Lúcia;


b) para que seja reconhecido o direito de Lúcia a ter interpretadas em seu favor as cláusulas
em questão, é imprescindível a interpelação judicial, em razão da natureza da relação jurídica,
considerando que esse direito decorre de interpretação jurisprudencial a partir da boa-fé
contratual, e não do texto da lei;
c) o contrato é nulo de pleno de direito;
d) as mencionadas cláusulas contratuais devem ser interpretadas mais favoravelmente ao
banco;
e) o contrato é inexistente.

De acordo com o apresentado pela questão e a teoria contratual, as cláusulas


contratuais ambíguas e contraditórias do contrato de adesão à conta poupança com
determinada instituição financeira devem ser interpretadas mais favoravelmente a Lúcia,
conforme artigo 423 do Código Civil de 2002: “Quando houver no contrato de adesão
cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao
aderente”. O contrato de adesão é classificado como unilateral considerando que o
contratante/aderente tem a única função de aderir ao mesmo. Como estabelece o CC/2002, as
cláusulas ambíguas ou contraditórias, considerando a gramática ou duplo sentido, deve-se
adotar esclarecimento favorável ao aderente considerando sua situação na qual não foi
possível alterar ou incluir outras cláusulas, assim a alternativa D está incorreta ao afirmar que
a interpretação das cláusulas contratuais devem ser interpretadas favoravelmente ao banco.
Ressalta-se que para o reconhecimento do direito de Lúcia não é necessário interpelação
judicial sendo justificável de acordo com o próprio texto da lei e por esse motivo a alternativa
B está incorreta. A alternativa C está incorreta considerando que o contrato de adesão não é
nulo de pleno direito considerando que o mesmo foi celebrado por pessoas capazes, com
objeto determinável, economicamente viável, lícito e possível. O contrato não é inexistente
considerando que não houve falta de elementos contratuais estruturais e por essa razão, a
alternativa E está incorreta.

Questão 03: João e Maria são casados e donos de um extenso patrimônio, que inclui um
imóvel residencial localizado no centro da cidade de Uberlândia/MG. O mencionado bem
encontra-se alugado para Pedro, pelo preço mensal de R$800,00, entre janeiro/2020 e
dezembro/2021. A minuta contratual, ratificada pelos três, prevê que os locadores se obrigam
a ceder, pelo período estabelecido, o uso e gozo do imóvel, mediante a prestação pecuniária
acordada. A partir das informações do enunciado, responda:

a) Classifique o contrato celebrado entre João, Maria e Pedro.

O contrato celebrado entre João, Maria e Pedro é classificado como um contrato de


aluguel, conforme estabelece artigo 565 do Código Civil de 2002: “Na locação de coisas, uma
das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não
fungível, mediante certa retribuição”. Desta forma, João e Maria cedem o imóvel residencial
localizado no centro da cidade de Uberlândia/MG para Pedro. Assim, pode-se conceituar o
mesmo como bilateral, envolvendo a questão da reciprocidade e distribuição da carga
obrigacional para ambos polos envolvidos na relação: o locador deve ceder a coisa para o
locatário, demonstrando a parte sinalagmática entre os abrangidos.
Ademais, o contrato de aluguel é oneroso considerando que ambas as partes possuem
direitos e deveres, conforme artigo 392, CC/2002: “Nos contratos onerosos, responde cada
uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas em lei”. Percebe-se a presença de
prestações e contraprestações que devem ser cumpridas de acordo com o firmado no contrato:
João e Maria cedem o imóvel e João cumpre com a parcela mensal do aluguel conforme valor
acordado entre os mesmos. Além da onerosidade, a relação contratual estabelecida na questão
é comutativo, ou seja, as prestações e contraprestações são certas e determinadas durante o
momento que o contrato é firmado, minimizando os riscos: João e Maria sabem qual será o
valor arrecadado pelo aluguel mensalmente e Pedro tem conhecimento de qual será o imóvel
que terá direito de moradia.
Havendo a livre vontade das partes, o contrato de aluguel é do tipo consensual
considerando a inexistência de formalismo de acordo com a legislação. Como o contrato de
locação de coisa está previsto no Capítulo V, Título VI, do Código Civil de 2002, o mesmo é
considerado como típico (há previsão legal). Outra característica é a execução sucessiva
considerando que as prestações e contraprestações são cumpridas através de atos reiterados: a
locação ocorre até o prazo previsto contratualmente mesmo com a quitação mensal do valor
do aluguel. O contrato de aluguel é principal, existindo por si só, sem necessidade de outra
relação contratual para sua existência e validade. É também individual no qual o credor e
devedor foram estabelecidos no momento da celebração do contrato.

b) Suponha que Pedro tenha pedido à sua amiga, Simone, para afiançar o contrato em questão.
Qual seria, nesse caso, a natureza jurídica do contrato firmado por ela? Qual a espécie de
responsabilidade assumida por Simone (individual, solidária, subsidiária, etc.)?

O artigo 818 do Código Civil de 2002 estabelece que "pelo contrato de fiança, uma
pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a
cumpra”. Assim, o fiador acolhe a obrigação de solução da mesma por meio do seu
patrimônio diante do credor, criando uma responsabilidade. A fiança poderá ser de caução
real ou fidejussória/pessoal. A primeira envolve bens como garantia da obrigação estabelecida
com o credor. A segunda é uma garantia pessoal, pautada na confiança. Desta maneira, a
responsabilidade assumida por Simone é subsidiária, estabelecida de forma expressa em uma
obrigação contratual obedecendo a codificação civil.
Em relação às características do contrato de fiança, ele é acessório considerando sua
dependência no contrato principal que estabelece uma obrigação a ser cumprida e em caso de
inadimplência, o fiador arcará com a mesma com seu patrimônio. Ademais, é unilateral e
gratuita ao gerar obrigações apenas para o fiador. Considerando a obrigação do fiador, o
contrato de fiança é também personalíssimo.

c) Agora, imagine que Pedro seja sobrinho de João e Maria, e que o imóvel em questão tenha
sido emprestado por estes àquele, sob o regime de comodato. O casal, residente em
Araguari/MG, resolve voltar a morar em Uberlândia, para que seu filho possa atender à
Universidade da cidade. Na hipótese proposta, considerando a jurisprudência do STJ, seria
necessária alguma formalidade prévia à retomada do imóvel. Se sim, qual? De toda forma,
explique a resposta, indicando o fundamento jurídico.

Segundo artigo 579 do Código Civil de 2002, “o comodato é o empréstimo gratuito de


coisas não fungíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto”. Caso João e Maria tenham
emprestado o imóvel para pedro em regime de comodato sem a determinação de prazo para
findar a relação contratual, o artigo 581 do CC/2002 estabelece a necessidade de um prazo
justo, fundado pelo juiz, para que o contratante resolva sua situação de forma a garantir menor
prejuízo para si. Como o comodato é um contrato unilateral gratuito, a sua extinção é feita por
meio da notificação pelo comodante ao comodatário (artigo 473, CC/2002), observando o
procedimento legal. Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do Recurso Especial
1812465, “sob essa perspectiva, também é obrigatória a ocorrência da notificação
premonitória considerando os aspectos negativos que a ação de despejo pode implicar sobre
aquele que deve ser retirado do imóvel”.

Questão 04: Apesar de não existir capítulo específico no Código Civil relativo à interpretação
dos contratos, existem cinco normas interpretativas que se destacam em sua parte geral.
Destaque-as, apontando quais as suas funções.
Como trazido no enunciado, apesar de não existir um capítulo específico no Código
Civil acerca da interpretação dos contratos, sabe-se que existem cinco normas interpretativas
cuja função é, na medida do possível, alcançar o elemento interno da vontade, ou seja, o que -
de fato - os indivíduos buscavam com o negócio jurídico em questão, além do elemento
externo, escrito, destacado no próprio documento, bem como ideais de boa-fé, equidade e
proporcionalidade, como ficará claro com a análise feita a seguir. Dessa forma, os princípios a
serem destacados são os dispostos no art. 112, 113, 114, 423 e, por fim, 424 do Código Civil -
os quais serão tratados detalhadamente abaixo.

Inicialmente, segundo o art. 112, CC/2002: “Nas declarações de vontade se


atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.”.
Assim, o artigo assegura que o contrato não será lido apenas por meio das palavras utilizadas
e do, consequente, sentido gramatical a elas atrelado, mas sim levando em conta o que as
partes buscavam, desejavam verdadeiramente, ao redigirem o documento em questão. Quanto
ao artigo 113, cujo texto legal determina que: “Os negócios jurídicos devem ser
interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração", percebe-se a
importância dada pelo legislador (em concordância com o artigo 422, CC/2002) à lealdade,
socialidade, busca verdadeira pela satisfação de ambas as vontades contratuais, desde o
cumprimento do ônus, caso haja, ao recebimento do bônus. Assim, chegamos ao art. 114, do
Código: “Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente", o
qual garante que, no caso de benefícios ou negócios gratuitos, caracterizados pela prestação
obrigacional de só uma das partes, o contrato será interpretado estritamente, considerando-se
a renúncia de direitos existente na relação. Por fim, é preciso ressaltar o dito pelo art. 423 e
424 do CC/2002, respectivamente, ambos referentes aos contratos de adesão: “Quando
houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a
interpretação mais favorável ao aderente.”; “Nos contratos de adesão, são nulas as
cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da
natureza do negócio.” - aqui, cabe enfatizar, a defesa pela proporcionalidade e equidade do
negócio jurídico, visto que, no primeiro caso é garantido ao aderente, o sujeito que não foi
responsável pela produção do conteúdo contratual, ter o benefício sob o objeto ambíguo e, no
segundo caso, tem como função proteger os direitos correlatos que, usualmente, são retirados
das cláusulas-padrão.

Questão 05: O mecanismo do contrato preliminar se mostra um instrumento adequado para


oferecer segurança para o eventual contratante? Explique.
Inicialmente, cabe enfatizar o conceito de contrato preliminar. Tal modalidade
contratual busca, a partir de um contrato prévio, assegurar a celebração de um contrato
definitivo, principal (nos moldes previamente acordados). Dessa forma, o mecanismo
apresenta-se como meio adequado na garantia de segurança contratual, haja vista: 1. como
dito outrora, o contrato prévio não assegura apenas a confecção de um contrato, mas também
de um determinado conteúdo, assim, caso não exista a cláusula de arrependimento, qualquer
uma das partes tem a possibilidade exigir que o contrato seja firmado e, consequentemente, as
prestações efetivadas; 2. o mecanismo supracitado é transmissível no que diz respeito, logo,
apesar da ausência do sujeito responsável pelo firmamento do contrato, seus herdeiros hão de
cumprir com o determinado outrora. Portanto, ainda que existam situações em que o contrato
pode ser, legalmente, extinto - como descrito nos arts. 464, 465 e 466 do Código Civil 1 - o
mecanismo mostra-se demasiadamente seguro para o eventual contratante.

Questão 06: Pode-se afirmar que todo contrato unilateral é gratuito, como também que todo
contrato bilateral é oneroso? Explique. Aponte e explique três vantagens práticas da distinção
entre contratos unilaterais e bilaterais.
Via de regra, os contratos unilaterais são gratuitos e os contratos bilaterais são
onerosos, no entanto, não é possível afirmar que tratar-se-á de uma lei sem exceções, como
enfatiza Carlos Roberto Gonçalves:

“O mútuo feneratício ou oneroso (em que é convencionado o pagamento de juros) é


contrato unilateral e oneroso. Unilateral porque de natureza real: só se aperfeiçoa
com a entrega do numerário ao mutuário, não bastando o acordo de vontades. Feita
a entrega (quando o contrato passa a produzir efeitos), nenhuma outra obrigação
resta ao mutuante. Por isso se diz que gera obrigação somente para o mutuário;
Como exemplo de contrato que pode ser bilateral e gratuito menciona-se o mandato,
embora se trate de bilateral imperfeito, visto que, para o mandante, a obrigação
surge, em geral, a posteriori (a de pagar as despesas necessárias à sua execução, p.
ex.)” (GONÇALVES, 2017, p. 39)

Algumas vantagens práticas podem ser retiradas da distinção entre contratos

1 As hipóteses trazidas nos artigos 464, 465 e 466 do Código Civil de 2002 são, respectivamente: “Art. 464.
esgotado o prazo, poderá o juiz, a pedido do interessado, suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo
caráter definitivo ao contrato preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação.; Art. 465. Se o
estipulante não der execução ao contrato preliminar, poderá a outra parte considerá-lo desfeito, e pedir perdas e
danos.; Art. 466. Se a promessa de contrato for unilateral, o credor, sob pena de ficar a mesma sem efeito, deverá
manifestar-se no prazo nela previsto, ou, inexistindo este, no que lhe for razoavelmente assinado pelo devedor.”
unilaterais e bilaterais, sendo estas: 1. tanto a exceptio non adimpleti contractus, quanto a
cláusula resolutiva tácita só podem ser utilizadas no caso de contratos bilaterais, nos moldes
do art. 476: “Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua
obrigação, pode exigir o implemento da do outro.”; 2. a teoria dos riscos, na qual, de modo
sintético, o responsável por criar o risco de dano a outrem tem o dever de reparar, só é
aplicável aos contratos bilaterais; 3. a garantia de execução do contrato, prevista a partir do
art. 477 do Código Civil de 2002: “Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das
partes contratantes diminuição em seu patrimônio capaz de comprometer ou tornar duvidosa a
prestação pela qual se obrigou, pode a outra recusar-se à prestação que lhe incumbe, até que
aquela satisfaça a que lhe compete ou dê garantia bastante de satisfazê-la", haja vista a própria
natureza estrutural dos contratos, só pode ser aplicada à modalidade bilateral.

Questão 07: Disserte, de forma sucinta, acerca dos institutos emptio spei e emptio rei
speratae, abordando os seus efeitos jurídicos e considerando os vícios redibitórios e a
evicção.

O contrato é constituído pela composição de partes para que se alcance finalidades e


interesses que atendam a coletividade. Nesse contexto, a realização do ato jurídico depende da
declaração de vontades em um determinado meio social, de forma que a diversidade deve ser
considerada para que os fins pretendidos sejam atendidos. Para isso, são estabelecidos
diversos modelos de contratos, sendo os institutos emptio spei e emptio rei speratae exemplos
clássicos.
Em primeira análise, o emptio spei é uma modalidade de contrato na qual é vendida
apenas a expectativa de proveito sobre algo, não o resultado em si. Por conseguinte, o emptio
rei speratae é caracterizado como uma espécie de contrato em que se vende algo, mas não se
especifica a quantidade, sendo esta incerta. Vale ressaltar o contraste dos conceitos
apresentados, visto que no primeiro o evento é dado como incerto e pode ou não ocorrer,
enquanto a modalidade emptio rei speratae é marcada pela incerteza apenas acerca da
quantidade, ou seja, é obrigatório que o evento ocorra. No que tange ao pagamento, este deve
ser realizado mesmo que a expectativa cultivada não se concretize quanto a existência (emptio
spei) ou quanto a quantidade (emptio rei speratae) do elemento esperado.

Questão 08: Os conceitos correlatos à boa-fé objetiva devem ser utilizados como função
integrativa, suprindo lacunas do contrato e trazendo deveres implícitos às partes contratuais.
A esse respeito, indique se as assertivas abaixo estão corretas ou incorretas, justificando o
porquê:
a) O tu quoque está relacionado à proteção de uma parte contra aquela que pretende exercer
uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente.

O elemento tu quoque estabelece que um contratante, ao violar uma norma jurídica,


não poderá, sem a caracterização de abuso de direito, buscar proveito em uma situação
anteriormente criada por seu desrespeito (TARTUCE, 2015). Dessa forma, é considerado
inaceitável que seja direcionada a outrem a conduta que demonstre um comportamento que
não seria aceitável contra si mesmo. Em suma, afirmação está correta, pois o tu quoque
impede que um indivíduo viole uma norma e possa exercer direito proveniente dela
posteriormente, especialmente em casos em que o conteúdo jurídico já tenha sido
desrespeitado pelo indivíduo em questão.

b) A surrectio refere-se a um direito que não exercido durante determinado lapso de tempo
não poderá mais sê-lo, por contrariar a boa-fé.

A surrectio está relacionada ao andamento de uma situação jurídica, de maneira que


o conteúdo obrigacional é ampliado a partir do surgimento de um direito que anteriormente
não existia. Todavia, observa-se a existência do instituto denominado supressio, o qual
ocasiona a supressão de um direito devido ao elemento temporal e a consequente redução do
conteúdo obrigacional. Visto isso, o enunciado está incorreto, pois a definição proposta
refere-se ao supressio, não ao surrectio.

c) O venire contra factum proprium proíbe que uma pessoa faça contra outra o que não faria
contra si mesmo, consistindo em aplicação do mesmo princípio inspirador da exceptio non
adimpleti contractus.

Em vista da boa-fé objetiva, é determinado que um indivíduo não pode utilizar


direito próprio quando a ação é contrária a um comportamento anterior, uma vez que deve ser
conservada a confiança e o dever de lealdade. Assim, veda-se o comportamento contraditório
em vista da defesa do sentido já estabelecido acerca de uma conduta, evitando-se os danos
decorrentes da quebra da confiança. Destarte, a exceptio non adimpleti contractus relaciona-se
com a possibilidade de um devedor se abster da prestação de determinada obrigação
contratual em caso de descumprimento do que competia a outra parte da relação jurídica.
É possível observar que o venire contra factum proprium não se relaciona
intimamente com o exceptio non adimpleti contractus, ao contrário do que o enunciado da
questão sugere. Nesse ínterim, o primeiro instituto citado busca impedir qualquer
comportamento que quebre a confiança e ocasione vantagens injustas, enquanto o exceptio
non adimpleti contractus afere a possibilidade de escusar-se de uma obrigação quando o outro
ente da relação contrariou os termos do contrato. Por isso, o exposto está incorreto, de forma
que os dois institutos não se relacionam da maneira definida no enunciado.

Questão 09: O contrato de fiança é celebrado entre o fiador e o:

(X) credor do afiançado, podendo ser gratuito ou oneroso, mas o fiador, se como tal
demandado, poderá compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado.
( ) afiançado, sendo gratuito ou oneroso, mas o fiador, se como tal demandado, não poderá
compensar sua dívida com a do credor ao afiançado, porque, obrigando- se por terceiro uma
pessoa, não pode compensar essa dívida com a que o credor dele lhe dever.
( ) afiançado, sendo necessariamente gratuito, mas o fiador, se como tal demandado, não
poderá compensar sua dívida com a do credor ao afiançado, porque, obrigando-se por terceiro
uma pessoa, não pode compensar essa dívida com a que o credor dele lhe dever.
( ) credor do afiançado, podendo ser gratuito ou oneroso, e o fiador, se como tal demandado,
não poderá compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado, porque a compensação
exige que duas pessoas sejam, ao mesmo tempo, credoras e devedoras uma da outra.

Questão 10: Segundo entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, nos contratos
bancários sujeitos ao Código de Defesa do Consumidor, é válida a cláusula que institui
comissão de permanência para viger após o vencimento da dívida. Contudo, a importância
cobrada a título de comissão de permanência não poderá ultrapassar a soma dos encargos
remuneratórios e moratórios previstos no contrato, ou seja: i) juros remuneratórios à taxa
média de mercado, não podendo ultrapassar o percentual contratado para o período de
normalidade da operação; ii) juros moratórios até o limite de 12% ao ano; e iii) multa
contratual limitada a 2% do valor da prestação, nos termos do art. 52, § 1º, do CDC.
Diante disso, constatada a abusividade dos encargos pactuados na cláusula de comissão de
permanência, deve o juiz “declarar a nulidade do contrato, determinando o retorno das partes
ao status quo ante”.

Em vista do texto acima transcrito, responda:

a) Os contratos bancários se enquadram na definição de contrato de adesão? E na definição de


contrato de consumo? Há alguma peculiaridade no modo de interpretação desses contratos?

Na dinâmica econômica e social adotada, as relações de consumo se tornam cada vez


mais abundantes. O contrato de adesão é um dos instrumentos utilizados para reger as
relações de consumo, sendo definido como o mecanismo no qual uma das partes deve aceitar
as cláusulas propostas, de forma que não há uma negociação sobre os termos presentes no
contrato, pois o ente que se vincula ao documento o adere tacitamente. Diante disso, é
verificado que os contratos bancários são típicos contratos de adesão, uma vez que deve haver
uma instituição financeira em sua elaboração, a qual estabelecerá os termos a serem seguidos
enquanto o outro polo da relação jurídica assume uma posição de aceitação em sua
vinculação.
Assim, o contrato bancário também é considerado um contrato de consumo. Cabe
ressaltar que alguns entendem que o Código de Defesa do Consumidor pode regular os
contratos bancários, enquanto outros resistem e afirmam que o referido Código não deve ser
utilizado nesses casos devido ao entendimento de que não há, na relação, a caracterização
plena de um consumidor. Apesar das divergências ocasionadas pelo entendimento da
aplicação do conceito de consumidor, o próprio Código verifica que atividades relativas aos
bancos podem levar ao estabelecimento de contratos de consumo (CDC, art. 3º § 2°).
A dúvida se esvai nas situações mencionadas expressamente no art. 2° do CDC:
“Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda
que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”. Isto pois, considerando o
destinatário final e em seu consequente vínculo consumerista, não há dúvida acerca da
aplicabilidade do CDC no que tange a determinados tipos de contratos.
A interpretação acerca dos contratos de adesão deve considerar que o consumidor é a
parte mais vulnerável da relação jurídica, o que gera a necessidade de que a interpretação seja
favorável a ele. Para que a interpretação seja realizada, o jurista Orlando Gomes estabelece
duas considerações: i) é convencionado que casos de obscuridade ou ambiguidade devem ser
interpretados contra o estipulante; ii) em casos de contradição entre normas manuscritas e
impressas, as manuscritas possuem prioridade. Por fim, pode-se verificar os arts. 423 e 424 do
CC/2002, os quais versam acerca da interpretação.

“Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou


contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente;
Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia
antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio”. (CC/2002)

b) Está correta a afirmação em destaque no texto, qual seja, “declarar a nulidade do contrato,
determinando o retorno das partes ao status quo ante”? Explique.

A abusividade no contrato pode ser decorrente do desequilíbrio e da desvantagem


excessiva na relação jurídica estabelecida. Para que o impasse seja sanado, o Código de
Defesa do Consumidor afere que devem ser declaradas como completamente nulas as
cláusulas que demonstrem as características do abuso. Cabe lembrar que a nulidade se
direciona apenas às cláusulas dotadas de abusividade, e não ao contrato como um todo,
portanto, a afirmação realizada no enunciado da questão está incorreta. Nesse sentido, o art.
51 do CDC presta grandes esclarecimentos.
“Art. 51: (...) § 1° Presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que:
I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do
contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a
natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias
peculiares ao caso”. (CDC, 1990)

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