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CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS

CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS


Há diferentes perspectivas de classificação dos contratos.
Cada uma delas possui as suas utilidades práticas.
3.1. Quanto à Formalidade Quanto à formalidade, os contratos podem ser informais (não solenes
ou de forma livre) ou formais (solenes).
Leva-se em conta a obrigatoriedade ou não de o contrato adotar uma forma, assim entendido o
modo de exteriorização da vontade das partes.
Contratos informais são aqueles para os quais a lei não impõe forma nenhuma. Podem ser
verbais, por sinais, por escrito ou por qualquer outra via não vedada em lei.
O importante é que a confluência das vontades dos contratantes ocorra.
A regra geral é que os contratos são informais (art. 107, CC).
Contratos formais são os que necessariamente adotar uma forma, sob pena de nulidade6 (art.
166, IV, CC). A forma pode ser imposta por força de lei, como nos casos de obrigatoriedade de: (1)
escritura pública para contratos relativos a direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 salários
mínimos (art. 108, CC); (2) forma escrita para o contrato de fiança (art. 819, CC); e (3) escritura pública
para o pacto antenupcial8 (art. 1.653, CC).
No quotidiano, a maior parte dos contratos são verbais e acabam sendo comprovados por conta da
emissão do documento fiscal (nota fiscal). A nota fiscal não é um contrato, mas apenas um mero meio de
prova escrita da existência de um contrato e, por isso, pode amparar uma ação monitória (art. 700,
CPC).

Não confunda contrato com forma.

A forma é apenas o modo de exteriorização de um contrato. Contrato é um ente invisível


constituído pelo acordo de vontades.
Em uma escritura pública, por exemplo, é possível haver a formalização de vários contratos, como um
contrato de compra e venda com um contrato de mútuo e um de alienação fiduciária em garantia. O
contrato não é a escritura! O contrato são os três entes invisíveis (compra e venda, mútuo e alienação
fiduciária em garantia) que se exteriorizaram em uma escritura pública.
3.2. Quanto à Natureza Jurídica Quanto à natureza jurídica, os contratos podem ser de direito
público ou de direito privado.

Os contratos de direito público são os registros pelas normas de Direito Público e envolvem entes
públicos em, pelo menos, um dos polos contratuais. 6
Nunca se esqueça de que, apesar da nulidade, é possível aplicar, em algumas situações, a
conversão substancial (art. 170, CC) ou a conversão formal (art. 183, CC) para aproveitar o acordo de
vontades, conforme já exposto na Parte Geral.
Lembre-se de que, no caso de contratos celebrados no exterior, aplica-se a lei estrangeira para
discipliná-lo, inclusive quanto à forma. Todavia, se esse contrato vier a ser executado no Brasil, a forma
deve ser a exigida pela lei brasileira.
Consideramos o pacto antenupcial como um contrato cuja eficácia depende da realização do
casamento (art. 1.653, CC.
Os contratos de direito privado são os regidos primordialmente por normas de direito privado.
Podem até haver ente da administração pública como parte, em casos de atos administrativos de
natureza nitidamente privada.
Os contratos de direito privado podem ser divididos em: (1) contrato civil: celebrado por sujeitos de
direito em geral; (2) contrato comercial, mercantil ou empresarial: em ao menos um dos polos, há um
sujeito que desempenha atividade empresarial, a exemplo da locação para fins comerciais com
instituição de um fundo de comércio ; (3) contrato de consumo: há consumidor como uma das partes.
3.3. Outras Classificações Também podemos classificar os contratos sob outras perspectivas,
como:
• quanto à obrigação das partes: contrato unilateral ou bilateral;
• quanto ao sacrifício patrimonial: contrato oneroso ou gratuito;
• quanto ao risco da prestação: contrato comutativo ou aleatório;
• quanto à negociação das partes: contrato paritário ou de adesão;
• quanto ao momento do cumprimento: contrato de execução instantânea, de execução diferida e
de execução continuada;
• quanto à designação da lei: contrato nominado ou inonimado;
• quanto à disciplina legal: contrato típico, atípico ou misto;
• quanto à independência do contrato: autônomo ou conexo.
Classificação quanto à Obrigação das Partes
2.1. Categorias Quanto à obrigação das partes envolvidas, os contratos podem ser classificados como
unilaterais, bilaterais e plurilateral, conforme haja obrigação apenas para uma ou para ambas as partes ou
para três ou mais partes.
Há quem mencione também os contratos plurilaterais para a hipótese de haver três ou mais partes
com obrigações; todavia, preferimos incluir essa categoria na de contrato bilateral.
O contrato unilateral é aquele que implica obrigação apenas para uma das partes, a exemplo do
contrato de doação, que só impõe obrigação ao doador.
O contrato de mútuo também é unilateral, pois só gera obrigação ao mutuário, que tem de restituir a
coisa.
É que, por ser um contrato real, o mútuo só se inicia com a entrega da coisa, de modo que o contrato
não gera obrigações ao mutuante.
Para a classificação em tela, não importa a quantidade de obrigações, e sim a quantidade de partes
que as possuem: se apenas uma parte tem uma ou mais obrigações, o contrato é unilateral.
O contrato bilateral ou sinalagmático é o que gera obrigação para ambas as partes, como no
contrato de compra e venda, em que o vendedor tem a obrigação de pagar o preço, e o comprador, a de
entregar a coisa.
O contrato plurilateral ocorre quando o contrato envolve três ou mais partes, todas recebendo uma
obrigação que se reverte em prol da realização de um fim comum.
A obrigação de uma das partes é uma contrapartida em relação às obrigações das demais partes: o
sinalagma é plurilateral. É o que ocorreria no contrato de seguro de vida em grupo, no de sociedade, no
de parceria empresarial e no de consórcio.
Entendemos que, nesses casos, todas as regras de contratos bilaterais devem ser aplicadas, no que
couber, pois a obrigação de cada parte é motivada pela contraprestação das demais.
Assim, por exemplo, temos que a exceptio non adimpleti contractus (art. 476 do CC) poderia ser
invocada. Há situações peculiares.
No caso da doação com encargo, o contrato continua sendo unilateral, pois só o doador possui obrigação
propriamente dita. O donatário não possui uma obrigação, e sim um encargo (um ônus), que não configura
uma contraprestação.
O ônus se distingue da obrigação, por ser um dever cujo descumprimento apenas acarreta a
perda de um direito pelo sujeito: o doador pode revogar a doação por inexecução do encargo (art. 555
do CC).
Já a obrigação autoriza meios coercitivos de cobrança e perdas e danos. Ademais, jamais se
poderia invocar a exceptio non adimpleti contractus para a doação com encargo, pois ela é estendida
apenas para contratos bilaterais (art. 476 do CC).
Há doutrinadores que preferem dizer que a doação com encargo é um contrato unilateral
imperfeito; todavia, temos por desnecessário esse adjetivo adicional, pois o ônus não é uma obrigação.
2.2. Utilidade
A principal utilidade prática na classificação quanto à obrigação das partes é a de que, apenas
nos contratos bilaterais (também, no que couber, nos plurilaterais), é viável a invocação da exceptio non
adimpleti contractus, da exceção de inseguridade e da quebra antecipada do contrato.
Vamos tratar da matéria.
Nos contratos bilaterais, o inadimplemento de uma das partes assegura à outra o direito de valer-se
da exceptio non adimpleti contractus (art. 476 do CC) ou de pleitear a resolução do contrato em razão do
fato de o inadimplemento ser uma condição resolutiva tácita (art. 475 do CC). Veja esses retrocitados
dispositivos:
Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do
contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer
dos casos, indenização por perdas e danos.
Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de
cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro.

A exceptio non adimpleti contractus é o direito de uma parte reter a prestação enquanto a outra não
cumprir a contraprestação. Há quem afirme que a exceptio non adimpleti contractus seja uma condição
resolutiva tácita dos contratos bilaterais.
Está implícito que a parte pode optar entre uma das seguintes opções: (1) valer-se da exceptio non
adimpleti contractus, que permite a parte reter a prestação e aguardar o outro contratante pagar a
contraprestação, caso em que o contrato será preservado; e (2) resolver o contrato em razão da
inadimplência, pois, nos contratos bilaterais, o inadimplemento é uma condição resolutiva tácita, a qual se
opera mediante interpelação judicial, conforme arts. 474 e 475 do CC.
Em qualquer um dos casos, a parte inadimplente será obrigada a adicionalmente pagar indenização
por danos sofridos pelo outro contratante. À luz da exceptio non adimpleti contractus, qualquer das partes
tem o direito de se recusar a cumprir a sua obrigação se a outra parte estiver inadimplente.
Não há necessidade de autorização judicial; trata-se de uma autotutela prevista no art. 476 do CC.
Esse direito de defesa (exceção!) é designado de exceptio non adimpleti contractus (exceção de
contrato não cumprido).
Se a parte inadimplente promover uma cobrança judicial, a outra parte poderá exitosamente
defender-se com base na exceptio non adimpleti contractus.
Igualmente, se a parte inadimplente se valer de outros meios coercitivos extrajudiciais – como uma
negativação do nome em cadastros de inadimplente –, esse ato pode ser tido por ilícito e, em
consequência, gerar dever de indenizar os danos morais que foram causados à parte.
Outrossim, a parte que se vale da exceptio non adimpleti contractus não estará em mora, pois
legitimamente está retendo a sua prestação, de modo que nenhum encargo moratório poderá ser-lhe
exigido.
No caso de uma das partes ter descumprido apenas parcialmente o contrato, a outra parte poderá
invocar a exceção de contrato não cumprido proporcionalmente à parte inadimplente. Se, por exemplo,
um serviço de empreitada foi prestado em 60%, o dono da obra pode pagar apenas 60% do preço e reter
o restante enquanto a empreitada não for completada.
Esse direito de defesa parcial é designado de exceptio non rite adimpleti contractus ou de exceção
de contrato parcialmente descumprido.
É evidente que, nesse caso de inadimplemento parcial de um contratante, a outra parte pode optar
pela resolução do contrato no lugar de valer-se da exceptio non rite adimpleti contractus.
Como a exceptio non adimpleti contractus é uma autotutela, a parte que dela se serve não precisa
de decisão judicial. Todavia, ela está a assumir o risco da sua avaliação.
Se, futuramente, em ação judicial, a outra parte comprovar que não havia inadimplemento algum e
que, portanto, o uso da exceptio non adimpleti contractus foi ilegítimo, a parte terá de arcar com todos os
encargos decorrentes da mora: o risco é dela
Exceções: Cláusula Solve et Repete por Lei ou por Vontade A exceptio non adimpleti contractus e
a condição resolutiva tácita consistente no inadimplemento podem ser afastadas quando for aplicável a
cláusula solve et repete (em tradução livre, pague e, depois, peça de volta).
Essa cláusula pode decorrer de vontade das partes ou de lei.
De um lado, havendo pacto expresso no contrato contemplando essa cláusula, a parte será
obrigada a cumprir a sua obrigação mesmo se a outra estiver inadimplente, assegurado, porém, o direito
de, no futuro, pleitear eventual devolução do valor pago.
Em relações civis em geral, essa cláusula é plenamente válida, mas, em nome da vedação ao
abuso de direito (art. 187 do CC), é preciso censurar pactos eventualmente extravagantes, como a que
ocorreria se uma parte fosse hipossuficiente e fosse privado de exercer a repetição de indébito em
qualquer momento.
Já em relações de consumo, o art. 51 do CDC considera nulas cláusulas que exponha o
consumidor em extrema desvantagem, de sorte que, a depender do contrato, a cláusula solve et repete
pode vir a ser declarada nula. É preciso analisar cada caso concreto.
De outro lado, a cláusula solve et repete pode decorrer lei expressa ou, até mesmo, de princípios
jurídicos, como os da vedação ao abuso de direito e os do contraditório (todos têm direito a defender-se
previamente a uma sanção).
Em contratos de prestação de serviços educacionais, o atraso na mensalidade escolar não autoriza o
emprego da exceptio non adimpleti contractus pela escola durante o período letivo, mas ela deverá tolerar
a frequência do aluno até o final desse período (art. 6º, § 1º, da Lei n. 9.870/1999, que disciplina o valor
total das anuidades escolares).
Trata-se de um exemplo de cláusula solve et repete com previsão legal.
Há outros casos de cláusula solve et repete oriunda de princípios jurídicos. Ex.: o hospital não pode
interromper a internação de um paciente que se tornou inadimplente, pois a proteção da vida é valor
superior ao interesse patrimonial da cobrança.
Consideramos que, em cursos de idiomas que funcione com aulas divididas em ciclos de
aprendizados (os vulgos “módulos” ou “níveis”), há implícita uma cláusula solve et repete a impedir a
suspensão do aluno inadimplente no curso das aulas de um dos ciclos, tudo em nome da vedação ao
abuso de direito.
O art. 6º, § 1º, da Lei n. 9.870/1999, poderia ser aplicado por analogia a esse caso.
EXCEÇÃO DE IRREGULARIDADE

Conforme art. 477 do CC, se, por um fato superveniente, o cumprimento da prestação por uma das
partes no vencimento tornar-se duvidoso, o outro contratante poderá defender-se (exceção = defesa)
dessa insegurança, retendo a sua contraprestação enquanto a outra não prestar uma garantia ou não
adimplir a prestação.
Trata-se da “exceção de inseguridade”, que é uma espécie de “medida cautelar da exceptio non
adimpleti contractus”, pois assegura ao contratante precaver-se de uma provável inadimplência futura da
outra parte.
Veja o referido dispositivo:
Art. 477. Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das partes
contratantes diminuição em seu patrimônio capaz de comprometer ou tornar
duvidosa a prestação pela qual se obrigou, pode a outra recusar-se à
prestação que lhe incumbe, até que aquela satisfaça a que lhe compete ou
dê garantia bastante de satisfazê-la.
O fato superveniente que inspira dúvida legítima ao outro contratante não é necessariamente
uma redução do patrimônio, como sugere o texto do art. 477 do CC. Qualquer outro fato superveniente
pode ser invocado, se seriamente inspirar desconfiança acerca da solvência futura do contratante.
O dispositivo deve ser interpretado extensivamente, como ensina o Enunciado n. 438/JDC: “A
exceção de inseguridade, prevista no art. 477, também pode ser oposta à parte cuja conduta põe,
manifestamente em risco, a execução do programa contratual”.
Se, por exemplo, uma pessoa, em janeiro, compra uma pacote de viagem em dezembro para
Las Vegas e parcela o pagamento em 12 parcelas mensais, ela poderá suspender o pagamento das
prestações se, em julho, tomar ciência que a agência de turismo contratante está descumprindo
sistematicamente o contrato com outros clientes que adquiriram similares pacotes de viagem.
Outro exemplo: o vendedor de um carro de luxo pode reter o bem até receber uma garantia ou o
pagamento se, perto da entrega do bem, tomar ciência de que o comprador sofreu uma grave quebra
financeira, como no caso de um comprador que seja uma sociedade anônima com ações que tenham
sofrido uma grave queda de valor na Bolsa de Valores.
Há outros casos específicos de exceção de inseguridade.
Por exemplo, o art. 495 do CC prevê uma “exceção de inseguridade” especificamente para os casos
de contratos de compra e com pagamento a prazo, estabelecendo que o vendedor pode reter a entrega da
coisa até receber uma caução por parte do comprador que veio a cair em insolvência.
Outro exemplo é o art. 590 do CC, que autoriza o mutuante a exigir uma garantia do mutuário cuja
situação econômica sofreu notório decréscimo.
QUEBRA ANTECIPADA DO CONTRATO
Se, por um fato superveniente, o adimplemento da prestação por uma parte no vencimento se tornar
impossível, o outro contratante poderá resolver o contrato precocemente.
O inadimplemento já está configurado antes mesmo do vencimento diante do fato de que, após a
celebração do contrato, sobreveio um fato que tornou impossível o cumprimento futuro da prestação.
É desnecessário que o credor aguarde o prazo pactuado para o adimplemento da obrigação,
quando há fatos inequívocos que demonstram a inviabilidade de seu cumprimento pelo devedor.
Esse direito é designado de “quebra antecipada do contrato” e foi importado do sistema do common
law.
Se o fato superveniente decorrer de culpa de uma parte, caber-lhe-á responder por todas as
consequências da resolução contratual, como o dever de pagar indenização por perdas e danos.
Se, porém, o fato não for de culpa de uma das partes, não haverá dever de indenizar em razão do
caso fortuito.
Ressalva-se que, na hipótese de responsabilidade civil objetiva, é irrelevante a existência de culpa:
a parte terá de indenizar os danos mesmo se não tiver havido culpa, salvo se o caso fortuito puder ser
considerado alheio ao risco da atividade (fortuito externo).
Se, por exemplo, alguém compra um apartamento na “planta” para ser entregue em dezembro do
próximo ano, o comprador poderá resolver antecipadamente o contrato por inadimplemento precoce da
incorporadora na hipótese de ser constatado que, no mês de setembro do próximo ano, as obras de
construção sequer foram iniciadas.
Nesse caso, é impossível que a incorporadora consiga, em poucos meses, concluir a construção,
razão por que o comprador pode, desde logo, reclamar a resolução contratual por inadimplência da
incorporadora.
Consideramos que o fato superveniente pode ser qualquer evento que contrarie aquilo que
legitimamente se espera da parte.
Nesse contexto, havendo a queda de um avião por falha mecânica de uma companhia aérea,
tenho que os consumidores que já haviam comprado passagens para momento posterior podem pedir a
resolução do contrato por um fato superveniente que rompeu a legítima expectativa dos consumidores.
O cumprimento da prestação (= transporte aéreo com segurança) no futuro pode ser tido como
impossível para esse efeito, de modo a autorizar a quebra antecipada do contrato.
Não nenhuma garantia que a companhia aérea poderia oferecer para proteger a vida dos
consumidores. Faça-se uma ressalva. Há divergências doutrinárias acerca das consequências do
inadimplemento antecipado.

3. Quanto ao Sacrifício Patrimonial das Partes


3.1. Categorias
Levando em conta o sacrifício patrimonial das partes, os contratos podem ser classificados em
gratuito, oneroso e bifronte.
Os contratos gratuitos ou benéficos são aqueles em que uma parte faz um sacrifício patrimonial sem
buscar qualquer proveito patrimonial. Esse sacrifício patrimonial pode consistir não apenas em perda
de um bem, mas também na utilização do seu tempo e do seu talento para prestar um serviço ou na
abstinência pessoal para cumprir uma obrigação de não fazer.
Nesse contrato, há uma parte que não está tendo proveito econômico algum, embora sofra um
desfalque patrimonial: trata-se de um “generoso”.
Um exemplo é o contrato de doação, em que o doador tem um sacrifício patrimonial sem almejar
qualquer proveito econômico.
Os contratos onerosos são aqueles em que uma parte faz um sacrifício patrimonial em busca de um
proveito econômico.
Esse proveito econômico pode ser predeterminado (contrato oneroso comutativo) ou pode depender
de um evento futuro e incerto (contrato oneroso aleatório).
Nesse contrato, não há um generoso; a parte tem interesse em obter proveito patrimonial com o seu
sacrifício.
Um exemplo é o contrato de compra e venda, em que o vendedor sacrifica um bem, transferindo-o
ao comprador, em busca de receber o preço: não há como vender um imóvel sem cobrar um preço, sob
pena de haver aí uma doação, e não uma venda.
O contrato bifronte é aquele que pode ser gratuito ou oneroso, a depende da vontade das partes.
Ex.: o contrato de mútuo – empréstimo de coisa fungível – pode ser gratuito ou oneroso.
Se um amigo empresta um dinheiro sem cobrar juros remuneratórios, tem-se mútuo gratuito; se,
porém, ele exige a restituição do dinheiro acrescido de juros, ter-se-á um mútuo gratuito.
Isso não acontece com o empréstimo de coisa infungível, pois, se este for oneroso, ter-se-á um
contrato de locação (art. 565 do CC) e, se ele for gratuito, haverá contrato de comodato (art. 579 do CC).
Em geral, os contratos onerosos são bilaterais, e os contratos gratuitos são unilaterais.
No caso de doação com encargo (= com modal, modal, com ônus ou onerosa), há um contrato
oneroso até o valor do encargo e um contrato gratuito no excedente ao valor do encargo.
De fato, na doação modal, o doador faz um sacrifício patrimonial, mas almeja obter, para si ou para
outrem, um proveito econômico.
Esse proveito econômico consiste em um dever assumido pelo donatário em dar, fazer ou não fazer
algo com a ameaça de perder a eficácia da doação no caso de descumprimento do dever.
Não há uma generosidade propriamente dita razão por que a doação com encargo é um contrato
oneroso até o limite do valor do encargo, mas será contrato gratuito no que exceder o valor do encargo.
Ex.: doação de um carro sob o encargo de o donatário levar o filho do doador para escola
diariamente por dois anos.
Se o valor desse serviço de transporte for estimado em 20% do valor do carro doado, tem-se que
20% do contrato de doação é oneroso, e os 80% restantes serão gratuitos.
E há consequência prática nisso, pois alguns institutos reservados apenas para contratos onerosos,
como a evicção e os vícios redibitórios, serão aplicados para as doações onerosas até o limite do valor
do encargo.
Essa é a lógica do art. 540 do CC.
3.2. Utilidades Proteção, sem Prestígio, do “Parasita” (do Obsequiado)
Parasita aí é o beneficiário de um negócio gratuito, ou seja, é aquele que recebe um favor, uma
generosidade, um obséquio (é o obsequiado).
Trata-se do que batizamos de princípio da proteção simplificada do agraciado.
Esse princípio é essencial para você “memorizar” vários casos concretos que são cobrados em
concursos públicos.
Ao classificar o contrato como gratuito, aplica-se a lógica de justiça da “proteção, sem prestígio, do
obsequiado”.
Com suporte na função social e na boa-fé objetiva, o Direito protege os beneficiários de atos
gratuitos, mas não lhes dá prestígio, salvo se houver algum outro relevante motivo, como o mínimo
existencial (ex.: beneficiários de programas assistenciais do governo).
Os obsequiados, que são esses destinatários da liberalidade, têm de ser protegidos, mas não
podem ser prestigiados.
O ditado popular já ensina: “a cavalo dado não se olham os dentes”.
Isso expressa um princípio geral de direito segundo o qual os contemplados por liberalidades não
podem exigir o mesmo prestígio daqueles que obtêm vantagens mediante sacrifícios patrimoniais (atos
onerosos).
Eles não podem ter a legítima expectativa de que a generosidade terá qualidade; não têm direito a
caprichos. Sob a perspectiva da função social, o estímulo do Direito deve ser em prol da proliferação de
posturas de audácia na produção e na circulação de riquezas, e não em favor da ociosidade da
dependência de assistencialismo.
A proteção jurídica, porém, deve ser dada às liberalidades, pois elas também desempenham papel
relevante na sociedade; todavia, essa proteção não deve carregar o prestígio que se confere aos atos
onerosos.
A exasperação na proteção das liberalidades também poderá gerar um efeito indesejado: o
desestímulo à realização de liberalidades, pois os generosos, diante das obrigações e dos riscos que
haverão de assumir, tenderão a recuar em manifestar suas benemerências.
O Direito não pode tornar a generosidade muito arriscada ao generoso.
Dessa lógica de justiça de que o direito protege a gratuidade sem prestígios, decorrem diversas
disposições legais.
Essa lógica deve servir também como guia interpretativo e como auxílio no preenchimento de
lacunas legais.
Vamos ver alguns exemplos da aplicação dessa lógica de justiça.
CASO DE FRAUDE CONTRA CREDORES

Na caracterização da fraude contra credores, o consilium fraudis é dispensado diante de negócios


gratuitos, pois, entre prestigiar o beneficiário de uma liberalidade e os credores, o direito prefere prestigiar
estes últimos diante da função social (art. 158 do CC).

CASO DE INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA

Negócios gratuitos devem ser interpretados restritivamente, pois seria injusto, ao permitir que o
beneficiário de uma liberalidade adote interpretações extensivas, isso prejudicaria o generoso (art. 114 do
CC).
FORMALIDADES PARA NEGÓCIOS GRATUITOS

O fato de a liberalidade somente trazer ônus ao generoso exige que ela se exteriorize por uma
forma que assegure, ao máximo, certeza do seu ânimo. O beneficiário da liberalidade não é
prestigiado do ponto de vista formal, razão por que a legislação se inclina – há exceções! – a
considerar os negócios jurídicos gratuitos solenes, como a fiança e a doação, que devem ser escritas
(arts. 541 e 819 do CC)

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