Você está na página 1de 226

1

DIREITO CONSTITUCIONAL

SUMÁRIO

1. EDITAL DO INSS EM DIREITO CONSTITUCIONAL


1.1. Temas de Direito Constitucional no edital do INSS
1.2. Dicas para seu estudo

2. TEORIA GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS


2.1. Noção geral
2.2. Distinção entre direitos e garantias fundamentais
2.3. Dimensões dos direitos fundamentais (e humanos)
2.4. Características dos direitos fundamentais
2.5. Sujeitos passivos dos direitos fundamentais (eficácia)
2.6. Revisão do tema
2.7. Questões CEBRASPE no tema

3. DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS


3.1. Incisos do art. 5º da Constituição Federal
3.1.1. Direito à vida
3.1.1.1. Âmbito de proteção
3.1.1.2. Mitigações do direito à vida
3.1.2. Princípio da igualdade
2

3.1.3. Princípio da legalidade civil


3.1.4. Princípio da liberdade de manifestação do pensamento e vedação à
censura
3.1.4.1. Pontos importantes e leading cases sobre a liberdade de
pensamento
3.1.5. Direito à privacidade
3.1.5.1. Leading cases sobre a privacidade
3.1.6. Inviolabilidade de domicílio
3.1.6.1. Mitigações à inviolabilidade de domicílio
3.1.6.2. Pontos importantes sobre a inviolabilidade de domicílio
3.1.7. Direito ao sigilo (liberdade de comunicação pessoal)
3.1.7.1. Pontos importantes sobre a quebra judicial do sigilo
3.1.8. Direito de reunião
3.1.8.1. Pontos importantes sobre o direito de reunião
3.1.8.2. Leading cases sobre o direito de reunião
3.1.9. Direito de associação
3.1.9.1. Pontos importantes sobre o direito de associação
3.1.10. Direito de propriedade e função social da propriedade
3.1.10.1. Função social da propriedade
3.1.11. Livre acesso à informação (liberdade de informação)
3.1.12. Princípio da inafastabilidade da jurisdição
3.1.12.1. Justiça condicionada (ou instância administrativa de curso
forçado)
3.1.12.1. Situações sui generis de acesso à justiça
3.1.13. Garantia de estabilidade das relações jurídicas (segurança
jurídica)
3

3.1.13.1. Fenômenos decorrentes da segurança jurídica direito


adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada
3.1.14. Mandados de criminalização
3.1.15. Princípio do devido processo legal
3.2. Parágrafos do art. 5º da Constituição Federal
3.2.1. Aplicação imediata dos direitos fundamentais
3.2.2. Princípio da não taxatividade (ou não tipicidade) dos direitos
fundamentais
3.2.3. Hierarquia dos tratados internacionais
3.2.3.1. Conclusões importantes sobre o art. 5, § 3º, da CF
3.2.4. Tribunal Penal Internacional
3.3. Revisão do tema
3.4. Questões CEBRASPE no tema

4. REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS
4.1. Habeas corpus (art. 5º, LXVIII da CF)
4.1.1. Espécies de habeas corpus
4.1.2. Pontos importantes do habeas corpus
4.2. Habeas data (art. 5º, LXXII da CF e Lei nº 9.507/97)
4.2.1. Hipóteses de cabimento do habeas data
4.2.2. Pontos importantes do habeas data
4.3. Mandado de injunção (art. 5º, LXXI da CF e Lei nº 13.300/2016)
4.3.1. Pontos importantes do mandado de injunção
4.4. Ação popular (art. 5º, LXXIII, da CF e Lei nº 4.717/1965)
4.4.1. Legitimidade ativa da ação popular
4.4.2. Finalidade: defesa de direitos transindividuais ou difusos
4

4.4.3. Pontos importantes da ação popular


4.5. Ação civil pública (art. 129, III, da CF e Lei nº 7.347/1985)
4.5.1. Legitimados ativos da ação civil pública
4.5.2. Pontos importantes da ação civil pública
4.6. Mandado de segurança (art. 5º, LXIX e LXX, da CF e Lei nº 12.016/2009)
4.6.1. Pontos importantes do mandado de segurança
4.7. Direito de petição (art. 5º, XXXIV, a, da CF)
4.7.1. Pontos importantes do direito de petição
4.8. Direito de certidão (art. 5º, XXXIV, b, da CF)
4.9. Revisão do tema
4.10. Questões CEBRASPE no tema

5. DIREITOS SOCIAIS
5.1. Noção geral e conceito
5.2 Natureza jurídica
5.3. Surgimento na história constitucional
5.4. Objetivo dos direitos sociais
5.5. Dimensões do princípio da igualdade
5.6. Mínimo existencial x reserva do possível: "escolhas trágicas"
5.7. Vedação ao retrocesso social
5.8. Direitos sociais em espécie presentes no art. 6º da CF
5.9. Programa permanente de transferência de renda (direito à renda básica)
5.10. Demais direitos sociais presentes nos arts. 7º a 11 da CF
5.10.1. Rol dos direitos trabalhistas (tabela comparativa)
5.10.2. Representante dos trabalhadores (número exato)
5.11. Revisão do tema
5

5.12. Questões CEBRASPE no tema

6. NACIONALIDADE
6.1. Noção geral e conceito
6.2. Espécies (ou tipos) de nacionalidade
6.3. Modos de aquisição da nacionalidade originária
6.4. Modos de aquisição da nacionalidade secundária
6.5. Modos de aquisição da nacionalidade originária na CF/88
6.6. Modos de aquisição da nacionalidade secundária na CF/88
6.7. Distinção entre brasileiros natos e brasileiros naturalizados
6.8. Perda da nacionalidade
6.10. Idioma e símbolos da República Federativa do Brasil
6.11. Revisão do tema
6.12. Questões CEBRASPE no tema

7. DIREITOS POLÍTICOS
7.1. Noção geral
7.2. Classificação dos direitos políticos
7.3. Direitos políticos positivos ativos
7.4. Direitos políticos positivos passivos
7.5. Direitos políticos negativos
7.6. Consultas populares no período das eleições municipais
7.7. Perda e suspensão dos direitos políticos
7.8 Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME)
7.9. Princípio da anualidade eleitoral
6

7.10. Revisão do tema


7.11. Questões CEBRASPE no tema

8. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
8.1. Noção geral
8.2. Princípios administrativos
8.3. Tratamento constitucional da administração pública
8.4. Exercício de mandato pelo servidor público
8.5. Regime jurídico do servidor público
8.5.1. Remuneração dos servidores públicos
8.5.2. Previdência dos servidores públicos
8.6. Estabilidade constitucional e perda do cargo público
8.7. Revisão do tema
8.8. Questões CEBRASPE no tema

⮚ CAPÍTULO 1 – EDITAL DO INSS EM DIREITO CONSTITUCIONAL


7

1.1. Temas de Direito Constitucional no edital do INSS

Olá, futuro(a) Técnico(a) do Seguro Social, seu edital em Direito Constitucional


contempla - de modo mais inteligível - os seguintes temas:

1) Direitos e garantias fundamentais: teoria geral.


2) Direitos e deveres individuais e coletivos: art. 5º da CF.
3) Direitos sociais: arts. 6º a 11 da CF.
4) Nacionalidade: arts. 12 e 13 da CF.
5) Direitos Políticos: apesar do edital mencionar "garantias dos direitos políticos"
fica implícita a cobrança dos arts. 14 a 16 da CF.
6) Garantias constitucionais: remédios constitucionais do art. 5º da CF.
7) Administração pública: arts. 37 a 41 da CF/88.

Analisaremos cada um destes tópicos, individualmente, nos Capítulos


seguintes.

1.2. Dicas para seu estudo: o perfil da CEBRASPE em direito constitucional

Ainda que seu concurso seja para nível médio, é esperado que a CEBRASPE,
nas matérias jurídicas, cobre algum entendimento jurisprudencial nas questões.

Por este motivo, nosso PDF em Direito Constitucional cobrirá toda parte
doutrinária e jurisprudencial correlata ao seu edital - visando abordar os temas
acima de modo bastante completo.
8

A teoria abordada neste PDF tem como referência meu livro de Direito
Constitucional, publicado pela editora Rideel. Trata-se do volume 1 da Coleção
amo Direito - deixarei no rodapé a indicação bibliográfica se precisar1.

Vamos lá!

⮚ CAPÍTULO 2 – TEORIA GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

2.1. Noção geral

Seu edital, no INSS, menciona tão somente "Direitos e Garantias


Fundamentais". Contudo, conhecendo o perfil CEBRASPE de organizar provas,
é possível que alguma questão de Direito Constitucional cobre a teoria que
ampara o Título II da Constituição Federal.

É por isto que estudaremos o ponto "Teoria Geral dos Direitos Fundamentais",
com foco no perfil da sua banca. Vamos lá!

Direitos fundamentais representam o conjunto de normas que garantem a


convivência pacífica e digna dos indivíduos em uma sociedade. Eles revelam

1
BARONOVSKY, Uadi Lammêgo. Direito constitucional. São Paulo: Rideel, 2022.
9

um conjunto de direitos jusfundamentais que deverão ser observados não


apenas pelo Estado, mas também pelos particulares entre si.

❖ Importante para a sua prova: o Título II representa o tema de maior


incidência em seu concurso. Dentro do art. 5º da Constituição Federal
encontramos temas de direito penal, direito processual penal, direito civil, direitos
humanos. O Título II da Constituição, por sua vez, abrange os seguintes
Capítulos:

▪ Direitos e Deveres Individuais e Coletivos (art. 5º)


▪ Direitos Sociais (arts. 6º a 11)
▪ Nacionalidade (arts. 12 e 13)
▪ Direitos Políticos (arts. 14 a 16)
▪ Partidos Políticos (art. 17)

De modo simples, os Direitos e Garantias Fundamentais representam o gênero,


que possuem como espécies os direitos reconhecidos entre os arts. 5º a 17. O
esquema abaixo ilustra a taxonomia (natureza jurídica) dos direitos
fundamentais.
10

2.2. Distinção entre direitos e garantias fundamentais

a) Direitos fundamentais: são os próprios bens essenciais conferidos aos


indivíduos. Representam um fim em si mesmo - ex.: liberdade de locomoção,
liberdade de expressão, liberdade religiosa, direito à vida etc.

b) Garantias fundamentais: são as ferramentas jurídicas que asseguram a


proteção e efetivação dos direitos fundamentais. Ou seja, representam o meio
e não um fim em si mesmo - exs.: contra a violação da liberdade de locomoção
(direito fundamental) caberá o habeas corpus (garantia fundamental); contra a
violação à liberdade de expressão (direito fundamental), caberá à vedação à
censura (garantia fundamental).
11

2.3. Dimensões dos direitos fundamentais (e humanos)

Trata-se da célebre classificação realizada pelo tcheko-francês Karel Vasak em


1979.

De início, cabe uma observação: as expressões "dimensões", "gerações",


"fases" são sinônimas e são indistintamente utilizadas pela doutrina e provas
de concurso.

É possível, então, listar três dimensões dos Direitos Fundamentais (ou


Humanos):

a) Primeira dimensão: representam os direitos civis e políticos. Nesta


dimensão tutela-se a liberdade do indivíduo, impondo uma abstenção ao
Estado. Daí ser chamada de liberdade negativas, liberdades clássicas ou
liberdades formais.

Tudo que imaginamos hoje sobre "liberdade" decorre desta fase: liberdade de
locomoção, liberdade religiosa, liberdade política, liberdade de imprensa.

Esta dimensão apresenta um caráter negativo, pois impõe um não fazer /


abstenção ao Estado em prol das liberdades individuais. Por isto, esta
dimensão é chamada de direitos negativos. Alguns autores também a chamam
de direitos humanos azuis2.

2
Terminologia empregada por Costas Douzinas em "O fim dos direitos humanos".
12

b) Segunda dimensão: representam os direitos sociais, econômicos e


culturais. Nesta dimensão tutela-se a igualdade do indivíduo, impondo
prestações pelo Estado. Daí ser chamada de liberdade positivas.

Esta dimensão visa garantir a igualdade material dos indivíduos. Em razão de o


Estado fornecer prestações / direitos promocionais, a doutrina diz que esta
dimensão apresenta um caráter positivo. São, portanto, os chamados direitos
positivos. Também é chamada de direitos humanos vermelhos.

c) Terceira dimensão: representam os direitos transindividuais. Nesta


dimensão tutela-se a fraternidade entre os indivíduos, tal como os direitos
difusos e coletivos.

Até a segunda dimensão, a preocupação era o indivíduo em si (liberdade e


igualdade). Nesta dimensão, a preocupação alcança toda sociedade,
nomeadamente os bens difusos, que pertencem indistintamente a todos.

Como exemplo desta dimensão, é possível citar os direitos ambientais. Uma


geração não poderá esgotar todos os recursos presentes, sob pena de tolher o
direito de as próximas gerações também desfrutarem dele (dever de
solidariedade intergeracional). Espera-se sempre uma evolução das próximas
gerações. Por conseguinte, também é denominada de direitos humanos verdes.

Pois bem.
13

Para facilitar a memorização das três dimensões dos direitos humanos, guarde o
seguinte processo mnemônico: L.I.F.

L iberdade
I gualdade
F raternidade

Dimensões dos Direitos Fundamentais / Humanos


1ª Dimensão Direitos civis e políticos 🡪 Liberdade
2ª Dimensão Direitos sociais, culturais e econômicos 🡪 Igualdade
3ª Dimensão Direitos transindividuais 🡪 Fraternidade

As dimensões subsequentes (4ª, 5ª, 6ª...) não são unânimes e possuem


relevância apenas para as provas dissertativas e/ou orais. Se cobradas em uma
prova objetiva, fatalmente a questão seria anulada.

2.4. Características dos direitos fundamentais

É possível que a CEBRASPE cobre entre os termos de uma assertiva as


características dos Direitos Fundamentais. Vejamos sete delas:

a) Historicidade: os direitos fundamentais não surgiram da noite para o dia. Ao


contrário, eles decorrem de uma longa evolução no tempo, pois nascem
conforme as necessidades humanas.
14

b) Universalidade: os direitos fundamentais ultrapassam as fronteiras


territoriais de cada País e beneficiam indistintamente qualquer ser humano.
Vale dizer, todos os seres humanos são titulares dos direitos fundamentais,
independentemente do sexo, raça, origem, idade, religião.

▪ Segundo o texto do caput do art. 5º da Constituição Federal, o turista é


titulares dos direitos fundamentais no Brasil? Resposta: não.

Embora a resposta cause espanto, trata-se de uma pegadinha clássica de


concurso. A interpretação gramatical do art. 5º, caput, da Constituição diz que
apenas os brasileiros e os estrangeiros residentes no País gozam dos
direitos individuais e coletivos catalogados no art. 5º da Lei Maior. Confira:

Art. 5º, caput, CF - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País
a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes.

Obviamente que se trata de uma interpretação absurda, pois parte de um


equívoco cometido pela redação constitucional. Em verdade, o STF e a doutrina
conferem interpretação extensiva ao art. 5º, caput, pois o legislador
constituinte disse menos do que queria dizer. Por esta razão, estão protegidos
pelos direitos fundamentais não apenas os brasileiros e estrangeiros residentes
no País, mas também os estrangeiros não residentes (os turistas).

Os direitos fundamentais existem para proteger os seres humanos globalmente,


não fazendo sentido que os ordenamentos domésticos dos Países
15

discriminassem o estrangeiro não residente. Isso não impede, contudo, que a


própria Constituição estabeleça distinções entre brasileiros natos e
naturalizados - como ocorre, por exemplo, com o art. 12, § 3º (cargos privativos
de brasileiros natos).

❖ Observação: tome cuidado com a forma da pergunta no concurso. Se


indagarem "nos termos expressos pelo caput do art. 5º da CF/88", o estrangeiro
não residente (turista) não estaria incluído. Mas, se a questão indagar sobre a
doutrina, jurisprudência ou não restringir aos termos literais da Constituição,
inclua também o turista.

Em suma, é possível que este tema lhe seja perguntado de três formas distintas:

Titularidade dos Direitos Fundamentais


"Segundo a Constituição..." Só brasileiros e
estrangeiros residentes
Todos (brasileiros,
"Segundo a doutrina ou a jurisprudência..." estrangeiros residentes e
estrangeiros não residentes)
Todos (brasileiros,
Se não discriminar, marque o mais completo estrangeiros residentes e
estrangeiros não residentes)

c) Irrenunciabilidade: os direitos fundamentais podem deixar de ser exercidos,


mas o indivíduo jamais poderá abrir mão de sua titularidade - ex.: é possível
que um indivíduo renuncie temporariamente ao seu direito de privacidade para
16

participar de um reality show, mas não poderá renunciar da titularidade deste


direito ad aeternum.

d) Inalienabilidade: traz uma ideia parecida com a característica anterior. Por


não possuírem conteúdo econômico, os direitos fundamentais não podem ser
comercializados. Isto não significa que os direitos fundamentais não possam ter
repercussões patrimoniais, como no caso do artista que cede seu direito de
imagem.

e) Imprescritibilidade: justamente por não ter conteúdo patrimonial ou


econômico, o eventual não exercício dos direitos fundamentais não retiram eles
da esfera jurídica do indivíduo. Vejamos um exemplo: o art. 12, I, c, parte final,
CF diz que o indivíduo nascido no estrangeiro, de pai ou de mãe brasileira, que
vier a residir no Brasil poderá optar, em qualquer tempo, depois de atingida a
maioridade, pela nacionalidade brasileira. Não há prazo para que ele exerça
esse direito potestativo. Noutras palavras, este direito não prescreve.

f) Não taxativos: prega que o rol de direitos fundamentais é exemplificativo,


pois se não exclui outros advindos de Tratados Internacionais que o Brasil seja
parte e/ou da interpretação. O rol de direitos fundamentais, portanto, é
meramente exemplificativo (ou não taxativo). Isto está previsto, inclusive, no
art. 5º, § 2º, da Constituição Federal.

g) Relatividade (ou Limitabilidade): decerto, é a característica mais cobrada


dentre todas. Ela traz a lição clássica de que não existem direitos
fundamentais absolutos. Se nem mesmo o direito à vida é um direito absoluto -
haja vista, por exemplo, à legítima defesa -, nenhum outro o será.
17

Isto decorre do fenômeno denominado convivência das liberdades públicas,


que prega que os direitos convivem entre si e, portanto, devendo ser
harmonizados no caso concreto. É por esta razão que a doutrina clássica nega
a existência de direitos fundamentais absolutos.

❖ Observação: até hoje, a quase totalidade das provas de concurso


cobraram este entendimento: os direitos fundamentais são relativos, sendo
incogitáveis direitos fundamentais absolutos. Este pensamento ainda prevalece
na doutrina clássica. Contudo, isto vem sendo relativizado pela doutrina
contemporânea. Autores como Norberto Bobbio e Virgílio Afonso da Silva
sustentam a existência de alguns direitos fundamentais absolutos, ou seja, que
não admitiriam mitigações. Por exemplo:

▪ Direito de não ser torturado


▪ Direito de não ser escravizado
▪ Direito de o brasileiro nato não ser extraditado
▪ Direito de não ser compulsoriamente associado

Para Virgílio diz que a ideia de não existir direitos fundamentais absolutos é
absolutamente equivocada. O autor critica a posição consolidada na
jurisprudência do STF e aponta que, embora a maioria dos direitos fundamentais
não seja absoluto, há alguns exemplos que mostram o contrário (como os
quatro direitos fundamentais citados anteriormente).3

3
SILVA, Virgílio Afonso da. Direito constitucional brasileiro. São Paulo: Editora da Universidade
de São Paulo, 2021. p. 117.
18

Um alerta: trata-se de um tema muito novo e ainda em debate na doutrina.


Apenas utilize esta nova corrente (que prega a existência de alguns direitos
absolutos) se expressamente cobrado / ressaltado pelo enunciado.

2.5. Sujeitos passivos dos direitos fundamentais (eficácia)

Tradicionalmente, os direitos fundamentais surgiram para proteger o indivíduo


contra os arbítrios e opressões estatais. Trata-se da clássica teoria da eficácia
vertical dos direitos fundamentais.

E entre os particulares? Os direitos fundamentais incidiriam?

Há quatro correntes sobre o tema:


19

a) Teoria da ineficácia horizontal dos direitos fundamentais / state action:


nega a produção de efeitos dos direitos fundamentais nas relações entre
particulares, pois a ideia de direitos fundamentais seria exclusiva da relação
Estado X Particular. É a corrente adotada, por exemplo, nos Estados Unidos.

b) Teoria da eficácia horizontal indireta dos direitos fundamentais: diz que a


incidência dos direitos fundamentais nas relações entre particulares aniquilaria a
autonomia privada. Por esta razão, caberia ao legislador a tarefa de mediar a
aplicação dos direitos fundamentais. Em outras palavras, esta teoria reconhece
a eficácia dos direitos fundamentais entre particulares, mas exige uma lei
expressamente determinando tal incidência. É a corrente, por exemplo, adotada
na Alemanha.

c) Teoria da eficácia horizontal direta dos direitos fundamentais: prega a


incidência direta dos direitos fundamentais entre particulares,
independentemente de qualquer intermediação legislativa. Ou seja, os direitos
fundamentais deveriam ser observados não apenas pelo Estado, mas também
por todos os particulares. Não é só. Caberia, ainda, ao Estado zelar para que
terceiros não violassem os direitos fundamentais. É a corrente adotada no
Brasil, Portugal e Espanha. Vários exemplos a ilustram: direito de ampla
defesa e contraditório em uma associação civil (art. 5º, LV); inviolabilidade
domiciliar perante outros particulares (art. 5º, XI); impetração de habeas corpus
contra um hospital que tolhesse a alta médica até o pagamento das despesas
hospitalares (art. 5º, LXVIII).
20

Mais recentemente, contudo, os concursos vêm cobrando uma nova corrente,


que pode ser resumida pelo seguinte desenho:

d) Teoria da eficácia diagonal dos direitos fundamentais: disciplina a relação


dos direitos fundamentais entre particulares desiguais, ou seja, analisa
especificamente as relações particulares assimétricas. Para alguns autores,
esta corrente seria mero desdobramento da corrente anterior. Já para outros,
seria uma terceira eficácia dos direitos fundamentais (ao lado da vertical e
horizontal). São exemplos da eficácia diagonal: relações consumeristas e
relações trabalhistas. Em ambas, vislumbram-se particulares em níveis
hierárquicos distintos, pois é evidente que o fornecedor e o empregador são
mais fortes que o consumidor e o empregado, respectivamente.

Eficácia dos Direitos Fundamentais


Eficácia vertical Estado X particular (concepção clássica)
Ineficácia horizontal Não incide nas relações particulares
Eficácia horizontal indireta Incide nas relações particulares,
desde que haja lei prevendo
21

Eficácia horizontal direta Incide plenamente entre particulares


Eficácia diagonal Incidência em relações particulares assimétricas
(particulares desiguais)

2.6. Revisão do tema

REVISÃO DO TEMA
Direitos fundamentais representam o conjunto de normas
que garantem a convivência pacífica e digna dos
Noção Geral indivíduos em uma sociedade. Na CF/88 compreende o
Título II (arts. 5º a 17).
Distinção entre ▪ Direitos fundamentais são os bens essenciais
Direitos e conferidos aos indivíduos (fim em si mesmo).
Garantias ▪ Garantias fundamentais são as ferramentas
Fundamentais jurídicas que asseguram a proteção e efetivação dos
direitos fundamentais (meio e não o fim em si mesmo).
Três dimensões:
▪ 1ª Dimensão = Direitos Civis e Políticos:
Liberdade (direitos negativos).
Dimensões ▪ 2ª Dimensão = Direitos Sociais, Econômicos e
dos Direitos Culturais: Igualdade (direitos positivos).
Fundamentais ▪ 3ª Dimensão = Direitos Transindividuais:
Fraternidade (ex.: meio ambiente).
Há doutrina escrevendo sobre a 4ª, 5ª e 6ª Dimensão
dos direitos fundamentais, porém isto não é pacífico.
22

Os direitos fundamentais são:


▪ Históricos
Características ▪ Universais
dos Direitos ▪ Irrenunciáveis
Fundamentais ▪ Inalienáveis
▪ Imprescritíveis
▪ Não taxativos
▪ Relativos (ou Limitados)
Eficácia Estado X particular
vertical (concepção clássica)
Ineficácia Não incide nas
horizontal relações entre particulares
Sujeitos Passivos Eficácia Pode incidir nas relações entre
dos Direitos horizontal particulares, desde que
Fundamentais indireta haja lei prevendo
(Eficácia) Eficácia Incide plenamente
horizontal na relação entre
direta os particulares
Eficácia Incidência em relações particulares
diagonal assimétricas (particulares desiguais)

2.7. Questões CEBRASPE no tema

1. (TC/DF – Procurador – CEBRASPE – 2021) Acerca de direitos e garantias


fundamentais e mandado de segurança no âmbito do Poder Legislativo, julgue o
item a seguir, considerando o entendimento do STF.
23

Para solucionar conflito entre uma entidade privada com poder social e um
associado, é possível a aplicação da teoria da eficácia horizontal dos direitos e
garantias fundamentais.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

2. (CRP/MS – Auxiliar Administrativo – QUADRIX – 2021) A respeito dos


direitos fundamentais, julgue o item.

A inalienabilidade dos direitos fundamentais representa a impossibilidade de sua


disposição por faltar-lhes conteúdo econômico, o que não quer dizer que os
direitos fundamentais não possam ter repercussões patrimoniais.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.
24

⮚ CAPÍTULO 3 – DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS

3.1. Incisos do art. 5º da Constituição Federal

Abaixo, estudaremos cada direito fundamental tipicamente constitucional.

3.1.1. Direito à vida


25

Art. 5º, caput, CF - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes.

O direito à vida representa o direito fundamental mais importante de todos. Sem


ele, obviamente não existiriam os demais direitos fundamentais.

3.1.1.1. Âmbito de proteção

O direito à vida tutela a existência do indivíduo por três prismas:

▪ Direito de nascer: protege contra o aborto.

▪ Direito de continuar vivo: protege contra o homicídio; induzimento,


instigação ou auxílio ao suicídio, infanticídio e genocídio.

▪ Direito de ter uma vida digna: garante os direitos elementares do ser


humano, como saúde e educação; tutelando o mínimo existencial. Liga-se,
portanto, à dignidade da pessoa humana.

❖ Importante para a sua prova: a última prova de Técnico do INSS cobrou


exatamente este tema; indagando como o direito à vida se desdobraria (vide no
item 3.4 abaixo).

Em uma classificação similar, parte da doutrina enfrenta o direito à vida sob uma
dupla acepção:
26

▪ Acepção negativa: corresponde ao direito de permanecer vivo (nascer e


não ser morto). Impõe, portanto, uma abstenção (um não fazer: não ceifar a
vida do outro).

▪ Acepção positiva: corresponde ao direito de ter uma vida digna. É


"positiva" porque exige prestações do estado - ex.: saúde, moradia, educação,
trabalho.

3.1.1.2. Mitigações do direito à vida

Mesmo sendo o direito fundamental mais relevante de todos, o direito à vida


encontra exceções pela ordem jurídica:

(i) Legítima defesa: representa uma excludente de ilicitude que garante o direito
de autopreservação do indivíduo. Ou seja, é um permissivo para que a vítima
tire a vida de seu algoz e possa sobreviver.

(ii) Estado de necessidade: representa uma excludente de ilicitude que


depende de uma situação de perigo. No estado de necessidade, o indivíduo
poderá tirar a vida de alguém quando presente um conflito de interesses
lícitos.

(iii) Aborto permitido: em regra, o aborto é proibido no Brasil. Contudo, há


três hipóteses em que poderá ocorrer o chamado aborto permitido. Duas
hipóteses estão no art. 128 do Código Penal - como causas especiais de
27

exclusão da ilicitude, por força do estado de necessidade - e uma hipótese foi


criada pela jurisprudência do STF (ADPF nº 54). Vejamos:

Art. 128, CP - Não se pune o aborto praticado por médico:

▪ Aborto necessário ou terapêutico: se não há outro meio de salvar a


vida da gestante. Isto é, traz um conflito de valores fundamentais, que
determina a prevalência da vida da gestante em detrimento do potencial
nascituro.

▪ Aborto sentimental, humano, piedoso ou ético: ocorre no caso de


gravidez resultante de estupro. Este aborto exige o consentimento da
gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal. Também deve ser
praticado por médico.

▪ Feto anencéfalos: há, ainda, uma terceira hipótese de aborto permitido


que emana da jurisprudência do STF. Ao julgar a ADPF nº 54, o Pretório Excelso
permitiu o aborto de anencéfalos. A anencefalia é uma malformação rara do tubo
neural, que acarreta a ausência total ou parcial do encéfalo ou da calota
craniana. Por consequência, seria um provável natimorto segundo parte da
medicina. Declarou, então, o STF a inconstitucionalidade de qualquer
interpretação que criminalize o aborto do anencéfalo. É a chamada antecipação
terapêutica da gestação de feto anencéfalo.

❖ Observação: Cuidado! O fato de o STF ter permitido o aborto de


anencéfalos não significa que uma tolerância ampla para o aborto de outras
más-formações (como a microcefalia). Isto incidiria no odioso aborto eugênico,
28

praticado na Alemanha nazista, com intuito de purificar a raça ariana. A


discussão na ADPF nº 54 é diversa.

(iv) Pena de morte em caso de guerra declarada: em regra, o Brasil proíbe a


pena de morte. Contudo, excepcionalmente ela será possível nos casos de
guerra declarada (art. 5º, XLVII, a, CF). Diz a doutrina que não basta uma
guerra de fato, sendo imprescindível que haja uma guerra declarada. Aliás, a
doutrina majoritária sustenta que a guerra deverá ser externa (e não interna).

3.1.2. Princípio da igualdade

Art. 5º, caput, CF - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança
e à propriedade, nos termos seguintes.

Embora conste do art. 5º (Direitos Individuais e Coletivos), analisaremos este


princípio no próximo Capítulo, que trata dos Direitos Sociais. O concurso do
INSS poderá explorar as modalidades do princípio da igualdade.

3.1.3. Princípio da legalidade civil

Art. 5º, II, CF - Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei.
29

Seu edital contempla dois tipos de legalidade dentro da Constituição Federal:

▪ art. 5º, caput = Legalidade Civil


▪ art. 37, caput = Legalidade Administrativa

A distinção é simples: a legalidade civil (art. 5º, II) é direcionada aos


particulares, permitindo que ele faça tudo que a lei não proíbe. Já a legalidade
administrativa (art. 37, caput) é direcionada aos agentes públicos - sendo
mais restrita -, permitindo que eles façam apenas o que a lei expressamente
determina - ex.: dever de licitação para aquisição de bens e serviços.

Esta distinção poderia ser vislumbrar por dois círculos concêntricos:


30

Note que a amplitude da legalidade administrativa é menor que a legalidade


civil. Isto porque, o Direito Administrativo exige uma postura mais vinculada do
agente público. Em outras palavras, se não houver previsão legal, não haverá
possibilidade de atuação administrativa.

A legalidade civil do art. 5º, caput, da Constituição dá gênese à autonomia


privada dos indivíduos. Ou seja, ela tutelará o indeclinável direito do indivíduo
em autorregulamentar sua vida e seus interesses. Decorre, portanto, da própria
dignidade da pessoa humana.

3.1.4. Princípio da liberdade de manifestação do pensamento e vedação à


censura

Art. 5º, CF - incisos:

IV - É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

VI - É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o


livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos
locais de culto e a suas liturgias.

VIII - Ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de


convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de
obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa,
fixada em lei.
31

IX - É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de


comunicação, independentemente de censura ou licença.

XIV - É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da


fonte, quando necessário ao exercício profissional.

A livre manifestação do pensamento representa o gênero de inúmeros outros


princípios decorrentes: liberdade de expressão, liberdade religiosa, liberdade de
imprensa, liberdade artística, liberdade religiosa entre outras. Por esta razão,
analisaremos conjuntamente os incisos IV, VI, VIII, IX e XIV da Constituição
Federal.

Nossa Constituição é classificada, quanto à ideologia, como Constituição


eclética ou compromissória, pois tolera as diversas ideologias e incentiva a
livre circulação de ideias. Há um compromisso entre forças políticas diferentes.

Um dos marcos simbólicos da nossa Constituição é a chamada


redemocratização do País, que trouxe como bandeira irrenunciável a vedação
à censura (art. 220, caput, § 1º e § 2º, CF) e a desnecessidade de licença
prévia para a liberdade de expressão.

Por esta razão, a interpretação histórica da Constituição nos mostra que -


ainda que inexista hierarquia formal entre as normas constitucionais - o livre
pensamento e a livre expressão ocupam uma posição preferencial (preferred
position) em relação aos demais direitos.
32

3.1.4.1. Pontos importantes e leading cases sobre a liberdade de


pensamento

(i) Não recepção da Lei de Imprensa: o STF, na ADPF nº 130, declarou a não
recepção da Lei de Imprensa (ADPF nº 130). Esta Lei impunha limitações
descabidas à liberdade de imprensa e de expressão, o que é incompatível com a
atual Constituição Federal.

(ii) Desnecessidade do diploma de jornalista: o art. 5º, IX, da Constituição diz


que "livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independentemente de censura ou licença”. Por esta razão, não
caberia ao Poder Público exigir uma licença para a divulgação de notícias, qual
seja, o diploma de jornalista. A conclusão do julgado foi, então, emblemática: é
dispensado o diploma de nível superior (de jornalista) para quem se disponha a
escrever e falar com habitualidade pelos órgãos de imprensa.

(iii) Investigação de "fake news": embora a liberdade de pensamento seja um


princípio com posição preferencial (preferred position), ela não é absoluta e
convive com outros direitos. Por este motivo, em junho de 2020, o STF entendeu
constitucional a abertura de Inquérito Policial para apurar "fake news" e/ou
crimes contra a honra e a segurança do STF; membros ou familiares (ADPF nº
572).

A investigação ainda não terminou e este é um tema polêmico na doutrina. Por


ora, guarde que a liberdade de pensamento encontra limitações, tendo como
exemplo este julgado.
33

(iv) Possibilidade de humor em período eleitoral: o STF declarou


inconstitucional os dispositivos da Lei Eleitoral que proibiam trucagem,
montagem ou sátira em época eleitoral (ADI nº 4.451/DF). Isto violaria a
liberdade de pensamento e de expressão assegurada pela Constituição de 1988.

(v) Possibilidade de proselitismo religioso: proselitismo significa fazer


catequese, ou seja, tentar convencer outras pessoas das suas próprias ideias.
Neste sentido, o STF entendeu inconstitucional a lei que proibia o
proselitismo religioso, ainda que em espaço público. Isto violaria o livre
exercício do culto religioso (art. 5º, VI, CF). Assim, é legítima a tentativa do
religioso em tentar converter outras pessoas. Proíbe-se, apenas, o discurso de
ódio religioso; que configura crime de racismo, inclusive (art. 1º da Lei nº
7.716/1989).

(vi) Sacrifício de animais X culto de religiões: o STF entendeu que é


constitucional a lei estadual que permite o sacrifício ritual de animais em
cultos de religiões de matriz africana, desde que sem excessos ou crueldades.
Tutela-se a liberdade religiosa nesta ponderação (STF, RE nº 494.601/RS).

(vii) Ensino religioso confessional: o ensino religioso nas escolas públicas (ou
privadas) pode ter natureza confessional, desde que se garanta oportunidade
a todas as doutrinas religiosas (o aluno escolhe). Esse ensino religioso deverá
ser disciplina do horário normal, mas de matrícula facultativa (STF, ADI nº
4.439/DF).

(viii) Vedação do anonimato: a Constituição assegura a liberdade de


pensamento, mas veda o anonimato. Isto é, o garante-se uma liberdade com
34

responsabilidade, pois embora o indivíduo seja livre para se manifestar, ele


deverá ser responsável pelas consequências de sua manifestação - ex.
retratação ou indenização, se praticar um discurso de ódio.

(ix) Escusa de consciência (imperativo de consciência ou objeção de


consciência): ocorre quando alguém invoca uma convicção pessoal para não
cumprir uma obrigação legal imposta a todos; razão por que deverá cumprir
uma prestação alternativa, fixada em lei (art. 5º, VIII, CF). Trata-se da chamada
"escusa de consciência", "imperativo de consciência" ou "objeção de
consciência". É o caso do jurado, mesário eleitoral ou de quem precisa prestar o
serviço militar obrigatório. Ao mesmo tempo que a Constituição tutela a
convicção religiosa, filosófica ou política do indivíduo, ela também garante a
isonomia por meio do cumprimento de uma prestação alternativa. Imagine o
caso de um anarquista que fosse convocado para ser mesário... Decerto, isto
violaria suas crenças políticas e filosóficas. Por corolário, deverá ele cumprir
uma prestação alternativa.

❖ Observação: acaso o indivíduo alegue a escusa de consciência para se


eximir de uma obrigação legal imposta e recuse-se a cumprir a prestação
alternativa, ele sofrerá a suspensão em seus direitos políticos (art. 15, IV, da
CF).

(x) Escusa de consciência X concurso público: em novembro de 2020, o STF


decidiu que, nos termos do art. 5º, VIII, da CF, é possível a realização das
provas de um concurso público em datas e horários distintos dos previstos no
edital, por candidato que invoca sua convicção religiosa, desde que preenchidos
alguns requisitos: (a) razoabilidade da alteração; (b) preservação da igualdade
35

entre todos os candidatos; (c) ausência de ônus desproporcional à


Administração Pública; e (d) decisão fundamentada. Embora o Brasil seja um
País laico (sem religião oficial), ele protege a liberdade religiosa - ex.: se uma
avaliação cair em um sábado, eventual membro da Igreja Adventista do Sétimo
Dia poderia pedir a remarcação da prova, pois eles se abstêm de exercerem
atividades seculares (não-religiosas) neste dia sagrado (RE nº 611.874/DF).

(xi) Escusa de consciência X vacinação obrigatória: em dezembro de 2020, o


STF entendeu que a vacinação obrigatória é constitucional e não viola a
liberdade individual. Em razão do direito à saúde coletiva, entendeu o STF que a
imposição da vacina prevaleceria sobre a autonomia privada, liberdade de
consciência e convicções filosóficas; em prestígio ao pacto coletivo da sociedade
(ADI nº 6.586/DF).

❖ Observação: não há que se confundir vacinação obrigatória com


vacinação forçada. Na primeira, exige-se sempre o consentimento do vacinado;
cujo desatendimento gera sanções indiretas, geralmente
político-administrativas. Já na vacinação forçada, o Poder Público utilizaria de
medidas invasivas ou coativas para aplicar a vacina; o que violaria a
integridade corporal e a dignidade da pessoa humana do indivíduo.

3.1.5. Direito à privacidade

Art. 5º, X, CF - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a


imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação.
36

A privacidade decorre da proteção dos direitos da personalidade e, portanto,


da própria dignidade da pessoa humana. Permite que o indivíduo conduza sua
própria vida como lhe aprouver.

Na doutrina americana, defende-se o right to be alone, isto é, o direito de ser


deixado só e não ser perturbado. Por meio da privacidade, veda-se
interferências externas do Poder Público, e também de outros particulares.

A Privacidade é o outro lado da moeda do direito à informação (que decorre


diretamente da liberdade de pensamento). Isto porque, a livre circulação de
ideias e pensamentos na sociedade fatalmente entrará em colisão com a
privacidade de algum indivíduo.

Quando isso ocorre, o tema se torna um hard case, e impõe aos Tribunais
ponderar o que deve prevalecer: se o direito à informação ou o direito à
personalidade. É o que veremos, exemplificativamente, do próximo tópico.

3.1.5.1. Leading cases sobre a privacidade

(i) Biografias não autorizadas: existem dois tipos de biografias no mundo


literário: as autorizadas e as não autorizadas. A polêmica jurisprudencial surgiu
nesta última, já que costumeiramente ela retrata fatos polêmicos e de revelação
não desejada pelo biografado. Por consequência, ela é mais atraente aos
leitores do que a biografia autorizada, não raras vezes parciais e tendenciosas.
37

Segundo o STF, não é necessária a autorização prévia do indivíduo


biografado (ou de sua família), no caso das biografias não autorizadas (ADI nº
4.815/DF). Elas não violariam os artigos 20 e 21 do Código Civil e decorreriam
da liberdade de expressão e vedação à censura.

Há uma frase utilizada pelo STF que bem resume a importância das biografias
não autorizadas: Biografia é história. A vida não se desenvolve apenas a partir
da soleira da porta de casa.

Excepcionalmente, contudo, o Pretório Excelso ressalvou o caso de a biografia


não autorizada abusar do direito à livre expressão e afrontar à honra do
indivíduo - ex.: houve polêmica na biografia não autorizada do jogador
Garrincha, ao retratar o tamanho de seu órgão sexual e sua vida amorosa. Por
não ser protegida de forma absoluta, a liberdade de expressão pode gerar o
direito à indenização, retratação ou direito de resposta nas situações da espécie.

(ii) Direito ao esquecimento: esta teoria consiste em impedir a divulgação de


fatos ou dados verídicos e licitamente publicados nos meios de comunicação,
em razão do decurso do tempo. Ou seja, ele é decorrência do direito da
privacidade e busca apagar fatos antigos que causariam sofrimento ou
transtorno aos personagens e suas famílias.

Há dois exemplos famosos na jurisprudência. Um deles, era do caso


denunciado e posteriormente absolvido no caso da "Chacina da Candelária" (de
1993) em relação ao programa "Linha Direta" da Rede Globo, que exibia a
história e contava seu nome. Outro famoso caso é o da apresentadora Xuxa em
38

relação à exibição de seu antigo e polêmico filme "amor, estranho amor" (de
1982).

Pois bem. A jurisprudência, sobretudo do STJ, aceitava, amplamente, o direito


ao esquecimento. Contudo, em surpreendente julgado de fevereiro de 2021, o
STF fez um overruling (mudança de entendimento) no tema, para dizer que o
direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição. Segundo o
Pretório Excelso, esta teoria (a) representaria ameaça à liberdade de expressão
e de imprensa; (b) torna ilícita uma informação que outrora era lícita; (c) apaga
informações de interesse da própria história e das próximas gerações; (d)
sobrepõe a privacidade acima do interesse público (STF, RE nº 1.010.066/RJ).

A rejeição do direito ao esquecimento não significa que a privacidade estará


desprotegida diante de qualquer informação. Excepcionalmente, no caso de
informações ilícitas ou abusivas, é possível se invocar o direito constitucional
à privacidade, a fim de obter reparação nas vias cível e criminal.

❖ Importante para a sua prova: se este tema for cobrado em sua prova,
você deve assinalar que o STF proíbe o direito ao esquecimento como regra.

3.1.6. Inviolabilidade de domicílio

Art. 5, XI, CF - A casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo


penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou
desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação
judicial.
39

Estatisticamente, este inciso representa o direito fundamental em espécie mais


cobrado nas provas CEBRASPE. A inviolabilidade de domicílio é decorrência
do próprio direito à privacidade e elege a casa como asilo inviolável do
indivíduo.

Mas, por também não ser um direito fundamental absoluto, a inviolabilidade de


domicílio não é absoluta e encontra mitigações pela Ordem Constitucional.

3.1.6.1. Mitigações à inviolabilidade de domicílio

Para otimizar seu tempo, esquematizarei as mitigações à inviolabilidade de


domicílio com este desenho:
40

E, para facilitar a memorização destas diversas exceções, guarde o seguinte


processo mnemônico: "se alguém entrar no Domicílio de outra pessoa fora das
exceções acima, o sujeito se C F O D S S"

C onsentimento do morador
F lagrante delito
O rdem judicial
D esastre
prestar S ocorro
estado de S ítio

3.1.6.2. Pontos importantes sobre a inviolabilidade de domicílio

(i) Conceito de "dia": há três correntes na doutrina para definir "dia" no caso
de cumprimento de determinação judicial.

▪ Critério cronológico ou objetivo: dia corresponde ao período das 6h da


manhã até às 18h da tarde. Ainda que não acompanhe as peculiaridades
geográficas de todo País, trata-se do critério mais seguro e objetivo para evitar
a nulidade da diligência. Atualmente, é a corrente majoritária na doutrina.

▪ Critério físico-astronômico: o dia se inicia pela aurora (amanhecer) e


se encerra pelo crepúsculo (anoitecer) de cada lugar. Esta corrente aponta que
o Brasil é um País continental, razão por que o sol nasce e se põe em diversos
horários STF já adotou essa corrente em alguns precedentes antigos. É criticada
por não trazer um critério objetivo e seguro para o cumprimento do mandado
judicial.
41

▪ Critério misto: sugere a adoção combinada das duas anteriores.


Contudo, resvala em problemas práticos, pois exige do executor do mandado
minudente conhecimento de ambas; o que potencializa o risco de nulidade da
diligência.

(ii) Conceito de "casa": o STF e a doutrina aplicam a interpretação extensiva


(ou ampliativa) do conceito casa, a fim de abranger - além do domicílio
tradicional do indivíduo - os lugares que se utilize reservadamente - exs.:
trailers, hotel, consultórios, escritórios e qualquer compartimento habitado ou
lugar onde se exerce a profissão ou atividade.

Ou seja, enquanto a recepção do dentista ou do advogado não é considerada


domicílio, o local onde ele exerce reservadamente sua profissão (o próprio
escritório) receberá a proteção do art. 5º, XI, da Constituição.

(iii) Autoridade expedidora do mandado judicial: apenas o Juiz pode expedir


mandado judicial para busca domiciliar. Isto é, Ministério Público, Delegados de
Polícia, autoridades administrativas em geral não possuem competência
constitucional para determinar a invasão domiciliar.

(iv) Flagrante delito: a doutrina prega que o termo "delito" foi utilizado pelo
Constituinte em sentido amplo, a fim de abranger crimes e contravenções
penais. Ou seja, as contravenções penais também autorizariam a invasão
domiciliar sem mandado judicial.
42

(v) Modalidades de flagrante delito: estão abrangidas todas as modalidades


de flagrante, a saber:

▪ Flagrante próprio, perfeito, real ou verdadeiro: ocorre quando o agente


cometeu ou acabou de cometer o delito (sem intervalo de tempo).

▪ Flagrante impróprio, imperfeito, irreal ou quase-flagrante: ocorre


quando o agente é perseguido logo após (há um pequeno intervalo de tempo).

▪ Flagrante presumido, ficto ou assimilado: ocorre quando o agente é


perseguido logo depois (espaço de tempo maior), e é encontrado com
petrechos e objetos do crime que faça presumir ser ele autor da infração penal.

3.1.7. Direito ao sigilo (liberdade de comunicação pessoal)

Art. 5º, XII, CF - É inviolável o sigilo da correspondência e das


comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas,
salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei
estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

A liberdade de comunicação pessoal também decorre do direito à privacidade.


No ponto, a Constituição tutelou os seguintes tipos de sigilo (art. 5º, XII):

▪ o sigilo de correspondência
▪ o sigilo das comunicações telegráficas
▪ o sigilo das comunicações de dados (bancário e fiscal)
43

▪ o sigilo das comunicações telefônicas


▪ o sigilo das comunicações telemáticas (por interpretação evolutiva)

3.1.7.1. Pontos importantes sobre a quebra judicial do sigilo

(i) Qualquer quebra é excepcional e depende de autorização judicial;

(ii) Embora a interpretação gramatical sugira que apenas as "comunicações


telefônicas" seriam passíveis de quebra ("salvo no último caso..."), condena-se a
interpretação meramente gramatical do art. 5º, XII, CF. Ademais, não
prevalece no STF a tese de direitos fundamentais absolutos; de sorte a negar
que as demais comunicações seriam insuscetíveis de quebra judicial. A doutrina
defende, então, a interpretação sistemática do dispositivo, em prestígio à
unidade da Constituição.

(iii) Qualquer dessas quebras somente podem ocorrer para investigação


criminal ou instrução processual (persecução penal). Ou seja, não se autoriza
a interceptação das comunicações para fins cíveis ou administrativos.

(iv) À época da promulgação da Constituição (1988), o mundo sequer imaginaria


o avanço e complexidade da internet perante os dias atuais. Por esta razão, a
jurisprudência confere interpretação evolutiva, a fim de incluir neste direito
individual o sigilo telemático. Ou seja, interpreta-se a Constituição segundo as
condições vigentes no momento de sua aplicação (hoje).
44

3.1.8. Direito de reunião

Art. 5º, XVI, CF - Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais
abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não
frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo
apenas exigido prévio aviso à autoridade competente.

O direito de reunião decorre direta ou indiretamente da liberdade de


expressão, pois sem a livre expressão, não seria possível livremente se reunir,
seja qual fosse o fim da reunião.

Logo, o direito de reunião também possui gênese na redemocratização do País


e promulgação da Constituição Federal de 1988. Representa, em linhas
gerais, o direito de todos se agruparem para exercerem a livre expressão de
suas ideias (desde que pacíficas).

3.1.8.1. Pontos importantes sobre o direito de reunião

(i) Autorização prévia ou prévio aviso? Cuidado com a literalidade do inciso


XVI do art. 5ª da Constituição, que exige tão somente o prévio aviso (para não
frustrar outra anteriormente convocada) e não a prévia autorização ou
requerimento do Poder Público.

Art. 5º, XVI, CF - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais
abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não
frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo
apenas exigido prévio aviso à autoridade competente.
45

(ii) Fins pacíficos: como se lê do inciso XVI, os fins deverão ser pacíficos. Não
confunda com a literalidade do direito de associação, que exige fins lícitos.

Art. 5º, XVII, CF - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a
de caráter paramilitar.

Guarde o seguinte processo mnemônico, então:

- A. L. 🡪 A ssociação = fins L ícito


- R. P. 🡪 R eunião = fins P acíficos

3.1.8.2. Leading cases sobre o direito de reunião

(i) Dispensa de prévio aviso formal pelo STF: em dezembro de 2020, o STF
afirmou que o direito de reunião não se condiciona ao prévio aviso formal. Ele
condenou a interpretação restritiva do inciso XVI do art. 5º da Constituição
Federal, a fim de ampliar o direito de livremente reunir-se.

Diz o Pretório Excelso que o aviso prévio deve existir sempre que possível, mas,
acaso inexistente, não transforma a reunião em ilícita. Tal aviso, aliás, seria
satisfeito com a veiculação de informações que permitissem ao Poder Público
zelar para que seu exercício ocorra de forma pacífica ou para que não frustre
outra reunião no mesmo local. Exemplos: em uma reunião convocada
espontaneamente pelas redes sociais ou após uma final de campeonato, é
objetivamente previsível que ocorrerá a reunião. Daí porque as autoridades
46

devem assumir uma posição ativa; não podendo alegar desconhecimento ou


ausência de prévio aviso (STF, RE nº 806.339/SE).

(ii) "Marcha da maconha" e de outras drogas: em decisão unânime, o STF


liberou o evento da "marcha da maconha" ou de qualquer outra substância
entorpecente/droga. Afirmou que entendimento contrário violaria o direito de
reunião e de livre manifestação do pensamento. Por serem valores
constitucionais, seria necessário conferir uma interpretação conforme a
Constituição ao art. 287 do Código Penal.

Art. 287, CP - Apologia de crime ou criminoso - Fazer, publicamente, apologia


de fato criminoso ou de autor de crime.
Pena - detenção, de 3 a 6 meses, ou multa.

3.1.9. Direito de associação

Art. 5º, CF - incisos:

XVII - É plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter


paramilitar.

XVIII - A criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas


independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu
funcionamento.
47

XIX - As associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter


suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso,
o trânsito em julgado.

XX - Ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado.

XXI - As entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm


legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente.

O direito de associação possui as mesmas bases do direito de reunião:


possibilidade de livremente se expressar e se agrupar. Também é uma conquista
da nova Ordem Constitucional. Daí surge a dúvida: qual a distinção dela para o
direito de reunião?

3.1.9.1. Pontos importantes sobre o direito de associação

(i) Suspensão X Dissolução compulsória: A suspensão da associação exige


decisão judicial (ex.: uma liminar), mas a sua dissolução compulsória exige
trânsito em julgado (decisão que não comporta mais recurso). Este é o teor do
art. 5º, XIX, da Constituição.

(ii) Vedação de associações paramilitares: a Constituição impôs como


limitação ao direito de associação as que possuam caráter paramilitar, isto é,
corporações privadas que se apresentassem armadas, fardadas ou mesmo
adestradas - em concorrência às Forças Armadas ou órgãos policiais.
48

3.1.10. Direito de propriedade e função social da propriedade

Art. 5º, CF - incisos:

XXII - É garantido o direito de propriedade.

XXIII - A propriedade atenderá a sua função social.

A propriedade tutela o direito do indivíduo de usar, gozar e dispor da coisa. Já a


função social da propriedade tutela sua destinação social, exigindo-lhe um fim
útil ao interesse público.

Em razão da inexistência de direitos fundamentas absolutos, a propriedade


também não é um direito absoluto, encontrando mitigações na própria ordem
constitucional.

Talvez um dos embates mais acalorados da chamada Assembleia Constituinte


que elaborou nossa Constituição tenha sido o confronto ideológico destes dois
direitos: Propriedade X Função Social da Propriedade.

De um lado, a corrente mais conservadora defendia a ideia absoluta da


propriedade, por não vislumbrar exceções a este direito. Doutro lado, a corrente
mais progressista entendia que a propriedade pertenceria à comunidade, e não
propriamente ao indivíduo.

Consequência: visando alcançar um meio termo entre ambos, a Constituição


colocou a Função Social da Propriedade não como um limite da Propriedade,
49

mas como seu próprio conceito. Daí serem "vizinhos" no art. 5º (incisos XXII e
XXIII) e no art. 170 (incisos II e III).

3.1.10.1. Função social da propriedade

O Constituinte de 1988 trouxe uma visão mais humana para a Ordem


Econômica, elegendo simultaneamente como princípios a livre iniciativa, a
dignidade da pessoa humana e a função social da propriedade. A função social
da propriedade remonta as lições de Léon Duguit - o idealizador deste conceito.

Dentro do conceito de propriedade hospedam-se diferentes funções: função


ambiental, função econômica, função humana.

Em linhas gerais, a função social da propriedade representa uma preocupação


com a finalidade coletiva da propriedade - ex.: distribuição e utilização de
grandes terras, conflitos rurais por grupos sociais, reforma agrária, preservação
ambiental, desapropriação etc.

3.1.11. Livre acesso à informação (liberdade de informação)

Art. 5º, CF - incisos:

XIV - É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da


fonte, quando necessário ao exercício profissional.
50

XXXIII - Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu
interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas
no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo
seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.

Assim como afirmei em relação à Liberdade de Pensamento, a Constituição de


1988 atribuiu grande peso à livre circulação de ideias.

Nos incisos XIV e XXXIII do art. 5º, o Constituinte garantiu a todos o acesso à
informação. O Constituinte ressalvou, apenas, as informações que
ameaçassem a segurança da sociedade e do Estado.

3.1.12. Princípio da inafastabilidade da jurisdição

Art. 5º, XXXV, CF - A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou
ameaça a direito.

Segundo o princípio da inafastabilidade da jurisdição, a lei não excluirá do


Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.

Este princípio pode aparecer com diversas nomenclaturas:

▪ Acesso à justiça
▪ Direito de ação
▪ Inafastabilidade jurisdicional
51

O princípio da inafastabilidade da jurisdição representa a maior garantia


democrática na reivindicação de direitos, permitindo que qualquer pessoa
(física ou jurídica; estrangeira ou nacional; capaz ou incapaz) defenda seus
direitos.

3.1.12.1. Justiça condicionada (ou instância administrativa de curso


forçado)

É pacífico o entendimento de que o acesso à Justiça não se limita ou


condiciona ao prévio esgotamento das instâncias administrativas. A Constituição
de 1988 baniu o sistema de "jurisdição condicionada", também chamada de
"instância administrativa de curso forçado".4

Isto, contudo, não afasta que algumas demandas observem certos requisitos
para que surja seu interesse processual. Senão vejamos.

3.1.12.2. Situações sui generis de acesso à justiça

A análise global da ordem jurídica permite verificar algumas situações peculiares


na sobre o acesso à justiça. Não seriam propriamente limitações, mas sim
requisitos para que surja o interesse processual da pretensão. Vejamos:

(i) Justiça desportiva: o art. 217, §1º da Constituição exige que a judicialização
de questões desportivas observe o prévio esgotamento da via administrativa
(perante a justiça desportiva - que é um órgão de natureza administrativa).

4
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p.
912., 2017, p. 641.
52

(ii) Habeas Data: o art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 9.507/1997 e a Súmula nº
02 do STJ exigem a prévia recusa administrativa (e não o prévio
esgotamento) para a impetração do habeas data.

(iii) Concessão de benefício previdenciário perante o INSS: em regra, é


necessário o prévio requerimento administrativo (e não o prévio
esgotamento) para ajuizamento de ação postulando a concessão de benefício
previdenciário.

3.1.13. Garantia de estabilidade das relações jurídicas (segurança jurídica)

Art. 5º, XXXV, CF - A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico
perfeito e a coisa julgada.

A Constituição de 1988 revela forte preocupação com a segurança jurídica.


Parte da doutrina diz que o termo "segurança" do art. 5º, caput, do Texto
Constitucional revelaria à segurança jurídica. Já o termo "segurança" do art. 6º
da Constituição revelaria à segurança pública.

Neste momento trataremos da segurança jurídica, que garante a estabilidade


das relações jurídicas ("segurança de papéis").

3.1.13.2. Fenômenos decorrentes da segurança jurídica: direito adquirido,


ato jurídico perfeito e coisa julgada
53

a) Direito adquirido: representa o direito que já se incorporou ao patrimônio


jurídico de seu titular, de modo que nenhuma norma ou fato pode modificar
essa situação. Ou seja, o direito já foi conquistado e está consolidado no
patrimônio jurídico do titular.

b) Ato jurídico perfeito: representa o ato já consumado segundo a lei vigente


no tempo em que se efetuou. Ao contrário do direito adquirido, que está ligado
ao conteúdo, o ato jurídico perfeito está mais ligado à forma. Visa, portanto,
garantir o próprio direito adquirido - ex.: se um indivíduo elaborou seu
testamento sob a égide da lei anterior, deve ser respeitada a forma testada. A
diferença é realmente tênue para o direito adquirido; tocando mais à proteção da
forma contra inovações ou mudanças legislativas.

c) Coisa julgada: representa a decisão judicial que não comporta mais


recursos. A fim de garantir a pacificação social, é importante a imutabilidade
das decisões judiciais. A coisa julgada visa, portanto, cristalizar as discussões
judiciais no próprio processo (coisa julgada formal) ou em outro processo (coisa
julgada material).

❖ Observação: somente decisões judiciais têm a aptidão de produzir


coisa julgada. As decisões administrativas não. Isto porque, o Brasil adota o
sistema administrativo inglês, que prega a unicidade de jurisdição, de sorte
que as decisões administrativas poderão passar por análise judicial. Este
sistema difere do chamado sistema administrativo francês, em que há uma
dualidade de jurisdição, ou seja, a decisão administrativa também produziria
coisa julgada. No sistema francês coexistem "duas jurisdições" paralelas. O
54

Brasil, contudo, adotou o sistema inglês, tolerando apenas uma jurisdição: a do


Poder Judiciário.

*OBS: Ainda sobre este ponto, alguns autores apontam que o Brasil teria
adotado um sistema inglês mitigado, pois ele excluir do Poder Judiciário os
atos políticos - como a sanção ou veto a projeto de lei pelo Chefe do Poder
Executivo e o impeachment. O tema, contudo, possui polêmicas.

3.1.14. Mandados de criminalização

Art. 5º, CF - incisos:

XLII - A prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à


pena de reclusão, nos termos da lei.

XLIII - A lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia


a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo
e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os
executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.

XLIV - Constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados,


civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.

Em pelo menos três incisos do art. 5º o Constituinte ordenou que o legislador


infraconstitucional criminalize com severidade determinadas condutas. São os
chamados mandados de criminalização expressos.
55

A fim de auxiliar a memorização destes três incisos, guarde o seguinte processo


mnemônico:

- Racismo = I. I. R. 🡪 I nafiançável + I mprescritível + R eclusão

- 3T H = I. G. A. 🡪 T ortura + T ráfico + T errorismo + H ediondos =


I nafiançáveis + sem G raça e sem A nistia

- Ação de grupos armados, civis ou militares, contra Ordem Constitucional


e Estado Democrático de Direito = I. I. 🡪 I nafiançáveis e I mprescritíveis

3.1.15. Princípio do devido processo legal e demais garantias processuais

Art. 5º, CF - incisos:

LIV - Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido


processo legal (Princípio do Devido Processo Legal).

XXXVII - Não haverá juízo ou tribunal de exceção (Princípio do Juiz Natural).

LV - Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em


geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos
a ela inerentes (Princípio do Contraditório e da Ampla Defesa).
56

LXXVIII - A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a


razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua
tramitação (Princípio da Duração Razoável do Processo).

A ideia de um processo devido remonta à Magna Carta, de 1215, pois impôs a


chamada lei da terra, que condicionava a perda das glebas ao processo judicial
que existia naquele tempo. Mais tarde, a doutrina norte-americana aprimorou
esta ideia para o due process of law, momento que se irradiou para todo
mundo.

O Devido Processo Legal representa um supraprincípio (ou sobreprincípio)


processual que abriga todos os demais princípios processuais. Isto é, ele revela
um conjunto de princípios processuais que irá limitar o arbítrio estatal.

Sem que haja um processo judicial devido, ninguém poderá ser desapossado de
sua liberdade ou propriedade (e, obviamente, todos os demais direitos
fundamentais).

Destarte, o devido processo legal estará preenchido quando se tutelar


simultaneamente os seguintes princípios processuais (exemplificativamente):

a) Princípio do juiz natural: veda a existência de Juízo ou Tribunal de Exceção


(ad hoc). Possui duas acepções:

▪ Acepção objetiva (ou formal) = Juiz natural é o que está fixado de


acordo com as regras gerais e abstratas previamente estabelecidas.
57

▪ Acepção substantiva (ou material) = Juiz natural é o que é imparcial e


independente.

b) Princípio da motivação das decisões: possui duas finalidades:

▪ Finalidades endoprocessuais (ou técnicas) = proporciona para as


partes do processo o conhecimento das razões de decidir, isto é, permitem
compreender o raciocínio que o Juiz fez para acolher ou rejeitar a pretensão.
Por consequência, permitirá que o derrotado impugne a decisão pelas vias
recursais, bem como que o Tribunal reexamine adequadamente a questão.

▪ Finalidades extraprocessuais (ou políticas) = permite que, além das


partes e do Juízes de segundo grau, a própria sociedade possa verificar se o
juiz decidiu com imparcialidade e com conhecimento de causa. Além de permitir
transparência, a finalidade política permite um controle difuso e generalizado
sobre a qualidade e volume das decisões judiciais.

c) Princípio da publicidade das decisões: a regra do processo é sua


publicidade. Contudo, em situações excepcionais, será permitido o decreto de
sigilo processual, nomeadamente para tutelar a intimidade das partes ou algum
interesse social relevante.

d) Princípio da ampla defesa e do contraditório: o princípio da ampla


defesa representa o conjunto de meios idôneos para o exercício abrangente
do contraditório. Embora seja uma figura conexa ao contraditório, alguns autores
os diferenciam. O princípio do contraditório, por sua vez, tutela o direito de
informação e a consequente possibilidade de influência na decisão judicial.
58

Em breves linhas, o contraditório permite reagir a um ato ou informação


processual, a fim de se garantir a isonomia das partes.

e) Princípio da duração razoável do processo: processo devido é, pois,


processo com duração razoável. Segundo Rui Barbosa, "a Justiça atrasada não
é Justiça, senão injustiça, qualificada e manifesta". Em um olhar crítico, o
processo deve demorar o tempo necessário e adequado à solução do caso
submetido ao órgão jurisdicional.

Além destes cinco princípios processuais citados, seriam também decorrência


do supraprincípio do devido processo legal os princípios da isonomia das
partes, proibição de provas ilícitas, presunção de inocência, entre outros que
tocarão os ramos específicos do processo civil e do processo penal.

3.2. Parágrafos do art. 5º da Constituição Federal

Analisados os incisos, vejamos agora os parágrafos do art. 5º. Este dispositivo


possui 4 parágrafos. Vejamos também em tópicos individuais.

3.2.1. Aplicação imediata dos direitos fundamentais

Art. 5º, § 1º, CF - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais


têm aplicação imediata.

O § 1º do art. 5º traz um mandamento de otimização dos direitos e garantias


fundamentais, isto é, impõe que eles tenham aplicação imediata na maior
59

medida possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas de cada


um.

Para a doutrina, este parágrafo representa uma metanorma (ou norma de


segundo grau), pois traz uma norma que estabelece o modo de aplicação e
interpretação de outras normas.

Dele é possível extrair, ainda, o princípio hermenêutico da máxima


efetividade possível das normas constitucionais. Este princípio prega que, ao
se interpretar o catálogo de direitos fundamentais, deve se prestigiar a máxima
efetividade dele - o que se revela pela sua aplicação imediata.

Contudo, obviamente, em algumas situações o constituinte tolerou que os


direitos fundamentais fossem regulamentados pelo legislador
infraconstitucional. É o caso das chamadas normas constitucionais de eficácia
limitada.

Um exemplo está no art. 5º, VII, da CF, que assim dispõe: é assegurada, nos
termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e
militares de internação coletiva.

3.2.2. Princípio da não taxatividade (ou da não tipicidade) dos direitos


fundamentais

Art. 5º, § 2º, CF - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não


excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou
60

dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja


parte.

O § 2º do art. 5º da Lei Maior prega que os direitos e garantias expressos no


Texto Constitucional não excluem outros advindos do regime e dos princípios
por ele adotados, ou mesmo dos Tratados Internacionais que o Brasil seja parte.

De modo simples, o catálogo de direitos fundamentais não é taxativo (ou não é


típico), pois as enunciações trazidas pelo Texto Constitucional são meramente
exemplificativas.

Em razão desta textura aberta da Constituição, é plenamente possível que um


Tratado Internacional ratificado pelo Brasil incorpore novos direitos
fundamentais. Assim ocorre, por exemplo, com o princípio do Duplo Grau de
Jurisdição que, embora apenas previsto de modo implícito pelo Texto
Constitucional, está expresso na Convenção Americana de Direitos Humanos -
que o Brasil faz parte.

3.2.3. Hierarquia dos tratados internacionais

Art. 5º, § 3º, CF - Os tratados e convenções internacionais sobre direitos


humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois
turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes
às emendas constitucionais.
61

Estatisticamente, o art. 5º, § 3º da Constituição é um dos dispositivos mais


cobrados em prova - não apenas em Direito Constitucional, mas também em
Direitos Humanos, Processo Penal e Processo Civil.

Este dispositivo foi introduzido pela Emenda Constitucional nº 45/2004,


permitindo que alguns Tratados Internacionais tenham hierarquia constitucional
(isto é, de emenda constitucional).

Conforme a matéria do Tratado Internacional (se de Direitos Humanos ou não) e


conforme quórum de internalização, um Tratado Internacional pode assumir
três hierarquias na ordem jurídica:

a) Status Constitucional: representa os tratados internacionais de direitos


humanos que tenham sido aprovados com o quórum do art. 5º, § 3, CF - isto é,
aprovação por três quintos dos membros das duas Casas do Congresso
Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), em dois turnos de
votação.

Para auxiliar na memorização deste quórum qualificado, guarde o seguinte


processo mnemônico: 3 5 2 2 🡪 isto é, TRÊS QUINTOS dos membros +
DUAS CASAS do Congresso + DOIS TURNOS de votação.

Atualmente temos três exemplos de tratados internacionais que possuem status


de emenda constitucional:

▪ Convenção de Nova York e seu protocolo facultativo: trata-se de uma


Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Foi
62

assinado em Nova York em 30/03/2007 e internalizado pelo Brasil através do


Decreto nº 6.949/2009.

▪ Tratado de Marraqueche: trata-se de um Tratado Internacionais que


possui o objetivo de facilitar o acesso de obras literárias e artísticas para as
pessoas cegas ou com outras dificuldades de acesso. Foi assinado em
Marraqueche em 27/06/2013 e internalizado pelo Brasil através Decreto nº
9.522/2018.

*OBS: Como bem aponta Márcio André, do Dizer o Direito, o termo


"Marraqueche" está gramaticalmente equivocado perante a língua portuguesa.
O correto seria "Marraquexe".5 Contudo, a despeito do equívoco, utilize o termo
empregado pelo legislador nacional: Marraqueche.

▪ Convenção Interamericana de Combate ao Racismo: trata-se de uma


Convenção Internacional que combate o racismo, a discriminação racial e
formas correlatas de intolerância. Ela foi ratificada pelo Presidente em
12/05/2021 e internalizado pelo Brasil através do Decreto nº 10.932/2022.

*OBS: você pode encontrar doutrinas dizendo que o Brasil possui "4 Tratados"
Internacionais com força de Emenda Constitucional. Isto se deve ao fato de
alguns deles considerarem a "Convenção Internacional de Nova York das
Pessoas com Deficiência" e "seu Protocolo Facultativo" como dois Tratados
distintos e independentes. Na minha ótica, contudo, eles representam apenas
"um Tratado" - devidamente internalizado através do Decreto nº 6.949/2009.

5
https://www.dizerodireito.com.br/2018/10/tratado-de-marraqueche-decreto-95222018.html
63

Assim sendo, podemos afirmar que o topo da pirâmide hierárquica das


normas é composto pelo chamado bloco de constitucionalidade, que
representa a soma dos(as):

▪ 250 artigos do Texto Constitucional e os ADCTs


▪ 125 Emendas Constitucionais (até o fechamento deste PDF)
▪ 3 Tratados Internacionais que foram incorporados com força de emenda
constitucional (art. 5º, § 3º)

b) Status supralegal: representa os tratados internacionais de direitos humanos


que não obtiveram o quórum de aprovação do art. 5º, § 3, CF - isto é, não
atingiram o quórum qualificado de três quintos dos membros das duas Casas
do Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), em dois
turnos de votação.

As normas supralegais possuem hierarquia inferior à das normas


constitucionais, mas superior à da legislação ordinária. Seria o andar
intermediário da pirâmide hierárquica e representa a maioria dos tratados
internacionais de direitos humanos incorporados - ex.: Pacto de San José da
Costa Rica.

c) Status de lei ordinária: representa os tratados internacionais que não


versem sobre direitos humanos. Isto é, representa todos os demais tratados
que não sejam de direitos humanos - ex.: tratados internacionais meramente
comerciais ou alfandegários. Este tipo de tratado possui a mesma hierarquia do
Código Civil, Código Penal, Código de Processo Civil etc.
64

A fim de resumir estes 3 níveis hierárquicos e facilitar sua revisão, guarde o


desenho abaixo:

3.2.3.1. Conclusões importantes sobre o art. 5, § 3º, da CF

É possível resumir os principais aspectos doutrinários e jurisprudenciais do art.


5º, § 3º, da CF/88 da seguinte forma:

(i) Os tratados internacionais de direitos humanos somente poderão ter


natureza de emenda constitucional ou norma supralegal; jamais de meras leis
ordinárias.

(ii) Por consequência, um tratado internacional de direitos humanos sempre


prevalecerá quando em colisão com leis ordinárias, a exemplo do Código Civil,
Código Penal, Lei de Licitações etc.
65

(iii) Por força deste entendimento, a prisão do depositário infiel teve a eficácia
paralisada, uma vez que um tratado internacional de direitos humanos - logo,
norma supralegal - proíbe qualquer prisão civil por dívidas, senão a do devedor
de alimentos (art. 7º, 7, do Pacto de San José da Costa Rica).

❖ Importante para a sua prova: tenha cuidado com a terminologia usada


na CEBRASPE. O correto é dizer que a prisão civil do depositário infiel foi
paralisada ou se tornou ilícita - e não "inconstitucional". Observe que o artigo
5º, LXVII, da Constituição ainda contempla a prisão civil do depositário infiel
(conjuntamente com a do devedor de alimentos). Não houve emenda
constitucional alterando o texto físico da Constitucional. Em verdade, o STF
realizou mutação constitucional no referido dispositivo, isto é, alterou tão
somente a interpretação dele (sem alterar o texto da norma).

Assim sendo, a prisão do depositário infiel, atualmente, foi inviabilizada em razão


da invalidade das normas que a regulamentavam. Isto porque, uma norma
supralegal (Pacto de San José da Costa Rica) paralisou a eficácia da legislação
ordinária que disciplinava este tipo de prisão. Guarde, por fim, a literalidade do
art. 5º, LXVII, da CF, bem como a literalidade da Súmula Vinculante nº 25:

Art. 5º, LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo
inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do
depositário infiel.

Súmula vinculante nº 25 - É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer


que seja a modalidade de depósito.
66

(iv) Os tratados internacionais de direitos humanos que forem incorporados pelo


quórum do art. 5º, § 3º, da CF integrarão o bloco de constitucionalidade e,
portanto, servirão como parâmetro para o controle de constitucionalidade.

3.2.4. Tribunal Penal Internacional

Art. 5º, § 4º, CF - O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal


Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.    

A fim de conferir maior proteção aos direitos fundamentais, o § 4º do art. 5º da


Constituição previu a submissão do Brasil ao Tribunal Penal Internacional a
cuja criação tenha manifestado adesão.

Este parágrafo também foi inserido pela Emenda Constitucional nº 45/2004.

A existência do chamado "TPI" não fere o princípio da soberania nacional, pois


decorre do ideal de convivência pacífica entre os povos e na universalidade dos
direitos humanos.

O Tribunal Penal Internacional foi instituído pelo Estatuto de Roma (Decreto nº


4.388/2002), que restringe sua competência aos crimes mais graves, que afetem
a comunidade internacional em seu conjunto (art. 5º, 1). Atualmente, o TPI
possui competência para julgar os crimes de genocídio, contra a humanidade, de
guerra e de agressão.
67

3.3. Revisão do tema

TABELA DE REVISÃO
Protege os direitos de nascer, não morrer e ter uma vida
Direito à digna. Embora seja o direito individual mais relevante de
Vida todos, ele possui mitigações na ordem jurídica: legítima
defesa, aborto legal ou permitido, pena de morte em caso de
guerra declarada, lei do abate etc.
Princípio da Será examinado no Capítulo dos Direitos Sociais.
Igualdade
Enquanto na legalidade civil (art. 5º, II, CF), o particular pode
Princípio da fazer tudo o que a lei não proíbe, na legalidade
Legalidade administrativa, o agente público só pode fazer o que a lei
expressamente determina.
68

Quanto à ideologia, a Constituição de 1988 é classificada


como eclética, pois tolera e incentiva a livre circulação de
ideias. Por ocupar uma posição preferencial (preferred
position) no ordenamento, qualquer tentativa de proibir a
circulação de ideias necessitária de elevado ônus
argumentativo, sob pena de configurar intolerável censura.

Princípio da
Liberdade
de Manifestação
do Pensamento
e Vedação
à Censura
69

Jurisprudência relevante:
(i) A lei de Imprensa não foi recepcionada pela CF/88.
(ii) É dispensável o diploma de jornalista para veiculação
habitual de notícias.
(iii) É constitucional a abertura de inquérito policial para
apurar "fake news".
(iv) É inconstitucional a lei eleitoral que proíbe sátiras e
humor durante o período de eleições.
(v) É constitucional o proselitismo religioso.
(vi) É constitucional a lei estadual que permite o sacrifício
ritual de animais em cultos de religiões de matriz africana,
desde que sem excessos ou crueldades.
(vii) O ensino religioso nas escolas públicas pode ter
natureza confessional.
(viii) a Constituição assegura a liberdade de pensamento,
mas veda o anonimato.
(ix) A Constituição tutela a escusa de consciência, mas
impõe o cumprimento de prestação alternativa, sob pena de
suspensão dos direitos políticos.
(x) É possível a remarcação de datas e horários de prova de
concurso por motivos de consciência religiosa, desde que
atendidos determinados requisitos.
(xi) É constitucional a vacinação obrigatória (que não se
confunde com a vacinação compulsória).
70

A privacidade decorre da proteção dos direitos da


personalidade e, portanto, da própria dignidade da pessoa
humana. O tema se torna um hard case quando colide com
o direito à informação.
Direito à Jurisprudência relevante:
Privacidade (i) O STF dispensa a autorização prévia nas biografias não
autorizadas, em prestígio à liberdade de pensamento e
vedação à censura.
(ii) O STF disse que o direito ao esquecimento é
incompatível com a Constituição. Contudo, em situações
excepcionais é possível a proteção da privacidade.
Direito de A censura e a proibição de circulação de ideias devem ser
Resposta medidas excepcionalíssimas. Ou seja, somente ocorrerão
e de em casos extremos - ex.: racismo. É preferível em seu lugar:
Indenização o direito de resposta, retratação e direito de indenização.
Representa o inciso mais cobrado em sua banca. Decorre
do próprio direito à privacidade, tutelando também o
sossego e a segurança do indivíduo. Mas, não é um direito
absoluto e encontra mitigações na ordem constitucional.
Mitigações da inviolabilidade de domicílio:
C onsentimento do morador
F lagrante delito
O rdem judicial (durante o dia)
Inviolabilidade D esastre
de Domicílio S ocorro (prestar socorro)
S ítio (estado de sítio)
- Dica: C F O F S S
71

Pontos importantes:
(i) "Dia" = 6h às 18h (majoritário).
(ii) "Casa" = recebe interpretação ampliativa pelo STF.
(iii) Apenas o Juiz pode expedir mandado judicial de quebra
domiciliar.
(iv) Flagrante delito abrange crimes e contravenções penais.
(v) Estão compreendidas todas as modalidades de flagrante
delito (próprio, impróprio e presumido).
Decorre do próprio direito à privacidade, abrangendo o sigilo
a correspondência, comunicações telegráficas,
comunicações de dados (bancário e fiscal), comunicações
Direito ao Sigilo telefônicas, e também as comunicações telemáticas
(Liberdade de (guiando-se pela interpretação evolutiva).
Comunicação Pontos importantes sobre a quebra:
Pessoal) (i) Toda quebra é excepcional.
(ii) Todas as comunicações são passíveis de quebra
(interpretação sistemática do art. 5º, XII, da CF).
(iii) As quebras somente podem ocorrer perante a
persecução penal.
(iv) O sigilo telemático também está protegido
constitucionalmente (interpretação evolutiva).
72

Decorre da liberdade de expressão e dispensa autorização


prévia. Exige fins pacíficos e prévio aviso.
Julgados relevantes:
(i) O STF dispensou o prévio aviso formal quando ele tolher
o próprio direito de reunião. A ausência dele não tornaria a
Direito de reunião em ilícita.
Reunião (ii) O STF liberou a "marcha da maconha" e de outras
drogas, conferindo interpretação conforme ao art. 287 do
Código Penal.
Também decorre da livre manifestação do pensamento.
Exige fins lícitos.
Direito de Reunião X Direito de Associação
Direito de Reunião Direito de Associação
Os reunidos possuem Os associados possuem
um vínculo físico um vínculo abstrato
Caráter transitório Caráter permanente
e efêmero e duradouro
Direito de Ex.: marcha da maconha, Ex.: associação do
Associação protestos em ruas Greenpeace
Pontos importantes:
(i) A dissolução compulsória da associação exige trânsito
em julgado, mas a suspensão apenas decisão judicial.
(ii) Veda-se associações de caráter paramilitar.
(iii) Ninguém pode ser compelido a associar-se ou manter-se
associado.
São valores que devem ser interpretados conjuntamente. A
função social da propriedade decorre da repersonalização
73

Direito à (despatrimonialização) do Direito. O caráter patrimonialista e


Propriedade individualista cede vez à dignidade da pessoa humana. A
e Função Social função social atenderá a finalidade coletiva da propriedade.
da Propriedade A propriedade deve estar à serviço da pessoa e da vida.
Livre Acesso Também recebeu grande peso do Constituinte. Garante a
à Informação todos o acesso à informação, bem como o direito de receber
(Liberdade de dos órgãos públicos informações de seu interesse particular,
Informação) coletivo ou geral. Ressalva-se, apenas, as informações que
ameaçassem a segurança da sociedade e do Estado.
A lei não excluirá do Poder Judiciário lesão ou ameaça a
direito. A Constituição de 1988 baniu o sistema de
"jurisdição condicionada", também chamada de "instância
Princípio da administrativa de curso forçado".
Inafastabilidade Situações sui generis de acesso à justiça:
da Jurisdição ▪ Justiça desportiva e reclamação constitucional =
exigem o esgotamento das vias administrativas
▪ Habeas data e INSS = exigem prévio requerimento
administrativo (e não "esgotamento").
Preocupa-se com a segurança jurídica das relações, seja na
dimensão subjetiva (proteção da confiança), seja na
dimensão objetiva (direito adquirido, ato jurídico perfeito e
Garantia de coisa julgada).
Estabilidade
das Relações
Jurídicas
(Segurança
Jurídica)
74

▪ Direito adquirido = representa o Direito que já se


incorporou ao patrimônio jurídico de seu titular (conteúdo).
▪ Ato jurídico perfeito = representa o ato já
consumado segundo a lei vigente no tempo em que se
efetuou (forma).
▪ Coisa julgada = representa a decisão judicial que
não comporta mais recursos.
São ordens dadas pelo legislador constituinte ao legislador
Mandados de infraconstitucional para criminalizar determinadas condutas -
Criminalização ex.: racismo, tortura, terrorismo, tráfico de drogas, crimes
hediondos, crimes contra a ordem constitucional e o Estado
Democrático.
Princípio Representa um supraprincípio ou sobreprincípio processual
do Devido que abriga todos os demais princípios processuais: juiz
Processo Legal natural, motivação e publicidade das decisões, ampla
defesa, contraditório, celeridade, economia processual.
Aplicação É uma metanorma (ou norma de segundo grau), pois traz
Imediata dos uma norma que estabelece o modo de aplicação e
Direitos interpretação de outras normas. Traz um mandamento de
Fundamentais otimização dos direitos e garantias fundamentais; exigindo
que tenham aplicação imediata na maior medida possível.
Princípio da não Diz que o catálogo de direitos fundamentais não é taxativo
Taxatividade (ou (ou típico), pois as enunciações trazidas pelo Texto
da não Constitucional são meramente exemplificativas. Ou seja, em
Tipicidade) razão desta textura aberta da Constituição, é plenamente
dos Direitos possível que um Tratado Internacional ratificado pelo Brasil
Fundamentais
75

incorpore novos direitos fundamentais - ex.: princípio do


duplo grau de jurisdição.
Existem três hierarquias de tratados internacionais:
a) Status Constitucional = representa os tratados
internacionais de direitos humanos que tenham sido
aprovados com o quórum do art. 5º, § 3, CF - isto é,
aprovação por três quintos dos membros das duas Casas do
Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado
Federal), em dois turnos de votação.
b) Status supralegal = representa os tratados
Hierarquia internacionais de direitos humanos que não obtiveram o
dos Tratados quórum de aprovação do art. 5º, § 3, CF - isto é, não
Internacionais atingiram o quórum qualificado de três quintos dos membros
das duas Casas do Congresso Nacional (Câmara dos
Deputados e Senado Federal), em dois turnos de votação.
c) Status de lei ordinária = representa os tratados
internacionais que não versem sobre direitos humanos. Isto
é, representa todos os demais tratados que não sejam de
direitos humanos.
*OBS: Por força de uma norma supralegal (art. 7º, 7, do
Pacto de San José da Costa Rica), a prisão do depositário
infiel teve a eficácia paralisada (Súmula vinculante nº 25).
Visando conferir maior proteção aos direitos fundamentais, o
§ 4º do art. 5º da CF previu a submissão do Brasil ao
Tribunal Penal Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha
Internacional manifestado adesão. A existência do chamado "TPI" não
76

fere o princípio da soberania nacional e foi instituído pelo


Estatuto de Roma (Decreto nº 4.388/2002).

3.4. Questões CEBRASPE no tema

1. (INSS – Técnico do Seguro Social – CEBRASPE – 2016) A respeito dos


direitos fundamentais, julgue o item a seguir.

O direito à vida desdobra-se na obrigação do Estado de garantir à pessoa o


direito de continuar viva e de proporcionar-lhe condições de vida digna.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

2. (PC/BA – Delegado de Polícia – CEBRASPE – 2013) Em relação aos


direitos e deveres fundamentais expressos na Constituição Federal de 1988
(CF), julgue o item subsecutivo.

A proteção do direito à vida tem como consequência a proibição da pena de


morte em qualquer situação, da prática de tortura e da eutanásia.

CERTO ou ERRADO?
77

Gabarito: ERRADO.

3. (PF – Escrivão de Polícia – CEBRASPE – 2021) A polícia foi acionada para


atender a um chamado de suspeita de ocorrência de tráfico ilícito de
entorpecentes no interior de determinada sociedade de economia mista federal.
Ao chegar ao local, os policiais verificaram que um dos traficantes era um
brasileiro naturalizado. Considerando essa situação hipotética, julgue o item
subsecutivo.

O tráfico ilícito de entorpecentes é crime inafiançável.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

4. (PF – Delegado de Polícia Federal – CEBRASPE – 2021) Considerando a


posição majoritária e atual do Supremo Tribunal Federal (STF), julgue o item a
seguir, a respeito dos fundamentos constitucionais dos direitos e deveres
fundamentais, do Poder Judiciário, da segurança pública e das atribuições
constitucionais da Polícia Federal.

Como regra, a medida própria para a reparação de eventual abuso da liberdade


de expressão é o direito de resposta ou a responsabilização civil, e não a
supressão de texto jornalístico por meio de liminar.

CERTO ou ERRADO?
78

Gabarito: CERTO.

5. (PF – Delegado de Polícia Federal – CEBRASPE – 2018) A respeito dos


direitos fundamentais e do controle de constitucionalidade, julgue o item que se
segue.

De acordo com o STF, é inconstitucional proibir que emissoras de rádio e TV


difundam áudios ou vídeos que ridicularizem candidato ou partido político
durante o período eleitoral.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.
79

⮚ CAPÍTULO 4 – REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS

4.1. Habeas corpus (art. 5º, LXVIII da CF)


80

Art. 5º, LXVIII, CF - Conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer


ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de
locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.

O habeas corpus visa proteger a liberdade de locomoção, ou seja, o direito de ir,


vir, permanecer, sair, passear, circular, transitar. A doutrina diz que este remédio
constitucional tutela a chamada liberdade ambulatória (ou direito de
locomoção).

Literalmente, habeas corpus significa "que tenhas teu corpo", "toma teu
corpo". Ou seja, o habeas corpus visa combater uma ilegalidade ou abuso de
poder contra a liberdade de ir e vir.

Representa uma das garantias constitucionais mais importantes, pois sem a


liberdade de locomoção inexistiriam as demais liberdades.

4.1.1. Espécies de habeas corpus

Há duas espécies de HC:6

a) Habeas corpus preventivo: é manejado quando há uma ameaça à liberdade


de locomoção. Nesta hipótese, o Juiz concederá um salvo-conduto. Esta
modalidade de habeas corpus teve gênese nas primeiras convocações feitas
pelas CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito), onde os "intimados" não

6
LENZA, Pedro – Direito Constitucional Esquematizado, 17ª ed. rev. atual. e ampl. – São Paulo:
Saraiva, 2013, p. 1118.
81

sabiam a condição em que seriam ouvidos (se como testemunhas ou como


acusados). Acaso fossem testemunhas, e desejassem exercer seu direito ao
silêncio (que apenas pertencente aos acusados), eles poderiam ser presos em
flagrante por crime de falso testemunho (art. 342, CP - "calar a verdade").
Recentemente, esta polêmica tornou a à baila durante a "CPI da Covid", em
2021.

b) Habeas corpus repressivo (suspensivo ou liberatório): é manejado


quando a agressão à liberdade de locomoção já se consumou. Nesta hipótese,
o Juiz concederá um alvará de soltura, a fim de liberdade o indivíduo do
cárcere. É a hipótese mais comum na praxe forense - ex.: um juiz incompetente
decretando uma prisão preventiva.

4.1.2. Pontos importantes do habeas corpus

O habeas corpus possui ampla utilização no dia a dia criminal - obviamente


apenas para proteger a liberdade de locomoção. A jurisprudência, então, impõe
limitações importantes para o manejo deste writ. Este, certamente, é o ponto
mais cobrado na CEBRASPE.

(i) Animais: não cabe habeas corpus em favor de animais. Embora a doutrina
atual (sobretudo a portuguesa e a alemã) discutam a natureza jurídica dos
animais (se "meras res / coisas" ou "seres sencientes"), a jurisprudência
majoritária entende que a Constituição não protegeu a liberdade de locomoção
dos animais. Ou seja, o habeas corpus é privativo de seres humanos.
82

(ii) Objetos: da mesma forma, não é possível impetração deste writ em favor de
objetos, ainda que sejam muito importantes para locomoção de um ser humano -
ex.: carro ou cadeira de rodas apreendidos. Há outros remédios
constitucionais que fariam esta proteção, como o mandado de segurança ou
ações ordinárias.

(iii) Pessoas jurídicas: não é possível impetrar habeas corpus em favor de


pessoas jurídicas, pois elas não possuem liberdade de locomoção. A pessoa
jurídica que representa a união de seres humanos em prol de algum objetivo
(teoria da realidade técnica). Em razão dessa abstração, não seria possível
prender, muito menos livrar uma pessoa jurídica do cárcere. Contudo, é possível
que a pessoa jurídica seja impetrante do habeas corpus, e desde que em favor
de um ser humano.

(iv) Penas de multa: em razão de ser dívida de valor, não é possível impetrar
habeas corpus para debater a inexigibilidade desta pena. Isto porque, após 1996
o não pagamento da pena de multa não converte mais a pena em privativa de
liberdade (os §§ do art. 51 do Código Penal foram revogados pela Lei nº
9.268/1996). Logo, inexistindo risco de cárcere, não seria possível utilizar o
habeas corpus. Trata-se, inclusive, do entendimento constante na súmula 693
do STF:

Súmula 693 do STF - Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a


pena de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena
pecuniária seja a única cominada.
83

(v) Extinção da punibilidade: uma vez presentes as causas de extinção da


punibilidade - e, por consequência, não existindo risco de prisão - não é
cabível o habeas corpus.

(vi) Crimes de responsabilidade ou impeachment: não é cabível habeas


corpus contra o processo de impeachment, pois não acarreta sanções
privativas de liberdade. A condenação em crimes de responsabilidade
acarreta, apenas, perda do cargo e inabilitação para o exercício da função
pública.

(vii) Processos administrativos, de improbidade administrativa ou de


suspensão dos direitos políticos: pelo mesmo motivo do item anterior, não
cabe habeas corpus. Não há risco de prisão; trazendo sanções que atingem
apenas a esfera de direitos (e não o corpo) do apenado.

(viii) Punições disciplinares militares: não cabe habeas corpus para


questionar as punições disciplinares militares (art. 142, § 2º, CF), pois isto
subverteria a hierarquia e disciplina militares.

❖ Observação: ainda que este ponto desborde ligeiramente do edital do


INSS, tome cuidado com a forma da pergunta da prova neste tema. Segundo a
literalidade da Constituição não cabe habeas corpus, inexistindo quaisquer
ressalvas. Contudo, a doutrina defende o cabimento do habeas corpus para
debater eventual ilegalidade da punição disciplinar (o mérito jamais). Desta
sorte, é possível que este tema lhe seja perguntado de três formas distintas:

Punições Disciplinares Militares


84

"Segundo a Constituição..." Jamais caberá HC


"Segundo a doutrina ou jurisprudência..." Somente diante de ilegalidades
Se não discriminar, marque o mais completo Somente diante de ilegalidades

(ix) Dilação probatória: o habeas corpus não pode ser utilizado como de
dilação probatória ou para reparar erros jurisdicionais. Isto porque, sua via é
estreita, ou seja, é dotado de procedimento célere e sumário.

(x) Capacidade postulatória: não é necessário ser advogado para impetrar


habeas corpus, isto é, este remédio heroico não exige capacidade postulatória;
podendo ser impetrado por todos.

(xi) Autoridades coatoras: via de regra, o habeas corpus será impetrado


contra atos do Poder Público (ilegalidades ou abusos de poder). Contudo,
excepcionalmente, ele poderá ser impetrado contra atos de particulares - ex.:
hospital que não libera o paciente inadimplente de suas dependências enquanto
ele não pagar a conta do hospital. Haveria, no caso, exercício arbitrário das
próprias razões (art. 345, CP), passível de ser questionado via habeas corpus.
Não pode o particular tolher a liberdade de locomoção de outrem; isto
equivaleria a fazer justiça pelas próprias mãos.

(xii) Gratuidade: tanto o habeas corpus, quanto o habeas data são gratuitos
(art. 5º, LXXVII, CF). Guarde o seguinte processo mnemônico: "os remédios
constitucionais com nome em latim não têm custas".

(xiii) Habeas corpus coletivo: a jurisprudência recente do STF tem admitido a


impetração de habeas corpus coletivo em analogia ao que ocorre com o
85

mandado de segurança coletivo. A despeito de não ter previsão legal, diante dos
novos conflitos da sociedade contemporânea ("sociedade de massa"),
revela-se imprescindível a tutela coletiva também no âmbito penal. A
viabilidade do habeas corpus coletivo foi amplamente debatida no leading case
das mulheres grávidas ou com filhos menores de 12 anos que permaneciam
recolhidas ao cárcere, a despeito de terem direito à prisão domiciliar (HC nº
143.641/SP).

Em suma, são dezenas, senão centenas de julgados importantes sobre o


Habeas Corpus. Os 13 pontos anteriores resumem com fidelidade os pontos
mais importantes para sua prova.

❖ Importante para a sua prova: presente a vastidão jurisprudencial sobre


o habeas corpus, assinale a alternativa que reúna dois elementos ser humano
ameaçado de prisão + risco efetivo de ser preso. Se faltar qualquer um destes
elementos, não será cabível o habeas corpus. É assim que raciocina a
jurisprudência dos Tribunais Superiores.

4.2. Habeas data (art. 5º, LXXII da CF e Lei nº 9.507/97)

Art. 5º, LXXII, CF - Conceder-se-á "habeas-data":


a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do
impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades
governamentais ou de caráter público;
86

b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo


sigiloso, judicial ou administrativo.

O habeas data visa assegurar o acesso de informações ou retificação de dados


do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades
governamentais ou de caráter público.

Literalmente, habeas data significa "que tenhas tua informação / teus dados",
"toma tua informação / teus dados".

O habeas data é uma criação norte-americana (Freedom of Information Act de


1974), que visa tutelar, sobretudo, o princípio da privacidade do indivíduo e a
retidão de suas informações perante o Poder Público. Daí ter vingado na
maioria das Constituições da América Latina - pós regime-militar -, surgindo no
Brasil com a Constituição de 1988.

4.2.1. Hipóteses de cabimento do habeas data

A Constituição Federal de 1988 trouxe duas hipóteses de cabimento (alíneas a e


b abaixo) e a Lei nº 9.504/97 trouxe uma terceira hipótese (alínea c).

a) Acesso às informações pessoais: o habeas data garante o conhecimento


de informações do próprio indivíduo - ex. um indivíduo que deseja saber se já
pagou determinado tributo federal perante o banco de dados da Receita Federal
do Brasil.
87

b) Retificação de dados: "retificação" significa corrigir, arrumar. Esta


expressão abrange dados do indivíduo que estejam errados ou desatualizados.
Ou seja, o indivíduo teve conhecimento deles, mas não conseguiu retificá-los na
via administrativa - ex.: há informação incorreta da metragem de um imóvel
perante o banco de dados de uma Prefeitura; o que provoca a cobrança
incorreta do IPTU.

c) Anotação dos assentamentos do interessado: a Lei do Habeas Data


acrescentou uma terceira hipótese além do Texto Constitucional: cabimento do
habeas data "para a anotação nos assentamentos do interessado, de
contestação ou explicação sobre dado verdadeiro, mas justificável e que esteja
sob pendência judicial ou amigável". Esta última hipótese tutela a presunção de
inocência do indivíduo e o protege contra possíveis humilhações ou
situações vexatórias.

4.2.2. Pontos Importantes do habeas data

(i) Ação personalíssima (como regra): o habeas data só pode ser utilizado
para acesso ou retificação de informações do próprio impetrante. Isto é, não é
possível o manejo do habeas data para acessar informações de terceiros.

(ii) Herdeiros do titular das informações (exceção): a regra anterior, contudo,


possui uma exceção: os herdeiros ou cônjuge do falecido podem impetrar
habeas data para preservar a memória do titular das informações. Segundo o
art. 12, parágrafo único, do Código Civil podem defender os direitos da
personalidade do falecido (suas informações pessoais, portanto) o cônjuge ou
qualquer parente em linha reta ou colateral até o quarto grau (até primos,
88

tios-avôs ou sobrinhos-netos). Guarde o seguinte processo mnemônico: "o


C.A.D.I. defende o titular das informações post mortem" (Cônjuge, Ascendentes,
Descendentes e Irmãos).

(iii) Recusa administrativa X interesse processual: exige-se para a


impetração do habeas data a prévia recusa ou omissão administrativa (art. 8º,
parágrafo único, da Lei nº 9.507/97 e Súmula nº 02 do STJ). Ou seja, o indivíduo
deve comprovar que tentou obter ou retificar a informação na via administrativa,
mas não teve sucesso, sob pena de não configurar o interesse processual da
ação. Dispensa-se, contudo, o esgotamento da instância administrativa, como
ocorre na Reclamação Constitucional contra atos ou omissões da Administração
Pública (art. 7º, § 1º, da Lei nº 11.417/2006) e no âmbito da justiça desportiva
(art. 217, § 1º, CF).

(iv) Pessoas jurídicas: ao contrário do habeas corpus, as pessoas jurídicas são


titulares de direitos à informação - ex.: CNPJ, domicílio, informações tributárias.
Assim sendo, o habeas data pode ser impetrado por qualquer pessoa física ou
jurídica.

(v) Legitimidade passiva: o habeas data deve ser impetrado contra registros
ou bancos de entidades governamentais (Administração Direta ou Indireta -
ex.: Receita Federal do Brasil) ou bancos de caráter público (pessoas físicas
ou jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público ou de interesse
público, na qualidade de cessionárias ou permissionárias - ex.: Serviço de
Proteção ao Crédito (SPC) ou SERASA, que, segundo o art. 43, § 4º, Código
de Defesa do Consumidor, são considerados entidades de caráter público).
89

(vi) Habeas data coletivo: parte da doutrina defende a possibilidade deste


remédio na forma coletiva, isto é, por partido político, sindicato, entidades de
classe ou associações desde que em regime de representação processual
(art. 5º, XXI, CF). Para alguns autores, seria uma mitigação do caráter
personalíssimo do instituto, uma vez que haveria autorização dos filiados7. Seria
vedada, contudo, a impetração de habeas data coletivo em regime de
substituição processual (art. 5º, LXX, CF), pois aqui inexistiria à autorização
dos titulares da informação. Outros autores, contudo, negam a possibilidade de
habeas data coletivo8.

(vii) Dilação probatória: assim como foi dito no habeas corpus, o habeas data
também não admite dilação probatória, exigindo-se prova pré-constituída. A
dilação probatória seria incompatível com sua via processual, que é estreita e
célere.

(viii) Prioridade: o habeas data possui prioridade processual sobre todos os


atos judiciais, com exceção do habeas corpus e mandado de segurança (art. 19
da Lei nº 9.507/97).

(ix) Gratuidade: assim como foi dito no tópico anterior, tanto o habeas corpus,
quanto o habeas data são gratuitos (art. 5º, LXXVII, CF). Lembre-se do seguinte
processo mnemônico: "os remédios constitucionais com nome em latim não
têm custas".

Estes são os 9 pontos mais importantes sobre habeas data para a sua prova.
7
BULOS, 2017, p. 812.
8
NOVELINO, Marcelo. Curso de direito constitucional. 12. ed. rev. atual. e ampl. Salvador:
Juspodivm, 2017. p. 442.
90

4.3. Mandado de injunção (art. 5º, LXXI da CF e Lei nº 13.300/2016)

Art. 5º, LXXI, CF - Conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de


norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à
cidadania.

Um dos grandes problemas do Direito Constitucional contemporâneo é a falta


de efetividade das normas constitucionais, seja pela complexidade da
sociedade atual, seja pela falta de boa vontade dos administradores públicos.

Tentando romper com essa inefetividade, a Constituição de 1988 trouxe em seu


texto o mandado de injunção, que é o remédio constitucional que visa combater
uma doença jurídica grave: a síndrome da inefetividade das normas
constitucionais.

Ou seja, este remédio constitucional irá atuar na ausência de uma norma


regulamentadora, a fim de garantir a aplicabilidade dos direitos e liberdades
constitucionais.

Diz a doutrina que o mandado de injunção surgiu no direito europeu, mas sua
forma mais próxima está no writ of injuction, instituto norte-americano
destinado a tutelar direitos fundamentais comprometidos pela ausência de
norma legal.9

9
BULOS, 2017, p. 794.
91

Vejamos um exemplo clássico de mandado de injunção: o leading case formado


nos Mandados de Injunção nº 670, 708 e 712. Em razão da ausência de uma lei
específica para o direito de greve dos servidores públicos - exigida pelo art. 37,
VII, da CF -, o STF reconheceu a omissão legislativa e ordenou a aplicação, no
que coubesse, da lei de greve vigente no setor privado (Lei nº 7.783/89). Isto é,
o STF adotou uma posição concretista geral e viabilizou o exercício do direito
de greve pelos servidores públicos - outrora impedido em razão da inércia
legislativa.

Em poucas linhas, é possível afirmar que o mandado de injunção atua perante


as omissões constitucionais, visando colmatar as lacunas do Texto
Constitucional causadas pela inércia do legislador.

4.3.1. Pontos importantes do mandado de injunção

(i) Normas de eficácia limitada: o mandado de injunção atua diante das


chamadas normas de eficácia limitada. Isto é, são normas cuja aplicabilidade é
mediata, indireta e reduzida. Geralmente vem acompanhadas da seguinte
expressão "na forma da lei", "segundo definido em lei específica / complementar"
etc.

(ii) Legitimidade ativa: assim como o habeas data, não há vedação para que
pessoas jurídicas o impetrem. Logo, possui legitimidade ativa ampla, podendo
ser impetrado por pessoas físicas ou jurídicas.
92

(iii) Legitimidade passiva: apenas o ente estatal pode ser réu do mandado de
injunção; jamais particular. Obviamente, a tarefa de elaborar leis ou atos
normativos está reservada ao Poder Público, nomeadamente ao Poder
Legislativo ou, excepcionalmente, ao Poder Executivo (quanto à iniciativa
reservada e às medidas provisórias).

(iv) Lei própria: embora o mandado de injunção tenha surgido em 1988 (com a
promulgação da Constituição Federal), a lei que o regulamenta somente surgiu
em 2016 (Lei nº 13.300). Até este momento, o STF mandava aplicar,
subsidiariamente, a Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009). Daí a
doutrina dizer que vivemos, por quase trinta anos, de uma omissão ao
quadrado, pois o remédio constitucional que visava combater as omissões era
omisso. Noutras palavras, não existia a lei do remédio que visava combater a
falta de lei...

(v) Mandado de injunção coletivo: o art. 12 da Lei do Mandado de Injunção


permite sua modalidade coletiva, quando impetrado:

▪ Pelo Ministério Público, para tutela relevante da ordem jurídica, do


regime democrático ou dos interesses sociais ou individuais indisponíveis

▪ Por partido político com representação no Congresso Nacional, para


defesa dos direitos, liberdades e prerrogativas de seus integrantes ou
relacionadas com sua finalidade partidária

▪ Por organização sindical, entidade de classe ou associação


legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, para defesa
93

dos direitos, liberdades e prerrogativas de seus membros e desde que pertinente


às suas finalidades; dispensada autorização especial

▪ Pela Defensoria Pública, para tutela relevante à promoção dos direitos


humanos e à defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados

Atente-se, por fim, que o mandado de injunção coletivo não induz litispendência
em relação aos individuais, mas os efeitos da coisa julgada não beneficiarão o
impetrante que não requerer a desistência da demanda individual no prazo de
trinta dias a contar da ciência comprovada da impetração coletiva (art. 13 da Lei
nº 13.300/2016).

(vi) Elaboração da norma regulamentadora: se durante o curso do processo


do mandado de injunção, a autoridade omissa elaborar a norma, o processo
perde o objeto. Contudo, se a norma regulamentadora for produzida quando já
existir uma sentença transitada em julgado no processo do mandado de
injunção, tal norma só produzirá efeitos ex nunc - em respeito ao direito
fundamental da coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF). Há uma exceção, contudo,
se a norma elaborada for mais benéfica, ela poderá favorecer o impetrante
que já possui decisão transitada em julgada (art. 11 da Lei nº 13.300/2016).

Estes são os 6 pontos mais importantes sobre o mandado de injunção.

4.4. Ação popular (art. 5º, LXXIII, da CF e Lei nº 4.717/1965)


94

Art. 5º, LXXIII, CF - Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação
popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de
que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao
patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento
de custas judiciais e do ônus da sucumbência.

A ação popular é um instrumento colocado à disposição de qualquer cidadão


para invalidar condutas do Poder Público que sejam lesivas a determinados
interesses transindividuais - ex.: meio ambiente, erário, patrimônio histórico e
cultural.

Este remédio constitucional traz uma ideia ínsita de altruísmo, pois um cidadão
defenderá interesses que pertencem a toda sociedade, isto é, os direitos
difusos.

Possui origem no direito romano, que previa um instrumento para defesa "das
coisas próprias do povo" ou "direito próprio do povo". Com efeito, seria o povo
defendendo as coisas do próprio povo. Nos dias atuais, ela se atrela ao
exercício da cidadania, pois permite a participação do cidadão nos negócios do
Estado.

A ação popular é um instrumento democrático, que fortalece a participação


política, a soberania popular e visa defender o patrimônio público. Em resumo, a
ação popular permite uma dupla interferência do cidadão na vida pública:10

10
BULOS, 2017, p. 816.
95

▪ Fiscalização dos negócios do Estado, protegendo a administração


pública

▪ Ação judicial corretiva, protegendo os bens públicos e difusos, como o


erário, meio ambiente e o patrimônio histórico e cultural

4.4.1. Legitimidade ativa da ação popular

O ponto essencial na ação popular é saber quem se enquadra como cidadão,


pois somente ele terá legitimidade para impetrá-la. Em termos simples, cidadão
será aquele que vota, isto é, que exerce o direito de sufrágio, pois está no gozo
de seus direitos políticos positivos ativos.

(i) Podem ser cidadãos:

▪ Brasileiros natos
▪ Brasileiros naturalizados
▪ Analfabetos que optem por votar
▪ Menores entre 16 e 18 anos que optem por votar

(ii) Não podem ser cidadãos (e, por consequência, não podem impetrar a ação
popular):

▪ Menores de 16 anos
▪ Brasileiros natos ou naturalizados que não se alistaram
▪ Menores entre 16 e 18 anos que ainda não se alistaram como eleitores
96

▪ Brasileiros natos ou naturalizados que tiveram seus direitos políticos


suspensos ou perdidos (art. 15 da CF)
▪ Estrangeiros
▪ Pessoas Jurídicas (Súmula nº 365 do STF)
▪ Ministério Público (embora exista corrente minoritária que defenda a ideia
de uma "ação popular multilegitimária", a corrente majoritária entende que o
Ministério Público não pode impetrar a ação popular - pois ela seria exclusiva
do cidadão -, mas apenas continuar a ação cujo cidadão desistiu de
prosseguir).

4.4.2. Finalidade: defesa de direitos transindividuais ou difusos

O escopo da ação popular é fazer a defesa de direitos que pertencem a mais


de um indivíduo, desbordando da esfera subjetiva do impetrante.

Por consequência, a procedência da ação popular acarretará a nulidade ou


anulação dos atos e contratos administrativos que atentaram contra os referidos
bens transindividuais.

Como exemplos de direitos difusos pode ser citado - em rol meramente


exemplificativo - o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art.
225, CF), o erário, a moralidade administrativa, o patrimônio histórico e cultural.

Muitos se recordarão que foi através de uma ação popular que se barrou a
posse de uma Ministra do Trabalho, que possuir condenações trabalhistas
contra si. Segundo a o Juízo deste caso (4ª Vara Federal de Niterói/RJ), ofende
o princípio da moralidade pública nomear para um Ministério pessoa
97

condenada por ilegalidades na área que chefiará11. Pese embora, a decisão foi
revertida posteriormente, em grau recursal, pelo STJ e retomada pelo STF. Fica
registrado, apenas, um exemplo prático de ação popular.

4.4.3. Pontos importantes da ação popular

(i) Domicílio eleitoral do cidadão: a ação popular pode ser impetrada por
cidadão que não reside no município em que foi verificada a violação do direito
transindividual. Isto é, ainda que o cidadão possua título de eleitor de outra
localidade, nada tolhe sua legitimidade. A finalidade da ação popular é tutelar
direitos transindividuais; logo não seria razoável impor esta restrição - ex.: um
cidadão de São Paulo pode impetrar ação popular para defesa de algum
desmatamento na Floresta Amazônica.

(ii) Isenção de custas judiciais e ônus da sucumbência (como regra): o


autor da ação popular (cidadão) estará isento de custas judiciais e ônus da
sucumbência, como regra. Contudo, se tiver procedido de má-fé, ele deverá
arcar com este ônus. Lembre-se do brocardo: a boa-fé se presume; a má-fé se
prova. Busca-se evitar, assim, que a ação popular seja instrumento de
perseguições políticas ou palco para desmoralizações públicas.

(iii) Competência jurisdicional: em regra, a competência da ação popular será


sempre em primeira instância (art. 5º da Lei nº 4.717/1965). Ou seja, neste
remédio constitucional não há, como regra, foro por prerrogativa de função. Há
uma exceção, contudo: na competência originária do STF, prevista no art. 102, I,

11
Processo sob autos nº 0001786-77.2018.4.02.5102.
98

f e n, da Constituição Federal. Isto é, nos conflitos federativos entre a União e os


Estados, bem como nas causas em que haja interesses privativos da
Magistratura, a pressupor que os membros do Tribunal de origem sejam direta
ou indiretamente interessados.

(iv) Atos concretos: não cabe ação popular contra lei em tese, assim como
também se verifica no mandado de segurança. Exige-se um ato concreto
violando o direito transindividual.

(v) Sucedâneo do mandado de segurança: a ação popular não serve para


tutelar direito líquido e certo, fazendo as vezes do mandado de segurança. Ela
possui incidência específica e não se coaduna com a caráter residual daquele
mandamus. É o teor da Súmula nº 101 do STF:

Súmula nº 101 do STF - O mandado de segurança não substitui a ação


popular.

(vi) Coisa julgada: opera secundum eventum litis, isto é, se for procedente,
invalidará o ato impugnado e atingirá a todos (erga omnes); mas, se for
improcedente, pela deficiência de prova, os efeitos não atingem a todos. Neste
caso, haverá apenas coisa julgada formal, de modo que qualquer cidadão,
valendo-se de prova nova, poderá impetrar nova ação popular com idêntico
fundamento.

(vii) Intervenção móvel, legitimação bifronte ou migração pendular: é o


nome que a doutrina dá ao fenômeno previsto pelo art. 6º, § 3º, da Lei da Ação
Popular. Este dispositivo faculta a pessoa jurídica de direito público ou de direito
99

privado abster-se de contestar o pedido, ou mesmo atuar ao laudo do


impetrante - sempre visando a defesa do interesse público. Este fenômeno,
inclusive, aplica-se a todo microssistema processual coletivo, como como a ação
civil pública e a ação de improbidade administrativa.

Art. 6º, § 3º, Lei nº 4.717/1965 - A pessoas jurídica de direito público ou de


direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de
contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure
útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente.

Estes são os 7 pontos mais importantes sobre a ação popular.

4.5. Ação civil pública (art. 129, III, da CF e Lei nº 7.347/1985)

Art. 129, III, CF - São funções institucionais do Ministério Público:

III - Promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do


patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos.

Art. 1º, Lei nº 7.347/1985 - Regem-se pelas disposições desta Lei, sem
prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e
patrimoniais causados:
l - ao meio-ambiente;
ll - ao consumidor;
III - a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
100

IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo (rol exemplificativo);


V - por infração da ordem econômica; 
VI - à ordem urbanística;
VII - à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos;
VIII - ao patrimônio público e social.

Parágrafo único.  Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões
que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos
beneficiários podem ser individualmente determinados.

A ação civil pública também representa um instrumento de defesa de interesses


transindividuais. A distinção, contudo, reside na sua legitimação ativa.

Enquanto na ação popular a defesa do bem difuso é feita pelo cidadão, na ação
civil pública, a defesa é feita por um dos legitimados previstos no art. 5º da Lei
nº 7.347/1985.

4.5.1. Legitimados ativos da ação civil pública

Diz o art. 5º da Lei nº 7.347/1985 que poderão impetrar a ação civil pública:

▪ Ministério Público

▪ Defensoria Pública

▪ Administração Direta (União, Estados, Distrito Federal e Municípios)


101

▪ Administração Indireta (autarquias, empresas públicas, sociedades de


economia mista e fundações)

▪ Associação que, concomitantemente, (i) esteja constituída há pelo


menos um ano nos termos da lei civil (constituição ânua); e (ii) inclua, entre
suas finalidades institucionais, a proteção ao patrimônio público e social, ao meio
ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos
de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico (isto é, que tenha pertinência temática).

*OBS: O requisito temporal (constituição ânua) pode ser dispensado pelo juiz
quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou
característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido (art.
5º, § 4º, da LACP) - ex.: imaginem um condomínio recém-constituído que está
sendo ameaçado pela instalação de um lixão irregular nas proximidades. Em
razão da dimensão do dano/relevância do bem jurídico, não dará tempo para
esperar esse prazo de um ano para sua defesa. Contudo, o requisito material
(pertinência temática) não poderá ser dispensado.

Nos processos em que o Ministério Público não intervier como parte, ele será
obrigatoriamente fiscal da ordem jurídica (intervenção obrigatória - art. 5º, § 1º,
da LACP).

Ademais, o Poder Público e as associações possuem a faculdade de habilitar-se


como litisconsortes de qualquer das partes (art. 5º, § 2º, da LACO). E, se uma
associação desistir de modo infundado ou abandonar a ação, poderá o
102

Ministério Público ou qualquer outro legitimado deste rol assumir a titularidade


ativa (art. 5º, § 3º, da LACP).

4.5.2. Pontos importantes da ação civil pública

(i) Objeto: a ação civil pública visa defender os bens transindividuais listados
pelo art. 1º da LACP. Cuidado: trata-se de rol meramente exemplificativo
(inciso III diz "qualquer outro interesse difuso ou coletivo").

(ii) Vedação: não cabe ação civil pública para veicular pretensões que envolvam
tributos, contribuições previdenciárias, FGTS ou outros fundos cujos
beneficiários possam ser individualmente determinados (art. 1º, parágrafo único,
da LACP. Isto ocorre em razão do caráter disponível do direito. Para o manejo
desta ação constitucional, exige-se a chamada "relevância social do direito",
sob pena de desnaturar a ação coletiva.

(iii) Competência: segundo o art. 2º da LACP, a competência será do local onde


ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional (logo, absoluta) para
processar e julgar a causa. Embora a letra da lei fale em funcional, Barbosa
Moreira critica a expressão, dizendo se tratar de competência territorial
absoluta.

Estes são os 3 pontos mais importantes sobre a ação civil pública.

4.6. Mandado de segurança (art. 5º, LXIX e LXX, da CF e Lei nº 12.016/2009)


103

Art. 5º, LXIX, CF - Conceder-se-á mandado de segurança para proteger


direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data",
quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública
ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

Art. 5º, LXX, CF - O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:

a) Partido político com representação no Congresso Nacional;

b) Organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente


constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos
interesses de seus membros ou associados.

O mandado de segurança representa uma ação constitucional residual, que


irá tutelar os direitos não amparados pelos demais remédios constitucionais. Por
isto, é didaticamente recomendável analisar o mandado de segurança por
último.

De todos, o mandado de segurança é o que possui maior incidência na


prática. Há inúmeros exemplos de mandado de segurança - exs.: participar de
um concurso após injusta exclusão, obter um medicamento do SUS, liberar um
veículo apreendido por autoridade de trânsito etc.

4.6.1. Pontos importantes do mandado de segurança

(i) Direito líquido e certo: representa o direito que não admite dilação
probatória. Segundo célebre lição de Hely Lopes Meirelles, exige-se, no
104

mandado de segurança, prova pré-constituída, isto é, uma prova já produzida


com a inicial do mandado de segurança.

(ii) Vedações do mandado de segurança: não cabe mandado de segurança:

▪ De ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo,


independentemente de caução (salvo se for omissão da autoridade - Súmula nº
429 do STF)
▪ De decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo
▪ De decisão judicial transitada em julgado
▪ De atos de gestão comercial praticados pelos administradores de
empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de
serviço público
▪ Como substitutivo de ação de cobrança
▪ Contra lei em tese

(iii) Legitimidade passiva: o mandado de segurança será impetrado contra a


autoridade que praticou o ato impugnado ou da qual emanou a ordem para
sua prática (art. 6º, § 3º, da LMS).

❖ Importante para a sua prova: uma das questões mais frequentes na


CEBRASPE, sobre o mandado de segurança, é a teoria da encampação;
fielmente resumida pela Súmula nº 628 do STJ:

Súmula 628 do STJ - A teoria da encampação é aplicada no mandado de


segurança quando presentes, cumulativamente, os seguintes requisitos: a)
existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou informações e a
105

que ordenou a prática do ato impugnado; b) manifestação a respeito do mérito


nas informações prestadas; e c) ausência de modificação de competência
estabelecida na Constituição Federal.

(iv) Mandado de segurança coletivo: também é possível o mandado de


segurança coletivo, para defender direitos coletivos e direitos individuais
homogêneos. São legitimados para o mandamus coletivo:

▪ Partido político com representação no Congresso Nacional

▪ Organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente


constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos
interesses de seus membros ou associados

Segundo o art. 22, § 1º, da LMS, o mandado de segurança coletivo não induz
litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada não
beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a desistência de
seu mandado de segurança no prazo de trinta dias a contar da ciência
comprovada da impetração da segurança coletiva. 

(v) Prazo decadencial: o mandado de segurança possui um prazo decadencial


(não prescricional) de 120 dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato
impugnado (teoria da actio nata subjetiva).

❖ Observação: segundo o STJ, o prazo inicial do prazo decadencial


inicia-se na data em que o candidato toma ciência do ato administrativo que
determina sua exclusão do concurso, e não da publicação do edital do certame
106

(EREsp nº 1.124.254/PI) - ex. caso um candidato seja excluído indevidamente


por motivos de tatuagem, a data inicial da decadência será a da exclusão e não
da publicação do edital.

Estes são os 5 pontos mais relevantes sobre o mandado de segurança - sob o


prisma constitucional.

4.7. Direito de petição (art. 5º, XXXIV, a, da CF)

Art. 5º, XXXIV, a, CF - são a todos assegurados, independentemente do


pagamento de taxas:

a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra


ilegalidade ou abuso de poder.

O direito de petição (ou direito de representação) representa um direito público


subjetivo, conferido a qualquer pessoa, de acionar os Poderes Públicos.

Ele possui uma índole essencialmente democrática e permite a comunicação


contra atos ilícitos ou abusivos, independentemente do pagamento de taxas.

Ou seja, é também um instrumento de fiscalização dos negócios do Estado,


mas que traz grandes distinções dos remédios constitucionais anteriores.

4.7.1. Pontos importantes do direito de petição


107

Dois pontos que merecem destaque:

(i) Informalidade: o direito de petição não possui formalidades, isto é, não


precisa seguir o catálogo imposto pelo art. 319 e ss do Código de Processo Civil,
como se exige dos demais remédios constitucionais. Não se exige, ademais,
advogado; podendo ser impetrado por qualquer pessoa física ou jurídica.

(ii) Via administrativa: o direito de petição não exige processo judicial, ou


seja, é manejado por um processo administrativo. Mais ainda, o direito de
petição se satisfaz com uma singela petição no balcão de uma repartição pública
- ex.: petição pedindo saneamento básico para o bairro.

4.8. Direito de certidão (art. 5º, XXXIV, b, da CF)

Art. 5º, XXXIV, b, CF - são a todos assegurados, independentemente do


pagamento de taxas:

b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e


esclarecimento de situações de interesse pessoal.

Alguns autores tratam o direito de certidão como espécie do direito de petição,


uma vez que possuiriam a mesma natureza jurídica. Outros autores, contudo,
tratam o direito de certidão como um remédio constitucional autônomo. Adotarei
esta posição, apenas para fins didáticos.
108

Assegura a Constituição o direito de obter certidões, independentemente do


pagamento de taxas, para defesa de direitos ou esclarecimentos de interesse
pessoal.

A Lei nº 9.051/1995 regula o direito de obter certidão. Este diploma exige a


existência de interesse legítimo e impõe o prazo improrrogável de quinze
dias para a expedição da certidão, a contar do registro do pedido no órgão
expedidor.

Se a repartição pública criar embaraço ao direito de certidão, o interessado


poderá se valer do mandado de segurança; e não do habeas data, em razão
da natureza da informação pretendida (não personalíssima).

4.9. Revisão do tema

TABELA DE REVISÃO
109

Noção O HC tutela o direito de locomoção (liberdade


Geral ambulatória) contra ilegalidade ou abuso de
poder. Literalmente, "toma teu copo".
a) HC preventivo = há uma ameaça à
liberdade de locomoção. Expede-se um
Espécies salvo-conduto.
de HC b) HC repressivo = a agressão à liberdade de
locomoção já se efetivou. Expede-se um alvará
de soltura.
(i) Animais = privativo de seres humanos
(ii) Objetos = privativo de seres humanos
(iii) Pessoas jurídicas = não possuem
liberdade de locomoção. Não podem ser
pacientes, mas apenas impetrantes.
(iv) Penas de multa ou pecuniárias = são
dívidas de valor.
(v) Extinta a punibilidade = não há risco
efetivo de prisão.
(vi) Crimes de responsabilidade ou
Habeas impeachment = as sanções não são privativas
Corpus Não cabe de liberdade.
HC (vii) Processos administrativos, de
improbidade administrativa ou de
suspensão de direitos políticos = as sanções
também não são privativas de liberdade.
110

(viii) Punições disciplinares militares =


subverteria a hierarquia e disciplina. A doutrina
e jurisprudência, contudo, admitem o HC para
questionar eventual ilegalidade da punição.
(ix) Se for necessária dilação probatória =
sua via é estreita e célere.
(x) Capacidade postulatória = não se exige,
podendo ser impetrado por todos.
Outros (xi) Autoridades coatoras = em regra, o
pontos Poder Público. Excepcionalmente, o particular.
impor-tant (xii) Gratuidade = HC e HD são gratuitos.
es (xiii) Habeas corpus coletivo = é admitido
pelo STF, que vislumbra uma tutela coletiva
também no âmbito penal.
111

O HD tutela o acesso ou retificação de


Noção informações pessoais constantes de bancos
geral públicos ou de caráter público. Literalmente,
"toma tua informação" / teus dados".
a) Conhecimento das informações pessoais.
Cabi- b) Retificação de dados.
mento c) Anotação nos assentamentos do
interessado, de contestação ou explicação
sobre dado verdadeiro, mas justificável.
(i) Ação personalíssima = em regra, só pode
ser impetrada pelo próprio titular da informação.
(ii) Herdeiros e cônjuge = excepcionalmente, o
C.A.D.I. pode fazer a defesa do falecido.
(iii) Ação personalíssima = em regra, só pode
ser impetrada pelo próprio titular da informação.
Habeas (iv) Recusa administrativa = requisito
Data necessário para o interesse processual do HD.
Pontos (v) Pessoas jurídicas = podem ser
Impor- impetrantes, pois titulares de informações /
tantes dados.
(vi) Legitimidade passiva = banco de dados
público ou de caráter público - ex.: SPC e
SERASA.
(vii) HD coletivo = há divergência na doutrina.
Alguns autores sustentam que é possível sob o
regime de representação processual.
112

(viii) Dilação probatória = inviável, em razão


de sua via estreita e célere.
(ix) Prioridade = possui prioridade de
tramitação, com exceção do HC e MS.
Noção O MI atua na ausência de norma
geral regulamentadora, combatendo a síndrome da
inefetividade das normas constitucionais.
(i) Normas de eficácia limitada =
aplicabilidade mediata, indireta e reduzida.
(ii) Legitimidade ativa = ampla (pessoas
físicas ou jurídicas).
(iii) Legitimidade passiva = ente estatal.
(iv) Lei própria = demorou quase 30 anos para
surgir sua Lei própria (Lei nº 13.300/2016).
Mandado de Pontos (v) Mandado de injunção coletivo = possível
Injunção Impor- (art. 12, da LHD).
tantes (vi) Tutela de urgência = não cabível (STF).
(vii) Elaboração da norma regulamentadora
= Se ela for produzida:
▪ Durante o processo do MI: o processo
perderá o objeto; ou
▪ Após o trânsito em julgado do processo
do MI: produzirá apenas efeitos ex nunc (coisa
julgada), salvo se for mais benéfica ao
impetrante.
113

A AP é um instrumento colocado à disposição


Noção de qualquer cidadão, para a defesa de direitos
Geral difusos. É o povo fazendo a defesa das coisas
do povo; tendo origem no direito romano.
▪ Brasileiros natos
▪ Brasileiros naturalizados
Podem ser ▪ Analfabetos que optem
cidadãos por votar
▪ Menores entre 16 e 18
Legiti- anos que optem por votar
midade ▪ Menores de 16 anos
ativa ▪ Brasileiros natos ou
naturalizados que não se
alistaram
Ação ▪ Menores entre 16 e 18
Popular Não podem anos que ainda não se alistaram
ser como eleitores
cidadãos ▪ Brasileiros natos ou
naturalizados que tiveram seus
direitos políticos suspensos ou
perdidos (art. 15 da CF)
▪ Estrangeiros
▪ Pessoas Jurídicas
▪ Ministério Público
114

A finalidade da ação popular é fazer a defesa


de direitos que pertençam a mais de um
Fins indivíduo (difusos), a exemplo do meio
ambiente.
(i) Cidadão domiciliado em outro Município =
possui legitimidade, em razão da natureza
transindividual do direito.
(ii) Isenção de custas = salvo má-fé.
(iii) Competência jurisdicional = em regra,
perante a primeira instância.
Pontos (iv) Atos concretos = não combate lei em tese.
Import- (v) Sucedâneo do MS = vedado.
tantes (vi) Coisa julgada = secundum eventum litis.
(vii) Intervenção móvel = faculta a pessoa
jurídica vinculada ao dano abster-se de
contestar ou atuar ao lado do autor da AP -
desde que útil ao interesse público.
115

Noção A ACP representa um instrumento de defesa de


geral interesses transindividuais. A distinção para a
AP está na sua legitimação ativa.
Diz o art. 5º da Lei nº 7.347/1985 que poderão
impetrar a ação civil pública:
▪ Ministério Público
▪ Defensoria Pública
Legiti- ▪ Administração Direta (União, Estados,
midade Distrito Federal e Municípios)
ativa ▪ Administração Indireta (autarquias,
empresas públicas, sociedades de economia
Ação Civil mista e fundações)
Pública ▪ Associação constituída há mais de um
ano e com pertinência temática
(i) Objeto = Rol meramente exemplificativo no
art. 1º da LACP - ex.: danos ao meio ambiente.
Pontos (ii) Vedações = Direitos disponíveis, em que
impor- não se verifique a "relevância social do direito".
tantes (iii) Competência = competência funcional do
local do dano (para alguns autores =
competência territorial absoluta).
116

Noção O MS visa tutelar direito líquido e certo não


geral amparado por HC, nem HD. Ou seja, assume
um caráter residual perante os demais.
(i) Direitos líquido e certo = não admite
dilação probatória. A prova é pré-constituída.
(ii) Vedações = não cabe MS:
▪ De ato do qual caiba recurso
administrativo com efeito suspensivo,
independentemente de caução (salvo se for
omissão da autoridade - Súmula nº 429 do STF)
▪ De decisão judicial da qual caiba recurso
Mandado de Pontos com efeito suspensivo
Segurança impor- ▪ De decisão judicial transitada em
tantes julgado;
▪ De atos de gestão comercial praticados
pelos administradores de empresas públicas,
de sociedade de economia mista e de
concessionárias de serviço público 
▪ Como substitutivo de ação de cobrança
▪ Contra lei em tese
(iii) Legitimidade passiva = contra a
autoridade que praticou o ato impugnado ou da
qual emanou a ordem para sua prática.
(iv) MS coletivo = cabível perante os direitos
coletivos e individuais homogêneos (doutrina
diverge nos difusos).
117

(v) Prazo decadencial = 120 dias contados da


ciência, pelo interessado, do ato impugnado.
O Direito de Petição assegura,
Noção independentemente do pagamento de taxas, a
geral defesa de direitos ou a comunicação contra
Direito de ilegalidades ou abuso de poder.
Petição Pontos (i) Informalidade = não exige via formal.
impor-
tantes (ii) Via administrativa = dispensa a via judicial.

O Direito de Certidão assegura, independentemente do


pagamento de taxas, a obtenção de certidões em repartições
públicas, para defesa de direitos ou esclarecimento de
Direito de situações de interesse pessoal. Alguns autores a incluem
Certidão dentro do gênero "direito de petição". Outros o tratam como
remédio constitucional autônomo. Eventual embaraço
administrativa faculta impetração de mandado de segurança.

4.10. Questões CEBRASPE no tema

1. (PF – Delegado de Polícia Federal – CEBRASPE – 2013) A respeito do


controle de constitucionalidade, julgue os itens que se seguem.

O mandado de injunção é remédio jurídico apto a enfrentar a


inconstitucionalidade por omissão.

CERTO ou ERRADO?
118

Gabarito: CERTO.

⮚ CAPÍTULO 5 – DIREITOS SOCIAIS

5.1. Noção geral e conceito

Tratando de uma prova para o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), este
Capítulo revela-se como um dos mais importantes para a prova. Tenha
119

atenção, sobretudo, à Teoria Geral dos Direitos Sociais - que estudaremos a


partir de agora.

Pois bem.

Os direitos sociais representam as liberdades públicas que visam auxiliar os


menos favorecidos. Têm por objetivo proporcionar a eles melhores condições
de vida, isto é, uma vida digna.

Os direitos sociais possuem como finalidade o fundamento da dignidade da


pessoa humana e como objetivo alcançar o princípio da igualdade material (e
não meramente formal).

Por consequência, eles impõem uma prestação pelo Estado (um "fazer"),
exigindo um comportamento ativo do Poder Público. Noutras palavras, os
direitos sociais são também chamados de direitos promocionais, pois exigem
uma conduta positiva do Estado - ex.: saúde, educação, moradia, trabalho, lazer.

Era comum - em tempos remotos - a pecha de que os direitos sociais seriam


"mera carta de intenções" ou "meras diretrizes políticas". Outrora, atribuía-se aos
direitos sociais mero caráter filosófico; não sendo eles exigíveis dos Poderes
Públicos.

Isto mudou com neoconstitucionalismo.

Hoje, os direitos sociais possuem máxima força normativa, isto é, são


verdadeiros direitos subjetivos e podem ser cobrados do Estado. Ainda que o
120

Estado alegue insuficiência financeira, isto não exime ele de descumprir a


Constituição (veremos, adiante, a polêmica "Mínimo Existencial X Reserva do
Possível).

O direito constitucional contemporâneo exige que os direitos sociais saiam do


papel e se incorporem efetivamente na vida dos cidadãos brasileiros.

Com efeito, o "problema" hoje não reside mais na natureza jurídica dos direitos
sociais (plenamente adjudicáveis), mas sim da limitação financeira para
implementá-los - conforme veremos do item "Escolhas Trágicas", logo abaixo.

5.2 Natureza jurídica

Conforme vimos na Teoria Geral dos Direitos Fundamentais, os Direitos Sociais


se filiam à 2ª Dimensão dos direitos fundamentais / humanos.

A convivência pacífica e digna dos cidadãos não se satisfaz apenas com a


liberdade (1ª Dimensão), é preciso que o Estado forneça prestações aos mais
desfavorecidos; rompendo as barreiras da miséria e do abandono.

Naturalmente, os indivíduos não são iguais e enfrentam vicissitudes diversas:


doenças, desemprego, injustiças históricas, ruína familiar, incapacidade civil etc.

Os direitos sociais surgem, então, para corrigir a desigualdade entre os


indivíduos e garantir-lhes um padrão de vida mínimo. A isto denomina-se
mínimo existencial (ou mínimo vital).
121

Em termos simples, os direitos sociais (saúde, educação, moradia, trabalho,


lazer) representam um crédito contra o Estado, sendo constitucionalmente
garantidos pelo art. 6º a 11 e Título VIII da Constituição Federal.

Não se olvide, ademais, que os direitos sociais estão dentro do Título II da


Constituição ("Dos Direitos Fundamentais"), sendo, portanto, espécies de
direitos fundamentais. Tudo que foi falado na Teoria Geral dos Direitos
Fundamentais se aplica a este capítulo.

Aliás, embora o art. 60, § 4º, da CF mencione apenas os "direitos e garantias


individuais" como cláusulas pétreas, parte substancial da doutrina (quiçá
majoritária) defende que os direitos sociais também seriam cláusulas pétreas.

5.3. Surgimento na história constitucional

Segundo a doutrina majoritária, os direitos sociais possuem gênese


constitucional na Constituições do México (1917) e na Constituição da
Alemanha (Constituição de Weimar - 1919) - marcos históricos da ascensão do
Estado Social pelo mundo.

5.4. Objetivo dos direitos sociais


122

Os direitos sociais visam reduzir as desigualdades sociais e garantir uma


existência humana digna. Atrelam-se, pois, ao princípio da igualdade em sua
dimensão material.

Em suma, não basta a liberdade, é preciso um mínimo de igualdade social.

5.5. Dimensões do princípio da igualdade

O princípio da igualdade assenta a base dos direitos sociais; nomeadamente em


sua dimensão material.

De modo detalhado, o princípio da igualdade (ou da isonomia) possui duas


dimensões:

a) Igualdade formal, abstrata ou genérica: representa a igualdade que não


analisa o caso concreto; cingindo-se aos termos abstratos da lei. Esta
dimensão pressupõe que a igualdade não deve conhecer distinções. Para
alguns autores, esta é a igualdade recomendada ao Poder Legislativo, pois em
sua função típica (fazer normas) ele precisa agir com abstração e
generalidade. A lei não pode se ater as inúmeras vicissitudes concretas de seus
destinatários, sob pena de violar a essência da norma jurídica. Decorre,
portanto, da própria literalidade do art. 5º, caput, da Constituição Federal.

b) Igualdade material, concreta, substancial, real ou aristotélica: representa


a igualdade que leva em consideração o caso concreto; examinando, portanto,
cada situação concreta. Decorre da máxima aristotélica "tratar os iguais de modo
123

igual e os desiguais de modo desigual, na medida de sua desigualdade". Para


alguns autores, esta é a igualdade recomendada ao Poder Executivo e ao
Poder Judiciário, pois em suas funções típicas (julgar e administrar) deverão
sopesar as circunstâncias do caso concreto. Isto é, o Poder Executivo estudará
as melhores políticas públicas para cada localidade e o Poder Judiciário aplicará
a norma como recomenda o caso concreto.

Pois bem.

A igualdade em sua dimensão material fundamenta o que a doutrina denomina


de discriminações positivas, ou seja, políticas públicas que visam reduzir as
desigualdades, através da concessão de alguma vantagem.

Por corolário, as chamadas ações afirmativas extraem fundamento das


discriminações positivas, cujo exemplo mais famoso são as cotas raciais em
concursos públicos.

Contudo, não há que se perder de vista a essência temporária e exaurível de


tais políticas públicas. Ou seja, não podem ser eternas, mas apenas subsistir
enquanto durarem as desigualdades.

5.6. Mínimo existencial X reserva do possível: "escolhas trágicas"

Esta discussão surgiu na Alemanha, na década de 70, ao tentar resolver o


seguinte conflito constitucional: embora a Constituição Alemã garanta o direito à
educação gratuita para todos, havia, na prática, mais interessados do que
124

número de vagas. Inaugurava-se, então, o principal conflito dos direitos sociais:


como garantir os direitos sociais para todos que precisam?

Inicialmente, convém conceituar ambos os institutos:

a) Mínimo existencial: visa garantir os direitos básicos e imprescindíveis


para a subsistência humana. Mais ainda, uma subsistência digna. Também é
chamado como mínimo vital; constitui a tese do administrado para obter a
prestação social - ex.: saúde, educação, trabalho etc.

b) Reserva do possível: representa a tese do administrador público, que


alegará a limitação financeira para o fornecimento de todas as prestações
materiais requeridas por seus administrados. Ou seja, a reserva do possível
representa uma limitação fática e jurídica para a realização satisfatória de
todas as demandas sociais.

A equação deste binômio faz nascer a famosa teoria das "escolhas trágicas".
Esta insigne expressão de Guido Calabresi e Philip Bobbit diz que para cada
dimensão alocativa de recursos, há, implicitamente, uma dimensão
desalocativa.

Em suma, as "escolhas trágicas" representam o dia a dia do administrador


brasileiro, que - diante da escassez de recursos orçamentários e impossibilidade
de atender satisfatoriamente todos os direitos sociais constitucionais - terá que
se balizar por uma linha de prioridade, ou seja, um "regime de urgência" no
atendimento.
125

❖ Observação: é fato notório o acometimento do Sistema Único de Saúde


(SUS) para atender tempestivamente toda sua demanda, sobretudo nos locais
mais distantes do País. Não raras vezes seus pacientes falecem na inexaurível
"fila de espera". Isto apenas se agravou durante a pandemia por COVID-19 e
tirou o véu do que já ocorria em muitas UTIs brasileiras: qual paciente deve viver
e qual paciente deve morrer? Com o avassalador aumento das internações, as
"escolhas trágicas" pelos médicos intensivistas se tornaram um dos episódios
mais tristes desta peste. Contudo, isto não ocorre apenas na saúde pública, mas
também perante a educação, moradia, trabalho, assistência aos
desamparados...

Não há solução pacífica e consensual sobre este conflito. A própria


jurisprudência do STF tem oscilado caso a caso. A doutrina, então, diverge
fortemente: alguns autores defende o irrestrito atendimento das demandas
sociais; outros, contudo, censuram a posição ativista dos Tribunais nesta
missão.

Contudo, analisando holisticamente toda a jurisprudência do STF, pode-se


chegar a algumas convergências para este hard case:

(i) A demanda social deve ser analisada pelos princípios da proporcionalidade


e da razoabilidade;

(ii) A tese da "Reserva do Possível", pelo Poder Público, só pode ser invocada
se houver um "justo motivo objetivamente aferível". Ou seja, o Estado deve
comprovar cabalmente sua impossibilidade fática e jurídica em implementar o
direito social requerido. Ou seja, sua inaptidão administrativa ou gerencial não
126

pode servir de pretexto para frustrar os direitos sociais constitucionalmente


assegurados.

❖ Observação: para que você compreenda a dificuldade prática do tema,


trago a seguinte manchete jornalística "Justiça do DF manda Ministério da
Saúde garantir 'remédio mais caro do mundo' (medicamento Zolgensma, de R$
12 milhões) a criança com doença rara (AME)".12 A tese do ente era de que
existiria um "justo motivo objetivamente aferível" para não fornecer o tratamento
de saúde; do contrário, dezenas de milhares de habitantes daquele ente
sofreriam as consequências deste tratamento singular. Visando contornar esta
situação, a jurisprudência desenvolveu mais critérios. Vejamos.

(iii) Ainda que o Poder Público comprove um "justo motivo objetivamente


aferível" para não atender a demanda social, ele jamais poderá violar o
"núcleo essencial" dos direitos sociais. Isto é, há direitos que não admitem
negociação e representam um "núcleo duro" constitucional. Exemplo clássico é a
garantia do direito à saúde; que deverá ser necessariamente atendido pelo
Estado. Outros direitos, contudo, possuiriam uma "zona periférica", passível de
relativização ("negociação") perante o aludido "justo motivo objetivamente
aferível" - ex.: direito social ao lazer.

(iv) A implementação dos Direitos Sociais não compactua com o retrocesso


social. Isto é, uma vez garantida determinada prestação social, não se pode
retroceder (princípio da vedação ao retrocesso social - adiante).

12

https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/2020/08/17/justica-do-df-manda-ministerio-da-saud
e-garantir-remedio-mais-caro-do-mundo-a-crianca-com-doenca-rara.ghtml
127

Em resumo, não há saída única para harmonizar as "escolhas trágicas" em


direitos sociais. Existe, contudo, uma profusão de teorias e construções
jurisprudenciais; a fim de otimizar a implementação da Constituição, sem
menosprezar as dificuldades fáticas e jurídicas do Poder Público.

5.7. Vedação ao retrocesso social

O princípio da vedação ao retrocesso social possui o condão de impedir o


atraso civilizatório. Em termos mais simples: a proibição ao retrocesso impõe
limites nas modificações dos direitos conquistados; impedindo que um direito
socialmente conquistado seja alijado pelo Poder Público.

Em suma, uma vez conquistado um direito social não se admite retrocesso na


matéria.

Um exemplo aclarará este fenômeno: frequentemente há a tentativa de se


diminuir a lista de medicamentos fornecidos pelo SUS. Imbuídos de sentimento
inumano, não raras vezes os administradores públicos tentam frustrar os
medicamentos de "alto custo" fornecidos pelo erário. A atitude, contudo, viola
flagrantemente o princípio da vedação ao retrocesso social, pois uma vez
conquistado um direito (medicamento, no caso), não se pode mais retroceder.

Isto vale para todos os direitos sociais constitucionalmente implementados.


128

❖ Importante para a sua prova: a CEBRASPE já explorou os sinônimos


deste fenômeno. Guarde, então, que a vedação ao retrocesso social pode
aparecer com diversos nomes:

▪ Princípio da vedação ao retrocesso social


▪ Não retrocesso social
▪ Efeito cliquet
▪ Efeito catraca
▪ Ratchet effect
▪ Proibição da contrarrevolução social
▪ Proibição da retrogradação social
▪ Não evolução reacionária
▪ Não retorno da concretização
▪ Cláusula de entrincheiramento

5.8. Direitos sociais em espécie presentes no art. 6º da CF

A fim de memorizar o rol de direitos sociais listados pelo art. 6º da Constituição


Federal, guarde o seguinte processo mnemônico: EDU MORA LÁ, SAÚ
TRABALHA ALI, ASSIS PRO SEG PRESO TRANSPORTE

EDU cação
MORA dia
LA zer

SAÚ de
129

TRABALHA
ALI mentação

ASSIS tência aos desamparados


PRO teção à maternidade e à infância
SEG urança
PRE/SO = PRE vidência SO cial
TRANSPORTE

❖ Importante para a sua prova: é irrelevante guardar as características de


cada um destes onze direitos sociais. De outro lado, certamente será cobrado de
você cinco pontos sobre este rol do art. 6º da CF:

(i) A seguridade social representa o gênero, da qual são espécies a Saúde, a


Previdência Social e a Assistência Social. Não aparece neste rol o termo
"Seguridade Social", mas tão somente suas espécies.

(ii) A literalidade do art. 6º da Constituição contemplou apenas a "assistência à


maternidade" e a "assistência à infância". Não há menção expressa para a
"assistência à adolescência". Cuidado com alternativas que afirmem "assistência
à maternidade, à infância e à adolescência".

(iii) A "segurança" referida pelo art. 6º da CF representa, segundo a doutrina, a


segurança pública. Já a "segurança" referida pelo art. 5º, caput, da CF
representa a segurança jurídica.
130

(iv) Há três direitos sociais do art. 6º que não estavam na redação original de
1988: moradia (2000), alimentação (2010) e transporte (2015). Logo, o
transporte é o direito social mais novo do art. 6º; foi introduzido pela Emenda
Constitucional nº 90 de 2015. Isto já foi questionado em prova objetiva, mais de
uma vez.

(v) Obviamente, o rol do art. 6º da Constituição Federal é meramente


exemplificativo (não taxativo). Presente a fundamentalidade material, nada
impede que outros direitos sociais sejam revelados (vide art. 5º, § 2º, CF).

5.9. Programa permanente de transferência de renda (direito à renda


básica)

No final de 2021, o art. 6º da Constituição recebeu um novo parágrafo único,


introduzido pela Emenda Constitucional nº 114. Este dispositivo passou a
assegurar o direito a uma renda básica para todo brasileiro em situação de
vulnerabilidade social.

Além da grave questão sanitária, a pandemia de COVID-19 deixou uma grave


crise social; contexto que mobilizou a criação de programas sociais de
combate à miséria.

A despeito das tensões políticas que marcaram sua promulgação, a EC nº


114/2021 estabeleceu um novo regime de pagamentos de precatório, a fim de
abrir espaço fiscal para a implementação de programa permanente de
131

transferência de renda. A medida visou, portanto, assegurar o mínimo vital


para as famílias mais pobres.

Vejamos a redação deste dispositivo:

Art. 6º, parágrafo único, CF - Todo brasileiro em situação de vulnerabilidade


social terá direito a uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em
programa permanente de transferência de renda, cujas normas e requisitos de
acesso serão determinados em lei, observada a legislação fiscal e orçamentária.

5.10. Demais direitos sociais presentes nos arts. 7º a 11 da CF

Estatisticamente, os arts. 7º a 11 da Constituição Federal são menos


exigidos pelos concursos. Por vários motivos:

▪ Eles são, na sua maioria, autoexplicativos - ex.: todo trabalhador possui


direito ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)

▪ Eles não trazem, na sua maioria, números, quóruns, róis ou dados de


difícil memorização

▪ Eles estão incorporados na realidade de quase todo concurseiro; que


provavelmente vive ou já viveu sob o regime trabalhista da CLT

▪ Eles tocam mais os concursos trabalhistas; sendo menos frequentes no


seu perfil de prova.
132

Por estes vários motivos, recomendo a "leitura seca" destes dispositivos,


dispensando comentários doutrinários supérfluos.

Não obstante à infrequência do tema, há dois pontos que merecem destaque: os


artigos 7º, parágrafo único, e 11 da Constituição - que veremos a seguir.

5.10.1. Rol dos direitos trabalhistas (tabela comparativa)

O art. 7º, parágrafo único, da Constituição Federal traz um ponto de difícil


comparação e memorização: há alguns direitos trabalhistas que pertenceriam
aos domésticos em geral, outros aos domésticos especiais e outros, ainda, aos
servidores públicos ocupantes de cargo público (art. 39, § 3º, da CF).

Vale dizer, o ponto mais árduo que pode ser cobrado sobre este tema reside na
memorização dos direitos sociais possuídos pelos:

▪ Trabalhadores urbanos e rurais (art. 7º, caput = todos)

▪ Trabalhadores domésticos em geral (art. 7º, parágrafo único, primeira


parte = alguns)

▪ Trabalhadores domésticos especiais (art. 7º, parágrafo único, primeira


parte = alguns)

▪ Servidores ocupantes de cargo público (art. 39, § 3º = alguns)


133

A fim de facilitar a memorização deste artigo guarde a tabela abaixo:

Art. 7º, Trabalhadores Trabalhadores Servidores


parágrafo domésticos em Domésticos Ocupantes de
único, e geral especiais Cargo Público*
39, § 3º: (em acréscimo)
INCISOS IV, VI, VII, VIII, X, XIII, I, II, III, IX, XII, XXV e IV, VII, VIII, IX, XII,
XV, XVI, XVII, XVIII, XXVIII e a integração XIII, XV, XVI, XVII,
XIX, XXI, XXII, XXIV, à Previdência Social XVIII, XIX, XX,
XXVI, XXX, XXXI e XXII e XXX
XXXIII
I- - I - relação de -
emprego protegida
contra despedida
arbitrária ou sem
justa causa, nos
termos de lei
complementar, que
preverá indenização
compensatória,
dentre outros direitos;
II - - II - -
seguro-desemprego,
em caso de
desemprego
involuntário;
134

III - - III - fundo de -


garantia do tempo de
serviço;
IV - IV - salário Idem IV - salário
mínimo, fixado em lei, mínimo, fixado em
nacionalmente lei, nacionalmente
unificado, capaz de unificado, capaz
atender a suas de atender a suas
necessidades vitais necessidades
básicas e às de sua vitais básicas e às
família com moradia, de sua família com
alimentação, moradia,
educação, saúde, alimentação,
lazer, vestuário, educação, saúde,
higiene, transporte e lazer, vestuário,
previdência social, higiene, transporte
com reajustes e previdência
periódicos que lhe social, com
preservem o poder reajustes
aquisitivo, sendo periódicos que lhe
vedada sua preservem o poder
vinculação para aquisitivo, sendo
qualquer fim; vedada sua
vinculação para
qualquer fim;
V- - - -
135

VI - VI - Idem -
irredutibilidade do
salário, salvo o
disposto em
convenção ou acordo
coletivo;
VII - VII - garantia de Idem VII - garantia
salário, nunca inferior de salário, nunca
ao mínimo, para os inferior ao mínimo,
que percebem para os que
remuneração percebem
variável; remuneração
variável;
VIII - VIII - décimo Idem VIII - décimo
terceiro salário com terceiro salário
base na remuneração com base na
integral ou no valor remuneração
da aposentadoria. integral ou no
valor da
aposentadoria.
IX - - IX - remuneração IX -
do trabalho noturno remuneração do
superior à do diurno; trabalho noturno
superior à do
diurno;
X- X - proteção do Idem -
salário na forma da
136

lei, constituindo crime


sua retenção dolosa;
XI - - - -
XII - - XII - XII -
salário-família pago salário-família
em razão do pago em razão do
dependente do dependente do
trabalhador de baixa trabalhador de
renda nos termos da baixa renda nos
lei; termos da lei;
XIII - XIII - duração do Idem XIII - duração
trabalho normal não do trabalho normal
superior a oito horas não superior a oito
diárias e quarenta e horas diárias e
quatro semanais, quarenta e quatro
facultada a semanais,
compensação de facultada a
horários e a redução compensação de
da jornada, mediante horários e a
acordo ou convenção redução da
coletiva de trabalho; jornada, mediante
acordo ou
convenção
coletiva de
trabalho;
XIV - - - -
137

XV - XV - repouso Idem XV - repouso


semanal remunerado, semanal
preferencialmente remunerado,
aos domingos; preferencialmente
aos domingos;
XVI - XVI - remuneração do Idem XVI - remuneração
serviço extraordinário do serviço
superior, no mínimo, extraordinário
em cinquenta por superior, no
cento à do normal; mínimo, em
cinquenta por
cento à do normal;
XVII - XVII - gozo de férias Idem XVII - gozo de
anuais remuneradas férias anuais
com, pelo menos, um remuneradas com,
terço a mais do que o pelo menos, um
salário normal; terço a mais do
que o salário
normal;
XVIII - XVIII - licença à Idem XVIII - licença à
gestante, sem gestante, sem
prejuízo do emprego prejuízo do
e do salário, com a emprego e do
duração de cento e salário, com a
vinte dias; duração de cento
e vinte dias;
138

XIX - XIX - Idem XIX -


licença-paternidade, licença-paternidad
nos termos fixados e, nos termos
em lei; fixados em lei;
XX - - - XX - proteção do
mercado de
trabalho da
mulher, mediante
incentivos
específicos, nos
termos da lei;
XXI - XXI - aviso prévio Idem -
proporcional ao
tempo de serviço,
sendo no mínimo de
trinta dias, nos
termos da lei;
XXII - XXII - redução dos Idem XXII - redução
riscos inerentes ao dos riscos
trabalho, por meio de inerentes ao
normas de saúde, trabalho, por meio
higiene e segurança; de normas de
saúde, higiene e
segurança; e
XXIII - - - -
XXIV - XXIV - Idem -
aposentadoria;
139

XXV - - XXV - assistência -


gratuita aos filhos e
dependentes desde o
nascimento até 5
(cinco) anos de idade
em creches e
pré-escolas; e
XXVI - XXVI - Idem -
reconhecimento das
convenções e
acordos coletivos de
trabalho;
XXVII - - - -
XXVIII - - XXVIII - seguro -
contra acidentes de
trabalho, a cargo do
empregador, sem
excluir a indenização
a que este está
obrigado, quando
incorrer em dolo ou
culpa.
XXIX - - - -
XXX - XXX - proibição Idem XXX - proibição
de diferença de de diferença de
salários, de exercício salários, de
de funções e de exercício de
140

critério de admissão funções e de


por motivo de sexo, critério de
idade, cor ou estado admissão por
civil; motivo de sexo,
idade, cor ou
estado civil.
XXXI - XXXI - proibição Idem -
de qualquer
discriminação no
tocante a salário e
critérios de admissão
do trabalhador
portador de
deficiência; e
XXXII - - - -
XXXIII - XXXIII - proibição Idem -
de trabalho noturno,
perigoso ou insalubre
a menores de dezoito
e de qualquer
trabalho a menores
de dezesseis anos,
salvo na condição de
aprendiz, a partir de
quatorze anos.
XXXIV - - - -
141

- Integração à Regime Próprio de


Previdência Social. Previdência Social

Não é só. É possível que seu examinador cobre, ainda, o sentido contrário:
"quais incisos do art. 7º da Constituição Federal não aparecem em nenhuma
das três categorias acima?"

Resposta: para facilitar seu estudo, compilarei aqui os incisos que não
ingressaram no rol (i) dos trabalhadores domésticos em geral; (ii) dos
trabalhadores domésticos especiais; nem (iii) dos servidores públicos:

V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho;

XI - participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e,


excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei;

XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de


revezamento, salvo negociação coletiva;

XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou


perigosas, na forma da lei;

XXVII - proteção em face da automação, na forma da lei;

XXIX - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com
prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o
limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;
142

XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou


entre os profissionais respectivos; e

XXXIV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício


permanente e o trabalhador avulso.

5.10.2. Representante dos trabalhadores (número exato)

Por fim, cabe trazer luz a um "ponto cego" na leitura do art. 11 da Constituição
Federal.

Este dispositivo diz que somente nas empresas de mais de duzentos


empregados assegurar-se-á um representante destes (dos empregados) com a
finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os
empregadores.

Cuidado: "mais de duzentos" significa empresas com "duzentos e um


empregados ou mais". Logo, a interpretação gramatical deste dispositivo diz
que este direito não seria assegurado nas empresas que possuam tão somente
duzentos empregados. Tais "pontos cegos" na leitura da "lei seca" são
frequentemente explorados pelas bancas examinadoras.

5.11. Revisão do tema


143

TABELA DE REVISÃO
Os direitos sociais representam as liberdades públicas
Noção Geral que visam auxiliar os menos favorecidos;
e Conceito garantindo-lhes uma vida digna. São prestações
fornecidas pelo Poder Público, a fim de garantir a
igualdade material dos indivíduos.
São espécies de direitos fundamentais, decorrendo da
Natureza 2ª Dimensão deles. Tais prestações representam
Jurídica créditos contra o Estado - ex.: educação, saúde,
moradia, trabalho.
Surgimento Os direitos sociais têm gênese constitucional na
na História Constituições do México (1917) e na Constituição da
Constitucional Alemanha (Constituição de Weimar - 1919).
Objetivo dos Os direitos sociais visam reduzir as desigualdades
Direitos Sociais sociais e garantir uma existência humana digna.
Possui duas dimensões:
a) Igualdade formal = não analisa o caso concreto
(abstrata e genérica). Dirige-se, em regra, ao Poder
Dimensões do Legislativo.
Princípio da b) Igualdade material = analisa o caso concreto para
Igualdade "tratar o igual de modo igual e o desigual de modo
desigual, na medida das suas desigualdades".
Dirige-se, em regra, aos Poderes Executivo e
Judiciário.
O mínimo existencial visa garantir os direitos básicos e
imprescindíveis para a subsistência humana. É a tese
utilizada pelos administrados para obter as prestações
144

sociais. Já a reserva do possível é a tese do


Mínimo Existencial administrador público, que alegará a limitação
X Reserva do financeira para o fornecimento de todas as prestações
Possível: materiais requeridas por seus administrados.
"Escolhas As "escolhas trágicas" revelam, então, tensão dialética
Trágicas" destes dois institutos. Trata-se de verdadeiro hard
case na vida do administrador público. Não há solução
pacífica e consensual sobre este nó górdio; oscilando
a jurisprudência caso a caso.
Representa o fenômeno que visa impedir o atraso
civilizatório. Ou seja, uma vez conquistado um direito
não se pode mais retroceder.
Cuidado com os sinônimos deste fenômeno:
▪ Princípio da vedação ao retrocesso social
Vedação ao ▪ Não retrocesso social
Retrocesso ▪ Efeito cliquet
Social ▪ Efeito catraca
▪ Ratchet effect
▪ Proibição da contrarrevolução social
▪ Proibição da retrogradação social
▪ Não evolução reacionária
▪ Não retorno da concretização
▪ Cláusula de entrincheiramento
Rol de onze direitos sociais:
EDU cação
MORA dia
LA zer
145

SAÚ de
Direitos Sociais em TRABALHA
espécie presentes ALI mentação
no art. 6º da CF
ASSIS tência aos desamparados
PRO teção à maternidade e à infância
SEG urança
PRE/SO = PRE vidência SO cial
TRANSPORTE
- Dica: EDU MORA LÁ - SAÚ TRABALHA ALI -
ASSIS PRO SEG PRE/SO TRANSPORTE
Programa permanente No final de 2021, o art. 6º da Constituição recebeu um
de transferência de novo parágrafo único - através da EC nº 114 - que
renda (direito à renda passou a assegurar o direito a uma renda básica para
básica) todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social.
Isto é, um programa permanente de transferência de
renda.
Recomendo, no ponto, tão somente a leitura da "lei
Demais Direitos seca" destes dispositivos - dispensando-se
Sociais presentes nos comentários doutrinários supérfluos. Sem prejuízo, dê
arts. 7º a 11 da CF ênfase aos arts. 7º, parágrafo único, e 11, da CF.

5.12. Questões CEBRASPE no tema


146

1. (TCE/RJ – Auditor de Controle Externo – CEBRASPE – 2021) Com relação


aos direitos fundamentais, julgue o item a seguir.

A segurança pública é um direito fundamental social.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

2. (DP/DF – Defensor Público – CEBRASPE – 2019) Acerca dos direitos e


garantias fundamentais e de seus princípios fundamentais, julgue o item que se
segue.

A revogação de norma que assegura direitos fundamentais sociais, sem a


implementação de medidas alternativas que tenham a capacidade de compensar
eventuais perdas já sedimentadas, contraria o princípio da proibição do
retrocesso social.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

3. (DPU – Defensor Público Federal – CEBRASPE – 2010) Os direitos sociais


previstos na Constituição, por estarem submetidos ao princípio da reserva do
possível, não podem ser caracterizados como verdadeiros direitos subjetivos,
mas, sim, como normas programáticas. Dessa forma, esses direitos devem ser
147

tutelados pelo poder público, quando este, em sua análise discricionária, julgar
favoráveis as condições econômicas e administrativas.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: ERRADO.

4. (INSS – Analita – CEBRASPE – 2021) Julgue o item a seguir, que se referem


aos direitos e garantias fundamentais previstos na CF e à administração pública.

Recentemente, o transporte foi incluído no rol de direitos sociais previstos na CF,


que já contemplavam, entre outros, o direito à saúde, ao trabalho, à moradia e à
previdência social, bem como a assistência aos desamparados.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

5. (INSS – Analita – CEBRASPE – 2021) Com referência à CF e às políticas de


seguridade, julgue o item subsecutivo.

O artigo da CF que prevê os direitos sociais, em consonância com a Declaração


Universal dos Direitos Humanos, de 1948, ainda que represente uma conquista,
deixou de contemplar o direito básico à moradia ao cidadão brasileiro.

CERTO ou ERRADO?
148

Gabarito: ERRADO.

⮚ CAPÍTULO 6 – NACIONALIDADE

6.1. Noção geral e conceito

Segundo clássica lição de Pontes de Miranda, a nacionalidade representa o


vínculo jurídico-político que faz da pessoa um dos elementos do Estado.
149

Ou seja, a nacionalidade é o atributo que faz com que o indivíduo seja


considerado "povo" - que ao lado dos elementos "território" e "governo" formará
um Estado.

O povo é formado por indivíduos que possuam a mesma nacionalidade


(nacionalidade ou adquirida) e não se confunde com o termo população, que
representa todos os indivíduos que ocupam um território (nacionais, estrangeiros
ou apátridas), independentemente de terem ou não um vínculo jurídico ou
sociológico com o território. População seria um critério puramente
demográfico.13

É possível, portanto, que alguém seja considerado povo brasileiro sem que
seja da população (caso de um brasileiro que esteja morando em outro País),
bem como que alguém seja considerado população do Brasil sem que seja
integrante do povo brasileiro (caso de um estrangeiro que reside no Brasil).

Guarde, então, a seguinte conclusão: é possível ser povo sem ser da


população, assim como é possível ser população sem ser do povo.

6.2. Espécies (ou tipos) de nacionalidade

A doutrina faz a distinção de duas espécies (ou tipos) de nacionalidade, de


acordo com o grau de participação política dos indivíduos.

13
Novelino, 2017, p. 503.
150

a) Nacionalidade originária (primária, nata, de primeiro grau ou


involuntária): é a nacionalidade adquirida, via de regra, pelo nascimento.
Nesta espécie, não se exige, em regra, a vontade do titular em adquiri-la.
Estamos falando do brasileiro nato.

b) Nacionalidade adquirida (secundária, derivada, de segundo grau ou


voluntária): é a nacionalidade adquirida pela vontade, ou seja, que é
requerida por um estrangeiro ao País que está residindo. Ocorre, obviamente,
após o nascimento, pois depende de um ato volitivo. Estamos falando do
brasileiro naturalizado.

6.3. Modos de aquisição da nacionalidade originária

Temos, atualmente, três modos de aquisição da nacionalidade originária no


Brasil.

a) Critério consanguíneo ou jus sanguinis: leva em conta o vínculo


consanguíneo do descendente com seu ascendente, pouco importando o local
onde nasceu. Traz, portanto, um critério genético para a nacionalidade.

b) Critério territorial ou jus solis: leva em conta o local do nascimento,


pouco importando seus laços sanguíneos (ou de ascendência). Traz, portanto,
um critério geográfico para nacionalidade.

c) Critério misto: conjuga os dois anteriores, isto é, revela os Países que adota
os dois critérios anteriores simultaneamente - tal como fez a Constituição
151

Federal de 1988. Segundo a doutrina, o critério misto é o mais recomendado, a


fim de evitar a indesejável situação do apátrida (heimatlos ou apólidos) - que
iremos analisar no próximo tópico.

6.4. Modos de aquisição da nacionalidade secundária

De outro lado, a nacionalidade secundária é adquirida por meio da


naturalização. Significa dizer que, ao contrário do que ocorre na nacionalidade
originária, exige-se do indivíduo um ato de vontade para se tornar nacional.

A naturalização de um indivíduo nascido no estrangeiro extrai fundamento da


universalidade dos direitos fundamentais (que já analisamos na Teoria Geral
dos Direitos Fundamentais). Ou seja, a naturalização diz que todos têm direito
de possuir uma nacionalidade.

Historicamente, podemos registrar dois modos de naturalização:

a) Naturalização tácita, naturalização coletiva ou "grande naturalização":


representa uma "naturalização automática", isto é, aquela que independeria de
requerimento. Ela já ocorreu no Brasil, perante a Constituição de 1891, que
instituiu a chamada "grande naturalização". Segundo esta Constituição, todos os
estrangeiros que não declarassem no prazo de seis meses a vontade de
conservar sua nacionalidade de origem, seriam tácita e automaticamente
considerados brasileiros.
152

Vale dizer, as razões histórico-políticas daquele momento (recém-colonização),


recomendava a atribuição automática da nacionalidade brasileira para todos os
indivíduos que tocassem em solo brasileiro.

Este critério confundia, portanto, o conceito de povo e população. Por


consequência, atualmente não existe mais a chamada naturalização
automática, pois ela contraria o direito humano (faculdade) de o indivíduo
estrangeiro obter ou não outra nacionalidade. Isto é, o ato de vontade
(requerimento) é indispensável na naturalização.

b) Naturalização expressa, explícita ou taxativa: exige um requerimento do


interessado, na qual ele manifesta sua vontade de adquirir a nacionalidade. Foi o
modo de naturalização adotado pela nossa atual Constituição.

6.5. Modos de aquisição da nacionalidade originária na CF/88

Guiando-se pela teoria geral dos tópicos anteriores, é possível vislumbrar quatro
modos de aquisição da nacionalidade originária no Texto Constitucional de
1988.

Em outras palavras, segundo o art. 12, I, da CF, há quatro modos de se tornar


um brasileiro nato:

a) Critério jus solis: os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que


de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país.
153

Esta hipótese faz apenas uma única exigência: que os pais estrangeiros, em
solo brasileiro, não estejam a serviço de próprio País. Do contrário, o indivíduo
não será brasileiro nato - ex.: o filho de um diplomata alemão no Brasil não será
brasileiro nato.

❖ Importante para a sua prova: tome cuidado com uma pegadinha neste
art. 12, I, a, da CF. A ressalva é de que o estrangeiro esteja a serviço de seu
próprio país. Do contrário, a criança será brasileira nata. Imagine o caso de um
alemão que tenha ido estudar e trabalhar na Argentina. Se porventura seu filho
nascer no Brasil, durante uma missão a serviço da Argentina, a criança será
brasileira nata. Isto porque, ele não estava a serviço de seu próprio país de
origem (a Alemanha).

b) Critério jus sanguinis + exercício funcional: os nascidos no estrangeiro, de


pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da
República Federativa do Brasil.

Nesta hipótese, basta que qualquer dos pais esteja a serviço do Brasil. Não
basta ser brasileiro, é preciso que esteja no desempenho de uma função do
governo brasileiro - ex.: nascimento do filho de um diplomata brasileiro na
Inglaterra. O filho será brasileiro nato automaticamente (independentemente
dos requisitos impostos pela alínea c do inciso I do art. 12 da Constituição).

Segundo a doutrina, estar a serviço do Brasil significa estar trabalhando pela


Administração Direta ou Indireta, federal, estadual ou municipal.14 Logo, se

14
BULOS, 2017, p. 857.
154

um pai ou mãe brasileira for representar uma autarquia municipal em outro País
e lá nascer seu filho... ele será brasileiro nato também,

c) Critério potestativo: representa a nacionalidade que decorrente da vontade.


Isto é, enquanto as anteriores decorrem do nascimento (que é a regra), esta
permite uma nacionalidade originária pela vontade (requerimento).

O art. 12, I, c, da CF diz que serão brasileiros natos os indivíduos nascidos no


estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que atendam uma das
duas condições abaixo:

▪ Critério jus sanguinis + registro: sejam registrados em repartição


brasileira competente = seria o caso, por exemplo, de brasileiros que tiveram
filhos no exterior (e que, obviamente, não estavam a serviço do Brasil - alínea b
supra).

▪ Critério jus sanguinis + residência + maioridade + opção: venham a


residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois
de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira = logo, é uma faculdade
conferida ao próprio indivíduo, quando atingir a maioridade brasileira (18 anos).

Estas duas hipóteses de nacionalidade originária foram reformuladas pela EC


54/2007, a fim de evitar os chamados apátridas (heimatlos ou apólidos), isto é,
indivíduos sem nacionalidade.

6.6. Modos de aquisição da nacionalidade secundária na CF/88


155

Conforme vimos, a nossa Constituição apenas admite a naturalização


expressa, isto é, aquela que exige um requerimento do interessado; negando a
nacionalidade automática ou ex lege (por força da lei).

Embora exista alguma divergência doutrinária, podemos vislumbrar três modos


de aquisição da nacionalidade secundária na Constituição de 1988. Em outras
palavras, segundo o art. 12, II e § 1º, da CF, há três modos de se tornar um
brasileiro naturalizado:

a) Naturalização ordinária ou comum: representa os indivíduos advindos de


países de língua portuguesa que possuam residência por um ano
ininterrupto e idoneidade moral.

❖ Observação: este critério carece de duas importantes observações:

▪ Países de língua portuguesa (também chamado de países lusoparlantes


ou lusófonos) não incluem Portugal, pois este terá um critério ainda mais
benéfico de nacionalidade (art. 12, § 1º, CF). Incluem-se aqui, por exemplo:
Moçambique, Angola, Açores, Cabo Verde entre outros.

▪ Idoneidade moral representa um critério subjetivo, pois revela o


indivíduo que teria "conduta ilibada". Assim sendo, a naturalização ordinária
receberá uma análise discricionária do Ministério da Justiça, à luz do juízo de
conveniência e oportunidade do Presidente da República.
156

b) Naturalização extraordinária ou quinzenária: representa a faculdade dos


estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes há mais de quinze anos
ininterruptos e condenação penal, de requerer a nacionalidade brasileira.

❖ Observação: este critério carece de quatro importantes observações:

▪ Estrangeiros de qualquer nacionalidade exclui, obviamente, os


indivíduos de países lusoparlantes e Portugal, uma vez que possuem critérios
mais benéficos (art. 12, II, a e § 1º, CF).

▪ Sem condenação penal representa um critério objetivo, afinal, ou o


indivíduo foi condenado criminalmente ou não o foi. Assim sendo, a
naturalização ordinária receberá uma análise vinculada do Ministério da
Justiça, constituindo verdadeiro direito público subjetivo. Em outras palavras,
a autoridade processante não pode indeferir a naturalização extraordinária do
indivíduo que preencha os presentes requisitos objetivos.

▪ Ato meramente declaratório: segundo o STF, em razão do caráter


vinculado da naturalização extraordinária, o ato de reconhecimento possui
caráter meramente declaratório e, portanto, retroage à data da solicitação
(efeitos ex tunc).

▪ Ausência temporária, segundo o STF, não significa interrupção nos


quinze anos de residência no País, pois há que se distinguir residência contínua
de permanência contínua.
157

c) Quase nacionalidade, português equiparado, cláusula 'ut des', cláusula


de admissão de reciprocidade ou elo de reciprocidade: retrata a situação do
português que possua residência permanente no Brasil e haja reciprocidade
entre os ordenamentos brasileiros e português. Ou seja, em razão da formação
histórica e cultural de nosso País, a Constituição de 1988 manteve o
estreitamento entre Brasil e Portugal, estabelecendo uma relação de cortesia.

❖ Observação: este critério carece de duas observações importantes:

▪ Ausência de prazo: este critério - ao contrário dos dois anteriores - não


exige prazos de residência; satisfazendo-se, apenas, com a residência
permanente do português em solo brasileiro. Daí se dizer que é "mais benéfico"
que os anteriores.

▪ É naturalizado (e não nato): mesmo que represente um critério "mais


especial" que os dois anteriores, não significa que o português possuirá idêntico
tratamento do brasileiro nato. O próprio art. 12, § 1º, da Constituição ressalva
que "serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, salvo os casos
previstos nesta Constituição". Alguns autores, contudo, tratam esta cláusula "ut
des" como uma naturalização especial. A corrente majoritária, contudo, trata
ela do mesmo modo que as anteriores; sendo apenas uma terceira hipótese de
naturalização.

❖ Importante para a sua prova: com o objetivo de resumir as diversas


modalidades de brasileiros natos e brasileiros naturalizados, guarde o
seguinte desenho esquematizado:
158

6.7. Distinção entre brasileiros natos e brasileiros naturalizados

Estatisticamente, este é o tema com maior incidência em nacionalidade, em


razão do rol de cargos reservados pelo art. 12, § 3º, da Constituição Federal aos
brasileiros natos.

Segundo o artigo 12, § 2º da Constituição Federal, a lei não poderá estabelecer


distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvos nos casos previstos na
Constituição.
159

Distinção de Brasileiros Natos e Naturalizados


Regra Não deve ocorrer = princípio da igualdade (art. 5º, caput, CF)
Exceção Excepcionalmente, e somente nas hipóteses constitucionais

Cabe a nós, então, listar todas as hipóteses do Texto Constitucional em que


ocorre distinção de natos e naturalizados. Vejamos:

(i) Extradição: o brasileiro nato, enquanto conservar essa condição, jamais


poderá ser extraditado. Contudo, o art. 5º, LI, da Constituição permite a
extradição do brasileiro naturalizado em duas hipóteses:

▪ Crime comum praticado antes da naturalização

▪ Tráfico de entorpecentes na forma da lei (a qualquer tempo: antes ou


depois da naturalização)

❖ Observação: em relação ao estrangeiro não há essa restrição do


brasileiro naturalizado, pois não integra o patrimônio pessoal do Brasil. Contudo,
o art. 5º, LII, da Lei Maior veda sua extradição nos casos de crime político ou
de opinião. É a polêmica que ocorreu nos cases Cesare Battisti e boxeadores
cubanos após as Olimpíadas. No caso de o Brasil negar a extradição, ele deverá
conceder asilo político ao estrangeiro (art. 4º, X, CF).

(ii) Cargos: o Texto Constitucional - para além de seu art. 12, § 3º - estipula
diversos cargos privativos de brasileiros natos. São eles:
160

▪ Presidente da República
▪ Vice-Presidente da República
▪ Presidente da Câmara dos Deputados
▪ Presidente do Senado Federal
▪ Ministro do Supremo Tribunal Federal
▪ Carreira Diplomática
▪ Oficial das Forças Armadas
▪ Ministro de Estado da Defesa (único Ministro de Estado que deve ser
brasileiro nato)
▪ Presidente do Conselho Nacional de Justiça (pois será sempre presidido
pelo Presidente do STF – art. 103-B, § 1º, CF)
▪ Seis cidadãos do Conselho da República (e não Conselho de Defesa
Nacional - art. 89, VII, CF)
▪ Propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e
imagens (deve pertencer a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez
anos ou pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede
no Brasil - art. 222, caput, CF)
▪ Pelo menos 70% do capital total e do capital votante das empresas
jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens (deve pertencer a
brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos - art. 222, § 1º, CF)
▪ Responsabilidade editorial e atividades de seleção e direção da
programação veiculada (deve pertencer a brasileiros natos ou naturalizados há
mais de dez anos - art. 222, § 2º, CF)

(iii) Perda da nacionalidade: a Constituição estabelece também hipóteses de


perda da nacionalidade exclusivas do brasileiro naturalizado, a que se
161

denomina de perda-punição (art. 12, § 4º, I, CF). Veremos esta hipótese no


próximo tópico.

6.8. Perda da nacionalidade

Pode causar estranheza, em um primeiro momento, mas é possível sim a perda


da nacionalidade, seja o indivíduo brasileiro nato ou naturalizado.

❖ Importante para a sua prova: a Constituição trouxe um rol taxativo de


causas de perda da nacionalidade. Isso significa que nem o legislador ordinário,
nem os Tratados Internacionais ordinários ou supralegais podem (i) ampliar, (ii)
modificar ou (iii) restringir o rol previsto pelo art. 12, § 4º, da Lei Maior. Aliás, isto
foi cobrado no último concurso da PRF (2021 - banca CEBRASPE) - questão
com altíssimo índice de erro entre os candidatos.

Vejamos, então, as duas hipóteses taxativas de perda da nacionalidade (art.


12, § 4º, I e II, da CF).

a) Perda-punição ou ação de cancelamento de naturalização: decorre da


prática de atividade nociva ao interesse nacional. Nesta hipótese, haverá o
cancelamento da naturalização por sentença judicial; o que significa que será
necessário processo judicial. Trata-se de modalidade que atinge, obviamente,
apenas o brasileiro naturalizado. Isto porque, se ela atingisse um brasileiro
isto equivaleria a uma "pena de banimento"; o que é proibido
constitucionalmente (art. 5º, XLVII, d, da CF); e
162

b) Perda-mudança ou naturalização voluntária: ocorre quando o brasileiro


decide livremente adquirir outra nacionalidade, atingindo, portanto, o brasileiro
nato. Contudo, a Constituição traz duas exceções que esta modalidade não
ocorrerá:

▪ Dupla cidadania ou polipátridas: quando houver reconhecimento da


nacionalidade originária pela lei estrangeira, como nos casos de dupla
cidadania (ou dupla nacionalidade); e

▪ Imposição pela norma estrangeira: ocorre quando houver imposição


de naturalização pela norma estrangeira, como condição para que o brasileiro
possa permanecer no seu território ou exercer direitos civis. Esta última retrata o
dilema de muitos jogadores de futebol em países do Oriente Médio, onde é
costume a imposição da nacionalidade local para que estrangeiros trabalhem. A
título de curiosidade, em 2008, enquanto atuava no Catar, o jogador Emerson
Sheik precisou se naturalizar e, com isto, pode jogar as Eliminatórias da Copa do
Mundo de 2010 por aquele País.

❖ Importante para a sua prova: em um famoso caso da jurisprudência, o


STF analisou o caso de uma brasileira nata que perdeu sua nacionalidade ao se
tornar norte-americana. Em breves linhas, ela já possuía o green card, mas
decidiu, voluntariamente, tornar-se norte-americana. Por inexistir as ressalvas
anteriores, esta brasileira perdeu seu vínculo de brasileira nata. Ocorre que
esta ex-brasileira matou o marido e fugiu para o Brasil. Justamente por não ser
mais brasileira nata, ela pode ser extraditada aos EUA (MS nº 33.864/DF e Ext
nº 1.462/DF). Repare que se a brasileira ainda fosse nata, ela não poderia ser
extraditada do Brasil (art. 5º, LI, CF).
163

6.10. Idioma e símbolos da República Federativa do Brasil

O Capítulo III - que trata Da Nacionalidade - se encerra com o art. 13 da


Constituição Federal.

Neste dispositivo, disse o Constituinte que o idioma oficial do País será a língua
portuguesa. Não há que se olvidar, contudo, do art. 210, § 2º, da Constituição,
que assegura às comunidades indígenas o direito de ter a sua própria língua
materna e os seus próprios processos de aprendizagem.

Por fim, estipulou o Constituinte que são símbolos do País a bandeira; o hino; as
armas; e os selos nacionais. A fim de memorizar este rol, guarde o seguinte
processo mnemônico: "os símbolos são o BA HI A S "

▪ BA ndeira
▪ HI no
▪ A rmas
▪ S elos nacionais

Em arremate, lembre-se que:

▪ Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão ter símbolos


próprios - ex.: apenas a título de exemplo, a Constituição do Estado do Paraná
menciona adota como símbolos, além dos nacionais, a Bandeira, o Hino, o
Brasão de Armas e o Sinete.
164

▪ O legislador infraconstitucional não pode ampliar ou restringir os


elementos mencionados pelo art. 13 da Constituição Federal (regulamentação
na Lei nº 5.700/1971).

6.11. Revisão do tema

TABELA DE REVISÃO
Representa o vínculo jurídico-político que faz da pessoa um
Noção Geral dos elementos do Estado. É, portanto, o atributo que faz
e Conceito com que o indivíduo seja considerado "povo" - conceito que
não se confunde com o de "população" (critério puramente
demográfico).
▪ Duas espécies (ou tipos):
Espécies a) Nacionalidade originária = em regra, decorre do
(ou Tipos) de nascimento.
Nacionalidade b) Nacionalidade adquirida = decorre de um ato de
vontade (requerimento do interessado).
▪ Três modos de aquisição:
Modos de a) Critério jus sanguinis = decorre do vínculo
Aquisição da consanguíneo do ascendente.
Nacionalidade b) Critério jus solis = leva em conta o local do nascimento.
Originária c) Critério misto = conjuga os dois anteriores (é o critério
adotado pela nossa CF).
▪ Dois modos de aquisição:
165

Modos de a) Naturalização tácita = impõe a naturalização


Aquisição da automática. Vigeu perante a CF de 1891 e não é mais
Nacionalidade adotada.
Secundária b) Naturalização expressa = exige ato de vontade
(requerimento) do interessado.
▪ Quatro modos de aquisição:
a) Critério jus solis = nascidos na República Federativa do
Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não
estejam a serviço de seu país.
b) Critério jus sanguinis + exercício funcional = os
nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira,
desde que qualquer deles esteja a serviço da República
Modos de Federativa do Brasil.
Aquisição da c) Critério jus sanguinis + registro = indivíduos nascidos
Nacionalidade no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde
Originária que sejam registrados em repartição brasileira competente.
na CF/88 d) Critério jus sanguinis + residência + maioridade +
opção = indivíduos nascidos no estrangeiro de pai
brasileiro ou de mãe brasileira, desde que venham a residir
na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer
tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade
brasileira.
▪ Três modos de aquisição:
a) Naturalização ordinária = indivíduo de país de língua
portuguesa + residência por 1 ano ininterrupto + idoneidade
Modos de moral (critério subjetivo e discricionário).
Aquisição da
166

Nacionalidade b) Naturalização extraordinária = estrangeiro de qualquer


Secundária nacionalidade + residência por 15 anos ininterruptos + sem
na CF/88 condenação penal (critério objetivo, vinculado, meramente
declaratório e com efeitos retroativos).
c) Quase nacionalidade = português com residência
permanente + reciprocidade em favor de brasileiros.
Distinção entre Regra Não deve ocorrer, em razão do
Brasileiros Natos princípio da igualdade (art. 5º, caput, CF)
e Brasileiros Exceção Excepcionalmente, e somente
Naturalizados nas hipóteses constitucionais
▪ Três níveis de distinção:
a) Extradição = o brasileiro nato jamais poderá ser
extraditado. O naturalizado poderá no caso de:
▪ Crime comum praticado antes da naturalização
▪ Tráfico de entorpecentes a qualquer tempo
b) Cargos = são privativos de brasileiros natos:
▪ Presidente da República
▪ Vice-Presidente da República
▪ Presidente da Câmara dos Deputados
▪ Presidente do Senado Federal
▪ Ministro do Supremo Tribunal Federal
Hipóteses ▪ Carreira Diplomática
Constitucionais ▪ Oficial das Forças Armadas
de Distinção de ▪ Ministro de Estado da Defesa
Brasileiros ▪ Presidente do CNJ
Natos e ▪ Seis cidadãos do Conselho da República
Naturalizados
167

▪ Propriedade de empresa jornalística e de


radiodifusão sonora e de sons e imagens (deve pertencer a
brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos ou
pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que
tenham sede no Brasil - art. 222, caput, CF);
▪ Pelo menos 70% do capital total e do capital votante
das empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de
sons e imagens (deve pertencer a brasileiros natos ou
naturalizados há mais de dez anos - art. 222, § 1º, CF);
▪ Responsabilidade editorial e atividades de seleção e
direção da programação veiculada (deve pertencer a
brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos -
art. 222, § 2º, CF); e
c) Perda da nacionalidade = a perda-punição atinge
apenas o brasileiro naturalizado.
▪ Duas hipóteses taxativas:
a) Perda-punição = atinge o brasileiro naturalizado que
houver praticado atividades nocivas aos interesses
nacionais.
Perda da b) Perda-mudança = atinge o brasileiro nato, quando
Nacionalidade adquirir voluntariamente outra nacionalidade; não sendo
caso de (i) reconhecimento da nacionalidade originária pela
lei estrangeira; ou (ii) imposição de naturalização pela
norma estrangeira, como condição para que o brasileiro
possa permanecer no seu território ou exercer direitos civis.
168

Língua portuguesa - sem prejuízo das


Idioma e Idioma comunidades indígenas utilizarem suas
Símbolos da Oficial línguas maternas e processos próprios de
República aprendizagem (art. 210, § 2º, da CF).
Federativa ▪ BA ndeira
do Brasil ▪ HI no
Símbolos ▪ A rmas
▪ S elos nacionais
- Dica: BA HI A S

6.12. Questões CEBRASPE no tema

1. (PRF – Policial Rodoviário Federal – CEBRASPE – 2021) Acerca de direitos


fundamentais, garantias e remédios constitucionais, julgue o item a seguir.

As hipóteses de perda da nacionalidade brasileira previstas na Constituição


Federal de 1988 têm natureza taxativa, de modo que nem mesmo convenções
ou tratados internacionais podem ampliá-las.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

2. (MP/SC – Promotor de Justiça – CONSULPAN – 2019) O brasileiro


naturalizado poderá ser extraditado em caso de crime comum, praticado antes
169

da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de


entorpecentes e drogas afins, na forma da lei.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

⮚ CAPÍTULO 7 – DIREITOS POLÍTICOS

7.1. Noção geral

Direitos Políticos são prerrogativas que garantem aos cidadãos a participação


no sistema eleitoral e, portanto, o exercício da soberania popular (um dos
fundamentos da República).
170

Os direitos políticos atribuem um status ativo, isto é, asseguram aos indivíduos


a participação nas atividades políticas do Estado (votar e ser votado).

Veremos adiante que todo cidadão é um brasileiro (pois estrangeiros não


podem votar), mas nem todo brasileiro é um cidadão (pois nem todo brasileiro
pode votar - ex.: menores de 16 anos).

7.2. Classificação dos direitos políticos

Para bem compreender os direitos políticos, é preciso conhecer seus


desdobramentos. Isto porque, esta matéria engloba tanto aqueles que votam
(direitos políticos ativos), quanto aqueles que são votados (direitos políticos
passivos).

Os Direitos Políticos possuem duas grandes espécies: direitos políticos


positivos e direitos políticos negativos. Os positivos, por sua vez, subdividem-se
em ativos e passivos. Vejamos o que significa cada espécie:

a) Direitos políticos positivos: garantem o chamado direito de sufrágio15, isto


é, o processo de escolha eleitoral, consistente em votar (direitos políticos
ativos) e ser votado (direitos políticos passivos).

b) Direitos políticos negativos: regulam as chamadas inelegibilidades, isto é,


circunstâncias que retiram os direitos políticos passivos.

15
Sufragium em latim significa "processo de escolha", "voto", "aprovação”.
171

Para bem esquematizar os direitos políticos, guarde o seguinte quadro sinótico:

Direitos Políticos
Positivos ativos Votar
Positivos passivos Ser votado
Negativos Inelegibilidades

7.3. Direitos políticos positivos ativos

Os direitos políticos positivos ativos regulam a capacidade eleitoral ativa,


isto é, o status do cidadão em participar das eleições. Simplesmente, diz quem
poderá ser eleitor (votar).

Direitos Políticos Positivos Ativos = Alistabilidade = Quem poderá votar

Vejamos alguns pontos importantes sobre a capacidade de votar:

(i) Inalistáveis: não podem se alistar como eleitores - e, portanto, não podem
votar (art. 14, § 2º, da CF):

▪ Os estrangeiros

▪ Durante o serviço militar obrigatório, os conscritos. Conscritos são os


recrutados ao serviço militar obrigatório; o que não inclui os engajados
permanentemente no serviço militar, como soldados, sargentos, oficiais etc.
172

Por razões evidentes, incluem-se, também, os menores de 16 anos.

(ii) Voto facultativo: possui a opção de votar:

▪ Analfabetos

▪ Menores entre 16 e 18 anos (também chamados de "menores púberes"


ou "menores relativamente incapazes por motivo de idade")

▪ Maiores de 70 anos (cuidado para não confundir com o conceito de


"Idoso" = igual ou maior de 60 anos. Logo, o Idoso entre 60 e 70 anos possui a
obrigatoriedade do voto)

(iii) Voto obrigatório: por critério residual, constata-se que o voto será
obrigatório para as pessoas que tenham entre 18 e 70 anos e sejam
alfabetizadas.

❖ Observação: segundo o STF, o eleitor pode votar apresentando apenas


documento com foto. Ou seja, o ato de votar não exige a apresentação do
título de eleitor (ADI nº 4.467).

7.4. Direitos políticos positivos passivos


173

Os direitos políticos positivos passivos regulam a capacidade eleitoral


passiva, isto é, o status que permite o cidadão se candidatar a um pleito.
Simplesmente, diz quem poderá ser eleito (ser votado).

Direitos Políticos Positivos Passivos = Elegibilidade = Quem poderá ser votado

Vejamos alguns pontos importantes sobre a capacidade de ser votado:

(i) Inelegíveis: não podem se candidatar, além dos inalistáveis, os


analfabetos. Ou seja, temos além dos estrangeiros e conscritos (durante o
serviço militar obrigatório), também não poderão ser votados os analfabetos.

Por razões evidentes, incluem-se, também, os menores de 16 anos.

A razão é evidente. Quem não pode votar, tampouco poderá ser votado - já que
este é ato muito mais intenso politicamente do que o mero ato de votar.

❖ Importante para a sua prova: a CEBRASPE já cobrou, neste tema, a


seguinte frase: Todo inalistável é inelegível, mas nem todo inelegível é
inalistável. Ou seja, o analfabeto poderá votar, mas não poderá ser votado.

(ii) Condições de elegibilidade: o § 3º do art. 14 da Constituição Federal exige


cumulativamente os seguintes requisitos para se tornar candidato:

a) Nacionalidade brasileira: a regra é que qualquer brasileiro nato ou


naturalizado poderá concorrer ao pleito. A exceção está nos cargos privativos
174

de brasileiro nato, nomeadamente nos cargos de Presidente e Vice-Presidente


da República. Os demais não decorrem das eleições ordinárias.

b) Pleno exercício dos direitos políticos: não pode ser candidato quem teve
os direitos políticos perdidos ou suspensos. O art. 15 da Constituição enumera
os casos de perda ou suspensão de direitos políticos:

Art. 15, CF - É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou


suspensão só se dará nos casos de:

I - Cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado;


II - Incapacidade civil absoluta;
III - Condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;
IV - Recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternativa, nos
termos do art. 5º, VIII;
V - Improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.

c) Alistamento eleitoral: exige-se do candidato sua inscrição nos quadros da


Justiça Eleitoral, isto é, que esteja alistado como eleitor.

d) Domicílio eleitoral na circunscrição: a Lei Eleitoral exige que o candidato


possua domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de seis meses
(art. 9º da Lei nº 9.504/97). Espera-se do representante popular que ele conheça
a realidade de seus pares e as vicissitudes daquela localidade - daí essa
exigência temporal.
175

e) Filiação partidária: embora alguns Países do mundo - e os próprios Tratados


Internacionais de Direitos Humanos - admitam candidaturas sem partido político,
isto não ocorre no Brasil. Ou seja, o STF e a Lei Eleitoral não admitem a
chamada candidatura avulsa ou candidatura independente (art. 11, § 14, da
Lei nº 9.504/97). Isto porque, a Constituição traz como requisito expresso a
vinculação do candidato a um partido político.

f) Idade eleitoral mínima: de acordo com a complexidade do cargo (e sua


extensão territorial), a Constituição estabelece idades eleitorais mínimas ao
candidato:

▪ 35 anos = Presidente da República, Vice-Presidente da República e


Senador Federal
▪ 30 anos = Governador e Vice-Governador dos Estados e do Distrito
Federal
▪ 21 anos = Deputados (Federal, Estadual e Distrital), Prefeito,
Vice-Prefeito e juiz de paz
▪ 18 anos = Vereador

❖ Observação: segundo a Lei Eleitoral, a idade eleitoral mínima deverá ser


verificada na posse, com exceção do Vereador, que deverá preencher a idade
eleitoral mínima até a data-limite para o pedido de registro (art. 11, § 2º, da
Lei nº 9.504/97).

Até aqui analisamos como se exterioriza o direito de sufrágio (direitos políticos


positivos), que confere o direito de ser escolher e ser escolhido.
176

Vejamos, agora, o outro lado da moeda (direitos políticos negativos), que traz as
inelegibilidades e, portanto, tolhe, absoluta ou relativamente, o direito de
sufrágio.

7.5. Direitos políticos negativos

Os direitos políticos negativos representam as normas que impedem o


cidadão de votar ou de ser votado. A regra é o direito de votar, contudo, em
algumas situações haverá restrições à atividade político-partidária.

É o que a doutrina chama de inelegibilidades; que podem ser absolutas ou


negativas. Vejamos.

▪ Inelegibilidades absolutas: representam as inelegibilidades que se


ligam à pessoa (e não ao cargo) e impedem o acesso a qualquer cargo
eletivo.

Trata-se, portanto, da vedação que se impõem aos inelegíveis absolutos trás


referidos: analfabetos e inalistáveis (estrangeiros e conscritos). Por razões
óbvias, também se inclui os menores de 16 anos.

▪ Inelegibilidades relativas: representam as inelegibilidades que se ligam


ao cargo exercido ou ao pleito eleitoral (e não à pessoa) e impedem o acesso
a determinados cargos eletivos.
177

As inelegibilidades relativas são as mais cobradas em concurso. Vejamos quais


são, à luz da terminologia empregada por Uadi Lammêgo Bulos - que apresenta
a lição mais completa no tema:

a) Inelegibilidade funcional por motivo de reeleição (art. 14, § 5º, da CF): foi
introduzida pela Emenda Constitucional 16/1997, de sorte a permitir que os
Chefes do Poder Executivo (Presidente, Governador e Prefeito) se reelejam
apenas uma vez.

Ou seja, esta inelegibilidade permite que os Chefes do Poder Executivo


possuam, no máximo, dois mandatos consecutivos. Isto ocorre para evitar a
perpetuação do Governante no Poder e frustrar o revezamento democrático.

❖ Importante para a sua prova: O STF não tolera a possibilidade de um


terceiro mandato mesmo em outro Município. Isto é, o Pretório Excelso veda a
figura do Prefeito Itinerante ou Prefeito Profissional, em prestígio aos
princípios republicano, democrático e de alternância no Poder. Censura,
então, o indivíduo que faz do cargo de prefeito uma profissão (RE nº
637.485/RJ).

❖ Observação: essa inelegibilidade, contudo, não atinge os cargos do


Poder Legislativo. Vale dizer, indo de encontro ao entendimento anterior, é
possível que um Parlamentar se reeleja infinitas vezes...

b) Inelegibilidade funcional por motivo de desincompatibilização (art. 14, §


6º, da CF): exige que os chefes do Poder Executivo (Presidente, Governador e
178

Prefeitos) - que almejem concorrer a outros cargos - renunciem seus mandatos


até seis meses antes do pleito.

Até mesmo os suplentes precisarão se desincompatibilizar por meio desta


renúncia. Caso não renunciem neste prazo, não poderão se candidatar ao pleito.

E os vices, precisarão também se desincompatibilizar? O artigo é claro: se não


tiverem substituído ou sucedido o titular, não precisarão.

❖ Observação: obviamente, para se reeleger o candidato não precisa se


desincompatibilizar, pois este instituto só incide para os que desejam concorrer a
outros cargos.

c) Inelegibilidade reflexa (ou reflexiva) (art. 14, § 7º, da CF): representa a


inelegibilidade que decorre de parentesco ou casamento/afinidade. Ou seja,
impede que parentes até o segundo grau (até irmãos, portanto) de Presidente,
Governador ou Prefeito disputem em seus territórios cargos eletivos, salvo se
já titulares de mandato e candidatos à reeleição. Evita o continuísmo familiar.

Esta regra visa evitar o nepotismo e o continuísmo familiar no poder. Isto


violaria o princípio republicano e de alternância no poder, que exigem postulados
ético-políticos para o exercício do regime democrático.

❖ Observação: melhor seria se o Constituinte Originário tivesse usado o


termo circunscrição, em vez de jurisdição. Seja como for, há três jurisdições
abrangidas por esta inelegibilidade:
179

Cargo X Jurisdição abrangida


Presidente Qualquer cargo no País
Governador Qualquer cargo no Estado
Prefeito Qualquer cargo no Município

O art. 14, § 7º, da Constituição Federal menciona apenas cônjuge, mas a


doutrina estende a inelegibilidade também para os companheiros16.

❖ Importante para a sua prova: há uma intensa discussão na


jurisprudência se o divórcio entre os cônjuges afastaria essa inelegibilidade. Em
razão do risco de fraude, o STF pacificou o tema na Súmula Vinculante nº 18:

Súmula Vinculante nº 18 - A dissolução da sociedade ou do vínculo conjugal,


no curso do mandato, não afasta a inelegibilidade prevista no § 7º do artigo 14
da Constituição Federal.

Situação diferente, contudo, ocorre na morte de um dos cônjuges. Neste caso,


há um distinguishing em relação ao entendimento anterior, pois não há como se
presumir fraude nas situações da espécie... Ou seja, o cônjuge sobrevivente
poderá se candidatar, não incidindo a inelegibilidade reflexa.

Podemos resumir o tema da seguinte forma:

Inelegibilidade Reflexa (ou Por Parentesco)


Divórcio Inelegível (Súmula Vinculante nº 18)
Morte de um dos cônjuges Elegível (Distinguishing à Súmula Vinculante)
16
BULOS, 2017, p. 902.
180

d) Inelegibilidade dos militares (art. 14, § 8º, da CF): representa a


inelegibilidade que atinge os militares das Forças Armadas (Exército, Marinha e
Aeronáutica), bem como os militares estaduais e do Distrito Federal.

Para que os militares possam concorrer ao pleito, eles devem preencher


algumas condições:

▪ Se o Militar-candidato contar com menos de dez anos de serviço, ele


deverá se afastar da atividade; ou

▪ Se o Militar-candidato contar com mais de dez anos de serviço, ele será


agregado pela autoridade superior e, se eleito, passará automaticamente, no
ato da diplomação, para a inatividade.

❖ Observação: ainda sobre as inelegibilidades dos militares há um nó


górdio em relação aos militares da ativa. O art. 142, § 3º, V, da Constituição
Federal proíbe que o militar, enquanto em serviço ativo, filie-se a partidos
políticos. Contudo, como já vimos anteriormente, o art. 14, § 3º, V, da Lei Maior
exige a filiação partidária como requisito obrigatório para elegibilidade. Como
resolver este impasse?

O TSE pacificou o tema, fixando a seguinte tese:

Resolução nº 21.787/2004 - A filiação partidária contida no art. 14, § 3º, V,


Constituição Federal não é exigível ao militar da ativa que pretenda concorrer a
181

cargo eletivo, bastando o pedido de registro de candidatura após prévia escolha


em convenção partidária.

Mais recentemente, o TSE também fixou a seguinte tese:

Cta 060106664 - O militar elegível não ocupante de função de comando deverá


estar afastado do serviço ativo no momento em que for requerido o seu registro
de candidatura.

e) Demais inelegibilidades legais (art. 14, § 9º, da CF): além das


inelegibilidades constitucionais, o art. 14, § 9º, CF permite que a Lei
Complementar estabeleça outros casos de inelegibilidade "a fim de proteger a
probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada
vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra
a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou
emprego na administração direta ou indireta".

Foi este dispositivo da Constituição Federal, por exemplo, que permitiu a


elaboração da chamada Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010,
que alterou a Lei Complementar nº 64/90).

7.6. Consultas populares no período das eleições municipais

A Emenda Constitucional nº 111 de 2021 acrescentou dois novos parágrafos


ao art. 14 da Constituição Federal. Tratando-se de uma novidade constitucional,
vale seu registro literal:
182

Art. 14, § 12, CF - Serão realizadas concomitantemente às eleições municipais


as consultas populares sobre questões locais aprovadas pelas Câmaras
Municipais e encaminhadas à Justiça Eleitoral até 90 dias antes da data das
eleições, observados os limites operacionais relativos ao número de quesitos.

Art. 14, § 13, CF - As manifestações favoráveis e contrárias às questões


submetidas às consultas populares nos termos do § 12 ocorrerão durante as
campanhas eleitorais, sem a utilização de propaganda gratuita no rádio e na
televisão.

Em breve síntese, estes dois novos parágrafos dispõem que as consultares


populares que envolverem questões locais deverão ser realizadas no mesmo
dia das eleições.

Tais convocações deverão ocorrer até 90 dias antes da data das eleições;
vedando-se a utilização de propaganda gratuita no rádio e televisão para
divulgar os argumentos favoráveis ou contrários do tema da consulta popular.

7.7. Perda e suspensão dos direitos políticos

Embora os direitos políticos sejam direitos fundamentais do cidadão, a


Constituição permite sua perda ou suspensão em situações excepcionais.
183

Mas, muito cuidado, a Constituição jamais permite a cassação dos direitos


políticos. Ou seja, em algumas situações é possível que o indivíduo seja privado
de sua cidadania política.

❖ Importante para a sua prova: embora a Constituição permita a perda e


a suspensão dos direitos políticos, ela veda a cassação dos direitos políticos.
Esta é a grande pegadinha das questões sobre este tema: cassação jamais!

O art. 15 da Constituição traz as hipóteses de perda e suspensão dos direitos


políticos, mas não discrimina quais hipóteses levariam a uma ou outra situação.
É a doutrina que - com alguma divergência - faz esta distinção. Vejamos a
posição majoritária da doutrina:

▪ Casos de perda dos direitos políticos:

a) Cancelamento de naturalização por sentença transitada em julgado (art.


15, I, CF): já abordamos no Capítulo da Nacionalidade as hipóteses em que
pode ocorrer a perda da naturalização. Vale a revisão: perda-punição (art. 12, §
4º, I, CF), que ocorre quando o naturalizado pratica atividade nociva ao
interesse nacional. Uma vez cancelada a naturalização, o indivíduo volta a ser
estrangeiro e, por consequência, não poderá votar ou ser votado.

b) Perda-mudança (ou Naturalização-voluntária): embora tal hipótese não


esteja expressa no art. 15 da CF, ela decorre da interpretação global da Lei
Maior. Isto porque, se o indivíduo adquire voluntariamente outra nacionalidade
fora das exceções do art. 12, § 4º, II, da CF, ele perderá sua condição de
brasileiro. Por consequência, não poderá votar ou ser votado.
184

▪ Casos de suspensão dos direitos políticos:

a) Incapacidade civil absoluta (art. 15, II, CF): segundo o art. 3º do Código
Civil, hoje apenas os menores de 16 anos são considerados absolutamente
incapazes (também conhecidos como menores impúberes).

b) Condenação criminal transitada em julgado (art. 15, III, CF): enquanto


durarem os efeitos da condenação privará o indivíduo de votar e ser votado.

c) Objeção de consciência (art. 15, IV, CF): também já analisamos o tema no


Capítulo de Direitos Individuais e Coletivos. Vale a revisão: objeção / escusa /
imperativo de consciência retrata o indivíduo que se recusa a cumprir uma
obrigação a todos imposta e recusa-se a cumprir uma prestação alternativa - ex.:
casos de convocados para servir como jurado, mesário, serviço militar
obrigatório.

d) Condenados por improbidade administrativa (art. 15, V, CF): uma das


penas da improbidade administrativa é a suspensão dos direitos políticos. É o
que dispõe o art. 37, § 4º da Constituição Federal e o art. 12 da Lei nº 8.429/92 -
recomendo o estudo mais aprofundado em Direito Administrativo.

Assim que comunicado o Juiz Eleitoral, o candidato que teve seus direitos
políticos perdidos ou suspensos não poderá ter seu nome incluído nas urnas
eletrônicas ou nas fichas de votação, ou seja, ele é privado de seus direitos
políticos positivos ativos e passivos.
185

Perda dos Direitos Políticos Suspensão dos Direitos Políticos


Cancelamento de naturalização por Incapacidade civil absoluta
sentença transitada em julgado
Perda-mudança / Condenação criminal
Naturalização-voluntária transitada em julgado
Objeção de Consciência*
Condenados por
improbidade administrativa
*A classificação da objeção de consciência - se hipótese de perda ou suspensão
dos direitos políticos - tem divergência na doutrina, se seria perda ou
suspensão.

7.8. Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME)

Segundo o art. 14, § 10, da Lei Maior, "o mandato eletivo poderá ser impugnado
ante a Justiça Eleitoral no prazo de 15 dias contados da diplomação, instruída
a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude".

A AIME representa importante conquista da democracia, tornando mais


cristalina a legitimidade democrática. Isto porque, permitirá que o povo tenha
representantes honestos e um governo isento de abusos do poder
econômico, corrupção e fraude. O ponto mais recorrente sobre ele em concursos
é seu prazo de decadência: quinze dias da diplomação.

7.9. Princípio da anualidade eleitoral


186

Segundo o art. 16 da Lei Maior, "a lei que alterar o processo eleitoral entrará em
vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um
ano da data de sua vigência".

O princípio da anualidade eleitoral é imprescindível para que haja segurança


jurídica no pleito eleitoral. Ou seja, evita que haja surpresa com a mudança das
regras do jogo eleitoral.

Vale dizer, este princípio almeja que o pleito eleitoral fica livre de mudanças de
última hora; impedindo, portanto, o casuísmo e o privilégios de determinados
grupos políticos. O Constituinte quis combater o oportunismo e imediatismo
eleitoral.17

7.10. Revisão do tema

TABELA DE REVISÃO
São prerrogativas que garantem o direito de sufrágio.
Noção Geral Decorrem, portanto, da soberania popular. Para Jellinek, é
o status ativo dos direitos fundamentais.
▪ Os Direitos Políticos se dividem em:
Classificação dos a) Direitos Políticos Positivos Ativos = direito de votar.
Direitos Políticos b) Direitos Políticos Positivos Passivos = direito de ser
votado.
c) Direitos Políticos Negativos = traz as inelegibilidades.

17
BULOS, pp. 903-905.
187

Regulam a capacidade eleitoral ativa, ou seja, estipula


quem poderá ser eleitor (votar).
▪ Inalistáveis (sem direito ao voto):
a) Estrangeiros
b) Conscritos, durante o serviço militar obrigatório
Direitos Políticos c) Menores de 16 anos
Positivos Ativos ▪ Voto facultativo:
a) Analfabetos
b) Menores entre 16 e 18 anos
c) Maiores de 70 anos
Menores de 16 anos
▪ Voto obrigatório: entre 18 e 70 anos alfabetizados.
Regulam a capacidade eleitoral passiva, ou seja, estipula
quem poderá ser eleito (ser votado).
▪ Inelegíveis (não podem ser votados):
a) Estrangeiros
b) Conscritos, durante o serviço militar obrigatório
c) Menor de 16 anos
Direitos Políticos d) Analfabetos
Positivos Ativos ▪ Condições de elegibilidade: são requisitos
cumulativos:
a) Nacionalidade brasileira
b) Pleno exercício dos direitos político
c) Alistamento eleitoral
d) Domicílio eleitoral na circunscrição
e) Filiação partidária
f) Idade eleitoral mínima
188

Traz as inelegibilidades, que se classificam em


inelegibilidades absolutas e relativas.
▪ Inelegibilidades absolutas = representam as
inelegibilidades que se ligam à pessoa (e não ao cargo) e
impedem o acesso a qualquer cargo eletivo.
▪ Inelegibilidades relativas = representam as
inelegibilidades que se ligam ao cargo exercido ou ao
pleito eleitoral (e não à pessoa) e impedem o acesso a
determinados cargos eletivos. São elas:
a) Inelegibilidade funcional por motivo de reeleição =
permite que os Chefes do Poder Executivo possuam, no
máximo, dois mandatos consecutivos.
b) Inelegibilidade funcional por motivo de
Direitos Políticos desincompatibilização = exige que os chefes do Poder
Negativos Executivo (Presidente, Governador e Prefeitos) - que
almejem concorrer a outros cargos - renunciem seus
mandatos até seis meses antes do pleito.
c) Inelegibilidade reflexa (ou reflexiva) = impede que
parentes até o segundo grau (até irmãos, portanto) de
Presidente, Governador ou Prefeito disputem em seus
territórios cargos eletivos, salvo se já titulares de mandato
e candidatos à reeleição.
d) Inelegibilidade dos militares = (i) se o
Militar-candidato contar com menos de dez anos de
serviço, ele deverá se afastar da atividade; ou (ii) se o
Militar-candidato contar com mais de dez anos de serviço,
ele será agregado pela autoridade superior e, se eleito,
189

passará automaticamente, no ato da diplomação, para a


inatividade.
e) Demais inelegibilidades legais = além das
inelegibilidades constitucionais, o art. 14, § 9º, CF permite
que a Lei Complementar estabeleça outros casos de
inelegibilidade.
A EC nº 111/2021 acrescentou dois novos parágrafos ao
Consultas art. 14 da CF. Os §§ 12 e 13 do art. 14 dispõe que as
Populares consultares populares que envolverem questões locais
no Período deverão ser realizadas no mesmo dia das eleições. Tais
das Eleições convocações deverão ocorrer até 90 dias antes da data
Municipais das eleições; vedando-se a utilização de propaganda
gratuita no rádio e televisão para divulgar os argumentos
favoráveis ou contrários do tema da consulta popular.
É vedada a cassação dos direitos políticos, sendo
permitida apenas sua perda ou suspensão.
▪ Hipóteses de perda dos direitos políticos:
a) Cancelamento de naturalização por sentença transitada
Perda e em julgado
Suspensão dos b) Perda-mudança (ou Naturalização-voluntária)
Direitos Políticos ▪ Hipóteses de suspensão dos direitos políticos:
a) Incapacidade civil absoluta
b) Condenação criminal transitada em julgado
c) Objeção de consciência (tem divergência na doutrina se
seria perda)
d) Condenados por improbidade administrativa
190

Ação de A AIME, que deve ser ajuizada no prazo decadencial de


Impugnação de 15 dias da diplomação, visa garantir que o povo tenha
Mandato Eletivo representantes honestos e um governo isento de abusos
(AIME) do poder econômico, corrupção e fraude.
Princípio da O princípio da anualidade eleitoral visa garantir a
Anualidade segurança jurídica no pleito eleitoral; evitando surpresas.
Eleitoral mudanças de última hora e oportunismo eleitoral.

7.11. Questões CEBRASPE no tema

1. (PC/SE – Escrivão de Polícia – CEBRASPE – 2021) A respeito dos direitos e


deveres individuais e coletivos previstos na Constituição Federal de 1988 (CF),
julgue o item a seguir.

No tocante às limitações ao exercício da vida política, além de hipóteses de


inelegibilidade, nas quais se macula a capacidade eleitoral passiva, o
constituinte elencou situações de perda ou suspensão dos direitos políticos, a
exemplo da incapacidade civil absoluta, quando se restringem tanto a
capacidade eleitoral ativa quanto a passiva.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

2. (MP/CE – Técnico Ministerial – CEBRASPE – 2020) Acerca de direitos e


garantias fundamentais, julgue o item a seguir.
191

Os analfabetos não podem registrar-se como eleitores.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: ERRADO.

⮚ CAPÍTULO 8 – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


192

8.1. Noção geral

À luz do Direito Administrativo, a "Administração Pública" possui dois


sentidos18:

▪ Administração Pública em sentido formal, subjetivo ou orgânico:


representa o conjunto de órgãos, pessoas jurídicas e agentes,
independentemente da atividade que desempenham. Ou seja, esta acepção de
"Administração Pública" leva em conta apenas "quem" integra a administração
público e não "o que" cada órgão faz.

▪ Administração Pública em sentido material, objetivo ou funcional:


analisa a administração a partir das atividades que costuma desempenhar, isto
é, analisa se o órgão desempenha ou não a função administrativa (defesa
concreta do interesse público). Essa acepção, portanto, qualificará como
"Administração Pública" a "atividade" desempenhada, pouco importando
"quem" a exerça.

Resumindo:

Administração Pública
Sentido formal Analisa as pessoas "quem" é a Administração Pública
que a integram
Sentido material Analisa a atividade "o que" faz a Administração Pública
desempenhada

18
ALEXANDRINO, Marcelo – Direito Administrativo Descomplicado, 25ª ed. rev. e atual. – São
Paulo: Método, 2017, pp. 22-25.
193

Segundo a doutrina majoritária, o Constituinte de 1988 adotou o sentido formal


de Administração Pública - o que se observa do próprio caput do art. 37 do Texto
Constitucional:

Art. 37, caput, CF - A administração pública direta e indireta de qualquer dos


Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência.

8.2. Princípios administrativos

Segundo a doutrina administrativista, a Administração Pública é regida por dois


supraprincípios - verdadeiras "pedras de toque" do Direito Administrativo 19:

▪ Princípio da supremacia do interesse público: trata-se de princípio


implícito que fundamenta todas as prerrogativas especiais de que dispõe a
administração para alcançar os fins que a Constituição e as leis lhe impõem. Ou
seja, este princípio fundamenta os atos de império (poder extroverso) do
Poder Público, de modo que, existindo conflito entre o interesse público e o
interesse particular, deverá prevalecer o primeiro. Contudo, não possui caráter
absoluto, uma vez que ele não incide na atuação de meio da administração
pública. Não incide, por exemplo, quando ela pratica os denominados atos de
gestão e atos de mero expediente. Também não incide quando a administração
pública atua como agente econômico produtivo (Estado-empresário).

19
ALEXANDRINO, 2017, pp. 227 e ss.
194

▪ Princípio da indisponibilidade do interesse público: este princípio -


também implícito - prega que a administração pública é "mera gestora" da
coisa pública, e não sua "dona". Ou seja, tutela o próprio conceito de "república"
(coisa do povo). Por consequência, este princípio está presente em toda e
qualquer atuação da administração pública, seja de meio, seja de fim.

A partir destes dois "supraprincípios" é que se revelam os demais princípios da


administração pública, nomeadamente os talhados no art. 37, caput, da CF.
Vejamos:

a) Princípio da legalidade: a legalidade representa o valor essencial do Estado


de Direito, uma vez que todos estão sujeitos ao "império da lei". Vale dizer,
ninguém (nem particulares, nem agentes públicos) pode agir contra lei. A
chamada legalidade administrativa prega o agente público só pode agir
quando houver previsão legal. Isto porque, a sua atuação é respaldada pela lei,
e não pela sua vontade. Por conseguinte, se não houver previsão legal, não
haverá possibilidade de atuação administrativa.

❖ Observação: lembre-se que a legalidade civil (art. 5º, II) é direcionada


aos particulares, permitindo que ele faça tudo que a lei não proíbe. Já a
legalidade administrativa (art. 37, caput) é direcionada aos agentes públicos -
sendo mais restrita -, permitindo que se faça apenas o que a lei expressamente
determina - ex.: dever de licitação para aquisição de bens e serviços. Isto foi
estudado no Capítulo dos Direitos Individuais e Coletivos.
195

b) Princípio da impessoalidade: a impessoalidade veda a prática do ato


administrativo visando interesses pessoais do próprio agente e/ou de terceiros,
bem como perseguições ou abusos de conduta. De modo mais completo, é
possível afirmar que a impessoalidade possui três prismas de atuação:

▪ Dever de isonomia: confere tratamento isonômico aos particulares,


evitando perseguições ou favoritismos.

▪ Conformidade ao interesse público: veda a utilização do cargo para


satisfação de interesses pessoais. Um bom exemplo desta vedação se encontra
no art. 37, § 1º, da CF, que exige que a publicidade dos atos governamentais
tenha apenas caráter informativo ou de orientação social; jamais de promoção
pessoal de autoridades ou servidores públicos. Coíbe-se o famoso "fui eu que
fiz".

▪ Imputação de atos praticados pelo agente público diretamente ao


órgão: quando o agente realiza um ato ele o faz em nome do Poder Público, e
não no dele.

c) Princípio da moralidade: embora a moralidade traga um elevado grau de


indeterminação, este princípio se pega em uma noção objetiva de "moral", pois
independe das convicções de foro íntimo do sujeito. Significa dizer que ele torna
jurídica a exigência de atuação ética e honesta dos agentes públicos.

d) Princípio da publicidade: a publicidade possui revela um dever de


transparência na administração da coisa pública. Isto é, todos têm o direito de
196

saber como os interesses públicos são administrados; e, somente, por meio da


motivação dos atos é que se atenderá perfeitamente ao dever de publicidade.

e) Princípio da eficiência: foi o último princípio incluído no art. 37, caput, da


CF - ingressando nele com a EC nº 19/98. A eficiência exige - tanto dos agentes,
quanto da organização dos órgãos administrativos - que haja o melhor
desempenho possível em suas atribuições. Somente por meio da atuação
efetiva e racional é que se obterá os melhores resultados para o interesse
público.

A fim de bem memorizar estes princípios, guarde o seguinte processo


mnemônico:

L egalidade
I mpessoalidade
M oralidade
P ublicidade
E ficiência

Além destes princípios, o art. 37 traz mais 22 incisos e 16 parágrafos de


diretrizes para a atuação da Administração Pública. Examinarei a seguir os
temas que interessam diretamente ao Direito Constitucional, tendo em vista
que a maioria dos presentes temas toca diretamente o Direito Administrativo.

8.3. Tratamento constitucional da administração pública


197

A fim de realizar uma análise eficiente do art. 37 da CF, traçarei, em tópicos, os


pontos que são frequentes em sua banca:

(i) Princípio do concurso público: a investidura em cargo ou emprego público


depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e
títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na
forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão
declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

(ii) Exceções ao princípio do concurso público: o próprio Texto Constitucional


traz algumas exceções à obrigatoriedade de concurso público para integrar os
quadros da Administração Pública.

▪ Cargos em comissão: destinados às atribuições de direção, chefia e


assessoramento.

▪ Servidores temporários: a lei estabelecerá os casos de contratação por


tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional
interesse público. Para que não haja o desvirtuamento desta excepcionalidade,
o STF fixa dois requisitos:

a) Requisito formal = exigência de uma lei que trate o tema.

b) Requisito material = exigência que essa lei detalhe as hipóteses em que


ocorrerá essa contratação, o tempo máximo que poderá ter e qual a
necessidade temporária de excepcional interesse público que a justifica.
198

▪ Cargos eletivos: estão sujeitos ao exercício da democracia indireta


(escolha pelo povo).

▪ Agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias:


dispõe o art. 198, § 4º, da CF que os gestores locais do sistema único de saúde
poderão admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às
endemias por meio de processo seletivo público, de acordo com a natureza e
complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação. Ou
seja, ingressam nos quadros públicos também sem concurso público.

▪ Ex-combatentes: dispõe o art. 53, I, do ADCT que ao ex-combatente que


tenha efetivamente participado de operações bélicas durante a Segunda Guerra
Mundial, será assegurado o aproveitamento no serviço público, sem a exigência
de concurso, e com estabilidade.

(iii) Prazo de validade dos editais: o prazo de validade do concurso público


será de até dois anos, prorrogável uma vez, por igual período: ou seja, não é
possível a prorrogação por mais de uma vez, nem a prorrogação por prazo
distinto da validade inicial.

(iv) Liberdade de associação sindical e direito de greve: é garantido ao


servidor público civil o direito à livre associação sindical. E seu direito de greve
será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica. Tais
preceitos são aplicados tão somente ao servidor público civil. Isto porque, os
militares, por estarem pautados pela hierarquia e disciplina, não podem se
sindicalizar, nem exercer direito de greve (art. 142, IV, CF).
199

❖ Observação: há uma omissão legislativa no direito de greve do servidor


público civil, pois a lei específica não foi elaborada até hoje. Por este motivo,
entendeu o STF que, enquanto perdurar a omissão legislativa, devem ser
aplicadas ao setor público as regras definidas para o setor privado, isto é, a Lei
nº 7.783/1989 (Mandados de Injunção nº 670, 708 e 712).

❖ Importante para a sua prova: embora a Constituição confira uma


imunidade ao servidor para exercer greve, entende o STF que a Administração
Pública poderá descontar os dias de paralisação, permitida a compensação
em caso de acordo. Esse desconto, contudo, será indevido na hipótese de ficar
demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do próprio Poder
Público (RE nº 693.456/RJ).

(v) Princípio da periodicidade: a remuneração dos servidores públicos e o


subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados
por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada
revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices. Ou
seja, o Texto Constitucional traz a previsão de uma revisão remuneratória anual.

(vi) Teto constitucional de remuneração: o teto remuneratório previsto pelo


art. 37, XI, da CF baliza não apenas a Administração Pública Direta (União,
Estados, Distrito Federal e Municípios), como também as autarquias e
fundações. O teto geral corresponderá a remuneração dos Ministros do
Supremo Tribunal Federal, que corresponde hoje aproximadamente a R$ 46,3
mil. Trata-se de dispositivo autoaplicável, pois não exige lei que o regulamente.
200

A finalidade do teto remuneratório é conferir maior transparência e


uniformidade no tratamento do erário, proibindo a concessão de vantagens por
meio de resoluções administrativas - muito comuns em tempos remotos -, o que
violaria o princípio da moralidade administrativa.

E no âmbito dos Estados, Distrito Federal e Municípios?

Poder Âmbito dos Estados Âmbito dos Municípios


Poder Executivo Subsídios do Governador Subsídios do Prefeito
Poder Legislativo Subsídios dos Deputados Subsídios do Prefeito (por
Estaduais e Distritais interpretação sistemática)
Poder Judiciário Subsídios dos Não há Poder Judiciário no
Desembargadores do TJ, âmbito municipal
limitado a 90,25% do
subsídio mensal do STF

❖ Importante para a sua prova: o § 9º do art. 37 da Constituição ressalva


desta regra as empresas públicas e sociedades de economia mista que não
recebam recursos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para
pagamento de despesas de pessoal ou de custeio em geral - ex.: imagine se um
grande executivo do Banco do Brasil ganhasse o teto constitucional... Decerto
haveria uma discrepância muito grande com o mesmo cargo em um banco
privado; o que poderia prejudicar a livre atuação econômica daquela sociedade
de economia mista federal.
201

(vii) Primazia dos vencimentos do Poder Executivo: os vencimentos dos


cargos do Poder Legislativo e do Poder Judiciário não poderão ser superiores
aos pagos pelo Poder Executivo.

(viii) Vedação à vinculação de remunerações: é vedada a vinculação ou


equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de
remuneração de pessoal do serviço público.

(ix) Proibição do "efeito repique" (ou "efeito cascata"): o "efeito repique" ou


"efeito cascata" corresponde ao ato de computar uma vantagem pecuniária
sobre outra. No passado isso era muito comum. Servidores acumulavam
diversos cargos - dentro da mesma carreira - e ostentavam "supersalários": os
conhecidos "marajás". Diz o Teto Constitucional, então, que os acréscimos
pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem
acumulados para fins de concessão de acréscimos ulteriores. Essa proibição
estende-se, também, para as aposentadorias.

(x) Princípio da irredutibilidade da remuneração: o subsídio e os vencimentos


dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis. Esta regra visa
tutelar o caráter alimentar da remuneração.

(xi) Cumulação de cargos públicos: a regra é a proibição da acumulação


remunerada. Contudo, a Constituição traz três exceções, se houver
compatibilidade de horários:

▪ Dois cargos de professor


202

▪ Um cargo de professor com outro técnico ou científico

▪ Dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com


profissões regulamentadas

Essa proibição de acumular estende-se a empregos e funções e abrange


autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas
subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder
público.

(xii) Administração Indireta: embora seja um tema pertinente ao Direito


Administrativo, trago uma rápida conceituação sobre a Administração Indireta. A
Administração Indireta é composta por quatro entes: autarquias, fundações
públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista. Vejamos a
distinção entre cada um20.

a) Autarquias: representam a personificação de um serviço retirado da


Administração Pública centralizada. A autarquia é criada por lei específica e
possui personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios.

b) Fundações públicas: representam a personificação de um patrimônio


que, dependendo da forma de criação, adquire personalidade jurídica de direito
público (a que nos interessa aqui) ou privado. As fundações públicas são
autorizadas por lei específica e tem suas áreas de atuação definidas por lei
complementar.

20
ALEXANDRINO, 2017, pp. 44 e ss.
203

c) Empresas públicas: são pessoas jurídicas de direito privado instituídas pelo


poder público sob qualquer forma jurídica, mediante autorização de lei
específica. O seu capital pertence à pessoa política instituidora, admitindo-se,
desde que esta mantenha o controle societário, a participação de outras pessoas
políticas, bem como de entidades da administração indireta de quaisquer entes
federativos.

d) Sociedades de economia mista: são pessoas jurídicas de direito privado


instituídas pelo poder público, mediante autorização de lei específica, sob a
forma de sociedade anônima. Possuem participação obrigatória de capital
privado e público, sendo da pessoa política instituidora o controle acionário.

(xiii) Pessoa jurídica subsidiária: não há uma definição legal de "pessoa


jurídica subsidiária". Segundo a doutrina, ela corresponderia às pessoas
jurídicas controladas por uma das entidades da Administração Pública Indireta.
O Texto Constitucional, por sua vez, diz que dependerá de autorização
legislativa, em cada caso, a criação de subsidiárias das entidades mencionadas
no tópico anterior, assim como a participação de qualquer delas em empresa
privada.

(xiv) Princípio da obrigatoriedade de licitação: ressalvados os casos


especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão
contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de
condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações
de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei,
o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica
indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.
204

O dever de licitação decorre da própria noção do princípio da legalidade


administrativa. Isto é, o agente público só pode fazer o que a lei expressamente
determina. E, se ele não é titular do patrimônio administrado (erário), não pode
dispor arbitrariamente dele. A licitação visa garantir as melhores condições
para a Administração Pública.

(xv) Atos de improbidade administrativa: o Texto Constitucional traz como


penalidades:

▪ P erda da função
▪ A ção penal cabível
▪ R essarcimento ao erário
▪ I ndisponibilidade dos bens
▪ S uspensão dos direitos políticos

Note o processo mnemônico para guardar as penalidades constitucionais dos


atos de improbidade: "Quem comete improbidade não vai a P A R I S".

(xvi) Prescrição das ações de ressarcimento ao erário: a lei estabelecerá os


prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou
não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de
ressarcimento.

❖ Importante para a sua prova: a regra no Direito brasileiro é a prescrição,


pois ninguém poderá ser devedor eterno. Mas há uma exceção: os atos de
improbidade administrativa.
205

(xvii) Responsabilidade civil estatal: as pessoas jurídicas de direito público e


as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos
que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito
de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

O art. 37, § 6º, CF consagrou a responsabilidade civil objetiva da


administração, isto é, que independe da demonstração de dolo ou culpa.
Contudo, tenha cuidado: a ação de regresso contra o agente público
diretamente causador do dano ocorrerá somente se verificado dolo ou culpa.

*OBS: a responsabilidade civil estatal é tema atinente ao Direito Administrativo.

8.4. Exercício de mandato pelo servidor público

O art. 38 da Constituição regulou a hipótese de o servidor público da


administração direta, autárquica ou fundacional assumir um cargo eletivo.

Segundo este dispositivo:

▪ Investindo-se em mandato eletivo federal, estadual ou distrital, o


servidor ficará afastado de seu cargo, emprego ou função. Ou seja, o servidor
público que for eleito Presidente ou Vice-Presidente da República, Governador
ou Vice-Governador, Senador Federal, Deputado Federal, Distrital Estadual
deverá ser afastado do seu cargo, emprego ou função.
206

▪ Investindo-se no mandato de Prefeito, esse servidor público deverá ser


afastado do cargo, emprego ou função, mas o Texto Constitucional permite que
ele opte por sua remuneração. Em pequenos Municípios, não raras vezes a
remuneração do servidor é superior ao que irá auferir como Prefeito.

▪ Investindo-se no mandato de Vereador, e havendo compatibilidade de


horários, o servidor público poderá cumular as remunerações: a de seu cargo e
a do mandato eletivo. Contudo, se não houver compatibilidade de horários, ele
poderá optar entre a remuneração do seu cargo ou a de Vereador.

As três hipóteses podem ser esquematizadas da seguinte forma:

Servidor Público Investido em Mandato:


Federal ou Estadual Deve se afastar de seu cargo -
de Prefeito Deve se afastar de seu cargo Pode optar pela remuneração
de Vereador Pode cumular os cargos e a Se não houver
remuneração se houver compatibilidade de horários,
compatibilidade de horários pode optar pela remuneração

Em qualquer caso que exija o afastamento para o exercício de mandato eletivo,


o tempo de serviço do servidor público será contado para todos os efeitos legais,
exceto para promoção por merecimento.

E, na hipótese do servidor público ser segurado pelo Regime Próprio de


Previdência Social (RPPS), permanecerá filiado a esse regime, no ente
federativo de origem.
207

8.5. Regime jurídico do servidor público

O art. 39 da Constituição traz o regime jurídico dos servidores públicos,


dispondo que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.

❖ Observação: o caput do art. 39 da Constituição foi reformulado pela


Emenda Constitucional nº 19 de 1998, que suprimiu a exigência de Regime
Jurídico Único e de planos de carreira para os servidores públicos. Após esta
Emenda Constitucional, o art. 39 da Lei Maior passou a figurar com o seguinte
texto:

Art. 39, caput, CF - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios


instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal,
integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes (texto
reformulado pela EC nº 19/98).

Contudo, foi ajuizada uma ADI contra este dispositivo e o STF concedeu a
cautelar para suspender a eficácia da alteração promovida pela EC nº 19/1998
(ADI nº 2135-4). Após esta decisão do STF voltou a vigorar a redação original
anterior do art. 39, caput, da CF:

Art. 39, caput, CF - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios


instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de
carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das
fundações públicas (texto original da CF/1988).
208

Esta sequência de acontecimentos explica o motivo de seu Vade Mecum


provavelmente ter "dois" arts. 39, caput. Seja como for, atualmente está valendo
a redação original dele - sem as alterações promovidas pela EC nº 19/1998.

8.5.1. Remuneração dos servidores públicos

A remuneração do servidor público é composta pelo somatório dos vencimentos


e de suas vantagens pecuniárias. Isto é:

Remuneração = Vencimento + Vantagens pecuniárias

O Texto Constitucional traz alguns requisitos que deverão ser observados para
fixar a remuneração de cada cargo. Diz o art. 39, § 1º que a fixação da
remuneração deverá observar:
     
▪ A natureza do cargo
▪ O grau de responsabilidade do cargo
▪ A complexidade dos cargos componentes de cada carreira
▪ Os requisitos para a investidura
▪ As peculiaridades do carago

Dispõe, ainda, o Texto Constitucional que determinados cargos deverão receber


por meio do chamado regime de subsídio.

O regime de subsídio representa uma inovação trazida pela Reforma


Administrativa promovida pela EC nº 19/98. Ele se caracteriza ser uma
209

remuneração fixada em parcela única, isto é, que veda o acréscimo de


"penduricalhos" ao salário, como, por exemplo: abono, verba de representação
ou outras espécies remuneratórias.

Segundo o art. 39, § 4º, da CF, o regime de subsídio representa modalidade de


remuneração obrigatória para os agentes políticos (que ocupam a cúpula do
Poder: parlamentares, Chefes do Poder Executivo, Juízes, Promotores), mas
facultativa para outros servidores públicos organizados em carreira (desde que
assim disponham as respectivas leis federais, estaduais e municipais).

Confira a literalidade deste dispositivo:

Art. 39, § 4º, CF - O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os


Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados
exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de
qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra
espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e
XI (isto é, o teto remuneratório constitucional).

8.5.2. Previdência dos servidores públicos

O art. 40 da Constituição traz o chamado Regime Próprio de Previdência


Social (RPPS), isto é, o sistema previdenciário dos servidores públicos
(estatutários).

O regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos


efetivos terá caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do
210

respectivo ente federativo, de servidores ativos, de aposentados e de


pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial.

Este regime previdenciário sofreu fortes alterações com a EC nº 103/2019, que


trouxe a chamada "Reforma Previdenciária" para os servidores públicos - fique
atento às inúmeras atualizações feitas por essa Emenda

De outro lado, estão excluídos do RPPS - aplicando-se o Regime Geral de


Previdência Social (RGPS), os seguintes agentes públicos:

▪ Ocupantes, exclusivamente, de cargo em comissão


▪ Cargos temporários
▪ Empregados públicos

Pois bem. A Constituição estipulou algumas modalidades de aposentadoria ao


servidor público vinculado ao RPPS:

a) Aposentadoria por incapacidade permanente para o trabalho: ocorre


diante de alguma vicissitude que impossibilite o servidor de continuar
trabalhando e não permita sua readaptação. Nesta hipótese, será obrigatória a
realização de avaliações periódicas para verificação da continuidade das
condições que ensejaram a concessão da aposentadoria, na forma de lei do
respectivo ente federativo.

b) Aposentadoria compulsória: traz uma presunção absoluta de que,


atingida determinada idade, o servidor público, independentemente de ainda
211

possuir condições físicas e mentais de continuar com sua função administrativa,


deverá ser obrigatoriamente aposentado. Com a chamada "PEC da bengala", a
regra continua sendo 70 anos de idade, mas lei complementar do respectivo
ente poderá estendê-la até os 75 anos de idade.

Há alguns agentes públicos que não precisam observar a aposentadoria


compulsória. Ou seja, são exceções à aposentadoria compulsória:

▪ Ocupantes exclusivamente de cargos em comissão (STF, RE nº


786.540/DF) - ex.: Ministros ou Secretários de Estado.

▪ Titulares de serventia judicial não estatizada, desde que não sejam


ocupantes de cargo público efetivo e não recebam remuneração proveniente dos
cofres públicos (STF, RE nº 647.827/PR).

c) Aposentadoria voluntária: nesta modalidade o servidor público possui


condições físicas e jurídicas de continuar no cargo, mas decide
voluntariamente se aposentar. Segundo a CF, no âmbito da União:

▪ Mulheres = 62 anos de idade

▪ Homens = 65 anos de idade

*OBS: os ocupantes do cargo de professor terão idade mínima reduzida em 5


anos em relação às idades aqui fixadas, desde que comprovem tempo de
efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino
fundamental e médio fixado em lei complementar do respectivo ente federativo.
212

Já no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a idade


mínima será estabelecida mediante emenda às respectivas Constituições e Leis
Orgânicas. Deverá ser observado, ainda, o tempo de contribuição e os demais
requisitos estabelecidos em lei complementar do respectivo ente federativo.

❖ Observação: As regras para cálculo de proventos de aposentadoria


serão disciplinadas em lei do respectivo ente federativo. Ademais, a lei
complementar do respectivo ente federativo as regras para cálculo de proventos
de aposentadoria serão disciplinadas em lei do respectivo ente federativo poderá
estabelecer idade e tempo de contribuição diferenciados para aposentadoria de
servidores com deficiência, previamente submetidos a avaliação
biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar.

Por fim, permitam-se uma crítica constitucional: infelizmente a EC nº 103/2019


trouxe um duro golpe no serviço público. Refiro-me ao adverso § 2º do art. 39
da CF:

Art. 39, § 2º, CF - Os proventos de aposentadoria não poderão ser inferiores ao


valor mínimo a que se refere o § 2º do art. 201 ou superiores ao limite máximo
estabelecido para o Regime Geral de Previdência Social, observado o disposto
nos §§ 14 a 16. 

Este parágrafo limitou o teto da aposentadoria do Regime Próprio ao teto do


Regime Geral de Previdência Social - hoje, na casa dos R$ 7 mil. Os servidores
que ingressaram na regra antiga da previdência (idos de 2000) ainda aposentam
213

com a integralidade de vencimentos, isto é, aposentadoria com os


vencimentos integrais que recebia na ativa.

A limitação de um "teto previdenciário" para o servidor público revela uma


injustificada equiparação do setor público ao setor privado. Lembre-se que o
servidor não possui FGTS, PLR, verbas rescisórias, nem vantajosos planos de
previdência privada ofertados por algumas empresas. Não obstante, muitos
servidores que ingressaram perante a regra antiga perderam, entrementes, seu
direito à aposentadoria integral, sob o surpreendente argumento de "inexistir
direito adquirido em regime jurídico".

Seja como for, a perda da aposentadoria integral infelizmente poderá impactar


na qualidade do serviço público e na independência técnica dos futuros
servidores públicos. Tornaremos a este debate ao comentar sobre a estabilidade
constitucional e as tentativas da Reforma Administrativa em suprimi-la.

8.6. Estabilidade constitucional e perda do cargo público

Antes de mais nada, tenha em mente que a estabilidade constitucional


representa um direito da sociedade, e não do servidor público em si. A
estabilidade visa conferir independência, isenção técnica e segurança
jurídica para o desempenho da missão pública.

Imagine o seguinte exemplo: um procurado municipal se depara com uma


licitação milionária e superfaturada. Qual a garantia que ele terá para contrariar
os interesses dos poderosos e impugnar a licitação em seu parecer? Se
214

porventura não tiver estabilidade no cargo, obviamente ficará sujeito às


pressões políticas e econômicas subjacentes; correndo, inclusive, o risco de
perder injustamente seu cargo.

É para isto que serve a estabilidade: ao combate das corrupções, desmandos


e abusos porventura verificados no exercício da função administrativa. Pese
embora, tramita, atualmente, uma série de propostas legislativas para destruir o
serviço público, a que eu denomino de "DEforma Administrativa". Enfim, descei
um véu de piedade sobre as insipiências jurídicas e maus desígnios que
motivam o desmonte dos quadros administrativos...

Retomando: a Constituição dispõe que somente após três anos de estágio


probatório é que se adquirirá a estabilidade constitucional.

Observo, no ponto, que apenas os servidores públicos estatutários terão


estabilidade. Os empregados públicos - isto é, os celetistas -, não a possuem.

Não obstante, entende o STF que eventual dispensa dos empregados públicos
deve ocorrer mediante ato formal e motivado. Ou seja, em respeito aos
princípios da impessoalidade, isonomia e moralidade administrativa, que regem
também regem a atuação das empresas públicas e sociedades de economia
mista, é vedada a rescisão unilateral e imotivada do contrato de trabalho do
empregado público. Garante-se, outrossim a ampla defesa e contraditório
deste agente público.

Em resumo:
215

Estabilidade
Servidores Públicos (estatutários) Possuem Após 3 anos
Empregados Públicos Não possuem A demissão, contudo,
deve ser motivada

Dispõe a Lei Maior, ainda, que a avaliação especial de desempenho por


comissão instituída para essa finalidade é condição obrigatória para a aquisição
da estabilidade.

*OBS: se a intenção da aludida "Reformação Administrativa" fosse mesmo a


busca pela eficiência do serviço público, os debates deveriam se concentrar
na efetiva concretização deste comando constitucional (art. 41, § 4º, da CF).
Bastaria uma rigorosa avaliação especial para aperfeiçoar os quadros
administrativos. Contudo, por mais um prisma se descortinam os simulados
objetivos destas propostas... A quem interessa trocar o servidor público
concursado por eventuais apadrinhados políticos? Perde a sociedade, perde a
administração; perdem a moralidade e impessoalidade administrativas...

A estabilidade, contudo, não confere uma imunidade absoluta ao servidor


público. Mesmo sendo estável, o servidor público poderá perder o cargo nos
seguintes casos:

▪ Em virtude de sentença judicial transitada em julgado


▪ Mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla
defesa
▪ Mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho
216

▪ Decorrente da redução de despesa de pessoal que aduz o artigo 169, §


4º, da CF

8.7. Revisão do tema

TABELA DE REVISÃO
A "Administração Pública" possui dois sentidos:
▪ Administração Pública em sentido formal =
representa o conjunto de órgãos, pessoas jurídicas e
agentes, independentemente da atividade que
desempenham. Ou seja, esta acepção de "Administração
Noção Pública" leva em conta apenas "quem" integra a
Geral administração público e não "o que" cada órgão faz.
▪ Administração Pública em sentido material =
analisa a administração a partir das atividades que costuma
desempenhar, isto é, analisa se o órgão desempenha ou
não a função administrativa (defesa concreta do interesse
público). Essa acepção, portanto, qualificará como
"Administração Pública" a "atividade" desempenhada,
pouco importando "quem" a exerça.
Há dois supraprincípios que regem o Direito Administrativo:
▪ Princípio da supremacia do interesse público =
fundamenta os atos de império (poder extroverso) do Poder
Público. Existindo conflito entre o interesse público e o
interesse particular, deverá prevalecer o primeiro.
217

▪ Princípio da indisponibilidade do interesse


público = prega que a administração pública é "mera
gestora" da coisa pública, e não sua "dona". Ou seja, tutela
o próprio conceito de "república" (coisa do povo).
A partir destes duas "pedras de toque" que se revelam os
demais princípios administrativos do art. 37, caput, da CF:
a) Princípio da legalidade = prega que o agente público só
pode agir quando houver previsão legal. Ou seja, a sua
atuação é respaldada pela lei, e não pela sua vontade. Por
conseguinte, se não houver previsão legal, não haverá
possibilidade de atuação administrativa.
Princípios b) Princípio da impessoalidade = a impessoalidade veda
Administrativos a prática do ato administrativo visando interesses pessoais
do próprio agente e/ou de terceiros, bem como
perseguições ou abusos de conduta.
c) Princípio da moralidade = embora a moralidade traga
um elevado grau de indeterminação, este princípio se pega
em uma noção objetiva de "moral", pois independe das
convicções de foro íntimo do sujeito. Significa dizer que ele
torna jurídica a exigência de atuação ética e honesta dos
agentes públicos.
d) Princípio da publicidade = a publicidade possui revela
um dever de transparência na administração da coisa
pública. Isto é, todos têm o direito de saber como os
interesses públicos são administrados; e, somente, por
meio da motivação dos atos é que se atenderá
perfeitamente ao dever de publicidade.
218

e) Princípio da eficiência = exige - tanto dos agentes,


quanto da organização dos órgãos administrativos - que
haja o melhor desempenho possível em suas atribuições.
Somente por meio da atuação efetiva e racional é que se
obterá os melhores resultados para o interesse público.
Dos 22 incisos e 16 parágrafos do art. 37 da CF é possível
extrair os seguintes pontos relevantes:
(i) Princípio do concurso público = a investidura em
cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em
concurso público de provas ou de provas e títulos, de
acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou
emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as
nomeações para cargo em comissão declarado em lei de
livre nomeação e exoneração.
(ii) Exceções ao princípio do concurso público =
excepciona-se da obrigatoriedade do concurso:
▪ Cargos em comissão
▪ Servidores temporários
▪ Cargos eletivos
(iii) Prazo de validade dos editais = o prazo de validade
do concurso público será de até dois anos, prorrogável uma
vez, por igual período.
(iv) Liberdade de associação sindical e direito de greve
= é garantido ao servidor público civil o direito à livre
associação sindical. E seu direito de greve será exercido
nos termos e nos limites definidos em lei específica. Tais
219

preceitos não se aplicam aos militares, cuja sindicalização e


greve são proibidas.
(v) Princípio da periodicidade = o Texto Constitucional
traz a previsão de uma revisão remuneratória anual dos
servidores públicos, nos termos de lei específica.
(vi) Teto constitucional de remuneração = o teto
remuneratório previsto pelo art. 37, XI, da CF baliza não
apenas a Administração Pública Direta (União, Estados,
Distrito Federal e Municípios), como também as autarquias
e fundações. O teto geral corresponderá a remuneração
dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, que
corresponde hoje aproximadamente a R$ 39,2 mil. Trata-se
de dispositivo autoaplicável, pois não exige lei que o
regulamente.
(vii) Primazia dos vencimentos do Poder Executivo = os
vencimentos dos cargos do Poder Legislativo e do Poder
Judiciário não poderão ser superiores aos pagos pelo Poder
Executivo.
(viii) Vedação à vinculação de remunerações = é vedada
a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies
remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do
serviço público.
(ix) Proibição do "efeito repique" (ou "efeito cascata") =
os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público
não serão computados nem acumulados para fins de
concessão de acréscimos ulteriores - isto também se
estende para as aposentadorias.
220

(x) Princípio da irredutibilidade da remuneração = o


subsídio e os vencimentos dos ocupantes de cargos e
empregos públicos são irredutíveis. Esta regra visa tutelar
o caráter alimentar da remuneração.
(xi) Cumulação de cargos públicos = a regra é a
proibição da acumulação remunerada. Contudo, a CF traz 3
exceções, se houver compatibilidade de horários:
▪ Dois cargos de professor
▪ Um cargo de professor com outro técnico ou
científico
▪ Dois cargos ou empregos privativos de profissionais
de saúde, com profissões regulamentadas
(xii) Administração Indireta = a Administração Indireta é
Tratamento composta por quatro entes: autarquias, fundações públicas,
Constitucional empresas públicas e sociedades de economia mista:
da Administração ▪ Autarquias = representam a personificação de um
Pública serviço retirado da Administração Pública centralizada. É
criada por lei específica e possui personalidade jurídica,
patrimônio e receita próprios.
▪ Fundações públicas = representam a
personificação de um patrimônio que, dependendo da forma
de criação, adquire personalidade jurídica de direito público
(a que nos interessa aqui) ou privado. São autorizadas por
lei específica e tem suas áreas de atuação definidas por lei
complementar.
▪ Empresas públicas = são pessoas jurídicas de
direito privado instituídas pelo poder público sob qualquer
221

forma jurídica, mediante autorização de lei específica. O


seu capital pertence à pessoa política instituidora,
admitindo-se, desde que esta mantenha o controle
societário, a participação de outras pessoas políticas, bem
como de entidades da administração indireta de quaisquer
entes federativos.
▪ Sociedades de economia mista = são pessoas
jurídicas de direito privado instituídas pelo poder público,
mediante autorização de lei específica, sob a forma de
sociedade anônima. Possuem participação obrigatória de
capital privado e público, sendo da pessoa política
instituidora o controle acionário.
(xiii) Pessoa jurídica subsidiária = não há uma definição
legal de "pessoa jurídica subsidiária". Segundo a doutrina,
ela corresponderia às pessoas jurídicas controladas por
uma das entidades da Administração Pública Indireta.
Dependerá de autorização legislativa, em cada caso, a
criação de subsidiárias das entidades mencionadas no
inciso anterior, assim como a participação de qualquer
delas em empresa privada.
(xiv) Princípio da Obrigatoriedade de Licitação = o dever
de licitação decorre da própria noção do princípio da
legalidade administrativa. Isto é, o agente público só pode
fazer o que a lei expressamente determina. E, se ele não é
titular do patrimônio administrado (erário), não pode dispor
arbitrariamente dele. A licitação visa garantir as melhores
condições para a Administração Pública.
222

(xv) Atos de improbidade administrativa = quem comete


improbidade administrativa está sujeito às seguintes penas:
▪ P erda da função
▪ A ção penal cabível
▪ R essarcimento ao erário
▪ I ndisponibilidade dos bens
▪ S uspensão dos direitos políticos
(xvi) Prescrição das ações de ressarcimento ao erário =
a lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos
praticados por qualquer agente, servidor ou não, que
causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas
ações de ressarcimento. Segundo o STF, as ações de
ressarcimento derivadas de atos de improbidade dolosos
são imprescritíveis.
(xvii) Responsabilidade civil estatal = as pessoas
jurídicas de direito público e as de direito privado
prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos
que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros,
assegurado o direito de regresso contra o responsável nos
casos de dolo ou culpa.
Federal ou Deve se afastar de seu -
Estadual cargo
Exercício de De Deve se afastar de seu Pode optar pela
Mandato por Prefeito cargo remuneração
Servidor
Público
223

Pode cumular os cargos Se não houver


De e a remuneração se compatibilidade,
Vereador houver compatibilidade poderá optar pela
de horários remuneração
O caput do art. 39 da CF foi alterado pela EC nº 19/98.
Contudo, o STF concedeu cautelar para restabelecer a
Regime redação original deste artigo, que hoje vigora nos seguintes
Jurídico do termos: A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Servidor Municípios instituirão, no âmbito de sua competência,
Público regime jurídico único e planos de carreira para os
servidores da administração pública direta, das autarquias e
das fundações públicas (texto original da CF/1988).
A remuneração do servidor público é composta pelo
somatório dos vencimentos e de suas vantagens
pecuniárias e sua fixação deverá observar:
▪ A natureza do cargo
▪ O grau de responsabilidade do cargo
Remuneração ▪ A complexidade dos cargos componentes de cada
dos Servidores carreira
Públicos ▪ Os requisitos para a investidura
▪ As peculiaridades do carago
O regime de subsídio representa uma remuneração fixada
em parcela única, isto é, que veda o acréscimo de
"penduricalhos" ao salário, como, por exemplo: abono,
verba de representação ou outras espécies remuneratórias.
É uma modalidade de remuneração obrigatória para os
224

agentes políticos, mas facultativa para outros servidores


públicos organizados em carreira.
O art. 40 da Constituição traz o chamado Regime Próprio
de Previdência Social (RPPS), isto é, o sistema
previdenciário dos servidores públicos (estatutários). O
RPPS terá caráter contributivo e solidário, mediante
contribuição do respectivo ente federativo, de servidores
ativos, de aposentados e de pensionistas, observados
critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.
Excluem-se do RPPS, contudo:
▪ Ocupantes, exclusivamente, de cargo em comissão
▪ Cargos temporários
▪ Empregados públicos
A CF trouxe as seguintes modalidades de aposentadoria:
a) Aposentadoria por incapacidade permanente para o
trabalho = ocorre diante de alguma vicissitude que
impossibilite o servidor de continuar trabalhando e não
permita sua readaptação.
b) Aposentadoria compulsória = traz uma presunção
Previdência absoluta de que, atingida determinada idade, o servidor
dos Servidores público, independentemente de ainda possuir condições
Públicos físicas e mentais de continuar com sua função
administrativa, deverá ser obrigatoriamente aposentado.
Com a chamada "PEC da bengala", a regra continua sendo
70 anos, mas lei complementar do respectivo ente poderá
estendê-la até os 75 anos de idade. Excepciona-se desta
regra, contudo:
225

▪ Ocupantes exclusivamente de cargos em comissão


▪ Titulares de serventia judicial não estatizada, desde
que não sejam ocupantes de cargo público efetivo e não
recebam remuneração proveniente dos cofres públicos
c) Aposentadoria voluntária = segundo a CF, no âmbito
da União, ela ocorre
▪ Mulheres = 62 anos de idade
▪ Homens = 65 anos de idade
Observando-se, ainda, o tempo de contribuição e os demais
requisitos estabelecidos em lei complementar do respectivo
ente federativo.
A estabilidade é um direito da sociedade, e não do servidor.
Ela visa conferir independência, isenção técnica e
segurança jurídica para o desempenho da missão pública.
Somente os servidores públicos estatutários terão
estabilidade. Os empregados públicos - isto é, os celetistas
-, não a possuem. Não obstante, entende o STF que
eventual dispensa dos empregados públicos deve ocorrer
Estabilidade mediante ato formal e motivado (a fim de respeitar os
Constitucional e princípios da impessoalidade e moralidade administrativa).
Perda do Cargo A estabilidade, contudo, não confere uma imunidade
absoluta ao servidor público, podendo o servidor estável
perder o cargo nos seguintes casos:
▪ Sentença judicial transitada em julgado
▪ Processo administrativo com ampla defesa
▪ Procedimento de avaliação periódica de
desempenho
226

▪ Redução de despesa de pessoal referida pelo artigo


169, § 4º, da CF

8.8. Questões CEBRASPE no tema

1. (MP/SC – Promotor de Justiça – CONSULPAN – 2019) Nos casos em que a


Constituição da República Federativa do Brasil estabelece o afastamento do
servidor público da administração direta, autárquica e fundacional para o
exercício de mandato eletivo, o tempo de serviço será contado para todos os
efeitos legais, inclusive para promoção por merecimento.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: ERRADO.

2. (PF – Delegado Federal – CEBRASPE – 2018) No que se refere aos


servidores públicos e aos atos administrativos, julgue o item que se segue.

Havendo compatibilidade de horários, é possível a acumulação remunerada do


cargo de delegado de polícia federal com um cargo público de professor.

CERTO ou ERRADO?

Gabarito: CERTO.

Você também pode gostar