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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS


DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

ANNY KAROLLYNE COSTA DA SILVA

PRÁXIS POLÍTICA DO CENTRO DE REFERÊNCIA EM DIREITOS HUMANOS –


MARCOS DIONÍSIO: Uma análise a partir da organização social e formação política do
Movimento Nacional da População em Situação de Rua em Natal/ RN

NATAL/RN
2019
ANNY KAROLLYNE COSTA DA SILVA

PRÁXIS POLÍTICA DO CENTRO DE REFERÊNCIA EM DIREITOS HUMANOS –


MARCOS DIONÍSIO: Uma análise a partir da organização social e formação política do
Movimento Nacional da População em Situação de Rua em Natal/ RN

Monografia apresentada ao curso de Serviço


Social da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, como requisito para obtenção do
título de bacharel em Serviço Social.

Orientadora: Profª Dra. Daniela Neves de Sousa

NATAL/RN
2019
PRÁXIS POLÍTICA DO CENTRO DE REFERÊNCIA EM DIREITOS HUMANOS –
MARCOS DIONISIO: Uma análise a partir da organização social e formação política do
Movimento Nacional da População em Situação de Rua em Natal/ RN

Monografia apresentada ao curso de Serviço


Social da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, como requisito para obtenção do
título de bacharel em Serviço Social.

Aprovado em: _/_/__

BANCA EXAMINADORA

Profª Dra. Daniela Neves de Sousa (Orientadora)


Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN

Profª Dra. Silvana Mara de Morais dos Santos


Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN

Profª Dra. Janaiky Pereira de Almeida


Universidade Federal Rural do Semi-Árido – UFERSA
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA

Silva, Anny Karollyne Costa da.


Práxis política do Centro de Referência em Direitos Humanos -
Marcos Dionísio: uma análise a partir do Movimento Nacional da
População em Situação de Rua em Natal/RN / Anny Karollyne Costa
da Silva. - 2019.
63f.: il.

Monografia (Graduação em Serviço Social) - Universidade


Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais
Aplicadas, Departamento de Serviço Social. Natal, RN, 2019.
Orientador: Profa. Dra. Daniela Neves de Sousa.

1. Práxis Política - Monografia. 2. Movimentos Sociais -


Brasil - Monografia. 3. Centro de Referência em Direitos Humanos
- Monografia. 4. Movimento Nacional da População em Situação de
Rua - Monografia. I. Sousa, Daniela Neves de. II. Universidade
Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/Biblioteca do CCSA CDU 316.334.56

Elaborado por Eliane Leal Duarte - CRB-15/355


Dedico este trabalho à minha família
e amigos, especialmente à minha
mãe,pelo apoio
e encorajamento contínuo.
AGRADECIMENTOS

A felicidade só é real quando compartilhada, por isso gostaria de agradecer as pessoas


que se fizeram presente nessa jornada. O meu muito obrigada por ouvirem minhas angústias e
anseios em tempos tão dificeis, mas também por dividirem comigo vários contentamentos. Cada
um de vocês tem sua preciosidade na minha vida e nessa pesquisa.
Deixo aqui registrado a minha infinita gratidão à minha mãe Graça, pelo eterno apoio e
encorajamento.
Na relação academia-interpessoalidade, minha profunda gratidão reside na minha dupla
infalível do curso: Beatriz Yanne. Amiga, lhe desejo que a vida seja generosa assim como você
sempre foi comigo.
Agradeço ao grupo de professores do departamento DESSO/UFRN que contribuirám
para minha formação enquanto profissional e enquanto ser humano.
Agradeço a minha orientadora Daniela Neves, por ter aceitado minha proposta e me
recebido com todo carinho e atenção.
Saudosos agradecimentos ao professor Henrique Wellwn, pelo seu brilhante exercício
da crítica e por ter provocado a inquietude da temártica aqui estudada ainda no ínicio do curso
de Serviço Social. O voltar para casa após as sias aulas foram momentos preciosos de reflexão
e comprometimento com o saber.
Agradeço também a professoa Iris Maria de Oliveira e a CNPq, em que fui bolsista de
iniciação ciéntifica, em que dei meus primeiros passos enquando (eu) pesuisador por um tempo
considerável da minha trajetória acadêmica. Obrigada ao Grupo de Estudos Questão Social,
Política Social e Serviço Social QSPSSS- UFRN, por fomentar analíses crítica sobre a
profissão de Assistente Social.
Por fim, gratidão à família de coração CRDH-MD, pelos aprendizados ao longo de todo
o estágio. É uma fortaleza saber que existem pessoas como vocês, comprometidas com uma
nova práxis na luta pelos Direitos Humanos. Ademais, gostaria de agradecer pelas vivências
junto aos diversos movimentos sociais, especialmente ao Movimento Nacional da População
em Situação de Rua do RN.
Cortar o nó gódio, eis a questão. Proletarizar o coração e a mente
desses subalternos, que permanecem abaixo das linhas de classe da
subalternização, como o último degrau da sociedade
(“indigentes”,“marginais” populações carerntes ou
“dependentes” e outros. Os anarquistas tiveram a virtude de
estender os braços a esses companheiros e a grandeza de
compreender o seu infortúnio. Os revolucinários nacionalistas ou
comunistas, da periferia, acabaram aprendendo, pela prática, que
eles são os humildes mais exigentes de amor, de solidariedade
humana e companheirismo. No Brasil ainda arranhamos as meias
verdades. Culpam-se a falta de “organzização” e a falta de
“meios”para chegar até eles com a mensagem libertária da
fraternidade humana e da igualdade política. Espera-se que o
movimento popular dê o salto qualitativo de mobilização que só
poderá nascer de uma identidade partidária forte, que compreenda
que a classe operária não contém fronteiras diante da miséria e que
o socialismo proletário só poderá florescer pela incorporação
daqueles que são os mais desiguais, estejam eles no campo ou na
cidades, sejam eles brancos, negros ou índios, enfretem os dilemas
humanos que enfrentarem. O que o capitalismo expulsa e separa, o
socialismo deve unir e liberar. Essa é a realidade histórica que
torna o proletariado tão diferente do seu antípoda burgês e de seu
porta-voz, o demagogo. Uma democracia popular, desde o começo,
não pode separar os de baixo – deve unificá-los em torno da mesma
bandeira igualitária.

“Os desenraizados”. Florestan Fernandes, folha de


S. Paulo, 21 ago, 1986.
RESUMO

Este trabalho tem como objetivo geral analisar a práxis política do Centro de Referência em Direitos
Humanos – Marcos Dionísio (CRDH-MD) a partir da organização social e formação política do
Movimento Nacional da População em situação de rua no RN. Para isso discutiu-se a práxis enquanto
categoria teórica e prática, procurando apreendê-la do ponto de vista histórico e dos diversos processos
de construção e desconstrução do termo. Buscou-se também estudar o conceito de práxis e movimentos
a partir da atuação do CRDH-MD como espaço estratégico para a atuação política junto aos movimentos
sociais, enquanto articulador da organização política e formação social do MNPR com vista ao
enfrentamento e prevenção aos contextos de violações na contemporaneidade. Este trabalho encontra-
se amparado em um referencial teórico crítico, que propicia a partir de uma visão de totalidade,
aproximações sucessivas do movimento do real. Do ponto de vista metodologico, a adoção pelo
materialismo histórico dialético permitiu perpassar o debate dos Direitos Humanos como resultado do
processo de lutas. Assim, consistiu na revisão bibliográfica e análise de documentos produzidos pelo
centro, bem como o mapeamento das principais demandas da população em situação de rua. Em suma,
dialogar acerca da práxis política na interlocução com a luta por Direitos Humanos deriva de que os
movimentos sociais podem ser potencializadores da transformação social.

Palavras-chave: Práxis Política. Movimentos Sociais. Centro de Referência em Direitos


Humanos. Movimento Nacional da População em Situação.

.
ABSTRACT

This final paper aims to analyze the political praxis of the Reference Center on Human Rights - Marcos
Dionísio (CRDH-MD) to be part of the National Population Movement in a street situation in the RN.
For this, the Praxis was discussed as a theoretical and practical category, seeking to apprehend it from
the historical point of view and the various processes of construction and deconstruction of the term.
We also sought to study the concept of praxis and movements based on the role of the CRDH-MD as a
strategic space for political action with social movements, as the articulator of the political organization
and social formation of MNPR with a view to Coping and prevention to the contexts of violations in
contemporaneity. This work is supported by a critical theoretical framework, which provides a vision of
totality, successive approximations of the movement of the real. From the methodological point of view,
the adoption of dialectical historical materialism allowed to cross the human rights debate as a result of
the struggle process. Thus, it consisted of the bibliographic review and analysis of documents produced
by the center, as well as the mapping of the main demands of the population in the street situation. In
short, a dialogue about political praxis in the dialogue with the struggle for Human Rights derives from
the fact that social movements can be potentials for social transformation.

Key-words: Political Praxis. Social Movements. Reference Center on Human Rights


Marcos Dionísio. National Movement of the Population in the Situation of the street
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CENTRO POP Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua


CONHABINS Conselho Municipal de Habitação e Interesse Social
CRDH Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionisio
CRP/RN Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Norte
Estruturantes
FACEX/UNIFACEX Faculdade para Executivos
FUNAI Fundação Nacinal do Índio
GEPOP Grupo de Estudo Espaço e População
LGBT Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Ttransexuais ou Transgêneros
LOAS Lei Orgância de Assistência Social
MDS Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
MMIRDH Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos.
MNPR Movimento Nacional da Populaçao em Situação de Rua
MNPR/RN Movimento Nacional da Populaçao em Situação de Rua do Rio Grande do
Norte
OAB/RN Ordem dos Advogados do Rio Grande do Norte
ONGs Organizações Não-Governamentais
PMCMV Programa Minha Casa Minha Vida
PNDH Programa Nacional de Direitos Humanos
PNPR Política Nacional Para a População em Situação de Rua
POP RUA/PSR População em Situação de Rua
PT Partido dos Trabalhadores
SDH- PR Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República
SEHARPE Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos
SEMTAS Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social
SINSENAT Sindicato dos Servidores Municipais de Natal
SINTEST/RN Sindicato Estadual dos Trabalhadores em Educação
Superior do Rio Grande do Norte
SNAS Secretaria Nacional de Assistência Social
UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte
11

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 11

2. PRÁXIS POLÍTICA E MOVIMENTOS SOCIAIS ..................................................... 14

2.2 A ORIGEM DA PRÁXIS: DO CONCEITO ARISTOTÉLICO AO CONCEITO 14


MARXISTA......................................................................................................................
2.2 CONTRIBUIÇÕES DA FILOSOFIA DA PRÁXIS PARA UMA 19
CULTURA EMANCIPATÓRIA ...................................................................................
2.3 BREVE CONCEITUAÇÃO ACERCA DOS MOVIMENTOS 21
SOCIAIS ..........................................................................................................................

3. MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL: UM PROCESSO DE LUTA 27


E RESISTÊNCIA ...........................................................................................................
3.1 TRAJETÓRIA SÓCIO HISTÓRICA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS 27
NO BRASIL .............................................................................................................
3.2 DESIGUALDES E ANTAGONISMOS DE CLASSE: A LUTA DO 32
MOVIMENTO NACIONAL DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE
RUA..................................................................................................................................
3.3 O SURGIMENTO DO MNPR NO RIO GRANDE DO NORTE .......................... 37

4. PARA UMA NOVA PRÁXIS POLÍTICA DOS DIREITOS HUMANOS ......... 40

4.1 A (RE) INVENÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS: UMA ABORDAGEM À 40


LUZ CRÍTICA .......................................................................................................
4.2 DIREITOS HUMANOS NO BRASIL ................................................................... 44

4.3 EXPERIÊNCIAS DO CRDH-MD À PARTIR DO MOVIMENTO NACIONAL 46


DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA DO RN .........................................
5. CONSIDERÇÕES FINAIS ................................................................................... 56

6. REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 59
12

1. INTRODUÇÃO

O estudo a qual este trabalho de conclusão de curso dedica-se, consiste em analisar a


práxis política do Centro de Referência em Direitos Humanos, a partir da realidade de um
sujeito social específico: a população em situação de rua em Natal/RN. Para isso, aborda as
questões relativas à análise marxista do processo de formação política e organização social do
movimento.
À vista disso, a relação entre práxis política e movimentos sociais deriva do
entendimento de que os movimentos sociais podem ser potencializadores da transformação
social, principalmente neste momento de ascensão do que se denomina onda conservadora, em
que vivemos tempos de regressão civilizatória. As ofensivas do capital impactam de forma
objetiva e subjetiva a vida da classe trabalhadora. Conquistas históricas estão sendo destituídas
em prol de um ajuste econômico. O cenário que se gesta é de recrudescimento da questão social,
da retração de direitos e principalmente de criminalização dos movimentos sociais. Por isso, se
debruçar sob a temática dos direitos humanos a partir da práxis política de sujeitos com
potencial revolucionário, revela um posicionamento político que não está alicerçado na
racionalidade formal abstrata.
Nesta tônica, dialogar acerca da práxis política na interlocução com a luta por direitos
humanos sociais deriva do entendimento de que os movimentos sociais podem ser
potencializadores da transformação social. Na definição de Gohn (2011), movimentos sociais
são ações coletivas de caráter sociopolítico e cultural com variadas formas dos grupos se
organizarem. Pode-se dizer, que são agentes da mudança, que através de uma luta consciente,
organizada e dirigida, elaboram análises, estratégias e especialmente projetos capazes de
transformar a sociedade.
Assim, na luta por uma análise materialista da afirmação histórica dos Direitos
Humanos, O Centro de Referência em Direitos Humanos–Marcos Dionísio, figura como um
projeto de extensão da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), um espaço
estratégico para a atuação política junto aos movimentos sociais, classes e grupos oprimidos,
fomentando debates e atos públicos, a cerca de temáticas como: a criminalização e o
encarceramento da juventude pobre e negra, o extermínio da comunidade cigana, a questão da
moradia para a população em situação de rua, a criminalização dos movimentos sociais entre
outras pautas.
Com vistas ao enfrentamento e prevenção dos contextos de violações, o Centro é um
dos parceiros e articuladores do Movimento Nacional da População em Situação de Rua em
13

âmbito local (MNPR-RN), por meio da sua incidência política continuada nos diversos espaços
de participação social, de formação de lideranças, fortalecendo o campo de disputa dos direitos
humanos a partir da ótica da emancipação humana, na qual é fundamental a participação
popular na busca pela transformação social. Como um dos parceiros e articulador, o Centro se
fez presente desde a emergência e fortalecimento do movimento, considerando os desafios,
conquistas e perspectivas de continuidade, pois é preciso ter clareza que a população em
situação de rua não está imune ao caldo conservador da sociedade brasileira, “os invisíveis ou
descartáveis urbanos” naturalizados pela mídia, tem cada vez mais adquirido consciência de
classe e desenvolvido estratégias de resistências e enfrentamento enquanto sujeitos
organizados.
Assim, por entender que a afirmação de uma cultura de respeito aos direitos humanos
está diretamente ligada à mobilização e participação social, com uma metodologia inspirada na
autonomia e participação dos grupos vulneráveis, a defesa dos direito humanos oferece
possibilidades de disputa, de trânsito, de diálogo e requer principalmente a articulação com
sujeitos sociais e instituições, o que tem importância para o acúmulo de forças no interior das
organizações populares.
Partindo desses pressupostos, o interesse em estudar a temática, advém principalmente
das reuniões do GEPOP, da experiência de estágio no CRDH-MD, (grupo de estudo
desenvolvido pelos docentes, discentes, apoiadores que trabalham com a temática da pop rua)
da aproximação com o movimento e participação nas ações de intervenção junto a esse
segmento com o objetivo de promover e ampliar a reflexão sobre essa temática tão complexa.
O intento é estar dialogando sobre uma Cultura de Direitos humanos a partir de uma dimensão
não somente violatória, mas emancipatória e garantidora de direitos.
Este trabalho encontra-se amparado em um referencial teórico metodológico crítico, que
propicia a partir de uma visão de totalidade, aproximações sucessivas do movimento do real.
Dessa maneira, a adoção pelo materialismo histórico dialético permite perpassar o debate dos
Direitos Humanos como resultado dos processos histórico de lutas. No que se refere ao aspectos
metodológicos, realizou-se uma pesquisa bibliográfica que compreendeu os estudos teóricos
que oferecem sustentação às análises críticas sobre as categorias da práxis, movimentos sociais,
direitos humanos e população em situação de rua. Analisou-se,também, documentos elaborados
pelo MNPR, com a Cartilha de Formação, relatório de audiências públicas além de relatos
produzidos pelo Centro ao longo de sua existência.
Portanto, organizou-se a exposição dessa pesquisa em três capítulos assim distribuídos:
O primeiro capítulo, intitulado “Práxis Política e Movimentos Sociais” discute-se os
14

constructos teóricos em torno das dimensões da práxis, fundamental para apreensão da


organização e ação política dos movimentos sociais, pois é entendida, como elemento norteador
do conhecimento, critério da verdade e finalidade da teoria.
No segundo capítulo, “Movimentos Sociais no Brasil” refere-se ao processo histórico
de lutas e resistências em diferentes conjunturas, em que as desigualdades e antagonismos fez
surgir no cenário brasileiro o Movimento Nacional da População em Situação de Rua.
No terceiro capítulo, “Práxis do Centro de Referência em Direitos Humanos” se faz
um reflexão sobre os direitos humanos para além do direito positivado, mostrando o caratér das
lutas sociais, da importância da formação social e organizaçao política dos movimentos,
especialmente o Movimento Nacional da População de Rua no RN. Para isso, contamos com a
experiência do Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio como espaço
estratégico estratégico para a atuação política junto aos movimentos sociais com vista ao
enfrentamento e prevenção aos contextos de violações na contemporaneidade.
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2. PRÁXIS POLÍTICA E MOVIMENTOS SOCIAIS

2.1 ORIGEM DA PRÁXIS: DO CONCEITO ARISTOTÉLICO AO CONCEITO


MARXISTA

Na antiguidade clássica, a práxis como termo filosófico encontra suas raízes no


pensamento de Platão, que a compreendia enquanto uma ação ou atividade humana com um
fim em si mesmo, ao não criar ou produzir um objeto alheio ao agente ou a sua atividade.
Todavia, é com a filosofia de Aristóteles, que a práxis é consagrada em seu significado mais
preciso: dar sentido as “atividades especificamente humanas” que distinguiam a espécie do
homem de outras, e por meio das quais ele se desenvolvia como homem. Assim, a fim de
designar todas as atividades humanas, Aristóteles aponta que a práxis é uma das características
das atividades básicas do homem, seguidas por mais duas: Theoria e Poieses, Cf. Bottomore
(2012, p.431). A atividade teórica, a práxis e o trabalho, diferiam entre si quanto à sua
finalidade, ou quanto à sua estrutura teleológica. Com isso, correspondiam respectivamente ao
pensar (atividade teórica) cujo objetivo é a verdade, ao agir (práxis) em que o conhecimento
prático aparece e é a própria ação, e no fazer (trabalho), que terá como resultado um produto
final.
Como assinala Carone (2004), pela primeira vez, no que diz respeito ao pensar como
atividade teórica, o homem visava a obtenção do conhecimento da natureza, de suas leis, sem a
intervenção sobre ela através do trabalho ou práxis. É partindo dessa premissa que a “teoria”
significa contemplação sem ação ou intervenção. No âmbito da filosofia teórica, a autora nos
coloca a Física e a Metafísica, como exemplos dessa atividade de conhecimento que tinha como
finalidade o próprio conhecimento.
No que concerne a práxis como atividade humana, podemos dizer que esteve voltada
para o aperfeiçoamento do sujeito e da sociedade, de modo a promover a espécie humana ao
mais alto grau de excelência. O pensamento de Aristóteles deixa claro que nascemos com
disposições inatas que precisam ser desenvolvidas e transformadas em virtudes. Utiliza como
exemplo o caso do educador e do legislador. Ambos sujeitos de uma práxis que visava formar
as virtudes morais dos educandos, porque estas serão também virtudes cívicas a favor do
desenvolvimento da pólis. Assim, a atividade da práxis é exercida pelos homens como sujeitos
da ação, mas os objetos da práxis, que recebem os seus efeitos são os próprios sujeitos da ação:
é a ação do homem que modifica a sociedade e é por ela modificado. Em suma, a finalidade
prática de aperfeiçoar a natureza humana ao mesmo tempo que aperfeiçoa a sociedade.
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Onde houver educação ou um processo formativo visando o aperfeiçoamento


humano, há práxis. Onde houver legislação ou política visando o
aperfeiçoamento das instituições sociais, há práxis. A natureza física em si,
com suas leis próprias, é incapaz de exercer uma atividade desse tipo. A práxis
é uma atividade intencional do homem que visa, em última análise, o bem do
homem. Como sempre há novos aperfeiçoamentos, a atividade da práxis tem
finalidade, mas não tem fim ou término. Nesse sentido estrito, ela não tem um
produto final na qual a finalidade esteja definitivamente objetivada.
(CARONE, 2004, p.40).

O trabalho é uma atividade humana, porém com finalidade diferente da práxis. Ele
transforma a natureza, com a finalidade de produzir um mundo para os homens. Antes da
interferência humana, a natureza é regida por suas leis próprias. É por meio do trabalho que o
homem transforma o mundo em que vive e transforma a si mesmo. O resultado do trabalho é
um produto final, no qual a finalidade objetiva se materializa. Nesse processo ocorrem fases
distintas, o homem detentor da capacidade teleológica, projeta em sua mente o resultado da sua
ação. O produto final será a objetivação material de sua finalidade subjetiva e da pré-ideação
inicial.
De súbito, é preciso deixar claro que, se por um lado o trabalho inclui a intervenção do
homem, conformando uma atividade produtiva, por outro lado, a práxis é uma atividade de
aperfeiçoamento contínuo da espécie humana e da sociedade, isto é, uma atividade formativa.
Em sua obra o futuro da filosofia da práxis, Konder (1992), ao retomar a origem
etimológica dos termos, chegou à conclusão que o debate acerca da práxis circunda de maneira
oscilante, ora pendendo para a ação prática, de modo a intervir na própria realidade do “mundo
dos homens”, ora para a ação contemplativa, buscando compreender a realidade de cada período
histórico.
Para Marx, na desenvoltura dos seus estudos, foi o materialismo histórico dialético que
permitiu aos homens se tornarem “demiurgo de sua própria história”. Dessa forma, os homens
são produtores das suas representações, sobretudo o homem real, que realiza a produção da vida
a partir do desenvolvimento das forças produtivas e pelas relações correspondentes a essas
forças, entendendo que eles são construtos daquilo que vivem e não do que imaginam ser.
A práxis na perspectiva marxista é compreendida como transformação objetiva do
processo social, como elemento norteador do conhecimento, critério da verdade e finalidade da
teoria. No dicionário do pensamento Marxista, Petrovic apresenta um ponto interessante: o
autor afirma que a práxis é a prática social incorporada de teoria e que Marx a define como a
“meta da filosofia verdadeira (isto é, da crítica a teoria especulativa) e a revolução como
verdadeira práxis”, Cf. Petrovic (2001).
“Por meio da práxis, a filosofia se realiza, se torna prática, e se nega, portanto, como
17

filosofia pura, ao mesmo tempo em que a realidade se torna teórica no sentido de que se deixa
impregnar pela filosofia”,Cf. Vázquez (2007, p.126). Dito isto, entende-se que como essência
humana, o homem é um ser prático, produtor material da sua própria vida e do convívio em
sociedade. A práxis é, assim, o modo como os indivíduos se apropriam do mundo, ou seja, é a
humanização do mundo que se efetiva na medida em que ocorre a socialização da sociedade.
Assim:
Como filosofia da práxis, o marxismo é a consciência filosófica da atividade
humana que transforma o mundo. Como teoria, não apenas se acha
correlacionado com a práxis – revela seu fundamento, condições e objetivos
– como também tem plena consciência dessa relação e, por isso, é um guia da
ação. (VÁZQUEZ, 2007, p. 178).

Assim sendo, as contribuições da Filosofia Marxista são extremamente relevantes para


o desvelamento da realidade, haja vista que a contradição não deve ser negada, mas observada
de modo que se possa extrair o essencial dela. O conhecimento a partir do materialismo
histórico dialético parte das questões materiais, passando em seguida às elaborações do
pensamento e reflexões teóricas.
Abordar a filosofia em Marx para entender a categoria da práxis é um ponto
fundamental, pois sua concepção de ciência não se limita a interpretar os fatos, mas a
transformação da sociedade em busca da emancipação humana. Embora Marx tenha usado o
sistema hegeliano1 como ponto de partida, isto é, tenha incorporado aspectos como a dialética
e a objetividade do homem, é preciso deixar claro que Hegel orientava-se do ponto de vista da
economia política, Marx parte da perspectiva do trabalho, Cf. Mészáros (2008).
Em suas análises, para Marx, o sentido do trabalho escravo, seria o trabalho alienado
porque a finalidade da ação não é subjetiva, autônoma, livre, mas heterônoma, não livre. Dito
isto, o trabalho deveria, de acordo com os “Manuscritos de Paris” de 1844, ser a atividade
destinada a desenvolver a natureza interna do homem através da transformação da natureza
externa. Todavia, se o trabalho é alienado, como o modelo do escravo mostra, então a natureza
interna do homem se deteriora, se animaliza socialmente e permanece como mera
potencialidade impedida de vir à tona. Carone (2004) deixa claro que assim, desalienar o
trabalho é a finalidade primordial da práxis política, uma vez que a forma alienada de ver o
mundo, é irrefletida, reina na consciência comum da práxis e reforça ações sociais que

1
Marx utiliza a dialética Hegeliana como ponto de partida. Todavia, por considerá-lo idealista, opta pelo processo
inverso colocando o materialismo como base de sua dialética, enquanto Hegel concebe o mundo das ideias em sua
base dialética.
18

concorrem para a manutenção do sistema capitalista.


Na sociedade capitalista, o trabalho é uma atividade produtiva de valor econômico,
subordinada às exigências do processo de valorização crescente do valor, ou seja, do capital. À
vista disso, em “O Capital” Marx explica o trabalho não em um sentido abstrato e universal,
mas em um sentido histórico-social. Em suas análises revela que o trabalho está alienado a
valorização do capital, que recai não apenas sob o trabalhador, mas também sobre a classe
proletária dos meios de produção. Dessa maneira, a práxis marxista no sentido clássico,
significa uma atividade política com a finalidade de transformar radicalmente o “status quo”
social, supondo que este impede o desenvolvimento da natureza humana. Dito isto, as primeiras
contribuições de Marx no sentido filosófico de superação do que já havia sido produzido, está
nas “Teses sobre Feuerbach” e nos Manuscritos Econômicos Filosóficos, onde Marx aponta
que “os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes maneiras, mas o que importa
é transformá-lo”, Cf. Marx (2004, p. 120)
No Manifesto Comunista de 1848, Marx reconhece a classe trabalhadora como agente
de transformação, por carregar o potencial e o suporte para a revolução capitalista. O que fica
explícito, é que os donos dos meios de produção não suportam as ideias da revolução e tem
muito a perder, enquanto a pequena burguesia alimenta a ideologia de ascensão social e o
lúmpen que é a massa dos excluídos do processo de produção, politicamente muito vulnerável
está apenas lutando pela sua sobrevivência.
De certo modo, podemos dizer que aspectos dessa significação da práxis se mantém nos
dias de hoje, pois sempre que se fala em práxis, é para dizermos que mudanças profundas são
necessárias e que não é possível se mudar a cultura, as instituições políticas, jurídicas e sociais,
o Estado burguês e demais instâncias, sem se alterar o modo pelo qual foram estabelecidas as
relações sociais de produção. Carone (2004) nos faz compreender que a práxis, nesse sentido,
é uma atividade anti-capitalista ou contra o capitalismo, dirigida primordialmente para a
destruição da relação considerada “alienada” entre trabalho e capital, e por consequência, para
a mudança das instituições que mediam o econômico, no plano social, político, jurídico e
cultural.
Para Vásquez (2007), a práxis na perspectiva marxista é compreendida como
transformação objetiva do processo social, isso quer dizer que é transformação das relações
homem-natureza, portanto práxis produtiva, e homem-homem que significa práxis
revolucionária. Nesse aspecto, a práxis significa o elemento norteador do conhecimento, o
critério da verdade e a finalidade da teoria. É a ação que necessita de reflexão, do
autoquestionamento da teoria. Assim, é a teoria que remete a ação. Práxis e teoria são
19

interdependentes, mas necessárias. Nas palavras de Konder, essa necessidade não é “luxo”, mas
uma característica que diferencia a práxis das atividades meramente repetitivas, cegas e
mecânicas.
Assim, a relação entre teoria e prática é uma relação de unidade dialética, na qual a
teoria não se reduz à prática, mas sua complementaridade e sua efetivação se dão por meio da
ação humana. É nessa intervenção que consiste a práxis, a atividade “revolucionária”,
“subversiva, questionadora e inovadora, numa expressão extremamente sugestiva crítico-
prática”. Como coloca Konder (1992), Para Marx, era preciso superar duas unilateralidades
opostas a do (materialismo e a do idealismo) e pensar simultaneamente a atividade e a
corporeidade do sujeito, reconhecendo-lhe todo o poder material de intervir no mundo
Nesse tônica, são várias as formas de práxis no conjunto da totalidade, da materialidade
da produção e reprodução da vida. Entre elas estão à práxis produtiva, a práxis artística, a práxis
experimental, a práxis criadora e a práxis política
De súbito, é preciso deixar claro que toda práxis é atividade, mas nem toda atividade se
constitui em práxis. Atividade esta que por seu caráter de generalidade, não ultrapassam o nível
meramente natural, isto é, biológicas ou instintivas. Portanto, não podem ser consideradas como
especificidades humanas.
A práxis produtiva refere-se a prática produtiva que o homem estabelece com a natureza,
mediada pelo trabalho. A partir desse intercâmbio, resiste às matérias e as forças naturais,
criando assim um mundo de objetos úteis para atender às suas necessidades, uma vez que é o
um ser ontologicamente social e realiza as transformações determinadas por relações de
produção estabelecidas. Haja vista, a práxis produtiva é fundamental, uma vez que o homem
transforma a natureza e a si mesmo.
Entendida como uma articulação entre a práxis teórica e a práxis produtiva, a práxis
social, que no sentido restrito é a práxis política, é uma atividade prática consciente, na qual o
sujeito tem como objetivo a intervenção transformadora ou conservadora – no homem como
ser social, ou seja, nas relações sociais, econômicas e/ou políticas. É uma dimensão que pode
potencializar as transformações na sociedade, na batalha tanto das ideias quanto da prática, na
medida em que a luta realizada pelos grupos ou classes sociais está ligada à determinada
organização, como é o caso, por exemplo, de movimentos sociais, instituições e partidos. Esses
fatores elaboram repertórios políticos, sendo que a práxis política deve ter como pressuposto a
participação da sociedade.
Como uma forma de ação humana, a práxis política é uma forma reflexiva, no sentido
de que na política, o homem atua sobre si mesmo, sobre sua condição de existência. É o tipo de
20

práxis cujo produto é a modificação direta da sociedade concreta em que vivemos. Silva (2017)
esclarece que na época de Marx e também na nossa, esta ação é tida como uma ação social e
pode gerar frutos de ser coordenada e guiada, isto é, consciente. Assim, acaba justificando a
criação de partidos que lutam entre si, refletindo a luta de classes que encontramos na sociedade.
Nesta tônica, dialogar acerca da práxis política na interlocução com a luta por direitos deriva
do entendimento de que os movimentos sociais podem ser potencializadores da transformação
social. A práxis política tem a potencialidade de se tornar práxis revolucionária, capacidade de
transformar radicalmente a sociedade.

2.2 CONTRIBUIÇÕES DA FILOSOFIA DA PRÁXIS PARA UMA CULTURA


EMANCIPATÓRIA.

O debate teórico acerca da concepção de práxis desenvolvida a priori, por Marx, no


sentido de prática transformadora nos parece fundamental para a apreensão da organização e
da ação política dos movimentos sociais na contemporaneidade. Estes autores estão
dialeticamente conectados com a realidade, com o intento de construir uma nova sociabilidade,
um novo tipo de homem para além das relações capitalistas. Em Gramsci, a filosofia da práxis
apresenta um teor eminentemente político, em que os subalternos2 devem se apropriar da
filosofia com vistas à superação dos seus problemas sociais. Dito isto, a superação ocorre por
meio da formulação de novas perspectivas políticas, econômicas e sociais, tendo como objetivo
a criação de uma nova sociedade fruto de um trabalho coletivo:
A ligação inseparável entre “filosofia, política e economia” (Q 4, 472) faz com
que a filosofia não se dissolva na abstração ou no intimismo, a política não se
torne um cego agir imediatista e pontual, a economia não seja vista como um
poder separado, uma fatalidade incontrolável que incumbe sobre os destinos
do mundo. Tanto a filosofia quanto a política e a economia, entrelaçadas, para
Gramsci formam indivíduos conscientes de sua subjetividade social, fincados
no terreno concreto da história e das suas contradições (Q 4, 471) de vida com
as quais precisa aprender a interagir para compreender seus mecanismos de
poder e se organizar para operar transformações: “O filósofo, de fato, é e não
pode não ser o político, quer dizer, o homem ativo que modifica o ambiente,
entendido este como o conjunto das relações das quais cada um participa”
(GRAMSCI apud SEMERARO, 2005, p.100-101).

2
Para Galastri (2014) Os grupos subalternos são formados pelo conjunto das massas dominadas, mas sem possuir
agregação de classe. Os grupos subalternos não estão necessariamente unificados em classes sociais, pois, para
que isso ocorresse, deveriam possuir formações, agregados próprios que interviessem politicamente na relação de
forças sociais vigente em determinada formação social.[...] Em seu raciocínio, as classes dominadas formam-se,
enquanto classes, desde que frações dos grupos subalternos estejam organizadas com o objetivo de colocar em
xeque, combater, questionar ou ameaçar algum fundamento material das relações de classe vigentes.
21

Ao percorrer o embasamento teórico-prático de Marx acerca das Teses sobre Feuerbach,


Gramsci fundamentado no materialismo histórico-dialético intenta compreender a existência do
homem e da sociedade. Assim, de forma mais precisa, concebe o campo da política e das
diversas mediações existentes na vida humana. No seu texto a concepção dialética da história,
o autor tece significativas contribuições acerca do pensamento dialético, ressaltando a
importância do estudo da filosofia da práxis, sem perder de vista que análise não é válida, se
não houver ação transformadora.

A filosofia da práxis, portanto, não é “ato puro”, puro do pensamento,


esquema gnosiológico abstrato que cria” idealisticamente as coisas e os fatos,
mas “ato impuro”, atividade concreta, histórica, fundada em relações abertas,
dinâmicas, dialéticas do homem com a natureza, da vontade humana com as
estruturas econômicas, dos projetos políticos com as cristalizações culturais.
E embora, em Gramsci se encontrem elementos que tendem a reduzir a
natureza a correlato passivo da práxis humana transformadora”, não há
diminuição da realidade objetiva e de sua independência ontológica, mas há
uma ênfase no sentido de que a natureza, a matéria, o objeto, são significados
pela atividade humana. (SEMERARO, 2006, p.33).

Dessa maneira, Como Marx, Gramsci esclarece que a filosofia não é mera produção de
ideias nem privilégio de poucos, uma vez que, na história moderna, as massas populares
conseguiram abrir caminhos para expressar seu pensamento, se organizar politicamente e se
emancipar, estabelecendo uma profunda e indissociável “equação entre ‘filosofia e política’,
entre pensamento e ação, ou seja, uma filosofia da práxis”.
Em sua leitura da realidade traz reflexões que vieram a contribuir com uma filosofia
própria da classe proletária, posicionando-se abertamente em sintonia com as lutas das classes
subalternas. Nas considerações de Gohn (1997) ele foi o autor que mais contribuiu para as
análises e as dinâmicas das lutas e dos movimentos populares. Haja vista, que coloca como
ponto fundamental da filosofia da práxis a formação de sujeitos críticos, despertando a
consciência crítica em um processo de apoderar-se do “conhece a ti mesmo”, questionando os
problemas da sociedade, além de buscar intervir na processualidade histórica. Dessa maneira,
a filosofia da práxis não se consubstancia somente ao mundo do trabalho, mas ao campo da
ética e da formação política.
Nessa perspectiva, Gramsci talvez seja o primeiro marxista ocidental que manifesta um
autêntico interesse eminentemente político pela cultura popular, porque nela se manifestava
uma produção de significados e interpretações do mundo provenientes das classes subalternas",
Cf. Capuzzo (2009, p. 49). Ao tomar a realidade a partir de um concepção de totalidade
22

histórica, explicita os antagonismos e contradições presentes, ao mesmo tempo que fortalece a


construção de uma nova cultura emancipatória, contrária a alienação, fragmentação e a
manipulação. Dito isto, torna-se perceptível que para Gramsci, a nova concepção de filosofia
da práxis se pauta no terreno dos movimentos populares, visando um progresso intelectual de
massa.
Como interlocutor crítico e fecundo da realidade vivida pelos movimentos populares
brasileiros e latino-americanos, Gramsci coloca que não há política, transformação social,
democracia, revolução e unidade nacional sem o protagonismo do "espírito popular criativo",
Cf. Gramsci (1996, p.57). Dessa maneira, o estudo e o desenvolvimento da filosofia da práxis
se torna fundamental para a formação política em tempos hodiernos,e desvelamento das
contradições assentado no capitalismo eu seu mais alto grau, expresso em uma hegemonia e
uma ideologia fortalecida em favor da classe dominante. Assim, não podemos negar a
potencialidade transformadora que os sujeitos sociais podem assumir articulados por meio dos
movimentos sociais.

2.3 BREVE CONCEITUAÇÃO ACERCA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS

No âmbito acadêmico, a temática dos movimentos sociais aparece com uma diversidade
de definições e não muito raro, ausência de definições. É perceptível, que as dificuldades
remetem a problemas de ordem ideológica e teórico-metodológica.
Um breve resgate histórico sobre a terminologia, nos permite apreender que o conceito
de movimento social surge pela primeira vez no século XIX e tem a sua denominação pautada
para designar o movimento que envolvia a classe trabalhadora, na relação contraditória entre o
capital e o trabalho. Cunhado pela primeira vez por Lorenz Von Stein, no século XIX, por volta
de 1840, na Alemanha, o termo conclamava a necessidade de um ramo da ciência social que se
voltasse para o estudo dos movimentos sociais da época, como o movimento operário e o
socialismo, emergente, Cf. Silva (2001, p.15).
À vista disso, o debate dos movimentos sociais pelos autores que seguem a análise
marxista, é fundamentado nos movimentos enquanto resultado da contradição existente entre
capital e trabalho, fomentando a luta de classes.

Desde o marxismo, interpretava-se os movimentos sociais com expectativas e


reservas: por um lado, como fenômeno coletivo para impedir o colapso do
capitalismo e, por outro lado, como fenômeno de mobilização, tendo em vista
23

sua substituição pelo socialismo. Para os marxistas, os movimentos sociais são


expressões coletivas de descontentamento social e de transformação social.
(VIDAL, 1997 p. 30, apud SILVA, 2001, p.17)

Assim, os movimentos sociais decorrem do conflito entre as classes sociais, tendo uma
dimensão coletiva e não individual, que visam à transformação da sociedade por meio da
supressão do capitalismo. Este paradigma revolucionário teria como base a obra de Marx (1818-
1883) que considera as classes sociais os verdadeiros sujeitos de transformação social.
Ainda por volta do século XX, o conceito de movimentos sociais contemplava apenas a
organização e a ação dos trabalhadores em sindicatos. Com a progressiva delimitação desse
campo de estudo pelas Ciências Sociais, principalmente a partir da década de 1960, as
definições, embora parecessem imprecisas, assumiram uma consistência teórica,
principalmente na obra de Alain Touraine, para quem os movimentos sociais seriam o próprio
objeto da sociologia. Como aponta Poker e Arbarotti (2015), dada a impossibilidade
epistemológica de construir laboratórios devido à natureza do conhecimento que pretende
produzir, as Ciências Sociais encontra nos movimentos a oportunidade de observar sujeitos
históricos em ação, e por meio deles avaliar a realização de experiências acerca das condições
e condicionantes da vida social. Assim, expressam de maneira inconfundível a atuação dos
indivíduos:
Os movimentos são assim situações nas quais fenômenos próprios da vida
social manifestam-se de maneira clara para cientistas sociais; fenômenos estes
que não seriam vistos em ocasiões cotidianas, quais sejam os limites e
possibilidades de atuação de seres humanos sobre si mesmos e sobre a
sociedade em que vivem. (POKER E ARBAROTTI, 2015, p.17)

Nessa perspectiva, os movimentos sociais, ao mesmo tempo que pretendem imprimir


mudanças na sociedade, produzem conhecimentos, que são fontes de inovação e matrizes
geradoras de saberes à medida que oferecem às Ciências Humanas e Sociais as experiências
empíricas necessárias para comprovação ou refutação hipóteses e teorias.
Os movimentos sociais e sua respectiva conceituação, encontram-se apresentado sob
três possibilidades de manifestação. Por diversos estudiosos são apresentados e conceituados
nas formas de movimentos sociais, novos movimentos sociais e novíssimos movimentos
sociais.
Assim, como assinala Poker e Arbarotti (2015), no plano teórico conceitual, quando
alguém se refere aos movimentos sociais, está embebido da concepção de um movimento
provocado por fatores econômicos, cujas demandas são endereçadas ao Estado, à quem cabe
responder às demandas do movimento, seja por meio de ações localizadas ou por meio da
24

execução de políticas públicas. Todavia, é necessário lembrar que se por um lado a abordagem
marxista dos movimentos sociais, cuja matriz situa-se no campo capital trabalho, priviliegia o
processo de luta histórica da classa subalterna, por outro lado, isto não significa limitar-se a
análise do movimento operário, ou apenas dialogar a partir de determinações econômicas. É
preciso estar atento, pois a opressão-dominação capitalista, perpassa várias dimensões do ser
social. Como coloca Guimarães e Guerra (2013) o grande diferencial do paradigma marxista
dos movimentos sociais consiste em apreender, para além dos aspectos imediatos, a essência
dos fenomenos e a relação contraditória entre essência e aparencia. Nessa teoria, há também a
preocupação frequente de subsidiar a ação política destes movimentos e assim contribuir para
a práxis revolucionária
Assim, entender o carater histórico da organização política dos movimentos sociais,
requer também enteder o desenvolvimento das forças produtivas inscritas na particularidade de
cada formação social em determinados períodos, que produzem: necessidades, determinações
e desafios. Isto, torna-se fundamental para apreender o real em sua contraditoriedade e na
relação singulariade—universalidade-particularidade.

Sob outro ponto de vista, a expressão novos movimentos sociais designa os movimentos
nos quais os sujeitos se constituem e são mobilizados por força de fatores identitários. A teoria
dos “novos movimentos sociais” questiona a possibilidade da revolução colocada pelo
marxismo. Busca mudanças culturais ao invés de apontar mudanças nas sociabilidade do
capital. Em seus estudos, Gohn (2011) pontua os “novos movimentos sociais”:

[...] foi expressão cunhada na Europa, nas análises de Clauss Offe, Touraine e
Melucci e diz respeito aos movimentos sociais ecológicos, das mulheres, pela
paz e etc. Os novos movimentos se contrapõem aos velhos movimentos
sociais, em suas práticas e objetivos, ou seja, se contrapõem ao movimento
operário-sindical,organizado a partir do mundo do trabalho. (GOHN, 2011,
p.44).

Assim, a discussão é justificada enquanto movimentos que vão aquém do conflito de


classes, decorrendo da maneira pela qual os sujeitos se identificam e se reconhecem mediante
referências simbólicas, tradicionais ou não, que sinalizam visões de mundo e modos de vida
concebidos como ideais por pessoas determinadas. Por isto, as demandas e as estratégias dos
novos movimentos sociais seriam mais extensas, plásticas e complexas que as dos movimentos
sociais. À vista disso, Montaño; Duriguetto (2010) afirmam que os chamados “novos
movimentos sociais”, isto é, os movimentos sociais contemporâneos surgem principalmente em
25

meados do século XX possuem como objetivo complementar as lutas de classes do movimento


clássico. Na América Latina, os novos movimentos sociais emergiram a partir da década de 1960
em um cenário marcado por ditaduras militares e processos revolucionários, como uma alternativa aos
movimentos classistas tradicionais.
Já os novíssimos movimentos sociais são definidos como aqueles movimentos
organizados em torno de demandas econômicas ou referências identitárias. Poker e Arbarotti
(2015), esclarecem que a caracterização como novíssimos consiste no fato de que as demandas
são dirigidas às organizações que compõe o chamado sistema internacional, ao invés de serem
elas dirigidas a um Estado específico, como ocorre com movimentos sociais e os novos
movimentos sociais. Um aspecto dos novíssimos movimentos sociais se refere à possibilidade
de eles serem constituídos por sujeitos vinculados a diferentes matrizes socioculturais, de
diversas nacionalidades e países, que criaram e criam redes entre si para atuação.
Com isso, os “novos e os novíssimos” movimentos sociais” são analisados como
distantes e apartados da contradição capital trabalho, pois afirmam a perda da centralidade do
conflito de classe no processo de organização e de ação política dos movimentos sociais. Com
parte de premissas pós-modernas, a ênfase está nas relações culturais, na identidade e na
solidariedade entre as pessoas. Em uma total negação das bases teóricas clássicas do marxismo,
trata-se de uma teoria que procura explicar a ação coletiva em uma pespectiva subjetiva dos
fenomênos.
Assim, tendo em conta a importância que os movimentos sociais, em geral, tem na
condição de objeto, variado e extenso, existe a necessidade de esclarecer que, apesar do
desenvolvimento que o conceito teve nos últimos anos, não há um consenso ainda hoje. O
contingente de conhecimentos que já foram produzidos, tanto na forma de propostas
metodológicas, quanto na forma de estudos de casos empíricos são analisados cuidadosamente
para que se tenha possibilidades de interpretação dos movimentos sociais, seja em obras
nacionais ou internacionais de referência. Diante de tudo que foi explanado, percebemos que a
presença dos movimentos sociais é uma constante política. Ademais, no novo milênio diversos
autores pressionam por processos de mudanças social e reinventam formas de fazer política,
eles se transformam, realizam deslocamentos em suas identidades, além de incorporarem outras
dimensões do pensar e agir social para manter-se em luta.
O trabalho de conceituação tem início com as análises feita por Alain Touraine (1989),
na qual ele define os movimentos sociais como conflitos de classes contra a ordem, cuja
existência tende a generalizar-se na sociedade pós-industrial, porque ele faz com que
desapareçam o sagrado e as tradições. Instituições cuja função é a de transmitir do passado para
26

o presente as regras de organização social e cultural que fundam a coletividade. Na perspectiva


do autor, as instituições uma vez extintas, generalizam-se os conflitos, o que “enfraquece,
progressivamente e frequentemente de maneira espetacular, o papel da intelligentsia, definida
como o conjunto das pessoas instruídas que servem de mediadoras entre as categorias excluídas
do sistema político e este”, Cf. Touraine (1989, p.7). Desse modo, a essência do movimento
seria o conflito, que é associado pelo autor como um comportamento de não conformidade
tolerado na sociedade pós industrial pelas características de um sistema político aberto. Em
contraposição, quando há um fechamento do sistema político, “em caso de despotismo, por
exemplo, os movimentos sociais se dispersam e acabam por se confundir com comportamentos
marginais de desvio, Cf. Touraine (1989, p.15)
À vista disso, o autor atribui os “conflitos” a sociedade pós-industrial, porque ela
suprime das pessoas o recurso a essência, tornando a sociedade um campo de conflito que
podem ou não ser negociados e limitados, conforme o estado da coletividade política
considerada e de suas instituições, Cf. Touraine (1989).
Como estudioso também da temática, as análises de Melucci (1989), são um pouco
diferentes. Ao questionar o conceito de movimentos sociais por considerá-lo reducionista,
emprega-o preferencialmente como “sistemas de ação que operam num campo sistêmico de
possibilidades e limites”. O autor elenca que esta é a melhor forma de estudar a questão dos
movimentos sociais, ao afirmar que o funcionalismo e o marxismo não conseguiram responder
satisfatoriamente as interrogações complexas da temática, como por exemplo, explicar a
passagem das condições sociais para a ação coletiva.
Ao tentar oferecer uma definição para movimentos sociais, este autor considera-os como
uma forma de conflito não patológico, mas que afeta o modo de produção. Melucci (1989)
descarta qualquer ideia associada aos movimentos sociais como ações motivadas por uma
orientação econômica. Em suas palavras, “eles também estão buscando solidariedade e
identidade, que diferentemente de outros bens, não são mensuráveis e não podem ser
calculados.” Desse modo, formula o seu conceito:

Eu defino analiticamente um movimento social como uma forma de ação


coletiva (a) baseada na solidariedade, (b) desenvolvendo um conflito, (c)
rompendo os limites do sistema em que ocorre a ação. Estas dimensões
permitem que os movimentos sociais sejam separados de outros fenômenos
coletivos (delinquência, reivindicações organizadas, comportamento
agregado de massa) que são, com muita frequência, empiricamente associados
com ‹movimentos› e ‹protesto. (MELUCCI 1989, p. 57)
27

São diversas as conceituações sobre os movimentos sociais, nas muitas obras produzidas
por Habermas (1981, 1984, 1987), encontra-se também uma conceituação e explicação para a
ocorrência dos movimentos sociais. Fundamentado em uma sociologia política Weberiana,
Habermas demonstra que os movimentos sociais decorreriam das transformações da sociedade
provocadas pela modernidade, o que implica a conclusão de que eles, os movimentos sociais,
somente são possíveis na sociedade moderna, e tem origem nas lutas sociais motivadas por
interesses econômicos. Assim como Gonh, autores como Habermas, Claus Offe, Bobbio e
Adam Pzreworski influenciaram as novas análises sobre os movimentos sociais, destacando a
questão do agir comunicativo presente nas ações dos movimentos e suas possibilidades de
geração de novas formas de relações e de produção, contribuindo para resolver problemas em
áreas econômicas.
Outra autora que conceitua movimento social é Scherer-Warren, que afirma que o
movimento social possui a sua base fundamentada na organização de grupos em torno de
libertação, ou seja, a busca da superação de formas de opressão, possibilitando uma sociedade
diferente. Aqui a expressão da práxis é concebida por Sherer-Warren (1984) como “toda ação
para transformação do social, desde que esta ação contenha um certo grau de consciência
crítica.” Neste sentido, a forma de reagir à opressão pode ser tanto de forma ativa, quanto de
forma passiva. Além disso, a autora enfatiza que com o desenvolvimento do debate sobre o
movimento social, o mesmo deixou de fundamentar-se apenas no conflito de classes e passou
a incorporar uma visão de mundo mais heterogênea na busca de liberdades sociais e individuais.
Corroborando com esse entendimento e no ímpeto de construir um entendimento sobre
movimentos sociais, Gohn 2011) elenca que são “ações sociais coletivas de caráter social-
político e cultural que viabilizam formas distintas de a população se organizar e expressar suas
demandas”. A autora esclarece que na ação concreta, essas formas adotam diferentes estratégias
que variam de simples denúncia, passando pela pressão direta (mobilizações, marchas,
concentrações, passeatas, distúrbios a ordem estabelecida até os atos de desobediência civil
dentre outras. Para a autora, a caracterização de movimentos sociais:

[...] possuem identidade, têm opositor e articulam ou fundamentam-se em um


projeto de vida e de sociedade. Historicamente, observa-se que têm
contribuído para organizar e conscientizar a sociedade; apresentam conjuntos
de demandas via práticas de pressão/mobilização; têm certa continuidade e
permanência. Não são só reativos, movidos apenas pelas necessidades (fome
ou qualquer forma de opressão); podem surgir e desenvolver-se também a
partir de uma reflexão sobre sua própria experiência. Na atualidade,
apresentam um ideário civilizatório que coloca como horizonte a construção
de uma sociedade democrática. (GOHN, 2011, p. 336)
28

Podemos inferir que uma das premissas fundamentais a respeito dos movimentos sociais
é que não configuram um processo isolado, destituído da processualidade histórica. Gohn
(2011) deixa claro que os movimentos sociais sempre existiram e crer que sempre existirão, um
vez que não são uma aglutinação de pessoas por força-tarefa, tendo como fundamento a ordem
numérica, mas representam forças sociais canalizadas, como campo de atividades e
experimentação social, fomentadoras de criatividade e inovações socioculturais. Assim, a
autora concorda com as premissas de Touraine (1989), em que elencava os movimentos sociais
como sendo o coração, o pulsar da vida em sociedade, e com isso, expressam energias de
resistência ao velho que oprime ou de construção do novo que liberta.
29

3. MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL: UM PROCESSO DE LUTA E


RESISTÊNCIA

3.1 TRAJETÓRIA SÓCIO HISTÓRICA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL

Os movimentos sociais são fenômenos históricos, resultado de lutas sociais que vão
introduzindo mudanças na sociedade, seja para a transformação ou para manutenção e
reprodução do conservadorismo. No processo histórico da luta, a organização da classe
trabalhadora em sindicatos, partidos político e movimentos sociais tem sido de grande
relevância, pois através da práxis política, os trabalhadores passam a problematizar as precárias
condições econômicas e sociais. Para Viola (2008), a grande contribuição desses movimentos
para a sociedade brasileira tem sido a formação de uma nova cultura que se manifesta em novas
formas de organização social e de participação política, para além do tradicional ambiente
institucional.
Como já vimos, várias são as concepções adotadas para explicar os Movimentos Sociais,
nesse trabalho comungamos com o conceito formulado por Montaño e Duriguetto (2011), ao
compreender que o movimento social é perpassado por diversas determinações, e
principalmente conformado pelos próprios sujeitos portadores de certa
identidade/necessidade/reivindicação e pertencimento de classe. Estes se mobilizam por
respostas e alternativas para enfrentar as múltiplas expressões da questão social. Assim, como
esclarece Almeida (2015), os movimentos sociais são formados por um coletivo com identidade
comum, que levantam uma bandeira de luta e disputam seus projetos na sociedade, portanto,
são imbricados por uma ideologia com direção política e pertencimento de classe.
Por essa razão, ao denunciar as contradições inerentes ao sistema capitalista, os
movimentos sociais apresentam-se como um importante espaço político coletivo. Dessa
maneira, a luta dos movimentos sociais é determinada pelo contexto histórico considerando as
relações de produção e reprodução e o processo de organização da classe trabalhadora que
condicionam as relações sociais. Lutando contra a apropriação privada da riqueza socialmente
produzida, expressam não somente os interesses dos segmentos da classe trabalhadora, como
também expressam suas diversas formas de resistência. Por serem marcados por determinadas
conjunturas históricas, as lutas sofrem uma não linearidade, em decorrência dos momentos de
efervescência e de inflexão, porém é preciso deixar claro que em ambos os momentos a latência
do potencial combativo fundamenta as estratégias de luta.
Gohn (2014) define como características de um movimento social: possuir liderança,
30

base, demanda, opositores e antagonistas, conflitos sociais, um projeto sociopolítico, entre


outros. Sherer- Warren (2006) concorda com a autora ao definir em sentido amplo os
movimentos sociais em torno de uma identificação de sujeitos coletivos, que possuem
adversários e opositores, em torno de um projeto social.
As autoras Duriguetto, Souza e Silva (2009) vão dizer que, no cenário brasileiro, assim
como em todos os países que tem como base a formação capitalista, foram os movimentos
sociais que tornaram a questão social como um problema público e político, e por esse motivo,
passivo de intervenção pelo Estado:

É fato conhecido que historicamente a questão social tem haver com a


emergência da classe operária e seu ingresso no cenário político, por meio das
lutas desencadeadas em prol dos direitos atinentes ao trabalho, exigindo o seu
reconhecimento como classe pelo bloco do poder, e, em especial pelo Estado.
Foram as lutas sociais que romperam com o domínio privado nas relações
entre capital e trabalho, extrapolando a questão social para a esfera pública,
exigindo a interferência do Estado para o reconhecimento e a legalização de
direitos e deveres dos sujeitos sociais envolvidos. (IAMAMOTO, 2001, p.
17)

À vista disso, Arcary (2015) nos leva a reflexão ao dizer que a organização da classe
trabalhadora é afetada pela articulação de três elementos próprios da condição de existência
dessa classe: o fato do proletariado ser economicamente explorado, socialmente oprimido e
politicamente dominado, tornando difícil disputar um projeto hegemônico. É a partir da
observância do movimento do contraditório, que se é dada a possibilidade para o processo
organizativo revolucionário da luta de classe e o alcance de inúmeras conquistas.
Para a análise sobre os Movimentos Sociais na perspectiva aqui trabalhada, dialogamos
também com Guimarães (2011) quando compreendemos os Movimentos Sociais como um dos
sujeitos coletivos presentes na cena política, apresentando forte potencial de mobilização e
articulação da classe trabalhadora, na luta pela hegemonia de um projeto societário
anticapitalista, afinal, a ação revolucionária está nas mãos de sujeitos revolucionários.
Na conjuntura particular do Estado brasileiro, onde se expressam contradições, o
cenário propício para a ascensão/irrupção dos movimentos sociais, como coletivos organizados
para luta de classes, se deu no momento que o país tinha a frente de sua direção os militares no
comando. Como nos alerta Mario, Trindade e Tavares (2018) mesmo sob os riscos e
incompletudes inerentes às classificações de ordem cronológica, é possível identificar três
momentos: a década de 1980, a década de 1990 e os anos 2000.
No primeiro momento é preciso rememorar o contexto anterior ao alvorecer da Nova
31

República. Sob o comando dos militares, ao assegurar os interesses do capital em sua fase
monopolista, o país reforçou ainda mais sua dependência e subordinação presentes desde o
início da sua formação econômica, política e social em relação aos países desenvolvidos.
Observa-se um intenso processo de modificações no cenário urbano e rural do país. Fatores
como a intensa industrialização, a urbanização e o aumento das migrações fez surgir “novos
personagens”, contribuindo com toda a dinâmica das organizações, movimentos, protestos,
novo sindicalismo e efervescência da sociedade civil. Ademais conferindo destaque a luta dos
estudantes, da classe operária em seus sindicatos e as pastorais e comunidades eclesiais de base
(CEBs).
Nesse cenário, a população brasileira se manteve em resistência e luta contra toda forma
de opressão e violação de direitos: os direitos econômicos e sociais de grande parcela da
sociedade, os direitos políticos, os direitos de organização e de expressão, o direito à
privacidade, os direitos jurídicos de defesa das pessoas entre outros. Foi a partir desse momento
que as lutas pelos direitos humanos3 passaram a ganhar a conotação que temos hoje.
Dessa forma, houve uma maior socialização da esfera política e um forte expansão dos
movimentos sociais, principalmente no processo de transição para a democracia, onde os vários
sujeitos entram em cena canalizando suas reivindicações para a esfera pública, Cf. Gohn (2011,
p. 23) coloca o quanto é inegável “que os movimentos sociais dos anos 1970/1980, no Brasil,
contribuíram decisivamente, via demandas e pressões organizadas, para a conquista de vários
direitos sociais, que foram inscritos em leis na nova Constituição Federal de 1988”. O
movimento de oposição e contestação ao regime militar tinha um propósito claro: a defesa dos
valores do Estado democrático e crítica a toda forma de autoritarismo estatal.
Almeida (2015) coloca que esse cenário de forte tensionamento e organização política
vai contribuir com a expressão de diferentes sujeitos políticos. Nesse período cada movimento
social foi forjando sua identidade, suas formas de atuação, pautas de reinvindicações, valores,
seus discursos que o caracterizam e o diferenciam de outros. Foram grupos que constituíram
uma nova forma de fazer política e politizaram novos temas ainda não discutidos e pensados
como constituintes do campo político. Nesse processo, ampliam o sentido e o espaço de se fazer
política”.(Evangelista, 2004, p.35). Medeiros (2015) ainda afirma que nesse período a

3
A temática os Direitos Humanos ganhou espaço de destaque no período da ditadura militar. A repressão permitiu
que fosse conquistado um espaço mesmo nos órgãos de impressa conservadores. Dessa forma, no plano
internacional, comissões compostas por juristas, membros da igreja católica, do meio universitário, dos
movimentos sociais foram incorporando os Direitos Humanos no campo das lutas políticas, dos debates e
principalmente na disputa pelo espaço hegemônico. Ao longo do 3 capitulo deste trabalho, ficará perceptível que
a questão dos Direitos Humanos tem acompanhado os movimentos sociais em busca de democratização da
sociedade, proposto a construção de uma cultura de participação capaz de criar um novo momento histórico.
32

sociedade civil4 organizada por meio dos movimentos sociais e populares, buscará o espaço
para influenciar nas decisões políticas e na construção da Constituinte de 1988. Assim, os
movimentos sociais refletem mais do que reações as privações materiais, pois vislumbram o
potencial político que pode ser construído a partir da criação de espaços públicos de discussão
que aumentam a capacidade de controlar o poder institucionalizado.
Com isso, a transição política para o Estado Democrático que ganhou força na década
de 1980 culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Assim, o processo
constituinte ficou marcado pela sua inovadora abertura à ampla participação, motivada pelos
anseios de redemocratização no país.

Nesse período houve um aumento considerável do número de ONGs e do


terceiro setor de responsabilidade social. As associações de bairro,
representantes de periferias e de moradores de classe média, também em
expansão, reivindicam a concessão de direitos sociais [...] As duas grandes
mobilizações nacionais deste período foram o Movimento pelas Diretas Já
(1983-1984) e a mobilização da sociedade civil organizada [...] para a inclusão
de novos direitos na Constituição brasileira, a qual veio a ser denominada de
“Constituição Cidadã” (SCHERER-WARREN, 2008, p.11-12)

Porém, como essa relação é complexa e determinada por condições objetivas, quando o
país adota o modelo econômico neoliberal, na década de 1990, há um rebatimento direto na
força e na organização dos movimentos sociais. Assim, ocorre o enfraquecimento dos
movimentos populares de resistência política, confirmado os reflexos do projeto neoliberal. “Se
a conjuntura é favorável à mobilização popular e a expansão das lutas, a estratégia pode ser
mais ofensiva, se o momento se apresenta desfavorável é marcado por uma retração de forças
populares a estratégia é defensiva, Cf. Faleiros (1985, p.82).

Como tudo nesse sistema capitalista, os movimentos passam a sofrer mudanças na sua
direção. O surgimento dos chamados “novos movimentos sociais”, como explicado ao longo
deste trabalho, entrelaça os princípios da fragmentação, apresentando um distanciamento da
luta de classes, própria dos movimentos sociais combativos, ou dos “velhos” movimentos.
Como ressalta Gohn (1997) os novos movimentos sociais se vinculam a uma condição de
interesses específicos e não mais de coletividade, o que vem a deturpar a questão política e a
militância, que até então, eram questões centrais dos movimentos sociais combativos.

4
Para Correia (2011), a sociedade civil serve-se dos movimentos sociais para conquistar direitos negados ou não
disponibilizados pelo Estado. É nesse contexto de carências, de exclusão e necessidade sociais que se situam as
práticas cotidianas de movimentos sociais, que ainda com certas limitações, são meios potencializadores de novas
formas de se fazer política, de participação social, de construção do processo democrático e de transformação
social.
33

Assim, submetidos à lógica do mercado em um contexto de precarização nas relações


de trabalho, de índices elevados de desemprego, de perdas de direitos conquistados, de
privatizações dos setores públicos, os Movimentos Sociais sofrem processos de rebatimento,
marcado por uma da fragmentação nas lutas, com a predominância de interesses coorporativos.
Nesse sentido, as mudanças na reestruturação produtiva implicou um redirecionamento do
sentido da luta, deslocando a discussão da dimensão infraestrutura para a dimensão
extraestrutural.
Uma breve ressalva sobre os anos 2000 nos permite identificar que foram de grande
expectativa5. Dessa maneira, com forte apoio das camadas populares e dos Movimentos Sociais,
Lula, como é reconhecido, ganha o pleito eleitoral para Presidência da República em 2002, o
que levou os Movimentos Sociais e partidos de esquerda a acreditarem em um novo cenário na
relação entre Estado e Movimentos Sociais, com vistas à efetivação de conquistas
historicamente pautadas pelas organizações populares.
Como assinala Almeida (2015) na realidade concreta, essas mudanças tão almejadas
pelos trabalhadores não aconteceram. Ao contrário, deu-se continuidade a ampliação da política
neoliberal iniciada na década de 1990. Nesse momento o governo Lula seguiu a agenda de
contrarreformas implementadas ainda em governos neoliberais anteriores, embora tenha havido
alguns avanços na área social, com mais investimentos nas políticas sociais. Todavia, não houve
mudanças estruturais que possibilitassem a diminuição da desigualdade social, tão pouco o
Estado deixa de perder seu caráter de classe:

Constatando que o Estado brasileiro percorreu esse caminho, podemos


entender que ele não perdeu seu caráter de classe, continua como sempre foi,
um Estado que garante os interesses de classe da classe economicamente
dominante, apenas somando aos instrumentos de caráter mais diretamente
coercitivo, outros que visam a formação do consenso. O petismo governista
parece acreditar que a modernização do Estado o desloca para algo acima dos
conflitos de classe, tornando possível que seu caráter seja determinado pela
correlação de forças. Dominado por forças conservadoras, ele é burguês; numa
correlação de forças de um governo petista em aliança com setores da
burguesia, ele é um Estado “democrático”; caso a correlação de forças
apresente-se a favor das forças populares, torna-se “democrático-popular” e
assim por diante (IASI, 2014, p. 66)

À vista disso, os Movimentos Sociais nesse contexto, apresenta uma tendência a


passividade na sua relação com o Estado. A política adotada pelo governo petista, de combate
à pobreza, sem promover grandes transformações estruturais ao manter a ordem a favor do

5
Ano de disputa eleitoral, que apresentava o nome do ex-operário Luiz Inácio Lula da Silva, sindicalista, filiado
ao Partido dos Trabalhadores.
34

capital, acaba influenciando no processo de “esfriamento” e cooptação, além do aparente


diálogo sem nenhuma conquista efetiva. Assim, podemos inferir que não se constata um forte
tensionamento na relação Movimentos Sociais/Estado. Entretanto, o governo agiu para inibir e
colocar os trabalhadores na defensiva, ao lançar um conjunto de regulações que contribuem
para criminalizar os movimentos sociais e reforçar a lógica punitiva do Estado burguês,
aprofundando as estratégias de apassivamento na direção de fortalecer a contrarrevolução
preventiva, Cf. Fernandes (2005). Em suma, a criminalização dos movimentos sociais não
perdeu força no governo Lula, pois a medida que o governo do Partido dos Trabalhadores (PT),
optou por uma grande coalizão, permitiu que os setores conservadores retornassem as suas
velhas práticas: de criminalizar as lutas sociais e suas lideranças.
Ainda no cenário atual, podemos dizer que a força do movimento social brasileiro
provoca o ataque da direita às lutas sociais, pois ao atingir os setores privilegiados, questiona
as profundas injustiças, desigualdades, opressão e propõe medidas concretas para tonar possível
a socialicação da riqueza produzida. Nas palavras de Sanson (2008), o caráter anticapitalista e
anti-imperialista dos movimentos desperta a ira dos conservadores.

3.2 DESIGUALDADES E ANTAGONISMOS DE CLASSE: A LUTA DO MOVIMENTO


NACIONAL DA POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA

A população em situação de rua é um fenômeno que se desdobra em cada país ou região


de acordo com o seu contexto histórico, social e cultural. No Brasil, os agravantes da questão
social são expressos nos dispares resultados entre os indicadores econômicos e sociais, um
dualismo que comprova a existência de dois “Brasis”. Assim, analisar a população em situação
de rua através do método histórico dialético, significa considerar que os determinantes políticos,
econômicos e sociais que os condicionam devem ser apreendidos historicamente, em sua
totalidade, no movimento concreto da realidade.
Dessa maneira, o fenômeno da população em situação de rua pode ser compreendido
como uma das expressões mais perversas da questão social, entendida como a organização e
reivindicação da classe trabalhadora, denunciando as suas condições de exploração e miséria,
cujo fundamento se constitui na contradição capital/trabalho. De acordo com Iamamoto (2005)
a questão social é a expressão das desigualdades oriundas das relações capitalistas
desenvolvidas a partir da relação capital trabalho. Assim, já é uma relação histórica entre a
população em situação de rua enquanto expressão da questão social no modo de produção
capitalista e o desenvolvimento das forças produtivas do trabalho social, desenvolvimento este
35

que se expressa na superpopulação relativa.


No Brasil, os ajustes no mundo do trabalho, a financeirização do capital e a redefinição
do papel do Estado são a tríade do modelo neoliberal que impacta diretamente na vida da classe
trabalhadora. Silva (2009) elenca que ocorre o aumento do desemprego, a precarização nas
condições e relações de trabalho, acentuando o que o Marx denomina superpopulação relativa
ou exército industrial de reserva, expressando o acirramento das desigualdades sociais e a
elevação dos níveis de pobreza da classe trabalhadora. É nesse contexto das mudanças ocorridas
no desenvolvimento do Capitalismo que o fenômeno da população em situação de rua vai se
acentuar. Segundo o último estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(Ipea) a partir de dados disponibilizados por 1.924 municípios via Censo do Sistema Único de
Assistência Social (Censo Suas), no ano de 2016, a estimativa foi de 102 mil pessoas em
situação de rua no ano de 2016.
Conquanto, para que possamos analisar posteriormente o surgimento do movimento, é
preciso entendermos a configuração de tal grupo populacional, que pode ser compreendido
como:
Um grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza
extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência
de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as
áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária
ou permanente, bem como a s unidades de acolhimento para pernoite
temporária ou como moradia provisória (BRASIL.2009, p.8).

A população de rua, em geral, possui ocupações temporárias, variadas e irregulares.


Muitas vezes em condições de insalubridade e de risco. São mulheres, crianças e idosos que
ocupam as ruas deste país que vêm sofrendo graves violações de direitos. Dentre elas, as
principais são: chacinas e extermínios, espancamentos, retirada dos pertences, jatos de água,
coação, detenção por vadiagem, impedimento de acessar serviços e espaços públicos e
criminalização por suas lutas. Viola-se o principal dos direitos humanos: o direito à vida, dado
os números alarmantes de homicídios que vitimizam as pessoas que vivem nas ruas.
Se por um lado, a constituição em seu artigo 5° diz que “somos todos iguais perante a
lei, sem distinção de qualquer natureza, não podendo ser violado o direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade”, a realidade comprova o inverso frente o histórico de
violações de direitos vivenciados por essa população. Desse modo, a democracia e a cidadania
só existem de verdade se houver o acesso e garantia dos direitos fundamentais à existência
humana. Todavia, como coloca Almeida et al (2014) não estamos falando do direito instituído
na lógica do Estado liberal, dos direitos relacionados à sustentação da classe burguesa, mas
36

referindo-se aos direitos sociais, frutos da luta e da conquista da classe trabalhadora. O direito
é contraditório, pois, ao mesmo tempo em que serve como mecanismo de manutenção do
Capitalismo, é também conquista da classe trabalhadora.
As pessoas em situação de rua sofrem cotidianamente as consequências de um sistema
econômico opressor, que necessita de um exército de miseráveis para a manutenção, produzindo
e reproduzindo a lógica do individualismo e da culpabilização dos sujeitos pelas suas condições
degradantes de vida. Estão expostas às mais diversas formas de violência, travando uma luta
constante pela sobrevivência. Assim, esse fator dificulta, e muitas vezes, impede a busca por
estratégias de resistência, pois é preciso analisar esse fenômeno em suas condições objetivas da
realidade e em suas particularidades, pois o homem tem necessidades emergenciais como
comer, beber, ter um teto, antes de fazer política.

A expressão população em situação de rua é usada [...] para designar uma


situação ou condição social que não resulta apenas de fatores subjetivos
vinculados à sociedade e à condição humana, como é comumente considerada,
mas é uma situação ou condição social produzida pela sociedade capitalista,
no processo de acumulação do capital (ALMEIDA et al, 2015, p. 157 apud
SILVA, 200 9, p.29)

Os levantamentos de dados realizados por estudiosos da temática revelam que, as


pessoas em situação de rua apresentam em suas vidas histórias de desemprego e trabalhos
instáveis e precários, como os da construção civil, ou atividades específicas de rua, como
guardadores de carro e catadores de materiais recicláveis. Fator agravante é a cultura e a
ideologia reproduzida pela classe dominante, que multiplica essa divisão de pessoas acentuando
a desigualdade. É o preconceito que reforça a imagem negativa de quem vive na rua. Os meios
de comunicação disseminam o termo “mendigo” e reforçam a segregação, a tutela, o
monitoramento por ser considerada uma população perigosa e danosa, que para manter a ordem
civilizatória precisa enquadrá-las em práticas higienizadoras.
É um estigma que rotula a todos como incapazes e desqualificados, acentuando a
criminalização da pobreza. Diante disso, os sujeitos continuam sendo tratados como indivíduos
que estão invalidados pela conjuntura econômica e social, gerando neles a falta de
pertencimento à sociedade e o reforço das condições de vulnerabilidade em que os mesmos se
encontram.
Como nos esclarece Almeida et al (2014) que embora o fenômeno da população em
situação de rua esteja intimamente relacionado à precarização no mundo do trabalho, pesquisas
realizadas indicam que tal fenômeno é resultante de múltiplas determinações. É o caso da
37

Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua, realizada no ano de 2008 pelo
anterior Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), mostrando que os
principais motivos que levam as pessoas estarem em situação de rua estão vinculados ao uso de
álcool e outras drogas, desemprego e vínculos familiares fragilizados ou interrompidos
(Brasil,2008).
Diante de tudo que foi explanado anteriormente, a história nos mostra que somente com
a organização e mobilização da classe trabalhadora é possível a reivindicação na luta pela
consolidação de direitos. O objetivo é retirar o véu da invisibilidade que recai sob essas pessoas,
é descontruir preconceitos e enaltecer valores sociais através da luta, combatendo as diversas
violações de diretos almejando a construção efetivação de políticas públicas que garantam
condições dignas de vida, direito de todo cidadão.
É sob esse contexto, que o Brasil registra, a partir do final da década de 1970, o
surgimento de diversos movimentos sociais inseridos nas lutas pela ampliação dos direitos de
cidadania e da participação política. Já nos anos 1980, a abertura política do país permite
também que despontem as primeiras diligências de organização da população em situação de
rua (PSR) – recebendo, depois, o apoio de organizações internacionais, estudiosos, especialistas
e movimentos religiosos.
Todavia, como assinala Almeida (2015), ao fazermos um resgate histórico é possível
constatarmos que as primeiras iniciativas de trabalhos voltados para a população em situação
de rua, surgiram no início dos anos de 1950, em São Paulo, através das irmãs “Oblatas de São
Bento”, sob o nome de Organização do Auxílio Fraterno, inicialmente com trabalhos
institucionais e posteriormente, na década de 1970, com trabalhos realizados nas ruas da cidade.
Ainda na década de 1970 é criada a Pastoral do Povo da Rua, até os anos 2000 podemos dizer
que as ações voltadas para a população em situação eram majoritariamente realizadas por
entidades religiosas, com algumas iniciativas pontuais do governo.
É entre o fim dos anos 19906e início dos anos 2000, que um grande contingente de
pessoas que vivem em situação de rua promoveram mobilizações com o objetivo de dar
visibilidade à sociedade e aos gestores, as péssimas condições de vida nas ruas. Assim, parcerias
foram se firmando e o debate, através de fóruns, de manifestações, e da participação nos
conselhos de Assistência, foram se ampliando.

6
De acordo com Almeida (2015), nesse período se registra as primeiras iniciativas do processo de
organização política, uma parte da população em situação rua, que trabalhava como catadores de
materiais recicláveis formaram as primeiras associações e cooperativas de catadores. Posteriormente se
organizaram no Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis.
38

Em agosto de 2004, as diversas organizações sociais envolvidas com a questão da PSR,


em meio à comoção causada pela chacina ocorrida na praça da Sé na cidade de São Paulo,
vitimizando 15 moradores de ruas, nos quais 7 foram mortos e 8 ficaram gravemente feridos,
passaram a perceber a necessidade de se organizarem como movimento social e a exigir sua
participação nos conselhos de assistência social e na elaboração de uma política nacional para
a população em situação de rua. O dia 19 de agosto foi instituído como o Dia Nacional da
População em Situação de Rua, a partir do qual se estruturou o movimento.

Após essa chacina as organizações da sociedade civil que atuavam nessa área,
bem como personalidades políticas, técnicos e até alguns gestores públicos
comprometidos com a luta por direitos e dignidade humana direcionaram suas
atuações para reforçar as mobilizações que começam a despontar nos grandes
centros, particularmente em São Paulo e Belo Horizonte, como reação as
perseguições dirigidas à população em situação de rua. Diversos espaços
foram criados e/ou redimensionados com o propósito de dar visibilidade às
condições de vida a que esta população está submetida, bem como para
estimular o processo organizativo. Assim surgiu a ideia da criação de um
movimento nacional, expressa, em 2004, a partir da articulação inicial de
lideranças de São Paulo e Belo Horizonte (SILVA, 2010, p. 20).

Assim, em 2005 durante o 4º Festival Lixo e Cidadania, que acontece durante o segundo
semestre de cada ano, o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) é lançado, já
exibindo a sua expressão de organização no cenário político em várias cidades brasileiras.
Ainda em 2005, se pode mencionar a importância do I Encontro Nacional de População
em Situação de Rua, organizado pela Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS) do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Contando com a presença
de representantes de entidades da própria PSR, de organizações governamentais de vários
municípios e do MDS, o principal objetivo foi “fazer uma análise da realidade de vida desta
população no Brasil, com a participação de atores qualificados, e traçar estratégias e diretrizes
para a construção de políticas nacionalmente articuladas” (BRASIL, 2011, p.17).
Em dezembro desse mesmo ano, já como réplica às demandas que são expostas no
encontro, é sancionada a Lei nº 11.258/2005, que altera a Lei Orgânica de Assistência Social
(LOAS), 12 anos após sua promulgação, incluindo nesse setor programas específicos para a
população em situação de rua (BRASIL, 2011). O que veio a contribuir para que no ano 2008,
um representante do MNPR entrasse para o Conselho Nacional de Assistência Social, sendo o
primeiro representante de movimento popular eleito.
Em resposta às pressões e lutas protagonizadas pelo MNPR, podemos dizer que ocorreu
a promulgação de alguns marcos legais, a exemplificar a Política Nacional para a População
39

em Situação de Rua (Decreto 7.053/09). Todavia, o que se observa é que o Estado continua
sendo violador, seja pela omissão histórica promovida contra os “descartáveis urbanos”, seja
pelas ações de cunho criminalizatório e repressivo. ALMEIDA et al (2014). Por mais que o
Movimento grite “não queremos apenas sopa e cobertor!” a invisibilidade social persiste e se
institucionaliza.
Nesse sentido, o caminho escolhido pelo movimento foi à luta organizada unindo forças
e estratégias de ação em defesa dos direitos e por políticas públicas sociais para a população
que está em situação de rua. No caminhar da sua organização, o MNPR após vivenciar algumas
experiências, faz uma análise de suas ações, e apresenta uma carta instituindo os princípios que
fundamentam e direciona a atuação política do movimento em todo território nacional, tais
princípios deverão ser seguidos pelo coletivo, desde as bases, coordenações, individualmente,
sempre que haja atuação na luta encampada pelo movimento.
À vista disso, os princípios7 que orientam sua organização e prática políticas são a
valorização do coletivo, da democracia, da solidariedade e ética, e principalmente do trabalho
de base. Diante de tantas violações de direitos, o MNPR destaca as seguintes bandeiras de luta:
o resgate da cidadania por meio de trabalho digno, salários suficientes para o sustento, moradia
digna e atendimento nos serviços sociais. Assim, utilizam como tática, o debate acerca das
políticas sociais públicas voltadas para essa população, e para além disso, a intervenção através
do controle social e da fiscalização das políticas e serviços que já estão em vigor.

3.3 O SURGIMENTO DO MNPR NO RIO GRANDE DO NORTE

O Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR) é formado e


constituído por pessoas em situação de rua, que tem como objetivo o tensionamento político
em busca de garantias dos direitos e da dignidade deste segmento, através de políticas públicas.
No Rio Grande do Norte a realidade não difere de outros estados brasileiros. Dados da
pesquisa realizada pelo MDS em 2008, contabilizaram 223 adultos vivendo em situação de rua,
na capital. Em 2010 o centro universitário FACEX, em parceria com a Secretaria de Trabalho
e Assistência Social (SEMTAS) realizou uma outra pesquisa, demonstrando que 2.200 pessoas
utilizam as ruas da capital como espaço de moradia e sobrevivência. A cidade do Natal/RN

7
Na carta de princípios do MNPR, podemos encontrar a importância da escuta de base e da democracia direta,
com decisões horizontais, acordadas após discussão, assegurando melhoras para toda a coletividade. O princípio
da a.ção direta resguarda a autonomia do movimento e a responsabilidade por suas ações. Por ser apartidário, o
movimento preserva a liberdade de expressão e o apoio mútuo de parceiros. Os princípios da não violência, da
honestidade e transparência, da igualdade e justiça estão comprometidos com a luta por uma sociedade livre de
opressão.
40

assim como outros centros urbanos é perpassada por diversas violações de direitos.
Até hoje na cidade de Natal não existe um censo sobre essa população. Se levarmos em
consideração a conjuntura política atual com a precarização dos serviços e enfraquecimento das
políticas públicas, em que o Estado se demonstra máximo para o capital e mínimo para o social,
o acirramento das desigualdades e o aumento da população em situação de rua tenderá a aumentar.
De acordo com Almeida (2015), no que concerne o território do Rio grande do Norte,
até o início do ano de 2012, sob um contexto de extrema fragilidade no âmbito público, ainda
não existia nenhuma iniciativa de organização da população em situação de rua. Somente a
partir do papel político do centro de referência de direitos humanos8 (CRDH) desenvolvido na
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) registram-se as primeiras iniciativas.
Como destaca Almeida (2015) o movimento que desencadeou esse processo de
organização, e de visibilidade da temática da população em situação de rua, no cenário local,
teve o seu início através do evento realizada pelo CRDH/UFRN em 2012, articulada
a outras organizações, que denominado de “Vivências de rua: sou invisível pra
você?” desempenhou de maneira bastante particular um dos fatores determinantes para a
mobilização de um grupo de pessoas que acabaram dando origem a uma organização local,
articulada ao Movimento Nacional da População de Rua. Dessa maneira, a proposição do
evento foi determinante para o processo de mobilização.
Para a jornada de lutas que estava por iniciar, democraticamente foi escolhido um
representante do grupo, que viajou para a Brasília no ano de 2013 com o objetivo de participar
do curso de Formação de Lideranças e de outros momentos que pudessem fortalecer a luta dos
companheiros, como a ida a São Paulo para o encontro que acontece anualmente com a
Presidência da República.
Esses espaços formativos como encontros, seminários, congressos, audiências e
reuniões em diversos locais propiciaram a formação político-organizativa do movimento.
Durante esse referido ano, ocorreram encontros quinzenais 9com um grupo de pessoas em
situações de ruas, inicialmente na sede do CRDH/RN e posteriormente na Ribeira, bairro
próximo a um ponto de concentração dessa população. A pauta dos encontros era dialogar sobre
as dificuldades encontradas e as violações de direitos existentes no serviço público voltados ao

8
Atualmente Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio, o seu papel nos aspectos formativos
desse movimento social na atual conjuntura será abordado ao longo deste trabalho.
9
Segundo os relatos socializados pelo GEPOP- UFRN, grupo que reune pesquisadores da temática (professores,
mestrandos, doutorandos, alunos de graduação) o evento foi realizado na Praça Augusto Severo, no Bairro da
Ribeira, contando com a presença da Coordenadora Nacional da População em situação de rua, profissionais da
rede socioassistencial e da saúde, estudantes de diversos cursos, além dos parceiros como o CRDH/RN, Conselho
Regional de Psicologia, Consultório de Rua.
41

atendimento desses sujeitos. Assim, atentando para as diversas particularidade da população


em situação de rua pelo Brasil, para as demandas expressas a sociedade e principalmente como
os gestores vem reagindo na construção de políticas que viabilizem direitos cotidianamente
negados.
Em uma conjuntura marcada pela repressão, criminalização por parte da mídia, em que
as lutas sociais são entendidas como “balbúrdia”, vários desafios são postos aos movimentos
sociais, e com o MNPR/RN não é diferente. Além dos fatores conjunturais, é preciso levar em
consideração as particularidade do movimento que muitas vezes enfraquecem a luta, como o
não ter sede própria para articulações, a ausência de recursos financeiros e as estratégias de
sobrevivência, as introdutórias iniciativas da gestão municipal, ademais, a própria dificuldade
de mobilização, tendo em vista as condições objetivas de vida das pessoas em situação de rua.
Todavia, a existência e atuação desse movimento aponta para o fim da invisibilidade
desse segmento, em que vem apresentando suas pautas, ocupando espaços políticos
importantes, como presença nos conselhos, nos debates das universidades, atos públicos, entre
outros. À vista disso, a forma como CRDH contribuiu e tem contribuído, como parceiro
fomentador de estratégias e fortalecimento político da população em situação de rua que será
abordado ao longo desse trabalho.
42

4.PARA UMA NOVA PRÁXIS POLÍTICA DOS DIREITOS HUMANOS

4.1 A (RE) INVENÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS: UMA ABORDAGEM À LUZ DA


TEORIA CRÍTICA

A história dos direitos humanos é perpassada por uma série de contradições. A evolução
conceitual do termo mostra que, durante muitos anos, o seu significado foi associado a uma
concepção teórica universal, colocando-os enquanto algo inerente a condição humana e que,
portanto, deveriam ser garantidos independentemente de esforços do Estado. Todavia, devemos
sempre lembrar que tais direitos são frutos de conquistas, e requer uma compreensão ampla da
processualidade histórica, exercício que talvez facilite entender as dificuldades que encerram
sua realização.
Assim, como coloca Viola (2007), a questão dos Direitos Humanos é uma dessas
questões que pressupõem conhecer o lugar do qual se olha/// e o efeito de colocar em dúvida
conhecimentos e certezas, questioná-los a partir das condições próprias do ambiente em que se
vive.
Formulados nessa esteira, os Direitos Humanos experimentaram três grandes fases que
justificam sua universalidade, indivisibilidade e interdependência na atualidade.
Na teoria hegemônica, o marco que dá início aos Direitos Humanos no século XVIII é
a Declaração Universal dos Direitos do Homem, em que se deu a ascensão dos direitos de
primeira dimensão: os direitos civis e políticos, conformando assim o ideal liberal e
individualista do capitalismo. A segunda dimensão é datada da primeira metade do século XX,
em que se observa um rol de direitos quanto ao trabalho e assistência social, sob forte influência
das constituições mexicanas e de Weimar.10 Com as atrocidades da II Guerra Mundial, há a
Declaração Universal dos Direitos Humanos consolidando sistemas de proteção11
internacionais e nacionais. É nesse momento que fica explícito a coexistência dos direitos civis
e políticos e os direitos econômicos, sociais e culturais, deflagrando posteriormente a terceira
dimensão dos direitos e a propagação do Estado de Bem Estar Social. E assim, a terceira
dimensão é aquela dos direitos difusos e coletivos, desta humanidade e das gerações futuras;
defesa ecológica, paz, desenvolvimento, autodeterminação dos povos, partilha do patrimônio
cientifico, cultural e tecnológico. Direitos sem fronteiras, de “solidariedade planetária”, Cf.
Benevides (2007).

10
Weimar foi uma cidade Alemã, cuja o modelo de república aconteceu durante os anos (1919-1933)
11
O Sistema Internacional de Direitos Humanos, o global, tem vinculação com a Organização das Nações Unidas
(ONU) e os Sistemas Regionais, são conformados pelo Sistema Americano, o Europeu e o Africano.
43

No entanto, é preciso esclarecer que essa normatividade não consegue explicar como se
dá a afirmação social dos Direitos Humanos, como se dão suas violações: a falência dos serviços
públicos, o alarmante número de homicídios, o encarceramento em massa, o machismo e o
racismo estrutural e estruturante nas relações societárias brasileira. A visão majoritária se
mostra simplória e superficial, não configura uma teoria apta a orientar uma análise crítica, pois
ele aponta uma linearidade dos direitos, sem contradições fundantes, renegando de certo modo,
a interpretação histórica, as relações sociais e o modo de produção vivenciado em cada uma
dessas gerações de direitos.
Em geral, essa perspectiva idealizada, como explica Valença (2015) busca a plena
realização dos Direitos Humanos a partir do campo da distribuição (ou seja, das políticas
públicas e ações compensatórias do Estado), quando a desigualdade emerge já no campo da
produção, da divisão social do trabalho e consequente da venda da força de trabalho. Dito isso,
visualiza Estados de Bem Estar Social em diversas regiões, desconsiderando as relações sociais
de produção. Como Herrera Flores (2009) ressalta:

A ideia que inunda todo o discurso tradicional reside na seguinte fórmula: o


conteúdo básico dos direitos é o “direito a ter direitos”. E os bens que tais
direitos básicos devem garantir? E as condições materiais para exigi-los ou
colocá-los em prática? E as lutas sociais que devem ser colocadas em práticas
para poder garantir um acesso mais justo a uma vida digna? [...] Se estamos
atentos, essa lógica nos faz pensar que temos os direitos mesmo antes de nos
dizerem que temos direitos, a imensa maioria da população mundial não pode
exercê-los por falta de condições materiais para isso. (HERRERA FLORES,
2009. p.33)

De acordo com o pensamento do referido autor, os direitos humanos devem ser vistos
como resultado de lutas da sociedade, não somente como algo positivado. Mas como a
racionalidade da resistência, a traduzir processos que abrem e consolidam lutas. Em seus
estudos o autor nos leva alguns questionamentos. Porque há um ciclo vicioso em que nos
encerra o aparente “simplismo” da teoria tradicional que começa falando dos direitos e termina
falando dos direitos? Será porque não há nada além dos direitos? Serve muito ter cada vez mais
e mais direitos se não sabermos por que surgem e para que são formulados?
Por isso, é preciso entender os direitos humanos como produto da civilização humana,
e não da natureza. Compreendê-los como conquista histórica, na busca pela transformação
concreta da realidade, e não enquanto uma abstração legalista-formal, Cf. Mészáros (2008).
Como esclarece Amaral (2009) mesmo com os pactos internacionais e declarações
universais, a exemplificar a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948; Pacto
44

Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966; Carta das Nações Unidas
de 1945, Declaração e Programa de Ação de Viena de 1993, os Estados-nação continuam
declarando guerras entre si e violando os mesmos direitos que pactuaram em instrumentos
jurídicos e normativos dos quais são signatários.
Se por um lado são respeitados no plano teórico, por outro, esses direitos na
materialidade da vida cotidiana passam por um conjunto de interesses sociais expressos nos
próprios interesses das classes dominantes que implicam em desrespeito, constantes violações,
processos de desigualdade e exclusão social que permeiam de forma estrutural a sociabilidade
atual. Por isso, é importante afirmar que os Direitos Humanos nascem de um processo histórico
material, marcados pela luta social, institucionalizados em formas de normas mínimas, que só
serão garantidos através da ação política. É a crítica marxista à concepção clássica que
demonstra a insuficiência da idealização, chegando à conclusão que somente a luta é capaz de
provocar mudanças.
Pensando esse processo eminentemente histórico de luta pela consquita de direitos,
Coutinho (2005) sublinha que a luta é tarefa fundamental para tornar os direitos efetivos, pois
somente o reconhecimento legal-positivo não garante a sua materialização. Contudo, revela que
é preciso estar atento a alguns aspectos para não cair em uma abordagem unilateral e
equivocada, como na esfera das políticas sociais: através de suas lutas, os trabalhadores
postulam direitos, que uma vez materializados, são uma indiscutível consquista. Todavia, isso
não anula a possibilidade de que, em determinadas conjunturas, a depender da correlação de
forças, a burguesia use as políticas sociais para desmobilizar a classe trabalhadora, para tentar
cooptá-la. Por isso, é dada a necessidade a instensificação das lutas pela realização da
cidadania12 e o estabelecimento de correlação de força favoráveis aos segmentos sociais
efetivamente empenhados nessa materialização.
Na obra “A reinvenção dos direitos humanos” de Joaquín Flores Herrera, o autor
trabalha uma perspectiva importante para a compreensão dos direitos humanos, do ponto de
vista de uma nova teoria, particularizando-o em três níveis.
O primeiro nível – o “o quê” dos direitos humanos, no ímpeto de fugir do simplismo, o
busca compreendê-los enquanto processos provisórios de lutas que os seres humanos colocam
em prática para ter acesso aos bens necessários à vida, não se confundindo com os direitos
positivados em tratados e convenções.

12
Para o autor, cidadania, democracia e soberania popular são expressões com a mesma significação, pois devem
ser pensadas como processos eminentemente históricos, como conceitos e realidades aos quais a história atribui
permanentemente novas e mais ricas determinações.
45

O segundo nível – O “por que” dos direitos humanos traz em seu bojo a pergunta “do
por que lutamos por direitos humanos?” utilizando-se de um construto histórico, político, social
e econômico para explicar as lutas, pautando-se em bases concretas, isto é, segundo a posição
que ocupemos no marco da divisão do fazer humano, dita se teremos uma maior ou menor
facilidade para ter acesso à educação, saúde, moradia, à expressão, ao meio ambiente e etc.
Assim, demonstrando os injustos e desiguais processos de divisão do fazer humano.
No terceiro nível – o “para que” dos direitos humanos nos faz compreender que as lutas
por tais direitos não são única e exclusivamente por sobrevivência, de caratér imediatista, mas
pela criação de condições materiais concretas em que as práticas sociais se aproximem da
dignidade humana13.
Esquematicamente, o autor resume as bases dessa nova teoria:
1.Devemos começar reconhecendo que nascemos e vivemos com a
necessidade de satisfazer conjuntos culturalmente determinados de bens
materiais e imateriais. Segundo o entorno de relações nas quais vivamos, serão
os bens a que tentaremos ter acesso. Mas em primeiro lugar não são os direitos,
são os bens. 2.Num segundo momento, deve-se ter em conta que temos de
satisfazer nossas necessidades imersos em sistema de valores e processos que
impõem um acesso restringido, desigual e hierarquizado de bens. Esse fato
materializa-se ao logo da história, por meio de marcos hegemônicos de divisão
social, sexual, étnica e territorial do fazer humano.3.A história de grupos
marginalizados e oprimidos por esses processos de divisão do fazer humano é
a história do esforço para levar adiante práticas e dinâmicas sociais de luta
contra esses mesmos grupos. Daí corresponder a nós pôr as frases dos direitos,
mas admitir que a verdade deles reside em lutas raramente compensadas com
êxito. 4.O objetivo fundamental de tais lutas não é outro que poder viver com
dignidade, o que, em termos materiais significa generalizar processos
igualitários (e não hierarquizados “a priori”) de acesso aos bens materiais e
imateriais que conformam o valor da “dignidade humana”.5. E, por fim – se
temos o poder jurídico e legislativo necessários -, estabelecer sistemas de
garantias (econômicas, políticas, sociais e, sobretudo, jurídicas) que
comprometam as instituições nacionais e internacionais ao cumprimento
daquilo conquistado por essas lutas pela dignidade de todas e todos.
(HERRERA FLORES, 2009, p. 32)

13
A ideia de diginidade humana trabalhada pelo autor não é um conceito ideal e abstrato, mas trata-se de um objeto
que se concretiza no acesso igualitário e generalizado aos bens, que fazem com que a vida seja “digna” de ser
vivida.Todavia, para que tal acesso seja igualitário e não hierarquizado é preciso que não hajam pessoas em
situações privilegiadas e outras em situação de subordinação e exploração.
46

4.2 DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

Como já situado anteriormente, a emergência da causa dos direitos humanos no Brasil


dá-se a partir da década de 1970, no cenário da articulação de grupos políticos em torno das
reivindicações pelo restabelecimento de direitos.
Durante a ditadura civil-militar no período de 1964 a 1985, a luta contra o arbítrio e
contra todo tipo de violência causada pelo terrorismo de Estado, tornava obviamente prioritária
a Defesa dos direitos civis e políticos e das liberdades individuais. Para isso, houve o
enfrentamento ao autoritarismo e a reorganização da sociedade civil.

A defesa dos Direitos Humanos demanda, no curso da história brasileira, a


constante busca pela queda de argumentos colonialistas que instauraram um
ciclo de autoritarismo e violência aos preceitos dos direitos humanos. Há no
processo de afirmação dos direitos humanos as marcas da luta pela afirmação
do outro enquanto sujeito reconhecido na ordem jurídico-político-social. É a
partir de conceitos colonialistas e autoritários que a subalternidade humana se
reafirma, ao passo que nega, viola, não reconhece e não promove a diferença
e a diversidade humana. (GOMES DA COSTA et al, 2015, p. 203)

Os movimentos sociais foram se organizando e criando comitês de luta contra a


carestia.14 Dessa forma, o conceito de direitos humanos mudava de mãos, de fonte justificadora
do Golpe de Estado ao controle do movimento social, fornecendo novos caminhos, Cf. Viola
(2007, p. 127).
Por isso, o processo de luta e consciência é exemplar para desvelar, na realidade
brasileira, a evolução da defesa dos perseguidos pela ditadura militar para, finda a repressão
política, o reconhecimento e a luta pelos direitos de todos, com ênfase naqueles que “não tem
voz”: os pobres, os presos comuns, os excluídos, os humilhados e discriminados em geral, Cf.
Genevois (2007, p.10).
Nossa sociedade só perceberá, e mesmo assim, gradualmente, - a necessidade
de se reconhecer, defender e promover os direitos humanos de todos, a partir
de dois movimentos: 1. A organização do povo, pela base, para exigir, do
Estado, a garantia real dos direitos fundamentais – segurança, educação,
saúde, acesso à justiça e aos bens culturais, moradia, emprego e salário justo,
seguridade social erc; 2. Uma vigorosa campanha de esclarecimento, nos
meios de comunicação, do significado dos direitos humanos, associados à
justiça social e à democracia, e um compromisso com a educação em direitos
humanos, na escola e em outros espaços públicos, desde já. (BENEVIDES,
2007,p. 345).
No Brasil, podemos dizer que com o a Constituição Federal de 1988 houve o

14
Milhares deles em defesa da anistia, a ponto de organizar manifestações em defesa das eleições diretas e da
constituinte soberana.
47

“casamento” com os Direitos Humanos. Após 21 anos de Estado de exceção, comandado por
militares e frações da burguesia aliados, de caráter ditatorial, o Brasil reestabelece o Estado
Democrático de Direito, reafirmando a visão de que os direitos são êxitos de lutas dos
movimentos e segmentos sociais, cabendo ao legislador a inserção no texto constitucional de
garantias.
Construir a noção de direitos humanos é atentar para o cenário de acirramento das
expressões da questão social, em que muitas vezes a centralidade do poder público acaba
circunscrita a busca pelo combate a violações, por meio de políticas sociais. Nos últimos
tempos, o que se coloca para a população brasileira é a ineficácia dessas políticas, com o
tradicional modelo assistencialista, focalizador, que esbarrando nas limitações impostas por
uma sociedade baseada na propriedade privada e no consumo, não permite integralmente a
garantia de todos os direitos a todos os cidadãos. Assim, na dimensão pós-violatória nos
deparamos constantemente com os limites e a necessidade da sociabilidade do capital, com a
ineficácia das políticas no combate às violações, além de uma frágil rede de proteção. Dessa
maneira, falar de direitos humanos é levar em consideração as dinâmicas sociais que tendem a
construir condições materiais e imateriais necessárias para conseguir determinados objetivos.
Essa perspectiva nos esclarece que somente a luta pelo combate as violações não é
suficiente, é preciso também construir ações que sejam afirmativas, de promoção e de fomento
de pautas identitárias com conexão a outras dimensões da organização social, que caminhem
na contramão da exclusão e de diversos setores da sociedade brasileira.
No país, data de 1977, a primeira forma institucionalizada de direitos humanos, com a
criação, no âmbito do Ministério da Justiça de uma secretaria responsável por atuar
especificamente nessa temática. Como esclarecido por Souza e Paiva (2015), em termos
cronológicos, posteriormente, no ano de 2003, a instituição passa a ser um órgão integrante da
Presidência da República, denominado Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Apenas em
2010 é que se consta o status de Ministério, por meio de decreto, recebendo até então o nome
de Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República15. Dessa forma, trata-se de uma
instituição responsável por articular de forma interministerial e intersetorial as políticas de
promoção e proteção aos Direitos Humanos no Brasil.

15
No ano de 2015, após um reforma ministerial pela Presidenta Dilma Rousseff, a pasta dos Direitos Humanos foi
unificada com as secretarias de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e de Políticas para as Mulheres,
formando o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos (MMIRDH). Tal ministério foi
extinto em 2016, por Michael Temer e recriado em 2017, sob o nome de Ministério dos Direitos Humanos. No
governo Bolsonaro, a pasta foi transformada em Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos,
englobando também as políticas indígenas da FUNAI, anteriormente vinculada ao Ministério da Justiça.
48

Dessa maneira, no âmbito da presidência da república, a SDH-PR é instituída para


assessorar direta e imediatamente o Presidente da República na formulação de políticas e
diretrizes voltadas à promoção dos direitos da cidadania, da criança, do adolescente, da pessoa
idosa e as “minorias” e à defesa dos direitos das pessoas com deficiência e promoção da sua
integração à vida comunitária, bem como coordenar a política nacional de direitos humanos,
em conformidade com as diretrizes do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH)16,
articular iniciativas e apoiar projetos voltados para a proteção e promoção dos direitos
humanos em âmbito nacional, tanto por organismos governamentais, incluindo os Poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário, como por organizações da sociedade civil, e exercer as
funções de ouvidoria - geral.
É no campo das diversas iniciativas de promoção e defesa dos Direitos Humanos que
situamos os Centros de Referência em Direitos Humanos, como uma importante ação
estratégica com o objetivo de promover e fortalecer uma cultura de direitos, articulada em
rede e com diversos atores estratégicos na luta por nova forma de sociabilidade.

4.3 EXPERIÊNCIAS DO CRDH-MD À PARTIR DO MOVIMENTO NACIONAL DA


POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA NO RN

Nesse momento de ascensão do que se denomina onda conservadora, vivemos tempos


de regressão civilizatória. Assim, os Centros de Referência em Direitos Humanos revelam-se
uma política pública imprescindível, em um país marcado por recorrentes violações de direitos.
Por isso, na busca pelo resgate do marxismo, ao compreender os Direitos Humanos como
constituintes de uma dialética social, o Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos
Dionísio (CRDH–MD) intenta no âmbito de sua atuação política se contrapor a visão tradicional
e linear da história, uma vez que há disputas em torno dos significados dos Direitos Humanos,
bem como da práxis adequada a sua realização. Com isso, dialogar sobre a atuação deste centro
de referência no RN, coloca em cena a relação da práxis com os movimentos sociais, além de
potencializar a organização política.

16
Os Programas Nacionais de Direitos Humanos foram mecanismos que buscaram a implementação dos direitos
humanos na nossa sociedade. Temos o Temos PNDH-1, PNDH-2 e o PDH-3.O primeiro Programa Nacional de
Direitos Humanos (PNDH-1) de 1996 tem uma grande relevância no que tange a política de direitos humanos e o
debate sobre o tema, criado a partir de uma recomendação da Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena
de 1993, e foi pensado com propostas subdivididas em curto, médio e longo prazo. A incorporação dos direitos
econômicos, sociais e político, foi fruto de uma revisão e atualização no ano de 2002, resultando na publicação do
(PNDH-2.) No que tange a terceira versão, o (PNDH-3) incorporou pautas que tratam da igualde racial, dos direitos
da mulher, do idoso e das pessoas com deficiência entre outros.
49

Para conhecer melhor o processo histórico e organizativo do CRDH-MD, ao realizarmos


uma vasta pesquisa documental com as produções do próprio centro, nos foi possível reconstruir
parte da trajetória recente buncando entender aspectos técnicos, políticos e militantes da ação
institucional e política do Centro. E é a partir desse percurso que passamos a descrever e analisar
essa trajetória com os movimentos sociais.
Podemos dizer que durante toda a vigência do Centro, a população do Rio Grande do
Norte enfrentou e enfrenta uma série de violações de direitos humanos e discriminações, das
mais diversas naturezas. Os altos índices de homicídios contra a população jovem,
especialmente a juventude pobre e negra; os casos emblemáticos de assassinato de pessoas da
comunidade cigana; de adolescentes que cumpriam medidas socioeducativas, dentro das
unidades de privação de liberdade; a morte de crianças e adultos nos corredores dos hospitais
públicos por falta de assistência médica e os homicídios de inúmeras pessoas em situação de
rua são apenas alguns dos exemplos do amplo espectro de violações que perpassam a sociedade
norte-riograndense.
Assim, apesar dos limites que a própria política impõe ao trabalho, (haja vista que o
centro deixou de funcionar por um período aproximado de dois anos) o CRDH-MD tem sido
referência e resistência no Estado do Rio Grande do Norte (RN) desde a sua implementação. E
até o momento, o centro obtém bom resultado no processo de articulação com diversas
instâncias do poder público e da sociedade civil, nos âmbitos do Sistema de Garantia de
Direitos, Sistema Único de Assistência Social, Sistema Único de Saúde, Sistema de Justiça,
Ministério Público, Conselho Estadual de Direitos Humanos, entre outras instâncias do poder
público.
O Centro de Referência em Direitos Humanos reabriu no dia 10 de maio de 2018 e
passou a receber o nome de Marcos Dionísio, uma homenagem ao militante das causas sociais
durante duas décadas no Estado, e idealizador do projeto, falecido no ano de 2017. Dessa
maneira, ao tratar da temática “Direitos Humanos em Tempo de Golpe” o evento de reabertura
contou com a participação ampla da sociedade civil, dos movimentos sociais, de antigos
parceiros, além de vários apoios políticos reconhecendo a importancia do momento.
Diante desse cenário, as ações do Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos
Dionísio (CRDH-MD), funcionam como um conjunto de forças para a articulação da rede
intersetorial, trabalhando na dimensão pré-violatória e pós-violatória. No panorama da violação
de direitos, segundo os últimos dados do Ministério dos Direitos Humanos em 2017, o Rio
Grande do Norte teve 3.253 denúncias de violação registradas pelos serviços de atendimento
50

do ministério17, como o disque 100 e 180. Esses números colocam o Estado em terceiro lugar
no ranking nacional, considerando a proporção por 100 mil habitantes.
Assim, podemos dizer que com a reabertura do CRDH-MD ocorreu o fortalecimento
das ações em parceria com o Observatório da População Infanto-juvenil em Contextos de
Violência, que visam o enfrentamento do extermínio da juventude negra, nos territórios de
maior índice de violência letal desse público, com a realização do monitoramento desses
índices, além de ações de formação de multiplicadores juvenis e dos atores do Sistema de
Garantia de Direitos que atuem com a temática em questão. Atendimentos e encaminhamentos
específicos para promoção da igualdade também são de atuação do Centro.
Àvista disso, uma das frentes de ações volta-se à população em situação de rua. Desde
2012, o CRDH Marcos Dionísio vem trabalhando de modo contínuo e sistemático junto a esses
segmentos, apoiando as ações do Movimento Nacional da População em Situação de Rua
(MNPR/RN) e da Associação Plural Potiguar18, contribuindo para sua formação política e
organização social.
Nessa perspectiva, no que tange ao assessoramento ao Movimento da População em
Situação de Rua em Natal, a implicação do CRDH-MD foi importante no desenvolvimento de
estratégias e fortalecimento político desse segmento social. Como mencionado anteriormente,
na cidade não havia um organização política das pessoas em situação de rua, e após a realização
de ações formativas, foi originada uma articulação política com a criação do Movimento da
População em Situação de Rua de Natal/RN, vinculado ao Movimento Nacional.
No antigo formato de organização do Centro, no ano de 2013, houve um mapeamento
das demandas que vinham sendo acompanhadas e criaram-se quatro núcleos de atuação,
visando atender situações de violações de direitos e construir um fluxo que garantisse uma
agenda política e pragmática. De acordo com Paiva e Souza (2015):
O Núcleo gentileza atuava com a população em situação de rua e com ações
de Direitos Humanos na interface com a saúde mental; O núcleo Pagu atuava
com a violência de gênero, população LGBT e idosos; o núcleo Marighela
atuava com questões relacionadas à tortura, ao extermínio da juventude,

17
O disque 100, ou disque direitos humanos é um serviço vinculado a anterior Secretaria Especial dos Direitos
Humanos. Funciona 24h por dia e atende não apenas denúncias de violência contra crianças e adolescentes, mas
qualquer violação aos direitos e à dignidade humana. Assim, o disque 100 é o canal de recebimento de violações
como: racismo, maus tratos aos idosos, discriminação por orientação sexual, abuso sexual e trabalho infantil,
violações a pop rua, entre outras. O CRDH-MD desde a reabertura tem como objetivo mapear e monitorar as
violações e acionar a rede de serviços, cobrando das instituições informações e encaminhamento dos casos.
O dique 180 é uma Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência. Trata-se de um serviço de utilidade
pública, gratuito e confidencial, que tem por objetivo receber denúncias de violência, reclamações sobre os
serviços da rede de atendimento à mulher e de orientar as mulheres sobre seus direitos e sobre a legislação vigente,
encaminhando-as para outros serviços quando necessário.
18
A Associação Potiguar Plural é um coletivo de usuários de Serviços de Saúde Mental da cidade de Natal/RN e
agrega também familiares, técnicos e defensores dos Direitos Humanos e da Luta Antimanicomial ,
51

privação de liberdade e movimentos agrários e urbanos, e por fim, um núcleo


voltado para as questões das comunidades étnicas – ciganos, indígenas,
quilombolas. (PAIVA E SOUZA, 2015, p. 51).

Nesse referido ano, o CRDH-MD por meio desse núcleo, e em parceria com o
MNPR/local, realizou em sua sede o planejamento das ações do movimento para 2013. Neste
calendário de formação interna foram abordadas temáticas como: organização e participação
política, movimentos sociais e direitos humanos, reflexões sobre a Política Nacional para a
população em situação de rua, saúde mental da população em situação de rua, diversidade
sexual, dentre outros.
Todavia, na conjuntura atual de precarização dos recursos, e se comparado à estrutura
anterior, as demandas que chegam ao centro nos anos de 2018/2019 não são mais setorializadas
em núcleos temáticos. O acompanhamento de contextos específicos de violação de direitos
ocorre por meio da assessoria jurídica e atendimento psicossocial. A equipe técnica
interdisciplinar é composta por uma assistente social, uma psicóloga, um advogado e estagiários
das áreas da psicologia, serviço social, direito, história, comunicação social e ciências sociais,
que contribuem na realização de atendimentos e construção de um fluxo, Cf. Paiva e Souza
(2015). As denúncias aos contextos de violações chegam por meio de várias formas: Programa
disque 100, encaminhamentos de outras instituições, demanda espontânea ou através das ações
itinerantes nas comunidades. Dessa forma, o atendimento é realizado a partir do contato com a
própria vítima ou denunciante, que pode solicitar o anonimato ou não. As denúncias podem ser
referentes a contexto de violação individual, ou seja, uma situação de violência em que uma
pessoa em particular esteja inserida (por exemplo, violência contra a pessoa idosa) ou a um
contexto de violação coletiva, situação em que uma comunidade ou um grupo de pessoas
estejam vivenciando, como as violações institucionais contra as pessoas em situação de rua.
Assim, o centro promove ações voltadas para a garantia dos direitos humanos de grupos
populacionais que vêm sendo vitimizados diuturnamente e que possa agregar ações de
acolhimento, encaminhamento e acompanhamento, além do monitoramento dos casos.
Ademais, busca dar uma projeção coletiva aos contextos de violação, realizando atividades
itinerantes, que busquem a problematização e discussão política, por meio de palestras, oficinas,
eventos, audiências públicas e assembleias. Atividades que são realizadas em parceria com
outras instituições e com os movimentos sociais.
Nesse cenário, o Centro vem se posicionando em relação às diversas negativas e
violações de direitos na capital. Segundo a reportagem do jornal local Tribuna do Norte, de 22
de agosto de 2016 “em dois anos, o número de moradores de rua cadastrados no Centro de
52

Referência Especializado para a População em Situação de Rua, da Prefeitura de Natal,


triplicou”. Ainda, dados da Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social (SEMTAS),
mostram que em 2014 o centro atendia 317 pessoas e até julho de 2016 foram contabilizados
1082. O quantitativo aumentou 240%. (TRIBUNA DO NORTE, 2016).
Contudo, sabe-se que esses dados estão aquém da realidade, pois grande parte da
população não se encontra cadastrada nos serviços oferecidos pela prefeitura. No município
contamos apenas com dois equipamentos socioassistenciais19 ofertados para essa população sob
responsabilidade da SEMTAS: O Centro de Referência Especializado para População em
Situação de Rua – Centro POP e a Unidade de Acolhimento para Pessoas em situação de Rua,
popularmente chamado de Albergue.
Em 2011 foi inaugurado o albergue Municipal José Augusto da Costa, destinado à
pessoas em situação de rua entre 18 e 60 anos, entrando segundo a Tipificação Nacional de
serviços socioassistenciais como serviço “para adultos e famílias”. Estima-se que a instituição
realize o acolhimento anual de 1600 pessoas, uma média de 59 por dia. Ainda segundo dados
da SEMTAS, esta unidade de acolhimento apresenta capacidade máxima de 58 vagas.
Já o Centro POP em Natal, funciona desde o início de 2016 no Bairro Vermelho,
próximo ao viaduto do baldo (local onde se encontra um alto percentual da população em
situação de rua). O serviço oferece orientação jurídica, psicológica e social, oficinas, bem como
alimentação (jantar e café da manhã). O acesso é realizado por demanda espontânea ou através
do encaminhamento de outros serviços semelhantes, sendo direcionado a jovens, adultos,
idosos, crianças e adolescentes acompanhados por pais ou responsáveis.
Ainda em Natal, existe o Consultório de Rua que é um dispositivo público componente
da rede de atenção substitutiva em saúde mental do município. Dessa forma, apresenta-se como
uma experiência importante diante das violações sofridas pela pop rua, devido a ausência de
políticas de saúde para esse segmento, que comumente apresentam histórico de consumo
prejudicial de álcool e outras drogas. Assim, o serviço oferta ações de promoção, prevenção
além de cuidados primários no espaço da rua, como prevê as orientaçãoes do Ministério da
Saúde.

19
Segundo os serviços socioassistenciais definidos pela Tipificação Nacional, os Albergues são serviços de
acolhimento em abrigo institucional, podendo ser destinado para crianças e adolescentes; adultos e famílias;
mulheres em situação de violência, jovens e adultos com deficiência e idoso. Já o Centro POP, é um Serviço
Especializado para Pessoas em Situação de Rua, classificado como Proteção Social Especial de Média
Complexidade e tem como finalidade analisar as demandas dos usuários, promover orientação individual e
coletiva, além de encaminhar os usuários aos demais serviços socioassistenciais. Ademais, o Centro deve oferecer
espaços de guarda de pertences, higiene pessoal e alimentação, bem como promover documentação civil e
endereço institucional.
53

Segundo os relatos de Almeida et al (2015), na capital potiguar, o Consultório de Rua


teve duas equipe entre os anos de 2011 e 2013, com atuação em diversas áreas da cidade que
concentravam grande contingente de pessoas vivendo na rua em situação de consumo de alcool
e outras drogas. Há alguns anos, houve alterações no nome, na equipe e no escopo de suas
ações. Se anteriormente as ações estavam focadas na saúde mental e nos transtornos
relacionados ao uso de susbtâncias, atualmente a proposta do “Consultório na Rua”, além de
abordarem a questão da saúde mental, as equipes multiprofissionais estão voltadas à atenção
primária dessas pessoas. Assim, na capital potiguar, a maioria dessas equipes são referenciadas
pelo Departamento de Atenção Básica, do Ministério da Saúde.
Notoriamente, há um série de critérios pré-estabelecidos que dificultam o acesso das
pessoas em situação de rua aos serviços, levando em consideração que certo aspectos são
comuns a esse segmento, por exemplo, como a não obtenção de documentos. Muitas são as
reclamações e denúncias dos usuários que se transformam em demandas coletivas. O que ocorre
em alguns casos é o despreparo técnico dos profissionais que prestam os serviços e acabam por
reproduzir injustiças sociais em um espaço que deveria ser de acolhimento.
E para a nossa pesquisa é fundamental analisar as ações e a praxis política do CRDH-
MD junto à População em Situação de Rua, o que passamos a expor nessa seção do nosso
trabalho.
Em relação ao que chamamos anteriormente de insuficiência de políticas públicas e
prestação de serviços à Pop Rua, o CRDH-MD tem realizado atendimentos individuais e
coletivos, com o acolhimento e acompanhamento diante das necessidades da pop rua e de outros
movimentos sociais. A equipe multiprofissional realiza orientações diversas acerca dos
programas, serviços e acionamento da rede intersetorial de políticas. Todavia, é preciso deixar
claro que o Centro não substitui o papel da rede de serviços, atuando apenas como articulador
das políticas.
Por meio de seu papel político de articulador e com o objetivo de ultrapassar os
atendimentos individuais, o CRDH-MD tem como linha de ações prioritárias a educação em
direitos humanos e formação política. Assim, a educação em direitos humanos aparece nas
reflexões de Benevides (2007), como:
Formação de uma cultura de respeito à dignidade humana através da
promoção de vivências dos valores da liberdade, da justiça, da igualdade, da
solidariedade, da cooperação, da tolerância e da paz. Isso significa criar,
influenciar, compartilhar e consolidar mentalidades, costumes, atitudes,
hábitos e comportamentos que decorrer de todos esses valores citados – os
quais devem se transformar em práticas. Ser a favor de uma educação que
significa a formação de uma cultura de respeito, significa querer uma mudança
54

cultural, que se dará através de um processo educativo. (BENEVIDES, 2007,


p.346)

Dessa maneira, por meio de palestras e diálogos interativos sobre os direitos da POP
Rua, vem assessorando o movimento nos espaços de participação política. O intento nessa parte
da análise não é relatar todos os eventos em que o Centro esteve presente, mas prover uma
reflexão em torno dessa articulação. Nessa perspectiva, o CRDH-MD se fez presente no Dia de
Luta da população em situação de rua. Este aconteceu próximo ao viaduto do baldo, no dia 31
de agosto de 2018, contando com representantes do movimento, sociedade civil, defensoria
pública, entre outros órgãos que reconhecem a importância da luta. Sob a bandeira do
movimento ao fundo, em uma faixa continha: “Chega de omissão. Queremos habitação! A
nossa fome é por direitos”. As diversas falas dos representantes versavam sobre a necessidade
de assegurar a essa população a garantia de direitos, inclusive a moradia. Para isso, cobrando a
elaboração de políticas habitacionais condizentes com a realidade desse segmento. Hoje o
principal acesso à moradia popular é o Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), no
entanto, tal política apresenta uma burocracia incompatível: a inserção só é realizada a partir de
uma demanda fechada ou de sorteio. O movimento, exige o mapeamento da comunidade que
será beneficiada, a distância dos conjuntos habitacionais produzidos pelo PMCMV entre outros
requisitos que dificultam tanto o acesso quanto à permanência dessa população à moradia.
Ainda sobre essa temática da moradia, em abril de 2019, o CRDH-MD e toda a
sociedade foi convidada a participar de uma audiência pública na câmara municipal, com o
tema: “Retrato Social das Pessoas em Situação de Rua na Cidade de Natal”. Segundo o relatório
produzido pela equipe responsável pelo evento, diante do crescimento da população em
situação de rua em Natal, o Ministério Público solicitou à Secretaria Municipal de Habitação,
Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes (SEHARPE) uma resposta à problemática da
habitação desse segmento populacional. A partir disso, foi criada uma comissão dentro do
Conselho de Habitação e Interesse Social – CONHABINS para estudar o tema e propor
encaminhamentos preliminares de soluções para essa questão que contribuísse com a
elaboração de uma política pública municipal. O relatório20 apresenta os resultados dos estudos
da comissão formada na reunião da CONHABINS, do dia 20 de agosto de 2018.

20
No referido relatório técnico constam a caracterização da população em situação de rua, as reinvindicações do
movimento, reflexões sobre o paradoxo dos imóveis desocupados na capital e o contingente de pessoas em situação
de rua, além de sugestões e encaminhamento preliminares para a problemática da moradia, pactuado com o
movimento. Esse relatório técnico é resultado dos estudos de uma comissão dentro do Conselho de Habitação e
Interesse Social – (COHABINS), ligada à Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos
Estruturantes- (SEHARPE).
55

Avançando nos debates e discussões, o CRDH-MD se fez presente em várias reuniões


de articulação do MNPR e eventos, com caráter formativo durante o ano de 2018 e 2019, em
parceria com o CRP/RN – Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Norte, SINTEST
RN – Sindicado Estadual dos Trabalhadores em Educação Superior do Rio Grande do Norte,
SINSENAT – Sindicatos dos Servidores Municipais de Natal, Mandato da parlamentar Natália
Bonavides, Comissão de Direitos Humanos da OAB/RN entre outros, comprometidos com a
construção de um conhecimento popular e acessível, contribuindo com uma análise crítica da
realidade, sem perder de vista que o movimento fala por si, com total autonomia.
Nessa perspectiva, pesquisadores, apoiadores e militantes em parceria com o CRDH-
MD intervêm, na tentativa de explorar o sentimento coletivo de luta e resistência além do
encorajamento a organização política, valorizando suas capacidades de atuação política contra
as injustiças. Desde a reabertura, o Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio
promove mensalmente “Ciclos Formativos” em que por várias vezes os representantes do
MNPR/RN estiveram presentes, dialogando e construindo estratégicas para a luta coletiva.
Dentre as temáticas trabalhada estão: LGBTfobia, em que se debateu sobre a Lei estadual
9036/2007, que dispõe sobre penalidades em casos de discriminação em razão da sexualidade
ou identidade de gênero; O debate sobre o desafio do acesso e permanência de indígenas e
quilombolas na universidade; A importância da luta e resistência em defesa da democracia;
Saúde mental na universidade; assédio entre outras temáticas. Ademais, a participação com
diversos coletivos e movimentos consagra a pluralidade da instituição na luta por direitos.
Assim se constitui como um espaço estratégico para a atuação política junto aos movimentos
sociais com vista ao enfrentamento e prevenção aos contextos de violações na
contemporaneidade.
Logo, os espaços de discussão, os “Ciclos Formativos” realizados pelo CRDH-MD e os
que este participou apresentam traços semelhantes ao que conhecemos da metodologia aplicada
na educação popular. Esclarín afirma:

O objetivo da Educação Popular não pode ser apenas fornecer conhecimentos,


habilidades, promover os educandos, dar títulos e certificados, mas deve-se
orientar para a formação de pessoas plenas, modelar corações fortes,
solidários, gerar cidadãos capazes de comprometer-se com o bem comum,
conscientes de que a sobrevivência da humanidade passa pela convivência, e
que o egoísmo, o individualismo e as agressões à natureza, são formas
anunciadas de suicídio. Precisamos atrever-nos a transformar os centros
educativos em oficinas de humanismo, e a fornecer títulos de pessoas
verdadeiras. A educação não pode ser apenas um meio de ganhar a vida,
precisa ser essencialmente um meio de oferecer a vida aos outros, provocar
neles a vontade de viver com sentido e com projeto, com metas e ideias.
56

(ESCLARÍN, 2005, p. 33-34)

Assim, as ações do CRDH-MD tem se amparado nos aspectos metodológicos que


recuperam os fundamentos da metodologia Freireana, como explicita Souza e Paiva (2015) que
se baseia em cinco momentos: Conhecer, Despertar, Dialogar, Avaliar e Celebrar. Assim, o
primeiro momento é o conhecer, em que os integrantes do Centro de Referência em Direitos
Humanos Marcos Dionísio buscam ter o contato com os territórios e seus sujeitos para conhecê-
los, ter um olhar sensível para perceber particularidades e especificidades do público, dos
movimentos, das localidades gerando respeito em relação aos distintos espaços de vida. Assim,
acontece o despertar, que diante do panorama de violações, o centro vai traçar estratégias para
os diversos contextos. O terceiro momento consiste na prática do dialogar, na
instrumentalização das soluções aplicadas de forma dialógica. A avaliação já denota o processo
do pensar e debater a continuidade do trabalho, levando em consideração aspectos positivos e
negativos. Por fim, o quinto momento é o de celebrar os êxitos junto à população que fez parte
de todo o caminhar.
Dessa maneira, compreende-se que a educação atua como ferramenta fundamental para
o desenvolvimento da autonomia dos sujeitos, contribuindo para que estes se percebam como
construtores e transformadores da realidade em que vivemos. Ainda sim, apresenta-se como
uma ferramenta de organização política e luta por direitos. O movimento encontra-se cada vez
mais comprometido com a construção de um projeto de totalidade, que não enxerga a realidade
a partir de visões fragmentárias, pois quando o debate político atinge a esfera da totalidade, a
demanda não é mais individual, é coletiva.
Diante de tudo que foi refletido até aqui, nos parece possível afirmar que a luta do Centro
de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio na construção de uma nova práxis
política, compreendendo que os direitos humanos não são um dado, mas um constructo
histórico, assim às violações a estes direitos também o são. Isto é, as exclusões, as
discriminações, as desigualdades, as intolerâncias e as injustiças são um construído histórico, a
ser urgentemente descontruído.
Com isso, fica explícito a necessidade de se assumir o risco de romper com a cultura da
“naturalização” da desigualdade e da exclusão social, que, enquanto construtos históricos não
compõem de forma inexorável o destino da humanidade. Há que se enfrentar essas amarras,
mutiladoras do protagonismo, da cidadania e da dignidade dos seres humanos, principalmente
em tempos de conservadorismo exacerbado, de recrudescimento do Estado penal e
criminalização dos movimentos sociais.
57

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A explanação dessa pesquisa a partir de uma análise histórico-dialética revelou que a


população em situação de rua é expressão genuína de um histórico de desigualdades sociais,
situação ou condição esta produzida pela sociedade capitalista, por meio de uma inclusão
perversa, subalterna e precarizada. Assim, em um cenário perpassado pelo recrudescimento da
questão social, de retração dos direitos e principalmente da criminalização dos movimentos
sociais, o objetivo do trabalho foi analisar a práxis política do CRDH-MD a partir da
organização social e formação política do Movimento Nacional da População em Situação de
Rua – MNPR/RN.
À vista disso, é preciso esclarecer que a população em situação de rua não está imune
ao caldo conservador da sociedade brasileira, “os invisíveis ou descartáveis urbanos”
naturalizados pela mídia, tem cada vez mais adquirido consciência de classe e desenvolvido
estratégias de resistências e enfrentamento enquanto sujeitos organizados. A pesquisa e o
diálogo sobre as diversas violações dos direitos que chegam ao CRDH-MD demonstram que o
atual desenho das politicas de proteção social ainda é marcado pela descontinuidade dos
projetos e programas, ausência de recursos, pela elaboração de políticas que negligenciam
alguns aspectos necessários à sobrevivência desse segmento populacional.
Na busca pela luta materialista da afirmação histórica em Direitos Humanos, o Centro
de Referência em Direitos Humanos–Marcos Dionísio se coloca como um parceiro e articulador
do movimento e no âmbito de sua atuação política se contrapõe a visão formal-legal dos direitos
humanos. Nessa tônica, dialogar acerca da práxis política na interlocução com a luta por direitos
humanos sociais deriva do entendimento de que os movimentos sociais podem ser
potencializadores da transformação social. Pode-se dizer que são agentes da mudança, que
através de uma luta consciente, organizada e dirigida, elaboram análises, estratégias e
especialmente projetos capazes de transformar a sociedade. Embora exista uma pluralidade
quanto à forma de organização, os movimentos se coadunam em prol de assegurar direitos e/ou
mudanças do status quo, com um cotidiano de lutas permeado por articulações com partidos
políticos, sindicatos, associações, dentre outras organizações institucionais e formais.
Nesse sentido, se debruçar sob a temática dos direitos humanos a partir da práxis política
de sujeitos com potencial revolucionário, revela um posicionamento político que não está
alicerçado na racionalidade formal abstrata. Por isso, é fundamental nos apropriamos do nosso
lugar de front, uma vez que o período de crise financeira, moral e política tornam complexa a
tarefa de desenvolvimento da cultura dos Direitos Humanos. Estes são impensáveis sem a
58

democracia.
Como socializado ao longo do trabalho, ficou visível a luta do Centro de Referência em
Direitos Humanos Marcos Dionísio na construção de uma nova práxis política, compreendendo
que os direitos humanos não são um dado, mas um constructo histórico, assim às violações a
estes direitos também o são. Isto é, as exclusões, as discriminações, as desigualdades, as
intolerâncias e as injustiças são um construído histórico, a ser urgentemente descontruído. O
Centro se fez presente desde a emergência e fortalecimento do MNPR/RN, considerando os
desafios, conquistas e perspectivas de continuidade, atuanto tanto na dimensão da promoção e
educação em direitos humanos quanto Destacamos aqui o processo de assessoria, atendimentos,
promoção de eventos e discussões, monitoramento e acompanhamento dos casos de violência.
Todavia, não podemos perder de vista que o CRDH-MD não substitui a rede
intersetorial de políticas e mesmo que venha desenvolvido um trabalho significativo, é um
projeto de extensão que carece de recuso e de uma conjuntura política favorável aos direitos do
conjunto da sociedade. Na atual tendência é fundamental que haja mobilização e luta em defesa
da universidade pública e gratuita e de qualidade, que não seja condicionada somente ao ensino,
mas que consiga manter o seu tripe: ensino, pesquisa e extensão, imprescidivel na produção do
conhencimento para além dos “muros da universidade”.
O que temos observado nos últimos anos é o avanço do conservadorismo, que se espraia
no cotidiano da sociedade brasileira, a luta pelos direitos humanos é alvo de infundadas críticas,
seja pela mídia ligada aos interesses das classes dominantes, atuando de forma sensacionalista,
ou seja, pelo imaginário social que propaga a expressão: “Direitos Humananos para humanos
direitos”, em que os operadores desse discurso associam ao aumento da criminalidade, violéncia
deixando à parte o debate da segurança pública. Nesse cenário de inúmeras violações dos
direitos humanos, a “noção de que nada funciona” também se disseminou na sociedade como
rastilho de pólvora, na tentativa de encobrir uma das perversas formas do Capital: as aspirações
a um governo protofascista, que dissemina o ódio, marcado pela opressão e criminalização à
qualquer movimento contrário ao governo.
Por fim, a frase perpretante de um filme francês “O fabuloso destino de Amélie Poulain”
lançado em 2001, do roteirista Jean Pierre Jeunet, “São tempos dificeis para os sonhadores”,
transpõe o que significa lutar pelos direitos humanos na atual conjuntura, em que a cada
ofensiva do capital exige que os movimentos sociais repensem estratégias políticas e sociais de
confronto, com um compromisso ético e político irrenunciável em prol de uma sociedade aberta
e democrática, edificada em valores como a solidariedade, a liberdade, igualdade e o pluralismo
político.
59

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