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AS CASADAS SOLTEIRAS

Martins Pena
PERSONAGENS
BOLINGBROK, negociante. BOLINGBROK - VIRGÍNIA -
JOHN, seu sócio. JEREMIAS. JOHN - CLARISSE –
NARCISO, pai de VIRGÍNIA e CLARISSE. JEREMIAS – HENRIQUETA –
GENOVEVA , Mulher de Narciso NARCISO – GENOVEVA -
HENRIQUETA, mulher de Jeremias.
EMPREGADOS / SERAPIÃO E PANTALEÃO –

Um criado e Diferentes pessoas de ambos os sexos.


A cena se passa, o primeiro ato, em Paquetá; o segundo, na Bahia, e o terceiro, no Rio de Janeiro.
COMÉDIA EM TRÊS ATOS.
ATO PRIMEIRO
CENA I Jeremias e o povo. Música 01 Abertura
JEREMIAS - Bem fiz eu em vir à festa de São Roque. Excelente dia passei e melhor noite passarei - e vivam as festas! Perca-as quem quiser, que
eu não. Para elas nasci, e nelas viverei. Em São Roque, na Penha, na Praia Grande, na Armação... Enfim, em todos os lugares aonde houver festa, se
estiverem duas pessoas, uma delas serei eu. Que belo que isto está! Barracas, teatrinho de bonecas, onças vivas, fogo de artifício, máquinas, realejo e
mágicos que adivinham o futuro Logo terá um nessa barracas...(Lê a placa ) Jean Claud Pifou! Ora, esses estrangeiros são capazes das maiores
extravagâncias para nos chuparem os cobres!... Se há tanta gente que acredita neles... Estou que não caibo na pele!
Música 02 Navio VOZES - Aí vem a barca! Aí vem a barca!
JEREMIAS - A barca! (Correm todos para a borda do mar, exceto Jeremias.) Vejamos, primeiro, quem vem da cidade, para depois aparecer. Tenho
cá minhas razões... (Sai pela direita. Nesse momento aparece a barca de vapor, que atraca à praia e toca a sineta. Principiam a saltar os passageiros, e
entre eles, John e Bolingbrok, que se encaminham para a frente.)
CENA II John, Bolingbrok e o povo.
JOHN - Enfim, chegamos.
BOLINGBROK - Oh, yes, enfim! É uma vergonhe estes barques de vapor do Bresil. Tão porque, tão, tão, tão...
JOHN - Ronceira.
BOLINGBROK - Ronceire? Que quer dize ronceire?
JOHN - Vagarosa.
BOLINGBROK - Yes, vagarosa. John, congratulation, você sabe mais portuguesa que mim.
JOHN - Bem sabes, Bolingbrok, que ainda que sou filho de ingleses, nasci no Brasil e nele fui criado; assim, não admira que fale bem a língua...
Mas vamos ao que interessa!
BOLINGBROK - Yes, vamos ao que interessa!.
JOHN – Viemos aqui para encontrar as nossas belas.
BOLINGBROK - Oh, God! Encontre nosses beles... Mim fica contente se encontre nosses beles. Oh, God!
JOHN - Já vejo, meu caro Bolingbrok, que está completamente subjugado. Admira-me! Um homem como sois, tão frio e compassado...
BOLINGBROK - Oh, non, my dear! Este é um error muito... fundo... muito oco...
JOHN – Oco?
BOLINGBROK - Non, non! Muito fundo...
JOHN – Oco fundo?
BOLINGBROK - Non... profundo.
JOHN – Ah! Oco profundo! Que?
BOLINGBROK – Non só profundo! Minha peito é uma volcão, uma barril de pólvora... Faltava só a faísca. Miss Clarisse é faísca, e minha peito
fez, fez, fez (grita)bbum!
JOHN - Explosão.
BOLINGBROK - Yes, yes! Explosão! Mim está incêndio.
JOHN – Então espera ai que eu vou chamar um bombeiro pra ele vim com a mangueira para apagar o fogo...
BOLINGBROK - Oh, non, non! Mangueira non! Primeiro quero casa com my Clarisse, senão eu mata a mim.
JOHN - Devagar com isso, homem, e entendamo-nos.
BOLINGBROK - Oh, God!
JOHN - Por um feliz acaso, que servirá para estreitar ainda mais a nossa sociedade? Amamos a duas irmãs.
BOLINGBROK - Oh, duas anjos, john! Duas anjos sister...
JOHN – Pena que o pai delas teve o desaforo de negar o seu consentimento, dizendo que não criou suas filhas para casá-las com ingleses.
BOLINGBROK - Oh, goddame! Atrevida!
JOHN - Mas deixa, hoje nos há de ele pagar.
BOLINGBROK - Oh, yes! Paga, atrevida, paga!
JOHN - Elas já estão aqui na festa. Logo haverá fogo de artifício... Sempre há confusão... o barco estará na praia nos esperando , e mostraremos ao
velho o que valem dois ingleses...
BOLINGBROK - Yes! Vale muito, muito! Goddame!
CENA III Jeremias e os ditos
JEREMIAS, entrando cauteloso – Ufa! Não veio nesta...
JOHN, para Bolingbrok - Silêncio! (Passeiam pela frente do tablado.)
JEREMIAS, à parte - Quem serão estes dois? (Aproximando-se deles.) Perecem-me ingleses... Há de ser,... É fazenda que não falta por cá. Não
gostam do Brasil, Brésil non preste! Mais sempre vão chegando para proa ganhar mais dinheiro...
BOLINGBROK, para John - Yes.
JEREMIAS, à parte - Não disse? São ingleses. Conheço um inglês a distância; basta que diga: yes! Vamos ver...... (Chegando-se para os dois:)
Scusa bambino! Os senhores, pelo que vejo, são ingleses.
BOLINGBROK - Yes. (Continua a passear.)
JEREMIAS - Eu os conheci logo por causa do yes; e o senhor... Mas que vejo? John? È você?
JOHN, reparando nele - Jeremias!
Música 03 Lenta
1
BOLINGBROK – Non! who is this guy? Vai Atrapalhar our Plans...
JEREMIAS – Aqui, no Rio de Janeiro, e em Paquetá, John? Quando chegou?
JOHN - Há quinze dias, e já te procurei em sua antiga casa, e disseram-me que casou e se mudou.
JEREMIAS - Verdade.
BOLINGBROK - Quem é este?
JOHN - Bolingbrok, Jeremias, Jeremias Bolingbrok! Estudamos no mesmo colégio aqui no Rio de Janeiro.
JEREMIAS, sacudindo a mão de Bolingbrok com violência - Muita honra. (Dá-lhe a mão e aperta com força e sacode.)
BOLINGBROK - Oh, chega, chega!
JEREMIAS, para John - Seu sócio fala português?
JOHN - Muito mal.
JEREMIAS - Nesse caso, falarei eu inglês.
JOHN - Sabe inglês? Desde quando
JEREMIAS – Jonh você não sabe que eu fui formado pela grande escola de inglês CCeara... Deixa comigo. (Para Bolingbrok:) Hellou ! Goodbye ,
The books on the table, Put and q pariu, I Can a pastel , Very well! Give me some bread. I thank you. Gato come frango. I say...
BOLINGBROK, com frieza - Viva, senhor! (Dá-lhe as costas e passeia.)
JOHN, rindo-se - Está muito adiantado...
JEREMIAS - Não falo como um inglês, mas me garanto.
JOHN – Você não mudou nada. Gozador e fanfarrão.
JEREMIAS – Nem tanto? Esqueceu que estou casado?
JOHN – Parou com a farra?
JEREMIAS – Nem imagina.
JOHN - Onde está sua mulher?
JEREMIAS - Eu sei lá?
JOHN - Oh, excelente marido!
JEREMIAS - Soube ontem que hoje era festa de São Roque. De manhã peguei a primeira barca e me safei sem dizer nada. Não posso resistir a
uma festa.
JOHN - E deixou sua mulher só?
JEREMIAS - Tomara que ela também me deixasse só. Estou com medo que ela estoure por aqui já, já... É capaz que ela venha a nado ! Ela é
melhor que o Aquaman! John, Deus te livre de uma mulher como a minha.
BOLINGBROK, correndo para John - John, John,! Vem ela, vem ela!
JEREMIAS, assustando-se - Minha mulher?
BOLINGBROK - Olha, John, olha! God! Mim contente!
CENA IV Entram pela direita Virgínia e Clarisse.
JOHN - São elas!
JEREMIAS - Que susto tive eu! Pensei que era minha mulher.
JOHN - Virgínia!
BOLINGBROK - My Clarisse!
VIRGÍNIA - John!
CLARISSE - Bolimbroque!
Música 04 Encontro 2
JEREMIAS, à parte - Ué! As filhas do Narciso... epa!
VIRGÍNIA – AI! Fud... Quero dizer! O senhor Jeremias!
CLARISSE - Ah!
JEREMIAS - Minhas senhoras!
JOHN, para Jeremias – Conhece elas?
JEREMIAS - Se as conheço! São minhas vizinhas. Eu vejo elas todos os dias brincando de calsola...
JOHN – O que! O quê?
JEREMIAS – Caçarola, brincando com a caçarola
JOHN _ Jeremias, espero que você não nos traia. Estas meninas vão ser nossas esposas... E como o pai não consente em nosso casamento, aqui
estamos para roubá-las, e as roubaremos.
BOLINGBROK – Yes Nos Arrombaremos
MENINAS – O quê? Ai!
JOHN - Roubaremos! (corrigindo)
JEREMIAS - Olá! Isto vai à inglesa... Dito e feito...
JOHN - Podemos contar com você?
JEREMIAS - Vocês vão casar com elas?
JOHN - Juramos!
BOLINGBROK - Yes! Jura!
JEREMIAS - Conta comigo. Tenho umas diferenças com o pai, e boa é a ocasião para me vingar. O que faço?
JOHN – Fique de olho nele para que não nos surpreenda.
JEREMIAS - Pronto! Dona Virgínia, Dona Clarisse, adeusinho. ( parte.) Ah, meu velhinho, agora você me paga. (Sai )
CENA V
CLARISSE – Estávamos procurando vocês. .
BOLINGBROK - Yes! Nós está aqui.
JOHN - Há meia hora que desembarcamos, e não sabíamos onde te encontrar.
VIRGÍNIA - Estávamos passeando e os vimos aqui, despistamos dele e corremos para cá. Meu pai a estas horas, estará a nossa procura.
BOLINGBROK - Está muito excitado...(John o cutuca com a bengala) , Miss, de fala a vós. Muito contente, Miss, muito satisfeita.
CLARISSE – Eu também..
BOLINGBROK - Yes! Também muito satisfeita! God dang!
JOHN - Virgínia, quanto sofro longe de ti.
VIRGÍNIA - Sei quanto me ama.
BOLINGBROK - My dear Clarisse, eu fica doente longe de ti.
CLARISSE – Sei que também me ama.

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BOLINGBROK - Mim não dorme mais... Leva toda a noite espirrando.
CLARISSE - Espirrando?
BOLINGBROK – No! Arfando....
CLARISSE – Arfando?
BOLINGBROK - No, no, suspirando. Yes, suspirando.
JOHN – Não consigo ficar longe de ti.
VIRGÍNIA - Meu caro John, não duvido um instante de vosso amor.
BOLINGBROK - Quando mim lembra vive sem ti... Oh god dang mim fica danada. By God! Yes, fica muito... muito... Yes.
CLARISSE - Certa de vosso amor, com amor vos pago.
JOHN - Seu pai ainda se opõe à nossa união?
VIRGÍNIA - Ainda. Ele diz que odeia aos ingleses pelos males que nos têm causado, e principalmente agora, que nos querem tratar como piratas.
BOLINGBROK - Piratas, yes. Piratas. As brasileiras é piratas... Enforca eles...
CLARISSE, afastando-se - Ah, somos piratas?
VIRGÍNIA - Muito obrigada...
BOLINGBROK - No, no, Miss... Eu fala só das brasileiras machos...
CLARISSE - São meus patrícios.
BOLINGBROK - As machos... mim não gosta deles. As brasileiras, mulheres, yes... são gostosas como sugar...
JOHN - Cala-te, Bolingbrok, que não dizes senão asneiras.
NARCISO – (Entrando) Bonito!
JOHN – Obrigado!
NARCISO - Está muito bonito! Muito bonito! (Espanto dos quatro.)
JOHN - Diabo!
BOLINGBROK - Goddame!
VIRGÍNIA e CLARISSE - Meu pai! (Ao mesmo tempo.)
NARCISO - Para isso é que se perderam de mim? Que pouca vergonha! Sua mãe esta aflita te procurando do outro lado da feira... E vocês
conversando com dois homens...
JOHN - Senhor, isto não teria acontecido se nos tivésseis dado a mão e o resto de vossas filhas.
NARCISO - Ah, são os senhores? É o que me faltava: casá-las com ingleses! Antes com o diabo!
JOHN - Senhor!
BOLINGBROK - Senhor!
NARCISO – Mais o que é isso ? (Para as duas:) Andando as duas.( Chegando a mãe)
GENOVEVA - Minhas filhas por onde se meteram?
NARCISO – Conversando com esse Ingleses dos infernos!
JOHN - Virgínia, conta comigo. A despeito deste velho insensato, serás minha.
BOLINGBROK - My Clarisse, há de ser mulher a mim, quando mesmo este velho macaco.
NARCISO - Macaco? Inglês dos infernos!
BOLINGBROK - Macaco fica zangado? Mim está contente de chama macaco. (Narciso se inflama)
GENOVEVA – Calma Narcisinho! Olha o coração!
NARCISO, tomando as moças pelos braços - Vamos, senão perco a cabeça. (Saem levando as duas.)
CENA VI Jeremias entrando.
JEREMIAS - John? John?
JOHN - Nós te estamos muito agradecidos.
BOLINGBROK - Mim quer joga soco.
JEREMIAS - Hem? O que é isso?
JOHN - Deixau o velho nos pegar.
BOLINGBROK - Mim quer jogar soco, senhor.
JEREMIAS - Não tive culpa. Estava seguindo o velho, quando passou por junto de mim, uma mulher... E assim que a vi, sai correndo e fugi...
BOLINGBROK, gritando - Mim quer joga soco, senhor!
JEREMIAS - Pois tome! (Dá-lhe um soco.)
BOLINGBROK - Goddame! (Atira um soco a Jeremias, que lhe responde.)
JOHN, separando-os - Então, o que é isso? Jeremias? Bolingbrok?
BOLINGBROK - Deixa, John!
JEREMIAS - Maluco! I say... drink the rum... Chega, que arrumo-te um tabefe!
JOHN - Não sejam crianças! (Para Jeremias:) Deixa pra lá. (Para Bolingbrok:) quieto...
BOLONGBROK - Mim não quer mais joga soco.
JEREMIAS - Mim também não quer jogo mais... (Bolingbrok passeia de um lado para outro.)
JOHN - Seu descuido muito nos prejudicou.
JEREMIAS - Já te disse que estava seguindo, mas a mulher...
JOHN - Mas quem é a mulher?
JEREMIAS - A minha! A minha! Pensei ver o diabo, e isto fez-me perder a cabeça... Por isso fugi.
JOHN – Arruinou nossos planos.
JEREMIAS - Por quê?
JOHN - Não tivemos tempo de falar do nosso plano. Agora o velho vai grudar como chicletes.
JEREMIAS – Tive uma idéia.
JOHN - Qual é?
JEREMIAS - Nesta barraca há um francês que, para enganar o público e ganhar dinheiro, vestir-se de mágico para ler o futuro, fazer adivinhações e
sortes, etc. Entra lá e dá pra ele...
JOHN – Epa!
JEREMIAS – Dá um dinheiro - esta gente faz tudo por dinheiro . Ai você veste as roupas dele , e assim disfarçado, talvez consigas falar com a
moça.
JOHN - Excelente ! (Abraça-o)
JEREMIAS - Que te parece? Bem bolado? Ó diabo! (Olhando para a esquerda, fundo.)
JOHN - O que é?

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JEREMIAS - (escondendo-se por detrás de John) - Minha mulher ! Não fale nada, nada... (Vai levando a John para o lado direito, encobrindo-se
com seu corpo.)
JOHN – Calma! O que é isso?
JEREMIAS, junto dos bastidores - Adeus. (Sai.)
CENA VII John, Bolingbrok e depois Henriqueta.
JOHN - Ah, ah! Que medo ele tem da mulher! Bolingbrok, vem cá. Estamos salvos!
BOLINGBROK - Agora mim tem pena de ter dado o soco... (Henriqueta vem-se aproximando.)
JOHN - O plano não pode falhar. Jeremias teve uma bela idéia.
HENRIQUETA, à parte - Falam em Jeremias...
BOLINGBROK - Quando encontra ele dá um abraço.
HENRIQUETA – Por favor...
JOHN - Minha senhora...
HENRIQUETA - Desculpem-me, meus senhores, se os interrompo, mas como ouvi que falavam no Sr. Jeremias...
JOHN - Conhece-o?
HENRIQUETA - Sim senhor. É meu marido.
JOHN, à parte - É ela! (Alto:) Muito prazer em conhece-la... Seu marido é um belo moço.
HENRIQUETA - É verdade. ( parte:) Patife, se o encontro, deixa ele comigo....
BOLINGBROK - Ah, a good boy.
HENRIQUETA - O que diz o senhor?
BOLINGBROK - Eu fala de sua marido... A good boy.
HENRIQUETA, à parte - Ora! (Para John:) Se quisesse ter a bondade de dizer-me onde o poderei encontrar...
JOHN - Pois não, minha senhora; ainda há pouco aqui esteve e dirigiu-se para este lado. (Aponta para a esquerda.)
BOLINGBROK - No, no, John!
JOHN – Sim, sim, foi para este lado. (Para Bolingbrok:) Take your tongue.
BOLINGBROK - Yes, foi esta lado...
HENRIQUETA – Agora você me paga Jeremias. (sai.)
CENA VIII
JOHN - Agora vamos por o plano em execução. Fique aqui e veja como faz!(vem entrando Pifou) O
BOLINGBROK - Para quê, John? No estar understand!
JOHN – Deixa comigo e Saberás. Olha ele ali! Hellou(Para Pifou) Pifu!
PIFOU – Não é Pifu! Jean Claud Pifou!
JOHN – Pifou é? Meus sentimentos... Sabe que é... é... I am... Le parje la Torre Eifel.. la Croassant com suflle de abobre...
PIFOU – Le parle portugais. Monsieur.
JOHN - E brasileiro parle?
PIFOU – Oui! C’est stupide...
JOHN – E porque não falou antes?
PIFOU – Porque veio com torre Elfeil, croassant...
JOHN – Sabe o que e?
PIFOU – No!
JOHN - Mas não é adivinho?
PIFOU – Je vejo le future, no presente!
JOHN - É que eu tô precisando de um favorzinho seu!(Enconta no Pifou)
PIFOU – Pelo visto é uma proposta indecente?
JOHN – Não! desculpa é que eu me expressei mal!
PIFOU – Então diga o que quer!
JOHN - E que eu preciso que tire a sua roupa!
PIFOU – No! Je suis français! Não sou fresco não!
JOHN - Não é nada disso não!
PIFOU – Quer que eu tire a roupa pra que?
JOHN – É que eu preciso ver....
PIFOU – Que me ver sem roupa pra que?
JOHN - Vamos andando ali que eu te explico tudo!(saindo)
BOLINGBROK, só - John vai fazer sacanagem... Mim não sabe o que ele quer... Não importa; rouba my Clarisse e fica contente. Velho macaco
está zangado. By God! Inglês faz tudo, pode tudo; está muito satisfeita. (Esfregando as mãos:) Inglês não deixa brinca com ele, no! Ah, Clarisse, my
dear, mim será sua marida. Yes! Ou No! Velha macaca tá chegando! E agora? (se esconde)
CENA IX
Entra Narciso, Clarisse, Virgínia, Genoveva e Henriqueta que anda de um lado para o outro

NARCISO – Onde já se viu conversando com aqueles, aqueles...


GENOVEVA – Ingleses! O meu Deus...
NARCISO – Arruaceiros, isso sim! Invadem o nosso Brasil e....
GENOVENA - Te chamarem de macaco! Meu amor...
NARCISO – Mais isso não vai ficar assim...
GENOVEVA – Tem que dar uma lição neles meu querido...
VIRGÍNIA – Mas! Mãe! Eu amo o John...
CLARISSE – E eu o Bolingbrok...
BOLINGBROK – (Escondido) Clarice me ama!
NARCISO – Chega disso! Já disse que não!
GENOVEVA – Vocês tem que acharem bons homens! Pode ser até italiano..
VIRGÍNIA – Italiano não mãe!
GENOVEVA – Espanhol então!
CLARISSE – Credo mãe! Porque não nos manda casar com argentinos então?

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NARCISO – Não! Argentinos não! Tem que casar com brasileiros..
BOLINGBROK – (Escondido) Não velho macaco! Clarice me ama!
VIRGÍNIA – E eu o John...
CLARISSE – Mas eu amo Bolingbrok ...

Música 05 Magico Entra pela barraca John, vestido de mágico, trazendo na mão uma buzina. John toca a buzina.

TODOS - O mágico! O mágico!


JOHN – Aproxime! Aproxime! (Todos se aproximam.) O future é de Deus! O céu é le pagine de seu imenso livre, e os astros os caracteres de sua
ciência; e quem lê nos astros conhece o futuro... o futuro! Homens e mulheres, moços, velhos(olha para Narciso) indecisos, não quereis conhecer o
vosso futuro?
TODOS - Eu quero! Eu quero!
JOHN - Silêncio! A inspiração se apodera de mim, Música 06 Desce o santo a verdade brilha a meus olhos, e o porvir se desdobra diante de
mim!
NARCISO, à parte – Vamos ver o quanto é mágico. (Alto:) Senhor mágico, Pode me dizer quem sou? Apenas olhando para mim?
JOHN - Aproxima-te. Deixe me ver! Tá meio nublado, meus olhos estão meio nuviado...
NARCISO – O que?
JOHN – Anuviado! Por acaso chegou a poucu de fora?
NARCISO – Sim! Agorinha!
JOHN – Já sabia! Este olhar de porco... estas orelhas de burro pertencem a (tempo) Narciso das Neves.
TODOS - Oh!
NARCISO - Sabe meu nome e sobrenome!
GENOVEVA – Narciso ele é mesmo mágico!
JOHN – Não vejo nenhuma qualidade ; só vícios vejo... És avarento, grosseiro, cabeçudo, egoísta...
TODOS, riem-se - Ah, ah, ah!
NARCISO – Chega. Diabo!
GENOVEVA - E eu consegue ver alguma coisa em mim?
JOHN – Deixe me ver ! (salta pra traz) Genoveva Neves....
GENOVEVA – Isso! Ele é mesmo mágico!
JOHN – Mãe de dois anjos...(tempo) Clarice e Virgínia.... ( para Clarisse0 E vós, minha menina, nada quereis saber?
CLARISSE - Eu ?
VIRGÍNIA - Vai, não tenha medo.
JOHN – Mostre-me tudo! (começa a abrir a camisa) Mostre-me sua mão. (Examinando sua mão e falando-lhe mais baixo:) Esta linha me diz que
Seu coração não está livre. Aquele que ama não é da sua nação, mas é um homem honrado e leal; pode confiar.
CLARISSE - E vê isso em minha mão?
JOHN - Céus!
CLARISSE - Senhor!
JOHN - Esta outra linha me diz que existe um grande obstáculo à vossa união; é preciso superá-lo, seguir aquele que ama; do contrário, acabará em
um convento.
CLARISSE - Em um convento? Morrer solteira?
JOHN - O destino fala por meus lábios; pensa e decide.
CLARISSE - Meu Deus!
VIRGÍNIA - Clarisse, o que te disse?
CLARISSE - Nada, nada. ( parte:) Meu Deus!
JOHN, para Henriqueta - E tu, pobre abandonada, queres que te diga o futuro?
HENRIQUETA - Abandonada? A primeira palavra é uma verdade... Dize-me o que devo esperar deste mundo.
JOHN - Não querei primeiro que te diga aonde está o infiel?
HENRIQUETA - Oh, claro!
JOHN - Dentro de uma hora o encontrarás aqui.
HENRIQUETA - Aqui?
JOHN - Sim.
HENRIQUETA - Obrigado, senhor mágico. ( parte:) Ah, Jeremias da minha alma, você me paga...
VIRGÍNIA - Agora eu.
JOHN, tomando pela mão e conduzindo-a à parte - Sim, agora tu, minha Virgínia, minha Virgínia a quem amo...
VIRGÍNIA - Ah, que ?
NARCISO - E lá! Que disse?
JOHN - Silêncio!
GENOVEVA – Quieto Narciso!
NARCISO - Isso é demais, é...
JOHN - Silêncio!
TODOS - Silêncio!
JOHN - Calado, velho insensato! Vê aquela estrela que parece um refletor? Olhe o senhora também!(Olham todos.) Lá está ao destino desta jovem.
Olhai todos, ! (Narciso fica olhando para a estrela.)
JOHN, à parte - Minha Virgínia!
VIRGÍNIA - És tu, John?
JOHN - Enquanto estiverem entretidos com os fogos, vem aqui me ver.
VIRGÍNIA - Sim.
NARCISO, olhando para a estrela – Não vejo nada! Isto não está bom... Virgínia vem para cá; isso não me cheira bem...
GENOVEVA – Foi o feijão que comi no almoço... (ouve-se o estrondo de bomba.)
Música 07 Fogos VOZES - Os fogos! Vamos ver os fogos! (Saem todos correndo pela direita, em confusão.)
NARCISO - (levando as filhas pela mão) Vamos, vamos ver os fogos!
GENOVEVA – Ai! Então vamos rápido! (Saem.)
JOHN - Quem mais quer saber do futuro?

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PIFOU - Eu! Eu! Eu!
JOHN - Aproxime-se um de cada vez.
PIFOU – Monsieur! Monsieur! (Entra Pifou só de cuecas e com a bengala do John) Que situacion? Ahn! Era só cinco minutinhos! Me de o traje
(John tira e troca com Pifou) Mas que sotaquezinho fajuto esse ! Pela amor de deus...
JOHN – Foi o queu pra fazer!
PIFOU – Monsieur! O l’argent!
JOHN – Que?
PIFOU – Mon argent! (sinal de não entender) Meu dinheiro, Cobre, cascalho, grana...(entrega o dinheiro e Pifou sai)

CENA X John e Bolingbrok.

JOHN - Bravo, tudo está arranjado!


BOLINGBROK - John, mim não entende nada. Que quer isto dize?
JOHN, tirando roupa de mágico - Silêncio, Bolingbrok, elas não demoram.
BOLINGBROK - Elas?
JOHN - Sim, nossas amantes; para fugirem conosco.
BOLINGBROK Oh, Oh! By God! Mim está muito satisfeita.
VIRGÍNIA - John!
CLARISSE, ao mesmo tempo - Bolingbrok!
JOHN, indo ao encontro de Virgínia - Minha Virgínia!
BOLINGBROK, indo ao encontro de Clarisse - My Clarisse!
VIRGÍNIA – Meu pai ficou entretido com os fogos!
JOHN – O barco está perto daqui; vamos...
VIRGÍNIA - A ti me entrego.
BOLINGBROK - My dear, let us go... (Saem pelo fundo à esquerda.)

CENA X Entram Narciso e Genoveva

NARCISO - (Entrando) Elas vieram por aqui!


GENOVEVA – (Entrando logo atrás) Tem certeza? Eu acho que as vi indo pra o outro lado...
NARCISO - Não, tenho certeza! Elas vieram atrás dos Ingleses do diabo!
GENOVEVA – Será que eles fizeram algum mal para elas? Será que eles a sequestraram?
NARCISO - Se eles fizeram isso vão pagar irei até o final do mundo atrás deles...
GENOVEVA – Isso Naná! Vamos atrás deles até... A gente tem dinheiro para isso?
NARCISO - Vendo as nossas propriedade! Faço tudo por elas...(entra Pifou de costas)
GENOVEVA – Olha o mágico! Vamos perguntar pra ele..
NARCISO - Senhor mágico!
PIFOU – Sim!(se vira)
GENOVEVA – Mas ele não é ele!
PIFOU – Como?
NARCISO - Cadê o mágico que estava aqui?
GENOVEVA – O que vê tudo e sabe tudo!
PIFOU – Sou eu!
NARCISO - Não você o outro, que adivinhou meu nome?
GENOVEVA – E chamou ele de burro com olhos de porco! E avarento, grosseiro, cabeçudo, egoísta...
NARCISO - Gege...
GENOVEVA – Que não gosta de tomar banho e tem um hálito de jegue...
NARCISO - Ele não disse isso!
GENOVEVA – Não? Ops!
PIFOU – Não precisa ser mágico pra ver tudo isso.
NARCISO - (pegando-o pelo pescoço) deixa de brincadeira cadê o outro mágico?
PIFOU – Não tem outro mágico nenhum! Eu sou o único mágico aqui!
GENOVEVA – Então mágico me diz onde estão as minhas filhas?
PIFOU – Eu tenho que me concentrar! (estica a mão pedindo dinheiro) eu vou me concentrar (aponta para a mão estendida)
NARCISO - (Genoveva cutuca Narciso) Que foi?
GENOVEVA – Da um dinheiro pra ele.
NARCISO - Porquê?
PIFOU – Estou sentido algo!(com a mão estica) Preciso limpar minha mente.
GENOVEVA – Da logo deixa ser muquirana.(Narciso da o dinheiro)
PIFOU – Estou vendo! Sim estou vendo!
NARCISO - O que?
PIFOU – Um homem! Um homem de chapéu e belgala
GENOVEVA – Bengala grande ou pequena?
NARCISO - Gege!
PIFOU – Grande! Esta com ela?
GENOVEVA – Com a bengala?
PIFOU - Não! com sua filha!
NARCISO - Minha filha esta com a Bengala!
PIFOU – Não o homem da bengala esta com sua filha!
NARCISO - São os ingleses... Safados...
GENOVEVA – E onde eles estão?
PIFOU – Fugiu!
NARCISO - Fugiu com elas?

6
PIFOU – Não a minha visão!
NARCISO – Deixa de brincadeira (segura pelo colarinho) onde estão elas?
GENOVEVA – Gegê! Não é assim que fala com o mágico! (sacode ele) Para onde eles foram?(outro sacode) fala francês dos infernos! (outro
sacode) Cadê as minhas filhas?
PIFOU – Pra bem longe! Fugiram pra bem longe...
GENOVEVA – Aprendeu?
NARCISO - Querida! E agora? (entra Jeremias e da de encontro com Narciso) Srº Jeremias!
JEREMIAS – Srº Narciso! Srª Genoveva! O senhores aqui em Paquetá?
GENOVEVA – (Pifou sai de fininho)Srº Jeremias, por acaso o senhor não viu as minhas filhas?
JEREMIAS – Suas filhas?
NARCISO - Clarisse e Virgínia! Elas também estavam aqui! Viemos ver os fogos. Mas elas fugiram... com os ingleses...
JEREMIAS – Tem certeza?
GENOVEVA – O mágico disse, não é? (procura pelo mágico)
JEREMIAS – Que mágico?
NARCISO - O mágico francês que estava aqui agorinha.
GENOVEVA – Agorinha! Ele falou do homem da bengala.
JEREMIAS – Sim tinha um mágico que estava conversando com dois ingleses. Sim é verdade! Cadê ele?
NARCISO - Ele esta de conluio com os ingleses!
GENOVEVA – Safado! Não se pode confiar em franceses!
NARCISO - Vamos atrás deles.(saem os dois)
JEREMIAS – Isso vai atrás dele... Não to gostando; parece que minha mulher está por toda parte. Tenho que ir com John para a cidade. O barco?
HENRIQUETA – (entra pela direita com um pau de macarrão) - Aqui que o mágico falou...
JEREMIAS – ( sem ver Henriqueta) Onde estará a maldita?
HENRIQUETA ( vendo-o) - Ei-lo! Seu, patife! (Vem-se aproximando de Jeremias sem ser vista.)
JEREMIAS - Se me encontra to ferrado; está por todo o lado! Ah, centopeia do diabo! (Henriqueta, que nesse tempo está atrás de Jeremias)
HENRIQUETA – Centopeia do que?
JEREMIAS - Do diabo! (vira para trás)
HENRIQUETA – Diabo! (dá-lhe uma paulada que o atira no chão.)
JEREMIA - Oh, sai satanás!
HENRIQUETA - Seu, patife! (Jeremias levanta-se apressado começa a correr para o fundo, e Henriqueta o segue. Henriqueta, correndo:) Espera,
patife, espera! (Saem correndo e desce o pano.) Fim do primeiro ato.

ATO SEGUNDO Música 08 Abertura 2 ato A cena passa-se na Bahia. O teatro representa uma sala; portas laterais, e no fundo duas janelas;
mesa e cadeiras.
CENA I Virgínia e Clarisse.

VIRGÍNIA, entrando pela direita – Que horror!


CLARISSE, acompanhando-a - É uma infâmia!
VIRGÍNIA - Tratar-nos assim, suas legítimas mulheres? Que acha?
CLARISSE – Você é que me diz?
VIRGÍNIA - Quem podia prever tudo isto?
CLARISSE - Pareciam tão submissos e respeitosos, lá no Rio de Janeiro! Que mudança!
VIRGÍNIA - E acreditamos neles...
CLARISSE - Este é o nosso castigo. Fugimos da casa de nosso pai... Ele nos avisou. Que cagada!
VIRGÍNIA - Quem poderia prever que eles fossem ingratos? Pareciam tão sinceros e amaveis...
CLARISSE - É verdade. E no entanto, há apenas dois meses que estamos casadas, e já mostraram suas manguinhas.
VIRGÍNIA -Ter de aturar as manias inglesas de nossos caros maridos... Ontem, o meu quis que eu comesse, rosbife quase cru.
CLARISSE - E o meu, que eu engolisse metade de um plum-pudding horroroso.
VIRGÍNIA – Me forçou a bebesse um copo de cerveja. Prrr... que bebida diabólica!
CLARISSE - E me obrigada a beber um copo de ponche deste tamanho, to tonta até agora.
VIRGÍNIA - O que mais assusta é que o Sr. Jeremias esta presenciando tudo isto e que o vá contar quando voltar para o Rio.
CLARISSE - E que remédio? Vamos preparar o chá, que nossos senhores não tardam.
VIRGÍNIA - Eu não! Preparem eles. Não sou sua escrava; não faço mais nada, não quero! (Batendo o pé.)
JEREMIAS, falando para dentro - Já volto, já volto, abram o champanha! (Para a cena:) Os diabos destes ingleses bebem como uma esponja!
(Vendo as duas:) Voltem para a mesa vão abrir o champanha?
CLARISSE - Não gosto de champanha.
VIRGÍNIA - Nem de vinho nenhum.
JEREMIAS - Não gostam de champanha, desse vinho divino e sem igual? Oh, minhas queridas, isso é mal gosto! Pif! Paf! Poum!
VIRGÍNIA - E o Sr. Jeremias por que não ficou lá, bebendo?
JEREMIAS - Porque tinha que lhes falar.
BOLINGBROK - ( Off) - Jeremias?
CLARISSE – Tão te chamando.
JEREMIAS, respondendo a Bolingbrok - Lá vou, e bebam enquanto eu não chegar. (Para as duas:) Assim esperarão com paciência.
VIRGÍNIA - Mas o que nos quer dizer?
JEREMIAS - Esta noite terá a peça: A Sonâmbula, pela Companhia Italiana de Teatro. Dizem que está maravilhosa
CLARISSE - Oh, se pudéssemos ir...
VIRGÍNIA - Seria bem bom, mas decerto que não deixarão.
JEREMIAS - E por que não?
VIRGÍNIA - Os nossos tiranos não o consentirão.
JEREMIAS - Oh, isso veremos! Deixe que eu Fale com eles?
CLARISSE - Não, não! Deixe por nossa conta. Vou pedir de surpresa, não são capazes de negar...
VIRGÍNIA - Clarisse tem razão. Com carinhos, obediência e meiguice talvez possamos convence-los.
JEREMIAS - Tempo perdido! Meiguices não são para ingleses; é bom para nós.

7
VIRGÍNIA - Deixe por nossa conta.
BOLINGBROK – ( Off) - Jeremias?
JEREMIAS - Lá vou, inglês do diabo!
CLARISSE - Vá, vá e tenha cuidado que eles não bebam muito.
VIRGÍNIA - Senão, não nos ouvem, pegam a dormir, e adeus Sonâmbula.
BOLIGBROK - ( Off Jeremias?
JEREMIAS – Ta bem! (Vai saindo, cantando:) God save the King!... (Sai.)
VIRGÍNIA - Mana Clarisse, é preciso fazer-nos amáveis.
CLARISSE - Amabilíssimas!
VIRGÍNIA - Preparemos primeiro o chá. (Chama) Tómas!
CLARISSE - Dizes bem. ( De uma mesa que está no fundo, trazem para a que está no meio da sala todos os preparos do chá.)
VIRGÍNIA, enquanto preparam o chá - Que remédio? Querem ser iludidos... (Chamando:) Tomás?
CLARISSE - Tanto pior para eles... Que culpa nós temos? (Aqui entra um criado inglês.) Tomás?
TOMÁS – (Entrando) Ai! Eu eu táva no ensaiando!
VIRGÍNIA – Ensaiando o que?
TOMÁS – Madame Butterfly...
VIRGÍNIA – E qual o personagem?
TOMÁS – A própria Butterfly! (Voa como uma borboleta)
VIRGÍNIA - Então pare de borboletear por ai e me trás água quente para o chá.
TOMÁS – Quente pra quente, ou quente pra morna?
VIRGÍNIA – Pra quente!
CLARISSE – Mas não demore!
TOMÁS – É só o tempo da água ascender e o fogo ferver! Acho que é ao contrario! (O criado sai dançando)
CLARISSE – Você não acha que ele é meio...
VIRGÍNIA – Meio...?
CLARISSE – (tempo) Não! As xícaras ? Tomás!
TOMÁS – A água ainda não esquentou...
CLARISSE – Traga também as xicaras.
TOMÁS - Sim! As xicaras! Indo...(sai dançando)
VIRGÍNIA – (olham pra ele saindo) Ia-me esquecendo do rum. Cadê o rum? Tomás!
TOMÁS – Sim! Eu nem sai direito, o que querem agora?
VIRGÍNIA – Traga rum!
TOMÁS – Rum acabou!
VIRGÍNIA - O que temos?
TOMÁS – Brazilian brandy!
CLARISSE – O quê?
TOMÁS – Water Hot!
CLARISSE – O quê?
TOMÁS – Cachaça!
VIRGÍNIA – ADORO! Então traga logo! (sai dançando)
CLARISSE – Isso colocaria tudo a perder... (Tempo)
AS DUAS – Tomás!
TOMÁS – (Entra o criado com uma chaleira, e a cachaça)
CLARISSE – Me dá. (Pega o bule.)
VIRGÍNIA – Me dá (Pega a garrafa, junto com Tomás arrumam a mesa)
CLARISSE - Leva. (Criado sai dançando com Chaleira)
VIRGÍNIA – (as duas olham) Agora não falta nada.
CLARISSE – Vamos nos arrumar.
Música 09 Hora do chá
VIRGÍNIA - Sim, sim! Bonitas, para melhor seduzir. Eles aí vem. (Saem ambas, apressadas.)
JEREMIAS - ( entrando) Já não aguento mais beber. Mais um pouco, acabo por uma combustão espontânea... como bebem esses ínglis!
JOHN – ( entrando) Assim abandonou os amigos?
BOLINGBROK – ( entrando) Jeremias está fraco, tem cabeça mole;
JEREMIAS - Sim, se eu estivesse como os senhores, acostumados desde criança a beberem cerveja...
BOLINGBROK - Beer
JEREMIAS - Yes, Beer
JOHN - Vamos ao chá. (Assentam-se à mesa.)
BOLINGBROK - Jeremias tem medo da vinho; gosta de água... É uma pata.
JEREMIAS - Pata será ele.
BOLINGBROK - Pata! Ah, ah! (Rindo:) Pata, yes!
JOHN - Quer chá?
JEREMIAS - Dá. (Servem-se de chá e continuam a falar, bebendo-o.)
JOHN - Tem recebido cartas do Rio?
JEREMIAS – Não. Também nem quero saber
JOHN - Chama-se a isso descuido e indiferença.
BOLINGBROK - Descuida, yes.
JEREMIAS - Sou assim. Também por descuido foi que me casei.
BOLINGBROK - Conforme... Quando mulher é má, deixa ela; quando é boa, pega nela.
JEREMIAS - Pega nela, yes! Mas como a minha era o diabo com saia, eu deixa ela.
BOLINGBROK - Yes!
JEREMIAS - Oh, John, oh, Bolingbrok, se eu tivesse uma mulher como as suas, então... Que anjos, isso sim é mulher! Se fosse qualquer de vocês,
não negava nada pra elas.
BOLINGBROK - Mim não nega coisa razoável. (Levanta-se.)
8
JOHN - Nem eu. (Levanta-se.)
JEREMIAS, levantando-se e à parte - Não gostaram do conselho... (Alto:) Enfim, cada um faz o que entende.
BOLINGBROK - Yes.
JEREMIAS - Tenho muito que passear, e é tarde. Farewell, my dear Bolingbrok. How do you do? Give me some bread. I thank you. Hem? Tem que
dizer a esta bela pronúncia? Até logo. ( parte:) É preciso deixá-los com as mulheres... (Alto:) Adeus! Sejam amáveis. (Sai cantando.)
BOLINGBROK, passeando - Mim está desconfiado...
JOHN – Será que nossas mulheres se queixaram a Jeremias?
BOLINGBROK - Mim pensa... Clarisse quer passeia, quer dança, quer theater, e mim não pode, mim não quer...
JOHN - E faz bem. De que servem tantas folias, senão para perdição das mulheres?
BOLINGBROK - John, eu não quer perde Clarisse, mas eu está muito aflita... Clarisse está zangado comiga. Quero que me falar palavras doces.
JOHN - Bolingbrok, meu caro sócio, desconfia sempre de três qualidades de mulher: primeiro, das que só palavras: meu amorzinho, meu bem, meu
ladrãozinho, e acarinham as faces com a mão; segundo, das que rodeiam de atenções e cuidados quando está vestindo para sair e terceiro, das que
fazem presentinhos de suspensórios bordados, bolsa para relógio, paninhos para barba, etc. É que te querem assim causar agradáveis surpresas.
Desconfia dessas, sobretudo. De surpresa em surpresa atiram com o homem ao inferno...
CENA II Virgínia, Clarisse e os mesmos.
VIRGÍNIA, à porta e à parte para Clarisse - Ei-los! Experimentemos. (Encaminham-se para os dois sem vistas.)
BOLINGBROK - Oh, oh, John, eu me lembrarei, John... Minha amorzinho, minha ladrãozinho, não quer... Ni presentes, ni carinhas... Oh, non!
VIRGÍNIA, tomando John pelo braço - Meu bom maridinho!
JOHN - Ah, Virgínia?
CLARISSE, tomando Bolingbrok pelo braço - Meu amorzinho!
BOLINGBROK - Clarisse! ( parte:) Disse: minha amorzinho...
VIRGÍNIA, para John - O chá estava bom?
JOHN - Não achei mau.
CLARISSE - (para Bolingbrok) Gostou do chá, meu ladrãozinho?
BOLINGBROK, à parte - Oh, minha ladrãozinho!...
VIRGÍNIA – (para John) Não vai sair hoje?
JOHN - Oh, tanto cuidado!
CLARISSE - Não vai sair? (Passando-lhe a mão pela barba.)
BOLINGBROK - Oh!
VIRGÍNIA - Que você tem? Acho assim, não sei como...
JOHN - Nada, nada, absolutamente!
CLARISSE – (para Bolingbrok) Por que te espantas?
BOLINGBROK – (à parte ) Oh, só falta suspensórias bordada!
VIRGÍNIA - John, queria pedir um favor...
JOHN – O que é?.
CLARISSE - Eu também meu amor...
BOLINGBROK - Fala.
VIRGÍNIA – Tome mais um pouquinho de chá, se que é tão bom...
CLARISSE - Tão amável...
VIRGÍNIA - E prometeu que hoje...
JOHN - O quê?
VIRGÍNIA - Você não terás a coragem de dizer não...
CLARISSE - Nem você, minha vida, terá o desaforo de recusar meu pedido...
JOHN - Vamos, fala.
BOLINGBROK - Eu está esperando.
CLARISSE - Queríamos hoje ir... Fala, Virgínia.
VIRGÍNIA - Ir ao teatro?
JOHN – Não. (Apartando-se dela.)
BOLINGBROK - Non, non pode! (Apartando-se dela.)
VIRGÍNIA – Não vai deixar?
JOHN - Não é possível.
CLARISSE - Recusa?
BOLINGBROK - No, non recusa... Permite a vós a permissão de não ir ao teatro...
VIRGÍNIA - Assim morreremos neste insuportável cativeiro!
JOHN - Virgínia!
CLARISSE - Isto é indigno! (Chora.)
BOLINGBROK - Clarisse!
VIRGÍNIA - Meu Deus, meu Deus, como sou desgraçada! (Chora.)
JOHN - Tenha juízo, senhora!
CLARISSE - Infeliz de mim! (Chora.)
BOLINGBROK - My Clarisse é criança?
JOHN – Virgínia, deixa de siricutico!
VIRGÍNIA, resoluta - Oh, mas isto não pode ficar assim; deixa senão...
CLARISSE, resoluta - Sim, ou deixa , ou eu...
JOHN - Ameaçando?
BOLINGBROK - Essa tom?
CLARISSE - É o tom que nos convém.
VIRGÍNIA - E o que havemos de tomar de aqui em diante.
JOHN - E pretendes assim obrigar a que te leve ao teatro?
BOLINGBROK - Pensas que assim obriga a mim, senhora?
VIRGÍNIA - Então não sairemos mais de casa?
JOHN - Não!
BOLINGBROK - No!

9
CLARISSE - Que inferno!
VIRGÍNIA - Muito bem! E durante o tempo que ficamos aqui vocês andam por esses hotéis, bailes, public-houses e teatros, se divertindo e
bebendo grogue...
JOHN - Virgínia!
CLARISSE – Fumando por essas ruas.
BOLINGBROK - Eu fuma aqui mesmo, senhora; sou capaz de fuma aqui mesmo.
VIRGÍNIA - Então não vamos sair?
CLARISSE, raivosa, ao mesmo tempo – Não vamos sair?
JOHN - Não! (Chamando:) Tomás?
BOLINGBROK, ao mesmo tempo - No! (Chamando:) Tomás? (Entra o criado.)
TOMÁS – Chamou, chamou?
JOHN - Nossos chapéus.
BOLINGBROK – Tomás!
TOMÁS – Sim chefe!
BOLINGBROK – Nossas bengalas !
VIRGÍNIA e CLARISSE - Meu Deus! (Vão cair desmaiadas nas cadeiras.)
BOLINGBROK, querendo ir socorrer Clarisse - My Clarisse!
JOHN, retendo-o – Deixa ? Vão ficar bem.
BOLINGBROK - Pode morre, John.
JOHN - Não morrem.
TOMÁS – (Entra o criado com os chapéus.)Aqui esta os chapéus!(coloca os chapéus neles:) E aqui as bengalas!
JOHN - A abril aqui perto uma nova casa das primas!
BOLINGBROK – Não sabia que você tinha tia no Brasil? (Puxando-o)
JOHN - Vamos. (sai)
VIRGÍNIA, levantando-se - Bárbaros!
CLARISSE, levantando-se, ao mesmo tempo - Desumanos!
BOLINGBROK, da parta - Oh, está viva!
JOHN - Não te disse? Vamos as primas...(Os dois riem-se às gargalhadas e saem.)
VIRGÍNIA, chegando-se à porta por onde eles saíram - Malcriados!
CLARISSE - Grosseirões!
VIRGÍNIA - E então?
CLARISSE - E então? Não sabia que eles tinham parente na Bahia?
TOMÁS – Senhoras! Tem uma senhora lá fora dizendo que quer falar com as senhoras. Nossa quantas senhoras....preciso melhor meu português....
CLARISSE – Quem é?
TOMÁS – Uma senhora de se denomina Henriqueta..
VIRGÍNIA – Henriqueta?
TOMÁS – Sim, Henriqueta!
CLARISSE – Henriqueta?
TOMÁS – Tô falando grego? Sim Henriqueta!
VIRGÍNIA – Mande-a entrar.
TOMÁS – Quem a Henriqueta? Brincaderia! (sai)
CLARISSE - Henriqueta aqui na Bahia? O que será?
VIRGÍNIA - Não adivinhas? Vem atrás do marido.
CLARISSE - Que casal também esse...
VIRGÍNIA - Henriqueta! (Abraçando-a.)
HENRIQUETA - Minhas amigas!
CLARISSE – Você por aqui, Henriqueta?
HENRIQUETA - Cheguei no vapor desta manhã, que bom ter-lhes encontrado. Pode me ajudar no que me trouxe à Bahia?
VIRGÍNIA – O que é ?
CLARISSE - Conta conosco.
HENRIQUETA - Venho em procura de meu marido, que há um mês e meio me abandonou.
CLARISSE - Abandonou?
HENRIQUETA - Sim, sim, e partiu para a Bahia. Um mês depois é que soube que ele aqui estava, e aqui estou.
VIRGÍNIA - Pobre Henriqueta!
HENRIQUETA - Vocês o não tem visto?
VIRGÍNIA - Se temos...
CLARISSE - E há bem pouco tempo.
HENRIQUETA - Aonde?
VIRGÍNIA - Aqui.
HENRIQUETA - Aqui mesmo?
CLARISSE - Sim.
HENRIQUETA - E voltará?
VIRGÍNIA - Não demora.
HENRIQUETA - Oh, Jeremias, agora veremos! Não esperava que eu viesse. Me abandonou...
VIRGÍNIA - E o Seu marido é como todos - falso, ingrato e traidor. (Aqui entra o criado com velas e as põe sobre a mesa.)
CLARISSE - Ele dizia sempre que recebia cartas suas, e dava-nos lembranças.
HENRIQUETA - Pérfido mentiroso! Oh, mas hei de segui-lo até o inferno!
VIRGÍNIA - Henriqueta, como são as coisas... Você corres atrás de Seu marido, e nós queremos estar bem longe dos nossos.
HENRIQUETA - Como assim?
CLARISSE - Henriqueta, estamos sofrendo com eles...
HENRIQUETA - Vocês, sofrendo?
VIRGÍNIA, chorando - Sim, e muito.
HENRIQUETA - Oh, e por quê?

10
CLARISSE - Nossos maridos tratam-nos como fôssemos suas escravas. (Chora.)
HENRIQUETA – Não é possível...
VIRGÍNIA – Não podemos fazer nada, não temos vontade própria. Nos governam britanicamente.
HENRIQUETA - E o que vocês fazem?
VIRGÍNIA - O que havemos fazer, nos sujeitarmos!
HENRIQUETA – Não acredito!
VIRGÍNIA - Virgínia, Clarisse, uma coisa que eu não disse. Mas sou sua amiga e tenho pena do estado e engano em que vivem...
VIRGÍNIA - Engano em que vivemos?
CLARISSE - Explica...
HENRIQUETA - Sabes vocês que se diz no Rio de Janeiro?
VIRGÍNIA – Você me assusta!
CLARISSE - Fala.
HENRIQUETA - Que vocês não estão casadas legitimamente.
AMBAS - Não estamos casadas?
HENRIQUETA - Não.
VIRGÍNIA – Que brincadeira é essa?
HENRIQUETA - Ora em que religião foram criadas?
VIRGÍNIA - Na religião de nossos pais.
CLARISSE - Católica, Apostólica, Romana.
HENRIQUETA - E Seus maridos?
VIRGÍNIA - São protestantes.
HENRIQUETA - E aonde casaram?
CLARISSE - No templo inglês do Rio de Janeiro, na Rua dos Barbonos.
HENRIQUETA - E não foram receber a benção católica do vigário?
VIRGÍNIA – Não, porque ele morreu e estamos esperando o novo vigário!
HENRIQUETA - Minhas amigas, sinto muito repetir; não estão legitimamente casadas.
VIRGÍNIA - Mas por quê?
CLARISSE - Não compreendo.
HENRIQUETA – Casamento protestantes só ligam os protestantes; e as católicos, os católicos.
VIRGÍNIA - Assim...
HENRIQUETA - Assim, só eles é que estão casados; vocês, não.
CLARISSE - Meu Deus!
VIRGÍNIA, ao mesmo tempo - Oh, é isto possível?
HENRIQUETA - E vivam na certeza que vocês não são mais que amantes de seus maridos, isto é, casadas solteiras.
VIRGÍNIA - Que palhaçada!
CLARISSE, ao mesmo tempo - Que safados!
HENRIQUETA - E agora que já sabem tudo, querer ainda viver com eles, e serem obedientes?
VIRGÍNIA - Nem mais um instante! Vamos fugir! Casadas solteiras!... Música 10 Revelação
CLARISSE – Vamos fugir! Que vergonha! Duas amantes!... Que posição a nossa!
HENRIQUETA - Esperem, calma. É preciso sangue frio. O vapor larga esta madrugada para o Rio de Janeiro, iremos nele.
VIRGÍNIA - Minha amiga, e você vem com a gente?
HENRIQUETA - Com uma condição...
CLARISSE - Qual é?
HENRIQUETA - Que vocês convenção Jeremias a me acompanhar , se eu o não puder convence-los.
AMBAS - Conta conosco.
HENRIQUETA - Muito bem. Agora vão arrumar as malas. (Ouve-se dentro Jeremias cantar.) E depressa, que eu ouço a voz daquele tratante...
VIRGÍNIA - Em um momento estamos prontas. (Saem as duas.)
HENRIQUETA, só – Vem cantando .. Mal sabe o que te espera. Canta, canta, que logo chorara! (Apaga a vela.) Safado!
JEREMIAS, entrando - Que diabo! Ainda não acenderam as velas! (Chamando:) Tomás, Tomás, traga luz! Não há nada como estar solteiro, ou, se
é casado, viver bem longe da mulher. ( Henriqueta vem-se aproximando) Nada como viver livre... E saber que a bruxa esta há mais de duzentas
léguas de mim. (Henriqueta, pega a gola da casaca, Jeremias assustando-se:) Quem é? (Henriqueta dá-lhe uma bofetada. Jeremias, gritando:) Ai,
tragam luzes! São Ladrões! (Aqui entra o criado com luzes.)
HENRIQUETA – Sou eu, patife!
JEREMIAS - Minha mulher!
HENRIQUETA - Pensava que não iria te encontrar?
JEREMIAS - Mulher do diabo! Xô satanás.
HENRIQUETA - Agora não te perderei de vista um só instante.
JEREMIAS, para o criado - Vai-te embora. (O criado sai.)
HENRIQUETA - Ah, não quere testemunha?
JEREMIAS - Não, porque quero te matar!
HENRIQUETA - Ah, ah, ah! Não me faça rir.
JEREMIAS, furioso - Ah, tem vontade de rir? Melhor; a morte será alegre. (Tomando-a pelo braço.) Você é uma peste, e a peste se cura; é um
demônio, e os demônios se exorcizam; é uma víbora, e as víboras se matam!
HENRIQUETA - E aos desavergonhados se ensinam! (Levanta a mão para dar-lhe uma bofetada, e ele, deixando-a, recua.) Vai fugir?
JEREMIAS - Fujo sim, porque da peste, dos demônios, e das víboras se foge... Não quero mais te ver! (Fecha os olhos.)
HENRIQUETA – Então vai me ouvir!
JEREMIAS - Não quero te ouvir! (Tapa os ouvidos com a mão.)
HENRIQUETA, tomando-o pelo braço – Então vai me sentir.
JEREMIAS, saltando – Sai de retro satanás!
HENRIQUETA - Agora vou ficar no seu pé, até o dia do Juízo...
JEREMIAS - Pois saiba que vou fugir de você como o diabo foge da cruz; vou ter evitar como o devedor ao credor; vou te odiar como as oposições
odeiam as maiorias.
HENRIQUETA - E eu vou te seguir como a sombra segue o corpo...

11
JEREMIAS, exclamando - Meu Deus, quem me livrará deste diabo encarnado?
TOMÁS- (entrando) - Uma carta da Corte para o Sr. Jeremias.
JEREMIAS - Dá cá. (Tomás o entrega e sai. Jeremias para Henriqueta:) Quem sabe se esta carta fosse à de convite para Seu enterro...
HENRIQUETA - Não terá esse gostinho. Pode ler, não faça cerimônia.
JEREMIAS - Não preciso da sua permissão. (Abre a carta e a lê em silêncio.) Estou perdido! (Deixa cair à carta no chão.) Desgraçado de mim! (Vai
cair sentado na cadeira.)
HENRIQUETA - O que é?
JEREMIAS – Não é possível!
HENRIQUETA - Jeremias!
JEREMIAS - Arruinado! Perdido!
HENRIQUETA apanha a carta e a lê - "Sr. Jeremias, muito sinto dar-lhe tão desagradável notícia. O negociante a quem o senhor emprestou o resto
de sua fortuna acaba de falir. E o mesmo fugiu do país. - Que desgraça Jeremias! Coragem homem.
JEREMIAS, chorando - Coragem! É fácil dizer... Pobre miserável... Ah! (Levantando-se:) Henriqueta, você que sempre me amou, não me abandone
agora... Mas não, você me abandonará; eu estou pobre...
HENRIQUETA – O quê? Por acaso acha que eu amava o Seu dinheiro, e não você?
JEREMIAS - Minha boa Henriqueta, minha querida mulher, agora que perdi tudo , só você é o meu tesouro; só você será a consolação do pobre
Jeremias.
HENRIQUETA - Abençoada seja a desgraça que me faz recobrar o Seu amor! Trabalharemos para viver, e a vida junto de você será para mim um
paraíso...
JEREMIAS - Nunca mais te deixarei! Vamos para o Rio de Janeiro, que talvez ainda seja tempo de remediar o mal.
HENRIQUETA – Vamos hoje mesmo.
JEREMIAS - Sim, sim, hoje mesmo, agora mesmo...
HENRIQUETA - Espera.
JEREMIAS - O quê?
HENRIQUETA - Virgínia e Clarisse também irão.
JEREMIAS - Virgínia e Clarisse? E seus maridos?
HENRIQUETA - Ficam.
JEREMIAS - E elas?
HENRIQUETA - Fogem.
JEREMIAS - Venha quem quiser comigo, fuja quem quiser, que eu o que quero ir pro Rio de Janeiro.
HENRIQUETA - Vem cá. (Saindo.) Agora serei feliz! (Saem pela direita.)
BOLINGBROK, entrando - Very good porter, John.
JOHN - Sim. É um pouco forte.
BOLINGBROK - Oh, forte não! Eu ainda pode bebe mais. (Senta-se e chama:) Tomás? Tomás? (O criado entra.) Traz uma ponche. (O criado sai.)
JOHN - Pois ainda queres beber? (Sentando-se.)
BOLINGBROK - John, bebe também comigo; eu quero bebe a saúde de minha Clarisse, e tu, de Virgínia. (Gritando:) Tomás? Tomás? (O criado
entra com uma salva com dois copos de ponche.) Bota aqui! (O criado deixa a bandeja sobre a mesa e sai.)
JOHN, bebendo - sua saúde, Bolingbrok.
BOLINGBROK, bebendo - Yes, minha saúde... Também saúde sua. Oh, este ponche está belo. John, à saúde de Clarisse!
JOHN - Vá, à saúde de Clarisse e de Virgínia. (Bebem.) autoridade marital!
BOLINGBROK - Yes, autoridade marital! (Bebem.)
JOHN - De duas coisas uma, Bolingbrok: ou é a mulher, ou o marido que governam.
BOLINGBROK - Yes, quando mulher governa, tudo leva diabo!
JOHN – Isso! Tem razão e compreende... nossa saúde! (Bebem.)
BOLINGBROK - Marido governa mulher, ou, - god dam! - mata ela. (Dá um soco na mesa.)
JOHN, falando com dificuldade - Obediência mata... salva tudo... Bolingbrok, à saúde da obediência!
BOLINGBROK - Yes! (Falando com dificuldade:) Eu quer obediência. (Bebem.)
JOHN - Virgínia é minha mulher... Há de fazer o que quero.
BOLINGBROK - Brasil é bom para ganhar dinheiro e ter mulher... John, eu quero dorme, mim tem a cabeça pesada... (Vai adormecendo.)
JOHN - Eu tenho sede. (Bebe.) Bolingbrok dorme. Ah, ah, ah! (Rindo-se.) Está bom, está bêbado! Ah, ah! Cabeça fraca... Não vai a teatro...
Virgínia... (Adormece.)
VIRGÍNIA, entrando - Silêncio, que eles dormem. (Adiantam-se para a cena, pé ante pé, passando entre os dois e o pano de fundo.)
CLARISSE, parando detrás dos dois - Se eles se arrependessem...
HENRIQUETA - Nada de fraqueza, vamos!
VIRGÍNIA - Talvez ainda fôssemos felizes...
JEREMIAS - Nada de demora, ou vou só...
VIRGÍNIA - Clarisse vamos ficar!
JOHN, sonhando - Virgínia é minha escrava.
VIRGÍNIA - Sua escrava?...
BOLINGBROK, sonhando e batendo com o punho na mesa - Eu mata Clarisse...
CLARISSE - Matar?...
VIRGÍNIA e CLARISSE - Vamos! (Vão atravessando para a porta da esquerda.)
HENRIQUETA - Adeus, gódames!
JEREMIAS, da porta - Good night, my dear! (Saem todos. Acordam, com o grito de Jeremias, como que acordam; esfregam os olhos.)
BOLINGBROK, dormindo - Good night!
JOHN, dormindo - Yes! (Tornam a cair em sono profundo e desce o pano.) Fim do segundo ato.
Música 11 Abertura 3 ato

ATO TERCEIRO
CENA I Virgínia e Clarisse, sentadas junto à mesa, cosendo. Narciso, tendo um papel na mão..
NARCISO, entrando - Está pronto. Muito bem! Meninas, é preciso que assinem este papel.
GENOVEVA – Isso meus anjos, assinem e se tornem novamente do bem e respeitável....
VIRGÍNIA - E que papel é este?

12
NARCISO, apresentando-lhe o papel e uma pena - A procuração para anular vossos casamentos.
GENOVEVA – Graças a Deus, Deus é maior! Assinem meus amores!
VIRGÍNIA - Ah, Me dá! (Toma o papel e assina.) Agora você, Clarisse.
CLARISSE toma o papel e assina - Está assinado.
NARCISO - Muito bem, minhas filhas!
GENOVEVA – Muito bem meus anjos!
NARCISO - Tudo certo. Não descansarei enquanto não vir anulados estes malditos casamentos.
GENOVEVA – Tudo certo. Não vamos descansar enquanto não anular estes malditos casamentos
NARCISO - Patifes,
GENOVEVA – Patifes malditos ingleses!
NARCISO - Vou ensina-los.
GENOVEVA – Dá uma lição neles!
NARCISO - Já estive esta manhã com meu advogado. Filhas amanhã serão livres.
GENOVEVA – Muito bom o Drº Teófilo...
NARCISO - Filhas amanhã serão livres.
GENOVEVA – Livres! Daquele crápulas, conquistadores..
CLARISSE - Livres?
NARCISO - Sim, sim, e poderá casar com quem quiser.
GENOVEVA – Quem sabe com um italiano...
VIRGÍNIA – Casar de novo?
NARCISO - E por que não?
GENOVEVA – Pode ser um espanhol, quem sabe um toureiro!
NARCISO – Não tô gostando dessa convença! Filhas, uma coisa eu quero pedir...
CLARISSE - O quê, meu pai?
NARCISO – Fugiram de casa; voltaram depois de dois meses e não disse nada e ainda te recebi com os braços abertos.
GENOVEVA – Um pai com esse não é pra qualquer uma. Querido...
VIRGÍNIA - Meu pai... (Levantando-se.)
CLARISSE, levantando-se – Pode pedir.
NARCISO - Amanhã espero que aceite os noivos que eu arranjei pra vocês.
CLARISSE - Noivos?
VIRGÍNIA - E quem são eles?
GENOVEVA – São dois rapagões maravilhosos...
NARCISO - Para você, Serapião.
VIRGÍNIA - Serapião?
GENOVEVA – Não é italiano!
NARCISO, para Clarisse - E para você, o irmão dele Pantaleão.
CLARISSE - Pantaleão?
NARCISO - São pessoas ótimas.
GENOVEVA – O pai dele estará aqui daqui a pouco.
CLARISSE – O Pai deles?
VIRGÍNIA – Não vamos conhece-los?
GENOVEVA – Eles estão fora do Rio! (saem os dois) .
CENA II As ditas e depois Henriqueta
VIRGÍNIA - Que me diz, mana? Eu, casada com um Serapião!
CLARISSE - E eu, com um Pantaleão!
VIRGÍNIA - Isto não pode ser...
CLARISSE - Que dúvida!
VIRGÍNIA - Até porque ainda tenho esperanças...
CLARISSE - E eu também.
HENRIQUETA, da porta - Dá licença?
VIRGÍNIA e CLARISSE - Entra!
HENRIQUETA - Como estão?
VIRGÍNIA - Bem, e você?
HENRIQUETA – Bem. Então, o que há de novo?
VIRGÍNIA - Muitas coisas... Amanhã estaremos completamente livres.
CLARISSE - E podermos casar com Serapiões e Pantaleões.
HENRIQUETA - Hem? O que é isso?
CLARISSE – Idéia do nosso pai.
HENRIQUETA – O que?
VIRGÍNIA - Meu pai quer nos casar de novo.
HENRIQUETA - Sim? E vocês consentem, e estão certas em abandonarem os pobres inglesinhos?
VIRGÍNIA - Não sei ...
CLARISSE - Eles estão aqui no Rio?
HENRIQUETA - Sei. Ontem encontrei, o Bolin, Bolin... Que maldito nome, que nunca pude pronunciar!
CLARISSE - Bolingbrok.
HENRIQUETA - Bolinloque Passeando Largo do Paço. Assim que me viu, veio direito á mim; Fiz de conta que não o vi, e sai andando.
VIRGÍNIA - Há quinze dias que chegaram da Bahia, e nos atormenta com cartas e recados.
HENRIQUETA - E já encontrou com ele?
VIRGÍNIA - Já, no baile.
HENRIQUETA - E dançou com ele?
VIRGÍNIA - Não.
CLARISSE - Por cinco ou seis vezes vieram nos convidar, mas não aceitamos.
HENRIQUETA - Coitados!

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CLARISSE - E se você visse as caras deles! zangados e raivosos agarravam-se ao primeiro par que encontravam. Depois iam encher a cara.
HENRIQUETA - Era para afogar as paixões. Ah, ah, ah!
VIRGÍNIA - Mandamos convidar-los a jantar conosco..
HENRIQUETA - Para mangarem deles?
CLARISSE - Sim, temos um plano para que eles paguem o que nos fez passar na Bahia.
HENRIQUETA - E depois?
CLARISSE - Depois? Veremos...
VIRGÍNIA - Henriqueta, e o seu marido?
HENRIQUETA - Trabalhando. Depois que perdeu tudo, fez-se procurador .. Pobre Jeremias! Mas eu sou bem feliz, porque ele agora me ama.
(Dentro dão palmas.)
CLARISSE - São eles! Henriqueta, recebe-os, enquanto nos vamos preparar.
BOLINGBROK, dentro - Dá licença?
VIRGÍNIA - Vamos. (Sai com Clarisse.)
HENRIQUETA - Pode entrar. Isto há de ser bom!
CENA III Henriqueta, Bolingbrok e John.
JOHN, da porta - Dá licença?
HENRIQUETA - Os senhores podem entrar.
JOHN, entrando - Minha senhora...
BOLINGBROK, para John - Este é mulher de Jeremias!
HENRIQUETA - Queiram ter a bondade de sentar.
BOLINGBROK - No precisa; obrigada. Dona Clarisse?
JOHN - Posso falar com Virgínia?
HENRIQUETA - Neste momento estão lá dentro, ocupadas. Esperarem um pouco, por favor...
BOLINGBROK - Mim não pode espera; quer fala a ela já.
HENRIQUETA - Ui!
JOHN - Bolingbrok!
BOLINGBROK - Eu grita, chama ela. Clarisse? (Gritando:) Clarisse?
HENRIQUETA - Não grite, que já a vou chamar. Safado! (Sai.)
JOHN - Esta louco?
BOLINGBROK, passeando pela casa com passos largos - John, oh, oh, mim está zanga...
JOHN - E eu também não estou muito contente; mas enfim, é preciso ter; estamos em casa de nossas mulheres.
BOLINGBROK - Yes, eu estar satisfeita de estar junto de Clarisse.
JOHN - E eu, de Virgínia. (Senta.) Há três meses que as vimos pela primeira vez pedir a mão ao pai. E agora voltamos ao principio...
BOLINGBROK, sempre passeando de um para outro lado - Yes, começa declaration outra vez...
JOHN - Que de acontecimentos, que de tribulações!... Mas você é que é a causa de tudo isto.
BOLINGBROK - Oh, este é forte! Culpada é tu, que dá conselho a mim. Maus conselhos.
JOHN - Sim? E tu, com estes maus modos?
BOLINGBROK - Oh, eu é que diz: minha ladrãozinho é mau, minha amorzinho é mau?... Oh, se não estar minha sócio... Eu dá soco.
JOHN, levantando-se – Você é que precisa de uns socos.
BOLINGBROK, chegando-se para John - Eu é que precisa, John? Eu é que precisa, John?
JOHN, gritando - É sim, maluco!
BOLINGBROK, gritando muito junto de John - Eu é que precisa, John?
JOHN, empurrando-o – Calado homem!
BOLINGBROK - Oh! (Arregaçando as mangas:) John, vamos joga soco? Vamos, John? Eu quer quebra o nariz...
JOHN – Cai dentro!
BOLINGBROK - Oh!
CENA IV Virgínia, Clarisse e os ditos.
CLARISSE, entrando - O que é isto, senhores?
BOLINGBROK, estático - Oh!
JOHN – Nada... não é nada.
BOLINGBROK, cumprimentando - Minhas comprimentas.
JOHN – Obrigado por nos convidar...
VIRGÍNIA - Queiram sentar-se. (Sentam-se)
JOHN, tossindo - Hum, hum!
BOLINGBROK, tossindo - Hum, hum! (As duas sorriem-se.)
JOHN - O dia hoje está fresco...
BOLINGBROK - Está bonita dia...
JOHN - E creio que teremos chuva...
BOLINGBROK - Muita chuva; a tempo está perturbada...
VIRGÍNIA, sorrindo-se - Bem vejo que está perturbado.
CLARISSE, desatando a rir - E muito... Ah, ah!
BOLINGBROK - Oh!
JOHN - Enfim, podemos conversar a sós.
BOLINGBROK - Yes... Mim estava sequiosa para vos ver.
CLARISSE - Sequioso? Quer um copo de água com açúcar?
BOLINGBROK - No, no. I thank you.
CLARISSE - Não faça cerimônia... Parece-me tão alterado.
BOLINGBROK, levantando-se - No quer! Oh!
JOHN, levantando-se – Não seria melhor falarmos sinceramente?
VIRGÍNIA, levantando-se - Como quiser, mas lembra das condições desse jantar. - nem uma palavra sobre o passado.
JOHN – Não quer ouvir a nossa justificativa?
BOLINGBROK - Oh, não dá orelha a nós?
JOHN - Se temos culpa, vocês também tem.

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VIRGÍNIA - Nós?
BOLINGBROK - Yes.
JOHN - Sem dúvida! Nos abandonaram...
VIRGÍNIA, com gravidade – Vocês acham que depois de nos enganar cruelmente, sujeitaríamos de boa vontade, a ser suas escravas? Felizmente
recobramos a nossa liberdade, e estamos resolvidas a não sacrificá-la de novo.
CLARISSE – Você nos traíram com suas lábias.
BOLINGBROK - My Clarisse!
JOHN - Virgínia, nunca me amou...
VIRGÍNIA - Mas convenha que muito pouco foi feito para alcançar o meu amor.
CLARISSE - Chega; deixemos de recriminações. Os senhores querem jantarem conosco.
BOLINGBROK, contente - Oh, by God!
JOHN, contente - É isto para nós de grande satisfação.
BOLINGBROK, à parte, para John - Elas gosta de nós, John. (Alto) Eu está muito satisfeita, muito contente janta com vós. Ah, ah, ah!
VIRGÍNIA - Henriqueta, nossa amiga, jantará conosco.
BOLINGBROK - Henriqueta, mulher de Jeremias? Jeremias está traidor.
CLARISSE - Jeremias é nosso amigo.
BOLINGBROK - Oh, pardon! Então é minha amiga.
VIRGÍNIA - Um favor que lhe quisera eu pedir...
JOHN - Ordenai.
VIRGÍNIA - Henriqueta gosta muito de empadas e pão-de-ló; será que poderiam comprar ai na padaria...
JOHN - Oh!
VIRGÍNIA - Como? Não querem?
JOHN - Eu vou, eu vou. (Sai apressado.)
CLARISSE – Também alface para salada...
BOLINGBROK - Eu vai, Miss, eu vai.
CLARISSE – Não é incômodo?
BOLINGBROK - Incômodo não; ... Eu compra alface, batata, repolha e nabos; eu traz tudo... Está muito satisfeita. Eu volta. (Sai.)
CENA V Virgínia, Clarisse e Henriqueta. Virgínia e Clarisse, logo que Bolingbrok sai, sentam-se e riem.
HENRIQUETA, entrando - O que é? Do que riem? Deles?
VIRGÍNIA, rindo-se - Ah, ah, ah! Isto é delicioso!
CLARISSE, rindo-se - Ah, ah, ah! É magnífico!
HENRIQUETA - Acabem de rir, e digam o que é.
CLARISSE - O meu ex-marido foi comprar alfaces e couves...
VIRGÍNIA - E o meu, empadas e pão-de-ló. Ah, ah!...
HENRIQUETA - Eles mesmos? Tão orgulhosos?
VIRGÍNIA - Pois então? Agora mudou de figura. Na Bahia nem queriam carregar o nossos Guarda-sol.
CLARISSE - E agora carregarão tudo quanto quisermos.
HENRIQUETA - Homens... Ou cordeiros quando dependem, ou leões quando nos governam. Se não precisássemos deles...
CENA VI Jeremias e os meninos. Jeremias virá vestido muito ordinariamente.
JEREMIAS - Viva!
VIRGÍNIA e CLARISSE - Sr. Jeremias!
JEREMIAS - Como passam?
VIRGÍNIA e CLARISSE - Bem.
HENRIQUETA - Que fazes você por aqui a estas horas?
JEREMIAS - Vim falar com estas senhoras.
VIRGÍNIA - Conosco?
JEREMIAS - Nem mais, nem menos.
CLARISSE - E para quê?
JEREMIAS - Seu pai encarregou ao seu procurador estes papéis. (Mostra-lhe uns papéis.) É o auto de anulação do vosso casamento com os meus
amigos íngles. O procurador, porém, que é um procurador muito procurado e tem muito que fazer, encarregou-me de dar andamento aos papéis.
Agora também trabalho com o procurador.
CLARISSE – Henriqueta já nos contou.
JEREMIAS - Muito bem. Recebi os papéis, e li os seus nomes, o dos nossos amigos Ingleses.pensei que isto pode ser coisa do velho Narciso das
Neves, e ainda vejo assinatura de suas filhas, não façamos nada sem consultá-las... Pus-me a caminho e eis-me aqui.
VIRGÍNIA - Muito lhe agradecemos.
JEREMIAS - Não há de quê.
HENRIQUETA – Muito bom meu amor.
JEREMIAS - Obrigado. Mas então, que querem que eu faça? Dá-se andamento aos papéis, ou não?
CLARISSE - Responde você Virgínia.
VIRGÍNIA - E por que não respondes tu?
HENRIQUETA - Ah, já sei! Não querem se arrepender. Pois decidirei eu.
JEREMIAS – Muito bem. O que quer?
HENRIQUETA - Não dê andamento a esses papéis.
CLARISSE - E por que?
HENRIQUETA - Porque bem depressa se arrependerão. Vocês ainda os amam...
VIRGÍNIA - E quem te disse?
HENRIQUETA - Isso não é preciso que se diga; adivinha-se.
CLARISSE - Pois bem, Jeremias, ainda amamos os nossos ingratos, e nem poderemos esquecer-los, por eles fugimos desta casa, e que para eles
vivemos dois meses... Nós, mulheres, não somos como os homens; o nosso amor é mais constante e resiste mais tempo.
HENRIQUETA - Está ouvindo?
CLARISSE - Mas em compensação, somos vingativas. Os nossos caros ex-maridos Primeiro penar um pouco, se quiserem ser perdoados. Vão se
curvar como nós nos curvamos, e obedecerem à nossa voz com humildade... Assim, talvez, o perdoamos.
JEREMIAS – Muito bom! Vou fazer com estes papéis o que fazem todos os procuradores – vou engavetar....

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CENA VII Entra Bolingbrok uma cesta cheios de hortaliças e frutas. E John com uma empada e um pão-de-ló na outra.
BOLINGBROK, entrando - Está alface e repolha, Miss.
CLARISSE - Oh, muito bem.
JOHN - E a empada e pão-de-ló.
VIRGÍNIA – Rápidos, não?.
BOLINGBROK - Para ser agradável a vós.
HENRIQUETA - Dá cá a empada.
JEREMIAS, ao mesmo tempo – Me dá a cesta.
BOLINGBROK - Jeremias está aqui!
JEREMIAS - Yes, my dear, dá cesta a mim. Nossa! Comprou o mercado inteiro?
BOLINGBROK - Para faze salada. (Indo para Clarisse:) Miss está contente?
CLARISSE, reprimindo o riso - Muito.
BOLINGBROK - Mim então está muito satisfeita.
JOHN - Querem ainda outra empada?
BOLINGBROK - Mais repolha e nabas?
VIRGÍNIA - Não, Agora vamos lá dentro ver como esta o jantar, Vocês arrumem a mesa.
CLARISSE - E os senhores terão a bondade de fazerem isto.
BOLINGBROK - Eu bota mesa? Oh!
JOHN - Querem que preparemos a mesa?
BOLINGBROK, à parte - Oh, este é muito! (Alto:) Mim não sabe faz doméstico; não quer.
CLARISSE - Ah, não quer? Está bem. (Mostrando-se zangada.)
JOHN - Pelo contrário, aceitamos com muito prazer. (Para Bolingbrok:) Quieto, que põem tudo a perder. (Alto:) Não é verdade Bolingbrok, que
temos nisso muito prazer?
BOLINGBROK - Oh, yes. ( parte:) Goddame! (Falso) Está contente bota mesa para nós janta; muito bom, está satisfeita, muito...
CLARISSE, com ternura - E eu te agradeço.
BOLINGBROK - Te agradeçe? Oh, oh! (Muito alegre.)
VIRGÍNIA - Mãos à obra! Tirem a toalha e pratos.
JEREMIAS - Melhor será que os senhores tirem primeiro as casacas....
VIRGÍNIA, CLARISSE e HENRIQUETA - É verdade!
BOLINGBROK - Mim não tira casaca!
CLARISSE – Tudo o que pedimos, fazem de má vontade!
BOLINGBROK - Eu tira. John, tira casaca. (Despem ambos as casacas. As três riem-se às escondidas.)
JEREMIAS - Agora sim, parecem mesmo uns criados ingleses.
VIRGÍNIA - Henriqueta, vamos ver o jantar. Já voltamos. (Saem as três, rindo-se.)
CENA VIII Bolingbrok, John e Jeremias.
JEREMIAS, rindo - Eis aí está como se doma o orgulho. (Alto:) John, põe esta mesa direito! Bolingbrok, adio, my dear, (sai)
CENA IX Bolingbrok e John.
JOHN, pondo a mesa - Então, que me diz?
BOLINGBROK, pondo a mesa - Quem dize que William Bolingbrok limpa pratas como uma cozinheiro, e carrega repolha e cesta?
JOHN – Isso só me mostra uma coisa, que cada vez a amo mais.
BOLINGBROK - Eu também, John. As garfos fica aqui... Mim está maluco por Clarisse.
JOHN - Aqui elas governam; lá nós governávamos.
BOLINGBROK - Yes. Nós está cativa aqui. Este é desagradável, mas está satisfeita de serve ela.
CENA X Entram Virgínia, Clarisse e Henriqueta, apressadas.
VIRGÍNIA, entrando - Escondam-se!
CLARISSE, entrando, ao mesmo tempo - Escondam-se!
HENRIQUETA - E depressa!
BOLINGBROK - O que é?
JOHN, ao mesmo tempo - O que foi?
CLARISSE - Meu pai e minha mãe! Se aqui os encontra, estamos perdidas!
BOLINGBROK - Oh, que fazer?
HENRIQUETA - Escondam-se, escondam-se!
JOHN - Mas onde? Onde?
VIRGÍNIA – Junto aos sacos de farinha, Tem dois sacos abertos entrem dentro deles..
CLARISSE - É verdade! Andem, andem! (As três ajudam a eles entrarem )
HENRIQUETA - Entrem!
JOHN – Ta cheio de farinha!
VIRGÍNIA - E o que tem isso? Entrem!
CLARISSE - Por quem sois, entrai, senão morreremos!
BOLINGBROK - Entra, John.
JOHN - Entrar?
VIRGÍNIA - É assim que nos amais?
HENRIQUETA – Anda logo.
VIRGÍNIA - Meu John, Pensa em mim!
CLARISSE - Meu Bolingbrok, só assim te perdoaremos, e tornarei a te amar.
HENRIQUETA - Entrem, entrem!
BOLINGBROK - John, entra; elas torna ama a nós. (Bolingbrok e John entram e elas dançam e riem.)
HENRIQUETA - Ah, ah, ah, que belo ensino!
VIRGÍNIA - Agora sim, estamos vingadas!
CLARISSE - Quantas casadas conheço que invejam agora a nossa posição... (Dança.)
HENRIQUETA - Está bom; não se demorem muito, que eles podem morrer respirando tanta.
VIRGÍNIA, saltando - Morrer? Isso não! Morto não me serve de nada.
CLARISSE, saltando - Para ensino, basta.

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