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MACHADO,
ED. 686 Campinas, 8 a 21 de maio de 2023 www.unicamp.br/ju
O EDITOR
Pesquisa da professora Lúcia
Granja (IEL), feita a partir
de contratos firmados entre o
editor Baptiste-Louis Garnier
e Machado de Assis, revela
que o escritor se envolveu
profundamente no processo
editorial de suas obras.
6e7
COVID
Uma tempestade perfeita 4
Tweets como termômetro 5
Método mapeia áreas com Aplicativo de celular ajuda A energia limpa e a busca
risco de deslizamentos 2 a reduzir consumo de sal 3 por novos catalisadores 8
Adaptação de árvores à seca Livro revisita vida, obra Histórias que fluem nas
afeta sequestro de carbono 9 e ideias de Paulo Freire 11 corredeiras do Piracicaba 12
professor Jefferson Picanço, o método de- locidade de fluxo, além de uma força de a de fluxo de detrito. Estou juntando os
senvolvido por Quiceno informa o local impacto significativa e longo escoamen- métodos já conhecidos na literatura”, ex-
mais suscetível à ocorrência de escorrega- to. Esse fluxo traz consigo uma energia plica a pesquisadora.
mentos rasos – que é quando o material se associada que chega a ser 40 vezes supe-
desprende do barranco e o talude começa rior à de uma enchente – quando o nível As bases
a se movimentar – e à formação do fluxo de água inunda uma casa, por exemplo, A pesquisa desenvolvida por Quiceno
de detritos, uma mistura de lama e mate- mas não chega a derrubar as paredes. teve como base o método Gides e o mode-
riais que desce pelos canais dos rios com Deslizamentos rasos são movimen- lo Shalstab, sendo que este último avalia o
grande energia e poder de destruição. tos de massa gravitacionais, caracteriza- potencial relativo para iniciação de desli-
Segundo a avaliação dos pesquisado- dos pelo deslocamento do solo ao longo zamentos rasos em terrenos íngremes, co-
res, os fluxos de detritos provocam os de- de superfícies de ruptura relativamente O professor Jefferson Picanço, orientador da pesquisa: bertos com solo de baixa permeabilidade.
“Método economiza esforços”
sastres mais graves. Trata-se de mistura pequenas e rasas. São geralmente de- O Gides, por sua vez, é uma meto-
de sedimentos e água, impulsionada pela sencadeados por chuvas extremas, mas dologia de mapeamento semiquantitati-
gravidade. Atinge mobilidade conside- podem se aglutinar e evoluir para um vo desenvolvida e implementada pelos
rável do espaço vazio alagado, saturado fluxo de detritos. metodologias disponíveis para avaliar o governos do Brasil e do Japão, como
com água ou lama, e apresenta alta ve- “O método desenvolvido pela Katerine movimento de massa, ainda existem al- parte do “Projeto de Fortalecimento da
serve para dizer quais são as áreas mais gumas limitações devido às especificida- Estratégia Nacional de Gestão Integrada
suscetíveis à ocorrência de escorregamen- des e condições de cada região de estudo. do Risco de Desastres Naturais”. Foi
tos e, depois que os fluxos de detritos vão Isso, segundo ela, inclui fatores geológi- ajustado e adaptado para o Brasil a par-
para o rio, apontar o local em que cessa o cos, ambientais, mecânicos, topográficos tir de 2013 e é usado para mapeamento
seu movimento, indicação que hoje não se e antrópicos. E são esses fatores que in- de perigos e para avaliação de risco de
consegue mapear com precisão”, explica o fluenciam no nível de precisão do méto- quatro fenômenos principais: falhas de
professor. “Ele não ajuda no mapeamento do, dificultando uma previsão mais pre- encostas, deslizamentos de terra, fluxos
de áreas muito grandes, como as de um cisa de áreas propensas a deslizamentos. de detritos e quedas de rochas.
município inteiro, mas indica áreas loca- “A novidade desse trabalho é a avalia- Quiceno conseguiu também auto-
lizadas onde o trabalho deve ser concen- ção integrada da suscetibilidade. Existem matizar o processo para extração dos
trado. Esse método economiza esforços”, outros métodos que foram testados para parâmetros morfométricos das bacias —
resume Picanço. essa avaliação, mas agora estou integran- como área, comprimento e redes de dre-
Andrea Katerine Vallejo Quiceno, autora do estudo: Na dissertação, a pesquisadora pon- do não só a avaliação de suscetibilidade nagens — a partir do Modelo Digital do
avaliação integrada da suscetibilidade dera que, apesar dos vários modelos e de escorregamento raso como também Térreo (MDT).
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Secretária Executiva de Comunicação Christiane Neme Campos Editor-chefe Álvaro Kassab Editores Pedro
Reitor Antonio José de Almeida Meirelles Coordenadora Fávaro Júnior, Raquel do Carmo Santos Chefia de reportagem Rachel Bueno Reportagem Adriana Vilar de Menezes, Carmo Gallo Netto, Felipe Mateus,
Geral da Universidade Maria Luiza Moretti Pró-Reitor Hebe Rios, Hélio Costa Júnior, Juliana Franco, Liana Coll, Mariana Garcia, Paula Penedo Pontes, Tote Nunes Fotos Antoninho Perri, Antonio Scarpinetti,
de Desenvolvimento Universitário Fernando Sarti Pró- Felipe Bezerra Projeto gráfico Luis Paulo Silva Editores de arte Alex Calixto de Matos, Paulo Cavalheri Atendimento à imprensa Ronei Thezolin, Sophia
Reitor de Pesquisa João Marcos Travassos Romano Pró-Reitor de Angeli Revisão Júlia Mota Silva Costa, Rodrigo Campos Castro Coordenadora do núcleo audiovisual Patrícia Lauretti Supervisora de TI Laura de Carvalho
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Cultura Fernando Antonio Santos Coelho Pró-Reitora de Pós-Graduação Bruna Mozer, Octávio Augusto Bueno da Fonseca da Silva Serviços técnicos Alex Matos, Américo Garcia Filho, Elisete Oliveira Silva, Mateus Fioresi,
Rachel Meneguello Chefe de Gabinete Paulo César Montagner Chefe Selvino Frigo Agradecimentos André Gustavo Gontijo Penha Impressão Gráfica Pigma Correspondência Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP
de Gabinete Adjunta Adriana Nunes Ferreira 13081-970, Campinas-SP. O Jornal da Unicamp é elaborado pela Secretaria Executiva de Comunicação (SEC) da Unicamp. Periodicidade quinzenal.
Campinas, 8 a 21 de maio de 2023
3
Criada na Faculdade
de Enfermagem,
ferramenta foi testada
durante dois meses e
comprovou ser eficaz
FELIPE MATEUS
felipeom@unicamp.br
Estudo detalha
implicações
da covid-19
a longo prazo
Trabalho conjunto da Unicamp e da
Universidade Johns Hopkins avalia efeitos
da doença no sistema cardiovascular
Integrantes da Força-Tarefa da Unicamp durante testagem na região central de São Paulo em 2021
FELIPE MATEUS
felipeom@unicamp.br
cidência dez vezes maior de infartos e 17 vezes maior de Organizando o conhecimento
AVCs entre pessoas que já haviam contraído o corona- Estudos de revisão sistemática, como o empreendido
vírus. “Com as vacinas e o relativo controle da doença, por Quinaglia e Sposito, cumprem uma função valiosa
havia mais tempo para avaliarmos os pacientes e os efei- no desenvolvimento científico ao estruturar o conhe-
Graças ao esforço coordenado da comunidade cientí- tos crônicos da doença. O infarto não era esperado como cimento global obtido por pesquisas isoladas. Segundo
fica de todo o mundo e ao consequente avanço da vaci- uma das manifestações da covid-19. As pessoas eram in- os pesquisadores, a pandemia foi um contexto em que
nação, hoje, a covid-19 está longe de impactar a vida das ternadas e, nos exames, não eram encontradas doenças a união de esforços e a necessidade de soluções rápidas
pessoas como fez nos piores momentos da pandemia. A coronarianas”, explica Sposito.
propiciaram uma intensa produção de dados, ainda que
história de sucesso, porém, não significa que a doença O estudo buscou sintetizar as pesquisas já desenvolvi- nem todos sejam confiáveis.
dispensa cuidados, nem que deixa de intrigar médicos das que associavam a covid-19 com doenças vasculares.
e pesquisadores. Depois da grande preocupação com os “A revisão sistemática, associada a uma meta-aná-
No total, 318 artigos foram encontrados nas plataformas
sintomas respiratórios agudos provocados pela infecção MedRxiv e LitCovid (PubMed). Desses, 66,4% foram ex- lise, fornece dados confiáveis e serve para compilar o
viral, são os efeitos crônicos prolongados do vírus que, cluídos por não serem estudos sólidos ou não apresenta- que se conhece até o momento ou consolidar o conhe-
hoje, chamam a atenção. Um estudo de revisão sistemá- rem bases confiáveis. A análise dos 107 artigos restantes cimento em uma direção, excluindo dúvidas que pos-
tica de artigos científicos realizado pela Unicamp e pela mostrou que a infecção pelo SARS-CoV-2 compromete sam surgir no caminho, permitindo avanços consis-
Universidade Johns Hopkins (EUA) debruça-se sobre as células do endotélio, camada celular que reveste os va- tentes”, afirma Quinaglia.
uma das implicações de longo prazo da doença: seus efei- sos sanguíneos e é responsável pela regulação do sistema A conclusão de que o comprometimento do sistema
tos no sistema cardiovascular. vascular. Isso prejudica funções importantes, como o vascular decorre da infecção pelo SARS-CoV-2 abre ca-
O artigo, publicado em 2021, foi um dos dez mais ci- transporte de oxigênio e o controle da pressão arterial, minhos para tratamentos mais eficientes. “No início, não
tados da revista Atherosclerosis naquele ano e mostra a im- além de facilitar a formação de coágulos. pensamos que fosse um problema relacionado aos va-
portância de estudos de revisão sistemática para melhorar “Há doenças dentro dos vasos e em torno deles, cau- sos sanguíneos, mas à coagulação. Por isso, foi comum a
a qualidade da produção científica. O trabalho tem auto- sando uma constrição, e também nos receptores envol- prescrição de anticoagulantes antes de descobrirmos que
ria de Thiago Quinaglia, pesquisador de pós-doutorado vidos na regulação da pressão arterial, o que prejudica a os medicamentos não funcionavam”, lembra Sposito.
no Hospital Geral de Massachusetts, em Boston, e Andrei oxigenação de tecidos e órgãos”, detalha Quinaglia. Ele O pesquisador comenta que, atualmente, parte do de-
Sposito, professor da Faculdade de Ciências Médicas lembra que esses não são efeitos isolados, mas que se safio é compreender os efeitos metabólicos da doença –
(FCM) e coordenador do Centro de Pesquisas Clínicas combinam com as demais inflamações provocadas pela como o aumento na incidência de diabetes – e neurológi-
(CPC) da Unicamp. Na época, Quinaglia era pesquisador infecção. “É uma tempestade perfeita.” Além das doen- cos, como a perda de memória relatada por pacientes. O
da Johns Hopkins e propôs unir esforços com a Unicamp ças vasculares, a desregulação desse sistema desencadeia especialista menciona, ainda, os problemas socioeconô-
na busca por respostas sobre a covid-19. “A Unicamp uma série de outros problemas, como disfunções renais, micos existentes no país e no mundo, intensificados pela
foi fundamental para que isso fosse possível. Graças à gastrointestinais e até manchas na pele. “Quando o sis- pandemia, e o estresse psicossocial coletivo. “Esses fatores
Universidade e a uma bolsa da Sociedade Brasileira de tema [vascular] não funciona, começam a surgir proble- contribuem para o aumento no número das doenças car-
Cardiologia, pude estar em um local que foi referência em mas em todo o corpo”, aponta Sposito. díacas que temos observado”, conclui o médico.
pesquisas sobre a covid-19”, recorda Quinaglia.
No Brasil, entre os dias 23 e 29 de janeiro de 2022,
mais de 1,3 milhão de novos casos da doença foram re-
gistrados e, entre os dias 4 e 10 de abril de 2021, 21 mil
mortes, fazendo desses dois períodos os piores da pan-
demia no país, segundo dados do Conselho Nacional de
Secretários de Saúde (Conass). Em abril de 2023, houve
uma média de 50 mil novos casos da doença, com cerca
de 300 mortes por semana.
‘A mão visível do ed
Campinas, 8 a 21 de maio de 2023
editor invisível’
Campinas, 8 a 21 de maio de 2023
Imagens: Reproduçao
de livros, inclusive os didáticos, obtendo apoio do go- mas ele só rompeu as fronteiras nacionais dois anos gunda metade do século XX. Não foi algo alcançado
verno e uma espécie de subvenção imperial para in- após sua morte, destaca a professora. O escritor foi em vida, apesar das tentativas e do controle editorial
vestir em livros que construíssem a imagem nacional. traduzido para o francês em 1910. “Hoje em dia, há que tentou manter.”
A Livraria Garnier funcionou de 1844 a 1934. Depois um grande interesse internacional pela obra macha-
que encerrou as atividades no Brasil, foi vendida para diana, mas isso começou a se construir a partir da se- Desromantização
a Ferdinand Briguiet, que abriu a Livraria Briguiet- De acordo com Granja, quase sempre a crítica so-
Garnier. Grande parte do acervo terminou nas mãos bre Machado de Assis é muito romântica. “A pesquisa
da Editora Itatiaia, em 1973, para depois chegar à Foto: Antoninho Perri está colocando os traços materiais do homem na traje-
Editora Martins, que, por fim, destinou parte desse tória do artista genial.” Ou seja, o efeito é revelar um
material à pesquisa. Machado de Assis mais humano, desmistificando a
imagem do gênio que ele conseguiu projetar no Brasil
Propriedade literária para a posteridade. “Isso não afeta a genialidade dele,
Machado tinha consciência de que era necessário o mas o desromantiza”, afirma a professora.
próprio autor proteger sua propriedade literária. Um A docente entende que a imagem construída do es-
dos indicativos disso é que ele era detentor, no Brasil, critor tem muito do homem e de uma série de outros
da propriedade literária do português Faustino Xavier fatores: o seu papel como editor, a circulação, o meio
de Novais (seu cunhado, irmão de sua esposa, Carolina intelectual e a própria intervenção na atividade edi-
Augusta Xavier de Novais). torial. “Isso não era exclusividade da época. Hoje em
A pesquisadora observa que, embora não houvesse dia ainda existe essa luta dos escritores na busca pela
legislação sobre propriedade literária ou intelectual à editora que vai melhor representar sua obra.” Granja
época, os debates sobre os temas vinham ganhando es- acredita que o papel da sua pesquisa é inserir o trabalho
paço. “É importante registrar que o processo de produ- de Machado em seu contexto e no seu tempo.
ção do livro no Brasil era bastante internacionalizado.” A pesquisadora sugere que o reconhecimento de
Um livro poderia ser escrito no Brasil, depois ser com- Machado andou junto com a sua capacidade de diver-
posto numa tipografia francesa e publicado em outra sificar, em benefício próprio, os contratos estabeleci-
tipografia em Viena, na Áustria, como aconteceu, em dos com Garnier. “O escritor conseguiu organizar a
1862, com um dos livros de poesia de Gonçalves Dias, recepção e a sua projeção, porque era um homem que
exemplifica a professora. tinha contato com todos os intelectuais da época e com
Garnier era um francês que editava livros no Brasil, o meio editorial. Para além disso, atuou em periódi-
mas os imprimia em Paris ou em Viena. Machado se A professora Lúcia Granja, coordenadora do projeto: “A pesquisa está cos desde os anos 1850 até a fundação da Academia
esforçou para conseguir circulação internacional, colocando os traços materiais do homem na trajetória do artista genial” Brasileira de Letras (ABL), em 1897”, salienta Granja.
8 Campinas, 8 a 21 de maio de 2023
FELIPE MATEUS
felipeom@unicamp.br
Árvores mortas na Floresta Amazônica: estudo demonstra como a adaptação das espécies à seca pode afetar sua capacidade de sequestrar carbono da atmosfera
A
té que ponto as árvo- As amostras foram submetidas a testes que simularam sa. Assim, são florestas mais resistentes à seca e possuem
res da Amazônia su- um processo de seca na floresta. Conforme o ramo seca- dinâmica de vida mais lenta e conservativa. Já no oeste,
portam condições de va, os pesquisadores avaliavam o quanto a condução de onde os solos são mais férteis, a dinâmica de vida é mais
seca? Um estudo con- água se mantinha nos ramos e em que ponto a tensão ne- intensa. São árvores que investem mais no crescimento e
duzido por pesquisa- cessária para esse transporte excedia o limite da espécie, na produtividade, sendo mais vulneráveis às secas.
dores da Unicamp, fazendo com que ocorressem o embolismo e a formação No entanto, a capacidade de suportar secas pode se
da Universidade de de bolhas de ar nos vasos internos. Na natureza, situações voltar contra a própria floresta. Por serem espécies que se
Leeds (Reino Unido) de estresse hídrico desse tipo podem desencadear nas ár- aproximam muito do limite de estresse, há pouca margem
e de instituições da América do Sul e Europa analisou as- vores processos responsáveis por matá-las. “Cada espécie de segurança, tornando-as mais vulneráveis às mudan-
pectos importantes da dinâmica de vida de espécies de ár- de árvore, a depender do local, vai ter que transportar a ças climáticas que, hoje, atingem em cheio a Amazônia.
vores encontradas em diferentes partes da floresta e des- água sob tensões maiores ou menores. Seria um tipo de “Apesar de as plantas estarem adaptadas, o clima tem se
cobriu que a capacidade de lidar com a seca varia de região adaptação à seca”, explica Oliveira. Os dados obtidos fo- tornado tão seco que elas não conseguem mais resistir à
para região, o que sustenta a ideia de que a Amazônia é um ram comparados com os das folhas coletadas na estação seca”, pontua Oliveira. Isso traz impactos também à ca-
bioma muito mais diverso e heterogêneo do que supõe o seca e, a partir disso, o limite de estresse hídrico de cada pacidade de capturar carbono da atmosfera. De acordo
senso comum. espécie foi determinado. com o estudo, porções mais próximas do limite de estres-
Publicada na revista Nature, a pesquisa também ex- Os resultados foram classificados entre amostras se hídrico estocam menos carbono se comparadas às que
plica como a adaptação das espécies à seca pode afetar de regiões que permanecem sempre úmidas, áreas em mantêm margens de segurança maiores. “São regiões que
sua capacidade de sequestrar carbono da atmosfera, que estações úmidas e secas se alternam e regiões que já se tornaram mais emissoras que captoras de carbono.”
concluindo que existem porções da floresta que, pos- margeiam outros biomas, como é o caso da porção sul,
sivelmente, devido ao estresse hídrico ao qual são sub- próxima ao cerrado e às fronteiras agrícolas, que pos-
metidas, já emitem mais carbono do que absorvem. O sui maior índice de seca. A porção sul, descobriram os
trabalho foi coordenado por pesquisadores brasileiros e cientistas, encontra-se atualmente fora de seu limite fi-
conta, entre seus autores, com Rafael Silva Oliveira, pro- siológico, com margem de segurança negativa, prova-
fessor do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, e Júlia
Tavares, doutora em Geografia pela Universidade de
velmente devido às mudanças climáticas já ocorridas.
São árvores que suportam maior tensão para manter o
RAIO X DA DIVERSIDADE
Leeds, que é, atualmente, pesquisadora na Universidade transporte de água, mas operam mais próximas do li-
A relação existente entre características fisio-
Uppsala (Suécia), além de outros pesquisadores da miar de falha hidráulica. Já as das regiões constantemen-
lógicas das árvores e o potencial da floresta de
Europa, do Brasil, do Peru e da Bolívia. te úmidas têm menos adaptações às secas. No entanto, estocar carbono foi um resultado inédito obtido
O estudo faz parte do Tremor (sigla em inglês para por estarem menos expostas ao estresse hídrico, contam pela pesquisa. Com base nesse conhecimento, é
“mortalidade de árvores”), importante projeto financiado com margem de segurança maior. possível apontar zonas mais propensas não só aos
pelo Conselho de Pesquisa sobre Ambiente Natural do Na comparação apenas entre florestas que alternam efeitos das mudanças climáticas, mas também
Reino Unido, cujo supervisor é David Galbraith, também períodos úmidos e secos, há diferenças entre as porções às atividades humanas, como o desmatamento
brasileiro. O objetivo do projeto é compreender os meca- leste e oeste. No leste, as florestas crescem em solos menos e as queimadas. Tavares adverte que estudos já
nismos e as consequências do aumento na mortalidade de férteis, o que aumenta o custo de produção de biomas- apontam para o aumento da mortalidade vegetal
árvores na Amazônia. em áreas onde há maior estresse. “Não é que essas
espécies não estejam adaptadas, e sim porque o
A coleta de amostras das plantas para o estudo foi
Foto: Divulgação clima muda muito intensamente.”
realizada em 11 sítios, locais da floresta de inventário
Os autores ressaltam a importância da pesqui-
permanente, onde os pesquisadores conhecem e acom-
sa para que o meio científico tenha uma compre-
panham o desenvolvimento de todas as espécies de ár-
ensão maior da diversidade amazônica. “Quando
vores. Os sítios abrangem porções do centro-leste da pensamos em floresta tropical, temos a imagem de
Amazônia (mais próximas de Manaus e do Pará), do sul uma floresta homogênea, totalmente úmida. Mas
(já no Mato Grosso), e no oeste, incluindo pontos lo- existem áreas diversas dentro da Amazônia, com
calizados no Estado do Acre, no Peru e na Bolívia. Ao espécies adaptadas à seca”, exemplifica Oliveira.
todo, foram extraídas amostras de 540 árvores, compre- Segundo ele, a maior parte dos estudos relativos
endendo 129 espécies. ao tema consideram apenas a porção centro-leste
Os ramos das plantas foram coletados das copas, a da Amazônia, justamente a que se mostra mais
uma altura de 30 a 40 metros, durante as estações úmi- resistente à seca. “Se tomamos como referência
da e seca do ano. Para tornar perceptíveis as condições apenas as árvores da porção centro-leste e os
das árvores em seu ponto máximo de hidratação, as co- dados sobre como elas responderam às secas
letas ocorreram por volta das 3 horas da madrugada. nos últimos 20 anos, por exemplo, e adotarmos
“Abranger essa vasta escala da Amazônia é algo muito isso como uma verdade para toda a Amazônia,
grande; precisamos ser um pouco loucos para fazer”, diz corremos o risco de subestimar a vulnerabilidade
Rafael Silva Oliveira, um dos autores do artigo publicado da floresta”, analisa Tavares.
Tavares entre risos. “Encontramos, contudo, as pessoas na Nature, em trabalho de campo: coleta de amostras das
certas para encarar esse desafio.” plantas para o estudo foi realizada em 11 locais
10 Campinas, 8 a 21 de maio de 2023
À sombra da mangueira,
sob a luz da história
Fotos: Antoninho Perri
Livro de professora da
Faculdade de Educação revisita
a trajetória de Paulo Freire
MARIANA GARCIA
marianagarcia@unicamp.br
do rio Piracicaba
Cientista social desvela
relações que fluem junto
ao curso de água
LIANA COLL
lianavnc@unicamp.br
A orientadora, professora Daniela Manica, e Fernando Camargo, autor da tese: trabalho textual e imagético