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Prefácio:

Vivo em uma época de efervescência artística e


intelectual, um período de paixão e revolução, onde a
emoção paira sobre a razão. Estou imersa nesse
universo romântico e fantástico, onde a busca pelo
sublime e o amor à natureza são os pilares de nossa
existência.

Nestes tempos, o Romantismo inspira poetas e


escritores a mergulhar nas profundezas da alma
humana, a explorar a beleza das paisagens selvagens e
a celebrar os heróis trágicos e as paixões ardentes. As
histórias que leio e escrevo refletem nosso desejo de
transcender o mundo material e alcançar o inefável, o
misterioso, o sobrenatural.

Somos fascinados pelo lado sombrio da natureza


humana, pelas emoções e experiências que desafiam
nossa compreensão e nos conduzem ao limiar da
loucura. Nossas obras buscam capturar a essência das
emoções mais intensas e das experiências mais
extremas, expressando-as através da linguagem poética
e das palavras simbólicas.

Acreditamos na importância do indivíduo e na


liberdade criativa, rejeitando as normas e convenções
impostas pela sociedade e pela tradição. Nossa arte é
uma forma de expressão autêntica, um grito de rebeldia
contra a opressão e a mediocridade, um chamado para
despertar o espírito humano e libertá-lo de suas
correntes.

Enquanto escritora, encontro inspiração em meus


próprios sentimentos e emoções, na beleza que me
cerca e nas histórias de amor e tragédia que ecoam
através dos séculos. Busco, assim como meus
contemporâneos, criar obras que toquem o coração e a
alma, que levem a questionar nossa própria existência
e a encontrar um sentido para a vida em meio ao caos e
à incerteza.

- Luna Celestine
1823
Luna à luz da lua caminhava pelas margens do rio, onde
a bruma dançava ao redor das árvores e a iluminação
da noite pintava a superfície das águas com um brilho
prateado. Seus passos eram leves, guiados pelo som
dos grilos e pelo murmúrio do vento, que sussurrava
histórias e segredos em seu ouvido.
Enquanto caminhava, Luna buscava a ideia para seu
próximo conto, ela queria uma história que pudesse
capturar a essência do Romantismo e tocar a alma de
todos que a lessem. Ansiava por criar algo tão belo e
profundo quanto as obras de seus ídolos literários
contemporâneos, como Mary Shelley e Lord Byron.
Luna avistou ou imaginou ter visto, do outro lado das
águas, uma figura solitária - uma mulher absorta em
suas anotações, escrevendo freneticamente em um
diário. A imagem dessa mulher despertou em Luna
uma intensa curiosidade para saber o que ela estava
escrevendo, e um sentimento de conexão que não
conseguia explicar.
Mesmo após o retorno à sua escrivaninha, Luna não
conseguia esquecer a figura da mulher à beira do rio. A
cena continuava a visitar seus pensamentos, e em breve
a semente da ideia para o conto perfeito começou a
germinar em sua mente. Inspirada pela mulher que vira,
Luna concebeu a história de uma escritora de contos
que se tornava obcecada pela busca de sua obra-prima.
A personagem dedicava cada momento de sua vida à
criação do conto, deixando de lado tudo o mais.
À medida que Luna desenvolvia a trama, ela se
surpreendia com a facilidade com que as palavras
fluíam de sua pena. As frases jorravam de seu coração
e se derramavam sobre o papel. A personagem da
escritora obcecada ganhava vida e personalidade,
tornando-se mais real a cada linha escrita. A história se
desenrolava de forma natural, como se Luna estivesse
apenas transcrevendo uma história que já existia em
algum lugar, à espera de ser revelada.
Conforme a história avançava, Luna começou a
perceber as semelhanças entre a personagem e si
mesma. A obsessão de sua criação literária se refletia
em sua própria vida, e aos poucos, Luna se tornava a
imagem viva da personagem que havia concebido.
Cada vez mais, ela se dedicava exclusivamente à
escrita, negligenciando outros aspectos de sua vida e
deixando-se consumir pela história que criara.
Luna se isolava cada vez mais do mundo, recusando
convites para eventos sociais e ignorando as
preocupações de sua família e amigos. Ela saía de casa
somente para buscar inspiração, em bosques e jardins,
sempre sozinha, sempre ao cair da noite. Envolta pelas
sombras e pela quietude, ela permitia que sua
imaginação se fundisse com a beleza misteriosa da
natureza. O silêncio noturno tornou-se seu refúgio.
Tudo o que importava era a busca pela perfeição
literária, e nada mais.
A vida de Luna e a de sua personagem se entrelaçaram
a ponto de tornarem-se indistinguíveis uma da outra.
Ela estava completamente imersa no mundo de sua
criação, e começava a questionar se a mulher que vira
à beira do rio era fruto de sua imaginação, ou um
presságio do caminho que estava prestes a trilhar. O
que antes era apenas mais uma história, se
transformava em uma jornada pessoal e inescapável.
Em seus sonhos, ela se via como uma personagem
dentro de seu próprio conto, vivendo as emoções e
desafios de suas criações. Cada vez mais, ela se perdia
em seus devaneios, incapaz de distinguir onde
terminava a escritora e começava a personagem. Um
dia, Luna despertou de um sonho profundo, em que
havia vivido uma história de amor trágico e intenso, tão
vívida, que ao acordar, as lágrimas ainda escorriam
pelo seu rosto. Quando olhou para o papel em sua
escrivaninha, percebeu que as palavras que haviam
surgido em seu sonho estavam ali, escritas à mão.
Luna, completamente consumida por sua criação,
encontrava-se envolvida por uma atmosfera misteriosa
e inquietante. As fronteiras entre a realidade e a ficção
se dissolveram diante de seus olhos, e ela sentiu que
algo oculto e profundo se escondia nas entrelinhas de
sua história. Inspirada, ela decidiu seguir sua intuição e
explorar o desconhecido.
Naquela noite serena, a escritora obcecada encontrava-
se imersa em um devaneio, passeando por um jardim
iluminado pelo luar. O suave murmúrio do vento
parecia sussurrar segredos há muito esquecidos, e a
beleza etérea da paisagem despertava nela uma mistura
de fascínio e melancolia. Foi então que a revelação
enigmática atingiu sua mente.
Luna compreendeu, de repente, que ela mesma era a
personagem dentro do conto. Sua busca pelo sublime,
seu anseio por transcender a realidade e sua própria
existência eram apenas parte da história que ela nunca
conseguia terminar. A angústia e a obsessão que a
afligiam não passavam de elementos tecidos
cuidadosamente por um autor misterioso, alguém que
orquestrava sua vida como se brincasse com um
fantoche.
A descoberta trouxe uma sensação de espanto e
admiração, fazendo-a questionar a própria natureza da
realidade. Seria ela apenas um fruto da imaginação de
outro autor, uma personagem em um conto romântico,
condenada a vagar pelas páginas de sua própria
história? Sendo uma autêntica escritora romântica,
Luna abraçou a revelação com curiosidade. Se ela era,
de fato, uma personagem, talvez houvesse uma maneira
de transcender sua condição e reivindicar o controle
sobre seu próprio destino.

Tomada pela revelação enigmática e determinada a


reescrever sua história, Luna decidiu enfrentar o
destino e dar um final à sua criação. A relação entre
artista e obra, e o processo criativo havia se tornado um
labirinto emaranhado de obsessão e paixão.
Empunhando sua pena com fervor ela se lançou ao
desafio de escrever o último capítulo de seu conto.

Luna acreditava que, ao enfrentar e concluir o processo


criativo que a mantinha cativa, alcançaria a liberdade e
a realização que tanto ansiava. Ela mergulhou nas
profundezas de sua própria alma, explorando cada
nuance de sua conexão com a personagem e a história
que a rodeava. O destino de sua criação e o de si mesma
estavam intrinsecamente entrelaçados.

No entanto, a cada vez que Luna pensava ter alcançado


o desfecho da história, um novo obstáculo ou
reviravolta surgia, impedindo-a de concluir o conto.
Ela mergulhava cada vez mais profundamente em sua
história, tentando desvendar o mistério que a impedia
de alcançar o fim. A angústia e a obsessão por
encontrar um desfecho para sua história pareciam
amplificar-se a cada palavra que escrevia. Cada
tentativa de encontrar uma saída apenas a levava a se
perder ainda mais em sua própria criação.
Luna sabia que, talvez, não houvesse um final para sua
história. A verdadeira essência do Romantismo residia
na busca incessante pelo sublime, na jornada
emocional e espiritual que transcende a própria
realidade. A angústia e o anseio por um desfecho eram,
afinal, parte intrínseca de sua natureza como
personagem e como escritora.

O labirinto do processo criativo revelou-se uma jornada


complexa, prazerosa e agonizante, à medida que Luna
tentava desvendar os segredos de sua própria existência
e da relação enigmática entre criador e criação. E,
enquanto ela buscava incessantemente dar um fim ao
seu conto, a obsessão pela história e pela personagem
apenas se intensificava, consumindo-a e
transformando-a no verdadeiro reflexo de sua própria
obra.
Posfácio:

Após a morte de Luna Celestine, sua história foi


descoberta e publicada, tornando-se uma das obras
mais aclamadas do Romantismo. Os leitores se
emocionavam com a intensidade e a beleza da escrita,
e a própria história de Luna se tornou um símbolo de
paixão e da busca incessante pelo sublime. O legado de
Luna Celestine permaneceu vivo para as mentes e os
corações de todos aqueles que se aventuram nas
profundezas emocionantes da criação artística, e até
hoje influencia autores e leitores, contribuindo para o
enriquecimento da cultura e do pensamento humano.

O conto perfeito de Luna Celestine viveu através dos


séculos, um testemunho do poder da imaginação e da
eterna conexão entre o artista e sua obra, entre a vida e
a literatura, exemplificando a luta do artista em busca
de significado e transcendência através de sua arte. Em
cada palavra escrita por Luna, em cada emoção e
pensamento que ela compartilhou, encontrava-se a
verdadeira essência do Romantismo, eterno e imortal.

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