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The
Elgar companion to classical economics. Cheltenham, UK; Northampton, MA, USA,
Edward Elgar, 1998. p. 440-445.
Excedente
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tinha que ser conciliado com o fato óbvio de que ele nunca se torna nulo. Então a ideia
naturalmente emergiu de que deve existir um mínimo, maior do que zero, no qual a
pressão descendente sobre o salário real cessa (cf. GAREGNANI, 1990: 118-22).
Com base na determinação do salário real que acabou de ser esboçado, o
excedente se revela como o aspecto material dos outros rendimentos que não os salários.
E se, para concentrar a atenção sobre os lucros, as demais rendas são assumidas
inexistentes, todo o excedente corresponde ao conteúdo físico dos lucros. A noção de
excedente, assim, auxiliou Ricardo e Marx a não perderem de vista qual é a fonte dos
lucros mesmo sob o véu dos valores das mercadorias. Como esses autores e, mais
recentemente, Sraffa mostraram (embora de apenas o último sobre as bases de uma
analise plenamente correta dos preços), os lucros não podem surgir como um fenômeno
puro de preço a partir dos atos de compra e venda de mercadorias – isto é, a partir da
“esfera da circulação”. A condição necessária para que os lucros sejam obtidos, e,
portanto, para sua presença nos valores de troca das mercadorias, é a obtenção de um
excedente a partir do processo de produção. Esta conclusão é provada por Sraffa quando
ele mostra que nos preços normais das mercadorias não há espaço para lucros se a
economia não é capaz de produzir um excedente material (SRAFFA, 1960, capítulo I).
Incluindo a subsistência entre os meios de produção e assumindo, por exemplo, que três
mercadorias sejam produzidas, uma economia sem excedente seria caracterizada pelo
seguinte conjunto de equações:
A=A a + Ab + A c
B=Ba + Bb + Bc (1)
C=C a+ Cb +C c
A pa= A a p a+ B a pb +C a p c
B p b= Ab pa + Bb p b +C b pc
C pc = A c pa + B c p b + C c p c
Uma vez que uma das mercadorias, digamos a mercadoria a, deva ser escolhida
como o numerário dos preços, com consequentemente pa=1, nas três equações acima
existe apenas duas incógnitas, pb e pc . Mas se a equações (1) se mantêm, uma dessas
equações de preço não é independente das outras, como poder visto ao multiplicar cada
uma das equações (1) pelo preço da respectiva mercadoria e adicioná-las. Portanto, sob
essas condições, apenas duas das três equações seria independentes, sem espaço para
qualquer incógnita ser inserida nelas. Se, pelo contrário, a economia produz um
excedente, de modo que pelo menos uma das relações (1) o sinal = é substituído pelo
sinal >, as três equações de preço são todas independentes, e haverá espaço para uma
terceira incógnita – a taxa de lucro geral, r. Então as equações de preço tomam a forma
usual (SRAFFA, 1960: capítulo II):
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A pa=( A a p a+ B a pb +C a p c ) ( 1+r )
B p b=( A b pa + Bb pb +C b pc ) ( 1+r )
C pc =( A c pa + Bc p b +C c p c ) ( 1+r )
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meio desses canais, e assim, em última análise, ter uma influencia sobre os níveis das
taxas de juros.
Nos trabalhos dos clássicos, a disponibilidade de um excedente é uma condição
necessária para a acumulação de capital. Para a maioria deles também era visto como
uma condição suficiente, pelo menos no que diz respeito à parcela do excedente que
assume a forma de lucros: na verdade, estes últimos são em grande parte poupados, e
aqueles autores assumiam que qualquer decisão de poupança se transformaria, direta ou
indiretamente, em investimento (ver, por exemplo, RICARDO, Works, I, pp. 290-91,
396; cf. também GAREGNANI, 1978: 338-91).
Podemos agora fazer uso do princípio de Keynes da independência do
investimento das decisões de poupança de forma a reconsiderar a relação entre
excedente e acumulação (a este respeito, ver também CICCONE, 1994). Admitamos,
por enquanto, que a subsistência é inteiramente consumida, de modo que a capacidade
da economia produzir um excedente físico é ainda uma condição necessária para a
acumulação. Podemos excluir, entretanto, essa capacidade sendo também uma condição
suficiente. A independência do investimento da poupança implica, aplicando as
concepções keynesianas, que qualquer excesso de renda excedente poupada acima do
investimento “desapareceria” por meio da redução do tamanho absoluta tanto do
excedente como do produto social, em uma extensão suficiente para reestabelecer a
igualdade entre produto e gasto, e, portanto, entre as decisões de poupança e
investimento. Segue-se que, dado o nível de subsistência, e consequentemente a relação
Ls
entre as quantidades de trabalho mencionadas acima, a magnitude de Ls assim como
Lv
a Lv , será menor, menor o nível de investimento (líquido).
De qualquer forma, com base em uma consideração adequada da noção de
subsistência, mesmo a premissa de que a poupança venha apenas das rendas excedentes,
para que um excedente seja estritamente necessário para a acumulação, não precisa ser
válido em geral. Em uma sociedade desenvolvida, a subsistência pode incluir a
capacidade do trabalhador poupar alguma parcela do salário, por exemplo de forma
sustentar seu padrão de vida após a aposentadoria, para fornecer a educação futura das
crianças, e assim por diante. Em tais casos a “propensão a poupar” dos trabalhadores
pode ser positiva mesmo ao nível de subsistência dos salários, e com respeito para a
formação de poupanças para a produção de um excedente não seria, em princípio, uma
condição necessária para a acumulação de capital. Naturalmente, que isto não nega que
os lucros sejam uma característica inerente de uma economia capitalista, e que sob essa
forma de produção a disponibilidade de um excedente é de fato um requisito para a
acumulação, bem como para o processo de produção em geral, a ser realizado.
Ver também:
Bibliografia:
Ciccone, R. (1994), ‘Surplus approach’, in P. Arestis and M. Sawyer (eds), The Elgar
Companion to Radical Political Economy, Aldershot: Edward Elgar.
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Garegnani, P. (1984), ‘Value and distribution in the classical economists and Marx’,
Oxford Economic Papers, 36,291-325.