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ECONOMIA POLÍTICA II

2.ª Turma – Exame de 23 de Julho de 2021 – 4.ª Sessão

I
Diga o que entende por:
a) Jogo de soma zero;
Um jogo – no fundo uma qualquer interacção estratégica entre diferentes agentes – diz-se de soma
zero se os ganhos de cada um dos participantes implicam perdas equivalentes do(s) outro(s). Por
exemplo: a final do Campeonato da Europa (de uma qualquer competição desportiva) foi um jogo
de soma zero – um ganhou o que o outro perdeu. Nem sempre é assim: há jogos em que as somas
dos ganhos excedem as perdas (vg, o comércio internacional), tal como há outros em que as perdas
excederiam os ganhos (vg, uma guerra atómica).

b) Operações passivas e operações activas;


As operações bancárias implicam alguma simetria: pode dizer-se que as famílias e as empresas
emprestam dinheiro aos bancos (porque recebem por isso uma taxa de juro), tal como se pode
dizer que os bancos emprestam dinheiro às famílias e às empresas (e cobram por isso uma taxa
de juro). A escolha do sujeito em relação ao qual se aferem as operações de que resultam créditos
(e por isso se recebe uma taxa de juro) ou débitos (e por isso se pagam juros) determina que
empréstimos são activos e que “empréstimos” são passivos. O sujeito é o sistema bancário (não
as Famílias nem as Empresas), de modo que as operações passivas são aquelas em que os bancos
ficam devedores (dos depósitos) e pagam juros, e as operações activas são aquelas em que os
bancos ficam credores e recebem juros. Para justificar o negócio, as taxas de juro devem ser mais
baixas nas operações passivas do que nas activas (que se traduzem, essencialmente, em aberturas
de crédito ou operações de desconto de títulos de crédito).

c) Preferência pela liquidez;


A preferência pela liquidez é uma designação introduzida por Keynes para explicar uma procura
autónoma de moeda. Ao contrário dos economistas que o precederam, que assumiam que a moeda
só interessava aos agentes económicos para obterem bens e serviços – era vista como um véu que
obscurecia as relações de troca fundamentais, que eram as que interessavam aos agentes e que
tinham a sua expressão última na lei de Say (os produtos trocam-se por produtos) – Keynes
admitiu que a moeda pudesse ser considerada ela própria um bem. A preferência pela liquidez
seria sustentada no motivo transacções (os agentes económicos precisam de manter certas
quantidades de moeda em saldos líquidos para fazer face às necessidades aquisitivas da sua
existência), no motivo precaução (os agentes económicos preferem manter certas quantidades de
moeda em saldos líquidos para fazer face a contingências da sua existência), e no motivo
especulação (os agentes económicos preferem manter certas quantidades de moeda em saldos
líquidos para poderem tirar partido das oscilações dos valores dos títulos). Incluía assim as razões
pelas quais a procura de moeda era autónoma (e não derivada da intenção de obtenção de bens ou
serviços) e explicava uma parte da divergência entre rendimento distribuído e rendimento afecto
a despesa (de consumo ou investimento).

d) Tecnologias de Aplicação Generalizada.


As chamadas Tecnologias de Aplicação Generalizada são técnicas susceptíveis de serem
aplicadas a um conjunto diversificado de actividades – como o foram a tecnologia do vapor, da
electricidade ou da informática – e os pontos de contacto entre tais tecnologias (que levou ao seu
englobamento na referida expressão) foram notados a propósito dos ciclos longos da actividade
económica propostos por Kondratiev há cerca de um século. Segundo o A. (que não usou a
expressão) com alguma regularidade (entre 40 e 60 anos) surgem inovações tecnológicas com
potencial para se disseminarem ao conjunto da economia, impulsionando uma fase de crescimento
à medida que tais inovações vão sendo integradas num número cada vez maior de processos
produtivos. A partir de certa altura, porém, os ganhos que se conseguem obter com a expansão
dessa tecnologia vão sendo menores e o ciclo entra numa fase de contracção – durante o qual se
multiplicam novas propostas inovadoras. De alguma, ou algumas, acabará por resultar uma
tecnologia com idêntico potencial de aplicação generalizada, que impulsionará uma nova onda de
crescimento, repetindo o padrão.

II
Supondo que dispõe do valor do Produto Nacional Líquido e os demais dados
necessários, explique os passos a dar para passar para o valor do Produto Interno Bruto.
O que se pede é o exercício inverso do que é utilizado com as correcções sucessivas que
levam à obtenção do Produto Nacional Líquido (PNL) a partir do Produto Interno Bruto (PIB).
Assim: o PNL é “Líquido” porque, para evitar a dupla contagem dos bens de capital
(enquanto bens finais, no ano de produção, e ao longo da sua vida útil, através da inclusão do seu
valor de amortização no preço dos bens que permitiram produzir), se retiraram as quotas de
amortização. Portanto, para obter um valor “Bruto” temos de somar ao PNL o valor dessas quotas.
O PNL (agora já PNB) é “Nacional” porque ao valor do PIB foi somado o saldo de
rendimentos primários com o exterior. Ou seja: se há valores de produção interna que são obtidos
com o contributo de factores que são aportados por residentes no estrangeiro, e se esses valores
(salários, rendas, juros e lucros) lhes são remetidos, esse valor é Interno, mas não é Nacional. Por
outro lado, há residentes em Portugal que contribuem com factores de produção (terra, trabalho,
capital, iniciativa) para a produção interna de outros países. Se cá recebem esses rendimentos,
esse valor é Nacional, embora não seja Interno. Como, no caso português, o saldo (que se diz
primário porque se trata de rendimentos gerados na produção e pagos a intervenientes nela) entre
entradas e saídas é negativo, quando se passa de uma grandeza interna para uma grandeza nacional
esse saldo é subtraído. Estando em causa a passagem de uma grandeza nacional para uma
grandeza interna soma-se ao PNL (já transformado em PNB pela correcção anterior) a diferença
entre rendimentos primários saídos e rendimentos primários entrados.
Com estas correcções estamos agora perante o valor do PIB.

III
Distinga o mercado de oligopólio do mercado de concorrência monopolística e,
usando diagramas, explique como se atingem os preços de equilíbrio em cada um deles.
Um mercado de oligopólio caracteriza-se por haver poucas empresas, de grande dimensão, a
vender produtos similares (diz-se puro se o produto for homogéneo, como o cimento ou alumínio,
ou diferenciado, se o produto for distinto, como é o caso dos aviões ou dos telemóveis, por ex.).
Como cada empresa tem capacidade para interferir com as condições de mercado, cada uma tem,
nas suas decisões, de ter em consideração o comportamento das demais. Isso torna a teoria dos
jogos não-cooperativos (os acordos entre empresas quanto à generalidade dos comportamentos
no mercado são proibidos pelas regras da concorrência) especialmente adequada para modelar o
comportamento dos oligopolistas.
Num mercado de concorrência monopolística (diagrama da direita), que se caracteriza por haver
muitas empresas, de pequena ou média dimensão, a vender produtos ligeiramente diferenciados
(sapatos ou refeições, por ex.), o preço de equilíbrio obtém-se a partir da evolução de uma situação
inicial de monopólio (diagrama da esquerda). Neste, o preço óptimo (P) ajusta a procura à
quantidade de oferta em que o custo marginal (MC) iguala a receita marginal (MR) – o que
acontece para as quantidades Q. A haver barreiras à entrada, o monopolista podia conservar um
volume de lucros equivalente à diferença entre o custo médio de cada unidade produzida (ATC)
– que, para as quantidades Q seria de C – e o preço de venda de cada uma dessas unidades (P),
multiplicada pelo número de unidades vendidas, ou seja, a área PABC.
Tal volume de lucros, porém, atrairia outras empresas que, inexistindo barreiras à entrada no
mercado, iriam aumentar a oferta total e desviar procura da empresa que inicialmente fornecia
todo o mercado. Esse aumento de oferta faria com que a curva da procura única se desdobrasse
em curvas da procura dirigidas a cada empresa presente nesse mercado, operando uma progressiva
erosão dos lucros (e uma redução dos preços, na medida em que o aumento da oferta os faz
descer). O processo de entrada continuaria até ao momento em que se atingisse a situação
representada no diagrama da direita – em que o custo marginal (MC) iguala a receita marginal de
cada empresa (MR) – uma característica do mercado de monopólio – e em que o preço (P) iguala
o seu custo médio (ATC) – uma característica do mercado de concorrência perfeita. Esse seria
um ponto de equilíbrio porque, deixando de haver lucros, deixaria de haver entrada de novas
empresas no mercado (não seria atractivo).

IV
Explique porque é que, apesar do Paradoxo de Leontief, o teorema de Heckscher-
Ohlin continua a ser considerado uma boa explicação para o comércio internacional.
O teorema de Heckscher-Ohlin supõe que os países têm diferentes dotações de dois factores de
produção (capital e trabalho), o que os torna atractivos como lugares de produção dos bens que
usam intensivamente o factor de produção em que são abundantes: naturalmente, esse factor será
mais barato do que o factor que é neles relativamente escasso. Assim, economias como a indiana,
ou a chinesa, seriam destinos óbvios para a produção de bens de trabalho intensivo, e economias
como a americana, ou a japonesa, seriam destinos óbvios para a produção de bens que
necessitassem de grandes quantidades de capital. O Paradoxo de Leontief, apurado primeiro a
propósito da situação dos EUA – que exportavam sobretudo bens de trabalho intensivo (em que
deviam ser menos competitivos) e importavam sobretudo bens de trabalho intensivo (em que
deviam ser mais competitivos) –, mas depois confirmado a na análise das importações e
exportações de outras economias, abalou, porém, essa explicação Neo-Clássica do comércio
internacional.
Apesar disso, o teorema continua a fornecer a explicação genérica mais consensual para o
comércio internacional porque há um conjunto de explicações – cada uma delas parcelar, mas na
totalidade bastante abrangentes – para essa inversão de resultados ocasional (há casos em que os
resultados são os esperados) face ao previsto pelo teorema.
Uma delas é a das preferências dos adquirentes: supondo que há um viés de preferências para os
bens que utilizam intensivamente o factor de que cada economia dispõe em abundância (como
evidencia a preferência por gadgets nas economias desenvolvidas e a preferência por arquitectura,
decoração e mobiliário barroco nas economias com grandes recursos de trabalho), teríamos uma
primeira razão para cada uma exportar os bens menos apreciados internamente (os que utilizavam
intensivamente o seu factor relativamente escasso) e importar os bens mais apreciados
internamente (os que utilizavam intensivamente o seu factor relativamente abundante).
Outra explicação é a da estrutura pautal de cada economia, que tenderá a ser enviesada para a
produção dos bens em que é menos competitiva: para os países que disponham de capital em
abundância, as condições internas de produção de bens capital intensivo podem provavelmente
dispensar protecção pautal, ao contrário dos bens trabalho intensivo. E nos países que disponham
de trabalho em abundância, as condições internas de produção de bens trabalho intensivo podem
provavelmente dispensar protecção pautal, ao contrário dos bens capital intensivo. Se se admitir
que a protecção pautal funciona, então cada país trava a importação dos bens em que é menos
competitivo, razão pela qual os registos mostram mais importações dos bens em que é abundante.
A possibilidade de as economias terem uma dotação de factores que é ela própria paradoxal
(fazendo, por exemplo, dos EUA um país abundante em trabalho, em vez de em capital) também
pode explicar alguns resultados: o próprio Leontief admitiu que a força de trabalho norte-
americana devia ser multiplicada por um factor de três para ser comparada com a força de trabalho
de outros países, tal era a sua diferença de produtividade (explicada pelo capital disponível para
cada trabalhador americano: máquinas-ferramentas, organização do trabalho).
Também a inclusão de um terceiro factor – os recursos naturais – interfere nos resultados:
classificando os bens só como trabalho-intensivos ou capital-intensivos descura-se a possibilidade
de estar a atirar para um dos termos da dicotomia bens que não são uma coisa nem outra, e que
são tidos como uma coisa ou outra em função de opções de registo que podem não ser as
adequadas nos dois tipos de produção (vg: o crude é mais capital intensivo se for obtido por
fracking do que por perfuração, e muito mais capital intensivo se for extraído off shore a grandes
profundidades do que on shore a pequenas). Porém, o registo do crude nas importações ou
exportações não terá isso em conta. O mesmo se diga dos processos produtivos utilizados para a
produção de, por exemplo, produtos agrícolas: são capital-intensivo nos EUA e trabalho intensivo
no Bangladesh, mas aparecerão nos registos ou como uma coisa ou outra, fazendo pender os bens
importados ou exportados para um registo conforme o teorema ou para um registo conforme o
paradoxo consoante esse registo seja, ou não, correspondente ao modo de produção de cada
economia.
Também pode interferir nas conclusões o nível de agregação com que se faz o apuramento (vg:
se se considerarem “produtos agrícolas” os resultados podem ser diferentes dos que se obtêm
considerando separadamente “cereais”; “legumes”; “frutas”; “produtos florestais”; “produtos
pecuários”; etc.), ou a existência de produtos paradoxais (vg: embora os automóveis sejam bens
capital-intensivo, há certas marcas, ou modelos, que são trabalho-intensivo). Nessa medida,
também distorcerão a conclusão, pois serão apresentados como produto de utilização intensiva de
um factor que, de facto, não foi usado intensivamente.
Há ainda outras explicações para a aceitação da teoria, apesar da sua comprovação empírica ser
equívoca, e que são mais ou menos adequadas a cada caso (por exemplo, anomalias nos anos de
registo, ou na própria obtenção dos dados, produtos que dependem de condições naturais únicas,
desagregação dos fluxos de importação/exportação com o resto do Mundo em fluxos bilaterais –
uma vez que os resultados obtidos para o todo podem ser diferentes dos obtidos com cada parte –
e diferentes metodologias aplicadas nos cálculos).

V
Indique qual a resposta correcta:
1. Um rácio de Palma (de rendimento) inferior a 1 mostra que:
a. O decil 10 tem menos rendimento do que a soma dos decis 1 a 5;
b. O decil 10 tem mais rendimento do que a soma dos decis 1 a 5;
c. O decil 10 tem mais rendimento do que a soma dos decis 1 a 4;
d. O decil 10 tem menos rendimento do que a soma dos decis 1 a 4;
e. O decil 10 tem mais rendimento do que a soma dos decis 5 a 9.
2. A elasticidade da curva da procura em oligopólio é:
a. Igual à unidade em todo o seu trajecto;
b. Inferior à unidade acima do preço estabelecido no mercado e superior à
unidade abaixo desse ponto;
c. Superior à unidade acima do preço estabelecido no mercado e inferior à
unidade abaixo desse ponto;
d. Inferior à unidade acima do preço estabelecido no mercado e inferior à
unidade abaixo desse ponto;
e. Superior à unidade acima do preço estabelecido no mercado e superior à
unidade abaixo desse ponto.
3. Duas economias com valores de PIB per capita aproximado em Paridades de
Poder de Compra e com coeficientes de Gini aproximados:
a. devem também ter valores de PIB aproximados;
b. devem também ter níveis de bem-estar aproximado;
c. podem ter níveis de bem-estar muito diferentes, mas terão valores de PIB
aproximados;
d. podem ter valores de PIB muito diferentes, mas terão níveis de bem-estar
aproximados;
e. podem ter níveis de bem-estar e de PIB muito diferentes.
4. Com uma propensão marginal ao consumo de 6/8, um acréscimo inicial de 20.000
de procura líquida gera, no termo dos períodos da actuação do multiplicador, um
acréscimo de aforro de
a. 20.000;
b. 40.000;
c. 60.000;
d. 80.000;
e. 100.000.

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