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Alberto Caeiro conhecido como o 'poeta bucólico' apresenta-se

como o 'guardador de rebanhos'. Para ele a busca essencial é a


completa naturalidade.

► Biografia de Alberto Caeiro


Segundo Fernando Pessoa, na carta que escreve a Adolfo Casais
Monteiro, Alberto Caeiro nasce em 1889. Vinte anos depois diria:
'acerquei-me de uma cómoda alta e, tomando um papel, comecei a
escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e
tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não
conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida, e nunca poderei ter
outro assim. Abri com um título - 'O Guardador de Rebanhos'. E o que se
seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o
nome de Alberto Caeiro. Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em
mim o meu mestre. Foi essa a sensação imediata que tive.'

A realidade só é captada através dos sentidos, de forma objetiva e


natural. Os seus pensamentos não passam de sensações. Através da
sua complexa simplicidade acaba por influenciar os outros heterónimos.
Fernando Pessoa procura através de Alberto Caeiro, seu mestre, recusar
toda a metafísica e foi nele que pôs todo o seu poder de
despersonalização dramática.

 
► O Poeta do olhar e da negação da metafísica
Alberto Caeiro exprime e representa a visão marcadamente não-humana,
primitiva e 'pura' da Natureza e até do Homem. Despido da emoção (da
subjetividade) e anulada toda a cultura (a Razão) que o Homem foi
criando, este heterónimo faz da pura sensação e do objetivismo
(absoluto) o 'ideário' da existência e da sua escrita. Vive de impressões,
especialmente, visuais.

Como o Mestre não tem preocupações de ordem metafísica e social


(como acontece com Pessoa e com Álvaro de Campos), é a única
criação pessoana que conhece a Verdade das coisas - porque não as
pensa ('Com filosofia não há árvores, há ideias apenas').

Da harmonia e da comunhão com a Natureza resulta uma visão pagã da


existência, que consiste na descrença total na transcendência. Para
Caeiro a única verdade é a sensação.

► Caeiro, 'Mestre' dos outros


Os ensinamentos de Caeiro, quer ao trazer o ser humano ao quotidiano e
ao integrá-lo na simplicidade da Natureza, quer ao encarnar a essência
do Sensacionismo, tornam-no mestre da outra humanidade. Para os
outros heterónimos, Caeiro representa um regresso às origens, ao
paganismo primitivo, à sinceridade plena. Caeiro ensinou-lhes a filosofia
do não-filosofar.

►Características literário-estilísticas de Alberto Caeiro


Alberto Caeiro é o poeta do olhar que ensina a simplicidade da vida.
Busca ver as coisas como são, na sua forma mais primitiva e natural. Faz
a apologia da visão como valor essencial (a ciência do ver). Para Caeiro,
ver é conhecer e compreender o mundo, a visão é um modo de
conhecimento privilegiado, pois permite percecionar a imensidão do
mundo, superando a dimensão física limitada do sujeito.

Caeiro foi o heterónimo que melhor interpretou o Sensacionismo. Só lhe


interessa vivenciar o mundo que capta pelas sensações. O mundo é visto
sem necessidade de explicações. Acredita na 'eterna novidade do
mundo'. Recusa o pensamento metafísico ('pensar é não compreender',
pensar 'é estar doente dos olhos'), insistindo naquilo a que chama
'aprendizagem de desaprender', ou seja, aprender a não pensar, para se
libertar de todos os modelos ideológicos, culturais ou outros, e poder ver
a realidade concreta. O pensamento gera a infelicidade ('pensar
incomoda como andar à chuva / quando o vento cresce e parece que
chove mais'), deturpa o significado das coisas que existem. O sentido
das coisas reduz-se à sua existência ('As coisas não têm significado: têm
existência'). A realidade vale por si mesma ('Cada coisa é o que é').

► Linguagem e estilo
Aparente simplicidade e natureza argumentativa do discurso poético,
visível no recurso a uma linguagem corrente e a construções causais.

• Plano do conteúdo 
linguagem simples, léxico objetivo, adjetivação quase ausente,
paralelismos, assíndetos, predominância das formas verbais no presente
do indicativo, preferência pela coordenação.

• Plano formal  
verso livre, métrica irregular, ritmo lento, alternância entre sons nasais e
vogais abertas e semiabertas

Ricardo Reis

Ricardo Reis é o poeta clássico, cuja base filosófica é o epicurismo e o


estoicismo. Aceita a relatividade e a fugacidade das coisas e defende a
busca de uma felicidade relativa, só possível pela indiferença à
perturbação.

► Biografia de Ricardo Reis


Educado num colégio de Jesuítas e formado em Medicina, foi expatriado
para o Brasil por ser monárquico, latinista e helenista. A sua poesia (as
suas odes) revelam um poeta que, sob a capa da mundividência
paganista e do modelo poético horaciano, continua o 'drama em gente'
que o próprio Pessoa viveu.

O Destino, a Morte, a Glória, o Amor e a fugacidade do Tempo são


marcas indicadoras da inutilidade de tudo. Aceitar as coisas (feitas pelo
tempo)com a alegria de um consciente infeliz é uma das atitudes típicas
de Reis. O epicurismo, o estoicismo e o carpe diem são a base filosófica
da sua poesia, de sintaxe naturalmente alatinada e esteticamente de raiz
neoclássica.

Ricardo Reis é um poeta disciplinado, que procura o prazer nos limites


do ser humano face ao destino e à fugacidade da vida que passa como o
rio. O fado surge acima dos próprios deuses e, naturalmente, dos
homens. Perante isto, considera que devemos pensar e agir
serenamente e com moderação, pois são inúteis cuidados ou
compromissos. A vida é efémera 'quer gozemos, quer não gozemos'. Por
isso há que buscar a calma ou a sua ilusão.
 
► Características literário-estilísticas de Ricardo Reis

Reis propõe uma filosofia moral de acordo com os princípios


do epicurismo e uma filosofia estoica.
• Epicurismo

• filosofia moral que defende o prazer como caminho da felicidade;


• ausência de dor, calma e tranquilidade, conseguida por um estado de
ataraxia, ou seja, sem qualquer perturbação;
• saber apreciar, muito consciente e tranquilamente, o prazer das coisas,
sem qualquer esforço ou preocupação;

Fernando Pessoa afirma que a obra de Ricardo Reis apresenta um


epicurismo triste, pois na vida, nunca se encontra a calma e a
tranquilidade desejada. Considera inútil e inconsequente qualquer ação
pois a vida passa e é necessário lidar com isso.

• Estoicismo

• viver a vida em conformidade com as leis do destino, indiferente à dor e


ao desprazer: 'Segue o teu destino, / Rega as tuas plantas, Ama as tuas
rosas. / O resto é a sombra / De árvores alheias';
• é possível encontrar a felicidade desde que se viva em conformidade
com as leis do destino que regem o mundo, permanecendo indiferente
aos males, às paixões e ao impulso dos instintos, que são perturbações
da razão;
• indiferença cética: ato de lucidez de quem sabe que tudo tem o seu fim
e de que tudo já está, fatalmente, traçado.

Reis, muitas vezes, considera a inconsciência ou a distração como a


melhor forma de gozar o pouco que nos é dado. Procura ignorar tudo
conscientemente, pensando apenas o momento, o gozo do instante.

• Classicismo

• rigor verbal e estrutural (ode, o epigrama e elegia; os versos brancos


decassílabos e hexassílabos e a disposição dos versos em estrofes -
sextina, quadra, oitava);
• recurso à mitologia;
• vocabulário erudito e cuidado;
• tom moralista (uso do imperativo;
• simbologia;
• sintaxe alatinada,frequentemente com a inversão da ordem lógica.

• Neopaganismo
• crença nos deuses antigos, cultivo da mitologia greco-latina;
• atitude perante o mundo que consiste em aceitar qualquer religião e a
existência de deuses em tudo e em todas as coisas.

Álvaro de Campos

Álvaro de Campos, o filho indisciplinado da sensação, como lhe chamou


Fernando Pessoa, procura a totalização das sensações. Tal como
Pessoa demonstra uma angústia existencial. A sua poesia passa por três
fases evolutivas.

► Biografia de Álvaro de Campos

É o oposto de Caeiro pelo drama ontológico que exprimiu, pela maior


envolvência no Modernismo e por manifestar uma trajetória evolutiva da
sua obra poética.
Pessoa atribuiu a este célebre heterónimo alguns dados biográficos com
interesse: nasceu em Tavira em 1890, formou-se em engenharia naval
por Glasgow (não é gratuito o facto de estas cidades serem marítimas), e
viveu inativo em Lisboa.
 
Costuma-se ver três fases na evolução da escrita de Campos: a primeira,
a decadentista, é a que mais se aproxima da nossa poesia finissecular; a
segunda, a modernista, corresponde à experiência de vanguarda iniciada
com Orpheu; e a terceira é a negativista, na qual a angústia de existir e
ser mais se evidencia e se radicaliza. É, por isso, o poeta pessoano que
mais se multiplicou na busca incessante do Absoluto e da Verdade.

► A obra de Álvaro de Campos passa por três fases:

• 1ª fase: decadentista
Esta fase surge como uma atitude estética finissecular que exprime o
old{tédio, o cansaço e a necessidade de novas sensações}. Traduz a
falta de um sentido para a vida e a necessidade de fuga à monotonia.
Um dos poemas mais exemplificativos desta fase é o 'Opiário'.

• 2ª fase: vanguardista e sensacionista


Como poeta da modernidade, Campos tanto celebra a civilização
industrial e mecânica, como expressa o desencanto do quotidiano
citadino, adotando sempre o ponto de vista do homem da cidade.

A 'Ode Triunfal' é o poema que melhor aproxima Campos do Futurismo,


ao exaltar os excessos da técnica e ao comprometer-se com o
dinamismo da modernidade. Com este poema marca uma evolução
estética ao associar a beleza ao dinamismo e à força.

• 3ª fase: intimista


A terceira fase é caracterizada pelo sono e pelo cansaço. Nela se
revela a desilusão, a revolta, a inadaptação, a dispersão, o cansaço e
uma grande angústia. Após a exaltação heróica e a obsessão dos
'maquinismos em fúria', cai no desânimo e na frustração. Perante a
incapacidade das realizações, traz de volta o abatimento, que provoca
'Um supremíssimo cansaço, / íssimo, íssimo, íssimo, / Cansaço...'.

Nesta fase, Campos sente-se vazio, um marginal, um


incompreendido. Sofre fechado em si mesmo, angustiado e cansado,
como nos diz no poema 'O que há em mim é sobretudo cansaço'.

► Marcas da linguagem e estilo

Campos busca, na linguagem poética, exprimir a energia ou a força que


se manifesta na vida. Surgem os versos livres, vigorosos, submetidos à
expressão da sensibilidade, dos impulsos e das emoções.
Estilisticamente, introduz na linguagem poética a terminologia desse
mundo mecânico citadino e cosmopolita, contemporâneo das máquinas e
da luz elétrica.
• Traços estilísticos

— verso longo;
— assonâncias, aliterações e onomatopeias;
_ mistura de níveis de língua;
— enumerações excessivas, exclamações, interjeições, pontuação
emotiva;
— grafismos expressivos;
— desvios sintáticos;
— construções nominais, infinitivas e gerundivas;
— estrangeirismos e neologismos;
— metáforas, oxímoros, personificações, hipérboles.

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