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- o neoclassicismo e o neopaganismo
- o epicurismo e o estoicismo
De acordo com a carta de Fernando Pessoa a João Gaspar Simões, o poeta começou
a esboçar o heterónimo Ricardo Reis em 1912 quando lhe veio “à ideia escrever uns
poemas de índole pagã”, mas seria apenas no “dia triunfal” - 8 de março de 1914 – que
ele surgiria, a completar o trio Caeiro, Campos, Reis.
Tal como fez para os outros, Fernando Pessoa criou Reis, além do nome, a idade, a
fisionomia, a biografia, o estilo. Assim, Ricardo Reis teria nascido no Porto, no dia 19 de
setembro de 1887.
Educado num colégio de jesuítas onde recebeu uma sólida educação clássica, formou-
se em Medicina.
Era monárquico e, por isso, em 1919 teve que se exilar no Brasil, na sequência da
derrota da rebelião monárquica do Porto contra o regime republicano instaurado havia
apenas nove anos. Era moreno, mais baixo e mais forte que Caeiro.
Discípulo de Caeiro, como Pessoa Ortónimo e Álvaro de Campos, Ricardo Reis
apresenta, contudo, uma poesia muito diferente da dos outros poetas-Pessoa. À grande
questão da indagação do sentido da existência, colocada de forma diversa por cada um
deles, Reis responde como se fosse um homem de outro tempo e de um outro mundo,
um grego antigo, pagão a braços com o Destino. Sabe que a efemeridade é parte da
condição humana, que na vida tudo passa, e sobre cada momento vivido pesa a sombra
da caminhada inexorável do Tempo. Então, para enfrentar esse medo da morte,
defende que é preciso viver cada instante que passa, sem pensar no futuro, numa
perspetiva epicurista de saudação do “carpe diem”.
Mas essa vivência do prazer de cada momento tem que ser feita de forma disciplinada,
digna, encarando com grandeza e resignação esse Destino de precaridade, numa
perspetiva que tem raízes no estoicismo.
Reis é, afinal, um conformista que pensa que nenhum gesto, nenhum desejo vale a
pena, uma vez que a escolha não está ao alcance do homem e tudo está determinado
por uma ordem superior e incognoscível.
Para quê, então, querer conhecer a verdade que, a existir, apenas aos Deus pertence?
Nada se pode conhecer do universo que nos foi dado e por isso só nos resta aceitá-lo
com resignação, como o Destino.
Além disso, o medo do sofrimento paralisa-o, conduzindo-o a uma filosofia de vida
terrivelmente vazia. Para Ricardo Reis, a vida deve ser conduzida com calculismo e
frieza, alheia a tudo o que possa perturbar. E como tudo o que é verdadeiramente
humano é intenso e perturbante, Reis isola-se, numa espécie de gaiola dourada que o
protege de qualquer envolvimento social, moral ou mesmo sentimental.
A educação que teve criou nele o gosto pelo classicismo e é na “imitação” do poeta
latino Horácio que se baseia a construção daquilo que é fundamental na sua poesia.
Uma poesia neoclássica, pagã, povoada de alusões mitológicas. Enfim, uma poesia
moralista, sentenciosa, contida, sem qualquer traço de espontaneidade. Cultivando
preferencialmente a ode, utiliza uma linguagem culta, rebuscada - o hipérbato,
inversão de ordem natural dos elementos da frase, é um recurso amplamente usado por
Ricardo Reis.
1. Ideias da poesia de Ricardo Reis
Epicurismo Estoicismo
• Na vida, devem procurar-se os prazeres • Autodisciplina e autocontrolo na vida e na
serenos e moderados. escrita.
• Aconselha-se a fruição tranquila do • Indiferença perante as paixões.
presente em vez de se recear a ação do • Encoraja-se a “apatia” um estado de
destino, a morte e outros problemas que ausência de sofrimento como forma de o
ameaçam os indivíduos. sujeito enfrentar com determinação as
• Adota-se a firmeza e a autonomia na contrariedades, a doença e a morte.
forma como se enfrentam as • Aconselha-se, também no Estoicismo, a
adversidades do mundo e se evitam as ataraxia.
ciladas da fortuna (fado).
• Advoga-se uma atitude imperturbável e
de distanciação face aos males que
podem surgir: ataraxia.
• Defende-se o carpe diem, a ideia de se
procurar uma felicidade suave e tranquila
de prazeres moderados.
• Incentiva-se a aceitação de uma vida
simples, sem grandes ambições e em
contacto com a natureza.
Segundo o que diz numa célebre carta a Adolfo Casais Monteiro, Fernando
Pessoa criou o heterónimo Alberto Caeiro, no dia 8 de março de 1914 e em seu
nome escreveu, a fio, um conjunto de poemas aos quais deu o título de O
Guardador de Rebanhos. Pessoa chamou-lhe o “Mestre” e criou para ele uma
biografia, uma fisionomia, uma obra. Assim, Alberto Caeiro nascera em 16 de
abril de 1889, em Lisboa, no entanto, órfão de pai e mãe, vivera quase toda a
sua vida retirado, no Ribatejo, na quinta de uma tia-avó, onde se recolhera
devido a problemas de saúde. Era de estatura média, louro, de pele muito branca
e com os olhos azuis. Não estudou nem exerceu qualquer profissão e foi no
Ribatejo que escreveu o fundamental da sua obra: O Guardador de Rebanhos,
primeiro, e O Pastor Amoroso, depois. Voltou para Lisboa no final da sua curta
vida e aí escreveu ainda os Poemas Inconjuntos, antes de morrer de
tuberculose, em 1915, quando tinha apenas vinte e seis anos.
Fernando Pessoa chamou a Caeiro o seu “Mestre”, pois ele era aquilo que
Pessoa não conseguia ser: alguém que não procura qualquer sentido para a vida
ou o universo, porque lhe basta aquilo que vê e sente em cada momento. Vive,
assim, exclusivamente de sensações e sente sem pensar. É, pois, o criador do
Sensacionismo, e também o Mestre dos outros heterónimos pessoanos.
Enquanto Pessoa ortónimo procura incessantemente conhecer o que está para
além daquilo que vê e sente, Caeiro não procura conhecer, não deseja adivinhar
qualquer sentido oculto, uma vez que o “único sentido oculto das coisas/ É elas
não terem sentido oculto nenhum” e “as coisas não têm significado, têm
existência”.
Nos seus poemas, está expresso um conceito de vida segundo o qual, partindo
da aceitação serena do mundo e da realidade, saboreia tranquilamente cada
impressão captada pelo seu olhar, ingénuo como o de uma criança. É, ao
contrário de Pessoa, o poeta do real objetivo e nunca foge para o sonho, nem
sequer para a recordação. Vive no presente, sem pensar no passado e, por isso,
não sofre de qualquer nostalgia, e sem pensar no futuro e, por isso, não tem
medo da desilusão, nem mesmo da morte.
Alberto Caeiro é o “poeta da Natureza” e com ela partilha cada instante que o
ciclo das estações lhe traz, feliz e deslumbrado com cada uma das maravilhas
simples e naturais que o seu olhar lhe permite ver. Sente-se fazendo parte dessa
Natureza, como um rio, ou uma árvore, ou a chuva, ou o sol que brilha nos seus
poemas como em nenhum outro poeta da “constelação pessoana”.
•
- o vanguardismo modernista e futurista
- o sensacionismo
- a abulia e o tédio
2. O imaginário épico
- A matéria épica: a exaltação do Moderno
- O arrebatamento do canto
- Desvios sintáticos;
- uma escrita que cede ao
- Recurso à metáfora invulgar (
impulso do sentimento e da
que descreve estados de alma) e à
emoção.
ironia (construindo autodescrições
pessimistas ou suportando a
crítica social.