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Campo Grande, MS
2023
Eduardo Corneto Silva
Campo Grande, MS
2023
INSTITUCIONALIZAÇÃO DA INTERNET DAS COISAS (IOT) COMO
FERRAMENTA DE GESTÃO NA PECUÁRIA BOVINA DE CORTE DE MATO
GROSSO DO SUL (MS)
Por
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Prof.ª. Dra. Márcia Maria dos Santos Bortolocci Espejo – Presidente – Universidade Federal
de Mato Grosso do Sul – UFMS
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Prof.ª. Dra. Daniela Callegaro – Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS
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Prof.ª. Dra. Fernanda Filgueiras Sauerbronn – Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ
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Prof. Dr. David Bernard Carter – University of Canberra - Canberra Business School
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Prof.ª. Dra. Erlaine Binotto – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS
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Prof. Dr. Guilherme Cunha Malafaia – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS
A Deus por ter me dado saúde e forças para enfrentar as adversidades que encontrei
durante o percurso como doutorando, na vivencia longe da minha cidade e do aconchego dos
meus familiares. Sem, Ele, não conseguiria alcançar mais esse objetivo.
A minha orientadora, Márcia M. S. Bortolocci Espejo, por todo apoio oferecido antes
mesmo de começarmos a vivência acadêmica. Todo o ensinamento, parceria e compreensão
foram essenciais para que a caminhada do doutorado fosse frutífera e sólida. Estendo, em
nome da professora Márcia, meu agradecimento ao grupo de pesquisa, Nupecon, que
colaborou e apoiou meu desenvolvimento como pesquisador.
Ao meu pai Lourivaldo Antônio da Silva e minha mãe Celia Regina Corneto, minha
eterna gratidão pelo carinho e apoio que me deram ontem, hoje e sempre. Desde o dia que
decidi sair do meu estado para realizar o mestrado em São Paulo e agora o doutorado em
Campo Grande, acreditei e senti o apoio e orações de vocês. Ao meus irmãos Ricardo Corneto
e Gleice Corneto meu muito obrigado pelo carinho e apoio de sempre. Meu beijo para minha
sobrinha, Julia, que tive que acompanhar o crescimento de longe, mas perto graças a
tecnologia. Espero que meu esforço a inspire a alçar voos cada vez maiores.
Ao Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal de Mato
Grosso do Sul, universidade onde me graduei e pela qual tenho um enorme carinho. Agradeço
a todo o corpo docente do PPGAd pelos conhecimentos compartilhados e oportunidades
concedidas. Estendo meus agradecimentos, também, a secretária do programa, Cibelly Urias,
que sempre gentil, auxilio-me nas questões burocráticas durante esses quatro anos.
A todos os entrevistados, meu muito obrigado pela colaboração durante esta pesquisa.
A disponibilidade de vocês foi essencial para colocarmos mais uma gota no oceano do
conhecimento.
Agradeço aos meus amigos de infância e em especial ao Anderson Ramires, amigo e
com quem dividi moradia nesses quatro anos. De forma especial, agradeço a turma do
“Churrasco doutoral” que entre um papo científico, ou não, vivemos incríveis momentos. Aos
amigos Douglas Castrillon, José Alexandre, Lidiane Parron e Weslei Maique, meu muito
obrigado.
Por fim, agradeço o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001, pela bolsa de estudos concedida.
RESUMO
A adoção da Internet das Coisas (IoT) na produção de bovinos de corte tem se mostrado
vantajosa para os produtores pecuaristas ao possibilitar melhorias nos processos produtivos e
de gestão, acarretando maior lucratividade e eficiência. Sua inserção no ambiente rural impõe
mudanças institucionais, exigindo que práticas de trabalho sejam desenvolvidas a fim de
institucionalizá-la. Esta tese tem como objetivo propor um framework teórico-conceitual,
consubstanciado na epistemologia estruturalista, sobre o papel de práticas de trabalho
institucional para adoção da Internet das Coisas (IoT), na pecuária bovina de corte, no estado
de Mato Grosso do Sul.. Como objetivos específicos foram definidos: a) apresentar as
possibilidades identificadas, teoricamente, da aplicação da IoT como ferramenta de gestão na
pecuária bovina de corte; b) mapear o campo institucional, por meio da evidenciação dos
atores que trabalham para a adoção da IoT como ferramenta de gestão na bovinocultura de
corte, em Mato Grosso do Sul; c) identificar o trabalho político, técnico e cultural realizado
pelos atores institucionais para institucionalização da IoT, na bovinocultura de corte, no
estado de Mato Grosso do Sul e; d) destacar as práticas de trabalho institucional “inibidoras”
para adoção da IoT, na bovinocultura de corte, no estado de Mato Grosso do Sul. Para atender
a estes objetivos realizou-se uma pesquisa empírica com abordagem qualitativa apoiada pela
realização de entrevistas semiestruturadas e coleta de dados secundários de: (1) dezesseis
atores institucionais do macroambiente do estado de MS que estão ligados a ações voltadas ao
fomento da IoT para a bovinocultura de corte do estado e; (2) oito proprietários e/ou gestores
de fazendas de bovinocultura de corte do estado de MS. O tipo de análise empregada foi a
análise de conteúdo (Bardin, 2009), sendo utilizado o software de análise qualitativa
ATLAS.ti8® na análise dos dados. Como principais resultados foram mapeados os atores
institucionais que tem realizado práticas de trabalho institucional voltadas a adoção da IoT
pela pecuária bovina de corte, sendo estes do setor público federal, setor público estadual,
setor educacional e do setor privado. Foi possível concluir que, apenas, algumas práticas de
trabalho institucional ligadas ao trabalho político, técnico e cultural são realizadas de maneira
ampla pelos atores do macroambiente. Identificou-se que a advocacia, por meio do apoio
político e regulatório, destaca-se no nível mais alto de prioridade como inibidora à adoção da
IoT para as fazendas de bovinocultura. Como resultado final propõe-se um framework
teórico-conceitual que evidencia o papel das práticas de trabalho institucional para adoção da
Internet das Coisas, na bovinocultura de corte, do estado de MS. Os resultados da pesquisa
preenchem a lacuna teórica ao unir três temas até então não investigados de maneira
simultânea (IoT, Pecuária e a teoria do Trabalho institucional). No âmbito prático, o estudo
contribui por evidenciar possibilidades de utilização da IoT no monitoramento, controle,
predição e logística de atividades rurais. Não obstante, evidencia-se a contribuição de elucidar
a teia de relações entre os atores institucionais e suas práticas de trabalho institucional
realizadas no macroambiente do estado de MS, as quais visam sustentar a elaboração de
estratégias e políticas mais eficientes voltadas à adoção da IoT na bovinocultura de corte. De
forma a complementar a análise qualitativa, ao entrevistar gestores de fazenda de
bovinocultura de corte sobre as práticas de trabalho institucional que são inibidoras à adoção
de produtos IoT, como a advocacia e construção de redes normativas, a tese apresenta ações
que devem ser desenvolvidas prioritariamente pelos atores públicos dos governos estaduais e
federal voltadas ao desenvolvimento deste fenômeno, destacando seu potencial impacto
social.
Palavras-chave: Internet das Coisas (IoT), Pecuária bovina de corte, Trabalho Institucional,
Framework teórico-conceitual.
ABSTRACT
The adoption of the Internet of Things (IoT) in the production of beef cattle has proven to be
advantageous for livestock producers by enabling improvements in production and
management processes, resulting in greater profitability and efficiency. Its insertion in the
rural environment imposes institutional changes, demanding that work practices be developed
in order to institutionalize it. This thesis aims to propose a theoretical-conceptual framework,
embodied in structuralist approach, on the role of institutional work practices for the adoption
of the Internet of Things (IoT), in beef cattle, in the state of Mato Grosso do Sul. As specific
objectives were defined: a) to present the theoretically identified possibilities of the
application of IoT as a management tool in beef cattle; b) mapping the institutional field,
through the disclosure of the actors who work for the adoption of IoT as a management tool in
beef cattle, in Mato Grosso do Sul; c) identify the political, technical and cultural work carried
out by institutional actors for the institutionalization of IoT, in beef cattle, in the state of Mato
Grosso do Sul and; d) highlight the “inhibiting” institutional work practices for the adoption
of IoT, in beef cattle, in the state of Mato Grosso do Sul. To meet these objectives, an
empirical research with a qualitative approach was carried out, supported by semi-structured
interviews and the collection of secondary data from: (1) sixteen institutional actors from the
macro environment of the state of MS that are linked to actions aimed at promoting IoT for
beef cattle in the state and; (2) eight owners and/or managers of beef cattle farms in the state
of MS. The type of analysis used was content analysis (Bardin, 2009), using the ATLAS.ti8®
qualitative analysis software for data analysis. As main results, the institutional actors that
have carried out institutional work practices aimed at the adoption of IoT by beef cattle were
mapped, being these from the federal public sector, state public sector, educational sector and
the private sector. It was possible to conclude that only some institutional work practices
linked to political, technical and cultural work are carried out in a broad way by the actors of
the macro environment. It was identified that advocacy, through political and regulatory
support, stands out at the highest level of priority as an inhibitor to the adoption of IoT for
cattle farms. As a final result, a theoretical-conceptual framework is proposed that highlights
the role of institutional work practices for the adoption of the Internet of Things in beef cattle,
in the state of MS. The research results fill the theoretical gap by uniting three themes that
have not been investigated simultaneously (IoT, Livestock and the theory of Institutional
Work). In the practical scope, the study contributes by highlighting possibilities of using IoT
in the monitoring, control, prediction and logistics of rural activities. Nevertheless, the
contribution of elucidating the web of relationships between institutional actors and their
institutional work practices carried out in the macro environment of the state of MS is evident,
which aim to support the elaboration of more efficient strategies and policies aimed at the
adoption of IoT in the beef cattle. In order to complement the qualitative analysis, when
interviewing beef cattle farm managers about the institutional work practices that are
inhibiting the adoption of IoT products, such as advocacy and the construction of normative
networks, the thesis presents actions that must be developed as a priority by public actors
from state and federal governments focused on the development of this phenomenon,
highlighting its potential social impact.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Relação de teses que utilizam a vertente teórica do Trabalho Institucional ........... 21
Quadro 2: Prática para criação de instituições ...................................................................... 30
Quadro 3: Prática para manter instituições ........................................................................... 31
Quadro 4: Formas, práticas e ações relacionadas a criação de instituições ........................... 37
Quadro 5: Algumas definições para o termo Internet das Coisas........................................... 39
Quadro 6: Clusters de artigos conforme o domínio de aplicação ........................................... 47
Quadro 7: Matriz de amarração metodológica da pesquisa ................................................... 64
Quadro 8: Palavras-chave usadas para busca nos repositórios científicos.............................. 67
Quadro 9: String utilizado para busca nos títulos, resumo e palavras-chave .......................... 68
Quadro 10: Atores institucionais que compõem o público alvo para entrevistas.................... 73
Quadro 11: documentos aplicados na pesquisa ..................................................................... 74
Quadro 12: Fazendas que compõem a amostra entrevistada na etapa 2 ................................. 77
Quadro 13: Referencial de codificação para análise de conteúdo .......................................... 80
Quadro 14: Modelo teórico metodológico conceitual para caracterização qualitativa da
priorização de práticas de trabalho institucional ................................................................... 84
Quadro 15: Frequência de citações para cada prática de Trabalho Institucional .................... 99
Quadro 16: Análise da existência de ações ligadas as práticas de trabalho institucional
segundo os setores entrevistados ........................................................................................ 132
Quadro 17: Análise da existência de práticas de trabalho institucional segundo os setores
entrevistados ...................................................................................................................... 133
Quadro 18: Análise da priorização das práticas de Trabalho Institucional inibidoras a adoção
da IoT pelas fazendas de bovinocultura .............................................................................. 145
Quadro 19: Classificação das práticas de trabalho institucional conforme nível de prioridade
para proposição de ações de trabalho institucional.............................................................. 158
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
1.1 INTRODUÇÃO
A população mundial cresceu de maneira acelerada nos últimos anos, tendo como
projeção aumentar dos atuais 7 bilhões de habitantes, para 9 bilhões em 2050 (Dinesh &
Ramesh, 2018). Com isso, até 2050, será necessário produzir 70% mais alimentos, o que
coloca todos os envolvidos na cadeia agroalimentar sob pressão (De Clercq et al., 2018).
Caberá, portanto, aos produtores agropecuários buscar formas de produção mais ágeis e
eficientes, utilizando menos recursos e obtendo-se retornos produtivos superiores (Negrete,
2018).
Entre os países fundamentais para atender a essa demanda, está o Brasil, que se
destaca como um dos maiores produtores agropecuários no mundo (Carraro et al., 2019). O
país desponta como referência mundial em produção de grãos e proteína animal, graças à
adoção de tecnologias que permitem o desenvolvimento de uma agricultura e pecuária de
precisão (Arvanitis & Symeonaki, 2020; Carraro et al., 2019). Tal realidade se evidencia,
quando se observa que o setor agropecuário possui importante representatividade no Produto
Interno Bruto (PIB) nacional, sendo responsável por 21,4% do seu total em 2019, além de
compor cerca de 50% das exportações e 30% do total de empregos no Brasil (Brasil, 2020). O
setor agropecuário é constituído pelas atividades rurais: agricultura, pecuária, pesca e
silvicultura (Barros et al., 2014).
1
Aqui, cabe destacar que se utiliza o termo agricultura 4.0 para ser fiel ao termo usado pelos autores, no entanto
os mesmos citam diferentes atividades que constituem a agropecuária.
13
operações agrícolas, oferecendo informações, de forma digital, entre e para todos os setores e
processos agrícolas (Zambon et al., 2019).
As quatro revoluções agrícolas são listadas, por Rose e Chilvers (2018): agricultura
1.0, caracteriza-se pelo uso de energia animal; a inserção do motor à combustão corresponde à
agricultura 2.0; a agricultura 3.0 tem como característica os avanços em produtividade,
associados à mecanização, à revolução verde e à geolocalização; a mudança para a agricultura
4.0 está ligada à adoção de inovações tecnológicas disruptivas que conectam as atividades
realizadas no campo.
A IoT é apontada como uma das principais tendências da internet do futuro (Da Xu et
al., 2014; Khattab et al., 2019). Seu funcionamento ocorre por meio da inserção de
inteligência e conectividade a objetos do cotidiano “coisas”, transformando-os em objetos
inteligentes, capazes de coletar dados, armazenar, transmitir, processar e compartilhar
informações sobre o ambiente em que estão inseridos (Borgia, 2014).
Nesse estudo, adota-se a definição para a Internet das Coisas (IoT), de Whitmore et al.
(2015, p. 261), como “um paradigma onde objetos do cotidiano podem ser equipados com
recursos de identificação, sensoriamento, rede e processamento que permitirão que eles
comuniquem-se entre si e com outros dispositivos e serviços pela Internet para atingir algum
objetivo”.
14
A Internet das Coisas destaca-se como uma das inovações que mais recebe incentivos
expressivos por parte dos países (Talavera et al., 2017). A ideia principal que dá força para a
IoT consiste no impacto positivo que a mesma terá sobre várias atividades do cotidiano e do
comportamento de seus usuários (Gershenfeld et al., 2004). Diante disto, não é de se
surpreender que países como os Estados Unidos da América (EUA), China, Inglaterra e Brasil
estejam investindo significativamente nessa tecnologia, a ponto de os EUA listarem a IoT
como uma das seis tecnologias civis disruptivas que podem impactar diretamente no poder do
país (Brasil & Brasil, 2017; Gershenfeld et al., 2004).
sensores estão conectados à internet, a coleta de dados torna-se instantânea e contínua, o que
confere ao produtor a capacidade de interferir imediatamente nos processos (Zaparolli, 2020).
Ainda segundo o artigo de Zaparolli (2020), um dos exemplos de sucesso com a implantação
da IoT é o da empresa Agropastoril Paschoal Campanelli, de Bebedouro, município do estado
de São Paulo. Ao fazer uso intensivo de sensores, balanças eletrônicas, chips de rastreamento,
cochos e bebedouros automatizados, a fazenda acelerou o período de engorda do gado
vendido para abate.
De acordo com Lawrence e Suddaby (2006), a literatura lista nove práticas de trabalho
institucional destinadas à criação de novas instituições: advocacia, definição, aquisição,
construção de identidade, mudança de associações normativas, construção de redes
normativas, mimetismo, teorização e educação. Estas práticas representam três categorias de
trabalho institucional: o trabalho político, que objetiva reconstruir e desenvolver regras,
direitos de propriedade, obter apoio social e determinar limites como forma de localizar uma
instituição dentro de um sistema social mais amplo. O trabalho cultural, que atua nas ações
17
que visam reconfigurar os sistemas de crenças dos atores (Lawrence & Suddaby, 2006). E o
trabalho técnico que visa constituir estruturas que sugerem, recomendam ou prescrevem as
ações relacionadas à determinada instituição (Lawrence & Suddaby, 2006; Perkmann &
Spicer, 2008).
Além dos textos anteriores, algumas pesquisas que estudam a adoção da IoT na
agropecuária de diferentes países como China, Irã e México, mesmo não utilizando, de
maneira clara, a teoria do trabalho institucional, citam as práticas de advocacia (Jayashankar
et al., 2018), mimetismo (Negrete, 2018), construção de redes normativas (Cedeño et al.,
2018) e teorização (Ronaghi & Forouharfar, 2020), como ações que são ou devem ser
realizadas para que a adoção da IoT tenha êxito dentro dos cultivos estudados.
Binz et al. (2016) acreditam que combinar o trabalho institucional com estudos de
inovação se mostra uma forma útil para avaliar como os atores, em setores embrionários,
conseguem influenciar as instituições existentes, de maneira a se criar confiança generalizada
em uma nova tecnologia. Zarpelon et al. (2019) destacam que, pelo setor rural brasileiro estar
sofrendo contínuos processos de desenvolvimento tecnológico e, mediante a natureza
tradicional do mesmo, as inovações que ali se inserem tendem a forçar movimentos de
mudança institucional que devem ser observados pela lente do trabalho institucional. Diante
disto, as pesquisas devem explorar “como os atores individuais contribuem para a mudança
18
institucional, como essas contribuições se combinam, como os atores respondem aos esforços
uns dos outros e como o acúmulo dessas contribuições leva a um caminho de mudança
institucional” (Lawrence et al., 2011, p. 55).
Como visto, a adoção de inovações tecnológicas no ambiente rural, entre elas a IoT, é
um fenômeno possível de ser observado, por meio da lente teórica do trabalho institucional.
Diante da relevância do estado de MS como produtor de bovinos de corte, do potencial para a
inserção da IoT nesta atividade e da possibilidade de estudar esse movimento pela lente
teórica do trabalho institucional, propõe-se a seguinte questão de pesquisa: Como práticas de
trabalho institucional fomentam a adoção da Internet das Coisas (IoT) como ferramenta
de gestão na bovinocultura de corte do estado de Mato Grosso do Sul?
1.4 JUSTIFICATIVA
Além do estudo realizado pelo MCTIC junto ao BNDES, a IoT aparece entre as
tecnologias estimuladas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA),
em seu plano estratégico 2020-2027 (Brasil, 2020) e como foco principal em projetos que
estimulam a agricultura 4.0, lançados pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial
(ABDI), em 2020.
Para os produtores que adotam a IoT, as diversas aplicações no meio rural facilitam
não só a operacionalização das atividades do dia a dia, como também a gestão de todas estas
atividades (Muangprathub et al., 2019). Por conseguinte, visualiza-se que a adoção de
tecnologias disruptivas pode ajudar os produtores rurais no controle do rebanho, manejo
20
A escolha do estado de Mato Groso do Sul como campo para esta pesquisa se deve,
entre outros aspectos, pela projeção nacional do mesmo como grande produtor de carne
bovina e pelo incentivo à adoção de tecnologias de informação na pecuária. O estado de MS
figura como um dos cinco estados com a maior população de bovinos do Brasil, contando, ao
final de 2021, com uma população de mais de 18 milhões de cabeças, aproximadamente 10%
do rebanho bovino brasileiro (IBGE, 2021). Tratando-se da produção de carne bovina em
Mato Grosso do Sul, o estado aumentou, em 2019, 9,41% a produção em relação ao mesmo
período do ano anterior, com o abate de mais de 3,5 milhões de animais somente no ano de
2019, cerca de 11% de toda a produção de carne bovina nacional (IBGE, 2020). Desta forma,
é possível constatar a competitividade do referido estado no que se refere à produção de
bovinocultura de corte no país.
para estudo de algum tipo de fenômeno na área de gestão. Os temas abordados são diversos
como se pode observar no Quadro 1. A busca por estudos que utilizam o trabalho institucional
como lente teórica não resultou na identificação de pesquisas que a relacionam com a adoção
da IoT, seja na pecuária ou qualquer outra atividade produtiva.
Entre as pesquisas listadas, destacam-se três que trabalham com o tema, inovação. A
primeira delas, a tese escrita por Bittencourt (2019), na qual a autora utilizou a Teoria do
Trabalho Institucional para reforçar a centralidade do ator e de suas práticas na promoção de
novas configurações institucionais, com enfoque na formação de um Ecossistema de
Inovação, na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). O segundo trabalho,
desenvolvido por Bonfim (2020), tem como objetivo “analisar como a complexidade
institucional e o trabalho institucional realizado pelos atores sociais podem levar à emergência
de um mercado híbrido no contexto da inovação urbana em sistemas de transporte”. Para
atender ao objetivo proposto, o autor conduziu um estudo de caso único qualitativo sobre o
desenvolvimento do sistema de transporte rápido de ônibus em Curitiba, Brasil. Por último, o
terceiro trabalho, de Zarpelon (2020, p. 23), objetiva “propor um framework teórico sobre a
promoção da colaboração dentro dos limites do ecossistema de inovação através de práticas
de trabalho institucional”. Como campo de pesquisa, o autor estudou os ecossistemas de
inovação de Sophia Antipolis, na França, e Tecnosinos, no Brasil.
O potencial impacto desta tese observa-se nas contribuições para o campo teórico e
científico, e igualmente para a prática e o desenvolvimento de políticas públicas. Como
contribuições para a teoria, destaca-se: a apresentação de um estudo empírico que conecte a
IoT, o agronegócio e a teoria do trabalho institucional; expansão do trabalho de Zarpelon et al.
(2019), atendendo a uma das sugestões para pesquisas futuras apresentadas pelos autores; e a
apresentação de um framework teórico-conceitual sobre a relevância das práticas de trabalho
institucional para fomentar a IoT como ferramenta de gestão na bovinocultura de corte.
Sustentável (ODS) estipulados para todos os países pela ONU em 2012. Os resultados do
estudo estão diretamente relacionados a ODS nº2 que trata da: “Fome zero e agricultura
sustentável: erradicar a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover
a agricultura sustentável” (ONU, 2012, p. 1). Mais diretamente a meta nº 2.a “Aumentar o
investimento, inclusive via o reforço da cooperação internacional, em infraestrutura rural,
pesquisa e extensão de serviços agrícolas, desenvolvimento de tecnologia, e os bancos de
genes de plantas e animais, para aumentar a capacidade de produção agrícola nos países em
desenvolvimento, em particular nos países menos desenvolvidos” (ONU, 2012, p. 2).
corroboradas ou refutadas com base nos resultados empíricos e discutidas, com base na
literatura pertinente. Esta parte apresenta igualmente a proposta de um framework teórico-
conceitual para o trabalho institucional, voltado à institucionalização da IoT, na bovinocultura
de corte.
Este capítulo traz para conhecimento a inovação tecnológica estudada, Internet das
Coisas (IoT), sua definição conforme literatura, abrangência dentro do campo de estudo e
aplicação no ambiente rural. É apresentada também a lente teórica do Trabalho Institucional,
base teórica escolhida para observar o fenômeno da adoção da Internet das Coisas como
ferramenta de gestão na pecuária bovina de corte no estado de MS. Por fim, é apresentado o
modelo teórico e as proposições desenvolvidas para a pesquisa.
Para responder parcialmente as críticas que surgiram quanto ao papel limitado dos
agentes institucionais, um corpo de pesquisa dentro do neoinstitucionalismo se dedicou a
26
Trabalho institucional é definido por Lawrence, Suddaby e Leca (2011, p. 52) como
“as práticas de atores individuais e coletivos com o objetivo de criar, manter e desorganizar
instituições”. Esta vertente da teoria neoinstitucional traz os atores para o centro da teoria
institucional ao se preocupar com as práticas cotidianas e intencionais dos indivíduos e grupos
para modificar ou manter o ambiente institucional (Hwang & Colyvas, 2011).
A instituição aos olhos dessa vertente teórica possui como características: ser produto
de uma ação intencional, ser organizada e estabelecida e refletir uma sequência de interações
padronizadas (Lawrence & Suddaby, 2006). Diante disto, instituição é definida pela lente do
trabalho institucional como “elementos (mais ou menos) duradouros da vida social que afetam
o comportamento e crenças de atores individuais ou coletivos, fornecendo modelos de ação,
cognição e emoção que permitem significado e estabilidade para a vida social” (Lawrence et
al., 2011, p. 53).
Por mais que o conceito tenha sido cunhado em 2006, pesquisas sobre o papel do
agente institucional, ascensão e queda de vários arranjos institucionais e verificação da ação
intencional sobre as instituições, já vinham sendo estudados de forma dispersa, o que
despertou o interesse de um grupo de autores em estabelecer o trabalho institucional como um
campo de pesquisa (Lawrence et al., 2009; Lawrence & Suddaby, 2006).
Alguns das justificativas para que o trabalho institucional seja visto como um campo
de estudo com potencial para abrir espaço para novas discussões são: a preocupação com
práticas mundanas e intencionais de atores e grupos para manutenção e transformação de
instituições; e o estímulo para mudar o olhar das questões do campo organizacional e
transformações em grande escala para a relação entre as instituições e os atores nelas
inseridos (Bartram et al., 2020; Lawrence et al., 2011). Com isso, “o trabalho institucional
logo se tornou um conceito guarda-chuva e um ponto de convergência em torno do qual os
estudiosos interessados em relatos de agentes sobre o surgimento, manutenção e ruptura de
instituições se uniram” (Hwang & Colyvas, 2011, p. 62).
A orientação para a prática é foco do trabalho institucional, pois essa lente teórica
analisa as práticas e estratégias cotidianas realizadas pelos indivíduos e grupos com a intenção
29
de moldar os padrões institucionais em que estão inseridos (Lawrence & Suddaby, 2006). Pela
perspectiva prática é destacado o trabalho criativo e especializado de atores que independente
de terem êxito, ou não, na modificação institucional estão engajados com as instituições que
os rodeiam (Zarpelon et al., 2019).
Os estudos que usam a teoria institucional como base para pesquisa organizacional
possuem uma visão de relação recursiva entre as instituições e a ação (Figura 1), ou seja,
estão preocupados em entender como as instituições afetam a ação organizacional fornecendo
modelos e mecanismos de regulamentação e, por consequência, como a ação afeta
posteriormente esses modelos e mecanismos reguladores (Lawrence et al., 2009; Lawrence &
Suddaby, 2006). Entretanto, o trabalho institucional se preocupa particularmente com a
relação representada pela segunda seta que parte da ação para a instituição, pois seu foco está
nos efeitos da ação individual e organizacional nas instituições (Lawrence et al., 2009).
Instituições Ação
Para buscar uma compreensão institucional, por meio do efeito das ações nas
instituições, Lawrence et al. (2009) acreditam que o estudo do trabalho institucional deve ser
orientado por três elementos-chave: (1) a consciência, habilidade e reflexividade dos agentes
deve ser evidenciada; (2) as instituições são constituídas por ações mais e menos conscientes
dos atores; e (3) não se deve sair da ação como prática, pois mesmo ações que objetivem
mudar a ordem institucional ocorrem dentro de um conjunto de regras institucionais macro e
micro habituadas. Está visão se consolida quando os autores afirmam que “não negamos nem
30
ignoramos o efeito das instituições sobre a ação, e de fato esses efeitos são cruciais para a
compreensão da natureza do trabalho institucional” (Lawrence et al., 2009, p. 7).
Entre estes três objetivos analisadas, o trabalho voltado para a criação de instituições
é o que ganha maior destaque dentro do campo do trabalho institucional (Lawrence &
Suddaby, 2006; Zarpelon et al., 2019). Em suas pesquisas empíricas Lawrence e Suddaby
(2006) identificaram nove práticas utilizadas pelos atores para se engajar em ações que
resultam na criação de novas instituições (Quadro 2).
Práticas Definição
Corresponde a mobilização de apoio político e regulatório por meio de
Advocacia
técnicas de persuasão social.
Elaboração de sistemas de regras capazes de conferir status ou identidade,
Definição
definir limites para associação e criar hierarquias no campo institucional.
A autoridade governamental ou outro tipo de autoridade coercitiva é usada
Aquisição para criar estruturas de regras que visam conferir direitos de propriedade
aos atores.
Construção de Construção de uma identidade que represente a relação entre um ator e o
identidade campo onde ele opera.
Mudança de Trabalho institucional voltada a reformular associações normativas já
associações existente por meio de novas conexões entre o conjunto de práticas e os
normativas fundamentos morais e culturas já em operação.
A construção de redes é formada por grupos de atores semelhantes que
Construção de
estão diretamente ligados ao cumprimento normativo, monitoramento e
redes normativas
avaliação.
Associação de novas práticas, tecnologias e regras as anteriormente já
Mimetismo
institucionalizadas.
Teorização Nomeação de conceitos e ações novas e criação de causa e efeito.
Educar os atores faz parte de um trabalho cognitivo necessário para o
Educação
sucesso nova instituição.
Fonte: Adaptado de Lawrence e Suddaby (2006).
Ao iniciarem algum trabalho para criar instituições, os atores buscam obter sucesso, ou
seja, uma nova instituição, no entanto, também correm o risco de falhar em fazê-la ao
31
provocar uma ruptura nas instituições existentes ou criar instituições muito diferentes do que
foi originalmente planejado (Lawrence et al., 2009). Tanto esta categoria como a definição
das práticas ligadas a criação de novas instituições são apresentadas com maior detalhe na
próxima subseção.
Práticas Definição
Habilitação do Refere-se a criação de normas para facilitar, complementar e ou apoiar as
trabalho instituições existentes.
O policiamento visa garantir o cumprimento das instituições por meio de
Policiamento
fiscalização, auditoria, monitoramento ou outro instrumento regulatório.
A dissuasão tem como objetivo manter a obediência consciente dos
Dissuasão atores institucionais pelo estabelecimento de barreiras coercitivas, a
qualquer movimento de mudança institucional
A prática da valorização e demonização funciona pelo meio da
Valorização e a
apresentação pública de exemplos positivos e, de maneira especial,
demonização
negativos que elucidam as bases normativos de uma instituição.
A prática de mitologizar busca preservar os fundamentos normativos das
Mitologizar
instituições mitologizando a sua história.
Infundir os fundamentos normativos de uma instituição nas rotinas e
Incorporação e práticas organizacionais, por meio de rotinas de contratação, certificação,
rotinização cerimonias de celebração e premiação, ou outros tipos de atividades que
estabelecem rotinas embutidas e ações repetitivas.
Fonte: Adaptado de Lawrence e Suddaby (2006).
Com base no exposto sobre a teoria do trabalho institucional duas opções embasam o
desenvolvimento desta pesquisa. A primeira é sobre o tipo de pesquisa utilizando a lente
teórica, neste caso serão observados “como” o trabalho institucional ocorre e “quem” são os
responsáveis por realizá-lo. A segunda definição é sobre o objetivo do trabalho institucional
realizado pelos atores, aqui será observada a criação de novas instituições e não a manutenção
ou desinstitucionalização das existentes. Com base nesta escolha são apresentadas as práticas
de trabalho institucional relacionadas ao trabalho político, técnico e cultural, que segundo
Lawrence e Suddaby (2006) podem ser utilizadas pelos atores para se engajar em ações que
resultam na criação de novas instituições.
Na lista apresentada por Lawrence e Suddaby (2006) estão nove práticas distintas:
Advocacia; definição; aquisição; construção de identidades; mudança de associações
normativas; construção de redes normativas; mimetismo, teorização; e educação. Estas
33
práticas, conforme Lawrence e Suddaby (2006) e Perkmann e Spicer (2008), refletem três
categorias de trabalho institucional pelas quais podem resultar a criação de uma instituição:
trabalho político; trabalho cultural; e trabalho técnico. Associadas a cada uma dessas
categorias estão três práticas de trabalho institucional, atores específicos e habilidades que
correspondem ao core principal de atuação dentro do trabalho institucional.
O trabalho político busca, por meio das práticas de advocacia, definição e aquisição,
reconstruir e desenvolver regras, direitos de propriedade, obter apoio social e político, e
determinar limites como forma de localizar uma nova instituição dentro de um sistema social
mais amplo (Lawrence & Suddaby, 2006; Perkmann & Spicer, 2008). Mediante esta forma de
trabalho, os atores relevantes são recrutados em coalizões e redes de estabelecimento de
regras e regulamentações (Perkmann & Spicer, 2008). Habilidades políticas são necessárias
para que os empreendedores institucionais envolvidos neste tipo de trabalho institucional
envolvam outros atores em papeis específicos, de modo que seus interesses sejam semelhantes
aos necessitados pela instituição criada (Perkmann & Spicer, 2008).
Gallemore, 2018; Lawrence & Suddaby, 2006). Na aquisição uma autoridade governamental
tem o papel de realocar os direitos de propriedade, permitindo com isso, criar novos atores e
ou dinâmicas de campo por meio da mudança nas regras relacionais existentes no mercado
(Jespersen & Gallemore, 2018). Elemento comum na aquisição é a negociação de uma
barganha regulatória entre autoridades coercitivas e outro ator interessado o que exige um
grau de compartilhamento de autoridade coercitiva e regulatória entre as partes (Lawrence &
Suddaby, 2006).
O trabalho cultural atua nas ações que visam reconfigurar os sistemas de crenças dos
atores por meio de práticas como a construção de identidade, mudança de associações
normativas e a construção de redes normativas (Lawrence & Suddaby, 2006). Ao se realizar
o trabalho cultural para a criação de uma instituição se tem como foco estabelecer uma
relação entre as novas ações institucionais com os sistemas de crenças, normas e valores
existentes e amplamente aceitos (Perkmann & Spicer, 2008). Os estudos de Binz et al. (2016)
e Lawrence e Suddaby (2006) permitem definir as práticas que constituem o trabalho cultural
como segue.
morais e culturas. Essa mudança associativa não só reformula as conexões como em vários
casos leva a novas instituições que passam a existir de forma paralela, complementar e de
apoio as já existentes.
Cada uma das práticas listada anteriormente, segundo Lawrence e Suddaby (2006) e
Perkmann e Spicer (2008) tem como foco a estrutura normativa das instituições atingindo
seus papéis, valores e normas. Ainda, segundo os autores, as práticas apresentadas se
diferenciam na atuação conforme o contexto onde ocorrem, por exemplo: a construção de
identidades trabalha na relação, ator-campo, e concentra seus esforços na relação entre um
ator e o campo institucional onde está situado; a mudança de associações normativas foca o
trabalho na manipulação da relação entre as normas e o campo institucional onde são
executadas (norma-campo); já o trabalho que altera a relação entre os atores que
compartilham de um mesmo campo institucional (ator-ator) são realizados pela construção de
redes normativas.
Por fim, o trabalho técnico é formado por ações que visam constituir estruturas que
sugerem, recomendam ou prescrevem as ações relacionadas a determinada instituição,
alterando assim, categorizações abstratas e seus significados (Lawrence & Suddaby, 2006;
Perkmann & Spicer, 2008). Neste tipo de trabalho estão as práticas de mimetismo, teorização
36
e educação que juntas focam o lado cognitivo das instituições apresentando crenças,
suposições e estruturas que dão significado e compreensão para as ações realizadas na criação
da instituição (Lawrence & Suddaby, 2006; Perkmann & Spicer, 2008). De acordo com
Canning e O’Dwyer (2016) e Lawrence e Suddaby (2006) podem-se definir as práticas que
compõem o trabalho técnico conforme a descrição a seguir.
No Mimetismo, os atores que tentam criar novas instituições buscam ter maior sucesso
associando as novas práticas, tecnologias e regras, as anteriormente já institucionalizadas. Ao
sobrepor as novas estruturas aos velhos modelos se torna facilitada a compreensão e acesso
dessa nova estrutura, permitindo tanto a compreensão dos problemas e deficiências existentes
atualmente como do potencial que a nova instituição tem de resolver conflitos anteriores.
Perkmann e Spicer (2008) afirmam que ao criar uma instituição os custos aos quais os
atores estão expostos são alavancados, pois se engajam por conta própria, não tendo total
conhecimento dos impactos e aceitação que terá a instituição. Todavia, quando são usadas a
37
mimetização, teorização e educação, alternativas para diminuição dos riscos e esforços são
encontradas (Lawrence & Suddaby, 2006).
Como este estudo está voltado a entender a criação de uma nova instituição, no caso
específico desta pesquisa, a prática de adoção da Internet das Coisas como ferramenta de
gestão na pecuária bovina de corte do estado de Mato Grosso do Sul, serão utilizadas como
variáveis de estudo: as categorias de trabalho institucional, as nove práticas para criação de
instituições e as ações listadas pela teoria que permitem a objetivação destas práticas
(unidades de análise). No Quadro 4, são apresentadas todas as variáveis que são investigadas
empiricamente no estudo.
Categorias de
Práticas para criação
trabalho Unidades de análise
de instituições
institucional
Apoio político e regulatório
Lobby por recursos
Advocacia
Promoção de agendas
Proposição ou ataque a legislação existente
Processo de acreditação formal
Trabalho Político Definição Criação de padrões
Certificação de atores em um campo
Realocação de direitos de propriedade
Mudanças de regras das relações de mercado
Aquisição
Compartilhamento de autoridade coercitiva
ou reguladora
Construção de Desenvolvimento de profissões
identidade Reorientação de identidades
Mudança de associações
Trabalho Cultural Substituição de normas generalizadas
normativas
Construção de redes
Proto-Instituições / Redes de apoio
normativas
Mimetismo Justaposição de velhos e novos modelos
Elaboração de cadeias de causa e efeito
Teorização
Trabalho Técnico Nomeação de novos conceitos e práticas
Educação nas habilidades e conhecimentos
Educação
necessários
Fonte: Elaborado com base em Canning e O’Dwyer (2016); Jespersen e Gallemore (2018);
Lawrence e Suddaby (2006); Perkmann e Spicer (2008) e Binz et al. (2016).
realizar a advocacia, por exemplo, os atores podem lançar mão de quatro ações, listadas pela
teoria, sendo elas: apoio político e regulatório; lobby por recursos; promoção de agendas e;
proposição ou ataque a legislação existente. Outras práticas, no entanto, possuem menos
ações, por exemplo, a prática “educação”.
As ações listadas no Quadro 4 servirão como base teórica para construção do roteiro
de entrevista para a etapa 1 e etapa 2 que objetivam, respectivamente, a identificação das
práticas de trabalho institucional que foram ou estão sendo realizado pelos atores
institucionais e das práticas inibidoras a adoção da IoT para as fazendas de bovinocultura de
corte no estado de MS.
A Internet das Coisas (IoT - Internet of Things) tem se destacado nos últimos anos
como uma das principais tendências dentro das tecnologias da informações e comunicação
(TIC) (Da Xu et al., 2014; Miorandi et al., 2012). A IoT representa a evolução em número e
tipo de dispositivos tecnológicos já existentes, a fim de gerar um ambiente onde sensores e
atuadores conectados são incorporados ao nosso redor (Gubbi et al., 2013; Whitmore et al.,
2015).
O termo Internet of Things (IoT) teve sua origem atribuída a Kevin Ashton, um dos
fundadores do Auto-ID Center no Massachute Institute of Technology (MIT), que, em 1999,
cunhou este termo em referência aos projetos desenvolvidos pela comunidade que visavam
formar uma infraestrutura entre empresas composta por Radio-Frequency Identification
(RFID) (Gubbi et al., 2013; Wortmann & Flüchter, 2015).
39
“Internet das Coisas” vem da união de duas palavras “internet” e “coisas” que juntas
ganham um significado de inovação disruptiva no cenário das tecnologias da informação e
comunicação (Atzori et al., 2010; Li et al., 2015). A internet é definida por Madakam et al.
(2015) como um sistema global de redes de computadores, públicos, privados, acadêmicos,
empresariais e governamentais, que funcionam por meio de protocolos padrão da internet. Já
as “coisas”, dentro da lente da IoT, podem ser qualquer objeto ou ser vivo que possa ser
distinguido por meio de endereçamentos únicos (Madakam et al., 2015). Para esses autores, os
objetos do dia-a-dia são tanto dispositivos dotados de alguma tecnologia e eletrônica,
exemplo, celulares, máquinas industriais, eletrodomésticos e lâmpadas, como objetos não
eletrônicos, por exemplo, roupas, animais, pessoas, alimentos, plantas, moveis, entre outros.
Nas comunidades de pesquisa a IoT é definida a partir de variados aspectos, seja por
utilizar diferentes tecnologias, aplicações ou visão do que são as “coisas”, por isso, diferentes
definições surgem na literatura (Bandyopadhyay & Sen, 2011). A seguir são apresentadas
algumas dessas definições (Quadro 5) trazidas por pesquisas que situam seu entendimento
sobre a Internet das Coisas.
Novo paradigma de tecnologia concebido como uma rede global de máquinas e Lee e Lee
dispositivos capazes de interagir uns com os outros. (2015)
Rede aberta e abrangente de objetos inteligentes que têm a capacidade de se Madakam
auto-organizar, compartilhar informações, dados e recursos, reagindo e agindo et al.
diante de situações e mudanças no ambiente. (2015)
Rede mundial (World Wide Network) de objetos endereçáveis exclusivamente Zambon et
interconectados por meio de protocolos de comunicação padrão. al. (2019)
Fonte: Elaborado pelo autor
Por mais que não se tenha, ainda, uma definição única utilizada para definir a Internet
das Coisas, algumas características quanto ao seu conceito podem ser elencadas com base nas
definições apresentadas. Como características-chave da IoT estão: heterogeneidade de
dispositivos e aplicação; visão da IoT como um paradigma; estrutura formada por objetos,
sensores e dispositivos que constituem uma infraestrutura de processamento e comunicação;
interconexão dos objetos que formam uma rede mundial e; endereçamento e protocolos de
comunicação para funcionamento das “coisas”.
informações, tomam decisões, invocam ações e fornecem serviços aos seus usuários diretos e
indiretos (Khan et al., 2012; Whitmore et al., 2015).
A Internet das Coisas é composta por uma estrutura ou arquitetura de várias camadas
que contemplam desde a captação de dados no campo até a divulgação e utilização destas
informações (Bandyopadhyay & Sen, 2011; Khan et al., 2012). Estas camadas devem ser
desenvolvidas visando atender aos requisitos de setores dispersos como empresas, sociedade,
institutos, fazendas, governo, etc. (Bandyopadhyay & Sen, 2011). Neste trabalho a
apresentação da estrutura para a IoT seguirá as cinco camadas apresentadas por Khan et al.
(2012): camada de percepção (ou borda); camada de rede; camada de middleware; camada de
aplicação; e camada de negócios.
As camadas que compõem a arquitetura da IoT constituem três fases pelas quais
ocorrem o processamento das informações coletadas pelos dispositivos IoT, evidenciando a
interação do mundo físico com o cibernético: fase de coleta; fase de transmissão; e fase de
processo, gestão e utilização (Borgia, 2014). Em cada fase, tecnologias e protocolos
específicos são utilizados para atender propósitos e funções diferentes, a saber:
(ii) Fase de transmissão: fase que ocorre depois que os dados são coletados, devido
à necessidade dos dados serem transportados por meio da rede para os
aplicativos que irão processá-los e a outros servidores externos (Borgia, 2014).
As tecnologias que compõem essa fase são, entre outras, a Ethernet, wi-fi e
satélite (Borgia, 2014).
As áreas de aplicação onde a IoT pode ser inserida são tão numerosas quanto diversas,
pois boa parte das áreas que rodeiam o dia-a-dia da população, estão interessadas e são
passíveis de sua utilização em alguma escala (Wortmann & Flüchter, 2015). As
potencialidades oferecidas pela IoT fazem com que inúmeras aplicações possam ser pensadas,
44
estando algumas já mais proeminentes e em expansão, enquanto outras são vistas como
aplicações futurísticas (Atzori et al., 2010; Da Xu et al., 2014). A seguir são destacados
algumas, entre várias outras, áreas de aplicações onde a IoT tem potencial de provocar
mudanças e trazer benefícios.
i. Aplicação na indústria: a IoT faz parte das tecnologias que compõem a chamada
indústria 4.0 tendo potencial para aumentar a lucratividade, reduzir custos e melhorar a
eficiência operacional em todos os processos da cadeia produtiva industrial (Khan et
al., 2012; Wortmann & Flüchter, 2015).
iii. Previsão de desastres naturais: por meio dos sensores instalados em locais estratégicos
como rios, córregos e morros a detecção de deslizamentos de terras, furações,
terremotos, enchentes, etc., poderão ser previstas com antecedência o que evitaria
prejuízos sociais e econômicos (Khan et al., 2012).
iv. Casas inteligentes: a utilização da IoT em casas inteligentes é uma realidade que vem
avançando a cada ano (Khan et al., 2012; Stankovic, 2014). Isso se deve ao
desenvolvimento de dispositivos inteligentes que monitoram o consumo de energia e
água, detectam emergências de segurança e saúde, permitem a comunicação entre os
eletroeletrônicos e eletrodomésticos, além de automatizar várias atividades realizadas
diariamente pelos usuários (Atzori et al., 2010; Khan et al., 2012).
A aplicação e o estudo sobre a adoção da Internet das Coisas na indústria 4.0 estão
mais sedimentadas do que seu entendimento e utilização no ambiente rural (Negrete, 2018;
Wollschlaeger et al., 2017). Entretanto, um campo diversificado e amplo como a agropecuária
fornece diferentes possibilidades para que novas tecnologias possam tornar as atividades mais
eficientes, inteligentes e ecologicamente sustentáveis (Balamurugan et al., 2016; Corallo et
al., 2018).
terceira posição estão a pecuária e pesca, ambas com 5 citações cada. Por último, ficaram as
pesquisas desenvolvidas na atividade de silvicultura. Duas pesquisas desenvolveram estudos
em mais de uma atividade sendo uma pesquisa que realizou uma survey com pecuaristas e
agricultores para verificar os antecedentes da adoção da IoT e outra que estudou o
desenvolvimento de uma plataforma de IoT em nuvem para ser usada tanto na agricultura
como na pesca.
Hassan et al. (2019) testaram tecnologias sem fio para constituir a chamado Internet of
Fish (IoF) a fim melhorar o monitoramento na produção de peixes em ambiente marítimo. Os
testes foram realizados em uma fazenda de peixes marinhos na Noruega e como resultado se
observou que a utilização de tecnologias baseadas em IoT são viáveis para aplicações em
telemetria de peixes em diversos ambientes de piscicultura. Por fim, outro exemplo de
tecnologia desenvolvida para monitoramento animal foi o aplicativo de IoT apresentado por
Taneja et al. (2020) que visa detectar claudicação, irregularidade no fluxo de sangue nas
pernas devido a alguma obstrução em uma ou várias artérias, em gado leiteiro. Os autores
dissertam que a detecção de claudicação é cara e tardia em animais o que causa problemas na
saúde do gado e pode reduzir a produtividade. Os testes com a tecnologia foram realizados em
um rebanho de 150 vacas leiteiras em Waterford, Irlanda. Os resultados apontam que a
claudicação pode ser detectada com até três dias de antecedência, permitindo que o animal
seja isolado e tratado de maneira rápida.
Para Monitoramento de pragas nas lavouras de batata e tomate foi desenvolvido por
Khattab et al. (2019) um sistema baseado em IoT para detecção e previsão do surgimento de
doenças epidêmicas no campo. Para testar o sistema foram realizados experimentos de campo
em safras de batata e tomate em 2017 e 2018 nas cidades de Beheira e Fayoum, Egito. Os
resultados mostraram que o sistema é capaz de detectar de maneira antecipada o surgimento
de doenças como a ferrugem nas lavouras. Permitindo redução no número de aplicações de
defensivos químicos e os resíduos nos alimentos, melhorando a qualidade dos produtos. Cao e
Chen (2020) também apresentam um sistema de monitoramento e alerta precoce para
surgimento da peste tardia da batata, no entanto esse sistema tem como método a medição de
esporos de Phytopht que estão no ar. Os testes foram realizados em um campo experimental
da China e demonstram que o sistema pode reconhecer e contar de maneira rápida os esporos
que estão no ar permitindo um controle mais eficaz da situação epidêmica.
O domínio definido como, controle, aborda pesquisas que tem como foco de pesquisa
o desenvolvimento ou melhoria de sistemas de controle de irrigação e alimentação de animais.
Entre os objetivos desses sistemas estão: executar de forma inteligente o controle do uso da
água; diminuir e otimizar seu uso; diminuir a necessidade da intervenção humana no processo
de irrigação, diminuir os custos produtivos, entre outros. No total são oito trabalhos
correspondentes a este domínio, sendo sete deles sobre irrigação e um sobre controle de
alimentação animal. A seguir são apresentados alguns exemplos que tratam sobre irrigação e
o artigo sobre alimentação animal.
produtivos para tomada de decisão proativa. O trabalho escrito por Santos et al. (2019)
apresenta o sistema AgriPrediction que combina sistemas de alcance de rede sem fio com
mecanismos de previsão para antecipar possíveis disfunções na cultura em produção. Esse
sistema notifica o agricultor assim que situações anormais aparecem permitindo que ações
corretivas de forma antecipada sejam adotadas. O AgriPredtiction, por meio de uma estrutura
de sensores, consegue medir aspectos como a umidade, luminosidade, clorofila da planta,
radiação solar, temperatura e outras informações mais. Para avaliação da funcionalidade do
sistema os autores brasileiros montaram uma estufa para cultivo de rúcula e fizeram
experimentos durante alguns ciclos de cultivo. Os resultados mostraram que o cultivo da
rúcula com o sistema proposto obteve ganhos de 17,94% no tamanho das folhas e de 14,29%
no peso em relação a um cultivo padrão.
O trabalho escrito por Gao et al. (2019) teve como objetivo desenvolver um sistema de
controle e rastreamento de pisciculturas baseadas em IoT que permite coletar, armazenar,
analisar, prever, rastrear e consultar os dados sobre a qualidade da água da lagoa onde os
peixes foram criados. Por meio de sensores de temperatura, pH, oxigênio, condutividade
elétrica e turbidez da água conectados as bombas de água, aeradores, alimentadores e outros
equipamentos os piscicultores podem controlar e gerenciar de forma inteligente o tratamento
da água da lagoa e a produção dos peixes. Os testes foram realizados em uma fazenda de
peixes localizada na China durante um mês e mostraram que o sistema pode prever de
maneira eficaz os indicadores da água.
Por fim, com relação ao Transporte, Yan et al. (2017) propõem a coordenação da
cadeia de suprimentos em ambientes de IoT nos níveis do fabricante, distribuidor e varejista,
por meio de um modelo de contrato aprimorado de compartilhamento de receita. Este contrato
aprimorado é direcionado para cadeia de suprimentos de produtos frescos e como forma de
54
validar o modelo foi realizada a análise da cadeia de suprimento de uma empresa chinesa de
aquicultura. Como resultado os autores concluíram que o contrato de compartilhamento de
receita permite determinar a solução ideal para alcançar lucro máximo, facilita a tomada de
decisão e aprimora a distribuição de lucros entre os níveis da cadeia de suprimento.
55
possuem uma definição clara sobre responsabilidades e regras, sendo assim faz-se necessária
sua realização (Zietsma & Lawrence, 2010). A prática de definição na IoT não fica restrita
apenas ao estabelecimento de regras e ao processo de certificação dos atores que atuam no
campo, também percorre a utilização dos dados gerados pelas dezenas de objetos IoT
utilizados nas propriedades. Jayashankar et al. (2018) mencionam as preocupações dos
agricultores com a propriedade e a privacidade de seus dados no nível da fazenda; os mesmos
questionam se os agricultores têm apenas o direito de acessar seus dados originados da IoT ou
detêm a posse sobre eles.
amplamente aceitos pelos potenciais adotantes (Obeng Adomaa et al., 2022; Perkmann &
Spicer, 2008).
sustentam (Lawrence & Suddaby, 2006). A diferença, no entanto, está na relação de cada uma
com o campo. Na construção de identidade, observa-se a interação entre o ator e o campo; na
mudança de associações normativas, a interação ocorre entre a norma e o campo; e, por fim, a
construção de redes normativas demonstra uma relação ator-ator (Lawrence & Suddaby,
2006). Diante os conhecimentos sobre as práticas que constituem o trabalho cultural e a forma
como são executadas a fim de institucionalizar inovações tecnológicas, apresenta-se a
proposição seguinte.
No trabalho institucional técnico, os atores criam uma nova instituição, por meio de
três práticas de trabalho: mimetismo, teorização e educação (Binz et al., 2016), as quais estão
relacionadas ao pilar cognitivo-cultural das instituições; e quando realizadas, constroem
“modelos mentais” e visões de mundo, compartilhadas ao mesmo tempo, e que alteram as
categorizações abstratas e seus significados dentro do campo (Lawrence & Suddaby, 2006;
Perkmann & Spicer, 2008).
responsáveis por ações no nível macro. Para produtos IoT, a realidade é semelhante; segundo
Ronaghi e Forouharfar (2020), os atores formuladores de políticas agrícolas devem promover
a IoT em uma agricultura inteligente, demonstrando e justificando os benefícios e as
facilidades da mesma em cantos distantes e remotos do país.
Lino et al. (2019) alegam que a teorização representou o tipo de trabalho institucional mais
relevante para superar as resistências por parte dos atores públicos que iriam adotar tais
inovações.
A escolha por utilizar um ou outro tipo de trabalho pode depender, também, da fase de
legitimação em que uma inovação está no ambiente ou de quem está realizando este trabalho
institucional. Binz et al. (2016) alegam que formas específicas de trabalho institucional estão
relacionadas a cada uma das três fases, validação local, difusão e validação geral pelas quais
uma inovação precisa passar durante o processo de legitimação. Já Kaartemo et al. (2020)
constatam, em estudo sobre a criação de modelos de mercado, que o trabalho institucional
realizado pelos atores públicos difere em relação ao desenvolvido pelas instituições privadas.
Em vista desses resultados, acredita-se que existam práticas denominadas, aqui, inibidoras, as
quais, ao ser realizadas, impactam, de maneira direta, na intenção de adoção da IoT pelas
fazendas de bovinocultura de MS, de maneira que se apresenta a última proposição
subsequente.
Esta pesquisa é caracterizada quanto aos seus fins como exploratória a qual
proporciona maior familiaridade com o fenômeno observado, com o objetivo de torná-lo mais
explícito e/ou auxiliar na construção de hipóteses e proposições (Munaretto et al., 2013;
Piovesan & Temporini, 1995). O planejamento de uma pesquisa exploratória é bastante
flexível, de tal forma que possibilita a consideração de diferentes aspectos ligados ao
fenômeno estudado (Gil, 2002).
Foram cumpridas duas etapas empíricas para coleta de dados as quais tiveram como
campo de pesquisa o estado de Mato Grosso do Sul (MS). A etapa 1 focou nas práticas de
trabalho institucional, desenvolvidas pelos atores institucionais do estado de MS e do governo
Federal. Os resultados desta etapa buscaram responder aos objetivos específicos “b” e “c”, ou
seja, evidenciar os atores institucionais que desenvolvem algum tipo de trabalho institucional
voltado à adoção da IoT pelas fazendas de bovinocultura, assim como os tipos de trabalho
político, técnico e cultural realizados no macroambiente do estado de MS. A etapa 2
relaciona-se ao objetivo específico “d” e visa destacar, de acordo com a fala de atores do
ambiente organizacional, fazendas de bovinocultura de corte, quais tipos de trabalho
institucional impactam como inibidores na adoção da IoT pelas fazendas de bovinocultura de
corte, no estado.
Método de Técnica
Questão de Objetivo Etapa de
Objetivos específicos levantamento de análise
pesquisa geral pesquisa
de dados dos dados
a) Identificar
Como práticas de trabalho institucional fomentam a adoção da Internet das Coisas (IoT) como
sobre o papel de práticas de trabalho institucional para adoção da Internet das Coisas (IoT) na
Propor um framework teórico-conceitual, consubstanciado na epistemologia estruturalista, teoricamente as
possibilidades de Revisão
Análise da
ferramenta de gestão na bovinocultura de corte do estado de Mato Grosso do Sul?
b) Mapear o campo
institucional por meio
da evidenciação dos
atores que trabalham Entrevista,
para a adoção da IoT documentos Análise de
como ferramenta de primários e conteúdo
gestão na secundários
bovinocultura de
corte de Mato Grosso
do Sul. Etapa 1
c) Identificar o
trabalho político,
técnico e cultural
Entrevista,
realizado pelos atores
documentos Análise de
institucionais para
primários e conteúdo
institucionalização da
secundários
IoT na bovinocultura
de corte no estado de
Mato Grosso do Sul
d) Destacar as
práticas de trabalho
institucional
“inibidoras” para Análise de
Etapa 2 Entrevistas
adoção da IoT na conteúdo
bovinocultura de
corte do estado de
Mato Grosso do Sul.
Fonte: Elaborado pelo autor.
65
Faria (2012) define questão epistemológica como o estudo dos conhecimentos que
objetivam o saber científico, tecnológico e filosófico. Para o autor, a epistemologia está
diretamente relacionada à ontologia por tentar explicar a natureza do conhecimento e a forma
como estes são produzidos: “(i) os meios para determinar a validade da informação; (ii) a
formulação e uso do método científico; (iii) os tipos de argumentos usados para chegar a
conclusões e; (iv) as implicações dos métodos e modelos científicos para as ciências" (Faria,
2012, p. 3).
realizam seus estudos no "campo", onde os participantes vivem e trabalham - esses são
contextos importantes para entender o que os participantes estão dizendo” (Creswell &
Inquiry, 2007, p. 18).
As principais epistemologias dentro dos estudos na área das ciências sociais aplicadas
são: positivismo, funcionalismo, estruturalismo, fenomenologia, pragmatismo e materialismo
histórico (Faria, 2012). Nesta tese, a dimensão epistemológica utilizada é o estruturalismo,
pois como a preocupação central é observar a relação entre o trabalho institucional realizado e
a adoção da IoT por fazendas de bovinocultura de corte, no estado de MS, acredita-se que o
estruturalismo seja uma epistemologia adequada à esta pesquisa.
estudo de Souza Neto e Mello (2009) no qual comenta que as pesquisas atuais de marketing
estão se utilizando de pressupostos teóricos e metodológicos estruturalistas para compreender
o modo como ocorrem práticas de consumo de determinados grupos ou cultura. Outro estudo,
aqui indicado, de Cezarino et al. (2019), utiliza uma abordagem estruturalista para desenhar
um framework que visa indicar caminhos para o posicionamento estratégico das economias
emergentes, em relação à implementação da indústria 4.0 e a economia circular no Brasil.
Para busca das pesquisas que compuseram a RSL, foram escolhidos, como base de
dados, dois repositórios científicos, Web of Science e Scopus, amplamente utilizados em
revisões sistemáticas em razão da grande quantidade de revistas e eventos indexados,
possibilitando, com isso, um universo de pesquisa abrangente. A definição das palavras-
chave, para busca automática nos repositórios, partiu da seleção de termos de pesquisa que se
relacionam diretamente às variáveis estudadas nesta revisão que são Internet das Coisas e
agropecuária. Estas palavras-chave foram divididas em dois grupos, conforme se observa no
Quadro 8, sendo o Grupo 1 composto pela palavra internet of things; e o Grupo 2, por
palavras relacionadas às atividades que compõem a agropecuária.
Grupo 1:
Internet of Things
Grupo 2:
Agricultural, agriculture, farming, precision agriculture, livestock, husbandry,
precision livestock, forestry, silviculture e fishing.
Fonte: Elaborado pelo autor.
sua grande maioria, artigos que apresentam, no mínimo, o título e resumo em inglês. A
operação lógica para busca avançada de artigos foi realizada por uma string de pesquisa que
combina os termos presentes nos dois grupos de palavras-chave (Quadro 9).
Filtros primários foram utilizados durante o processo de busca dos arquivos nos
repositórios científicos, a fim de se reduzir o número de artigos gerados, bem como aprimorar
a seleção dos mesmos para melhor responderem à questão de pesquisa. Os filtros são
apresentados a seguir:
A área de publicação do artigo deve ser uma das grandes áreas pré-definidas pelos
repositórios científicos: Negócios, Gestão e Contabilidade; Ciências Agrícolas e
Biológicas; Economia, Econometria e Finanças ou; Multidisciplinar.
Para exclusão do artigo da amostra final a ser analisada, o documento deveria atender
a um ou mais dos critérios apresentados abaixo.
Artigo duplicado.
A análise das pesquisas foi composta pela extração das seguintes informações: autores,
ano de publicação, journal publicado, métodos científicos utilizados, setor/atividade da
agropecuária ao qual a tecnologia está vinculada, países de estudo, sugestões para pesquisas
futuras e os domínios de aplicação principais à qual a inovação baseada em IoT se aplica. Os
domínios de aplicação do artefato, baseada em IoT, seguem um agrupamento proposto por
Talavera et al. (2017): Controle, Monitoramento, Predição ou Logística. No entanto, ficou
aberta a possibilidade de inserção de algum outro domínio que poderia emergir da análise dos
trabalhos.
Tendo como base o protocolo de pesquisa apresentado anteriormente, dois
pesquisadores realizaram, de forma independente, as buscas na Web of Science e Scopus, em
junho de 2020. A string de pesquisa (Quadro 9) foi inserida no campo de busca, limitando-se
ao título, resumo e palavras-chave dos artigos. Não houve limitação de tempo de publicação
dos artigos para busca.
A busca sistemática resultou na identificação primária de 4.588 documentos, sendo
1.385 na base Web of Science e 3.203, na Scopus. Nesta primeira etapa, foram aplicados os
filtros estabelecidos, a saber, idioma, área de publicação e tipo de arquivo. Desta primeira
filtragem, foram excluídos 4.294 arquivos, restando para a próxima etapa, seleção, 294
artigos.
Na etapa de seleção, para inclusão na amostra final, os estudos remanescentes tiveram
seus resumos lidos pelos dois pesquisadores, sendo que os critérios de inclusão e exclusão
foram aplicados. O primeiro critério de exclusão, artigos duplicados, resultou na eliminação
de 67 trabalhos. No segundo, 24 pesquisas estavam fora da agropecuária. Identificaram-se 36
trabalhos apenas teóricos. Sem acesso disponível para download, foram 10; e 26 pesquisas
não tratavam diretamente da IoT. Por fim, o critério que resultou na exclusão do maior
número de trabalhos, 92, que somente desenvolveram um artefato (Tecnologia), baseada em
IoT, sem teste empírico. Ao final, 39 estudos compuseram a amostra utilizada para análise
(Apêndice F).
O campo de estudo desta pesquisa é o estado de Mato Grosso do Sul. A partir desse
elemento, foram selecionados para pesquisa: (1) os atores institucionais, individuais e
coletivos, públicos e privados, do macroambiente do estado, que estejam ligados à realização
de ações envolvendo a IoT e bovinocultura de corte; (2) órgãos do governo Federal que atuam
70
Durante a realização desta pesquisa, enfrentou-se uma grave crise de saúde pública,
resultante da pandemia da covid-19, período este em que se adotaram medidas com o objetivo
maior de se garantir a saúde de todos os envolvidos e obedecer às diretrizes sanitárias
impostas pelo Ministério da Saúde. Com isso, as entrevistas que compõem as etapas empíricas
1 e 2 foram realizadas 100% de maneira remota, com o apoio do aplicativo Google Meet e de
ligação telefônica.
Por se tratar de uma pesquisa com seres humanos e, em consonância com normativas do
Conselho Nacional de Saúde – CNS: Resolução 466/2012 (Resolução No 466, 2022) e
Resolução 510/2016 (Resolução No 510, 2016), para a coleta de dados empíricas, fez-se
necessária a submissão deste projeto na Plataforma Brasil, para apreciação do Comitê de Ética
em Pesquisa (CEP), da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS, e em
atendimento da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa – CONEP. A submissão foi
realizada em 02/03/2021; e em 30/03/2021 houve retorno do CEP, com o parecer nº.
4.620.281, com status pendente, para o qual foi elaborada carta-resposta com os devidos
ajustes e esclarecimentos e enviada para apreciação do CEP. O retorno pela plataforma Brasil
veio no dia 18/05/2021, com o parecer de número 4.717.611, no qual consta a situação do
projeto como APROVADO. Após esta etapa, iniciou-se a validação dos instrumentos e a
coleta dos dados empiricamente.
que os dados fossem cedidos, apenas a assinatura do TCLE. Os atores entrevistados que
possuíam dados privados e/ou secretos expressaram essa questão durante as entrevistas,
relatando quais informações não deveriam ser utilizados no âmbito da pesquisa.
A seleção dos respondentes ocorreu inicialmente por duas formas: (1) contato do
pesquisador com uma empresa privada que fornece produtos IoT para as fazendas produtoras
de bovinos no estado, ocorrido em 2019, durante a participação em um evento sobre inovação,
promovido pelo SENAR-MS, na cidade de Dourados-MS; e (2) busca na internet, na página
do Google®, por trabalhos acadêmicos, reportagens e publicações diversas, utilizando como
estratégia de pesquisa os termos “IoT”, “Internet das Coisas” e “Mato Grosso do Sul”. Como
resultado da busca na internet surgiram mais sete nomes de atores do estado que poderiam
fazer parte da amostra pesquisada. Em um segundo momento, novos entrevistados foram
selecionados, mediante o uso da estratégia de amostragem não probabilística, denominada
snowball (Bola de neve). Esta estratégia consiste em selecionar, por meio da indicação de
fontes já entrevistadas, novas fontes de dados para compor a amostra da pesquisa (Vinuto,
2014). Desta forma, o número de entrevistados e sua relação com o fenômeno estudado se
tornam maior.
Quadro 10: Atores institucionais que compõem o público alvo para entrevistas
Tempo de
Código Setor Área de atuação Págs. Data
entrevista
SE01 Docente área da
Setor Educacional 01:01:51 14 05/04/2022
computação
SE02 Setor Educacional Incubadora de empresas 00:53:24 8 11/03/2022
SE03-1 Setor Educacional Docente/Pesquisador 00:43:50 12 15/03/2022
SE03-2 Setor Educacional Docente/Pesquisador 01:02:07 16 28/03/2022
SE04-1 Setor Educacional Docente/Pesquisador 00:59:30 15 30/09/2021
SE04-2 Setor Educacional Docente/Pesquisadora 00:53:59 15 08/10/2021
SP01 Setor Privado Pecuária de precisão 00:41:46 13 14/12/2021
SP02 Setor Privado Sócio proprietário 00:54:48 12 12/05/2022
SP03 Setor Privado Customer Sucess 01:19:55 23 14/06/2022
SP04 Setor Privado Sócia proprietária 01:05:01 15 08/03/2022
SP05 Setor Privado Sócio proprietário 00:57:25 15 07/12/2021
SP06 Analista da área de
Setor Privado 00:37:40 11 22/10/2021
inovação
SP07 Centro de excelência em
Setor Privado 00:40:06 9 08/10/2021
Bovinocultura de Corte
SPE01 Setor Público
Diretor presidente 00:46:19 13 20/10/2021
Estadual
SPE02-1 Superintendência de
Setor Público ciência e tecnologia,
00:46:17 12 14/10/2021
Estadual produção e agricultura
familiar
SPE02-2 Setor Público Coordenadoria de ciência,
00:32:47 8 22/10/2021
Estadual tecnologia e inovação
SPF01 Setor Público Supervisor de Tecnologia
01:28:00 25 29/09/2021
Federal da Informação
SPF02 Setor Público Departamento de Apoio à
00:54:22 14 15/07/2022
Federal Inovação Agropecuária
SPF03 Setor Público Coordenadoria Geral de
00:45:59 11 05/08/2022
Federal Transformação Digital
Fonte: Elaborado pelo autor.
A triangulação, de acordo com Yin (2015), pode ser de quatro tipos diferentes: por
múltiplas fontes de dados; entre diferentes pesquisadores; por meio da teoria; e a triangulação
metodológica. Em uma pesquisa científica, é necessário que existam fontes diversas de dados
que convergirão em uma triangulação, a fim de se responder às proposições desenvolvidas
previamente (Creswell, 2010; Yin, 2015). Nesta pesquisa, a triangulação foi realizada por
meio do confronto dos dados adquiridos nas múltiplas fontes de evidências.
A saturação teórica ocorre quando nenhum novo elemento, capaz de trazer novas
informações, é encontrado, deixando de ser, assim, necessária a continuidade da coleta dos
dados, pois o que surge não tem a capacidade de alterar a compreensão do fenômeno estudado
(Nascimento et al., 2018). No caso dessa tese, identificou-se a saturação teórica, ao se deparar
com a escassez de entrevistados no campo de pesquisa.
O intuito foi identificar, no caso das fazendas que possuem algum produto IoT, qual
ou quais tipos de trabalho institucional foram importantes para que adotasse essa tecnologia.
No caso das fazendas que ainda não o (os) adotam, quais tipos de trabalho institucional são
entendidos como imprescindíveis para fazer com que essa adoção ocorra em um futuro
próximo.
que possui perguntas específicas para cada público entrevistado e perguntas gerais, para os
dois grupos. No entanto, todas estão dentro das mesmas características teóricas.
A validação do roteiro de entrevista para esta etapa da pesquisa foi realizada por
especialistas teóricos e de mercado. O primeiro especialista ouvido é consultor técnico da
COIMMA, empresa agropecuária, com atuação nacional, que fornece para o mercado
produtos IoT, voltados à bovinocultura. A segunda avaliadora é professora da área de
computação da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) e sócia de uma
empresa de tecnologia para pecuária bovina. O terceiro e último a avaliar o roteiro de
entrevista foi o analista, responsável pela gerência-geral de tecnologia da informação da
Embrapa. Foi solicitado aos três avaliadores que tecessem críticas sobre o roteiro de entrevista
a ser aplicado nas fazendas. Quando pertinentes ao objetivo da pesquisa, os comentários
foram avaliados e incorporados ao roteiro semiestruturado.
Foram adotados os seguintes critérios para seleção das fazendas entrevistadas a serem
pesquisadas: a propriedade rural deveria ser sediada no estado de MS; trabalhar com
bovinocultura de corte; participar de algum programa de melhoramento genético; e que, a
figura do proprietário, gestor ou funcionário responsável conhecesse, no mínimo, um dos
produtos IoT em comercialização no mercado. Como a variedade desses produtos ainda é
baixa e a disponibilidade no mercado é recente, saber que o entrevistado conhece
minimamente algum dos produtos IoT citados permitiu identificar, com maior fidelidade, a
visão do mesmo sobre o produto e o que poderia ser feito a nível de práticas de trabalho
institucional para que a fazenda ou outras fazendas se propusessem a adotar tais produtos
como ferramenta de gestão.
Diante desses critérios, para tentativa de contato, foram utilizadas duas listas de
clientes de associações, voltadas ao melhoramento genético de bovinos. Acredita-se que a
chance de as fazendas que estejam nesta lista conhecer produtos IoT seja maior, pois os
produtos IoT mais sedimentados no mercado são justamente utilizados em processos de
melhoramento genético. A primeira lista utilizada, do Programa Embrapa de Melhoramento
de Gado de Corte – GENEPLUS, disponibiliza, em seu site, uma relação com 79 fazendas de
MS que trabalham com melhoramento genético do gado da raça nelore. A segunda lista, da
Associação Nacional de Criadores e Pesquisadores (ANCP), contém o nome de 55 fazendas
de MS, cadastradas em seu programa, sem identificação de raça bovina. Como nas duas listas
o pesquisador, somente teve acesso ao nome e cidade em que as fazendas estavam
localizadas, foi necessária uma busca na internet para tentar encontrar o número telefônico
77
dessas propriedades; no entanto cerca de 60% do total de fazendas listadas ou não possuíam
telefone cadastrado, ou não atenderam às ligações.
Tempo de
Código Cidade Área de atuação Págs. Data
entrevista
FAZA01 Terenos - MS Gerente Geral 00:39:34 10 05/09/2022
FAZA02 Terenos - MS Gerente comercial 01:00:57 13 08/09/2022
FAZA03 Maracaju - MS Proprietária/Gerente - 5 13/09/2022
FAZN04 Anastácio - MS Proprietário 00:33:57 7 03/10/2022
António João -
FAZN05 Proprietário 00:30:28 7 20/10/2022
MS
FAZN06 Bela Vista - MS Proprietário 00:24:44 7 21/10/2022
FAZN07 Juti - MS Administrador 00:21:39 6 23/10/2022
Campo Grande - Proprietária/
FAZN08 00:16:17 5 09/11/2022
MS Responsável técnica
Fonte: Elaborado pelo autor.
Como método de análise dos dados, adotou-se a análise de conteúdo (AC), proposta
por Bardin (2009). O procedimento para análise dos dados das duas etapas empíricas foi o
mesmo, variando apenas a fonte dos dados. A análise de conteúdo consiste em um conjunto
de técnicas de análise de dados textuais ou em outros formatos que, por meio de
procedimentos sistemáticos e objetivos, compreende criticamente o sentido das comunicações
e seus significados explícitos ou implícitos (Bardin, 2009).
Nesta tese, a lógica de análise escolhida foi o método dedutivo, utilizando-se, como
categorias, as categorias amplas de trabalho institucional, como subcategorias, as práticas de
trabalho institucional, e como, unidades de análise, as formas de trabalho institucional citadas
pela literatura como ações pelas quais os atores realizam tais práticas. Contudo, a análise não
seguiu um processo dedutivo fechado, permitindo que novas categorias ou subcategorias
emergissem dos dados analisados. Com isso, para a etapa 2, já se incluiu uma nova prática de
trabalho institucional que emergiu da análise dos dados da etapa 1, Pesquisa e
Desenvolvimento. No Quadro 13, é apresentado o referencial de codificação para análise de
conteúdo realizada.
80
Como comentado, os dados que compõem a Etapa Empírica 1 são formados pelas
transcrições das entrevistas com atores institucionais, ligados ao fenômeno estudado, no total
de 261 páginas; e por dados secundários, coletados nos sites das organizações entrevistadas,
no total de 154 páginas. As entrevistas foram gravadas, mediante autorização, e transcritas
posteriormente, constituindo, junto com os dados secundários, o corpo textual utilizado para a
análise de conteúdo. Na Etapa Empírica 2, 60 páginas correspondem à transcrição das
entrevistas gravadas com gestores e/ou proprietários das fazendas produtoras de bovinos de
corte, no estado de MS. As transcrições das entrevistas realizadas em vídeo ou áudio, em
ambas as etapas de pesquisa, foram apoiadas com a utilização do site, Transkriptor®.
Ao total, as etapas para análise dos dados foram divididas em nove partes que
compreendem desde a transcrição das entrevistas, preparação de todo o corpo textual
utilizado, importação dos arquivos para o software de análise qualitativa, codificação do
material seguindo o referencial de codificação e codificação livre, geração dos relatórios do
Atlas.ti8, tratamento dos dados e apresentação, análise teórica e discussão dos resultados
empíricos.
81
Com base neste último resultado: práticas de trabalho institucional versus existência
segundo os grupos de atores entrevistados, é observado o macroambiente de MS como um
todo, ou seja, agrega-se todos os grupos de respondentes em apenas um. No caso de a maioria
dos setores estarem listados com resultado semelhante, a classificação final seguiu a
classificação predominante. Por exemplo, no caso de uma prática estar listada como “existe”,
83
em quatro ou três setores, considerou-se que esta prática, existe, no macroambiente. O mesmo
raciocínio foi utilizado para as outras classificações, existe parcialmente e não existe. Nos
casos em que dois setores estão classificados como não existe ou existe, e dois setores como
existe parcialmente, optou-se por avaliar o macroambiente de acordo com a classificação
“extrema”. Nos casos em que dois setores estão listados como existe e dois como não existe,
classifica-se como existe parcialmente.
A universidade SE03 foi criada em 1994 e possui 15 campus espalhados pelo estado
de MS. Com oferta de cursos de graduação, especialização, mestrado e doutorado, a
organização entrevistada objetiva atender às necessidades da região e ajudar no
desenvolvimento tecnológico e social do estado. Ao realizar as entrevistas com docentes
pesquisadores da universidade, pôde-se identificar que a universidade tem um projeto de
zootecnia de precisão e um setor específico para bovinocultura de corte. Diante disso, o
contato da organização com a adoção da IoT para bovinocultura de corte ocorre em dois
87
momentos: primeiro, por meio dos aparelhos IoT instalados nos animais da fazenda
experimental da universidade, como se observa no comentário a seguir:
Outro projeto que envolve a adoção de IoT na pecuária foi apresentado pela
entrevistada SE04-2, professora e pesquisadora da área de computação. Segundo ela, há
alguns anos, na universidade, há um mestrado em computação aplicada que tem desenvolvido
estudos sobre a implementação da IoT na bovinocultura de corte. Conforme cita a
entrevistada SE04-2, diferentes projetos estão em elaboração dentro do programa de
mestrado:
88
A gente tem projetos nessa área, né? Estamos estudando, ainda, algumas formas de
como implementar a Internet das Coisas na pecuária, então, muitas das coisas ainda
estão em fase de projeto. Aqui na universidade tem o mestrado profissional que é
bastante voltado para a área da pecuária e a gente tem vários projetos junto com o
SPF01, pois a gente trabalha em conjunto com o SPF01. Até o projeto meu com o
Camilo, é justamente pra gente conseguir centralizar essas informações e montar
uma infraestrutura de IoT. (SE04-2)
Além das ações citadas anteriormente, a universidade ainda desenvolve, junto ao
SPF01 e ao SP02, protótipos de um alimentador automático, com tecnologia IoT, para
fornecimento de ração aos bovinos. Este projeto tem um aporte financeiro de mais de 353 mil
reais, captados pela universidade junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (MAPA) e cuja realização, segundo os pesquisadores, irá beneficiar a
comunidade científica, ao permitir que novas pesquisas sejam realizadas, além de funcionar
como um showroom para produtores e empresários que venham a conhecer a tecnologia e
queiram implantá-la em suas propriedades.
O entrevistado SP02 é uma startup brasileira, sediada em Campo Grande, MS, que tem
como foco o desenvolvimento de soluções tecnológicas inovadoras, e que surgiu dentro do
organização entrevistada SE04. Atualmente, a organização está incubada na mesma
organização em que surgiu. Entre seus principais produtos, todos ainda em fase de teste, estão
dois baseados em IoT. O primeiro é uma plataforma de monitoramento bovino, desenvolvida
em parceria com o SPF01 e o SE04. Esta plataforma conta com dispositivos acoplados em
uma espécie de cabresto para coleta dos dados junto aos bovinos (Figura 7). Além disso,
possui equipamentos para transmissão, análise e apresentação dos dados coletados. As
principais informações coletadas, segundo o entrevistado, são “(...) algumas informações
fisiológicas do animal, como a temperatura do animal e frequência cardíaca e respiratória do
animal”.
Outro produto que ainda está em fase de teste e possui tecnologia IoT é um
equipamento de suplementação alimentar automatizado, que fica no meio do pasto,
fornecendo ração com horário e quantidade programados (Figura 8). Este produto está sendo
desenvolvido, também, em parceria com o SPF01 e SE04:
(...) é um dispositivo totalmente autônomo ali no pasto que tem comunicação com a
internet por meio de uma estação base. Então, todos os eventos que acontecem são
enviados para a estação base, ela envia esses dados para a nuvem e por meio da
estação base é possível configurar o equipamento e fazer o monitoramento da
suplementação de todos os lotes. (SP02)
90
metabolismo, utilizados para prestação de quatro tipos de serviço diferentes, voltados tanto ao
mercado como para desenvolvimento científico.
Entre os dois principais serviços prestados pela empresa para a bovinocultura de corte,
(cada serviço possui um nome comercial que será mantido em sigilo) estão: o primeiro
serviço é realizado com a balança de pesagem eletrônica voluntária e funciona instalando o
equipamento em frente a um bebedouro no curral. A balança reconhece o animal por meio do
brinco eletrônico e envia automaticamente as pesagens coletadas para a nuvem que armazena
estas informações e as envia, em tempo real, para um sistema que realiza a análise estatística,
gera alertas e dá suporte para as tomadas de decisão. O dispositivo utilizado para a prestação
desse serviço é similar ao do SP01.
Figura 10: Balança voluntária de pesagem e brinco com leitura por RFID
O SP06 é uma organização brasileira privada, de serviço social, sem fins lucrativos,
que presta apoio às micro e pequenas empresas desde 1972. Com objetivo de capacitar e
promover o desenvolvimento econômico e competitivo das empresas assistidas, a organização
fornece cursos de capacitações, consultoria e outros diferentes serviços que estimulam o
empreendedorismo no Brasil. Trata-se de uma organização nacional, que possui unidades
administrativas e educacionais em todos os estados do país, desenvolvendo ações específicas
para cada região. A organização entrevistada não possui, em Mato Grosso do Sul, projeto
exclusivo voltado à IoT, contudo esta tecnologia permeia as atividades de inovação da
organização. Isso ocorre, pois a mesma tem como papel ofertar ambientes de inovação no
estado os quais podem receber diferentes tipos de ideias e projetos inovadores, até projetos
voltados à adoção da IoT para a bovinocultura de corte.
Entre as principais ações desenvolvidas que podem receber projetos de IoT, estão o
laboratório de inovação, editais de fomento à inovação, lançados nacionalmente, e a criação
de ecossistemas de inovação, nas diferentes cidades do estado de MS. Segundo a entrevistada:
94
“linhas de fomento para o capital humano”, nome dado pela fundação às bolsas de estudo
concedidas para alunos de ensino médio, graduação, mestrado e doutorado.
Tem o que a gente chama de economias do futuro, que tem até em outra área, que
são o projeto Centelha e agora o Tecnova que são as subvenções econômicas e os
bônus tecnológicos. Se você observar os nossos editais do Centelha essas
tecnologias já estão presentes. Blockchain está sempre presente, Internet das Coisas,
machinelearning também, inteligência artificial, Bigdata, todos já estão previstos
nesses editais. (SPE01)
Entre os entrevistados do setor público do estado de Mato Grosso do Sul, está o
SPE02, uma secretaria do estado, responsável por projetos em todas as áreas de
desenvolvimento agropecuário, inclusive, ciência, tecnologia e inovação. De acordo com o
SPE02-2, esta secretaria “executa toda a parte de projetos junto a FINEP2 e CNPq3. Então, a
gente escreve os projetos e capta recurso financeiro e também a gente realiza feiras e eventos
ligadas a ciência e tecnologia”. As ações do ator entrevistado, voltadas à adoção da IoT na
pecuária, não são exclusivas para a tecnologia, no entanto projetos que utilizam a IoT na
bovinocultura de corte podem ser contemplados, em razão da amplitude das tecnologias
aceitas pelos programas lançados. Entre essas ações, constam feiras de inovação para o agro,
eventos sobre tecnologias 5G e editais de subvenção econômica:
2
A Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) é uma empresa pública brasileira de fomento à ciência,
tecnologia e inovação em empresas, universidades, institutos tecnológicos e outras instituições públicas ou
privadas, sediada no Rio de Janeiro. Fonte:
3
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (até 1974, Conselho Nacional de Pesquisas,
cuja sigla, CNPq, se manteve) é uma entidade ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI)
para incentivo à pesquisa no Brasil. Fonte:
96
Então, essa parceria tripartite tá possibilitando que a gente crie dentro da unidade um
campo experimental com rede IoT e esse campo ele vai utilizar algoritmo de
inteligência artificial para monitorar bem-estar animal e predizer ganhos de
produtividade como uma fase 1 do projeto, mas a nossa ideia é que esse projeto
persista. (SPF01)
97
Eu vou lhe falar de maneira transversal. A gente não escolhe uma cadeia específica.
(...) Assim que a gente chegou, a gente procurou fazer alguns estudos de cenários
futuros e definiu cinco eixos estratégicos de atuação na área de inovação do
ministério: sustentabilidade; bioeconomia; inovação aberta; agricultura digital e
foodtechs. (SPF02)
Dentro do planejamento realizado para as atividades relacionadas à IoT,
desenvolveram-se algumas iniciativas, entre elas, a criação, em parceria com o SPF03, da
Câmara Agro 4.0. Nas palavras do entrevistado, dentro do site da Câmara, “(...) tem uma série
de documentos e o principal deles que pode servir de subsídio para teu trabalho é o plano de
ação da Câmara Agro 4.0, pois ele leva em consideração, primordialmente, a implementação
do Plano Nacional de Internet das Coisas”.
Além da criação da câmara, o SPF02 ainda realiza outras ações como, por exemplo, a
abertura de editais, junto a órgãos como a ABDI, FINEP e BNDES, para apoiar ideias e
empresas que estejam desenvolvendo projetos de inovação para o agro. Outra ação destacada
pelo entrevistado é a busca por estabelecer, fomentar e fortalecer ecossistemas regionais, em
cidades ou regiões, voltados à inovação agropecuária no país. Para o estado de Mato Grosso
do Sul, foi celebrado um “protocolo de intenções”, com todo estado, pois existiam algumas
iniciativas dispersas e, por isso, fazia mais sentido ao SPE02 celebrar esse acordo, de maneira
conjunta.
98
A gente percebeu que nos últimos três anos teve uma revolução nessa questão de
agricultura digital só que as informações não estavam muito fáceis de visualizar e
então, a gente criou e lançou no começo do ano um portal Agro Hub Brasil. Lá a
gente tem um conjunto de informações de quais são os ambientes de inovação, são
mais de cinquenta, os hubs existentes e as aceleradoras focados em agropecuária.
Tem também quais são os ecossistemas regionais que a gente tem trabalhado e
quais são as startups. (SPF02)
Por fim, o SPF03 é, assim como o entrevistado anterior, parte de um ministério do
poder Executivo Federal. Criado em 1985, este ministério é responsável por formular e
implementar a política nacional de ciência e tecnologia no país. Suas ações, direcionadas à
IoT, começaram em 2016, com a realização de um estudo chamado “Internet das Coisas, um
plano de ação para o Brasil”, realizado em parceria com o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Depois da conclusão e publicação do
estudo, foi lançado o Plano Nacional de Internet das Coisas, que definiu quatro verticais de
atuação no país: cidade, indústria, saúde e agropecuária.
Durante a entrevistada, foram citados diferentes projetos em nível nacional para apoiar
iniciativas de inovação nas quatro verticais estabelecidas pelo plano de IoT. No entanto, essas
ações são abrangentes e perpassam diferentes tipos de tecnologia e áreas de implementação,
sendo assim não são realizados projetos específicos em nível nacional para a IoT, assim como
a aplicação destes na pecuária de corte. Os mesmos podem, ou não, ser contemplados, já que
os editais possuem um leque de tecnologias atendidas. Cabe ao SPF03:
4.2.1.1 Advocacia
As ações listadas pela literatura que caracterizam a advocacia são apoio político e
regulatório; realização de lobby por recursos; promoção de agendas; e proposição ou ataque à
legislação existente.
Ao realizar a análise dos dados com foco na identificação de ações de apoio político e
regulatório, constatou-se que treze atores entrevistados dizem ter conhecimento de projetos
dessa natureza. Contudo, a falta de apoio político por parte do estado de MS foi um destaque
recorrente nas falas dos entrevistados. Diferentes atores relatam sentir falta de ações do
governo, voltadas especificamente à IoT ou que pelo menos que contemplem esta tecnologia.
Tal descontentamento é corroborado pelo próprio SPE02, órgão do governo do estado, que
cita serem pequenas as iniciativas no estado. As poucas ações visualizadas em nível estadual
são apresentadas a seguir.
O SPE01 cita o apoio a projetos de IoT, por meio de dois caminhos principais: o
primeiro, mediante editais de apoio à pesquisa, em diferentes níveis educacionais, como
menciona o entrevistado: “Aí você tem algumas linhas de fomento daquilo que a [SPE01]
101
chama de Capital Humano que são nossas bolsas: várias bolsas de mestrado, doutorado, pós-
doutorado. Na verdade já tem bolsas hoje desde o ensino médio, ensino superior também tem
bolsas”. A segunda forma de apoio político ocorre por meio da realização de programas
voltados a estimular a criação de empreendimentos inovadores e disseminar a cultura
empreendedora no estado de MS: Centelha MS e Tecnova. Esses programas são realizados
em parceria com o SPE02, como se pode observar na fala do entrevistado: “A gente fomenta
muito as inovadoras através de dois programas FINEP que a gente capta recurso, e a [SPE01]
aplica, que é o Centelha e o Tecnova. São subvenções econômicas sem devolução”.
Foram lançados dois editais Centelha MS; o primeiro, em 2019, no qual 30 projetos
foram selecionados e contemplados, com um aporte de 60 mil reais. Entre os projetos
contemplados, estão três que trabalham com IoT na agricultura e um com IoT na pecuária de
corte. Em 2021, foi lançada a segunda edição do Centelha MS, que ainda está em fase de
análise dos projetos submetidos. De acordo com os editais preliminares, mais quatro projetos,
que trabalham com a temática da Internet das Coisas para a agropecuária, estão pleiteando o
apoio por meio da programa.
O Governo rodou dois editais e vai rodar o terceiro agora de forma estadual. Então
eles rodaram o Centelha, depois rodou o Tecnova que foi, se eu não me engano para
dez empresas. A gente foi selecionado como uma delas. A gente pegou duzentos mil
a fundo perdido pra desenvolver a nossa solução de balança móvel que está em
desenvolvimento. (SP05)
Eu tenho visto, como eu disse, alguns editais da [SPE01], por exemplo. Aí já tem o
Centelha também, né? Centelha MS tem trazido essa questão da inovação. Eu acho
que eles têm dado oportunidade sim, mas eu acho que precisa mais. (SE02-1)
Durante as entrevistas, algumas ações de apoio político, voltadas a IoT, também foram
identificadas em nível Federal. Os SPF02 e SPF03 listaram variadas ações realizadas em
conjunto por eles, em nível nacional, de maneira ampla quando se observa a aplicação da IoT.
Contudo, essa ações impactam todas os atores nacionais que queiram trabalhar com IoT para a
bovinocultura de corte. A primeira e mais conhecida delas é a realização do estudo “Internet
das Coisas: um plano de ação para o Brasil” que teve início em janeiro de 2017 e foi
encerrado com o lançamento do “Plano de Ação”, um documento que contém 60 iniciativas
propostas pela equipe gestora para quatro verticais diferentes: Cidade, Saúde, Rural e
Indústria.
Como forma de colocar em prática as ações traçadas pelo estudo sobre IoT, surgiu o
Decreto Nº 9.854, de 25 de junho de 2019, que institui o Plano Nacional de Internet das
Coisas e que dispõe sobre a Câmara de Gestão destinada a acompanhar a implementação do
Plano. Em agosto de 2019, lançou-se a Câmara Agro 4.0 que ficou responsável pela
implementação da ação focada do Plano de IoT, na questão do agro. Dentro da câmara, foram
assinados diversos protocolos de intenções com cidades, regiões e estados como, por
exemplo, o Mato Grosso do Sul, que visam criar ecossistemas regionais de inovação:
(...) a gente formaliza com esses protocolos mais como um instrumento de confirmar
assim os interesses, as intenções do que como uma exigência de que o estado se
comprometa com algo. É simplesmente entender que esse é o futuro e que a gente
tem que caminhar em conjunto e dar as condições para que as instituições de
pesquisa, as empresas e o produtor rural, principalmente, estejam dialogando para
construir essa agenda. Sem esse diálogo é difícil, não adianta. É nesse sentido aí que
a gente tem trabalhado, o político!! Não tem como, o papel do [SPF02] é política e
programas, mas quem executa são as universidades, são as instituições de pesquisas,
são os atores locais. (SPF02)
A existência de ações de Lobby4, no estado de MS, foram citadas por três atores
entrevistados, sendo que dois deles, declaram já ter realizado lobby junto ao governo do
estado; e o terceiro afirma ter conhecimento da realização de lobby por de outras empresas.
4
Lobby é a “atividade de pressão por parte de um grupo organizado, a fim de exercer influência no voto de
parlamentares, conforme determinados interesses”. Fonte: https://www.estadao.com.br/politica/lobby-entenda-o-
que-significa-e-o-que-e-permitido-fazer-no-brasil.
103
Até, por isso, teve reunião, tem umas duas semanas, de conversas sobre esse
movimento, daí só tinha eu de representante de empresa lá. Quarenta pessoas e o
resto era governo, era secretaria de inovação municipal, era pô, mas a gente tá
discutindo o que que deve ser beneficiado e o que deve ser de benefício para as
empresas, mas não tem empresa. Então assim, eu expus a minha situação, eu expus
as minhas necessidades (SP05).
Um terceiro entrevistado do setor privado indica não ter realizado a prática de lobby,
dentro do estado de MS, no entanto cita ter conhecimento de duas situações em que isso
ocorreu: a primeira, realizada por sindicatos rurais de alguns municípios do estado que
procuraram órgãos do governo estadual para solicitar políticas de capacitação dos
trabalhadores rurais para as tecnologias da agropecuária 4.0, entre elas, as fornecidas pela
empresa. A segunda, realizada por iniciativas privadas, com intuito de trazer o 5G de maneira
mais rápida e ampla para o estado.
Algumas práticas de lobby para a IoT são citadas por entrevistados como existentes
em nível Federal. Tais ações ocorrem frequentemente dentro da Câmara Agro 4.0, conforme o
SPF02:
A própria Câmara 4.0 é uma das instâncias onde isso acontece. Na câmara agro 4.0,
são mais de cem instituições, eu diria que oitenta por cento são representantes do
setor produtivo, mas eu não estou falando só de produtivo da pecuária e da
agricultura. Eu diria que maior parte das instituições que estão lá são das áreas de
tecnologia, operadoras, a questão de semicondutores da área digital, conectividade,
automação. (SPF02)
A promoção de agendas foi identificada na fala de seis entrevistados, sendo que três
deles declaram possuir uma programação de ações voltadas para IoT; e outros três referem,
apenas, ter conhecimento sobre a existência de agendas estaduais ou federais. Entre os três
atores entrevistados que afirmam possuir agendas de trabalho, dois deles, SPF02 e SPF03,
104
possuem ações traçadas para a IoT, no entanto estas são para todo o país e não direcionadas
exclusivamente à pecuária. O terceiro ator possui uma agenda de trabalho para o estado de
MS, contudo a mesma não é direcionada a IoT e, sim, à inovação de forma geral.
A agenda traçada pelo SPF03 diz respeito ao plano de ações estratégicas de 2021-
2024, definido pelo órgão do poder executivo federal para a Internet das Coisas no Brasil.
Essas ações estratégicas estão no site institucional do órgão e possuem 60 ações divididas
entre diferentes horizontais: Viabilidade Econômica; Regulatório, Segurança e Privacidade;
Infra. Conectividade e Interoperabilidade; Capital Humano; Inserção Internacional; e Ciência,
Tecnologia e Inovação.
Uma terceira agenda, destacada pelo SPF02, é o plano de ação definido para a Câmara
Agro 4.0, entre os anos de 2021-2024, publicado no site da Câmara e que tem como
prioridade:
Então assim, o ecossistema ele é composto aí por várias instituições, (...) composto
pela academia, por governo e o que puder participar em termos de governo do estado
como a FUNDECT, prefeituras, as empresas privadas e as instituições do sistema S.
Quando a gente mapeia a gente coloca, verifica, um planejamento estratégico para
aquela região, para aquele município para fomentar o ecossistema. (SP06)
Ao investigar a proposição de novas legislações e ou ataque as legislações existentes,
três atores entrevistados, SPE01, SPF02 e SPF03, relatam conhecer a existência de leis e
decretos voltados à IoT. Após pesquisa em sites na internet, no site do governo Federal e falas
de alguns dos entrevistados, identificou-se, sobre IoT, uma resolução, um decreto e uma lei;
todos em nível federal. No entanto, os mesmos não regem especificamente sobre a IoT na
pecuária e, sim, sobre a utilização desta tecnologia, em qualquer área dentro do território
nacional.
Art. 1º Fica instituído o Plano Nacional de Internet das Coisas com a finalidade de
implementar e desenvolver a Internet das Coisas no País e, com base na livre
concorrência e na livre circulação de dados, observadas as diretrizes de segurança da
informação e de proteção de dados pessoais.
Art. 4º Ato do Ministro de Estado da Ciência, Tecnologia, Inovações e
Comunicações indicará os ambientes priorizados para aplicações de soluções de IoT
e incluirá, no mínimo, os ambientes de saúde, de cidades, de indústrias e rural.
(Brasil, 2019, p. 10)
O segundo documento legal publicado foi a “RESOLUÇÃO Nº 735, DE 3 DE
NOVEMBRO DE 2020” que “altera o regulamento sobre exploração do serviço móvel
pessoal por meio de rede virtual, o regulamento geral de portabilidade e o regulamento geral
de direitos do consumidor de serviços de telecomunicações” (Resolução No 735, 2020, p. 5).
106
O terceiro e último documento legal, foi lançado pelo governo Federal, é a “LEI Nº
14.108, DE 16 DE DEZEMBRO DE 2020”, também conhecida como Lei da Internet das
Coisas. No entanto, a referida Lei não regula a Internet das Coisas (IoT) e, sim, refere-se à lei
de direito tributário que se aplica à IoT, com fins de reduzir a zero a alíquota de determinadas
taxas e contribuições para as comunicações realizadas de máquina a máquina. Com isso,
desde 1º de janeiro de 2021 e pelo período de cinco anos, as comunicações efetuadas por
objetos IoT não são oneradas com as mesmas taxas e contribuições que incidem legalmente
sobre a telefonia móvel e demais serviços de telecomunicações no Brasil.
Com a lei, nós preparamos nosso decreto, foi o quarto estado a ter sua
regulamentação da lei de ciência e tecnologia do país, ou seja, desde 2018 nós
estamos aptos a aplicar de forma mais ágil, efetivo e moderna recursos utilizando o
marco legal de ciência e tecnologia. Isso dá uma flexibilidade de colocação do
recurso na mão do pesquisador ou da pessoa que recebe subvenção econômica de
forma mais rápida, ágil. (SPE01)
Em busca, na internet, foram identificados apenas dois aparatos legais no estado de
MS, voltados para inovação, embora não específicos à IoT. Estes documentos são: o Decreto
Estadual “Nº 15.116, DE 13 DE DEZEMBRO DE 2018”, e a “LEI Nº. 6.786, DE 9 DE
MARÇO DE 2022”, promulgada pelo poder Executivo de Campo Grande. A lei nº. 6.786, de
9 de março de 2022, institui a política municipal de desenvolvimento da inovação e tecnologia
no ambiente produtivo urbano e rural de Campo Grande (LEI n. 6.786, 2022). O Decreto nº
15.116 visa “Regulamentar a Lei Federal nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004, no tocante a
normas gerais aplicáveis ao estado de Mato Grosso do Sul, e dispõe sobre outras medidas em
matéria da política estadual de ciência, tecnologia e inovação” (Decreto n. 15.116, 2018, p. 2).
4.2.1.2 Definição
Durante a análise das entrevistas, constatou-se a existência de três tipos de ações que
caracterizam o trabalho de definição: processos de acreditação formal, criação de padrões e
certificação de atores em um campo. De acordo com os resultados, não foram identificadas
ações de criação de padrões, nas falas dos atores entrevistados.
107
Ações relacionadas aos processos de acreditação formal foram citadas por sete atores
entrevistados, no entanto a acreditação observada ficou restrita à realização de projetos de
pesquisa com IoT que envolvam testes em animais. Na realização de pesquisas para
desenvolvimento de produtos IoT para a bovinocultura de corte, é necessário que os testes de
campo sejam liberados pelo comitê de ética da universidade ou pelo centro de pesquisa ao
qual o projeto está ligado.
A gente tem o CUA dentro da instituição, o comitê de ética no uso de animais. Para
a gente fazer a pesagem desses animais, trabalhar com os animais a gente precisa
dessa certificação, dessa aprovação do comitê de ética, porque queira ou não a
pesagem acaba causando um certo estresse para os animais. (SE03-1)
O governo do estado de MS, como cita o SPE02, não realiza ações de acreditação
voltadas para utilização da IoT: “as empresas não precisam passar por nada no estado,
absolutamente. Elas funcionam por conta e risco próprio. A única coisa que elas podem passar
pelo estado é se elas vão pegar recurso de crédito, por exemplo FCO em Mato Grosso do Sul”
(SPE02-2).
No caso da Anatel, (...) se você não tiver, por exemplo, o registro do rádio, o rádio
homologado pela Anatel, se você desenvolve um equipamento e não faz a
regulamentação devida junto a ANATEL, você não vai ter como comercializar ele
no Brasil, porque todos os equipamentos radiotransmissores eles precisam ser
homologados pela Anatel. (SPF01)
A segunda forma de definição ligada à certificação dos atores, refere-se ao registro de
patentes. Os atores SE01, SE04, SP01, SP02 e SPF01 dizem já ter solicitado alguma patente
108
4.2.1.3 Aquisição
No caso específico do SPF03, entende-se que houve a prática de aquisição, pois foi
firmado, junto ao SPF02, um acordo de cooperação, no qual as ações nacionais voltadas para
a IoT no ambiente rural ficam a cargo do parceiro especializado em desenvolver políticas para
o ambiente do agronegócio. Conforme afirma a entrevistada: “É porque a câmara do agro, nós
fazemos a gestão junto com o [SPF02]. E a grande maioria das ações que são financiadas no
âmbito da Câmara do agro elas são executadas pelo [SPF02], [SPF01] e essas instituições que
são ligadas ao agro no Brasil”.
Como responsável, no país, pela execução do plano nacional para IoT, voltado para o
agro, cabe ao SPF02 realizar o planejamento estratégico para a área do agro; elaborar o plano
de ação; realizar parcerias para fomento da tecnologia; estabelecer, fomentar e fortalecer os
ecossistemas regionais de inovação agropecuária no país; fechar acordos de cooperação;
lançar editais e chamadas públicas para fomento de projetos de inovação; e a atuação no
âmbito regulatório. Estas ações são realizadas, a fim de se dar cumprimento ao plano de ação
elaborado para a Câmara Agro 4.0:
ações como essas: “o [SPF02] não entra nessa seara em questão de mercado. Elas devem estar
regulares no país, ter CNPJ, todas as questões legais para construção de uma empresa.
Atender as questões tributárias, a legislação trabalhista, tudo isso”. (SPF02).
No entanto, ações que facilitam o acesso desses produtos IoT ao mercado da pecuária
são citadas pelo SE02 como algo que deveria acontecer. Quando questionado sobre quais
eram os principais problemas enfrentados para poder desenvolver e comercializar esses
produtos pelas empresas que trabalham com Internet das Coisas e pecuária de precisão, o
entrevistado cita que deveriam existir mecanismos, por parte do governo, que forcem a
adoção dessas tecnologias:
Uma questão é o acesso às vezes ao mercado. né? Essa é uma das questões. Outro
ponto é criar mecanismos que faça com que esses grandes produtores adotem esses
sistemas para gerar maiores informações sobre rastreabilidade e agregar valor ao
produto. (SE02)
As principais ações relacionadas à execução do trabalho político, identificadas nas
falas dos atores entrevistados e nos documentos publicados pelos mesmos, estão sintetizadas
na Figura 12, apresentada a seguir.
Figura 12: Síntese das práticas relacionadas ao trabalho político realizadas no macro ambiente
do estado de MS
O desenvolvimento de novas profissões foi destacado, pela maior parte dos atores
entrevistados, como não necessário para que a adoção da IoT seja institucionalizada,
conforme retratado nas falas dos entrevistados SE01: “Eu acho que não precisa de novas
profissões, porque o que acaba acontecendo é que na verdade você precisa de profissionais
que tenham uma formação e conhecimento de outras áreas também”; e também do SE03-1:
“Eu acho que não há necessidade de mais profissões. Eu só acho que existe a necessidade de
um contato maior, de um network maior entre as profissões que já existem”.
111
O que você precisa na verdade é ter um corpo.., às vezes você não precisa nem que
eu saiba tudo, mas você precisa ter, para desenvolver esse tipo de solução, um corpo
multidisciplinar, uma equipe multidisciplinar em que as pessoas têm, pelo menos,
um conhecimento da outra área envolvida. Um engenheiro da computação que sabe
um pouco de veterinária, o veterinário que tem uma ideia de computação, dos
dispositivos. (SE01)
Em oposição aos demais atores entrevistados, o SE03-2 acredita que haja a
necessidade de se criar uma nova profissão, capaz de gerar essas tecnologias e fazer o uso
correto delas; profissão que ele denomina como “agroinformata”. Segundo ele, “A gente
precisa criar aí o cara que entende de computação, entende de processamento de dados e
entende da agropecuária para fazer essa conexão. Esses profissionais são raros hoje em dia e
quando existem são muito caros, são muito valorizados”. O entrevistado acredita que as
universidades não estão preparando esse profissional que será altamente demandado e bem
remunerado pelo mercado.
alega o SP04: “Muitos têm que se adaptar. A gente tem histórico de programadores antigos
que tem um bom histórico, mas não estão habituados com tecnologia habilitadoras
principalmente”. Quando estes profissionais não chegam preparados, algumas empresas
desempenham esse papel, como relata o SP03, “a gente precisa muito desse tipo de
profissional que seja adaptado ou adaptável conforme a necessidade que a gente tem... Então a
gente tem feito muito mais é isso, adaptar o nosso profissional para que ele entenda esse
meio”.
O SE02 cita como exemplo a experiência que teve com uma das startups incubadas na
universidade na qual os proprietários, que são engenheiros de computação, sentiram a
necessidade de entender quais eram as complexidades do campo rural para desenvolver seus
produtos: “Então eles tiveram que conhecer um pouco dos aspectos zootécnicos, veterinários
e comportamentais do animal para que eles conseguissem extrair ali os dados que eles
requerem para atender o serviço ou produto deles”.
Em relação aos profissionais que atuam dentro da fazenda e que estão expostos à
utilização desses dispositivos IoT, a readaptação e o desenvolvimento de novas habilidades
também é uma necessidade, segundo os entrevistados. Para o SPF01, existem duas formas de
suprir essa exigência: “ou você pega profissionais novos no mercado que realmente tenham
essa condição de lidar com essas tecnologias ou você capacita os profissionais que você já
tem na fazenda. Isso precisa ser feito. Isso é uma exigência dessa nova realidade baseada em
IoT”. O SP04 corrobora esta ideia ao alegar que, no momento em que os produtos IoT se
estabelecerem no mercado, serão necessários treinamentos por parte das empresas
fornecedoras ou políticas públicas que amparem esses profissionais.
Não que vai sumir os empregos, as pessoas não vão deixar de trabalhar só porque
tem a tecnologia. “Ah, então agora tem uma estrutura lá no meio do campo que pesa
o animal toda vez que ele vai comer, toda vez que ele vai beber água, então agora o
peão deixou de existir?” Pelo contrário, tem que ir lá todo dia, ver se tá tudo certo,
se o equipamento tá funcionando, se não tá com nenhum problema, então vai mudar
as relações nesse sentido. (SE03-2)
Os entrevistados SP01 e SP05 mencionam, por sua vez, um aspecto interessante sobre
a reorientação de identidade, ao destacar o surgimento de novas gerações de filhos e netos de
proprietários das fazendas que já estão vindo para o campo com uma mentalidade voltada
para inovações.
A gente vê muito cliente também que quem vai pagar é o pai, mas quem tá
assumindo o negócio é o filho. Então é um cara da terceira geração, um cara que já
tá nesse mundo nosso. Ele já entende de tecnologia, ele é muito mais aberto e adepto
a isso. Então esse é o perfil aí. (SP01)
Então assim, tá vindo filhos dessas pessoas. Tá tendo uma qualificação em cima de
utilização de tecnologia, mas uma qualificação não de treinamento, mais de
usabilidade, de uso do dia a dia. Assim, hoje a maioria dos nossos clientes que são
fazenda empresa, tem alguém lá que gere toda a parte de conectividade na fazenda,
que gere toda a parte de sistema da fazenda, porque a fazenda ela evoluiu. (SP05)
Estas afirmações evidenciam que os novos profissionais que se inserem nas “fazendas
empresas” e aqueles que iniciam a sucessão das atividades dentro da propriedade familiar,
possuem maior qualificação tecnológica e são propensos a priorizar o investimento em
tecnologia para melhorar a produtividade e a gestão da propriedade.
(...) o produtor rural ele está pensando em bem-estar animal depois que ele foi
convencido de que isso é benéfico para ele. E quando ele entende que o animal que é
produzido com qualidade de vida produz mais. Um animal menos estressado gera
mais lucro. Então a hora que você falar isso ele muda totalmente o conceito dele e
ele entende. O sistema de produção mostrou que é melhor você tratar o animal de
maneira correta que você vai ganhar mais. (SE03-2)
Além de melhorar a lucratividade graças à maior eficiência produtiva, a mudança para
práticas de manejo mais corretas e voltadas para o bem-estar animal tem se tornado uma
exigência do mercado consumidor, como afirma o SE04-1: “O mercado consumidor já não
permite mais maus tratos e se isso aparecer, com certeza, tem sérios problemas para o
produtor, para ele comercializar até para os frigoríficos, para todo sistema. Isso já é uma
realidade”. O SE03-1 corrobora essa afirmação e ainda cita a importância dessas novas
tecnologias 4.0 para atender às demandas dos clientes:
Essa é uma tendência, o consumidor ele quer saber como é que esses animais são
criados e a tecnologia 4.0 nos ajuda muito com isso, porque, por exemplo, é possível
que vários trabalhos surjam aí com o objetivo de identificar a vocalização dos
animais, associando isso a uma dor ou a um estresse ou o próprio monitoramento.
(SE03-1)
115
Inclusive, a gente vislumbra um mercado de pessoas que estão preocupadas com isso
mesmo. Consumir carne de animal que não passou por um processo de ferro quente,
que não ficou preso. Um animal mais livre, que comeu à vontade, que teve a curva
de alimentação dele atendida. E a gente acredita que existe um mercado para isso,
para o boi verde, para o boi criado só no Pantanal. E esses nichos de mercados eles
são interessantes e eles procuram a gente. (SP04)
Mostra-se, diante o observado, a preocupação crescente das empresas que
desenvolvem produtos IoT para a bovinocultura de corte, em colocar no mercado produtos
que estejam adequados as práticas de bem-estar animal. Consumidores estão preocupados em
adquirir produtos de proteína animal de fazendas e empresas que não tenham adotado práticas
nocivas e prejudiciais à saúde dos animais. Como seus produtos IoT fazem parte dos
processos de produção dos bovinos, adequá-los a essas novas exigências passou a ser parte
indispensável para essas empresas.
De acordo com as parcerias identificadas nas falas de cada ator entrevistado, foi
possível elaborar a Figura 13. A rede nela apresentada é formada apenas pelos 16 atores
institucionais relacionados neste trabalho, contudo todos os atores relevantes que trabalham
com a aplicação da IoT na bovinocultura do estado e que foram citados nas entrevistas estão
contemplados na pesquisa.
116
A rede de cooperação construída pelo SPF01 foi a maior e mais diversa, em termos de
objetivo pretendido. No total, o entrevistado cita parcerias com outros nove entrevistados,
sendo algumas delas criadas para determinados projetos; e outras, perenes. Entre as parcerias
temporárias, tem-se, como exemplo, a realizada junto ao SE04 e SP01, que objetivou o
desenvolvimento, em 2016, de uma balança de passagem, com tecnologia IoT. Para o SPF01
,essa parceria gerou “nosso equipamento de maior sucesso em IoT, que é a balança de
passagem”. A parceria firmou-se da seguinte forma, como cita o SP01:
Um segundo projeto, este de maior porte, está sendo desenvolvido junto com a
Huawei e o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPQD), com
utilização das tecnologias do SP01 e SP02. Este projeto tem como objetivo:
A gente tem um programa dentro da [SPF01], que é junto com a [SE04] que é um
programa de mestrado profissional. Então esse programa de mestrado profissional,
ele favorece que todo ano a gente tem diversos trabalhos sendo desenvolvidos aonde
você, em pares de pesquisadores das duas instituições, desenvolve tecnologias de
pecuária digital. (SPF01)
O SE04 constituiu a segunda maior rede de cooperação identificada. Além das
parcerias com o SPF01 e SP01, citadas anteriormente, a universidade também possui
cooperação com os SP02 e SP05. O SP05 foi incubada durante dois anos, na incubadora de
empresas da universidade, tendo recebido a “graduação”, em julho de 2022. Já, o SP02 ainda
está recebendo mentoria na incubadora da universidade, além de ter dois produtos em parceria
com a mesma: um em comercialização e outro, em prototipagem.
Para implantação do Plano Nacional de Internet das Coisas, voltado à área rural, foi
constituída a “Câmara Agro 4.0”, gerida pelos dois atores citados acima e composta por mais
de 100 organizações público-privadas que deliberam sobre as questões da agropecuária 4.0.
Segundo o entrevistado SPF02, “A câmara foi construída para isso, como um instrumento de
implementação do plano nacional para IoT. E eu diria que hoje é a instância de maior
interlocução com o setor produtivo no tocante a Internet das Coisas e a agricultura 4.0”.
Figura 14: Síntese das práticas relacionadas ao trabalho cultural realizadas no macro ambiente
do estado de MS
4.2.3.1 Mimetismo
Mesmo porque o que que é a Internet das Coisas? Se a gente for pensar, por
exemplo, equipamentos de pecuária de precisão, eles já existem há vinte anos, trinta
anos, só que eles estão soltos.? Quando a gente fala em Internet das Coisas,
normalmente tá pensando em integração, mas são os mesmos equipamentos, sabe?
(SPF01)
120
Então, fala assim, ah você teve que criar uma coisa totalmente nova para fazer em
pecuária? Não, o que eu fiz foi pegar tecnologias que já estão aí e alterar alguma
coisa. Basicamente isso, né? Não precisa criar um microcontrolador novo. É isso que
eu estou querendo dizer. Não precisa criar um capacitor diferente na área de
eletrônica. Os componentes já estão aí e você precisa só organizar isso para criar
essa solução. (SE01)
Os produtos IoT em comercialização também utilizam tecnologias já existentes no
mercado. De acordo com os resultados das entrevistas, foi possível identificar que atores que
prestam diferentes serviços para os bovinocultores do estado de MS se utilizam da prática de
mimetismo. O primeiro deles é o SP03, que realiza serviços voltados para a prova de
eficiência alimentar de bovinos. Segundo o entrevistado, o cocho, a balança e o brinco
utilizados já estavam disponíveis no mercado e sua estratégia foi unir essas infraestruturas, a
fim de prestar um serviço diferenciado ao mercado. O SP01 cita a utilização de sensores
infravermelhos, encontrados facilmente em porta de lojas, brincos e balança de pesagem, para
desenvolver as balanças eletrônicas que comercializa:
Olha, o que eu vejo em eficiência alimentar é que nada se cria, tudo se transforma.
Então, se a gente parar para pensar na nossa estrutura de equipamento é algo
relativamente simples. Uma balança de pesagem? Já existia. Um cocho? Já existia.
(...) E o brinco de identificação, a quanto tempo se utilizam esse brinco de
identificação?! (...) Aí eu percebo muito mais isso, essa visão de unir tecnologias, de
unir infraestruturas que já existiam em prol dessa novidade para a eficiência
alimentar. (SP03)
Ora os sensores infravermelhos por exemplo são sensores similares a sensores de
porta de loja. (...) esses sensores eles tem a comunicação, cortou a comunicação,
opa, entrou o animal aqui. Se ele não saiu e cortou a comunicação de novo, ele está
entre os dois raios, ele está ali dentro. (...) Então isso daí foi espelhado em algo que
já existia. (...) Esses brincos tem um chip dentro dele também, então também é algo
em cima de algo que já existia, mas foi acoplado ao produto. (SP01)
Algumas empresas usam tecnologias e estruturas já presentes nas fazendas de
bovinocultura para prestar seus serviços. O primeiro caso é do SP01, que integra seu produto
a softwares de gestão já utilizados pelo fazendeiro: “Quando ele já faz uso de algum software
e ele tem todas as pesagens dos animais, por exemplo, se ele quiser, ele faz uso de outro
software de gestão e ele tira essas pesagens da balança, exporta esses dados e joga no software
121
dele pra fazer parte da gestão dele”. Um segundo exemplo refere-se ao SP04 que utiliza da
estrutura física da fazenda para instalar seus produtos, como cita a entrevistada: “A gente
coloca as nossas câmeras no tronco, no local lá onde eles pesam e manejam, então a gente já
aproveita a estrutura existente da propriedade e a gente usa câmeras de segurança residenciais
que são as mais baratas, mais fáceis de adquirir”.
A prática de mimetismo, por mais que seja essencial na IoT, não é a única maneira de
se avançar nesse ambiente tecnológico, de maneira que se faz necessário o desenvolvimento
de novas tecnologias por empresas privadas e ou centros de pesquisa. O AEI04 traz, em sua
fala, a ideia de algo novo demandado pelo mercado: “Claro que na Internet das Coisas você
estimula o desenvolvimento de novas tecnologias, também. É um ciclo que se retroalimenta.
Você aproveita o que já tinha, tenta integrar, cria novas possibilidades e isso você gera
demanda para criar novas tecnologias”.
4.2.3.2 Teorização
Toda vez que a gente é convidado para ir a um evento, num leilão, numa feira, a
gente tenta demonstrar para eles que os problemas que eles já têm podem ser
resolvidas com tecnologia. A gente percebe que a Embrapa tem um programa grande
disso daí de levar esse conhecimento. As universidades, a UFMS com o programa de
mestrado profissional deles lá da Facon. E o 5G vai ser importantíssimo para isso.
(SP04)
Mesmo não atuando de maneira direta, alguns atores entrevistados desempenham
ações de teorização se utilizando de parceiros como fundações, entidades de classe e empresas
públicas e privadas para disseminar informações sobre benefícios e problemas que a adoção
da IoT pode trazer às propriedades produtoras de bovinos de corte:
(...) os projetos têm acontecido e a forma de chegar para eles que aí a gente utiliza
muito o nosso canal de comunicação que é o mídia-ciência. Mas como é um público
específico a gente utiliza muito as fundações de pesquisa, tipo a Fundação
Chapadão, em Chapadão do Sul, e a Fundação MS, em Maracaju. A gente acaba
dialogando com esse produtor por meio das ICTs ou fundação de pesquisa ou as
próprias Embrapas que são nosso canal. (SPE01)
O que a gente faz é tudo por meio das câmaras. A gente usa essas instituições que
participam das câmaras para poder divulgar os assuntos no setor, entendeu? A gente
faz um edital e a gente divulga para todas essas instituições e elas levam essas
informações para o setor. (SPF03)
Alguns entrevistados referem acreditar que existe uma boa divulgação no estado de
MS da tecnologia IoT como, por exemplo, o SP01: “Olha eu acho que hoje é bem divulgado.
O caso mais explícito é o caso da balança que foi desenvolvida lá no [SPF01] junto com [o
SP01]. Hoje tem muita gente produzindo e o pessoal realmente tá adotando a tecnologia”.
Contudo, outros entrevistados citam não visualizar uma boa divulgação e mencionam o fato
de ainda existir vários produtos em fase de desenvolvimento como um impeditivo para uma
boa divulgação da tecnologia, como mencionam o SE01 e o SE04-1:
Então eu acho que a partir do momento que você tiver o produto formatadinho,
bonitinho ali, pronto para entregar, aí as pessoas vão descobrir os benefícios. O
negócio é que como a gente está muito na pesquisa em alguns dispositivos ainda não
chegaram para o mercado. Está muito na divulgação científica ainda e esse que é o
problema. (SE01)
Eu acho que esse é um dos grandes problemas, porque se fala que vale a pena, tem
vários benefícios, só que ainda demonstrar mesmo assim ó, aumentou tantos por
cento, gastou tanto e teve tanto de retorno em tanto tempo, isso ainda é bem frágil.
Aqui no Estado por exemplo, não tem. (SE04-1)
Quando se observa a adoção desses dispositivos de IoT pelas propriedades rurais
produtoras de bovinos de corte, é possível constatar, pela fala dos entrevistados, que esse
número é baixo. Isso decorre, segundo eles, da dificuldade de se realizar a ampla divulgação
sobre os benefícios e adversidades que os produtores de bovinos de corte terão, ao adotar um
dispositivo IoT. Tal fato é observado na fala do SPF02 e do SE03-2:
isso, a gente tem trabalhado muito com os ecossistemas regionais, com projetos
pilotos. Tem que mostrar para o produtor que ele não está tendo um custo, que ele
está fazendo um investimento, está otimizando, tá investindo em rastreabilidade,
uma série de questões. (SPF02)
A divulgação de informações sobre os produtos IoT tem sido uma agenda de trabalho
para algumas organizações, como cita o SPF02: “existe um trabalho nosso e de todas as
instituições que atuam no segmento para tentar levar essa informação para o produtor tomar a
decisão. Mas assim, não é algo simples e geralmente o produtor ele é, principalmente na
cadeira da pecuária de corte, mais conservador”. Também o SPE02-2: “(...) é o próximo
passo. Hoje o estado enxerga que faz parte da política pública a comunicação, que era uma
coisa que não fazia, cabia ao cidadão procurar. Então é, também, ação do estado divulgar isso
e atrair novos produtores. O próximo passo são as tecnologias de IoT”.
É algo que as vezes a gente não para, para pensar, né? Mas no final das contas eu
acho que a gente tem quase que uma nova língua que envolve a eficiência alimentar.
Porque a gente fala muito “CAR” por exemplo. A grande maioria das pessoas nunca
escutou o que que é CAR. CAR é consumo alimentar residual. (...) Então, agora
analisando eu acho que sim, a gente tem um dicionário completamente novo, que a
gente repassa para os produtores, para os funcionários, para o pessoal da fazenda e
explica para eles o que que funciona. (SP03)
Outro exemplo de nova terminologia é no nome dado à balança de passagem,
desenvolvida pelos entrevistados SE04, SPF01 e SP01 cujo nome não será divulgado, por ser
o único produto comercializado com esta identificação; no entanto, por mais que esse produto
tenha seu nome comercial, a empresa prefere utilizar em determinadas ocasiões um termo
124
mais fácil de ser entendido pelos produtores: “É a própria [nome do produto], às vezes a gente
chama também para o cliente entender que é uma balança de passagem. O animal passa e já
pesa, né? Então essa é a terminologia mais usada” (SP01).
Existem terminologias novas, mas nada que mude muito, sabe? Na verdade, a
tecnologia se adapta ao mundo pecuário. Normalmente, quando você digitaliza isso,
até por uma questão comercial, mercadológica o que você faz é o inverso. Você traz
esses nomes que são utilizados pelos produtores para o mundo digital, então você
vai chamar de brete digital, ovo eletrônico, e assim por diante. (SPF01)
Os resultados das entrevistas demonstram que a criação de novas terminologias não é
algo buscado pelos desenvolvedores de produtos IoT. Na verdade, o caminho é inverso visto
que nomes cotidianamente utilizados dentro das atividades pecuárias são adaptados as novas
tecnologias. Isso se deve a uma questão comercial e mercadológica visualizada pelas
empresas, pois nomes muito tecnológicos e terminologias diferentes podem atrapalhar a
adoção desses produtos.
4.2.3.3 Educação
Entre os dezesseis atores entrevistados para a pesquisa, apenas quatro dizem visualizar
alguma ação voltada à educação. Observa-se que, entre os atores privados que dizem realizar
algum tipo de ação voltada à educação, essas ações apresentam a tendência de serem locais e
específicas a um grupo restrito. Isso fica destacado na fala do SP01:
Ainda mais que eu mando, por exemplo, depois que instalou lá, eu mando os
tutoriais para o cliente e falo: dá uma olhada aí, rapidinho, só procê ver como
funciona o negócio. Como cê cadastra aí e o que cê vai olhar principalmente aí. O
que ele pode te proporcionar, né? (SP01)
O entrevistado SP03 menciona duas situações em que a realização da prática de
educação se faz necessária para ele: Primeiro, “quando um produtor vai iniciar algum teste,
alguma avaliação, nós temos os treinamentos que são ofertados para toda a equipe da fazenda
e para todos aqueles que trabalham junto à equipe da fazenda. Esse treinamento ele pode tanto
ser presencial, como online” (SP03). O treinamento da equipe é um pré-requisito para que se
possa iniciar a prova de eficiência alimentar. A segunda situação onde ocorre a prática de
125
educação é na formação dos funcionários da empresa. Para o SP03, como a formação na área
da pecuária de precisão é baixa ou quase inexistente na graduação ou em cursos disponíveis
no mercado, cabe a eles apresentar o mínimo do ambiente para os funcionários entrantes:
Para você ter uma ideia sempre que profissionais novos entram na empresa eles
passam por alguns dias de treinamento sobre termos básicos de pecuária. Tipo
“gente, isso é um boi, isso é uma vaca, existe cria, recria e engorda. O animal se
alimenta disso, demora por tanto tempo para...”. Então a gente tem feito muito mais
é isso, adaptar o nosso profissional para que ele entenda esse meio. (...) do que
encontrar diretamente esse profissional já cem por cento capacitado. (SP03)
Entre os atores entrevistados do setor educacional, alguns dizem realizar algum tipo de
ação voltada a educar os atores, com conhecimento e habilidades necessárias sobre a adoção
da IoT na bovinocultura de corte, contudo o número de pessoas que adquirem uma
experiência mais completa nessa temática é restrito aos alunos que participam de projetos de
pesquisa, desenvolvidos pelos docentes. Como se observa pela fala do SE01: “Acaba
acontecendo na UEMS, por exemplo, como você tem o pessoal ali trabalhando na iniciação
científica (...) Então, os estudantes que saem formados ali acabam tendo contato por causa da
iniciação científica, por causa de pesquisa”. E pela fala do SE04, que possui um programa de
pós-graduação em computação aplicada, no qual desenvolve pesquisas na pecuária de
precisão, em parceria com o SPF01:
Como eu disse, tiveram alunos nossos que aí, assim, tendo esse conhecimento um
pouco do domínio desse ambiente, começaram a desenvolver, trabalhar na parte
mais de desenvolvimento de software. Como eu ainda não tenho nada implantado
então, ainda não surgiu um curso, porque a gente sabe que tem alguns cursos mais
genéricos. (...), mas eu não sei exatamente o que eles fornecem de informação.
(SE04)
A formação dos demais alunos da comunidade acadêmica e o público externo
interessado fica restrita a eventos e cursos generalistas que perpassam o tema da IoT. Alguns
desses eventos foram observados em documentos secundários, coletados na internet como,
por exemplo, o Programa “Mover”, realizado em 2019, e o seminário “MS 2019: Parcerias
estratégicas para o desenvolvimento baseado na tecnologia e na inovação”, realizado pelo
SE04.
Então esse grupo de trabalho que foi construído na câmara é para discutir isso,
justamente. O que é visto de agricultura 4.0 na matriz curricular do curso de
agronomia, veterinária? Nada. O que que é visto de agropecuária num curso de TI?
Nada. Os profissionais saem puros e tem que buscar uma pós-graduação ou na
prática e ir construindo isso no seu dia a dia. Mas são trabalhos difíceis, porque
alterar matriz curricular não é o corriqueiro. (SPF02)
Os desafios na formação de profissionais para trabalhar com a pecuária de precisão é
algo conhecido pelos atores institucionais do setor público federal entrevistados. Mesmo
ainda não realizando alguma prática de educação específica para essa temática, esses atores
sabem da necessidade da referida prática para o país, de modo que tem priorizado ações para
sanar esse gap.
Lawrence e Suddaby (2006), listam nove conjuntos de práticas, nas quais os atores se
engajam para criar novas instituições, no entanto os mesmos deixam claro que os tipos de
trabalho institucional listados não apresentam uma relação exaustiva de todas as práticas
possíveis de serem desenvolvidas com o objetivo de criar instituições. Diante disso, durante a
análise de conteúdo despendida sobre as entrevistas com atores institucionais ligados a IoT no
estado de MS, uma nova forma de trabalho institucional emergiu aos olhos dos pesquisadores.
A “Pesquisa e Desenvolvimento (P&D)” destacou-se como uma prática de trabalho, na fala de
diferentes atores, mostrando-se relevante em um fenômeno em transformação que é a adoção
da IoT na bovinocultura de corte.
Os atores que realizam ações de P&D, no estado de MS, podem ser divididos em dois
grupos: atores que executam pesquisas e desenvolvem produtos IoT; e os atores que possuem
projetos que incentivam e apoiam o desenvolvimentos de novas pesquisas e produtos.
Um dos exemplos de produtos IoT, fruto de P&D desenvolvido no estado de MS, são
as balanças de passagem. O produto comercializado pelo SP01 foi desenvolvido em parceria
com os atores SE04 e SPF01, como explica o SP01: “A SPF01 tem o know-how científico e
128
O SPF01 tem parceria para P&D com diferentes atores do estado, como já apresentado
no tópico que trata sobre a construção de redes normativas no estado de MS. Dentre suas
parcerias, a mais perene é com o SE04, sendo que, juntas, são responsáveis por desenvolver
diferentes projetos de pesquisa, voltados à utilização a IoT na pecuária de corte, no mestrado
acadêmico em computação aplicada. Além das ações acadêmicas, o entrevistado também
mantém parcerias com empresas privadas, com o objetivo de desenvolver e testar novos
produtos IoT que poderão ser ofertados futuramente ao mercado. Este papel de articulador
para realização de P&D é destacado na fala do entrevistado:
Outra universidade que tem dado destaque à pesquisa de tecnologias 4.0 para a
agropecuária, o que inclui a IoT, é o SE04. Na visão do entrevistado SE04-1, a instituição tem
priorizado pesquisas com essa temática entre os projetos fomentados pela universidade:
Entretanto, a falta de recursos para desenvolver os atuais e até novos projetos sobre
essa temática foi citada pelo SE04-2 como um impeditivo que impacta bastante o trabalho dos
pesquisadores. Como alega a entrevistada, “as possibilidades são muitas. A questão que a
gente ainda não tem nem financeiramente e estamos sem verba de projeto nos últimos anos.
Isso impacta bastante (...)”. Mesmo utilizando equipamentos de baixo custo, os pesquisadores
precisam de “um dinheirinho”, segundo ela, para conseguir trabalhar. Uma alternativa
escolhida para ultrapassar essas limitações é a parceria com empresas privadas que possuem
mais recursos:
A gente sempre foca num custo que seja baixo, que seja baseado em tecnologias
abertas, que não fique dependente de uma única empresa. Apesar que às vezes você
acaba tendo que fazer, por exemplo, o caso da balança de passagem, você acaba
tendo que fazer a parceria com a empresa pra produzir, porque a gente não tem
como produzir o equipamento, mas de qualquer forma você passa o Knowhow e fica
com a patente. (SE04-2)
Alguns atores entrevistados não realizam diretamente pesquisa e desenvolvimento de
produtos voltados à IoT, no entanto dizem ter, como prerrogativa, o objetivo de fazer o
fomento ao ensino, ciência e tecnologia do estado de Mato Grosso do Sul. Este apoio, de
acordo com o SPE01, vem em forma de várias ações como a concessão de fomento para
aquilo que ele chama de “capital humano”, que são bolsas de pesquisa para o ensino médio,
via Pintec, ensino superior, bolsas de mestrado, bolsas de doutorado e bolsas de pós-
doutorado. O entrevistado SPE01 alega que “atualmente a gente cobre oitenta por cento de
todas as bolsas de doutorado e mestrado necessárias no estado de Mato Grosso do Sul”.
(...) é esse grupo que tá se reunindo periodicamente pra tentar botar um Hub de
inovação aqui em Campo Grande, botar pra funcionar o parque tecnológico de Ponta
Porã, fazer o mapeamento e atrair novos negócios no âmbito da inovação. A gente
fez um mapeamento e a gente vai trabalhar em automação, saúde, agronegócio e
construção. Esses são os quatro eixos do ecossistema de inovação.
130
As ações identificadas nas falas dos atores entrevistados e nos documentos publicados
pelos mesmos, relacionadas à execução do trabalho técnico, estão sintetizadas na Figura 15.
Figura 15: Síntese das práticas relacionadas ao trabalho técnico realizadas no macro ambiente
do estado de MS
propriedades rurais. Para a teorização, alguns atores citam a necessidade ou não da criação de
novas terminologias para os produtos IoT e, também, como algumas organizações têm
desenvolvido ações de divulgação das relações de causa e efeito dos produtos IoT. Em relação
à educação, os atores mencionam como esta prática é falha no estado e quais os planos para
superar esse desafio. Para a prática de P&D, são citados os atores que mais realizam essa ação
e quais as formas de incentivo estão presentes no estado de MS.
Quadro 16: Análise da existência de ações ligadas as práticas de trabalho institucional segundo os setores entrevistados
Setor Setor
Setor Setor
Trabalho Institucional Unidades de análise Público Público
Educacional Privado
Estadual Federal
Apoio político e regulatório E EP E E
Lobby por recursos NE NE NE EP
Advocacia
Promoção de agendas NE EP NE E
Proposição ou ataque a legislação existente NE NE EP EP
Processo de acreditação formal E NE NE E
Trabalho
Definição Criação de padrões NE NE NE NE
Político
Certificação de atores em um campo EP NE NE EP
Realocação de direitos de propriedade NE NE NE EP
Mudanças de regras nas relações de mercado NE NE NE NE
Aquisição
Compartilhamento de autoridade coercitiva
NE NE NE NE
ou reguladora
Construção de Criação de novas profissões NE NE NE NE
identidade Reorientação de identidades E E EP EP
Trabalho Mudança de associações
Substituição de normas generalizadas EP EP NE EP
Cultural normativas
Construção de redes
Proto-Instituições / Redes normativas E E E E
normativas
Mimetismo Justaposição de velhos e novos modelos E EP NE EP
Elaboração de cadeias de causa e efeito EP EP EP EP
Trabalho Teorização
Nomeação de novos conceitos e práticas EP EP NE EP
Técnico
Educação Conhecimento e habilidades necessárias EP NE EP NE
Pesquisa Desenvolvimento de pesquisas e produtos E E E E
(Legenda: E = Existe; EP = Existe Parcialmente; NE = Não Existe)
Nos casos em que dois setores estão classificados como não existe ou existe, e dois
setores com a classificação existe parcialmente, optou-se por avaliar o macroambiente de
acordo com a classificação “extrema”, como no caso das práticas de construção de identidade
e educação. Nos casos em que dois setores estão listados como existe e dois como não existe,
classificou-se como existe parcialmente. E, por fim, para a prática de mimetismo, optou-se
por classificar como existe parcialmente, pois foi a classificação mais listada nos setores
observados.
135
A prática de advocacia foi observada por meio de três ações: apoio político e
regulatório; lobby por recursos; e proposição ou ataque à legislação existente. Apenas o apoio
político e regulatório foi apontado pela maior parte dos entrevistados como inibidor na adoção
de produtos IoT pelas fazendas produtoras de bovinos de corte.
O apoio político e regulatório foi a única ação dentro da advocacia apontada pela
maioria dos entrevistados como uma questão importante na decisão de adoção ou não de
produtos IoT como ferramenta de gestão dentro das suas fazendas de bovinocultura. Esta
visão vem junto com a constatação da realidade apresentada pelos entrevistados sobre as
136
ações desenvolvidas pelo governo do estado de MS para tais tecnologias. Ao ser questionados
sobre o conhecimento que possuem sobre ações do governo, os entrevistados alegaram:
Não tenho conhecimento nenhum, assim, nunca foi mostrado para nós. Se tiver, mas
eu acredito que não tenha, porque nunca foi mostrado. E uma das propriedades, das
principais propriedades no estado que tem esse equipamento é a gente, então acho
que não tem. (FAZA01)
O estado praticamente não tem feito nada nesse quesito, Entendeu? O que tem são as
próprias empresas que produzem os equipamentos que ficam divulgando essa marca.
O estado hoje nesse quesito não vi nada. Eu particularmente não vi nada nesse
ponto. (FAZN06)
Nota-se, a partir da crítica dos entrevistados, que faltam ações por parte do governo de
MS para fomentar a adoção da IoT pelas fazendas de bovinocultura de corte. Os próprios
entrevistados mencionam quais políticas de apoio poderiam ser realizadas para que a intenção
de adoção fosse positiva. Para cinco dos entrevistados, principal política que deveria ser feita
envolve a concessão de crédito. Segundo a FAZN06, não existe crédito específico para as
tecnologias IoT. Caso ele queira adquirir algum desses produtos, teria que recorrer a crédito
para infraestrutura, pois não tem um específico para esta atividade-fim.
Rapaz, falta crédito. O cara só fala, exige mundos e fundos. Eles vêm na
propriedade, é obrigado a deixar reserva, cuidar de água, brejo essas coisas todas.
Falta incentivo governamental, a conscientização, incentivo, tudo mais. (FAZN04)
Crédito igual foi feito, por exemplo, para a energia solar. A gente já colocou energia
solar em quase tudo. Todas as propriedades nossa. Pegamos financiamento, uma
belezinha. E ele mesmo se paga, né? Então o principal é crédito a juros descentes.
(FAZN08)
A realização de lobby não foi apontada como ação relevante, para cinco entre oito
entrevistados. Segundo a FAZA01, quando questionado sobre a existência de algum grupo de
interesse que estava atuando junto ao governo do estado de MS ou a algum político para
busca de recursos para essas tecnologias IoT, o mesmo afirmou: “Não, não tem. Esse tipo de
grupo não tem. É realmente é um negócio que tem que ser feito bem particular porque o
estado, o governo não incentiva”. Um dos entrevistados mostrou-se reticente ao envolvimento
da classe política nessas ações: “Olha se for político envolvido nessa parte não dá. Só se for
política para desenvolvimento de vias de créditos essas coisas, mas a nível de política não me
interessaria não”.
Entre as três fazendas que citaram ser a realização de lobby interessante para elas, a
FAZN06 menciona que a falta de união de produtores, associações de classe ou até das
empresas, responsáveis por desenvolver o setor de bovinocultura de corte no país, prejudica o
avanço na adoção desses produtos IoT. Para ele:
137
Sete, entre os oito entrevistados, disseram que a existência de leis, normativas e/ou
regulamentações, acerca da adoção da IoT, não interferem na sua intenção de adoção desses
produtos. A FAZN05 alega que “Lei, na verdade, não representaria nada isso aí né? Para mim
independe se tem lei ou não”. Enquanto a FAZN04 cita que “Minha opinião, Eduardo. Eu
acho que em vez de existir mais leis, eles deviam simplificar as leis. Criou o precoce MS, mas
só o confinamento do JBS que atende eles mesmo. O resto ninguém atende”.
Ao indagar os entrevistados sobre qual seria o impeditivo principal para ainda não
terem adotado nenhum dos produtos IoT disponíveis no mercado nacional, o principal motivo
destacado foi o custo, tanto dos produtos, como das mudanças estruturais e de gestão que
devem ser realizadas para adoção. Destaca-se, diante disso, que o custo é um ponto
importante para os produtores. As falas dos entrevistados mostradas a seguir corroboram a
assertiva anterior: “Eu diria questão da própria estruturação, custos e a coisa tem que ser feita
devagar, né? Vontade não falta, cabe na fazenda, mas muitas vezes não cabe no bolso, tá?”
(FAZN04). E para o entrevistado FAZN05:
seja benéfico as suas operações como, por exemplo, vantagens de mercado ao utilizar essas
tecnologias. Esse benefício de mercado por utilizar produtos IoT já existe, de maneira não
formal, como cita o entrevistado FAZA02: “Sim, existe um benefício de valor agregado,
porque como havia comentado, hoje o pecuarista tá muito preocupado em alimentação, a
suplementação dos animais e qual que é o período que ele vai conduzir esses animais até o
abate”. No entanto, de acordo com os entrevistados, se as fazendas obtivessem, por meio de
um órgão governamental ou autoridade coercitiva, a possibilidade de acesso a mercados,
bonificações ou outras vantagens, a adoção seria algo positivo.
O caminho da qualificação profissional também foi adotado pela FAZA01, que cita:
“teve que qualificar as pessoas dentro da fazenda que não entendiam do equipamento. Daí a
gente teve que dar o treinamento e com a utilização diária ali a gente conseguiu fazer com que
eles ficassem bem treinados”. Hoje, a FAZA01 conta com uma pessoa específica, veterinária,
que trabalha, olhando os dados diariamente: “todo dia ela olha os dados para ver se não tem
nenhum problema, porque assim, para coletar esses dados a gente precisou ter um processo
140
muito diário, é todo um cuidado muito específico, senão você tem muita perca de dados,
sabe? Isso é um equipamento sensível”.
A construção de redes normativas foi uma prática em que quatro dos entrevistados
disseram impactar na própria decisão, na hora de adotar os produtos IoT: balanças e cochos
comercializados pelo SP03 e as balanças de passagem, comercializadas pelos SP01 e SP05.
Quando questionados sobre necessidade da existência de grupos de empresas, produtores ou
associações trabalhando para poder desenvolver atividades diversas voltadas a facilitar a
adoção desses produtos, os entrevistados externaram a visão desta existência como algo
importante para eles. Segundo a FAZN06, “eu acho que isso seria de grande valia, com
certeza. E nós não temos ninguém hoje que apoia essas tecnologias, né? Até esses programas
de melhoramento não tem muito incentivo da parte deles para você utilizar isso. Com certeza
faria muita diferença”.
Como o custo para adoção desses produtos é alto, segundo os entrevistados, a criação
de grupos de produtores que compartilhassem as tecnologias do SP03 para realização de
prova de eficiência alimentar seria uma maneira de superar os desafios para preencher essa
lacuna dentro de seus processos de melhoramento genético. Para o entrevistado FAZN05:
Se tiver alguma parceria, alguma coisa que seja bom para os dois lados, às vezes
poderia até ter implantado. E a gente gosta muito da parceria, a gente acha que a
parceria é um caminho, né? De repente se aparecer alguma coisa a gente não tem
nada contra não, mas eu acho que toda parceria tem que ser bom para os dois lados,
né? (FAZN05)
As práticas ligadas ao trabalho institucional técnico destacaram-se como inibidoras à
adoção da IoT, de acordo com parte dos entrevistados. Todas as quatro práticas de trabalho
institucional tiveram a maior parte dos respondentes destacando que a sua realização seria um
ponto importante na hora de adotar algum dos produtos IoT disponível no mercado. Apenas a
141
questão da existência de novas terminologias foi destacada como algo indiferente, na intenção
de adoção dessas fazendas.
tanto as federais como as particulares. E também por meio de instituições de pesquisa como a
Embrapa e as instituições particulares, como a própria Intergado e outras instituições que
fornecem ferramentas tecnológicas”. No entanto, o entrevistado cita que essas mesmas
informações não são comumente apresentadas por órgãos governamentais os quais estão em
contato direto com os produtores rurais: “Agora, por órgãos governamentais é bem sazonal
através de palestras e convenções, mas muito sazonalmente” (FAZA03).
capatazes, para reprodução, para manejo de nutrição, para a formulação de ração, mas para a
parte de tecnologia IoT eu nunca vi”. Essa visão é corroborada pela FAZA01: “Não tem nada
do governo que de treinamento e incentive essas tecnologias, isso daí eu tenho certeza que
não tem nada, sabe?”. E pela FAZN05: “No Senar tem muitos cursos, mas é muito isolado.
Quem usa mais essa tecnologia é a parte de melhoramento animal, então o SENAR ainda está
focado em outras tecnologias, cursos mais básicos para aos produtores e funcionários”.
Ressalta-se, portanto, a crítica dos entrevistados quanto ao papel que o Senar e outras
entidades de assistência rural possuem na oferta de cursos focados em tecnologias como a IoT
para as produtores de bovinos de corte do estado de MS.
Três fazendas mencionaram que o objetivo com a adoção das balanças de passagem é
monitorar o ganho de peso dos animais para ter mais informações na hora de comercializar
seus produtos. A FAZ03, por exemplo, cita que a balança de passagem possibilitará
“Monitorar individualmente e diariamente os animais do confinamento para entender a
lucratividade de cada um e formar lotes mais homogêneo com o intuito de aumentar a
144
lucratividade”. Já a FAZ04 acredita que “a balança eu acho que é uma das melhores
ferramentas da propriedade. Não é a mais cara, é um investimento e não exige tanto dinheiro.
É um dos melhores indicativas que tem, pois é ela que vai dizer para você qual o animal que
melhor se adapta e qual pasto é melhor para sua região”.
Apenas a FAZN07 mencionou que pretende adotar produtos IoT, no caso específico,
as balanças de passagem, para melhorar o processos logísticos da propriedade. Segundo o
gestor entrevistado, a identificação dos animais por brinco impresso e a necessidade de
movimentá-los até o curral para pesagem representam um problema para eles: “Ah, você não
perder muito tempo levando até o curral, porque você perde muito tempo no curral para ver
número, tem número que apaga, né”.
Quadro 18: Análise da incidência das práticas de trabalho institucional como inibidoras a
adoção da IoT pelas fazendas de bovinocultura
Entre as quatros unidades de análise ligadas, a advocacia, pôde-se concluir que apenas
o apoio político e regulatório está recebendo uma ação efetiva por parte dos atores
institucionais do estado de MS. De acordo com o campo, as principais ações políticas, em
nível local, são desenvolvidas pela parceria entre aos SPE01 e SPE02, setor público estadual,
no qual as organizações utilizam dois caminhos para apoiar o desenvolvimento de projetos
voltados a IoT na bovinocultura: o primeiro, por meio de editais de apoio à pesquisa, com
concessão de bolsas de estudo, desde o ensino médio até a pós-graduação. O segundo, por
meio de dois programas de fomento à inovação, Centelha MS e Tecnova, que fornecem
subvenções econômicas, sem devolução a empresas locais, selecionadas por edital. Esses
resultados se assemelham ao encontrado no estudo de Wahid e Sein (2014), no qual o apoio
147
Algumas ações de apoio político foram citadas pelos atores entrevistados SPF02 e
SPF03 como executadas pelo governo Federal. O primeiro e mais conhecido em nível
nacional foi o estudo intitulado “Internet das Coisas: um plano de ação para o Brasil” do qual
decorreu o Plano Nacional de Internet das Coisas e a Câmara Agro 4.0. A realização de ações
por parte do governo Federal surge como estratégia nacional de defesa da inovação,
mostrando que a mesma tem interesse e apoio regulatório por parte desses atores (Jespersen &
Gallemore, 2018).
Mesmo com as ações executadas por parte do governo do estado de MS, é perceptível,
na falas dos atores educacionais e privados, que falta apoio político, visto que os mesmos
dizem serem raras ações do governo voltadas especificamente à IoT ou que, ao menos,
contemplem esta tecnologia. A falta de ação por parte do estado é confirmada pelo próprio
ator institucional SPE02, órgão do governo do estado, no qual ele cita serem pequenas as
iniciativas realizadas. Diante deste fato, a necessidade de políticas públicas mais efetivas para
a IoT é uma realidade destacada pelos atores entrevistados que não se limita à realidade do
estado de MS. A pesquisa realizada por Chuang, Wang e Liang (2020), com produtores de
Taiwan, também sugere, como resultado, a necessidade das agências de administração
agrícola locais taiwanesas desenvolver políticas agrícolas inteligentes, voltadas para a IoT.
Segundo os entrevistados SE03 e SE04, para desenvolver produtos IoT para a bovinocultura
de corte, é necessário que os testes de campo sejam liberados pelo Comitê de Ética Animal da
universidade à qual o projeto está ligado. Só após o reconhecimento pelo Comitê de Ética
Animal (CUA) da observância, pelo projeto de todos os padrões especificados, é feita a
liberação para realização dos testes envolvendo animais. A realização da prática de definição
foi destacada, também, em Obeng Adomaa et al. (2022), no qual os autores citam a
incorporação de serviços de certificação como novos caminhos alternativos para
implementação das Boas Práticas Agrícolas (BPAs).
Com base nas falas dos entrevistados, foi possível elaborar uma representação
esquemática da rede de cooperação desenvolvida no estado de MS para atuação em IoT e
bovinocultura de corte (Figura 16). Por ordem de intensidade, os atores com maior destaque
foram, respectivamente, Embrapa, UFMS, Sebrae, Semagro e UCDB. Como os desafios à
adoção da IoT pela pecuária são muitos, uma das formas mais eficazes de os superar é os
governos, as agências centrais, regionais e locais trabalharem juntos, como força motriz, com
o objetivo de desenvolver iniciativas para a adoção desta tecnologia (Zhang et al., 2016).
Figura 16: Rede normativa criada no estado de MS para IoT e Bovinocultura de corte
O Sebrae destaca-se como o terceiro ator com a maior rede de cooperação no estado de
MS, no entanto as parcerias desenvolvidas entre ele e os demais atores não visam ao
desenvolvimento de produtos ou pesquisas e, sim, à estruturação de um ecossistema de
inovação que envolva todos os setores do estado de MS, no qual parcerias, projetos e outras
ações possam surgir de maneira espontânea. O papel da empresa, nesse projeto, é como
articulador responsável por colocar em prática as ações da Câmara Agro 4.0 que objetivam
criar ecossistemas regionais de inovação por todo o país. Ambientes como esse, em que a
troca de experiências e recursos entre entidades podem ocorrer livremente, é uma das
soluções em longo prazo para o avanço da agropecuária 4.0, em países em desenvolvimento,
como é o caso da China e do Brasil (Zhang et al., 2016).
Além do impacto nas receitas por causa da menor lucratividade por animal, a
comercialização dos produtos de pecuaristas que ainda adotam práticas inadequadas de
manejo está no radar de consumidores cada vez mais conscientes e de países que exigem
certificações que comprovem as práticas de manejo adequadas e sustentáveis. A União
Europeia, por exemplo, assinou, em dezembro de 2022, um acordo sobre lei que impede a
importação de carne de animais criados em áreas desmatadas (Money Times, 2022). Por meio
das inovações baseadas em IoT, os produtores podem atender a essas exigências do mercado,
criando um sistema de rastreabilidade baseado na IoT, para fornecer informações sobre o
produto do campo até a mesa, satisfazendo às novas necessidades do consumidor (Talavera et
al., 2017).
152
Os atores que realizam ações de P&D no estado de MS são divididos em dois grupos:
os atores que executam pesquisas e desenvolvem produtos IoT; e os atores que gerenciam
projetos de fomento para apoio a essas pesquisas. Entre as ações executadas, estão a
concessão de bolsas de pesquisa ao ensino médio, via Pintec, ao ensino superior, bolsas de
mestrado, doutorado e bolsas de pós-doutorado. Para as empresas, o apoio concretiza-se pela
realização do Centelha MS e Tecnova. Os principais produtos IoT, frutos de P&D
desenvolvido no estado de MS, são as balanças de passagem, comercializadas pelo SP01 e
SP05. Outros produtos como os alimentadores automáticos e dispositivos de monitoramento
das características biológicas devem chegar ao mercado brevemente.
A prática de mimetismo foi citada apenas por oito atores entrevistados, por isso foi
classificada como existente de modo parcial dentro do macroambiente do estado de MS. Entre
os objetivos do mimetismo, está a associação de novas práticas, tecnologias e regras para algo
já existente e institucionalizado, de modo a facilitar sua aceitação no ambiente institucional e
153
organizacional (Lawrence & Suddaby, 2006). Quando se trata de IoT, por mais que o
mimetismo não seja a única forma de desenvolver esse paradigma, esta é uma prática sine qua
non, conforme cita os entrevistados, pois quase todas as tecnologias utilizadas em um
universo IoT são reaproveitadas de outras inovações. Esta prática mostra-se interessante,
porque, em cenários resistentes e com altos custos, unir o “novo” e o “velho” libera o
potencial dessas novas tecnologias (Sahay et al., 2018).
A pecuária bovina de corte, assim como outros ambientes rurais possuem um contexto
institucional denso, ao se observar a abertura para adoção tecnológica, por isso inserir
mudanças nas práticas de produção e gestão do gado se torna mais rapidamente viável,
quando podem ser aninhadas dentro de instituições já formalizadas, prática encontrada no
estado de MS (Rutherford & Schultz, 2019). Os atores do setor educacional, por exemplo,
citam utilizar, de maneira frequente, tecnologias já existentes para criar novos produtos,
dando aos mesmos nova usabilidade, aperfeiçoando e adequando-os às exigências de seus
projetos. O mesmo é citado pelas empresas que já estão com produtos IoT sendo
comercializados no mercado. A exemplo, pode-se observar as balanças de passagem, as quais,
segundo os entrevistados, contêm sensores infravermelhos similares aos encontrados em porta
de lojas.
comercializam seus produtos para bovinocultura baseados em IoT. Como exemplo, tem-se a
balança de passagem que recebe o nome de Balpass; o cocho eletrônico que é o e-feeder; e o
Bovine Electronic Plataform (BEP). O próprio termo IoT e as tecnologias que a compõem,
como a redes de sensores sem fio (RSSF), computação em nuvem (CN) e outros, são
desconhecidos para uma boa parte da população (Aydin & Aydin, 2020). Entretanto, está é
uma prática pouco realizada pelos pesquisadores e até por empresas que comercializam
produtos IoT. Eles afirmam que preferem não adotar termos novos e, sim, nomes usados
cotidianamente na “lida” da fazenda, pois isso gera uma compreensão facilitada da
funcionalidade dos produtos e maior aproximação com os produtores.
A única prática de trabalho institucional, ligada ao trabalho técnico, que não foi
observada empiricamente como existente no macroambiente do estado de MS foi a educação.
O que se mostra contrário ao mencionado em diferentes estudos sobre trabalho instrucional e
IoT, ou seja, há necessidade de educar os atores para que eles estejam aptos a adotar e
colaborar com a nova instituição (Binz et al., 2016; Wahid & Sein, 2014). Para os
entrevistados, não são realizadas ações de educação suficientes para fomentar a IoT como
ferramenta de gestão na pecuária bovina no estado, nem por órgãos públicos, nem privados.
Tal fato é preocupante, porque, diante a baixa alfabetização em TIC dos profissionais que
empreendem para o setor rural e, principalmente, de quem está no dia a dia nas fazendas, os
mesmos não conseguem entender os benefícios do uso de tecnologias emergentes para a
aquisição de conhecimento e informação sobre atividades produtivas (Zhang et al., 2016).
Atores entrevistados do setor educacional dizem realizar algum tipo de ação voltada a
educar os estudantes, com conhecimentos e habilidades necessárias sobre a adoção da IoT na
bovinocultura de corte, porém o número de alunos expostos a esse conhecimento é mínimo,
em relação ao total existente, sendo que apenas os alunos que participam de projetos de
pesquisa desenvolvidos pelos docentes têm acesso a essas formações. Ao público externo
interessado, fica restrita a participação em eventos e cursos generalistas.
uma mudança em longo prazo no perfil dos profissionais que têm papel importante para
disseminar e incorporar tecnologias no ambiente rural (Zhang et al., 2016).
A análise dos dados coletados por meio da Etapa Empírica 2, entrevistas com
responsáveis por fazendas de bovinocultura de corte do estado de MS, trazem resultados que
permitem corroborar a proposição 4. Ao observar as práticas de trabalho institucional como
possíveis inibidoras à adoção de produtos IoT pelas fazendas de bovinocultura, evidencia-se
que nem todas as ações realizadas pelos atores institucionais demonstram o potencial de
fomentar a adoção dessa tecnologia (Chiwamit et al., 2014).
Para alguns entrevistados, uma das ações de advocacia que pode ser realizada pelo
governo estadual e que ajudará a mitigar esse problema é a oferta de linhas de crédito
específicas para esse tipo de inovação, assim como foi feito para instalação de energia solar e
156
A análise dos dados empíricos, coletados junto aos atores institucionais, Etapa 1, e aos
gestores das fazendas de bovinocultura de corte de MS, Etapa 2, permitiram obter dois
resultados: o primeiro, quanto à existência de práticas de trabalho institucional voltadas para a
IoT no macroambiente do estado de MS; e o segundo, sobre as práticas de trabalho
institucional inibidoras à adoção de produtos IoT. Tendo como base esses resultados, foi
possível: (1) realizar uma análise qualitativa para estabelecer o nível de prioridade, de cada
prática de trabalho institucional, para a proposição de ações que fomentam a adoção de
produtos IoT pelas fazendas de bovinocultura de corte e; (2) propor um Framework teórico-
conceitual sobre o papel de práticas de trabalho institucional para adoção da Internet das
Coisas (IoT), na pecuária bovina de corte, no estado de Mato Grosso do Sul.
Para realizar estas análises foi utilizado o modelo teórico metodológico conceitual,
Quadro 14, apresentado detalhadamente na seção de métodos. A metodologia de priorização
proposta considera, primeiramente, os resultados identificados na Etapa 2 e, na sequência, os
resultados da Etapa 1, ou seja, primeiro, o nível como inibidor; e segundo, a sua existência
dentro do macroambiente. Optou-se, nesta pesquisa, por analisar apenas as práticas que
apresentaram incidência alta e média como inibidoras. A ordem de qualificação para
priorização foi definida, como exposto, no entanto, o campo empírico foi analisado como se
apresenta, com isso, nos casos em que uma relação, inibidor versus existência, não foi
observada, a próxima relação correspondeu ao nível de prioridade seguinte.
permitem visualizar se o que é considerado como inibidor na adoção pelas fazendas, tem sido
realizado a nível macro pelos atores institucionais individuais e coletivos no estado de MS;
além da prioridade de ações institucionais que cada prática de trabalho necessita.
Quadro 19: Classificação das práticas de trabalho institucional conforme nível de prioridade
para proposição de ações de trabalho institucional
Práticas de
Trabalho Macro Nível de
trabalho Unidades de análise Inibidor
institucional ambiente prioridade
institucional
Apoio político e
Existe Alto 1
regulatório
Advocacia Lobby por recursos Não existe Baixo -
Proposição ou ataque a
Não existe Baixo -
legislação existente
Processo de acreditação Existe
Trabalho Baixo -
formal parcialmente
Político Definição
Certificação de atores em
Não existe Médio 2
um campo
Realocação de direitos de
Não existe Inexistente -
propriedade
Aquisição
Mudanças de regras nas
Não existe Médio 2
relações de mercado
Construção de Reorientação de
Existe Médio 4
identidade profissões
Mudança de
Trabalho Substituição de normas Existe
associações Baixo -
Cultural generalizadas parcialmente
normativas
Construção de Proto-Instituições / Redes
Existe Médio 4
redes normativas normativas
Justaposição de velhos e Existe
Mimetismo Médio 3
novos modelos parcialmente
Elaboração de cadeias de Existe
Médio 3
causa e efeito parcialmente
Teorização
Nomeação de novos
Não existe Baixo -
Trabalho conceitos e práticas
Técnico Educação nas habilidades
Educação e conhecimentos Não existe Médio 2
necessários
Desenvolvimento de
Pesquisa e
pesquisas e produtos Existe Médio 4
Desenvolvimento
novos
Fonte: Elaborado pelo autor.
de aparências, por isso ela não pode ser apreendida diretamente na realidade concreta, sendo
necessário estabelecer modelos teóricos capazes de apresentá-los e explicá-los.
Apenas o apoio político e regulatório, ligado à advocacia, é listado como uma ação
que tem potencial alto como inibidor na adoção, sendo realizado de maneira significativa
dentro do macroambiente do estado, nível de prioridade 1. Este resultado é relevante para o
fenômeno estudado, visto que o ambiente institucional regulatório desempenha papel
importante na transformação do comportamento dos cidadãos ao estabelecer um lugar de
apoio ao desenvolvimento e adoção da IoT na bovinocultura de corte (Kummitha & Crutzen,
2019). No entanto, os produtores que citam ser esta uma prática inibidora tem como
argumento a realização de ações de criação e acesso a linhas de crédito para compra de
produtos IoT; algo que o governo do estado e o governo Federal tem feito pouco.
160
Dentre as práticas realizadas de maneira parcial no estado de MS, mas que não foram
identificadas no macroambiente, nível de prioridade 2, estão: definição, aquisição e educação.
As ações voltadas a essas práticas devem ser priorizadas pelos atores institucionais, pois, sem
um incentivo, a utilização decorrente de vantagens de mercado que as diferenciem dos demais
concorrentes e a impossibilidade de capacitar seus funcionários para utilizar essas tecnologias,
farão com que os produtos IoT demandem um custo de aquisição e manutenção alto, mas sem
o retorno econômico e de eficiência esperado pelas fazendas (da Rosa Righi et al., 2020).
Entre as práticas consideradas no nível médio como inibidoras e que estão sendo
realizadas no macroambiente do estado de MS, estão a construção de identidade, construção
de redes normativas e P&D, nível de prioridade 4. Essas práticas visam qualificar os
profissionais do mercado e das fazendas para trabalhar com produtos IoT cada vez mais
eficientes e diversos para a bovinocultura (Muzio et al., 2010). Além disso, permitem que
redes de cooperação distintas sejam criadas dentro do estado, fortalecendo-se as iniciativas
voltadas à IoT, desde projetos de P&D, de subvenção econômica, até troca de equipamentos
para superar desafios como a falta de recursos (Muilerman & Vellema, 2017).
Neste capítulo, é recordado o objetivo desta tese e apresentado como o mesmo foi
abordado e respondido. Além disso, são apresentados os principais resultados, as
contribuições para a teoria e prática, as limitações enfrentadas durante o desenvolvimento da
pesquisa e, por fim, listadas sugestões para pesquisas futuras.
Para atender ao objetivo específico (a), foi realizada uma revisão sistemática de
literatura, nas bases de dados Scopus e Web of Science. Como principais resultados,
identificou-se que a IoT pode agregar valor em diferentes atividades na agropecuária como,
por exemplo, para o monitoramento de pragas, do ambiente e dos animais, no controle de
irrigação e alimentação dos animais, na predição de anomalias no processo produtivo e na
logística de produtos dentro e fora da fazenda.
Para atender aos objetivos (b) e (c), foram realizadas entrevistas semiestruturadas e
coleta de documentos secundários, com dezesseis atores institucionais, com a finalidade de
163
Em relação ao objetivo (c), foi possível concluir que nem todas as práticas de trabalho
institucional ligadas ao trabalho político, técnico e cultural são realizadas pelos atores, a fim
de institucionalizar a adoção da IoT na bovinocultura de corte do estado de MS. As práticas
de aquisição e educação não foram visualizadas pelos entrevistados como existentes no
macroambiente do estado. As práticas de definição, mudança de associações normativas,
mimetismo e teorização foram listadas como existentes, mas, de modo parcial, pelos
entrevistados. Apenas as práticas de advocacia, construção de identidade, construção de redes
normativas e P&D foram listadas pela maioria dos atores entrevistados como práticas que
possuem ações realizadas de maneira efetiva.
prática de advocacia é a que mais impacta o fomento a adoção da IoT, sendo classificada no
nível 1 de prioridade de realização dentro do macroambiente. No nível 2 de prioridade, estão
as práticas de definição, aquisição e educação. As práticas de mimetismo e teorização estão
no nível 3. No nível 4, estão a construção de identidade, construção de redes normativas e
P&D.
O primeiro artigo empírico tem como título prévio “As práticas de trabalho
institucional que fomentam a adoção da Internet of Things (IoT) na pecuária bovina de corte
brasileira”. Este artigo terá como base teórica a lente do trabalho institucional e como unidade
de análise os órgãos de fomento à produção rural e à ciência e tecnologia do governo Federal
e os atores institucionais do estado de Mato Grosso do Sul. O objetivo é enviar este artigo
para o Journal of Management Studies (Oxford), classificada no quadriênio 2017-2020, com o
qualis A1.
O segundo artigo empírico tem como título prévio “Práticas de trabalho institucional
inibidoras a adoção da Internet of Things (IoT) pela pecuária bovina de corte brasileira”. Este
artigo terá como base teórica a lente do trabalho institucional e como unidade de análise os
pecuaristas que atuam no estado de Mato Grosso do Sul. O objetivo é enviar este artigo para o
journal, RAUSP MANAGEMENT JOURNAL, classificada no quadriênio 2017-2020 com o
qualis A2.
Além dos artigos, também será produzido um vídeo de, aproximadamente, dez
minutos, apresentando os principais resultados da pesquisa para ser postado no canal oficial
do Youtube do Núcleo de Pesquisas e Estudos em Controle Gerencial (Nupecon), grupo de
166
pesquisa coordenado pela orientadora desta pesquisa, da qual o pesquisador faz parte. E uma
“nota de pesquisa”, para publicação em sites e revistas não acadêmicas.
Entre as contribuições para a prática trazidas pelos resultados desse trabalho, pode-se
citar o levantamento, por meio da RSL, das possibilidades de utilização da IoT no
monitoramento, controle, predição e logística de atividades rurais brasileiras. Essas diferentes
possibilidades de utilização da IoT podem estimular empresas e centros de pesquisa a investir
no desenvolvimento de novos produtos IoT.
práticas que se destacam como potenciais inibidoras à adoção de produtos IoT pelas
propriedades de bovinocultura do estado.
Mudança nas regulamentações do mercado para que fazendas que utilizem produtos
IoT possam obter vantagem em comparação a seus concorrentes no acesso a novos clientes
nacionais e internacionais.
Algumas dessas ações demandam maiores esforços por parte dos atores institucionais
para que sejam estruturadas e colocadas em prática local e nacionalmente, no entanto elas não
precisam vir de esforços solitários e dispendiosos de um único ator e, sim, realizadas de forma
integrada entre vários deles. Os esforços coletivos para institucionalizar essa tecnologia
gerarão maior rapidez no efeito e assertividade por parte dos atores.
Por fim, alguns pontos identificados como resultados podem indicar gaps para
pesquisas futuras, entre eles: a lacuna entre o que se desenvolve de tecnologia nas
universidades e sua adoção no mundo prático; a baixa cooperação entre os atores que
desenvolvem tecnologias; falta de estimulo governamental para desenvolvimento de projetos
e produtos de IoT e; baixa qualificação profissional para tecnologias 4.0.
170
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183
1. Qual conhecimento a organização onde atua possui sobre tecnologias de Internet das
Coisas voltadas para a pecuária bovina de corte?
2. Qual ou quais setores dentro da organização onde atua são os responsáveis por desenvolver
estratégias para este tipo de tecnologia?
3. O interesse da organização onde atua é individual ou se trata de um interesse coletivo
voltado para incentivar a adoção da IoT na pecuária bovina de corte de MS?
4. Qual interesse sua organização tem em incentivar a adoção da IoT na pecuária bovina de
corte de MS?
5. Quais benefícios a IoT pode trazer para a pecuária bovina de corte de MS?
6. Quais as principais dificuldades que se apresentam na adoção da IoT na pecuária bovina de
corte de MS? Como estão superando?
7. O que sua organização tem feito para concretizar a adoção da IoT na pecuária bovina de
corte de MS?
8. Quais outros agentes públicos ou privados você indica para que eu possa entrevistar?
Breve apresentação sobre Trabalho Político e suas práticas: O trabalho político busca por
meio das práticas de advocacia, definição e aquisição, reconstruir e desenvolver regras,
direitos de propriedade, obter apoio social e político, e determinar limites como forma de
localizar uma nova instituição dentro de um sistema social mais amplo (T. B. Lawrence &
Suddaby, 2006; Perkmann & Spicer, 2008). Na prática de Advocacia é mobilizado o apoio
político e regulatório, por meio de técnicas diretas e deliberadas de persuasão social. Na
Definição são elaborados sistemas de regras capazes de conferir status ou identidade, definir
limites para associação e criar hierarquias no campo institucional. Na Aquisição uma
autoridade governamental tem o papel de realocar os direitos de propriedade meio da
mudança nas regras relacionais existentes no mercado.
10. Você tem conhecimento de algum grupo de interesse que tenha procurado políticos ou
órgãos do governo estadual para pressionar a formalização da IoT na pecuária bovina de
corte de MS?
11. Quais agendas de trabalho, ligadas ao governo do estado, foram propostas para estruturar a
adoção da IoT no estado?
12. Foram propostas novas legislações estaduais ou mudanças nas existentes para incentivar e
facilitar a adoção da IoT nas fazendas de bovinocultura de corte?
13. Quais são as regras legais ou termos contratuais específicos para atuação no
desenvolvimento, comercialização ou adoção da IoT na pecuária bovina de corte?
14. Quais são os métodos utilizados para avaliação e certificação das empresas permitidas a
trabalhar com o desenvolvimento e comercialização da IoT no estado? E para as fazendas
adotantes?
15. Como ocorre a certificação dos atores permitidos a trabalhar com a IoT na pecuária bovina
de corte?
16. Quais foram as alterações realizadas, por órgãos estaduais, sobre o direito de produção e
comercialização da IoT para bovinocultura de corte?
17. O governo estadual interfere diretamente no livre mercado da IoT para pecuária bovina de
corte?
18. Além do Governo estadual, algum outro órgão atua como autoridade de regulamentação e
fiscalização sobre as operações com a IoT?
19. Quais são as profissões ou tipos de profissionais que surgiram para atuar na adoção da IoT
pela pecuária bovina de corte de MS?
20. Quais mudanças os profissionais que atuam no mercado tiveram que fazer para trabalhar
com a adoção da IoT nas fazendas de pecuária bovina de corte de MS?
185
21. Houve modificações no que se considerava como correto ou culturalmente aceitável nas
práticas da pecuária bovina de corte de MS após se adotar a IoT?
22. Foram criadas no estado alianças ou grupos de trabalho entre diferentes organizações com
objetivo de tornar as práticas ligadas a adoção da IoT aceitas, monitoradas ou avaliadas
constantemente? Qual a função desses grupos?
23. Quais tipos de práticas, tecnologias e regras, já em operação, foram utilizados para auxiliar
na estruturação e adoção da IoT na pecuária bovina de corte de MS?
24. Os benefícios e problemas enfrentados pela utilização da IoT são claramente apresentados
ao ponto de incentivar ou inibir a adoção da IoT na pecuária bovina de corte?
25. Novas terminologias foram criadas para as práticas que são de uso específico da IoT
voltadas a pecuária bovina de corte?
26. Quais tipos de cursos de capacitação são oferecidos para profissionais, empresários ou
produtores que queiram trabalhar com a IoT na pecuária bovina de corte? Quais
instituições oferecem esses cursos?
186
25. A necessidade das empresas fornecedoras de receber uma certificação para fornecer
esse tipo de tecnologia faria com que você considerasse a adoção desses produtos?
26. O recebimento de uma certificação diferenciada para sua fazenda ou produto, por
utilizar algum equipamento IoT, faria com que você pensasse sobre a adoção?
27. A definição por parte do governo de quem deve produzir e comercializar essas
tecnologias IoT impactam na sua avaliação de adoção?
28. A possibilidade de obter vantagem de mercado ao adotar esses dispositivos IoT faria
você considerar a adoção?
29. A existência no mercado de profissionais formados especificamente para trabalhar e
prestar assistência para essas tecnologias faz com que você pondere a adoção desses
produtos IoT?
30. A necessidade de mudanças nas práticas de produção dos bovinos de corte para a
adoção dessa tecnologia (lida, bem-estar, etc) faria avaliar a adoção?
31. A existência de grupos de empresas ou produtores que desenvolvam trabalhos de
apoio a adoção ou utilização dessas tecnologias IoT é algo relevante para que você
adote?
32. A possibilidade de utilizar as mesmas estruturas ou processos que vocês já possuem
para adotar a IoT impacta na sua intenção de utilizar esses equipamentos?
33. Você avaliaria a adoção desses produtos IoT se existisse maior divulgação de
informações sobre a sua utilização nas mídias sociais, sindicatos ou outro ambiente
(benefícios ou problemas)?
34. A necessidade de aprender novos nomes ou terminologias provenientes da adoção
desses dispositivos IoT na produção dos bovinos, faria com que você considerasse a
adoção?
35. Você analisaria a adoção de produtos IoT se fossem amplamente ofertados cursos de
capacitação e formação para utilização dessas tecnologias na fazenda? Quem poderia
oferecer?
36. A existência de pesquisas para desenvolvimento produtos IoT estimula uma intenção
de adoção por parte da fazenda?
46. Houve mudanças na prática de produção dos bovinos de corte depois da adoção dessa
tecnologia (lida, bem-estar, etc)?
47. Vocês se depararam com informações sobre a utilização da IoT que poderiam inibir ou
incentivar a adoção?
48. Houve a necessidade de aprender novos nomes sobre as operações que vocês realizam
com apoio da IoT (terminologias)?
49. Vocês foram submetidos a algum tipo de curso de capacitação para operarem a
tecnologia? Se sim, qual instituição ofereceu?
50. Tem conhecimento da existência de pesquisas para desenvolvimento produtos IoT
estimula uma intenção de adoção por parte da fazenda?
190
______________________________
Nome e assinatura do (a) participante
Local: Data:
192
6
Rubrica participante Rubrica pesquisador
193
______________________________
Nome e assinatura do (a) participante
Local: Data:
194
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AgriPrediction: A proactive internet of things model to Computers and
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Agriculture.
197
(Continua)
Trabalho institucional Trabalho Político
Práticas para criação de
Advocacia Definição
instituições
Apoio Proposição ou Processo de Certificação
Lobby por Promoção Criação de
Indicação Setor de atuação político e ataque a legislação acreditação de atores em
recursos de agendas padrões
regulatório existente formal um campo
SE01 Setor Educacional E NE NE NE E NE E
SE02 Setor Educacional E NE NE NE NE NE NE
SE03 Setor Educacional E NE NE NE E NE NE
SE04 Setor Educacional E NE NE NE E NE E
SP01 Setor Privado NE NE NE NE NE NE E
SP02 Setor Privado E NE NE NE E NE NE
SP03 Setor Privado NE E - NE NE NE E
SP04 Setor Privado E NE NE NE NE NE NE
SP05 Setor Privado E NE E NE NE NE NE
SP06 Setor Privado E NE E NE NE NE NE
SP07 Setor Privado NE NE E NE NE NE NE
SPE01 Setor Público Estadual E NE NE E NE NE NE
SPE02 Setor Público Estadual E NE NE NE NE NE NE
SPF01 Setor Público Federal E NE E NE E NE E
SPF02 Setor Público Federal E E E E E NE E
SPF03 Setor Público Federal E E E E E NE NE
(Legenda: E = Existe; EP = Existe Parcialmente; NE = Não Existe)
198
(Conclusão)
(Continua)
Trabalho institucional Trabalho Político
Práticas para criação de
Advocacia Definição Aquisição
instituições
Apoio Proposição ou Processo de Certificação Realocação de Mudanças de regras
Lobby por
Indicação político e ataque a legislação acreditação de atores em direitos de nas relações de
recursos
regulatório existente formal um campo propriedade mercado
FAZA01 Não Não Não Não Sim Não Sim
FAZA02 Sim Não Não Não Não Não Sim
FAZA03 Sim Não Não Não Sim Não -
FAZN04 Sim Não Não Não Sim Não Sim
FAZN05 Sim Não Não Sim Não Não Não
FAZN06 Sim Sim Sim Não Sim Não Sim
FAZN07 Sim Sim Não Não Sim Não Sim
FAZN08 Sim Sim Não Não Sim Não Sim
(Legenda: E = Existe; EP = Existe Parcialmente; NE = Não Existe)
202
(Conclusão)
Trabalho
Trabalho Cultural Trabalho Técnico
institucional
Práticas para Mudança de Construção
Construção Pesquisa e
criação de associações de redes Mimetismo Teorização Educação
de identidade Desenvolvimento
instituições normativas normativas
Justaposição Educação nas
Criação / Substituição Elaboração Nomeação de Desenvolvimento
Proto- de velhos e habilidades e
Indicação Reorientação de normas de cadeias de novos conceitos de pesquisas e
Instituições novos conhecimentos
de profissões generalizadas causa e efeito e práticas produtos
modelos necessários
FAZA01 Sim Não - Sim Sim Não Não -
FAZA02 Sim Sim - Sim Sim Sim Sim Sim
FAZA03 Não Não - Sim Não Não Sim -
FAZN04 Sim Não Sim Sim Sim Não Sim -
FAZN05 Sim Não Sim Não Não Não Sim Sim
FAZN06 Sim Não Sim Sim Sim Não Sim Sim
FAZN07 Sim Sim Sim Sim Não Não Não Sim
FAZN08 Não Sim Não Não Sim Não Sim Não
(Legenda: E = Existe; EP = Existe Parcialmente; NE = Não Existe)
Meta: Beneficiar quarenta projetos de P&D, por ano, com recursos financeiros para
desenvolverem produtos e pesquisas para a bovinocultura com produtos IoT. - Atores
institucionais envolvidos: Semagro e Fundect. - Tempo de realização: 6 meses.
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C. Mudança nas regulamentações do mercado para que fazendas que utilizem produtos
IoT possam obter vantagem em comparação a seus concorrentes no acesso a novos
clientes nacionais e internacionais.
Meta: Instituir arcabouço legal e programa de acreditação para que empresas que
adotem a tecnologia IoT sejam beneficiadas na comercialização externa e interna.
Atores institucionais envolvidos: Semagro e Governo Federal. - Tempo de realização:
12 meses.
Meta: Cadastrar 100% das propriedades do estado que adotem produtos IoT no
programa de bonificação por adoção tecnológica. Atores institucionais envolvidos:
Semagro. - Tempo de realização: 6 meses.
Meta: Oferecer, no mínimo, cinco disciplinas, cursos, palestras, oficinas e afins para
alunos, produtores e trabalhadores rurais, por meio de parcerias entre instituições
públicas e privadas. Atores institucionais envolvidos: Semagro, Sistema Famasul e
universidades públicas e privadas do estado de MS. - Tempo de realização: 12 meses.
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