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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de Pós-Graduação em Direito

A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA

Henrique Viana Pereira

Belo Horizonte
2010
Henrique Viana Pereira

A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA

Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Direito da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais, como
requisito parcial para obtenção do
título de Mestre em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Almeida


Magalhães.

Belo Horizonte
2010
FIC H A C AT AL O G R ÁF I CA
E la b or ad a p e la B ib l i ot ec a da Po nt if íc i a U ni v ers id a de C a tó l ic a de M in as G er a is

P er e ir a , H enr i q ue V ia n a
P 43 6f A f u nç ã o s oc ia l d a em pres a / He nr i qu e V i an a Per e ir a. Be l o
Hor i zo n t e , 2 0 10 .
1 2 1f .

O r i e nt a dor : R odr i g o A lm ei d a Ma g a lh ã es
D is s er t aç ã o (M es tra d o) – P o n tif íc i a U ni v ers i da d e C at ó l ic a d e
M in as G er a is . Pr ogr a m a de Pós - G ra d uaç ã o em D ir e i t o.

1. R es p ons a b il i d ad e s oc i a l da em pres a . 2. D ir e it o
em pr es ar ia l – Br as i l . 3 . Pr i nc í p ios c o ns ti t uc i on a is . I . M ag a l hã es ,
Ro dr i go Alm e id a . II . P on t if íc ia U n i ve rs i d ad e Ca tó l ic a d e M in as
G er ais . Pr o gr am a d e P ós - G r ad u aç ã o em D ir e it o. I II . T ít u l o.

C DU : 3 47 .7 2
Henrique Viana Pereira
A função social da empresa

Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em
Direito Privado da Pontifícia
Universidade Católica de Minas
Gerais, como requisito parcial para
a obtenção do título de Mestre em
Direito.

Prof. Dr. Rodrigo Almeida Magalhães (orientador) – PUC Minas

Profa. Dra. Taisa Maria Mac ena de Lima – PUC Minas

Prof. Dr. Fernando Gonzaga Jayme – UFMG

Profa. Dra. Maria Emília Naves Nunes (suplente) – PUC Minas

Belo Horizonte, 18 de janeiro de 2010.


Aos meus pais, pelo
imprescindível apoio.
AGR ADECIMENTOS

A todos os professores do curso de mestrado , fundamentais


nessa etapa que chega ao fim, em especial o Professor Doutor Rodrigo
Almeida Magalhães, pela orientação, comprometimento e confiança.
À Cristina, meu amor, que vive nciou de perto me incentivando
para esta importante conquista, com total compreensão e carinho.
Agradeço, também, aos amigos que fiz durante o curso de
mestrado, pelo apoio e por estarem sempre presentes.
RESUMO

Esta dissertação reali zou estudo exploratório acerca da função


social da empresa. Procurou contribuir, por meio de investigação na
doutrina, a uma concreta interpretação da função social inerente à
atividade empresarial. A pesquisa iniciou com um breve histórico do
direito empresarial, desde a origem do direito comercial até o direito
empresarial atual, de acordo com a análise das consequências públicas
do direito privado, bem como com a constitucionalização desse ramo do
direito. Em seguida, passou ao estudo dos princípios iner entes à
atividade empresarial na ordem econômica e social conforme a
Constituição da República de 1988. Essas foram as peças
fundamentais para o desenvolvimento desse trabalho. Após, focalizou a
função social da empresa, com ênfase no contexto do Estado
Democrático de Direito. Por fim, investigou as relações da função
social da empresa perante tudo que a empresa afeta ou que pode ser
afetado por ela. Como resultado, após uma bagagem cognitiva
relevante, concluiu que o empresário, para estar em conformidade com
os valores consagrados na Carta Magna, deve exercer função social.
Para isso, além de gerar empregos, pagar tributos e circular riqu eza,
deve contribuir para o bem -estar social, para fins de assegurar a todos
existência digna, conforme os princípios co nstitucionais. Destarte, a
meta do empresário na obtenção de lucros deve estar atrelada a uma
busca do bem-estar coletivo.

Palavras-chave: Direito brasileiro. Constitucionalização do direito


privado. Direito empresarial. Função social da empresa.
11

ABSTRACT

This dissertation conducted an exploratory study about the


social function of the enterprise. Sought to contribute, through research
in the doctrine, to a concrete interpretation of the inherent social
function in business activity. The research b egan with a brief history of
business law, since the origin of commercial law to the current business
law, according to an analysis of the public consequences of private law,
as well as a interpretation of this branch of law according to the
constitution. Then came the study of the inherent principles in business
activities in economic and social order according to the Constitution of
1988. Those were the fundamental pieces for the development of this
work. After, focused on the social function of the enterprise, with
emphasis in the context of the democratic state of law. Finally, it
investigated the relations of the social function of the enterprise before
everything that the enterprise affects or that can be affected by her . As
a result, after a relevant cognitive baggage, concluded that the
enterprise, to comply with the consecrated values in the Constitution,
must exercise a social function. For that, beyond generate jobs, pay
taxes and circulate wealth, the enterprise should contribute to social
welfare, for the purpose of assure to all worthy existence, according to
the constitutional principles. Th erefore, the goal of the entrepreneur in
the obtaining of profits should be tied to a search of the collective well -
being.

Keywords: Brazilian Law. Interpre tation of the private la w


according to Constitution. Business Law. Social function of the
enterprise.
12

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................ 09

2 BREVE HISTÓRICO DO DIREITO EMPRES ARI AL ............................ 11


2.1 Do direito comercial ao Direito Empresarial ............................... 11
2.2 Evolução das fontes d o Direito Privado ao longo da história
brasileira ........................................................................................ 15
2.3 O Direito Empresarial no Estado Democrático de Direito ........... 18
2.4 Análise das consequênci as públicas do Direito Privado ............. 22
2.5 Publicização do Direito Privado ................................................. 25
2.6 Constitucionalização do Direito Pr ivado ..................................... 26

3 PRINCÍPIOS INERENTES À ATIVIDADE EMPRES ARIAL NA ORDEM


ECONÔMICA E SOCI AL CONFORME A CONSTITUIÇÃO DE 1988 ........ 31
3.1 Princípio da dignidade da pessoa humana ................................. 34
3.2 Princípio da livre iniciativa ........................................................ 37
3.3 Princípio da valorização do trabalho humano ............................. 39
3.4 Princípio da soberania nacional econômica ................................ 41
3.5 Princípio da livre concorrência .................................................. 43
3.6 Princípio de defesa do consumidor ............................................ 44
3.7 Princípio de defesa do meio ambiente ....................................... 46
3.8 Princípio da redução das des igualdades regionais e sociais ...... 48
3.9 Princípio da busca do pleno emprego ........................................ 50
3.10 Princípio do tratamento diferenciado para as microempresa s e
empresas de pequeno porte ............................................................ 51
3.11 Princípio da propriedade privada e da função social da
propriedade .................................................................................... 53
13

4 FUNÇÃO SOCI AL DA EMPRES A ..................................................... 58


4.1 Empresa .................................................................................... 58
4.2 Função social ............................................................................. 61
4.3 Função social do contrato .......................................................... 63
4.4 Função social da empresa .......................................................... 65
4.5 Responsabilidade social ............................................................. 74
4.5.1 Liame entre responsabi lidade social e função social .............. 78
4.6 Reflexos da função social da empresa ....................................... 80

5 A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRES A NA SOCIE DADE ......................... 82


5.1 Função social da e mpresa perante os consumidores .................. 83
5.2 Função social da empresa perante a comunidade ....................... 87
5.3 Função social da empresa perante os sócios e os
administradores .............................................................................. 90
5.4 Função social da empresa perante os empregados ..................... 93
5.5 Função social da empresa perante o meio ambiente .................. 96
5.6 Função social da empresa perante o mercado ........................... 100
5.7 Função social da empresa perante o Direito Penal Empresarial .. 102

6 CONCLUS ÃO ................................................................................. 109

REFERÊNCI AS ................................................................................. 112


9

1 INTRODUÇÃO

O surgimento do Estado Democrático de Dir eito brasileiro,


marcado pela Constituição da República de 1988, instigou a sociedade
à reflexão sobre as atuais condições de vida, bem como a respeito das
perspectivas de futuro da humanidade. Foi iniciada uma crescente
preocupação sobre a precariedade e a constante deterioração das
condições – sociais e econômicas – da existência humana.

O homem, por sua própria natureza, vive e coexiste em


comunidade. O direito deve regular o convívio social, assegurando ao
ser humano condições de existência e de desenv olvimento.

Nesse contexto, percebe -se que dentre as diversas discussões


atuais que são fontes de debates, encontra -se a função social da
empresa. Essa função será o objeto de estudo , que é justificado pela
ausência de análise satisfatória, data venia, pela doutrina de direito
empresarial.

Atualmente, o crescimento econômico deve sempre estar


atrelado ao desenvolvimento social, para não deixar de lado o princípio
da dignidade humana. O ser humano não pode ser desvalorizado a
ponto de se tornar insignifican te frente aos objetivos empresariais.
Então, pretende -se demonstrar que a atividade empresarial deve
buscar o lucro e, de maneira harmônica, o bem comum, a fim de
assegurar a todos existência digna. Destarte, o exercício da função
social, legitimador da at ividade econômica, vai muito além do mero
exercício da empresa.

Nessa concepção, será analisado se o lucro é o único objetivo


da empresa e se ela deve ter como meta objetivos sociais atrelados à
exploração da atividade econômica. Pretende -se, nesse sentido ,
demonstrar que o lucro não pode ser o objetivo isolado da atividade
10

empresarial. Aliás, é essa a contribuição que se pretende oferecer com


esta dissertação.

Ao desenvolver o tema, será estudada a função social da


empresa, aplicada sob a luz dos novos par adigmas do direito privado,
no contexto do Estado Democrático de Direito brasileiro. Será abordada
a diferença entre f unção social da empresa e responsabilidade social.
E, ainda, se a autonomia privada do empresário pode ser limitada a
ponto deste ter que harmonizar seu objetivo de lucro com o de buscar o
bem comum. Para isso, o desenvolvimento do trabalho que ora se
apresenta traz à baila do entendimento do leitor quatro capítulos.

No capítulo dois será feito um breve histórico do direito


empresarial, desde a origem do direito comercial, passando pela
evolução das fontes do direito privado ao longo da história do Brasil,
até o direito empresarial no estado democrático de direito. Serão
abordadas, ainda, as consequências públicas do direito privado, a
publicização e a constitucionalização desse ramo do direito.

No terceiro capítulo serão analisados princípios constitucionais


inerentes à atividade empresarial na ordem econômica e social
estabelecida pelo Estado Democrático de Direito. Sendo certo que
todos os princípios são fundamentais para a correta interpretação da
função social da empresa.

O capítulo seguinte traz à luz apreciação acerca da empresa, da


função social, da função social do contrato, da função social da
empresa, bem como a respeito da responsa bilidade social. Também
será analisado o liame entre função social e responsabilidade social,
bem como os reflexos da função social da empresa.

O capítulo cinco mostra a relação da função social perante tudo


que afeta ou é afetado pela atividade empresaria l, como os
consumidores, a comunidade, os sócios e administradores, os
empregados, o meio ambiente, o mercado e, até mesmo, o direito penal
empresarial.
11

2 BREVE HISTÓRICO DO DIREITO EMPRES ARI AL

2.1 Do Direito Comercial ao Direito Empresarial

Esse cap ítulo não pretende esgotar a temática referente ao


histórico do direito empresarial. Tem o intuito de mostrar os pontos
básicos, indispensáveis ao desenvolvimento do presente trabalho.
Conforme sabido, é necessário estudar as origens do direito, eis que
inúmeros institutos jurídicos permanecem atuais. Diante disso, será
feito apenas um breve histórico acerca do direito mercantil.

O direito comercial nasceu como um direito de classe, visando


regular a atividade dos mercadores. Sua fase primitiva era
caracterizada pela troca direta de mercadorias e pela organização de
comerciantes visando o melhor interesse da classe.

Dessa forma, o direito comercial surgiu como consuetudinário e


classista. Os próprios mercadores criavam o direito para decidir as
divergências surgidas em razão da atividade econômica por eles
exercida. Para isso, se organizavam em associações profissionais e
corporações. Nestas últimas havia o costume da redação dos seus
próprios estatutos, o que acabava por facilitar a célere incorporação de
novas práticas comerciais ao direito escrito.

Nessa primeira fase do direito mercantil, como um direito de


classe, o alcance da aplicação das regras comerciais era determinado
pela qualidade de comerciante. Para saber se o direito comercial seria
aplicado, bastava analisar a característica do autor. Dessa forma, esse
sistema jurídico somente era aplicado para um comerciante.

Sobre essa fase subjetiva, ensina Rubens Requião:


12

T em os , nes s a f as e, o p erí o do es tr it am en te s u b j et iv is t a d o
d ir e i to c om erc i a l a s e rv iç o d o c om erc i a nt e, is t o é, um dir e it o
c or p or at iv o, pr of is s i o na l , es p ec ia l , a u tô n o mo , em rel aç ã o ao
d ir e i to ter r i t ori a l e c i v i l, e c o ns ue tu d i nár i o . (R EQ U I ÃO , 19 9 8,
p. 1 1) .

Os comerciantes eram registrados e possuíam um local onde


exploravam suas ativida des, as quais se submetiam às regras feitas
para a classe. Por isso, em suma, o direito comercial era marcado,
principalmente, por um caráter subjetivo, com foco na qualidade do
autor.

Assim, surgiu como um direito costumeiro para, com o tempo, se


transformar em um sistema de direito comercial. As principais críticas
para essa fase subjetiva dizem respeito ao fato de que algumas
pessoas, mesmo sem serem comerciantes, se beneficiavam pelo direito
mercantil, simplesmente por serem registradas. E, por outro l ado,
verificou -se que nem todos os atos praticados pelos mercadores tinham
natureza comercial.

Após a primeira teoria (subjetiva), o direito comercial passou a


ser aquele que rege os atos de comércio, possuindo, dessa forma,
característica predominantement e objetiva (segunda fase). Seu foco
estava nos atos praticados, e não na qualidade da pessoa. Essa
transição está relacionada com o princípio da igualdade entre os
cidadãos (que ganhou força com a Revolução Francesa) e com o
fortalecimento do estado nacion al frente às corporações.

Sobre a transição da teoria subjetiva para a objetiva, explica


Rubens Requião:

P as s o u- s e d o s is t em a s u bj e t i vo a o o bj e t i v o, v a le n do - s e da
f ic ç ã o s e g u nd o a q u a l de v e r e pu tar - s e c o m erc ia nt e qu a l qu er
pes s o a qu e at u e em j uí zo po r m ot i vo c om e rc i al . Es s a f ic ç ã o
f av or ec e u a ex t e ns ã o do d ir e it o es p ec ia l d os c om erc i a nt es a
to d os os at os d e c o m érc io , f os s e q uem f os s e s e u au t or.
( R EQ U I ÃO , 1 9 98 , p . 1 2).
13

Dessa forma, o direito comercial passou a ser o direito dos atos


previstos em lei como ato s de comércio. E, por isso, caso uma pessoa
explore o comércio, pode usufruir dos privilégios concedidos pelo
direito comercial.

O problema da segunda teoria (objetiva) é que os atos de


comércio não se limitam aos atos assim definidos em lei, eis que
impossível esgotar todos eles em uma lista, bem como pelo fato de que
eles são renovados diariamente frente à modernidade e seus novos
usos e costumes.

Após, surge a denominada teoria da empresa (terceira fase), que


possui como marco a mudança do Código Comerc ial italiano, unificado
com o Código Civil na parte relativa às obrigações, em 1942. Pode -se
dizer que foi uma tentativa da Itália em criar um código apenas com
matéria concernente ao direito privado. Sobre essa unificação, comenta
Rachel Sztajn:

S e a lg u ém f os s e l e va do a en te n de r qu e a u n if ic aç ã o d o d ire i to
obr i g ac io n al im p l iq u e o des a par ec im en to d o D ire i to C om erc i a l,
é pr ec is o l em brar q u e , m esm o na I tá l i a, e m que o f en ôm en o
da t a d e 1 94 2 , d ir e it o c i v i l e c om erc ia l p erm an ec em dis t in tos .
T am bém é de a po n tar qu e n u nc a h ou v e gra nd e pre oc up aç ão ,
s ej a pe l a d o utr i n a, s ej a pe l a j ur is pr ud ê nc i a, c om a qu es t ã o,
por q u e, d e r egr a, s e e nt e nd em c om erc ia is as a t i vi d a des
s eg u nd o noç ã o ec on ôm ic a o u c on tá b i l. ( SZT AJ N, 20 0 4, p.
14 5) .

Com a teoria da empresa, não se fala mais em comerciante,


mas, apenas, empresário. É o que se extrai dos dizeres de W aldírio
Bulgarelli:

Co nc or d a d e m an e ira g era l a d ou tr i na i ta l i an a em qu e nã o
ho u v e m era s u bs t it u i ç ão d o c om erc ia n te pe l o em pres ár i o , e
s im , a a d oç ã o de um s is t em a d an d o pr e e m inê nc ia a es t e e
as s im igu a la n do os ag e nt es d as a ti v i d ad es ec on ôm ic as da
pr o d uç ão d e be ns o u s er v iç os , s o b a ru br i c a de em pres ár i o,
m as , not e - s e, c onc e b i do es t e n ã o c om o es pec u l ad or , p orém ,
c om o r es po ns á ve l p e l a pro d uç ã o ; d es ta f or m a, o c om erc i an t e
14

an t ig o f o i a bs or v i do p e la c a te g or ia de em pr es ár i o, c om o t it u la r
da at i v i d ad e in t erm ed i ár ia . H á qu e s e a te nt ar, p ois , p or o utr o
l ad o, qu e o em pres ár i o c om erc i a l c orr es p o n de de c er t a f orm a
ao an t ig o c om erc ia n te e nã o a o em pr es ár i o em gera l , o u s ej a ,
há c or r es p o nd ê nc ia e ntr e os d ois , n o q u e s e ref er e ao f a to d e
qu e am bos ex erc em um a at i v i da d e ec o n ô m ic a or ga n i za d a de
i nt er m ed iaç ã o, e h á d if ere nç a no f at o d e qu e é c o ns i d er ad o
em pr es ár io p or q ue é a ge nt e d a pr o du ç ão e nã o m ero
es p ec u la d or. ( BU LG A RE L LI , 2 00 0, p. 8 5) .

Nesse sentido, também não se fala mais em atos de comércio,


mas tão somente em empresa:

T oda v i a, é im por ta n te res s al t ar o q u e v em a s er a ex pr es s ã o


da un if ic aç ã o d e um no vo d is c i p l i nam en t o pr i v ad o d a a t i v id a de
ec o n ôm ic a , u l tra p as s an d o - s e a d ic ot om i a d os at os de
c om ér c i o e d os a t os c i v is , um a ve z qu e, na at u al i d ad e, v e io a
ex pr es s ã o “em pres a” a s u bs t i tu ir a “a t o d e c om érc io ”.
( M AR S H AL L , 20 0 2, p . 12 4) .

Sobre a importância das sociedades empresárias no mundo


atual, acentua Fábio Konder Comparato:

S e s e q u is er i nd ic ar um a ins t i tu iç ã o s oc i a l qu e , p el a s u a
i nf l uê nc ia , d in am is m o e po d er de tr ans f o r m aç ão, s ir v a c om o
e lem en t o ex p l ic at i v o e def i n id or d a c i vi l i za ç ã o c o nt em por ân e a,
a es c o lh a é i n d ub i t á ve l : es s a ins t it u iç ã o é a em pr es a .
( CO MP A R AT O , 1 99 5, p. 3) .

O Código Ci vil brasileiro de 2002 demonstra que abraçou a


teoria da empresa, conforme dispõe o artigo 966, in verbis: “Considera -
se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica
organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços” .
15

2.2 Evolução das fontes do Direito Privado ao longo da história


brasileira

Na época Colonial, pode -se dizer que as fontes do Direito


Privado Brasileiro foram as Ordenações dos reis portugueses Dom
Afonso, Dom Manuel e Dom Filipe, além do chamado Direito C omum
(Canônico e Romano). Nos dizeres de Rubens Requião:

Dur a nt e o p erí o do d o Br as i l - c o l ô ni a as r e laç õ es j urí d ic as


pa u ta v am - s e, c om o n ão po d ia de ix ar d e s er, p e l a l eg is l aç ã o
de P or t u ga l . Im per a v am , por ta n to , as O rd en aç ões Fi l i p in as ,
s ob a i nf l uê nc i a d o d i re i to c a nô n ic o e d o d ir e it o r om an o.
( R EQ U I ÃO , 1 9 98 , p . 1 5).

As Ordenações Afonsinas (1446 a 1514), que foram resultado do


nacionalismo português e tinham caráter romanista, não vigoraram por
muito tempo em território brasileiro. Com pouco tempo de vigênci a
foram substituídas pelas Ordenações Manuelinas (1514 a 1603). Estas
que vieram para tentar atender à necessidade de unificar o Direito,
visando fortalecer o poder absolutista central e enfraquecer os poderes
dos senhores locais.

Já em 1603, vieram as Or denações Filipinas, que vigoraram até


a República. Foram obra dos reis espanhóis Dom Felipe I e Dom Felipe
II. Houve uma busca pelo abrandamento do Direito Canônico. Era
inspirado também no Direito Comum, eis que aplicado de forma
subsidiária.

No Brasil imperial, as leis de Portugal continuaram em vigor. A


atividade legislativa brasileira começou aos poucos e, nesse mesmo
ritmo foi substituindo a legislação de Portugal. Para César Fiuza,
16

T am bém eram f ontes d o D ir e it o no Im pér i o os c os tum es ; o


Dir e it o R om an o, re v i s to p e l o P an d ec t is m o a lem ã o, q u e er a
s up l em en to a o Di re i to n ac i o n al , s em pre f u n da d o na b o a r a zã o ;
o D ir e it o d as N aç õ es Ci v i l i za d as , pr i nc i pa l m ente a d o utr i na d o
Dir e it o C om um e, f i na lm en te , o Di re i to Ca nô n ic o, a t é a
Co ns t i tu iç ã o d e 1 89 1, qu a n do a Igr ej a s e s ep ar o u d o Es t a d o .
( FIU ZA , 2 0 07 , p. 74) .

Em 1850, surge o Código Comercial, conhecido e válido até a


atualidade. Já o Código Civil, só entrou em vigor em 1916. Antes deste,
ocorreram algumas tentativas de codif icação.

Em 1855, o famoso juris ta Teixeira de Freitas foi encarregado


de consolidar o Direito Civil que estava em vigor. Seu trabalho de
sistematização jurídica foi tido como admirável.

Para César Fiuza, “a Consolidação das Leis Civis de Teixeira


de Freitas foi um magnífico trabalho d e legislação, de sistematização
jurídica. Fixou, de forma bastante organizada, o Direito Civil vigente”
(FIUZA, 2007, p. 75).

Após essa mencionada consolidação, passou -se a tentativa de


esboço de um Código Civil. Essa tentativa foi abandonada em 1872.
Após algumas tentativas infrutíferas, em abril de 1899, Clóvis
Bevilaqua foi nomeado para elaborar um projeto de Código Civil.
Inspirado no Código Francês, no Código Austríaco, no Código Alemão,
na doutrina francesa, italiana e alemã, no esboço feito por Teix eira de
Freitas e, ainda, em outros projetos, apresentou seu projeto.

Esse projeto feito por Clovis Bevilaqua, após sofrer diversos


exames e revisões, foi aprovado em 1902, ocasião em que seguiu para
o Senado. Neste, foi nomeada outra comissão, presidida por Ruy
Barbosa. Após este saudoso jurista examinar e discutir o texto legal,
em 1912, o Senado apresentou 186 emendas de fundo e outras de
redação. Depois de rejeições de 94 emendas, o projeto retornou ao
Senado, o qual manteve 24 das que foram rejeitada s.
17

Após, houve preparação para a redação definitiva do Código,


que foi aprovado em 1916, somente entrando em vigor no dia 1º de
janeiro de 1917. Este código nasceu com os olhos para o passado. Por
isso, após o início de sua vigência, ocorreram várias prom ulgações de
leis especiais visando a adaptação da lei civil aos ditames do Estado
Social.

Dessa forma, apesar de existir um Código Civil no ordenamento


jurídico brasileiro, não se pode dizer que havia absoluto monopólio
desse código. Com isso, surgiram o Estatuto da Mulher Casada, o
Código de Menores, dentre outras leis.

Ocorreram várias tentativas de revisões do Código Civil.


Orozimbo Nonato e outros apresentaram um Código das Obrigações,
cujo anteprojeto f oi apresentado em 1941. Este anteprojeto não se
efetivou. Em 1963, Orlando Gomes, juntamente com Caio Mário da
Silva Pereira e Orozimbo Nonato, apresentaram o Anteprojeto de um
novo Código Civil. Também não prosperou.

Já em 1967, foi a vez de Miguel Reale tentar a missão de fazer


um novo código. O resu ltado desse trabalho somente foi aprovado pela
Câmara e pelo Senado em 2001, publicado em 11 de janeiro de 2002, e
entrou em vigor aos 11 de janeiro de 2003. Trata -se do novo código
civil brasileiro.

Fundamental mencionar também sobre a Constituição da


República, promulgada em 1988. Após essa Constituição, o Brasil
determinou diretrizes para se tornar um Estado Democrático de Direito.
Por isso, todo o ordenamento jurídico passou a ser lido sob essa ótica.
Dessa forma, em detrimento da propriedade privada e da autonomia da
vontade passa-se a priorizar a dignidade da pessoa humana. Nesse
embalo, surgem o Código do Consumidor, o Estatuto da Criança e do
Adolescente, leis sobre a união estável, lei do meio ambiente, dentre
outras.
18

Essa releitura sob a ótica de um Estado Democrático de Direito


afetou de forma drástica a doutrina e a jurisprudência pátria. Por isso
que hoje muito se fala em constitucionalização do Direito Civil.

Nesse ambiente entrou em vigor o Código Civil de 2002. Sobre


esse Código, opina Césa r Fiuza:

P od e- s e di ze r q ue s e dis t anc i a r ad ic a l m ente d a m od er na


te n dê nc ia c o d if ic a do ra. N as c e p re te ns i os o , p or dem a is
de t al h is t a , r ep l et o d e r eg ras a bs ol u tam e nt e i nú t eis , à an t ig a
m oda do s éc ul o X IX , qu e pr et en d i a pr e v er na L e i c o d if ic a da o
m aior n úm er o pos s í ve l d e d et a l hes , c om o q ue abr aç a nd o t od a a
r ea l i d ad e f át ic a. Is to é m is s ã o im pos s í v e l. A m o der n a téc n ic a de
c od if ic aç ã o pr ec e i tu a de v er em os c ód ig o s at en ta r m ais a os
pr inc íp i os q u e às re gr as , m ais a o g er a l q ue aos d et a l hes . Es tes
s ão f ac i lm ent e d e du tí v e is aos pr inc íp i os . (F I UZ A, 2 0 07 , p . 77) .

E, conforme opinião sugere César Fiuza, o Código Civil de 2002


já nasceu obsoleto, exigindo dos intérpretes grande atividade exegética
para utilizá-lo de forma correta dentro das necessidades atuais.

2.3 O Direito Empresarial no Estado Democrático de Direito

Com o Estado Democrático de Direito brasileiro, marcado pela


Constituição da República de 1988, não se pode falar em atividade
empresária separada de objetivos sociais, econômicos e ambientais.
Em razão dos direitos fundamentais, a empresa e seus resultados
estão ligados a uma prática de responsabilidade social corporativa.

A Constituição de 1988 marcou definitivamente a


redemocrarização do Brasil e uma profunda mudança da ordem jurídica,
eis que, a partir dela, os princípios constitucionais passaram a incidir
19

nas relações privadas, visando garantir a efetividade do texto


constitucional. Neste sentido,

A Co ns ti t uiç ã o F e der a l d e 1 98 8 f inc o u no Br as i l um Es t ad o


Dem oc r á t ic o d e D ir e it o , b us c an d o um e qu i l íb r i o en tre o
i nd i v íd u o e o s oc i al . O c a pu t do ar t ig o 1º é ex pr es s o em
c l as s if ic a r a r e pú b l ic a bras i l e ira c om o Es ta do D em oc rát ic o d e
Dir e it o . ( F O N S E CA , 2 00 7 , p. 1 3 5).

Sobre o Estado Democrático de Direito, ensina José Afonso da


Silva:

É um ti p o d e Es t a d o qu e t en d e a r e al i za r a s ín t es e d o
pr oc es s o c o nt ra d it ór i o do m un do c o nt em por ân e o, s up er a nd o o
Es t a do c ap i ta l is t a p a ra c o nf i gur ar um Es t ad o pr om oto r de
j us t iç a s oc i a l q ue o pers o n al is m o e o m on is m o po l ít ic o d as
dem oc r ac i as po p ul ar e s s ob o i nf l ux o d o s oc ia l is m o re al n ão
f or am c a pa ze s d e c o n s tru ir . ( S IL V A , 2 00 6, p . 12 0) .

A Constituição demonstra, com uma clareza s olar, sua


preocupação com o bem -estar social e, ao mesmo tempo, com a
iniciativa privada. Ela privilegia a livre iniciativa e a liberdade de
concorrência, ao mesmo tempo em que protege a valorização do
trabalho humano, para fins de assegurar a todos existência digna,
segundo os ditames da justiça social (Art. 170 da Constituição da
República de 1988), conforme se extrai das seguintes ponderações:

Es pec if ic am en te em n os s o or d e nam en to , o i nt er es s e s oc i a l na
m oder na em pres a pr i v ad a , d en tr o d e um a ord em ec o nôm ic a
f un da d a n a l i be rd a de de in ic i at i v a (ar t. 17 0 d a C ons t it u iç ã o
Fe der a l d e 1 9 8 8, c a pu t), vem s e t orn a nd o c ad a v e z m ais
pr em e nt e, em es p ec ia l em c on t ex t o on d e a pr es e nç a d o Es t a d o
c om o a g en t e ec o n ôm ic o es t á d im in u i nd o, a o m es m o t em po em
qu e aum en t a a pre oc u paç ã o c om a re a l i zaç ão d os d it am es d a
20

j us t iç a s oc i a l ( ar t. 1 70 d a C ons t it u iç ã o Fe der a l d e 19 8 8,
c ap u t) . ( PI M ENT A , 2 0 04 , p . 30) .

Conforme os ditames do Estado Democrático de Direito, todos


devem se preocupar em desenvolver o bem comum ao praticar seus
atos em sociedade, resultando em necessário envolvimento harmonioso
dos sujeitos de direito. A sociedade atual possui estrutura que se
desenvolve diariamente, sendo, por isso, extremamente mutável. Não
há que se falar mais em um padrão específico e único, mas sim em
padrões revisáveis, que se adequam a diferentes situações.

O Estado atual é estruturado de uma forma em que cada sujeito


de direitos seja livre. Essa liberdade pode ser interior e exterior. A
primeira é tida como liberdade individual e é garantida pelas
organizações sociais. Já a exterior é garantida pelas leis.

Para favorecer os interesses do Estado, demonstrados de


forma evidente na Constituição da República de 1988, é comum na
atualidade o apoio do Estado com entidades, visando o
desenvolvimento sustentável. Isso porque para que o desenvolvimento
econômico signifique bem -estar coletivo, deve ocorrer,
simultaneamente, desenvolvimento s ocial.

Pode-se dizer que as sociedades empresárias mantêm seus


lucros também sob o enfoque de um desenvolvimento sustentável, eis
que visam reduzir suas externalidades negativas e sempre revigorar o
mercado. Há uma preocupação, ao mesmo tempo, com a lucr atividade e
o bem comum.

Dessa forma, resta claro que a atividade mercantil se


desenvolve em um círculo construtivo, no qual a preocupação com o
bem-estar social está intimamente ligada à continuidade ( ad aeternum)
dos lucros resultantes da empresa. Diss ertando sobre o tema, Suzana
Sarmiento professa:
21

O em pr es ár io d e ve b u s c ar o pr o gram a de d en tr o p ar a f or a e ,
as s im , tr ans f o rm ar a s oc i ed a d e a s u a v o lt a. Q ua nt o a o
Es t a do , es t am os u ni d os n a pro p os t a de b e m - es tar p ar a t o da a
po p u laç ã o e es t ar at rá s dos ar ra n j os pr od ut i v os e d as c a d e ias
pr o d ut i v as . As s im os e m pree nd im en tos d e ve m s er aqu e l es q u e
c ap ac it am e a p erf e iç o am a s oc ie d ad e . ( S AR MI E NT O , 20 0 5)

Caso o empresário atue sem se preocupar com o bem -estar


social, aumentará o custo social consequente de sua ativ idade no
mercado e, com o tempo, poderá refletir em redução dos lucros.
Quando, por exemplo, o empresário tenta proteger suas riquezas e
deixa de investir em capital produtivo, colabora para o desemprego.
Essa situação somente prejudica a economia e, conse quentemente, as
sociedades empresárias, eis que desempregados consomem menos e
fazem com que uma quantidade inferior de dinheiro circule no mercado.

Sobre o interesse social da atividade empresarial, declara


Raquel Sztajn: “interesse social é uma das raz ões que justificam a
promoção das trocas eficientes porque isto aumenta o bem -estar das
pessoas” (SZTAJN, 2004, p. 43).

Seguindo o mesmo raciocínio, quanto menor a exclusão social


e maior for o desenvolvimento econômico da sociedade em que um
empresário atuar, com certeza, maior será seu lucro. Isso decorre do
aumento do mercado consumidor, que é intimamente ligado à redução
da pobreza e soluções de políticas sociais. A manutenção de um
desenvolvimento equilibrado e sustentado é uma questão permanente
no dia a dia do empresário.

Nesse sentido, Vu Minh Giang ensina que para a melhoria de


um ambiente para investimentos é necessária a combinação de
crescimento econômico com soluções de políticas sociais e redução da
pobreza. Sendo assim,

O d es e n v o l v im ent o e c o n ôm ic o d ep e nd e d a es t ab i l i da d e
po l ít ic a e s oc i a l. P ort a nt o, é nec es s ár io f o rt a lec er os
22

m ec an is m os es tru t ura i s em d if er en tes n í v eis e l e v ar em c on ta


a v i da da p o pu l aç ão p obr e . (G I ANG , 2 00 3 , p . 13 1)

O foco do direito empresarial atual é o mercado e sua


organização, eis que nada adianta produzir se não existir ninguém para
comprar. Ronald Coase conceitua mercado como “a instituição que
existe para facilitar a troca de bens e serviços, isto é, existe para que
se reduzam os custos de se efetivarem operaçõe s de trocas” (COASE,
1988, p. 7).

O mercado envolve os empresários, os bens, serviços, a família,


e, ainda, é necessário para a organização econômica da sociedade.
Dessa forma, é fundamental para a economia, tendo, de forma clara,
uma relevante função soc ial.

Portanto, o direito empresarial no Estado Democrático de Direito


está intimamente ligado a um modelo de política econômica que busca
tornar compatíveis o crescimento econômico sustentável, a estabilidade
financeira e o desenvolvimento social.

2.4 Análise das consequências públicas do Direito Privado

O direito privado, no contexto do Estado Democrático de Direito,


se preocupa com as consequências públicas das ações privadas. Dessa
forma, “o Direito Privado deve ter em conta algumas perspectivas
públicas, pois têm -se diminuído as distâncias com o Direito Público”
(LORENZETTI, 1998, p. 225).

Falar de direito privado, sem mencionar suas consequências


públicas, é extremamente difícil, para não dizer impossível. Conforme
acentua Pietro Perlingieri:
23

A pr ó pr ia dis t inç ã o e ntr e d ir e it o pr i v ad o e pú bl ic o es tá em


c r is e. Es t a dis t inç ã o, q ue j á ós R om an os ti n ham d if ic u l da d e
em def i n ir , s e s u bs ta nc ia or a n a n a tur e za pú b l ic a d o s uj e it o
ti t ul ar dos i nt er es s es , ora n a n a tur e za p ú b l ic a e pr i va d a d os
i nt er es s es . Se , por ém , em um a s oc i ed a de on d e é pr ec is a a
d is t i nç ã o en tr e l i b erd a de d o p ar tic u l ar e a ut or id a de d o Es t ad o ,
é pos s í ve l d is ti n gu ir a es f er a d o i nt er es s e dos p art ic u l ares
da q ue l a do i n ter es s e p úb l ic o, em um a s oc ie d ad e c om o a
at u al , t or na - s e d if íc il in d i v i du ar um int er e s s e p ar tic u l ar q u e
s ej a c om pl et am ent e aut ô n om o, i nd e pe n de n te , is o la d o d o
i nt er es s e d i to pú b l ic o . (P E R LI NG I E RI , 2 00 7, p . 5 3)

Então, para buscar soluções de problemas privados, bem como


proteger a pessoa, bens públicos e o mercado, é necessário pos suir
uma perspectiva pública para as ações privadas. Sendo assim, pode -se
afirmar que “o individualismo à deriva necessita de âncoras, de pontos
fixos onde atar -se; do contrário o Direito e o indivíduo serão arrasados
pelos fortes ventos das forças do merc ado” (LORENZETTI, 1998, p.
221).

Ademais, se fosse para privilegiar o individualismo, como se


cada pessoa fosse possuidora de um castelo inexpugnável, o direito
privado deveria ser cham ado de direito dos particulares, nome que não
se harmoniza com os ditames constitucionais.

Sobre a interligação entre o público e o privado, pode -se


pronunciar que se trata de uma via de mão dupla, onde o público
privatiza -se e o privado torna -se público. Esta idéia é demonstrada com
clareza por Ricardo Luis Lorenzetti, conf orme suas ponderações,
segundo as quais:

Na ár ea d o D ir e it o P úb l ic o, têm - s e pro d u zi d o pr i va t i zaç õ es


qu e pr o voc ar am um tras l ad o d e um a de s uas ár e as m ais
im por ta nt es a o D ir e it o Pr i v ad o; a m ud a nç a é tã o prof un d a q u e
o D ir e it o A dm in is tra ti v o tem s i d o le v a d o à s ua m ín im a
ex pr es s ã o. M as a o D ir e it o Pr i v ad o l h e r es u lt a d if íc il ex p l ic ar a
i dé i a d e um s er v iç o pú b l ic o f orç os o e de ut i l i zar s u as
f er r am en tas tr a d ic i o n a is par a d ef e n der o s c o ns um id ores . De
24

ou tr a p ar te , tem as tí p ic os d o D ir e it o P ri v ad o, c om o os
f am ili a r es e os d a p es s oa s e t or n am pú b l ic o s . N ã o é p os s í v e l
r es o l v er c as os v inc u l ad os à ge n ét ic a, s em c ons i der aç ões
pú b l ic as , ou tem as c on tr at ua is , s em um a a va l i aç ão d a
ec o n om ia . ( LO R E NZ E TT I, 19 9 8, p . 2 27) .

No mesmo sentido, as palavras de Caio Mário da Silva P ereira:

Co ns t i tu i o d ire i to um a u n id a de c onc e it u al no p la n o f il os óf ic o,
um a un i d ad e or g â ni c a n o p l a no c i en tíf i c o, um a un i da d e
te l eo l ó gic a n o p l an o s oc i a l. N ão o bs ta nt e a u n i da d e
f un dam en t al , os pr in c íp i os j u rí d ic os s e a gru p am em duas
c at e gor i as , c ons t it u i n do a pr im eir a o d ir e it o p úb l ic o e a
s eg u nd a o d ir e it o pr i v ad o . N ão h á c o g it ar , p or ém , de do is
c om par t im en t os h erm ét ic os , i nc om un ic á v e i s , es t ab e lec e nd o
um a s ep ar aç ã o t ot a l e a bs o l ut a d as norm as p úb l ic as e das
nor m as pr i v a da s . A o r e vés , in te rc om un ic am - s e c om f req üê nc i a
c ons t an te , tã o as s í d u a qu e m ui t as ve ze s s e enc o ntr am regr as
at i ne n tes a o di re i to p úb l ic o nos c om pl ex os l eg a is de d ir e it o
pr i va d o, e , vic e - v ers a, di p lom as d e n at ur e za pri v a da en v o l vem
i ne q ui v oc am ent e prec e it os j us pú b l ic os . A i n ter p en et raç ã o d os
c onc e it os nã o perm i t e o tr aç a d o d e um a l in h a l i n de ir a de
ex tr em a n it i d e z e n tre um as e ou tr as d is p os i ç ões . E, s e é c ert o
qu e n or m as ex is t em qu e s e i de n tif ic am c om o ius pu b l ic um
pur am en te , e ou tr as qu e f orm am ius pr iv at um , pr ec is am en te ,
um a zon a de i nt erf er ênc i a r ec í proc a s e d e li n e ia , em qu e é
d if íc i l c a r ac ter i za r c o m j us te za a s u a n at ure za pr i v a da ou
pú b l ic a . ( P E R EI R A, 2 0 09 , p . 11) .

Diante disso, pode -se assegurar que “a falta de perspectiva


pública na solução dos problemas provoca um Direito Privado invál ido”
(LORENZETTI, 1998, p. 228). Portanto, as instituições de Direito
Privado e as ações privadas devem ser referenciadas publicamente,
através de uma análise de suas consequências públicas.
25

2.5 Publicização do Direito Privado

Faz-se necessária bre ve consideração acerca da publicização


do direito privado, para que seu conceito não seja confundido com o de
constitucionalização.

O Estado Social do século XX foi marcado por uma excessiva


intervenção estatal na autonomia privada. A considerável limitaçã o
dessa autonomia, principalmente através do âmbito legislativo, é
perceptível, com heranças deixadas para a atualidade.

Essa intervenção culminou na retirada do Código Civil de várias


matérias, algumas transformadas, até mesmo, em micro sistemas,
como, por exemplo, o direito do trabalho, o direito do consumidor, o
estatuto da criança e do adolescente, o direito autoral, a locação de
imóveis e o direito ambiental.

Importante mencionar que a publicização do direito civil, com a


subtração das matérias suprac itadas, não modifica a natureza
originária de relação jurídica privada das mesmas. Neste sentido:

In d ep e nd e nt em ent e d o gr au de i nt er v enç ão es t at a l, s e o
ex er c íc io d o d ir ei t o s e dá p or par t ic ul ar em f ac e d e o utr o
par t ic u l ar , ou q u an d o o Es ta d o s e r e lac i o na p ar it ar i am ent e
c om o p ar t ic u lar s em s e va l er d e s e u im pér i o, e nt ã o o d ir e it o é
pr i va d o. ( L Ô BO , 2 0 03 , p . 2 00) .

Acerca da publicização, afirma Caio Mário da Silva Pereira:

A inf lu ê nc i a abs or v e nt e d o Es t a do e a n ec es s i d ad e d e s e
i ns t it u ír em , c om m ais s eg ur anç a e am pl i tu de , f órm ul as c a d a
v e z m ais d ir i g id as no s en t id o de r e al i za r a f i na l i da d e pr ec í p u a
do d ir ei t o q u e s e p os i ti v a e s e af irm a n o pr op ós it o de g ara n ti r
26

e pr o t eg er o b em - es ta r d o in d i ví d u o in c o nc ret o , c o g it a nd o d a
nor m aç ão s oc ia l em at e nç ã o ao b e m do hom em , ger am a
te n dê nc ia à p u b lic i za ç ão d a n orm a j ur íd ic a. Em c ons e qü ê nc ia
des t e m ov im ent o a c en t ua - s e a r es t riç ão da l i ber d ad e
i nd i v i du a l, tom an d o c orp o a es ta t i zaç ão d e n um eros os
s er v iç os e i nt er v i nd o o Es ta d o em m atéri a s qu e a nt es e ram
r e le g ad as ex c lus i v am en t e a o ar bí tr io d e c a da um . ( P ER EI R A,
20 0 9, p . 1 4).

Resumidamente, sobre a definição de publicização, declara


Paulo Luiz Netto Lôbo:

Em s um a, par a f a z er s e nt i d o, a p u bl ic i za ç ã o d e v e s er
en t en d id a c om o o pr oc es s o d e in t er v enç ã o l eg is l at i v a
i nf r ac o ns t it uc io n al , a o pas s o q ue a c ons t it uc io n al i za ç ão t em
por f it o s u bm et er o di re i to p os i t i vo a os f und am en tos d e
v a li d ad e c ons t it uc io na lm en t e es t a b el ec i dos . En q ua nt o o
pr im eir o f e nôm en o é de d is c ut í ve l p ert i nê n c i a, o s eg u nd o é
im pr es c i nd í ve l par a a c om pree ns ão d o m oder n o d ir e it o c i v i l.
( LÔ BO , 20 0 3, p . 2 00) .

Então, não se pode confundir publicização com


constitucionalização do direito privado.

2.6 Constitucionalização do Direito Privado

Após o surgimento do Estado Democrático de Direito, todos os


ramos do direito estão ligados à constituição. Até mesmo o direito
privado que, desde suas origens, se mantinha distante do direito
constitucional, hoje está intimamente unido.
27

O direito privado, atualmente, deve ser lido a partir da


Constituição, sendo certo q ue essa leitura torna -se condição para
validade dos atos privados. Neste sentido:

S e a Co ns t i tu iç ã o n ã o é o c en tr o d o s is t em a j us c i v i lís tic o , é ,
s em s om bra d e d ú v i da , o c e n tro do ord en am en to j u rí d ic o ,
c om o um tod o. É , p ort an t o, a p art ir de l a, d a Co ns t i tu i ç ão , q u e
s e d e v em ler t od as as n orm as inf r ac o ns t i tuc i on a is . (FI UZ A,
20 0 7, p . 1 20 ).

A Constituição, em seu artigo 1º, lista, como fundamentos do


Estado Democrático de Direito, a soberania, a cidadania, a dignidade
da pessoa humana, o pluralismo político e os valores sociais do
trabalho e da livre iniciativa.

No artigo 3º, cita como objetivos fundamentais da República


Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre, justa e
solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da
pobreza e a marginalização, redução das desigualdades e, ainda, a
promoção do bem de todos.

Os demais dispositivos constitucionais, bem como as leis, se


subordinam aos fundamentos, objetivos e princípios constitucionais. É
o que se extrai das ponderações de Rodr igo Garcia da Fonseca,
segundo as quais:

T odo o r es t an te d a C o ns t i tu iç ão , e to d a a l e g is l aç ão o rd i ná ri a ,
f ic am c on d ic i on a das p or es t es pr i nc í p ios e o bj e t i vos
f un dam en t ais do p a ís . D e v em s er e l es a b as e , o u os óc u los
atr a v és d os q u ais a Co ns t i tu iç ã o e t o da a le g is laç ã o h ão d e
s er v is t as . E l es s ão a s í nt es e ou m atr i z d as d em ais n orm as
c ons t it uc io n a is , qu e no f un d o s ã o m eros des d ob ram en tos
s eus . ( FO N S E C A, 2 0 0 7, p . 1 39) .

No mesmo sentido, ensina César Fiuza:


28

P or c o ns ti t uc i o n al i za ç ão d o D ir e it o Ci v i l d e v e - s e e nt e nd er q ue
as n or m as de D ire i t o C i v i l têm qu e s er li d as à l u z d os
pr inc íp i os e va l or es c ons a gr ad os na C ons t i tu iç ão . A bem da
v er d a d e, n ão s ó as norm as d o or de n am ent o j urí d ic o, s ej am
e las d e D ir e it o Pr i v ad o, s ej am de D ir e it o P úb l ic o. Es t e é um
d it am e d o c h am ado E s ta d o D em oc rá t ic o d e D ir ei t o, q u e t em
na C o ns t i tu iç ã o s ua b as e herm e nê ut ic a, o q ue eq u i v al e a di ze r
qu e a i nt er pre t aç ã o d e qu a lq u er n orm a d e v erá b us c ar ad e qu á -
l a a os pr i nc í p ios e va l ores c o ns t it uc i on a is , u m a ve z q u e es s es
m esm os pri nc í p i os e v a lor e s f or am ele i tos por to d os n ós , p or
m eio d e n os s os re pr e s en t an tes , c om o p i l ar es d a s oc i ed a de e,
c ons e qu e nt em en te , d o D ir ei t o. (FI UZ A , 20 0 7 , p. 1 1 9).

A visão social das relações privadas impõe nova atitude do


poder público. Agora, o Estado é garantidor do e quilíbrio na ordem
privada e, por isso, mesmo alguns institutos básicos do direito privado
devem ser disciplinados pela Constituição, que age como instrumento
delimitador e regulador das funções do Estado. Por isso, situações que
antes apenas eram regulada s pelo Direito Privado, passam a ter
previsão Constitucional, como, por exemplo, contrato, propriedade,
família e a empresa.

A constitucionalização do direito privado elimina limites entre


uma norma pública e outra privada. E, por isso, para buscar uma
solução jurídica, não basta vislumbrar os dispositivos legais
concernentes ao caso. Deve ser feita uma aplicação simultânea, das
leis e dos códigos com as normas fundamentais, eis que nosso
ordenamento jurídico é unitário. Esclarece Pietro Perlingieri:

A q u es t ã o d a ap l ic ab i l id a de s im ul t ân e a d e l e is i ns pi ra d as em
v a lor es d i v ers os ( o Có d ig o C i v i l it a l ia n o, l em bre - s e, é de
19 4 2: per te nc i a, p o rta nt o , a o or de n am en t o f as c is ta ; a
Co ns t i tu iç ã o, a o c o n tr ár io , en tr ou em v i gor em 19 48) res o l v e -
s e s om e nt e t e nd o c on s c i ên c i a de q ue o or d en am en to j ur íd ic o
é u n it ár io . A s o l uç ã o par a c a d a c o ntr o v ér s i a n ão po d e m ais
s er e nc o n tra d a l e v an d o em c ont a s im p les m e nt e o a rt i go d e le i
qu e pa r ec e c on tê - l a e res o l v ê - l a, m as , an t e s , à l u z d o i nt e iro
or d e n am ent o j urí d ic o , e, em p ar tic u l ar, d e s eus pr i nc í p i os
29

f un dam en t ais , c o ns i d era d os c om o o pç õ es de bas e q u e o


c ar ac t er i zam . ( P ER L I NG I E RI , 20 0 7, p . 5) .

A respeito do sistema jurídico atual, conforme entende Lúcio


Antônio Chamon Júnior, pode -se dizer que “o Direito não é um sistema
de normas convencionadas e sim um sistema de princípios” (CHAMON
JUNIOR, 2008, p.230).

Importante ressaltar que a constitucionalização do direito


privado não significa a exclusão do Código Civil como centro do direito
privado, eis que é a partir desse código que s ão buscadas as diretrizes
gerais do direito comum. Nos dizeres de César Fiuza, “não se pode
furtar ao Código Civil o trono central do sistema de Direito Privado.
Seria incorreto e equivocado ver neste papel a Constituição” (FIUZA,
2007, p. 120).

Ademais, gravitam em volta do Código Civil os microssistemas


do direito privado, como, por exemplo, o código do consumidor, o
estatuto da criança e do adolescente, a lei do meio ambiente, lei de
locação, dentre outras. Neste sentido, César Fiuza leciona:

Fa la r em c ons t it uc i on a li za ç ão do Di re i to Ci v i l n ã o s i g nif ic a
r et ir ar d o C ó d ig o C i v i l a im por tâ nc i a q ue m erec e c om o c en tro
do s is t em a, p a pe l es t e q ue c on t in u a a ex e rc er. É n o C ód i g o
Ci v i l q ue ir em os b us c ar as d ir etr i ze s m ais ge ra is do D ir e it o
Com um . É em tor n o d e l e q u e gra v i ta m os c ham ad os
m ic r os s is tem as , c om o o im ob i l iár i o, o da c r ia nç a e d o
ad o l es c e nt e , o d o c o n s um id or e o utr os . (F IU ZA , 2 00 7, p. 1 1 9).

Para concluir a idéia de constitucionalização do direito privado,


fundamental transcrever os seguintes dizeres de C aio Mário da Silva
Pereira, verbis:
30

Na her m en ê ut ic a d o no v o C ó d ig o C i v i l d e s tac am - s e hoj e os


pr inc íp i os c ons t it uc io n a is e os d ir e it os f u nd a m enta is , os qu a is
s e im põ em às rel aç õ es in ter pr i v ad as , aos i n ter es s es
par t ic u l ar es , d e m odo a f a ze r pre v a l ec e r um a v erd a de ir a
“ c ons t it uc i on a l i zaç ã o” do D ir e it o Pr i v a do . Ca b e, p or ta nt o , a o
i nt ér p r e te e v i d enc i ar a s u bor d i naç ã o da n orm a d e d ire i to
pos i t i vo a um c onj un to de d is p os iç ões c o m m aior gr a u d e
ge n er al i za ç ão , is t o é , a pr i nc íp i os e v a l or es d os qu a is nã o
po d e ou n ã o d e ve m a is s er d is s oc ia d a. ( P ER E IR A , 2 0 0 9, p.
18- 1 9) .

Dessa forma, após o surgimento do Estado Democrático de


Direito, o direito privado está intimamente ligado à constituição. Com
isso, os princípios e valores constitucionais são condições
indispensáveis a serem observadas para a validade dos atos privados.
E, em decorrência da constitucionalização do direito privado,
atualmente é comum observar conteúdos sociais e funcionalização em
atos e institutos privados.
31

3 PRINCÍPIOS INERENTES À ATI VIDADE EMPRES ARIAL NA ORDEM


ECONÔMICA E SOCI AL CONFORME A CONSTITUIÇÃO DE 1988

A Constituição de 1988 prevê vários princípios. Esses


fundamentos, que servem de base para todo o sistema jurídico, são
como um alicerce das normas jurídicas. São preceitos qu e permitem
uma ação ou exigem uma determinada conduta. E, ainda, conforme
entende Paulo Luiz Netto Lôbo, “a doutrina passou a entender que os
princípios constitucionais são auto -executáveis.” (LÔBO, 2003, p. 207).

Sobre a palavra princípio, pode -se afirmar que:

A p a l a vr a “ pr inc í pi o” po d e t er m uit os us os . T em um a f unç ão


e voc a ti v a d os v a lor es f un da n tes d e um ord en am en to j ur íd ic o,
tam bém a lu d e ao i n íc i o d e a lg o , às n oç õe s b ás ic as d e um a
c i ênc i a ( pr i nc í p ios de é tic a o u d e m atem át ic a), às
c ar ac t er ís t ic as es s e n c i ais d e um ord e n am en to q u e r epr es en t a
s eu “ es p ír i t o”. N a j ur i s pru d ê nc i a o pr inc í pi o é c onc e b id o c om o
um a r e gr a g er a l e abs tr at a qu e s e ob t ém in du t i v am ent e,
ex tr a in d o o es s enc i a l de norm as p ar t ic u l ar es , ou c om o um a
r eg r a ge r a l pre ex is t e nt e. P ar a a l gu ns s ão norm as j ur íd ic as ,
par a ou tr os re gr as d e pe ns am ent o, p ara a lg uns s ã o i nt er i or es
ao or d e nam en t o, e n qu a nt o p ara o u tros s ão a n ter i or es ou
s up er i or es ao s is t em a l eg a l. (L O R E NZ ET T I, 19 9 8, p . 3 12 ).

Eros Roberto Grau ressalta a importância dos princípios:

É q u e c a d a d ir ei t o n ã o é m ero agr e ga d o d e norm as , por ém um


c onj u nt o d o ta d o d e un i da d e e c o erê nc i a – u n id a de e c oer ê nc ia
qu e r ep o us am pr ec is am ent e s obr e os s e us (d e l e = d e um
de t er m in ad o d ir ei t o) pr inc íp i os . D a í a ênf as e q u e im prim i à
af ir m aç ã o d e qu e s ão norm as j ur í dic as os pr i nc í p ios , e l em ent os
i nt er n os a o s is tem a; i s to é , es t ã o n e le in te gra d os e i ns er id os .
P or is s o a i nt er pr et aç ão d a Co ns t i tu iç ã o é dom i na d a pe l a f orç a
dos pr i nc íp i os . (G R AU , 20 0 8, p . 1 65) .

De acordo com José Afonso da Silva, “princípio exprime a noção


de mandamento nuclear de um sistema” (SILVA, 2007, p. 91). E, ainda,
para esse autor,
32

O s pr i nc íp i os s ã o or d en aç ões qu e s e irr ad i am e im ant am os


s is t em as d e n orm as , s ão (c om o obs er v am G om es C an o ti l h o e
V it a l M or e ir a) n úc le o s de c o nd e ns aç õ es n os q u a is c o nf l u em
v a lor es e be ns c o n s ti t uc i o na is . Mas , c om o d is s eram os
m esm os au to res , os p ri nc í p ios , qu e c om eç a m por s er a b as e
de n or m as j urí d ic as , p od em es t ar p os it i v am en t e i nc orp or a dos ,
tr a ns f or m an d o - s e em norm as - pr i nc í p io e c ons t it u in d o
pr ec e it os b ás ic os d a or ga n i zaç ã o c o ns t it uc i on a l. ( SI L V A,
20 0 7, p . 9 2).

Ricardo Luis Lorenzetti entende que não há diferença entre


princípios e regras: “é importante esclarecer que tanto os princípios
como as regras se referem ao âmbito do dever -ser e, portanto, são
normas.” (LORENZETTI, 1998, p. 286). No mesmo sentido, a respeito
da relação entre princípios e regras, Taísa Maria Macena de Lima
observa:

Hoj e, pr e va l ec e a c o nc e pç ão f o rt e d os pr i nc í p ios j urí d ic os ,


des a pa r ec e nd o a pre c ed ê nc ia hi er ár qu ic a das r eg ras s obr e
e les , e os j ur is t as s e v o lt am para a c o ns tr u ç ão de um a te or i a
j ur í d ic a n a q ua l os pr i nc í p ios as s um em rel e v ânc i a i ne q uí v oc a.
( LI M A, 20 0 3, p . 2 42) .

Do exposto, é vedada a interpretação isolada ou excludente de


algum princípio, eis que o sistema jurídico brasile iro exige a busca pelo
sentido harmônico de todas as normas, conforme registra Paulo Luiz
Netto Lôbo: “Veda -se a interpretação isolada de cada regra, ou a
hegemonia de uma sobre a outra, devendo -se encontrar o sentido
harmônico de ambas, pois têm igual dig nidade constitucional.” (LÔBO,
2003, p. 211).

O artigo 170, caput, da Constituição da República, ao iniciar o


capítulo I do Título VII, que trata sobre os princípios gerais da
atividade econômica, determina as finalidades da ordem econômica:

Ar t . 1 7 0. A ord em ec o n ôm ic a , f un da d a na v al or aç ão d o
tr a b al h o h um an o e na l i vre i n ic i a ti v a , tem po r f im as s egur ar a
33

to d os ex is t ê nc i a d i g na , c onf orm e os d it am es da j us tiç a s oc i a l,


obs er v a dos os s eg u in t es pr inc í p ios : ( .. .).

Dessa forma, pode -se afirmar que, na Constitu ição de 1988, há


uma junção entre os interesses capitalistas (valorização da livre
iniciativa) e interesses sociais (valorização do trabalho e garantia de
existência digna).

No Estado Democrático, o exercício da livre iniciativa está


diretamente ligado à garantia que será proporcionada à valorização do
trabalho e a busca pela efetividade da existência digna ao ser humano.
Dessa forma, a liberdade econômica, conforme os fundamentos
constitucionais, não é absoluta.

No mesmo sentido, verbi gratia , a Constituição assegura o


direito de propriedade, desde que ela cumpra a sua função social.
Então, o Estado, ao mesmo tempo em que dá liberdade e garantias ao
ente particular - para usar, como bem entender, sua propriedade -
impõe limites, podendo interferir na e sfera individual caso o indivíduo
atue em prejuízo da coletividade.

Sendo assim, resta claro que o direito à propriedade sucumbe


frente ao direito à existência digna e que a Constituição de 1988 coloca
a busca do bem comum como uma responsabilidade coletiv a.

Ressalte-se que os princípios jurídicos são auto -aplicáveis e


não admitem exceções à sua execução, eis que não podem ser
previamente elencados todos os casos em que serão cabíveis suas
aplicações. Sobre a inadmissibilidade de normas e condutas
incompatíveis com o artigo 170 da Constituição da República, explana
Eros Roberto Grau:

A am p li t ud e d os pr ec e i tos c ons t it uc i on a is a br an g e n ão
ap e nas n orm as j ur í dic as , m as tam bém c o nd ut as . D aí p or qu e
des ej o af irm ar, v i g or os am en t e, s er em c o ns t i tuc i on a lm en te
i na dm is s í v e is n ão s o m ente norm as c om el e i nc om p at í ve is ,
m as ai nd a q ua is qu er c on d ut as ad v ers as ao d is p os t o n o ar t.
17 0 d a C ons t it u iç ã o . ( G R AU , 20 0 8, p . 1 9 6).
34

Nesse sentido, as observações de Ana Frazão de Azevedo


Lopes:

O s pr i nc íp i os c o ns t i tu c i on a is , na v erd a de , s ão de o nt o ló g ic os
e ob r i g at ór i os , f orm an d o um s is t em a c ons t it uc io n a l qu e
pr ec is a s er c o er en te . D aí a im po rt ânc i a da c om pr ee ns ão
par a d igm át ic a do Es t ad o d em oc rát ic o d e d ire i to , po is , ao
pos s i b i li t ar a i nt er pr et aç ã o dos pr i nc í p ios c ons t it uc io n a is a
par t ir d e um f un da m ento c om um , f ac il i ta a a p lic aç ã o
ad e qu a da d e c a da um del es , d e f orm a a s e m ant er a
i nt egr i d ad e do s is tem a c om o um to d o. ( L O P E S, 2 00 6 , p .
22 4) .

Posto isso, para a Constituição da República, um siste ma


econômico equilibrado - e válido - deve ter coerência entre os
interesses econômicos, jurídicos e sociais. Tudo isso para promover um
desenvolvimento harmonioso e eficaz da coletividade, com coerência
às exigências de um Estado Democrático de Direito, especialmente
visando efetivar a dignidade da pe ssoa humana.

3.1 Princípio da dignidade da pessoa humana

A palavra dignidade vem do latim dignitate e significa


“respeitabilidade; autoridade moral” (BUENO, 1996, p. 213). Sobre a
dignidade da pessoa humana, registra Nicola Abbagnano:

O q ue t em preç o p od e s er s u bs t i tu íd o p or a l gum a ou tr a c ois a


eq u iv al e nt e , o q ue é s up er ior a qu a l qu er preç o , e p or is s o
nã o p er m it e ne n h um a e q ui v a l ênc i a, t em di g ni d a de .
S ubs ta nc i a lm ent e, a d i gn i da d e d e um s er ra c i on a l c o ns is t e no
f ato d e e l e nã o ob e d e c er a n e nh um a l e i qu e nã o s ej a t am bém
i ns t it u íd a p or e le m es m o. A m ora l id a de , c o m o c on d iç ã o d es s a
au t on om ia le g is la t i va , é, p ort an t o, a c on d i ç ão da d i g ni d a de
35

do hom em , e m oral id a de e h um an id a de s ão as ún ic as c o is as
qu e n ã o têm pr eç o. ( A B B AG N A NO , 19 9 8, p . 27 6 /2 7 7).

Quanto ao princípio da dignidade da pessoa humana, além de


ser um dos fundamentos da organização de um Estado Democrático de
Direito, pode ser considerado um princípio do qual emanam os outros
direitos fundamentais, individuais e coletivos. Neste sentido:

O pr inc íp i o da d i gn i d ad e d a pes s o a hum an a , c om o


f un dam en t o da Re p ú b lic a F ed er at i v a d o Br as il , c om o ra i z
f un da nt e dos d em ai s d ire i tos f un d am ent a is , pos s u i es s a
pr ec í pu a f unç ã o he rm en ê ut ic a n o s is t em a j urí d ic o , o u s ej a ,
c onf er e as ba l i za s n ort e ad or as ta n to da at i v i da d e
i nt er p r e ta t i va d as n orm as j urí d ic as , qu an t o d a pró pr i a
at i v i da d e le g if er a nt e i nf rac o ns t it uc io n al e m esm o d o po d er
c ons t it u in t e r ef orm ad o r. ( L A MO U NI E R, 2 0 09 , p . 1 45) .

No mesmo sentido, assevera Luiz Antônio Ramalho Zanoti:

As s im , o pos t u la d o d a d ig n i da d e da p es s oa hum an a é um dos


f un dam en t os d a o rg a n i zaç ã o n ac io n a l, te n do p as s a d o a s e
c ons t it u ir n o v ér tic e p ara o q ua l c o n v er gem tod os os d ire i tos
i nd i v i du a is ( d a p es s o a hum an a) e c o l et i v o s (d os s in d ic at os ,
das as s oc i aç õ es , das en t id a des d e c l as s e , d en tr e o ut ras ) ,
pr oc l am ad os n as c ons t it u iç õ es dem oc r át ic as de um a
s oc ie d ad e c a d a v e z m a is p lur a l is t a. (Z A NO T I, 2 0 09 , p. 12 2).

Para Eros Roberto Grau, a dignidade da pessoa humana é


fundamento da República Federativa do Brasil e, ainda, é uma diretriz
para as atividades econômicas:

A d ig n i da d e d a p e s s oa h u ma n a é ad ot a da p e lo t ex t o
c ons t it uc io n a l c o nc o m itan t em ent e c om o fu n da m en t o d a
Re p úb l ic a F ed er at i v a d o Bras i l ( ar t. 1 º, II I) e c om o f i m d a
or d em ec o nôm ic a (m und o d o s er) ( art . 1 70 , c ap ut – “ a or de m
ec o n ôm ic a .. . te m p or fi m as s e gur ar a to d os ex is t ênc i a
d ig n a ”) . Em bor a as s u m a c onc r eç ã o c om o d ir ei t o i n d i v id u al , a
d ig n id a de da pes s o a hum an a , e nq u an t o pr i nc í p io , c o ns t i tu i ,
ao l a do d o d ir e it o à v i da , o n úc le o es s e nc ia l dos d ir e it os
hum an os . (G R AU , 2 00 8, p . 1 96) .
36

Em obediência a esse princípio, a atividade empresarial, diante


da ordem econômica e social - conforme a Constituição de 1988 -
deve conferir a cada pessoa uma respeitabilidade, um direito a um
respeito inerente à qualidade de ser humano. E, por consequênc ia,
deve buscar colocar o homem em condições idôneas para exercer suas
aptidões pessoais, assumindo posição relevante dentro da ordem
econômica e social.

Dessa forma, seres humanos não podem ser tratados como


objetos, como se pudesses ser trocados. São su jeitos de direito e estão
no centro do ordenamento jurídico. Ademais, o princípio da dignidade
da pessoa humana deve ser observado tanto pelo direito público,
quanto pelo direito privado. Sobre esse aspecto, esclarece Eros
Roberto Grau:

A d ig n id a d e d a pes s o a h u m an a as s um e a m ais pr o nu nc ia d a
r e le v â nc ia , v is t o c om prom et er t od o o ex er c íc i o d a at i v id a d e
ec o n ôm ic a , em s en ti d o am p lo – e em es p ec i al , o ex erc íc i o d a
at i v i da d e ec on ôm ic a e m s enti d o es tri t o – c o m o progr am a de
pr om oç ão d a ex is t ê nc i a di g na , d e qu e , r e p it o , t o dos d e v em
go za r . D aí p or qu e se enc o ntr am c ons t it uc io n a lm ent e
em pen h a dos n a r ea l i z aç ã o d es s e pr o gram a – des s a p ol ít ic a
pú b l ic a m ai or – ta n to o s e tor pú b l ic o qu a nt o o s e t or pr i v ad o .
Lo g o, o ex erc íc io d e q ua l q uer p arc e l a da at i v i da d e ec o nôm ic a
de m odo n ã o ad e qu a d o àq u el a pr om oç ã o ex pres s ar á v i o laç ã o
do pr inc íp i o d u p la m ente c on tem p la d o na C o ns t it u iç ão .
( G R AU , 2 00 8, p. 1 9 8).

Diante disso, “a Constituição estabelece a finalidade de toda a


atuação através de políticas econômicas, qual seja a de assegurar a
todos existência digna , conforme os ditames da justiça social.
(FONSECA, 1996, p. 83). Então, é inaceitável que os empresários
visem a redução de custos em detrimento da dignidade da pessoa
humana.
37

3.2 Princípio da livre iniciativa

A livre iniciativa está presente na Constituição de 1988 em dois


dispositivos. No artigo 1º, inciso IV, ela consta como sendo um
fundamento da República Federativa do Brasil. Já o artigo 170, caput,
prevê que a ordem econômica deve estar fundada na livre iniciativa.

Então, a livre iniciativa é um dos princípios constitucionais


fundamentais da República Federativa do Brasil, e, também, um dos
fundamentos da ordem econômica. Dessa forma, ela fundamenta toda a
estrutura dos ideais de liberalismo econômico, que circundam toda
atividade empresarial e, ainda, possui relevante destaque econômico
constitucional.

A previsão constitucional da livre iniciativa determina que “a


eleição da atividade que será empreendida assim como o quantum a
ser produzido ou comercializado resultam de uma decisão livre dos
agentes econômicos” (MELLO, 2005, p. 732).

Sobre a liberdade de iniciativa econômica, José Afonso da Silva


ensina que:

A l ib er da d e de i n ic ia t iv a e n v ol v e a l ib er da de d e in d ús tr i a e
c om ér c i o o u l i b erd a de de em pr es a e a l i b er da d e d e c o ntr a to .
Co ns t a d o ar t. 1 7 0 , c om o um d os e s te i os d a or dem
ec o n ôm ic a , as s im c om o de s e u p ará gr af o ú n ic o, q ue as s e gu ra
a t o d os o l iv re ex er c íc i o d e qu a l qu er a ti v i da d e ec o n ôm ic a,
i nd e pe n de nt e m en te d e a u tor i za ç ão d e ór g ã os p ú b lic os , s a lv o
c as os pr ev is tos em le i . ( SI L V A, 20 0 7, p . 7 93 ).

A livre iniciativa garante ao ser humano o direito de atuar


livremente no segmento econômico que preferir e, ainda, assegura ao
proprietário a liberdade de dispor de seus bens, da maneira que melhor
lhe aprouver.

Ressalte-se que a livre iniciativa somente é legítima quando, ao


perseguir o lucro, não esquece os ditames da justiça social. E,
38

consequentemente, será ilegítima quando for utilizada tão somente


para satisfazer os interesses egocêntricos do empresário. Pode -se
dizer que a livre iniciativa está intimamente atrelada à função social da
empresa, tema este que será aprofundado mais adiante.

Outra limitação no que tange à livre iniciativa diz respeito ao


poder estatal de impedir concentrações capitalistas, as quais objetivem
prejudicar a livre concorrência, dificultando pequenas iniciativas
econômicas.

Nesse sentido, apesar da livre iniciativa estar assegurada


constitucionalmente, não se pode esquecer que a mesma esbarra em
algumas limitações. Isso tendo em vista que inexiste pri ncípio absoluto,
devendo todos os princípios coexistir num sistema coerente.

A idéia de que a livre iniciativa deve ser exercida no interesse


da justiça social é explorada por José Afonso da Silva:

As s im , a li b er da d e de in ic i at iv a ec on ô m ic a pr iv a d a , n um
c on t ex t o d e um a C ons ti t uiç ã o pre oc up a da c om a re a li za ç ã o d a
j us t iç a s oc ia l (o f im c on d ic io n a os m e ios ), nã o p o de s ig n if ic a r
m ais d o qu e l i ber d ad e de d es e n v o l vim e nt o da em pres a no
qu a dr o es t ab e l ec i d o p el o p od er p ú bl i c o, e , por ta n to ,
pos s i b i li d a de de g o z ar d as f ac i li d a des e nec es s id a de d e
s ubm et er - s e às lim i t aç õ es p os t as p e l o m es m o. É le gí t im a,
en q ua n to ex erc id a no i nt er es s e d a j u s tiç a s oc i a l . S er á
i le g ít im a, qu a nd o ex erc id a c om obj et i v o d e p ur o l uc ro e
r ea l i za ç ão p es s oa l d o em pres ár io . ( S IL V A , 2 00 7 , p. 7 9 4 ).

Ou seja, é garantido o direito do homem para, com o seu capital,


explorar atividade econômica. Porém, ele deverá desempenhar tal
mister em busca do bem comum, conforme os ditames da justiça social,
e não somente com um egocentrismo exacerbado, sob a l uz do
princípio da função social.
39

3.3 Princípio da valorização do trabalho humano

O princípio da valorização do trabalho humano, da mesma forma


que o da livre iniciativa, é um pilar fundamental do ordenamento
jurídico econômico.

No artigo 1º, inciso IV, da Carta Magna de 1988, ele consta


como fundamento do Estado Democrático de Direito. Já no artigo 170,
existe a previsão de que a ordem econômica deve ser fundada na
valorização do trabalho humano. Então, além de ser um princípio
constitucional, é um fundamento da ordem econômica.

O trabalho deve ser sempre valorizado, eis que consiste em


fonte de sobrevivência do ser humano. Sendo assim, ao redor da
valorização do trabalho circunda interesse social, bem como está
intimamente ligado à dignidade da pess oa humana.

José Afonso da Silva entende que a ordem econômica prioriza


os valores do trabalho humano sobre todos os demais valores da
economia de mercado:

A Co ns t i tu iç ã o dec l ar a qu e a ord em ec o n ô m ic a é f u n da d a na
v a lor i za ç ão do tra b a lh o h u ma n o e na i n ic i a t i v a pr i v ad a . Q u e
s i gn if ic a is s o ? Em pri m eiro lu g ar q ue r d i zer prec is am ent e q u e
a C o ns t i tu iç ã o c ons agr a um a ec o n om ia d e m erc a d o, d e
na t ur e za c ap i ta l is ta , po is a in ic i at iv a pr iv a da é um pri nc í p io
bás ic o d a ord em c ap i t a lis t a. Em s e gu n do lu gar s ig n if ic a q ue ,
em bor a c a pi t al is ta , a ord em ec on ôm ic a d á pr i or id a de aos
v a lor es d o tr a ba l h o h u m ano s o br e to d os os dem a is v a l ores da
ec o n om ia d e m erc ad o . C o n qu a nt o s e tr at e de dec l ara ç ã o d e
pr inc íp i o , es s a pr io r i da d e tem o s en t id o d e or i en ta r a
i nt er ve nç ã o d o Es t ad o , n a ec o nom i a, a f im de f a ze r v a ler os
v a lor es s oc ia is d o tr a ba l h o q u e, a o la d o da i n ic i a ti v a pr i v ad a,
c ons t it u em o f un dam e nt o nã o s ó d a or dem ec o n ôm ic a , m as
da pr ó pr ia R ep ú b lic a F ed er at i v a do Br as il (ar t. 1 º , I V) .
( SI L V A , 20 0 7, p . 7 88 ).

Sobre a relação entre em presa e trabalho, observa Luiz Antônio


Ramalho Zanoti que:
40

O tr ab a lh o ex is t e a nt es da em pres a, e es t a f o i c r i ad a pa ra
r ac io n a li za r a f orm a c om que e l e er a a té e nt ã o re al i za d o , d e
m ane ir a q u e e le t i v es s e o m el hor r e s u lt ad o p os s í v e l,
m edi an t e o em pre go da m enor f orç a f ís ic a e d o m enor
c ons um o d e m atér ias - pr im as , c om m enor c us t o f i na l . Is s o
m os tr a, po is , q u e a em pres a é um a i ns t it u iç ã o n i t id am en te
hum an a , pr of un d am ent e h um an a, p or qu e é pr of u n dam en t e
hum an o pr oc ura r a o tim i za ç ã o. C o nt u do , es s e pr oc es s o de
ot im i zaç ã o d e v e pr i v i le g i ar o des e n vo l v i m ento pes s o a l d o
hom em , par a qu e o tr ab a l ho s ej a r e a li za d o c om pra ze r, e n ã o
c om o f ont e g er a dor a de r ec urs os m at er ia is par a a s at is f aç ã o
das n ec es s i d ad es pes s oa is d o em pre g ad o e d e s ua f am íl i a .
( ZA NO T I, 2 0 09 , p . 19 0 ).

Posto isso, pode -se afirmar que o exercício de qualquer


atividade econômica incompatível com o princípio da valorização do
trabalho humano estará na contramão da Constituição. Neste sentido:

O tex to d o ar t. 17 0 n ão af irm a q u e a ord e m ec onôm ic a es tá


f un da d a na v al or i za ç ão do tr a ba l h o hu m ano e n a l i vr e
i nic i at i v a e te m p or f i m as s eg ura r a t o dos ex is t ênc i a d ig n a,
c onf or m e os d i tam es da j us t iç a s oc i a l, s en ão qu e e l a dev e
es t ar – va l e d i zer , t e m d e nec es s ar ia m en t e es t ar – f un d a da
na va l or i zaç ã o do tr a ba l h o hum an o e n a l i vr e in ic i at i v a, e
dev e t er – va l e d i ze r, te m d e nec es s ar ia m en t e t er – por f im
as s e g ur ar a t o dos ex i s tê nc ia d ig n a, c onf o r m e os di tam es d a
j us t iç a s oc i al . A p erf e it a c om pre e ns ã o d e s s a o b v ie d ad e é
es s e nc i al , n a m ed id a em qu e inf orm ará a p l en a c om pre e ns ã o
de q ue q ua l q uer prá t ic a ec o nôm ic a ( m un d o d o s er )
i nc om pa tí v e l c om a v a lor i za ç ão do t ra b al h o hum an o e c om a
l i vr e in ic i at i v a, o u q u e c onf l it e c om a ex i s tê nc ia d i g na d e
to d os , c o nf orm e os d i tam es da j us t iç a s oc i a l, s er á a d v ers a à
or d em c ons t i tuc i o na l. S e rá , p ois , i ns t i tuc i on a l me n te
i nc o ns t i tuc i o na l . Des de a c om pree ns ão d es s e as p ec t o
po d er ão s er c o ns tr u í dos n o vos pa dr ões nã o s om ent e d e
c on tr ol e d e c o ns ti t uc i on a l id a de , m as , em es p ec i al , no v os e
m ais s ó l i d os es p aç os de c ons t it uc io n al i d ad e . A am pl i tu d e d os
pr ec e it os c o ns t it uc i o na is a bra n ge n ã o ap e n as n orm as
j ur í d ic as , m as tam bé m c ond u tas . D aí por q ue des ej o af irm ar
s er em c ons t it uc io n alm en t e i na dm is s í v e is n ã o s om en te norm as
c om ele i nc om p at í v e is , m as a in d a q u a is q u er c o n du tas
ad v er s as a o d is pos t o no ar t. 17 0 d a C o n s ti t uiç ã o. (G R AU ,
20 0 8, p . 1 95 - 1 9 6).

Dessa forma, pode -se dizer que o aspecto patrimonial das


relações de emprego possui significativa limitação com o princípio da
valorização do trabalho humano. Além disso, diante desse princípio, o
41

exercício de qualquer atividade econômica fica condicionado às


exigências de dignidade da pessoa humana e valorização social do
trabalho.

3.4 Princípio da soberania nacional econômica

A soberania nacional é mencionada, no artigo 1º, inciso I, da


Constituição, como um d os fundamentos da República e, no artigo 170,
inciso I, como princípio da ordem econômica. Uma não se confunde
com a outra. A prevista no artigo 1º é tida como soberania política e a
do artigo 170 trata da soberania nacional econômica, sendo que esta
última é complemento da primeira.

O princípio da soberania nacional econômica, previsto


expressamente no artigo 170, inciso I, da Constituição da República,
garante que o exercício de qualquer atividade econômica não entre em
choque com os interesses nacionai s. Dessa forma, os interesses
nacionais estão em um plano superior aos interesses do livre exercício
da iniciativa privada.

Esse princípio proíbe que os interesses nacionais se submetam


aos objetivos unilaterais de entidades internacionais. Ressalte -se que
afirmar a soberania nacional econômica “não supõe o isolamento
econômico, mas antes, pelo contrário, a modernização da economia – e
da sociedade – e a ruptura de nossa situação de dependência em
relação às sociedades desenvolvidas” (GRAU, 2008, p. 226).

Diante desse princípio, pode -se dizer que o constituinte de 1988


visou formar um capitalismo nacional autônomo, independente. Para
isso, foi necessária a criação de condições jurídicas indispensáveis
para um sistema econômico autocentrado e desenvolvido, sem que isso
42

signifique afastamento de outras economias e nem da dignidade da


pessoa humana. Neste sentido:

A C o ns t i tu iç ão c r i o u as c o n diç õ es j ur íd i c as f un d am ent a is
par a a a doç ã o do d e s env o lv i me nt o a ut oc e ntr a do , nac i o na l e
po p u lar , q ue , n ão s e n do s in ô nim o de is o l am en to o u
au t ar q u i za ç ã o ec o nô m ic a, p os s i bi l i ta m arc h ar pa ra um
s is t em a ec on ôm ic o d e s en v o l v id o , em qu e a bur g u es i a loc a l e
s eu Es ta d o t en h am o d om ín io d a re pr od uç ã o da f orç a de
tr a b al h o, d a c en tr a li za ç ã o d o ex c e d en te d a p ro d uç ã o, d o
m er c ad o e a c a p a c id ad e d e c om pet ir n o m erc ad o m un di a l ,
dos r ec ur s os na tu ra is e, e nf im , d a tec n o lo g ia . É c la ro q ue
es s a f or m aç ã o c a pi t al is t a d a Co ns ti t uiç ã o de 1 9 88 t em q ue
l e var em c o nt a a c ons tr uç ã o d o Es ta d o D em oc rát ic o d e
Dir e it o , em qu e, c om o v im os , s e e n vo l v em dir e it os
f un dam en t ais d o h om em que n ão ac e it am a p erm an ê nc i a de
pr of un d as d es i gu a l da des , an t es , pe l o c o ntr ár i o, r ec lam am
um a s i tu aç ão d e c on v i v ênc i a em qu e a d i g n id a de d a pes s o a
hum an a s ej a o c en tr o d as c ons i d eraç õ es da v i d a s oc i a l.
( SI L V A , 20 0 7, p . 7 93 ).

Sobre o tema, esclarece Eros Roberto Grau:

Af ir m ar a s o b era n i a ec o n ôm ic a n ac io n a l c om o i ns trum e nt o
par a a r e al i za ç ão d o f im de as s e g urar a to d os ex is t ênc i a
d ig n a e c om o obj et i v o par t ic u l ar a s er a l c anç a do é d ef i n ir
pr o gr am a de po l ít ic a s pú b lic as vo l ta d as – r ep it o – nã o a o
is ol am en to ec o n ôm ic o, m as a vi a b il i za r a pa rt ic ip aç ão da
s oc ie d ad e bras i l e ira , em c ond iç õ es d e i gu a l da d e, n o m erc ad o
i nt er n ac i on a l. (G R AU , 20 0 8, p . 2 27 ).

Ademais, com a atual e constante globalização, ocorrem quebras


de barreiras geográficas , em prol do exercício de atividades
econômicas, com circulação de capitais internacionais. A economia
mundial, atualmente, é interligada. Ocorrem criações de blocos
econômicos, celebração de tratados internacionais, mas, tudo isso, sem
prejuízo da soberan ia nacional econômica.
43

3.5 Princípio da livre concorrência

O princípio da livre concorrência está previsto no artigo 170,


inciso IV, da Constituição da República. Ele é um princípio que, ao
mesmo tempo em que decorre da livre iniciativa, atua como lim ite do
seu exercício. Dessa forma, visa prevenir abusos da livre iniciativa, eis
que assegura o direito de conquistar clientela, em igualdade de
condições.

Esse princípio proíbe a utilização incorreta da livre iniciativa e


do poder econômico. É fundamento para o disposto no artigo 173, §4º,
da Constituição de 1988: “A lei reprimirá o abuso do poder econômico,
que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao
aumento arbitrário dos lucros”. A lei que esse dispositivo se refere é a
lei nº 8.884/1994, a qual dispõe sobre a prevenção e repressão às
infrações à ordem econômica.

O artigo 170, inciso IV, bem como o artigo 173, §4º, ambos da
Constituição da República, se complementam para atingir o mesmo
objetivo. Sobre esse objetivo comum desses dispositivos, esclarece
José Afonso da Silva:

V is am tu te l ar o s is tem a d e m erc ad o e , es pec i a lm ent e,


pr o t eg er a l i vr e c onc orr ênc i a, c o ntr a a t en d ênc i a
aç am ba r c a d ora d a c o nc e n traç ã o c ap i ta l is ta . A C o ns t i tu iç ã o
r ec o n h ec e a ex is t ê nc i a do p o der ec o nôm ic o . Es t e nã o é , p o is ,
c on d en a do p e l o r eg i m e c ons ti t uc i o n al . Nã o r ar o es s e p od er
ec o n ôm ic o é ex erc i do de m an e ira an t i - s oc i a l . Ca b e, e nt ã o, a o
Es t a do in t er v ir p ara c o ib ir o a b us o. ( SI L V A, 2 0 07 , p. 79 5).

Então, a livre concorrência não é uma liberdade sem controle


algum. Muito pelo contrário. Trata -se de uma liberdade em prol da
coletividade. Nos dizeres de Eros Roberto Grau: “A livre concorrência é
elevada à condição de princípio da ordem econômica, na Constituição
44

de 1988, mitigadamente, não como liberdade anárquic a, porém social”


(GRAU, 2008, p. 215).

A respeito da relação entre o princípio da livre concorrência com


o da livre iniciativa, vale citar a sintética observação de Sérgio Botrel,
segundo a qual “a livre concorrência consiste, ao mesmo tempo, na
confirmação da livre iniciativa e em limitação ao seu exercício.”
(BOTREL, 2009, p. 63).

Dessa forma, o princípio da livre concorrência visa proteger o


livre acesso ao mercado, aumentando o direito de escolha dos
consumidores. E, ainda, é instrumento indispensável p ara o correto
exercício da livre iniciativa.

3.6 Princípio de defesa do consumidor

No artigo 170, inciso V, da Constituição da República, encontra -


se previsto o princípio de defesa do consumidor. A proteção deste
também está positivada no artigo 5º, i nciso XXXII.

A definição legal de consumidor encontra -se prevista no artigo


2º, caput, da lei 8.078/1990: “Consumidor é toda pessoa física ou
jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário
final”. Sobre o conceito de consumidor, José Geraldo Brito Filomeno
assevera:

O c onc e it o d e c o ns um i dor ad o ta d o pe l o C ód i g o f oi
ex c lus i v am ent e d e c ar át er ec on ô m ic o , o u s e j a, l e v an d o - s e em
c ons i d er aç ã o t ã o - s om en t e o p ers o n a gem q ue n o m erc a do d e
c ons um o a dq u ir e b e ns o u e nt ã o c o ntr at a a pr es taç ã o d e
s er v iç os , c om o d es ti n at ár io f in a l, pr es s u p o nd o - s e as s im qu e
ag e c om v is t as ao at e nd im en t o d e um a n ec e s s i da d e pr ó pr ia e
nã o p ar a o d es en v o l v i m ento d e um a o ut ra a ti v i d ad e n eg oc ia l .
( FI LO M E NO , 20 0 0, p . 26) .
45

Destarte, o consumidor, seja ele pessoa física ou ju rídica, é


elemento central da ordem econômica constitucional, eis que afeta todo
o exercício de atividade econômica, razão pela qual mereceu tutela
constitucional, inclusive. O Estado Democrático de Direito preocupa -se
em protegê-lo, tratando-o como hipossuficiente frente às relações
empresariais.

Sobre o princípio de defesa da parte vulnerável nas relações de


consumo, ensina Eros Roberto Grau:

A p ar de c ons u bs t a nc iar , a d ef es a do c o ns u m i dor , um


m odis m o m oder n i za n te do c ap i ta l is m o – a i de o l og i a d o
c ons um o c o n tem por i z ad a ( a r e gra “ac um ul a i, ac um ul a i” im põ e
o d it am e “c o ns um i, c ons um i”, ag or a p or ém s ob pr ot eç ã o
j ur í d ic a de qu em c ons om e) – af et a t od o o ex erc íc io d e
at i v i da d e ec o n ôm ic a, i nc lus i v e tom ad a a ex pr es s ão em
s en t id o am p lo . O c ará t er c o ns t i tuc i o na l c on f orm ad or da
or d em ec o n ôm ic a, d e s te c om o dos d em ais pr inc íp i os de q ue
te n ho c o g it a do , é i n q u es t i on á v e l. (G R A U, 2 0 08 , p . 24 9) .

Vislumbrando um mercado propício para um desenvolvimento


econômico, além de prever a livre iniciativa e a livre concorrência, a
Constituição resguardou o consumidor, parte vulnerável numa rede de
relações comerciais. Dessa forma, para incentivar o desenvolvimento
das relações comerciais, bem como viabilizar o desenvolvimento
econômico e o bem -estar da coletividade, o Estado deve efet ivar
proteções à pessoa – física ou jurídica – que adquirir ou utilizar
produto ou serviço como destinatário final.

Então, pode-se afirmar que tanto a livre iniciativa quanto a livre


concorrência devem ser observadas tendo como elemento central - a
ser tutelado - o consumidor, peça fundamental para a circulação de
bens numa economia de mercado, que não pode ser visto apenas como
instrumento para obtenção de lucro.
46

3.7 Princípio de defesa do meio ambiente

Outro princípio da ordem econômica é o de defes a do meio


ambiente, previsto no artigo 170, inciso VI, da Carta Magna de 1988.
Nesse dispositivo há previsão acerca de tratamento diferenciado
conforme a violência ambiental causada pelos produtos e serviços, bem
como de seus processos de elaboração e pres tação, o que indica a
presença de proporcionalidade da defesa ambiental.

O Estado Democrático de Direito demonstrou relevante


preocupação com essa proteção, numa evidente busca de um
desenvolvimento econômico sustentável. Este, que pode ser definido
conforme as seguintes palavras:

O des e n vo l v im en to q ue proc ur a s a t is f a ze r as nec es s i da d es


da ge r aç ã o a tu a l, s em c om prom eter a c ap ac id a de d as
ger aç õ es f ut uras de s a tis f a zer em as s uas pró pr i as
nec es s i da d es , s i gn if ic a p os s i bi l i tar q u e as pes s o as , a gor a e
no f u tur o , at i nj am um ní ve l s at is f a tór i o d e des en v o l v im ent o
s oc ia l e ec o n ôm ic o e de re a l i zaç ã o h um ana e c u lt ur a l,
f a ze nd o, a o m es m o te m po, um us o ra zo á v e l dos rec urs os da
ter r a e pres er v a nd o as es p éc i es e os ha b it a ts n a tur a is .
( D ES E N VO L VI M ENT O S U ST E NT Á V EL , 2 00 9 )

Nesse sentido, a observação de Ricardo Luis Lorenzetti, a


respeito do conceito de desenvolvimento sustentável: “trata -se de
preservar aquelas coisas nas quais se sustenta o desenvolvimento”
(LORENZETTI, 1998, p. 576).

Conforme dispõe o artigo 225, da Constit uição de 1988, o meio


ambiente ecologicamente equilibrado é direito de todos, assim como é
bem de uso comum e essencial à sadia qualidade de vida, razão pela
qual, impõe-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e
preservar a natureza, visan do o bem-estar atual e futuro.
47

Dessa forma, a ordem econômica resta diretamente influenciada


pelo dever de proteção ao meio ambiente, o que limita sua atuação, em
benefício da busca pela existência digna. Neste sentido, Eros Roberto
Grau explica que:

O pr i nc í p io d a d ef es a do m e i o am b i en te c onf orm a a or dem


ec o n ôm ic a (m und o d o s er) i nf orm an d o s u bs t a nc i a lm en te os
pr inc íp i os d a gar a nt i a do d es env o lv im e nt o e d o pl e no
em pr e go . A l ém de o bj et i v o, em s i, é i ns tr um en t o n ec es s ár i o –
e in d is pe ns á ve l – à rea l i za ç ão d o f im de s s a o rd em , o de
as s e g ur ar a t od os ex i s tê nc ia d i gn a . N ut re t am bém , a dem a is ,
os d it am es d a j us t iç a s oc ia l . T od os t êm d ir ei t o ao m ei o
am bi en t e ec o l o g ic am e nt e e qu i l i bra d o, bem de us o c om um do
po v o – d i z o ar t. 22 5 , c ap u t. O des e nv o lv i m en t o n ac io n a l q ue
c um pr e r e a l i zar , um dos o bj e ti v os d a R ep ú b l ic a F e der at i v a d o
Br as il , e o p l e no e m pre g o q u e im pe n d e a s s eg ur ar s u p õem
ec o n om ia a ut o - s us t e n ta d a, s uf ic i e nt em en te eq ui l i br ad a p ar a
per m i tir a o h om em reenc o ntr ar - s e c o ns i go pró pr i o, c om o s er
hum an o e nã o ap e na s c o m o um da do o u í nd ic e ec o n ôm ic o.
( G R AU , 2 00 8, p. 2 5 2).

Ressalte-se que a defesa do meio ambiente está intimamente


ligada ao direito – fundamental – à vida e, por isso, deve preponderar
sobre quaisquer considerações de desenvolvimento econômico
desenfreado. Dessa forma, a tutela do meio ambiente serve como
orientação nas atividades empresariais, para o exercício do direito de
propriedade, bem como em qualquer iniciativa privada. É o que se
extrai das ponderações de José Afonso da Silva, segundo as quais:

A q u al i d ad e d o m ei o am bi en t e s e tr ans f or m a num bem , num


pa tr im ôn io , num v a lor m esm o, c uj a pr es erv aç ã o , rec u per aç ã o
e r ev it a li za ç ã o s e t or n aram n um im per at i v o do Po d er P úb l ic o,
par a as s eg ur ar a s aú d e, o bem - es t ar do h om em e as
c on d iç ões d e s eu des e n vo l v im en to . Em v er da d e, p ara
as s e g ur ar o di re i to f und am en ta l à v i da . As n orm as
c ons t it uc io n a is as s um ir am a c o ns c i ê nc ia d e q u e o d ir e it o à
v i da , c om o m atri z d e to d os os dem a is d ir e i tos f u n dam en t ais
do h om em , é qu e h á de or i en tar t od as as f orm as de at u aç ão
no c am po d a tu t el a d o m eio am b ie n te . C o m pree nd e u q ue e l e
é um va l or pre p on d era n te , qu e h á d e es t ar ac im a d e
qu a is qu er c o ns id er aç õ es c om o as d e des e n v o l vim e nt o, c om o
as de r es p e it o ao d ire i to d e pr opr i e da de , c om o as d a
i nic i at i v a pr i va d a. T a m bém es tes s ão g ar an t id os n o t ex t o
c ons t it uc io n a l, m as , a t od a e v id ê nc i a , n ão p od em prim ar
s obr e o di re i to f u nd a m enta l à v id a , q ue es tá em j og o q ua n do
s e d is c ut e a t u te l a d a q u a li d a de d o m ei o am bi en t e, qu e é
48

i ns tr um ent o n o s en t id o de q ue , atr a v és des s a t u te l a, o q ue s e


pr o t eg e é um v a lo r m aior : a q ua l i da d e da v i d a h u ma n a .
( SI L V A , 20 0 7, p . 8 47 / 84 8) .

Como sabido, é inerente ao desenvolvimento econômico a


ocorrência de atos que prejudicam o meio ambiente, como, por
exemplo, o aumento da emissão de gases poluentes, geração e
utilização de produtos não biodegradáveis, dentre outros. A
preponderância que a Constituição determina para tutelar do meio
ambiente diz respeito a uma utilização racional, evitando danos
desnecessários ou abusivos.

Diante disso, a atividade empresarial deve ser ex ercida atravé s


de condutas ecologicamente corretas, em busca de um
desenvolvimento econômico ecologicamente sustentável. E, assim, de
acordo com as diretrizes do Estado Democrático de Direito que dizem
respeito à tutela ambiental, assegurando a todos exist ência digna.
Trata-se, então, de uma compatibilização da livre iniciativa, da livre
concorrência, da valorização do trabalho humano, com o respeito ao
meio ambiente.

3.8 Princípio da redução das desigualdades regionais e sociais

No artigo 170, inciso VII, da Constituição da República,


encontra-se previsto, dentre os princípios gerais da atividade
econômica, o da redução das desigualdades regionais e sociais. Diante
disso, no Estado Democrático de Direito, há determinação para que,
simultaneamente a o crescimento econômico, ocorra a redução dessas
desigualdades.

Esse princípio também se encontra inserido no artigo 3º, inciso


III, da Constituição de 1988, que prevê a erradicação da pobreza e da
49

marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais


como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. É
neste sentido a observação de José Afonso da Silva, que sustenta o
seguinte:

A r ed uç ão das d es i g u a ld a des r e gi o na is e s oc ia is é, t am bém ,


um dos o bj et i v os f u n dam en t a is da R e pú b l i c a F e de ra t i va d o
Br as il ( ar t. 3º , I II) e, j á v im os , por um la d o , q ue os d ir e it os
s oc ia is e os m ec an is m os d a s e gu ri da d e s oc i al s ã o
pr e or d en a dos n o s e n t i do d e b us c ar um s is t em a qu e pr op ic i e
m aior ig u a li za ç ão d as c on d iç õ es s oc i a is , e , p or o utr o la d o,
c ons i g nam os , al h ur es , a pr e oc u p aç ão c on s ti t uc i o na l c om a
s o luç ã o d as d es ig u a l da d es re g i on a is , pre v en d o m ec an is m os
tr i b ut ár i os (Fu n d o E s pec i a l) e orç am ent ár ios p ara ta n to
( r e gi o na l i za ç ão , arts . 43 e 16 5 , §1 º) . ( S IL V A , 20 0 7, p . 7 96) .

A redução das desigualdades sociai s e regionais (princípio da


ordem econômica) e a busca pela erradicação da pobreza e da
marginalização (objetivo fundamental da República) estão intimamente
ligados, sendo que, para Eros Roberto Grau:

A er r ad ic aç ão d a po bre za e d a m arg i na l i za ç ã o , b em as s i m
r ed uç ã o d as d es ig u a l da d es s oc i a is e r eg i o na is , s ã o o bj e t i v os
af i ns e c om pl em en ta res d a qu e l e a t in e nt e à pr om oç ã o ( =
gar a nt ir ) d o d es e n v o l v im ent o ec on ôm ic o (G R AU , 20 0 8, p .
21 9) .

Dessa forma, o processo de desenvolvimento econômico, no


Estado Democrático d e Direito brasileiro, não pode ser desenfreado,
devendo contribuir para o regular funcionamento das práticas
mercantis. O princípio da redução das desigualdades regionais e
sociais está conectado à evolução da ordem econômica, ao contribuir
para o estável funcionamento dos mercados, possuindo evidente
função social.
50

3.9 Princípio da busca do pleno emprego

O princípio diretivo da busca do pleno emprego, previsto no


artigo 170, inciso VIII, da Constituição de 1988, se opõe às políticas
recessivas. Pode ser entendido como uma busca pela “expansão das
oportunidades de emprego produtivo” (GRAU, 2008, p. 253) e, também,
como uma garantia para o trabalhador.

No mesmo sentido, José Afonso da Silva explica que:

P le n o em preg o é ex pres s ã o abr a ng e nt e da u ti l i za ç ão , a o


m áx im o gra u, d e to d o s os r ec urs os pr od u ti v os . M as ap ar ec e ,
no ar t. 1 7 0, V II I, e s pec i a lm ent e n o s en ti d o de pr o p ic i ar
tr a b al h o a t od os q ua nt os es t ej am em c on d iç õ es d e ex e rc er
um a at i v i da d e p ro d ut i v a. T ra ta - s e d o p l en o em pre go d a f orç a
de tr a ba l ho c a p a z. El e s e harm o ni za , a s s i m , c om a re gra d e
qu e a or dem ec o n ôm ic a s e f u nd a n a v al or i za ç ã o d o tr a ba l h o
hum an o . Is s o im pe d e q ue o pr i nc í p i o s ej a c ons i d era d o
ap e nas c om o m era b us c a qu a nt it a ti v a , em qu e a ec on om ia
abs or v a a f orç a d e tra b al h o dis p o ní v e l, c om o o c o ns um o
abs or v e m erc a dor i as . Q u er - s e q ue o tr ab a l h o s ej a a bas e d o
s is t em a ec o nôm ic o, r e c eb a o tr at am en to d e pr inc i p al f at or d e
pr o d uç ão e p art ic i p e do pr o d ut o da r iq u e z a e da re n d a em
pr o p or ç ão d e s ua p os iç ã o na or d em ec on ôm ic a . ( SI L V A,
20 0 7, p . 7 97 ).

Diante disso, a principal característica da busca do pleno


emprego é servir de base para a ordem econômica. E, assim, para que
ocorra um desenvolvimento econômico eficaz, deve ser lastreado no
aumento de ofertas de empregos produtivos, fundamentais para o
crescimento da economia no Estado Democrático de Direito brasileiro.

Conforme sustenta Ana Frazão de Azevedo Lopes,

O p le n o em preg o é de t erm in ad o tam bé m pel a s om a do


c ons um o e d os i n v es t i m entos , d e f orm a qu e o Es t a do de v er i a
i nt er v ir p ara es t im ul ar es s as d u a s f unç ões , s ej a dir e tam en t e,
por m e io de des p es as pú b l ic as , s ej a i n d ire t am ent e, p or m eio
da po l ít ic a f is c a l. ( LO P E S, 2 0 06 , p . 15 5) .
51

Além de sua evidente ligação com o princípio da valorização do


trabalho humano, conforme sustenta Eros Roberto Grau, a busc a do
pleno emprego possui liame com o princípio da função social da
propriedade:

O pr i nc í p io (d a b us c a d o pl e no em pr eg o) i n f orm a o c on te ú do
at i v o do pr i nc í p i o da f unç ã o s oc ia l d a pro pr i ed a de . A
pr o pr i ed a de do ta d a d e fu nç ão s oc i a l o br ig a o pr o pr ie tá ri o o u
o t i tu l ar d o po d er d e c o ntr o le s o br e e la a o ex erc íc io d es s e
d ir e i to - f unç ã o ( p od er - dev er ) , a té par a qu e s e es tej a a r ea l i za r
o p le n o e mpr e g o . (G R AU , 2 00 8 , p. 2 5 4).

O homem que vive sem possibilidades de emprego, em estado


de escassez econômica, está imposs ibilitado para desenvolver suas
capacidades básicas, situação que ofende a dignidade da pessoa
humana, inclusive. Destarte, percebe -se que a dignidade do
trabalhador deve prevalecer frente ao aspecto patrimonial da relação
de emprego.

3.10 Princípio do tratamento diferenciado para as microempresas e


empresas de pequeno porte

O último dos princípios constantes do rol do artigo 170 da


Constituição da República é o do tratamento favorecido para o
microempresário e para o empresário de pequeno porte (inci so IX).
Também foi reproduzido no artigo 179, verbis:

Ar t . 1 7 9. A U n i ão , os Es ta d os , o D is tr i to F ed er a l e os
Mu n ic í p i os d is p ens ar ã o às m ic r oem pres as e às em pres as de
pe q ue n o p ort e, as s im d ef i n id as em l e i, tr at am ent o j ur íd ic o
d if er e nc i ad o , v is a n do a i nc e n t i vá- l as pe l a s im pl if ic aç ã o de
s uas obr i g aç õ es a dm i n is tr at i v as , tr i b ut ár ias , pre v i de nc iá ri as e
52

c r ed i tíc i as , o u p e la e l i m inaç ão o u re d uç ã o d es t as p or m ei o d e
l ei .

Importante mencionar a diferença entre esses dois pequenos


empresários, prevista na Lei Compl ementar nº 123/2006 (alterada pela
Lei Complementar nº 128/2008). Por esse diploma legal,
microempresário é o que aufere receita bruta anual até R$ 240.000,00
(duzentos e quarenta mil reais), e empresário de pequeno porte é o que
embolsa valor superior a e sse, até o limite de R$ 2.400.000,00 (dois
milhões e quatrocentos mil reais).

Esse princípio, além de fundamentar a reivindicação de


realização de políticas públicas, estabelece, conforme observa Eros
Roberto Grau, proteção para empresas de pequeno porte, constituídas
sob as leis do Brasil e que tenham sua sede e administração no país,
“constituindo, em termos relativos, porém, cláusula transformadora”
(GRAU, 2008, p. 255).

O tratamento diferenciado previsto para as microempresas e


empresas de pequeno porte visa estimular o desenvolvimento
econômico dessas pessoas jurídicas, como esclarece Fábio Ulhoa
Coelho:

O m ic r o em pres ár io e o em pres ár io de p e qu en o p ort e , p or s ua


v e z, t êm c ons t i tuc i on a lm en te as s e g ura do o d ir e it o a
tr a tam e nt o j urí d ic o d if ere nc i ad o , c om o o bj e ti v o d e es t im ul ar -
l hes o c res c im en to c om a s im pl if ic a ç ão , r e duç ã o ou
e lim i naç ã o de o br i gaç õ es a dm in is t ra t i v as , t ri b ut ár i as ,
pr e v i d enc i ár i as e c re d it íc i as (CF , ar t. 1 79) . (CO E LH O , 2 0 09 ,
p. 7 6) .

No mesmo sentido, Maria Helena Diniz sugere que:

A v i da e m pr es ar i a l, i nf l ue nc i ad a p el o C ód i go C i v i l it a l ia n o,
i no v o u a o r eg u lam e nt ar a m ic r oem pr es a ( M E) e a em pres a d e
pe q ue n o p or te ( E P P) num m ovim e nt o in ic i a do p e lo Dec re to - l e i
n. 1. 75 0 /8 0 , s e gu i d o da L ei n. 7. 2 56 /8 4 , r eg u l am ent a da pe l o
Dec r et o n . 9 0. 8 80 /8 5 , qu e d is c ip l i na a m ic r oe m pr es a ( M E), e
pe l a C ar t a Ma g na d e 1 9 88 , q u e v e i o a tut e l ar n ã o s ó a
m ic r oem pr es a c om o tam bém a e m pres a de p e qu e n o por t e
53

( E P P) , c om o es c o p o d e f ac i l i tar - l h es a c ons t i t uiç ã o e o


f unc io n am ent o , f ort a le c en d o s u a par t ic i p aç ã o n o p roc es s o d e
des e n vo l v im en to ec o nôm ic o - s oc i a l, inc l us i v e c om o f ont e d e
ger aç ã o de em pr eg os p ar a pe q ue n os em pres ár i os , m em bros
de s ua f am íl i a e t erc ei ros , e, c om is s o , h a ve rá es tím ul o p ar a o
s eu c r es c im e nt o. (D IN IZ, 2 0 09 , p . 39 ).

Esse princípio visa facilitar as ativ idades das microempresas e


empresas de pequeno porte e, dessa forma, promove a efetivação da
livre iniciativa, bem como da livre concorrência. Diante disso, ocorre
ampla abertura para o livre exercício de atividade econômica, tornando
mais simples a disput a saudável pelo mercado consumidor.

3.11 Princípio da propriedade privada e da função social da


propriedade

No artigo 170, incisos II e III, da Constituição da República, há


previsão da propriedade privada e sua função social, como princípios
da ordem econômica. O princípio da propriedade privada e o da função
social serão tratados juntos, em face de sua inviolável ligação, na
busca constitucional de assegurar a todos existência digna.

Importante mencionar o artigo 5º, incisos XXII e XXIII, da


Constituição, sendo que a combinação destes dispositivos prevê que é
garantido o direito de propriedade, desde que esta atenda sua função
social. Dessa forma, a propriedade não pode mais ser vista como um
direito individual intocável, nem como instituição unica mente de Direito
Privado.

A respeito da propriedade, Eros Roberto Grau comenta:

A pr o pr i ed a de s em pre f oi j us t if ic a da c om o m odo d e pr ot eg er
o i n d i ví du o e s u a f a m íli a c o ntr a as n ec es s i da d es m ater i a is ,
ou s ej a, c om o f orm a de pr o v er à s u a s ubs i s tê nc ia . Ac o nt ec e
54

qu e n a c i vi l i za ç ão c on t em porâ n ea , a pro pr ie d ad e pr i v a da
de ix a d e s er o ú n ic o, s en ão o m el hor m ei o d e g ar an t ia da
s ubs is tê nc i a i n d i vi d u a l o u f am i l iar . Em s eu lu g ar ap ar ec em ,
s em pr e m ais , a g ar a nt i a de em pre g o e s a lár i o j us t o e as
pr es t aç õ es s oc i a is de v i das o u g ar an t id as p e lo Es t ad o , c om o
a pr e v a l ênc i a c o ntr a os r is c os s oc ia is , a ed uc aç ã o e a
f or m aç ão prof is s io n a l, a h a bi t aç ã o, o tr a ns por t e, e o l a zer .
( G R AU , 2 00 8, p. 2 3 5/ 2 36) .

César Fiuza, ao definir propriedade, observa que:

As s im , d i ze r q ue p r opr i e d a d e é o d ir e it o d e ex erc er c om
ex c lus i v i da d e o us o, a f ru iç ã o , a d is p os iç ã o e a re i v i n dic aç ão
de um b em , é d i ze r m uito p o uc o. É es q ue c er os de v er es d o
do n o e os d ire i tos d a c o le t i vi d ad e . A o es q u ec er os d ir e it os d a
c o le t i vi d ad e , ou s ej a, d o ou tr o, d o p róx im o, es t am os
ex c lu i nd o - o. É es qu e c er, a d em ais , o c ar át er d i nâm ic o d a
pr o pr i ed a de , q u e c o n s is t e em relaç õ es q u e s e m ov im en t am ,
qu e s e tr a ns f orm am no tem p o e n o es paç o . S em es s a v is ã o d a
pr o pr i ed a de c om o f e n ôm eno d i n âm ic o, é i m pos s í ve l s e f al ar
em f unç ão s oc ia l e, m ui to m en os , em funç ã o ec o nôm ic a.
( FIU ZA , 2 0 07 , p. 75 8).

Sobre a aplicabilidade do princípio da função social da


propriedade, José Afonso da Silva esclarece:

A no r m a q ue c o nt é m o pri nc íp i o da f unç ã o s oc i a l d a
pr o pr i ed a de i nc id e im ed i at am ent e, é d e a p lic a b il i d ad e
im ed i at a, c om o o s ã o to dos os pr inc íp i os c ons t it uc io n a is . A
pr ó pr i a j ur is pr u dê nc i a j á o r ec o n hec e . R e a lm en t e, af irm a - s e a
tes e d e qu e a q ue l a norm a t em pl en a ef ic ác ia , p or qu e
i nt er f er e c om a es tr ut ur a e o c o nc e i to d a pr opr i e da d e,
v a le n do c om o r e gra q ue f u nd am en ta um n o v o r e gim e j urí d ic o
des t a, tr a ns f orm an do - a n um a ins t it u iç ã o d e D ire i to P úb l ic o,
es p ec i alm e nt e, a in d a que n em a dou tr in a nem a
j ur is pr u dê nc i a t e nh am p erc eb i do o s eu a lc a nc e , n em lh e d ad o
ap l ic aç ã o a de q ua d a, c om o s e n ad a ti v es s e m uda do . ( S IL V A ,
20 0 7, p . 2 81 ).

Então, pode-se afirmar que a função social determina uma


limitação interna, no sentido de que legítimo será o interesse individual
quando realizar o direito social, e, não apenas quando não o exercer
em prejuízo da coletividade. O princípio da função social, dessa forma,
impõe ao proprietário (ou a quem for exercer o direito de usar, gozar e
55

dispor da propriedade) a prática de comportamentos em benefício da


sociedade.

No mesmo sentido, esclarece Eros Roberto Grau:

O q u e m ais r e le v a e nf at i za r, en tr et an t o, é o f at o d e q ue o
pr inc íp i o d a f unç ã o s oc i a l d a pr opr i e da d e im põ e a o
pr o pr i et ár i o – o u a qu em det ém o po de r de c o n tro l e, na
em pr es a – o de v er d e ex erc ê - l o em be n ef íc i o d e o u trem e
nã o , a pe n as , de n ão o ex erc er em prej uí z o d e o u t rem . Is s o
s i gn if ic a qu e a f unç ã o s oc i a l da pr opr i e da d e at ua c om o f on te
da im pos iç ã o d e c om por t am ent os p os i t i vos – pr es t aç ão d e
fa ze r , p or t an t o, e n ão , m eram en te , d e n ã o fa ze r – ao de t en tor
do po d er d e qu e d ef l u i d a pr op ri e da d e. (G RA U, 2 0 08 , p. 24 6).

Assim, salta aos olhos a idéia de que o direito fundamental da


propriedade tem que servir como instrumento para a efetivação de um
desejo coletivo. Para o Estado Democrático de Direito brasileiro,
interessa que o proprietário atue contribuindo para a dignidade de
todos.

Conforme entende Pietro Perlingieri:

T am bém para o pr op ri et ár io , a f unç ã o s o c i al as s um e um a


v a lê nc ia d e pr i nc í p io ger a l. A au to n om ia n ã o é l i vre ar bít ri o :
os at os e at i v i da d es nã o s om en te n ã o po d em pers e gu ir f i ns
an t i- s oc i a is o u n ão - s o c i ais , m a s , par a t er e m rec on h ec im ent o
j ur í d ic o , d e v em s er a v a li á v e is c om o c o nf or m es à ra zã o pe l a
qu a l o d ir e it o d e pr o pr ie d ad e f o i g ara n ti d o e rec o nh ec i do .
As s im , a at i v id a de de go zo e d e d is pos iç ã o d o pr opr i et ár i o
nã o p o de s er ex erc i d a em c o ntr as t e c om a u ti l i da d e s oc ia l o u
de m od o a pr o v oc a r da no à s e gur a nç a , à l i ber d a de , à
d ig n id a de hum an a . ( P ER L ING I ER I, 2 0 07 , p . 22 8) .

Diante disso, o Estado, ao mesmo tempo em que garante ao


proprietário a utilização da propriedade privada, exige que seja
cumprida a sua função social. Então, a legitimidade do uso da
propriedade está condicionada ao cumprimento de sua função social.
Mais ainda, como princípio da ordem econômica, tem como objetivo
assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça
social.
56

Sobre o sentido harmônico entre o direito da propriedade e o


princípio da função social, esclarece Paulo Luiz Netto Lôbo:

A f u nç ão s oc ia l é i nc om pa tí v e l c om a noç ã o d e d ir ei t o
abs o l ut o, op o ní v e l a to dos , em qu e s e adm it e ap e nas a
l im itaç ã o ex t er n a, n eg at i v a. A f u nç ã o s oc i a l im por t a l im itaç ã o
i nt er n a , p os it i v a, c o n d ic io n an d o o ex erc íc i o e o pr ó pr io d ir ei t o.
Líc i to é o i nt er es s e i nd i v i du a l qu a nd o r ea l i za , i gu a lm ent e , o
i nt er es s e s oc i a l. O ex erc íc i o d o d ir e i to in d i v id u al da
pr o pr i ed a de d e v e s e r f ei to n o s e nt i do da u t il i d ad e, n ã o
s om ent e p ar a s i, m as par a t o dos . D aí s er i nc om pa tí v e l c om a
i nér c i a, c om a in ut i l i d ad e , c om a es p ec u laç ão . ( LÔ BO , 2 0 03 ,
p. 2 1 2)

Dissertando sobre o tema, Ana Frazão de Azevedo Lopes


professa que “a função social estaria atendida quando o titu lar da
propriedade cumprisse o seu dever de empregar produtivamente a sua
riqueza de forma a manter e aumentar a interdependência social”
(LOPES, 2006, p. 112). Ainda segundo essa autora, a função social
ressalta “o papel da propriedade como instrumento de assegurar a
liberdade não apenas do titular, mas de todos os membros da
sociedade” (LOPES, 2006, p. 113).

Ademais, a função social da propriedade, como princípio geral


da atividade econômica, determina que o proprietário (ou o titular do
poder de controle sobre a propriedade) tenha, ao mesmo tempo, um
direito e uma função (poder -dever), para buscar o bem da coletividade,
como, por exemplo, o pleno emprego. Isto é o que se extrai das
ponderações de Eros Roberto Grau, verbis:

A pr o pr i ed a d e d ot a d a de f unç ã o s oc i a l ob r i ga o pr opr i et ár i o
ou o t i tu l ar do p od er d e c o n tro l e s o br e el a a o ex erc íc i o des s e
d ir e i to - f unç ã o ( p od er - dev er ) , a té par a qu e s e es tej a a r ea l i za r
o p le n o e mpr e g o . (G R AU , 2 00 8 , p. 2 5 4).

Nesse sentido, conclui Pietro Perlingieri que “a ausência de


atuação da função social, portanto, faz com que falte a razão da
57

garantia e do reconhecimento do direito de propriedade”


(PERLINGIERI, 2007, p. 229).

Sobre a relação entre a função social da propriedade e a função


social da empresa, Ana Frazão de Azevedo Lopes assevera:

O pr inc íp i o d a f u nç ã o s oc ia l da pro pr i ed a de , c uj a d ec orr ênc i a


nec es s ár ia é a f u n ç ão s oc i a l d a em pres a , p od e s er
c ons i d er a d o c om o um a f orm a q ue a Co ns ti tu iç ão e nc o n tro u
de c o nd ic i o nar o ex er c íc i o da a ti v i d ad e em pres ar i a l à j us t iç a
s oc ia l s e m ter qu e r ec orr er a ne n h um c om prom is s o
pr e v i am en te d e term i n ad o . ( LO P E S, 2 0 06 , p . 2 7 9).

Ainda neste estudo, em capítulo seguinte, será desenvolvido


com maior profundidade tema atinente à função social da propriedade,
especificamente, à função social da em presa. Isso porque a atividade
empresarial, para ser legítima, também deve cumprir relevante função
social, tendo como pano de fundo a dignidade da pessoa humana.
58

4 FUNÇÃO SOCI AL DA EMPRES A

4.1 Empresa

A palavra empresa possui diversos s entidos, econômicos e


jurídicos, razão pela qual, antes de seguir neste estudo, pretende -se
especificar o significado que tal vocábulo será empregado. Ademais,
existe distância entre os conceitos técnicos do direito e a linguagem
cotidiana. Destarte, impor tante diferenciar empresário, estabelecimento
e empresa.

O empresário é quem exerce, profissionalmente, atividade


econômica organizada. Nos termos do artigo 966 do Código Civil de
2002, in verbis: “Art. 966. Considera -se empresário quem exerce
profissiona lmente atividade econômica organizada para a produção ou
a circulação de bens ou de serviços”.

Conforme ensina Fábio Ulhoa Coelho,

Em pr es ár io é a p es s o a q u e t om a a i n ic i a ti v a d e or g an i za r um a
at i v i da d e ec o nôm ic a de pr od uç ã o o u c irc u l aç ã o de b ens o u
s er v iç os . Es s a pes s o a po d e s er t a nt o a fí s ic a , q ue em pre g a
s eu d in h e iro e or g a ni za a em pres a i n di v i d ua lm en t e, c om o a
j ur í d ic a , n as c i da da un i ã o d e es f orç os de s eus in t egr a nt es .
( CO EL HO , 20 0 9, p . 6 3 ).

Caso o empresário seja pessoa física, será denominado


empresário individual, o qual, apesar de ser obrigado a se registrar na
junta comercial, é equiparado à pessoa jurídica apenas para efeitos
fiscais. E, apesar de poder destacar uma parte de seu patrimônio para
o exercício da atividade econômica, responde, com seu patrimônio
individual, pelas obrigações contraídas no exercício da atividade
empresarial, sem limites para sua responsabilidade pessoal.
59

Na hipótese de pessoa jurídica, o empresário será chamado de


sociedade empresária, a qual, via de regra, possui p atrimônio próprio e
seus sócios possuem responsabilidade limitada.

A empresa, após o advento do Código Civil de 2002, não pode


ser confundida com sociedade empresária. Deve ser entendida como
sendo a atividade, que visa obter lucros, através do ofereciment o ao
mercado de bens ou serviços, gerados mediante a organização dos
fatores de produção. Vale lembrar que esses fatores são quatro: força
de trabalho, matéria prima, capital e tecnologia.

Conforme entende Fábio Ulhoa Coelho, “se empresário é o


exercente profissional de uma atividade econômica organizada, então
empresa é uma atividade; a de produção ou circulação de bens ou
serviços” (COELHO, 2008, p. 12). Então, a empresa não possui
personalidade jurídica, sendo objeto – e não sujeito – de direito.

Dissertando a respeito do termo empresa, Luiz Antônio Ramalho


Zanoti registra que:

P el o ter m o em pres a s ub t en d e - s e c o nd iç ão a ti v a , aç ã o,
d il i g ênc i a, d en tre o ut ras . Lo g o, em ex is ti nd o em pres a , há
at i v i da d e m ed ia n te o ex erc íc io d e um a s é ri e de a tos
c oor d e na d os , c om pl e x os o u n ã o, c om ob j et i v o es pec íf ic o.
Es s a at i v i da d e tem fi ns ec o n ôm ic os , e v i a à pr o duç ã o ou
c ir c ul aç ã o de be ns o u s er v iç os . Par a o ex er c íc i o d a at i v i d ad e
ec o n ôm ic a s ã o n ec e s s ár ios q u atr o f at or es de pro d uç ã o :
c ap i ta l , tr a ba l h o, m at ér ia - pr im a e tec n o l o g i a. S ubs um e - s e ,
po is , q ue es s es b e ns d e pro d uç ão p os s am pro d u zi r os
r es u l ta d os es p era d os , do h om em e para o hom em , s e f orem
em pr e ga d os de f orm a c oor d e na d a. D aí o f at o de q u e, n a
c onc e it u aç ã o d e em pres a , im p õe - s e a ex ig ênc i a d e q u e e l a
s ej a um en t e o rg a ni za d o . Es s a c o nj u g aç ão d e es f orç os é
r ea l i za d a pe l o em pr es ár i o, em nom e pr ópr i o, em c arát er
ha b it u a l, c om o u s em o c onc urs o de a ti v i d ad e a l he i a,
m edi an t e a or g an i za ç ão e d ir eç ã o d o n eg óc i o. (Z AN O T I,
20 0 9, p . 1 7).

Já o estabelecimento é o conjunto de bens em que a empresa


(atividade, conforme esclarecido nos parágrafos anteriores) é
explorada, exercida. É constituído pelo complexo de bens (materiais e
imateriais) utilizados pelo empresário para o efetivo exercício de
60

atividade econômica. É o que se extrai d as ponderações de Fábio


Ulhoa Coelho, segundo as quais:

Es t a be l ec im ent o em p res a ri a l é o c o nj u nt o d e b ens qu e o


em pr es ár io r eú n e par a ex p l oraç ã o de sua at i v i da d e
ec o n ôm ic a . C om pree n de os b e ns i n d is p e ns á ve is ou út e is a o
des e n vo l v im en to da em pres a, c om o a s m erc ad or i as em
es t o qu e, m áq u i nas , ve íc u l os , m arc a e o u tros s in a is dis t in t i vos ,
tec n ol o g ia , etc . T ra ta - s e de el em en to in d is s oc iá v e l à em pres a.
Nã o ex is t e c om o d ar i níc i o à ex p l oraç ã o de qu a l qu er at i v i da d e
em pr es ar ia l , s em a or g an i za ç ã o d e u m es ta be l ec im ent o .
( CO EL HO , 20 0 9, p . 9 6 ).

Ademais, o Código Civil de 2002 prevê, expressamente, a


definição de estabelecimento, nos termos do seu artigo 1.142, in
verbis: “Art. 1.142. Considera -se estabelecimento todo complexo de
bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por
sociedade empresária”.

Dessa forma, não se pode confundir empresa com a sociedade


empresária e nem com o estabelecimento. Neste sentido, importante
citar a sintética observação de Maria Helena Diniz, englobando os três
conceitos sup ra mencionados:

E mpr es a é a a ti v i d ad e ec o n ôm ic a u n it ar i a m ente es tr ut ur ad a
ou or g an i za d a p ar a a pro d uç ã o o u c irc ul aç ã o d e be ns o u
s er v iç os . E mpr es ár io , i nd i v i du a l ou c o l et i v o, é o t it u l ar d a
em pr es a. Es t a be l ec i me n to é o c o nj un t o de b e ns ,
c ar ac t er i za d os p o r s u a u n id a de de d es t i na ç ão , p o de n do s er,
c om o d i z M i g ue l Re a l e, o bj e to u n it ár io d e ne g óc ios j urí d ic os ,
da í s ua im p ort â nc i a p ara q u e a “ em pres a ” pos s a at i n gi r s u as
f in a li d ad e , p o is o e m pres ár i o pr ec is a r eu n ir m ei os p ara
c ons ec uç ã o c on tí n ua de um obj et i v o t éc n ic o.( DI NI Z, 20 0 9, p.
35) .

Diante disso, pretende -se analisar a função social da empresa,


partindo do conceito de empresa como atividade organizada, a qual é
exercida pelo empresário, que busca otimizar a produção para o
mercado.
61

4.2 Função social

O termo função social, tão importante no Estado Democrático de


Direito, orienta as atividades humanas, no sentido de que os at os
praticados devem visar o bem -estar coletivo. Conforme observa
Eduardo Tomasevicius Filho,

O c o nc e i to d e f unç ã o ter i a s id o f or m u la d o pe l a pr im eir a ve z


por S ã o T om ás de A qu i n o, q u a nd o af ir m ou qu e os b ens
apr o pr ia d os i n di v i d ua l m ente t er i am um des t i no c om um , que o
hom em de v er i a r es p e it ar . (T O M A S E VI CI U S FI LHO , 2 00 3, p .
33) .

Sobre a palavra função, Fábio Konder Comparato assevera que :


“o substantivo functio, na língua matriz, é derivado do verbo depoente
fungor (functus sum, fungi ), cujo significado primigênio é de cumprir
algo, ou desempenhar-se de um dever ou uma tarefa.” (COMPARATO,
1996, p. 40).

No mesmo sentido, Humberto Theodor o Júnior sugere que a


“função quer dizer papel que alguém ou algo deve desempenhar em
determinadas circunstâncias. Falar em função, portanto, corresponde a
definir um objetivo a ser alcançado” (THEODORO JÚNIOR, 2004, p. 45 -
46).

Com relação ao termo social, deve ser entendido como


“pertencente à sociedade humana considerada como entidade dividida
em classes graduadas, segundo a posição na escala convencional:
posição social, condição social, classe social” (MICHAELIS, 1998, p.
1961).

A expressão função socia l, segundo Rodrigo Almeida


Magalhães, pode ser definida como “um objetivo a ser alcançado em
benefício da sociedade” (MAGALHÃES, 2007, p. 342).
62

No mesmo sentido, Ana Frazão de Azevedo Lopes afirma que a


função social orienta o exercício da externalização de interesse
privados para o bem da sociedade, “acabando com o seu caráter
arbitrário e pessoal” (LOPES, 2006, p. 96).

Dissertando sobre o tema, Francisco dos Santos Amaral Neto


observa que:

Em pr es tar ao D ir e it o um a f unç ão s oc ia l s i gn if ic a , p ort an t o,


c ons i d er ar q u e os i nt e res s es d a s oc i e da d e s e s o br e põ em aos
i nt er es s es do in d i ví d u o, s em qu e is s o im pl iq u e,
nec es s ar iam en t e, a a n u laç ã o d a p es s o a h um an a , j us t if ic a n do -
s e a aç ão d o Es t ad o pe l a n ec es s i d ad e d e s e ac ab ar c om as
i nj us tiç as s oc ia is . F unç ã o s oc i a l s i g n if ic a n ã o - in d i v id u a l,
s en d o c r it ér i o de v a l or aç ã o d e s it u aç õ es j urí d ic as c o nex as a o
des e n vo l v im en to d as at i v id a d es d e o r dem ec o n ôm ic a .
( A M AR A L N ET O , 20 0 3 , p. 3 6 7).

Pietro Perlingieri entende que falar sobre função social é falar


de algo especial. Para es se autor,

A f u nç ão s oc i a l, c o n s tru íd a c om o o c onj un t o dos l im it es ,


r ep r es e nt ar ia um a n o ç ão s om e nt e de t i p o ne g at i v o v o lt a da a
c om pr im ir os po d eres pr opr i e tár i os , os q u a is s em os lim i tes ,
f ic ar i am ínt e gros e l i vr es . Es te res u lt a do es t á pr óx im o à
per s p ec t i v a tr a d ic i o n a l. Em um s is tem a i ns p ira d o n a
s o li d ar ie d ad e p o lí t ic a, ec o nôm ic a e s o c i al e ao p l e no
des e n vo l v im en to d a pes s o a o c o nt eú d o da f u nç ão s oc i al
as s um e um pa pe l d e ti p o pr om oc i on a l, no s en t id o d e q u e a
d is c i p l in a das f o rm as de pr opr i e da d e e as s uas i n t er pr et aç õ es
de v er i am s er atu ad a s par a g ara nt ir e p ara prom o v er os
v a lor es s o br e os qu ai s se f un d a o ord e nam e nt o.
( P ER L ING I ER I, 2 0 07 , p. 2 2 6).

Ainda segundo esse autor, “a função social é também critério de


interpretação da disciplina proprietária para o juiz e para os operadores
jurídicos” (PERLINGIERI, 2007, p. 227).

Então, pode-se dizer que cumprir uma função social é atingir


uma finalidade útil para a coletividade, e não apenas para as pessoas
diretamente envolvidas. Ela determina uma limitação interna , no
sentido de que legítimo será o interesse individual quando realizar o
63

direito social, e, não apenas quando não o exercer em prejuízo da


coletividade.

O princípio da função social, dessa forma, impõe ao proprietário


(ou a quem for exercer o direito de usar, gozar e dispor da
propriedade), bem como ao empresário – conforme será visto adiante –
a prática de comportamentos em benefício da sociedade.

4.3 Função social do contrato

Contrato, conforme observa Orlando Gomes, “é todo acordo de


vontades dest inado a constituir uma relação jurídica de natureza
patrimonial e eficácia obrigacional” (GOMES, 1998, p. 12). Contratos,
segundo entende Rachel Sztajn, podem ser definidos como “títulos que
permitem a transferência ou atribuição patrimonial entre diferent es
partes em razão de negócio jurídico celebrado” (SZTAJN, 2004, p. 30).
Ainda, para essa autora, “contratos facilitam a circulação da
propriedade; empresas organizam a produção para os mercados e
estes tornam eficiente a troca econômica” (SZTAJN, 2004, p. 29).

Como sabido, no sistema capitalista, o contrato se tornou uma


das mais importantes formas de operação econômica. Praticamente
todas as relações econômicas partem dele. Também é inerente a esse
sistema a liberdade de contratar, a qual decorre da livre iniciativa.

Nesse sentido, pode -se dizer que “a liberdade de iniciativa


envolve a liberdade de indústria e comércio ou liberdade de empresa e
a liberdade de contrato” (SILVA, 2007, p. 793). E, ainda, como registra
Caio Mário da Silva Pereira: “o mundo mo derno é o mundo do contrato”
(PEREIRA, 2004, p. 9).

Para Humberto Theodoro Júnior, as pessoas utilizam o contrato


como instrumento para realizar a circulação dos bens patrimoniais:
64

O ú n ic o e es s e nc i al obj et i v o d o c on tr at o é o d e prom o v er a
c ir c ul aç ã o d a r iq u e za , de m od o qu e pr es s u põ e s em pre par t es
d if er e n tes c om i n ter es s es d i vers os e o p os t o s . P ara h arm on i za r
i nt er es s es c o nf l it a nt e s , o c o n tra to s e d is põ e a s er út i l n a
def in iç ã o de c om o a pr ox im á - l os e d ar - lh es u m a s aí da ne g oc ia l .
Nu nc a, t o da v i a, o in ter es s e d o ve n de d or s erá i gu a l a o do
c om pr a dor , o do m utu an t e ig u a l a o d o m ut uár i o, o d o l oc a d or
i gu a l a o d o l oc at ár i o, o d o em pre it e ir o ig u al ao d o do n o d a obr a
e as s im por di a nt e. (T HE O DO RO J ÚN IO R, 2 00 4 , p. 4 6) .

Visando regulamentar, de forma expressa, a utili zação do


contrato, o artigo 421 do Código Civil brasileiro de 2002 prevê o
princípio da função social do contrato. Dispõe essa norma: “A liberdade
de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do
contrato”.

A função social do contrato já estava implícita no ordenamento


jurídico brasileiro antes mesmo da vigência do Código Civil de 2002,
eis que decorre do valor social da livre iniciativa e da função social da
propriedade, previstos expressamente na Constituição da República de
1988.

Esse princípio prevê uma limitação à liberdade contratual,


exigindo que esta seja exercida com observância de suas
consequências públicas, sendo certo que inexiste contrato que não
afete a coletividade. Conforme os dizeres de Humberto Theodoro
Júnior,

A f u nç ão s oc i a l do c on tr at o c ons is te em ab or d ar a l ib er da d e
c on tr at ua l em s eus ref l ex os s obr e a s oc ie d a de ( terc e ir os ) e n ã o
ap e nas no c am po d as re laç õ es e ntr e as p ar t es q ue o es t i p ul am
( c on tr at a nt es ). (T H EO DO RO J Ú NI O R , 20 0 4, p. 3 1) .

Dessa forma, o individuali smo inconsequente e a autonomia


irrestrita não encontram guarida no Estado Democrático de Direito, que
privilegia os ditames da justiça social. E, ainda, conforme entende
Claudio Luiz Bueno de Godoy, a função social do contrato é uma
projeção da função soc ial da propriedade:
65

S en d o a f u nç ã o s oc i a l d o c o ntr at o um a proj eç ão da f u nç ão
s oc ia l da pr o pr ie d ad e , d e qu e v erd a de ir am en t e s e or i gi n a, é
bom ac e nt u ar qu e a pr opr i e da d e, h oj e, vem ex p líc i ta n a
Co ns t i tu iç ã o c om o d ir e it o e g ara n ti a i n d i vi du a l, por is s o s e u
ac es s o , pe l o c o ntr at o – e aí a his t óric a l i g a ç ão e n tre am b os os
i ns t it u tos – d e ve s er d em oc rat i za d o (ar t. 5 º, X X X III) . P or ou tr a,
ta l s e dá na ex a ta m ed i d a em que o c o nt rat o f unc i o na l i za d o
i ns tr um ent a l i za a aq u i s iç ão dos b ens v i ta is à p es s oa h um ana ,
m as , da m es m a form a, m arc ad o pe l a n ec es s i d ad e de
at e nd im en to nã o s ó do in t eres s e d a p art e c om o tam bém ao
at e nd im en to de in t er es s es e v a lo res s oc i a is . E ta is va l or es
s oc ia is enc o ntr am - s e, pr im eir o, na pr ópr i a C o ns t i tu iç ão .
( G O DO Y, 20 0 4, p . 1 22 ).

Sobre a atitude d o poder judiciário frente a um contrato que não


cumpre a sua função social, professa Humberto Theodoro Júnior que:

S e o c o nt ra to n ã o c u m pre s u a f u nç ã o s oc i a l, is to é , s e re v e l a
of e ns i v o a d ir e it os d e terc e ir os ou agr i d e i nt eres s es d e or d em
pú b l ic a c aros a o c ons e ns o da s oc i e da de e s e m os tr a
i nc om pa tí v e l c om c om an d os c o g en tes d o d i re it o p os it i v o, ao
j ui z c om pet e a p l ic ar - l he a s a nç ã o d a nu l i da d e o u d a
i nef ic ác i a, c onf orm e o c as o. S e is to nã o f or s uf ic i e nt e p ar a
e v it ar o p rej uí zo d e terc ei ros , a t ut e l a aos pre j u d ic a d os
c ons is t ir á em im p or aos inf r at ores a r es p ons a b il i d ad e c i v i l,
s uj e i ta n do - os ao res s arc im ent o pró pr i o d os a t os i l íc it os .
( T HEO D O RO J Ú NIO R, 2 0 04 , p. 14 5 - 14 6) .

Então, caso o contrato se desvie de sua função social, deverá


incidir uma sanção jurídica , pois a realização de um acordo de
vontades sem observar esse princípio atinge o campo da ilicitude.

4.4 Função social da empresa

Conforme já exposto, exercer uma função social significa atingir


um objetivo útil, não apenas para os sujeitos diretament e envolvidos,
mas também para a sociedade. Ademais, conforme observa Rodrigo
66

Almeida Magalhães, “considerando a função econômica da empresa


como fonte geradora de riquezas, impostos, emprego e lucro, não é
certo dizer que, só por funcionar, a empresa cumpr e sua função social”
(MAGALHÃES, 2007, p. 345).

A empresa, no mundo atual, tem extrema importância, gerando


reflexos imediatos na coletividade. Ela concentra a prestação de
serviços, fornecimento de bens, geração de empregos, coleta dinheiro
para o Estado – por meio da arrecadação fiscal – bem como contribui
para a constante e crescente interligação da economia de mercado.

Dessa forma, possui relevante poder sobre a ordem econômica


nacional e global, eis que representa uma fonte inesgotável de
parcerias. Ademais, não se pode mais aceitar uma visão obtusa, alheia
à função social da empresa. Sobre a importância da empresa, Ana
Frazão de Azevedo Lopes sugere que:

A em pr es a é v is t a c om o ins t it u iç ão c uj a im port â nc i a
tr a ns c en d e à es f era e c on ôm ic a e p as s a a a barc ar in t eres s es
s oc ia is dos m ais r e l e v an t es , c om o a pr ó pr ia s obr e v i v ênc i a e o
bem - es t ar d os tr a ba l ha d or es qu e p ar a e l a pr es t am s eus
s er v iç os e dos dem a is c i da d ãos qu e d i v i dem c om el a o
m esm o es paç o s oc i a l. (LO P E S, 2 0 06 , p . 11 9) .

O homem, no contexto do Esta do Democrático de Direito, é


visto, necessariamente, em integração com a coletividade, razão pela
qual as restrições aos interesses individuais em face da sociedade são
inerentes a toda atividade econômica.

Então, a empresa, ao reunir enorme capacidade de influência


perante a coletividade, não pode ser tratada apenas como uma
produtora de riqueza, mas também como um poder. Este – o poder –
não traz somente direitos, mas também obrigações. Dessa forma, deve
ser exigida da mesma uma proporcional – e correspondente –
responsabilidade social. Neste sentido, assevera Eduardo
Tomasevicius Filho:
67

A f unç ã o s oc i al da em pres a c o ns t it u i o po d er - de v er d e o
em pr es ár io e os adm i nis tr ad or es d a em pre s a h arm on i zar em
as a ti v i d ad es d a e m pres a, s eg u nd o o s in ter es s es d a
s oc ie d ad e, m ed i an te a o be d iê nc i a d e de t er m ina dos de v er es ,
pos i t i vos e ne g at i v os . (T O MA S E VI CI U S FI LH O , 2 00 3, p. 4 0).

O empresário possui uma relação de propriedade para com os


bens de produção, bem com o estabelecimento. Sobre a relação entre
função social da pr opriedade e empresa, Ana Frazão de Azevedo Lopes
observa que:

O po d er - de v er do pro pr ie tá ri o de da r à c ois a um a d es t i n aç ã o
c om pat í ve l c om o i n ter es s e d a c ol e ti v i d a de tr ans m ud a - s e,
qu a nd o t ais be ns s ão inc or por a d os a um a ex p lor aç ã o
em pr es ar ia l , em pod er - de v er do t i tu l ar d o c o ntr o le de d ir ig ir a
em pr es a p ar a a r e a li z aç ã o dos i nt er es s es c o le t i vos . Por t an to ,
a ênf as e d a f unç ã o s oc ia l d es loc a - s e d a p rop ri e da d e p ara o
po d er de or g an i za ç ão e c on tro l e q ue a em pres a ex erc e s obr e
pes s o as e s o br e be ns de pro d uç ã o . ( LO P E S, 2 0 06 , p. 12 4).

Ademais, todas as sociedades empresárias são constituídas


através de um contrato, com exceção das sociedades por ações. E,
ainda, todas as relações entre o empresário e as pessoas ou entidades
por ele afetadas ocorrem por meio de contr atos.

Diante do liame contratual, bem como da relação de


propriedade, ambos com normas positivadas que determinam o
cumprimento de uma função social, percebe -se a inseparável ligação
da empresa com o exercício de uma função social.

Nesse sentido, os contr atos influenciam -se uns aos outros, bem
como os direitos de propriedade. Então, se toda atividade econômica
organizada para obtenção de lucros parte da utilização da propriedade
e de relações contratuais, pode -se afirmar que a função social da
empresa deco rre da função social da propriedade e da f unção social do
contrato. É o que se extrai das ponderações de Ana Frazão de Azevedo
Lopes, segundo as quais:
68

Dec or r ênc i a n ec es s ár i a d o rec on h ec im ent o da f u nç ão s oc i a l


da pr opr i e da d e e d a f unç ã o s oc i a l d o c o ntr at o f o i a p os ter i or
d is c us s ã o s o bre a f u n ç ão s oc i a l d a em pres a , c om o ins t it u iç ã o
c uj a im por tâ nc i a s ó aum en t ara n o s éc u l o X IX , n ã o s ó n o
âm bit o ec on ôm ic o , m a s tam b ém no po l ít ic o e no s oc i a l. Com
ef e it o, a em pres a as s um ir a o p a pe l de c é l u la s oc i al
c at a l is a d ora d e as p ir aç õ es , d e ans e i os d e pr os p er i da d e; de
c r ed or a e , ao m es m o tem po , d e ve d ora da c om un id a de , o q u e
e v id e nc i a v a a s ua n at ure za c om o c om un i d a de d e tra b a lh o e
de c a p it a l. S e t o da a ti v i da d e d a em pres a p a rti a d a u t il i za ç ão
da pr o pr ie d ad e e do c o nt ra to , é i n e qu í v oc o q ue as
tr a ns f or m aç õ es s o br e es t es i ns t i tu tos ter i a m ref lex os d ir et os
na pr ó pr ia em pres a. P or ou tro l a do , a s ua c res c e nt e
im por tâ nc ia f e z c o m que um a at e nç ã o es p ec ia l f os s e
c onf er i d a a os b ens d e pr o duç ã o. (L O PE S , 2 00 6 , p. 1 1 3 - 11 4).

No mesmo sentid o, as palavras de Sérgio de Abreu Ferreira:

A f u nç ão s oc ia l d a e m pres a de v e s er c om pre e n di d a n o f e ix e
de i n ter es s es c om po s to p e la pr o pr ie d ad e e pe l os c o ntr at os
( em pr es ár io , em pr eg a dos e c o ns um id or es ), qu e s e e ntr e l aç am
a p ar t ir d e s u a r a zã o es tr ut ur a nt e. (F ER R EI RA , 2 00 9 , p. 5 1 8).

Ressalte-se que a Carta Magna de 1988, ao estabelecer a


função social da propriedade, em seu artigo 5º, inciso XXIII, bem como
no artigo 170, inciso III, indiretamente, definiu essa mesma função à
empresa, a partir da principal r azão de sua existência, que é a
circulação de riqueza, nesta, incluída, a propriedade. Neste sentido,
Eros Roberto Grau assevera que:

O pr i nc í p io d a f u nç ã o s oc ia l d a p r opr i e da d e ga n ha
s ubs t anc i a li d a de p r ec is am en t e qu a n do ap l ic a d o à
pr o pr i ed a de d os b en s de pr o d uç ã o, ou s ej a , n a d is c ip l i n a
j ur í d ic a da p ro pr ie d a de de t a is b ens , im p l em ent a da s o b o
c om pr om is s o c om a s ua des t i naç ã o. A pr opr i e da d e s o br e a
qu a l os ef e it os d o pr i nc í p io s ã o r ef l e t id os c om m aior gr au d e
i nt ens i d ad e é j us t am ent e a pr opr i e da d e, e m din a m is m o, dos
be ns de pr od uç ão . N a ver d ad e , a o n os re f erirm os à f u nç ão
s oc ia l d os b e ns d e pr od uç ão em din am is m o, es t am os a a l ud ir
à fu nç ão s oc i a l d a e m pres a . (G R AU , 2 00 8 , p . 23 8) .
69

Dessa forma, a empresa, para cumprir sua função social, não


basta se manter at iva. Ela deve exercer suas atividades visando o bem
comum, sem praticar atos lesivos à coletividade.

A autonomia do empresário não é um completo exercício do livre


arbítrio. Os atos empresariais não devem apenas evitar fins anti -
sociais, mas, além disso, devem estar em conformidade com a razão
pela qual a livre iniciativa foi garantida e reconhecida: busca da
dignidade e da justiça social. Para Ana Frazão de Azevedo Lopes, “a
autonomia traz em si a necessária compatibilização entre a liberdade e
a igualdade a partir de um critério de justiça” (LOPES, 2006, p. 232).

Dissertando sobre o tema, Pietro Perlingieri declara:

O ex er c íc i o da em pr e s a, a tu a do d e ac ord o c om o m áx im o d e
c oor d e naç ã o p os s í v e l, is t o é de pro gr am aç ão , e v i tar i a, v .g .,
em ter m os d e “s e g ura nç a”, c om pr om ete r a s a úd e d os
hom ens , o am bi e nt e e , em ger a l, o e q ui l í bri o ec o l ó gi c o (t om e -
s e, c om o ex em pl o, o tem a d a ec on om ia de e n erg i a e as
pr o i b iç ões c o nt ra as p o lu iç ões e as s of is t ic aç ões ) . M ais
m ar c ad a d e v e s er, t a m bém no i n tér pr et e , a c ons c i ênc i a d e
qu e o c r es c im ent o e c on ôm ic o e o c o ns e qu e nt e b em - es t ar
( be n es s er e ) qu a nd o n ão pres er v am a q ua l i da d e d e v i da , o u
s ej a , a “ l ib er d ad e” e a “d i g n id a de h um ana ”, nã o s ã o
pr o gr es s o e des e n vo l v im ent o s oc i al e c o ns t i tuc i on a lm en te
v a lor á v e is , m as s e tr ad u zem , an tes o u d e po is , em um m al -
es t ar p ar a to d os . ( P E RL ING I ER I, 2 0 07 , p . 2 28) .

O homem é um ser social por natureza e, por isso, a empresa,


no Estado Democrático de Direito, deixa de ser vista apenas sob a
perspectiva de uma atividade que busca apenas lucros. Posto i sso,
transforma-se em vínculo intersubjetivo, entre diversas pessoas e bens,
a respeito da organização dos fatores de produção, atuando, também,
com a finalidade de exercer uma função social.

Não se trata de uma simples busca ávida por lucros, mas sim o
regular desempenho de uma atividade no interesse de todos que
possam ser beneficiados ou prejudicados pela atividade empresarial. O
direito individual da busca por lucros – principal escopo de toda
70

atividade econômica – não é esquecido, eis que inerente a t oda


empresa.

Então, a empresa deixa de ser vista como instrumento de


satisfação egoística dos sócios e administradores da sociedade
empresária, e passa a ser analisada dentro de um contexto social, eis
que, sob o contexto de um Estado Democrático de Direi to, as
atividades devem ser voltadas para a realização de valores como a
liberdade e a dignidade e, por isso, não se pode permitir que autonomia
se confunda com alvedrio.

Apesar disso, não se pode esquecer a função primordial da


empresa – busca por lucros – e nem que o empresário, da mesma
forma que todo ser humano, é um maximizador de seus próprios
interesses. Posto isso, tais características não podem ser
desconsideradas, a pretexto de cumprir, unicamente, uma atividade
assistencial. É neste sentido a obs ervação de Rodrigo Almeida
Magalhães, que sustenta:

Lo g o, a f u nç ã o s oc i a l nã o t ir a a l i b erd a d e d o in d i ví d u o d e a g ir
de ac or do c om os pr ó pr ios i n ter es s es , m as ter á d e ver es c om
a s oc ie d ad e d et er m ina dos p e l os pr in c íp i os e n orm as
j ur í d ic as , pos i ti v a das ou n ão , l im ita n d o a a ut o nom i a pr i v a da
em r a zã o d o bem c om um . D ia nt e d o ex p os t o, a s oc i ed a de s ó
po d er á ex i g ir d as em pres as a f unç ã o s oc i a l d as a ti v i d ad es
qu e c o ns t it u em obj e t o d e l a, o u s ej a, l i g ad o a s u a at i v i da d e
ec o n ôm ic a ex erc i d a. Nã o é p os s í v e l ex ig ir , c om f u nd am en to
na f u nç ã o s oc i a l, d e v eres par a os q u ais as em pres as nã o
f or am c r ia das , p orq u e s en ão s ó t er i a d e ver es e n ão di re i tos .
( M AG A LH Ã E S, 2 0 0 7, p. 3 4 3).

Uma sociedade empresária que não busca lucros não sobrevive,


sendo certo que, se deixar de existir, ca usará, inevitavelmente,
prejuízos para a economia, a qual, na atualidade, é interligada. Neste
sentido, a empresa deve ser exercida com a observância de sua função
social, que é diferente de uma função de assistência social, conforme
sugere Ana Frazão de A zevedo Lopes, a partir dos seguintes dizeres:
71

A f unc i o na l i za ç ã o d os dir e it os n ão po d e v i o l ar, p o is , o âm bi to


em que a p es s oa d e v e a tu ar c om o s er a ut ô nom o, c am pos em
r e laç ã o a o q ua l n ão é líc it o c o n ver te r o i nd i v íd u o em m eio
par a os f i ns s oc i ais . ( LO P E S, 2 0 06 , p. 12 6) .

Do mesmo modo, mitiga -se a liberdade de agir do empresário,


mas ele ainda é livre no exercício de suas atividades – livre arbítrio
que decorre da livre iniciativa – sem que o Estado interfira. Destarte, a
intervenção estatal estará legitima da quando o empresário insistir em
exercer seu alvedrio de modo socialmente prejudicial.

Dessa forma, a função social não destrói a liberdade do


empresário e nem torna a empresa um simples meio para fins sociais,
mesmo porque isso implica em ofensa à digni dade dos empresários,
bem como violação à livre iniciativa. A função social não transforma
uma sociedade empresária em órgão público. Sua finalidade é o de
mostrar o compromisso e as responsabilidades sociais da empresa,
sem deixar de lado a busca do bem s ocial enquanto exerce atividade
econômica. Neste sentido, a observação de Raquel Sztajn:

A r ac i on a l id a de dos a ge n tes , um dos pos tu l ad os ec o nôm ic os ,


qu e l e v a à pr oc ur a da m ax im i zaç ão d e ut i l i da d es , e a
ef ic i ênc i a al oc at i v a, s eg u nd o es s a vis ã o, v ão a o e nc o ntr o da
i dé i a d e s o li d ar ie d a de e ger aç ão de b em - es tar c ol e ti v o .
( SZT AJ N, 20 0 5, p . 7 6) .

A função social da empresa atua como um limite à livre iniciativa


econômica, eis que o principal objetivo do empresário é o lucro.
Ademais, na atualidade, quem possui m aior capacidade de fornecer o
bem-estar não é a Igreja, nem a família, muito menos o Estado, mas
sim a empresa. Os empresários, cada vez mais, se interessam com a
qualidade de vida de seus empregados, administradores e
consumidores, bem como com toda a cad eia que é afetada por suas
atividades, eis que isso será benéfico para a solidificação de sua
atividade.
72

Tendo em vista que a Constituição da República de 1988 firmou


no Brasil em Estado Democrático de Direito, com uma evidente
exigência da busca de um equ ilíbrio entre o interesse individual e o
coletivo, a função social da empresa insurge e se destaca, sobretudo a
partir de suas relações com todos que podem ser por ela afetados.

Nesse sentido, após a Carta Magna de 1988, sem lugar a figura


do homo oeconomicus que, para Ana Frazão de Azevedo Lopes, pode
ser definido como “um homem descontextualizado de sua cultura e
hábitos, que age como maximizador racional e egoísta de prazer,
orientando suas ações de forma estratégica e por meio de cálculos de
utilidade” (LOPES, 2006, p. 302)

Ressalte-se que o princípio da função social da empresa impõe


ao empresário o dever de exercer suas atividades em benefício da
coletividade e não, meramente, de não o exercer em prejuízo de
outrem. Destarte, a função social da empres a atua como forma de
determinação da prática de comportamentos positivos – obrigações de
fazer, portanto, e não, apenas, de não fazer – ao empresário.

Dessa forma, a função social da empresa é uma forma de


compatibilizar a fruição individual da atividade econômica e o
atendimento da sua função social, visando que os empresários não
abusem do seu direito, no exercício da administração empresarial.

Sobre a função social da empresa, registra Eros Roberto Grau:

A f u nç ã o s oc ia l d a em pres a – q ue s u po nh o j á es t i ves s e
em br i on ar i am ent e p o s tu l ad a n a c o ntr i bu iç ão d e C ou rc e l l e -
S en e u il , na af irm aç ã o d a f u nç ã o s oc i al d o c om erc i a nt e, d o
pr o pr i et ár i o e d o c ap i ta l is t a – a par ec e i n d i ret am en te no art .
42 d a C ons t it u iç ã o I t a li a na : “ É l i vr e a i n i c i at i v a ec on ôm ic a
pr i va d a. N ão p o de , to da v i a, d es en v o l v er - s e em c on tras t e c om
a u t i li d ad e s oc ia l o u de m o do a c aus ar d a no à s eg ur a nç a , à
l ib er d ad e, à d i gn i d ad e hum an a. A le i d e term i na os pr og ram as
e os m ei os d e f i s c a li za ç ão d es t i na d o s à d ireç ã o e
c oor d e naç ã o d a at i v i d ad e ec o nôm ic a, p ú b l ic a e pr i v a da , p ar a
f ins s oc ia is ” . Ne l e r es u lt a c ons a gra d a, em s ua i n te gr a li d ad e –
o s e gu n do i nc is o d a d is p os iç ã o a u tor i za n d o a im p os iç ã o d e
l im ites n e ga t i vos e o t erc e ir o a im pos iç ão d e l im ites p os it i v os
à i n ic i a ti v a ec o nôm i c a – a f unç ã o s oc i al da in ic i at i v a
ec o n ôm ic a , p ort a nt o a f unç ã o s oc i a l d a em p res a . O pr i nc í p i o
73

es t á t am bém c ons a gr ad o no d ir e it o pos i ti v o br as i l eir o . O art .


15 4 e o par á gr af o ú ni c o d o art . 1 16 da le i 6. 4 04 /7 6 ref erem ,
de m od o ex pres s o , res p ec ti v am en te , a f unç ã o s oc i al da
em pr es a e a f u n ç ã o s oc ia l d a c om pan h i a. (G R AU , 20 0 8, p.
23 8) .

Estabilizado o entendimento sobre a função social da empresa,


cabe mencionar sobre qual o critério que deva ser utilizado para
conciliar esse dever com o aspecto individual inerente às atividades
econômicas. Para Ana Frazão de Azevedo Lopes, para essa necessária
harmonização deve -se atentar para “a proporcionalidade e a
ponderação entre os diferentes valores em conflito” (LOPES, 2006, p.
147).

Diante disso, pode -se afirmar que se trata da busca pelo


interesse público de forma menos onerosa para o empresário. Então,
as atividades econômicas devem visar benefícios para a coletividade,
observados critérios razoáveis de proporcionalidade e ponderação,
sendo certo que a busca pelo lucro – durante o exercício de ati vidade
econômica – é perfeitamente conciliável com a imposição do exercício
da função social. Neste sentido:

O s d ir e it os in d i v id u a i s , a tr ib u íd os a c ad a c i da d ão , d e vem
c oex is t ir c om os in t eres s es /d e v eres s u p e ri ores d o Es t a do
i ns c r i t os no t ex to c ons t it uc io n a l e q ue , em t es e , d e ve
c o inc i d ir c om os i nt e res s es c o le t i vos . Po d em e de v em os
d ir e i tos p art ic u la res t er v id a e s erem ex erc i ta d os a o l ad o dos
i nt er es s es g er ais , pr oc ur a n do c om es t es n ão e ntr ar em
c onf l it o. ( L E A L, 19 9 8, p. 1 1 8).

Assim, salta aos olhos a i déia de que as atividades empresariais


tem que servir como instrumento para a efetivação de um desejo
coletivo. No contexto do Estado Democrático de Direito brasileiro,
interessa que o empresário atue sem causar prejuízos à coletividade e,
ainda, contribuindo para a dignidade de todos.
74

4.5 Responsabilidade social

A responsabilidade social decorre da função social e, conforme


observa Rodrigo Almeida Magalhães, “seguindo entendimento de que a
função social somente está ligada ao objeto da empresa, surge o termo
responsabilidade social” (MAGALHÃES, 2007, p. 346). Neste sentido,
Alexandre Husni assevera que:

Do c um pr im en t o a t i v o d a f u nç ão s oc i al d ec or re a id é i a d e
em pr es a s oc i a lm ent e res p o ns á ve l , q u e c o nt ri bu i p ara c om a
j us t iç a s oc ia l no c am po das ex c lus õ es e o des en v o l v im ent o
s us t e nt á ve l d e f orm a p l en a e es p on t ân e a , s em im pos iç ã o
l eg a l. ( H U SN I, 2 0 07 , p . 63) .

Sobre o conceito de responsabilidade social, Eduardo


Tomasevicius Filho ensina que:

A r es p o ns a b i li d ad e s oc i a l d as em pr e s as c o ns is t e n a
i nt egr aç ã o vo l u nt ár ia de pr e oc u p aç õ es s oc i a is e am bi e nt a is
por p ar t e d as em pr es as n as s u as o p er aç õ es e na i nt er aç ã o
c om a c om un id a de . A lém d is s o , s er i a um a f orm a d e l e v ar
ou tr as ins t it u iç õ es a c o la b orar c om o Es t ad o na b us c a d a
j us t iç a s oc ia l , a o i n vé s de f ic a r es p er a nd o qu e o es t ad o t om e
pr o v i d ênc i as n es s as á reas . (T O M A S E VI CI U S FI L HO , 20 0 3, p.
46) .

A responsabilidade social não é um compromisso exclusivo dos


empresários, conforme se extrai das ponderações de Lilian S. Outtes
W anderley e Jane Collier, sobre o conceito de responsabilidade social
empresarial, segundo as quais:

É o c om prom is s o d as em pres as em c on tr ib u ir p ar a o
des e n vo l v im en to s us t e nt á ve l , j u nt am en t e c om os
em pr e ga d os , s uas f am íl i as , a c om un i d ad e lo c a l e a s oc i ed a de
c om o um tod o , vis a n do a m el h or ia d a q u a li d ad e de v i d a.
(W ANDER L E Y; CO L L I ER , 2 00 0 , p. 4 6) .
75

É inegável que as variações nas condições econômicas dos


empresários geram reflexos na comunidade onde estão inseridos. Além
disso, dependendo do porte de uma sociedade empresária, a oscilação
de suas condições financeiras pode influenciar no mercado de outras
localidades, até mesmo em território estrangeiro, tendo em vista que a
economia atual é globalizada e interligada.

Qualquer dano sofrido pelo empresário, em maior ou menor


proporção, gera reflexos so ciais e, por isso, todo empresário possui
uma relevante responsabilidade social, eis que suas decisões
influenciam a vida de um número indeterminado de pessoas.

Para Rodrigo Almeida Magalhães, o exercício da


responsabilidade social consiste, especificament e, na decisão do
empresário em contribuir, voluntariamente, para o desenvolvimento
econômico sustentável, conforme se extrai de suas ponderações,
segundo as quais: “O empresário voluntariamente decide contribuir com
objetos distintos de seu âmbito de ativi dades para fazer uma sociedade
mais justa, contribuindo para o desenvolvimento social e ambiental do
país” (MAGALHÃES, 2007, p. 346).

Dessa forma, desempenhar a responsabilidade social consiste


no exercício da autonomia privada dos sócios em contribuir,
voluntariamente, para o desenvolvimento econômico sustentável da
sociedade.

Maria Helena Diniz, ao dissertar sobre a responsabilidade social


da empresa, registra que:

A em pr es a tem res p ons a b il i d ad e s oc i a l e des em pe nh a um a


im por ta nt e f unç ã o ec o nôm ic a e s oc ia l , s en d o e lem en t o de p a z
s oc ia l e s o l i dar i e da d e, c ons t it u in d o um ins tr um ent o de po l ít ic a
s oc ia l e d e p rom oç ã o da j us t iç a s oc i a l. S u a res p ons a b il i d ad e
s oc ia l a im pu ls i on a a pro p ic i ar, c om s ua a ti v i da d e ec on ôm ic a ,
c om un ic aç ã o m ais ab ert a c om s eus c o l ab ora d or es e c om a
c o le t i vi d ad e , m el h or e s c o n diç õ es s oc ia is , g ar an t in d o s u a
s obr e v i v ênc i a n o m er c ad o g l ob a l i za d o, p or s er f at or d ec is i v o
par a s er c res c im en to , v is to q u e ga n har á o res pe i to d e s e us
76

c o la b or a d ores e c ons um id ores e pro v oc ar á s u a i ns e rç ã o n a


s oc ie d ad e . ( DI NIZ , 2 0 09 , p . 33) .

Nesse sentido, pode -se afirmar que a prosperidade da empresa


possui conexão com a prosperidade da comunidade em que está
inserida. Ademais, a empresa afeta e é afetada por toda uma cadeia
social, a qual pertencem os empregados, os sócios, os fornecedores,
os consumidores, o mercado, o meio ambiente, enfim, toda a cadeia
responsável pela própria razão de ser da empresa.

Nesse contexto, a responsabilidade social deve ser entendida


como o respeito aos direitos e interesses dos que se situam em torno
das empresas. Daí decorre a expressão stakeholder, que “é um termo
usado em administração que refere -se a qualquer pessoa ou entidade
que afeta ou é afetada pelas atividades de uma empresa”
(STAKEHOLDER, 2009). Dessa forma, stakeholders são os indivíduos,
grupos, instituições ou ambiente, influenciados ou que influenciam a
atividade empresarial.

Esse sentido do termo stakeholder também é extraído das


ponderações de Luiz Antônio Ramalho Zanoti, segundo as quais:

A bus c a de um a s oc ie d ad e s us t en tá v e l im põe a
c ons c i e nt i za ç ã o d os e m pres ár i os de qu e h á um a c om uni da d e
no i n ter i or das c or p oraç õ es e no e nt or n o des tas , qu e é
af et a da , d ir et a o u i n d ir et am ent e , pos i t i va o u n eg at i v am en te ,
pe l os im p ac t os d as d e c is ões qu e os em pres ár ios t om am . Com
ef e it o, n o des em pe n h o d e s u as at i v i da d es ec o nôm ic as , as
em pr es as s e in ter - re l a c i on am c om es s es ato res q u e s ã o a l v os
das in ic i at i v as ét ic a s d e s eus n e g óc i o s , os c ham ad os
s tak e ho l de rs , v e z q u e e l a n ão s e c ons t it u i num e nt e is o l ad o
da s oc i e da d e. (Z A NO T I, 2 0 09 , p. 12 5) .

Destarte, a responsabilidade social envolve atividades que


geram benefícios para os stakeholders, não ligadas ao objeto social.

A responsabilidade social empresarial torna -se, cada dia mais,


necessária, eis que a vontade do ser humano é ilimitada, os r ecursos
são escassos e o Estado optou por um raio mínimo de atuação,
77

transferindo, destarte, para o âmbito privado, parte considerável da


competência regulatória que lhe pertenceu. Ele – o Estado – dessa
forma, incapaz de cumprir com todos os seus deveres perante a
sociedade, é ajudado pelo empresário o qual, como maximizador de
seus próprios interesses, é claro, buscará algum benefício econômico
com esses atos. Ademais, o aumento desenfreado da busca por lucros
pelo empresário, à custa de prejuízos sociais , ocasiona danos de difícil
restauração por parte do Estado.

O empresário somente exercerá responsabilidade social,


contribuindo para o desenvolvimento social e ambiental do país, caso
consiga obter benefícios com esses atos. Afinal, da mesma forma que
todo ser humano, ele é um maximizador dos próprios interesses e
somente agirá de uma certa maneira se tiver incentivos para isso.
Neste sentido, as palavras de Stephen J. Dubner e Steven David Levitt:
“os incentivos são a pedra de toque da vida moderna” (DUB NER;
LEVITT, 2005, p. 15).

Por isso, ocorre a divulgação dos atos sociais, visando, com


uma publicidade eficiente, atrair mais consumidores e grupos de
interesse, satisfeitos em adquirir e divulgar produtos de um empre sário
que se preocupa com o bem -estar social. Dessa forma, ocorre aumento
na circulação de riquezas. Ademais, com a prática de atos de
responsabilidade social, o empresário, não raras vezes, obtêm
benefícios fiscais.

Sobre esses benefícios, Rodrigo Almeida Magalhães esclarece


que:

A p ar t ir des s es a tos , as em pres as ai n da c ons e gu em obt er


be n ef íc ios f is c a is , ou s ej a, ao i n vés de p ag ar os im pos tos ,
e las i n v es t em na c om un i d ad e o c a p it a l qu e s er i a do Es t ad o .
E ntr et a nt o, es s e d irec i on am en to d os tr i b ut o s nã o p od em s er
c ons i d er a d os c om o res p o ns a b i l id a de s oc ia l , p or qu e a
em pr es a es t á in v es t i n do na s oc ie d ad e um di nh e ir o q ue nã o é
de l a, e s im d o Es t a do . (M AG A L HÃ E S , 2 00 7, p. 3 4 7).
78

Sendo assim, a responsabilidade social e a função social da


empresa possuem íntima ligação com a idéia de desenvolvimento
sustentável.

4.5.1 Liame entre responsabilidade social e função social

Desde a Constituição da República de 1988, a ligação entre a


responsabilidade social da empresa e sua função social torna -se, cada
vez mais, ativa. Percebe -se diariamente o uso, pelos empresários, de
atos com reflexos sociais como estratégia para se solidificarem no
mercado.

Dessa forma, as atividades econômicas e sua função social


refletem diretamente na coletividade. Toda a atividade empresarial
afeta a sociedade, de forma positiva e negativa. Dos efeitos positivos,
pode-se citar geração de empregos, circulação de bens, pagamento de
tributos, dentre outros. E, dentre os negativos, pode -se mencionar a
poluição ambiental.

O empresário, visando tornar seus produtos ou serviços cada


vez mais atrativos, busca demonstrar para a sociedade suas
preocupações sociais, bem como o modo pelo qual tenta, ao máximo,
reduzir as externalidades negativas inerentes ao exercício de atividade
econômica. Tudo isso por causa da influência que a população
consumerista tem quando quer prejudicar um empresário socialmente
irresponsável. Nesse sentido, Robert Henry Srour observa:

A s oc ie d ad e c i v i l r eú n e c o n d iç õ es p ara m o b i l i zar - s e e r et a l iar


as em pr es as s oc i alm en t e irr es p o ns á ve is ou in i d ôn e as . O s
c l ie n tes , em pa rt ic u la r, a o ex e rc i t ar s e u d i re it o de es c o lh a e
ao m igr ar s im pl es m ent e p ar a os c o nc orre nt es , d is p õ em de
um a i nd is c ut í v el c a p ac id a de d e d is s u as ã o , um a es p éc ie d e
ar s e n a l n uc l ear . A c i da d an i a org a n i za d a po d e le v ar os
79

d ir i g e nt es em pres ar i a is a a gi r d e f orm a r es p o ns á v e l, em
de tr im ent o , a té , d e s uas c o n vic ç õ es í nt im as . ( S RO U R, 20 0 3,
p. 5 2) .

No mesmo sentido de ligação entre responsabilidade social e


função social da empresa, não se pode tolerar um desenvolvimento
econômico desenfreado, não sustentável, eis que acabará atraindo
muitas pessoas para grandes centros urbanos e, após, não será
possível gerar empregos suficientes para todas elas. Então, haverá
contribuição para as desigualdades sociais, com inevitável aumento da
criminalidade e da exclusão social. E, d iante disso ocorre redução do
mercado consumidor, eis que várias pessoas buscarão mercadorias
alternativas para satisfazerem suas vontades, como, por exemplo,
produtos de origem ilícita.

Dessa forma, o desenvolvimento econômico, desvinculado da


responsabilidade e da função social, não promove equidade e justiça
social, muito pelo contrário. Gera um ambiente inseguro para
investimentos, eis que os consumidores perdem poder aquisitivo.
Ademais, o cidadão mais esclarecido opta por consumir de outras
fontes, visando gastar seu dinheiro com quem contribuir para o meio
social.

A atividade dos empresários encontra -se rodeada dos limites da


ética e da legislação, sendo certo que o interesse social é uma questão
importante a ser observada, eis que influenciará futura s escolhas das
pessoas e dos entes que são afetados pela empresa .

Ademais, considerando sua crescente importância no meio


social, a atividade empresária torna -se responsável por relevante parte
da cobrança e do ônus da responsabilidade social. Dessa forma ,
fatores que, antigamente, eram de preocupação exclusiva do Estado,
passam a ser responsabilidade, também, do empresário.

O empresário, pelo poder econômico que tem nas mãos, deve


exercê-lo com responsabilidade, de modo que, acompanhado de todo
poder, tem-se um dever de proporcional grandeza. Então, atualmente, o
80

Estado divide diversas responsabilidades com os empresários, os quais


somente exercerão atividades em prol da sociedade se enxergarem
benefícios nessas condutas.

Diante disso, pode -se dizer que a atividade empresarial


contempla, também, atributo de serviço público, bem como está
investida de relevante função social. Por isso, a empresa se reveste,
até mesmo, de um munus público.

Com relação à expressão munus público, deve ser entendida


como “encargo ou ônus, conferido pela lei e imposto pelo Estado aos
cidadãos e aos membros de certas classes profissionais, em benefício
coletivo ou no interesse da pátria ou da ordem social” (BUENO, 1996,
p. 445).

Então, o crescimento econômico deve sempre estar lig ado ao


desenvolvimento social, para não deixar de lado o aclamado princípio
da dignidade humana. O ser humano não pode ser desvalorizado a
ponto de se tornar insignificante face aos objetivos das empresas, sob
pena de infringir esse já citado princípio, pr evisto no artigo 1º, inciso
III, da Carta Magna de 1988.

4.6 Reflexos da função social da empresa

A atividade empresarial, tendo em vista sua inerente função


social, gera incalculáveis reflexos que colaboram para o bem comum.
Esse bem-estar ocorre não apenas para os sócios, bem como para
todos os stakeholders, podendo a empresa, destarte, afetar, toda a
nação e, até mesmo, países estrangeiros.

Nesse sentido, pode -se mencionar, como alguns dos incontáveis


reflexos positivos da função social da empresa, o fortalecimento da
economia pela ampliação da circulação de riquezas, acréscimo de
81

verbas para o bem -estar social, com o aumento dos tributos


arrecadados pelo Estado, favorecimento ao consumidor, eis que terá a
sua disposição maior variedade de produtos e a constante criação de
oportunidades de negócios.

Dentre os inúmeros reflexos negativos decorrentes do


desrespeito ao princípio da função social da empresa, pode -se citar:
poluição ambiental, redução da arrecadação de tributos, redução de
empregos e da circulação de riquezas, insegurança para os
trabalhadores, prejuízos para os consumidores, aumento das
desigualdades sociais e regressão da economia.

Dessa forma, a função social da empresa, a qual resulta de


exigência da ordem econômica prevista na Carta Ma gna de 1988 é
fundamental, dentro de um contexto de um Estado Democrático de
Direito, para que seja efetivada a busca pela justiça social, bem -estar
coletivo, bem como tudo o que emanar do princípio da dignidade da
pessoa humana.

Posto isso, fundamental explicar sobre os indivíduos, entes ou


grupos que são influenciados ou que influenciam a atividade econômica
empresarial. São os chamados stakeholders .
82

5 A FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRES A NA SOCIEDADE

Do exercício da função social da empresa – e também da


responsabilidade social – extrai-se que o empresário deve respeitar os
direitos e interesses de tudo que se envolve com a atividade
econômica. Como esclarece Humberto Theodoro Júnior,

Ne n hum a f i gu ra j urí d ic a p od e s er v is t a c om o e nt i da d e
des v i nc ul a da d a r e al i da d e s oc i a l e ec o n ô m ic a. A dim e ns ã o
j ur í d ic a n ão é is o lá v e l d a c om pl ex id a de do c om por t am ent o
hum an o em s oc i e d ad e , e n v o l vi d o qu e s e ac h a d it o
c om por t am en to p or um em aran h ad o de f orç as e
c on d ic io n an t es , d e ntr o do q u a l nã o s e m os tr a v i á v el , n em
r ac io n a l, is o l ar - s e o f en ôm en o j ur í dic o c om o s e tra t as s e d e
um a r ea l i da d e c om pl e t am ent e a u tô n om a, c a pa z de r es um ir - s e
às r e gr as d a l ei e s ua ex eg es e p e l os t é c n ic os d o d ir e it o.
( T HEO D O RO J Ú NIO R, 2 0 08 , p. 4 - 5) .

Nesse sentido, vale lembrar o sentido da expressão


stakeholder, que “é um termo usado em administração que refere -se a
qualquer pessoa ou entidade que afeta ou é afetada pelas atividades
de uma empresa” (STAKEHOLDER, 2009). Então, stakeholders são os
indivíduos, grupos, instituições ou meio ambiente, enfi m, tudo o que
pode ser influenciado pela atividade empresarial ou que pode
influenciar essa atividade econômica.

A busca por um desenvolvimento sustentável, na acepção de


que o desenvolvimento econômico deve estar atento com os ditames da
justiça social, e xige que o empresário se conscientize da evidente
afetação – positiva ou negativa, direta ou indireta – perante os
stakeholders. Isto porque os empresários não são entes isolados na
comunidade, pois se inter -relacionam, a todo o momento, com toda a
coletividade.
83

O exercício de atividade econômica, sem respeitar a função


social da empresa, constitui um abuso de direito, conforme se extrai
das ponderações de Ana Frazão de Azevedo Lopes, segundo as quais:

O ex er c íc io d o p od er ec o n ôm ic o qu e n ã o g e ra n e nh um a f o rm a
de d is tr i b u iç ã o d e r i qu e za ou d os b e n ef í c i os d a at i v i da d e
ec o n ôm ic a é ab us i v o, po is , n es t a h i p ót es e , a f unç ã o s oc i al da
em pr es a c ert am ent e nã o es t ar á s e nd o c um pri da . ( LO P E S,
20 0 6, p . 2 95 ).

Desta forma, as decisões diárias dos empresários, quando do


exercício da empresa, na busca por lucro, são extremamente
importantes, na medida em que afetam uma infinidade de pessoas e o
meio ambiente. Posto isso, fundamental mencionar sobre a função
social da empresa perante os stakeholders , bem como diante do direit o
penal empresarial.

5.1 Função social da empresa perante os consumidores

No Brasil, a condição de vulnerável do consumidor ficou clara


após a promulgação do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº
8.078/1990). A respeito do conceito de consumidor, en tende José
Geraldo Brito Filomeno que:

O c onc e it o d e c o ns um i dor ad o ta d o pe l o C ód i g o f oi
ex c lus i v am ent e d e c ar át er ec on ô m ic o , o u s e j a, l e v an d o - s e em
c ons i d er aç ã o t ã o - s om en t e o p ers o n a gem q ue n o m erc a do d e
c ons um o a dq u ir e b e ns o u e nt ã o c o ntr at a a pr es taç ã o d e
s er v iç os , c om o d es ti n at ár io f in a l, pr es s u p o nd o - s e as s im qu e
ag e c om v is t as ao at e nd im en t o d e um a n ec e s s i da d e pr ó pr ia e
nã o p ar a o d es en v o l v i m ento d e um a o ut ra a ti v i d ad e n eg oc ia l .
( FI LO M E NO , 20 0 0, p . 26) .
84

Então, na relação entre empresário e consumidor, a parte


considerada vulnerável merece proteção específica, privilégios legais e
preocupação do detentor do poder, seja ele econômico ou de
informação.

Como a economia atual é globalizada, o empresário deve estar


atento para atender um número indeterminado de consumidores, de
diferentes partes do estado, país ou, até mesmo, do mundo. Com o
aumento e diversificação dos bens e serviços que são lançados, deve o
empresário se preocupar em orientar o consumidor, parte frágil da
relação, para que o mesmo não seja prejudicado ao exercer seu papel
na contribuição para a circulação de riquezas.

Uma distância instransponível entre fornecedor e os


consumidores não tem espaço no contexto do Estado Democrático de
Direito brasileiro. Ademais, faz -se necessária a intervenç ão estatal
visando o equilíbrio nas relações consumeristas, quando o exercício da
empresa for abusivo, ou seja, quando não observar a função social.

Nesse sentido, no artigo 170, inciso V, da Constituição da


República, encontra -se previsto o princípio de d efesa do consumidor. A
proteção deste também está prevista no artigo 5º, inciso XXXII, in
verbis: “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”.
Ressalte-se que o Código de Defesa do Consumidor é, atualmente, o
maior responsável pela defesa do consumidor frente ao fornecedor de
bens ou serviços.

Vale mencionar que o Código de Defesa consumerista é uma lei


interdisciplinar, tendo dispositivos inerentes ao direito civil, processo
civil e, até mesmo, direito penal. Ademais, conforme entende Lui z
Antônio Ramalho Zanoti,

É p os s í ve l af irm ar q u e o C ó d ig o de Def es a do C o ns um ido r s e


c ons t it u i num d os e lem en t os f u nd a m enta is p ara a
c ons o l id aç ão d o Es ta do D em oc rát ic o d e Dir e it o e l ei t o p e l o
pa ís , p o is s e t ra ta de um n ot á ve l re g u l ad or d a po l ít ic a
nac i o na l de r e laç õ es de c ons um o, qu e tem por m et a a
85

v a lor i za ç ão d o pr i nc í p i o c ons t it uc io n a l da d i g n id a de d a p es s o a
hum an a , c uj o f oc o é o c o ns um id or. (Z AN O T I, 20 0 9, p . 1 64) .

Então, pode-se dizer que a função social da empresa possui


inseparável ligação com os con sumidores. É neste sentido a
observação de Ana Frazão de Azevedo Lopes, que sustenta:

A pr ó pr i a C o ns t it u iç ã o j á d et erm in a a lg u ns d os pr inc í pi os
c onc r e tos qu e po d erã o n ort e ar a f u nç ão s oc ia l da em pres a,
ta is c om o a d ef es a do c ons um id or ( art . 1 7 0, V), a pro t eç ã o do
m eio am bi e nt e ( ar t. 17 0 , VI) , a re d uç ã o das d es i gu a l da d es
r eg i o na is e s oc i a is ( ar t. 1 70 , V II) e a bus c a do p l e no em preg o
( ar t . 1 70 , VI II) . M as o d e ba te s obr e a f unç ão s oc i a l n ão s e
es g o ta a í, ex i gi n do u m a an á lis e m a is abr a ng e nt e d a a t i v id a de
ec o n ôm ic a e nq u an t o i ns tr um en to d e r e a li za ç ão d e um a ord em
j us t a e s ol i d ár ia . Nã o s e p od e es qu ec er qu e a f u nç ã o s oc i al
da em pr es a tem c om o des do br am ent o a ne c es s id a de de qu e a
r i qu e za e os be n ef íc i os g er ad os pe l a em pres a nã o s ej am
apr o pr ia d os ap e nas p or e la , m as s ej am rep art i dos , d e m an ei ra
s at is f a tór i a, c om a s oc ie d ad e c om o um t od o , inc l u in d o aí
em pr e ga d os , c ons um i dor es e os c i da d ãos em gera l . (L O PE S ,
20 0 6, p . 2 95 ).

Diante desse liame, será legítima a intervenção estatal na


relação de consumo visando combater e ventuais abusos de poder
econômico e desrespeito à função social da empresa, os quais,
certamente, prejudicarão o consumidor, que continua detentor do
direito à dignidade.

Vale frisar que, para a empresa cumprir sua função social


perante os consumidores, não basta exercer a tividade econômica sem
prejudicá-los. O empresário tem o dever de exercer sua atividade em
benefício da parte frágil da relação consumerista. Destarte, a função
social da empresa atua como forma de determinação da prática de
obrigações de fazer, e não, apenas, de não fazer, ao empresário. Como
esclarece Sérgio Botrel:

O r ec o nh ec im ent o d o s d ir ei t os do c o ns um idor c om o d ir ei t os
f un dam en t ais c o nf er e no v a d ir eç ão a o d e s en v o l v im ent o da
at i v i da d e ec o n ôm ic a. Is s o p or qu e f ic a im po s to a o em pres ár i o
um dev e r d e r es u l ta d o , no s e nt i do d e c o l o c ar n o m erc a d o d e
86

c ons um o pro d ut os o u s er v iç os s eg ur os e qu e a te n dam às


l eg ít im as ex p ec ta t i va s do d es t i n at ár i o f in a l d aq u i lo qu e é
of er ec i d o p e lo em pre s ár io . Es s as pr em is s as g en ér ic as s ã o
ex tr aí d as n ã o s ó d a e x eg e s e d a c l á us u l a g e ra l d e pr ot eç ão do
c ons um id or ( CF/ 8 8, a rt. 5º , inc . X X X II ) e da d ig n i da d e d a
pes s o a h um an a, c o m o do pró pr i o s is t e m a c ons um eris t a
i ns t aur a d o p el a Le i nº 8. 07 8 /9 0 (C ó di g o d e D ef es a d o
Co ns um id or), o qu a l reg u l am ent a a l im it aç ão c o ns t i tuc i on a l
do ar t . 17 0 , i nc . V. ( B O T RE L, 2 0 09 , p. 55) .

No mesmo sentido, Eduardo Tomasevicius Filho observa que:

A f unç ã o s oc i al da em pres a c o ns t it u i o po d er - de v er d e o
em pr es ár io e os adm i nis tr ad or es d a em pre s a h arm on i zar em
as at i v i da d es d a em pres a , s e gu n d o o i n t er e s s e d a s oc ie d ad e ,
m edi an t e a o b e di ê nc i a d e d et erm i na d os d e v eres , p os it i v os e
ne g at i v os . (T O M A S E V ICI U S FI LH O , 2 0 03 , p. 4 0).

Dessa forma, a empresa, para cumprir a função social, não


basta se manter ativa. Ela deve exercer suas atividades visando o bem
comum, sem praticar atos lesivos à sociedade. Então, “o cumprimento
da função social, no seu aspecto positivo, não diz respeito apenas à
ausência de prejuízos; mais do que isso, exige a existência de
benefícios sociais.” (LOPES, 2006, p. 281).

No mesmo sentido, Luiz Antônio Ramalho Zanoti sugere que


“apenas pode ser considerada empresa socialmente responsável
aquela que inclua o consumidor no foco de suas melhores atenções,
como estratégia vigorosa de valorização da dignidade da pessoa
humana” (ZANOTI, 2009 , p. 169).

Apesar disso, existem empresários que abusam do poder


econômico, numa busca por lucro, a qualquer custo. Estes empresários
não éticos sonegam tributos, prejudicam de modo desenfreado o meio
ambiente, desrespeitam os empregados, fornecem bens ou serviços de
má qualidade para os consumidores, e, dessa forma, não se importam
com as consequências malditas de suas atitudes diárias. Eles
esquecem que o sucesso econômico, para durar muito tempo, não
depende apenas de sua estrutura, mas, “de um conjunto de atores que,
87

unidos, viabilizam esse mesmo negócio, sob uma perspectiva de curto,


médio e longo prazo” (ZANOTI, 2009, p. 168).

No que diz respeito aos interesses dos consumidores a respeito


da atividade empresarial, observa Sérgio Botrel:

O s c o ns um i dor e s s e i nt eres s am pe l a l ib er da d e de es c o lh a;
pe l a q u al i d ad e e j us t a re l aç ã o e n tre qu a l i da d e - preç o; pe l a
i nf or m aç ã o v er d ad e ir a e c l ar a s o br e os pro du t os e s er v iç os ;
pe l a g ar a n ti a d e s eg ur a nç a d os pr od ut os e s er v iç os
pr es t ad os ; e p e la as s i s tê nc ia p ós - c on tr at u a l . ( BO T R EL , 20 0 9,
p. 1 2 7) .

Sobre a necessidade de preocupação com o consumidor, por


parte do empresário, Luiz Antônio Ramalho Zanoti registra que:

T al f at o é d ec orr e nt e do aum en t o d o gr a u de ex i g ê nc i a dos


c ons um id or es , os q ua i s o pt am por pr o du tos de b o a qu a l id a de ,
qu e n ão of ereç am ri s c os , q u e nã o c a us em tra ns t or nos à
s aú d e, pr od u zi d os c om res p ei t o às no rm as tr a ba l h is t as e
am bi en t ais . ( Z ANO T I, 20 0 9, p . 1 80 ).

Ademais, o sucesso empresarial e o desenvolvimento econômico


possuem, como pilar, o consumidor, p ois é ele o grande responsável
pela circulação de riquezas, sem o qual nenhum mercado sobrevive.
Desta forma, privilegiar o consumidor é contribuir para um
desenvolvimento econômico sustentável, de modo que conservará uma
de suas bases de sustentação.

5.2 Função social da empresa perante a comunidade

Dentro do contexto do Estado Democrático de Direito brasileiro,


o empresário não pode ser visto como pessoa desvinculada da
88

realidade social e econômica. Sua dimensão jurídica não é isolável das


relações humanas em sociedade. Dessa forma e, pelo fato de o
empresário ser dependente da comunidade, não se mostra racional que
o mesmo se isole em uma fortaleza inexpugnável, eis que a sociedade
influenciará no sucesso da atividade empresarial, pois também é
responsável pela circulação de riquezas.

A respeito da função social da empresa perante a comunidade,


observa Luiz Antônio Ramalho Zanoti:

Há um r ec í proc o d e v er d e f id e l id a de en tr e os s óc i os e a
s oc ie d ad e. O ex erc íc i o d o dir e i to s oc ie tá ri o nã o é t ão am pl o a
po n to d e o s óc i o v is a r a in ter es s es p es s o a is , em d e tr im ent o
dos i nt er es s es s oc ia i s . Q u em dec id e p e l a opç ã o d e i n v es t ir
s eus r ec urs os f i n a n c e iros o u m at er ia is n um a a ti v i d ad e
em pr es ar ia l , n a ex pec ta t i va d e qu e e la lh e p rop orc i on e l uc r os
em f orm a de d i v i de n d os , de v e t er c o nt a q u e es s a or g a ni za ç ão
tem um a res p ons a bi l i da d e s oc i al p ara c om os em pre ga d os ,
c ons um id or es , m e io a m bie nt e, f orn ec ed or es , c om un i d ad e e o
Es t a do , e q ue es s e s óc i o t em tam bém as m esm as
r es p o ns ab i l id a des . (Z AN O T I, 2 00 9 , p. 1 8 1).

Então, a atividade empresarial, além de buscar o lucro, deve se


preocupar com a comunidade em que está inserida. Destarte, é
imprescindível que o objetivo econômico do empresário seja
harmonizado com a necessidade de respeito à dignidade da pessoa
humana. Neste sentido, Ana Frazão de Azevedo Lopes assevera que:

O es f or ç o is ol a do do Es t a do pa ra as s e g ura r a j us t iç a s oc ia l é
i nóc u o s e a s oc i e d ad e e os i nd i v íd u os q u e a c om põ em nã o
as s um ir em a s u a r es p ons a b il i d ad e e a ef et i v a p ar t ic i p aç ã o n o
pr oc es s o. A f u nç ã o s oc ia l d a pro p r i ed a de e d a em pres a nã o
de ix a de s er um a t e nt at i v a de i ns er ir a s o li d ar ie d ad e n as
r e laç õ es h or i zo n t ais en tr e os i n d i ví du os , tra ns f orm an d o - os
em r es po ns á v e is p e la ef et i va r ea l i za ç ã o d o pr oj e to de um a
s oc ie d ad e d e m em bros au tô n om os e i gu a is , inc l us i ve no qu e
d i z r es p e it o à r e duç ã o das d es i gu a ld a des s oc ia is . ( LO P E S,
20 0 6, p . 2 53 ).

Se o empresário se isolar da comunidade, sem se preocupar


com os efeitos da ausência do exercício da função social, deixará de
89

garantir uma forma de prolongar, no tempo, suas ativi dades. Se ele


planeja expandir ou manter sua atividade lucrativa, deve colaborar para
a promoção do bem de todos, eis que, para um desenvolvimento
sustentável, deve preservar “aquelas coisas nas quais se sustenta o
desenvolvimento” (LORENZETTI, 1998, p. 57 6). É neste sentido a
observação de Luiz Antônio Ramalho Zanoti, que sustenta:

A f unç ã o s oc i a l das c o rp or aç õ es es t á l i ga d a à
s us t e nt ab i l i da d e. Em bora s ej a adm is s í v e l q ue as c or por aç õ es
pu g nem p el a c o nt a bi l i za ç ã o de l uc r os dec orr en tes d e s uas
at i v i da d es em pr es ar i a is , é im pres c i n dí v e l qu e es t e o bj e ti v o
ec o n ôm ic o s ej a c o n c i l ia d o c om a nec es s id a de d e s e
pr es er v ar o m ei o am b i en te e d e s e v a l ori za r a di g n id a de d a
pes s o a hum a na , at é m es m o c om o f orm a de g ar a nt ir a
l on g e vi d ad e e a ex pa ns ão d e s e us pr ópr i os ne g óc i os .
( ZA NO T I, 2 0 09 , p . 18 0 ).

No mesmo sentido, Ana Frazão de Azevedo Lopes observa que:

O e qu i l íbr i o en tr e a li ber d a de em pres ar i al e o ig u al d ir e it o à


l ib er d ad e dos dem a is m em bros d a s oc i e da d e é ex tr em am ent e
de l ic ad o e e n vo l v e a qu es tã o d a j us t iç a s o c i al . Es ta , por s u a
v e z, n ão t em c om o s er r ed u zi d a a f órm ul a s f ec h ad as e q ue
s ej am ins en s í v e is a o proc es s o dem oc r át ic o e a o c o nt ex to
s oc ia l e h is tó ric o em q ue é an a l is a d a. ( LO P E S, 20 0 6, p . 2 79) .

Sobre os interesses da comunidade a respeito da empresa,


observa Sérgio Botrel:

A c om un i da d e, p or f i m , tem in t eres s e , s ob o p on t o de v is t a
l eg a l: no c um prim e nt o d as o br i gaç õ es f is c a is e no
c um pr im en to da le g is l aç ã o ; s ob o p on to de vis t a s oc ia l : n a
c on tr ib u iç ão p os it i v a p ara o d es e n v o l vim e nt o l oc a l e r eg i o na l ;
no q u e res p e it a ao m eio am bi e nt e, n a pr es er v aç ão d os
r ec u r s os n a tur a is re n o vá v e is e n ã o re no v á ve is . (BO T R E L,
20 0 9, p . 1 27 ).

Decorre da função social da empresa a necessidade de que o


empresário não se aproprie, de forma isolada, das benfeitorias geradas
pela atividade econômica. Esses benefícios devem ser repartidos, com
90

toda a comunidade. A necessidade dessa distribuição de ganhos


também decorre do aumento da exigência da comunidade frente aos
empresários, detentores de grande poder econômico e com enorme
capacidade de afetação na sociedade em que estão inseridos.

Destarte, um empresário que se afasta da função social de sua


atividade, necessariamente se afasta da comunidade.

5.3 Função social da empresa perante seus sócios e


administradores

A empresa possui objetivo implícito de obtenção de lucro. Dessa


forma, o empresário atua, diariamente, na busca de atividades
lucrativas. Ocorre que o lucro só é legítimo quando o empresário
exercer atividade econômica cumprindo a função social. Vale frisar que
a empresa, quando exercida coletivamente, será explorada por uma
pessoa jurídica, sendo representada por seus sócios.

Conforme entende Sérgio Botrel, os interesses dos sócios


consistem em

( .. .) b as ic am en te , n o a um ent o d o v a l or da or g an i za ç ã o
em pr es ar ia l ; na r en t ab i l id a d e e l i q u id e z de s e us
i n ves t im ent os ; na tr a n s par ê nc ia nas op er aç ões e pr oj e tos ; e
par t ic ip aç ão e c o nt ro l e da g es t ã o s oc ia l . ( BO T R EL , 2 00 9, p .
12 7) .

E , segundo esse mesmo autor, os administradores

( .. .) t êm i nt er es s e e m aum ent ar s ua inf lu ênc i a e pr es t í g i o;


m ax im i zar o va l or d a org a n i zaç ã o em pres ar i al ; d es en v o l v er e
c o loc ar em prát ic a s u as id é ias e c ap ac i da d e; e p ar t ic i p ar dos
r es u l ta d os d a at i v i da d e. ( BO T R EL , 2 00 9, p. 12 7) .
91

Os administradores e os sócios detêm relevante poder


econômico, razão pela qual devem ter responsabilidade, na mesma
proporção desse poder, eis que podem causar danos a um número
indeterminado de pessoas, ao Estado, bem como ao meio ambiente. O
Estado deve se preocupar com o controle da atividade empresarial, eis
que:

O p od er ex ac er b ad o em m ãos de um ou d e po uc os (m in or ia
or g a n i za d a), po d e res u l ta r em in ic i at i v as a ut or it ár i as ,
pr e p ot e nt es , a bus i v as , p ouc o dem oc rá t ic as , qu e ex c l u am , por
ex em p lo , os ac io n is t a s q ue n ã o par t ic ip am d o c om and o , n a
d i vis ã o d os l uc ros da em pres a. (Z ANO T I , 2 0 09 , p . 19 6) .

Quem comanda a empresa são os administradores e, por isso,


são detentores do efetivo poder de direção das atividades. Destarte,
não podem se esquivar da função social da empresa, sob pena de
configurar abuso de direito. Dessa forma, estão, pe rmanentemente,
diante de difíceis decisões, eis que devem gerir a empresa no sentido
de harmonizar os interesses dos sócios – otimização dos lucros – com
o necessário e efetivo exercício da função social. E, além disso, devem
respeitar os direitos fundamen tais dos sócios. Sobre esses direitos,
observa Sérgio Botrel:

Os d ir e it os f un d a m enta is d os s óc i o s se res um em ,
bas ic am en te , ao d ir e it o da l i b erd a de d e s e a s s oc iar (e d e nã o
per m a nec er as s oc i ad o ), a o d ir e it o d e p ro pr i ed a de ( q ue i nc id e
nã o s obr e o p atr im ôn i o s oc i a l, m as s ob re a s qu ot as ou aç õ es
em qu e s e d i v i de o c a p it a l s oc i a l) e a o d ire i to d e inf o rm aç ão .
A c om pr ee ns ão d e q u e es s es di re i tos d e ve m s er qua l if ic a d os
c om o f un d am ent a is é nec es s ár ia p ar a q ue s e pos s a pr om ov er
a s ua c onc i l i aç ã o c o m os d em ais d ir e it os q ue gra v i tam em
tor n o da em pres a. ( BO T REL , 2 00 9 , p. 5 7) .

Sobre o abuso de poder, esclarece Luiz Antônio Ramalho


Zanoti:
92

É o d es pre zo à le i e aos es t a tu t os s oc i a i s da c om pa nh i a ,
i nt er p r e ta n do - os s e g u nd o i n ter es s es p art ic u lar es , e nã o d a
pes s o a j ur íd ic a , e n e m da c om un i d ad e, c o m o in t ui t o d e s e
at i ng ir a o bj e ti v os nã o - pr ec o n i za d os o u pro i bi d os p e los
m enc i on a dos i ns t i tu t o s , d es v ia n do - s e , c om o c o ns eq ü ênc i a,
dos i n ter es s es dos ac i on is tas e d a s oc ie d a de c om o um to do .
P or t a nt o, o des v i o d e p o der c o l oc a a c om p an h i a em rot a d e
c o lis ã o c om a f unç ã o s oc ia l q u e d e le s e es per a . A c onc l us ã o
a q u e s e c h eg a é qu e o in te res s e da c om pan h i a d e v e
pr e v a l ec er , e n ã o os i nt eres s es pe s s o a is e p ar tic u l ares d o
adm i n is tr ad or . N es s e p as s o , a t ar ef a d o a dm in is tr a dor é
pu g na r p ara q ue os in te res s es s oc i a is d a em pres a s ej am
at i ng i d os , po rém , d e v erá f a zê - l o em perf e it a h arm on i a c om os
do gr u po s oc i al n o qu a l e l a es t á ins er i da . ( ZA NO T I, 20 0 9, p .
19 5) .

A legitimidade da busca por lucros, pelos sócios, através da


empresa, depende do cump rimento da função social. Qualquer
concepção alheia à função social não tem espaço dentro do contexto
do Estado Democrático de Direito brasileiro. Neste sentido, as
seguintes ponderações:

E nt en d e- s e, c om ef ei to , q ue o l uc ro f a z p art e d o pr oc es s o
em pr es ar ia l , por ém s ó é l eg ít im o qu a n do a em pr es a ,
r ep r es e nt ad a p or s e u s ac io n is t as ou c o t is tas , c um pr e s u a
f unç ão s oc i a l. Es t a é a c o nc epç ã o c on t em porâ n ea de
em pr es a qu e r em et e aos s óc i os à s ens i b i li za ç ã o das
nec es s i da d es s oc i a is dos s e us em pr eg ad os , ac i on is tas ,
f or n ec e d ores , c ons u m idor es , m ei o am bi e nt e, Es ta d o, e a
c om un id a de q u e r ec e be os ref lex os , t a nt o p os i t i vos q u an t o
ne g at i v os d ec orr e nt es d e t od a e q u al q ue r aç ão pra t ic a d a p el o
gr u p o em pres ar i al . ( Z AN O T I, 2 00 9 , p. 1 9 6).

Posto isso, ao administrador cabe a pr eocupação com as


necessidades sociais dos seus empregados, fornecedores,
consumidores, meio ambiente, Estado, bem como de toda a
comunidade que será afetada – positiva ou negativamente, direta ou
indiretamente – por suas decisões e por toda e qualquer ação
praticada.
93

5.4 Função social da empresa perante os empregados

Os empregados são peças chave no dia a dia da atividade


empresarial, eis que eles, através da força de trabalho, compõem os
fatores de produção, os quais, organizados, oferecerão ao mercad o
bens ou serviços. Diante da constitucionalização do direito privado, a
dignidade do trabalhador impera frente ao aspecto monetário da
relação de emprego.

Sobre os interesses dos empregados, assevera Sérgio Botrel:

O s em pr e g ad os têm i nt er es s e n o s al ár i o; n as p res taç õ es


pr e v i d enc i ár i as ; na h i g ie n e; na s e gur a nç a ; e n a s a l u br id a de
do am b ie nt e d e tr a b a lh o; n a pr om oç ão p rof is s i on a l; e n o
des e n vo l v im en to d e s uas p ers on a l id a des . ( BO T R EL , 20 0 9, p .
12 7) .

A Constituição da República de 1988 – conforme o artigo 1º,


incisos III e IV – elegeu a proteção da dignidade da pessoa humana e a
valorização social do trabalho como condições fundamentais do Estado
Democrático de Direito. Ademais, no artigo 170 da Carta Maior existe a
previsão de que a ordem econômica deve ser f undada na valorização
do trabalho humano. Então, a dignidade do trabalhador deve prevalecer
frente ao aspecto patrimonial da relação de emprego.

O postulado da função social da empresa exige que o


empresário tenha compromissos sociais perante seus empregad os,
sendo que esses compromissos não se limitam ao regular e pontual
pagamento de salários. Isso porque, conforme assevera Luiz Antônio
Ramalho Zanoti,

O tr a b al h ad or é m ais qu e um m ero v en d ed o r de s ua f orç a de


tr a b al h o, at é m es m o p orq u e es s a f or ç a é f i ni t a, e
i n var i a v elm e nt e s e ex aur e m uit o a nt es d o f i nd ar d e s u a v i da
b io l óg ic a. N em s e po d e d i zer q u e o s eu la b or é ta l q ua l um a
94

m er c ad or ia q u a lq u er, q u e s e a dq u ire e s e c o ns om e n o
pr oc es s o pr o du t i vo . S obr e o po n to de v is t a c ont em por â ne o ,
nã o s e a dm it e qu e a p erc e pç ã o ó pt ic a da e m pres a s e l im it e à
pu g na p e l a m ax im i z aç ã o d o l uc ro , a l he i a dos p ri nc íp i os
s upr em os q u e c ons is t em na p le n a v al or i za ç ão d a d ig n id a d e
da pes s o a h um ana , s ob pe n a d e, as s im não o f a ze nd o , s e
c o loc ar a em pres a e m rota d e c o l is ão c o m o orde n a m ent o
j ur í d ic o pá tr io . ( Z ANO T I, 2 0 09 , p . 16 2) .

Então, o empresário, dentro de uma concepção privada


contemporânea, que prioriza a valorização da dignidade da pessoa
humana, além de proporcionar a satisfação das necessidades básicas
do trabalhador, atravé s do salário, deve oferecer um ambiente propício
para que o empregado desenvolva suas habilidades e tenha prazer na
realização de suas atividades. Assim, será considerado um empresário
ético, condizente com o direito empresarial dentro do contexto do
Estado Democrático de Direito. É o que se extrai das seguintes
ponderações:

P or t a nt o, em pres a ét i c a é aq u el a q ue of er ec e um am bi e nt e
m or alm en te g ra t if ic an te p ar a os s e us em preg a d os , n a q ua l
es t es te n ham pr a ze r de c o n v i v er, e q ue p o s s am des en v o l v er
as s uas p ot e nc ia l i d ad es , as s u as v ir t ud es e os s eus
c on h ec im ent os . (Z A N O T I, 20 0 9, p . 1 27) .

Importante mencionar que a redução do salário dos empregados


e o aumento do desemprego contribuem para a redução do consumo, a
qual reduzirá a circulação de riquezas. Posto is so, o empresário,
preocupado com o prolongamento – no tempo – de sua atividade, bem
com o desenvolvimento sustentável, tem interesse na busca da geração
de novos empregos e na melhoria das condições de trabalho já
existentes. Nesse sentido, é plausível que os empresários busquem a
redução de seus custos e o aprimoramento tecnológico dos meios de
produção, contudo, é intolerável que esses progressos ocorram em
detrimento da preservação da dignidade do homem.

A respeito da afinidade entre empresa e trabalho, assevera Luiz


Antônio Ramalho Zanoti que:
95

O tr ab a lh o ex is t e a nt es da em pres a, e es t a f o i c r i ad a pa ra
r ac io n a li za r a f orm a c om que e l e er a a té e nt ã o re al i za d o , d e
m ane ir a q u e e le t i v es s e o m el hor r e s u lt ad o p os s í v e l,
m edi an t e o em pre go da m enor f orç a f ís ic a e d o m enor
c ons um o d e m atér ias - pr im as , c om m enor c us t o f i na l . Is s o
m os tr a, po is , q u e a em pres a é um a i ns t it u iç ã o n i t id am en te
hum an a , pr of un d am ent e h um an a, p or qu e é pr of u n dam en t e
hum an o pr oc ura r a o tim i za ç ã o. C o nt u do , es s e pr oc es s o de
ot im i zaç ã o d e v e pr i v i le g i ar o des e n vo l v i m ento pes s o a l d o
hom em , par a qu e o tr ab a l ho s ej a r e a li za d o c om pra ze r, e n ã o
c om o f ont e g er a dor a de r ec urs os m at er ia is par a a s at is f aç ã o
das n ec es s i d ad es pes s oa is d o em pre g ad o e d e s ua f am íl i a .
( ZA NO T I, 2 0 09 , p . 19 0 ).

Ainda, para esse m esmo autor, existe a necessidade da


colaboração mútua entre empregador e empregado, conforme se extrai
das seguintes ponderações:

Em bor a s ej a a té n at ur al q ue ex is t am d i ver g ênc i as n as


ne g oc iaç õ es e n tre e m preg ad or es e em pr eg a dos , é d e bom
a l vi tr e q ue , a i n da as s im , haj a m útu a c o l a bor aç ã o e ntr e as
du as p ar t es , par a q u e pr e va l eç a a pa z n a em pres a, es t a s e
m ante n ha em at i v id a de , e o em pre ga d o d is p o nh a de um a
c on d iç ão s a t is f at ór i a de v id a, a f im d e qu e a d ig n id a d e des te
s ej a pr es er v ad a. (Z A N O T I, 20 0 9, p . 1 52) .

No mesmo sentido, as ponderações de Sérgio Botrel, a respeito


da relação de codependência entre os trabalhadores e a empresa:

Com ef ei t o, o pr im eir o c e ntr o d e d ir e it os f un d am ent a is q u e


de p en d e do ex erc í c i o da em pres a d i z r es pe i to a os
tr a b al h a dor es . A p art i r do m om ent o em qu e s e a v er i gu a qu e a
ex p l or aç ã o da em pres a c o ns is t e na c oor de n aç ão e
or g a n i zaç ã o de c a p it a l e m ão d e o bra , f ic a n ít i da a re l aç ã o d e
c od e pe n dê nc i a ex is t e nt e e nt re es t a (m ão de obr a) e a
at i v i da d e d es en v o l v id a p e l o em pres ár i o. ( BO T R EL , 20 0 9, p.
53) .

Ademais, o desemprego e condições desumanas de trabalho


contribuem para o alcoolismo, o tráfico de drogas, prostituição,
violência e, dessa forma, colaboram para um ambiente inseguro para
investimentos necessários ao desenvolvimento econômico.
96

5.5 Função social da empresa perante o meio ambiente

A Constituição da República de 1988 determina como princípio


norteador da função social da empresa, a proteção ambiental, nos
termos do artigo 170, inciso VI, eis que a defesa do meio ambiente é
um dos princípios inerentes à atividade empresarial na ordem
econômica e social. Ademais, o direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado é um direito difuso, eis que “o meio
ambiente é considerado um bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida do homem” (ZANOTI, 2009, p. 173).

Sobre o reconhecimento da proteção ambiental como direito


fundamental difuso, esclarece Sérgio Botrel:

A c o ns c ie nt i za ç ão de qu e os rec urs os n at ura is n ã o


r en o v á v eis , e tam b ém os r en o v á ve is (c om o pro d ut os
agr íc ol as ) , p od em tor nar - s e ins uf ic i e nt es p ara r es p o nd er às
nec es s i da d es de t o do s c o nd u zi u ao rec o nh e c im ent o d o d ire i to
ao m ei o am b ie n te c om o um d ire i to f un dam e nt a l d e
ti t ul ar i da d e d if us a. ( B O T RE L, 2 0 09 , p. 57) .

A ocorrência de atos que prejudicam o meio ambiente co mo, por


exemplo, a emissão de gases poluentes, aumento da quantidade de
produtos não biodegradáveis, redução da vegetação, dentre outros, é
inerente ao desenvolvimento econômico. Portanto, a tutela
constitucional do meio ambiente diz respeito a uma utiliza ção racional
dos recursos ambientais, visando evitar danos desnecessários ou
abusivos.

Dessa forma, a empresa deve ser exercida através de condutas


ecologicamente corretas, em busca de um desenvolvimento
sustentável. Neste sentido, as ponderações de Ricard o Luis Lorenzetti,
segundo as quais:
97

Us em os o q u e nec es s it am os da na t ure za , m as as s eg ur an d o
qu e a qu e les q u e ve n ham d ep o is de n ós n ão s ej am pri v a dos
de ta is be ns . P or is s o o d es en v o l v i m ento de v e s er
s us t e nt á ve l , d e ve p od er m ant er - s e e c ons er v ar a qu e l as
c o is as n as q u ais s e s u s te nt a . ( LO R E NZ ET T I, 1 9 98 , p. 57 6).

A tutela ambiental também visa assegurar a todos existência


digna, eis que o meio ambiente é um bem de uso comum do povo. O
postulado da função social da empresa, perante o meio ambiente, exige
que o empresário compatibilize a busca por lucros – através da livre
iniciativa e da livre concorrência – com o respeito ao meio ambiente.

Tendo em vista que preservar o meio ambiente envolve aumento


de custos para o empresário e que este, como maximizador dos
próprios interesses, sempre buscará otimizar e reduzir custos na
produção, pode -se pensar que ele não se importará com a natureza.
Ocorre que, diante da previsão constitucional da tutela ambiental, tal
postura é inaceitável. Neste sentido:

É i na dm is s í v e l qu e o des e n vo l v im en to o c orr a à c us t a da
de gr a daç ã o d a q ua l i d ad e d e v id a d e o utr o s po v os , g er a nd o
ex t er na l i da d es n eg at i v as , m es m o por q u e os r ec urs os
am bi en t ais s ão f i n it os . Des s a f orm a, im põ e - s e a o Es ta d o a
tar ef a d e ex i g ir d as e m pres as q ue t od o pr o c es s o d e e v ol uç ão
ec o n ôm ic o - s oc ia l s ej a rea l i za d o m edi a nt e a g ara n ti a d e um
p la n ej am en to d e des e n vo l v im en to s us te n tá v e l, c om o f orm a d e
r ed u zi r os c o nf l it os e ntr e c r es c im ent o ec o n ôm ic o e pr ot eç ão
am bi en t al . ( Z ANO T I, 2 00 9 , p. 1 7 1).

Dessa forma, cabe ao Estado f iscalizar, criar incentivos e


modos de desestímulo, para que o empresário atue como parceiro na
preservação do meio ambiente, interagindo de forma harmoniosa com
os ecossistemas. Ademais, conforme entendem Stephen J. Dubner e
Steven David Levitt: “os incen tivos são a pedra de toque da vida
moderna” (DUBNER; LEVITT, 2005, p. 15). Sobre a intervenção estatal
e a criação de incentivos, de modo a direcionar a atividade empresarial
para o desenvolvimento sustentável, Luiz Antônio Ramalho Zanoti
observa que:
98

E o des e n v ol v im en to s us te nt á v e l oc o rre qu a n do se
c om pat i b i li za as n ec e s s i da d es do pr es en t e , m ed ia n te o us o
par c im on i os o d os rec urs os na t ura is , p ara nã o c o loc ar em
r is c o a s at is f aç ã o d as nec es s i da d es d as ge raç õ es f u tu ras . E
a i nt er v enç ã o es ta ta l s erá ef ic i en te s e o Es ta d o s e es tru t urar
de f o r m a ad e qu a da , par a po d er f is c a li z ar as aç ões d a
i nic i at i v a pr i va d a. E x s urg e , e n tã o, a n e c es s id a de d e s e
pos i t i var , no or d en a m ento j ur íd ic o bras i l e iro , o p ri nc íp i o
po l u id or - p ag a dor , c o m a ad oç ão d e m ed i das tr i bu t ár ias q u e
im po nh am c us t o a o a ge nt e p o lu i d or, c om o c om pe ns aç ã o
pe l os d a nos ec o l óg i c os q ue pro d u zi r n o m ei o am bi en t e.
( ZA NO T I, 2 0 09 , p . 17 1 ).

A defesa do meio ambiente está intimamente ligada ao direito à


vida e, por isso, deve preponderar sobre considerações de
desenvolvimento econômico desenfreado. Dessa forma, a proteção
ambiental serve como orientação para que a atividade empresarial
atenda à sua função social. Ademais, de acordo com as palavras de
Sérgio Botrel, “o direito a um meio ambiente sadio constitui um direi to
fundamental que deve servir de limites ao exercício da empresa, como
expressamente estatui o art. 170, inc. VI, da Constituição Federal.”
(BOTREL, 2009, p. 58).

Destarte, cabe ao Estado uma atuação preventiva, bem como


repressiva. A primeira, através da educação e da conscientização
social, para que o comportamento empresarial seja modificado para
uma postura ética. Já a ação repressiva deve visar garantir uma justa
indenização do empresário que agredir o meio ambiente, de forma
abusiva, não racional. Ta is atitudes se justificam eis que a sociedade,
atual e futura, sofrerá consequências alarmantes de condutas
agressivas ao meio ambiente.

Então, a busca por lucros, inerente à toda atividade empresarial,


não deve – e nem poderia – ser descartada, porém, nã o pode colocar
em risco a qualidade do meio ambiente, sendo certo que essa
preocupação é inerente à função social da empresa.

Ao empresário também interessa agir de forma ética perante o


meio ambiente, eis que suas atitudes ecológicas servem como valiosa
99

propaganda, de modo a conquistar, cada vez mais, consumidores e, até


mesmo, investidores. É neste sentido a observação de Luiz Antônio
Ramalho Zanoti, que sustenta:

A a d oç ã o de um a po l ít ic a d e g es t ã o am bi e nt a l, p or i nt erm éd io
de aç õ es c o nc r et as e l eg ít im as , pro p orc i on a à em pres a a
pos s i b i li d a de de s e d es t o ar d as d em ais , o qu e l h e g er a um
d if er e nc i a l es tr at é gic o d e s er de te n tor a d e m aior es v an t ag e ns
c om pet i ti v as , p e lo f a t o d e t er s e a n tec i p a do àq u e las . V a l e
f r is ar q ue es s as aç ões a p en as po d em s er c ons i de ra d a s
l eg ít im as s e f orem tra ns p ar e nt es e ef ic a ze s , c om patí v e is c om
a gr a n di os i da d e d as m etas a s er em at i ng i d as , l i vr es d a
b li n da g em de o bj et i v os es c us os , qu e s e l im itam a p en as a
es tr at é g ias d e mark e ti n g ins t it uc io n a l. (Z AN O T I, 20 0 9, p.
17 8) .

No mesmo sentido, as ponderações de José Carlos Barbieri:

O e n v ol v im en t o das e m pres as c om os pr ob l em as am bi e nt a is
ad q u ir e im por tâ nc i a es tr at é g ic a à m edi d a qu e a um en ta o
i nt er es s e da o p in i ã o p úb l ic a s o br e q u es t õ es am bi en ta is , b em
c om o d os gru p os i nt er es s a d os nes s es pro b l em as :
tr a b al h a dor es , c o ns u m idor es , i n v es t i dor es e am bi en t al is tas .
( B AR B I ER I, 2 0 04 , p . 1 10) .

Por isso, ocorre a divulgação dos atos ecológicos, visando, com


uma publicidade eficiente, atrair mais consumidores e grupos de
interesse, preocupados em adquirir e divulgar produtos de um
empresário que se preocupa com o bem -estar social. Dessa forma, a
escolha do consumidor, bem, como do investidor, será influenciada
pela ética ambiental empresarial. Sobre a postura ecológica que vem
sendo adotada, cada vez mais, po r empresários, observa Sérgio Botrel
que:

O qu e s e p o de ex i g ir da qu e l es qu e s e dis põ em a ex p l orar
a lg um a at i v i da d e e c on ôm ic a é a do t ar um a “po lí t ic a
ec o l o gic am en te a de q ua d a”, e v it an d o l es õ es d es n ec es s ári as
ao m e io am bi e nt e. Es s e p a drã o d e c o nd u ta , a l i ás , tem
ga n ha d o c or p o n ão s ó n o B ras i l, c om o em to do o m und o. A
c ons c i e nt i za ç ã o da p o pu l aç ão s o br e a im po rtâ nc ia d e def es a
do m ei o am bi en te t em le v a do os a g en t es ec o n ôm ic os a
100

i n ves t ir em c ond ut as ec o l o gic am en te c orre t as , q u e ot im i zam


s eus r es u l ta d os . ( BO T RE L , 20 0 9, p . 6 7).

Diante disso, pode -se dizer que o empresário, através de uma


postura ambiental ética, atende à função social de sua atividade, bem
como desempenha importante papel em benefício da coletividade. E,
como maximizador de seus interesses, utiliza rá a melhoria da sua
imagem perante a comunidade como forma de aumento dos lucros.

5.6 Função social da empresa perante o mercado

A livre iniciativa, da qual decorre o livre mercado, é um dos


princípios constitucionais fundamentais da República Federa tiva do
Brasil, e, também, um dos fundamentos da ordem econômica. Dessa
forma, ela fundamenta toda a estrutura dos ideais de liberalismo
econômico e possui relevante destaque econômico constitucional.

O mercado, que pode ser definido como “uma abstração de finida


pela existência e entrechoque de forças aparentemente antagônicas, as
da oferta e as da procura” (ROSSETTI, 2006, p. 439), está diretamente
ligado à atividade empresarial. Isto porque ao empresário interessa
oferecer ao mercado bens ou serviços, ger ados através da organização
dos fatores de produção. Ademais, de nada adianta produzir se não
houver ninguém para comprar.

A respeito de mercado, pode -se afirmar que “é a instituição que


existe para facilitar a troca de bens e serviços, isto é, existe par a que
se reduzam os custos de se efetivarem operações de trocas” (COASE,
1988, p. 7). Dessa forma, os mercados “tornam eficiente a troca
econômica” (SZTAJN, 2004, p. 29).
101

O mercado envolve todos os stakeholders , e, ainda, contribui


para a organização econô mica da sociedade. Neste sentido, a seguinte
observação de Rachel Sztajn:

Na m ed i da em qu e s e en te n da m erc a d o c o m o um a ins t i tu iç ão
qu e vis e a c r ia r i nc e n ti v os , re du zi r i nc er t e zas , f ac i l i tar
op er aç ões en tre p es s oas , f ic a c l ar a a i d é ia de q u e m erc ad os
aum en t am a pros p er i da d e e, por t an to , o bem - es t ar g era l .
( SZT AJ N, 20 0 4, p . 3 4) .

O mercado é fundamental para a economia, tendo, de forma


clara, uma relevante função social. É neste sentido a observação de
Luciano Timm, que sustenta ser o mercado um meio que fa cilita as
trocas, tendo a função social de viabilizar que os indivíduos possam
satisfazer suas vontades, seja para sua sobrevivência, ou, então para
sua comodidade. (TIMM, 2008, p. 85). Neste sentido:

O m er c ad o, por t an to , al ém de s er um f ato s oc i a l, é um a
nec es s i da d e s oc i a l. A s oc ie d ad e c o nt em por ân e a nã o
c ons e gu e s e es ta b e lec er (m ui to m en o s at i ng ir ní v e is
ad e qu a dos d e v i da ) s em as prát ic as d e m erc ad o , p orq u e as
tr oc as s oc i a is em es paç os pú b l ic os f ís ic o s (c om o as f e iras ,
por ex em pl o) ou vi rtu a is (c om o as b o ls as d e v a lor es
e le tr ô n ic as ) s ã o c o ns eq ü ênc i as i n arr ed á v e i s do am b ie n te de
es p ec i al i za ç ão ver if ic ad o a pós o pr oc es s o de d i v is ão d o
tr a b al h o, o nd e as n ec es s i d ad es i lim it a d a s e os r ec u rs os
es c as s os – o c on h e c i do pro b l em a c en tr a l d a Ec o n om ia –
ex ig em ot im i za ç ã o. (T I M M; M A CH A DO , 2 0 0 6, p . 4)

O livre mercado, decorrente dos princípios da livre iniciativa e


da livre concorrência, contribui para o bem -estar coletivo. É o que se
extrai das ponderações de Rachel Sztajn, segundo as quais: “a
liberdade de mercado ate nde aos interesses de todos ao facilitar a
oferta de bens e a concorrência entre agentes e, portanto, o incremento
do bem-estar social” (SZTAJN, 2004, p. 26).

Vale frisar que é comum o empresário – detentor de poder


econômico – obter lucros tirando vantage ns de sua posição destacada
no mercado. Esse fato, por si só, não denota qualquer irregularidade,
102

sendo que o Estado deve reprimir as condutas que visem dominar o


mercado, prejudicando a livre concorrência, bem como os atos de
aumento abusivo de preços, le sando o consumidor. É neste sentido a
observação de Luiz Regis Prado, que sustenta:

Res s a lt e - s e qu e o p od er ec o nôm ic o é u m dad o d e f a t o


i ner e nt e a o l i vre m erc ad o , is to é, os ag e nt e s ec o n ôm ic os s ã o
nec es s ar iam en t e d es i gu a is , u ns m ais f or te s qu e os o utr os .
Nã o s er i a p os s í v e l i g nor ar ou p re te n de r a e lim i naç ã o d es s e
po d er . O q u e o D ir e it o p o d e f a ze r é d is c ip l i na r o s e u
ex er c íc io , re pr im in d o c ert as m oda l i da d es de in ic i at i v a q ue
am eac em ou p os s am am eaç a r as es tr ut ur as do l i vre m erc a d o,
v .g ., o d om ín io d e m er c ad o s , a e l im in aç ão d a c onc orr ê nc i a o u
o a um ent o ar b itr ár i o d e l uc ros . (P R AD O , 2 0 0 4, p . 3 3).

O empresário, no exercício de sua atividade, cumprirá sua


função social quando colaborar para um mercado lícito em que haja
liberdade de escolha, dentro de um context o da livre iniciativa e da
livre concorrência. Somente através do respeito à função social da
empresa será possível atingir um modelo de mercado que possibilite o
regular exercício da autonomia da vontade, contribuindo, destarte, para
o desenvolvimento eco nômico sustentável.

Portanto, o sucesso empresarial e sua inerente função social


dependem do mercado, pois este é responsável pela circulação de
bens ou serviços. A empresa que descumprir sua função social
necessariamente prejudica o mercado, o qual também possui papel
fundamental na sociedade.

5.7 Função social da empresa perante o direito penal empresarial

O chamado Direito Penal Empresarial, ou Penal Econômico,


possui matéria complexa eivada de tecnicismo e de árdua apreensão.
103

Esse ramo do direito vi sa tutelar a atividade econômica desenvolvida


numa economia de mercados livres.

Apesar de integrar o direito penal, possui íntima ligação com a


atividade econômica empresarial, eis que, em alguns casos de abuso
de direito, os agentes, na busca da maximiza ção de seus lucros,
infringem normas de Direito Penal Econômico por meio de uma
sociedade empresária. Conforme observam Paulo José da Costa Júnior
e Cesare Pedrazzi,

No ins ta n te em qu e s e perm it e a os s ó c i os ex e rc er um a
at i v i da d e c om erc ia l c om o res pa l d o d a pes s o a j ur í dic a ,
l im ita n d o - l h es a res p o ns a b i l id a de , a l e i s e s en t e n o de v er de
pr o t eg er , inc l us i ve p en a lm en te , t erc e iros q ue e ntr em em
c on t at o c om a s oc i ed a de . ( CO ST A J ÚN IO R ; P ED R AZZ I, 2 0 05 ,
p. 1 4) .

Sobre o Direito Penal Empresarial, assevera Jair Leona rdo


Lopes:

Em s e tr a t an d o das re l aç õ es d o d ir ei t o p en a l c om o utr as
d is c i p l in as j u rí d ic as , m erec e ref erê nc i a es p ec ia l o d en om in a do
“ Di r e i to P e na l Ec on ô m ic o” q ue , s eg u nd o a lg u ns , tem po r
obj et o os c r im es pr at ic ad os “n a p ro d uç ão , d is tri b u iç ã o e
c ons um o de be ns e s e rv iç os ”. (L O PE S , 2 00 5 , p. 3 4) .

Dessa forma, o Direito Penal Empresarial trata do conjunto de


delitos – geralmente de natureza patrimonial – que podem ser
praticados quando do exercício de atividade econômica organizada
visando a obtenção de lucr os, em uma economia de mercado.

São condutas graves, eis que suas consequências atingem,


geralmente, pessoas indeterminadas, interesses difusos e, ainda, pela
finalidade de maximização dos lucros que inspira os autores. Conforme
entendem Paulo José da Cos ta Júnior e Cesare Pedrazzi, “trata -se,
104

pois, de tutela penal coletiva” (COSTA JÚNIOR; PEDRAZZI, 2005, p.


14).

Esse tipo de tutela penal se justifica pela natureza supra


individual dos bens jurídicos protegidos. Por exemplo, a tutela da
ordem tributária, a través desse ramo do direito penal, visa proteger,
ainda mais, a receita tributária, que dará o respaldo econômico para a
realização de atividades destinadas às necessidades sociais.

Ainda sobre a tutela da ordem tributária, fundamental ressaltar


que a tributação é um eficaz instrumento de erradicação da pobreza e
da redução das desigualdades sociais, na medida em que ocorra uma
distribuição funcional da renda. Vale frisar que a erradicação da
pobreza e a redução das desigualdades sociais constituem obj etivos
essenciais de nosso Estado Democrático de Direito, conforme dispõe o
artigo 3º, inciso III, da Constituição da República de 1988. Sobre a
importância da atividade tributária, Luiz Regis Prado assevera:

Es s as r egr as e pr inc í p ios i nf orm am a at i v i da d e tr i b ut ár ia d o


Es t a do e pr o porc i o na m o in gr es s o d os rec urs os n ec es s ár i os
par a at e nd er s e us ga s tos , n o c as o de nã o s erem s uf ic i en tes
os auf er id os d e s ua rec e it a p atr im on i a l, o u s ej a , a qu e la
or iu n da d a ex p l oraç ã o d o pa tr im ôn io es ta t a l. A ob te nç ã o d e
r ec e i ta é f e it a m ed i a nt e a i ns t i tu iç ã o d e t ri bu tos ( im pos t os ,
tax as , c o ntr i bu iç õ es d e m el hor i a, em prés t im os c om pu ls ór i os e
c on tr ib u iç ões s oc i a is ) e t em c om o es c op o pr im ord i a l
s at is f a ze r às n ec es s i da d es s oc ia is e at e n der a os e nc ar g os
pú b l ic os do o rç am en t o . ( P RA DO , 20 0 4, p . 4 0 0 - 4 0 1).

Contrabando, descaminho, delitos contra o sistema


previdenciário, dentre outros previstos no Código Penal, fazem parte do
ramo específico do direito penal empresarial. Da mesma forma, os
crimes previstos na Lei de Falência e Recuperação de Empresas e os
previstos nas seguintes legislações: Lei dos crimes contra o sistema
financeiro (7.249/86), Lei dos crimes ambientais (9.605/98), Lei de
licitações (8.666/93), Lei dos crimes de lavagem de dinheiro (9.613/98),
Lei 9.279/96 (que prevê crim es contra as patentes, contra os desenhos
industriais, contra as marcas, contra as indicações geográficas e os
105

crimes de concorrência desleal), o Código de Defesa do Consumidor


(Lei 8.078/90, arts. 61 a 76) e a Lei dos crimes contra a ordem
tributária, econômica e contra as relações de consumo (Lei nº
8.137/90).

Então, percebe-se que o legislador preocupa -se, cada vez mais,


com a regulação da atividade empresarial, prevendo sanções penais
para várias práticas que lesem interesses difusos. Assim, pode -se
afirmar que o empresário, ao maximizar seus interesses, deve estar
atento para que sua atividade econômica exerça função social. Neste
sentido, as palavras de Rachel Sztajn:

A r ac i on a l id a de dos a ge n tes , um dos pos tu l ad os ec o nôm ic os ,


qu e l e v a à pr oc ur a da m ax im i zaç ão d e ut i l i da d es , e a
ef ic i ênc i a al oc at i v a, s eg u nd o es s a vis ã o, v ão a o e nc o ntr o da
i dé i a d e s o li d ar ie d a de e ger aç ão de b em - es tar c ol e ti v o .
( SZT AJ N, 20 0 5, p . 7 6) .

E, é claro, o empresário somente irá pensar no bem -estar


coletivo se isso não significa r prejuízo para ele, aumentando seus
custos de modo não eficiente. O custo benefício sempre deve ser
analisado, eis que inerente à atividade empresarial. Sobre o sentido de
eficiência aqui tratado, importante citar as palavras de Bruno Salama:
“Eficiência diz respeito à maximização de ganhos e minimização de
custos. Dessa ótica, um processo será considerado eficiente se não for
possível aumentar os benefícios sem também aumentar os custos.”
(SALAMA, 2008, p. 55).

Nesse sentido, percebe -se que um dos principais objetivos da


tutela penal empresarial é assegurar que o exercício da empresa
atenda à sua função social, contribuindo para o regular funcionamento
do mercado, estabilidade econômico social e, consequentemente, para
um desenvolvimento econômico sust entável. Isso tendo em vista que o
legislador deu tratamento mais severo nos casos de ameaça a
interesses econômicos coletivos, atendendo a um critério de
proporcionalidade e razoabilidade das penas.
106

Pode-se afirmar que o ser humano, ao exercer atividade


econômica organizada, irá analisar todas as consequências de seus
atos, tendo em vista que age maximizando seus interesses em busca
de lucros dentro de um mercado livre e globalizado. Por isso, para que
o Estado consiga que o empresário atue exercendo funç ão social, deve
apresentar desestímulos e incentivos para direcionar e orientar as
atividades econômicas.

Com relação aos incentivos, a pessoa primeiro busca


informações, para calcular o que ganha e o que pode perder com
determinada escolha. A respeito d os desestímulos, vale frisar que o
empresário sempre tenta antever as consequências de seu
comportamento. Trata -se de uma análise de custo benefício, exercício
diário na vida de quem exerce atividade empresarial.

Então, uma pessoa analisa todas as variáve is na hora de


pensar em infringir ou não uma norma com possibilidade de efeitos
criminais. Ademais, conforme entende Steven Shavell (2000), quando
um indivíduo resolve cometer ou não um ato criminoso, elE analisará a
sanção prevista e o benefício que ela p ode obter. Caso a sanção seja
superior do que o benefício esperado e a pessoa decida não cometer o
ato, pode-se dizer que ela foi dissuadida a isso e o sistema preventivo
funcionou da forma esperada.

Para exemplificar, pode -se citar a hipótese de um sócio de uma


sociedade empresária que, antes de implantar uma estratégia
tributária, consulta um advogado criminalista para saber se sua
conduta configura algum crime. E, além disso, quais as consequências
jurídicas desse comportamento.

A respeito da relação en tre a função social da empresa e o


direito penal econômico, pode -se dizer que esse ramo penal visa
proteger a dignidade da pessoa humana, bem como desestimula
práticas empresariais que prejudiquem os ditames da justiça social.
Neste sentido, Paulo José da Costa Júnior e Cesare Pedrazze
asseveram que o direito penal empresarial protege a sociedade, bem
107

como os bens envolvidos na circulação de riquezas, pois visa


“assegurar que seu patrimônio se destine à obtenção de escopos
sociais” (COSTA JÚNIOR; PEDRAZZI, 2005, p. 16). E, ainda, para
esses autores,

A t ut e l a d as s oc i e da des c om o p es s o as j u ríd ic as o b ed ec e a
e v id e nt e in te res s e c o l et i v o: da d o o p a pe l de pr ot a go n is t as
qu e as s um iram no s is t em a ec on ôm ic o nac i o na l , c o ns t it u i
i nt er es s e n ão a p en as d e s e us s óc ios , m a s d e t o da a Naç ã o,
qu e ve n ham el as a s er ger i d as h on es t a e c orr e tam en t e.
( CO ST A J ÚN IO R; P E D RA ZZI , 2 00 5 , p. 1 6) .

A legitimidade da tutela penal empresarial se consolida no fato


de que a empresa possui relevante função social e que os recursos
econômicos ligados à atividade empresarial se destinam a assegurar
melhores condições de vida a todos. Dessa forma, o direito penal
empresarial “tem por fim garantir a todos uma existência digna,
conforme os ditames da justiça social” (PRADO, 2004, p. 31), sob pena
de ocorrer responsabilidade penal.

Então, o direito penal econômico visa orientar a intervenção do


Estado na economia, com o objetivo de fazer valer a função social da
empresa, a fim de punir e evitar que sejam realizadas práticas
empresariais abusivas que de stoem do contexto empresarial no Estado
Democrático de Direito brasileiro. Neste sentido, as palavras de Ana
Frazão de Azevedo Lopes:

O d ir e it o c ert am en te nã o p od e es per ar q ue a em pres a de ix e


de b us c ar o l uc r o e a ef ic i ênc i a, p o is is s o s er ia s ub v ert er
to ta lm en te a r ac i o n a li d ad e ec o nôm ic a ex is t en t e, s e nd o
pr e v is í ve l a in ef ic ác i a de q u a lq u er n orm a qu e c o nt i v es s e
pr e v is ã o s em el h an te . No e nt a nt o, o d ire i t o p od e pr et e n der
r eg u l ar e a de q ua r a b us c a d a ef ic iê n c i a e do l uc r o,
es t a be l ec e n do c r it ér i os qu e d ir ec io n em o ex erc íc i o d a
at i v i da d e em pres a ri a l em ra zã o d e nor m as e pr i nc í p i os
j ur í d ic os , i nc lus i v e p a ra o f im de p u n ir as c on d ut as i l íc i t as .
( LO P E S, 2 0 06 , p . 26 8) .
108

Sempre que ocorrer ofensa a uma norma do direito penal


empresarial, a função social da empresa não foi observada. Dessa
forma, para evitar que os sócios sejam responsabilizados penalmente,
deverá ocorrer conciliação entre a busca por lucros e o respeito às
normas inerentes ao exercício da função social.
109

6 CONCLUS ÃO

Ao longo desta dissertação foi analisada a função social da


empresa, após a Constituição da República de 1988, a qual fincou o
Estado Democrático de Direito, em uma busca de equilíbrio entre a
pessoa e a coletividade. Neste contexto, percebe -se que o direito
privado de ve ser lido a partir da Constituição, sendo que essa leitura
torna-se condição para validade de todos os atos, públicos e privados,
eis que os princípios fundamentais somente são decifrados através de
uma perspectiva constitucional.

Verifica -se a necessidade de interpretação de todas as normas


de acordo com a Carta Magna, eis que ela é o centro do ordenamento
jurídico. Até mesmo o Código Civil, que é o centro do direito privado,
deve ser lido em conformidade com a Constituição de 1988.

A empresa é elemento fundamental para a estrutura econômica


e social da coletividade. Partiu -se do conceito de empresa como
atividade econômica organizada, a qual é exercida – profissionalmente
– pelo empresário, que busca aperfeiçoar a produção para o mercado.

Para atingir essa meta, foi feito um breve histórico do direito


empresarial, desde a origem do direito comercial até o direito
empresarial no contexto do Estado Democrático de Direito. Com efeito,
foi analisada a interpenetração entre o público e o privado, bem como a
constitucionalização do direito privado.

Efetivamente, verificou -se que a função social, como princípio


previsto na constituição e intrínseco à todos os princípios inerentes à
empresa na ordem econômica e social conforme a Carta Magna, exige
uma postura em presarial que busque privilegiar os ditames da justiça
social, com um ganho econômico mais justo para todos e, ainda, que
vise impedir abusos no uso do poder econômico. Isso tendo em vista
110

que o direito é um sistema de princípios, e não um mero sistema de


normas convencionadas.

Nessa ordem de idéias, a função social da empresa mostra o


compromisso das atividades econômicas com a dignidade da pessoa
humana. Trata-se de uma proposta de humanização, a fim de que os
indivíduos deixem de ser tratados como meros instrumentos na busca
por lucro e possam ser reconhecidos como valores supremos.

Destarte, a dignidade da pessoa deve prevalecer frente ao


aspecto patrimonial da atividade empresarial, através de condições
impostas pela função social, sem pretender reduz ir a empresa a apenas
uma função social. O propósito é de tornar apropriada uma empresa
socialmente responsável, resgatando o seu papel institucional diante
dos compromissos que lhe atribui a ordem constitucional econômica,
dentro do contexto do Estado Dem ocrático de Direito.

De forma alguma é condenada a busca pelo lucro, até porque


constitui exigência da subsistência empresarial, mas o empresário deve
exercer, ao mesmo tempo, a função social. Ademais, função social é
diferente de uma função de assistência social. Portanto, deverão ser
atendidos os interesses monetários e, de forma harmônica, os
socialmente relevantes, numa busca de equilíbrio na ordem econômica,
com supremacia na observância dos princípios constitucionais.

Além disso, é esta responsável pe la geração de empregos, pelo


recolhimento de tributos (sustento da economia) e, ainda, movimenta a
economia (compra e venda de bens e prestação de serviço).

Então, o imperativo do exercício da função social é alcançado


quando, além da empresa gerar emprego s, pagar corretamente os
tributos e fazer circular riquezas, for observada a dignidade da pessoa
humana, a livre iniciativa, a valorização do trabalho humano, a
soberania nacional econômica, a livre concorrência, a defesa do
consumidor, a defesa do meio am biente, a redução das desigualdades
sociais e regionais, a busca do pleno emprego, dentre outros princípios
constitucionais.
111

Com efeito, o empresário tem como meta a obtenção de lucro –


inerente a toda atividade empresarial – e, conforme o princípio da
função social da empresa, deve buscar conciliar esse objetivo com a
busca do bem -estar coletivo. Ademais, a empresa é instrumento
essencial ao cumprimento da função sócio econômica.
112

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