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VOLTA REDONDA
2017
CAROLINE GARCIA ERMANO
Junior
VOLTA REDONDA
2017
TERMO DE APROVAÇÃO
Fluminense – UFF
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________
_________________________________________________
_________________________________________________
Todo o esforço empenhado neste trabalho não seria possível sem o incentivo e a
motivação daqueles que sempre acreditaram no meu êxito: minha família. Quero agradecer
aos meus amados pais, Alessandra e Adivaldo, e ao meu irmão, Pedro, por estarem sempre
comigo em todo o caminho que percorri até chegar aqui, até minha formação. Obrigado por
Aos meus professores durante todo o curso que sempre me inspiraram a pesquisar e a
conhecer cada vez mais, eu lhes agradeço. Minha admiração por vocês é enorme.
teve imprescindível participação neste trabalho. Sem você, professor, eu não o teria finalizado
(Friedrich Nietzsche)
RESUMO
O presente trabalho tem como objeto de estudo a estrutura do negócio jurídico, mais
precisamente sobre os elementos de sua formação. O tema será analisado nas teorias de
Pontes de Miranda e de Emílio Betti, de forma mais aprofundada. O desenvolvimento se deu
a partir de pesquisa bibliográfica, em obras de diversos autores civilistas, dentre eles os
citados.
Inicialmente, reporta-se ao conceito de negócio jurídico e as teorias que explicam a vontade
na formação do mesmo. Em sequência, demonstra-se a dissonância doutrinária acerca da
formação do negócio e seus elementos estruturais. Adiante, principal objetivo do presente,
expõe-se o pensamento de Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, autor cuja teoria ganhou
maior receptividade na civilística brasileira e, após, a teoria de Emílio Betti, jurista italiano e
precursor da teoria preceptiva do negócio, a qual é apresentada aqui como um contraponto e
uma segunda forma compreensiva sobre a formação do negócio jurídico.
O resultado é a demonstração de duas concepções distintas acerca da estrutura do negócio
jurídico, encontrando nas duas teorias seus aspectos diferentes sobre o instituto.
INTRODUÇÃO.................................................................................................................. p. 08
10
15
JURÍDICO ......................................................................................................................... p. 21
MIRANDA.......................................................................................................................... p. 24
27
3.3 Da forma......................................................................................................................... p.
35
jurídicos................................................................................................................................ p. 40
43
BETTI.................................................................................................................................. p.
45
47
4.2 Do conteúdo.................................................................................................................... p.
56
CONCLUSÕES................................................................................................................... p.
62
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................. p.
65
INTRODUÇÃO
as relações sociais.
A todo momento o homem moderno realiza negócios jurídicos. Seja compra e venda,
doação, ou qualquer outra modalidade de contrato ou negócio – aquele sendo espécie deste –
jurídico.
exigências legais para sua validade e eficácia, subsiste um certo dissenso sobre os elementos
necessários para a sua constituição. A doutrina não possui uma explicação satisfatória sobre
os elementos constitutivos do negócio jurídico. Por isso, neste trabalho tenta-se elucidar as
principais posições sobre quais elementos compõem seu suporte fático. Desse modo, o que
Além do mais, não há, em nosso Código Civil, capítulo e nem dispositivos para
negócio, razão pela qual o presente trabalho tem preocupação intensamente conceitual e
doutrinária. Vale dizer, é de imensa relevância o estudo da formação do negócio, para que,
quando estiver formado e existir no mundo jurídico, possa a norma nele incidir e produzir
A fim de imprimir uma visão mais abrangente sobre a estrutura do negócio jurídico,
diferente sobre aquilo que fundamenta o balizamento dos negócios jurídicos. Encontrou-se na
doutrina de Emilio Betti, Catedrático da Universidade de Roma, jurista italiano que representa
compreendendo uma composição de interesses das partes com uma finalidade específica2.
É meio eficaz e relevante para estabelecer relações jurídicas, e com certo destaque
humana (art. 170 e 1º, III, da Constituição Federal de 1988). O negócio é instrumento
1
AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Negócio Jurídico: Existência, Validade E Eficácia. 4. ed. São Paulo:
Saraiva, 2002. p. 16.
2
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. 6. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense;
São Paulo: MÉTODO, 2016. p. 221.
3
GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 264, grifo nosso.
12
que todo contrato é um negócio jurídico, sem exceções. A sociedade moderna celebra dezenas
4
BETTI, Emílio. Teoria Geral do Negócio Jurídico. 1. ed. Coimbra: ed. Coimbra, 1969, tomo I. p. 89, grifo
nosso.
5
AZEVEDO, Fábio de Oliveira de. Direito Civil: Introdução e Teoria Geral. 3. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro:
Editora Lumen Juris, 2011. p. 350.
6
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 3. ed. Rio de Janeiro: Editor
Borsoi, 1970, tomo III. § 249, p. 3, grifo nosso.
13
Pontes aduz que “todo negócio jurídico cria relação jurídica, constituindo, ou
exceções”7. O que se estabelece, pois, pelos interessados no negócio é a sua eficácia, não se
Emílio Betti, por sua vez, ao conceituar o negócio jurídico como um ato de autonomia
7
Idem. Ibidem. tomo III, § 250, item 1, p. 8.
8
Assim dispõe o autor “O que os interessados no negócio jurídico estabelecem não é mais do que eficácia do
negócio jurídico; não e, sequer, vontade que permanece, nem se há de confundir a vontade, que traçou a conduta
futura e o futuro do próprio negócio jurídico, com a eficácia do negócio jurídico que aponta essa conduta e faz
preestabelecido o futuro do negócio jurídico.” (Idem. Ibidem. tomo III, § 250, item 1, p. 9)
9
BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 98, grifo nosso.
10
Idem. Ibidem. p. 107-108, grifo nosso.
11
Idem. Ibidem p. 102.
12
GOMES, Orlando. Op. Cit., p. 269.
14
ato jurídico lato sensu, que, por sua vez, é espécie de fato jurídico lato senso. Portanto, fato
jurídico é gênero, no qual são espécies atos jurídicos em sentido amplo (ou lato sensu) e fatos
Para uma conceituação dos fatos jurídicos, estes são, segundo Emílio Betti:
Nos fatos jurídicos, a nova situação jurídica estabelecida pela norma não se produz
enquanto não se verificar, inteiramente, a hipótese de fato, ou seja, o suporte fático. Isso inclui
Outros autores, como Marcos Bernardes de Mello, de forma um pouco diversa, diferem as
duas categorias pela presença ou não de conduta humana volitiva à base do suporte fático15.
13
BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 20.
14
Betti critica a doutrina que distingue os fatos jurídicos em fatos voluntários (atos) e fatos naturais (fatos em
sentindo estrito), sendo desprovida de interesse e equívoca: “Na realidade, a distinção entre actos e factos
jurídicos, só tem sentido na medida em que tome por base o modo como a ordem jurídica considera e valoriza
um determinado facto. Se a ordem jurídica toma em consideração o comportamento do homem em si mesmo e,
ao atribuir-lhe efeitos jurídicos, valoriza a consciência que, habitualmente, o acompanha, e a vontade que,
normalmente, o determina, o facto deverá qualificar-se como acto jurídico. Mas deverá, pelo contrário,
qualificar-se como facto, quando o direito tem em conta o fenómeno natural como tal, prescindindo de eventual
concorrência da vontade: ou então quando ele considera, realmente, a acção do homem sobre a natureza exterior,
mas, ao fazê-lo, não valora tanto o acto humano em si mesmo, quanto o resultado de facto que ele tem em vista;
quer dizer, a modificação objectiva que ele provoca no estado de coisas pré-existente.” (Idem. Ibidem. p. 30)
15
“Parece evidente que a presença de uma conduta humana como componente cerne de suporte fáctico
estabelece uma diferença substancial entre os fatos jurídicos. Analisando o mundo do direito, sob esse aspecto,
constatamos que há fatos jurídicos cujos suportes fácticos são integrados: (a) por simples fatos da natureza ou do
animal, que prescindem portanto, para existir, de ato humano; são os fatos jurídicos stricto sensu, lícitos e
15
Os atos jurídicos lato senso (ou em sentido amplo), por sua vez, se dividem em: ato
Nesta esteira, prevalece a teoria dualista que, adotada pelo nosso Código Civil, tem
origem alemã (bem como italiana), tendo sido objeto de extensa abordagem por Pontes de
Miranda. Há, para tal teoria, duas espécies de atos jurídicos: atos jurídicos stricto sensu (ou
não negociais) e os negócios jurídicos. A diferença entre as duas espécies consiste em que nos
atos jurídicos stricto sensu os efeitos decorrem da lei, as pessoas envolvidas não podem
jurídicos, o sistema jurídico deixa ampla margem para que as partes determinem as sutilezas
de eficácia que o negócio terá (por exemplo, contratação de shows musicais por
empresários)17.
anterior, de Clóvis Beviláqua, elaborado em 1899 não dispensou tratamento específico a estes,
mas apenas aos atos jurídicos. Porém, no atual Código, de lavra do Ministro Moreira Alves,
ilícitos; (b) outros, diferentemente, têm à sua base, como elemento essencial (cerne), um ato humano; entre estes:
(b.a) há alguns em que, embora a conduta humana lhe seja essencial à existência, o direito considera irrelevante
a circunstância de ter, ou não, havido vontade em praticá-la, dando mais realce ao resultado fáctico que dela
decorre do que a ela própria: são os atos-fatos jurídicos, lícitos e ilícitos; (b.b) em outros, porém, a vontade em
praticar o ato não somente é relevante, como constitui o próprio cerne do fato jurídico. São os atos jurídicos lato
sensu, que se subdividem em atos jurídicos stricto sensu e negócios jurídicos e atos lícitos.” (MELLO, Marcos
Bernardes de. Teoria Do Fato Jurídico: Plano Da Existência. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 122)
16
BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 30.
17
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson; NETTO, Felipe Peixoto Braga. Manual de Direito Civil:
Volume Único. 1. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017. p. 490.
18
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodoldo Pamplona. Novo curso de direito civil: Parte Geral. 13. ed.
São Paulo: Saraiva, 2011, v. 1. p. 347.
16
Assim explicam Cristiano Chaves de Farias, Felipe Braga Netto e Nelson Rosenvald:
conceito novo, e, assim, precisa de mais desenvoltura de sua matéria, sobretudo sobre os
negócio, ora o define como ato de vontade, ora como um preceito. O primeiro estaria
“auto-regramento da vontade”20.
19
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson; NETTO, Felipe Peixoto Braga. Op. Cit., p. 489.
20
AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Op. Cit., p.1-2.
17
A corrente voluntarista adota a teoria da vontade interna, isto é, o negócio tem sua
a produzir efeitos jurídicos, ou em ato de vontade dirigido a fins práticos tutelados pelo
jurídico”23.
humana regular os efeitos desejados, que é a sua perspectiva psicológica”24. O mesmo autor
ainda destaca que se trata de uma concepção liberal do negócio jurídico, embasada em uma
21
GOMES, Orlando. Op. Cit., 270.
22
Idem. Ibidem. p. 4.
23
Idem. Ibidem. p. 7.
24
AZEVEDO, Fábio de Oliveira de. Op. Cit., p. 351.
25
GOMES, Orlando. Op. Cit., p. 271.
18
Portanto, a teoria voluntarista faz prevalecer a vontade interna do agente, sua intenção,
no negócio.
como representantes Bullow, Henle e Larenz, na Alemanha, e Betti, na Itália. Para esta teoria,
eficácia vinculante”27.
26
AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Op. Cit., p. 8-9.
27
Idem. Ibidem. p. 11-12.
28
GOMES, Orlando. Op. Cit., p. 271.
19
Precursor da teoria preceptiva do negócio, Betti expõe que a vontade, como fato
Betti ensina que a declaração tem natureza preceptiva ou dispositiva, e, desta forma,
caráter vinculativo (o que será tratado mais adiante). O comportamento concludente também
dispõe deste caráter. Ressalta que a vontade, entendida não como fato psicológico individual
do querer, mas como orientação concreta e tomada de posição, em relação a certos interesses,
deve se tornar exteriormente reconhecível no ambiente social, para poder adquirir relevância e
29
BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 101, grifo nosso.
30
“Uma definição, ainda hoje comum na doutrina, onde se tornou translatícia por uma espécie de inércia mental,
caracteriza, ao invés, o negócio como uma manifestação de vontade, destinada a produzir efeitos jurídicos. Mas
esta qualificação formal, frágil e incolor, inspirada no <<dogma da vontade>>, não lhe apreende a essência, a
qual está na autonomia, no auto-regulamento de interesses nas relações privadas, como facto social:
auto-regulamento, portanto, que o particular não deve limitar-se a desejar, a <<querer>>, na esfera interna da
consciência, mas antes a preparar, ou seja, a realizar objectivamente. (...) Nega-se, apenas, que a vontade se
encontre, no negócio, em primeiro plano, e que a concordância entre os efeitos jurídicos e a função ou razão
(causa) do negócio, também deva, ela própria, ser querida, como se pretende quando se postula uma vontade
individual orientada para os efeitos jurídicos.” (BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 111-114)
31
Idem. Ibidem. p. 109, grifo nosso.
20
A teoria da declaração, valorizando a vontade declarada, seria uma fase para se chegar
conciliar as duas teorias – voluntarista e objetivista – criou o critério “estrutural”, para quem
pressupostos de existência, validade e eficácia impostos pela norma jurídica que sobre ele
incide”34.
Fábio de Oliveira Azevedo35 expõe que, para Antônio Junqueira, o negócio jurídico
qualificada, a que se atribuirá o nome declaração de vontade. Quer dizer que há uma
32
Idem. Ibidem. p. 133.
33
Idem. Ibidem. p. 10.
34
“A referência ao negócio jurídico como um poder da vontade o associa à teoria da vontade, enquanto a alusão
a autorregramento o vincula à teoria objetivista. Eis aí a razão que levou Antônio Junqueira de Azevedo a
‘concluir que as duas concepções do negócio são insuficientes; impõe-se a adoção de uma terceira concepção’.”
(AZEVEDO, Fábio de Oliveira de. Op. Cit., p. 353)
35
Idem. Ibidem. p. 353.
36
Apesar de louvável trabalho elaborado por Antônio Junqueira de Azevedo, mais acertada é a adoção à teoria
objetivista, a qual se perfilha o presente trabalho. Até mesmo o autor, ao definir o negócio, assim o faz como
“todo fato jurídico consistente em declaração de vontade...”. Nota-se que, em regra, mesmo para o autor, a
valorização deve ser da declaração, de forma que esta constitui o negócio, e não a vontade interna do agente. Não
se pode, ao mesmo tempo, valorizar a vontade interna e a declaração. O que deve preponderar é a segunda em
relação à primeira, até mesmo em atenção aos ditames da boa-fé objetiva e da segurança jurídica que norteiam o
ordenamento jurídico. A teoria criada, denominada “estrutural” em muito se aproxima das teorias objetivistas,
uma vez que valoriza a vontade declarada, e não o caráter psíquico do agente. A semelhança pode ser percebida
em tal trecho da obra de Junqueira: “O importante na caracterização do negócio é salientar que, se, em primeiro
lugar, ele é um ato cercado de circunstâncias que fazem com que socialmente ele seja visto como destinado a
produzir efeitos jurídicos, em segundo lugar, a correspondência, entre os efeitos atribuídos pelo direito (efeitos
jurídicos) e os efeitos manifestados como queridos (efeitos manifestados), existe, porque a regra jurídica de
atribuição procura seguir a visão social e liga efeitos ao negócio em virtude da existência de manifestação de
vontade sobre eles.” (AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Op. Cit., p. 19)
21
Para Cristiano Chaves de Farias, Felipe Braga Netto e Nelson Rosenvald o Código
Civil atual pareceu trilhar um caminho intermediário, enunciando, no art. 112: “Nas
literal da linguagem”37. A afirmação, porém, não é uníssona na doutrina. Ana Luisa Maia
Nevares entende que o Código Civil atual, em seu art. 112, adotou a prevalência da declaração
JURÍDICO
Visto isto, quais seriam os elementos que formam e estruturam o negócio? Dito de
outra forma, o que é necessário para que o negócio se forme ou exista, e nele incida a norma
jurídica? A resposta guarda alto nível de complexidade e está longe de ser uníssona na
concepções sobre a estrutura do negócio jurídico, e como elas divergem entre si.
37
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson; NETTO, Felipe Peixoto Braga. Op. Cit., p. 491.
38
NEVARES, Ana Luisa Maia. O erro, o dolo, a lesão e o estado de perigo no Código Civil de 2002. In:
TEPEDINO, Gustavo (Org.) A Parte Geral do Novo Código Civil: estudos na perspectiva civil-constitucional.
Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 263.
22
O suporte fático, à que aludimos, faz referência “a algo (=fato, evento ou conduta) que
poderá ocorrer no mundo e que, por ter sido considerado relevante, tornou-se objeto da
normatividade jurídica”40. Betti propõe o termo fattispecie para designar o suporte fático do
negócio jurídico41.
O que se busca identificar é o conjunto de fatos que devem estar presentes para que o
negócio jurídico se forme, vale dizer, qual seria o seu suporte fático ou fatispécie. Na
legislação privada brasileira não há disposição sobre tais elementos do suporte fático. Além
39
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 2. ed. Rio de Janeiro: Editor
Borsoi, 1954 tomo IV, § 358, item 1, p. 8.
40
MELLO, Marcos Bernardes de. Op. Cit., p. 41.
41
BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 17-18.
42
Idem. Ibidem. p. 17-18.
23
Desta forma, enunciam-se, a seguir, as diversas posições dos autores, quais elementos
Miranda, adotando, ainda, os mesmos elementos deste, como se verá nos capítulos ulteriores.
forma43. Tais autores adotam a divisão dos planos da existência, validade e eficácia de Pontes
de Miranda.
José Abreu Filho, por sua vez, enuncia os seguintes elementos estruturais ao negócio
ao negócio jurídico, a causa e a forma. Esta estará presente se for da substancia do ato45.
Carlos Roberto Gonçalves, por outro lado, enuncia como requisitos de existência do
43
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodoldo Pamplona. Op. Cit., p. 360.
44
AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. p. 397, apud AZEVEDO, Fábio de Oliveira de. Op. Cit., p.
355.
45
FILHO, José Abreu. O Negócio Jurídico e sua Teoria Geral. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 111.
46
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 1. p. 171.
47
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Parte Geral. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, v. 1.
p. 350.
24
Orlando Gomes, em sua obra, elenca como requisitos de existência – o autor assim os
existência49, que aqui se destrincha. O autor segue a doutrina francesa, e trata apenas da
validade do negócio, não tratando de sua existência e formação. Destaca, ainda, a causa como
Cristiano Chaves de Farias, Felipe Braga Netto e Nelson Rosenvald elencam como
enunciados no art. 104 do Código Civil pátrio, não considerando, portanto, elementos de
existência do negócio50.
abarca o preceito de autonomia privada regulamentado pelas partes, que, recepcionado pelo
ordenamento jurídico pela sua relevância social, expressa os interesses destas na realização do
negócio51.
formação dos negócios jurídicos. O presente trabalho busca investigar a concepção de dois
doutrina de Pontes de Miranda, e a de Emílio Betti. Pontes de Miranda tem grande relevância
na civilística brasileira, a maioria dos autores o seguem. De forma diferente deste, Emílio
48
GOMES, Orlando. Op. Cit., p. 363.
49
Ao contrário do que afirma Tartuce, em sua obra, para quem Caio Mário adota a teoria da inexistência do ato
ou do negócio jurídico (TARTUCE, Flávio. Op. Cit., p. 230). Discordamos da afirmação, uma vez que o autor
trata diretamente da validade do negócio, ignorando sua (in)existência (PEREIRA, Caio Mário da Silva.
Instituições De Direito Civil. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, v. 1. p. 309-313).
50
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson; NETTO, Felipe Peixoto Braga. Op. Cit., p. 504-508.
51
BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 243-328.
25
Betti expõe a formação do negócio também de forma notável, que merece total consideração e
destaque.
DE MIRANDA
Antes de se adentrar nos elementos que Pontes de Miranda considera como integrantes
do suporte fático do negócio jurídico, insta esclarecer que o autor divide toda a lógica do
Para que algo valha é preciso que exista. Não tem sentido falar-se de
validade ou de invalidade a respeito do que não existe. A questão da
existência é questão prévia. Somente depois de se afirmar que existe é
possível pensar-se em validade ou em invalidade. Nem tudo que existe é
suscetível de a seu respeito discutir-se se vale, ou se não vale. (...) Os
conceitos de validade ou de invalidade só se referem a atos jurídicos, isto é, a
atos humanos que entraram (plano da existência) no mundo jurídico e se
tornaram, assim, atos jurídicos52.
validade seria o segundo plano (plano da validade); e a eficácia estaria no terceiro plano
(plano da eficácia). Estes são cumulativos, de forma que, ao se analisar o segundo plano, para
dizer se o negócio é válido ou não, isto é, se incide ou não uma causa de nulidade ou
anulabilidade, ele deve existir, deve ter cumprido os elementos do plano da existência53. O
negócio é nulo ou anulável quando alguma regra jurídica sobre nulidade ou anulabilidade o
52
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo IV, § 357, item 1, p. 6-7.
53
“Existir, valer e ser eficaz são conceitos tão inconfundíveis que o fato jurídico pode ser, valer e não ser eficaz,
ou ser, não valer e ser eficaz. As próprias normas jurídicas podem ser, valer e não ter eficácia (H. KELSEN,
Hauptprobleme, 14). O que se não pode dar é valer e ser eficaz, ou valer, ou ser eficaz, sem ser; porque não há
validade, ou eficácia do que não é.” (Idem. Ibidem. tomo IV, § 359, item 1, p. 15)
26
ser inválido (nulo ou anulável), e ainda produzir efeitos – apesar de serem raras as hipóteses:
(...) (a) que existência, validade e eficácia são três situações distintas por
que podem passar os fatos jurídicos e, portanto, não é possível trata-las
como se fossem iguais; (b) que o elemento existência é a base de que
dependem os outros elementos. Essas conclusões demonstram a extrema
propriedade e utilidade da proposta de Pontes de Miranda de considerar o
mundo jurídico dividido em três planos, o da existência, o da validade e o da
eficácia, nos quais se desenvolveria a vida dos fatos jurídicos em todos os
seus aspectos e mutações55.
Pontes de Miranda ainda critica incisivamente aqueles que confundem, de certa forma,
sistematizada58.
Em sua obra, logo em seu prelúdio do Tomo III do Tratado de Direito Privado, Pontes
56
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo IV, § 358, item 1. p. 8 -9.
57
Idem. Ibidem. tomo IV, § 358, item 17, p. 14.
58
“Para ser deficiente, é preciso que exista. O que não existe nem é válido, nem inválido: não entrou, ou já não
está, no mundo jurídico. Revela pouco estudo de lógica e, mais ainda, da estrutura dos sistemas lógicos,
pensar-se que, se há o conceito de inexistência, êsse há de estar no mundo jurídico: e seria cometer o êrro
inverso, — em vez de se forçar a inserção do nulo no inexistente, forçar-se-ia a inserção do inexistente no nulo,
trazendo-se aquêle para o mundo jurídico.” (Idem. Ibidem. tomo IV, § 360, item 2, p. 19)
Fábio de Oliveira Azevedo, seguindo a tricotomia de Pontes de Miranda, assim a explica de forma bastante
satisfatória: “O negócio jurídico equipara-se, ilustrativamente, a um edifício. No primeiro andar está a existência
do negócio jurídico. No segundo, está a validade. E no terceiro reside a eficácia. Não é possível erguer o segundo
e terceiro andares sobre o nada, o que torna o primeiro pavimento um pressuposto lógico e necessário dos
demais. Mas os três não são andares sequenciais, pois é possível passar diretamente do primeiro ao terceiro, ou
daquele para o segundo. O que não se admite é a ausência do primeiro andar, pois se assim fosse o segundo e o
terceiro ‘flutuariam’, o que é inconcebível para a engenharia, e igualmente para o Direito. Mas, apesar dessa
autonomia para “pular andares”, a ordem natural, porém, é subir do primeiro (existência) ao segundo andar
(validade), finalmente alcançando o terceiro (eficácia).” (AZEVEDO, Fábio de Oliveira de. Op. Cit., p. 354)
28
59
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo III, § 249, item 1, p. 4, grifo nosso.
60
Vale transcrever a disposição contida no Código Civil Português, que segue a mesma linha de raciocínio:
“ARTIGO 245º (Declarações não sérias) 1. A declaração não séria, feita na expectativa de que a falta de
seriedade não seja desconhecida, carece de qualquer efeito. 2. Se, porém, a declaração for feita em circunstâncias
que induzam o declaratário a aceitar justificadamente a sua seriedade, tem ele o direito de ser indemnizado pelo
prejuízo que sofrer.” Disponível em:
<http://www.cm-cascais.pt/sites/default/files/anexos/gerais/codigo_civil_atualizado_ate_a_lei_59_99_.pdf>.
Acesso em 14 de novembro de 2017.
29
conhecerem, anteriormente, seus efeitos legais, bem como por saberem quais os efeitos
se dar de algumas formas diversas: traz-se à baila a distinção entre declaração de vontade e
manifestação de vontade ou ato volitivo adeclarativo. Defende o autor que “não seria de
admitir-se que não produzissem negócio jurídico atos humanos adeclarativos, em que há
vontade de negócio”63. Para ele, não se poderia dizer que não há negócio jurídico em
vendida a contento, entre outros citados pelo ilustre autor. Complementa ainda que, alguns
vontade e, nelas, a lei ou as circunstâncias garantem que essa intenção existe. Se a própria
manifestação de vontade dá resposta sobre qual seja o seu conteúdo, diz-se expressa. Fora daí,
é tácita64.
declarações de vontade tácitas. Aqueles são sem declaração, posto que manifestem vontade; e
estes têm declaração silente, como a propósito da revogação do testamento ou mandato por
61
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo III, § 253, itens 1 e 2, p. 45-46, grifo nosso.
62
Idem. Ibidem. tomo III, § 253, item 4. p. 47-48.
63
Idem. Ibidem. tomo III, § 249, item 2. p. 5.
64
R. HENLE, Ausdruckliche und stillschweigende Willenserklarung, 30 s. apud PONTES DE MIRANDA,
Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo III, § 249, item 2. p. 4-7.
30
destruição. “No ato volitivo adeclarativo, o ato é indício de vontade, talvez de vontade de
declaração de vontade, embora sem palavras”65. Neste ponto, Pontes de Miranda se opõe a
Andreas von Tuhr, jurista e professor russo-alemão para quem as declarações de vontade
Assim, o elemento estrutural da vontade pode se dar por meio de declaração expressa,
Em sequência, superada as distinções, o autor deixa claro que o importante para saber
se a declaração de vontade ou o ato volitivo adeclarativo pode ser suporte fático do negócio
negócio jurídico ou o suporte fático deste. Deve haver vontade de negócio, e sem ela este não
há. Há de existir vontade de negócio e não só declaração de vontade, não sendo essencial a
receptividade. Por exemplo, o testamento é negócio jurídico, sendo suporte fático a declaração
65
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo III, § 249, item 2. p. 6.
66
Idem. Ibidem. tomo III, § 249, item 2. p. 4-7.
67
Porém, nem todos os atos volitivos adeclarativos, e nem todas as declarações de vontade, podem servir como
suporte fático de negócios jurídicos. Por exemplo, a restituição do penhor, é ato volitivo adeclarativo, porém não
configura negócio; ou a declaração de vontade ao confessar-se ao padre, não sendo suporte fático da convenção
negocial.
68
LÔBO, Paulo. Autorregramento da vontade - um insight criativo de Pontes de Miranda. Revista Jus
Navigandi, Teresina/PI, 5 de outubro de 2013. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/25357>. Acesso
em: 30 de julho de 2017.
31
de vontade; e assim o é mesmo que não haja intuito inicial de divulga-lo. O que se conclui
Marcos Bernardes de Mello, autor que segue a doutrina de Pontes de Miranda enuncia
deve ser considerada, por exemplo, uma vontade externada em estado de hipnose.
vontade (ato a declarativo) para compor suporte fático do negócio jurídico, isto é, não há
69
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo III, § 249, item 2. p. 4-7.
70
MELLO, Marcos Bernardes de. Op. Cit., p. 45.
71
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo III, § 249, item 3. p. 7-8.
72
Idem. Ibidem. tomo III, § 249, item 3. p. 7-8.
32
indicia seja negocial, com a finalidade de concluir o negócio jurídico, bem como consciente.
jurídicas interpretativas73.
Vontade”. Em sua definição, “é o espaço deixado às vontades, sem e repelirem do jurídico tais
vontades (...) o nome que se dá à possibilidade de se fazer elemento nuclear do suporte fático,
suficiente para tornar jurídicos atos humanos, a vontade”74. Em suma, é como se denomina a
possibilidade de se fazer que a vontade integre o suporte fático do negócio jurídico, isto é,
Nesta parte da obra, o autor se remonta aos limites legais que tratamos acima, expondo
que “somente dentro de limites pré-fixados, podem as pessoas tornar jurídicos atos humanos
vontade”, o auto-regramento, não é mais do que ‘o que ficou às pessoas’”75. Pontes adverte
73
“Por vezes, é preciso que o conteúdo e o futuro da eficácia do negócio jurídico sejam previstos claramente; dai
a técnica legislativa adotar a) regras jurídicas dispositivas, regras jurídicas ‘preenchentes”, que tomem o lugar
das manifestações de vontade que deveriam ter sido feitas num ou noutro sentido e não no foram, e b) regras
jurídicas interpretativas, que sirvam, na dúvida, para se entender o que foi que quiseram os manifestantes
obscuros. Regras jurídicas somente para os casos em que se não haja adotado alguma declaração, ou
manifestação, — as regras jurídicas dispositivas nada sofrem com ficarem sem incidência. Elas mesmas se
marcaram esses limites. São normas para se encher vazio de declaração ou de manifestação de vontade. As
regras jurídicas interpretativas nada dispõem: resolvem dúvida, que o próprio manifestante deixou.” (Idem.
Ibidem. tomo III, § 250, item 1. p. 8-9)
74
Idem. Ibidem. tomo III, § 254, item 1. p. 54-55.
75
Idem. Ibidem. tomo III, § 255, item 1. p. 55-56.
33
privado, porque excluiria qualquer auto-regramento da vontade em direito público, o que seria
falho. “O que caracteriza o auto-regramento da vontade é poder-se, com êle, compor o suporte
fático dos atos jurídicos com o elemento nuclear da vontade. Não importa em que ramo do
direito”76.
direito e, podemos interpretar como agente. Explica que, sendo a capacidade de direito
pressuposto necessário comum a todos os atos jurídicos, gênero no qual o negócio é espécie, é
vida civil. Distingue-se da capacidade de fato, que é a aptidão para utilizar e exercer os
direitos por si mesmo78. Toda pessoa é dotada de capacidade de direito, mas nem toda de
intimamente ligada à personalidade, que se adquire ao nascimento com vida79. “Como toda
pessoa tem personalidade, tem também a faculdade abstrata de gozar os seus direitos”80.
torna o negócio inexistente. Pontes ainda destaca que, a falta de capacidade civil torna o
suporte fático deficiente, e faz nulo ou anulável o negócio jurídico81, enquanto que, a falta de
76
Idem. Ibidem. tomo III, § 255, item 1. p. 56.
77
Idem. Ibidem. tomo III, § 251, item 1. p. 10.
78
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. Cit., p. 162.
79
“A capacidade de direito, de gozo ou de aquisição não pode ser recusada ao indivíduo, sob pena de despi-lo
dos atributos da personalidade. Por isso mesmo dizemos que todo homem é dela dotado, em princípio. Onde
falta esta capacidade (nascituro, pessoa jurídica ilegalmente constituída), é porque não há personalidade.” (Idem.
Ibidem. p. 162)
80
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. Cit., p. 162.
81
“A capacidade civil, especialmente a capacidade para os negócios jurídicos (capacidade negocial), o poder de
disposição, a procuração etc., são elementos do suporte fático e acompanham todas as declarações ou
manifestações de vontade, sem que a falta deles ou de algum deles exclua a suficiência do suporte fático: só o
torna deficiente. E.g., o negócio jurídico do louco é nulo, e não inexistente. A alienação do bem móvel, com a
34
tradição, pelo que não tem poder de disposição, é nula; a venda, a troca, ou outro contrato sobre o bem móvel,
pelo não-proprietário, ou por pessoa que não tem o direito de disposição, é ineficaz para a alienação.” (PONTES
DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo III, § 251, item 4. p. 11-12)
82
Marcos Bernardes de Mello, ao dispor sobre o elemento subjetivo do suporte fático – o sujeito de direito,
assim enuncia: “Os fatos jurídicos pressupõem uma necessária referibilidade a sujeitos de direito, porque sua
eficácia (jurídica) se liga, essencialmente, a alguém ou a algum ente, inclusive a conjunto patrimonial, a que o
ordenamento jurídico outorga capacidade de direito. A eficácia jurídica, seja qual for sua natureza —
constitutiva, modificativa, extintiva, qualificante —, diz respeito a algum sujeito de direito. Mesmo as normas
jurídicas que não criam direitos, pretensões, ações e exceções, mas, apenas, dispõem sobre possibilidades de
titularidade de direitos, pretensões, ações e exceções (e. g., art. 1.263 do Código Civil), têm como pressuposto
sujeito que lhes venha a ser titular. Seria sem sentido fato jurídico que não se referisse a algum sujeito de direito.
Por esse motivo, os suportes fácticos são integrados, sempre, por elemento subjetivo (indicação de certo sujeito
de direito), mesmo quando não esteja explícito, caso em que deve ser pressuposto. Na configuração de cada
suporte fáctico, portanto, é necessário considerar, como dado completante de seu núcleo, o elemento
subjetivo que o compõe, não se podendo tê-lo concretizado se o sujeito não existir ou, se existir, não for
aquele previsto pela norma.” (MELLO, Marcos Bernardes de. Op. Cit., p. 50-51, grifo nosso).
35
Acredita-se que sim. Por razões já expostas, capacidade de direito é aptidão oriunda da
personalidade, isto é, da pessoa, e desta forma, pode-se concordar em denominar a pessoa que
3.3 Da forma
enunciado por Pontes de Miranda é a forma. Para ele, as exigências de forma especial são de
suma relevância. Esta pode ser elemento do suporte fático, sendo pressuposto de existência e,
sem ela, não existir o negócio jurídico; ainda, a forma pode também ser elemento
anulabilidade; bem como, pode ser elemento complementar para a eficácia; ou até mesmo
83
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo III, § 251, item 5. p. 12-13, grifo nosso.
84
Flávio Tartuce, Antônio Junqueira de Azevedo, Fábio de Oliveira Azevedo, entre outros.
36
apenas complementar. Para ilustrar, tem-se o exemplo do casamento: se não foi celebrado, não
existe85.
A forma pode ser elemento necessário ao suporte fático para que entre no
mundo jurídico, ou para que o ato jurídico valha, ou para que o ato jurídico
tenha certo efeito, ou certos efeitos86.
explica que a forma é a expressão da vontade. A vontade, enquanto íntima, não exteriorizada,
não é relevante ao direito. Aduz o autor que todos os fatos jurídicos têm forma. Mas, a forma
só é importante para os atos – aqueles fatos jurídicos que envolvem uma conduta humana
volitiva, na esteira do autor –, e, portanto, elemento essencial ao suporte fático dos negócios
Todos os fatos jurídicos têm conteúdo e forma. Mas só a forma dos atos
jurídicos é relevante para o direito. Qualquer que seja a forma com que se
morre, o que importa é o fato da morte, como só importa o fato do
nascimento ou o ato-fato da tomada de posse ou do pagamento. Enquanto a
vontade permanece íntima, não exteriorizada, não interessa ao direito.
(...) A expressão é a forma; só se levam em conta as vontades que se
enformaram. A forma é a da vontade e dos outros elementos do suporte
fático, que precisem exteriorizar-se, como fatos da psique. A forma mesma
é elemento do suporte fático, razão para se preferir falar de forma da
manifestação de vontade, de conhecimento ou de sentimento, em vez de
forma do ato jurídico (DRAGOLJUB ARANGJELOWITSCH, Die
formellen Willenserklärungen, 11). Antes de ter forma, o ato não é, para o
direito; não existe (O. VON VÖLDERNDORFF, Die Form des
Rechtsgeschäfts. 14 s.). Mas, em se tratando de forma especial, pública,
legal ou voluntariamente exigida, ou de forma escrita, legal, a sanção é a
nulidade, e não a inexistência87.
a forma exigida não é satisfeita, o negócio existe, sendo, porém, defeituoso, imperfeito. Tal é
o que explica o autor no final do trecho supra. Forma especial é aquela forma que o sistema
85
Idem. Ibidem. tomo III, § 251, item 5. p. 20-23.
86
Idem. Ibidem. tomo III, § 332, item 2. p. 347.
87
Idem. Ibidem. tomo III, § 332, item 1. p. 346, grifo nosso.
37
jurídico exige para determinado ato, ou quando se trate de alguma pessoa, ou coisa. Só a lei a
anulabilidade, em regra:
Quando se fala de forma especial, em geral, entende-se a forma sem a qual não
valeria o ato jurídico. Às vezes, porém, a lei exige forma especial para que o ato
exista; e outras, para que o ato jurídico válido produza ou se preste a algum efeito. Já
não se está no plano da validade, e sim no plano da eficácia88.
deve-se atentar aos casos excepcionais, em que o defeito de forma gera a inexistência. Pontes
validade do negócio devem estar expressas em lei90. O autor explica que se a lei exige forma
especial, sem dar sanção, infere-se que é a de nulidade – sendo então a forma especial
concernente ao plano da validade –; porém, se a faz elemento para que o suporte fático seja
suficiente, na falta da forma exigida não haverá negócio – não se atenderá ao plano da
Ainda, a não obediência à forma especial pode-se ferir a eficácia do ato de autonomia
privada. A respeito da forma como parte da eficácia, Pontes ensina que ela – a forma especial
– será reforço à produção de efeitos. O negócio existe e vale, mas, sem a forma adequada, não
88
Idem. Ibidem. tomo III, § 334, item 2. p. 351.
89
Idem. Ibidem. tomo III, § 332, item 1. p. 347.
90
Idem. Ibidem. tomo III, § 332, item 2. p. 347-348.
91
Idem. Ibidem. tomo III, § 334, item 1. p. 351.
38
produz certa eficácia. Por exemplo, o contrato de compra e venda de imóvel por instrumento
particular não basta para que se entenda transferida a propriedade; para ter eficácia, a
Em sequência, a forma dos negócios jurídicos pode ser oral, escrita ou por atos. Em
regra, quem vai praticá-lo é que escolhe a forma. Deve-se somente bastar à expressão da
O autor cita também a forma tácita, ou fática. Esta consiste na forma não escrita, nem
impressa, nem gravada ou pintada, nem por qualquer outro modo fixada. A forma tácita ou
fática caberá naquelas hipóteses em que não se exige a forma em palavras, que fiquem, ou em
sinais, que se possam reproduzir. Como exemplo, a aceitação da oferta pelo consumo da coisa
nenhuma vedação para a ocorrência, de modo que, se um contrato, que não tenha previsão de
obrigatoriedade de forma especial, for realizado em forma especial pela vontade das partes,
será válido95: “Toda forma pública, comum, pode ser adotada em vez da forma particular. A
92
Idem. Ibidem. tomo III, § 334, item 2. p. 351-352.
93
Idem. Ibidem. tomo III, § 333, item 1. p. 348-349. “Os instrumentos ou são públicos lato sensu (= scripturae
authenticae, instrumenta authentica) ou privados (scripturae privatae, instrumenta primata). Escritura pública,
instrumento público stricto sensu, é o que é feito pelo oficial público, de acôrdo com as regras jurídicas de
competência e de pressupostos formais, para efeitos de existência, validade e eficácia dos atos jurídicos
(SILVESTRE GOMES DE MORAIS, Tractatus de Executionibus, IV, 64: ‘Publica scriptura est solennis, et rite
ordinata seriptura per authenticae personae manum publicae memoriae causa facta.’)” (Idem. Ibidem. tomo III, §
336, item 3. p. 355)
94
Idem. Ibidem. tomo III, § 333, item 4. p. 350-351.
95
“Diz-se voluntária a forma quando foi exigida por negócio jurídico unilateral ou bilateral. É princípio geral de
direito que se pode estabelecer determinada forma para ato jurídico a ser feito ou para atos jurídicos a serem
feitos, de modo que da falta de observância resulte a ineficácia, ou a nulidade, ou apenas para que se previnam os
figurantes com o fito de melhor segurança da prova. A técnica legislativa tem três atitudes, dentre as quais pode
escolher a que melhor lhe pareça: adotar a sanção da ineficácia da determinação privada de forma, para que
possa quem o exigiu atribuir-lhe, ou não, eficácia; adotar a sanção de nulidade, naturalmente com caráter de
regra jurídica dispositiva; entender que tôda determinação foi apenas com intuito de segurança da prova de
convenção futura. O princípio geral existe no sistema jurídico brasileiro. Qualquer pessoa pode exigir que todos
39
forma especial é que não pode ser substituída, se a lei, por si mesma, não o permitiu”96.
3.4 Do objeto
Pontes de Miranda não trata de forma extensa sobre este elemento, citando-o apenas em
Sempre que a regra jurídica não exclui o negócio jurídico (= não no diz
não-existente ou não o diz negócio extrajurídico), negócio jurídico há, ainda
que deficiente o suporte fáctico. A deficiência pode concernir aos sujeitos
(deficiência subjetiva), ou ao objeto, ou às vontades, ou a outro elemento
do suporte fático, como a forma e o assentimento de terceiro97.
adotando os planos de existência, validade e eficácia, comumente citam o objeto como sendo
Sobretudo no Tomo IV de sua obra Tratado de Direito Privado, Pontes cita o objeto
Para que o ato jurídico possa valer, é preciso que o mundo jurídico, em que
se lhe deu entrada, o tenha por apto a nele atuar e permanecer. É aqui que se
lhe vai exigir a eficiência, quer dizer — o não-ser deficiente; porque aqui é
ou alguns negócios jurídicos, em que figure, observem forma especial (escritura pública, forma escrita). Nada se
disse, porém, quanto à sanção, exceto quando se trate da cláusula de não valer sem instrumento público (art.
133).” (Ibidem. tomo III, § 342, item 1. p. 386-387) A forma voluntária, uma vez acordada, vincula a existência
do negócio, segundo Pontes de Miranda, salvo se for com a finalidade de conservação ou consistência da prova:
“No direito brasileiro, a forma voluntária, quando não se trate de instrumento público, tem de ser observada, para
que o ato entre no mundo jurídico, salvo se foi estabelecido que apenas se quis dar mais consistência a prova
futura, caso em que o ato entra no mundo jurídico, é válido e eficaz, mas a inobservância da forma fêz difícil a
prova.” (Idem. Ibidem. tomo III, § 342, item 2. p. 389)
96
Idem. Ibidem. tomo III, § 334, item 2. p. 351-352.
97
Idem. Ibidem. tomo III, § 255, item 2. p. 56-57, grifo nosso.
98
Entre eles, Flávio Tartuce, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, e Fábio de Oliveira Azevedo, que
seguem os ensinamentos de Pontes de Miranda sobre o assunto. (TARTUCE, Flávio. Op. Cit., p. 228;
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodoldo Pamplona. Op. Cit., p. 360; AZEVEDO, Fábio de Oliveira de. Op.
Cit., p. 355)
40
aqueles que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade,
como, por exemplo, o dinheiro. Já os bens infungíveis são aqueles que não podem ser
substituídos, têm natureza insubstituível, por exemplo, uma obra de arte. A infungibilidade
99
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo IV, § 356, item 1. p. 3.
100
“Os pressupostos de validade concernem: a) ao sujeito ou sujeitos do ato jurídico, que consentem ou devem
assentir; b) ao objeto do ato jurídico; c) a elementos do ato juridico relativos ao gestum (forma + o que é
essencial em ato, sem ser a forma em sentido estrito): forma externa (mi. 145, 111) e interna (art. 145, IV).”
(Idem. Ibidem. tomo IV, § 356, item 2. p. 4) “Tomemos, por exemplo, a declaração de vontade. Ou ela foi feita,
ou não foi feita. Não se pode dizer que a declaração de vontade pelo que estava coagido, ou ameaçado, não foi
feita; foi-o, embora atingida pelo defeito. Defeito não é falta. O que falta não foi feito. O que foi feito, mas tem
defeito, existe. O que não foi feito não existe, e, pois, não pode ter defeito.” (Idem. Ibidem. tomo IV, § 358, item
7. p. 13)
101
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodoldo Pamplona. Op. Cit., p. 362-363.
102
Idem. Ibidem. p. 304-305.
41
jurídicos
O que se tratou acima se detém aos elementos essenciais comuns dos negócios
jurídicos. Não é objeto do presente trabalho ser ater aos elementos presentes em contratos
não-volitivos.
Correspondem ao que integra, como necessário, o negócio. O que vem a mais do que o é
essencial, ou necessário, seria natural, ou, como Pontes denomina, naturalia negotii, este
Sempre com um tom objetivista, Pontes assevera ainda sobre os elementos volitivos:
103
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit., tomo III, § 258, item 1. p. 65.
104
Idem. Ibidem. tomo III, § 258, item 1. p. 65. Sobre o tema, discorre Pontes de Miranda: “Algumas vêzes tem o
intérprete de apurar se algum elemento acidental passou a ter tal importância que, sem êle, não teria o
manifestante da vontade querido o negócio jurídico. (...) A vontade-cerne, de que acima se fala, não importa em
tornar essencial o acidental. A distinção entre essentialia negotii e accidentalia negotii é objetiva, no sentido de
diferença entre o que a lei faz cogente ou dispositivo e o que a lei deixa à vontade dos manifestantes de vontade,
de jeito que não há vontade se não foi manifestada. O determinar o que é vontade principal ou vontade anexa
cabe aos manifestantes delas, na arrumação dos elementos do suporte fáctico do negócio jurídico. O modus pode
ser principalizado; na compra-e-venda, pode haver a cláusula de reserva de servidão, o pactum de retroemendo, o
de retrovendendo, o de non praestanda evictione (E. REGELSBERGER, Pandekten, 1, 602). A condição é
sempre cerne, pôsto que accidentale negotii”. (Idem. Ibidem. tomo III, § 260, item 1. p. 70)
42
interno105.
Mello. Este explica que a estrutura do suporte fático é composta por elementos nucleares e
Cerne é fato que determina a configuração final do suporte fático e fixa, no tempo, sua
jurídico, mas que não constituem o cerne. Os completantes podem ser, por exemplo forma do
negócio solene, ou a tradição, em contratos que envolvem coisas móveis: não são o que define
contratos. Os elementos tratados acima estão inseridos no suporte fático como elementos
nucleares, ou seja, necessários à configuração de todo e qualquer negócio, de modo que sua
falta implica na inexistência do mesmo106. O que se deve acautelar aqui é sobre os elementos
do suporte fático que devem estar presentes em alguns tipos de negócios, ou alguns contratos.
Pontes assevera que “o suporte fáctico do negócio jurídico pode conter declaração ou
mais ato real (ato-fato). São os negócios jurídicos ditos, por isso, reais (L. ENNECCERUS,
105
Idem. Ibidem. tomo III, § 260, item 2. p. 70-71.
106
“Os elementos nucleares do suporte fáctico têm sua influência diretamente sobre a existência do fato jurídico,
de modo que a sua falta não permite que se considerem os fatos concretizados como suporte fáctico suficiente à
incidência da norma jurídica. Nos negócios jurídicos, por exemplo, em que a manifestação da vontade,
consciente é o cerne do suporte fáctico, a sua ausência implica não existir o negócio.” (MELLO, Marcos
Bernardes de. Op. Cit., p. 53)
107
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit. tomo III, §251, item 5. p.16.
43
do autor, é componente do suporte fático do negócio jurídico real, isto é, aqueles que
aperfeiçoam com a entrega da coisa que constitui seu objeto.”. O mero consentimento das
partes não é suficiente para ter o contrato como existente. Os contratos reais opõem-se aos
de bens imóveis, contrato real, contém a transmissão, sendo este elemento do núcleo. “O
núcleo do suporte fáctico da doação é composto pela convenção sôbre a gratuidade e pela
transmissão”. Ainda, sobre o mútuo: “O núcleo do suporte fático do mútuo é composto pela
exemplo, na locação, ou a compra e venda. Nesta, Pontes afirma que o ato estatal de registro,
108
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 14. ed. São
Paulo: Atlas, 2014. p. 453.
109
Idem. Ibidem. p. 454.
110
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit. tomo III, § 251, item 5. p. 18.
111
“A transmissão da propriedade imóvel e a constituição de direitos reais só se operam pelo registro
(transcrição, inscrição). Tal ato estatal é posterior á perfeição do contrato consensual e integrativo da eficácia do
acôrdo, que não é contrato juri-real dependente do ato de registro, conforme demonstraremos ao tratarmos da
classificação dos negócios juridicos. O acôrdo (“transmito a A... e A aceita”) é negócio jurídico; não é contrato
real. Aqui, nem se deve considerar o acôrdo mais a transcrição contrato real (certo, E. BRODMANN, em G.
PLANCK, Kommentar, III, 4. ed., 363, para quem a transmissão é efeito), nem se lhe há negar o ser negócio
jurídico per se, pôsto que lhe falte, para o efeito real, o registro.” (Idem. Ibidem. tomo III, § 251, item 8. p. 26)
44
suporte fático, Marcos Bernardes de Mello esclarece sobre a formação do suporte fático por
outros fatos jurídicos, como a compra e venda que, em sua formação, deve dispor da proposta
e da aceitação:
“Mas, apesar de serem mais freqüentes esses casos, há hipóteses em que são os
próprios fatos jurídicos que constituem o suporte fáctico de outros fatos jurídicos.
O suporte fáctico dos contratos tem como elementos dois fatos jurídicos (negócios
jurídicos unilaterais): a proposta (oferta) e a aceitação”112.
Vale ainda a observação sobre os negócios mortis causa, ou a causa de morte, em que,
somente ao ocorrer a morte começa a eficácia do negócio jurídico. O negócio se perfaz, sendo
válido e eficaz, antes da morte. A partir desta começará ele a irradiar efeitos. Como exemplo,
Pontes de Miranda cita o testamento e a doação mortis causa. “A morte é espécie típica de
elemento fáctico eficacial, como o advento do último dia do prazo ou o advento do têrmo”113.
causais. Em contrapartida, os negócios jurídicos abstratos não têm a causa em seu suporte
fático.
112
MELLO, Marcos Bernardes de. Op. Cit., p. 47.
113
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Op. Cit. tomo III, § 251, item 5. p. 20.
45
Para o autor, a causa seria a atribuição dada ao negócio causal pelo ordenamento
venda.
Pontes chama atenção à distinção entre causa e motivo, causa e motivo relevante, e
causa e fim.
A causa importa, quando se tem de saber qual o ato jurídico de que é efeito a
atribuição. Sabendo-se qual foi a causa, sabe-se qual foi a atribuição, e a tal tipo de
atribuições correspondem regras jurídicas comuns, — junto a regras jurídicas à
parte, peculiares ao tipo de ato jurídico, ou à espécie de ato jurídico, e não
concernentes à atribuição em si. Por exemplo, a regra jurídica do art. 134, II,
relativa à transmissão de direitos reais sôbre imóveis, não diz respeito à causa, mas
à transmissão imobiliária em si116.
4 DA ESTRUTURAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO PELA TEORIA DE
EMÍLIO BETTI
trabalho é do jurista italiano Emílio Betti, precursor da teoria preceptiva do negócio, como já
negócio.
A forma seria o modo como o negócio é, ou seja, como ele se apresenta em face dos outros.
114
Idem. Ibidem. tomo III, § 262, item 1, p. 78-79.
115
Idem. Ibidem. tomo III, § 262, item 1, p. 80.
116
Idem. Ibidem. tomo III, § 262, item 3, p. 81-82.
117
BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 243-244.
46
autor que, “na vida de relação, um ato só é reconhecido pelos outros através de sua forma”118.
Por esta razão, a vontade, enquanto puro fenômeno psíquico, não tem relevância social e
Uma vez que os atos só podem ser identificáveis pelo outro através de sua forma,
Trazendo à tona a classificação corrente entre negócios formais e não formais, isto é,
de forma vinculada ou livre, Betti faz enfoque à errônea crença de que existam negócios nos
quais seja possível prescindir de toda e qualquer forma: “Na realidade, um acto, como facto
socialmente eficaz, não existe sem uma forma de comportamento, através da qual se torne
Vale dizer, a referida distinção entre negócios formais ou não formais, tem como
critério que o direito pode, ou prescrever à autonomia privada o modo do ato, ou então
deixa-la livre. Se assim prescrever, o negócio será formal, considerando irrelevante qualquer
outro modo de o realizar. Quando deixa livre à escolha das partes negociais, estes optam pelo
meio mais adequado, desde que sejam admissíveis e idôneos para tornar o ato exteriormente
reconhecível aos outros. Os negócios, portanto, de forma livre são aqueles que o ordenamento
solenes120 – são aqueles que pressupõem uma forma determinada de realização do negócio, de
O que Betti chama atenção é que, independente do negócio classificar-se como formal
ou livre (não formal) ele sempre terá forma. Esta é um elemento da estrutura de todo e
qualquer negócio jurídico, que o torna reconhecível à coletividade. Até mesmo nas chamadas
No que tange à causa, esta consiste, de acordo com a teoria de Emílio Betti, na função
do negócio jurídico. Não é elemento constitutivo como a forma e o conteúdo, mas sim a
Vale, portanto, analisar cada elemento trazido por Emílio Betti – Forma e Conteúdo –
121
Idem. Ibidem. p. 245-246, grifo nosso.
122
“Repudiados estes diversos modos de identificar a causa com elementos especiais do negócio, como que
devidos a perspectivas unilaterais e, por isso, erróneas, é fácil concluir que a causa ou razão do negócio se
identifica com a função económico-social de todo o negócio, considerado despojado da tutela jurídica, na síntese
dos seus elementos essenciais, como totalidade e unidade funcional, em que se manifesta a autonomia privada. A
causa é, em resumo, a função de interesse social da autonomia privada. Os elementos necessários para a
existência do negócio, são também elementos indispensáveis da função típica que é sua característica. A sua
síntese, assim como representa o tipo do negócio, na medida em que é negócio causal, também lhe representa,
igualmente, a função típica.” (Idem. Ibidem. p. 350-351)
48
A forma, segundo Emílio Betti, é aquela através da qual o negócio jurídico se torna
simples, sem valor de declaração124. Deste modo, constata-se que o autor divide o gênero
pensamento do íntimo de cada um, para se tornar expressão objectiva, dotada de vida própria,
natureza, um ato consciente destinado a ser conhecido por outros, para dar conhecimento de
um determinado conteúdo. Consiste, portanto, num ato que se dirige, necessariamente, aos
outros. A consequência desta afirmação é de que não existe declaração sem um destinatário,
que em algum momento – mais cedo ou mais tarde – deva a vir conhece-la. O que se pode
diferir é que o destinatário poderá ser determinado e fungível, bem como indeterminado e
infungível, podendo ser o conhecimento tanto imediato, tanto retardado. Um exemplo citado
por Betti de um conhecimento retardado é de uma garrafa lançada ao mar, o que ilustra
satisfatoriamente a explanação. O conhecimento, portanto, à outra parte não pode faltar, sob
pena de perder sua relevância social: por exemplo, uma voz clamada no deserto126. Não
havendo destinatário desta declaração, que exprime certo conteúdo, não há relevância social
Por outro lado, diferindo da declaração, “o comportamento puro e simples não pode
123
Idem. Ibidem. p. 246-247.
124
Idem. Ibidem. p. 247.
125
Idem. Ibidem. p. 248.
126
Idem. Ibidem. p. 249.
49
contar com a colaboração psíquica alheia, representando uma exigência a satisfazer numa
relação com os demais; não apela para a consciência ou para a vontade das pessoas em cuja
interesses privados, porém, não pretende torná-la conhecida aos outros, apesar de, por se
Para ilustrar, Betti traz exemplos um tanto razoáveis do Código Civil Italiano, bem
estabelece uma diferença, ainda, quanto aos critérios de interpretação, entre ele e a
coloca à sua conta e risco um modo inexato de se exprimir, o comportamento não vincula o
agente, de acordo com seu objetivo significado social, senão na medida em que ele seja,
concretamente, de acordo com a sua intenção efetiva. Essa diferença existe quanto a ser
127
Idem. Ibidem. p. 249.
128
Idem. Ibidem. p. 250.
50
ato129.
O que se destaca é que não existe negócio sem uma forma que o torne socialmente
reconhecível, e, a forma do ato obriga, em regra, o agente, segundo o seu objetivo significado
social. Posto que o valor vinculativo é diferente se o negócio possui destinatários – sendo uma
declaração – e, como tal, gere nestes uma confiança, ou não se tenha destinatário – sendo um
comportamento. Ocorre que, quando o ato não é dirigido a ninguém (não há destinatários), no
caso do comportamento, não produz nos outros uma confiança, mas, segundo Betti, apenas
justifica ilações pode parte deles130. “Ilações” são deduções, inferências, induções.
Tendo em vista a genérica necessidade de uma forma para que os outros possam
reconhecer o negócio, Betti compreende que a vontade da parte, quando não seja expressa de
forma adequada, não tem valor jurídico. Nos negócios declarativos, a parte é livre, até certo
ponto, quanto à escolha das palavras, e, desta forma, tem o ônus de escolher a expressão
adequada àquilo que lhe interessa, e, por conseguinte, a ela cabe o risco de uma expressão
129
Mais uma vez Betti critica o dogma da vontade: “Seria, porém, um erro explicar essa diferença, recorrendo à
ideia de que nos negócios que consistam num simples comportamento, a <<vontade>> se encontra no estado
puro, sem necessidade de uma forma”. Idem. Ibidem. p. 251.
130
Idem. Ibidem. p. 252.
131
Idem. Ibidem. p. 253.
51
só tem eficácia na medida em que é exprimida, de modo que, das palavras empregadas deve
resultar o conteúdo essencial do negócio jurídico. O autor ainda complementa que: “E quando
a lei (ex.: Cód. Civ., arts. 466.º, 1230.º, parág.; 1937.º, 2879.º, 1), ou a consciência social o
exijam, ele deve resultar de um modo explícito ou completo, sem ser permitida a remissão ou
No que tange ao processo formativo da declaração, Betti ensina que este só está
“acto com que o autor da expressão desprende esta de si, desapossando-se dela e tornando-a
uma coisa independente, estranha a ele e idónea para chegar ao conhecimento do destinatário,
determinado ou não, fazendo dela uma declaração irrevogável propriamente dita (...)”133. O
ato pelo qual a declaração se separa de seu autor, então, denomina-se emissão, segundo
Emílio Betti.
e o ato da separação se confundem com o momento e o ato da expressão. Neste caso, emissão
e expressão são uma só coisa e, imediatamente recolhidas pelo destinatário, tem caráter
irrevogável. Por outro lado, tratando-se de declaração mediata, feita através de escrita, ou
em por em ação o processo por meio de qual a escrita deve chegar ao conhecimento do
132
Idem. Ibidem. p. 255.
133
Idem. Ibidem. p. 256.
52
Esse mesmo lapso entre a expressão e a emissão pode também ser observada nas
chamadas declarações não receptícias. Não há declaração sem destinatário, mas existem
aquelas que devem ser emitidas e dirigidas a um determinado destinatário infungível, a quem
são comunicadas, em razão do interesse que ele tem no conteúdo da declaração, sendo
denominadas receptícias. Contrariamente, existem outras que não necessitam de ser dirigidas
a um destinatário determinado, pois, na realidade, não o têm, a não ser de caráter fungível,
também se haja realizado por inteiro o processo de comunicação, isto é, quando a declaração
Ainda sobre a declaração, pode ocorrer que, para garantir seu efeito – o conhecimento
alheio – a expressão destinada a ser conhecida pelos outros tenha que ser representada em um
documento. Betti, citando Carnelluti, recorda a noção de documento, que consiste em “uma
coisa que, formada em presença de um facto, é destinada a fixar, de modo permanente, a sua
documento assume, em relação à declaração documentada, uma função que varia conforme
sirva para formar essa declaração, ou sirva para garantir e preservar a declaração já formada.
No primeiro caso, em que o documento serve para formar a declaração, é confiado a ele uma
função constitutiva, quer como instrumento de comunicação entre ausentes, quer como
Superado este ponto, vale trazer a baila algumas considerações adicionais sobre o
comportamento.
certo conteúdo preceptivo a quem interessa, pode, entretanto, adquirir no ambiente social um
experiências comuns, uma posição e respeito de algum interesse que afeta a esfera jurídica
consente e impõe, por lógica coerência, semelhante dedução, há uma manifestação que, não
sendo direta ou explícita, se qualifica como indireta, ou implícita (ou tácita). Assim difere o
Todavia, alerta Betti, há relações nas quais não é admitida uma conduta concludente,
pelas dificuldades de interpretação que poderia trazer, e, portanto, exigem da parte um ônus
137
Idem. Ibidem. p. 269.
54
de declaração explícita138. O autor cita alguns exemplos de negócios os quais não se poderia
admitir uma conduta concludente. Entre eles, o art. 1230 do Código Civil Italiano, que
circunstâncias, o significado objetivo do negócio jurídico, que não está explícito, sendo
Nesta esteira, vale ainda citar algumas considerações sobre o silêncio na formação do
negócio jurídico.
Betti investiga em sua obra até que ponto a inércia consciente – assim denomina o
silêncio – na presença de certas circunstâncias e situações, por parte de quem tenha a concreta
possibilidade de agir e de reagir, será suficiente para dar formação a um ato de autonomia
privada e revestir o significado de negócio jurídico. Isto é, até quando a conduta omissiva
poderia estruturar o negócio. O autor enfatiza que não se pode considerar a existência de um
negócio sem manifestação alguma. Betti conclui pela possibilidade do silêncio – a inércia
circunstâncias:
138
Idem. Ibidem. p. 269-270.
139
Art. 1230. Novazione oggettiva. L'obbligazione si estingue quando le parti sostituiscono all'obbligazione
originaria una nuova obbligazione con oggetto o titolo diverso. La volontà di estinguere l'obbligazione
precedente deve risultare in modo non equivoco. Disponível em:
<http://www.altalex.com/documents/news/2015/01/08/delle-obbligazioni-in-generale>. Acesso em 28 de outubro
de 2017.
140
BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 270.
55
relevante como manifestação receptícia, deve ser reconhecível aos interessados a tomada de
posição que atinge a sua esfera de interesse. Betti exemplifica com a aceitação da herança.
Betti – é um ato cujo evento se concretiza sempre no espírito alheio, ora apelando só para a
consciência, ora também para a vontade do destinatário, conforme tenda apenas a informar, a
141
Idem. Ibidem. p. 275.
142
Idem. Ibidem. p. 289.
143
Idem. Ibidem. p. 291.
56
valor de negócio, instrumento da autonomia privada, quando traz certo conteúdo preceptivo,
ainda que enunciativa. Esta é a conclusão que se pode chegar a partir da obra de Emílio Betti,
Finalmente, o autor ainda aduz que nas declarações enunciativas, tendo o conteúdo
comunicativa acerca desse conteúdo, cujo reconhecimento é relevante. Para ilustrar, destaca o
art. 1396, que trata da modificação ou extinção da procuração145, bem como o art. 1260, que
conteúdo reveste um caráter normativo, a forma tem também, normalmente, uma função
144
“A boa-fé objetiva é, em sua versão original germânica, uma cláusula geral que, assumindo diferentes feições,
impõe às partes o dever de colaborarem mutuamente para a consecução dos fins perseguidos com a
celebração do contrato.” (TEPEDINO, Gustavo; SCHREIBER, Anderson. A Boa-Fé Objetiva no Código
de Defesa do Consumidor e no novo Código Civil. In: TEPEDINO, Gustavo (Org.). A Parte Geral do
Novo Código Civil: estudos na perspectiva civil-constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 32)
145
“Art. 1396. Modificazione ed estinzione della procura. Le modificazioni e la revoca della procura devono
essere portate a conoscenza dei terzi con mezzi idonei. In mancanza, esse non sono opponibili ai terzi, se non si
prova che questi le conoscevano al momento della conclusione del contratto. Le altre cause di estinzione del
potere di rappresentanza conferito dall'interessato non sono opponibili ai terzi che le hanno senza colpa
ignorate.” Disponível em:
<http://www.altalex.com/documents/news/2014/10/29/delle-obbligazioni-dei-contratti-in-generale>. Acesso em:
29 de outubro de 2017.
146
“Art. 1260. Cedibilità dei crediti. Il creditore può trasferire a titolo oneroso o gratuito il suo credito, anche
senza il consenso del debitore, purché il credito non abbia carattere strettamente personale o il trasferimento non
sia vietato dalla legge. Le parti possono escludere la cedibilità del credito; ma il patto non è opponibile al
cessionario, se non si prova che egli lo conosceva al tempo della cessione.” Disponível em:
<http://www.altalex.com/documents/news/2014/10/29/delle-obbligazioni-dei-contratti-in-generale>. Acesso em:
29 de outubro de 2017.
57
relevo na análise do conteúdo do negócio jurídico, o segundo elemento formador que enuncia
4.2 Do conteúdo
interesses nas relações entre os sujeitos, vale dizer, regulamenta um suporte fático que
Enuncia o autor:
147
BETTI, Emílio. Op. Cit., p. 300.
148
“Na realidade, o que o indivíduo declara ou faz com o negócio, é sempre uma regulamentação dos próprios
interesses nas relações com outros sujeitos: regulamentação, da qual ele compreende o valor socialmente
vinculante, mesmo antes de sobrevir a sanção do direito. É característica do negócio que a sua fatispécie, ainda
mais que o seu efeito, prescreva uma regulamentação obrigatória, a qual, uma vez reforçada pela sanção do
direito, está destinada a elevar-se a preceito jurídico. Não quer isto dizer – com tantas vezes se repete – que a
vontade privada possa, só por si, por virtude própria, ser causa imediata do efeito jurídico, já que sem uma ordem
jurídica que estabeleça o nexo <<causal>>, esse efeito nem sequer é concebível. Acontece, porém, que, aqui, a
previsão a que está ligado o efeito jurídico, contém em si mesma um preceito de autonomia privada, cujo
reconhecimento por parte da ordem jurídica representa, na sua essência, um fenómeno de recepção. A ordem
estabelecida pelas partes para os seus interesses, é valorada pelo direito de acordo com os seus pontos de vista
gerais, tornada própria com as oportunas modificações e traduzida nos termos de uma relação jurídica.” (Idem.
Ibidem. p. 300-301)
58
preceito de autonomia privada, isto é, o que deve ser declarado ou que espécie de
comportamento deve ser observado para que tenha um negócio. Betti responde à indagação de
aquilo cuja expressão ou execução seja necessária, de acordo com a consciência social e a
ordem jurídica, para que a declaração ou o comportamento possa desempenhar sua função
Tal preceito de autonomia privada, que constitui o conteúdo do negócio jurídico, tem
social, e socialmente reconhecível (mas não jurídico), e portanto de tal sorte, que considera
149
Idem. Ibidem. p. 303-304.
150
Idem. Ibidem. p. 304.
151
Idem. Ibidem. p. 305.
152
Idem. Ibidem. p. 310-311.
59
aqueles interesses em relação com os outros consociados”153, isto é, o vínculo jurídico não
por parte da ordem jurídica. Finalmente, o preceito é “vinculativo para quem o estabelece e
dotado de uma eficácia legitimante para outros, mais ainda no terreno social, que no terreno
jurídico: como tal, idóneo para se elevar a facto juridicamente relevante, em virtude de uma
da vontade interna e psíquica que o gerou, bem como da pessoa que o exprimiu. Somente o
preceito pode ser objetivamente considerado para posterior alteração. Assim traz Betti:
Vale dizer, no que tange ao efeito vinculativo do negócio, normativo, que o ato de
liberdade.
153
Idem. Ibidem. p. 311.
154
Idem. Ibidem. p. 311.
155
Idem. Ibidem. p. 314.
60
responsabilidade pela emissão do preceito é tal que não se requer uma análise psíquica do
servirão como limitadores desta responsabilidade, sob uma perspectiva social e legal, isto é,
dos costumes negociais como também da disposição normativa que embasa o negócio.
conteúdo. Já foi visto que o negócio se constitui pela forma e pelo conteúdo, segundo Emílio
Betti. A forma pode consistir numa declaração ou num comportamento. O conteúdo, por sua
vez, consiste no preceito de autonomia privada, expresso pelas partes, recepcionado pelo
ordenamento jurídico158.
156
Idem. Ibidem. p. 316.
157
Assim enuncia Betti: “O fenómeno que se nos apresenta na declaração, pode caracterizar-se como uma evasão
do pensamento de dentro de nós, uma objectivação, para se tornar expressão dotada de vida própria, comunicável
e apreciável no mundo social.” (Idem. Ibidem. p. 36)
158
“(...) através de um processo de recepção, o conteúdo do negócio é elevado a preceito jurídico, coisa que ele,
por si mesmo, não é.” (Idem. Ibidem. p. 169)
159
Idem. Ibidem. p. 168-169.
61
privada, bem como o tratamento do negócio validamente efetuado. Estes são de competência
normativa de lei. Não poderiam, por exemplo, as partes dispensarem elementos da estrutura
atitude do sujeito que são relevantes juridicamente, e se correspondem com a forma, com o
Deve haver vontade de declaração ou vontade de comportamento. Nas palavras do autor “não
basta (...) que o acto seja materialmente realizado: ele deve, também, ser querido como
deve corresponder, no agente, a consciência do seu significado e valor. “É preciso que o autor
esteja consciente do significado objetivo da declaração emitida, no seu conteúdo total e nos
vários elementos de que conta, e se dê conta do específico valor social do comportamento que
um escopo prático, que é uma tomada de posição vinculativa a respeito de certos interesses.
Esta se identifica, na maioria das vezes, com a realização da função típica – causa – do
160
Idem. Ibidem. p. 200-201.
161
Idem. Ibidem. p. 318-319.
162
Idem. Ibidem. p. 319.
163
Idem. Ibidem. p. 319.
164
“Quando a nossa conduta seja idónea para suscitar nos outros, com quem estamos em relações, a impressão
razoável de uma vinculação da nossa parte, e portanto baste para justificar uma expectativa, não é relevante para
a tutela desta que exista ou não, em nós, a consciência efectiva desse valor vinculativo: o lugar do saber é
ocupado pelo dever saber, e a este ónus está ligada, no caso de negligência, uma auto-responsabilidade
correlativa, que corresponde à imputação da conduta.” (Idem. Ibidem. p. 322-323)
62
Assim, a parte não é, necessariamente, a pessoa do declarante, uma vez que aquela
pode ser constituída por várias destas, bem como o negócio e a declaração de vontade – no
aspecto formal, como enuncia Betti – não são sinônimos. Para a formação do negócio, podem
haver várias declarações de vontade, e não haverá, ainda, de forma obrigatória, multiplicidade
de partes.
CONCLUSÕES
do negócio é explicada pela doutrina pátria e estrangeira, uma reflexão sobre os elementos
que estruturam as convenções negociais, e o dissenso presente acerca do tema. Para tanto,
além de uma revisão teórica da teoria de Pontes de Miranda, que encontrou ampla recepção na
civilística brasileira, a teoria de Emílio Betti, autor de destaque na doutrina civil italiana.
2) A teoria de Pontes de Miranda é marcada pela distinção dos planos que o autor faz do
sucessivamente, de forma cumulativa, por tais planos. A tricotomia é adotada fortemente pela
doutrina civil brasileira, como exposto. Tendo em vista o presente trabalho ter como objeto os
165
Idem. Ibidem. p. 163-164.
63
manifestação de vontade. Esta pode se dar por declaração – que pode ser tácita ou expressa –
ou ainda por um ato volitivo adeclarativo. A vontade tem, no negócio, finalidade negocial;
deve-se ter vontade de realizar o ato jurídico. Ainda, deve ser consciente, atendendo a teoria
oriunda da personalidade, adquirida por todos ao nascerem com vida. A capacidade de direito
pode ser denominada por “agente”, pois qualquer pessoa a possui. Vale dizer, o que concerne
Pontes de Miranda, pertencendo ao plano da validade. O terceiro elemento que integra o plano
da existência, isto é, que faz parte do suporte fático do negócio jurídico é a forma. Todo
negócio tem forma, sendo esta a expressão da vontade. A exigência de forma especial pode se
objeto. Pontes de Miranda não discorre sobre este de forma extensa, mas apenas o cita em
alguns trechos como parte integrante do plano da existência. Sem tais elementos citados o
negócio não se forma, não existe. Eles se referem à todas as convenções negocias, de forma
que, em alguns negócios específicos, o suporte fático integra, além destes, outros elementos
objeto de ampla abordagem no presente trabalho, que se dedicou aos elementos gerais, isto é,
3) A teoria de Emílio Betti, por sua vez, estrutura o negócio jurídico de forma distinta. A
lógica dos planos não tem abordagem na teoria de tal autor, que não se estrutura em torno dos
planos consecutivos, mas sim em elementos fundantes que são a forma e o conteúdo. Todo e
64
qualquer ato dispõe de forma e conteúdo. Independente do negócio ser formal ou não, a forma
existe para qualquer negócio – ponto em que se pode fazer uma aproximação das duas teorias.
por outros. Por outro lado, o comportamento esgota seu resultado numa modificação objetiva,
declaração e comportamento, não existe negócio sem uma forma que o torne socialmente
função econômica e social. O conteúdo preceptivo é delimitado pela consciência social e pela
ordem jurídica: se estende a tudo aquilo cuja expressão ou execução seja necessária, de
designada. O preceito ainda, é independente da vontade interna que o gerou, bem como da
pessoa que o exprimiu. É, desse modo, considerado de forma plenamente objetiva. Sem forma
negócio jurídico, as quais divergem de modo significativo entre si, bem como os elementos
que estruturam o negócio jurídico pelas mesmas. A teoria de Pontes de Miranda, como
exposto, é adotada fortemente pela doutrina brasileira. Porém, falta a esta a análise de outras
formação do negócio, que, no presente trabalho, foi efetuada na de Emílio Betti, assim como
65
pela relevância do esclarecimento das teorias já adotadas, que, neste, foi trabalhada na de
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