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Dicionario Do Pensamento Kleiniano
Dicionario Do Pensamento Kleiniano
Psicanálise, Psicologia,
Psicopedagogia, Psiquiatria
TÍTULOS EDITADOS
* Aberastury. A.; Adolescência
* Aberastury. A,: Psicanálise da Crança —Teoria e Técnica
* Aberastury. A.: A Percepção da M orte na Criança e Outros Escritos
* Aberastury 8, Knobel Adolescência Normal
* Aberastury £k Salas: A Paternidade — Um Enfoque Psicanalítico
* Ackerman. Na Diagnóstico e Traramento das Relações Familiares
* Aimard, Paule: A Linguagem da Criança
* Ajuriaguerra 6, Marcelli; Manual de Psicopa tologia Infanríl
' Ajuriaguerra, j.: A Dislexia em Questão
* Ajuriaguerra. j. A Escrita infantil — Evolução e Dificuldade
* Albuquerque, T. Lins: Psicologia &. Educação
* Alencar. Eunice: Psicologia da Criatividade
* Alexandet. Franz:/Vledícina Psicossomática
* Alliençle 8. Condenwiri; A Leitura
* Artdolfi. Mautizio: Por Tra's da Mascara familiar — Um novo
Enfoque em Terapia familiar
* Andolfi 8. An gelo: Tempo e Mico em Psicoterapía familiar
* Anzteu. Didier: A Auro-Análise de Freuet e a Descoberta da Psica
nálise
* Aucouturier e colaboradores: A Prática Psicomotora
* Aucouturier 8. lapierre; Sruno — Psícomotricidade e Terapia
1 Balaban, Naney: O inicio da Wda Escolar
* Baranger. W.: Posição e Objeto na Obra de Metanie Klein
* Barbizet 8, Duizabo; Neuropsicoiogia
* Beilak 8. Smaíi: Psicoterapía de Emergência S, Psicoterapía Breve
* Bergeret: Personalidade Normal e Patológica
■ Bergeret 8, Leblaric: Toxicomanias
* Bèrgés 8. Lézine; Fesre de Imiração de Cestos
* Besteiheim 8, Zelan: Psicanálise da Alfabetização
* Bettelheim, Bruno:Sobrevívência
* B!anck. G, 8, R,: Psicologia do Ego — Teoria e Praríca
* Bleger. josé: Psicologia da Conduta
’ Bleger. josé; Psíco-HIgiene e Psicologia institucional
* Bleichmar. Emitce-, O fem inism o Espontâneo da Histeria
* Bleichmar. NugO: Depressão.- Um Estudo Pslcanaíirico
* Bleichmar. Hugo: Introdução ao Esrudo das Perversões
' Bleichmar. Hugo: Narcisisçno
* Bleichmar. Hugo: Angus (ia e Fantasma
* BI um, H,; Psicologia Feminina
’ Bossuet. Gérard: O Computador na Escola — O Sistema Logo
* Bowlby, John: Uma Base Segura
* Brazelton: A Dinâmica d o Bebè
' Brazelton. T,; O Desenvolvimento d o A pego
* Brunnet, Lèzine; Desenvolvimento Psicotogíco da I; infância
* Bryant 8, BradSey; Problemas de leitura na Criança
* Cabral, Lanza 8. Tejera — Educar Vivendo — O C orpo e o Crupo
na Escola
■ Calkins. Lucy: A Arre de Ensinar a Escrever
* Chasseguer-Smirgeí. j. 8, Cols: Sexualidade Feminina
* Chasseguet-Smirgel, j..; As Duas Arvores do jardim
* Chasseguet Smirgel: Erica e Esférica da Perversão
* Castorina e Cols.: Psicotogia Genética
* Chess & Hassibi; Princípios e Prática da Psiquiatria infantil
* Chlland. Collete: A Criança, a Família, a Escola
* Ctawson. A.: Bender Infantil
* Coridemarirv Mabek Dislexia — Manual de Leitura Corretiva
’ Condemarin, Mabel: A Escrita Criativa e Formal
* Condemarin. Chadwtck 8. Milícic: Maturidade Escolar
' Craig. Robert: Enrrevisra Clinica e Diagnostica
* Cunha, Freitas 8. Raimundo: Psicodiagnósrico
* Curtiss. Sandra: A Alegria d o Movim ento na Pré-Escola
* Debray, Rostne: B.ebés/Mães em Revolta
* Decherf, Gérard; Edipo em Grupo: Psicanálise e G rupos de Crian-
ças
* Dejours. C.i O Corpo entre a Biologia e a Psicanálise
* DeWald. Paul: Psicoterapía — Uma Abotdagem Dinâmica
* Dt Léo; A Interpretação do Desenho Infanríl
* Dolto. Frartçoise: A Dificuldade d e Viver
* Duarte, Bornholdt 8. Castro: A Prática da Psicoterapía Infantil
* Eiguer, Alberto: Um Divã para a Família
1 Eizirik: Psicoterapía d e Orientação Analítica
* Eikãim Mony 8. Cols.: Formações e Práticas em Terapia Familiar
* Enderle, Carmen: Psicologia da Adolescência
* Enderle. Carmen: Psicoiogia d o Desenvolvimento
* Etchegoyen. Hofácio: Fundamentos da Técnica Psicanalirica
* Fernandes, Alicia; A Inteligência Aprisionada
* Ferreiro 8. PalaciO: Novas Perspectivas Sobre os Processos de
leitura e Escrita
" Ferfeiro 8, Teberoski: Psicogènese da Língua Escrica
* Fogel 8 Cols.: Psicoiogia Masculina
’ Gambaroff, Marina: Utopia da Fidelidade
* Garma. Angel: A Psicanálise — Teoria, Clinica e Técnica
* Gibello. Bernard; A Criança com Distúrbios de inteligência
Giovacchtni, P,: Roteiro à Leitura de Freud
* Golbert, Clarissa: A Evolução Pskolingüistica e Suas im plicações
na Alfabetização
* Goodrich et al.; Terapia Feminista da Família
* Goodwin, Guze: Diagnóstico da Doença Mental
* u ftril ^obetto: Discorrer a Psicanálise
, Hetren 8 He nem A Estimulação Psicomotora Precoce
, Homstein. L.: Cura Ps/canafitica e Subtimaçâo
■, Horowiiz, M.: Introdução á Psicodlnám/ca
V: lerusalinsky, A,: Psicanálise do Autismo
. lerusalinsky. A.: Psicanálise e Desenvolvimento Infantil
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dicionário do
pensamento
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Tradução:
JOSÉ OCTAVIO DE AGUIAR ABREU
Supervisão da tradução:
ELIZABETH LIMA DA ROCHA
LIANA PINTO CHAVES
Psicanalistas. Membros -da: Sociedade Brasileira
de Psicanálise de São Paulo e da comissão editorial
para a tradução brasileira das obras de Melanie Klein.
AlHÊS
ÍVEDiCAS PORTO ALEGRE / 1992
A meu pai,
que não entendia muito
desta maneira de pensar,
mas teria ficado
orgulhoso de meus esforços.
SUMARIO
Prefácio à 1? edição........................... . ......................................................................................................... 11
Prefácio à 2? Edição................................................. ......................... ............................................................13
Introdução.........................................................................................................
1 Técnica..................... 23
2 Fantasia inconsciente.......................................... 46
;P3 Agressão, sadismo e instintos componentes.......................................................... 61
4 Complexo de Êdipo.................................................. 71
if-5 Objetos internos............................................................................ 82
6 Fase da feminilidade........................................................................................ 99
■i 7 Superego........................................................................................................ 109
£ 8 Situações arcaicas de ansiedade......................................................................................................... 126
'l 9 Mecanismos primitivos de defesa................................................................................................ 136
Ç-TO Posição depressiva.................................................................................................................................. 152
11 Posição esquízoparanóide............................................................................ 170
12 Inveja.......................................................................................................................................................... 181
13 Identificação projetiva ........................................................................................................................... 193
B - VERBETES GERAIS
ROBERT M. YOUNG
FAB
R.D.Hinshehvood / 12
PREFÁCIO À 2? EDIÇÃO
Esta edição revisada do Dicionário do Pensamento Kleiniano é uma
oportunidade feliz para considerarmos o clamor da resposta à segunda edição.
Foi extremamente encorajador ter uma resposta tão ampla - e tão favorável,
em sua maior parte.
Mas nem todos os que responderam formavam um consenso sobre o
trabalho e isto deu-me a oportunidade para refletir ainda mais sobre a geo
grafia da área. Como resultado disso, acrescentei novos materiais e reescre-
vi várias passagens. Felizmente, a quantidade do que está reescrito e modifi
cado da primeira edição é muito pequena. Fico satisfeito com isso, tanto pe
lo prazer de ter produzido uma versão substancialmente aceitável do pensa
mento kleiniano, quanto porque a quantidade de material a ser relido por
aqueles que estudaram a primeira edição não é grande. O mais importante,
acerca desta segunda edição, é o material adicional.
As principais críticas relacionavam-se a duas questões: certos aspectos
do instinto de morte e inveja e os recentes avanços na técnica associada ao
nome de Betty Joseph.
A primeira destas críticas levou-me a fazer algumas alterações nas entra
das instinto âe morte, inveja, agressão e perversão,
A segunda crítica - de que não valorizei e não representei adequadamen
te o trabalho de Betty Joseph - foi mais difícil avaliar. A publicação de uma
coletânea de seus trabalhos em 1989, editada por Michael Feldman e Eliza-
beth Spillius, traz esta questão de um modo mais vigoroso. Seu livro é uma
coleção admirável de textos sobre um desenvolvimento impressionante no trá-
balho de um grupo significativo de kleinianos londrinos - trabalho este admi
rado e reconhecido por todo o grupo kleiniano. Relaciona-se ao fenômeno
do "acting-in", como Betty Joseph o chama. Ela o descreve como a manifesta
ção clínica encontrada com maior frequência dentro do tratamento analítico
de certos tipos de pacientes particularmente difíceis, aqueles que são "difíceis
de serem alcançados". O "acting-in" é o correlativo clínico dos problemas teó
ricos chamados pelos analistas kleinianos de "organizações patológicas". Eu
dei maior ênfase a este trabalho na presente edição, introduzindo novas entra-
R.D.Hínshelwood / 13
das, organizações patológicas, e, para cobrir o trabalho de Betty Joseph, alte
rações psíquicas e equilíbrio psíquico (termos adotados por Feldman e Spil-
lius para dar aos escritos de Betty Joseph maior clareza técnica) e dor psíqui
ca e acting~in. Também foram necessárias algumas modificações às entradas
já existentes de transferência e contratransferência. Consegui explicar de mo
do mais completo minhas próprias impressões sobre a importância do trabalho
de Betty Joseph, quando fui convidado a revisar seu livro para a Free Asso-
ciations 22.
A bibliografia foi atualizada e tentei manter-me em dia com a republica-
ção dos textos anteriormente publicados pelos kleinianos, que parecem for
mar, atualmente, um importante empreendimento por seus próprios méritos.
Sou grato aos amigos e colegas por terem apontado alguns erros meno
res de ortografia, que foram corrigidos nesta edição. Graças a Selina 0'Grady,
poucos desses erros passaram por sua atenta vigilância. Agradeço também a
Hanna Segai, pelo tempo que passou comentando e discutindo sobre a pri
meira edição deste livro; e também por uma correspondência detalhada com
Elizabeth Spillius, após sua revisão da primeira edição ("On Kleinian langua-
ge", Free Associations 18:90-110). E, como sempre, Robert Young encorajou-
me muito com sua perspicácia sobre os elementos necessários ao trabalho.
Robert H inshelwood
R.D.Hínshelwooâ / 15
do sujeito e a linguagem do observador representam discursos tradicionalmen
te separados na psicologia 'científica".
Existem várias características principais na formação do pensamento kleiniano:
1. Klein chegou à vida profissional, e à psicanálise, tarde em sua vida, e, de
vido a isso — bem como, provavelmente, por razões localizadas em sua pró
pria personalidade — lutou continuamente para estabelecer-se de modo segu
ro, posição que constantemente lhe fugia. A psicanálise kleiniana continua a
ser um corpo de conhecimentos cuidadosamente mantido por um grupo de
pessoas (o Grupo Kleiniano) com o mesmo arredio senso de insegurança e
uma preocupação sobre o que outros que venham a possuir os conhecimen
tos possam fazer com eles. O debate com outras escolas de psicanálise foi
ou inexistente ou, quando aconteceu, degenerou em disputas de tipo bastan
te pessoal.
2. Mesmo assim, Klein, como todos os inovadores, foi afortunada em desco
brir-se de posse de uma nova técnica que lhe permitiu um alcance muito
maior em sua área de descobertas do que qualquer pessoa antes dela. Ela vi
brou com o poder de sua técnica através do brincar e ficou entusiasmada pa
ra demonstrar a utilidade dela. Mas a novidade e o poder de sua técnica fa
lharam em dar-lhe a posição segura que buscava; na realidade, aconteceu o
inverso: seus resultados excepcionais tornaram-na um membro embaraçoso
e divergente da comunidade psicanalítica ortodoxa.
3. Outro elemento de vulto no pensamento de Klein foi a importância conce
dida às "relações objetais", que lentamente surgiram da ênfase crescente da
da a um aspecto especial do relacionamento analítico: a transferência. A vi
da profissional de Klein acompanhou a lenta compreensão da realidade con
creta das relações objetais internas, o processo de compreendê-las através
do brincar das crianças e da loucura dos psicóticos, e por fim a revisão radi
cal da natureza e do uso da transferência, em resultado dessas descobertas.
O pensamento de Klein nem sempre progrediu em uma direção única. As eta
pas podem ser relacionadas em ordem cronológica aproximada:
1919 Importância do conteúdo {antes que a origem pulsional da ansiedade)
1922 Terapia através do brincar
1923 Fantasia inconsciente
1923 Violência e sadismo ná vida de fantasia
1925 Abandono do esquema temporal das fases evolutivas
c.1925 Ciclos de perseguição
1926 Objetos internos
1926 Culpa e superego arcaico
1927 Introjeção das imagens fantasiosas dos pais!
1928 Simbolização, personificação e externaíização
1930 Mecanismos primitivos de defesa
R, D, Hinshelwood / 17
outros, muito pouco, e poderão necessitar conhecer mais sobre os anteceden
tes, caso em que só posso referi-los ao Vocabulário da psicanálise, de Laplan-
che e Pontalis, e ao Dicionário 'crítico de psicanálise, de Charles Rycroft, ex
celentemente simples.
A tradição kleiniana sempre deu ênfase ao trabalho clínico e pode-se dizer
que virtualmente nenhum trabalho kleiniano surge sem uma quantidade subs
tancial de material clínico a respaldar-lhe os argumentos. Klein, sendo uma
observadora tão excepcional no consultório, sempre apoiou-se nessa força
quando sentiu, durante os anos de discussão, de 1926 a 1946, que era pressio
nada a defender seu caso. Sua base foi sempre o conteúdo psicológico das
mentes de seus pacientes, tal como surgia no material. E curioso redigir um
relato não-clínico do pensamento kleiniano, mas, constitui pilar central do
propósito deste dicionário reunir seus fios teóricos.
Embora os conceitos kleinianos surjam da psicanálise clássica, eles existem
hoje em contraste com a psicologia do ego, atualmente a tradição dominan
te derivada da psicanálise freudiana clássica. Onde possível, fiz referência
aos caminhos divergentes entre estas duas escolas.
Finalmente, compilei uma Bibliografia bastante abrangente, para meus pró
prios fins, ao trabalhar neste dicionário, e, de vez que existe uma fronteira
bastante clara entre aqueles que trabalham rigorosamente com a psicanálise
kleiniana e aqueles que não o fazem, pareceu valer a pena incluir essa compilação.
Fiquei embaraçado com o uso de pronomes da terceira pessoa. O neutro
(it) é desagradavelmente impessoal, em minha opinião, para a descrição de
uma matéria-prima tão intensamente humana e pessoal. Qualificar constante
mente o pronome utilizando a expressão "ele ou ela" ou "dele ou dela" leva
a um estilo laborioso. Portanto, ocasionalmente utilizei "ele", "a ele" ou "de
le" onde me podería referir a identidades tanto masculinas quanto femininas,
e com isso não se pretende qualquer ofensa. Em verdade, é minha opinião
— e da psicanálise em geral — que o gênero não vai além da pele; somos
um amálgama de ambos os estereótipos de gênero e o emprego de "ele" ou
"ela" reduz a identidade a um objeto parcial, ponto que pode ser esclarecido
consultando-se o verbete PAI.
Desejo agradecer a meu próprio analista kleiniano, a meus professores de
psicanálise e a meus pacientes, com quem aprendi a empunhar esses difíceis
instrumentos conceptuais, e também a um certo número de pessoas que me
ajudaram na preparação deste livro: Gillian Beaumont, ]oe Berke, Susanna
Isaacs Elmhirst, Karl Figlio, Selina 0'Grady, Frank Orford, Hanna Segai, Eli-
zabeth Spillius, Victor Wolfenstein, Bob Young.
Devo particularmente assinalar o constante apoio que agradecidamente re
cebí de Bob Young e o rigoroso teste intelectual a que Karl Figlio submeteu
o meu original, algo que tornou o resultado algo muito mais meticuloso do
que eu teria doutra maneira conseguido. Na preparação das correções a acrés
cimos posteriores, tenho de reconhecer a ajuda de muitos colegas e amigos,
Bick, Esther (1968), “The experiertce of the skin in early object relations", Int. ]. Psycho-A-
rtal, 49:484-6; replublícado (1987) em Martha Harris e Esther Bick, The collected papers
o f M artha Harris and Esther Bick, Perth, Clunie, p.114-8.
Bion, Wilfred (1959), “Attacks on Hnking", Int. J. Psycho-A nal., 40:308-15; republicado
(1967) em W. R. Bion, Second Thoughts, Heinemann, p .93-109.
...........(1962), Leam ing from experience, Heinemann.
-------- (1970), Attention and interpretation, Tavistock.
Joseph, Betty (1975), "The patient who is difficult to reach", em Peter Giovacchini, (org.),
Tactics and techniques in psycho-analysis, vol. 2, Nova Iorque, Jason Aronson, p.205-16.
Klein, Melaníe (1946), “Notes on some schizoid mechanisms'', em The wrítings o f M elanie
Klein, vol, 3, Hogarth, p.1-24.
Meltzer, Donald (1968), “Terror, persecutíon, dread", Int. ]. Psycho-A nal., 49:396-400; repu
blicado (1973) em Donald Meltzer, Sexual States o f mind, Perth, Clunie, p,99-106.
-------- (1975), "Adhesive identifícation", Contem porary Psycho-Analysis, 11:289-310.
Meltzer, Donald; Brenner, John; Hoxter, Shirley; Weddell, Doreen e Wittenberg, Isca (1975),
Explorations in autism, P,erth, Clunie.
Money-Kyrie, Roger (1956), "Normal counter-transference and some of its deviatíons", Int.
J. Psycho-Anal., 57:360-6; republicado (1978) em The collected papers o f R oger M oney-Kyrie,
Perth, Clunie, p.330-42,
Rosenfeld, Herbert (1971), "A clinicai approach to the psycho-analytic theory of the life and
death instincts: an investigation into the aggressive aspects of narcissism", Int. }. Psycho-Anal.,
52:169-78.
R.D.Hinshehoood / 19
Segai, Hanna (1957), "Notes on symbol-formafcion", Int. ]. Psycho-A nal., 38;391~7; republica
do (1981) em The w ork o f Hanna Segai, Nova Iorque, Jason Arortson, p.49-65.
Tustin, Francês (1981), Àutistic states in children, Routíedge & Kegan Paul.
Williams, Raymond (1972), "Ideas of nature", em (1980) Problem s in materialism and cultu-
re, Verso, p,67-85.
Àm
TÉCNICA
DEFINIÇÃO, O trabalho de Klein com crianças enfatizou a função da fantasia
e a sua técnica utilizou brinquedos no setting psicanalítico, para realçar a
expressão de fantasias. O brincar, tal como a associação livre, os sonhos
e a atuação [acting out] foram encarados como expressões da fantasia.
Klein demonstrou que a técnica da interpretação imediata e profunda resul-
tava em uma modificação da ansiedade, achado que apoiou fortemente es
se tipo de interpretação, enfatizando também a qualidade mutativa das in
terpretações transferenciais.
Todo o material das manifestações verbais do paciente em uma sessão
analítica, mesmo em um adulto que está associando livremente, refere-se
a aspectos da relação transferenciai com o analista.
As associações que se referem a figuras externas da vida do paciente
são encaradas como aspecto da transferência que foram escindidos (split
offj a fim de reduzir a ansiedade do momento imediato com o analista a
um nível tolerável.
A contratransferência foi sempre encarada com certa desconfiança por
Klein, como também aconteceu com Freud; entretanto, o modelo apresen
tado por Bion, de uma interação mãe-bebê, trouxe-a para o centro da téc
nica psicanalítica. A compreensão da contratransferência é equivalente à
compreensão que a mãe tem das necessidades corporais de seu bebê e de
senvolve a capacidade que o padente/bebê tem de compreender a si mes
mo. Os analistas kleinianos não interpretam um sentimento contra transfe
renciai sozinho; a própria experiência do analista é interpretada à luz dos
relacionamentos descritos no material do paciente.
CRONOLOGIA
1918 Trabalho com crianças.
1919 Interpretação de perguntas inconscientes sobre a sexualidade.
1921 Utilização de brinquedos e do brincar (Klein, Melanie, 1920, 'The
development of a child"; Klein, Melanie, 1955, "The psychoanalytic
play-technique: its history and significance").
R.D.Hínshelioood / 23
1926 Confrontação com Anna Freud (Klein, Melanie, 1926, 'The psycho-
logical principies of early analysis").
1934 Ênfase dada por Strachey à tranferência (Strachey, James, 1934, 'The
nature of the therapeutic action of psycho-analysis").
1956 Ênfase na contratransferência e nos ciclos de identificações projeti-
va e introjetiva (Money-Kyrle, Roger, 1956, "Normal counter-trans-
ference and some of its deviations"; Bion, Wilfred, 1959, "Attacks
on linking").
II Psicanálise de adultos
(1) as associações livres dos adultos vieram a ser vistas com um brincar
com objetos (com o analista ou com partes da mente deste);
(2) deu-se mais ênfase à criança no paciente adulto;
(3) importância da transferência negativa;
(4) a "situação total" (isto é, todas as associações) refere-se à transferência
para o analista;
(5) o analista, suas partes corporais e as funções de sua mente podem ser,
todas elas, experienciadas como objetos parciais;
(6) o bebê no paciente.
R.D.Hínshehuood / 25
de três anos; dessa maneira, achava ela, podia remontar à área cinza da
primeira infância mais longe do que qualquer outro o fizera.
A técnica não surgiu de uma vez só, mas através de uma série de eta
pas, Ela começou reservando tempo para conversar com crianças e respon
der às perguntas delas, especialmente aquelas relacionadas à vida sexual
dos pais, Era franca e aberta, e modelava o que fazia na maneira pela
qual Freud abordara o manejo dos problemas com o Pequeno Hans {Freud,
1909). Descobriu que se dava um efeito geralmente positivo na criança con
frontada com um adulto aberto e totalmente franco, de maneira que o brin
car e a vida de fantasia eram visivelmente enriquecidos.
Entretanto, quando relatou seu trabalho em um encontro da Sociedade
Psicanalítica Húngara em Budapeste, em 1919, um colega, Anton von
Freund, queixou-se de que ela se dirigia apenas às questões conscientes
que estavam intrigando a criança, e não às inconscientes. Suas interpreta
ções, disse ele, não eram psicanalíticas, ainda que a maneira pela qual for
mulava suas observações o fosse.
Depois disso, ela começou a dirigir-se às questões inconscientes [ver 2.
FANTASIA INCONSCIENTE], A princípio, teve muita cautela com as in
terpretações; ainda assim, ficou estupefata com as mudanças de grande al
cance que ocorreram, resultando num surgimento bastante espantoso de
fantasias e brincadeiras: "(...) de modo inteiramente espontâneo ele come
çou a falar e, daí por diante, contou histórias fantásticas mais longas ou
mais curtas (...) Até então, a criança havia mostrado tão pouca tendência
a contar histórias quanto a brincar" (Klein, 1920,' p. 31). Ela parece ter fi
cado quase alarmada pela repentina e infindável produção de fantasias,
não menos, talvez, por descobrir que elas eram com tanta freqüência vio
lentas. Contudo, a força da técnica foi-lhe imediatamente confirmada.
Introdução de pequenos brinquedos (1923): Para realçar a expressão des
sas fantasias, Klein começou a usar conjuntos muitos pessoais de brinquedos:
Em uma sessão em que novamente encontrei a criança respondendo pou
co e retraída, deixei-a, dizendo-lhe que voltaria em um momento. Fui
até o quarto de brinquedos de meus próprios filhos, apanhei alguns brin
quedos, carrinhos, figurinhas, tijolos de armar, um trem, coloquei-os
numa caixa e voltei para o paciente. A criança, que não fora atraída
pelo desenho ou outras atividades, ficou interessada nos brinquedos e
imediatamente começou a brincar com eles. (Klein, 1955, p. 125).
Klein tomou como modelo as interpretações feitas por Freud de um bebê
de oito meses, a brincar com um carretei de algodão (Freud, 1920).
R.D.Hinshetwood / 27
contato positivo com a criança: "Vi-me assim forçada a tomar outras me
didas, medidas que mais uma vez deram prova notável da eficiência da in
terpretação na redução da ansiedade e da transferência negativa do pacien
te". Prossegue descrevendo como utilizou material provindo de várias ses
sões para formular uma interpretação da ansiedade da criança a respeito
das entranhas da mãe, e o temor de um bebê por nascer. Ela ficou espanta
da com a mudança imediata: "O efeito de minha interpretação foi assom
broso. Pela primeira vez, Ruth voltou sua atenção para mim e começou
a brincar de maneira diferente, menos tolhida" (Klein, 1932, p. 26-7).
A ansiedade e a transferência negativa: Os aspectos negativos do relaciona
mento da criança com o analista (transferência negativa) eram de conside
rável importância, uma vez que o brincar a que Klein assistia achava-se im
pregnado por fantasias agressivas e pelo temor e alarma a que pareciam
dar origem. Tornou-se-lhe óbvio que o ato de interpretação;tinha de, em
primeiro lugar e acima de tudo, lidar com os aspectos negativos das fanta
sias da criança, tanto porque era esse o ponto máximo de ansiedade quan
to por ela haver descoberto que ele definitivamente mudava os sentimen
tos pelo analista nessa direção positiva. ísaacs (1939) confirmou o efeito
de interpretar o ponto de ansiedade máxima. Nessa ocasião, contudo, ou
tros analistas de crianças, alarmados por interpretações explícitas e profun
das, desaprovaram intensamente isso (Anna Freud, 1927) [ver adiante; tam
bém ANÁLISE DE CRIANÇAS].
R.D.Hinshelwood / 29
A relação com o analista é vista como possuindo significado para o pacien
te, de acordo com os impulsos ativos neste, no momento [ver 2 FANTA
SIA INCONSCIENTE],
Externalizaçâo da fantasia inconsciente: Não se trata, portanto, meramen
te de uma repetição de antigas atitudes, acontecimentos e traumas do pas
sado; trata-se de uma externalizaçâo da fantasia inconsciente "aqui e ago-
ra • ^ primado dos processos (projetivos) de externalizaçâo concede uma
importância espacial; assim como temporal, ao conceito de transferência,
em oposição a uma importância meramente temporal [ver TRANSFERÊN
CIA],
A tradição kleiniana enfatizou a importância, na transferência, da ansie
dade e das atitudes negativas no "aqui~e-agora". Strachey (1937) ampliou
isto em fundamentos teóricos que derivaram da teoria dos objetos inter
nos e do superego [ver 5. OBJETOS INTERNOS; 7. SUPEREGO]:
Suponhamos que o analista dê a uma paciente uma interpretação no
sentido de que, em certa ocasião, ela teve o desejo de que o marido
morresse. Ora, o efeito que (de acordo com nossa teoria da interpreta
ção) se deveria produzir aqui é que a paciente, por ser conscientizada
desse particular impulso do id, ficasse em posição de discriminar entre
seu objeto real (uma imago paterna, talvez) e pudesse assim ser capaz
de efetuar uma correção em sua atitude para com a realidade externa e,
em última análise, fazer um reajuste interno. Mas o que na realidade
acontece é algo inteiramente diferente. Quando a interpretação é dada,
todo o conflito se transfere da situação sobre a qual o analista está fa
lando para outra situação sobre a aual não está falando. A paciente po
de, é verdade, concordar que desejou que o marido morresse, mas seus
interesses emocionais passaram automaticamente para outro problema,
desta vez a respeito do analista e sua interpretação. Ela agora está reple
ta de sentimentos conflitantes a respeito dele — raiva, temor, desconfian
ça, gratidão, e muitos mais. E a totalidade deste novo conflito está, de
momento, fora da visão e do alcance do analista. (Strachey, 1937, p. 142-3).
Estas concepções, por sua vez, fortaleceram a própria ênfase dada por
Klein aos objetos internos e coincidiram com sua formulação da posição
depressiva [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA].
Klein estabeleceu que o total de todas as associações livres que vem a men
te de um paciente pode ser referido à transferência, por mais afastado da
consciência que o vínculo possa ser:
Durante muitos anos a transferência foi entendida em termos de referên
cias diretas ao analista no material do paciente. Minha concepção da
transferência como enraizada nos estágios iniciais do desenvolvimento
e em camadas profundas do inconsciente é muito mais ampla e acarre
ta uma técnica pela qual, de todo o material apresentado, os elementos
inconscientes da transferência são deduzidos. (Klein, 1952, p. 55).
Isto desenvolveu-se como uma ênfase dada à situação total. A análise clás
sica, em contraste, desconfia de tais interpretações "profundas" [ver adiante].
Esta ênfase é um marco decisivo da abordagem kleiniana, à qual ela re
tornou repetidas vezes:
R.D.Hínshelwood / 31
(...) o paciente e obrigado a lidar com conflitos e ansiedades reexperien-
ciados em relação ao analista através dos mesmos métodos que utilizou
no passado, ou seja, ele se afasta do analista como tentou afastar-se
de seus objetos originários; tenta cindir as relações com ele, manten
do-o seja como figura boa, seja como figura má; desvia alguns dos sen
timentos e ansiedades experienciados em relação ao analista para outras
pessoas de sua vida atual, e isto faz parte da "atuação" [acting out]
(Klein, 1952, p. 55-6).
Isto repete a atividade primária de cisão do ego infantil [ver CISÃO]. Des
sa maneira, todas as figuras que aparecem no brincar ou nas associações
livres devem ser consideradas como aspectos do analista que foram cindi
dos [spiit off] e projetados [ver PROJEÇÃO]; trata-se de uma cisão desti
nada a regular o relacionamento com o analista em níveis controláveis de
ansiedade. É esta a importância da situação total (Joseph, 1985).
R.D.Hinshelwood / 33
ções depressiva e esquizoparanóide, isto significava o estabelecimento de
um objeto bom interno mais seguro.
R.D.Hinshelwood / 35
ta trabalha para conter a si próprio como distinto da representação do pa
pel de uma ou outra figura arcaica (Elmhirst, 1978).
Contratransferência normal e anormal: Money-Kyrle (1956) e Bion (1959)
formularam o quadro mais claro do conter projetivo e introjetivo das expe
riências do paciente. Money-Kyrle (1956) elaborou a teoria de Strachey.
Enquanto que este olhou para o problema da introjeção, pelo paciente,
de seu analista, e descreveu a maneira pela qual as projeções do paciente
atribuíam aspebtos primitivos do objeto ao analista, Money-Kyrle descre
veu a situação desde dois pontos de vista intrapsíquicos: o do paciente e
o do analista. Se o paciente projeta sobre o analista e depois reintrojeta o
analista distorcido pela projeção, existe também a situação do analista que
introjeta a projeção do paciente e o que faz com ela dentro de si, antes
de devolvê-la ao paciente, para reintrojeção. Neste processo normal, o ana
lista aceita em si aquilo que o paciente diz e, sob forma de uma interpreta
ção, ele calmamente projeta uma versão modificada da comunicação do
paciente [ver MEMÓRIA E DESEJO], A conversão da projeção do pacien
te, embora resida dentro do analista, deve, em circunstâncias normais,
achar-se alinhada com a opinião de Strachey, de que a interpretação não
apresenta o analista como qualquer dos objetos arcaicos polarizados ("bom"
ou "mau"). Money-Kyrle chama isto de contratransferência n orm al Contu
do, as coisas não são tão diretas. Usos "anormais" do analista surgem a
partir da deterioração do processo, com um crescente vigor das projeções
para dentro do analista [ver CONTRATRANSFERÊNCIA; LIGAÇÃO].
Há situações em que o processo de introjeção oriundo do paciente cau
sa problemas para a mente do analista, e então a projeção de volta para
o paciente fica empacada. O analista pode sofrer de estados prolongados
de aferramento a um paciente introjetado, pensando nele após a sessão
de maneira preocupada, etc., ou, então, estados prolongados de projeção
em que o seu proprio self infantil é atribuído de modo exagerado ao pacien
te. Isto exige que o psicanalista se valha de trabalho interno para corrigir
a situação. Ele tem, em verdade, de elaborar aquilo que, em si, é perturba
do por aquilo que o paciente nele projeta [ver CONTRATRANSFERÊNCIA].
Precauções!: Klein, tal como Freud, objetava a este uso da contratrans
ferência, porque ele poderia constituir uma licença para o analista pojetar
defensivamente qualquer de seus sentimentos no paciente, parecendo assim
culpar a este por colocar seus sentimentos em mim". E importante relem
brar este equívoco (Finell, 1986). Os próprios sentimentos do analista são
apenas um guia para a experiência do paciente. A dificuldade que o analis
ta deve ter em distinguir o seu próprio investimento inconsciente no set-
ting significa que ele precisa conferir os seus próprios sentimentos pela uti
lização dos detalhes das associações do paciente para fazer sentido de sua
própria experiência com o paciente.
R.D.Hinshekoood / 37
Em contraste, a técnica clássica, tal como desenvolvida em Viena, era in
teiramente diferente. Aqui, a técnica era identificar os impulsos (tal como
emergiam no pré-consciente) como derivados das pulsões no inconsciente,
identificar para o paciente o impulso imediato — quase à superfície —,
que está lutando para aparecer, e interpretar a defensividade final que re
siste a sua infiltração na consciência. Dessa maneira os analistas clássicos,
ao descreverem o derivado mais superficial das pulsões, que ainda não é
inteiramente consciente, acreditavam manter uma cooperação baseada
em uma transferência positiva (posteriormente denominada aliança de tra
tamento, Zetzel, 1956) e impedir que uma transferência negativa prejudi
cial fosse despertada mediante o desafio das defesas além de um certo ní
vel mínimo, que podia ser controlado (ver Fenicheí, 1941). O método clás
sico de interpretar a partir da superfície e apenas mover-se cautelosamen
te, de modo sistemático e mais fundo através das camadas da mente, ba
seia-se na abordagem "fisiolófica" de Freud da energia mental [ver LIBI-
DO; MODELO ECONÔMICO], Para um resumo claro da divergência en
tre as duas técnicas, ver Payne (1946).
O DEBATE COM ANNA FREUD. Em 1926, Anna Freud deu uma série de
palestras em Viena sobre a sua experiência de análise de crianças. A essên
cia de suas conferências foi uma crítica do trabalho de Klein e sua técnica
através do brincar (Anna Freud, 1927). Embora essas críticas fossem mais
tarde um tanto mitigadas, elas constituem a base do abismo profundo exis
tente entre a técnica, tal como descrita neste verbete, e a técnica clássica
que veio a ser adotada pela escola de psicanálise conhecida como psicolo
gia do ego [ver PSICOLOGIA DO EGO].
Em 1927, o ano seguinte as palestras de Anna Freud, houve um simpó
sio no 10? Congresso de Psicanálise, em Innsbruck, no qual Anna Freud
forneceu um breve resumo de suas conferências e Klein (1927) contestou
plenamente as críticas da primeira.
Críticas iniciais de Anna Freud. Anna Freud efetuou um certo número de crí
ticas específicas, formuladas em linguagem intransigente. Transmitiam elas
a opinião de que Klein encontrava-se seriamente em erro na sustentação
teórica de sua abordagem. Essas críticas podem ser consideradas sob diver
sos subtítulos: (i) a fase preparatória; (ii) a situação analítica modificada;
(iti) a transferência de crianças e (iv) o brincar e associação livre.
(a) A fase preparatória: Anna Freud começou apontando que a criança
não chega à análise por sua própria vontade, mas sim por causa de outros
família, escola —, que sofrem com os sintomas dela. A criança come
ça sem entendimento de para que serve a analise e o analista tem de enga-
jar-lhe o interesse, mostrando como, de uma forma ou de outra, ele pode
ser útil ao pequeno paciente como um aliado. Ela advogava uma "fase pre
paratória , destinada a vincular a criança ao analista em um apego emocio-
R.D.Hinshelwood / 39
de um brincar mais vigoroso (...) Pela resolução de alguma parte da
transferência negativa, obteremos então, tal como acontece com os adul
tos, um aumento da transferência positiva, e isto, em concordância com
a ambivalência da infância, logo, por sua vez, será sucedido pelo ree-
mergir da negativa. (Klein, 1927, p. 145-6)
Ela impiedosamente demonstrou a maneira inconsistente que Apna Freud
tinha de lidar com a transferência negativa.
Até onde posso entender do livro dela [Anna Freud] (...) ela tenta por
todos os meios ocasionar uma transferência positiva, a fim de atender
à condição, que considera necessária para seu trabalho, de criar um ape
go na criança à personalidade dela (...) [Mas] nós temos outra excelen
te e bem-testada arma, a qual empregamos de maneira análoga à que
utilizamos nas análises de adultos (...) Quero dizer que nós interpreta
mos. (Klein, 1927, p. 145-6).
R.D.Hinshehvood / 41
da interpretação permaneceu constante (ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO].
Greenson (1974) mostrou-se muito crítico da alegação feita pelos kíeinia-
nos (por exemplo, Rosenfeld, 1965) de que os esquizofrênicos podiam ser
analisados sem mudança na técnica clássica, quando, aparentemente, a téc
nica kleiniana havia abandonado por inteiro essa técnica. Isto se reflete
também nos trabalhos repetidamente críticos de Kernberg (1969, 1980, por
exemplo), que foram fulminantes também a respeito de interpretações que
são consideradas profundas, por haver perigo de que o paciente as experi
mente como intrusiva. Não é de surpreender, reivindicam eles, que os klei-
nianos encontrem com tanta freqüência ansiedade persecutória em seus pa
cientes: suas interpretações a provocam. Em resposta, Rosenfeld (1987) ten
tou distinguir, no material clinico, entre aquelas ocasiões em que o pacien
te é ferido por uma interpretação incorreta e as reações paranóides que
derivam de outras fontes. Enfatizou ele também o importante alívio quan
to a sentimentos paranóides que as interpretações "profundas" corretas po
dem fornecer.
A natureza do brincar. Por haver Anna Freud sido crítica do pressuposto klei-
niano da equivalência entre o brincar e a associação livre, Klein começou
a ter um interesse de longa duração pela natureza da simbolização. Cons
tantemente retornou à importância da externalização como simbolizadora
do conteúdo das fantasias ansiosas e como forma de voltar-se para novos
objetos [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. Em contraste, os analistas vie-
nenses, que apoiavam Anna Freud, encaravam o brincar como uma ativi
dade mais inocente, embora Waeíder (1933), seguindo Freud (1920), consi
derasse o brincar uma repetição, na qual uma situação ou incidente peno
so é constantemente re-representado, para fins de chegar-se a um acordo
com o trauma; a situação de ansiedade é controlada invertendo-se os pa
péis, de maneira a que o sujeito não seja mais passivo, mas tenha o papel
ativo. Anna Freud (1936), mais tarde, adotou a expressão "identificação
com o agressor" [ver também 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA] para
designar esse processo. Dessa maneira, brincar é mudar o final para um
desfecho agradável, ao invés de penoso. A diferença decisiva era que, pa
ra Klein, a externalização da fantasia é uma manobra defensiva, enquan
to que, na psicanálise clássica, a fantasia é utilizada para elaborar o trau
ma [ver DEFESA PSICOLÓGICA].
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R.D.Hinshehvood / 45
\ 2 ]
FANTASIA INCONSCIENTE
DEFINIÇÃO. As fantasias inconscientes estão subjacentes a todo processo men
tal e acompanham toda atividade mental. Elas são a representação mental
daqueles eventos somáticos no corpo que abrangem as pulsões, e são sen
sações físicas interpretadas como relacionamentos com objetos que causam
essas sensações. Irrompendo a partir de sua instigação biológica, as fanta
sias inconscientes são lentamente transformadas por duas maneiras: (i) pe
la mudança através do desenvolvimento dos órgãos para a percepção à
distância da realidade externa, e (ii) pelo surgimento no mundo simbólico
da cultura, a partir do mundo primário do corpo. As fantasias podem ser
elaboradas para alívio dos estados internos da mente, quer pela manipula
ção do corpo e suas sensações (fantasias masturbatórias), quer pelo fanta
siar direto. A fantasia é a expressão mental das noções pulsionais e tam
bém dos mecanismos de defesa contra essas noções pulsionais.
CRONOLOGIA
1920 Fantasia consciente e curiosidade sexual (Klein, Melanie, 1920, "The
development of a chiíd").
1921 Fantasias pre-genitais (Klein, Melanie, 1923, "The role of the school
in the libidinal development of the child").
1925 Fantasias de masturbação (Klein, Melanie, 1925, "A contribution to
the psychogenesis of tics").
1948 Pulsão e fantasia (Isaacs, Susan, 1948, "The nature and function of
phahtasy").
R.D.Himhetwood / 47
cientes, ainda que a expressão "fantasia inconsciente" pareça ser quase
uma contradição. Tais fantasias (distinguidas na literatura por serem grafa
das com ph e não com f*) tornam-se evidentes através de derivados de
um tipo ou de outro, tal como acontece com o próprio inconsciente. Ficam
conhecidas por inferência com base na evidência clínica.
R.D.Hinshelwood / 49
O crescendo de raiva e medo do bebê, à medida que sua fome permane
ce insatisfeita, deriva, naturalmente, de reações pulsionais, mas ele o expe-
riencia, à sua própria maneira, como sendo a ameaça crescente de um per
seguidor cada vez mais hostil, que com sucesso ataca-lhe a barriga e tor
na o sofrimento cada vez pior, Esta é uma situação temível, e os bebês pa
recem ter capacidade de sentir medo e raiva desde o começo. É esta cren
ça de haver, dentro de seu estômago, algo que está malevolentemente ten
tando prejudicá-lo e destruí-lo que constitui o conteúdo da raiva. Essas fan
tasias temíveis são o que mais se aproxima de uma manifestação direta
da pulsão de morte, experiendada como desviada para um objeto [ver
PULSÃO DE MORTE].
R.D.Hinshelwood. / 51
A teoria freudiana da sedução: A teoria da sedução foi uma tentativa de
colocar em forma fisiológica a anormalidade de uma neurose psicológica
(Freud, 1896). Um trauma de infância fazia um trauma físico separar-se
do circuito elétrico do cérebro, com a subseqüente criação dê tensões. A
substituição, por Freud, desta teoria por outra em que o trauma resulta-
va de um acontecimento imaginado (distorcido) introduziu a idéia de fanta
sia inconsciente. É a fantasia que a criança faz de uma sedução que consti
tui o trauma perturbador, não o acontecimento físico real em seu corpo.
(A idéia que Freud tinha de alguma interferência física com os circuitos elé
tricos do cérebro sobreviveu na psiquiatria geral sob a forma de tratamen
tos elétricos e outros tratamentos físicos, ainda que a psicanálise a tenha
hoje abandonado [Caper, 1988]).
Fantasia ou realidade: A recente controvérsia instigada por Masson (1984)
baseia-se na alegação de que Freud reaímente suprimiu sua teoria de uma
sedução física que conduzia a um trauma neurológico. A implicação é de
que o "acontecimento real" deveria ser resgatado do esquecimento. A natu
reza alternativa (ou/ou) do problema (ou sedução real ou fantasia), que
originaímente expressou o conflito entre fisiologia e psicologia, migrou pa
ra um conflito entre a realidade externa e o mundo interno (em verdade,
sociologia versus psicologia) [ver PROBLEMA MENTE-CORPO; SUBJETI
VIDADE], com a idéia de uma sutil interpenetração dos mundos externo
e interno.
R.D.Hinshelwood / 53
paranóide para a posição depressiva, à medida que o amor pelo objeto se
torna mais mobilizado. As observações foram contestadas sob fundamen
tos diversos: (i) que as proporções de momentos ansiosos versus momen
tos de contentamento estavam incorretas, e que, de vez que a maior por
ção de tempo nos primeiros meses é ocupada pela alimentação, as ocasiões
de contentamento sobrepujavam as ansiosas; (ii) que observações diretas
de estados de sentimento em bebês não podem ser corroboradas pela psica
nálise, método aplicável apenas a crianças muito mais velhas. A réplica
de ísaacs (desenvolvida plenamente na versão publicada de seu artigo,
em 1948) foi de que todo conhecimento científico era inferencial e que a
inferência fora um método suficientemente válido nas descrições que Freud
fizera do desenvolvimento das crianças. Apelou ela no sentido de que as
conclusões psicanalíticas podiam e precisavam ser testadas em cotejo com
a observação direta dos bebês.
Continuou a haver protunda dúvida a respeito do método pelo qual
os kleinianos adquirem suas teorias, com a suspeita de que o método de
interpretação profunda cria, por si, artifícios nas observações.
(2) Narcisismo primário. De acordo com os analistas ortodoxos, os primeiros
anos de vida são ocupados pela gratificação auto-erótica e narcísica, nas
quais qualquer objeto é simplesmente um instrumento para a satisfação
pulsional. Existe apenas "prazer sem significado". O amor objetai não apa
rece até õ terceiro ao quinto ano, e somente então podem existir fantasias
de relações com objetos: "A fantasia como corolário imaginário da pulsão
assume o lugar do corolário sensório (prazer/sofrimento)" (A. Freud,
1943), opinião que decorre, de maneira ortodoxa, da opinião do próprio
Freud de que as qualidades de sofrimento ou prazer eram tudo o que o be
bê pode apreciar, e não existe capacidade de imaginar as fontes que pro
porcionam sofrimento ou prazer. Barbara Lantos (1943), contestando as
descrições feitas por ísaacs de suas provas de fantasia inconsciente no pri
meiro ano de vida do bebê, disse:
O fato de ele [o bebê] poder reconhecer pessoas, de estar ciente de suas
idas e vindas, temeroso de sua perda e de reagir em conseqüência dis
so, acha-se ligado, em nossa opinião, ao desenvolvimento do aparelho
sensório e mental, sem sugerir a existência de fantasias.
A disputa, aqui, parece girar em torno da distinção entre o mero registro
perceptual e mnêmico de objetos, por um lado, e a capacidade de conce
ber atividades desejadas com eles ou por eles. O tema torna-se então um
debate sobre a época em que o bebê faz ligações entre essas imagens perce
bidas e relembradas e o reconhecimento emocional delas como fontes ama
das ou odiadas de prazer ou sofrimento.
íd
I
realmente mais sofisticados do que tanto Klein quanto seus críticos vienen-
ses alegavam. Lichtenberg (1983) e Stern (1985) começaram a fazer o levan
tamento desta literatura, em busca de suas implicações psicanalíticas.
R.D.Hinshelwood / 57
repetições posteriores [ver 9. MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA];
dessa maneira, a importância da regressão reside em incluir as configura
ções defensivas nos estágios iniciais a que a regressão se dá.
Glover mostrou-se inflexível em afirmar que ampliar o significado do
termo fantasia mais além das satisfações regressivas e alucinatórías torna
va redundantes os outros termos. Uma fantasia inconsciente continuada-
mente ativa, de um tipo primitivo, parecería pôr fim aos conceitos de pon
tos de fixação, de regressão da libido ou de regressão das relações objetais
desde formas posteriores para anteriores.
Fixação permanente: Por reivindicar a importância da fantasia inconscien
te em todos os estágios, desde o mais remoto, e enfatizar as fantasias ori
ginárias do estágio oral {incorporação, introjeção, etc.), argumentou-se, a
metapsícologia de Klein equivalia a uma fixação permanente nos primei
ros estágios. Acreditava-se que a ocorrência de fantasias ligadas a impul
sos orais, anais e genitais eliminaria a regressão compíetamente, de vez
que Klein havia se desfeito do conceito de progressão através dessas fases
[ver LIBIDO].
A utilização de fantasias contra outras fantasias — por exemplo, o de
senvolvimento de fantasias genitais como meio de lidar com o sadismo pré-
genital [ver DESENVOLVIMENTO] em verdade dispensa o modelo econô
mico da conservação qualitativa de energia [ver MODELO ECONÔMICO].
O enclave de G lover: Glover insistiu em que a idéia de fantasias conti-
nuadamente ativas, de tipo primitivo, no inconsciente, não era freudiana.
Conceptualizou isso como sendo um enclave de atividade mental primiti
va que continuava, por alguma maneira separada, no inconsciente. Enfati
zou a qualidade herética dessas idéias através do argumento de que se pre-
eminencia for dada a esse enclave primário, o complexo de Edipo é auto
maticamente rebaixado de sua posição psicanaíítica chave. Esta critica do
deslocamento do complexo de Édipo será tratada mais adiante [ver 4.
COMPLEXO DE EDIPO]. Nenhum outro analista apoiou esta crítica espe
cífica, e os kleinianos que responderam nos Debates sobre as Controvér
sias concederam pouco tempo a um debate sério com Glover, pondo de
lado suas críticas, de modo geral, como sendo a â hominem.
Entretanto, de maneira irônica, o tempo pode ter sido mais gentil com
Glover. A idéia de um enclave separado (escindido) retornou, e na literatu
ra kleiniana, A própria Klein veio a entreter a idéia de existir uma área
de objetos arcaicos extremamente primitiva (Klein, 1958) [ver 7. SUPERE-
GO], Mais tarde, Rosenfeld (1971), em suas investigações das manifesta
ções clínicas da pulsão de morte, descreveu uma espécie de "máfia" inter
na que não se acha integrada com o resto da personalidade. Este tipo de
estruturação da personalidade tornou-se um foco proeminente do pensa
mento kleiniano contemporâneo na Grã-Bretanha [ver ESTRUTURA].
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CRONOLOGIA
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1927 As primeiras origens do superego, da culpa e do remorso (Klein, Me
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1929 Situações infantis de ansiedade (Klein, Melanie, 1929, "Infantil an-
xiety-situations reflected in a work of art and in the Creative impulse").
1932 O sadismo como manifestação da pulsão de morte (Klein, Melanie,
1932, The psycho-analysis o f children).
R.D.Himhelwood / 61
1935 A posição depressiva (Klein, Melanie, 1935, “A contribution to the
psychogenesis o f manic-depressive States").
R.D.Hinshelwood / 65
volveu a opinião controversa de que era o impacto dos impulsos agressi
vos nesses estágios muito iniciais que determinava o curso do desenvolvi
mento ou a sua obstaculização [ver LIBIDO; DESENVOLVIMENTO],
Foi com base na evidência das fantasias pré-genitais que eía começou a
revisar a visão classica do complexo de Édipo e da origem do superego
[ver 4. COMPLEXO EDIPIANO; 7, SUPEREGO],
(4) A pulsao de morte. Mais tarde (a partir de 1932), Klein considerou a tota
lidade do primeiro ano de vida como sendo a época de sadismo máximo.
Essa ampliação de suas concepções deu-se em resultado da adoção por eía,
em 1932, da pulsão de morte como fonte primária dos impulsos agressivos
desde o início: "(•••) um desvio da pulsão de morte para fora influencia
as relações da criança com seus objetos e conduz ao desenvolvimento ple
no de seu sadismo" {Klein, 1932, p. 128), e:
(...) suas puísões destrutivas despertaram-lhe ansiedade já nos primei
ros meses de vida. Em conseqüência, suas fantasias sádicas ficaram liga
das à ansiedade, e este elo entre ambas dá origem a situações específi
cas de ansiedade (...) A satisfação libidinal, como expressão de Eros,
reforça sua crença em suas imagos dè auxílio e diminui os perigos que
o ameaçam do lado da sua pulsão de morte e de seu superego, (Klein
1932, p. 201) [ver PULSÃO DE MORTE],
A partir deste ponto, a visão kleiniana da mente e seu desenvolvimento
gira em torno do conflito inerente entre a pulsão de morte e a libido (pul-
sões de vida), e da maneira pela qual o mundo externo pode auxiliar no
desenvolvimento da consciência das realidades externas e internas.
Quando a pulsão de morte predomina, então a mistura (ou fusão) das puí
sões resulta em inveja, masoquismo ou outras formas de perversão, e vá
rios outros estados de agressão patológica. A saúde e o desenvolvimento
normal apóiam-se na dominância das pulsões de vida [ver PULSÃO DE
MORTE].
R.D.Hinshelwood / 67
Uma forma primária de inveja parecia representar uma das mais primiti
vas manifestações dos impulsos agressivos, e Klein achou que, no come
ço, o bebê era dotado de uma discrepância inata nas quantidades de pul-
são de vida e de morte, junto com outras falhas (nos esquizofrênicos), es
pecialmente a dificuldade em separar entre impulsos agressivos e libidinais
(e tolerância fraca da frustração, meio ambiente desfavorável ao desenvol
vimento, etc.).
R.D.Hinshelwooâ / 69
senvolvimento libidinal por parte do sadismo, que assinala os pontos de
fixação da libido.
Os problemas, portanto, permanecem. Para os kleinianos, a pulsão de
morte não é silente, mas ativa como importante fator que perturba e mo
difica grandemente a progressão natural do desenvolvimento libidinal atra
vés das fases iniciais, enquanto que os psicanalistas clássicos minimizam
a importância clínica da pulsão de morte e enfatizam o desenvolvimento
epigenético da libido e do ego [ver PSICOLOGIA DO EGO]. A que situa
ções criticamente decisivas na prática clínica levaria a decisão destas ques
tões é algo que ainda espera receber atenção séria.
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CRONOLOGIA
1920 O complexo de Édipo clássico em crianças (Klein, Melanie, 1920,
"The development of a child").
1928 Formas pré-genitais do complexo de Édipo e complexo de Édipo in
vertido (Klein, Melanie, 1928, "Early stages of the Oedipus complex").
1932 Desligamento do superego do complexo de Édipo (Klein, Melanie,
1932, The psycho-analysis o f children (Parte II); Klein, Melanie,
1933, "The early development of conscience in the child").
R.D.Hinshelwood / 71
1935 Complexo de Édipo e posição depressiva (Klein, Melanie, 1940, "Mour-
ning and its relation to manic-depressive States"; Klein, Melanie,
1945, "The Oedipus complex in the light of early anxieties").
R.D.Hinshelwooâ / 73
tuada pelo genitor do sexo oposto e outras indicações de tendências edipia-
nas incipientes" (Klein, 1926, p. 129). Impulsos pré~genitais ocorrem nas
reações das crianças aos pais e ao relacionamento sexual destes, e seus brin
quedos giram em tomo de idéias, fantasias e ansiedades ligadas à cena ori
ginária; na ignorância que a criança tem dos fatos, essas fantasias baseiam-
se em interpretações de suas próprias necessidades (orais ou anais) e a
cruel frustração delas:
De acordo com o estágio sádico-oral e sádico-anal que esteja atravessan
do, a relação sexual vem a significar para a criança um desempenho
em que comer, cozinhar, troca de fezes e atos sádicos de todo tipo (es
pantar, cortar, etc.) desempenham o papel principal. (Klein, 1927, p. 175)
Com esta massa de provas clínicas de fantasias pré-genitais, Klein viu-se
forçada à conclusão de que o complexo de Edipo surge antes da fase genital.
Dessa maneira, os pais estão sempre se alimentando mutuamente, incor-
porando-se um ao outro, despedaçando-se a mordidas, mexendo um den
tro do outro, controlando-se mutuamente, mas há também fantasias geni-
tais de penetrar, cortar, cuidar ou proteger um ao outro:
(...) a análise dos primeiros anos demonstrou que ela [a criança] desen
volve essas teorias muito mais cedo do que isso, em uma época em que
os impulsos pré-genitais ainda determinam predominantemente o qua
dro, mesmo que seus impulsos genitais ainda ocultos tenham voz no
assunto. Essas teorias são no sentido de que, na cópula, a mãe está con
tinuamente incorporando o pênis do pai por via da boca, de maneira
que o corpo dela acha-se repleto de um grande número de pênis e be
bês. Todos estes a criança deseja comer e destruir. Ao atacar o interior
da mãe, portanto, ela está atacando um grande número de objetos.
(Klein, 1933, p. 254)
(4) Complexo de Édipo invertido. Por estar Klein analisando crianças muito
pequenas, encontrava-se ela em posição particularmente boa para demons
trar que o complexo de Édipo não é simplesmente um amor pelo genitor
do sexo oposto e um ódio pelo genitor rival do mesmo sexo. Em verdade,
ela descobriu sentimentos muito misturados e, portanto, veio a enfatizar
o complexo de Édipo invertido, no qual menininhas tanto amam quanto
se identificam com a mãe, e os meninos amam o pai e com ele se identifi
cam, à exclusão do genitor do sexo oposto. Isto se acha de acordo com a
visão que Freud tinha da bissexualidade inerente. As oscilações entre com
plexo edipiano positivo e complexo edipiano invertido tornaram-se de im
portância crescente e acabaram por contribuir para o desenvolvimento,
por parte de Klein, do conceito da posição depressiva (ver 10. POSIÇÃO
DEPRESSIVA].'
R.D.Hinshelwood / 75
ela, do conceito de Freud da pulsão de morte em seu entendimento de
suas provas clínicas; isto conduziu ao conceito da posição depressiva.
(3) Perda do objeto amado. Freud pensava que os país edipianos tinham de
acabar por serem abandonados, e que essa perda era alcançada de modo
semelhante às outras perdas, tal como descrevera em 1917: por uma intro-
jeção do objeto. Em 1923, definira o objeto interno que resultava como
superego. Por volta do fim da década de 1920, contudo, quando Klein já
se instalara no arcabouço apoiador da Sociedade Psicanahtica Britanica,
ela ficou mais livre para permitir que suas próprias deduções teóricas se
guissem avante.
Os objetos internos resultantes dos pais edipianos tornaram-se, para
Klein, as figuras psicológicas importantes, mais importantes que as exter
nas, das quais, naturalmente, as internas apesar disso derivam. Acredita
va que as oscilações entre os complexos de Edipo positivo e negativo no
curso do desenvolvimento infantil resultavam em objetos internos amados
e objetos internos odiados. Uma confluência acaba por se desenvolver en
tre as figuras amadas e as odiadas, resultando em um objeto interno (geni
tor) que é tanto amado quanto odiado, Esta confluência do amor com ata
ques sádicos dá origem a uma constelação especial de afetos, atitudes, rela
ções objetais, ansiedades e defesas, à qual Klein deu o nome de posição
depressiva [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA].
R.D.Hinshelwood / 77
o complexo edipiano positivo (querer o amor do genitor do sexo oposto
contra a rivalidade com o genitor do mesmo sexo) e o complexo de Édi-
po invertido (amar o genitor do mesmo sexo e com ele identificar-se, vol
tando-se a oposição no sentido do genitor do sexo oposto). Dessa manei
ra, existe alguma correspondência entre a reunião dos pais na situação edi-
piana e a reunião do objeto parcial "bom” com o "mau":
Cada objeto, portanto, está por sua vez sujeito a tornar-se às vezes bom
e, às vezes, mau. Este movimento para lá e para cá entre vários aspec
tos das imagos primárias [figuras parentais] implica uma interação estrei
ta entre os primeiros estágios do complexo de Édipo invertido e positi
vo. (Klein, 1945, p. 409) [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA]
R.D.Hinsketwood / 79
rosos pré-genitais; a igualação do pênis com o seio ou com as fezes, e a
igualação do coito à incorporação oral. Todos estes componentes acabam
por influenciar o complexo de Édipo quando a fase genital vem a ser atin
gida, e pareceriam, na realidade, pesar contra o argumento de Fenichel e
em favor da importância dos primeiríssimos estágios do complexo de Édipo.
isto se contrapõe à visão kleíniana de estados emocionais contrastantes
(o ciúme e o amor, por exemplo), que considerariam a separação como
uma não-intçgração secundária (uma cisão dos objetos e do relacionamen
to) mais do que primária, antes de o ego começar a funcionar como for
ça integradora. Os analistas freudianos clássicos consideravam as fantasias
pré-genitais da relação sexual dos genitores e a situação edipiana como sur
gindo retrospectivamente, a partir de uma elaboração posterior, na fase
genital, do casal edipiano, em termos de impulsos pré-edipianos que eram
externados através da regressão. A reivindicação kleiniana de que impul
sos de todas as fases (oral, anal, genital) tendiam a coincidir parecia abo
lir o fenômeno psicanalítico da regressão.
A reação kleniana foi enfatizar o princípio da continuidade genética
[ver CONTINUIDADE GENÉTICA]; os fenômenos no estado adulto, ou
mesmo na infancia, decorrem inevitavelmente de algo anterior, argumen
to que foi utilizado, na mesma época, a respeito do superego arcaico, E a
regressão tem de ser regressão de volta a alguma coisa, o que equivale a
dizer que as fantasias arcaicas, orais ou anais, de relação sexual dos pais
têm de ter existido, para que se possa a elas regredir. A disputa entre re
gressão à atividade de fantasia de um estágio inicial e elaboração retrospec
tiva de impulsos anteriores é difícil de ser decidida com base em provas
clínicas e, tal como acontece com tantas disputas, esta tendeu a sair de dis
cussão antes de ter-se chegado à sua resolução.
Os embates, a estima ferida e as posições assumidas dos Debates sobre
as Controvérsias de 1943 ilustraram as dificuldades de buscar-se uma atitu
de inteiramente científica em relação a tais tópicos [ver DEBATES SOBRE
AS CONTROVÉRSIAS]. A temperatura subiu especialmente a respeito
do conceito-chave do complexo de Édipo, por ele ser central à teoria clás
sica de Freud na ocasião. A acusação de Klein (1927) de que Anna Freud
não interpretara o complexo de Édipo (ver 1. TÉCNICA] ocasionou arrou
bos lancinantes e amargor, expressos de modo sofrido e cuidadoso em cor
respondência trocada entre o próprio Freud e Ernest Jones, respectivos pa
tronos das mulheres em disputa (Steiner, 1985) [ver 1. TÉCNICA].
O desenvolvimento da teoria kleiniana do complexo de Édipo, contu
do, afastou-a da idéia çlássica dos pais "reais" para um mundo de fantasia
de objetos parciais na posição esquizoparanóide. Na prática, no consultó
rio, são o casamento e a devoção do analista à psicanálise, ou a reunião
dos pensamentos do analista, ou de partes de sua mente, os casais decisi
vos a que o paciente psicanalítico responde. Para alguns (os analistas clás
sicos), a teoria é hoje irreconhecível; para os kleinianos, é a continuidade
R.D.Hinshelwood / 81
5
OBJETOS INTERNOS
DEFINIÇÃO, Este termo denota a experiência ou fantasia inconsciente de um
objeto concreto fisicamente localizado no interior do ego (corpo), que pos
sui seus próprios motivos e intenções para com o ego e outros objetos. Ele
existe dentro do ego, em maior ou menor grau de identificação com este
(uma fantasia de absorção ou assimilação pelo ego). A experiência do obje
to interno é profundamente dependente da experiência que se tem do obje
to externo, e os objetos internos são, por assim dizer, espelhos da realida
de. Eles também contribuem de modo significativo, porém, através da pro
jeção, para a maneira pela qual os objetos externos são, eles próprios, per
cebidos e experienciados.
CRONOLOGIA
1927 Expulsão como meio de administrar o mundo interno (Melanie Klein,
1927, “Criminal tendencies in normal children").
Objetos internos múltiplos (imagos que constroem o superego (Klein,
Melanie, 1929a, “Personification in the play of children").
1935 Perda do objeto interno bom (Klein, Melanie, 1935, "A contribution
to the psychogenesis of manic-depressive States").
1946 Cisão de objetos e do self (Klein, Melanie, 1946, "Notes on some schi-
zoid mechanisms"),
(1) O objeto introjetado. Em sua análise de Rita, em 1923, Klein deu-se con
ta da importância de um objeto introjetado que veio a aterrorizar a crian
ça. Essa compreensão proveio da elucidação da fantasia envolvida em ri
tuais da hora de dormir: o "temor de que um camundongo ou um amigui-
nho* entrassem pela janela e lhe cortassem o seu amiguinho* (órgão geni-
tal) a dentadas" (Klein, 1926, p. 132). Este temor do objeto interno perse
guidor constituía uma proibição violenta, mas não emanava "(...) da mãe
real, e sim de uma mãe introjetada" (Klein, 1926, p. 132). Klein descobriu
que parte do ritual da hora de dormir envolvia a colocação de um elefan
te, representando o pai, ao lado da cama:
O elefante (a imago paterna) destinava-se a assumir o papel do pertur
bador, papel que o pai introjetado desempenhara dentro dela desde o
tempo em que [quinze meses de idade] quisera usurpar o lugar da mãe
junto ao pai, roubar da mãe a criança com que estava grávida, e ferir
e castrar os pais. (Klein, 1926, p. 132).
R.D.Hinshelwood / 83
a fim de transmitir a qualidade de um mundo inteiro de fantasia em que
a criança se acha envolvida.
Já em 1923 estivera absorvida no estudo da maneira pela qual as crian
ças se preocupavam com os interiores dos corpos, os próprios e o da mãe:
A menininha tem um desejo sádico, a originar-se nas etapas iniciais do
conflito edipiano, de despojar o corpo da mãe de seus conteúdos, a sa
ber, o pênis do pai, fezes, crianças, e destruir a mãe, ela própria. Este
desejo dá origem à ansiedade de que a mãe, por sua vez, despeje a pró
pria menininha dos conteúdos de seu corpo (especialmente das crian
ças) e de que este seja destruído ou mutilado. (Klein, 1929b, p. 217).
A criança tem assim uma concepção de objetos dentro de seu próprio cor
po, retratados, diz Klein aqui, como sendo seus próprios filhos. Não se tra
ta apenas de meninas; a respeito do rapazinho, diz ela:
Contudo, não é apenas seu pênis que ele sente dever preservar, mas tam
bém os conteúdos bons de seu corpo, as boas fezes e a boa urina, os
bebês que deseja desenvolver na posição feminina e os bebês que —
em identificação com o pai bom e criativo — deseja produzir, na posi
ção masculina. (Klein, 1945, p. 412)
Por esta atenção concedida ao interior da mãe, Klein denominou este está
gio de fase da feminilidade [ver ó. FASE DA FEMINILIDADE]. Ela via as
crianças como tendo um interesse absorvente, desde muito cedo, pelos
seus próprios interiores, os quais sentiam conterem objetos bons e enrique-
cedores e os quais sentiam estarem ameaçados e, com freqüência, danifica
dos pelo ataque por parte de objetos maus, quer de dentro de si mesmos,
quer do exterior.
"As figuras de ajuda assim inventadas são, a maior parte delas, do tipo
extremamente fantasioso" (Klein, 1929a, p. 203). Embora as primeiras im
pressões que Klein havia obtido da análise infantil fossem de lutas assusta
doras com perseguidores horríficos, versões distorcidas dos pais, ela ago
ra "(...) viera a dar-se conta de que o funcionamento de tais imagos, com
características fantasiosamente boas e fantasiosamente más, é um mecanis
mo geral nos adultos, assim como nas crianças" (Klein, 1929a, p. 203).
Neste estágio, Klein pensou que as figuras de ajuda eram conjuradas co
mo defesa contra os perseguidores, e continuou, pela elaboração dessas
imagos, a apontar os problem as que decorrem de uma "(...) influência ex
cessivamente forte exercida por esses tipos extrem ados de imagos, a inten
sidade da necessidade de figuras bondosas, em oposição às ameaçadoras,
a rapidez com que aliados transformam-se em inimigos" (Klein, 1929a, p.
204). Esta visão de "imagos" muito variadas acha-se em nítido contraste
com as relações muito limitadas que Freud descreveu existirem entre o su
perego e o ego e o id. Mais tarde, Klein veio a descrever essas figuras de
ajuda como objetos "bons", especialmente o objeto interno bom.
O bjetos internos múltiplos: A compreensão dos dois lados do superego
— o severo e o de ajuda —, expressos como objetos diferentes, e, depois,
dos objetos dos diferentes níveis libidinais (oral, anal e genital) conduziu
a uma visão do mundo interno como povoado por grande número de obje
tos variados, derivados do meio ambiente e das histórias reais do bebê.
Por lealdade a Freud, Klein escreveu: "(...) o superego como um todo é
constituído pelas várias identificações adotadas nos diferentes níveis [fa
ses] do desenvolvimento" (Klein, 1929a, p. 204), e, a fim de fazer suas pró
prias observações conformarem-se à visão de Freud de um amálgama mo
nolítico de pai e mãe, internamente, descreveu um processo de "(...) sinte
tizar as identificações em um superego integral". Entretanto, com o correr
do tempo, o pensamento kleiniano veio a aceitar que o mundo interno é
R.D.Hinshelwood / 85
uma arena cheia de objetos variados, em diversos graus de síntese e separa
ção, em contextos diferentes e em épocas diferentes.
R.D.Himhelwooá / 87
OS OBJETOS INTERNOS E O CORPO. O uso que Klein faz do termo “ob
jeto Ínterno“ refere-se principalmente a esta experiência muito primitiva
dos objetos internos como concretamente reais. Schilder e Wechsler (1935),
em um estudo empírico piloto, conseguiram extrair de crianças o que elas
pensavam que havia dentro de seus corpos e demonstraram uma espanto
sa variedade de objetos concretamente imaginados. No caso clínico de
Schmideberg (1934), os sintomas corporais derivavam de causas psicológi
cas (sintomas de conversão e hipocondria): “(...) os sintomas de conversão
e a ansiedade dela eram em grande parte determinados por sua ansiedade
do objeto incorporado. Ela sentia que o objeto perigoso dentro dela acha
va-se em oposição a seu ego“ (p. 263), e, à medida que a condição da pa
ciente melhorou, “(...) o contraste entre o objeto incorporado e o ego tor
nou-se menos poderoso e ela se identificou com o objeto dentro de si" (p, 263).
Este modo de experienciar objetos internos é conduzido através de to
do o desenvolvimento e no decorrer da vida; entretanto, a ele se sobrepõe
um conjunto progressivo de modos adicionais de experienciar. A experiên
cia do corpo, com o desenvolvimento dos receptores de distância, assume
as possibilidades de uma apreciação mais objetiva. Isso resulta no que é
então chamado de “representações" na mente de objetos internos e exter
nos. As representações são, portanto, uma capacidade evolutivamente avan
çada do bebê. Mais tarde, surge a substituição do objeto primário por ou
tros objetos, e isto é o desenvolvimento da formação de símbolos. Este
progresso passo a passo na experiência de objetos foi esboçado por
Money^Kyrle (1968), que nele distinguiu três estágios: (i) a crença concre
ta em um objeto fisicamente presente; (ii) a representação de um objeto
na mente e na memória, e (iii) uma representação simbólica em palavras
ou outros símbolos [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. A passagem da
experiência concreta de objetos para uma modalidade mais representacio-
nal complementa as concepções de Piaget (1954; ver também Matthews,
1980) e se acha ligada ao fenômeno que Bion chamou de função-alfa [ver
PENSAR; FUNÇÃO-ALFA].
R.D.Hinshelwooá / 89
quais o seio da mãe é o protótipo" (Klein, 1935, p. 262). A introjeção de
objetos não mais deveria ser entendida como ocasionada pela perda de
um objeto amado, nem, tampouco, como dependente da resolução do con
flito edipiano. A introjeção e a consecução de um objeto "bom" dentro
do ego é uma defesa contra a pulsão de morte. As terríficantes imagos, contudo,
(...) são um retrato fantasiosamente distorcido dos objetos reais [genito
res externos] em que se baseiam, [elas] se instalam não apenas no mun
do externo, mas também através do processo de incorporação, dentro
do ego (...) Muito cedo também o ego tenta defender-se contra os perse
guidores internalizados pelos processos de expulsão e projeção. (Klein,
1935, p. 262).
Narcisismo: Parte dos resultados obtidos pelo Grupo dos Objetos Internos
foi uma nova visão do narcisismo, que Heimann (1952) elaborou a partir
da idéia, previamente sugerida por Schmideberg (1931) e Riviere (1936),
de que o narcisismo representava a retirada da libido do objeto externo
para um objeto interno identificado com o ego [ver NARCISISMO], e não
simplesmente para o próprio ego.
De fato, em um anterior artigo formativo, Klein (1925) analisara dois
meninos com tiques nervosos, dos quais até então se pensara
(...) como sendo um sintoma narcísico primário (...) A experiência me
convenceu de que o tique não é acessível à influência terapêutica enquan
to a análise não teve êxito em revelar as relações objetais nas quais se
baseia. (Klein, 1925, p. 121)
O tique não é apenas uma satisfação auto-erótica como a masturbação,
mas "(...) fantasias masturbatórias acham-se também ligadas a ele" (Klein,
1925, p. 124), e postulou Klein que essas fantasias masturbatórias consis
R.D.Himhelwood / 91
OS OBJETOS NA POSIÇÃO DEPRESSIVA. Alcançar a posição depressiva
é, dessa maneira, mais do que conquistar maior capacidade perceptual.
Envolve uma intensa situação emocional, preocupada com os objetos par
ciais em ocionais, e dá origem a uma mudança e uma agitação emocionais
especiais, ou seja, à posição depressiva.
A mudança no objeto: A descrição inicial que Klein deu da posição depres
siva repousava na distinção existente entre objetos parciais e objetos totais:
(...) a perda do objeto amado se dá durante aquela fase do desenvolvi
mento em que o ego efetua a transição da incorporação parcial para a
incorporação total do objeto (...) os processos que subseqüentemente
se tornam claros, como "'perda do objeto amado", são determinados
pelo senso de fracasso que o sujeito experiencia (durante o desmame e
nos períodos que o precedem ou seguem) em garantir seu objeto "bom
e internalizado" (...) Uma das razões para o seu fracasso é ter sido inca
paz de superar seu pavor paranóide de perseguidores internalizados.
(Klein, p. 267)
R.D.Hinshehoooâ / 93
mente com a tristeza e a dor o seu pavor arcaico de ser roubada por
uma mãe "má" e retaliadora é reativo e confirmado. (Klein, 1940, p.
353) [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA].
R.D.Hinshehoood / 95
Sandler e Joffe (1969), explorando a distinção entre "ego" e "representa
ção do self" feita por Hartmann (1950) e Jacobson (1954) [ver PSICOLO
GIA DO EGO], desenvolveram o conceito de mundo representacional (San
dler e Rosenblait, 1962) em um modelo para mapear outros arcabouços
conceptuais no arcabouço psicanalítico clássico. Ultimamente, Sandler
(1989) vem usando este modelo para entender a expressão "objeto inter
no", a qual, propôs ele, deveria representar a construção teórica, por par
te do analista, de uma estrutura subjacente no paciente (antes que denotar
um aspecto da experiência deste último).
O conceito de "objeto interno" partilha, com o de "fantasia inconscien
te", o papel dos mais originais e inovativos aspectos do trabalho de Klein,
e ambos aprofundam a visão que Freud tinha do inconsciente. O concei
to de "objeto interno" permanece sendo uma força poderosa para entender
os distúrbios mentais mais graves, constituindo uma arma igualmente po
derosa para os mal-entendidos mais graves existentes entre a escola kleinia-
na e outras escolas psicanalíticas.
Temos hoje uma situação em que o caráter misterioso dos "objetos in
ternos", que tanto preocupava os analistas nas décadas de 1930 e 1940,
foi eclipsado (não solucionado) nas de 1970 e 1980 pelos mistérios da "i-
dentificação projetiva". Talvez fosse mais útil, ao tentar-se avaliar os méri
tos relativos da escola kleiniana e da psicologia do ego, que a distinção
entre objetos internos e representações fosse tornada foco de atenção, ao
invés das disputas mais usualmente teóricas que se dão a respeito da eficá
cia do conceito de "identificação projetiva".
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CRONOLOGIA
1928 Ansiedade ligada a ataques ao corpo da mãe (Klein, Melanie, 1928,
"Early stages of the Oedipus confíict'" Klein, Melanie, 1932, The
Psycho-Analysis o f Children).
1945 Fase feminina e posição depressiva (Klein, Melanie, 1945, 'The Oedi
pus complex in the light of early anxieties").
R.DMinshelwood / 99
plícitas em suas observações. Ela tinha de ser incaracteristicamente reticen
te, mas havia uma contribuição que podia fazer, uma contribuição ao inte
resse contemporâneo na psicologia feminina.
(2) Objetos novos. O resultado da agressão para com a mãe é que a criança
se volta para o pai com uma atitude feminina: a fase da feminilidade. A
princípio, Klein pensou que esta era impelida por uma afronta real feita à
criança pela mãe, qual seja, o desmame. "Encaro a privação do seio co
mo a causa mais fundamental do voltar-se para o pai" (Klein, 1928, p.
193). Mais tarde, contudo, achou que esta surgia da ambivalência ineren
te com relação a objetos.
Voltar-se para novos objetos é o começo de um dos mais importantes
passos evolutivos: a capacidade de substituir objetos primários de interes
se por símbolos [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. O ímpeto de explo
rar objetos novos e a de alargar o mundo do bebê resulta de lesões, da
perda, e das fantasias temerosas que as acompanham. Os símbolos têm a
qualidade, portanto, de servir de defesa contra as ansiedades da agressão
arcaica e fazem parte da elaboração da posição depressiva [ver 10. POSI
ÇÃO DEPRESSIVA].
R.D.Hínshelwood / 101
Horney lançara um desafio e acompanhou esse ato por dissociações cada
vez mais estridentes quanto à visão psicanalítica, dominada pelos homens,
a respeito das mulheres (Horney, 1926). Freud (1925, 1931) e Jones (1927)
tentaram manter-se à altura, mas o ritmo foi dado por analistas femininas
(Lampl de Groot, 1928; Riviere, 1929; Deutsch, 1930; Klein, 1932; Horney,
1932, 1933).
Em 1930, Deutsch pronunciou uma série de palestras sobre O desenvol
vimento psíquico das mulheres no Instituto Psicanalítico de Viena, e Hor
ney (1933), crescendo de modo mais provocativamente independente, anun
ciou sua concordância com a descoberta kleiniana da furiosa e retaliatória
relação com o interior da mãe. Riviere (1934) aproveitou a oportunidade
que lhe foi oferecida pela publicação das N ovas conferências introdutórias
de Freud para criticar a opinião deste a respeito da psicologia feminina,
no meio de uma resenha sob outros aspectos laudatória. Jones (1935) pas
sou em revista a "nova compreensão" da psicologia das mulheres em uma
conferência que pronunciou na Sociedade Psicanalítica de Viena. Ela foi
a primeira de uma série de Conferências de Intercâmbio entre Londres e
Viena, organizadas por causa das divergências teóricas existentes entre os
dois principais centros da psicanálise na época. E significativo que Jones,
ao confrontar as diferenças crescentes e ameaçar com o divórcio, tenha to
mado a sexualidade feminina como tema central. Estava se atrevendo a le
var a Viena uma das mais importantes divergências quanto às concepções
de Freud que permaneciam internas ao mundo psicanalítico [ver DEBATES
SOBRE AS CONTROVÉRSIAS].
R.D.Hinshehoood / 103
Os sentimentos da menininha equivalem a um desejo de entrar, despojar
e destruir a barriga da mãe e sua criatividade, e o relacionamento que lá
existe com o pênis do pai. Esta fantasia primitiva, misteriosa e inconscien
te, é então igualada pelo temor de que a mãe e os danificados e irados res
tos de suas entranhas, de seus filhos e do pênis do pai voltem-se contra ela
para destruir o seu próprio corpo e os seus próprios filhos, através, exata
mente, do mesmo tipo de ataque. A menininha teme a mãe como repleta
de objetos danificados e, agora, hostis; ao mesmo tempo, sente a perda
da mãe como grande amor e protetora.
São as fantasias da garotinha, de destruição mútua das entranhas uma
da outra que criam um relacionamento intensamente problemático com a
mãe. Ele resulta em uma necessidade, semelhante à do menino, de manter
amnésia durante este período de desenvolvimento da infância e coloca
em movimento uma prolongada elaboração de sentimentos hostis para com
a mãe e os pais unidos. Lança as sementes para as ansiedades da mulher
adulta a respeito de sua atração física, ou falta dela, e das devastações
do processo de envelhecimento.
Os suportes da inveja do pênis; Essas ansiedades terrificantes acham-se sub
jacentes à crença em um corpo danificado que acaba por se expressar co
mo o problema clássico da inveja do pênis. A menina padece do temor
de existir algo errado com o seu corpo (simbolizado pelo pequeno órgão
genital externo), o qual se manifestará nos medos, durante a gravidez, de
dar à luz bebês deformados; todos esses medos combinam com as deformi
dades causadas aos bebês e ao pênis que a menininha atacou em fantasia
dentro da mãe.
R.D.Hinshelwood / 105
ambivalência inerente. Dessa maneira, a dor e o sofrimento da posição de
pressiva também se acham envolvidos aqui.
Estas ansiedades [ver ANSIEDADE DEPRESSIVA], experimentadas nos
"prinadros estágios do complexo de Édipo", são forças poderosas para a
promoção do desenvolvimento, assim como para causar dificuldades e a
parada do crescimento (fixações):
A gratificação experienciada ao seio da mãe capacita o bebê a voltar
seus desejos na direção de novos objetos, primeiro de tudo no sentido
do pênis do pai. Um ímpeto específico, contudo, é dado ao novo dese
jo pela frustração na relação como seio. (Klein, 1945, p. 408)
A relação com o seio é dupla. Tanto o aspecto positivo dela como instiga
ção a desenvolver novas experiências e relacionamentos, quanto os aspec
tos negativos podem acentuar (os últimos, provavelmente, de modo prema
turo e ansioso) um passo evolutivo à frente [ver DESENVOLVIMENTO].
Esta atitude dupla (ambivalente) acaba por ser transferida para o pênis:
A frustração e a gratificação, desde o início, moldam a relação do be
bê com um seio bom e amado e um seio mau e odiado. A necessidade
de lidar com a frustração e com a agressão que se lhe seguem é um dos
fatores que levam a idealizar o seio bom e a mãe boa e, correspondente
mente, a intensificar o ódio e os temores do seio mau e da mãe má,
que se torna o protótipo de todos os objetos perseguidores e assustado
res. As duas atitudes conflitantes para com o seio da mãe são transferi
das para a nova relação com o pênis do pai. A frustração sofrida na re
lação anterior aumenta as exigências e as esperanças em relação à no
va fonte e estimula o amor pelo novo objeto. (Klein, 1945, p. 408)
As duas atitudes conflitantes para com a mãe — com o terceiro objeto (o
pai) — são integradas à complexidade dos complexos edipianos coexisten-
tes, positivo e invertido [ver 4. COMPLEXO DE ÉDIPO].
R.D.Hinshelwood / 107
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CRONOLOGIA
1926 Culpa inconsciente e o superego severo (Klein, Melanie, 1927, "Cri
minal tendencies in normal children").
1929 Objetos internos múltiplos.
1932 O superego e a pulsão de morte (Klein, Melanie, 1932, "Early stages
of the Oedipus conflict and of superego formation".
(Capitulo 8 de The psycho-analysis o f children)', Klein, Melanie,
1933, "The early development of conscience in the child").
1935 Culpa e a posição depressiva (Klein, Melanie, 1935, "A contribution
to the psychogenesis of manic-depressive States").
esde o inicio de seu trabalho, até 1932, Klein esforçou-se por enten
D der a experiência do remorso e da culpa em seus pacientes infantis, e,
a partir de 1923, quando Freud produziu a sua própria teoria do supere
go como sendo a fonte da culpa, não apenas teve de esforçar-se para enten
der seus pacientes, mas também descobriu-se em oposição às opiniões orto
doxas. Ela constantemente tentou incluir as suas descobertas dentro do* ar
cabouço teórico "correto" do superego, mas cada vez com menos sucesso,
R.D.firísiiríiraM / 109
à medida que o tempo passava. Acabou por romper com a visão ortodo
xa em 1932, quando adotou o superego como sendo a manifestação da
pulsão de morte, visão que permanece, hoje tal como então, oposta à psi
canálise clássica. Entretanto, a importância do conceito de superego vem
diminuindo no pensamento kleiniano desde 1935, quando o conceito da
posição depressiva surgiu e tornou-se a sua teoria de culpa em plena escala.
O problem a: O problema principal era que Klein, desde o começo de seu
trabalho, em 1918, descobrira intensos sentimentos de remorso em crian
ças, algumas delas contando apenas dois anos e poucos meses. Cinco anos
depois, porém, em 1923, Freud descreveu a culpa como se originando do
superego, que se forma após o complexo de Édipo na posição genital, con
cedendo ao superego uma data no desenvolvimento, por volta de quatro
a cinco anos. As opiniões de Klein vieram a divergir disso por três manei
ras principais: (i) as formas arcaicas; (ii) constituintes múltiplos, e (iii)
uma história evolutiva específica do superego, de severo para mais suave.
A teoria freudiana da culpa e do superego. Até esse ponto, Freud não tivera
conhecimento de Klein ou de suas provas de remorso arcaico. Ela deve ter
ficado ao mesmo tempo emocionada e desalentada pela nova teoria dele;
emocionada porque concedia a seu próprio trabalho importância e um ar
cabouço teorico, alem de permitir-lhe fornecer provas clínicas àquele gran
de homem, mas desalentada porque a teoria declarava categoricamente
que a instância moral interna, o superego, se formava por volta da idade
de quatro ou cinco anos. Freud confirmou a importância de suas próprias
concepções no ano seguinte, em seu artigo a respeito da dissolução do com
plexo de Édipo (Freud, 1924b). O molde acl)ava-se então criado para uma
nova ortodoxia em psicanálise, a qual persistiu até os dias de hoje.
R.D.Hinshelwood / 111
mos que o complexo de Édipo atinja seu auge por volta do quarto ano
de vida e reconhecermos o desenvolvimento do superego como resulta
do final do complexo não me parece contradizer essas observações de
maneira alguma. (Klein, 1926, p. 133)
Ela sustentou até 1932 não existir discordância real dela com Freud, opi
nião ardentemente contestada por Anna Freud no inflamado debate (1926-7)
entre as duas mulheres [ver ANNA FREUD; ANÁLISE DE CRIANÇAS*
1. TÉCNICA].
A despeito de suas negativas, Klein alterou de modo significativo a teo
ria de Freud, e também para ela contribuiu:
Estes fenômenos definidos e típicos, cuja existência na forma mais clara
mente desenvolvida podemos reconhecer quando o complexo de Édipo
alcançou o seu auge e que precedem o seu declínio, são meramente o
término de uma evolução que ocupa anos. A análise de crianças muito
pequenas mostra que, assim que surge o complexo de Édipo, elas come
çam a elaborá-lo e, por esse meio, a desenvolver o superego. (Klein,
1926, p. 133)
Ao que ela estava se referindo aqui era que o superego plenamente desen
volvido é tudo aquilo que é corretamente reconhecido a partir da distância
das análises de adultos, mas também que, do ponto de vista privilegiado
da análise de crianças, o processo arcaico de formação do superego podia
ser descrito com pormenores muito mais precisos. De fato, antes da nova
teoria estrutural de Freud, tinha havido sugestões da existência de instân
cias “morais" arcaicas dentro da mente: Abraham (1924) descrevera a ini
bição interna da voracidade oral e Ferenczi (1925) introduzira a idéia de
uma "moralidade esfincteriana" que derivava da fase anal.
A poio por parte da Sociedade Britânica.* Inconvenientemente, Abraham
faleceu em 1925 e a Sociedade Psicanalítica de Berlim teve de escolher en
tre endossar as concepções dessa desafiadora mas ainda insignificante no
va analista ou rejeitá-la e a seu trabalho não testado com crianças. Ela já
apresentara trabalhos desafiadores e impopulares, tais como, por exemplo,
o seu artigo sobre os tiques nervosos (Klein, 1925) [ver 2. FANTASIA IN
CONSCIENTE]. A Sociedade de Berlim não lhe concedeu o reconhecimen
to e o apoio imediatos que ela desejava e precisava, de maneira que ficou
vulnerável às propostas provindas da Grã-Bretanha. Decidira-se a analisar
as formas arcaicas da vida mental e da ansiedade e, com a finalidade de
proporcionar-se lugar para fazer isso sem ser importunada, mudou-se pa
ra Londres (1926), onde lhe foi concedido considerável apoio para suas
descobertas (Jones, 1926, 1927; Isaacs, 1929).
Não está claro por que Ernest Jones, alguém de alta posição no mundo
psicanalítico internacional, tenha feito essas propostas a uma "arrivista"
pouco conhecida. Pode ter sido o desejo sub-reptício dele de tentar arran
(1) A origem do superego. Embora Klein aceitasse a descrição que Freud de
ra do superego, ela não concordava com sua origem somente no quarto
ou quinto ano de vida; suas provas daras dos sentimentos arcaicos de cul
pa apresentavam as origens do superego como sendo no segundo ano de
vida, no máximo. Quais eram essas provas?
(a) A prova direta: A análise de crianças pequenas, com menos de quatro
a cinco anos, mostrava provas diretas de remorso e culpa.
(b) A prova dos sintomas continuados: As fantasias subjacentes envolvi
das em sintomas podem ser imaginadas como operando na ocasião eirt
que os sintomas começaram; por exemplo:
R.D.Hinshelwood / 113
f
O caso de Rita claramente mostrava que o pavor noctum us que apare
cera à idade de dezoito meses de idade era uma elaboração neurótica
de seu complexo de Édipo (...) [e se achava] muito intimamente vincula
da a fortes sentimentos de culpa que surgiam desse conflito edipiano
arcaico. (Klein, 1932, p. 4)
Schmideberg expressa claramente a lógica disso:
Presumo que os determinantes para os sintomas que encontrei aos três
anos de idade tenham estado continuadamente em operação desde a
ocasião em que os sintomas pela primeira vez ocorreram. Isto não é sus
cetível de prova, mas a mesma presunção foi assumida por Freud quan
do utilizou os fatores revelados na análise de adultos para explicar sinto
mas que haviam ocorrido na infância. (Schmideberg, 1934, p, 257-8)
(c) A severidade do superego da criança: Algo para que Klein continuada
mente apontava era a qualidade da culpa, que sugeria um superego extre
mamente severo, muito mais que nos adultos — único aspecto do trabalho
de Klein a que Freud um dia se referiu (Freud, 1930). Exemplificando, Er-
na experienciara um treinamento de asseio muito precoce aos doze meses
de idade, "(...) na realidade efetuado sem qualquer tipo de severidade",
mas a menininha o vívenciou "(...) como um ato muito cruel de coerção",
do qual os seus sintomas se desenvolveram, indicando "(...) sua sensibilida
de à atribuição de culpa e o precoce e acentuado desenvolvimento de seu
sentimento de culpa" nessa idade (Klein, 1926, p. 136n).
Em verdade, Klein demonstrou que, quanto mais jovem a criança, mais
severo é o superego, sugerindo que, no desenvolvimento da criança, exis
te um processo de modificação e suavização contínua de um superego ar
caico sádico, que persegue a criança com idéias de horripilantes castigos.
A implicação é que o superego severo acha-se relacionado a fases pré-geni-
tais do sadismo, tal como descritas e datadas por Abraham (1924).
Em 1927, Klein fortaleceu esta visão do superego severo quando, seguin
do Freud (1916), interessou-se pelas características criminais nas crianças
e a relação delas com a culpa e com o sadismo a que a culpa dava origem
(Klein, 1927) [ver CRIMINALIDADE].
(d) O superego prê-genital: A quarta forma de prova se acha no caráter
pré-genital das fantasias envolvidas, a indicar uma origem nas fases pré-
genitais. A severidade específica do superego em algumas crianças (Erna,
por exemplo) "(...) porta a marca dos impulsos pré-genitais". (Klein, 1929,
p. 204).
(...) a criança então teme um castigo correspondente à ofensa; o supere
go se toma algo que morde, devora e corta. A conexão entre a forma
ção do superego e as fases pré-genitais do desenvolvimento é muito im
portante, desde dois pontos de vista. Por um lado, o sentimento de cul
pa liga-se às fases sádico-orais e sádico-anais, que ainda predominam;
R,D.Himhelwood / 115
truídas com base em objetos edipianos reais", acrescenta ela lealmente, e
continua:
Estes níveis iniciais são responsáveis pelas fantásticas imagos que devo
ram, cortam em pedacinhos, subjugam, e nas quais vemos uma mistu
ra dos variados impulsos pré-genitais em operação. Acompanhando a
evolução da íibido, estas imagos são íntrojetadas sob a influência dos
pontos libidinais de fixação. O superego, porém, como um todo, é cons
tituído pelas várias identificações adotadas nos diferentes níveis de de
senvolvimento cuja marca portam. (Klein, 1929, p. 204)
Figuras de ajuda: Cada vez mais Klein notou que essas figuras incluíam fi
guras de ajuda, assim como figuras terrificantes e sádicas. As de ajuda cor
respondem àquelas que proporcionam satisfação dos impulsos pré-genitais.
Entretanto, a importância das figuras de ajuda parece ter sido secundária
para Klein neste estágio de seu pensamento, de vez que as observações
da agressividade no brincar das crianças e da culpa e do remorso por cau
sa dela haviam sido muito proeminentes e chocantes. Foi somente em 1935
que a importância das figuras internas de ajuda chegou apropriadamente
ao primeiro plano e, então, com a introdução da posição depressiva, o ob
jeto interno bom e a preservação dele tornaram-se o fator mais importan
te [ver 5. OBJETOS INTERNOS].
R.D.Hinshelwood / 117
(1) O superego e a pulsão de morte. Klein via-se continuamente empurrada
para longe de sua lealdade à teoria clássica. Sua "pequena" modificação
da visão de Freud a respeito das origens do superego — ou seja, que o su
perego surge a partir do momento em que o complexo de Édipo aparece
— teve na realidade importância maior do que ela revelou na ocasião [ver
4. COMPLEXO DE ÉDIPO]. Em particular, implicara ela que a introjeção
dos pais não vem após a "perda dos objetos amados" da primeira infância,
mas que é um processo que prossegue no curso de um relacionamento ati
vo — e, em verdade, desde o início deste. Esta implicação acha-se muito
mais alinhada com as opiniões de Abraham, quais sejam, de que a introje
ção e a projeção são processos constantemente ativos, ligados a impulsos
orais e anais, e são ativos continuadamente, desde o início da vida e atra
vés desta [ver 9. MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA].
Em 1932, as atitudes haviam se endurecido, com pouca perspectiva de
as concepções de Klein e Anna Freud poderem ser reconciliadas. A primei
ra tinha o patrocínio seguro de Ernest Jones e existe uma correspondência
interessante, trocada entre Jones e Freud, a respeito dos conflitos entre
suas respectivas protegidas (Steiner, 1985). Dessa maneira, existiam cada
vez menos obstáculos a impedir que Klein desse o passo decisivo de aban
donar a teoria clássica do superego, tal como assentada por Freud. O livro
dela, The psycho-analysis o f children [A psicanálise de crianças], publica
do em 1932, era uma compilação de artigos clínicos (Parte 1), originalmen
te palestras proferidas em 1925, e capítulos teóricos (Parte 2) sobre as im
plicações das observações clínicas para as teorias do complexo de Édipo,
do desenvolvimento arcaico de meninos e meninas e do superego, reescri-
tos com base em conferências feitas em 1927. A parte teórica fora revisa
da e é, em alguns aspectos, inconsistente. "É a sua descrição mais comple
ta de sua primeira série de descobertas e concepções, escrita, porém, em
um momento de transição, e apresenta opiniões que só parcialmente con
cordam com a base teórica principal delas" (Melanie Klein Trust, 1974).
Uma das mais decisivas das novas evoluções, introduzida como esboço
aqui e ali no texto, era a visão inteiramente nova da origem do superego
na pulsão de morte.
O superego e a pulsão de morte: Klein elaborou a teoria da origem do su
perego na pulsão de morte de modo mais sistemático em 1933. Ao romper
com as concepções clássicas, ela engenhosamente descobriu, em Freud,
passagens que podia alegar estar seguindo. Apoiando-se nas descrições da
pulsão de morte por aquele feitas em Além do princípio do prazer (Freud,
1920), ela utilizou a visão dele de que a mais arcaica função do ego é des
viar para fora a pulsão de morte, no sentido de um objeto do mundo ex
terno. Este primeiro ato cria o ego:
A fim de escapar de ser destruído por sua própria pulsão de morte, o
organismo emprega sua libido narcísica, ou de autoconsideração, para
R.D.Hínsheiwood / 119
(1934) de objetos bons e objetos maus. Sugeriu ela fazer a expressão "supe-
rego" referir-se ao "ideal negativo" (o imperativo "não farás") e a de "ide
al do ego" ao positivo ("farás"). Searl, nessa ocasião, já estava se afastan
do do Grupo Kleiniano e pouco depois demitiu-se da Sociedade Psicanalí-
tica Britânica. A idéia foi ressuscitada muito tempo depois por Meltzer
(1967) e Maneia e Meltzer (1981), para fazer distinção entre a posição de
pressiva (na qual a passagem de figuras internas persecutórias para figuras
internas de ajuda predomina) e a inveja (a razão para não se poder livrar
de um superego persecutório).
O efeito maior do abandono da teoria clássica do superego foi permitir
desenvolvimento em direções bastante diferentes, das quais se pode salien
tar em particular, em 1935, a posição depressiva [ver 10. POSIÇÃO DE
PRESSIVA]. Isto deu a Money-Kyrle (1951) a possibilidade de utilizar a
distinção entre posição depressiva e posição esquizoparanóide para sepa
rar duas categorias amplas de superego. Ele aplicou esta formulação psica-
nalítica à Alemanha, nos dias que se seguiram à Segunda Guerra Mundial,
numa tentativa de predizer quais os nazistas capazes de reabilitação e, as
sim, merecedores de empregos responsáveis (pessoas com um superego
mais acentuado, na posição depressiva) e quais os possuidores de um supe
rego autoritário e sádico, que mais haviam florescido sob o regime nazis
ta, baseados mais na obediência e na perseguição do que na responsabilida
de pessoal (funcionamento esquizoparanóide). Grinberg (1978) enfatizou
os diferentes tipos de culpa: persecutória (ou severamente punitiva) e de
pressiva (com possibilidades de reparação) [ver ANSIEDADE DEPRESSI
VA]. Comum a todos esses textos é a ênfase na seqüência de mudança de
afeto no curso do desenvolvimento: (i) perseguição; (ii) culpa persecutória;
(iii) culpa e reparação [ver ANSIEDADE DEPRESSIVA],
OUTROS DESENVOLVIMENTOS
R.D.Hinshelwooâ / 121
perigosas e persecutórias ainda coexistem com figuras idealizadas. (Klein,
1958, p. 242)
Embora a persistência de um conjunto profundamente inconsciente de obje
tos originários fosse reconhecida nos esquizofrênicos, isso não era inteira
mente novo, por se assemelhar a um retorno às descrições de crianças (al
gumas delas na latência) no primeiro período do trabalho de Klein, e lá
Strachey, para mencionar apenas ele, fizera uso (1934) da idéia de objetos
arcaicos perseguidores e imagos idealizadas.
A persistência de relações, em um estado separado, com objetos especial
mente arcaicos foi utilizada por Bion na distinção entre partes psicóticas
e não-psicóticas de uma personalidade [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJE
TIVA]. Rosenfeld também levou esta idéia mais além, em termos de uma
dominação interna da personalidade por partes cruéis e escindidas, que
aterrorizavam as partes boas da personalidade, tal qual uma quadrilha
da Máfia (Rosenfeld, 1971); linha semelhante de pensamento foi desenvol
vida por Sidney Klein ao descrever aspectos autistas e encapsulados de
personalidades neuróticas (Sidney Klein, 1980) [ver ESTRUTURA],
R.D.Hinshelwood / 123
ensão das fases libidinais iniciais versus sua progressão a ciaramente dar-
se no momento oportuno; a manifestação da pu!são de morte interna à
personalidade versus a puísão de morte como algo clinicamente silencioso;
o funcionamento arcaico do ego ao nascimento versus o desenvolvimento
dele muito mais tarde; o primeiro ato do ego de cisão e desvio (projeção)
versus sua função inicial integrativa; a fenomenologia e a experiência sub
jetiva de objetos internos de diversos tipos, concretamente sentidos, ver
sus a experiência de representações simbólicas na mente. Esses temas entra
ram em erupção em acaloradas atmosferas de controvérsia entre Melanie
Klein e Anna Freud, entre as sociedades psicanalíticas britânica e vienen-
se e, por fim, entre grupos diferentes dentro da Sociedade Britânica. Tal
atmosfera não era propícia à resolução desses debates, de maneira que os
temas permanecem conosco, hoje amiúde irreconhecidos por uma nova
geração que parece ter herdado o calor mas não a clareza das questões.
A disputa ulterior tem tendido a ser conduzida a respeito de desenvolvi
mentos posteriores na teoria, por ambos os lados (ver 13. IDENTIFICA
ÇÃO PROJETIVA; PSICOLOGIA DO EGO], sem remontá-los às suas ra
ízes nas questões anteriores e não solucionadas das décadas de 1920 e 1930.
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R.D.Hinshelwood / 125
SITUAÇÕES ARCAICAS DE ANSIEDADE
L*L
DEFINIÇÃO. Klein tirou esta expressão da referência de Freud às situações ar
caicas de ansiedade ou perigo para o bebê e aplicou-a à sua própria desco
berta dos medos que surgem de fantasias sádicas de atacar o corpo da
mãe, e da retaliação que deste se espera. A intensidade da ansiedade e a
importância dela em crianças de ambos os sexos conduziu à descoberta
da fase da feminilidade tanto em meninas quanto em meninos. Em 1935,
Klein introduziu a posição depressiva; neste ponto, reverteu à visão de
Freud de ser a perda do objeto amado a ansiedade decisiva, mas modifi
cou significativamente a idéia de Freud, pois enfocou a perda do objeto
amado interno. Posteriormente, a partir de 1946, a descrição da fase esqui-
zoparanóide de cisão muito arcaica indicou uma situação de ansiedade di
ferente, qual seja, um medo de aniquilação do ego (resultante da pulsão
inerente de morte a funcionar no mundo interno), e, em textos posteriores
aos de Klein, a ansiedade tem sido concebida predominantemente neste
sentido (ansiedade persecutória).
CRONOLOGIA
1927 Ataques ao corpo da mãe, com retaliação (Klein, Melanie, 1928, "E-
arly stages of the Oedipus conflict"; Klein, Melanie, 1929, "Infantile
anxiety-situations as reflected in a work of art and in the Creative im
pulse")-
1935 Ansiedade não paranóide, ligada à perda do objeto interno bom
(Klein, Melanie, 1935, "A contribution to the psychogenesis of manic-
depressive States"; Klein, Melanie, 1945, "The Oedipus complex in
the light of early anxieties").
1946 Medo de aniquilação do ego, devido à operação interna da pulsão
de morte (Klein, Melanie, 1946, "Notes on some schizoid mechanisms").
R.D.Hímhehvood / 127
prio desenvolvimento teórico de Klein. Ao introduzir a expressão “situa
ções infantis de perigo e ansiedade", Freud confirmou para ela a correção
de sua abordagem ao conteúdo da ansiedade, Em verdade, Freud estava
reagindo ao livro de Rank que argumentava que toda ansiedade era devi
da a uma só causa: o trauma do nascimento. Freud argüía ao invés que a
situação de ansiedade mudava nos diferentes estágios da vida. Assim pro
cedendo, estava ele, com efeito, endossando a importância do conteúdo
de fantasia, ou de realidade, que dá significado à ansiedade.
A abordagem inortodoxa de Klein, que dava prioridade ao conteúdo
da ansiedade, resultou em contribuições específicas a esta última:
(1) ansiedade nas crianças ligada à expressão revelada no brincar;
(2) ansiedade como conflito pulsional;
(3) ênfase no conteúdo de fantasia da ansiedade;
(4) ataques ao corpo da mãe;
(5) ansiedades psicóticas, e
(6) técnica.
R.D.Hinshehoood / 129
Freud presume que a situação infantil de perigo pode ser reduzida em
última análise à perda da figura amada (por quem se anseia). Nas meni
nas, acredita ele, a perda do objeto é a situação de perigo que opera
de modo mais vigoroso; nos meninos, é a castração. Meu trabalho me
provou que ambas estas situações de perigo são modificação de outras
ainda mais antigas. Descobri que nos meninos o pavor da castração pe
lo pai está ligado a uma situação muito especial que, acho eu, prova
ser a mais arcaica de todas as situações de ansiedade. Como indiquei,
o ataque ao corpo da mãe, que psicologicamente é cronológico com o
zênite da fase sádica, implica também a luta com o pênis do pai dentro
da mãe. (Klein, 1929, p. 213 [ver ô. FASE DA FEMINILIDADE; FIGU
RA COMBINADA DOS PAIS].
(4) Ataque ao corpo da mãe. A situação de ansiedade que Klein primeiramen-
íe descreveu era, decisivamente, os ataques infantis ao corpo da mãe, com
o temor da retaliação na mesma moeda [ver 6. FASE DA FEMINILIDA
DE], Klein já descobrira uma ansiedade especifica em diversas análises:
Rita, em 1923, e Trude e Ruth em 1924.
Minha observação dos casos de Trude, Ruth e Rita, juntamente com o
conhecimeto que ganhei nos últimos anos, levaram-me a reconhecer a
existência de uma ansiedade, ou, antes, de uma situação de ansiedade
que é específica das meninas e equivalente à ansiedade de castração sen
tida pelos meninos (...) Ela se baseia nos impulsos de agressão que a
criança tem contra a mãe, e em seus desejos, que brotam dos estágios
iniciais de seu complexo de Edipo, de matá-la e roubá-la. Estes impul-,
sos conduzem não somente a uma ansiedade ou a um temor de ser ata
cada pela mãe, mas a um medo de que a mãe a abandone ou morra.
(Klein, 1932, p. 31)
Esta situação de ansiedade surge da provocação edipiana à agressão extre
mada contra o interior do corpo da mãe, com o consequente temor de re
taliação por parte desta, e do pai, cujo pênis reside dentro do corpo ataca
do da mãe e que é também atacado por aí residir. Estas fantasias infantis
são extraordinariamente ricas (SearI, 1929) e o intenso entusiasmo senti
do por Klein, por desta maneira acrescentar algo à teoria de Freud da an
siedade, deve ter se defrontado com uma recepção pétrea igualmente inten
sa por parte de Anna Freud e dos analistas continentais que se opunham
a essa abordagem [ver DEBATES SOBRE AS CONTROVÉRSIAS].
Destruição dos perseguidores: Uma das defesas contra essas imagos genito-
riais horrendamente severas (tal como a dos pais combinados) é lançar con
tra elas ataques diretos a fim de destruí-las, com o resultado de ser o obje
to então temido ainda mais, por causa de seus poderes de violência retalia-
tória. Decorre daí o círculo vicioso da paranóia [ver PARANÓIA]. A in
tensidade a que pode montar o medo chega a tal tom que Klein começou
R.D.Hinshetwood / 131
A primeira manifestação da pulsão de morte vem desde o nascimento, co
mo temor de perseguição pelo objeto mau e mobilização de ódio contra
esse objeto, criando o primeiro paradigma para "uma relação objetai má",
da seguinte maneira: "Farte da pulsão de morte é projetada dentro do ob
jeto, tornando-se este, por isso, um perseguidor, enquanto que a parte da
pulsão de morte que é retida no ego faz a agressão voltar-se contra o obje
to persecutório" (Klein, 1958, p. 238n). O elemento paranóide destas rela
ções objetais más é claro, e elas foram esclarecidas mediante o trabalho
com pacientes paranóides e esquizofrênicos e crianças feito por Klein e
seus colaboradores próximos. (Segai e Rosenfeld)
Referimo-nos a este tipo de ansiedade como ansiedade persecutória e
ela é a marca distinta do que veio a ser descrito como posição esquizopara-
nóíde [ver 11. POSIÇÃO ESQUÍZOPARANÓIDE], Em 1946, a situação
de ansiedade arcaica foi descrita como sendo um novo medo, uma aniqui-
lação do ego, uma fragmentação que resulta da ação interna da pulsão
de morte.
Mundo interno: A ansiedade depressiva (relacionada com a perda do obje
to amado interno) e a ansiedade persecutória (relacionada com o temor
de aniquilação do self) são situações desagradáveis profundamente pesso
ais e relacionam-se às próprias e perturbadas fantasias da pessoa sobre o
que ele ou ela são por si próprios, o que se acha dentro delas, no que ele
ou ela consistem. As "situações de ansiedade", a partir de 1935, foram si
tuações internas.
Os mecanismos primitivos de defesa (ou mecanismos psicóticos) estão
envolvidos primariamente em aliviar os temores a respeito destes estados
internos e, em verdade, iniciam o ego como função que controla esse mun
do interno. As defesas contra as ansiedades psicóticas são a cisão, a nega
ção, a projeção, a introjeção, a identificação e a idealização [ver 9. MECA
NISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA], e elas são gradativamente eclipsadas
à medida que as ansiedades mudam e defesas mais maduras ganham proe-
minência. A repressão sobrepuja a cisão, as defesas obsessivas assumem
o lugar das maníacas, etc.
Inveja primária: A o dar acabamento a seu sistema teórico em 1957 com a
teoria da inveja primária, Klein descreveu um relacionamento particular
de fantasia com um objeto. Retornou ela à fantasia específica de introdu-
zir-se em um objeto "bom" e estragar os conteúdos que lá dentro se acham.
A contribuição original de Klein — o ataque ao corpo da mãe — foi inicial-
mente considerada como edipiana. Em 1957, ele retornou como inveja pri
mária, remontada a um conflito inerente e pulsional [ver 12. INVEJA].
(6) Técnica. Klein começou por observar a mudança na ansiedade, como re
sultado de suas intervenções interpretativas, algo que continuou a ser um
indicador importante do trabalho analítico, Joseph (1978, 1981) demons
R.D.Hinshelwood / 133
(a) a pulsão de morte, de acordo com Freud, é, em grande parte, clinica
mente silenciosa (Freud, 1920);
(b) é desnecessário postular que a agressão seja uma manifestação (através
da projeção) da pulsão de morte, de vez que a agressão como frustração
das pulsões de vida, tal como descrita por Freud (1915), é bastante suficiente, e
(c) as provas de um processo interno de destrutividade autodirigida que
foram oferecidas pelos kleinianos — a teoria do superego de Klein (Klein,
1933) e teorias posteriores da estrutura das personalidades fronteiriças (Hei-
mann, 1952; Rosenfeld, 1971) [ver ESTRUTURA] — são discutidas [ver
PULSÃO DE MORTE],
Ansiedade e técnica: O interesse de Klein no conteúdo da ansiedade condu
ziu à sua técnica de interpretações profundamente penetrantes. Em contras
te, a técnica clássica desenvolvida pelos psicólogos do ego interessava-se
por analisar os mecanismos de defesa (e de adaptação) do ego e levou à
crítica feita a Klein de que suas interpretações profundas eram causa de
ansiedade, pois deviam ser experienciadas pelo paciente como intrusivas
e, portanto, persecutórias, com o resultado de serem os kleinianos confron
tados por muita ansiedade persecutória (Geleerd, 1963; Greenson, 1974)
[ver 1. TÉCNICA].
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R.D.Hinshelwooá / 135
[ 9
]
CRONOLOGIA
1895 Freud (projeção).
R.D.Hinshelwood / 137
Assim, Klein preencheu esse período inicial com dados clínicos reais, oriun
dos da análise de crianças. "Esta defesa", escreveu ela, ligando-a com a
passagem de Freud, "em conformidade com o grau de sadismo, é de cará
ter violento e difere fundamentalmente do mecanismo posterior da repres
são" (Klein, 1930, p. 220). Ela vinculou a qualidade especial das ansieda
des paranóides da criança a defesas especiais que operam no começo da
vida, defesas inteiramente diferentes da repressão, com a qual a maior par
te da análise de adultos se preocupava.
É somente nos estágios posteriores do conflito edipiano que a defesa
contra os impulsos libidinais faz seu aparecimento; nos estágios iniciais,
é contra os impulsos destrutivos acompanhantes que a defesa se dirige
(...) Esta defesa é de caráter violento, diferente do mecanismo da repres
são. (Klein, 1930, p. 232)
Este foi um momento importante no próprio desenvolvimento teórico de
Klein. A partir daí, ela assumiu grande interesse pelas defesas reais arcai
cas e manteve-se relativamente desinteressada na repressão e nas "defesas
neuróticas". Em contraste, chamou as defesas muito arcaicas de "defesas
psicóticas" ou mecanismos primitivos âe defesa. Ligou isto à sua própria
descoberta, em algumas crianças, de ansiedades intensas que se aproxima
vam de uma intensidade psicótica e tinham uma qualidade psicótica, a pa
ranóia [ver PARANÓIA]. Ficou mais entusiasmada com essas defesas pri
mitivas quando pôde ver que a teoria de Freud de uma operação especial
arcaica da projeção poderia solucionar o problema da origem do supere-
go, que lhe havia causado tanta busca interior e ostracismo. As observa
ções dela sobre o superego capacitaram-na a demonstrar esta "(...) medi
da de defesa aparentemente muito arcaica por parte do ego" (Klein, 1933,
p. 250) [ver 7. SUPEREGO].
Onipotência: Uma das características mais importantes dos mecanismos
primitivos de defesa é a qualidade da onipotência, que dá origem a mudan
ças de vulto na estrutura da mente e da personalidade. Estes mecanismos
acham-se ligados com o funcionamento de fantasias primitivas e inconscien
tes a respeito dos conteúdos do self e do mundo externo, tais como a nega
ção, a projeção e a introjeção [ver ONIPOTÊNCIA].
R.D.Himhelwooá / 139
OS MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA. Klein não foi a única analis
ta a acompanhar a investigação da projeção e da introjeção feita por Abra-
ham (Harnik, 1932, por exemplo). Seu desenvolvimento dessas idéias, con
tudo, foi inteiramente original e acabou por desviar-se dos conceitos clássi
cos. Klein enfatizou os vínculos existentes entre os mecanismos e as fanta
sias, e Stephen (1934) resumiu, em traços gerais, as ligações desses meca
nismos a estados de sentimentos e a objetos, mais do que a impulsos.
R.D.Hínshelwood / 141
ção de dor ou frustração) conduz a uma mudança abrupta para um obje
to "mau", Esta imensa precariedade só diminui quando nos aproximamos
da posição depressiva e desenvolve-se uma certa tolerância de um objeto
"bom" que não é perfeito.
R.D.Hinshelwood / 143
paranóia ou deles surge, sugeriram a ela um processo flutuante em que se
dá, repetidamente, uma retirada da posição depressiva, quando as ansieda
des depressivas se tornam fortes demais. Nesse caso, "(...) os temores e
as desconfianças paranóides eram reforçadas como defesa contra a posição
depressiva" (Klein, 1935, p. 274) [ver DEFESA PARANÓIDE CONTRA
A ANSIEDADE DEPRESSSIVA]. Mais tarde, então, dá-se mais uma vez
um avanço em direção à posição depressiva e da sustentação da ansieda
de depressiva (Joseph, 1978, 1981) [ver EP-D).
O suicídio é uma forma drástica de "defesa", que visa a "{...) destruir
a (...) parte do ego que está identificada com os objetos maus e com o id"
(Klein, 1935, p. 276). E um pouco surpreendente, em vista da disputa com
os psicanalistas clássicos a respeito de provas em favor da pulsão de mor
te como sendo uma destrutividade dirigida para o self, que os kleinianos
não tenham prestado mais atenção às idéias, fantasias e comportamentos
suicidas.
Defesas maníacas: As defesas maníacas, tais como a paranóide, são uma
tentativa de fugir ao agudo sofrimento da culpa na posição depressiva ar
caica. A defesa é, na realidade, uma coleção de defesas que envolvem a
negação da realidade psíquica e, portanto, da importância dos objetos que
são amados e incorporados [taken inj, um desprezo denegridor pelos obje
tos que são amados, de maneira a que sua perda não seja experienciada
como impoltante, e uma forma triunfante e onipotente de corrigir tudo.
Todas elas são meios de minimizar os sentimentos de perda e culpa [ver
DEFESAS MANÍACAS],
R eparação: Em grau significativo, o conceito de reparação assumiu, no
pensamento de Klein, o lugar das defesas obsessivas, em particular a defe
sa conhecida como "desfazer", em que há uma tentativa de retraçar exata
mente uma ação destrutiva (real ou imaginada) e, por essa maneira, restau
rar uma situação preexistente. A reparação também sumplantou, em grau
significativo, a noção de sublimação, ou seja, a descarga saudável das pul-
sões, em forma alterada, através de canais socialmente aceitos e propicia
dos. Dizendo-o de outra maneira: a forma de sublimação, para Klein, era
a reparação, ou seja, a "sublimação" da culpa em ação construtiva [ver
REPARAÇÃO].
R.DMinshehvood / 145
mas são depois projetadas e/ou negadas, de maneira que para o ego sobre
vive apenas um objeto bom sem aspectos maus (objeto idealizado), enquan
to que a ameaça ao ego por parte de qualquer objeto mau é eliminada (ne
gação e projeção) (Rosenfeld, 1983) (ver IDEALIZAÇÃO],
Defesas contra a inveja: Em 1957, Klein introduziu o seu último grande
conceito teórico: a inveja [ver 12. INVEJA]. Ele surgiu de seu interesse pe
los esquizofrênicos e referia-se a formas muito primitivas de agressão con
tra o objeto bom (ou idealizado) [ver OBJETOS]. Parte do interesse dela
se voltou para as manifestações defensivas que o bebê tem de adotar logo
no início da formação do ego. A inveja resulta da dotação herdada da libi-
do e da pulsão de morte, e de um certo grau de confusão entre os resulta
dos disso. O bebê precisa urgentemente separar esses dois impulsos contras
tantes logo de início, e o faz utilizando o processo mais arcaico da cisão.
Isto representa o primeiríssimo momento em que as coisas podem sair erra
das, dando origem a certas formas de patologia [ver PSICOSE; ESTADOS
DE CONFUSÃO; NARCISISMO]. Proeminente entre estas defesas é a pron
ta separação dos dois tipos de noções pulsionais, que equivalem a uma for
ma normal de cisão, essencial para a sobrevivência.
Klein (1957, p. 216-9) detalhou outras defesas [ver 12. INVEJA], tais
como onipotência, negação e cisão, e confusão; fuga do objeto originário,
desvalorização do objeto e, paradoxalmente, desvalorização do se//; inter-
nalização voraz do objeto, incentivo da inveja em outros, abafamento dos
sentimentos de amor e uma correspondente intensificação do ódio, e, final
mente, uma forma especial de atuação [acting out}, descrita por Rosenfeld
(1952). Um pouco relacionada à última é uma defesa descrita por Segai
(1962), que a retratou como sendo uma excisão da inveja primária para
dentro de um estado não integrado [ver 12, INVEJA]. As defesas desta li
nha compilada por Klein são organizações características dos típicos meca
nismos primitivos de defesa que podem ser encontrados na posição depres
siva ou paranóide.
jR.D.Hinshelwood / 147
Dessa maneira, esses mecanismos primitivos de defesa desempenham
quatro funções do ego:
R.D.Himhelwood / 149
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R.D.Hinshehvood / 151
10
POSIÇÃO DEPRESSIVA
DEFINIÇÃO. A confluência de ódio e amor na direção do objeto dá origem a
uma tristeza particularmente pungente que Klein chamou de "ansiedade
depressiva" (ou "anseio" "anelo" [pining]). Ela expressa a forma de culpa
mais arcaica e angustiada, devida a sentimentos ambivalentes para com
um objeto. O bebê, em certo estágio (normalmente dos quatro aos seis
meses de vida), já se acha física e emocionalmente maduro para integrar
suas percepções fragmentadas da mãe, reunindo as versões (imagos) boas
e más que anteriormente experienciou. Quando tais objetos parciais são
reunidos num todo, eles ameaçam formar um objeto total contaminado,
danificado ou morto.
A ansiedade depressiva é o elemento decisivo dos relacionamentos ma
duros, a fonte dos sentimentos generosos e altruístas que são devotados
ao bem-estar do objeto, Na posição depressiva, são mobilizados esforços
para maximizar o aspecto amoroso do relacionamento ambivalente com
o "objeto total" danificado (reparação), mas também o são os mecanismos
de defesa. Estes compreendem a constelação de defesas paranóides (origi
nalmente chamada por Klein de "posição paranóide", e posteriormente
abandonada) e as defesas maníacas.
CRONOLOGIA
1935 Enunciado definitivo da mudança ao se alcançarem objetos totais
(Klein, Melanie, 1935, "A contribution to the psycho-genesis of ma-
nic-depressive States").
1945 Luto pela perda do objeto interno amado (Klein, Melanie, 1940, "Mour-
ning and its relation to manic-depressive States").
R.D.Hinshehvood / 153
(3) em contraste com seu persistente interesse pelo relacionamento de obje
to -mau e ansiedade paranóide, Klein deu subitamente ênfase, de um no
vo modo, à importância do objeto bom e dos impulsos amorosos;
(4) o objeto bom que é perdido é o objeto interno, e
(5) a posição depressiva representou uma mudança em ênfase, no desen
volvimento, da projeção (nos estados paranóídes precedentes), para a in-
trojeção.
(1) A integração teórica. A ênfase dada por Klein à vida de fantasia, em opo
sição às economia clássica da energia puísional, abriu um mundo novo:
um mundo de objetos experienciados como concretamente localizados den
tro da personalidade. As fantasias de sadismo e agressão haviam contri
buído para uma nova teoria do complexo de Edipo e enfocado a contro
vérsia psicanalxtica sobre o primeiro ano de vida. A combinação das fases
libidinais, do complexo de Edipo e da formação do superego havia muda
do a importância de cada uma delas. O resultado final foram os aspectos
disputantes do superego (perseguidores e figuras de ajuda) e do complexo
de Edipo (complexos positivo e invernos [negativo]), bem como a tensão
entre as pulsões libidinais (na maior parte consideradas como genitais) e
os impulsos agressivos (na maioria encarados como pré-genitais). Isto atin
gira seu foco teórico, anteriormente, na fase da feminilidade e na situação
específica de ansiedade em que a criança ataca, suja, rouba e destrói o cor
po da mãe e o pênis do pai, que reside dentro da mãe [ver 6. FASE DA
FEMINILIDADE; 8. SITUAÇÕES ARCAICAS DE ANSIEDADE].
Entretanto, a crescente consciência por Klein da importância, para a
criança, dos interiores das pessoas levou-a a conceder importância crescen
te aos processos de projeção e introjeção e ao movimento constante, na
fantasia, entre os mundos interno e externo. Com a compreensão da im
portância do objeto bom, e do dano a ele, Klein pôde ver o mundo inter
no como centrado em tomo do objeto interno bom, e os problemas que
se apresentam para o bebê quando ele descobre seus impulsos agressivos
em relação a esse objeto, assim como o seu amor. Dessa maneira, a posi
ção depressiva se forma a partir da crescente apreciação da pungêncía dos
impulsos ambivalentes [ver AMOR, GRATIDÃO], da importância do
mundo interno na fundação da própria personalidade e da percepção em
desenvolvimento de um mundo interno de objetos e impulsos bons e maus
(insight).
(2) Objetos totais. Por diversas razões, que incluem a falta de desenvolvimen
to perceptual, o bebê muito novo a princípio reconhece apenas objetos
muito polarizados, pessoas boas e pessoas más. Por causa desta falta de
percepções, o bebê nem mesmo reconhece pessoas totais, mas somente par
tes de pessoas, o seio, especialmente, e, por fim, o rosto da mãe: "A per-
R.D.Hinshetwood / 155
ego vem a penosamente encontrar um lugar menor em seu próprio e cres
cente mundo. Os objetos vão e vêm apesar dele.
(b) Com este passo, aparece uma nova capacidade de amar. O interesse,
o pesar e o amor pelo objeto total são pelo objeto em si, não simplesmen
te pela gratificação que proporciona. Abraham (1924) foi o primeiro a des
crever o "verdadeiro amor objetai", em contraste com o desejo por obje
tos parciais. Esta nova forma de amor traz novas conseqüências para o
ódio e a perda [ver AMOR], Klein considerou isto importante para a com
preensão das condições psicóticas: "Acredito que a diferença principal en
tre a incorporação na paranóia e na melancolia acha-se ligada com mudan
ças na relação do sujeito com o objeto" (Klein, 1935, p. 263). Na posição
depressiva, o objeto é amado apesar de suas partes más, enquanto que,
na posição esquizoparanóide, a percepção das partes más transforma o ob
jeto bom, abruptamente, em um perseguidor. Dessa maneira, o amor po
de ser mantido na posição depressiva, proporcionando os primórdios da
estabilidade.
A confluência de emoções é extremamente perturbadora e pode-se resistir
a este passo à frente a partir do estado paranóide, de maneira que o bebê
cresce com uma propensão inusitadamente forte a relações paranóides (is
to é, um potencial psicótico se fixa na personalidade). Klein descreveu a
reversão às relações paranóides como sendo uma defesa paranóide contra
a ansiedade depressiva.
(3) A importância do objeto bom. Até este ponto (1935), o enfoque de Klein
sempre se voltara para as relações paranóides — o medo e o ódio — e pa
ra o objeto destes impulsos — o objeto mau. Era o objeto mau que domi
nava o mundo da criança e o mundo interno, e controlava o desenvolvi
mento normal ou anormal da libido. Neste ponto, porém, Klein começou
a dar-se conta da importância do objeto bom, da necessidade de sustentá-
lo e do relacionamento com ele, assim como da acerbidade e da dor do
amor por ele.
A compreensão do relacionamento com o objeto bom deu início a to
da uma nova redisposição das lutas evolutivas da criança. Ao invés dos
conflitos sobre o controle da libido que Freud descrevera e em vez das lu
tas para controlar os impulsos agressivos, Klein via agora a base das lutas
como sendo o ímpeto a proteger e reparar o objeto bom. Ela descreveu a
insegurança como sendo especialmente importante para o objeto interno
bom — o sentimento de existir uma figura boa e de ajuda dentro da perso
nalidade, sentida como residindo lá, e tão estreitamente amada a ponto
de constituir a identificação primária básica em torno da qual toda uma
identidade se forma. O objeto interno bom proporciona o diálogo inter
no e contínuo de incentivo e auto-estima em que a confiança e a seguran
ça psicológica se baseiam.
R.D.Hinsheíwooâ / 157
"Muitas pessoas enlutadas só podem dar passos lentos no restabeleci
mento das ligações com o mundo externo, por estarem lutando contra o
caos que têm dentro de si (...) este desenvolvimento gradual nas relações
objetais do bebê (...) é também devido ao estado caótico de seu mundo in
terior" (Klein, 1940, p. 361). O bebê tem a experiência de que tudo dentro
dele acha-se em tumulto e caos. Não são apenas os seus sentimentos que
se encontram caoticamente mesclados. Por estes se acharem sempre repre
sentados ém sua mente como fantasias, o bebê acredita que o objeto resi
de concretamente dentro dele, ou em seu próprio corpo, de maneira que
seu próprio estado interno é um estado que se torna confuso e embaralha
do, com uma mistura de objetos "bons" e objetos perigosamente "maus",
amados e odiados, tudo ao mesmo tempo. Em particular, ele sente que seu
ódio danifica sua mãe real amada, e isto vem a ser também refletido na
experiência de que o objeto dentro dele está também danificado ou morto,
e ele pode identificar-se com esta morte interna. Um caos interno surge atra
vés da introjeção de um objeto externamente já danificado ou morto. Em
verdade, Klein foi mais além: "(,..) qualquer sofrimento causado por expe
riências infelizes, seja qual for a natureza delas, tem algo em comum com
o luto" (Klein, 1940, p. 360).
Bastante mais tarde, quando já havia mais compreensão dos estados
não integrados do ego [ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE], Grin-
berg (1978) observou que o luto pela perda do objeto amado deve incluir
uma forma de luto pela parte do self que se acha ligada com esse objeto.
(...) somente quando o ego introjetou o objeto como um todo (...) é ele
capaz de dar-se plena conta da catástrofe criada através de seu sadis
mo e, especialmente, através de seu canibalismo (...) O ego vê-se então
confrontado com a realidade psíquica de que seus objetos amados acham-
se em estado de dissolução — em fragmentos — e há a ansiedade de co
mo reunir esses fragmentos de maneira correta e livrar-se dos maus;
de como trazer o objeto à vida, quando reunidos, e há a ansiedade de
que nessa tarefa interfiram objetos maus e o próprio ódio, etc. (Klein,
1935, p. 269)
R.D.Hinshelwood / 159
Nestes primeiríssimos momentos da apreciação do objeto total, o sofri
mento é particularmente agudo. Ele vem coroar as antigas ansiedades para-
nóides:
(...) o ego sente-se constantemente ameaçado em sua posse de objetos
bons internalizados. Está cheio de ansiedade de que tais objetos possam
morrer. Tanto em crianças quanto em adultos a padecerem de depres
são, descobri o pavor de abrigar objetos mortos ou moribundos (espe-
cialmente os pais) dentro de si e uma identificação do ego com objetos
nessa condição. (Klein, 1935, p. 266)
A angústia do sujeito é pessoal, um temor por sua própria sobrevivência
dentro da mãe que o apóia, e também uma preocupação genuína por ela
.
[ver 8 SITUAÇÕES ARCAICAS DE ANSIEDADE; AMOR].
O primeiro período dos textos de Klein referia-se a "ansiedade e um sen
timento de culpa", mas isto foi resolvido em 1935 por uma distinção níti
da entre uma ansiedade paranóide de perseguição e culpa associada à posi
ção depressiva, a qual é mencionada como ansiedade depressiva. A ansie
dade persecutória é um temor pelo ego; a ansiedade depressiva, um medo
pela sobrevivência do objeto amado:
Existem assim dois conjuntos de medos, sentimentos e defesas, os quais,
por variados que sejam em si e por intimamente ligados que estejam,
podem, em minha opinião, para fins de clareza teórica, ser isolados uns
dos outros. O primeiro conjunto de sentimentos e fantasias é o persecu-
tório, caracterizado por medos relacionados à destruição do ego por
perseguidores internos, através de métodos violentos, furtivos e astutos
(...) O segundo conjunto de sentimentos (...) vai constituir a posição
depressiva- (Klein, 1940, p. 348)
Mas a ansiedade, na prática, é mista. A interação da ansiedade persecutó
ria e da culpa (agora denominada "ansiedade depressiva") é extremamen
te complexa e manejada por combinações intrincadamente tecidas de intro-
jeções e projeções de objetos entre o mundo interno e o externo. As ansie
dades paranóides precedentes não desaparecem, mas permanecem como
um pano de fundo proeminente a colorir a posição depressiva, envolvendo
(...) o estado depressivo como o resultado de uma mistura de ansieda
de paranóide e daqueles conteúdos de ansiedade, sentimentos de aflição
e defesas que se acham ligados com a perda iminente do objeto amado
total. (Klein, 1935, p. 275)
As ansiedades persecutórias e depressivas interagem — em particular a in
terferência na posição depressiva do círculo vicioso que cria a ansiedade
persecutória através da projeção e da reintrojeção: "Uma das razões para
o seu fracasso é que ele foi incapaz de superar seu pavor paranóide de per
seguidores internalizados" (Klein, 1935, p. 267). Culpa é um termo que en-
R.D.Hinshehoooà / 161
A defesa maníaca. Central à defesa maníaca está a idéia onipotente de que
as relações objetais não são de grande importância. O ego diz a si mesmo
que o objeto amado, que é sentido como estando morto ou danificado,
dentro ou fora, não é realmente de grande importância; ele pode sair-se
perfeitamente bem sem depender de ninguém:
(...) neste estado,a fonte do conflito é que o ego não está disposto
nem é capaz de renunciar a seus objetos internos bons, mas, apesar dis
so, esforça-se por fugir aos perigos da dependência deles, assim como
de seus objetos maus (...) Obtém êxito neste compromisso negando a
importância de seus objetos bons e também dos perigos com que é ame
açado por parte de seus objetos maus e do id. (Klein, 1935, p. 277)
A defesa maníaca é, na realidade, uma coleção de defesas, a envolver uma
negação da realidade psíquica e, portanto, da importância dos objetos que
são amados e tomados para dentro de si, um desprezo denegridor pelos
objetos que são amados, de maneira que sua perda não seja experiencia-
da como importante, e uma forma triunfante e onipotente de acertar tu
do. Todos estes são meios de minimizar os sentimentos de perda e culpa
[ver 9. MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA; DEFESAS MANÍACAS].
Klein enfatizou que as defesas maníacas visam tanto aos sentimentos
depressivos quanto aos paranóides que existem na posição depressiva: "Na
mania, o ego busca refúgio não apenas da melancolia, mas também de
uma condição paranóide que é incapaz de dominar" (Klein, 1935, p. 277).
D efesas obsessivas; Por serem as ansiedades da posição depressiva tão es
treitamente vinculadas, nos primeiros estágios, com as ansiedades paranói
des, as defesas específicas para a posição depressiva acham-se misturadas
com as defesas contra a ansiedade persecutória que resulta das fases sádi
cas, inclusive a defesa específica de destruir os perseguidores, e também
as defesas obsessivas. Por várias vezes Klein percebeu relações diferentes
entre as defesas maníacas e as obsessivas [ver DEFESAS OBSESSIVAS].
Ambos os tipos envolvem domínio e controle sobre os objetos e isto se
mostra, de modo particular, nos tipos de reparação que são tentados. Com
freqüência o sujeito fantasia a reparação do objeto, mas se este se acha em
baralhado demais com as defesas contra a perseguição (maníaca ou obses
siva), a reparação será efetuada com todas as características de ódio do
estado paranóide: o domínio e o controle terão uma qualidade odienta e
rancorosa e levarão à ansiedade de que os objetos tenham sido ainda mais
danificados no processo de conserto.
Mais tarde, quando Klein afrouxou seu compromisso com a teoria clássi
ca, a idéia de sublimação caiu também um tanto, enquanto que a idéia
de reparação desenvolveu-se e tornou-se a perda angular dos processos
de maturação que forjam uma saída para a posição depressiva [ver AMOR].
A reparação é evocada especificamente pelas ansiedades da posição de
pressiva e, junto com o teste da realidade, constitui um dos dois princi
pais métodos de superar a ansiedade depressiva. Klein acentuou que a pre
ocupação é mais que apenas a necessidade que a criança tem de garantir
sua própria sobrevivência através da manutenção de uma mãe para apoiá-
la e cuidar dela, ainda que esse seja um dos aspectos da ansiedade. A repa
ração também surge da preocupação real pelo objeto, de um anseio por
ele, e pode envolver grande auto-sacrifício. Exemplificando, ao descrever
os sentimentos maternais, diz:
(...) a mãe é capaz de pôr-se no lugar da criança (...) ser capaz de fazê-
lo com amor e simpatia, acha-se estreitamente ligado, como vimos, com
sentimentos de culpa e o impulso à reparação (...) [e] pode levar a uma
atitude inteiramente auto-sacrificante. (Klein, 1937, p. 318)
R.D.Hinshelwood / 163
A questão é complexa, contudo, porque a teoria da posição depressiva é
de que a preocupação é igualmente a respeito do objeto interno, que por
uma boa parte do tempo se identifica com o ego. Dessa maneira, a repara
ção devotada à restauração da mãe boa (objeto externo) tem, como aspec
to correspondente, o efeito de restaurar ao mesmo tempo um estado inter
no dentro do sujeito [ver NARCÍSISMO],
R.D.Hinshehvood / 165
O segundo desenvolvimento da teoria é semelhante. Foram algumas ob
servações feitas por Hanna Segai no curso da análise pioneira de um esqui
zofrênico gravemente enfermo {Segai, 1956). Mostrou ela que havia algu
mas evidências de depressão em um esquizofrênico, mas que esta não era
sentida por ele. Ao invés, existia um processo no qual a depressão é senti
da por outras pessoas — no curso da análise, no analista. Klein ficou im
pressionada por este trabalho de uma de suas jovens estudantes (Klein,
1960) [ver PSICOSE].
R.D.Hinshehvood / 167
Apontou ele que aquilo que com freqüência é chamado de depressão é,
de fato, um afeto bastante diferente, um afeto que chamou de futilidade.
Vinculou-o com estados mentais histéricos, tipicamente a belle indifféren-
ce sem afetos, caracterizada por um afeto aparentemente faltante. Fairbairn
atribuía este vazio a uma cisão da mente e defendeu energicamente que
mais atenção fosse prestada aos fenômenos dissociativos, coisa com que
Klein devidamente concordou (1946) [ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARA-
NÓIDE]. Fairbairn considerava que os fenômenos depressivos mascaravam
os fenômenos dos estados esquizóides e, em particular, a cisão do ego e o
conseqüente temor pelo self, pontos que Klein tomou a sério.
No que concernia a esta e seus seguidores imediatos, a posição depressi
va imediatamente tornou-se central e sofreu excepcionalmente pouca modi
ficação. A consecução da posição depressiva, com uma visão equilibrada
da realidade dos objetos, ainda é considerada marca distintiva de progres
so psicológico. James Strachey (1934), em sua teoria da modificação de
objetos irrealisticamente bons e maus, claramente caminhava nos calcanha
res de Klein na compreensão da importância terapêutica de modificar os
objetos bons e maus arcaicos. Stephen (1934), sem dúvida por causa de
seu conhecimento íntimo de Klein, também explorou a relação existente
entre a internalização de objetos, a destrutividade e a culpa.
Contudo, após a publicação dos artigos sobre a posição depressiva (1935,
1940), o mundo psicanalítico foi envolvido pela situação política da Euro
pa e, depois, pela luta interna na Sociedade Psicanalítica Britânica. Quan
do delas emergiu, Klein já havia avançado para sua descoberta da posição
esquizoparanóide.
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R.D.Hinshelwood / 169
11
POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE
DEFINIÇÃO. No estado mental mais arcaico, a ansiedade persecutória se encon
tra com processos que ameaçam fragmentar (e fragmentam) a mente. A
gravidade dela afeta a passagem para a posição depressiva, porque a inte
gridade da mente é seriamente perturbada. Os processos de cisão tipica
mente conduzem à projeção de partes do self ou do ego (identificação pro
jetiva) para dentro de objetos, com um efeito esvaziador sobre o self. Es
te self esvaziado tem então dificuldades com a introjeção e a identificação
introjetiva. Esta posição foi descrita em 1946 e constituiu modificação pro
funda das descrições anteriores, feitas por Klein, dos estados persecutório
e paranóide. Estas descrições, em 1946, levaram a desenvolvimentos de
vulto (especialmente da identificação projetiva) por parte de seus colegas
contemporâneos e de seus discípulos.
CRONOLOGIA
1929 Primeiras idéias precursoras.
1946 Posição esquizoparanóide (Klein, Melanie, 1946, "Notes on some schi-
zoid mechanisms"; Rosenfeld, Herbert, 1947, "Analysis of a schizop-
hrenic state with depersonaíization").
R.D.Hinshelwooá / 171
Como, deve ter se perguntado, pode ela vir a experienciar-se como se
achando em fragmentos? Descobriu que havia ficado impressionada e, ao
mesmo tempo, também determinada a incorporar isso em um arcabouço
apropriadamente kleiniano. Deu-se conta de que ainda não havia presta
do atenção suficiente aos primeiros meses de vida, por haver situado o de-
sencadeamento da posição depressiva no segundo trimestre do primeiro
ano de vida.
Klein havia, em certo sentido, superado os ataques feitos às suas opi
niões no início da década de 1940 [ver DEBATES SOBRE AS CONTRO
VÉRSIAS], com o resultado havendo sido um empate, insatisfatório mas
estável. Não havia razão para esperar que outros analistas fora de seu gru
po emparelhassem com as opiniões dela, de maneira que Klein simplesmen
te seguiu em frente, pelo retorno a seu antigo interesse na psicose. Anterior
mente, haviam sido as crianças e os estados de pensamento inibidos e frag
mentados delas (Klein, 1930, 1931). Ela sempre enfatizara o medo paranói-
de que inibia o desenvolvimento do pensamento e da simbolização, de
maneira que, sem abandonar a importância da posição depressiva, concor
dou com Fairbairn que o início desta dependia da elaboração anterior e
adequada de outro tipo de ansiedade que não o depressivo. Concordou
também que isto concernia aos mecanismos esquizóides e tinha lugar de
relevo no mecanismo da cisão. Em consequência, reconheceu a contribui
ção de Fairbairn combinando a expressão dele, "posição esquizóide", com
o seu próprio termo "posição paranóide", para produzir a expressão corre
ta mas um tanto desajeitada, ou seja, "posição esquizoparanóide",
R.D.Hinshelwood / 173
da pulsão de morte para fora. Ela veio a dizer que esta é uma ansiedade
primária subjacente a todas as outras ansiedades, que ela é, de fato, aque
la mesma que é evocada pela ação da pulsão de morte: um objeto inter
no está prestes a aniquilar o ego [ver 8. SITUAÇÕES ARCAICAS DE AN
SIEDADE].
Isto difere de suas descrições anteriores da situação arcaica de ansieda
de, quando entusiasticamente assumira a idéia de Freud e utilizara seu pró
prio material clínico para preencher a idéia dele; então {em 1927), conside
rara a ansiedade como derivada das incursões feitas ao corpo da mãe, em
fantasia, e da temida retaliação na mesma moeda por parte da mãe ou
dos conteúdos danificados desta. Este é um dos conteúdos específicos da
ansiedade, ligados aos impulsos genitais, e, naquela época, reconhecida
por Klein como fazendo parte do complexo de Edipo ortodoxo. Em 1932,
Klein adotara a descrição hipotética, por Freud, no desvio da pulsão de
morte para fora, e a temida reintrojeção de um perseguidor interno. Foi
em sua descrição da posição esquizoparanóide, em 1946, que ela a preen
cheu com a experiência da pulsão de morte, em termos de fantasias de ob
jetos que ameaçam de morte desde dentro, que possuem qualidades sádi
cas pré-genitais, assim como edipianas.
R.D.Hinshelwood / 175
lação com ele. A diferença se dá pela qualidade da introjeção. Quando es
ta se faz acompanhar, na fantasia, por um certo grau de onipotência (Ro-
senfeld, 1964), há um dissolvimento da fronteira entre o ego e o objeto in
terno, que é possuído pelo primeiro como simplesmente uma parte do self.
A posição depressiva assinala o esvaecimento desta dissolução narcísica e
onipotente das fronteiras do ego, e os objetos são mais realisticamente ex-
perienciados como totais em si próprios [ver NARCISISMO].
Com freqüêncía o ego fica grandemente enfraquecido pela cisão e inca
paz de satisfatoriamente introjetar e identificar-se, resultanto isso em obje
tos internos não assimilados [ver ASSIMILAÇÃO]; além disso, fantasias
onipotentes de incorporação podem envolver uma agressão considerável
e resultarem na perda de algum objeto não danificado dentro de alguém
[ver VORACIDADE]. Em verdade, a introjeção pode ser grandemente pre
judicada nesta posição, devido ao medo de introduzir-se objetos bons em
um mundo interno catastroficamente destrutivo.
R.D.Hímhelwood / 1 7 7
emocionai ou psíquica. O ego fica enfraquecido pela perda de suas partes.
Isto pode tomar as introjeções mais difíceis de serem manejadas e elas po
dem parecer dominar completamente um ego agora enfraquecido dentro
de seu próprio mundo interno, e ele pode sentir-se como sendo meramen
te uma concha para um objeto estranho dentro de si, de maneira que se
sente esmagado e "compulsivamente subordinado" até mesmo ao objeto
interno bom. Há muitos processos nestas descrições que claramente se asse
melham aos estados extravagantes de identidade que são sofridos pelo pa
ciente esquizofrênico [ver PSICOSE].
R.D.Hinshehuood / 179
riação conceptual e simples confusão. Uma tentativa de desemaranhá-la é
efetuada alhures, neste dicionário [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA].
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CRONOLOGIA
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hrenic").
1952 Exposição teórica por Klein (Klein, Melanie, 1957, Envy and Gr atitude) >
1971 Inveja e estrutura do ego (Rosenfeld, Herbert, 1971, "A clinicai ap-
proach to the psycho-analiticy theory of the life and death instíncts:
an investigation into the aggressive aspects of narcissism").
R.D.Hinshelwood / 181
gressar em um objeto "bom" e estragâ-lo e a seus conteúdos é muito preva-
lecente. Esta fantasia constitui expressão primária de uma pulsão: a pulsão
de morte. Enquanto que, anteriormente, imaginava-se que a pulsão de
morte fosse desviada para fora, para um objeto, talvez arbitrariamente es
colhido como objeto "mau", com intenções contra o sujeito, Klein descre
veu um deslocamento diferente dos impulsos da pulsão de morte. Estes
eram agora vistos como dirigidos no sentido do objeto "bom", de manei
ra que impulsos "bons" e "maus" e objetos "bons" e "maus" parecem cón-
fundir-se. Este estado, de que o bebê inevitavelmente padece, tem de ser
imediatamente tratado, ainda que os esforços se transformem em uma lu
ta de vida inteira para discriminar entre o que é bom e mau na própria
pessoa e no mundo externo que a cerca.
R.D.Hinshelwood / 183
Em outro trabalho desse mesmo ano, descreveu a inveja como sendo um
dos motores fundamentais das fantasias agressivas: "(...) essas emoções
premem Fabian a apoderar-se das posses de outras pessoas, tanto materiais
quanto espirituais; elas o impelem, de modo irresistível, no sentido do que
descreví como sendo identificações projetivas" (Klein, 1955b, p. 154). Ela
concedeu à inveja considerável importância, como fator que promove a
identificação projetiva [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA],
A luta pelo objeto bom : Klein, com base na tendência a atacar o objeto
bom, estabeleceu como sendo o primeiro e necessário ato do ego uma dis
criminação entre estados mentais bons e maus e objetos bons e maus. Es
ta é uma forma de cisão que parece ser saudável, quer dizer, sem ódio de
masiado. Quando ódio demais acha-se presente, esta forma de cisão é per
turbada e permanecem confusões entre os impulsos e objetos bons e maus.
Se o bebê não consegue resguardar do ataque o objeto bom, ele não
pode introjetá-lo apropriadamente, de modo seguro e sem danos. Não po
de desenredá-lo dos objetos maus de que precisa fugir e, assim, começará
com a incapacidade básica de colocar suas próprias experiências na for
ma mais primitiva. No desenvolvimento normal, uma forma de cisão nor
mal separa o objeto bom do mau, de maneira que o processo de integra
ção do ego baseado em um objeto bom amado e protegido pode prosse
guir. Os elementos da inveja, o ataque a pessoas com vantagens e qualida
des especiais simplesmente por causa de sua bondade, podem ser gradual
mente modulados até chegarem ao ciúme e, por fim, a um estado mais ho
nesto de competição.
R.DMinshelwood / 185
(ti) Voracidade: A inveja é uma fantasia de entrada forçada (por métodos
projetivos) no objeto bom , e de destrutivos ataques a ele, apenas por cau
sa de sua bondade. Quando a inveja é forte, pode haver uma fantasia igual
mente onipotente de agressão introjetiva, uma absorção com violência da-
nificante, de maneira que o objeto é estragado através de uma forma vio
lenta de posse e controle. O estado interno, então, permanece sem nutri
ção, com uma fome continuamente insatisfeita. A voracidade pode resul
tar em uma acumulação de objetos danificados dentro de si, cada um de
les provocando maior demanda e fome por um objeto bom que seja absor
vido para aliviar o estado interno em piora contínua.
R.D.Hinshelmood / 187
se pode prolongar como estrutura narcísica da personalidade (Rosenfeld,
1987) [yer NARCISISMO; ESTRUTURA].
Rosenfeld (1965) considerou a confusão nas relações objetais por oca
sião do nascimento como uma dotação inerente. Um potencial especialmen
te herdado para confundir as noções pulsionais desta maneira pode bem
conformar-se às provas, reunidas de fontes psiquiátricas, da existência de
um fator genético na esquizofrenia [ver FATOR CONSTITUCIONAL].
A inveja é, assim, um dos diversos fatores que Klein encarava como
constitucionais, isto não significa que a inveja seja imodificável, ainda que
tal critica tenha sido dirigida contra o conceito. Ela é constatável no esqui
zofrênico, onde, em verdade, não foi modificada, mas, no curso normal
da evolução, o bebê humano em verdade a modifica o suficiente para po
der receber nutrição e desenvolver uma psique que evolua normalmente.
É apenas nos distúrbios mentais graves, onde a modificação fracassou, e
em alguns estados escindidos que ela permanece primitivamente ativa.
Inveja e narcisismo: Klein pouco diz em seu artigo (1957) sobre a estrutu
ra e os sistemas de fantasia do narcisismo. Acentua os detalhes de observa
ção das defesas e disto fica claro estar ela descrevendo uma elaboração
da posição esquizoparanóide. Como esta se relaciona com o estado do ego,
trata-se de uma posição narcísica (em verdade, Segai [1983] chamou-a de
"posição narcísica"):
R.D.Rinshelwooá / 189
Joffe quatro componentes do ego: (i) a capacidade de distinguir entre self
e objeto; <ii) uma certa capacidade de fantasias; (iii) a capacidade de distin
guir entre uma realização fantasiada de desejo e uma gratificação alucinató-
ria (isto e, entre a realidade interna e o mundo externo), e (iv) a existência
de uma qualidade de sentimento duradoura: "Talvez devéssemos falar de
uma organização de inveja' de tipo permanente ou semipermanente" (p, 540).
Não e inteiramente correto dizer que Joffe criticou o conceito kleinia-
no. Ele o tomou de modo equivocado, presumindo-o relacionado à frustra
ção de noções pulsionais, de vez que diz que o que é invejado é "(...) o
seio que alimenta (...) visto desde o nascimento como deliberadamente re
tendo gratificação, em seu próprio benefício" (p. 538). Em verdade, a inve
ja e o estrago de algo bom por causa de sua bondade e não por frustrar
pela retenção dessa bondade; na analise, com freqüência, porque o analis
ta não reteve consigo sua interpretação, mas forneceu-a realmente ao pa
ciente. E esta idéia de uma confusão de sentimentos maus para com um
objeto bom que escapou a Joffe.
Ele demonstrou de modo definitivo que o conceito kleiniano de inveja
não e compatível com o arcabouço de conceitos da psicologia do ego, mas
não lhe montou uma crítica a partir de uma posição que fornecesse uma
perspectiva dele, de maneira que o conceito torna-se meramente uma esco
lha entre dois arcabouços integrais. Em verdade, desde por volta de 1946
a teoria kleiniana afastou-se tanto da psicologia do ego que é difícil para
aqueles que pertencem a um dos campos apreender os importantes aspec
tos e matizes do arcabouço conceptual do outro e, portanto, distinguir com
exatidão os pontos dos quais surgiram divergências. Conseqüentemente,
o diálogo ütil entre os dois tendeu a extinguir~se.
Para os situados fora do Grupo Kleiniano, o conceito de "inveja" apoiou
a opinião de que a psicanálise kleiniana é profundamente pessimista. Por
ser constitucional a inveja, presumiu-se que fosse imutável, e isto conduz
a tentativas de reduzi-la a conceitos mais compatíveis. Terem os seres hu
manos a agressão e a destrutividade aleatória tão fundamentaímente inseri
das em nossa natureza constitui uma compreensão sombria, a que ninguém
dá boas-vindas. Em verdade, pode existir alguma verdade na opinião de
que Klein era pessimista a respeito deste trabalho:
Tanto ela quanto eu viemos a reconhecer a importância de sua inveja
destrutiva para comigo e, como sempre acontece quando chegamos a
estes estratos profundos, parecia que quaisquer que fossem os impulsos
destrutivos que lá existissem eles eram sentidos como onipotentes e,
portanto, irrevogáveis e irremediáveis. (Klein, 1957, p. 207)
Aqueles que se achavam em posição de fazer críticas mais bem informa
das do conceito kleiniano de "inveja" — notavelmente Heimann e Winni-
cott ja se haviam afastado do pensamento de Klein em considerável
grau, apos a introdução da teoria da posição esquizoparanóide. Heimann
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CRONOLOGIA
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ties"; Bion, Wilfred, 1959, "Attacks on linking"; Bion, Wilfred, 1962b,
Leaming from experience).
R.D.Hinshelwood / 193
esde cedo Klein descreveu partes do self e seus impulsos como locali
D zadas no mundo externo: "Gerard propôs que o mandássemos [a um
tigre de brinquedo] para o quarto ao lado, para executar os desejos agres
sivos dele para com o pai (...) Esta parte primitiva de sua personalidade
estava, neste caso, representada pelo tigre" (Klein, 1927, p. 172). Entretan
to, somente em 1946 é que o conceito foi inteiramente descrito e situado
em seu arcabouço teórico [ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDEJ.
Neste ponto, Klein estava descrevendo a patologia grave no desenvolvi
mento do ego do esquizofrênico.
Quando ela republicou seu artigo de 1946 em D evelopments in psycho-
analysis, de 1952, efetuou um acréscimo para sugerir o termo "identifica
ção projetiva como nome para esse processo. Desde então o conceito de
identificação projetiva" tem vindo cada vez mais para o centro do palco
da psicanálise kíeiniana. Os desenvolvimentos principais que se deram
após o falecimento de Klein em 1960 foram na compreensão da importân
cia do grande alcance do conceito. Suas origens e arcabouço são debati
dos alhures (ver 11.* POSIÇÃO ESQUÍZOPARANÓIDE; PROJEÇÃO].
O presente verbete descreverá os problemas na definição do termo, os prin
cipais desenvolvimentos ocorridos no emprego do conceito (com referência
a debates mais amplos sob determinados verbetes gerais) e alguns dos
usos não-kleinianos e críticas do conceito.
R.D.Hinshehvood / 195
tificação projetiva parecia oferecer a possibilidade de um significado simé
trico, mas suas ramificações não tornaram real essa esperança.
Neste ponto, podería ser tentador considerar-se utilizar o termo “proje
ção" no sentido de Abraham, qual seja, o de projetar objetos, e “identifica
ção projetiva" no sentido de Klein, de projetar partes do self. Mais uma
vez, porém, uma solução tão límpida não se sustenta.
Em primeiro lugar, como a citação mencionada (Klein, 1930b, p. 226)
torna claro, partes do ego (self) são projetadas com o objeto interno. Isto
é enfatizado na definição que Klein fornece da identificação projetiva: “Jun
to com esses excrementos daninhos, expelidos com ódio, partes escindidas
do ego são também projetadas" (Klein, 1946, p. 8). Além disso, nas idéias
posteriores sobre identificação projetiva, a projeção de um objeto capaz
de conter uma projeção é um pré-requisito para projetar-se parte do self
no objeto externo [ver PELE].
Em segundo, a maneira pela qual objetos e o ego são psicologicam ente
construídos contribui para a dificuldade.
Não acho que seja útil distinguir entre projeção e identificação projeti
va. O que Klein fez, em minha opinião, foi adicionar profundidade e
significado ao conceito de Freud de projeção, ao enfatizar que não se
pode projetar impulsos sem projetar parte do ego, o que envolve cisão,
e, ademais, que os impulsos não desaparecem simplesmente quando pro
196 / Dicionário do Pensamento Kleiniano
jetados, mas penetram num objeto e distorcem a percepção deste últi
mo, (Spillius, 1983, p. 322)
Contudo, Freud ocasionalmente referiu-se a este aspecto mais profundo
da projeção. Ao escrever sobre o brincar das crianças, em uma referência
que indubitavelmente influenciou Klein no início do seu trabalho, descre
veu a maneira pela qual as crianças tentam elaborar experiências traumáti
cas: "À medida que a criança supera a passividade do brinquedo, ela entre
ga a experiência desãgradável a um de seus companheiros de jogo e, des
ta maneira, vinga-se em um substituto"(Freud, 1920, p. 17). Híe está de
monstrando como uma experiência do sujeito é transferida, para tornar-
se a experiência de um objeto (em substituição).
R.D.Hinshehvooá / 197
tá acontecendo em palavras, A experiência subjetiva do analista é difícil
de apreender:
(ii) o outro é introduzir rio objeto um estado mental, como meio de comu
nicar-se com ele a respeito desse estado [ver CONTER].
(i) Identificaçãso projetiva para fins defensivos, tais como livrar o self de
partes indesejadas.
(a) Intrusão onipotente, levando à fusão ou confusão com o objeto.
(b) Fantasia concreta de viver passivamente dentro do objeto (parasitismo).
(c) Crença em uma unicidade de sentimento com o objeto (simbiose).
(d) Expulsão da tensão por alguém que, em criança, foi traumatizado
por intrusões violentas.
(íi) Identificação projetiva utilizada para comunicação.
(a) Método de chegar-se a um objeto que se acredita ser arredio.
(b) Inversão do relacionamento bebê/genitor.
(c) Identificação com similaridades no objeto, para fins narcisicos.
(iii) Identificação projetiva com o fim de reconhecer objetos e identificar-
se com eles (empatia).
Conseqüências da fantasia: As identificações projetivas, sendo uma função
de fantasia envolvida na construção da identidade do self e dos objetos,
têm conseqüências de vulto para as experiências do indivíduo. O desloca
mento do self é experienciado por um certo número de maneiras:
(i) a cisão subjacente dá a sensação de estar em pedaços [ver CISÃO];
R.D.Hinshelwood / 201
(ii) a experiência de um ego esvaziado e enfraquecido leva a uma queixa
de hão se ter sentimentos nem impulsos, e a um senso de futilidade;
(iii) esta perda para o ego pode ser experienciada como um senso de hão
se ser uma pessoa, de modo algum (despersonalização);
(iv) a identificação com o objeto leva a uma confusão com alguém mais;
(v) o ego pode sentir que partes dele foram retiradas, aprisionadas e con
troladas à força (claustrofobia);
(vi) a identificação pode resultar em um aferramento peculiarmente tenaz
ao objeto em que partes do self se acham localizadas;
(vii) surgem ansiedades a respeito de dano causado ao objeto, em resulta
do da intrusão e controle;
(viii) podem existir ansiedades graves a respeito de retaliação por parte
do objeto, por causa da intrusão violenta;
(ix) o destino do objeto, na identificação projetiva patológica, è o destino
do setf perdido, que pode vir a ser sentido como estranho e perseguidor
(ver ESTRUTURA].
R.D.Hinshehoood / 203
cerne é o vínculo edipiano. Desta maneira, o pensamento acha-se basea
do nas fantasias corporalmente experienciadas de sugar e de sexo [ver CO
NHECIMENTO INATO]. Referiu-se a este vínculo por via de uma de
suas propriedades-chave, a de um elemento a ajustar-se dentro de outro,
como sendo o relacionamento continente-conteúdo. Ao enfocar o acasala
mento dos dois objetos, um a entrar no outro, começou Bion a ampliar a
idéia da identificação projetiva para a de uma função bastante onipresen
te [ver CONTER].
A partir dai, Bion realizou um tour-de-force teórico que o levou a um
exame de largo alcance de muitíssimos problemas nas esferas psicológicas,
filosóficas, religiosas e sociais [ver BION; FUNÇÃO-ALFA, CONTER].
Das principais, entre elas salientam-se suas teorias do pensar e do relacio
namento continente-contido.
R.D.Hinshehvood / 207
dela padeceu de uma falta de método rigoroso até que Bick começou, em
1948, observações sistemáticas de bebês com as mães em base semanal
(Bick, 1964). Ela reconheceu que o primeiro objeto dá ao bebê o sentimen
to de existir, de ter uma identidade, e a personalidade é mantida reunida,
de modo passivo, por esse primeiro objeto (Bick, 1968).
Bick acreditava que a luta para manter o objeto interno bom era prece-
dida por uma introjeção da capacidade de introjetar. Mostrou ela o bebê
lutando pela capacidade de introjetar e que isto é uma função da pele, ou
melhor, uma função de sensações epidérmicas que despertam fantasias de
um objeto continente.
Ele tem de desenvolver um conceito de um espaço limitado no qual coi
sas podem ser colocadas ou do qual podem ser retidadas. A primeira reali
zação é conquistar o conceito de um espaço que segura coisas. Este concei
to e adquirido sob a forma da experiência de um objeto que mantém uni
da a personalidade. O bebê, ao receber o mamilo na boca, tem a experiên
cia de adquirir esse objeto, objeto que tapa o buraco (a boca e outros ori
fícios) situado na fronteira epidérmica. A primeira introjeção é a introje-
ção de um objeto que proporciona um espaço em que objetos podem ser
introjetados. Antes que a projeção possa acontecer, tem de haver um obje
to interno capaz de conter o que possa ser projetado para dentro de um
objeto, antes que esse objeto possa ser sentido como contendo uma projeção.
Quando essa primeira conquista fracassa, o bebê é incapaz de projetar
ou introjetar. Sem um objeto interno desse tipo, que mantém unida a per
sonalidade, ela não pode ser projetada em um objeto externo que dê às
projeções um continente. A personalidade é simplesmente sentida como a
vazar sem contenção em um espaço sem limites. O bebê tem de encontrar
outros métodos de maneter unida sua personalidade, uma formação de se
gunda pele. Meltzer (Meltzer et a l , Tustin, 1981, 1986) achou estas idéias
importantes para uma técnica analítica utilizada com crianças autistas, que
tipicamente se empenham em uma forma de mímica mecânica, experiencia
da, na fantasia, como aderindo ao objeto, ou seja, uma forma adesiva de
identificação.
(viii) Estrutura [ver ESTRUTURA]: Klein, originalmente, tentou reter a
visão clássica das instâncias internas de id, ego e supergo. Entretanto, com
suas modificações à teoria do superego [ver 7. SUPEREGO; 5. OBJETOS
INTERNOS], o mundo interno veio a ser encarado como muito mais flui
do. Os objetos internos são variados, amorosos e odientos, e incluem a "fi
gura combinada dos pais", particularmente importante. A personalidade
é estruturada por relacionamentos com todos estes objetos internos.
Importante na visão estrutural do mundo interno é o estado de identifi
cação ou não entre o ego e os objetos. Alguns objetos serão estreitamente
assimilados ao ego, enquanto que outros não ficarão tão próximos. Em
verdade, alguns objetos podem fracassar em serem assimilados sob qual
quer aspecto e existirão como objetos estranhos ou corpos estranhos [ver
R.D.Hinshelwooâ / 209
no comum está claramente projetando, como grupo, no inimigo. Semelhan
temente, um grupo que mantém sua coerência pela lealdade comum a um
líder único constitui também uma condição em que os membros se acham
coletivamente projetando qualidades no último, e um líder bem sucedido
dá a recíproca com uma projeção de qualidades complementares, que seus
seguidores coletivamente introjetam e com as quais se identificam.
A identificação projetiva foi assim ampliada por Jaques para demons
trar o importante processo de coesão grupo e a qualidade tenaz, similar à
da cola, das lealdades a grupos que os membros individuais desenvolvem.
Isto descrevia o misterioso efeito de "contágio" descrito por Le Bon em gru
pos, e que Freud (1921) explicara como sendo o poder do hipnotizador so
bre o seu jeito em transe. Embora a explicação de Freud esteja apenas subs
tituindo um mistério (o da hipnose) por outro, ela poderia ser desenvolvi
da demonstrando-se que os processos da identificação projetiva e introjeti-
va são os processos subjacentes ou hipnotismo.
R.D.Hinshelwood / 211
que se achava implicada na confusão entre self e objeto (Rosenfeld, 1965).
Visões conflitantes deste tipo precisam ser reconciliadas.
Entretanto, quando Kernberg tentou implantar o conceito em seu arca-
bouço teórico, suas explicações foram expressas em uma terminologia de
forma profundamente diversa: "(...) o que é projetado de maneira muito
ineficaz não é 'agressão pura', mas uma representação do self ou uma re
presentação objetai vinculada com esse derivado do impulso" (Kernberg,
1975, p. 80-1). "Representações do self" e "representações objetais" não
são contemporâneas, em termos de desenvolvimento, com a identificação
projetiva em sua forma original. Um "derivado do impulso" substitui "u-
ma parte escindida do self". Falta a idéia de fantasia de objetos concreta
mente sentidos e partes do self. O efeito é um híbrido curioso de termos
teóricos, no qual os conceitos da psicologia do ego e da teoria das rela
ções objetais se deformaram em formatos inteiramente diferentes. O que
parece ter acontecido é que houve um embate inevitável entre processos e
estruturas psíquicas objetivamente descritos e fantasias inconscientes subje
tivamente experienciadas. A metapsicologia kleiniana, expressa nos termos
das próprias fantasias do paciente, foi parcialmente traduzida para a ter
minologia de uma ciência objetiva [ver SUBJETIVIDADE].
R,D,Hinskelwood / 213
Deve haver certa validade na crítica de que bebês não podem desempe
nhar suas identificações projetivas por maneira tão sofisticada quando os
pacientes adultos. Os médicos extraordinariamente sutis de usar o analis
ta, que Joseph (1975), por exemplo, descreve, acham-se a uma longa dis
tância do simples grito de um bebê que engaja a mãe no mundo dele. A
descrição kleiniana da identificação projetiva como primitiva tem de ser
ressalvada quando se descrevem manobras interpessoais sofisticadas desse
tipo, e restrita à qualidade primitiva da concretude [concreteness] das fan
tasias existentes por trás dos métodos sutis.
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í
B
Verbetes
Gerais
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A L L TS 1 Biografia. Nascido na Alemanha em 1877,
Xxdi 1Abraham começou a interessar-se pela psi
canálise enquanto fazia um estágio em psiquiatria em Zurique, com Jung.
Em 1907, começou uma clínica psicanalítica em Berlim, a primeira na Ale
manha, e fundou a Sociedade Psicanalítica Alemã em 1910.^ Tornou-se pre
sidente da Associação Psicanalítica Internacional em 1924, mas logo fale
ceu, no auge de sua capacidade e reputação profissional, em 1925 (Hilda
Abraham, 1974).
Foi persuadido por Melanie Klein a analisá-la, em 1924, embora a análi
se fosse interrompida cerca de quinze meses depois por causa da saúde
má de Abraham. Ele também analisou um certo número de analistas ingle
ses, inclusive James Glover, Edward Glover e Alix Strachey. Abraham go
zava de uma posição especial dentro do movimento psicanalítico, de vez
que fora, com Jung (em Zurique), Ferenczi (em Budapeste) e Jones (em
Londres), um dos primeiros pioneiros da psicanálise fora de Viena. Mais
que isso, porém, sua importância é a de um observador clínico notável.
R.D.Hinshelwood / 225
de formas sádicas de introjeção e projeção foi, posteriormente, grandemen
te realçada por Klein [ver 3.AGRESSÃO].
O interesse de Abraham, portanto, residia nas manifestações múltiplas
do sadismo e da agressividade; exemplificando, seu artigo (1919) sobre pa
cientes difíceis é uma descrição famosa das manifestações ocultas de agressão.
Narcisismo e relações objetais: O falecimento de Abraham, porém, deixou
incompleto o seu trabalho. Embora se achasse investigando a fase do nar
cisismo primário, que ele e Freud achavam, na ocasião, durar do nascimen
to até por volta da idade de dois anos, ele estava, na realidade, descreven
do a incorporação e a expulsão de objetos ou fragmentos de objetos. Ain
da existe hoje desacordo a respeito da natureza das relações objetais du
rante o período do narcisismo primário [ver NARCISISMO]. O trabalho
de Abraham, de maneira apenas esboçada, sugeria que o bebê se relacio
na a objetos nesse estágio primário, mas que se trata de tipos muito esqui
sitos de objetos, a que deu o nome de objetos parciais, e teve dificuldade
para descrever o desenvolvimento, em um estágio posterior, do verdadei
ro amor objetai [ver OBJETOS PARCIAIS; OBJETO TOTAL; AMOR].
Esta distinção foi de grande importância no desenvolvimento que Klein fez
da idéia da posição depressiva [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA],
A dívida de Klein para com Abraham é enorme, não apenas por anali
sá-la, mas por fornecer-lhe um pano de fundo de teoria bem fundada a
desenvolver.' Klein foi importante para Abraham, também, de vez que seu
trabalho com crianças trazia provas confirmatórías a respeito dos postula
dos dele sobre o sadismo das fases pré-genitais iniciais e a importância
da introjeção e da projeção [ver ANÁLISE DE CRIANÇAS]. Embora Abra
ham, tal como Freud, mal mencione Klein, é possível que as próprias ob
servações do primeiro, em 1924, se valessem do material que Klein esta
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R.D.Hinshehvood / 227
a um lugar central do conceito-chave da posição depressiva [ver 10. PO
SIÇÃO DEPRESSIVA],
Os sentimentos conflitantes podem, em contraste, ser alternados, em
estados mentalmente dissociados um do outro, ou cindir-se [ver CISÃO],
dando origem a uma considerável instabilidade, na medida em que amor
e ódio abruptamente dão lugar um ao outro [ver OBJETO IDEAL]; ou im
pulsos podem se fundir, tal como, por exemplo, a mistura de íibido e des-
trutividade (sadismo), que dá origem a uma perversão sádica sexual excitada.
R.D,Hinskelwood / 229
da análise de pacientes adultos. Buscou então provas diretas do desenvol
vimento da sexualidade a partir da observação de crianças e solicitou aos
pais de seu círculo em Viena que registrassem a atividade e a conversa de
seus filhos. O resultado disto foi o "caso' do Pequeno Hans, que serviu
para confirmar belamente as teorias provisórias. Situação semelhante sur
giu mais tarde, quando Freud refinara e levara suas teorias mais além, par
ticularmente em resultado do interesse que ele e Abraham haviam assumi
do pelos pacientes psicóticos, algo que deu origem à teoria do narcisismo
(Freud, 1914) e, subseqüentemente, ao lugar dos mecanismos de introjeção
e projeção e ao desenvolvimento do modelo estrutural (Freud, 1923). Hou
ve ainda uma outra volta a um interesse psicanaíítico pelas crianças a par
tir de 1917 [ver 1. TÉCNICA],
Psicanálise e edu cação: Em Viena, Hug-Hellmuth (1921) dera início a uma
forma psicanaliticamente inspirada de instrução pedagógica infantil. Ela,
contudo, não utilizava interpretações, tal como na análise de adultos, ou
sequer, a propósito, tal como o pai do Pequeno Hans havia feito. Hug-
Hellmuth acreditava que a criança, diferentemente do adulto, não era mo
tivada a procurar a análise e, portanto, interpretações não lhe significariam
nada. Era a família que sofria, achava ela, e não a criança. Em acréscimo,
achava que o ego ainda não havia se desenvolvido suficientemente em for
ça para suportar o peso adicional da interpretação psicanalítica. Acredita
va, também, que as crianças só deveríam ser vistas em suas próprias casas
e, daí, não existir oportunidade de desenvolver-se uma transferência com elas.
Os primeiros pacientes infantis: Em Budapeste, Klein (1918-19) começou
a praticar uma forma diferente de análise de crianças. Esta, sabemos ago
ra, foi feita, primeiro de tudo, com seus próprios filhos, atividade à qual
hoje se franziría o cenho (e ela parece ter escondido o fato após a publica
ção de seu primeiro trabalho em 1919 [Petot, 1979; Grosskurth, 1986]), em
bora na ocasião, com as provas do tratamento bem-sucedido do Pequeno
Hans, essa forma parecesse muito mais correta. Fora incentivada nisso por
Abraham, que analisara a filha (Abraham, 1974), e, em verdade, Freud
também analisou a filha (Gay, 1988).
Bastante cedo Klein chegou a conclusões diferentes das de Hug-Hell
muth. Ela acreditou que as crianças podiam, uma vez tivessem experiencia-
do interpretações de suas ansiedades, ser (inconscientemente) motivadas,
dentro de si mesmas, para a análise. Em verdade, acreditava Klein que as
crianças possuíam uma compreensão inconsciente muito maior de seus pró
prios problemas e da natureza do auxílio interpretativo do que parecia (re
latado por Alix Strachey, 1924).
A primeira prática de Klein foi responder francamente e de modo aber
to às solicitações de conhecimento sexual que as crianças apresentavam.
Nisto, ela foi influenciada pelo conselho de Freud ao pai do Pequeno
Hans (Freud, 1909) e também pela história qlínica que aquele descrevçra
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R.D.Hinshelwood / 233
de preocupação e culpa, Bion considerou o medo da aniquilação como sen
do uma experiência persistentemente ameaçadora durante toda a vida.
Qualquer mudança faz expressar-se a ameaça, mas a mudança é parte
necessária da vida e do pensamento. Bion enfocou a necessidade de mudar
e desenvolver o pensamento, e suas concepções aplicam-se a todas sa for
mas de mudança de personalidade. A conseqüência de sua visão é que to
do desenvolvimento traz em sua esteira a ameaça de catástrofe para a men
te, e o desenvolvimento repousa em pequenas oscilações entre a fragmenta
ção esquizoparanóíde e a preocupação da posição depressiva, algo a que
deu a notação de "Ep-D" [ver Ep-D].
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* 1 1 1 *
Tanto Segai (1979) quan-
A n sied ad e d ep ressiva
a
to Grosskurth (1986) su
gerem que o desenvolvimento aa compreensão de Klein a respeito do sofri
mento da posição depressiva foi estimulado por sua própria desolação pe
la morte de seu filho, em 1933.
R.D.Himhelwood / 235
De mãos dadas com este desenvolvimento dá-se uma mudança da mais
alta importância, a saber: de uma relação objetai parcial para a relação
com um objeto completo (...) o ego chega a uma nova posição, que for
ma a fundação da situação chamada de perda do objeto amado. Somen
te quando o objeto é amado com o um todo é que a sua perda pode ser
sentida como um todo. {Klein, 1935, p. 264)
O medo da perda do objeto, tipicamente no luto real, repete uma perda infantil:
A pungência da perda real de uma pessoa amada é, em minha opinião,
grandemente aumentada pelas fantasias inconscientes que a pessoa enlu-
tada tem de haver perdido também os seus objetos "bons" internos. Ela
sente então que os objetos internos "maus" predominam e que seu mun
do interno acha-se em perigo de ruptura. (Klein, 1940, p. 353)
R.D.Hinshehvood / 237
da mãe. Durante os primeiros meses de vida, tais estados de integração
são de curta duração. (Klein, 1952, p. 65)
Estes estados representam um certo 'progresso [inicial] em integração que
depende de os impulsos amorosos predominarem temporiamente sobre os
impulsos destrutivos" (Klein, 1952, p. 69). isto sugere que estes momentos
de integração são os promissores primórdios da diminuição na dominância
da ansiedade persecutória.
(ii) Subseqüentemente, um estado mais sinistro de coisas foi descrito, em
resultado das tentativas pioneiras de psicanalisar esquizofrênicos utilizan
do conceitos kleinianos. Rosenfeld, reconhecendo os estados transitórios
de integração, acrescentou, contudo:
Desejo fazer alguns acréscimos tentativos a estes conceitos, e sugiro que,
sob certas condições externas e internas em que impulsos agressivos tem
porariamente predominam, podem surgir estados em que impulsos de
amor e ódio e objetos bons e maus não podem ser mantidos separados
e são assim sentidos como misturados ou confusos. (Rosenfeld, 1950, p. 53)
Este fracasso da cisão primária que mantém o objeto bom intacto e separa
do do mau na posição esquizoparanóide arcaica resulta em confusão de im
pulsos e objetos.
Klein endossou parcialmente isto e concordou que uma forma particu
larmente persecutória de culpa resulta de circunstâncias especiais em que
a inveja é anormalmente alta, principalmente por razões constitucionais,
mas pareceu preferir apegar-se ao termo "culpa" para descrever a experiência:
Parece que uma das conseqüências da inveja excessiva é um desencade-
amento precoce da culpa. Se uma culpa prematura é experienciada por
um ego que ainda não é capaz de suportá-la, a culpa é sentida como
perseguição e o objeto que desperta a culpa é transformado em um per
seguidor. O bebê então não consegue elaborar a ansiedade persecutória
nem a depressiva, porque elas se tornam confundidas uma com a outra.
(Klein, 1957, p. 194)
Segai (1956) também, ao analisar esquizofrênicos, demonstrou claramente
que estes possuem uma capacidade de experienciar depressão, apesar de
sua fixação na posição esquizoparanóide. O recurso deles é a fragmenta
ção imediata e a projeção dos fragmentos de si mesmos, quando são pos
tos em perigo por sentimentos depressivos. A deterioração conseqüente
de seu próprio estado mental acha-se vinculada à experiência, pelo analis
ta, da depressão e do desespero projetados, em nome do paciente.
R.D.Hinshelwood / 239
Em seu artigo de 1940, porém, Klein mostrou existirem diversas formas
de reparação:
(a) a reparação maníaca conduz uma nota triunfante em que a reparação
se baseia em uma inversão, humilhante para os pais, da relação criança-
genitor [ver REPARAÇÃO MANÍACA];
(b) a reparação obsessiva consiste em uma repetição compulsiva de ações
do tipo de desfazer, sem um elemento criativo real, e destinadas a aplacar,
com freqüência de maneira mágica, e
(c) uma forma de reparação baseada no amor e no respeito pelo objeto
[ver REPARAÇÃO].
R.D.Hinshehuood / 241
Heimann (1955) também ilustrou a situação típica de um objeto que foi
assimilado e se torna um recurso adicional para o ego com a criança que
introjeta o seio da mãe após ser alimentada e o identifica com seu polegar;
mais tarde, quando com fome, pode sugar esse objeto intêrno sob a for
ma do polegar, a fim de, em ponto posterior, gerar fantasias de satisfação
para protegê-lo de um objeto hostil e gerador de fome [ver 5. O&JETOS
INTERNOS].
No decurso do desenvolvimento há "(...) uma assimilação progressiva
do superego [objeto interno hostil] pelo ego" (Klein, 1952, p. 74); "(...) o
aumento da capacidade do ego de aceitar os padrões dos objetos externos
(...) está ligado à síntese maior dentro do superego e à assimilação crescen
te do superego pelo ego" (Klein, 1952, p. 87). À medida que objetos totais
se desenvolvem na posição depressiva, eles se tornam mais disponíveis pa
ra apoio e identificação, internamente, e o mundo interno se transforma
em uma coleção hostil menor de objetos internos estranhos.
A - — . C A *
As relações entre
A tu a ça o n a tran sferen cia o analista e o pacien
te podem encenar impulsos, relações objetais ou defesas primitivas e for
mar uma resistência ao trabalho da análise (Freud, 1914). Essa encenação
na transferência tem sido chamada de "atuação dentro da sessão" (Sandler,
Holder e Dare, 1973). Na época de Freud, presumia-se que a resistência e
a defesa se expressassem na transferência como uma perturbação às asso
ciações livres. Betty Joseph, no entanto, torna a transferência importante
por outra maneira, qual seja, "examinar a maneira pela qual os pacientes
nos usam — os analistas — para ajudá-los com a ansiedade" (Joseph, 1978,
p. 223).
R.D.Hinshelwood / 243
Na transferência, algo está constantemente acontecendo, o analista es
tá constantemente sendo usado. Isto não é a análise da resistência e da de
fesa, mas sim a representação, no relacionamento com o analista, de sutis
e amiúde extremamente obscuras relações objetais. O analista é submeti
do à manobra inconsciente (de seu inconsciente), a fim de que o paciente
possa organizar as partes de si próprio, e seus objetos internos, "para aju
dá-lo com sua ansiedade". As palavras do paciente, portanto, têm de ser
escutadas, não primariamente pelo conteúdo delas, mas mais pelo que vi
sam a fazer ao analista e à mente deste.
Outros analistas kieinianos apoiaram recentemente estas conclusões:
O paciente não se expressa somente em palavras. Usa também ações e,
às vezes, palavras e ações. O analista escuta, observa e sente as comu
nicações do paciente. Escrutiniza suas próprias reações ao paciente, ten
tando entender os efeitos que o comportamento deste têm sobre ele pró
prio, analista, e entende isto como uma comunicação partida do pacien
te (ao mesmo tempo em que está ciente daquelas reações que provêm
de sua própria personalidade). É isto, abrangido em sua totalidade, que
é apresentado ao paciente como uma interpretação. (Riesenberg-Mal-
colm, 1986, p. 434)
Segai (1982), colocando a questão de modo sucinto, escreveu: "o desen
volvimento infantil arcaico se reflete na parte infantil da transferência.
Quando ele é bem integrado, dá origem a uma comunicação não-verbal
subjacente, que dá profundidade a outras comunicações. Já quando não é
integrado, dá surgimento à atuação dentro da sessão como um modo pri-
'mitivo de comunicação" (Segai, 1982, p. 21).
Joseph demonstrou que os pacientes tentam preservar um equilíbrio psí
quico, incertamente postado entre a posição esquízoparanóide e a posição
depressiva (Joseph, 1989) [ver EQUILÍBRIO PSÍQUICO]. O movimento
no sentido da posição depressiva parece ser particularmente bloqueado
por uma forma específica de sofrimento psíquico [ver DOR PSÍQUICA].
As personalidades limítrofes, especialmente, parecem sentir que seu equi
líbrio é precário e valem-se então de uma organização de suas defesas que
é extremamente rígida. Estes estados estão associados com o desenvolvi
mento sob a dominância da pulsão de morte e destrutividade [ver PUL-
SÃO DE MORTE] e essas organizações com freqüência envolvem a domi-
nância das partes "más" do self sobre as "boas" [ver ORGANIZAÇÕES
PATOLÓGICAS].
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R.D.Hinshekoood / 245
mental e das formas aberrantes em que ele pode se dissolver. A inversão
do processo normal de integração mental ocasiona uma desintegração em
fragmentos de dados sensórios [ver PENSAR; ELEMENTOS-BETA], resul-
tando-em falta do desenvolvimento adequado para pensamentos pensáveis
(Meltzer, 1978). Ele também ligou isto ao trabalho de Bion sobre a identi
ficação adesiva derivado da observação de bebês "normais" a partir do
nascimento [ver IDENTIFICAÇÃO ADESIVA]. Parece haver uma corres
pondência significativa entre observações de crianças autistas e de bebês
normais, a partir dos primeiros dias (Meltzer, 1975). Bick (1968) demons
trou a maneira pela qual o bebê primeiro vem a adquirir o senso de ser
mantido reunido, através da estimulação da pele. Quando isto não aconte
ce de modo suficiente, a criança fica com um senso deficiente de integra
ção, imaginado como uma incapacidade de sustentar o senso de um espa
ço continente. A ausência deste espaço continente, quer interna a ela pró
pria, quer externa, caracteriza a criança autista [ver PELE]; em resultado
disso, a criança encara intensas sensações perceptuais e outras sensações
como sendo mecanismos para sustentá-la reunida.
Como geralmente acontece com novas compreensões das experiências
arcaicas da primeira infância, elas podem ser utilizadas para entender os
problemas posteriores, em distúrbios adultos. Sidney Klein (1980) demons
trou aspectos autistas de pacientes que apresentavam problemas neuróti
cos. Eles se achavam encapsulados em rígido isolamento estrutural e eram
amíúde concebidos em sonhos como insetos duros ou animais com carapa
ças, remaniscentes a defensividade secundária dura e muscular descrita
por Bick (1968). Estas paries escindidas da personalidade podem estar rela
cionadas à organ zaçáo de elementos profundamente narcísicos descrita
por Rosenfeld >1971) b - r ESTRUTURA].
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R.D.Hínshelwood / 247
Originalmente, tratava-se de um método de ensinar psicoterapeutas de crian
ças e psicanalistas em formação a observar, ao invés de intervir. As obser
vações, contudo, produziram resultados imediatos [ver OBSERVAÇÃO
DE BEBÊS].
(ii) Sensação epidérmica primária: A observação mais importante de Bick
referia-se à experiência passiva que tem o bebê de ser mantido unido por
um objeto externo sentido através das sensações da pele [ver PELE], e de
passivamente despedaçar-se se esse objeto falha (Bick, 1968). A pele é deci
siva em sua função de fornecer provas da existência de um objeto desse
tipo. Isto se acha em contraste com as experiências descritas por Bion e
outros, ao trabalharem com esquizofrênicos, de um processo ativo de ci
são e aniquilação do self.
A idéia de que a experiência de espaço interno tem de ser adquirida im
plica a possibilidade de um fracasso em consegui-lo e, portanto, da neces
sidade de medidas compensatórias, as mais primitivas de todas as defesas,
a que Bick (1968) deu o nome de fenômenos de "segunda pele" [ver PELE],
(iii) O objeto,prim ário: Bick conseguiu provas, em detalhes muito maiores,
da natureza deste primeiro objeto que mantém unida a personalidade [ver
12. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE] e tem de ser introjetado a fim de
dar um senso de espaço no qual introjeções possam ser colocadas. A opi
nião de que a experiência de um espaço interno é uma experiência adquiri
da, através de uma experiência adequada, contrasta com a idéia de uma
experiência inata de espaço interno, implícita nas teorias de Bion.
(iv) Identificação adesiva: O possível fracasso em desenvolver um objeto
(espaço) integrador primário desse tipo parece ser confirmado pelo traba
lho com crianças autistas (Meltzer et a l , 1975) [ver AUTISMO]. Bick e
Meltzer (Meltzer, 1975, 1986) colaboraram na descrição das maneiras pe
las quais as crianças autistas se desenvolvem sem senso de espaço interno
ou externo. O relacionamento delas com objetos parece ser uma "coíar-se
ao" objeto, mecanismo que recebeu o nome de "identificação adesiva"
[ver IDENTIFICAÇÃO ADESIVA].
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* N .T.: Trata-se de uma condecoração concedida pela Coroa aos oficiais por bravura em combate.
R.D.Hirtshehoood / 249
balho e pesquisa em desenvolvim ento organizacional (Rice, 1963; Menzies
Lyth, 1988, 1989); (iv) à introdução de um método novo e duradouro de
seleção de oficiais nas forças armadas (Bion, 1946); (v) à compreensão da
psicologia social dos grandes grupos (Turquet, 1975), e (vi) ao desenvolvi
mento de m étodos de ensino em grupos (Gosling et al., 1967).
A contribuição de Bion à psicanálise pode ser sucintamente resumida
nos subtítulos seguintes, dos quais exposição adicional aparece nos verbe
tes que a eles se referem:
(2) Empatia. Uma vez uma forma patológica de identificação projetiva tenha
sido isolada, uma forma mais "normal", dirigida com menos ódio, podia
ser compreendida. Processos benignos do tipo da empatia, que envolve "co
locar-se no lugar do objeto", tornaram-se características importantes para
entender o efeito terapêutico da psicanálise [ver 1. TÉCNICA].
(4) Conter. Bion (1962a) descreveu uma nova teoria do relacionamento que
avança além do paradigma tradicional da sexualidade. Entretanto, ela po
de ser enunciada de maneira inversa, qual seja, que o complexo de Édipo
e seu distúrbio podem vir a investir de energia qualquer destes contatos in-
terpenetrantes. Pode-se pensar no contato como sendo um processo de con
ter. Determinada coisa torna-se comprimida em outra, com ou sem violên
cia. Bion descreve então toda uma fenomenologia do relacionamento çon-
tinente-contido, na qual o que é contido pode fazer explodir o continente
ou então, por sua vez, pode ser constringido e sufocado pelo continente,
ou ainda, alternativamente, pode dar-se uma adaptação mútua entre os
dois. Descreveu ele formas sim bióticas, parasitárias e comensais do relacio
namento (Bion, 1970). Embora tenha descrito esta forma interpretante de
contrato primeiro de tudo no processo de desenvolvimento de pensamen
tos e teorias, ele estendeu-a a todos os tipos de fenômenos: colocar pensa
mentos em palavras; o pensamento, ou o sentimento, na mente do indiví
duo; o indivíduo em seu grupo social; o bebê na consciência [conscious-
ness] da mãe (reverie), etc. [ver CONTER.]
R.D.Hinsheíwood / 251
(5) A comunicabilidade do pensamento psicanalítico, Mais tarde, em sua car
reira, Bion começou a interessar~$e pela maneira pela qual os psicanalistas
entendem — ou entendem mal uns aos outros. Primeiro de tudo, ele in
ventou uma grade (Bion, 1963), na qual, sobre duas coordenadas, locali
zou todos os tipos possíveis de comunicações. Uma das coordenadas era
uma cascata serial de relações continentes em diferentes níveis de abstra
ção, indo de dados sensórios muito primitivos até teorias gerais do tipo
mais abstrato (de sonhos e fantasias até conceitos, sistemas teóricos e cál
culo algébrico). A outra coordenada apresentava a maneira pela qual estes
elementos mentais podiam ser usados. Dessa maneira, Bion tentou trazer
precisão à comunicação a respeito da psicanálise e, em verdade, rigor ao
pensamento que se deve comunicar.
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Em seu brincar, as crianças repetem tudo que lhes causou grande impres
são na vida real e, assim fazendo, ab-reagem à força da impressão e,
como se poder ia dizer, tornam-se senhoras da situação. Por outro lado,
porém, é óbvio que todo o seu brincar é influenciado por um desejo
que as domina a totalidade do tempo: o desejo de serem crescidas e ca
pazes de fazer o que as pessoas crescidas fazem. Pode-se também obser
var que a natureza desagradável de uma experiência nem sempre a tor
na inapropriada para o brinquedo. Se um médico examina a garganta
de uma criança ou lhe faz alguma pequena operação, podemos estar in
teiramente certos de que estas experiências assustadoras serão o tema
do brinquedo seguinte, mas não devemos, com relação a isso, passar
por cima do fato de existir uma obtenção de prazer, provinda de outra
fonte. Quando a criança passa da passividade da experiência para a ati
vidade do brincar, ela passa adiante a experiência desagradável a um
de seus companheiros de jogo e, desta maneira, vinga-se em um substi
tuto (Freud, 1920, p. 17.
(ii) a criança busca alívio quanto aos reveses de seu mundo interno median
te a externalização das piores situações persecutórias para o mundo externo;
R.D.Hinshelwood / 255
(iii) parte do desenvolvimento natural da criança é buscar novos objetos
como substitutos de anteriores, e brinquedos [coisas] e companheiros de
jogos são uma das formas de praticar uma simbolização deste tipo, e
(iv) o voltar-se para novos objetos é também movido pelos conflitos com
o objeto arcaico, de maneira que se ganha uma folga pela descoberta de
um novo objeto (um símbolo),
Estes processos são inconscientes e representam a mente da criança a lutar
com as dificuldades que lhe são colocadas por seus impulsos e seus obje
tos. O brincar, na visão de Klein, era uma coisa séria para a criança e não
meramente um prazer trivial, nem, tampouco, apenas um exercício no do
mínio “do meio ambiente físico.
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R.D.Hinshelwood / 257
A experiência do ego de despedaçar-se desta maneira é uma manifesta
ção da pulsão de morte [ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDEj.
Üso inicial. O conceito de cisão foi tirado por Freud da idéia mais antiga da
dissociação. A mente era considerada como existindo em partes separadas,
o que explicava o fenômeno da personalidade múltipla. Estas idéias de dis
sociação, oriundas da filosofia do século XVIII, foram utilizadas por Bleu-
ler para descrever e denominar a esquizofrenia.
Freud, contudo, afastou-se da psicologia associacionista ao descobrir o
inconsciente e a teoria da repressão. Desde esta época muito inicial, a psi
canálise foi uma teoria de conflito da mente. A maioria dos acontecimen
tos mentais podiam, para Freud, ser teoricamente entendidos com o con
ceito da repressão, sem recorrer-se a qualquer idéia ulterior de cisão. Com
muito atraso, contudo, em trabalho escrito em 1938, relatou ele achar-se
ciente do fenômeno da cisão do ego. Nesse artigo, descreveu claramente
a adoção, pela mente, de dois pontos de vista separados. Seu exemplo foi
o do fetichista que ao mesmo tempo acreditava haver a mulher perdido o
pênis dela e também que ela tinha um pênis (representado pelo objeto de
fetiche). Este mecanismo não é resultado da repressão, ainda que um dos
pontos de vista possa ser reprimido. E como a criança que acredita em Pa
pai Noel e tem toda a excitação e a reação emocional apropriada na noi
te de Natal, ainda que tenha aprendido a realidade de que ele é "apenas
papai fantasiado". Do mesmo modo, o comentário preconceituoso de que
"alguns de meus melhores amigos são estrangeiros" apresenta uma atitu
de cindida semelhante.
Há várias formas de cisão: (i) cisão do objeto e (ii) cisão do ego.
(i) Cisão do objeto .-O trabalho inicial de Klein concentrou-se nos objetos
e suas vicissitudes. Demonstrou ela que, desde extremamente cedo na vi
da, os objetos não são objetivamente percebidos e entendidos mas que,
em verdade, concedem-se-lhes com freqüência naturezas inaturalmente bo
as ou inaturalmente más [ver OBJETOS PARCIAIS]. As crianças cindem
os seus objetos de maneira a que as imagos dos pais sejam separadamen
te dotadas, no brinquedo imaginativo dos filhos, de qualidades e inten
ções inteiramente boas e benignas ou, então, inteiramente más. Em resulta
do disso, "cisão" torna-se um termo empregado para descrever a maneira
pela qual objetos vêm a ser separados em seus aspectos bons e seus aspec
tos maus.
Então, a introjeção e a projeção da versão boa ou má do objeto vem a
desempenhar um papel de vulto no desenvolvimento da personalidade
[ver REALIDADE INTERNA], A integração de tais cisões nos objetos em
uma forma realista de discriminação tornou-se, para Klein, o aspecto-cha-
ve do desenvolvimento infantil, A percepção cada vez mais realística dos
objetos ocasiona a posição depressiva [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA],
R.D.Hinshelwood / 259
(b) uma cisão coerente (tal como em "bom" versus "mau") ou uma cisão
fragmentadora.
Dessa maneira, os quatro tipos possíveis de cisão são: uma cisão coerente
no obfeto, uma cisão coerente no ego, uma fragmentação do objeto e uma
fragmentação do ego. Claramente, algumas delas acompanham-se mutua
mente.
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R.D.Hinsheíwood / 261
to um reflexo, A teoria, contudo, sugeria que o bebê terá alguma represen
tação mental deste evento, isto é, haverá uma fantasia de um objeto para
o qual voltar-se e do qual sugar. Isaacs (1948), em seu artigo-chave, esten
de-se com certa minuciosidade a fim de tentar transmitir a idéia de um co
nhecimento somático realmente engastado nas sensações físicas. Freud já
se interessara sucintamente por este debate em suas reflexões sobre o Pe
queno Hans: 'X-..) as sensações de seu pênis haviam-no colocado no cami
nho de postular uma vagina" (Freud, 1909, p, 135). Klein foi mais explíci
ta: (...) a criança muito pequena, que aparentemente nada sabe a respei
to do nascimento, possui um 'conhecimento' muito definido do fato de as
crianças crescerem no útero" (Klein, 1927, p. 173). Entre os críticos de
Klein, houve considerável resistência em aceitar o conhecimento inato.
Dotes cognitivos inatos: Na formulação a que Isaacs deu início parecería
que tem-se de postular certas capacidades inatas a efetuar distinções:
(i) de distinguir algo que é motivado para o bem ("objeto bom") de algo
que é motivado para o mal ("objeto mau");
(ii) distinguir o self do que não é self (objetos).
Estas capacidades de que se é dotado [ver EGO] são inerentes às sensações
corporais. No processo de representação mental [ver FUNÇÃO-ALFA],
estas sensações são experienciadas como relacionamentos afetivos com ob
jetos. Os objetos que são então fantasiados não são físicos ou, em verda
de, concretos no sentido normal, mas são dotados de um senso primitivo
de lugar, dentro ou fora do self, e de motivações afetivas de benevolência
ou malevolência. No primeiro caso, portanto, eles são objetos afetivos
[ver OBJETOS PARCIAIS].
O paciente (...) mostrou que havia projetado seu self danificado, conten
do o mundo destruído, não apenas em todos os outros pacientes, mas
em mim, e, por essa maneira, me modificara. Entretanto, em vez de fi
car aliviado por esta projeção, ele tornou-se mais ansioso, por estar com
medo do que eu estava então colocando de volta nele, e, em conseqüên-
cia, seus projetos introjetivos tornaram-se gravemente perturbados. (Ro-
senfeld, 1952, p. 80-1)
R.D.Hinshehoood / 263
Através de toda a análise o paciente valeu-se da identificação projetiva
com uma persistência a sugerir tratar-se de um mecanismo do qual ele
nunca fora suficientemente capaz de valer-se; a análise concedeu-lhe a
oportunidade para o exercício de um mecanismo do qual havia sido pri
vado (...) houve sessões que me levaram a supor que o paciente sentia
haver algum objeto que lhe denegava o uso da identificação projetiva
(...) há elementos a indicar que o paciente sentia que partes de sua per
sonalidade que desejava repousar em mim tinham seu ingresso por mim
recusado (...) Quando o paciente esforçou-se por livrar-se dos temores
de morte que eram sentidos como poderosos demais para que sua perso
nalidade os contivesse, ele escindiu seus medos e os colocou em mim,
com a idéia aparentemente sendo que, se lhes fosse permitido repousar
aí por tempo suficiente, eles experienciariam modificação por parte de
minha psique e poderíam então ser reintrojetados com segurança. Na
ocasião que tenho em mente, o paciente sentira (...) que eu os havia
evacuado de modo tão rápido que os sentimentos não haviam sido mo
dificados, mas sim se tornado mais penosos (...) ele esforçou~se por for
çá-los para dentro de mim com maior desespero e violência. Seu com
portamento, isolado do contexto da análise, podería ter parecido ser
uma expressão de agressão primária. Quanto mais violentas eram as
suas fantasias de identificação projetiva, mais assustado ele se tornava
comigo. Houve sessões em que um comportamento desse tipo expressou
agressão não provocada, mas cito esta série porque ela mostra o pacien
te sob uma luz diferente, com sua violência sendo uma reação ao que
ele sentia ser minha defensividade hostil. A situação analítica fez cres
cer-me na mente a sensação de estar assistindo a uma cena extremamen
te remota. Senti que o paciente fora testemunha, na primeira infância,
de uma mãe que obedientemente reagia às demonstrações emocionais
do bebê. A reação submissa tinha em si um elemento de impaciência:
— Não sei o que há com esta criança. — Minha dedução foi que, a fim
de entender o que a criança queria, a mãe deveria ter tratado o choro
do bebê como sendo mais que uma exigência da presença dela. Do pon
to de vista do bebê, ela deveria ter recebido em si e, assim, experiencia-
do, o medo de que a criança estivesse morrendo. Era este medo que a
criança não conseguia conter. Ela esforçou-se por escindi-lo junto com
a parte da personalidade em que residia e projetá-lo para a mãe. Uma
mãe compreensiva é capaz de experienciar o sentimento de pavor com
que este bebê estava se esforçando por lidar através da identificação
projetiva e, ainda assim, manter uma aparência equilibrada. Este pacien
te tivera de lidar com uma mãe que não podia tolerar a experiência de
tais sentimentos e reagia quer denegando-lhes ingresso, quer, alternati
vamente, tornando-se presa da ansiedade que resultava da introjeção
dos sentimentos maus do bebê. (Bion, 1959, p. 103-4)
R.D.Hinshehüooâ / 265
vés da identificação projetiva e reinternalizam o curso e o resultado do
conflito externamente percebido por meio da identificação introjetiva.
(p. 21) [ver SISTEMAS SOCIAIS DE DEFESA].
Embora este desenvolvimento do conceito de identificação projetiva tenha
sido, em parte, um esforço de todo o Grupo Kleiniano na década de 1950,
Bion tornou-se o seu principal expoente, dele colhendo os maiores frutos
[ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA]. A mente materna nesse estado
de "rêverie" desempenha uma função a que Bion deu uma denominação
neutra: "função-aífa" [ver RÊVERIE; FUNÇÃO-ALFAj.
Espelhando o bebê: Winnicott (1967) desenvolveu a idéia de um estado
materno que refletia o estado do bebê. Reconheceu as descrições feitas por
lacan (1949) das descobertas da criança a respeito de si mesma em um es
pelho, mas foi mais além ao descrever a maneira pela qual o rosto da mãe
constitui um "espelho" emocional para o bebê e a criança, e descreveu is
to como sendo um método da aprendizagem da criança a respeito de seus
próprios estados internos. O método está claramente relacionado ao tipo
de ciclos projetivos/introjetivos que os kleinianos tinham estado desenvol
vendo; contudo, ao descrever esta interação visual, Winnicott achava-se
inevitavelmente enfocando um período posterior de desenvolvimento. Qual
quer interferência nesta interação é atribuída somente ao objetivo externo.
As relação continente-contiâo: Bion esforçou-se por traçar uma teoria ge
ral. Postulou ele três formas básicas de relacionamento coniinente-conti-
do: a parasitária, a sim biótica e a comensal.
Por "comensal" quero significar um relacionamento em que dois obje
tos partilham um terceiro, para vantagem de todos os três. Por "simbió-
tico" entendo um relacionamento em que um depende do outro, para
vantagem mútua. Por "parasitário" desejo representar um relacionamen
to em que um depende do outro para produzir um terceiro, que é destrui
dor de todos os três. (Bion, 1970, p. 95).
A teoria bioniana do pensar consiste no acasalam ento de uma pré-concep-
ção com uma realização, o resultado sendo uma concepção e um degrau
na_construção do pensamento e das teorias [ver PENSAR, PRÉ-CONCEP-
ÇAO]. A relação existente entre os termos, neste processo, é a do conti
nente para com o contido.
R.D.Hinshekoooá / 267
súbita de perspectiva constitui uma manobra que fascinava Bion. Cha
mou-a de mudança de vértice, ou transformação, e concedeu-lhe grande
importância, particularmente porque resulta em uma "catástrofe" psíqui
ca na mente do leitor (ver adiante).
M emória: A reciprocidade é particularmente importante para o psicanalis
ta quando ele vem a considerar a memória — a sua própria memória. Ele
pode estar cheio de lembranças. Alternativamente, as lembranças podem
estar saturadas de emoções. Neste relacionamento reciprocamente satura
do, o analista torna-se incapaz de fazer descobertas, por causa da satura
ção. Bion desejava distinguir a "memória", neste sentido, de algo a que
deu o nome de "lembrar". Fez a distinção através da consideração de duas
situações: uma em que o paciente chega com uma lem brança de um sonho
para contar ao analista; a segunda, quando um sonho subitamente apare
ce, como um todo coerente, na mente do paciente, dela havendo estado
ausente um momento antes (lembrar). Exige-se do analista que desempe
nhe a segunda função — lembrar — e que se faça aberto para que a reme-
moração aconteça sem esforço (ou desejo), no curso de um momento atem
poral [ver MEMÓRIA E DESEJO].
Quando o contato entre paciente e analista se frustra, a ausência de
momentos espontâneos — repletos que são de catástrofe ■ — é uma causa
importante do fracasso de um tratamento psicanalítico.
O paciente ficará sem saber como transmitir seu significado ou o signifi
cado do que deseja transmitir será intenso demais para que ele o expres
se de maneira apropriada, ou, ainda, a formulação será tão rígida que
ele sente que o significado transmitido é despido de qualquer interesse
ou vitalidade. Semelhantemente, as interpretações fornecidas pelo ana
lista, "o contido", encontrar-se~ão com a reação aparentemente coopera
tiva de serem repetidas para confirmação, o que priva "o contido" de
significado, seja por compressão, seja por desnudamento. O fracasso
em observar ou demonstrar o ponto pode produzir uma análise externa
mente progressiva, mas factualmente estéril. A pista reside na observa
ção das flutuações que fazem do analista, em determinado momento, "o
continente , e o analisando, "o contido", para, no momento seguinte,
inverter os papéis (...) Quanto mais familiar o analista se torna com a
configuração "continente" e "contido", e com acontecimentos da sessão
que se aproximam destas duas representações, melhor será. (Bion, 1970
p. 108).
R.D.Hinshelwood / 269
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Continuidade genéticai"S5
importante papel na teoria e na prática psicanalíticas. Trata-se da suposi
ção de que aspectos psicológicos da personalidade no presente têm uma
continuidade com estágios precedentes do desenvolvimento. Foi assim que
Freud desenvolveu a idéia de que as neuroses adultas surgem de ocorrên
cias traumáticas e fantasias acontecidas na infância. Mais do que isso, po
rém, aspectos normais da personalidade, tais como o superego, desenvol
vem-se a partir de seus precursores, os pais edípicos no estágio preceden
te de desenvolvimento.
Foi com base na continuidade genética que Freud fez as suas inferên
cias, a partir de adultos, sobre a evolução psicológica das crianças. A teo
ria da continuidade genética foi testada quando Freud e o pai do Peque
no Hans investigaram a teoria psicanalítica do desenvolvimento infantil
pela análise direta de material tirado de uma criança de cinco anos de ida
de (o Pequeno Hans) durante as fases de desenvolvimento sobre as quais
se haviam formulado hipóteses com base na análise de adultos (Freud, 1909).
Quando Klein veio a analisar crianças, descobriu-se também especulan
do a respeito de estágios de desenvolvimento anteriores aos que estava
analisando. Embora analisasse crianças com apenas dois anos e nove me
ses, descobriu que havia muitos desenvolvimentos fundamentais a serem
descritos antes dessa idade. Suas inferências, portanto, basearam-se tam
bém no princípio da continuidade genética, assim como em outras provas,
que acabaram por incluir a observação direta de bebês (ver BICK; OBSER
VAÇÃO DE BEBÊS].
Desanimadoramente, Klein descobriu que suas contribuições à teoria
psicanalítica da evolução eram discutidas. Waeíder, sustentando a psicaná-
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R.D.Himhelwood / 271
seus sentimentos, em vez de descarregá-los de modo semelhante ao pa
ciente. (Heimann, 1960, p. 9-10)
Sua tese principal era de que "(...) comparando os sentimentos desperta
dos em si próprio com o conteúdo das associações do paciente e as quali
dades de seu estado de espírito e comportamento, o analista tem meios pa
ra conferir se entendeu ou fracassou em entender seu paciente" (p. 10).
Anteriormente, Ferenczi (1919) já havia descrito a qualidade distanciado-
ra do analista que se defende contra qualquer contratransferência, e Feni-
chel (1941) também criticara a visão de "tela branca" do papel do analis
ta. Nesta época, tanto quanto com Heimann e Racker na tradição kleinia-
na, houve um movimento disseminado para tomar a sério a contratransfe
rência (Winnicott, 1947; Berman, 1949; Little, 1951; Gitelson, 1952; Annie
Reich, 1952; Weigert, 1952).
Há várias fases na história do conceito kleiniano de "contratransferên
cia": (1) a importância dos sentimentos do analista como indicadores do
estado mental do paciente; (2) a descoberta de uma forma normal de iden
tificação projetiva, que é utilizada como método de comunicação não-sim-
bólica; (3) ciclos de identificações introjetivas e projetivas como base de
uma compreensão intrapsíquica da situação interpessoal de transferência/
contratransferência entre analista e paciente; (4) a idéia de contratransfe
rência "normal", e (5) a importância da mente do analista sobre tudo o
mais como sendo o aspecto significante do meio ambiente do paciente
[ver 1. TÉCNICA],
(3) O analista como continente materno. Bion (1959, 1962) desenvolveu estas
opiniões em uma teoria mais rigorosa do conter materno e terapêutico e
utilizou o conceito da identificação projetiva para iluminar a interação in
terpessoal [ver CONTER]. Segundo esta visão, o bebê chora e efetua uma
forma de comunicação projetiva na qual a sua aflição é realmente sentida
(introjetada) pela mãe. Se esta for uma mãe capaz e em forma razoavel
mente boa no momento, ela pode efetuar um trabalho mental dentro de
si mesma para definir o problema e o que é necessário para lidar com ele.
Esta é uma importante função do ego envolvida na maternidade [ver RE-
VERIE]. Sendo capaz de discernir algo do que está errado, ela pode tomar
providências para prover a criança de maneira tal que avalie algo da afli
ção desta. O processo de definir a aflição e lidar com ela é comunicado
no ato de lidar com o bebê: alimentando-o, digamos. Esta é uma forma
de projetar de volta (reprojetar) a aflição sob a forma de uma ação com
preensiva. A criança, uma vez que a mãe tenha começado a prover e a aten
der sua aflição, pode então receber de volta sua experiência de aflição —
reintrojetá-la —, agora sob forma modificada, porém, uma forma que foi
modificada pela função da mãe de definir e entender a aflição, expressa
ao bebê mediante as ações apropriadas que o ajudam. A experiência, des
ta maneira, traz as marcas da compreensão por parte da mãe, impressas
na modificação da experiência. Ela é agora uma experiência compreendi
da e, na interação entre esses dois mundos intrapsíquicos, gerou-se um sig
nificado. Pela introjeção desta experiência compreendida, o bebê pode vir
a adquirir a compreensão que a mãe possui: exemplificando, se a mãe esti
ver certa, ele pode dar-se conta, através do atendimento dela, que uma
certa experiência significa fome (isto é, exige que algo seja colocado contra
seus lábios, para fins de sugar e alimentar). As ocasiões acumuladas, em
que as experiências forem entendidas, começam a equivaler a uma aquisi
ção, dentro do próprio bebê, de um objeto interno que possui a capacida
de de compreender as experiências dele. Isto, como Segai o disse, "(...) é
um começo de estabilidade mental" (Segai, 1975, p. 135). Segai descreveu
R.D.Hinshehoood / 273
esta interação mãe-criança como modelo para o empenho terapêutico do
analista [ver CONTER].
R.D.Himhelwood / 275
ções ao analista, mas também como fazendo coisas à mente do analis
ta, projetando para dentro do analista de uma maneira que afeta este
último. (Segai, 1977, p. 82) [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA].
Joseph (1975) refinou consideravelmente a sensibilidade do analista às atua
ções do paciente na transferência [ver ATUAÇÃO DENTRO DA SES
SÃO], Descreveu ela a própria experiência do analista como muito impor
tante para sentir como o paciente está "trazendo o analista para dentro",
ou aliciando-o:
(...) como nossos pacientes atuam sobre nós por muitas e variadas ra
zões; como tentam atrair-nos para seus sistemas defensivos; como incons
cientemente atuam conosco na transferência, tentando fazer-nos atuar
com eles; como transmitem aspectos de seu mundo interior, construí
do a partir da primeira infância e elaborado na infância e no estado
adulto, experiências com freqüência situadas mais além do uso de pala
vras, que só podemos capturar através dos sentimentos despertados
em nós, através de nossa contratransferência. (Joseph, 1985, p. 62)
Este aumento de sensibilidde capacitou os analistas a efetuarem progressos
com difíceis pacientes limítrofes e "inatingíveis", que pareciam impedidos
de se desenvolver, [ver EQUILÍBRIO PSÍQUICO; ORGANIZAÇÕES PA
TOLÓGICAS],
Contra-identificação projetiva: Grinberg (1962), endossado por Segai
(1977), descreveu pacientes que sentiam que o analista estava fazendo vio
lentas identificações projetivas para dentro deles. Esta sensibilidade do pa
ciente baseia-se na experiência inicial de pais que faziam identificações pro
jetivas maciças para dentro dele durante a primeira infância e a infância
propriamente dita. Grinberg cunhou a expressão "contra-identificação pro
jetiva" para esta ocorrência na situação analítica.
(5)A mente do analista como objeto do paciente. Nos últimos anos, tem siste
maticamente emergido quão sensíveis são os pacientes aos sentimentos do
analista e aos métodos utilizados por este para lidar com esses sentimentos,
defensivos ou de outra espécie. Por uma das implicações do ciclo de iden
tificações projetivas e introjetivas ser o processo de modificação no analis
ta, do qual se exige que tenha a estabilidade mental para lidar com ansie
dades intoleráveis sem ficar abertamente perturbado ele próprio, são em
verdade as percepções do paciente quanto à capacidade que tenha o analis
ta de modificar a ansiedade que constituem realmente o componente im
portante. Rosenfeld (1987) e muitos outros chamaram a atenção para isto.
Por exemplo, ao debater a oportunidade das interpretações, escreveu Ro
senfeld:
Em algumas situações, pode-se interpretar depressa dem ais aquilo que
se reconheceu, com o resultado de que o paciente experiencia o que é
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Ver BEBÊS.
R.D.Hinshelwood / 279
do um movimento no sentido da posição esquizoparanóide (afrouxamen
to da integração), seguido pela reorganização em tomo de um novo pon
to, um mamilo, que reune novamente as partes em um movimento de vol
ta, no sentido da posição depressiva. Representou isto pelo símbolo Ep-D
[ver Ep-D],
R.D.Hinshelwood / 281
ças. Em ambos os casos deu-se conta de que um processo de externaliza-
çao {no brincar ou no crime real) correspondia à opinião de Freud sobre
criminosos oriundos de um senso inconsciente de culpa e que essa externa-
lização era um método de mitigar a violência interna entre os desejos e as
proibições do superego. A ação externa permite que o mundo real tranqüi-
lize o ego de que as duras e violentas ameaças retaliatórias não são tão te
míveis quanto as internas, que o superego externo não é tão onipotente e
pode ser enganado e que, no caso do brincar, novas fantasias, que melho
rarão a violência, podem ser geradas {ver 7. SUPEREGO].
Aqui, Klein confirmou também a opinião de Freud de que as tendên
cias criminais resultam de uma situação interna de culpa que surge de um
superego de extraordinária severidade e observou a proximidade entre es
tes níveis inconscientes de culpa e a paranóia dos pacientes psicóticos [ver
3. AGRESSÃO; 7. SUPEREGO; PSICOSE].
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R.D.Himhehtiood / 283
tribuiu de modo importante para este problema. Ela tinha, de qualquer
modo, muito material a mostrar a ocorrência inicial de remorso, pesar e
culpa em crianças e suas origens nas relações objetais agressivas e sádicas
[ver 3. AGRESSÃO; 7. SUPEREGO]. Em 1927, ela acompanhou as opi
niões de Freud a respeito do lugar da culpa inconsciente no comportamen
to criminoso com seu artigo sobre as tendências criminais em crianças [ver
CRIMINALIDADE].
Ela confirmou a opinião de Freud de que se lida com o com portam en
to criminoso por uma externalização da culpa que é inconscientemente sen
tida. A situação externa reflete a forma dos violentos ataques internos ao
ego por um superego severo, representado como objetos internos hostis.
Confirmou também que o mecanismo por trás disto era a substituição por
uma punição externa a fim de aliviar os sádicos e terrificantes estados in
ternos que provocam completo desamparo. Um castigo substituto duro
mas externo é sentido como menos aterrorizante por ser real, antes que
fantasioso; pode-se também fugir a ele pela ocultação ou pelo descrédito
do acusador.
Este uso da teoria freudiana de externalização do estado interno também
tornou-se^ importante para Klein na compreensão do processo do brincar
[ver 1. TÉCNICA] e de formação de símbolos [ver FORMAÇÃO DE SÍM
BOLOS]. A externalização era uma defesa contra uma perseguição inter
na aterrorizante (culpa inconsciente) e, ao mesmo tempo, criava a possibi
lidade de utilizar símbolos (Klein, 1929, 1930). O movimento de um obje
to para outro, que, neste caso, era de um objeto interno para outro exter
no, também tornou-se pedra angular de suas teorias de desenvolvimento
na criança (Klein, 1932). Quando o relacionamento com determinado obje
to se torna hostil demais, novos objetos são buscados: exemplificando, o
afastamento da mãe, que desaponta o bebê no desmame e cria uma crise
de sadismo e perseguição, no sentido da busca de um novo objeto, o pai,
ou, alternativamente, as relações objetais sádicas das fases pré-genitais po
dem provocar um movimento no sentido de impulsos e objetos genitais (tal
vez a genitalidade prematura) [ver DESENVOLVIMENTO].
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R.D.Hinsheiwood / 285
siva", da autoria de Melanie Klein, debatido em dois encontros. Estes tra
balhos foram publicados, em formas reescritas, em Developments in psycho-
analysis (1952).
Os Debates sobre as Controvérsias não resolveram nenhuma questão
científica. Concentraram as mentes dos kleinianos de maneira a produzir
descrições sistemáticas de suas opiniões e demonstraram também, para sur
presa dos vienenses, a sofisticação e o poder de argumento dos analistas
britânicos. O desfecho foi cada lado deixar o outro em paz e concordar
com uma solução burocrática para a estrutura de comitês da Sociedade
Britânica e a formação de novos psicanalistas. O acordo final ficou conhe
cido por "Acordo de Cavalheiros", embora tivesse sido subscrito por três
mulheres; Melanie Klein, Anna Freud e a presidenta da Sociedade Britâni
ca, Sylvia Paine (Grosskurth, 1986). Desde então uma paridade cuidadosa
mente controlada dos integrantes dos comitês, especialmente dos de forma
ção, tem sido mantida pela designação dos três grupos dentro da Socieda
de; o Grupo Klein, o Grupo "B" (hoje chamado de Freudianos Contempo
râneos) e um Grupo Intermediário de Independentes.
Os resumos feitos por Glover de suas críticas aos trabalhos kleinianos
foram subseqüentemente publicados (Glover, 1945) e Brierley foi estimula
da a escrever um certo número de artigos que foram coligidos em livro so
bre a nova forma da psicanálise (Brierley, 1946). Confrontações diretas en
tre psicanalistas kleinianos e psicanalistas Ortodoxos (ou psicólogos do ego,
como vieram a tornar-se conhecidos) tenderam a ser evitadas desde então;
o debate entre Greenson (1974, 1975) e Rosenfeld (1974), bem como a con
ferência de 1985 sobre identificação projetiva (Sandler, 1988) foram das
raras exceções publicadas.
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R.D.Hinshehoood / 287
para as psicoses. Esta idéia foi confirmada mais tarde na análise de Dick,
um menino de quatro anos, em 1929 {Klein, 1930) [ver PSICOSE). Em
1932 e 1933, Klein começou a encarar uma certa classe de defesa como es
pecífica contra a manifestação da pulsão de morte, os impulsos destruti
vos. Estes se achavam especiaímente implicados nos medos paranóides e
estavam, portanto, ligados a processos incipientes de psicoses, representan
do pontos de fixação iniciais para a esquizofrenia e a paranóia (Klein, 1930).
Impulso e defesa: A estrita distinção feita por Klein entre as fantasias an
siosas que formavam o conteúdo da ansiedade e as defesas contra elas não
era simples. Ela não elucidou esta complexidade de modo claro, mas se
guiu de perto as descobertas clínicas de Abraham de que as defesas primi
tivas envolviam a atividade de moções pulsionais, com a projeção depen
dendo da expulsão anal e a introjeção, da incorporação oral. Abraham
(1924) descreveu clinicamente estes processos em termos das fantasias atua
das por pacientes psicóticos e Klein pôde perceber os paralelos com o ma
terial dela enquanto as crianças atuavam as suas fantasias no consultório
de crianças. As fantasias, portanto, vinham a estar envolvidas tanto no
conteúdo da ansiedade contra a qual se erguia defesa quanto nos proces
sos de defesa contra essas ansiedades. Com fundamento nisto, desenvolveu-
se gradualmente a teoria da natureza onipresente da fantasia inconsciente
como a função básica da própria mente [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE].
Dessa maheira, fantasias desenvolvem-se, de modo inconsciente, para
defesa contra outras fantasias, confusão apontada e elucidada por Segai
(1964). A manipulação das fantasias que protegem contra a ansiedade po
de a princípio se dar através do estímulo de sensações somáticas [ver S.
OBJETOS INTERNOS; FANTASIAS DE MASTURBAÇÃO ]. Como Bick
observou, estas fantasias manipuladas podem, no primeiro caso, ser provo
cadas pelo objeto externo, a mãe, especiaímente através do contato epidér
mico [ver PELE]. Joseph demonstrou a maneira pela qual estas fantasias
defensivas são mobilizadas no relacionamento transferenciai:
Podemos observar fantasias serem ligadas ao analista, como se o forçan
do a um papel específico, como processo constante em progresso na si
tuação analítica, de maneira que ansiedades surgem, defesas são mobili
zadas, o analista é, na mente do paciente, atraído para o processo, sen
do continuamente usado como parte do seu sistema defensivo. (Joseph,
1981, p. 24)
R.D.Hinshelwooá / 289
Ver 9. MECANISMOS PRIMITIVOS DE DEFESA.
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Segai, Hanna (1964), Introduction to the ioork of Melaníe Klein, Heinenn.
ÍOI:
A
tros a serem incorporados. — Esta depreciação da importância do obje
to e o desprezo por ele é, penso eu, uma característica específica da ma
nia. (Klein, 1935, p. 278)
(Ui) Controle: Ao mesmo tempo, contudo, ele se esforça incessantemente
por controlar e dominar todos os seus objetos (Klein, 1935, p. 277). "isto
é necessário por duas razões: (a) a fim de negar o pavor deles [os objetos
de que depende] que está sendo experienciado, e (b) de maneira a que o
mecanismo de fazer reparação ao objeto possa ser efetivado". (Klein, 1935,
p. 278)
(iv) Idealização: "A idealização é uma parte essencial da posição manía
ca" (Klein, 1940, p. 349) [ver OBJETO IDEAL].
Tão importantes são os mecanismos envolvidos na mania que Klein, du
rante um período, no final da década de 30, referiu-se à posição maníaca.
Estas defesas protegem o sujeito de experienciar as penosas conseqüên-
cias da dependência em objetos bons e amados e as conseqüências igual
mente penosas de tal dependência. As defesas maníacas, contudo, condu
zem a novos problemas:
A gratificação sádica de superá-lo e humilhá-lo, de sair-se melhor que
ele, o triunfo sobre ele, podem ingressar tão intensamente no ato da re
paração que o "círculo benigno" iniciado por este ato se rompe. Os ob
jetos que devería ser restaurados transformam-se novamente em perse
guidores (...) Em resultado do fracasso do ato de reparação, o ego tem
de valer-se, repetidamente, das defesas obsessivas e maníacas. (Klein,
1940, p. 351) [ver REPARAÇÃO]
R.D.Hinshelwood / 291
F )p fp c a C n h c P Q Q l v a c Defesas obsessivas são atos ou
L / C I C u C l J U L / j C O D I V CS. D pensamentos repetitivos geralmen-
te destinados a algum ato de controle — deslocados da ansieade a respei
to do controle de um estado interno, um impulso ou uma emoção — in
vertendo ritualmente um impulso a danificar. Klein seguiu Freud (1909) e
Abraham (1924) em considerar as defesas obsessivas como específicas con
tra impulsos sádicos:
(...) os mecanismos e sintomas obsessivos em geral servem ao fim de
unir, modificar e desviar uma ansiedade pertencente aos níveis mais ini
ciais da mente, de maneira que as neuroses obsessivas se erigem sobre
a ansiedade das primeiras situações de perigo (Klein, 1931, p. 246).
Tão grande era a ênfase dela que se referiu, em uma ou duas ocasiões, à
'posição obsessiva". O desfazer repetitivo (uma defesa-chave nos mecanis
mos obsessivos) foi particularmente proeminente em seu material clínico
a respeito de crianças pequenas, e Klein a atribuiu, nesse estágio, aos efei
tos da culpa: "(...) da maior importância no desenvolvimento da neurose
obsessiva (...) é o sentimento de culpa no desenvolvimento da neurose ob
sessiva (...) é o sentimento de culpa engendrado pelo superego" (Klein,
1927, p. 179).
O status dos mecanismos obsessivos, no entanto, começou a diminuir
em anos posteriores, quando as descrições de Klein a respeito da posição
depressiva revisaram as suas opiniões sobre a culpa. As defesas proeminen
tes que descreveu então foram as maníacas [ver DEFESAS MANÍACAS]
e tornou-se difícil distingui-la das defesas obsessivas:
(...) onde a neurose obsessiva era o fato mais poderoso no caso, tal do
mínio pressagiava uma separação forçada de dois (ou mais) objetos, en
quanto que, onde a mania se achava em ascendência, recorria a méto
dos mais violentos. Isto quer dizer que os objetos eram mortos, mas,
sendo o sujeito onipotente, supunha ele que podia também imediatamen
te trazê-los de volta à vida. (Klein, 1935, p. 278)
Esta distinção muito fina era sustentada mais ainda:
O próprio fato de as defesas maníacas estarem operando em ligação tão
estreita com as obsessivas contribui para o temor que o ego tem de que
a reparação tentada por meios obsessivos tenha também fracassado.
(Klein, 1940, p. 351)
A defesa obsessiva específica do desfazer foi substituída pela descoberta
da reparação, a que, em certos aspectos, se assemelha; a reparação é a ten
tativa de corrigir um dano [ver REPARAÇÃO].
O rebaixamento das defesas obsessivas tornou-se completo em 1946,
quando Klein voltou sua atenção para o estudo dos processos de cisão que
vieram para o primeio plano no trabalho que ela e seus colegas psiquia
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R.D.Hinshekoood / 293
o amadurecimento fisiológico; (2) as fases da libido; (3) o princípio da re
alidade; (4) o desenvolvimento das relações objetais; (5) o desenvolvimen
to do ego, e (6) a seqüência das situações de ansiedade. Serão descritos
um por um:
R.D.Hinshelwood / 295
plano, com um aumento de conscientização do mundo interno e a discri
minação dele em relação ao mundo externo [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA].
R.D.Hinshelwood / 297
Interação com o mundo externo. Uma visão da ansiedade como sendo um
conflito entre as pulsões conduziu a uma acusação, formulada contra Klein,
de que negligenciou o mundo externo e repudiou tanto os fatores malévolos
quanto os benévolos provindos do exterior, e também que ela adotava
uma visão inteiramente pessimista da natureza humana e da impossibilida
de da tarefa terapêutica da psicanálise [ver MUNDO EXTERNO; FATOR
CONSTITUCIONAL]. Na realidade, ela não repudiou a importância dos
fatores externos, nem negou a eficácia terapêutica da psicanálise. Os tex
tos dela se acham repletos com o efeito espantoso das interpretações co
mo eventos externos, que modificam a situação interna de seus pacientes.
Klein encarava o mundo interno [ver REALIDADE INTERNA] como
uma situação dramática [ver POSIÇÃO] em constante interação com o
mundo externo através da introjeção e da projeção [ver CONTER], O pro
cesso de amadurecimento depende inteiramente da modificação progressi
va da ansiedade tornada possível pelo meio ambiente, que funciona co
mo continente da ansiedade. Dessa maneira, o desespero do bebê a respei
to de sua ansiedade depara-se com uma mãe que pode, primeiro de tudo,
interpretá-lo como sendo uma necessidade que ela pode atender [ver REVE-
RIE], ou, em segundo lugar, pode persistir em tolerar a ansiedade do be
bê mesmo quando este não o consegue [ver CONTER]. O resultado é um
bebê que tem a oportunidade de introjetar um objeto que pode tolerar a
ansiedade e dela fazer sentido.
Inversamente, um meio ambiente que não faz sentido em termos de sa
tisfação de uma necessidade ou não tolera a ansiedade do bebê tem um efei
to deletério sobre este. Então, a oportunidade é meramente a de introjetar
um objeto que não apenas não faz sentido, mas se adiciona à falta de sen
tido. O bebê sofre então uma piora da ansiedade de um tipo especial a
que Bion chamou de "pavor sem nome" [ver PAVOR SEM NOME].
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R.D.Hmshelwood / 299
senvolvimento se acha sob a dominância dos impulsos destrutivos (pulsão
de morte) [ver 10. POSIÇÃO DEPRESSIVA].
A reação imediata a este sofrimento, por parte do paciente, é tratá-lo
como uma ansiedade sinaíizadora, e retrair-se para o atoleiro e o triunfo
de uma inacessibilidade [ver TRANSFERÊNCIA; ATUAÇÃO DENTRO
DA SESSÃO].
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T71 « 1 ,
Ao gerar uma teoria pela qual um organis-
C l c i n t í I l l U b L / v lld mo biológico se torna uma psique queex-
periencia, Bion (1962a) descreveu um processo a que deu o nome de fun-
ção-alfa e do qual a característica essencial é o processo de gerar "significa
do" a partir de sensações. Os resultados finais da função-alfa são os ele-
mentos-alfa, que constituem o mobiliário dos sonhos e do pensar [ver FUN-
ÇÃO-ALFA]. Quando a função-alfa sai errada ou fracassa, outro tipo (a-
normal) de conteúdo mental é gerado, o qual Bion chamou de elementos-
beta. "Elemento-beta" é uma das expressões de Bion "livre de significado",
destinada a ser preenchida a partir da experiência de utilizar o conceito
na prática [ver BION] e existem diversos aspectos do termo:
(i) Dados sensórios puros: A experiência é gerada de dados sensórios pu
ros (uma realização) pelo encontro com alguma expectativa preexistente
(uma preconcepção), resultando em uma concepção "plena de sentido"
[ver PRECONCEPÇÃO; PENSAR], Ocasionalmente, contudo, esse encon
tro pode fracassar (fracasso da função-alfa), com o resultado de partículas
de dados sensórios "indigeridos" se acumularem. Estas são os elementos-beta.
(íi) Evacuação: Os elementos-beta podem aglomerar-se em coleções (seme
lhantes ao tipo de fala "salada de palavras" do esquizofrênico). Estas acu
mulações são processadas por evacuação, não por pensar pensamentos
em sonhos e teorias. O processo de evacuação é o descrito por Klein co
mo identificação projetiva em sua forma patológica [ver 13. IDENTIFICA
ÇÃO PROJETIVA],
Ver PENSAR.
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R.D.Hinsheiwood / 303
que se volte para as relações entre as impressões objetais, porque se es
te elo de ligação pudesse ser cortado ou, melhor ainda, nunca forjado,
...então pelo menos a consciência da realidade seria destruída, ainda que
a realidade em si não o pudesse ser. (Bion, 1957, p. 50)
O resultado final é que o esquizofrênico vive em um mundo fragmentado
de violência, com idéias primitivas inutílizáveis em sua mente:
Todas estas são agora atacadas, até que, finalmente, dois objetos não
podem ser reunidos de maneira que deixe cada um deles com as suas
qualidades intrínsecas intactas e ainda capaz, pela conjunção deles, de
produzir um novo objeto mental (Bion, 1957, p. 50). [ver PSICOSE]
A destruição destas conexões e conjunções conduz ao paciente sentir-se "ro
deado por minúsculos elos de ligação que, estando impregnados agora com
crueldade, ligam cruelmente os objetos" (Bion, 1957, p. 50) [ver OBJETOS
BIZARROS], Bion chamou estas partículas de "elementos-beta" [ver ELE-
MENTOS-BETA], O efeito aproxima-se do que Freud chamou de "catástro
fe mundial" (Freud, 1911, p. 70):
Isto constitui um desastre para a vida mental, que então não se estabele
ce segundo o modo normal. Ao invés de um pensar baseado no princí
pio da realidade e da comunicação simbólica dentro do self e com ou
tros objetos, ocorre um aumento anômalo do ego do prazer, com uso
excessivo da cisão e da identificação projetiva como seu modo concre
to de relacionar-se com objetos odiados e que o odeiam. A onipotência
substitui o pensar e a onisciência, a aprendizagem com a experiência
em um ego desastrosamente confuso, subdesenvolvido e frágil. (0'Shaugh-
nessy, 1981, p. 183) [ver PENSAR]
Adicionada à retirada narcísica da libido quanto aos objetos na realidade,
que Freud havia descrito como sendo a catástrofe mundial, está a idéia
de uma onipotente e violenta cisão e projeção do ego. O ego é o foco da
agressão, não apenas do amor libidinal [ver NARCISISMO].
Elo de ligação edipiano: Bion (1959) levou estas observações mais à fren
te e estabeleceu uma teoria formal. Ele considerou esta atividade de acasa
lamento como baseada em uma predisposição inata à concepção da liga
ção entre um continente e seus conteúdos, de modo típico o mamilo na
boca ou o pênis na vagina. O ataque ao elo de ligação entre dois objetos
internos mentais é um ataque ao casal interno de pais [ver FIGURA COM
BINADA DOS PAIS]. Por causa da conotação do casal edipiano, a união
de dois objetos mentais é sentida não apenas como despertando inveja,
mas como base para a criatividade mental e interna.
Continente e contido: O acoplamento de pênis e vagina, ou boca e mami
lo, é considerado por Bion (1962) como protótipo da maneira pela qual
os objetos mentais são reunidos, um dentro do outro. Dessa maneira, colo
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R.D.Hinshelwooá / 305
Meissner (1980) argumentou amargamente que é falso incluir a empatia
e outros fenômenos não-psicóticos dentro da expressão "identificação pro
jetiva", pois afastava como apta a causar confusão a extensão do concei
to de "identificação projetiva" mais além de sua referência às perturbadas
fronteiras de ego dos esquizofrênicos.
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R.D.Hinshehüood / 309
(i) a tentativa de vir a conhecer o objeto e o self atavés da identificação
projetiva ("K"): por exemplo, o conhecimento, pela mãe, do estado men
tal de seu bebê;
R.D.Hinshekoood / 311
LOS] em que há uma iguaíização do símbolo com a coisa simbolizada, re
sultando em o símbolo ser tratado como se fosse realmente o original. A
descrição de Segai (1950), contudo, é vivida; assim, para um de seus pacien
tes esquizofrênicos
(...) não havia distinção entre o símbolo e a coisa simbolizada.
(...) Ele corava, gaguejava, dava risinhos e se desculpava após trazer-
me um pedaço de fezes feito de lona. Comportava-se como se me hou
vesse oferecido um pedaço de fezes real. Não era meramente uma expres
são simbólica de seu desejo de trazer-me suas fezes. Ele sentia que as
havia realmente oferecido a mim. (Segai, 1950, p. 104)
Uma vez formado, contudo, o símbolo não funcionava como tal, mas
tornava-se, em todos os respeitos, equivalente ao objeto (p. 105).
Segai (1957) utilizou mais tarde elegantes exemplos clínicos para demons
trar a representação sim bólica, na qual o símbolo é colocado no lugar em
que o original estivera, mas sem perder a diferença real do símbolo, e a
equação sim bólica, em que o símbolo não é distinguido e acredita-se que
o objeto inocente seja a coisa simbolizada.
O paciente A. (...) foi um dia perguntado por seu médico porque havia
parado de tocar violino desde sua enfermidade. Ele respondeu com algu
ma violência; — Por quê? Espera que eu me masturbe em público? —
Outro paciente, B., sonhou certa noite que ele e uma menina estavam
tocando um dueto de violinos. Fez associações com remexer, masturbar-
se, etc., das quais emergiu claramente que o violino representava seu
órgão genital, e tocar violino uma fantasia masturbatória de relação
com a menina. Aqui, então, temos dois pacientes que aparentemente
utilizam os mesmos símbolos na mesma situação: o violino representa
o órgão genital masculino e tocar violino representa a masturbação. A
maneira pela qual os símbolos funcionam, contudo, é muito diferente.
Para A., o violino tornou-se tão completamente igualado com seu ór
gão genital que tocá-lo em público tornou-se impossível. (Segai, 1957,
p. 49-50)
A equação, feita pelo paciente A., do objeto com a coisa simbolizada fa
zia parte de um distúrbio habitual de sua realidade, que resultava do uso
da forma concreta e patológica da identificação projetiva [ver 13. IDENTI
FICAÇÃO PROJETIVA]. O resultado foi que o símbolo perdeu a sua dis
tinção com o original e atraiu os mesmos conflitos e inibições que este último.
Segai, tal como Klein e Ferenczi, reconheceu o lugar da identificação
no processo. Onde existe uma falha em distinguir entre a coisa simboliza
da e o símbolo, ela
(...) faz parte de um distúrbio na relação entre o ego e o objeto. Partes
do ego e objetos internos são projetados em um objeto [externo] e iden
R.D.Hinshdwood / 313
grau tal que o self e o objeto se fundem, com a subseqüente equação de
símbolo e objeto simbolizado {equação simbólica).
Segai prosseguiu demonstrando como isto afeta o desenvolvimento dos
símbolos verbais:
A verbalização pode ser encarada desde o ângulo da relação entre con
tinente e contido. Diferentemente de outras formas de simbolismo, a fa
la tem de ser aprendida, embora o bebê comece por emitir sons onoma
topaicos. Esses sons têm de ser compreendidos pelo meio ambiente a fim
de serem convertidos em fala e, posteriormente, palavras têm de ser
aprendidas do meio ambiente. O bebê tem uma experiência e a mãe for
nece a palavra ou a frase que circunscreve essa experiência. Ela con
tém, abrange e expressa o significado, fornece um continente para este.
O bebê pode então internalizar essa palavra ou frase que contém o sig
nificado. {Segai, 1978, p. 318)
Dessa maneira, o conter verbal, sendo aprendido do meio ambiente social,
exige a projeção para o meio ambiente (mãe) da situação a ser simboliza
da [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS].
A identificação projetiva patológica na mãe funde o bebê com ela, e
as reações da mãe (ações de protesto, sons, etc.) serão reinternalizados co
mo objetos hostis, igualados à própria situação. De uma paciente específi
ca, relatou Segai: "Coisas estranhas aconteceram às minhas interpretações.
Elas podiam tornar-se uma dor na barriga dela ou uma excitação sexual"
(Segai, 1978, p. 318). O fracasso da função continente da mãe despia de
significado a experiência e ela era reduzida a uma sensação somática.
A situação psicodinâmica é que a relação entre o símbolo e o objeto sim
bolizado é uma relação de grande violência, que destrói a separação e o
significado no símbolo. Tocar violino ficou reduzido, no paciente de Se
gai, a uma sensação somática masturbatória em que a voz comunicativa
do violino, o significado da música, era violentamente obliterado, a fim
de destruir o senso de fronteira entre o ego e o mundo ao redor a escutar.
R.D.Hinsheíwood / 315
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R.D.Hinshelwood / 3 1 7
Entretanto, existem muitos psicanalistas britânicos que alegariam hoje
que Klein não faz verdadeiramente parte da Escola das Relações Objetais
(ex., Kohon, 1986). Eles reservam esse termo para Fairbairn, Balint e
Winnicott. Guntrip {1961), por exemplo, ao promover Fairbairn, traçou
um mapa particular do processo em teoria psicanalítica nos últimos cinqüen-
ta anos. Ele se estende ao longo de uma dimensão que começa com a neu
rologia científica de Freud, dirigindo-se para uma teoria psicológica, ínte
gra e incontaminada pela biologia. Esta idéia é tentadoramente direta, ain
da que possa se argüir tratar-se de um retrato espúrio, mais sedutor que
substancial. É realmente verdade que tem havido uma oscilação de pêndu
lo a afastar-se da neurologia e biologia científicas no sentido da psicologia
pura, e isto é certamente evidente, mas o estilo melífluo da caneta de Gun
trip tende a fazer oscilar demais o pêndulo. Apesar disso, a dimensão que
Guntrip enfatiza constitui aspecto proeminente do mapa. Ela foi também
descrita por Greenberg e Mitchell (1983) como sendo o contraste entre
um "modelo pulsão/estrutura" e um "modelo relacionai/estrutural".
Tanto o "biologismo" científico por que Freud começou quando o "psi-
cologismo" puro de Fairbairn {e Guntrip) são pontos extremados. Os seres
humanos são biológicos e psicológicos ao mesmo tempo e tanto uma inter
pretação estritamente biológica de Freud quanto da psicologia rejeitante
das pulsões de Fairbairn terminam por padecer da mesma falácia, qual se
ja, ambas tentam reduzir a dimensão total (biologia-psicologia) a uma
área de estudo isolada e simples. Infelizmente, a mente humana acha-se
tentalizantemente colocada diretamente através dessa dimensão [ver PRO
BLEMA MENTE-CORPO] e a teoria psicanalítica não precisa refletir tal
dialética. Klein, naturalmente, ficou igualmente dividida por este dilema,
enquanto constantemente tentava equilibrar a sua lealdade à experiência
de seus pacientes com uma lealdade aos propósitos científicos de Freud, e
permaneceu inconfortavelmente distendida entre a biologia e a psicologia.
Kohon (1985) sugeriu que se redesenhasse o mapa ao longo de uma di
mensão em que a tensão na abordagem de Freud entre uma biologia cientí
fica da mente e uma psicologia literária e humanística se tornasse dividi
da, após a dispersão de Viena, em uma tensão entre psicanalistas britâni
cos e americanos, caracterizada pelo desenvolvimento, por parte dos ana
listas britânicos, de uma teoria que "interessa-se pela relação do sujeito
com o seu objeto, não como relacionamento entre o sujeito e o objeto,
que é um relacionamento interpessoal" (Kohon, 1985, p, 27).
Os primórdios da teoria das relações objetais, À medida que Freud foi força
do cada vez mais a conceder importância à transferência [ver TRANSFE
RÊNCIA], assim também os relacionamentos do paciente ganharam cada
vez mais proeminência. O relacionamento transferenciai é a pedra angular
da prática da psicanálise, e a teoria baseada na prática concreta (aparente
mente uma característica especial da psicanálise britânica) inevitavelmen-
R.D.Hinshelwood / 319
narcisismo (Freud, 1914) e dele acabaria por surgir um interesse pelo pró
prio objeto {o self ou outrem) que é investido de interesse libidinal.
Introjeção de objetos: O segundo grande passo inovador se deu em 1917,
com o artigo de Freud sobre "Luto e melancolia". Durante certo tempo,
Freud estivera trabalhando com Abraham na tentativa de entender as psi
coses. Na realidade, Abraham (1911) havia também escrito um artigo so
bre o assunto aproximadamente na mesma época do trabalho de Freud so
bre o esquizofrênico Juiz Schreber. O artigo de Abraham, no entanto, era
sobre a psicose maníaco-depressiva e ele se achava em certa vantagem so
bre Freud. O interessante a respeito dessa psicose é o fato de ser intermi
tente. O paciente passa por fases em que a condição sofre remissão e ele
vem a parecer aproximadamente normal. Abraham, então, pôs-se a tentar
analisar esses pacientes durante os períodos de remissão. Podería então tra
balhar com eles como o faria com um paciente neurótico? A resposta, des
cobriu ele, era que podia (Abraham, 1924). Isto despertou interesse na en
fermidade maníaco-depressiva, de preferência à esquizofrenia, e o artigo
de Freud sobre luto e melancolia representou suas próprias reflexões sobre
o distúrbio. Trata-se de um trabalho com algumas belas descrições nas con
dições do luto e da melancolia (psicose maníaco-depressiva) e, nele, Freud
também produziu um desenvolvimento extraordinário de seu pensamento
conceptual. Demonstrou ele que o trabalho de luto é o abandono lento,
como se fosse por etapas, do investimento em um objeto amado que foi
perdido. Demonstrou também que a condição da melancolia é clinicamen
te semelhante, em muitos aspectos, ao pesar e que acarreta um abandono
semelhante de um objeto amado perdido. A diferença, argumentou ele,
era que o melancólico não abandona o objeto, mas faz algo bastante dife
rente com ele, que é restabelecer o objeto dentro de seu próprio ego e con
tinuar a relacionar-se com ele aí. Argüiu Freud que a razão para fazer is
so é um elemento particularmente forte de ódio e fúria para com o objeto
amado e que o desfecho são fortes ódio e fúria enfocados sobre o ego, co
mo se este fosse o objeto. Disse ele, "A sombra do objeto cai sobre o ego"
(Freud, 1917, p. 249) e chamou isto de "identificação" [ver INTROJE-
ÇÃO; IDENTIFICAÇÃO].
Até este ponto, Freud estava descrevendo uma fenomenologia do obje
to e deixara de lado a economia das noções pulsionais. Havendo descober
to este altamente interessante processo de identificação, que na realidade
causa uma "alteração do ego", demonstrou ele, quatro anos mais tarde
(Freud, 1921), que a psicologia grupai baseia-se na identificação. Já havia,
nesta ocasião, realizado o truque familiar que tem sido o destino de tantos
conceitos psicanalíticos: havendo sido descobertos como fenômenos patoló
gicos em pacientes, eles vêm a ser vistos, em toda parte, como ingredien
te essencial da psicologia normal.
F c h n r ln c r r m LIf nU LcOi lv
Ju O I u U U ü
rm a i c ° s estados confusionais sío
/X lC lI D comuns em pacientes esquizo
frênicos e as origens deles foram descritas por Rosenfeid (1965). Demons
trou este que pode existir uma confusão de pulsões primária que é extrema
mente perturbadora. Se a puísão de morte domina a Hbido, então o obje
to bom é odiado e destruído por engano, por assim dizer, conduzindo a
uma intensa insegurança e à incapacidade de classificar estados internos e
impulsos. Esta confusão das pulsões é um resultado pernicioso da inveja,
na qual o objeto bom é odiado por ser bom [ver 12. INVEJA].
Confusão entre self e objeto: Rosenfeid também descreveu diversas formas
de confusão que constituíam defesas contra a inveja — uma situação com
plicada que se tem de desemaranhar na psicanálise dos esquizofrênicos.
O ego fica confuso com os objetos em resultado de formas onipotentes
de projeção e introjeção que visam a denegar a separação e a dependência
[ver NARCISISMO]. Particularmente, enormes partes do self são coloca
das dentro do objeto mediante a operação maciça e violenta do mecanis
mo da identificação projetiva,
Uma forma de fusão do self com o mundo externo pode ser alcançada
em certos estados autistas de retirada para uma ocupação exclusiva com
as sensações corporais [ver AUTISMO].
Este tipo de confusão entre self e objeto é secundário e para fins de defe
sa. Ele contrasta com um estado primário de fusão e confusão regressiva
descrito pelos psicólogos do ego (tipicamente, Mahler et al., 1975), que se
guem a teoria ortodoxa do narcisismo primário [ver NARCISISMO]. O
narcisismo primário é um arcabouço teórico inteiramente diferente, que
assevera não haver experiência primária de "eu" e "não-eu", nenhuma fron
teira do ego ao nascimento e, portanto, ego algum ao começo da vida. Is
to não é aceito pelos kleinianos, que aceitam um ego, funções do ego e
uma fronteira do ego como presentes e ativas desde o nascimento. A con
fusão entre ego e objeto é, assim, secundária e resultado de mecanismos
primitivos e onipotentes de defesa.
Mahler, Margaret; Pine, Fred e Bergman, Anni (1975), The psychological birth o f the human
infant, Hatchinson.
Rosenfeid, Herbert (1965), Psychotic States, Hogarth,
R.D.Hinshelwood / 323
T7 i a Freud produziu vários modelos da estrutura da mente,
C b i r U l U r d principalmente: (i) o modelo topográfico de inconscien
te, pré-consciente e consciente; e (ii) o modelo estrutural de id, ego e supe-
rego. A seguir à introdução do último modelo (Freud, 1923), a psicologia
do ego concentrou-se na estrutura dos mecanismos de defesa do ego (An-
na Freud, 1936) e da adaptação (Hartmann, 1939).
Um m odelo estrutural kleiniano: Em contraste, Klein deu menos atenção
ao modelo freudiano de ego, id e superego. A visão kleiniana da estrutu
ra normal da personalidade concernia à população de objetos internos, al
go que acha frouxamente relacionado à opinião que Freud tinha das rela
ções entre o ego e o superego. Heimann (1942, 1952) começou a elaborar
a estruturação deste mundo interno em termos do grau de assimilação —
ou falta de assimilação — de objetos no ego [ver ASSIMILAÇÃO], Na
normalidade, existe uma estrutura fluida da personalidade, na qual o self
(ego) está em relação com seus objetos internos, identificando-se com eles
por períodos maiores ou menores, tal como possa ser realístíco nas circuns
tâncias do mundo externo na ocasião.
Em 1946, porém, Klein chamou a atenção para a estrutura do ego, tal
como ela é afetada pela cisão. Esta pode conformar-se às divisões existen
tes entre os objetos internos com que se identifica, ou pode ser outra for
ma de cisão e dispersão no mundo externo que é alcançada mediante a iden
tificação projetiva em objetos externos.
A estrutura nas posições esquizoparanóide e depressiva: Na posição esqui-
zoparanóide, o mundo interno, tanto os objetos quanto o ego, é cindido
e pode ser fragmentado; a preocupação do ego é constituir uma integração
dos variados objetos parciais e das partes do self.
Quando a posição depressiva chega, a estrutura da personalidade alte-
ra-se radicalmente para tornar-se mais integrada, com um objeto bom no
cerne do ego. Esse objeto bom pode estar danificado ou morto e está em
relação com objetos de ajuda ou daninhos que povoafn os mundos inter
no e externo, Esta estrutura mais integrada — que se apóia menos na disse
minação do mundo interno em objetos externos, como acontece na posi
ção esquizoparanóide — forma uma fronteira mais consistente do ego e
um senso de identidade e dos conteúdos do self mais realista e, portanto,
mais estável.
Meltzer (1973) descreveu o desenvolvimento da estrutura psíquica à
medida que ela se desloca da posição esquizoparanóide para a posição de
pressiva em termos do aumento do uso da introjeção e do estabelecimen
to dos pais com binados como um casal no âmago do mundo interno [ver
FIGURA COMBINADA DOS PAIS].
R.D.Hinshehoood / 325
De modo semelhante, relações internas perversas entre as partes da per
sonalidade foram descritas por Steiner (1982), que mostrou que as partes
boas da personalidade podiam ser exploradas pelas partes más como uma
espécie de traje de mascarado por trás do qual aqueles podiam ocultar-se.
Relações amorosas escondem uma qualidade perversa de crueldade secre
ta da qual a parte má ou perversa da personalidade pode tirar prazer.
Psicose escinâida: A separação dos aspectos maus ou psicóticos do mun
do interno em um compartimento separado foi descrita por Bion em 1957.
Neste quadro de referência, os primeiros objetos e ansiedades psicóticas
permanecem sendo profundamente escindidos "(..,) figuras terrificantes
(...) relegadas às camadas profundas do inconsciente" (Klein, 1958, p.
241), Elas se acham, aparentemente, fora de contato com o self não-psicó-
tico, mas, contudo, permanecem sempre disponíveis para reativação em
certas circunstâncias.
Sidney Klein (1980) descreveu evidências em sonhos de objetos duros e
encapsulados que contêm partes psicóticas escindidas da personalidade,
que podem ocorrer mesmo em pacientes neuróticos. Bick descreveu a pre
servação, no bebê muito pequeno, de uma "fachada" rígida e externa à
personalidade. Descreveu ela "fenômenos de segunda pele" [ver PELE], cu
jo propósito era proteger o bebê da experiência de um despedaçamento
ou dissolução catastrófica (Symington, 1983, 1985) [ver ANIQUILAMEN
TO]. A fim de proteger-se da falta de um objeto que o segure e ao qual o
bebê possa adequadamente relacionar-se, diversos métodos de atividade
muscular ou verbal proporcionam uma forma de enfocar a sua atenção
em um estado integrado, algo que normalmente seria conseguido pelo ma
milo e seio da mãe.
Rosenfeld demonstrou como os elementos encapsulados da psicose po
diam ser identificados com órgãos físicos dentro do corpo, as "ilhas psicó
ticas" (Rosenfeld, 1978). Este domínio restrito da psicose não era na reali
dade idéia nova, de vez que Freud já o descrevera com clareza:
A distinção nítida entre neurose e psicose, contudo, é enfraquecida pe
la circunstância de que também na neurose não faltam tentativas de subs
tituir uma realidade desagradável por outra que esteja mais de acordo
com os desejos do sujeito. Isto é tornado possível pela existência de
um mundo de fantasia, de um domínio que se toma separado do mun
do externo real por ocasião da introdução do princípio da realidade.
Desde então este domínio tem sido mantido livre das necessidades das
exigências da vida. (Freud, 1924, p. 187)
Bion, Wilfred (1957), "Differenüatíon of the psychotic from the non-psychotic personalifcies",
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R.D.Hinshehoood / 32 7
projetivas, e também não pode introjetar objetos bons e que prestou aju
da de maneira a assimilá-los. Ao invés, o sujeito sente-se esmagado por
eles. "Esvaziamento" é um termo descritivo da experiência que o paciente
tem do processo que resulta na despersonalização.
E v o lu çã o Ver DESENVOLVIMENTO.
R.D.Hmshelwood / 329
ranóide (externaíização) que ela própria descrevera* Reconheceu a contri
buição que ele fizera da expressão "posição esquizóide" combinando-a com
a sua própria, de maneira a produzir o termo correto, mas um tanto desa
jeitado de "posição esquizoparanóide". Ela esforçou-se, contudo, por indi
car as suas diferenças com Fairbairn no que tangia a outras coisas (especial-
mente o abandono de qualquer teoria das puisões):
Ver~$e-á que algumas das conclusões que apresentarei neste artigo acham-
se alinhadas com as conclusões de Fairbairn, enquanto que outras delas
diferem fundamentalmente. A abordagem de Fairbairn deu-se, em gran
de parte, desde o ângulo do desenvolvimento do ego em relação aos
objetos, enquanto que a minha foi predominantemente desde o ângulo
das ansiedades e suas vicissitudes (...) a ênfase particular que ele deposi
tou na relação inerente existente entre histeria e esquizofrenia merece
plena atenção. Sua expresão "esquizóide" seria apropriada se fosse en
tendida como a abranger tanto o medo persecutório quanto os mecanis
mos esquizóides. (Klein, 1946, p. 3)
Klein havia começado a perceber que havia toda uma classe de mecanis
mos primitivos de defesa especificamente dirigidos contra o sadismo e a
pulsão de morte e reconhecia agora, com Fairbairn, que eles eram diferen
tes dos mecanismos obsessivos que originalmente apontara como candida
tos para as defesas específicas contra o sadismo.
O bjetos introjetados: Fairbairn aceitava que o estágio inicial do ego resul-
tava em um objeto introjetado, mas pensava neste como sendo o objeto
mau. Não havendo necessidade de introjetar o objeto bom, era somente
do mau que se tinha de defender-se, através da introjeção e, depois, cisão.
Isto contrasta com Klein, que achava que, desde o início, tanto os objetos
bons quanto os maus eram introjetados; o bom vinha estabelecer a estabi
lidade do cerne do ego e mostrava os esforços do bebê para proteger a si
mesmo e seu objeto bom quanto ao objeto "mau" (Klein, 1946).
Há uma diferença significativa de enfoque a ser aqui apreciada. Fair
bairn encarava o ego como ancorado na realidade externa, com os objetos
internos e introjetados estabelecidos para defender-se contra (ele emprega-
va a palavra "reprimir") o objeto externo mau. Isto contrastava com o en
foque de Klein voltado para o mundo interno e o desenvolvimento do ego
que, inicialmente pelo menos, resulta na construção do mundo externo ba
seada em manobras projetadas para estabelecer a segurança do mundo interno.
Estruturas endopsíquicas: As abordagens de Fairbairn e Klein aos fenôme
nos da cisão e da fragmentação do seíf eram radicalmente diferentes. De
modo característico, as descrições de Klein exploravam multidimensional-
mente um amplo panorama de fantasias variadas e variantes experiencia-
das pela pessoa a respeito do estado de seu setf. Em contraste, Fairbairn
parecia querer reduzir os fenômenos a segmentos estritamente categorizá-
R.D.Hinshelwooâ / 331
— embora aparentando que não o estava fazendo — e substituindo-o pe
la idéia de fantasia inconsciente, uma visão flexível e fluida da estrutura
interna. Fairbairn, por outro lado, substituiu a estrutura ortodoxa de id/e~
go/superego por um sistema monolítico e aparentemente inflexível de estru
turas endopsíquicas (sistemas de relações objetais), em uma engenhosa ver
são de relações objetais daquela primeira estrutura.
Poder-se-ia dizer que Klein reinterpretou o conceito de "pulsão" de ma
neira a significar a experiência de um objeto que é "dada" pelas sensações
corporais das moções pulsionais, enquanto que Fairbairn remoldou a pul-
são como sendo a "energia" para buscar objetos.
Cisão: A descoberta da importância das cisões no sistema de parte do ego
/relacionamento/objeto deve ser creditada tanto a Fairbairn quanto a Klein,
que estimularam as observações feitas por um e pelo outro. Klein clara
mente continuou a refletir sobre o problema e, embora não reconhecesse
a semelhança com a opinião de Fairbairn, brincou com uma idéia similar:
um tipo especial de cisão que deixava um sistema de relações objetais não
modificado e primitivo em uma parte "profundamente inconsciente" da
mente (Klein, 1958, p. 241) [ver ESTRUTURA].
Amor: Fairbairn foi muito enfático a respeito da importância das relações
objetais na experiência humana. Demonstrou ele, de modo mais crítico
que Klein, que as teorias clássicas de satisfações pulsionais (redução de
pulsão) consideram os objetos como incidentais ao sujeito, existindo unica
mente para a descarga das tensões. Em contraste, ele enfatizou o sentimen
to genuino pelos objetos. É esta qualidade de tentar ligar o amor e a preo
cupação humana com a compreensão científica que o tornam tão interes
sante para o ministro cristão Guntrip [ver AMOR].
Desenvolvimentos posteriores: As idéias de Fairbairn suportaram o tem
po bastante bem. Ele teve dois importantes seguidores —•Guntrip (1961)
e Sutherland (1963) — e é amplamente reconhecido por muitos autores
americanos (ex., Ogden, 1983). Suas intrincadas sondagens teóricas, con
tudo, não foram significativamente desenvolvidas por seguidores posteriores.
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R.D.Himhehvood / 333
nadas com jogos. Estas fantasias demonstravam como algumas de suas
■" fixações eram elaboradas como um interesse por jogos. Em sua primei
ra fantasia sexual (...) o coito já havia sido substituído pelo futebol. Es
te jogo, juntamente com outros, havia absorvido inteiramente o interes
se e a ambição dele. (Klein, 1923, p. 90)
Klein estava demonstrando que, engastadas no processo de gratificação
narcísica, havia fantasia de objetos associados com a "masturbação". Mais
tarde, Heimann, desenvolvendo a visão kíeiniana do narcisismo [ver NAR-
CIS1SMO], descreveu a masturbação como sendo a fantasia de uma rela
ção erótica com um objeto interno:
O auto-erotismo baseia-se em fantasias relacionadas com um seio "bom"
interior e gratificante (mamilo, mãe) que é projetado em uma parte do
próprio corpo do bebê e assim representado por ela. Este processo, por
assim dizer, encontra a meio caminho a qualidade erotógena dos ór
gãos da criança. (Heimann, 1952, p. 147-8)
As zonas erógenas permitem o uso do corpo para a geração de fantasias
inconscientes, especialmente, e de modo intenso mediante a manipulação
masturbatória. A sexualidade erótica é, portanto, um conjunto comumen-
te imaginado de fantasias inconscientes que são elaboradas defensivamen
te contra as ansiedades persecutória ou depressiva. Meltzer (1966) descre
veu um caso em que a masturbação anal era empregada para engendrar
fantasias inconscientes.
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T? «__ *
1 Imediatamente após o nasci-
r a to r constitucional mento, os fatores constitucio
nais compõem-se com os fatores ambientais e o relacionamento profunda
mente entrelaçado entre nutrição e natureza desde o início torna os dois
extremamente difíceis de desemaranhar. O problema é agravado por cau
sa da enorme quantidade de interação que se processou no desenvolvimen
to de um indivíduo antes que qualquer comunicação simbólica direta com
ele seja possível. O estudo dos estados muito iniciais da interação entre o
334 / Dicionário do Pensamento Kleiniano
fator constitucional e o meio ambiente depende de abordagens de observa
ção, tais como a observação de bebês [ver OBSERVAÇÃO DE BEBÊS],
ou de estudos psicológicos acadêmicos da cognição inicial, ou, ainda, de
um estudo psicanalítico dessas condições iniciais mediante as "secções con
geladas" do desenvolvimento que são apresentadas pelos estados de autis
mo (Meltzer et al.; Tustin, 1981) [ver AUTISMO]. Não há dúvida de que
muitas características psicológicas, de modo semelhante às corporais, são
herdadas. A genética da esquizofrenia, por exemplo, demonstra satisfato
riamente que existe uma precondição herdada definida, sobre a qual os fa
tores ambientais (psicológicos) atuam para trazer à tona a psicose (Gelder,
1983).
Pessimismo biológico: Grande parte das críticas a Klein originou-se da ên
fase dada por ela aos fatores "internos", oriunda da suposição pessimista
de que qualquer coisa que se receba por dote dentro da constituição bioló
gica é imutável. Esta não era a opinião de Klein, e, em verdade, é manifes
tamente inverídico biologicamente, de vez que os seres humanos são dota
dos de uma psicologia que é especialmente adaptável. E, de fato, marca
distintiva das teorias de Freud que as puísões humanas são, de modo típi
co, extraordinariamente plásticas. A dotação de uma pulsão sexual, por
exemplo, não impede a atratividade sexual de um conjunto aparentemen
te ilimitado de todo tipo de parceiros, assim como de todos os tipos de
objetos fetiches que são absorventemente atraentes para certos apetites.
A impetuosidade da indústria da moda não existiría sem uma extraordiná
ria disposição por parte da constituição sexual biologicamente dotada a
adaptar-se e buscar o que é novo. Em realidade, parte da dotação biológi
ca humana é ser atraída pela mudança e no sentido de novos objetos [ver
DESENVOLVIMENTO].
Klein é com freqüência criticada por ser indevidamente biológica ao acei
tar de Freud o conceito da pulsão de morte. A plasticidade desta pulsão,
contudo, conduzindo à variedade, engenhosidade e adaptabilidade da des-
trutividade humana sob influências psicológicas e sociais, não é menor
que aquelas da pulsão sexual.
Inveja: Klein, no entanto, enfatizou que as proporções relativas da libido
e da destrutividade podem ser determinadas pela hereditariedade. Estudos
de gêmeos deram ao fator constitucional provas crescentes da existência
de um fator genético na esquizofrenia. Uma balança de pulsão inclinada
em favor da pulsão de morte é predisposição constitucional da inveja par
ticularmente grave desde o início (ver Rosenfeld, 1965), inveja que pertur
ba tanto a mãe quanto a criança e acaba por levar a uma criança esquizói-
de, uma mãe desesperada e um ambiente interpessoal esquizofrenógeno
na família. Uma preponderância de impulsos destrutivos pode ser iguala
da por uma fraqueza inerente do ego, conduzindo a um limiar muito bai
xo de frustração [ver 12. INVEJA],
R.D.Hinshelwood / 335
Está implícito no conceito de fantasia inconsciente que existe fundamen-
- to constitucional para o desenvolvimento de uma mente [ver MENTE] e
para que esse desenvolvimento se dê sob a forma de representar todas as
sensações e experiências como relacionamento com objetos [ver CONHE
CIMENTO INATO]. Que tem de haver algum fundamento biológico no
corpo para o desenvolvimento de uma mente é algo que dificilmente seria
contestado pela opinião científica e psicológica comum. O problema é on
de estabelecer o limite do self psicológico que luta com a dotação biológi
ca [ver SUBJETIVIDADE]. Klein, sem negar a importância do meio ambien
te social, avançou muito no sentido de um quadro de um seíf puramente
psicológico a engalfinhar-se com seus próprios estados internos, com fato
res constitucionais (tais como os sociais) agindo apenas como limites de
restrição.
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Meltzer, Donald (1973), Sexual states o f mild, Perth, Clurtíe.
Ver COITO.
R,D,Hinshelwooá / 339
Entretanto, o trabalho de Freud era, na realidade, apenas descritivo da
distinção entre a coisa e o seu símbolo verbal e isso era mais ou menos tu
do de que ele precisava, enquanto sua técnica fosse verbal. O apoio de
Klein nas palavras foi suplementado pelo valor simbólico do brinquedo in
fantil. Dessa maneira, ela considerava a descarga das crianças no brinçar
como altamente simbólica, fato não apropriadamente suprido nas teorias
de Freud, onde a ação física é igualada a uma descarga direta de energia
pulsional. Klein encarava o brincar como equivalente aos sonhos:
Em seu brincar, as crianças representam simbolicamente fantasias, dese
jos e as suas experiências. Aqui estão empregando a mesma linguagem,
o mesmo modo de expressão arcaico e filogeneticamente adquirido com
que estamos familiarizados nos sonhos. (Klein. 1926, p. 134) [ver 1.
TÉCNICA]
Os sonhos eram admitidos por Freud como alternativa simbólica às pala
vras para descarga da energia mental — admitidos porque tanto palavras
quanto sonhos evitam o recurso à ação muscular. Klein, contudo, demons
trou que o brincar era tão simbólico quanto as palavras, ainda que envol
vesse descarga muscular. Dessa maneira, a fantasia não era necessariamen
te um método de descarga alternativo à ação corporal, como Freud conten
tara-se em deixá-la ser, mas concomitante profundamente importante, se
não a mola mestra, da descarga física de energia. A relação entre descar
ga direta e atividade simbólica fora invertida.
Klein, ela própria, não fez grandes avanços na compreensão da diferen
ça existente entre esses dois mundos (satisfações físicas ou satisfações sim
bólicas), mas apontou implicitamente para a importância do estudo ulte-
rior da formação de símbolos como conquista exclusivamente humana.
Substituição: Klein nunca tornou explícita a discrepância com Freud, de
vez que desejava evitar provocar o mundo psicanalítico ortodoxo. Ainda
assim, muitas pessoas subseqüentemente queixaram-se da visão dita "não
freudiana" que Klein tinha da fantasia (ex. Glover, 1945; Yorke, 1971)
[ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE]. Na parte inicial de sua carreira,
Klein mapeou as vicissitudes da formação de símbolos e as causas e efei
tos da simbolização deficiente (Klein, 1929a, 1929b, 1930, 1931). Demons
trou ela que, desde os estágios mais iniciais, o bebê começa a busca de sím
bolos e o faz a fim de aliviar-se de experiências penosas [ver BRINCAR].
Os conflitos com objetos primários (isto é, o corpo da mãe) e a persegui
ção por eles, em fantasia, promovem a busca de novos relacionamentos,
livres de conflitos, com objetos substitutos (símbolos). Apesar disso, esses
conflitos tendem a seguir e com freqüência afetam o relacionamento com
o objeto substituto (o símbolo), o que acaba por promover nova busca
por outro substituto ainda. Neste caso, ela descreveu um processo de subs
tituição semelhante ao deslocamento, que Freud também pensava ser um
dos fatores subjacentes ao processo de simbolização onírica.
R.D.Hinshehvood / 341
pressão simbólica original e, depois, como base de toda comunalidade ulte-
rior dos símbolos.
Biologia e psicologia: De vez que as sensações corpóreas (que dão origem
a pulsões) são representadas como relacionamentos com objetos [ver 2.
FANTASIA INCONSCIENTE], as experiências das partes do corpo são
objetos para o bebê, independentemente da causa real da sensação. Este é
um mundo mental de concepções, que já são símbolos. Quando o bebê
acaba por perceber objetivamente o mundo externo, a significação desses
objetos externos provém do investimento dos relacionamentos mentalmen
te concebidos. Os objetos externos já são símbolos e têm significado so
mente por causa dos objetos internos; exemplificando, um bebê que espe
rou para ser alimentado em estado de crescente frustração pode voltar o
rosto para o seio quando este acaba por se aproximar; o que acontece é
que, em sua raiva e terror, ele percebe o objeto externo a aproximar-se e
dá-lhe significado identíficando-o com o perseguidor "mau", que pretende
causar-lhe sofrimento e dano.
Inibição da form ação de sím bolos: A capacidade de viver em um mundo
de símbolos afastado do mundo dos objetos físicos e biológicos é a marca
distintiva do desenvolvimento humano. A capacidade de deslocar-se para
novos objetos substitutos (símbolos) é um afastamento quanto à ansieda
de, mas constitui também uma movimentação evolutiva.
Klein compreendeu pela primeira vez que a dificuldade que tem o esqui
zofrênico em formar e utilizar símbolos era uma inibição deste processo
de formação de símbolos. A capacidade de identificar objetos, de manei
ra simbólica, com coisas inteiramente diferentes é de grande importância,
e também o mecanismos subjacente ao desenvolvimento do intelecto. Ou
— para expressá-lo de maneira oposta — como Klein descobriu, o fracas
so em simbolizar resulta em uma falta de desenvolvimento intelectual que
se assemelha à esquizofrenia nos adultos (Klein, 1930).
R.D.Hinshelwood / 343
A teoria do desenvolvimento conceptual tem de ser ampliada de manei
ra a incluir não apenas o crescimento no número e raio de ação dos con
ceitos, mas também o crescimento de cada conceito isolado através de,
pelo menos, três estágios: um estágio de representação concreta que,
estritamente falando, não é de modo algum representacional, de vez
que nenhuma distinção é feita entre a representação e o objeto ou situa
ção representados; um estágio de representação ideográfica, tal como
acontece nos sonhos, e um estágio final de pensamento consciente e
predominantemente verbal. (Money-Kyrle, 1968, p. 422)
A progressão através destas três etapas faz parte integrante do avanço do
sujeito no sentido da posição depressiva e através dela.
(i) Representação concreta: O momento de conscientização de uma sensa
ção corpórea resulta em uma fantasia concreta (inconsciente) de um obje
to que tem uma realidade integral.
(ii) Iâeógrafos: A conversão de eíementos-beta em conteúdo mental utilizá
vel resulta no que Bion considerava "ideógrafos" ou o ''mobiliário dos so
nhos" (elementos-alfa).
(Ui) Verbalização;Os ideógrafos (elementos-alfa), se foram formados, são
adequados para com ele se criar sonhos, mas também para o desenvolvi
mento simbólico ulterior em representações verbais.
Pavor sem nome. Os dois passos — entre (i) e (ii) e entre (ii) e (iii) — depen
dem de estar a função-alfa funcionando de modo satisfatório. Quando es
tá, os estágios acima podem ser seguidos; contudo, em caso de falha da
função-alfa (Meltzer, 1978), ela é substituída por uma função diferente
em que se despe progressivamente de significado os objetos, que se tornam
cada vez mais persecutórios; isto dá origem a um estado de terror ao qual
se pode referir como "pavor sem nome" [ver PAVOR SEM NOME].
A função-alfa pode falhar por causa de frustração excessiva por parte
do mundo externo real, quando há tão pouco acasalamento de preconcep-
ções com realizações que nenhum desenvolvimento de concepções e capa
cidade de pensar corretamente ocorre, ou, alternativamente, o indivíduo
pode possuir um grau tão alto de inveja inata que ele não pode fazer um
elo de ligação com "K", mas apenas com uma forma cruel ("~K"), que cria
objetos de pensamento extremamente persecutórios [ver ELO DE LIGA
ÇÃO]. Nestes casos, há uma "inversão da função-alfa" (Meltzer, 1978) e
os conceitos percorrem de volta as três etapas, partindo do pensamento
verbal, passando pelos ideógrafos onírico e chegando à representação con
creta e, talvez (nos distúrbios psicossomáticos), finalmente, aos estados
corporais. Esta batida em retirada é o aspecto cognitivo de uma retirada
da posição depressiva para a posição esquizoparanóide [ver DEFESA PA-
RANÓIDE CONTRA A ANSIEDADE DEPRESSIVA].
R.D.Hinshelwood / 345
da fusão com as diferenças. Trata-se de uma idéia abstrata da situação psí
quica para que Segai apontava quando descreveu a beleza como sendo
uma qualidade da luta por restaurar um objeto partido em pedacinhos e
em relação ao qual um luto é feito. A oscilação entre os fragmentos e o
todo é um tema que foi posteriormente retomado por Bion, ao descrever
as oscilações entre a posição esquizoparanóide e a posição depressiva que
são subjacentes a todo esforço criativo, não apenas o artístico, mas tam
bém o científico (Bion, 1962) [ver Ep-D].
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R.D.Hinshelwood / 349
reza da fantasia, dos misteriosos objetos internos e do arcabouço teórico
da posição depressiva. Entretanto, esses seguidores foram se afastando pou
co tempo após isso. Susân Isaacs faleceu em 1948; o interesse de Joan Ri-
viere pelo trabalho minguou à medida que envelhecia e ficava particular
mente desconcertada com a virulência da rivalidade com os analistas clás
sicos de Viena; Paula Heimann acabou por buscar um grau maior de inde
pendência profissional em 1956 [ver HEIMANN].
(iv) Pouco após a guerra, um certo número de médicos jovens, alguns emi
grantes que não eram anteriormente analistas, chegou para fazer formação
com Klein. Eles foram talvez a verdadeira segunda geração e permanece
ram com o grupo; notáveis entre eles foram Hanna Segai, Herbert Rosen-
feld e Wilfred Bion. Foram estas pessoas, juntamente com o sólido apoio
do mais afastado Roger Money-Kyrle e, posteriormente, com o acréscimo
de Donald Meltzer, que levaram à frente o pensamento kleiniano, quase
inteiramente na base da ampliação do conceito da identificação projetiva.
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R.D,Hinshehvood / 351
sa época, havia considerável interesse em examinar a natureza e o possí
vel uso da contratransferéncia [ver CONTRATRANSFERÊNCIA].
Heimann mostrou-se muito crítica das tentativas feitas por analistas de
manterem uma fria falta de reação, à maneira de um cirurgião que faz
uma operação (ver Freud, 1912). Ao invés, argumentou ela que os senti
mentos do analista bem podem ter alguma correspondência com os senti
mentos transferenciais do paciente e são, portanto, uma pista quanto à
transferência, ou aspectos ocultos desta [ver 1. TÉCNICA; CONTRA
TRANSFERÊNCIA].
Isto apresenta também perigos potenciais, de vez que poderia permitir
aos analistas rédea livre para "acusar" o paciente por todos os estados
mentais do analista. O problema de distinguir entre os sentimentos do ana
lista que derivam de uma posição que lhe é atribuída pela transferência
do paciente e aquele que são defensivos contra o paciente e a transferência
deste tem sido fonte de considerável debate desde então (Money-Kyrle,
1956; Brenman Pick, 1985; Rosenfeld, 1987) e repete, de certo modo, a
controvérsia a respeito da técnica ativa de Ferenczi (Balint, 1968). Em rea
lidade, alguns analistas assumiram um interesse pela contratransferéncia
como método de justificar o engajamento ativo com o paciente deles: con
tato físico, tomar chá com eles, etc. (Little, 1951; Gitelson, 1952; Winni-
cott, 1971). Heimann, subseqüentemente, criticou esses passos menos orto
doxos (Heimann, 1960).
A divergência com Klein: Aparentemente (King, 1983), Klein pediu a Hei
mann para retirar o seu artigo (sobre a contratransferéncia) em 1950, tal
vez, semelhantemente a Freud, desconfiada do potencial mau emprego da
contratransferéncia; existem histórias apócritas das supervisões de Klein,
nas quais ela criticava com grande humor os estudantes por seu uso da
contratransferéncia. Heimann, contudo, recusou-se a retirar o artigo e assu
miu o crédito por uma importante inovação que outros se achavam por
essa época considerando (ver Little e Langs, 1981; Racker, 1948). A rejei
ção por Klein pode ter sido um golpe severo para Heimann e tenha condu
zido ao seu rompimento. Apesar disso, é possível que ela tenha provoca
do um pouco Klein. Pode-se notar que, embora Heiman tenha sido a gran
de exposítora da teoria kleiniana da posição depressiva na década de 1940,
ela nunca mencionou a posição esquizoparanóide ou a identificação proje
tiva, que^ foram os desenvolvimentos teóricos subseqüentes de Klein nessa
década. É possível que os últimos desenvolvimentos tenham sido colabora
ções com outras pessoas — a geração mais nova de Herbert Rosenfeld,
Hanna Segai, Wilfred Bion — e não com Heimann,
O artigo de 1950 de Heimann pode ter deixado Klein zangada, pois fo
ra escrito sem referência a ela — uma daquelas situações retaliatórias ti
po bola de neve a respeito das quais Klein tanto havia escrito. O proble
ma final, para Heimann, foi a teoria kleiniana da inveja (Klein, 1957 —
apresentada como artigo em 1955), que Heimann não pôde aceitar, embo-
R.D.Hinshelwood / 353
Ui) Klein adotou uma abordagem clínica ao id que não apenas incluía a
pulsão de morte [ver PULSÃO DE MORTE], mas concebia as pulsões sob
a forma de sua representação mental, antes que de suas origens fisiológi
cas. Isto dirigiu a atenção dela para a fantasia e para a fantasia inconscien
te como representação das pulsões [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE].
Por temperamento, Klein foi leal ao "modelo estrutural" de Freud, mas,
na realidade, o "id" mudou de significado em suas mãos, à medida que
desenvolvia suas próprias teorias, Ela abraçou a teoria freudiana da pulsão
de morte, fornecendo-lhe pontos clínicos de referência, e seu modelo de
conflito psíquico concernia ao embate não entre a pulsão de vida e a pul
são de morte per se, mas ao que se dava entre os seus representantes na
fantasia inconsciente. Devido ao fato de o conflito psíquico resultar, na
opinião dela, do impacto da pulsão de morte sobre as relações objetais, o
"id" tendeu a tornar-se um representante dessa pulsão em seus textos. O
conflito freudiano entre o ego e o id (estimulado pelas exigências feitas pe
lo superego ao ego) foi substituído, com efeito, pela idéia kleiniana do con
flito entre a pulsão de vida e a pulsão de morte [ver ANSIEDADE],
Fairbairn, Ronald {1952), Psycho-analytic studies o f the personality, Routledge & Kegan PauL
Freud, Sigmund (1932), "The Ego and the Id", S.E. 19, p. 3-66.
R.D.Hinshelwood / 355
Bick no início da década de 70 (Bick, 1986) e por Meltzer (1975). O traba
lho de Bick no desenvolvimento de um método rigoroso de observação
de bebês (Bick, 1964, 1968) produziu novas idéias a respeito dos momen
tos muito iniciais da vida, do primeiro objeto e da primeira introjeção
(ver OBSERVAÇÕES DE BEBÊS; PELE]. Nos casos em que a identificação
falha, os estágios mais iniciais do desenvolvimento saem mal, de vez que
a identificação projetiva não pode ser corretamente empregada por causa
da ausência de um senso de espaço interno [ver REALIDADE INTERNA].
Meltzer (Meltzer et ah, 1975) retomou estas idéias e descobriu que eram
importantes na pesquisa de uma técnica de análise infantil com crianças
autistas. Ele descreveu uma criança que
(...) tendia a desenhar retratos de casas, nos quais havia uma casa des
te lado do papel e outra no outro lado do papel; quando se o segura
va contra a luz, via-se que as portas eram superpostas, ou seja, um ti
po de casa em que se abre a porta da frente e sai-se pela de trás ao mes
mo tempo. (Meltzer, 1975, p. 300)
No decorrer desta elaboração, Bick e Meltzer começaram a identificar um
padrão nessas formações de "segunda pele" [ver PELE]. Bick, tipicamente,
chamou-o de ato de mímica. Contudo, o que começaram a perceber foi
que a imitação representava a experiência, e a fantasia, de apegar-se a
um objeto, em oposição a projetar-se para dentro dele [ver 13. IDENTIFI
CAÇÃO PROJETIVA]. Um lapso no desenvolvimento de um senso de es
paços internos conduz a uma tendência a relacionar-se a objetos por ma
neiras bidimensional, sem profundidade [ver AUTISMO]:
Este bebê tinha de aproveitar o máximo do ato de sua mãe que apenas
tocava nele, de maneira a que pudesse adormecer novamente. Durante
o banho, quando a mãe lhe tirava as roupas, ele começava a tremer e
tiritar (...) talvez estivesse com frio porque as roupas lhe haviam sido
tiradas, mas isso era tornado improvável pelo fato de que quando a
mãe o tocava com um pedaço de algodão molhado ele também parava
de tremer. Sugeriria eu que esse toque deriva seu poder de sua impor
tância como adesão, como restabelecimento do sentimento de sentir-se
preso à mãe. (Bick, 1986, p. 297)
Ver PELE.
Bick, Esther (1964), "Notes on infant observa ti on jn psycho-analytic training”, Int. /, Psycho-
Artal,, 45:558-66; republicado (1987) em Martha Harris e Esther Bick, The collected pa~
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Meltzer, Donald (2975), "Adhesive identification", Contem porary psychoanah/sis, 11:289-310.
—
O termo "incorporação" refere-se à fantasia
in c o rp o ra ç ã o
T
da absorção corporal de um objeto que é sub-
seqüentemente sentido como fisicamente presente dentro do corpo, ocupan
do espaço e sendo ativo lá. É a experiência que o sujeito tem de um meca
nismo de defesa que é objetivamente descrito como "introjeção".
Ver INTROJEÇÃO.
R.D.Hinshelwood / 357
T *1"** * A inibição é um aspecto importante da teoria psicanaíítica
i n i D l Ç . d . 0 e descreve o bloqueio a uma saída natural da atividade men
tal. Freud (1900) desenvolveu a teoria mecânica de um bloqueio a uma sa
ída natural da atividade mental. Freud (1900) desenvolveu a teoria mecâni
ca de um bloqueio da energia mental, mas Klein acentuou, ao invés, a ini
bição da atividade simbólica e, particularmente em seu trabalho inicial,
do brincar infantil. Ela constituía um dos sintomas mais prevalecentes em
crianças perturbadas e Klein atribuiu-o aos efeitos do sadismo [ver SADIS
MO] (ou da retaliação que o sadismo das crianças pode provocar), o qual
assustava tanto essas crianças que elas inibiam alguma atividade mental.
As vezes, em crianças psicóticas, toda a atividade mental fica inibida
(Klein, 1930; Rodrigué, 1955).
Klein ampliou esta idéia para demonstrar que o sadismo tinha o efeito
de inibir o desenvolvimento em geral e perturbava o desdobramento natu
ral (epigênese) das fases libidinais [ver LIBIDO; DESENVOLVIMENTO].
Ver DESENVOLVIMENTO
R.D.Hinshelwood / 359
sica ocorrida em si próprio, quando seu pai morrera e os cabelos do psica
nalista ficaram brancos de um dia para o outro! Havia claramente um pro
cesso de identificação em processo, assim como introjeção. Em seu exem
plo, os cabelos brancos eram uma identificação com os do pai e, dessa
maneira, a introjeção é de um objeto no ego, provocando a mudança neste.
Abraham demonstrou que o processo de introjeção de um objeto ama
do é muito freqüente e, em verdade, um processo norm al nas relações hu
manas. As pessoas carregam seres amados em seus corações e continuam
um diálogo interno com eles [ver 5. OBJETOS INTERNOS].
A introjeção e o superego: Em 1923, contudo, Freud modificou o concei
to de introjeção, ao elaborar o desenvolvimento do superego. Com o aban
dono dos objetos edipianos amados {mãe e pai), eles são introjetados pa
ra formar o superego, que se torna um verdadeiro objeto interno. O sujei
to não se identifica com ele e permanece sendo uma estrutura interna sepa
rada. Parecem existir, então, duas possibilidades:
(i) a introjeção de um objeto outrora externo, com o qual a identificação
se dá (identificação introjetiva) [ver ASSIMILAÇÃO], e
(ii) a introjeção de um objeto com o qual a identificação não se dá, tal co
mo o superego.
R.D.Hinshelwood / 361
debate acadêmico para as intuições clínicas dos analistas praticantes. Ela
faleceu na plenitude de sua carreira, em 1948.
CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS. Os trabalhos escritos de Isaacs acham-se
espalhados entre a psicanálise e a educação. Tal como acontecia com Klein,
ansiava por distinguir as duas. Seu trabalho psicanalítico é, em grande
parte, uma exposição rigorosa das idéias de Klein, com muitas ilumina
ções clínicas. Ela e Heimann foram as principais protagonistas dos Deba
tes sobre as Controvérsias (Isaacs, 1948; Isaacs e Heimann, 1952). O espí
rito aguçado e o pensamento rápido de Isaacs concederam ao Grupo Klei-
niano vantagem nesses debates, ganhando pontos ainda que raramente con
vencessem a oposição [ver DEBATES SOBRE AS CONTROVÉRSIAS].
Sua última grande e duradoura contribuição foi sua exposição meticulo
sa do conceito de fantasia inconsciente (Isaacs, 1948). É difícil dizer quan
to do conceito, com toda sua profunda importância, tanto filosófica quan
to psicanalítica, foi obra de Isaacs, mas parece provável que a idéia ini
cial, provinda de Klein, a clínica, tenha sido assumida por Isaacs, a pensa-
dora acadêmica, em parceria [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE].
Jo g o Ver BRINCAR.
Freud, Sigmund (1909), "Anaiysis of a phobia in a five-year-old boy", S.E. 10, p,3-149.
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Segai, Hanna (1979), Klein, Fontana.
R.D.Hinshekoood / 363
tamente análoga a uma energia física e considerou-a como gerada pelo es
tímulo das zonas erógenas (boca, ânus, órgãos genitais). Esta teoria da li
bido (Freud, 1905) considerava toda energia mental como derivada de fon
tes sexuais, mesmo que no curso de seu fluxo através do aparelho mental
ela se tornasse "dessexualizada". Deu a essa energia o nome de Hbiâo.
Em resumo, a mente opera dirigindo a libido para algum objeto (que tam
bém pode ser o próprio ego do sujeito); isto equivale a dizer que o objeto
é investido de atenção e interesse (catexia). Quando alguém se acha apaixo
nado, por exemplo, seu ser amado (objeto) é investido de imensas quanti
dades de interesse, absorvendo quantidades enormes de energia mental
(ver PULSÕES; MODELO ECONÔMICO].
As fases da libido: Em cada estágio do desenvolvimento do bebê, a libido
se organiza de modo bastante diferente. Existem três fases principais de
evolução da libido infantil: o estágio oral, em que a boca é o foco primá
rio de interesse; o estágio anal, em que o treinamento de toalete e os subs
titutos simbólicos constituem o interesse preocupante, e o estágio genital,
quando os órgãos genitais iniciam sua longa hegemonia como fontes de
ávido e compulsivo interesse pulsional Iver 3. AGRESSÃO].
Abraham, com extrema precisão, elaborou estas fases através da prepa
ração de um esquema de subfases. Cada um dos estágios de Freud foi di
vidido em dois, resultando num total de seis: (i) estágio oral inicial (su
gar), pré-ambivalente; (ii) estágios oral posterior, sádico (canibalístico);
(iii) estágio anal-sádico inicial, retentivo (excesso de sadismo); (iv) estágio
anal-sádico posterior, expulsivo; (v) estágio genital inicial, fálico e sádico;
(vi) estágio genital posterior, pós-ambivalente, com amor objetai verdadei
ro (objetos totais) (ver Abraham, 1924).
A visão da libido por Klein. As teorias kleinianas da libido incidem em duas
fases: antes e depois do período 1932-35, ponto em que ela adotou a teoria
freudiana da pulsão de morte como conceito clínico.
1920-32: Klein, trabalhando incentivada por Abraham, começou por veri
ficar as descobertas dele com crianças. Descobriu que essas fases não eram,
de maneira alguma, tão assinaladas quanto Freud e Abraham descreviam.
Em verdade, demonstrou ela que, desde o início, havia principalmente
uma mistura de todas essas fases, ou seja, que haviam impulsos orais,
anais e genitais e impulsos sádicos a ocorrerem juntos. Isto não significa
que ele descartou inteiramente a seqüência; em verdade, ela (e, crescente
mente, muitos outros analistas) começou a pensar em um primado de im
pulsos sobre outros impulsos. Todos os tipos de impulsos existem na fase
oral, mas os orais são dominantes, e coisa semelhante ocorre com as ou
tras fases [ver COMPLEXO DE ÉDIPO; 7. SUPEREGO].
Klein continuamente se impressionava com a força dos impulsos sádi
cos e percebeu que parte importante da pressão a progredir através da se
qüência de dominância era efeito do sadismo, do temor da retaliação e
Ver PULSÕES.
Abraham, Karl (1924), "A short study of the development of the libido", em Karl Abraham
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Laplanche, J. e Pontalis, J.-B. (1973), The language of psycho-analysis, Hogarth.
R.D.Hinshelwood / 365
bebê faz dela. No primeiro estágio do desenvolvimento, o bebê não pos
sui a percepção da distância e só conhece a mãe a partir de sensações que
surgem da pele para dentro. A experiência do bebê, quando aprecia a sua
própria sensação corporal, é a de que um objeto, sentido como tendo mo
tivações para com ele, causou as sensações corporais da criança [ver 5.
OBJETOS INTERNOS]. Este objeto primário é às vezes chamado o "seio"
[ver SEIO], sendo apreciado de acordo com ele ser (a) bem ou mal inten-
sionado para com o bebê, e (b) ser experienciado como situado dentro ou
fora da criança.
Existem de fato, ao início, numerosas "mães", cada uma delas vincula
da à gratificação que o bebê recebe ou que lhe falta, dando origem a res
pectivamente uma mãe "boa" e uma mãe "má" para cada necessidade. Es
tas "mães" correspondem a "bebês" separados, ou seja, estados separada
mente experienciados pelo bebê cindem-se uns dos outros e são mantidos
separados para fins defensivos [ver 11. POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓI-
DE; CISÃO].
Ver PAI.
R.D.Hinshelwood / 367
constituirá uma distração para a sessão atual. Descreveu também como
um desejo ambicioso de extrair progresso, quer da análise, quer do pacien
te, pode igualmente lançar uma influência deformante sobre a capacidade
de observar o presente. A referência ao passado (memória ou lembrança)
ou ao futuro (desejo) significa que "a evolução da sessão não será observa
da na única ocasião em que pode ser observada, ou seja, quando está acon
tecendo" (Bion, 1967, p. 18).
Achava ele que suas regras conduziríam a um atravancamento menor
da mente do analista e à maior abertura dela ao paciente. As consequên
cias de adotar-se este estrito regime mental seriam o progresso poder ser
medido em termos do "maior número de variedade de estados de espírito,
idéias e atitudes percebidos em qualquer sessão determinada (...) [e] me
nor obstrução das sessões pela repetição de material que deveria ter desa
parecido e, conseqüentemente, um ritmo mais rápido dentro de cada ses
são, em todas as sessões" (Bion, 1967, p. 18).
Bion, Wilfred (1967), "Notes on memòry and desire", em Blizabeth Spillius, (org.), (1988),
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Freud, Sigmund (1912), ''Recommendations to physidans practising psychoanalysis", S.E.
12, p. 111-20.
R.D.Hinshelwood / 369
no defende o seu ego da ansiedade intolerável pela cisão, expulsão e
projeção de impulsos e sentimentos indesejados em seu objeto. Esta é a
perspectiva das relações objetais sobre a descarga de tensões e estímu
los desagradáveis. (0'Shaughnessy, 1981, p. 182)
No arcabouço do modelo econômico de Freud, uma pulsão inibida quan
to ao alvo dá origem à frustração, enquanto que, no kleiniano, a mesma
situação dá surgimento a um estado de luto por um objeto {ao qual se vi
sa) que não pode ser encontrado. A evacuação da ansiedade experiencia-
da através da identificação projetiva para um objeto é muito diferente da
descarga de uma hipotética energia mental inibida em relação ao seu objetivo.
R.D.Hínshelwooâ / 371
O objetivo disto é tornar mais seguro um objeto interno com preensivo;
uma função com caráter de julgamento fortalece objetos internos de natu
reza persecutória e a posição esquizoparanóide [ver 1. TÉCNICA; CONTER],
Esta função de um objeto que dá suporte e compreensão capacita o pa
ciente a enfrentar e compreender a realidade de seu mundo interno de im
pulsos e do estado de seus objetos, e ele alcança "mudança psíquica e a
longo prazo, em termos de movimento no sentido e para dentro da posi
ção. depressiva; em termos de uma maior integração do self e de uma rela
ção mais total e realística com os objetos" (Joseph, 1989, p. 202). Ela será
"indicada não apenas por um alargamento e aprofundamento das emoções,
mas por sinais de partes do ego a engajar-se em um novo caminho no tra
balho analítico" (Joseph, 1983, p. 296).
Bion, Wilfred (1967), "Notes on memory and desire", em The Psycho-Analytic Forum, 2:272-3
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R.D.Hinshelwood / 373
Klein discordou e afirmou que não existia narcisismo primário. Esta talvez
seja sua mais fundamental diferença teórica com a psicanálise clássica e a
psicologia do ego [ver PSICOLOGIA DO EGO]. Há um certo número de
estágios no desenvolvimento do conceito kleiniano de narcisismo:
(1) o narcisismo e as relações objetais coexistem;
(2) estados narcísicos em oposição a um estágio narcísico;
(3) narcisismo e inveja;
(4) narcisismo negativo, e
(5) estrutura narcísica de caráter.
R.D.Hinshehvooâ / 375
são de morte liga as relações objetais narcísicas à ansiedade, à agressão e
à pulsão de morte.
(3) Narcisismo e inveja. Segai (1983) apontou que Klein, em Envy and gratitu-
de [Inveja e gratidão] (1957):
(...) descreve completamente a disposição estratégica da identificação
projetiva como uma consecução de objetivos invejosos e, também, co
mo uma defesa contra a inveja, tal como, por exemplo, entrar em um
objeto e assumir as qualidades deste. Em conexão a isso, ela não se refe
re ao narcisismo, mas, contudo, em sua obra está implícito que tem de
haver uma relação íntima entre narcisismo e inveja. A descrição por
Freud do narcisismo primário é que o bebê sente a si mesmo como fon
te de todas as satisfações. A descoberta do objeto dá surgimento ao ódio.
Por outro lado, a inveja primária, tal como descrita por Klein, é:
Uma hostilidade arruinante face à compreensão de que a fonte da vida
e das coisas boas residem do lado de fora. Para mim, inveja e narcisis
mo são dois lados de uma mesma moeda. O narcisismo defende-nos
contra a inveja e a diferença residiría nisto: se se acredita em um está
gio narcxsico prolongado, a inveja seria sedundária à desilusão. Se, com
Melanie Klein, argumenta-se que a percepção de uma relação objetai e,
portanto, da inveja, existe desde o início, o narcisismo podería ser vis
to como uma defesa contra a inveja e, portanto, estar mais relaciona
(4) Narcisismo negativo. Rosenfeld (1964) achava que "(...) a força e a persis
tência das relações objetais onipotentes e nardsicas acham-se estreitamen
te relacionadas à força da inveja do bebê" (p. 171). Ele tirou essa idéia
do aspecto agressivo do narcisismo que é devido à inveja e também à pul
são de morte (Rosenfeld, 1971). Identificou ele uma simetria entre a retira
da da libido para o ego (tal como descrito por Freud), por um lado, e a
retirada da pulsão de morte para o ego, por outro. Ao último deu o no
me de narcisismo negativo e também o relacionou à reação terapêutica ne
gativa:
Ao estudar o narcisismo em maior pormenor, parece-me essencial dife
renciar entre os aspectos libidinais e destrutivos dele. Considerando-o
desde o aspecto libidinal, pode-se perceber que a supervalorização do
self desempenha um papel central, baseada principalmente na idolização
do self. A auto-idealização é mantida por identificações onipotentes in-
trojetivas e projetivas com objetos bons e as qualidades destes. Desta
maneira, o narcisista sente que tudo de valioso que é relacionado a ob
jetos externos e ao mundo exterior faz parte dele ou é por ele onipoten
temente controlado. De modo semelhante, quando se considera o narci
sismo, descobrimos que os aspectos destrutivos da auto-idealização
mais uma vez desempenham papel central, mas agora, porém, é a idea
lização das partes onipotentes e destrutivas do self. Elas são dirigidas
contra qualquer relacionamento objetai libidinal positivo e qualquer
parte libidinal do self que experiencie necessidade por um objeto e o de
sejo de deste depender. (Rosenfeld, 1971, p. 173).
No decurso do material clínico apresentado neste artigo, Rosenfeld descre
veu a organização dos objetos e das relações internamente, sob a dominân-
cia de impulsos agressivos autodirígidos, remanescentes da pulsão de mor
te original com que a "externalização" primária descrita por Freud e Klein
não lidou plenamente [ver PULSÃO DE MORTE; ESTRUTURAS].
(5) Estrutura nardsica de caráter. A dissecção feita por Rosenfeld dos dois
tipos de narcisismo é de considerável importância prática e tem sido endos
sada por outros autores. A estruturação da personalidade, tal como descri
ta por Rosenfeld, entre um self "mau" onipotente e um self "bom" aprisio
nado fora anteriormente descrita por Meltzer (1968) e Money-Kyrle (1969),
mas Rosenfeld demonstrou a estabilidade desta organização em certos ti-
R.D.Hinshelwood / 377
pos de personalidade, a que geralmente se costuma designar por “fronteiri
ços" ou "limítrofes".
Segai (1983) deu ênfase à distinção entre uma simples retirada narcísi-
ca, por um lado, e, por outro, a estrutura permanente de personalidade
de uma personalidade narcísica de quem vemos números crescentes"
(p. 270). A estrutura é construída pela "(...) reinternalização do objeto pro-
jetivamente possuído" (p. 270). A estrutura da personalidade acha-se defen
sivamente organizada contra a inveja. Estudos mais recentes sobre a pato
logia das personalidades fronteiriças demonstram o combate contra partes
"más" do self que são compostas de mecanismos e relações objetais liga
das com a pulsão de morte. Este é um dos métodos pelos quais o ego ten
ta organizar as fantasias que expressam essa pulsão e ele contrasta com o
modo mais típico de projetar um objeto "mau", descrito por Klein:
Sustento que a ansiedade surge da operação da pulsão de morte dentro
do organismo, é sentida como temor de aniquilamento (morte) e assu
me a forma de perseguição. O medo do impulso destrutivo parece ligar-
se imediatamente a um objeto, ou, antes, é experienciado como o te
mor de um objeto irresistível e incontrolável. (Klein, 1946, p. 4)
As estruturas patológicas que organizam a pulsão de morte por esta ma
neira foram subseqüentemente descritas por muitos outros (Joseph, 1982;
Steiner, 1982; Brenman, 1985; Sohn, 1985) [ver ESTRUTURA].
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A n a l, 52:169-78.*
R.D.Hinshetwood / 379
ser a remoção, da consciência, apenas da realidade de algum acontecimen
to externo, ou a lembrança dele. Contudo, embora exista uma tendência
dos kleinianos utilizarem o termo "negação" e a dos freudianos clássicos
referirem-se à "repressão", na prática, pouca clareza existe. A distinção
deve ser feita quanto ao grau de violência e onipotência. A negação é uma
obliteração onipotente, sem referência à realidade concreta, enquanto que,
na repressão, a realidade externa é respeitada [ver REPRESSÃO].
Tal como acontece com outros mecanismos primitivos de defesa, a nega
ção refere-se à atividade defensiva de um tipo inicial, primitivo e tipica
mente violeto, no qual o ego luta com ansiedades psicóticas.
O paciente era responsável por construir uma cultura desse tipo no "a-
qui-e-agora" e minha tarefa era a análise dessa estrutura. O que estava
sendo revivido era uma interação com os objetos internos construídos
no passado, e isto precisava ser revisto e integrado. (Brenman, 1980, p. 55)
R.D.Hinshelwood / 381
O objeto externo, portanto, não é apenas o objeto físico, mas sim, inva
riavelmente, a presença psicológica da pessoa (ou do analista). Sandford
(1952), por exemplo, descreveu um paciente cujo objeto fora uma mãe que
utilizava o bebê para nele projetar ansiedade, a qual a criança introjetava,
resultando em uma criança ansiosa. Neste caso, o objeto externo era o in
consciente da mãe — o que pôde ser experenciado no relacionamento trans
ferenciai [ver RÊVERIE].
Grinberg (1962) relatou uma situação semelhante referente à contra-íden-
tificação projetiva, quando descreveu um paciente que se experienciava in
conscientemente como recebendo identificações projetivas do analista. Foi
este reconhecimento de que o objeto é percebido primariamente como pos
suindo motivos e atitudes e apenas secundariamente atributos físicos que
impulsou para o primeiro plano o interesse na contratransferência.
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R.D.Hinshelwood / 383
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cas e motivações mistas boas e mas" venham a ser percebidos [ver 10
POSIÇÃO DEPRESSIVA].
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R.D.Himhehoood / 385
a sensação corporal, juntamente com um conjunto lentamente acumulado
de dados sensórios provindos do contato epidérmico e de outros recepto
res de distancia experienciados em princípio dentro dos primitivos relaciona
mentos objetais. Sendo radicalmente reduzidos a uma entidade unicamen
te motivada, esses objetos são, de um ponto de vista objetivo, parciais, e
por esse nome conhecidos: objetos parciais [ver 1 1 . POSIÇÃO ESQUIZO-
PARANOIDE; OBJETOS PARCIAIS].
■ *»
maus. Este tipo de objeto é portanto "cindido", desde um ponto de vista
objetivo [ver CISÃO], conduzindo a uma cisão no estado do ego e de
seus sentimentos.
(ii) Pulsões instintivas: Em princípio, cada impulso dá origem a um obje
to específico para as sensações corporais características da pulsão: uma
mãe que "causa" a fome, uma mãe que "satisfaz" a fome, uma que causa
frio e outra que aquece, uma que segura o bebê de maneira precária e ou
tra que o agarra com firmeza, etc. [ver PULSÕES; 2. FANTASIA INCONS
CIENTE], Estes objetos referidos pelo nome de "mãe" não devem de ma
neira alguma ser confundidos com a mãe real, tal como é percebida por
um observador externo, de vez que as percepções do bebê são radicalmen
te diferentes e baseadas em estados internos de seu corpo. No começo da
vida, mal existe um reconhecimento do tempo e de um objeto a substituir
outro. Deve-se também notar que esses objetos vem em pares, ou seja,
aqueles que frustram e aqueles que satisfazem. Cada um dos pares corres
ponde à distinção de bom versus mau no item (i), anterior [ver OBJETOS
PARCIAIS],
(iii) Objeto parcial versus objeto total: Estes estados primitivos [ver 11,
POSIÇÃO ESQUIZOPARANÓIDE] em que o bebê teme objetos maus, in
ternos ou externos, dão lugar ao novo estado de excitantes sentimentos
mistos (objetos bons contaminados) e relações ambivalentes [ver AMBIVA
LÊNCIA]. O novo estado, que é tão penoso quanto o primeiro, mas de
maneira diferente, acha-se assim ligado com a experiência de objetos mais
completos, conhecidos como objetos totais. A reversão a relações objetais
parciais e o progresso no sentido de relações objetais totais e uma dinâmi
ca constante e flutuante através de todo o decurso da vida, sendo represen
tada por Bion pelo sinal "Ep-D", que se refere a uma oscilação entre a po
sição esquizoparanóide e a posição depressiva [ver Ep-D].
(iv) Interno/externo: O ego, do nascimento em diante, tem uma fronteira e
experiencia-se em relação ao mundo de fora, que é ínerentemente experien-
ciado como externo. Objetos experíenciados em resultado de sensações cor-
póreas províndas do interior do corpo são sentidos como situados dentro
do ego e constituem, assim, objetos internos: exemplificando, o objeto
causador de fome" é interpretado como localizado dentro da barriga, on
de se situam as dores da fome. Inversamente, os objetos experíenciados
através da pele são vivenciados como situados fora (objetos externos).
Do trabalho de alguns dos colaboradores de Klein, especialmente Bick,
apareceu que a distinção entre dentro e fora pode ser catastroficamente
rompida [ver IDENTIFICAÇÃO ADESIVA], Muito cedo na vida, a locali
zação de objetos como situados dentro ou fora pode ser alterada: um obje
to interno vem a ser expelido para fora ou um objeto externo o seio
do qual o bebê suga vem a ser experienciado como a residir dentro da
barriguinha, fornecendo-lhe as sensações de calor e plenitude. Tais movi-
R.D.Hinshelwood / 387
mentos de objetos em relação às fronteiras do ego são interpretações de
sensações corporais [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE] e, eventualmen
te, de sensações corpóreas induzidas, tais como sugar o polegar [ver FAN
TASIAS DE MASTURBAÇÃO]. O intuito de tais relocalizações na fanta
sia e a estimulação corporal que pode ser empregada para dar surgimento
a essas fantasias é proteger o bebê quanto a objetos temíveis, tais como,
por exemplo, um objeto interno produtor de fome mau e daninho, motiva
do a ferir ou danificar a barriga do bebê [ver 9 . MECANISMOS PRIMITI
VOS DE DEFESA].
(v) Físico versus mentfih No decurso do desenvolvimento, o mundo dos
objetos internos muda e uma qualidade mental torna-se separada de uma
qualidade física (Scott, 1948). Os objetos internos retêm uma qualidade fí
sica, mas ocorre agora uma possibilidade de representação que não é senti
da como sendo uma presença física, mas reconhecida como "mera" repre
sentação. Isto traz consigo as possibilidades do "mundo representacional"
(Sandler e Rosenblatt, 1962) e de representações de "sei/" e de "objeto",
termos que são utilizados no arcabouço da psicologia do ego [ver PSICO
LOGIA DO EGO].
R.D.Hinshelwood / 389
a l 7 3 ) X g f r t h 64)' lntr°ãuCtÍOn t0 the WOrk Klein, Heinemann; republicado
R.D.Hínshelwood / 391
MENTO INATO]. Em particular, o objeto possui um estado de sentimen
to — bom ou mau — e tem intenções ou motivos para com o bebê. O ob
jeto, de início, é sensorio, emocional e intencional, antes que físico. Des
sa maneira, "o seio" não é capaz de conjurar as variadas imagens ou a pe
numbra de significados associados que posteriormente terá na vida. Trata-
se de um objeto com um relacionamento mais simples com o bebê. Toca-
lhe a bochecha, introduz-lhe um mamilo na boca, para intuitos bons ou
maus. Apesar de possuir apenas estas qualidades efêmeras, ele é çompleta-
mente real para o bebê. Tais objetos são chamados de "objetos parciais",
embora, do ponto de vista do bebê, a parte seja tudo o que existe no objeto.
Onipotência: Na posição esquizoparanóide, um objeto parcial existe em
relação às sensações corporais do sujeito. Através da projeção para o obje
to, ele se torna uma extensão narcísica das experiências do próprio ego e
a qualidade de separação do objeto bom não é reconhecida. Somente quan
do o objeto vem a ser reconhecido como total é que ele assume apropria
damente uma existência separada da do sujeito e isto acarreta a irada rea
ção narcísica que realça os temores da posição depressiva, na qual o bebê
está tentando manter o objeto bom a salvo de danos.
A capacidade que o bebê tem de perceber pessoas como objetos totais
gradualmente se desenvolve, à medida que o aparelho visual entra em uso.
Esta capacidade de ver pessoas como totalidades não é apenas uma capaci
dade do aparelho perceptual; ela representa também uma realização emo
cional. De vez que objetos separados são definidos para o bebê em gran
de parte em termos de seus sentimentos e intenções benévolos ou malévo
los para com ele, então reunir as partes em algo mais integrado ou inte
gral significa a fusão em um só objeto, com uma mistura de sentimentos
e intenções, dos objetos separados que representavam sentimentos e inten
ções distintas. Este passo no sentido de sentimentos mistos apresenta uma
situação emocional que é inteiramente nova e muito penosa para o bebê
(ver 1 0 . POSIÇÃO DEPRESSIVA]. Ele tem de abandonar uma visão oni
potente de um mundo que foi criado por sua própria interpretação de
suas sensações corpóreas.
O bjetos parciais e síntese: As partes da personalidade podem ser separa
das e expelidas para o mundo externo: "O fato de que nas fantasias de
George os papéis eram desempenhados por figuras que ajudam, distinguia
o seu tipo de personificações das do brincar de Erna. Três papéis princi
pais achavam-se representados no brinquedo dele" (Klein, 1929a, p. 2 0 1 ).
O mundo interno era descrito, então, em termos de papéis que podem ser
representados de modo separado e que interagiam como se o fosse num
drama representado num palco. De fato, Klein relacionou especificamen
te os dramas que ocorriam internamente no mundo de fantasia dos obje
tos internos a um desempenho realizado sobre um palco (ver Klein, 1929b).
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R.D.Hirtshelwood / 393
Observação de bebêsSCSTír. tíí,S
Guerra Mundial era substanciar as opiniões de Freud a respeito da infân
cia, as quais ele havia formulado por extrapolação retrocedendo desde o
estado adulto. O mesmo imperativo começou a ser sentido a respeito das
descobertas das experiências do bebê no primeiro ano de vida que haviam
provindo da análise, feita por Klein, de crianças mais velhas (de aproxima
damente dois anos e meio em diante). No começo da década de 1950, fize
ram-se tentativas para observar esta idade evolutiva.
O problema é o de ser um observador externo, sem método direto de
tornar-se um ouvinte ao mundo interno do bebê. O estágio de desenvolvi
mento é uma fase em que a vida simbólica encontra-se em um mínimo e,
portanto, as possibilidades de comunicação (que normalmente dependem
de símbolos) são igualmente mínimas. O método utilizado com adultos é
uma comunicação verbal mútua; com crianças, é o brincar delas que se
observa e do qual, às vezes, se participa [ver ANÁLISE DE CRIANÇAS].
Com bebês, torna-se necessário um método novo. O bebê conceptualiza
tudo em termos de objetos em relação a seu corpo, as partes deste e as sen
sações e satisfações diretas delas. Sem alguma forma de comunicação sim
bólica, é qualquer ingresso no mundo do bebê de algum modo possível?
A questão foi furiosamente discutida nos Debates sobre as Controvér
sias, em 1943. Quando o artigo desse ano de Susan ísaacs ("A natureza e
a função da fantasia") foi posteriormente publicado (1948), ela incluiu nele
uma exaustiva introdução que tentava validar o processo da inferência psi-
canalítica: se Freud havia extrapolado, retrocedendo à infância a partir
de adultos, então era válido para Klein extrapolar para a primeira infância
o seu trabalho com crianças.
Klein também efetuou observações diretas de bebês, interpretando, com
base em suas próprias descobertas, os tipos de experiências nas mentes de
les. De modo interessante, quando seu artigo acabou por ser publicado
(Klein, 1952), ele demonstrava apenas quanta atenção ela havia concedi
do ao meio ambiente da mãe e ao estado mental desta como meio ambien
te primário da criança. Ele efetivamente apoiava do dito "não existe essa
coisa chamada bebê" (Winnicott, 1960). Joseph (1948) debateu uma rápi
da observação, em termos do problema de efetuar uma intervenção tera
pêutica. À parte estas observações felizes efetuadas por acaso, o interesse
em bebês fez um progresso lento.
Com unicação não sim bólica: Quando finalmente se compreendeu que exis
tem variedades diferentes de identificação projetiva (Bion, 1957) [ver 13.
IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA], uma via no sentido de um método de
observação de bebês tornou-se possível. A identificação projetiva não é
uma forma simbólica de comunicação, mas compreendeu-se que o impac
to direto de um estado mental sobre outro pode ter um potencial comuni-
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• — . / •
Nos últimos anos,
O rg an izaçõ es p ato ló g icas 1
pacientes com gra
ves distúrbios de personalidade foram submetidos a uma investigação
mais atenta (Rey, 1979). Joseph (1975, 1978) descreveu os problemas técni
cos de trabalhar com esses pacientes [ver TRANSFERÊNCIA; CONTRA-
TRANSFERÊNCIA; 1. TÉCNICA]. Eles não parecem ser psicoticamente
deficientes demais, mas sim atolados em um nível de distúrbio que não
muda, ou muda apenas lentamente, com análises muito longas (Spillius,
1988). Tal como o trabalho efetuado com pacientes psicóticos na geração
anterior, e com crianças na geração que precedeu à última, o trabalho com
os pacientes acima mencionados deu origem a certos desenvolvimentos teó
ricos.
De um ponto de vista kleiniano, as personalidades fronteiriças ou limí
trofes apresentam três características principais:
(i) elas ficaram empacadas em alguma posição intermediária entre as posi
ções esquizoparanóide e depressiva, com uma defensividade complexa tan
to contra a fragmentação da posição esquizoparanóide quanto contra a
culpa e a responsabilidade de posição depressiva (Joseph, 1989) [ver EQUI
LÍBRIO PSÍQUICO];
(ii) desenvolveram-se no contexto de um excesso de pulsão de morte e in
veja, mas conseguiram desenvolver certos tipos de relações objetais está
veis, ainda que estas se organizem em torno da dominância das partes
"más" do self sobre as partes "boas" [ver ESTRUTURA; NARCISISMO
NEGATIVO];
(iii) a estabilidade da personalidade é especialmente frágil e elas consegui
ram chegar além da posição esquizoparanóide apenas pelo desenvolvimen
to de um sistema rígido de defesas, conhecido origínalmente como organi
zação narcísica (Rosenfeld, 1964), depois, sistema delirante dé defesa (Se
gai, 1972), organização defensiva (0'Shaughnessy, 1981) e, então, mais re
centemente, como organização patológica (Steiner, 1982; Spillius, 1988),
de vez que sua função e, de modo claro, não apenas defensiva, mas tam
bém uma adesão rígida a certos tipos de relações objetais e fonte de consi
derável prazer de tipo patológico e, usualmente, perverso [ver NARC1SIS-
MO; ESTRUTURA].
Vários autores pesquisaram estes "pacientes com um ego fraco que, com
mais perseguição que o normal, chegam na primeira infância às fronteiras
da posição depressiva, tal como definida por Klein (1935), mas são então
incapazes de com ela lidar e, ao invés, formam uma organização defensi
va" (0'Shaughnessy, 1981, p. 359) [ver ANSIEDADE DEPRESSIVA; AN-
R.D.Hinshelwood / 399
po Kleiniano. Mais tarde, ele descreveu um mundo interno em que a fun-
ção-alfa fracassa; trata-se de um mundo dominado pelo despojamento de
significado de todas as experiências e pela produção de mísseis extrema
mente persecutórios (elementos-beta), expelidos com a finalidade de elimi
nar toda a experiência (Bion, 1962) [ver PENSAR; FUNÇÃO-ALFA]. A
idéia de partes separadas de uma personalidade isolada dividida segundo
o eixo psicose-neurose conquistou considerável peso e foi central para as
idéias relativas à estruturação da personalidade [ver ESTRUTURA]. Melt-
zer (1968) e Money-Kyrle (1969) descreveram conflitos internos entre uma
parte do self que era capaz de experíenciar a dependência e relações obje
tais mais realísticas, e outras partes que assumia uma atitude de deboche
para com os benefícios das relações objetais e constantemente distorcia o
indivíduo no sentido de atitudes fúteis, desesperantes, destrutivas ou auto-
destrutivas [ver ESTRUTURA], Money-Kyrle (1969), nesta ocasião, descre
veu também a luta interna entre as partes sãs e insanas do self.
Idealização das partes >!m âs>r do self: Rosenfeld (1971) descreveu a idealiza
ção do self 'mau" e o narcisismo negativo como sendo proposição geral
nesses pacientes ''fronteiriços" [ver NARCISISMO; NARCISISMO NEGA
TIVO]. Descreveu uma estrutura na qual, tal como na de Meltzer, a pul-
são de morte se organiza dentro da personalidade como um objeto, ou gru
po de objetos, que domina o restante da personalidade. As partes destruti
vas e autodestrutivas da personalidade exigem ser idealizadas e intimidam
ou seduzem as partes amorosas, construtivas e mais realísticas da persona
lidade a essa idealização. Sxdney Klein reenfatizou em 1980 a importância
da descrição original, feita por Bion, do contraste entre psicótico e não-
psicótico dentro da personalidade e descreveu clinicamente o conhecimen
to inconsciente, por seus pacientes, de estruturas dentro deles próprios a
que deu o nome de "autistas". Áreas da personalidade são dominadas pe
la pulsão de morte e encapsuladas e separadas do restante da personalida
de, que mantém um estado mais "normal" (neurótico). Estas cápsulas emer
giam em sonhos como objetos de casca dura, tais como moluscos, etc., e
Sidney Klein referiu-se ao conceito de Rosenfeld (1978) de "ilhotas" de psi
cose que podem ser convertidas em patologia somática. Por volta desta
época (1970), Brenman (1985a e b) descreveu um superego cruel que domi
nava internamente a personalidade da maneira- antes descrita por Bion
(1962). A fim de manter uma crença idealizada nos aspectos cruéis, vinga
tivos e destrutivos da personalidade, argumenta Brenman, é necessária
uma grosseira restrição da percepção, uma estreiteza de mente. Isto elimi
na a compreensão humana e exige "a adoração da onipotência, que é sen
tida como superior ao amor humano e à capacidade humana de perdoar,
o apego à onipotência como defesa contra a depressão e a santificação do
ressentimento e da vingança" (Brenman, 1985a, p. 280), Esta supressão
da percepção é ilustrada também por Steiner (1985).
R.D.Hinshelwooâ / 401
neira pela qual as partes remanescentes da personalidade lidam com es
sa destrutividade. Nos pacientes psicóticos, esta parte destrutiva do self
domina a personalidade, destruindo e imobilizando as partes saudáveis,
No indivíduo normal, a parte destrutiva é menos escindida, de manei
ra que pode, em maior grau, ser contida e neutralizada pelas partes sa
dias da personalidade. Permanece uma situação intermediária, em que
o equilíbrio é maior, o que resulta, clinicamente, em estados fronteiri
ços e narcísicos. Aqui, a parte destrutiva do self não pode ignorar com
pletamente as partes sadias, sendo forçada a levá-las em conta e a ingres
sar em uma ligação com elas. (Steiner, 1982, p. 242)
A ligação cria uma questão complexa, na qual partes sadias da persona
lidade são induzidas a conscientemente conluiar-se com intuitos sentidos
como destrutivos e são assim perversamente utilizadas para mascarar-se
como saúde [ver PERVERSÃO],
Excitação: Em muitas destas descrições, a organização patológica oferece
gratificações perversas de um tipo excitante, nas quais os objetos são oni
potente e sadomasoquistamente controlados (Meltzer, 1968; Riesenberg-
Malcolm, 1970; 0'Shaughnessy, 1981; Joseph, 1975, 1982, 1983; Brenman-
Píck, 1985), A excitação seduz as partes cooperativas da personalidade pa
ra longe do desenvolvimento normal e das relações objetais "boas" e curativas:
Tecnicamente, é extremamente importante estar claro se o paciente es
tá-nos falando a respeito de um desespero real e comunicando-nos esse
desespero (ou depressão ou medo ou perseguição), que ele quer que com
preendamos e o ajudemos com ele, ou se está se comunicando de ma
neira a primariamente criar uma situação masoquista na qual pode ser
apanhado. (Joseph, 1982, p. 318)
O funcionamento de uma organização patológica distorce as realidades
interna e externa de tal maneira (Riesenberg-Malcolm, 1981b; Joseph, 1983)
que estes pacientes têm sido às vezes chamados de "perversões de caráter"
[ver PERVERSÕES], ainda que possam não apresentar perversões sexuais
explícitas. Entretanto, o elemento sadomasoquista destas defesas não é in
variavelmente relatado, de maneira que resta a ser visto se ele constitui
elemento integrante da organização patológica.
R elações internas das organizações patológicas: Na descrição que Sidney
Klein (1980) fez das partes autistas do self, o paciente parece ser inatingí
vel porque grande parte da.personalidade acha-se encerrada dentro da par
te psicótica encapsuíada da personalidade. Em contraste com isso, outros
autores consideraram a organização patológica como profundamente im
plicada em um conflito interno que surge da intimação (Rosenfeíd, 1971)
ou sedução (Meltzer, 1968; Riesenberg-Malcolm, 1970) das partes "boas"
do self pelas partes "más". Steiner, por sua vez (1982), postulou a existên
cia de uma ligação entre as partes "más" e "boas" do self. Dessa maneira,
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R.D.Hinshehoood / 405
medo de retaliação, Ela retratou isto como um "(...) círculo vicioso domi
nado pela pulsão de morte, no qual a agressão dá origem à ansiedade e a
ansiedade reforça a agresão' (Klein, 1932, p. 150), Ela descreveu a manei
ra pela qual as crianças podem se ver apanhadas por este círculo vicioso
que conduz ao pânico e ao pavor noctumuB {terrores noturnos) e desco-
briu~se a pensar a respeito da relação entre esses estados e a«psicose para-
nóide nos adultos. Ela acabou por descobrir, em uma criança gravemen
te inibida, que esses temores paranóides eram tão intensos que inibiam to
da a atividade, inclusive a capacidade de criar símbolos. Klein percebeu
então que esses crescendos de agressão e medo eram, em verdade, a base
para as psicoses {Klein, 1930).
Embora Klein estivesse muito cônscia da importância dos sentimentos
amorosos e bons [ver AMOR], ela sempre encarou os impulsos agressivos
e os círculos viciosos a que dão origem como sendo o distúrbio decisivo
que interrompia a capacidade de amar.
Klein, Melanie (1930), "The importance of symbol-formation in the development of the ego"
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c o m m
X d V UI bCÍIl num eo Este foi um íermo usado pela pnmei-
ra vez por Karín Stephen {1941) para
descrever o grau extremado de ansiedade na primeira infância: "um pavor
da impotência em face da tensão da pulsão na infância" (p. 161). "Pavor
sem nome" ou "pavor inominável" recebeu mais tarde de Bion um signifi
cado mais pleno e específico para descrever um estado de medo sem sen
tido que surge no contexto de um bebê com uma mãe incapaz de "rêverie"
[ver RÊVERIE], conceito derivado da teoria bioniana do conter [ver CON
TER], Quando a mãe fracassa em conter os terrores do bebê e torná-los
significativos, este "objeto rejeitante da identificação projetiva" [ver PEN
SAR] é sentido como despindo de significado a experiência e o bebê; este
portanto reintrojeta, não um medo de morrer tornado tolerável, mas
um pavor sem nome" {Bion, 1962a, p. 116). Com a recorrência repetida
deste fracasso projetivo, um objeto interno é formado segundo as mesmas
linhas através da introjeção; este objeto destrói o significado e deixa o sujei
to em um mundo misterioso e sem sentido:
Na prática, significa que o paciente sente-se cercado não tanto por obje
tos reais, coisas-em~si, mas por objetos bizarros que são reais apenas
no fato de serem o resíduo de pensamentos e concepções que foram des
pidas de seu significado e ejetadas (Bion, 1962b, p. 9 9 ) [ver CONTER}.
Um objeto interno que despoja de significado dá surgimento a um supere-
go que edita injunções sem sentido a respeito do comportamento.
R.D.Hínshelwooâ / 409
tido pelo bebê como se fosse uma pele parcial, uma pele que tende a desen
volver "burados".
A segunda pele: Bick achou que havia uma reação específica de que o be
bê se valia quando o objeto continente era, de modo particular, incerta
mente estabelecido. Para desenvolver um método de manter-se unido, o
bebê gera fantasias onipotentes que evitam a necessidade da experiência
passiva do objeto:
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R.D.Hinshelwood / 411
na, primária e o doloroso e sub-reptício pensar a respeito dos mistérios da
sexualidade dos pais (Klein, 1923). Seu interesse no componente epistemo-
fílico da libido ocasionou algumas modificações de vulto na compreensão
da curiosidade e do conhecimento, ambos inerentes desde o começo da vi
da (Klein, 1930,1931) [ver EPISTEMOFILÍA; CONHECIMENTO INATO].
Embora o interesse de Klein por este aspecto de seu trabalho tenha min
guado durante certo tempo, ele ganhou um novo ímpeto quando diversos
de seus colaboradores começaram a analisar esquizofrênicos e se viram
confrontados por distúrbios graves de cogníção. Rosenfeld e Segai produ
ziram material clínico a analisar o pensamento fraturado e a cisão de per
sonalidade desses pacientes [ver ELO DE LIGAÇÃO]. Bion, contudo, le
vou isto mais à frente e deu início a uma ampla viagem teórica, tomando
como ponto de partida as dificuldades que os esquizofrênicos têm em efe
tuar elo de ligação intelecutal (Bion, 1959) [ver ELO DE LIGAÇÃO]. As
maneiras anormais pelas quais os esquizofrênicos utilizam o seu aparelho
mental levou-o a uma compreensão do pensamento normal.
O trabalho de Bion descrevia várias visões diferentes do pensar (Spil-
lius, 1988), todas elas apresentadas em suas duas publicações de 1962: (1)
o acasalamento de uma pré-concepção com uma realização; (2 ) o acasala
mento de uma preconcepção com uma ausência, e (3) um processo que
dependia da função-alfa, originalmente proporcionado pela mente mater
na em um estado de "rêverie"; a mente da mãe forma um objeto capaz
de compreensão, que pode ser introjetado para formar a base da função
do pensar. O último destes modelos foi o que ele escolheu para elaborar
melhor (Bion, 1970) e outros autores o adotaram como sendo uma teoria
kleiniana do pensar.
R.D.Hinshekoood / 413
é um afastamento importante dos acontecimentos que Freud descreve
como característicos do pensamento na fase da dominância do princípio
da realidade, Aquiio que deveria ser um pensamento, um produto da
justaposição, da preconcepção e da realização negativa, torna-se um
objeto mau, indistinguível de uma coisa em si, adequada apenas para
evacuação, (Bion, 1962a, p. 112}
Um aparelho para pensar fracassa então em desenvolver-se e, ao invés, é
o uso da identificação projetiva que se desenvolve:
O modelo que proponho para este desenvolvimento é o de uma psique
que opera segundo o princípio de que a evacuação de um seio mau é
sinônimo de obter-se sustento de um seio bom, O resultado final é que
todos os pensamentos são tratados como se fossem indistinguíveis de
objetos internos maus; a maquinaria apropriada é sentida como sendo
não um aparelho para pensar pensamentos, mas como um aparelho pa
ra livrar a psique de acumulações de objetos internos maus, (Bion, 1962a,
p. 112)
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R.D.Hinshehvood / 4 1 7
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Ver BRINCAR.
R.D.Hinshelwood / 419
Rosenfeld (1971) e outros autores chamaram repetidas vezes a atenção
para as manifestações de destrutividade e sadismo arbitrários em relação
ao analista e para a maneira porque isto é organizado como parte da per
sonalidade — uma perversão de caráter [ver NARCIS1SMO; ESTRUTU
RA]. A organização interna da pulsão de morte pode resultar em partes
más do self intimidarem as partes "boas'' (por exemplo, Money-Kyrle,
1969; Rosenfeld, 1971) ou em as partes perversas do self poderem seduzir
as partes "boas" (Meltzer, 1968; Steiner, 1982) [ver ESTRUTURA].
Steiner (1982) descreveu detalhados materiais clínicos que demonstram
as descrições mais gerais, feitas por Joseph (1975), da maneira pela qual
partes aparentemente boas do self podem ser assumidas e utilizadas a fim
de seduzir, distorcer e perverter o relacionamento com o analista, de ma
neira que aquilo que aparece como impulsos cooperativos e amorosos ocul
ta tentativas secretas de controlar e invadir [ver ORGANIZAÇÕES PATO
LÓGICAS].
P e sa r Ver LUTO
R.D.Hinshêhvood / 421
do, de vez que no desenvolvimento normal as ansiedades e os mecanis
mos psicóticos nunca predominam isoladamente (fato que, naturalmen
te, enfatizei), a expressão "fases psicóticas" realmente não é satisfatória.
Estou empregando agora o termo "posição" (...) Parece-me mais fácil
associar com esta expressão (...) as diferenças existentes entre as ansie
dades psicóticas evolutivas da criança e as psicoses do adulto, ex . , 1 a
rápida mudança que ocorre de uma ansiedade de perseguição *ou senti
mento deprimido para uma atitude normal, reviravolta essa que é tão
característica da criança (Klein, 1935, p, 276n)
O termo "posição", achava ela, indicaria um ponto de atração regressiva
no psicótico, antes que a psicose franca. Dessa maneira, chamou-as de po
sições psicóticas, a serem contrastadas com as posições libidinais, por esta
rem relacionadas com os métodos primitivos e violentos de lidar com as
manifestações da pulsão de morte.
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P re ssu p o sto s b á s ic o s L ™ 0
R.D.Hinshelwood / 423
Bion no modelo psicanalítico de um funcionamento refinado da mente ba
seado em um inconsciente fervilhante foi observado por Wilson (1983).
O estado de grupo de trabalho usualmente mostra sinais de estados ativos
de pressupostos básicos e Bion imaginou os pressupostos como "valências",
que atraíam inevitavelmente pessoas a se reunirem e estabeleciam o senti
mento de pertencer ao grupo.
Bion tentou relacionar as características dos pressupostos básicos aò funcio
namento das instituições sociais: o exército, por exemplo, representava cla
ramente o pressuposto de luta/fuga, e a Igreja, acreditava ele, representa
va o pressuposto de dependência. Via o pressuposto do acasalamento na
aristocracia, uma instituição preocupada com a procriação.
Esta visão da natureza tríplice dos pressupostos grupais tornou-se disse
minada fora da psicanálise (de Board, 1978; Pines, 1985). Embora Bion fi
zesse uma tentativa inicial de relacionar seus achados com o conceito klei-
niano da identificação projetiva (Bion, 1955), subseqüentemente ele aban
donou estas idéias e o seu trabalho com grupos. Mais tarde (Bion, 1970;
Menzies Lyth, 1981), porém, reformulou a idéia do pressuposto de acasala
mento para torná-la mais ou menos básica à vida grupai em geral, ven
do-a como o método principal para examinar a função continente dos gru
pos e como uma maneira apropriada de entender o relacionamento existen
te entre o indivíduo e a sociedade — o místico e o establishment (ver CONTER].
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R.D.Hinshelwood / 425
estão igualmente convencidos e nenhum dos dois é realmente convincente
(Young, 1986). Como este último argüiu, o que faltou a Freud (e ainda
nos falta hoje) é uma linguagem com a qual possamos falar a respeito da
mente e do corpo, e, em verdade, da "pessoa" (Strawson, 1959).
Paralelismo psicofísico: A posição de Freud sobre o problema mente-cor-
po é tecnicamente conhecida, em filosofia, como paralelismo psicofísico,
ou seja, existe uma mente e existe um cérebro. Ambos funcionam à sua
própria maneira. O funcionamento de uma não é traduzível, de modo exa
to, no funcionamento do outro. Nem um nem outro tampouco são primá
rios e determinantes, mas, contudo, tem de se inter-relacionar. Para fins
práticos, os dois existem em paralelo (paralelismo psicofísico), sem especi
ficar qual produz o quê. A fim de progredir como psicólogo, Freud, influen
ciado por Hughlings Jackson, tomou o fenômeno da mente e deixou de la
do o problema de como ela se relacionava ao cérebro.
Interacionismo: E possível assumir uma posição filosófica ulterior e dizer
que a mente surge da atividade do cérebro, o qual, por sua vez, pode ser
manipulado por aquela. Membros do Grupo Kleiniano, que estavam con
siderando a fantasia inconsciente em finais da década de 30 e começos da
de 40, chegaram perto de adotar este interacionismo psicofísico.
Os processos biológicos se espelham em atividades da mente chamadas
de fantasias inconscientes. De igual modo, essas fantasias moldam tanto
a pessoa quando o seu mundo social. Nem os eventos físicos nem os psico
lógicos são primários e torna-se claro, dos textos kleinianos, existir uma
presunção de que possam influenciar-se mutuamente. Dessa maneira, estí
mulos pulsíonais provindos de um estômago vazio, digamos, são mental
mente representados como uma fantasia inconsciente de uma relação com
um objeto (um objeto que causa fome). A mente também pode elaborar
uma fantasia inconsciente como uma manobra defensiva contra intensas
ansiedades de fantasia (Segai, 1,964). Tais fantasias defensivas elaboradas
são iniciadas por manipulação do corpo (masturbação), especialmente nas
fases iniciais da primeira infância; assim, por exemplo, a expulsão das fe
zes pode ser utilizadas para dar início à fantasia de expulsão de um obje
to interno mau [ver FEZES]. Mais tarde, a manipulação das representa
ções simbólicas retém vínculos somáticos (corporais).
Biologia e psicologia: Fantasias de expulsão ou incorporação criam o sen
so do self e da identidade, e as fantasias específicas reúnem o caráter espe
cífico do self, Processos projetivos também criam as percepções do mun
do social, em torno do qual, por sua vez, mediante processos introjetivos,
eles precipitam formas sociais no indivíduo. O desenvolvimento do bebê
é um deslocamento para fora de um mundó de, satisfação corporal e para
dentro de um mundo de símbolos e satisfação simbólica. Há um movimen
to progressivo a sair do corpo para dentro do mundo simbólico da mente
amadurecida [ver FUNÇÃO-ALFA]. Esse movimento ocorre na geração
R.D.Hinshelwood / 427
do longa. O termo veio primeiramente da óptica e da nova ciência da car
tografia no século XVI, chegando no século XIX à psicologia da percepção,
donde Freud introduziu na psicanálise.
Há vários sentidos em que o termo "projeção" é utilizado: (i) percepção;
(ii) projeção e expulsão; {iii) externalização de conflitos; (iv) projeção e iden
tidade, e (v) projeção de partes do self,
(i) Percepção: No sentido fisiológico, certas experiências são interpretadas
como projetadas fora, mais além do alcance real do órgão perceptual. Des
sa maneira, embora o impacto dos raios luminosos aconteça fisiologica-
mente na retina, a interpretação visual é atribuída a alguma distância
maior ou menor, na frente dos olhos. De modo semelhante, o cego que
caminha com sua bengala branca encontrará um obstáculo mediante as
sensações tácteis na palma da mão que está segurando a bengala. Apesar
disto, ele com precisão projeta a sua percepção de um objeto para a outra
extremidade da bengala. Isto é "projeção", tal como o termo é normalmen
te empregado na psicologia da percepção. Com base em sensações corpo
rais, o bebê projeta da mesma maneira um objeto que está causando essas
sensações [ver PULSÕES; 5. OBJETOS INTERNOS]. A projeção é, portan
to, parte de um processo normal de interpretar os dados sensorios do siste
ma perceptivo [ver FUNÇÃO-ALFAj.
(ii) Projeção e expulsão: Freud (1895) já havia notado, a ligação existente
entre projeção e paranóia. Abraham (1924), ao investigar a melancolia e
a importância, nesta condição, do "objeto perdido" ou do temor de perdê-
lo, reconheceu que uma importante fantasia era a fantasia anal de expelir
fisicamente do corpo um objeto. Ele ligou o impulso à expulsão anal ao
mecanismo de projeção.
(iii) Externalização de conflitos: Klein achou que o mecanismo de projeção
era importante na externalização de conflitos internos no brincar com obje
tos externos (Klein, 1927). Esta forma de projeção nos atos delinqüentes
confirmou a opinião de Freud a respeito dos criminosos que atuam a par
tir de um sentimento inconsciente de culpa (Freud, 1916).
(iv) Projeção e identidade: A projeção tem um papel primordial na existên
cia do ego: "A projeção (...) origina-se do desvio da pulsão de morte pa
ra fora e, em minha opinião, ajuda o ego a superar a ansiedade por livrá-
lo do perigo e da maldade" (Klein, 1946, p. 6 ). A projeção é uma das ati
vidades elementares de fantasia que situam objetos dentro ou fora do ego:
(...) expresso na linguagem das moções pulsionais mais antigos — os
orais — o julgamento é: — Eu gostaria de comer isto — ou — Eu gosta
ria de cuspi-lo fora — ou, colocado de modo mais geral: — Eu gostaria
de receber isto em mim e manter aquilo fora — o que equivale a dizer
Ficará dentro de mim — ou — ficará fora de mim. Como já demons
R.D.Hinshelwooá / 429
(d) Identificação projetiva: Esta constitui a visão mais tradicional da proje
ção, na qual parte da self é atribuída a um objeto. Assim, parte do ego
— um estado mental, por exemplo, tal como uma raiva indesejada, o ódio
ou outro sentimento mau — é vista em outra pessoa e completamente re
pudiada (negada). Klein chamou isto de "'identificação projetiva" [ver 13.
IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA].
Muitos destes empregos não podem ser completamente distinguidos; a
projeção do objeto, o impulso, o relacionamento ou a parte do self envol
vida são, todos eles, aspectos inextriçáveis do relacionamento objetai.
Onipotência: Bion (19S9) distinguiu duas formas de identificação projeti
va com base no seguinte: uma forma patológica, que é conduzida com
onipotência e violência, e uma forma "normal", sem esse grau de violência
e com a conseqüente manutenção de um senso de realidade interna e exter
na. A forma patológica da identificação projetiva, na qual há confusão
do self com um objeto, deve ser contrastada com a empatia, na qual o
que projeta permanece ciente de sua própria identidade separada [ver 13.
IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA; EMPATIA].
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P sico lo g ia do ego
( P c i V a n a l i c o r - l a c c i í - a V psicanálise clássica' tal co'
\ 1 D Iv -C lX L C L llO C L l d u i j l L C l / mo se desenvolveu até a épo
ca do falecimento de Freud em 1939, continuou sendo um estudo especial
do ego e resultou na escola dominante de psicanálise, a psicologia do ego.
Embora tenha havido afastamentos radicais da tradição freudiana, a psico
logia do ego conquistou uma posição como herdeira da tradição em sua
forma pura, alcançada em parte por virtude dos números. Por haverem
os vienenses emigrado em grande parte para os Estados Unidos e por cau
sa do aumento do interesse pela psicanálise neste país entre a década de
40 e meados dos anos 70, o número de psicanalistas formados segundo a
R.D.Hirtshelwood / 431
ção das pulsões corporais primárias de sobrevivência e sexo. À parte a re
dução das pulsões, diz a psicologia do ego, existe toda uma área de desen
volvimento através da qual o ego passa de maneira autônoma (isto é, inde
pendentemente das pulsões), ou seja, há um reino de desenvolvimento psí
quico fora das pulsões. Postulou-se uma fonte especial de energia psíqui
ca dentro do ego, a qual foi separada da energia pulsional do id, potencial
mente conflitiva.
Desde a década de 1960, contudo, tem havido uma percepção das limi
tações da psicologia do ego, especialmente na área das relações objetais,
e desenvolveu-se um interesse por certos psicanalistas britânicos dessa área,
notavelmente Fairbairn e Rosenfeld (por causa do trabalho do último com
esquizofrênicos) [ver FAIRBAIRN; ROSENFELD]. A escola de psicanálise
da psicologia do ego parece ter ultrapassado o seu apogeu.-Ultimamente,
um certo grau de crítica tem-se mostrado crescente nos Estados Unidos,
baseado na omissão de uma teoria abrangente das relações objetais na psi
cologia do ego [ver adiante].
Assim como Anna Freud e Hartmann, Kris, Loewenstein e Rapaport fo
ram expoentes de vulto da psicologia do ego. Rapaport (1958) deu a essên
cia de um breve resumo histórico desta psicologia, da qual Blanck e Blanck
(1974) produziram um levantamento mais definitivo.
A teoria da adaptação: A característica central da psicologia do ego é a
teoria da adaptação. Partindo de certos aspectos da teoria da ansiedade
de Freud (1926), a noção de funções autônomas do ego (particularmente
as de síntese) foi desenvolvida, descrevendo a maneira pela qual certas ca
racterísticas do ego (motilidade, percepção, memória, etc.) acham-se pre
sentes sem se haverem desenvolvido a partir do id, da vida pulsional ou
dos conflitos a que o id dá surgimento. O ego tem a função, independen
te do id, de adaptar-se ao meio ambiente. Em princípio, a psicologia do
ego presume que o ego normal é dotado, de início, de potencialidades que
progressivamente se desdobram, a fim de atender satisfatoriamente o meio
ambiente de expectativa médica. Dessa maneira, o encontro do indivíduo
e do meio ambiente social (a mediação do id e do superego, feita pelo
ego) é harmonioso, a menos que nele doutra maneira interfira um meio
ambiente inesperado. Esta epigênese do ego que se adapta para enfrentar
a sociedade é inteiramente separada do desdobramento epigenético das fa
ses da libido. Erikson, que definiu os estágios seriais do desenvolvimento
característico do ego, voltou-se especificamente para ela (1951).
A teoria
R.D.Hinshelwood / 433
nião muito importante, de vez que a concepção kleiniana dos mecanismos
primitivos de defesa nos primeiros seis meses de vida simplesmente não é
aceita pelos psicólogos do ego, que encaram o ego como inexistente nesse
estágio [ver 2. FANTASIA INCONSCIENTE; CONTINUIDADE GENÉTI
CA].
Bion elaborou uma teoria do pensar baseada nos dois princípios freudia
nos do funcionamento mental, nos quais os pensamentos e um aparelho
pensante são gerados p or um ego em um turbilhão de conflito emocional,
esforçando-se por administrar seus objetos (internos e externos) [ver PENSAR].
A opinião radical nos Estados Unidos reparou que "a psicanálise modi
ficou a sua função na cultura de nossa época" (Marcuse, 1969, p. 190). O
desenvolvimento de uma abordagem adaptacional representa uma corren
te conformista na cultura americana, espedalmente talvez nas partes imi
grantes. A abordagem adaptacional, ao acentuar um ingresso normaliza
do e não conflitivo do indivíduo na sociedade, como Erikson o faz [ver
acima], tendeu a diminuir os aspectos "negativos" do indivíduo humano
que são inerentemente antagônicos à conformidade social, detalhados por
Freud em 1930 (Jacoby, 1975). Os mecanismos de defesa contra a sexuali
dade foram rebaixados como enfoque da análise, em favor dos mecanis
mos adaptacionais.
R.D.Hinshekvood / 435
pode ser o self infantil e dependente, ou seja, a parte do self que é capaz
de aceitar a dependência.
Esta diferença leva a grandes diferenças em técnica [ver 1. TÉCNICA].
O psicólogo do ego apela ao paciente para que reconheça conscientemen
te certos conteúdos de seu pré-consciente, derivados pulsionais que se acham
mais próximos da superfície da mente do paciente. Desta maneira, o ana
lista alinha-se com o ego do paciente, em sua luta com os impulsos do id.
Klein, ao invés disso, acreditava que, a fim de estabelecer e manter a situa
ção analítica, o analista deve fornecer interpretações profundas, que locali
zem o nível de ansiedade.
Nos Estados Unidos, naturalmente, "a cura da doença mental" tem si
do vista como sendo a tarefa principal da psicanálise, tal como a cura
da enfermidade corporal o é da medicina. Espera-se que qualquer pes
soa que faça psicanálise consiga resultados tangíveis — o tipo de resulta
dos que o médico alcança para o corpo — antes que uma compreensão
mais profunda de si mesmo e um controle maior de sua vida (...) de to
dos os aspectos da teoria freudiana, os mecanismos de ajustamento tor
naram-se os mais amplamente aceitos nos Estados Unidos. Isto revela
a natureza da aceitação americana da psicanálise, particularmente quan
do se sabe que Freud pouco se importava com o "ajustamento" e não
o considerava valioso. A verdade (...) é que o conceito de ajustamento
foi injetado no sistema freudiano porque era de importância primordial
(i) A abordagem com binada: Mahler (Mahler et al., 1975) e, até certo pon
to, Jacobson (1964) mantêm a teoria tradicional das pulsões, enquanto ten
tam chegar a uma síntese com uma teoria de relações objetais: Kernberg
(1980) e Grotstein (1981), por exemplo. Langs (1978) e Ogden (1982), que
adotaram ambos uma forte ênfase relacionai objetai, apesar disso o fazem
por uma maneira que ainda mostra traços da abordagem adaptacional in
terpessoal. Especificamente, utilizaram o conceito de "identificação projeti
va" para enfocar o entendimento no aspecto interpessoal da ambiência ana
lítica.
(ii) A teoria dos dois fatores: Kohut (1971) e Modell (1975) trabalham tan
to com a teoria das pulsões quanto com uma teoria das relações objetais,
usando cada uma delas quando apropriada com certos pacientes, ou em
certos estágios, com determinado paciente.
R.D.Hinshelwood / 437
(iv) Psicologia do self: O trabalho de Kohut (1971) com pacientes fronteiri
ços e narcísicos desenvolveu uma psicologia das relações com o self. Par
tindo da opinião de que o sentimento do self é a primeira luta psicológica
com que o bebê se defronta (quando o narcisismo primário abre caminho
à percepção de um objeto e da relação com ele), Kohut enfocou não tan
to a relação com o objeto, mas o selfr que está tendo de fazer o relaciona
mento. Trata-se de um ponto de vista que se assemelha, em alguns aspec
tos, à opinião desenvolvida por Klein e também por Winnicott de que a
primeira preocupação do bebê é manter seu sentimento de um self contra
o medo do aniquilamento. Aqui, a semelhança é maior com Winnicott, a
quem Kohut presta reconhecimento por haver descrito a importância do
objeto como um espelho usado para desenvolver um retrato do self.
R.D.Hinshelwood / 439
(1) Paranóia infantil: O brincar das crianças é cheio de atos violentos cometi
dos em inimigos e do temor da mesma tortura e morte às mãos desses ini
migos. Klein tomou isto a sério e encarou-o como representando um sadis
mo real nos anos iniciais da criança. A análise da pequena Erna, por vol
ta de 1925, mostrou a Klein que crianças pequenas podem padecer de en
fermidade psicótica: "A medida que a análise progredia, descobri que a
grave neurose obsessiva mascarava uma paranóia" (Klein, 1927, p. lóOn).
Nessa análise, a própria Klein, no brincar,
(...) tinha de passar por fantásticas torturas e humilhações. Se no brin
quedo alguém me tratava com bondade, geralmente revelava-se que es
sa bondade era apenas simulada. Os traços paranóicos se mostravam
em ser eu constantemente espionada, com as pessoas adivinhando os
meus pensamentos. (Klein, 1929, p. 199)
Este é um retrato do mundo da criança, no qual não há pessoa que ajude,
mas apenas perseguidores em potencial. Ataques retaliatórios feitos aos
perseguidores tornam-os mais daninhos do que antes, porque deles se su
põe, em fantasia, que fiquem ainda mais enraivecidos pela violência reta-
liatória. Este tipo de círculo vicioso representa um estado paranóide de
hostilidade, com uma intensa desconfiança de quaisquer figuras "boas":
(...) uma fantasia sobre como ele conseguiría alcançar um lugar melhor
na classe. Fantasiou como se emparelharia com os que se achavam aci
ma dele, os afastaria e mataria, e descobriu, para seu espanto, que ago
ra eles não mais lhe apareciam como companheiros, como acontecia até
há pouco, mas como inimigos. (Klein, 1923, p. 61)
A essência do problema que o psicótico enfrenta e fracassa em superar é
a qualidade de sadismo excessivo, que conduz a fantasias de temível reta
liação por parte dos objetos e a uma cessação parcial ou total da vida de
fantasia (e da vida interna), de modo integral. Esta visão do estado emo
cional extremado do psicótico foi seguida, um ano mais tarde (Klein,
1930a), por um artigo sobre a inibição do desenvolvimento intelectual,
no qual ela demonstrou que certas palavras tornam-se o ponto principal
(ponto de fixação) de fantasias agressivas decisivas que assustam a crian
ça a um grau tal que essas palavras não podiam ser aprendidas [ver FOR
MAÇÃO DE SÍMBOLOS].
O circulo vicioso da paranóide: Achando-se além do ego jovem, a tarefa
de lidar com os círculos viciosos sádicos da paranóia pode conduzir a uma
inibição do processo de expulsão e, portanto, da simbolização. A inibição
desta última distorce ou interrompe todo o processo de desenvolvimento
do ego e do intelecto:
R.D.Hinshelwooâ / 441
condições esquizóides (Klein, 1946), Ao longo do interesse que desenvol
veu pelos esquizofrênicos adultos, ela descreveu a identificação projetiva
e a posição esquizoparanóide. Todas estas condições achavam-se particu
larmente ligadas com o problema do sadismo e da retaliação.
Durante a década de 40, Klein, juntamente com certos íolegas, estudou
a esquizofrenia. Rosenfeld (1947) relatou na totalidade a primeira psicaná
lise de um esquizofrênico conduzida à maneira kleiniana. Utilizou ele uma
técnica rigorosa, restringindo-se à interpretação da transferência (embora
algumas das características normais da situação analítica, tal como o uso
do divã, fossem dispensadas pelo paciente), e Segai (1950) seguiu-o logo
depois com a análise de um esquizofrênico hospitalizado. Esses pacientes
demonstraram a importância de entender os mecanismos da cisão e da iden
tificação projetiva que se acham envolvidos na instabilidade do ego e de
seu senso de identidade, na perda de afeto, nas falhas de cognição e no
prejuízo da formação normal de símbolos, assim como a importância de
uma técnica estrita de análise da transferência [ver 13. IDENTIFICAÇÃO
PROJETIVA; FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS].
(...) saindo de casa na hora em que deveria estar lá. Ela não havia es
quecido que a viagem levava trinta minutos, mas este fato e a ação de
viajar haviam-se tornado completamente dissociados um do Outro (...)
parecia como se todos os processos de pensamento, ações e impulsos
estivessem cindidos em partes inumeráveis, isolados uns dos outros e
mantidos em estado de divisão. A paciente referiu-se espontaneamente
à condição deles dizendo: — Estou novamente dividida (...) A cisão
de pensamentos e ações mostrava-se particularmente em relação à situa
ção analítica; exemplificando, seu atraso freqüente para a análise origi
nava-se do fato de ela dividir sua vinda para esta em muitas ações par
ciais isoladas. Levantar-se, vestír-se, tomar café, pegar o ônibus para a
R.D.Hinshelwood / 443
formulações completamente originais são descritas com detalhes em outros
verbetes [ver BION], de vez que o avanço em teoria provindo do trabalho
com esquizofrênicos teve um efeito profundo sobre todo o corpo da teoria
e da prática kleinianas. Bion distinguiu uma forma patológica de identifica
ção projetiva, encontrada em esquizofrênicos e outros pacientes gravemen
te perturbados, de uma forma mais normal [ver 13. IDENTIFICAÇÃO
PROJETIVA; EMPATIA]. Juntamente com outros, ele estabeleceu que a
identificação projetiva constitui a base para uma comunicação extremamen
te primitiva, não-verbal e não~simbóíica, que se dá entre mãe e bebê. Isto
tornou-se conhecido como "conter" [ver CONTER] e foi importante para
o desenvolvimento da técnica psicanalítica [ver 1. TÉCNICA; CONTRA-
TRANSFERENCIAJ. Bion investigou os processos envolvidos na função
continente da mãe [ver RÊVERIE; FUNÇÃO-ALFA] ou do analista com
pormenores e demonstrou o que podia sair errado com os objetos-rejeitan-
tes-da~identificação~projetiva [ver 13. IDENTIFICAÇÃO PROJETIVA*
CONTER; PENSAR; FUNÇÃO-ALFA].
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U Irfp í teork inic,alJfre
L \Z desenvolveu-se Judia"adaspor
da descoberta, pu,sele,
ões
dos impulsos sexuais da infância. Considerou a Iibido como se achando
em conflito com a sociedade, mas, mais tarde, percebeu este conflito co
mo se dando entre a Iibido e as pulsões do ego que buscam em outros
amor, aprovação e os meios físicos de sobrevivência [ver ANSIEDADE;
LIBIDO]. No decurso do estudo de condições narcísicas tais como as psico
ses maníaco-depressivas, Freud (1914) deu-se ponta de que o apego 'libidi
nal a um objeto e o amor por este podem ser devolvidos ao ego, de ma
neira que este se torna o objeto amado. Neste caso, as pulsões do ego cons-
Críticas ao uso feito por Klein do conceito da pulsão de morte: Tem havi
do muitas críticas bem entrincheiradas da aceitação kleiniana da manifesta
ção clínica da pulsão de morte. A rejeição direta, mas sucinta da teoria
kleiniana a respeito deste ponto, feita por Kernberg (1969) com fundamen
to em ser a pulsão de morte "clinicamente silenciosa", foi refutada por Ro-
senfeld (1971), que descreveu, com ilustrações clínicas, a manifestação de
uma agressão dirigida para dentro, a que então deu o nome de "narcisís-
mo negativo" [ver NARCIS1SMO]. Apesar disso, Kernberg repetiu sua cáus
tica rejeição em 1980: "Os principais expoentes continuaram a aderir a es
tes conceitos e o fracasso deles em responder às críticas de tais conceitos
indica seja sua incapacidade de fazê-lo, seja o seu dogmatismo" (Kernberg,
1980, p. 41) — como se não houvesse notado o considerável volume de
material clínico publicado por Rosenfeld e outros kleinianos (Joseph, 1975;
Sidney Klein, 1974; Meltzer, 1968, 1976).
R.D.Hinshelwooá / 445
Os kleinianos apontaram também que as descrições originais, feitas por
Freud, da pulsão de morte, em 1920, incluíam observações clínicas. Freud
estava preocupado com as neuroses de guerra, após a Primeira Guerra
Mundial, que eram repetições do trauma, amiúde sob a forma de um so
nhar repetitivo. Observou também a repetição do trauma*na transferência
e na formação de sintomas. Ligou isto a suas próprias observações de uma
criança a brincar de perder e redescobrir um objeto, e ficou impressiona
do pela importância de repetir o brinquedo a fim de dominá-lo. Ele intro
duziu o conceito de compulsão à repetição nesse trabalho (Freud, 1920),
a fim de acentuar que existe algo mais além de uma simples busca do pra
zer na satisfação dos impulsos libidinais.
Em uma reformulação recente do conceito kleiniano das manifestações
clínicas da pulsão de morte, Segai (1987) descreveu-lhe um certo número
de características importantes. De acordo com Freud, a pulsão de morte é
cíinicamente silente; contudo, ela é silenciosa apenas com respeito ao fato
de que o sofrimento e a ansiedade provêm da premência a viver. O sofri
mento está no viver; a morte é o esquecimento.
A experiência das necessidades pessoais, com que o bebê se defronta a
partir do momento do nascimento, conduz a duas reações alternativas: (i)
a pulsão a satisfazê-las, que conduz à busca objetai e ao amor, ou (ii) uma
pulsão a aniquilar a necessidade, ou a percepção dela, ou o ego que perce
be. A primeira destas puísões é a manifestção das pulsões de vida; a segun
da é a da pulsão de morte.
A pulsão de morte manifesta-se sob três formas:
R.D.Hínshelwooâ / 447
ego muitíssimo em mente, investigou num caso clínico a volta da destruti-
vidade contra o self (ego). Deu a isso o nome de narcisismo negativo, por
analogia com teoria freudiana da volta da libido para o self, nas descri
ções que fez do narcisismo [ver NARCISISMO]:
Quando os aspectos destrutivos predominam, a inveja é mais violenta
e aparece como um desejo de destruir o analista como objeto que é a
fonte real da vida e da bondade. Ao mesmo tempo, surgem violentos
impulsos autodestrutivos e são estes que quero considerar com mais de
talhe. Nos termos da situação infantil, o paciente narcísico quer acredi
tar que deu vida a si mesmo e é capaz de alimentar-se e cuidar de si pró
prio. Quando é defrontado com a realidade de ser dependente do analis
ta, a representar os pais, particularmente a mãe, ele preferiría morrer,
não existir, denegar o fato de seu nascimento, e também destruir seu
progresso analítico e seu insight, que representam a criança nele próprio,
a qual ele sente que o analista, representando os pais, criou (...) Como
o indivíduo parece determinado a satisfazer um desejo de morrer e desa
parecer no nada, o que se assemelha à descrição freudiana da pulsão
de morte "pura", poder-se-ia considerar estarmos lidando, nestes esta
dos, com a pulsão de morte em completa defusão. Entretanto, analitica-
mente pode-se observar que o estado é causado pela atividade de partes
invejosas e destrutivas do self, que se tornaram gravemente escindidas
expelidas e defundidas do self libidinal e que cuida, e se preocupa, o
qual parece haver desaparecido. O todo self integral torna-se identifica
do com o self destrutivo (...) O paciente amiúde acredita que destruiu
para sempre o seu self que cuida, o seu amor (...) Parece que estes pa
cientes lidaram com a luta entre seus impulsos destrutivos e libidinais
tentando livrar-se de seu interesse e amor por seus objetos através da
morte de seu self amoroso e dependente e identificando-se quase ir.teira-
mente com a parte narcísica e destrutiva do self que lhes proporciona
um senso de superioridade e auto-admiração. (Rosenfeld, 1971, p.173-4)
Existem hoje numerosos trabalhos que descrevem a organização de uma
parte da personalidade dedicada à destrutividade [ver ORGANIZAÇÕES
PATOLÓGICAS; ESTRUTURA; NARCISISMO] e temos agora muitas
descrições de objetos internos e partes do self que são sentidas como más
e que possuem um poder perverso e destrutivo sobre as partes boas, exer
cendo sobre estas uma servidão intimidante. O indivíduo idealiza sua pró
pria violência e destrutividade, tanto quanto a si próprio quanto em rela
ção a outras pessoas.
R.D.Hinshelwood / 449
tais primários que eram interpretações subjetivas de estímulos corpóreos,
tal como provocados por um objeto. Susam Isaacs demonstrou como es
tas interpretações, conhecidas pelo nome de "fantasias inconscientes", cons
tituem, com efeito, a substância da mente [ver 2 . FANTASIA INCONS
CIENTE].
R.D.Hinshelwood / 451
da libido, dava origem a uma fenomenologia clínica separada e a conjun
tos separados de defesa [ver SADISMO]. Klein finalmente abandonou a
ligação entre o sadismo e a libido e mudou explicitamente para a teoria
posterior das pulsões, de Freud, que outros analistas não haviam realmen
te desenvolvido. Em 1932, aceitou ela estar observando as manifestações
clínicas de um conflito entre as pulsões de vida e de morte: "(,,.) nos está
gios inicais do desenvolvimento, a pulsão de vida tem de exercer o seu po
der ao máximo, a fim de sustentar-se contra a pulsão de morte" (Klein,
1932, p,150). O abraçar da teoria mais recente das pulsões concedeu-lhe
mais liberdade de pensamento para desenvolver as suas próprias teorias:
da natureza e do desenvolvimento do superego; do sadismo, perseguição
e paranóia, como fenômenos coerentes que derivam da pulsão de morte,
interatuando com o desenvolvimento da libido; e da qualidade distinta
da ansiedade e da culpa na posição depressiva.
R.D.Hinshelwooâ / 453
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Klein elaborou isso com a teoria dos objetos internos; ela efetuou uma
descoberta que criou um acréscimo revolucionário ao modelo da men
te, a saber, que não vivemos em um só mundo, mas em dois, que vive
mos em um mundo interno que é um lugar tão real para viver quanto
o mundo de fora (...) A realidade psíquica podia ser tratada de manei
ra concreta. (Meltzer, 1981, p. 178).
Os objetos internos são experienciados como concretamente reais e inter
nos ao ego, o que significa uma experiência de dentro do corpo [ver PE
LE]. Eles são diferentes das imagens e representações que, quando as expe-
rienciamos, retêm em sí uma qualidade efêmera (embora possam ser repre
sentações de coisas concretas). Essa idéia bizarra derivou, em última análi
se, do trabalho com pacientes psicóticos, mas foi considerada como sen
do o estado inicial que o bebê tem de experienciar a si mesmo e a seu mun
do quando do nascimento e antes que possa saber qualquer coisa de obje
tivo a respeido do mundo que o rodeia. Este é sentido concretamente co
mo um mundo interno de objetos reais (não imagens ou representações)
que se empenham em relações uns com os outros e com o sujeito.
R.D.Himhelwood / 455
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R.D.Hinshehuood / 457
prevenção e o desfazer obsessivos. Eie acarretava uma grande preocupação
e atividade no sentido de corrigir as coisas e mobilizar extraordinários im
pulsos criativos. Ela veio a imaginar a reparação como raiz importante
de toda atividade criativa: "(...) o desejo de fazer reparação, de consertar
o dano psicologicamente feito à mãe e também de restaurar a si mesma
achava-se no fundo da premência imperiosa a pintar esses retratos de seus
parentes" {Klein, 1929, p. 218). Em grau significativo, o conceito de repa
ração assumiu, no pensamento de Klein, o lugar das defesas obsessivas.
Reparação e sublim ação; A sublimação é a conversão de impulsos libidi-
nais em habilidades refinadas e criativas. A reparação, por outro lado,
não é vista desta maneira. De modo característico, Klein ficou interessa
da no conteúdo psicológico do processo de conversão a que Freud estava
se referindo. A reparação está certamente relacionada com os impulsos,
mas consiste na fantasia de corrigir os efeitos dos componentes agressivos.
Existe alguma sugestão também de que Klein via a reparação como uma
fantasia trazida à tona, de modo particular pela agressão, enquanto que
a ênfase da sublimação repousa nos componentes libidinais ou sexuais. En
tretanto, era importante para ela apontar a interação existente entre os im
pulsos agressivos e os impulosos libidinais: "O curso do desenvolvimento
libidinal é assim, em todos os passos, estimulado e reforçado pelo impul
so à reparação e, em última análise, pelo sentimento de culpa" (Klein,
1945, p. 410). A reparação é o resultado da confluência das noções pulsio-
nais opostas, antes que meramente o deslocamento de um impulso para
algum representante socialmente aceitável, tal como acontece na sublimação.
Mais tarde, quando Klein relaxou o seu comprometimento com a teoria
clássica, a idéia de sublimação desapareceu um pouco, enquanto que a
idéia de reparação se desenvolveu e tornou-se a pedra angular dos proces
sos de maturação que forjam um caminho de saída para a posição depressiva.
O altruísmo inerente à reparação é um desvios das noções pulsionais
[ver PULSÕES] para canais sociais. Ele é, portanto, uma categoria da su
blimação, processo identificado por Freud como sendo o meio pelo qual
as noções pulsionais podem ser canalizadas para aplicações socialmente
construtivas, neste caso, a saber, a culpa canalizada para o reparo.
A posição depressiva: Na posição depressiva, a reparação passa a ter um
papel central. Primaríamente, o que se pretende é um conserto do mundo
interno, mediante a reparação do externo. Ela é uma fonte de energia pa
ra a energia e a criatividade maduras no mundo externo real [ver CRIATI
VIDADE].
A reparação é invocada especificamente pelas ansiedades da posição de
pressiva e, junto com o teste da realidade, constitui um dos principais mé
todos de superar a ansiedade depressiva. Na posição depressiva, a preocu
pação é com o destino do objeto amado, "bom", sendo mais do que ape
nas necessitar garantir a própria sobrevivência da criança mediante a ma
R.D.Hinshehvood / 459
s Nos estágios iniciais do desen-
m an íaca volvimento, o bebê emprega
mecanismos onipotentes para estabelecer a segurança de seu ego. Conse-
qüentemente, quando a posição depressiva pela primeira vez o atinje [ver
1 0 . POSIÇÃO DEPRESSIVA], ele pode experienciar o objeto amado co
mo irreparavelmente danificado, espelhando a violência extremada de
suas fantasias onipotentes. A angústia de querer reparar um objeto tão to
talmente danificado origina-se do fato de isto ser experienciado como uma
tarefa imensamente demandante. Em resultado disso, toda a situação tem
de ser subestimada e a tarefa transformada em fácil, como se pudesse ser
realizada através de mágica.
Mais tarde na vida, até mesmo tensões normais podem provocar a fan
tasia desdenhosa de que, de qualquer maneira, o objeto não vale a pena
que por ele se tenha preocupação. O desdém e a depreciação, porém, são
defesas maníacas contra a gravidade da angústia e ajudam o sujeito a sen-
tir-se menos desamparado e dependente de seus importantes objetos bons,
que lhe aparecem como danificados, e fazem vir à tona uma responsabilida
de tão pesada [ver.ANSIEDADE DEPRESSIVA], O resultado final, contu
do, é que o desprezo danifica os objetos ainda mais e pode, portanto, con
duzir a um círculo vicioso.
Ver REPARAÇÃO.
R.D.Hinshelwood / 461
talmente), enquanto que a repressão atribui parte da mente, agora mais in
tegrada, a um reino inconsciente, sem destruir a integridade (divisão vertical).
A gravidade da cisão diminui à medida que a posição depressiva assu
me preponderância com a conseqüente aceitação maior das realidades in
terna e externa: ”(...) à medida que a adaptação ao mundo real aumenta,
a cisão é efetuada em planos que gradualmente se tornam cada vez mais
proximos da realidade (Klein, 1935, p. 288). A repressão gradativamente
emerge com o impacto maior da realidade e a natureza dos objetos exter
nos reais.
Elementos alfa e beta: A distinção feita por Bion (1962) entre elementos
alfa e beta [ver FUNÇÃO-ALFA; ELEMENTOS-BETA] constitui um arca
bouço teórico alternativo para examinar-se a distinção existente entre a re
pressão e os mecanismos primitivos de defesa, neste caso, a identificação
projetiva. A função-alfa é o processo psicológico que gera significado a
partir dos dados sensórios brutos. Ela dá origem a conteúdos mentais que
podem ser utilizados para pensar e sonhar, sendo a repressão quem com
eles lida. Contudo, se a função-alfa falha em sua operação, a mente acu
mula quantidades de elementos-beta, conteúdos mentais impensáveis, apro
priados apenas para descarga por meio da identificação projetiva (patoló
gica), e a mente se desenvolve como se fosse um aparelho para descarre
gar essas acumulações [ver PENSAR].
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R,D,Hinshelwood / 463
termo *oi a<*ofcado Por Bion (1962) para referir-se a
X\t- V Cl It um estado de mente que o bebê exige da mãe. A mente da
mãe precisa estar em um estado de calma receptividade para receber os
próprios sentimentos do*bebê e dar-lhes significado [ver CONTER]. A
idéia é que o bebê, através da identificação projetiva, inserirá na mente
da mãe um estado de ansiedade e terror do qual ele é incapaz de fazer sen
tido e que é sentido como intolerável (especialmente o medo da morte).
A rêveríe da mãe é um processo de fazer algum sentido dele para o bebê,
função conhecida como "função-alfa" [ver FUNÇÃO-ALFA]. Mediante a
introjeção de uma mãe receptiva e compreensiva, o bebê pode começar a
desenvolver sua própria capacidade de reflexão sobre seus próprios esta
dos mentais.
Quando, por alguma razão, a mãe é incapaz desta rêveríe para um sig
nificado reflexivo, o bebê fica incapaz de receber dela um sentimento de
significado; ao invés, experiencia a sensação de o significado haver sido
despojado, o que resulta em um aterrorizante sentimento do desconheci
do medonho [ver PAVOR SEM NOME], Pode haver variadas razões pa
ra um estado insatisfatório de rêveríe:
(i) O bjeto externo inadequado: A mente da mãe pode de fato achar-se api
nhada por outras preocupações e, dessa maneira, acha-se ausente para o
bebê. Assim, a mente da mãe é o componente importante do mundo exter
no para o bebe [ver OBJETO EXTERNO].
(ii) Inveja: O bebê pode atacar a função continente da qual depende [ver
12. INVEJA] e, dessa maneira, restringir suas oportunidades íntrojetivas
de um objeto bom e compreensivo.
(iii) Continente despojaáor: O bebê pode ter um componente de inveja
anormalmente grande, o qual, projetado no objeto, transforma-o em fanta
sia, num continente invejoso que priva de qualquer significado as proje
ções do bebe [ver CONTER; PAVOR SEM NOME; EPISTEMOFILÍA].
(iv) Projeções ilimitadas: A mãe pode ser um continente fraco para as pro
jeções e entrar em colapso sob a força das identificações projetivas onipo
tentes provindas do bebê. Uma função de limitar as projeções é desempe
nhada, na fantasia, pelo ''pênis dentro da mãe". Se uma função limitado
ra suficiente achar-se presente, ela pode, por sua vez, conduzir a um au
mento da inveja, com as conseqüências descritas em (ii) e (iii), [ver PAI].
R.D.Hinshelwood / 465
portante na qual parte da personalidade está organizada para a expressão
de impulsos da pulsão de morte e se manifesta clinícamente como uma ide
alização da destrutividade e um ataque às próprias partes boas do sujeito.
Nisto, seguiu Meltzer (1968), mas introduziu a expressão narcisismo nega
tivo. Esta organização sinistra do ego, que perverte a transferência e todas
as relações humanas (Rosenfeld, 1987), tem sido elemento de muitas inves
tigações clínicas recentes por parte dos kleinianos.
Durante muitos anos Rosenfeld supervisou analistas e psicoterapeutas
na Grã-Bretanha e no exterior, e desenvolveu uma sensibilidade intensa à
capacidade que tem o analista de entender o paciente. Interessou-se mui
to por separar as reações negativas dos pacientes a interpretações em que
estes acham que não os entenderam direito de suas reações destrutivas (in
veja) a interpretações que sentiram que realmente demonstravam a capaci
dade do analista em compreender e tolerar o paciente (Rosenfeld, 1987).
R.D.Hinshelwood / 467
CONTRIBUIÇÕES CIENTÍFICAS. Segai contribuiu para o caráter pioneiro
da psicanálise de esquizofrênicos nas décadas de 40 e 50, juntamente com
Scott, Rosenfeld e Bion. Ela ficou particularmente impressionada pela im
portância do distúrbio quanto à formação de símbolos nos esquizofrênicos
(Segai, 1950) [ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. Suas observações origi
nais sobre estes problemas, contudo, tiveram de esperar elucidação adequa
da até o seu artigo decisivo de 1957. Demonstrou ela que a capacidade de
empregar símbolos impõe a construção de um relacionamento entre o sím
bolo e o que é simbolizado (na raiz, uma parte do corpo), que deixavas es
paço para que uma distinção fosse feita entre eles. Ela contrastou isto cqm
a equação sim bólica, na qual o símbolo e a coisa simbolizada não são dis-
tinguidas. Equacionar símbolos e os referentes deles interfere por sérias ma
neiras com o pensamento e o comportamento, por causa do distúrbio da
capacidade de reconhecer a realidade. A equação simbólica resulta do uso
da identificação projetiva patológica, que confunde objetos com partes do
setf. Todo o fenômeno da formação simbólica perturbada, da identificação
projetiva patológica e de um sentido prejudicado da realidade constitui
uma característica da posição esquizoparanóide, Estes artigos (Segai, 1950,
1957) foram uma confirmação das hipóteses originais de trabalho de Klein,
quais sejam, de que os pontos de fixação para as psicoses residem na posi
ção esquizoparanóide.
Relacionada à investigação da formação de símbolos, deu-se uma inves
tigação da estética (Segai, 1952). Mais uma vez ela utilizou a distinção en
tre a posição esquizoparanóide e a posição depressiva com efeito vigoro
so (ver FORMAÇÃO DE SÍMBOLOS]. A criação artística exige uma con
secução relativamente estável da posição depressiva, da qual o impulso à
reparação é mobilizado para a atividade construtiva. Esta visão foi leva
da a sério e elaborada pelo crítico de arte Adrian Stokes (Stokes, 1963).
Subseqüentemente, Segai escreveu uma série de artigos sobre aspectos da
criatividade (Segai, 1974, 1977, 1981, 1984).
Não o menor dos importantes trabalhos de Segai foi a redação de resu
mos definitivos das próprias idéias de Klein (Segai, 1964, 1979). Nos últi
mos anos, ela tem estado interessada pela questão dos armamentos nucle
ares e se manifestado de modo franco a respeito deles (Segai, 1987).
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R.D.Hinshelwood / 469
como uma organização mental objetivamente descrita e o self como sen
do a representação que é investida no narcisismo. A expressão "ego" é
um termo técnico imaginado pelos pragmáticos tradutores ingleses de Freud,
a fim de realçar a objetividade da ciência psicanalítica; constitui, portan
to, uma distorção do alemão “ich" (eu), usado por Freud, que fornece
uma conotação muito mais pessoal e subjetiva (Bettheim, 1983).
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R.D.Hinshelwood / 471
Os indivíduos podem colocar seus conflitos internos em pessoas do
mundo externo, podem inconscientemente seguir o curso do conflito,
por meio da identificação projetiva, e podem reinternalizar o curso e o
resultado do conflito externamente percebido por meio da identificação
introjetiva. (jaques, 1953, p.21)
O trabalho de EÍIiott Jaques foi central ao desenvolvimento do Instituto
Tavistock, tal como o foi o de Bion [ver PRESSUPOSTOS BÁSICOS] e
o de Isabel Menzies; eles exploraram as opiniões de Klein (1946) sobre os
mecanismos primitivos de defesa da projeção e da introjeção em conjun
ção com a identificação.
Defesas coletivas; Jaques (1953) descreveu a maneira pela qual os indiví
duos podem utilizar as instituições sociais a fim de apoiar as suas próprias
defesas psíquicas, da maneira que estes métodos institucionais constituem
formas coletivas de defesa a que Jaques deu o nome de sistema social de
defesa. Elas vêm a ser incorporadas à vida rotineira da instituição. As ins
tituições humanas, portanto, possuem uma subculíura que é inconsciente
no verdadeiro sentido freudiano e aítamente determinante da maneira pe
la qual a instituição conduz seus assuntos e da eficácia que os indivíduos
dedicam às suas tarefas conscientes.
Menzies (1960) utilizou a idéia de um sistema social de defesa na "psica
nálise" de um sistema hospitalar e demonstrou como certos mecanismos,
que cada novo recruta tinha de aprender, haviam sido instalados nas roti
nas de enfermagem do hospital (as técnicas defensivas). Estes mecanismos,
ao servirem de defesa contra ansiedade no trabalho, amiúde solapavam
os objetivos terapêuticos da instituição, qual seja, no caso, o cuidado dos
pacientes. A idéia de defensividade coletiva demonstrou ser uma aplicação
fértil do pensamento kleiniano (Rice, 1963; Miller e Gwynne, 1973; de Bo-
ard, 1979; Hinshelwood, 1987; Menzies Lyth, 1988, 1989). O "sistema so
cial de defesa" é uma idéia importante que demonstra a inserção do incons
ciente do indivíduo, da fantasia inconsciente e dos mecanismos de defesa
em processos sociais, sem reduzir os últimos à psicologia individual.
R.D.Hinshelwood / 473
de novo. A teoria clássica de Freud considerava os sonhos como sendo a
atividade de uma mente perturbada. A fim de preservar o sono, o que dor
mia construía, sob forma disfarçada, uma solução fantasiosa para o confli
to perturbador. Os sonhos, dessa maneira, representavam uma realização
de desejos. Os sonhos de ansiedade, contudo, aqueles que despertam o
que sonha, parecem ser um fracasso do processo, em resultado da intensi
dade do distúrbio.
A idéia kleiniana da fantasia inconsciente como alicerce sempre presen
te de todos os processos mentais fornece uma visão nova da natureza dos
sonhos. O sonho é mais claramente uma expressão (sob forma disfarçada)
da fantasia inconsciente, assim como uma defesa contra a sua apreciação
consciente. Segundo esta visão, os sonhos de ansiedade não constituem
um problema tão grande para a teoria psicanalítica. O sonho, portanto,
representa a fantasia inconsciente de relações objetais que é estimulada pe
los impulsos ativos (bons ou maus) do momento.
Meítzer (1983) considerou sonhos e fantasia inconsciente como sinôni
mos e achou que a vida consciente e deperta é o conteúdo manifesto de
um sonho. Nisto, ele acompanhou Bion (1962), que considerava os pensa
mentos oníricos como sendo o primeiro produto mental de toda experiên
cia que deriva dos dados sensórios brutos processados pela função-alfa
[ver FUNÇÃO-ALFA]. Neste sentido, os sonhos são o espaço interno "(...)
onde o significado é gerado" (Meltzer, 1981, p.178).
R.D.Hinshelwooá / 475
trojeção" refere-se à descrição científica objetiva de um psicológico no
qual algum aspecto de um objeto externo se torna parte do ego; a expres
são "incorporação" refere-se à fantasia que o indivíduo tem de receber
em si alguma coisa do objeto.
Parecería que a confusão entre categorias diferentes de linguagem pode
ría ser esclarecida através de um emprego rigoroso dos termos: termos
metapsicológicos para a descrição científica objetiva; termos fenomenológi-
cos para a experiência subjetiva. Entretanto, isto não parece funcionar cor
retamente.
Colapso da distinção: Qualquer separação entre a descrição objetiva do
ego e a experiência subjetiva do mundo da fantasia inconsciente conduz a
questões paradoxais tais como:
(...) ela [Klein] freqüentemente trata a fantasia como constitutiva da re
alidade psíquica: nela são erigidos o superego e o ego e nela existem to
das estas partes do self. Por outro lado, contudo, ela emprega a lingua
gem estrutural da metapsicologia freudiana e trata a fantasia como sen
do uma das atividades do ego. (Mackay. 1981, p. 196)
Pergunta-se: é a introjeção parte das funções do ego ou é o ego um produ
to da introjeção (a fantasia de incorporar um objeto)?
Quando falamos sobre a realidade psíquica, que linguagem deveriamos
usar? A realidade psíquica é o mundo que é real para o paciente, mas, con
tudo, como pode o seu mundo subjetivo ser real para outra pessoa? Melt-
zer reivindicou que as descobertas de Klein significavam que "a realidade
psíquica podia ser tratada de maneira concreta, como se fosse um lugar
(...) onde o significado da vida é gerado, para desdobramento para o mun
do exterior" (Meltzer, 1981, p.178) e distinguiu o novo tipo de conhecimen
to que se acha implícito nisso:
Esta transformação para uma visão platônica acha-se implícita nos tra
balhos iniciais da Sra. Klein e isso transformou a psicanálise dela, nes
se ponto, de uma ciência baconiana, que visa a explicações e espera che
gar a verdades ou leis absolutas, em uma ciência descritiva, que obser
va e descreve fenômenos infinitos em suas possibilidades, por serem fe
nômenos da imaginação, (p. 178)
Fica difícil manter separadas as linguagens. "Ego" é um termo metapsicoló-
gico (linguagem [i]), mas se cria a partir dos atos da fantasia pessoal (lin
guagem [ii]). A fantasia de incorporar um objeto tem o efeito de uma "al
teração do ego" objetiva, experienciada pelo sujeito e visível ao observa
dor. A descrição de que o ego se forma a partir da incorporação de obje
tos soa como uma explicação objetiva do que acontece — tal como "o sis
tema solar se forma a partir de redemoinhos de matéria". Mas descrever
a formação do ego pela incorporação de objetos é também uma atividade
pessoal de fantasia a respeito de si próprio. Mesmo que mantenhamos o
R.D.Hinshelwood / 477
fora do sujeito e de sua experiência que opera com processos diferentes
dos que pertencem ao sujeito humano que está estudando. O psicanalista
emprega métodos subjetivos (empatia e intuição) para coletar seu material.
Acompanhando Bion (1962) [ver PENSAR], o trabalho de pensar que o
psicanalista faz com os dados subjetivamente coletados a respeito de seu
paciente é também um processo subjetivamente determinado de fantasia
inconsciente.
Validade e confiabilidade: O analista experiencia subjetivamente o seu pa
ciente e a. interação de dois mundos subjetivos e intrapsíquicos necessita
ser explorada mediante as complexidades do relacionamento transferenciai
e contratransferencial [ver CONTRATRANSFERÊNCIA]. As característi
cas desta forma de comunicação entre duas pessoas, a respeito de experiên
cias subjetivas, são extraordinariamente complicadas, complicação que,
até certo ponto, foi colocada em alguma ordem pelo conceito do conter
[ver CONTER] e pela compreesão da comunicação não simbólica conduzi
da por meio da identificação projetiva.
Chegamos a outra situação quando temos de pensar a respeito da comu
nicação de experiências subjetivas entre determinado analista e outro. Tem
sido natural presumir que tais comunicações seriam conduzidas, tais co
mo as de outras ciências, por meio de uma linguagem de palavras profis
sionalmente adaptada e especial, a terminologia da metapsicologia. É pro
vável, contudo, que quando se trata de uma ciência do subjetivo, tenha
mos de ser cuidadosos a respeito disto, dando o desconto do mesmo tipo
de complexidade que ocorre nas comunicações (transferenciais e contratrans-
ferenciais) entre analista e paciente. Durante a última parte de sua carrei
ra como psicanalista, Bion (1970) ocupou-se a fundo com os problemas
de comunicação entre analistas a respeito de suas experiências, como analis
tas, dos mundos subjetivos inconscientes de seus pacientes [ver BION].
A confiabilidade das observações e interpretações de um psicanalista
são subjetivamente determinadas por sua própria personalidade. Testar-
lhe a validade, portanto, repousa em sua própria análise pessoal, a qual
recebeu durante sua própria formação ou subseqüentemente. Esse proces
so de validade é privado e o analista é validado apenas da maneira mais
grosseira, por ser aceito em uma sociedade psícanalítíca. É compreensível,
portanto, que a validade e a confiabilidade estejam publicamente restritas
à filiação a uma sociedade ou a uma linhagem de analistas que remonta a
uma figura fundadora específica. Bion (1963) tentou estabelecer critérios
diferentes e objetivos para debater o que acontece em uma psicanálise e
isolou um certo número de "elementos" — a grade [ver BION], e
"K" [ver EPISTEMOFILIA) e o relacionamento continente-contido [ver
CONTER]. Entretanto, ele não parece ter sido seguido no desenvolvimen
to disto como método de comunicação entre psicanalistas. Ao invés, seus
conceitos foram aplicados mais à prática clínica com pacientes.
Técnica de análise
através do brincar Ver X. TÉCNICA.
r-f-t £ /\ « A transferência era conhecida desde o pró-
1 F a n s f e r e n c i a p r i o início da psicanálise, mas a maneira
por que é entendida e o seu impacto sobre o desenvolvimento teórico tem
se alterado constantemente. O conceito de transferência é, na realidade,
composto de vários conceitos que se desdobraram no decorrer do perío
do de mais de um século: (1) foi um evento fora de ética e inconveniente;
(2) foi depois o aliado do psicanalista na superação das resistências, quan
do os métodos hipnóticos montraram-se limitados e apenas passageiramen
te benéficos; (3) podia apresentar uma forma de resistência à análise, por
transformar o relacionamento de trabalho em um relacionamento emocio
nal; (4) veio depois a ser visto como a reencenação do passado, fornecen
do uma clareza nova à reconstrução psicanaítica dos detalhes dos traumas
da infância; (5) alternativamente, a reencenação no consultório pôde ser
vista como a externalização da fantasia inconsciente atual, e (6),- finalmen
te, um conjunto multiplamente cindido de relacionamentos com o analis
ta foi descrito.
R.D.Hinshelwood / 479
do por Breuer. Este então decidiu imediatamente que seu método não era
ético para um praticante da medicina e deixou o campo para que Freud
com ele lutasse sozinho. Freud foi mais circunspecto. Examinou os limites
do problema ético e, sendo um dentista natural bem formado, adotou a
neutralidade característica às questões éticas. Decidiu encarar o amor de
Anna O. como um fenômeno para estudo. Isto significa abster-se de qual
quer satisfação pessoal no relacionamento. O amor devia ser considerado
como um fenômeno inteiramente afastado da pessoa real do analista e, quan
do descobriu as afeições ansiosas de suas outras jovens pacientes femininas
voltando-se para ele da mesma maneira, recusou-se a aceitar que isso fos
se devido a seus encantos pessoais.
Dessa maneira, a transferência foi examinada de maneira nova, qual se
ja, em vez de ser um acontecimento incômodo e fora de ética ela podia tor-
nar-se um fenômeno para estudo e, depois, para utilização na prática.
R.D.Hinshehuood / 481
da como uma reencenação no consultório, era agora encarada como reen-
cenação de experiências fantasiosas correntes, da mesma maneira que o
brincar da criança contitui uma reencenação da elaboração fantasiosa que
faz de seus traumas [ver ATUAÇÃO DENTRO DA SESSÃO], Essa visão
da transferência como surgindo das dificuldades .dq.aqube^agora,, concreta-
mente durante a sessão da análise’,""foi apoiada pelo desenvolvimento da
idéia de fantasia inconsciente e da ênfase concedida a esta [ver 2. FANTA
SIA INCONSCIENTE], A prática da psicanálise kleiniana tornou-se uma
compreensão da transferência como expressão da fantasia inconsciente, ati
va exatamente ali e agora, no momento da análise. A transferência, contu
do, molda-se nos mecanismos infantis com que o paciente manejou as
suas experiências há longo tempo atrás:
; (...) o paciente está fadado a lidar com seus conflitos e ansiedades expe-
/ rienciados em relação ao analista pelos mesmos métodos que utilizou
i no pasado. Isto quer dizer que ele se afasta do analista tal como tentou
I afastar-se de seus objetos principais. (Klein, 1952, p.55)
Esta visão da transferência veio, por sua vez, a escorar o conceito de fanta
sia inconsciente e os dois conceitos desenvolveram-se reciprocamente co
mo o cerne da prática kleiniana.
Atuação na transferência: Mais recentemente, tem havido um aumento
de interesse na maneira pela qual o paciente atua [acts out] na transferên
cia. Este desenvolvimento, ligado particularmente ao trabalho de Betty Jo-
seph [ver EQUILÍBRIO PSÍQUICO], demonstrou que os pacientes utilizam
a transferência não apenas para alcançar a satisfação de seus impulsos,
mas também para apoio de suas posições defensivas [ver ATUAÇÃO DEN
TRO DA SESSÃO]. Os pacientes tentam "utilizar-nos —- os analistas —
para ajudá-los com a ansiedade" (Joseph, 1978, p.223). Ela descreve ma
neiras extremamente sutis pelas quais os pacientes tentam "atrair-nos pa
ra seus sistemas defensivos" (Joseph, 1985, p.62). Ao enfatizar a transferên
cia como sendo a situação total (Joseph, 1985), ela investigou pacientes fron
teiriços difíceis e intratáveis, cujas personalidades são construídas em tor
no de um sistema rígido de defesas, de uma organização patológica [ver
ORGANIZAÇÕES PATOLÓGICAS],
Técnicas da psicologia do ego: Uma das diferenças na abordagem à trans
ferência é que os psicólogos do ego olharão o material em busca da existên
cia de provas de impulsos, derivados pulsionais e defesas contra estes, en
quanto que outros procurarão objetos e os relacionamentos com eles.
Existe, contudo, um nível mais profundo nesta diferença. Aquilo a que
Klein deu início foi uma ênfase diferente no exame do material que os pa
cientes produziam. Ela estava interessada no conteúdo das ansiedades e,
nisto, afastava-se do interesse anterior nas pulsões e na descarga da ener
gia deles. Os analistas estão quer interessados em abordar a estrutura da
R.D.Hinshekoood / 483
razões: (a) um analista não pode, na prática, manter secreta sua própria
personalidade; (b) os sentimentos que um analista descobre em si, no cur
so de suas sessões, têm, se cuidadosamente processados, considerável im
portância na compreensão do estado de mente do paciente que ele tem con
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R.D.Hinshehvood / 507
O Dicionário do Pensamento Kléiniano é a primeira
exposição completa e didática dos principais conceitos da
psicanálise kleiniana e de seus mais recentes desenvolvimentos.
Perpassa o trabalho de kleinianos como Bion, Segai,
Rosenfeld, Joseph e Meltzer, incluindo uma bibliografia
ampla e atualizada.
O Dicionário do Pensamento Kléiniano se notabiliza
por ser uma obra de referência indispensável para analistas,
psicoterapeutas, psicólogos, estudantes e todos que se
interessam pela natureza humana. É acima de tudo
um livro útil, fruto de muito trabalho e amadurecimento e
se constitui em companheiro essencial para
a prática e a reflexão.
A oportunidade e a magnitude deste trabalho
fizeram com que a Artes Médicas se empenhasse em trazê-lo
para o leitor de língua portuguesa com o crédito
de ser uma tradução autorizada e referendada pelo
Melanie Klein Trust.
R. D. Hinshelwood é psicanalista com formação no London
Institute of Psycho-Analysís. É fundador e Editor do British
Journal o f Psychotherapy.
Livros
por uma melhor
qualidade devida