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Resumo

A Revolução Burguesa no Brasil


(Capítulo 7)

Florestan Fernandes
RESUMO

FERNANDES, Florestan. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação


sociológica. São Paulo: Globo Livros, 2006.

Contexto Histórico
O livro começa a ser escrito em 1966, como resposta ao golpe militar, mas é
publicado em 1974. Florestan Fernandes é socialista militante.

Capítulo 7
1. O Modelo Autocrático-Burguês de Transformação Capitalista
Florestan esclarece, incialmente, que sua intenção é explicar o processo de
transformação capitalista nos países periféricos, ressaltando que não se pode repetir nesse
caso o mesmo modelo utilizado na interpretação das revoluções burguesas nos países
centrais. A revolução burguesa no Brasil não segue seu curso “clássico”, ou liberal-
democrático. Aqui, ela tem início com a abolição da escravidão e a proclamação da
República. Com efeito, a competição entre os países capitalistas centrais no século XIX
acirrou a busca por novos mercados consumidores, o que fez com que voltassem a atenção
às antigas colônias. Desse modo, o fim da escravidão era uma reforma estrutural
necessária do ponto de vista econômico. O autor vai sustentar, entretanto, que essa
mudança econômica não foi acompanhada de uma mudança política significativa no
sentido da criação de uma classe burguesa autônoma e nacional. Por conseguinte, o
fortalecimento da burguesia no Brasil, embora tenha implicado uma rápida
industrialização do país, manteve a subjugação pelos países capitalistas centrais.
Florestan desmente, então, a tese de que os países em desenvolvimento estão em
um estágio menos avançado do capitalismo e que, assim que se criarem as condições
necessárias, a história repetir-se-á e esses tornar-se-ão tão desenvolvidos quanto as nações
hegemônicas. Demonstra, assim, que é do interesse das nações desenvolvidas manter a
relação de dominação dos países periféricos. Ao mesmo tempo, porém, precisam permitir
o fortalecimento da burguesia nesses locais para conterem as ameaças dos regimes
socialistas.
Nesse contexto, a dominação burguesa demonstra suas características
autocráticas, voltadas apenas a sua própria manutenção, não importando que isso
implique uma ditadura de classe. A burguesia nos países periféricos detém o poder
econômico e político e controla o Estado, de modo que é impraticável usar o espaço
político e a ordem legal instituída para evidenciar as contradições de classe. Ademais, ela
não está só lutando para manter privilégios de classe, mas também pela sobrevivência do
capitalismo em nível global. Segundo Florestan, tal fato acrescenta um elemento político
ao comportamento de classe da burguesia nos países periféricos que é sui generis e
explica o crescente afastamento entre a utopia burguesa e a realidade criada por sua
dominação.
O autor deixa transparecer que esses são os ingredientes que permitirão a junção
de uma república parlamentar com o fascismo, tal como se observa nas ditaduras sul-
americanas.

2. Dominação burguesa e transformação capitalista


Florestan explica que a dupla articulação (ou seja, a simultaneidade entre o
desenvolvimento desigual interno e a dominação imperialista externa) cria um modelo
próprio de transformação capitalista nos países de capitalismo dependente. Assim, a
burguesia nacional assume para si um papel na atual fase do capitalismo monopolista que
a impede de lograr qualquer transformação no sentido da eliminação da desigualdade
interna e da independência da dominação externa.
Para o autor, uma característica da atuação da burguesia nacional diz respeito a
sua dependência de dominação da máquina estatal. O Estado foi colocado no centro da
evolução do capitalismo no Brasil, o que também justifica a associação daquela com os
militares e a militarização estatal. Facilitaram esse processo a natureza autoritária do
presidencialismo e a identificação dos militares com os propósitos burgueses, fazendo
com que a burguesia “monopolizasse” o Estado, dificultando sobremaneira sua conquista
por outra classe.

3. Contrarrevolução prolongada e “aceleração da história”


Florestan aponta as quatro décadas seguintes à 1ª Guerra Mundial como o período
de maturação da burguesia brasileira. Segundo ele, não houve o surgimento de uma nova
classe no Brasil, pelo contrário, a burguesia brasileira se formou, inclusive, pela
adaptação da antiga aristocracia aos propósitos burgueses.
A burguesia brasileira também precisava construir sua identidade, dadas as
particularidades históricas que a diferenciavam dos burgueses europeus, como a forte
tradição escravista. Além disso, as diferenças locais impediam uma unificação nacional.
Todavia, essa chance se perdeu e a burguesia nacional assimilou para si o papel
subserviente no capitalismo mundial em expansão, crendo que o subdesenvolvimento era
apenas uma etapa e aceitando a ideologia norte-americana do “desenvolvimento com
segurança”. Aqui, portanto, a burguesia não criou um caráter revolucionário nacionalista,
adotando como utopias a defesa da “democracia”, da “civilização cristã”, da “ordem
mundial capitalista” etc.
Os conflitos entre as classes eram postos fora da ordem legal, de modo que
defender a ordem era defender a burguesia. A Nação Burguesa se sobrepunha à Nação
Legal. É esse deslocamento da ordem que Florestan vai chamar de contrarrevolução, que
implica a manutenção das desigualdades internas e da dominação externa. Essa
contrarrevolução se dá em relação à crescente demanda por uma democracia de
participação ampliada. A contrarrevolução burguesa no brasil é uma resposta autocrática
(ditadura) às transformações também burguesas no sentido de uma democracia de
participação ampliada, com conquistas sociais, políticas e econômicas das classes
trabalhadoras (como vinha acontecendo no governo de João Goulart). Ela é prolongada
pois visa à manutenção de certos estratos da burguesia no poder. A história, por sua vez,
tende a ser acelerada, graças à rápida e contínua industrialização fomentada durante esse
período. Mais uma vez percebe-se que a revolução burguesa brasileira se pautou nas
mudanças econômicas e relegou as mudanças políticas, diferente do ocorrido nas
revoluções burguesas clássicas.
A revolução burguesa conduziu o Brasil, portanto, à transformação ao capitalismo
monopolista, mas não à esperada revolução nacional e democrática.

4. Estrutura política da autocracia burguesa


O autor se propõe a analisar como o modelo autocrático-burguês de transformação
capitalista se concretizou historicamente. Afirma que uma situação pré-revolucionária
antiburguesa só existiu de maneira potencial no Brasil, ou seja, aqui a dominação
burguesa nunca esteve ameaçada. Contudo, seus sucessivos erros e instabilidades criaram
antagonismos entre classes e entre os próprios estratos da classe burguesa, dificultando a
unificação e a centralização do poder.
Florestan frisa a extrema necessidade de a burguesia brasileira manter-se no
controle do Estado. O autor aponta também o temor de classe decorrente da inferioridade
numérica dos que se classificam “dentro da ordem” em comparação com aqueles que não
se classificam ou se classificam apenas parcialmente, o que prejudica a estabilidade da
“condição burguesa” e gera uma reação societária marcada por uma mentalidade política
burguesa especial, inflexível e intolerante ao radicalismo burguês (mais “nacionalista” e
democrático), dificultando, assim, um processo de revolução nacional. Isso faz com que
as classes burguesas se fechem sobre si mesmas, criando não uma ordem social
competitiva “ideal”, mas uma ordem social possível em uma sociedade de classes
dependente e subdesenvolvida. Além disso, essa condição faz com que a burguesia se
preocupe não em resolver o problema da instauração de uma democracia burguesa, mas
em sustentar uma ordem burguesa.
O esforço para a unidade e conciliação das diversas classes e estratos de classes
burgueses, segundo Florestan, dirigiu-se para uma autodefesa dos interesses comuns, e
não para o tradicional e complexo processo de diferenciação vertical, integração
horizontal e articulação entre essas classes e estratos. Esse tipo de unificação (padrão
agregado de hegemonia) teria permitido à burguesia alcançar os mesmos fins, acarretando
o que o autor chamou de “aceleração burguesa da história”. Desse modo, a burguesia
brasileira não modificou substancialmente a si própria, a Nação e o seu relacionamento
material com as demais classes.
Florestan chama de “demagogia populista” as tentativas dos radicais burgueses
por uma democracia mais participativa, a qual foi solapada pela contrarrevolução que
firmou no poder a burguesia adepta do capitalismo dependente, da regeneração dos
costumes e da manutenção da ordem. Essa demagogia populista não gozava de qualquer
pluralismo real, sendo, na verdade, uma aberta manipulação consentida das massas
populares.

5. Persistência ou colapso da autocracia burguesa?


Para Florestan, à época em que escrevia sua obra, estava em curso um processo
de consolidação da autocracia burguesa. Entretanto, ele vaticinou a ocorrência de
manifestações contra a ordem, sobretudo em razão dos anseios da nova classe média
crescente. O Estado autocrático burguês, para ele, seria uma variante subdesenvolvida e
modernizada do fascismo.
Cabe também salientar sua ideia de democracia de cooptação, a partir da qual
seriam abertos pequenos espaços às classes “de baixo” para se manifestarem, mas sem
permitir sua articulação a ponto de ameaçar todo o sistema. Seria uma “democracia dentro
da autocracia”.
Resumindo, para Florestan era inviável e fadado ao fracasso o processo de
associação entre a aceleração do desenvolvimento capitalista e a autocratização da ordem
social competitiva, promovido pelas classes burguesas que sustentam o capitalismo
dependente. O que surgiria depois poderia ser o advento de um capitalismo de Estado ou
do socialismo.

Juiz de Fora, 2019


Rafael Maciel Artuzo
macielartuzo@hotmail.com

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