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ARTE SACRA EM PIRACICABA: IGREJAS HISTÓRICAS

Por Fábio San Juan1

Informações referentes às igrejas de Piracicaba, visitadas em grupo monitorado pelo autor


deste artigo, no dia 01 de abril de 2023.

Igreja Matriz / Catedral de Santo Antônio


A primeira igreja de Piracicaba é a igreja Matriz. Seu primeiro edifício possivelmente foi
construído em 1770.

A igreja teve cinco edifícios, sendo que o terceiro foi obra de Miguel Dutra, o
Miguelzinho, artista pioneiro paulista e que morava em Piracicaba desde 1844. A
construção desta terceira versão da Matriz iniciou-se em 1833, tendo Miguelzinho
assumido as obras em 1858, tendo terminado as obras somente em 1875. Tinha estilo
barroco tardio, com adições do neoclássico, com talha em madeira.

A atual Catedral de Santo Antônio substituiu o quarto edifício da Matriz, que incendiou-se
em 1939. A catedral teve seu projeto arquitetônico assinado por Benedito Calixto Neto (o
mesmo autor do projeto arquitetônico da nova Basílica de N.S. Aparecida, em Aparecida
do Norte) e teve suas obras iniciadas em 1946, terminando somente em 1961.

Seu estilo arquitetônico é o neorromânico (arcos de volta perfeita, ou romanos, capitéis),


com adições neogóticas (rosácea na fachada principal e vitrais). Possui vitrais da Casa
Conrado, talha em madeira de Eugênio Nardin (cadeiral do presbitério, caixotões do teto,
portas), pintura do batistério de Enrico Bastiglia, imagens de santos de várias
procedências e épocas (um Senhor Flagelado, que a história oral atribui a Miguelzinho
Dutra; uma Nossa Senhora das Dores, de procedência espanhola, do séc. XIX), além de
alguns poucos elementos litúrgicos vindos da antiga Matriz, como os candelabros de prata
do século XIX no altar principal.

Igreja de São Benedito

Miguelzinho Dutra foi responsável também pela reforma e ampliação da antiga capela
de N.S. do Rosário, situada na rua a que deu o nome, que se tornou a igreja de São
Benedito, realizada em 1867. Esta igreja, até onde sabemos, é o segundo templo católico
construído em Piracicaba, e o mais antigo sobrevivente.

Provavelmente sua origem deve-se à capela que foi construída no antigo cemitério da
Praça Tibiriçá, que possuía uma parte destinada ao enterro dos escravos. (O cemitério
localizava-se aproximadamente na praça do atual prédio da escola Moraes Barros). Em
1859, foi cedida metade do cemitério à Irmandade de São Benedito. Um muro, construído
pela prefeitura, dividia o cemitério. Existe a notícia que a capela era dedicada a N.S. do
Rosário, e provavelmente estava no local da atual igreja de São Benedito.

1
Licenciado em Artes Visuais pela Universidade Estadual de Campinas - Unicamp, e Especialista em História da
Arte pelo Instituto Claretiano de Rio Claro.

1
Em 1867, Miguelzinho constrói no lugar da antiga capela uma igreja nova, que é
consagrada, agora, a São Benedito, outro santo predileto dos negros. Supostamente a
igreja teve ajuda financeira do Barão de Resende, que tinha seu Solar (casarão) na
esquina da atual rua do Rosário com a rua São José. Em 1892, novas reformas são feitas,
sendo acrescentada a torre neogótica. De 1910 a 1917, as paredes da igreja, feitas em
taipa de pilão, são demolidas e reconstruídas, conservando-se somente a torre. A última
reforma é feita com projeto do engenheiro Eduardo Kiehl e a obra é conduzida por sua
esposa, da. Eutália Kiehl.

Igreja Sagrado Coração de Jesus, a “Igreja dos Frades”

Em 1895, ano de inauguração da incompleta Igreja dos Frades, Piracicaba contava com
pouquíssimas igrejas: a Matriz de Santo Antônio, a Capela de Santa Cruz, São Benedito e
a igreja da Irmandade de de N.S. da Boa Morte. O Passo do Senhor do Horto, na rua
Prudente de Moraes, obra de Miguelzinho Dutra, não era uma igreja, mas sim um dos três
passos permanentes da Via Sacra, utilizado somente na época da Semana Santa.

Fruto do trabalho missionário dos freis franciscanos capuchinhos, que aqui chegaram em
1890, sua pedra fundamental foi inaugurada em 1893 e sua inauguração realizada em
1895, ainda sem ornamentação.

A decoração interna é obra de vários artistas. Os altares e o púlpito são obras em talha
de madeira de Antonio Spinelli. As imagens dos santos são do escultor tirolês Antonio (ou
Franz) Tavella, que confeccionou as imagens na Europa na técnica do “carton pierre”, e
nunca esteve no Brasil. A imagem do Sagrado Coração de Jesus é de Giacomo Scopoli,
escultor italiano que morou durante anos nos conventos franciscanos do estado de São
Paulo e decorou muitas igrejas da Ordem. Os quadros da via Sacra são pinturas originais a
óleo do irmão redentorista Max Schmalzl, também autor das pinturas da Basílica Velha de
Aparecida do Norte. O tabernáculo e altar-mor é de 1900, de autoria da oficina dos Irmãos
Trentini, de Taubaté. A primeira decoração em pintura mural foi realizada pelo frei Paulo
Maria de Sorocaba, irmão franciscano capuchinho, entre 1917 a 1924. A segunda
decoração foi feita por Pietro Gentili entre 1938 e 1939, provavelmente auxiliado por seu
irmão Ulderico.

A arquitetura, do projeto original de J.L. Maiden, era de inspiração renascentista e


possuía estátuas de bronze em sua fachada, que segundo a história oral, foram
emparedadas na reforma desastrosa de 1956-59, que descaracterizou completamente a
fachada.

Capela de São Pedro do Monte Alegre

Construída sob patrocínio do Comendador Pedro Morganti, para atender os habitantes do


bairro Monte Alegre, funcionários da Usina Monte Alegre e suas famílias. Iniciou sua
construção em 1936, foi inaugurada no Natal do mesmo ano, e consagrada em 04 de
janeiro de 1937. Somente depois de consagrada é que iniciou-se sua decoração.

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O projeto arquitetônico é de Antonio Ambrogi, italiano residente em São Paulo, um
“prático licenciado”, um dos empreiteiros que prestava serviços, entre outros, ao escritório
de arquitetura de Ramos de Azevedo. Supostamente, teria se inspirado em igrejas da
região de Lucca, da qual Morganti (e Ambrogi) era originário.

A decoração interna das paredes é feita na técnica de afrescos em têmpera, por Alfredo
Volpi, e foi executada entre 1938 e 1939, num período entre seis meses a um ano. Nesta
época, Volpi ainda não era famoso, seu principal trabalho era o de pinturas ornamentais
em residências e igrejas, e começava a participar de salões de arte moderna com pinturas
de cavalete. Teve como auxiliares Aldorigo Marchetti e Mario Zanini, dois companheiros do
pintor no grupo de artistas, todos decoradores mas também interessados em pintura
moderna, que depois seria conhecido como Grupo Santa Helena.

Foi repintada na década de 1960, provavelmente por Mario Zanini, e passou por vários
proprietários, donos do patrimônio da Usina Monte Alegre, até ser adquirida em separado
pela Diocese de Piracicaba em 2021.

Capela do Lar dos Velhinhos

A Capela de São José, inaugurada em 1982, foi projetada pelo mestre de obras João
Marques da Silva. A capela se reveste de interesse especial pela coleção de quadros
realizados por artistas piracicabanos, alguns deles hoje considerados artistas os mais
importantes das artes da cidade, como Arquimedes Dutra, Joca Adamoli, Renato Wagner,
Pacheco Ferraz e outros. O quadro de Dutra mostra Jesus cercado de crianças com o
cenário da Rua do Porto ao fundo. A exposição ao público e a ótima amostragem de
muitos dos principais artistas piracicabanos da segunda metade do século XX fazem da
Capela uma verdadeira “pinacoteca da arte piracicabana”, segundo as palavras de Jairo
Mattos, responsável pelas encomendas aos artistas. O ex-vereador e presidente por
muitos anos do Lar dos Velhinhos Jairo Mattos, era também escultor e amigo da maior
parte dos artistas ali presentes.

Igreja Matriz da Paróquia São Judas Tadeu

A igreja foi iniciativa dos padres premontratenses, originários de Premontre, na França,


para trabalhar na comunidade em 1953, a pedido de Dom Ernesto de Paula, bispo de
Piracicaba e ex-aluno do colégio da Ordem. Todo o bairro São Judas se desenvolveu à
volta da igreja, que teve uma capela, primeiramente, e depois a igreja de arquitetura
modernista.

A igreja, de enormes proporções, com capacidade para abrigar 1.500 fiéis sentados, é a
maior igreja católica de Piracicaba. É diretamente inspirada no projeto do Santuário de
São Judas Tadeu do bairro do Jabaquara, em São Paulo, cujo projeto é do arquiteto Giulio
del Fabro. Sua construção foi iniciada na década de 1960 e foi inaugurada, ainda
incompleta, em 1975.

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A imagem de São Judas, presente no interior do templo, é uma réplica da imagem da
fachada do Santuário do Jabaquara. A decoração conta com vitrais modernistas abstratos,
de procedência ignorada; com mosaicos de Osvair Perón, na parte externa; e murais em
estilo neobizantino de Gustavo Montebello, discípulo do artista Claudio Pastro. Montebello
decorou ainda outras igrejas em Piracicaba, na mesma paróquia de São Judas, como a
Capela de São Roque, Capela de São José em Tupi, e também a igreja Matriz da paróquia
Santa Cruz e São Dimas.

OUTRAS IGREJAS

Esta visita contemplou somente algumas igrejas, dentre as mais importantes de


Piracicaba, possíveis de serem visitadas no tempo limitado de somente um dia.

Podemos citar outras igrejas importantes na cidade, como a Igreja de Nossa Senhora da
Boa Morte e Assunção, no Colégio Dom Bosco Assunção, cuja primeira edificação foi
projetada e decorada por Miguelzinho Dutra; a igreja Matriz N.S. da Imaculada Conceição,
da Vila Rezende, projetada por João Chaddad; a igreja do Senhor Bom Jesus do Monte, do
Bairro Alto, projetada por Paulo Nardin e decorada pelos irmãos Tomazi; a igreja da
Ordem das Carmelitas Nossa Senhora do Carmo e Santa Terezinha, com entalhes de
Eugênio Nardin; o conjunto do Seminário Seráfico “São Fidélis” dos franciscanos, com
obras de frei Paulo de Sorocaba, entre outras edificações.

Piracicaba, 31 de março de 2023.

Referências bibliográficas
A PROVÍNCIA ON-LINE. Piracicaba. Disponível em <http://www.aprovincia.com.br/.> Vários
artigos.
CACHIONI, Marcelo (org). Igrejas. Piracicaba: Instituto de Planejamento PPLAP, 2012. 92 p: il. -
(Patrimônio Cultural de Piracicaba; v. 2)
________________. IPAC - Inventário de Patrimônio Cultural Imóveis Tombados Bairro
Monte Alegre. Karina Vênere, Gabriella T. C. Aude, Karime Tejada, Victório E. M. S. Jordan Rojas,
Walter De Castro Junior. (col.). Piracicaba: IPPLAP, s/d. [2003]
CAPELA de São Pedro do Monte Alegre, 1937: Patrimônio da Arte Moderna, da colonização
italiana e dos grandes engenhos. Memorial de restauração. Fato Engenharia,, s.d. Disponível
em http://www.capelamontealegre.com.br. Consultado em 31 de julho de 2015.
ELIAS Netto, Cecílio. Almanaque 2000. Memorial de Piracicaba – século XX. Piracicaba:
Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba / A Tribuna Piracicabana / Jornal de Piracicaba.
GUERRINI, Leandro. História de Piracicaba em Quadrinhos. Piracicaba, SP: Equilíbrio :
Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba – IHGP, 2009. 402 p. 2 vls. [2 a ed.].
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE PIRACICABA. <www.ihgp.org.br>, com dezenas de
livros e revistas sobre Piracicaba, publicados pelo Instituto, em versão digital para leitura on-line
ou para download.
PFROMM Netto, Samuel. Dicionário de Piracicabanos. 1a ed. São Paulo, SP: PNA, 2013.

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INSCRIÇÕES EM LATIM NOS FRISOS DA CAPELA DE SÃO PEDRO DO MONTE
ALEGRE, em Piracicaba, E PROPOSTAS DE TRADUÇÕES PARA O PORTUGUÊS
Fábio San Juan
Nos frisos superiores da nave:
QUODCUMOUE [sic] ORAVERINT IN LOCO ISTO ET EXAUDIES IN LOCO HABITACULI TUI IN
COELO [sic] ET CUM EXAUDIERIS PROPITIUS ERIS
Tradução: “Quando orarem neste lugar ouvi-os do alto de vossa morada no céu, ouvi-os e
perdoai”.
A citação provém de I Reis, 8, 30b, provavelmente do texto da Vulgata, e está truncada.

Parte superior da parede do braço direito do transepto:


INFIDELITATE [sic] EJUS [sic] MENS NOSTRA IN FIDE SOLIDATUR
Tradução: “Na fidelidade dele [de São Pedro] fortalece-se a fé em nossa mente”.
Acreditamos que seja uma citação de Santo Tomás de Aquino da Summa Theologica., embora não
tenha sido possível determinar a fonte exata da qual foi retirada. Um indício dessa tese é a
inscrição situar-se acima do altar lateral do braço direito do transepto, o qual abriga, entre outras,
a imagem do Doutor Angélico.

Parte superior da parede do braço esquerdo do transepto:


REX DEUS REGUM DOMINATOR ORBIS SE TIBI SUBDIT
Tradução: “Deus Rei dos Reis, governador do mundo, protetor te chamei ”
Citação do Breviário Romano, Ofício da festa de São José (Laudes):
“Rex Deus regum, Dominator orbis, Cuius ad nutum tremit inferorum
Turba, cui pronus famulatur aether, Se tibi subdit” .2

“Deus, Rei dos Reis, governador do mundo, Aquele que a turba do inferno treme, Aquele a quem
os céus adoram, protetor Te chamei”.

Parte superior da abside:


SUPER HANC PETRAM ÆDIFICABO ECCLESIAM MEAM
Tradução: “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja”.
Citação de Mt, 16, 18.

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Ofício das Horas, consultado em http://divinumofficium.com/cgi-bin/horas/Pofficium.pl?
date1=4-27-
2015&command=prayLaudes&version=1960%20Newcalendar&testmode=regular&lang2=English
&votive=

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