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PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO

STRICTO SENSU EM EDUCAÇÃO

MESTRADO

ATENDIMENTO A DISLÉXICOS
NO ENSINO MÉDIO: EM BUSCA
DE UMA POLÍTICA PÚBLICA
Autor: Elizete Cristina de Souza
Orientador: Beatrice Laura Carnielli

2008
ELIZETE CRISTINA DE SOUZA

ATENDIMENTO A DISLÉXICOS NO ENSINO MÉDIO:


EM BUSCA DE UMA POLÍTICA PÚBLICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto


Sensu em Educação da Universidade Católica de Brasília, como
requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Política e
Administração Educacional.

Orientador: Profª Drª Beatrice Laura Carnielli

BRASÍLIA
2008
S729a Souza, Elizete Cristina de.
Atendimento a disléxicos no ensino médio: em busca de uma política
pública / Elizete Cristina de Souza – 2008.
92 f.: il. ; 30 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2008.


Orientação: Beatrice Laura Carnielli

1. Dislexia – Estudantes do ensino médio. 2. Política e educação -


Ensino médio. I. Carnielli, Beatrice Laura, orient. II. Título.

CDU 376.36

Ficha elaborada pela Coordenação de Processamento do Acervo do SIBI – UCB.


Dedico este trabalho à minha família, com
relevância a meu pai e à minha mãe, que foram
cruciais para meu desenvolvimento pessoal e
intelectual. A meu namorado, Julio, pelo
companheirismo e por manter viva a paixão que
culmina em grandes realizações. E, a cada amigo
que, nos momentos mais difíceis, estiveram ao meu
lado e me propiciaram meios e disposição para que
eu chegasse até aqui. Em especial, à querida amiga
Ellis Regina co-responsável por meu crescimento
intelectual nos últimos anos.
AGRADECIMENTOS

Agradeço às amigas e colegas de trabalho Chistina e


Gabriela, que me incentivaram e deram o impulso
inicial para que eu pudesse ingressar no Mestrado.
E, especialmente, ao Capitão Anísio, que
possibilitou um ambiente de trabalho tranqüilo, o
que refletiu na elaboração do meu trabalho.
À minha professora/orientadora Drª Beatrice Laura
Carnielli que, desde o primeiro momento, acreditou
na minha idéia, incentivou-me e se dedicou
plenamente para que eu pudesse desenvolver minha
pesquisa da melhor maneira possível.
A todos os amigos e profissionais que direta ou
indiretamente me auxiliaram na elaboração desta
pesquisa, ao disponibilizar tempo e material para
aprofundar meu estudo. Especialmente, às
professoras e doutoras Cíntia Carla Moreira
Shwantes e Clélia de Freitas Capanema. À Ellis
Regina, por colaborar na elaboração dos gráficos.
Sobretudo aos meus pais que abdicaram de sua
própria formação intelectual para se dedicarem ao
trabalho para sustentação dos estudos de seus filhos.
E, a Deus que colocou na minha vida todas essas
pessoas maravilhosas junto com as oportunidades de
progredir, dando-me força, e discernimento em
todos os momentos.
“A palavra escrita mistura-se intimamente à
palavra oral, da qual é imagem, acabando por
usurpar seu papel principal. (...) A escrita
mascara a vista da língua: ela não é uma roupa,
mas um disfarce”.
(SAUSSURE)

“Fui totalmente desestimulado em tudo, em meus


dias de escola. E nada é mais desencorajador do
que ser marginalizado em sala de aula, o que leva
a nos sentirmos inferiores em nossa origem
humana”.
(WINSTON CHURCHILL)

“Quando eu lia, somente ouvia o que estava


lendo, e era incapaz de lembrar a aparência visual
da palavra que lia”.
( ALBERT EINSTEIN)
RESUMO

Este estudo teve como objetivo investigar o encaminhamento dado ao aluno do ensino
médio, com suspeita de dislexia, pelas escolas do Distrito Federal. Para tanto, recorreu-
se à pesquisa exploratória desenvolvida em duas unidades de ensino médio da rede
pública, tendo como participantes orientadores pedagógicos e professores de Português.
A escolha dos professores dessa disciplina específica se justifica por serem eles os
primeiros capazes de detectarem os sintomas de dislexia, visto que exploram mais a
escrita e a leitura. Além disso, realizaram-se entrevistas com os profissionais de
educação e de saúde do Centro de Orientação Médico Psicopedagógico (Compp) e do
Hospital da Universidade de Brasília (HUB), que atendem alunos com transtorno de
aprendizagem. Verificou-se que, no caso de suspeita de dislexia, a escola encaminha o
aluno ao Compp ou HUB para a formulação do diagnóstico pertinente. Observou-se
também, que essas duas instituições não possuem pessoal em quantidade suficiente ou
com a experiência necessária para a definição ágil do diagnóstico, donde o longo espaço
de tempo entre a suspeita e o início do atendimento adequado, que pode comprometer o
êxito do procedimento necessário. Os docentes, por sua vez, desconhecem as facilidades
ou barreiras para a implementação de práticas pedagógicas que favoreçam a
aprendizagem do disléxico, pois a formação inicial dos professores de Língua
Portuguesa não os prepara para lidar com o aluno disléxico. Em face dessas
constatações, é recomendada uma política de atendimento eficaz para os distúrbios de
aprendizagem, em geral, e da dislexia, em particular, bem como, são apresentados
procedimentos a serem adotados pelos professores de Língua Portuguesa que podem
propiciar a superação do problema.

Palavras-chave: Dislexia. Política educacional. Ensino Médio. Formação de


Professores.
ABSTRACT

The study aimed at surveying the approach by the high schools in the Federal District
towards students supposed to suffer from dyslexia. Hence, it employed the exploratory
research that was developed in two public high schools, relying on the participation of
learning mentors and Portuguese language teachers. The selection of teachers of that
specific subject is due to the fact that they are the first teachers capable of perceiving the
symptoms of dyslexia, since they explore more reading and writing. Furthermore, the
survey interviewed education and health professionals of the Compp (Center of Psycho-
pedagogical and Medical Guidance) and of the Brasilia University Hospital (HUB) who
work with students suffering from learning disorders. It was found out that, in the event
of supposed dyslexia, the school refers the student to the Compp or HUB to the
pertinent diagnosis. It was also observed that both institutions miss personnel, either in
terms of quantity or with the required skill to promptly define the diagnosis, and that the
long time span between the suspicion and the starting of the proper treatment could
jeopardize the success of the required procedure. The teaching staff, in turn, is unaware
of the help or barriers faced to implement pedagogical practices capable of favoring the
dyslexic individual’s learning. That is so because the initial training of the Portuguese
Language teachers fails in preparing them to handle with dyslexic students. Such
findings lead to the recommendation of a policy towards providing efficient services to
individuals with learning disorders, in general, notably the dyslexic individuals.
Moreover, the research points out some procedures to be adopted by the Portuguese
Language teachers towards overcoming the problem.

Keywords: Dyslexia. Educational Policy. Teachers Training.


SUMÁRIO

PÁG

INTRODUÇÃO ....................................................................................................12

CAPÍTULO l.
O ESTUDO, SEUS OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS ................................14

1.1 O problema em questão .................................................................................... 14

1.1 Objetivos ........................................................................................................... 19

1.1.1 Geral ........................................................................................................... 19

1.1.2 Específicos ..................................................................................................... 19

1.2 Justificativa do estudo ....................................................................................... 19

1.3 Procedimentos metodológicos .......................................................................... 21

1.3.1 Cenário da pesquisa, seus participantes e a coleta de dados .......................... 22

1.3.2 Instrumentos de coleta de dados e as informações levantadas .......................23

CAPÍTULO II.
EXPOSIÇÃO DO REFERENCIAL TEÓRICO ................................................ 25
2.1 Por uma escola democrática ............................................................................ 25

2.2 Portadores de necessidades especiais ............................................................... 29

2.3 A legislação sobre a educação dos portadores de necessidades especiais ........ 34

2.4 Uma visão de Vygotsky sobre as relações sociais e o domínio da linguagem ...39

2.5 O que os elaboradores de políticas precisam saber sobre dislexia ......................41

2.5.1 Entendendo a dislexia ..................................................................................... 41


2.5.2 Explicações sobre a natureza da dislexia ........................................................ 45

2.5.3 O diagnóstico da dislexia ................................................................................. 47

2.6 O apoio ao disléxico: entidades voltadas ao atendimento dos portadores do

distúrbio no Brasil ................................................................................................... 48

2.6.1 Associação Brasileira de Dislexia – ABD ....................................................... 49

2.6.2 Associação Nacional de Dislexia – AND ......................................................50

2.7 O trabalho pedagógico .........................................................................................50

2.7.1 O Disléxico e o Papel da Escola .......................................................................54

CAPÍTULO III.
ATENDIMENTO AO JOVEM DISLÉXICO NO DISTRITO FEDERAL ..... 59

3.1 Os professores de Língua Portuguesa e a inclusão do disléxico ........................59

3.1.1 O serviço de orientação pedagógica ................................................................69

3.1.2 Os centros de apoio pedagógico: um exemplo ................................................71

3.2 A importância da família ....................................................................................71

3.3 Instituições de atendimento do aluno com suspeita de dislexia .........................73

3.3.1 O Compp: conduta no atendimento .................................................................73

3.3.2 O HUB: conduta no Atendimento ...................................................................75

3.3.3 O atendimento nas duas instituições públicas de saúde ..................................76

3.3.4 O diagnóstico e o tratamento da dislexia ........................................................78

CAPÍTULO IV.
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 87

4.1 Recomendações ................................................................................................ 89


REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 93

APÊNDICE A – Questionário destinado aos professores de Língua Portuguesa ........ 98

APÊNDICE B – Roteiro de entrevista destinada aos orientadores pedagógicos .........101

APÊNDICE C – Roteiro de entrevista destinada aos psicopedagogos, fonoaudiólogos,

neurologistas ...............................................................................................................102
LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 – Tempo de graduação dos professores .............................................60


GRÁFICO 2 – Modalidade de administração acadêmica onde os professores se
graduaram.......................................................................................60
GRÁFICO 3 - Abordagem da dislexia na graduação ..............................................61
GRÁFICO 4 - Informações sobre dislexia ..............................................................62
GRÁFICO 5 - Presença de alunos disléxicos em sala de aula, no ensino médio ....63
GRÁFICO 6 - Retorno do diagnóstico ....................................................................64
GRÁFICO 7 - Reação dos pais ...............................................................................65
GRÁFICO 8 - Diferenciação das práticas pedagógicas ..........................................66
GRÁFICO 9 - Favorecimento das práticas pedagógicas pela escola ......................67
GRÁFICO 10 - Barreiras para implementar práticas pedagógicas .........................67
GRÁFICO 11 - Distinção do modo e tempo de avaliação ......................................68
12

INTRODUÇÃO

Tanto a Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 2000) quanto a


Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) nº 9394/96, de 20 de dezembro de
1996 (Brasil, 1996), ressaltam a importância e a urgência de promover a inclusão
educacional como elemento formador da cidadania. Nesse sentido, durante as últimas
décadas, percebe-se um crescente interesse da sociedade em relação ao tratamento especial
de alunos com dislexia. Esse fator é oriundo de uma consciência de que o problema de
leitura e de escrita pode determinar o fracasso escolar desses indivíduos com conseqüentes
problemas emocionais como ansiedade e depressão, e a desvalorização da pessoa no
mercado de trabalho.
Em consonância com os pressupostos legais e conceituais de uma educação de
qualidade para todos, o Programa Educação Inclusiva – direito à diversidade – do Ministério
da Educação (MEC) visa disseminar a política de educação inclusiva nos municípios
brasileiros e apoiar a formação de gestores e educadores para efetivar a transformação dos
sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos. Logo, na perspectiva de apoiar
a implementação da educação inclusiva nas escolas brasileiras, a Secretaria de Educação
Especial do MEC desenvolve, desde 2004, o Projeto Educar na Diversidade.
A promoção da educação inclusiva, fundamentada no princípio da universalização
do acesso à educação e na atenção à diversidade, requer uma filosofia de educação de
qualidade para todos. Assim, é crucial o desenvolvimento de uma pedagogia centrada no
estudante, a ampliação da participação da família e da comunidade nos espaços
educacionais, a organização das escolas para a participação e aprendizagem de todos os
alunos e a formação de redes de apoio à inclusão.
A proposta de educação inclusiva tem também como objetivo formar e acompanhar
docentes para o desenvolvimento de práticas educacionais inclusivas nas salas de aula. De
acordo com a Resolução nº 2, de 11 de setembro de 2001, do Conselho Nacional de
Educação, Câmara de Educação Básica (CNE/CEB) artigo 18, consideram-se professores
capacitados para atuar em classes comuns com alunos que apresentam necessidades
educacionais especiais aqueles que comprovem que, em sua formação, de nível médio ou
superior, foram incluídos conteúdos sobre educação especial adequados ao desenvolvimento
de competências e valores (BRASIL, 2001).
13

Todavia, é possível que a rede pública ainda deixe muito a desejar em relação a
professores capacitados para lidar com portadores de necessidades especiais, especialmente
com disléxicos. A desinformação é tanta que um distúrbio como esse é ainda erroneamente
caracterizado como um problema surgido somente após a alfabetização ou como deficiência
mental. A dislexia pode ser causa ainda ignorada de evasão e uma das causas do
analfabetismo funcional.
Nesse contexto, percebe-se a necessidade de novas políticas de educação. Assim,
esta pesquisa visa a oferecer subsídios e sugestões para a ação dos gestores e educadores,
especialmente aos docentes da Língua Materna. Por meio deste trabalho, o leitor poderá
perceber as diferentes abordagens sobre o tema, dentro da perspectiva atual. Procurou-se
elucidar se as escolas da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal têm
diagnosticado e proporcionado tratamento adequado aos alunos disléxicos da rede pública.
Além disso, pretende-se verificar até que ponto os docentes de Português estão preparados,
a partir da formação inicial, para ministrar as aulas a esses alunos no ensino médio.
É oferecida uma série de leituras fundamentais que poderão ajudar os profissionais de
educação a refletirem sobre suas ações, tendo em vista a busca por uma política pública que
ampare os estudantes disléxicos no ensino médio. Como propõe Perrenoud (2002), a
autonomia e a responsabilidade de um profissional dependem de uma grande capacidade de
refletir em e sobre sua ação. Isso está no âmago do desenvolvimento permanente, em função
da experiência de competências e dos saberes profissionais que vão além da formação
inicial. Conforme o autor, a figura do profissional reflexivo está no cerne do exercício de
uma profissão, pelo menos quando considerados sob o ângulo da especialização e da
inteligência no trabalho.
No atual momento em que a dislexia tem sido mais discutida é importante apresentar
as diferentes visões sobre o assunto para que se possam determinar os melhores meios de
superar o problema. Embora em alguns países como os Estados Unidos e Nova Zelândia os
estudos sobre esse distúrbio já estejam avançados, no Brasil, ainda há muito a explorar.
14

CAPÍTULO I – O ESTUDO, SEUS OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS

1.1 O problema em questão

Ao final da década de 90, do século XX, o Brasil conseguiu alcançar a universalização


do Ensino Fundamental, garantindo o acesso à escola das crianças e jovens compreendidos
na faixa etária de sete a 14 anos. Se, em termos quantitativos, a universalização do ensino
fundamental foi uma realização a ser celebrada, a qualidade do ensino tem ainda um longo
caminho a percorrer. Prova dessa afirmação encontra-se nos resultados dos diversos
sistemas nacionais de avaliação, como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb),
conforme estabelece a Portaria nº 931, de março de 2005, onde, via de regra, mais da
metade das crianças das 4ª e 8ª séries do ensino fundamental e 3ª série do ensino médio, têm
rendimento nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática, classificados como muito
crítico ou crítico, o que significa possuírem um domínio muito baixo dos conteúdos dessas
disciplinas (BRASIL, 2005).
A literatura especializada tem destacado uma série de fatores que podem ser
responsabilizados pelo fraco desempenho dos alunos da educação básica. Entre os fatores
recorrentemente lembrados, cita-se a má formação dos professores ou sua falta de
motivação para o desempenho de suas funções; a falta de equipamentos e materiais
instrucionais adequados nas escolas; a inércia dos gestores das escolas em adotar
metodologias e promover atividades que estimulem o aprendizado dos alunos.
Enquanto esses problemas estruturais vão sendo superados, com uma lentidão de
exasperar, soluções paliativas são adotadas para atender o aluno com “dificuldade de
aprendizagem”, visando a evitar as sucessivas repetências, fato que, na maioria das vezes,
acaba levando-o a abandonar a escola. A adoção do sistema de ciclos, por exemplo, visa
prolongar o período de aprendizagem do discente de determinado nível, adaptando-o ao seu
ritmo, assim como as classes de aceleração, que, por meio da intensificação dos estudos,
buscam levar o aluno a alcançar os objetivos estipulados para determinada série. Essas
inovações não têm alcançado os resultados esperados, conforme demonstram os dados do
Saeb.
15

Cerca de 10% da população brasileira apresenta algum tipo de deficiência, de acordo


com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Isso leva à necessidade de se pensar em
políticas públicas eficientes para o ensino especial. Essa política de inclusão se tornou mais
consistente, no Brasil, somente a partir da Declaração de Salamanca, que surgiu depois da
Conferência Mundial sobre Necessidades Especiais, realizada na Espanha, em 1994, com o
objetivo de promover a educação para todos (UNESCO, 1994).
Esse encontro é considerado referência mundial para a tomada de decisões
governamentais e não-governamentais relativas à viabilização do acesso da população com
necessidades especiais a atendimentos educativos diferenciados. Reafirma-se, então, o que
já constava na Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, que prevê o direito de
todos à educação.
Para os efeitos da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, a educação especial,
como modalidade de educação escolar, será oferecida preferencialmente na rede regular de
ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. Haverá, quando necessário,
serviços de apoio especializado na escola regular, para atender as peculiaridades da clientela
de educação especial. Esse atendimento educacional será feito em classes, escolas ou
serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não
for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular.

Tendo como horizonte a democracia e a inclusão social, o Plano Nacional de Educação,


Lei 10.172, de 9 de dezembro de 2001, propõe às escolas ampliar, progressivamente, a
matrícula no ensino médio, de forma a atender, no final daquela década, pelo menos 80%
dos concluintes do ensino fundamental e reduzir em 5% ao ano, a repetência e a evasão, de
forma a diminuir para quatro anos o tempo médio para conclusão do ensino médio. Logo, é
necessário melhorar o aproveitamento dos alunos do ensino médio, de forma a atingir níveis
satisfatórios de desempenho definidos e avaliados pelo Saeb e pelos sistemas de avaliação
que venham a ser implantados nos Estados. Além disso, quanto à formação dos profissionais
da educação, há como diretriz o desenvolvimento do compromisso social e político da
docência (BRASIL, 2001).

O Plano prevê também a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando,


para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas
condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores. Além disso, propõe o
aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o
desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico. Haverá também, quando
16

necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender à peculiaridades


da clientela de educação especial. Para isso, o Plano propõe as tendências recentes dos
sistemas de ensino:
• integração/inclusão do aluno com necessidades especiais no sistema regular de
ensino e, se isso não for possível em função das necessidades do educando, realizar
o atendimento em classes e escolas especializadas;
• ampliação do regulamento das escolas especiais para prestarem apoio e orientação
aos programas de integração, além do atendimento específico;
• melhoria da qualificação dos professores do ensino fundamental para essa clientela;
• expansão da oferta dos cursos de formação/especialização pelas universidades e
escolas normais.

Em verdade, a dificuldade de aprendizagem é um problema complexo, que envolve


uma série de situações, algumas delas de difícil diagnóstico e (ou) ainda pouco estudadas.
Compõem este quadro a Síndrome de Down, o déficit cognitivo, a discalculia e,
principalmente, a dislexia, que, segundo estimativa da International Dyslexia Assotiation
(IDA), pode atingir de 15% a 20% dos alunos numa sala de aula.
Como o tratamento do distúrbio dura de dois a cinco anos, podendo ser iniciado a
partir do 3º ano (ensino fundamental), pode estender-se até o 9º ou demais anos. No entanto,
caso os alunos não tenham sido diagnosticados nessa fase, levam o problema consigo por
todo o ensino médio e, também, para a o curso superior.
A dislexia, segundo Ellis (1995), é um defeito de aprendizagem da leitura
caracterizado por dificuldades na correspondência entre símbolos gráficos, às vezes, mal
reconhecidos e fonemas, muitas vezes, mal identificados. O primeiro sinal de possível
dislexia pode ser detectado no ensino fundamental quando a criança, apesar de ter
oportunidades educacionais adequadas, tem grande dificuldade em assimilar o que é
ensinado pelo professor, em aprender a ler e a escrever e, especialmente, em escrever
corretamente sem erros de ortografia, mesmo tendo o Quociente de Inteligência (Q.I.) igual
ou acima da média.
Por outro lado, o desenvolvimento das habilidades emocionais parece ser o grande
desafio para o educador contemporâneo, principalmente quando o aluno apresenta algum
distúrbio que dificulte a aprendizagem, como a dislexia. Não é possível, pois, desenvolver
as habilidades cognitivas e as sociais sem que a emoção seja trabalhada. Por isso o professor
17

precisa desenvolver a autoconfiança da criança e a sua crença de que ela será capaz de
aprender a ler. Com autoconfiança e sucesso crescentes, a ansiedade é dissipada
gradualmente. Por conseguinte, garantir-se-á uma boa convivência escolar (VALETT,
1990).
Dessa forma, a educação deve ocorrer por meio de troca de experiências, entre o
docente e o discente, o que, na maioria das vezes, não acontece em sala de aula. Chalita
(2001) ressalta que o docente deve agir com bom senso para desenvolver a autonomia dos
alunos. Assim, deve demonstrar entusiasmo, paixão e não discriminação. A aprendizagem
deve ter, portanto, cooperação com base na abordagem construtivista, assegurando, desta
maneira, a utilização do potencial do aluno, para respeitar e nutrir diversas inteligências. No
caso de dislexia, trata-se, então, de compreender como os professores possibilitam a
construção dos conceitos por meio de práticas pedagógicas adaptadas ao desenvolvimento
dos discentes com esse distúrbio.
A dislexia traz prejuízos à vida escolar e afetiva dos seus portadores, bem como afeta
a administração escolar, que teria de proceder a um esforço adicional para garantir, em
princípio, um desempenho mínimo de todos os alunos. Em que pese o percentual
relativamente elevado de portadores do distúrbio, principalmente na rede pública de ensino,
pouca atenção lhe tem sido dispensada, a começar pela dificuldade do seu diagnóstico, que
envolve uma equipe multidisciplinar.
A Sub-Secretaria de Educação Especial do Distrito Federal restringe sua
preocupação sobre dislexia apenas ao ensino fundamental. Necessariamente, há atendimento
especializado pela Equipe de Apoio de Aprendizagem só para os alunos de 1ª a 4ª séries, em
Diretorias de Regionais de Ensino, com a perspectiva de intervenção.
Urge, portanto, a criação de políticas educacionais sensíveis que respeitem tanto a
dignidade de todas as pessoas como os inerentes benefícios e a harmonia derivados da
ampla diversidade existente entre elas.
O mais recente documento versando sobre os portadores de deficiência é a Carta
para o Terceiro Milênio, aprovada no dia nove de setembro de 1999, em Londres, Grã-
Bretanha, pela Assembléia Governativa da Rehabilitation Internacional. A Carta proclama
que, para transformar os direitos humanos básicos em realidade, há que assegurar
oportunidades iguais para as pessoas com deficiência a fim de que tenham o acesso e a
plena inclusão, em todos os aspectos da sociedade. Ela alerta que a ignorância, o
preconceito, a superstição e, até mesmo, o medo ainda dominam grande parte das respostas
da sociedade à deficiência.
18

A Carta expõe que, no século XXI, a sociedade precisa aceitar a deficiência como
uma parte comum da variada condição humana. Uma conseqüência alarmante do
preconceito é que, em países desenvolvidos e em desenvolvimento, nos hemisférios Norte e
Sul do planeta, a segregação e a marginalização têm colocado pessoas com deficiência no
nível mais baixo da escala sócio-econômica. Assim, segundo a Carta:

Todas as nações devem ter programas contínuos e de âmbito nacional para


reduzir ou prevenir qualquer risco que possa causar impedimento, deficiência ou
incapacidade, bem como programas de intervenção precoce para crianças e
adultos que se tornarem deficientes. (BRASIL, 1999, p.2)

Esse documento complementa que todas as pessoas com deficiência devem ter
acesso ao tratamento, à informação sobre técnicas de auto-ajuda e, se necessário, à provisão
de tecnologias assistenciais e apropriadas. Propõe-se, assim, uma política que ampare o
aluno disléxico no ensino médio, nas escolas públicas do Distrito Federal.
Logo, este estudo procurou elucidar algumas questões pertinentes ao tema, quais
sejam: Que tipo de informação sobre a dislexia recebe a média dos professores na formação
inicial, que lhes permita suspeitar que o aluno seja portador do distúrbio? Quais são os
procedimentos adotados pelos órgãos públicos das áreas de educação e de saúde para
estabelecer o diagnóstico e tratamento dos eventuais disléxicos? Uma vez constatada a
presença do distúrbio, quais são as medidas administrativas e pedagógicas tomadas, visando
ao tratamento diferenciado de que o disléxico necessita? Dessa forma, pergunta-se: tem-se
dado tratamento diferenciado aos alunos portadores de dislexia em sala de aula? Até que
ponto os docentes de Língua Portuguesa estão qualificados para lidar com a dislexia no
ensino médio?
19

1.2 Objetivos:

1.2.2 Geral

Identificar estratégias para uma política educacional de atendimento a estudantes disléxicos


no ensino médio.

1.2.3 Específicos

1. Investigar se a formação inicial dos professores de Língua Portuguesa possibilita a


identificação do aluno disléxico;
2. Identificar como o diagnóstico dos alunos disléxicos é realizado, em escolas públicas de
ensino médio do Distrito Federal;
3. Identificar as facilidades e barreiras encontradas por professores para a implementação
de práticas pedagógicas que favoreçam a aprendizagem de alunos disléxicos em sala de
aula, no ensino médio.

1.2 Justificativa do estudo

Embora seja uma condição neurológica e sem cura, a dislexia pode ser superada em
até 80% de seus sintomas com a ajuda do docente em sala de aula. Os professores que
conseguem suspeitar dos sintomas e sugerir um encaminhamento clínico para o estudante
precisam ir além e buscar novos significados para as práticas pedagógicas.

O problema pede que eles se dediquem muito ao aluno ao longo do tratamento, que
envolve em partes iguais a escola, a família e profissionais de saúde. As dificuldades de
aprendizagem devem ser, então, entendidas sob enfoque múltiplo, considerando fatores de
ordem psicológica, pedagógica e social.

É importante enfatizar que, atualmente, a dislexia já tem sido lembrada em exames


como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) ou vestibulares como o da Fundação
Universitária para o Vestibular (FUVEST) e do Centro de Seleção e Promoção de Eventos
da Universidade de Brasília (CESPE/UnB) - inclusive, no Programa de Avaliação Seriada
(PAS). Nessas avaliações, os candidatos com o problema comprovado de dislexia têm
condições especiais (sala e tempo diferenciados) para realização das provas. Para a prova do
PAS e o vestibular da UnB, por exemplo, a duração se estende por mais uma hora, além de
20

que os candidatos disléxicos podem solicitar um ledor e auxílio transcrição. O transcritor


mantém os erros ortográficos, porém o problema de disgrafia é, dessa forma, contornado.

No entanto, a preocupação com o diagnóstico e a prática docente diferenciada com o


aluno portador de dislexia parece, ainda, estar apenas no ensino fundamental, passando
despercebida pelos docentes no ensino médio. Talvez, porque, nessa fase, o discente, por
ser considerado “mais maduro” e, supostamente mais responsável por suas tarefas, torna-se
mais distante dos pais e dos professores durante o processo de ensino-aprendizagem. Além
disso, alunos disléxicos não diagnosticados, em face às novas exigências do ensino, podem
simplesmente abandonar a escola, e assim, nem sequer chegar ao ensino médio.

As dificuldades de aprendizagem do aluno disléxico, principalmente em Português,


por haver mais elaboração de textos visando, neste caso, o ingresso na educação superior,
podem ser consideradas descaso ou falta de interesse. O aluno, caso tenha dislexia sem
acompanhamento adequado, pode tornar-se impotente para competir com seus colegas que
possuem raciocínio dentro dos padrões neurológicos considerados “normais”.

Ainda há muito o que se explorar sobre a dislexia. Os professores não podem


simplesmente ignorar esse problema, visto que o fracasso escolar pode estar associado a
essa condição, levando o aluno à reprovação e até mesmo à evasão escolar, tanto no ensino
médio quanto no superior. Além disso, o sofrimento das pessoas com dislexia pode arrastar-
se por vários anos, traduzindo-se por problemas de comportamento no meio familiar e no
mercado de trabalho.
Uma investigação em torno de alunos disléxicos, no ensino médio, fornece subsídios
para que as instituições de ensino públicas identifiquem os sintomas desses alunos não
apenas no ensino fundamental. Hoje a idéia que se passa é que as instituições escolares
fecham os olhos para esse problema, como se ele não permanecesse por toda a vida do
estudante, ainda que tenha sido diagnosticado e tratado na infância.
Deve-se considerar que uma dislexia leve pode passar despercebida durante todo o
ensino fundamental, contudo, diante da maior carga de leitura e de produção escrita do
ensino médio, torna-se aparente. O disléxico que não obteve tratamento na infância, nessa
fase, apresenta permanência na dificuldade na soletração de palavras mais complexas,
leitura vagarosa e com muitos erros, dificuldade em planejar e fazer redações, vocabulário
empobrecido e criação de subterfúgios para esconder sua dificuldade. Nesse caso, o
professor deve ficar atento às dificuldades individuais de cada aluno para que seja feito o
encaminhamento aos profissionais de apoio pedagógico.
21

A partir dessa lacuna, este estudo tornou-se relevante uma vez que sua proposição
orienta-se para uma investigação no ensino médio, haja vista o momento atual do cenário da
educação que, necessariamente, precisa capacitar profissionais para o processo de ensino-
aprendizagem em classes regulares, para todos os alunos escolarizáveis portadores de
necessidades educacionais especiais. Isso, embora a dislexia tenha sido ignorada até pelo
MEC, pois a palavra dislexia aparece apenas no Parecer CNE/CEB nº 17/20011, da
Resolução do CNE/CEB Nº 2, de 11 de setembro de 2001. Embora não imponha tratamento
diferenciado para alunos que possuem esse distúrbio, diz
O quadro das dificuldades de aprendizagem absorve uma diversidade de
necessidades educacionais, destacadamente aquelas associadas a: dificuldades
específicas de aprendizagem como a dislexia e disfunções correlatas;
problemas de atenção, perceptivos, emocionais, de memória, cognitivos,
psicolingüísticos, psicomotores, motores, de comportamento; e ainda há fatores
ecológicos e socio-econômicos, como as privações de caráter sociocultural e
nutricional. (BRASIL, 2001, p.20, grifo nosso).

Além disso, muitas teorias foram elaboradas em várias áreas do conhecimento


(neurologia, psicologia, educação) para descrever e explicar os déficits na aprendizagem de
leitura e escrita nas crianças, mas pouco é abordado esse problema, em relação aos
adolescentes. Dessa forma, a pesquisa, além de suprir essa lacuna, fornece subsídios
relevantes para planejadores educacionais, gestores escolares e professores, no que diz
respeito ao procedimento a ser adotado com o aluno disléxico adolescente.

1.3 Procedimentos metodológicos

A metodologia escolhida para desenvolvimento do estudo em questão foi a


qualitativa e de caráter exploratório. Esse caráter deriva da lacuna na literatura especializada
de estudos que abordem a dislexia no adolescente. Trata-se, portanto, de situações que
requerem do pesquisador um exercício exploratório com vistas a estudos posteriores
(COSTA, 2001). Segundo Costa (2001, p. 30), essas situações podem ser reconhecidas pelos
seguintes sinalizadores:
• O pesquisador sabe pouco sobre o assunto;
• Não se conhece quase nada sobre o tema; além disso, a bibliografia é escassa;
• Não existem teorias explicativas adequadas; por isso, a formulação de hipóteses
torna-se difícil.

1
Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/parecer17.pdf>. Acesso em 22 out 2007.
22

Gil (1996, p. 45) classifica as pesquisas em três grandes grupos: exploratórias,


descritivas e explicativas, de modo que ocorram, usualmente, com base nos objetivos da
pesquisa. Para o autor, a pesquisa exploratória tem como objetivo proporcionar maior
familiaridade com o problema, a fim de torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses para
aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições. Assim, seu planejamento é bastante
flexível de forma que possibilite a consideração de vários aspectos relativos ao fato
estudado. Conforme Gil, a maioria das pesquisas envolve:
• Levantamento bibliográfico;
• Entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema
pesquisado;
• Análise de exemplos que estimulem a compreensão.

1.3.1 Cenário da pesquisa, seus participantes e a coleta de dados

A pesquisa foi desenvolvida em duas escolas públicas de ensino médio do Distrito


Federal, uma localizada no Plano Piloto e a outra em Taguatinga. Escolheram-se escolas
públicas por, geralmente, possuírem menos condições de assistência ao aluno que apresente
quaisquer transtornos de aprendizagem e de instrumentos que possam medir o grau de
dificuldade do estudante. Da mesma forma, a investigação ocorreu nas duas localidades para
se perceber as diferenças de infra-estrutura entre as duas, já que isso interfere no ensino-
aprendizagem do discente com dislexia.
A seleção das escolas ocorreu, primeiramente, mediante consulta ao serviço de
orientação educacional, a fim de verificar quais delas possuíam informações sobre a
presença de alunos disléxicos nas turmas do ensino médio ou quais possuíam registro dos
alunos que foram identificados como disléxicos ainda no ensino fundamental. Para surpresa
da pesquisadora, não havia qualquer registro de casos de estudantes com diagnóstico de
dislexia. A Secretaria de Educação Especial até informou que isso seria impossível.
Entretanto, disse que esses alunos poderiam estar inseridos apenas no quadro de déficit de
aprendizagem.
Percebemos a resistência e insegurança dos orientadores para falar sobre alunos com
sintomas de dislexia. Dessa forma, ambas as escolas sugeriram que a pesquisadora
procurasse o Centro de Orientação Médica Psicopedagógica (Compp) para prosseguir com
as investigações por não haver encaminhamento, diagnóstico ou tratamento realizado
23

pelas/nas escolas supracitadas de alunos com sintomas propriamente de dislexia. Sentimos a


necessidade de investigar esse caso também em uma instituição hospitalar pública, o
Hospital da Universidade de Brasília (HUB), para termos mais evidências de como os
estudantes das escolas públicas estão amparados em se tratando de deficiência de
aprendizagem, em especial, a dislexia.
Posteriormente, houve um contato telefônico com a Diretora de Educação Especial
da Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEDF), para receber informações sobre o
funcionamento dos Centros de Apoio Pedagógico do Distrito Federal e do Compp para
delineamento da pesquisa. Além dos três orientadores educacionais das escolas
selecionadas, foram entrevistados, individualmente, três psicopedagogos, um
fonoaudiólogo, dois neurologistas e duas mães cujos filhos são atendidos pelos serviços
especializados, cujos depoimentos foram colhidos mediante entrevistas semi-estruturadas.
Um total de dez docentes do ensino médio participou da pesquisa. Seis entre os sete
que trabalham na escola do Plano Piloto responderam ao questionário de pesquisa e quatro
entre dez de Taguatinga. Percebeu-se maior dificuldade para contatar os professores da
segunda instituição, especialmente por não estarem na escola em horários pré-estabelecidos
pela escola.

1.3.2 Instrumentos de coleta de dados e as informações levantadas

A pesquisa foi realizada por meio de questionários para os respectivos professores de


Português e entrevistas individuais aos demais profissionais da educação e saúde como
orientadores pedagógicos, psicopedagogos, fonoaudiólogos e neurologistas. Isso porque
aqueles são os que lidam diretamente com o problema dos disléxicos: ortografia e/ou leitura;
e esses para que se possa perceber como é realizado o diagnóstico dos discentes com
dislexia, além de, paralelamente ao docente, trabalhar para a superação do problema.
Primeiramente, foram realizadas as entrevistas individuais com os orientadores
educacionais das escolas, visando obter as seguintes informações: como são realizados o
encaminhamento dos alunos, o diagnóstico e o acompanhamento desses durante o
tratamento. Depois, foram aplicados questionários aos professores a fim de se verificar
como conduzem as práticas pedagógicas aos alunos portadores de dislexia e qual é seu
conhecimento em torno desse assunto.
Em seguida, a coleta de dados foi efetuada com a utilização de questionários
direcionados aos professores. Uma das características do questionário é que ele tende a ser
24

menos dispendioso que a entrevista, além de que os informantes podem se sentir mais
seguros em função de seu caráter anônimo desse instrumento. Dessa forma, sentem-se mais
à vontade para expressar pontos de vista que temam colocá-los em situação problemática ou
que julguem não ter aprovação.
No caso das entrevistas, como o entrevistador e a pessoa entrevistada estão presentes
no momento em que as perguntas são apresentadas e respondidas, existe oportunidade para
maior flexibilidade e obtenção de dados de alta qualidade, além da oportunidade de observar
comportamentos não-verbais e das informações sobre o contexto social do entrevistado
(ALLI, 1972, p.267).
As entrevistas permitem explorar questões que talvez sejam muito complexas para
serem trabalhadas por meios quantitativos. Desse modo, o método da entrevista permite que
o pesquisador tenha uma percepção mais detalhada do sujeito entrevistado, porque o
entrevistador valoriza as diferenças naturais que existem entre as pessoas, suas experiências
de vida e a realidade em que estão inseridas.
A análise de conteúdo das entrevistas foi feita segundo orientação de Bardin (1998),
para quem a pesquisa qualitativa consiste num processo de organização sistematizada dos
materiais acumulados. Conforme o autor, essa organização tem como objetivo auxiliar a
compreensão e interpretação dos dados.
25

CAPÍTULO II. EXPOSIÇÃO DO REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Por uma escola democrática

A educação inclusiva é uma questão de direitos humanos e implica uma definição de


políticas públicas, traduzidas nas ações institucionais planejadas, implementadas e
avaliadas. Nesse sentido, a implantação de propostas com vistas à construção desse tipo de
educação no Brasil requer mudanças nos processos de gestão, na formação de professores,
nas metodologias educacionais, com ações compartilhadas e práticas colaborativas que
respondam às necessidades de todos os alunos.

O movimento pela inclusão se constitui numa postura ativa de identificação das


barreiras que alguns grupos encontram no acesso à educação e também na busca dos
recursos necessários para ultrapassá-las. Consolida-se, assim, um novo paradigma
educacional de construção de uma escola aberta às diferenças ao promover a necessária
transformação da escola e das alternativas pedagógicas, com vistas ao desenvolvimento de
uma educação para todos nas escolas regulares.

Nesse caso, a cidadania pode libertar a humanidade, pois dá aos indivíduos a


consciência de serem senhores de si mesmos (TOURAINE, 2007). Da mesma forma, para
Ferreira (2004), a cidadania, compreendida como soberania, implica autoconsciência que ela
considera que ainda seja limitada. Segundo essa autora, poucos são os que dispõem de
condições para se informarem para compreenderem as inúmeras informações que recebem,
e de se posicionarem diante dos acontecimentos mundiais. Dessa forma,

Somente quando se criam as condições mais plenas para a elaboração da


autoconsciência, no sentido de consciência para si, então, a cidadania realiza-se
propriamente como soberania. Isso significa criar condições plenas para todos os
seres humanos no planeta, num processo de autoconsciência que só se dará pelo
conhecimento, pelas condições dignas de vida e pela participação na vida
societária mundial, o que vai exigir uma outra qualidade e quantidade de
conhecimento a ser adquirido. (FERREIRA, 2004, p. 1239).
26

A Constituição Federal Brasileira garante, ainda no preâmbulo, a instituição de um


Estado democrático. Desse modo, ela assegura o exercício dos direitos sociais e individuais,
a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como
valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. No que se refere
aos dois últimos itens, percebe-se que o processo de inclusão deve ser uma constante nas
políticas públicas, no Brasil.

Além disso, o artigo 1º afirma que o Estado democrático de direitos tem como
fundamentos: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do
trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. Visto que todo poder emana do povo e
que, por meio de representantes eleitos ou diretamente, pode provocar mudança na política,
ele pode construir uma sociedade livre, justa e solidária, o que constitui um dos objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil. Isso é ratificado pelo Artigo 205
(BRASIL, 2000, p. 118) em que se afirma:

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e


incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho.

Dessa forma, tornar-se-ia possível promover o bem de todos, sem preconceitos de


origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Logo, a falta de
políticas públicas para amparar o disléxico no espaço escolar, impede-o de desenvolver suas
habilidades, por conseguinte, pode retardar o pleno desenvolvimento nacional. Por outro
lado, a conquista do Estado Democrático de Direito delineou para as universidades a co-
responsabilidade com a construção de uma cultura de promoção, proteção e defesa dos
direitos humanos, por meio de ações multi e interdisciplinares. Cabe, pois, a essas
instituições de ensino promover o desenvolvimento da justiça social, da democracia, da
cidadania e da paz.

O MEC mantém relacionamento profícuo com diversos organismos internacionais


como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO),
a Organização dos Estados Americanos (OEA), a Organização dos Estados Ibero-
americanos para a Educação, Cidadania e a Cultura (OEI), sobretudo por meio de
participação em programas e projetos na área de desenvolvimento e melhoria dos sistemas
educacionais dos países. Também estão trabalhando para promover educação de qualidade
27

como um direito fundamental para todos. Em se tratando de educação inclusiva, levou a


uma abordagem de desenvolvimento das necessidades de aprendizagem para todas as
crianças, jovens e adultos, especialmente aqueles que são vulneráveis à marginalização e
exclusão. O princípio da educação inclusiva foi adotado na Conferência Mundial sobre as
Necessidades Educativas, e apoiada pelas Regras Básicas das Nações Unidas em Igualdade
de Oportunidades para Pessoas Portadoras de Deficiências. Dessa forma, deve haver
promoção dos valores universalmente compartilhados e a diversidade culturalmente sensível
dos contextos e métodos educacionais.
2
A Unesco (1994) se compromete em apoiar os Estados Membros que desejam
fomentar a diversidade lingüística e o respeito pela Língua Materna em todos os níveis
educacionais. Além disso, essa organização deseja promover, por meio da educação, a
conscientização do valor positivo da diversidade cultural, e fazer total uso de métodos
culturalmente apropriados de comunicação e transmissão de conhecimento.
Na proposta de Educação para Todos, apresentam-se seis objetivos aprovados
durante a Conferência de Dacar de 2000 a serem alcançados até 2015. Dentre eles,
propõem-se melhorar todos os aspectos da qualidade da educação e assegurar a excelência
de todos, de forma que resultados de aprendizagem reconhecidos e mensuráveis sejam
alcançados por todos, especialmente em alfabetização e matemática e na capacitação
essencial para a vida (UNESCO, 1994).

A pós-modernidade educativa pressupõe novos modos de conhecer e de participar do


conhecimento, trazendo um paradigma de referência que é a “Sociedade Educativa”. Na
história dos sistemas educativos, o educar para a plena cidadania é indissociável da
formação da personalidade equilibrada e madura. Nesse caso, aprende-se a viver a
cidadania, celebrando a diversidade e apreciando a democracia, na qualidade de membros
ativos de comunidades, cidadãos titulares de direitos e deveres inalienáveis. Com isso, é
preciso aprender a condição humana, na sua infinita dignidade e riqueza, mas também na
sua misteriosa contingência e vulnerabilidade como quando se trata da educação de alunos
com dislexia, que precisam de educação especial.

Nos últimos anos, percebe-se que há determinantes externos e internos do fracasso


escolar. Além disso, evidencia-se a função decisiva que a educação escolar desempenha na
formação da cidadania. Saviani D. (1986, pp.73-76) afirma que “ser cidadão significa ser

2
Disponível em: < http://unesdec.unesco.org/images/0013/001093/139394.por.pdf>. Acesso em 14 abr 2007.
28

sujeito de direito e deveres. Trata-se daquele que está capacitado a participar da vida da
cidade literalmente e extensivamente, da vida da sociedade”.

Saviani D. (1986) complementa ainda que a escola instrumentaliza o sujeito para o


exercício consciente (direitos e deveres da cidadania), à proporção que ela deve
democratizar, com qualidade e quantidade, os conhecimentos acumulados historicamente
pela humanidade. Logo, isso requer, conforme Mello (1982), educação escolar num
contexto de autonomia relativa e específica. Assim, exige-se uma atuação de forma
competente e transformadora dos professores junto aos discentes. Estes devem, ao final da
educação escolar, apresentar diferenças significativas na forma de perceber o mundo
(SAVIANI D., 1986).

Mello aponta que, para uma nova escola mais democrática, são necessários educadores
mais competentes para que cumpram melhor sua função. Contudo, isso só se tornará
possível se houver condições mínimas de trabalho e possibilidades de ampliação e de
atualização do conhecimento. É também importante o resgate da competência técnica do
docente na construção da Escola Pública Brasileira. Competência profissional exige o
domínio adequado do saber escolar a ser transmitido, juntamente com a habilidade de
organizar e transmitir esse saber de modo a garantir que ele seja efetivamente apropriado
pelo aluno. É também uma compreensão das relações entre o preparo técnico que o docente
recebera, a organização da escola e os resultados de sua ação.

O princípio da igualdade individual, que determina um dos princípios da democracia,


não se baseia na igualdade psicológica dos indivíduos, mas sim na igualdade política. O
Estado deve, assim, proporcionar oportunidades iguais de desenvolvimento e de
participação social (TEIXEIRA, 1996).

Teixeira (1996) aborda a hipótese político-social que, segundo ele, ocorrerá a partir da
participação do indivíduo na elaboração dos valores da sociedade a que pertence. Para que
isso seja possível, são necessárias, portanto, condições apropriadas à sociedade, oferecendo-
lhe acesso aos meios de desenvolver suas capacidades para possibilitar maior participação
possível nos atos e nas instituições em que transcorra sua vida. Para o estudioso, a
participação é essencial à dignidade do ser humano e para que a hipótese político social seja
possível.

Segundo Gadotti (1990), a sociedade vem exigindo a real democratização da escola.


Desse modo, pressiona o Estado para que assuma, de fato, sua responsabilidade de
29

proporcionar educação de boa qualidade a todos os estratos da população. O autor


complementa que uma transformação necessária da educação nacional precisa, antes de
mais nada, das forças que até agora lutaram por uma educação para todos, democrática e de
boa qualidade.

A regeneração democrática supõe a regeneração do civismo, a qual supõe a


regeneração da solidariedade e da responsabilidade, ou seja, o desenvolvimento da antropo-
ética, que instrui-nos a assumir a missão antropológica do milênio como trabalhar para
humanização da humanidade, efetuar a dupla pilotagem do planeta, alcançar a unidade
planetária na diversidade, desenvolver a ética da solidariedade. A democracia favorece,
portanto, a relação rica e complexa indivíduo/sociedade. Nesse caso, ambos podem ajudar-
se, desenvolver-se, regular-se e controlar-se mutuamente. Compreende, dessa forma, a
esperança na completude da humanidade, como consciência e cidadania planetária ao
respeitar no outro, ao mesmo tempo, a diferença e a identidade quanto a si mesmo (MORIN,
2006).

2.2 Portadores de necessidades especiais

Deficiência corresponde à insuficiência, falta; imperfeição, defeito. Pode ser


encontrada, por sua vez, em pessoa que tem diminuídas suas faculdades físicas ou
intelectuais. Dessa forma, significa uma restrição física, mental ou sensorial, de natureza
permanente ou transitória e que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades
essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social. A
respeito desse conceito, destaca-se o caso da deficiência mental.
Até o início do século XIX, todos os tipos de deficientes (mentais e outros
deficientes) e doentes mentais eram entendidos e tratados da mesma forma. A diferenciação
entre diversos casos começa a surgir com os primeiros avanços da medicina e da pedagogia.
Até que isso ocorresse, houve diversas maneiras sociais de se definir e tratar o deficiente no
decorrer da história.
Conforme Junior e Spovieri (2000), podemos dividir a história da Deficiência
Mental em quatro fases:
30

1. Idade Antiga
É o momento em que as sociedades eram mais primitivas, logo a visão do deficiente
mental relaciona-se cada vez mais com a sua própria subsistência. Nessa ocasião, havia
necessidade de vigor físico em uma sociedade guerreira como a espartana e isso justificaria
o sacrifício daqueles que nasciam privados de suas plenas faculdades físicas. Platão se
refere a eles em “República”

Quanto aos corpos de constituição doentia, não lhes prolongava a vida e os


sofrimentos com tratamentos e purgações regradas, que os poriam em condições
de se reproduzirem em outros seres fadados, certamente a serem iguais aos
progenitores. Acreditava também que não deveria curar os que, por frágeis de
compleição não podem chegar ao limite natural da vida, porque isso nem lhes é
vantajoso a eles nem ao Estado. (PLATÃO apud JUNIOR; SPOVIERI, p. 2).

2. Idade Média
Pode ser caracterizada pela obra “Malleus Malleficarum”, publicada em 1482 por
dois dominicanos que diagnosticavam bruxas e feiticeiros. Isso levou milhares de
deficientes mentais às fogueiras da Inquisição, por terem sinais de malformação, física ou
mental. Tais características eram consideradas sinais de ligação com o demônio.
Nessa fase, o Cristianismo, passou-se a ver o deficiente mental como “Lês Enfants
du Bom Dieu”, ou seja, pela boca dos quais Deus falava, uma vez que representavam
inocência e pureza. Assim, nessa época, surgiram as primeiras leis de proteção ligadas às
questões institucionais.
Em 1325, surge a necessidade de que o Estado passe a gerenciar os bens dos
deficientes. Construiu-se, portanto, a idéia da Instituição que, sob a forma hospitalar, teve
suas origens no século XVI. Sem caráter lucrativo, na verdade, tinha por objetivo a exclusão
social, sem qualquer forma de assistência médica.
Krynski (1969 apud JUNIOR; SPOVIERI, 2000) diz que, por volta do século XIV,
surge uma lei que dá somente à região de Champagne a possibilidade de fornecer os
“bobos” para a corte real. Ironicamente, esse fato possibilitou, de certo modo, o processo de
aceitação da pessoa com deficiência mental na sociedade.

3. Renascença e Idade Moderna


Inicia-se uma visão médica em relação ao deficiente mental. Por conseguinte, essa
situação desvincula-se da magia e da religião para se inserir, paulatinamente, na Ciência,
passando a privilegiar a questão etiológica.
31

Então, começa a procura da localização das causas da deficiência mental,


relacionando-as com estruturas cerebrais. Desse modo, representa tanto a visualização da
relação causal existente entre estruturas cerebrais e a deficiência intelectual quanto a
possibilidade de não ver o deficiente mental como pessoa, mas sim como organismo,
propiciando mais seus mecanismos de exclusão social.
Em 1700, o enciclopedista e filósofo, John Locke, propõe a teoria da “tabula rasa”,
na qual afirma que o conceito mente é compreendido como uma página em branco, passível
de ser preenchida a partir dos programas sistemáticos de educação. Essa teoria influencia,
posteriormente, o mais importante estudioso da deficiência mental daquele período, Jean
Itard, considerado o “pai” dos estudos sobre a deficiência mental, que aos 24 anos, já era
médico-chefe do Instituto Imperial dos Surdos-Mudos.
Itard iniciou um projeto com o menino selvagem, Victor de Aveyron, capturado pouco
antes nas florestas ao redor da cidade e que havia recebido o diagnóstico realizado por
Philippe Pinel, de “imbecilidade”. Com o decorrer do tempo e com as tentativas de
reeducação, o menino apresentou uma série de progressos, o que justificaria a abordagem do
médico a partir de uma visão pedagógica. Portanto, essa nova visão traz à tona a questão
diagnóstica, já que considera, para a avaliação do retardo mental, toda a história do
desenvolvimento.
Nesse período, vários médicos contribuíram com as pesquisas em relação à
deficiência mental. Emmanuel Fodéré relaciona a deficiência mental com o bócio endêmico
e o hipotiroidismo; Pinel com o estudo das alterações neuropatológicas; Jean-Étienne
Dominique, que diferencia-a da loucura e das demências, sendo devida a carências infantis
ou condições pré ou perinatais. Além desses tem-se, também, Séguin, estudioso da
deficiência mental e aos distúrbios a ela relacionados, vincunlando-a, principalmente à
falência da vontade e Morell com a teoria das degenerescências e a descrição da Síndrome
de Down, no século XIX.

4. Século XX
A problemática passa a ser muito mais operacional e a questão custo-benefício passa
a ser vista de modo mais pragmático. Os Estados modernos passam a querer investir seu
dinheiro em indivíduos capazes de produzir.
Houve, nesse sentido, a contribuição do pedagogo e psicólogo francês Alfred Binet,
com seus conceitos de Idade Mental na revisão do termo de Quociente Intelectual, avaliando
o desempenho médio da criança e os possíveis graus de afastamento dessa média.
32

O estudo da deficiência mental e das deficiências sensoriais físicas, a partir do


advento do quociente de inteligência (QI), insere-se cada vez mais na área de psicologia,
dando a idéia de que o sujeito é anterior à cultura. Ou seja, “a mente humana pré-existe ao
nascimento, o ambiente apenas a expande. [...] O locus da deficiência é a própria pessoa que
a detém ou em que ela se imprimiu.” (BARTHOLO; TUNES, 2006, p. 139).
Com o desenvolvimento da neurofisiologia, começa a se estabelecer a distinção
entre as diversas formas de anomalias, estabelecendo-se o conceito de fatalismo orgânico.
Inaugura-se, assim, a visão naturalista. Nesse caso, segundo Bartholo e Tunes (2006), a
deficiência instaura-se no corpo de quem a possui como algo que lhe é naturalmente
próprio, logo é postulada a origem biológica da deficiência.
Entretanto, para mudar estas visões, surge a corrente determinista, que divisa a
marca da deficiência mental no plano social. Agora, o que determina a deficiência mental
são o ambiente social, a história do indivíduo e da sociedade. Assim, esse tipo de deficiência
ocorre após a concepção do ser, no decorrer de sua vida e, conforme Bartholo e Tunes
(2006), são buscadas as possibilidades que favorecem o desenvolvimento do indivíduo, em
vez de traços que caracterizam a irreversibilidade do mal que o acomete.
Observa-se, então, que deficiência é uma percepção que surge na comunidade.
Nessa concepção social, ela apresenta características biológicas que se contrapõem ao
desempenho de atividades socialmente valorizadas. Por isso, o tratamento dispensado a
essas pessoas deve considerar o contexto em que elas se inserem, a fim de analisar como o
deficiente é percebido pela sociedade.
A Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes (BRASIL, 1975), em
Resolução aprovada pela Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas, em
09/12/75, proclamou a necessidade de proteger os direitos e assegurar o bem-estar e a
reabilitação daqueles que estão em desvantagem física ou mental. Tem-se em vista a
necessidade de prevenir deficiências físicas e mentais e de prestar assistência às pessoas
deficientes, para que elas possam desenvolver suas habilidades nos mais variados campos de
atividades.
Essa Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes apela à ação nacional e
internacional para assegurar que seja utilizada como base comum de referência para a
proteção aos direitos, especialmente:

• As pessoas deficientes têm direito a tratamento médico, psicológico e funcional,


incluindo-se aí aparelhos protéticos e ortóticos, à reabilitação médica e social, educação,
33

treinamento vocacional e reabilitação, assistência, aconselhamento, serviços de


colocação e outros serviços que lhes possibilitem o máximo desenvolvimento de suas
capacidades e habilidades e que acelerem o processo de sua integração social.
• As pessoas deficientes deverão poder valer-se de assistência legal qualificada quando
tal assistência for indispensável para a proteção de suas pessoas e propriedades.

A Declaração de Salamanca, anteriormente citada, culminou no documento das


Nações Unidas "Regras Padrões sobre Equalização de Oportunidades para Pessoas com
Deficiências". Esse documento estabelece normas a fim de que Estados assegurem que a
educação de pessoas com deficiências seja parte integrante do sistema educacional. Assim,
proclamou-se que:

• toda criança tem direito fundamental à educação, e lhe deve ser dada a oportunidade de
atingir e manter o nível adequado de aprendizagem;
• toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de
aprendizagem que são únicas;
• os sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam
ser implementados no sentido de se levar em conta a vasta diversidade de tais
características e necessidades;
• aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que
deveria acomodá-los dentro de uma pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer
tais necessidades.
Enfatiza-se o treinamento especializado do docente em educação especial que leve
às qualificações profissionais necessárias. Além disso, políticas de educação deveriam ser
integradas aos cursos de graduação como uma forma regular da formação de professores.
Nesse caso, é recomendado trabalhar prioritariamente nas seguintes áreas:

a) prevenção de todas as formas de deficiência preveníveis;


b) detecção e intervenção precoce, tratamento, reabilitação, educação, formação
ocupacional e prestação de serviços completos para garantir o melhor nível de
independência e qualidade de vida para as pessoas portadoras de deficiência; e
c) sensibilização da população, por meio de campanhas de educação, destinadas a
eliminar preconceitos, estereótipos e outras atitudes que atentam contra o direito das
34

pessoas a serem iguais, permitindo, dessa forma, o respeito e a convivência com as


pessoas portadoras de deficiência.

2.3 A legislação sobre a educação dos portadores de necessidades especiais

No Brasil, a Constituição de 1824 previa, pela primeira vez, legislação voltada à


educação primária e gratuita para todos. Conforme Mazzota (2001), o País legitimou
políticas públicas que ratificam o direito à educação para todos, ainda no segundo Império.
Nessa época, o atendimento educacional especial era oferecido nas residências (Escolas
Residenciais). Isso incentivou grupos de familiares de pessoas com necessidades especiais a
criar instituições particulares e a pleitearem recursos oficiais. Visavam, dessa forma, a
melhoria da escolarização básica de seus filhos.
De 1854 a 1956 houve iniciativas oficiais e particulares isoladas, o País
já podia contar também com a primeira escola para a educação de cegos, o
Imperial Instituto para Meninos Cegos, no Rio de Janeiro, passando a se chamar
Instituto Nacional dos Cegos a partir de 1890; trajetória seguida, a partir de
1891, pelo atual Instituto Benjamin Constant (IBC). Além da primeira escola,
inaugurada em 1857, na mesma cidade, para meninos surdos, o Imperial Instituto de Surdos
Mudos, hoje, Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), ambas mantidas pelo
governo federal e atuantes até hoje. A instalação do IBC e do INES possibilitou a discussão
da educação dos portadores de deficiência, no primeiro Congresso de Instrução Pública em
1883, convocado pelo Imperador em dezembro de 1882 (MAZZOTA, 2001).
No entanto, somente, em 1934, foi incorporada na Constituição Federal Brasileira a
atenção às pessoas com necessidades especiais. Além de que, só cerca de 20 anos depois, no
final dos anos 50 e início dos 60, do século XX, houve as primeiras manifestações de
intenção de se estabelecerem políticas voltadas para alunos com deficiência mental, quando
o governo anunciou, em cadeia nacional, o atendimento especial a esses. Assim, houve a
inclusão da “educação de deficientes” da “educação dos excepcionais” ou da “educação
especial” na política educacional (MAZZOTA, 2001).
Somente no final de 1950 a Educação Especial foi incluída na política educacional
brasileira embora, no período imperial, já houvessem sido implantados alguns serviços de
atendimento a portadores de necessidades especiais. Com isso, segundo Mazzota (2001)
oportunizou-se a aprendizagem, garantindo a preocupação com as características
35

individuais, interesses, habilidades e necessidades desse discente. Até o final daquela


década, havia 40 estabelecimentos de ensino regular mantidos pelo poder público, sendo um
federal e os outros estaduais que prestavam algum tipo de atendimento escolar específico a
deficientes mentais, além de 14 outras instituições escolares públicas e particulares para
atendimento a alunos com outros tipos de deficiências.
A LDB define e regulariza o sistema de educação brasileiro com base nos princípios
presentes na Constituição. Foi citada pela primeira vez na Constituição de 1834, porém
criada apenas em 1961, seguida por uma versão em 1971, que vigorou até a promulgação da
versão mais recente em 1996. A primeira LDB, em um de seus dois artigos sobre educação
especial, abordava os benefícios governamentais em prol dos deficientes ao afirmar, no
artigo 89, que toda iniciativa privada considerada eficiente pelos conselhos estaduais de
educação, e relativa à educação de excepcionais, receberá dos poderes públicos tratamento
especial mediante bolsas de estudo, empréstimos e subvenções.
Mas, para Mazzota (2001), a educação especial passou a ter consistência só a partir
do primeiro Plano Setorial de Educação e Cultura, de 1972. A Lei nº 4.024/61, que dedica
um capítulo à Educação de Excepcionais e a Lei nº 5.692/71, que coloca a questão como um
caso do ensino regular e cita sobre diversos aspectos da educação especial destaca um grupo
de trabalho – Grupo Tarefa de Educação Especial, constituído por Portaria de 25 de maio de
1972 – que deveria reunir esses e outros elementos para delinear a política e as linhas de
ação do Governo na área da Educação de Excepcionais. Em novembro desse mesmo ano, o
especialista James Gallagher apresentou ao Grupo o Relatório de Planejamento com
propostas para estruturação da educação especial no Ministério da Educação e Cultura do
Brasil. Os resultados desse relatório contribuíram para a criação, em 1973, de um órgão
central responsável pelo atendimento aos excepcionais no Brasil, o Centro Nacional de
Educação Especial (Cenesp).
Aparece, então, pela primeira vez, na Lei de Diretrizes e Bases, nº 4.024/71 e na Lei
nº 5.692/71, que a educação dos excepcionais3 deveria, no que for possível, enquadrar-se no
sistema geral de educação. Com o terceiro Plano Setorial de Educação e Cultura, na mesma
década, foi incentivada, também, a profissionalização do portador de deficiência. Em 1986,
com a extinção do Cenesp, foi criada, no âmbito do MEC, a Secretaria de Educação
Especial (Sespe), para definição das linhas gerais da política nacional de educação especial.
Em 1990, o Ministério da Educação foi reestruturado, extinguindo-se a Sespe. Logo,
suas atribuições relativas à educação especial passaram a ser da Secretaria Nacional de
3
Maneira como eram denominados os portadores de necessidades especiais naquela época.
36

Educação Básica (Seneb). Nesse mesmo ano, o Departamento de Educação Supletiva e


Especial (Dese) foi incluso como órgão da Seneb. Desse modo, propunha no artigo 7º que à
secretaria Nacional de Educação Básica competia

Propor ao Ministério de Estado a política e as diretrizes para o desenvolvimento


da educação básica e da educação especial, além de prestar cooperação técnica e
apoio financeiro e sugerir a política de formação e valorização do magistério para
educação especial. (MAZZOTTA, 2001, p.59-60).

Com a reorganização dos Ministérios e na nova estrutura após a queda do Presidente


Fernando Collor de Mello, no final de 1992, reapareceu a Secretaria de Educação Especial
(Seesp), como órgão específico do Ministério da Educação e do Desporto.
Nas décadas de 1980 e 1990, do século passado, a educação especial foi muito
discutida mundialmente4. No Brasil, a LDB, nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, repetindo
o que consta na Constituição Federal de 1988, estabeleceu, quanto aos princípios e fins da
educação nacional, no artigo 3º, que o ensino será ministrado com base em:

• igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;


• garantia de padrão de qualidade;
• pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas.

A partir do princípio da igualdade proposto acima, depreende-se, também, o


respeito às diferenças entre os desiguais, o que é fundamentado no Artigo 5º da Constituição
Federal Brasileira5 de 1988. Porém, da legislação infraconstitucional, apenas uma, do
município de São Paulo, de janeiro de 2007, aborda esse direito, estendendo-o aos alunos
portadores de dislexia (BRASIL, 2000).

4
Devido às discussões a respeito do tema em questão surgiram o Programa de Ação Mundial para as Pessoas
Portadoras de Deficiência, aprovado pela Assembléia Geral das Nações Unidas (Resolução 37/52, de 3 de
dezembro de 1982); o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, "Protocolo de San Salvador" (1988); os Princípios para a Proteção
dos Doentes Mentais e para a Melhoria do Atendimento de Saúde Mental (AG.46/119, de 17 de dezembro de
1991); a Declaração de Caracas da Organização Pan-Americana da Saúde; a Resolução sobre a situação das
pessoas portadoras de deficiência no Continente Americano [AG/RES.1249 (XXIII-O/93)]; as Normas
Uniformes sobre Igualdade de Oportunidades para as Pessoas Portadoras de Deficiência (AG.48/96, de 20 de
dezembro de 1993); a Declaração de Manágua, de 20 de dezembro de 1993; a Declaração de Viena e Programa
de Ação aprovados pela Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, das Nações Unidas (157/93); a
resolução sobre a situação das pessoas portadoras de deficiência no Hemisfério Americano [AG/RES. 1356
(XXV-O/95)] e outros.
5
TÍTULO II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais – Capítulo I – Dos Direitos e Deveres Individuais e
Coletivos. Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, [...] (2000, p.15).
37

Percebe-se que, para garantir o direito de igualdade ao portador de deficiência,


consta no Artigo 206, inciso III da Constituição Federal Brasileira, que o ensino será
ministrado com base no pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas e coexistência de
instituições públicas e privadas de ensino. E, além disso, garante o padrão de qualidade, no
inciso VII.
Ainda, o Artigo 208 garante, no inciso III, que o dever do Estado com a educação
será efetivado mediante a garantia de atendimento educacional especializado aos portadores
de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. Aqui, subentende-se, por
conseguinte, que o portador de dislexia tem direito a práticas pedagógicas diferenciadas,
além da garantia de padrão de qualidade.
Isso requer, então, a preparação do professor no decorrer de sua vida acadêmica e
profissional para lidar com esse problema. É garantido, além disso, o atendimento ao
educando, no ensino fundamental, por meio de programas suplementares de material
didático-escolar e assistência à saúde.
A legislação brasileira, no que se refere ao dever de educar, prevê que os
estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino,
têm a incumbência de, entre outras coisas, elaborar e executar sua proposta pedagógica e
prover meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento. Dessa forma, deve-se
articular com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com
a escola. Depreende-se que prover meios para a recuperação dos alunos de menor
rendimento vai além. Insere-se nessa proposta, também, o encaminhamento do aluno à
orientação pedagógica para que se identifique o real problema do educando por meio dos
diagnósticos, a fim de que sejam tomadas as devidas providências pelo professor.
No ensino médio, que é uma etapa para a consolidação e o aprofundamento dos
conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de
estudos, os alunos ficam mais desamparados pelos pais e até mesmo pela instituição escolar.
Assim, a proposta de preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, de modo
a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou
aperfeiçoamento posteriores, pode não ser viável para o aluno disléxico. É necessário que,
de fato, haja o aprimoramento do estudante como pessoa humana, incluindo a formação
ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico.
O currículo do ensino médio tem, na Língua Portuguesa, o instrumento de
comunicação, acesso ao conhecimento e exercício da cidadania. Conforme previsto nos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), os conteúdos, as metodologias e as formas de
38

avaliação serão, portanto, organizados de forma que, ao final do ensino médio, o educando
demonstre conhecimento das formas contemporâneas de linguagem. Dessa forma, o aluno
disléxico que, na maioria das vezes, apresenta mais dificuldades na aprendizagem da leitura
e da escrita, precisa receber estímulos da escola, que deve adotar metodologias de ensino e
de avaliação que estimulem a iniciativa dos estudantes (BRASIL, 2000).
A Resolução n° 2, de 19 de 11 de setembro de 2001, institui diretrizes nacionais para
a educação especial na educação básica. Entende-se por educação especial, para os efeitos
da legislação sobre educação dos portadores de necessidades especiais, a modalidade de
educação escolar para educandos portadores de necessidades especiais. As condutas típicas
se encaixam nesse quadro por serem manifestações de comportamento típicas de portadores
de síndromes (exceto Síndrome de Down) e quadros psicológicos, neurológicos ou
psiquiátricos. Esses distúrbios ocasionam atrasos no desenvolvimento e prejuízos no
relacionamento social em grau que requer atendimento educacional especializado. Segundo
o artigo 3° daquela Resolução:

Por educação especial, modalidade da educação escolar, entende-se um processo


da educação definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e
serviços educacionais especiais organizados institucionalmente para apoiar,
complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços
educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o
desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam
necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da
educação básica. (BRASIL, 2001, p.1).

Embora aquela Resolução preveja atendimento educacional especializado com


apoio pedagógico especializado aos estudantes especiais, realizado preferencialmente na
rede regular de ensino, nem sempre há, quando necessário, esse tipo de assistência e
equipamentos adequados, na escola pública, para atender às peculiaridades da clientela de
educação especial, principalmente, em se tratando da dislexia, em escolas de ensino médio.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8069, de 13 de julho de
1990, ao que se refere às Disposições Preliminares, dispõe sobre a proteção integral à
criança e ao adolescente. Considera-se criança, para os efeitos desta lei, a pessoa até doze
anos de idade incompletos e, adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. De
acordo com ela, cabe ao Poder Público e seus órgãos assegurar às pessoas portadoras de
deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive, da educação. Nessa área,
exigem-se ainda que abranja (BRASIL, 1990):
39

• educação precoce, a pré-escolar, as de ensinos fundamental e médio, a supletiva, a


habilitação e reabilitação profissionais, com currículos, etapas e exigências de
inclusão, no sistema educacional, da Educação Especial como modalidade educativa;
• oferecimento obrigatório de programas de Educação Especial em nível pré-escolar e
escolar, em unidades hospitalares e congêneres nas quais estejam internados, por
prazo igual ou superior a um ano, educandos portadores de deficiência;
• acesso de alunos portadores de deficiência aos benefícios conferidos aos demais
educandos, inclusive material escolar, merenda escolar e bolsa de estudo.

2.3 Uma visão de Vygotsky sobre as relações sociais e o domínio da linguagem

Tomou-se como ponto de partida para a investigação o estudo crítico da teoria do


pensamento e da linguagem, o que implica num embate com diversas concepções, algumas
opostas. Os estudos realizados por Vygotsky (2001) o levaram a considerar equivocada a
concepção das raízes genéticas do pensamento e da linguagem.

Uma vez que a teoria vygotskyana em relação ao pensamento e à linguagem


começou a ser utilizada como referencial teórico apenas da década 80, do século passado,
há muito o que explorar desse estudo para aplicar em sala de aula. Formado em Letras e em
Psicologia, Vygotsky elegeu a linguagem como objeto de estudo. Reforçou que ela exerce
papel fundamental na mediação entre as relações sociais e a aprendizagem. Seu objeto de
estudo foi o desenvolvimento humano, a partir do processo histórico que o indivíduo
vivenciava.

O autor acrescenta ainda ser essencial que o indivíduo se insira num determinado
ambiente cultural para que ele se constitua como pessoa, pois as mudanças ocorridas
durante seu desenvolvimento, estão ligadas à interação dele com a cultura e a história da
sociedade da qual faz parte. Por isso, o aprendizado envolve a interação com outros
indivíduos e a interferência direta ou indireta deles.
Para Vygotsky (2001), as funções psicológicas superiores, características do ser
humano, estão ancoradas nas características biológicas da espécie humana e são
desenvolvidas ao longo de sua história social. Assim, é o grupo social que fornece os signos
e os instrumentos para o desenvolvimento das atividades psicológicas. Logo, deve-se
40

analisar o reflexo do mundo exterior no mundo interior dos indivíduos, a partir da interação
destes com a realidade.

Segundo o autor, a psicologia moderna ainda não tomou conhecimento do problema


das relações interfuncionais. Para ele, quem funde pensamento e linguagem, fecha para si
mesmo o caminho para abordar a relação entre eles e antecipa a impossibilidade de resolver
a questão da aprendizagem.

Em busca de novos significados para as práticas pedagógicas da leitura e da escrita,


autores especialistas em ensino-aprendizagem abordam a necessidade de se desvincular as
práticas pedagógicas do ensino tradicional, baseado em conteúdos prontos e à base de
assimilação por meio de repetição. A respeito da relação entre pensamento e linguagem,
Vygotsky afirma:

É um equívoco os conceitos apreendidos em forma pronta. O professor que


envereda por esse caminho costuma não conseguir senão uma assimilação vazia
de palavras, um verbalismo. O aluno capta mais de memória que de pensamento e
sente-se impotente diante de qualquer tentativa de emprego consciente do
conhecimento assimilidado. Substitui-se a apreensão de conhecimento vivo pela
apreensão de esquemas verbais mortos e vazios. (MARTINS, 2001, p. 247).

A comunicação, conforme Vygotsky (1991), é importante no processo de


aprendizagem. Comunicar é considerado um fator do desenvolvimento mental, o que
representa um trabalho paralelo do professor na recuperação do aluno com dislexia. Além
disso, interfere no nível de desenvolvimento alcançado – decorrente do modo como o
sujeito organiza os conceitos comunicados ou constrói os conceitos, a partir de informações
recebidas.
Trata-se, portanto, de como os educadores possibilitam a construção dos conceitos
por meio de práticas pedagógicas, que devem ser modificadas no caso do desenvolvimento
dos discentes com dislexia. Para Vygotsky (2001), há relação de independência entre
sentido e palavra, o que envolve conceitos espontâneos (antes da escola) e conceitos
científicos (no decorrer da vida acadêmica).
Vygotsky (1999) faz uma importante advertência sobre a fase de formação dos
conceitos. As rupturas podem ocorrer pela falta de clareza em uma elaboração de idéias por
meio de palavras, devido a não compreensão de um conceito anterior utilizado ou mesmo
dos que se relacionam com os significados de certas palavras que compõem um texto, o que
pode comprometer o aprendizado do conteúdo em pauta. Assim, o autor pede atenção e
41

busca constante do docente para intervir adequadamente nos processos de construção


conceitual.
Enfim, Vygotsky (2001), afirma que o fator educativo é o ambiente social. Acredita,
assim, que só a vida educa. Segundo ele, quanto mais amplamente a vida penetrar na escola,
tanto mais forte e dinâmico será o processo educativo. Com isso, o trabalho educativo do
pedagogo deve estar sempre vinculado a seu trabalho social, criativo e relacionado à vida.

2.5 O que os elaboradores de políticas precisam saber sobre dislexia

2.5.1 Entendendo a dislexia

A dislexia é um distúrbio, que se constitui em um dos mais sérios desafios sociais e


educacionais hoje. Trata-se de uma específica dificuldade de aprendizado da linguagem em
leitura, soletração, escrita, em linguagem expressiva ou receptiva, em razão e cálculos
matemáticos, como na linguagem corporal e social.
O saber semântico ocupa um espaço mental de acordo com os estudos de Lecours e
Parente (1997). Com a condição de não ultrapassar sua capacidade de memória imediata,
alguns disléxicos podem repetir frases sem compreender seu significado. Trata-se de afasia
transcortical sensorial6, que ocorre nas demências orgânicas. Assim, pode-se ler e escrever
palavras sob ditado sem ter acesso à sua significação, ou tendo acesso muito fragmentado.
Os autores complementam essa idéia ao se referirem às vias da Suméria e da
Babilônia, que estão relacionadas à evolução da escrita. A invenção da primeira possibilitou
a linguagem escrita, e remete-se aos pictogramas iniciais que evocaram realidades
concretas, acessíveis aos sentidos, principalmente à visão; desenvolveu-se numa escrita de
logogramas cuneiformes7, cuja característica abstrata e arbitrária liberou a escrita das
restrições sensoriais. A segunda diz respeito a uma importante reforma da escrita.
Implantou-se um novo código não sendo de grafemas que representavam as palavras e os
sentidos de uma língua qualquer como ocorria com a Suméria. Os babilônicos mantiveram
um certo número destes grafemas e passaram a um sistema de escrita no qual cada um dos

6
. É uma deterioração da função da linguagem, devido a uma lesão na região parieto-occipital posterior,
depois de ter sido adquirida de maneira normal e sem déficit intelectual correlativo. Caracteriza-se por
dificuldade em nomear pessoas e objetos.
7
Diz-se especialmente da antiga escrita dos assírios, medas e persas.
42

mantidos representa – um a um – os sons silábicos da língua acadiana (do sistema da


babilônia).
No entanto, a invenção babilônica não impede o funcionamento da via sumeriana.
Aquela traça uma segunda via que autoriza a descoberta do sentido, por um viés prévio da
“conversão” de entidades sublexicais de origem visual em suas contrapartidas de origem
sonora, seguido de um acesso à memória audiofonatória das palavras. Ambos levam,
portanto, à dupla direção dos acessos de emparelhamento com a memória semântica e da
forma atribuída ao acesso de emparelhamento de entrada à leitura semântica sugerida pela
observação clínica. Isso pode levar, por outro lado, a comportamentos paraléxicos8.
O distúrbio faz com que o portador de dislexia suponha um vaivém entre léxico
logográfico de entrada (segunda resposta: uma parafasia formal, supostamente correta,
segundo o disléxico) e saber semântico (primeira resposta: parafasia semântica da parafasia
formal). Pode-se observar que

A análise qualitativa da leitura oral de um disléxico revelará algumas dificuldades


como confusão entre letras, sílabas ou palavras com diferenças sutis de grafia (a-
o, c-o, e-c, f-t, h-n, i-j, m-n, v-u etc) e com grafia similar (b-d, b-p, d-b, d-p, d-q,
n-u, w-m e a-e) ou com ponto de articulação comum ( d-t, j-x, c-g, m-b, m-b-p e
v-f). Além disso, podem ocorrer inversões parciais ou totais de sílabas ou
palavras como me-em, sol-los, som-mos, sal-las e pal-pla e substituição de
palavras por outras de estrutura mais ou menos similar ou criação de palavras,
embora tenham significados distintos tais como soltou/salvou, era/ficava etc.
(CONDEMARIN; BLOMQUIST, 1989, p.22).

Outras características também podem ocorrer, de acordo com as autoras, como


adições ou omissões de sons, sílabas ou palavras, como por exemplo, “famoso” pode ser
substituído por “fama” e “casa” por “casaco”. Além disso, durante a leitura, podem ocorrer
repetições de sílabas, palavras ou frases; pular uma linha, retroceder para a anterior ou
perder a linha ao ler. É comum, portanto, que haja fixações do olho na linha e soletração
defeituosa e produção escrita em espelho (em casos excepcionais), assim como letras
ilegíveis.
Esses sintomas podem gerar problemas de compreensão. As dificuldades do
disléxico, no reconhecimento das palavras, obrigam-no a realizar uma leitura hiperanalítica
e decifratória. Por causa desse esforço em decifrar o material, a velocidade e a compreensão
necessárias para a leitura diminuem significativamente.

8
Como por exemplo: para a palavra “equívoco”; o disléxico leria anteriormente pedestre e, depois,
“equitação”; em outro caso, para a “sofá”, ele leria “poltrona” e só em seguida perceberia “sofá” (LECOURS;
PARENTE, 1997, p. 22).
43

Quanto ao léxico, a dislexia de evolução (ou específica) impede, muitas vezes, a


leitura e a escrita das não-palavras, mas não a das palavras conhecidas, que são termos
concretos na mente da pessoa. Para os autores, possivelmente, há mudança das atitudes
cerebrais de pessoa para pessoa e a possibilidade de os códigos escritos não terem sempre as
mesmas exigências para com o funcionamento cerebral.
Dessa forma, algumas pessoas não acessam a significação das palavras escritas, cuja
informação que transita pelo lóbulo temporal esquerdo não se efetiva, por meio de
interações diretas entre as estruturas occipitais e parietais, deste lado, como no caso da
maioria das pessoas. A dislexia de evolução, geralmente, é acompanhada de transtornos de
aprendizagem na escrita, ortografia, gramática e redação.
Esse distúrbio representa um conjunto de sintomas reveladores de algumas
disfunções da estrutura parietal9 ou parietal occipital10, geralmente hereditárias, ou às vezes,
adquiridas. Isso afeta a aprendizagem da leitura num contínuo que pode se estender do grau
leve ao severo. (CONDEMARIN; BLOMQUIST, 1989, p. 21)
Nem sempre o impedimento de aprendizagem está relacionado à dislexia específica.
Ela se diferencia das demais causas de dificuldades na leitura, levando-se em conta que a
dificuldade para ler persiste até a idade adulta, os erros na leitura e na escrita são de
natureza peculiar e específica, existe uma incidência familiar de tipo hereditário da
síndrome e a dificuldade se associa, também, à interpretação de outros símbolos.
A participação do lóbulo temporal esquerdo no comando da leitura pode variar de
um indivíduo a outro. Contudo, o nível de escolarização de cada um e seus hábitos pessoais
de leitura e de escrita devem ser considerados diante dessa variação. Segundo Lecours e
Parente (1997), a leitura pode ser mais ou menos rápida, pois existem cérebros que só
praticam a leitura alfabética pela mediação de origem fonológica; e para outros, é necessário
somente a visão das letras e de sua organização.
A dislexia de evolução demonstra uma inaptidão na transcodificação sublexial (rota
da Babilônia). Na idade adulta, o indivíduo, com essa dificuldade, pode ler e escrever
convencionalmente desde que sejam palavras que já conheça. Assim, percebe-se que a
linguagem escrita depende de um recurso de estoques e procedimentos translexicais (rota da
Suméria). Esse tipo de dislexia requer atenção especial da sociedade se ela pretende que
todos se apropriem de um sistema perfeito de escrita.

9
Cada um dos dois ossos que formam os lados da abóboda craniana.
10
Diz-se do osso ínfero-posterior da cabeça
44

Uma criança que não adquira um código primário (que não aprenda a ler e a falar),
durante os primeiros anos de vida, pode ser considerada biologicamente anormal.
Entretanto, Shaywitz (2006) afirma que uma criança lenta em todas as habilidades
cognitivas não seria classificada como disléxica. Segundo ela, para ter dislexia, a criança
precisa ter pontos fortes no que diz respeito à cognição e não apenas problemas nas funções
de leitura, ainda que a maior parte das informações sobre esse distúrbio tenha como base os
estudos com pessoas que já haviam sido identificadas como tendo um problema de leitura.
Quando se trata de distúrbios adquiridos de leitura e de escrita, após uma lesão no
lado esquerdo do cérebro, de origem súbita, algumas pessoas apresentam, no início, uma
“Afasia de Broca” que afeta quase todas as aptidões da fala e de leitura; e evoluem para um
quadro de agramatismo11 e de dislexia profunda. Nesse caso, nas demências orgânicas, a
leitura em voz alta e a escrita sob ditado podem, às vezes, estar temporariamente
preservadas, enquanto que a compreensão lingüística está quase totalmente abolida; e a
degeneração da escrita pode preceder a da leitura. Além do que alguns pacientes com lesão
cerebral occipital esquerda que apresentam uma alexia pura podem reconhecer palavras que
não podem nem ler em voz alta nem entender (LECOURS; PARENTE, 1997).
As dificuldades de leitura complicam o processo de ensino-aprendizagem e levam o
aluno ao fracasso escolar na maioria das disciplinas, segundo Condemarin e Blomquist
(1989). Torna-se impossível, dessa forma, desenvolver-se intelectualmente num meio que
lhe exige ler sinais, advertências, avisos, instruções, notícias etc. Por sua vez, o discente se
vê impedido de se desenvolver plenamente do ponto de vista intelectual, social e emocional.
Outras perturbações da aprendizagem podem ser observadas na pessoa disléxica.
Ela, geralmente, apresenta, além dos sintomas já citados, alterações na memória imediata ou
dificuldades para memorizar visualmente os objetos, palavras ou letras. Também pode
apresentar dificuldade para aprender séries (dias da semana, meses do ano e o alfabeto),
para se orientar com propriedade no espaço e aprender a noção de direita-esquerda. Com
isso, o disléxico pode se sentir confuso e frustrado, o que pode levar, como conseqüência,
além do fracasso escolar, a problemas emocionais, a atitude depressiva e (ou) agressiva.
Na maioria dos casos, apresenta-se disortografia, tendo o indivíduo dificuldades para
expressar idéias com boa sintaxe, seqüência e estrutura adequadas. No momento em que

11
O agramatismo é um aspecto linguístico particular da afasia de expressão caracterizado pela supressão quase
constante dos morfemas gramaticais (preposições, artigos, pronomes) e a redução das frases apenas à
sequência dos morfemas lexicais.
45

escreve, apresenta, então, inversões, adições, omissões e substituições já presentes na leitura


oral.
A falta de interesse, de motivação, de esforço ou de vontade não é causa de dislexia
e ela nada tem a ver com acuidade visual ou aditiva. A dificuldade no aprendizado da
leitura, em graus distintos, é característica de cerca de 80% dos disléxicos. Devido ao jeito
de ser e aprender do discente dislexo é que surgem dificuldades como: disgrafia12 ,
discalculia13 , hiperatividade14 e hipoatividade15.
Em relação aos fatores causais, a dislexia possui aspectos extrínsecos e intrísecos. O
primeiro faz correlações com o funcionamento cerebral, os fatores genéticos e as
características constitucionais. E, o segundo refere-se a aspectos cognitivo-lingüísticos.

2.5.2 Explicações sobre a natureza da dislexia

A dislexia pode estar associada a várias outras terminologias como: alexia (supressão

da leitura), afasia (dificuldadades na aquisição da audição, da fala, da leitura e da escrita),


agnosia (perda da capacidade de reconhecer objetos), apraxia (incapacidade de realizar
movimentos com a finalidade proposta), analfabetismo (incapacidade de ler por falta de
oportunidade educacional) e bloqueio secundário da aprendizagem (específico da leitura).

12
Inabilidade ou atraso no desenvolvimento da linguagem escrita, especialmente da cursiva. A caligrafia
costuma ser grafada com letras mal desenhadas, borradas ou incompletas, com tendência à letra de fôrma. Há
também os erros ortográficos, supressões ou substituições de letras, de sílabas ou de números, e as inversões
do sentido direcional de letras e de números (o que se chama de ‘escrita de espelho’).
13
Dificuldades com a linguagem Matemática em diferentes níveis e complexidades. É possível que se
evidencie ainda no aprendizado aritmético básico, assim como, na elaboração do pensamento matemático mais
complexo. Essas dificuldades podem se manifestar sem que haja inabilidade de leitura. As mais graves são
decorrentes da imprecisa percepção de espaço e tempo; na apreensão, coordenação e processamento de fatos
matemáticos em sua devida ordem; déficit de atenção – dificuldade de concentrar e de manter concentrada a
atenção em objetivo central, para discriminar, compreender e assimilar o foco central de um estímulo. Essa
deficiência pode manifestar-se isoladamente ou associada a uma linguagem corporal que caracteriza a
hiperatividade ou a hipoatividade.
14
Atividade psicomotora excessiva, com padrões diferenciais de sintomas. A criança ou o jovem hiperativo
fala sem parar e nunca espera por nada. Isso porque age sem pensar e sem medir as conseqüências de suas
ações. Assim, é comum que tenha muitos hematomas ou cortes na pele. Por outro lado, há um segundo tipo de
hiperatividade que apresenta características voltadas para dificuldade de foco de atenção, pois ocorre uma
superestimulação nervosa que leva a pessoa a passar de um estímulo a outro, e ela não consegue, então, focar
sua atenção em um único tópico. Logo, passa a impressão de que é desligada, sendo que, ao contrário, está
ligada a tudo ao mesmo tempo.
15
Nível baixo de atividade psicomotora, com reação lenta a qualquer estímulo. Normalmente, a pessoa parece
estar “no mundo da lua” ou “sonhando acordada”. Por falta de concentração, tem memória pobre e
comportamento vago, pouca interação social e apatia em sala de aula.
46

Desde a década de 30, do século passado, quando a dislexia começou a ser estudada,
de forma sistemática, surgiram várias teorias tentando explicar a gênese e desenvolvimento
do distúrbio. Condemarin e Blomquist (1989) apresentam algumas explicações sobre a
natureza dessa disfunção. Entre elas, tem-se a tese de Samuel Orton, entre 1925 e 1930, que
levantou a hipótese de uma inadequada instalação da dominância lateral do cérebro.
Segundo ele, a escrita em espelho, por exemplo, seria explicada por conflito e pela
predominância entre os dois hemisférios, o que seria a mesma explicação para o atraso na
linguagem e a gagueira. Para o estudioso, dislexia significava “símbolos invertidos”. Ele
recomendou um procedimento corretivo sistemático de tipo visual, auditivo e cinestésico.
Devido ao estudo de Bertil Hallgren, em 1950, com duzentos e setenta disléxicos,
chegou-se à conclusão de que a dislexia devia-se a um fator hereditário. Esse fator é
resultante de um gene monoíbrido dominante autossômico com manifestação praticamente
completa. Essa investigação mostrou que, em 80% dos casos, havia problemas de leitura
num ou mais membros da família. Nesse sentido, Shaywitz (2006) alerta que, além de as
dificuldades de leitura serem em geral ignoradas nas crianças que vivem em circunstâncias
desvantajosas, representa pelo menos 80% de todos os problemas de aprendizagem.
A dislexia trata-se de um dano neurológico mínimo que afeta sutilmente a
aprendizagem e a conduta, sem uma diminuição evidente da sua capacidade intelectual
geral. Acreditam-se hoje que essas deficiências podem ser o resultado de variações
genéticas, irregularidades bioquímicas, dano perinatal e cerebral (no momento do parto); ou
então, de doenças ou lesões originadas nos anos críticos para o desenvolvimento e
maturação do sistema nervoso central (SHAYWITZ, 2006).
Na visão neurológica, segundo Shaywitz (2006), podem ocorrer as disfunções
congênitas que se refletem na criança desde o nascimento; e a adquirida que é a repentina
perda da capacidade de ler. A última afeta principalmente adultos, pois ocorre após uma
lesão no lado esquerdo do cérebro (derrame ou tumor). A diferença entre as duas está no
momento em que se dá o rompimento dos sistemas neurais no cérebro. Na forma congênita,
há uma espécie de queda de energia nas conexões cerebrais durante o desenvolvimento
embrionário. Logo, o problema fica nas conexões neurais, confinado a determinado sistema
neural utilizado para leitura. Por outro lado, na adquirida, uma lesão bloqueia um sistema
neural que já está em funcionamento e pode também estender seu impacto a outros sistemas.
Vale ressaltar que a lesão cerebral mínima é muito confundida com o atraso
maturacional, conceito introduzido por Lauretta Bender, em 1957, citada por Condemarin &
47

Blonquist (1989), que se refere à lentidão no desenvolvimento de certos aspectos


neurológicos especializados num contínuo de leve a severo. A estudiosa baseou sua noção
de atraso maturacional sobre um conceito de áreas funcionais do cérebro e da personalidade
que se desenvolvem de modo congênito de acordo com um padrão reconhecido. Ao
contrário da lesão cerebral mínima, não implica defeito estrutural, deficiência ou perda; isto
é, a dislexia específica corresponderia a um atraso maturacional, porém somente em relação
ao “florescimento” de certas faculdades específicas.
Os educadores devem estar sempre atentos à manifestação do distúrbio em sala de
aula. Para que se possa avançar na hipótese do aluno ser disléxico, os profissionais em
educação devem investigar se há existência de um familiar próximo que apresente ou tenha
apresentado problemas de linguagem ou dificuldades na aprendizagem da leitura e da escrita
(CONDEMARIN; BLOMQUIST, 1989, p. 24).
A teoria hormonal é uma possível explicação. A dislexia estaria ligada à produção
excessiva de testosterona na fase de gestação. Este excesso de hormônio masculino na
gestação de um feto masculino provocaria, então, um aborto natural, ou, por outro lado,
provocaria o distúrbio na criança que conseguisse sobreviver.

2.5.3 O diagnóstico da dislexia

É necessário fazer um diagnóstico psicológico a todos os alunos que apresentem


qualquer tipo de inadaptação escolar, conforme Baroja, Paret, Riesgo (2000), para
desvendar as distintas causas que a originam, e orientar a cada um de acordo com elas.
Desse modo, evitar-se-ia, além das perturbações em classe, o atraso escolar com a perda de
anos de aprendizagens para aquele que não está bem inserido no seu nível de escolaridade
devido, por exemplo, à dislexia. Os aspectos que se devem explorar para levar a um bom
resultado do diagnóstico da dislexia, segundo as autoras, são: nível mental, linguagem, nível
pedagógico, percepção e motricidade, personalidade.
A neuropsicologia cognitiva contemporânea se encarrega de interpretar os distúrbios
de leitura ou de escrita. Segundo Lecours e Parente (1997), é importante que isso ocorra.
Um modelo abrangendo tanto o agramatismo como a dislexia profunda explicaria várias
falhas de leitura e de escrita. Por isso, são essenciais as observações neurorradiológicas e os
dados das avaliações neuropsicológicas e afasiológicas rotineiras.
Na avaliação afasiológica, há testes de denominação de objetos e de imagens e de
emparelhamento destes às palavras. Se o paciente era escolarizado antes de sua doença, as
48

provas de denominação e de emparelhamento compreenderão as formas oral e escrita.


Conforme os autores, as provas são essenciais para dar uma interpretação coerente ao exame
de leitura e de escrita.
Como exemplo, se um sujeito nomeia objetos, mas é incapaz de escrever seus nomes
sob ditado, supõe-se uma falha específica nos processamentos de saída lexical a partir do
saber semântico. Se o disléxico, ao denominar palavras irregulares na escrita, comete erros
de regularização como, em vez de “bicicleta”, escreve “bisicleta”, justifica-se a existência
de léxicos logográficos de entrada independentes do léxico logográficos de saída
(LECOURS; PARENTE, 1997).
A avaliação só seria adequada e completa caso fosse possível confrontar o
comportamento do paciente diante de diversos estímulos comuns nas diferentes provas.
Como, por exemplo, leitura, escrita sob ditado, denominação oral e escrita, emparelhamento
de palavras vistas e ouvidas, informação não-lingüísticas de origem auditiva (como vozes de
animais) ou visual (LECOURS; PARENTE, 1997).
É pela avaliação multidisciplinar que se têm condições de um encaminhamento
adequado a cada caso. Consideram-se as várias possibilidades, inclusive de manifestação da
dislexia. Esse diagnóstico que envolve profissionais de saúde, como neurologista e
fonoudiólogo, além de psicólogo, orientador educacional, professores e pais de alunos pode
identificar com precisão o que está ocorrendo.
No Brasil, ainda não há parâmetros para a avaliação da dislexia que descrevam o
nível de leitura esperado para a escolaridade e faixa etária. Os processos de diagnóstico
diferem em função disso, tornando-se, também, subjetivos. Mesmo assim, com o
acompanhamento adequado, o disléxico evoluirá de forma consistente durante o tratamento,
que pode durar de dois a cinco anos. Esse tempo de acompanhamento varia de acordo com
cada caso, além de se considerar os diversos graus de dislexia, que podem ser leve,
moderado e severo.

2.6 O apoio ao disléxico: entidades voltadas ao atendimento dos portadores do


distúrbio no Brasil

Historicamente, segundo Mazzotta (2001), os pais têm sido uma grande força para as
mudanças no atendimento aos portadores de deficiência. Os grupos de pressão por eles
organizados têm seu poder político concretizado na obtenção de serviços e recursos
49

especiais para grupos de deficientes. No Brasil, na Constituição Federal e em diversos textos


oficiais, observa-se também a busca de organizações e instituições especializadas
gerenciadas pelos próprios pais.
A Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) foi a primeira instituição
de apoio aos portadores de necessidades especiais no Brasil. A Apae surgiu em 11 de
dezembro de 1954 na cidade do Rio de Janeiro e teve estímulo e orientação, em sua
fundação, de membros da National Association for Retarded Children (Narc), organização
fundada em 1950, nos Estados Unidos. Em seguida, fundaram-se várias Apaes em outras
cidades do Rio de Janeiro, Goiás, Paraíba, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, São
Paulo, havendo hoje mais de mil entidades (MAZZOTTA, 2001).
Nesse sentido, tem-se registrado a organização dos movimentos de portadores de
deficiência. Conforme Mazzota (2001), tais grupos têm levado suas necessidades ao
conhecimento dos organismos governamentais em todos os níveis da organização social e
vêm fazendo esforços para assegurar que suas necessidades sejam satisfeitas de modo mais
eficiente. No caso da dislexia, apresentaremos a seguir, algumas associações já existentes no
País.

2.6.1 Associação Brasileira de Dislexia - ABD

A Associação Brasileira de Dislexia (ABD) existe no Brasil, desde 1983, com sede
em São Paulo (SP), que atende pessoas de todo país. Trata-se de uma entidade filantrópica
que oferece orientação direcionada aos diferentes distúrbios de aprendizagem; atendimento
a pais, familiares, escolas, profissionais clínicos, imprensa, órgãos públicos e toda a
comunidade. Há também curso de formação em dislexia; simpósios nacional e internacional
(dislexia, cognição e aprendizagem) a cada dois anos; encontros com disléxicos e reunião
com pais; palestras em escolas, comunidades, clínicas etc; diagnóstico multidisciplinar de
exclusão; encaminhamento adequado a cada caso atendido; cadastro de profissionais e
clínicas especializadas; e desenvolvimento de pesquisas científicas e estudos quanto à
incidência e forma da dislexia no Brasil.
50

2.6.2 Associação Nacional de Dislexia – AND

A Associação Nacional de Dislexia (AND) foi fundada em 2000, e é sediada na


cidade do Rio de Janeiro. Trata-se de uma sociedade civil, sem fins lucrativos, políticos ou
religiosos.
Essa associação tem objetivos científico, cultural e social. Além disso, a organização
oferece serviço social de avaliação diagnóstica de dislexia e cursos de atualização, encontros
de disléxicos etc, assim como a ABD. A AND tem por finalidade congregar
fonoaudiólogos, médicos, psicopedagogos, psicólogos, pedagogos, pais de disléxicos e
instituições que se dediquem ao aprofundamento dos estudos sobre dislexia, além de

• promover o conhecimento e a compreensão do fenômeno da dislexia, por meio do


aprofundamento dos estudos e de pesquisas científicas, assim como oferecer apoio
profissional aos que se dedicam a este tema;
• promover palestras informativas e dinâmicas de grupos para pais e escolas;
• criar espaços de reflexão, estudo de casos e supervisão clínica para os profissionais das
áreas de fonoaudiologia e psicopedagogia;
• editar publicações sobre os temas pertinentes à dislexia;
• acompanhar, opinar, oferecer subsídios e, se possível, colaborar na elaboração de
projetos de lei, regulamentos, resoluções e procedimentos escolares em questões
relacionadas à dislexia;
• promover o constante aprimoramento técnico e científico de seus associados mediante a
sistemática obtenção e veiculação de novos conhecimentos, experiências e recursos
clínicos para intervenção terapêutica; e
• liderar a defesa das pessoas portadoras de necessidades especiais e valorização pessoal
das pessoas disléxicas, favorecendo a sua inserção na vida escolar, profissional e social.

2.7 O trabalho pedagógico

Ao falar do trabalho pedagógico comprometido com espaços de balanço da


realidade, Rezende (2006, p.17) denomina-os “ênfase na crítica”, estruturados por
concessão e conquista. Assim, adentram à escola questões de classes sociais, relações de
produção, lutas por emancipação, denúncias da escola reprodutora. Isso fortalece, então, um
51

trabalho que se pretende crítico-reflexivo, porém, freqüentemente, é acompanhado por


posturas conservadoras.
Já como “ênfase na diversidade”, a autora sugere que o trabalho pedagógico se paute
no princípio de que a crítica e a reflexão devem ser promotoras de ações efetivas, a partir da
grande variedade de sujeitos, espaços e tempos. Enfatiza, também, que os desafios dessa
ênfase, diferentemente das demais, buscam suas bases no emergente paradigma da
complexidade16.
Para Martínez (2006), a criatividade é um processo complexo da subjetividade
humana. Há, contudo, uma tendência a produzir coisas novas em sala de aula sem uma
preocupação em analisar seu impacto na aprendizagem e no desenvolvimento. Segundo a
autora, criatividade e novidade não significam a mesma coisa. A primeira implica a
novidade, mas deve permitir novos níveis de aprendizagem e desenvolvimento, visto que

[...] a inclusão escolar supõe, precisamente, a mudança da escola para dar


oportunidades de aprendizagem e desenvolvimento a todos os alunos com
independência de classe social, raça, características individuais e outras
diferenças. (MARTÍNEZ, 2006, p. 73).

A concepção de inclusão implica uma alta dose de criatividade e de inovação na


instituição escolar. Deve-se extinguir a longa história de padronização e homogeneização
dos processos educativos e a conseqüente exclusão daqueles que “não aprendem” segundo
as ações padronizadas, características de parte do trabalho pedagógico. O sucesso do
processo de inclusão escolar depende de fatores de ordem estrutural, ideológica, política e
técnica (MARTÍNEZ, 2006, p. 72-73).
O professor é quem planeja e desenvolve o trabalho pedagógico a partir de suas
configurações subjetivas, além das características do contexto em que atua e da
subjetividade social que o caracteriza. Envolve também alto grau de desenvolvimento da
motivação para a profissão, clara orientação de futuro na esfera profissional, força da
individualidade como importante elemento dinâmico da expressão criativa, orientação muito
ativa para a superação profissional e orientação consciente para a criação.
Dessa forma, o trabalho pedagógico hoje reforça o apelo à diversidade. As
instituições educativas não se traduzem mais pelas figuras de alunos e professores a partir
de estereótipos desejáveis e idealizados. Rezende (2006, p.18) complementa que

16
O paradigma da complexidade é um modelo capaz de guiar uma investigação, sem imposições, como
mudança de olhar, diferentes formas de olhar, procurando dar conta de uma faceta, de uma realidade.
52

Fica cada vez mais difícil ignorar que os espaços educativos constituem-se de
profunda e concreta diversidade – brancos, negros, índios, imigrantes, pobres,
ricos, homens, mulheres, sadios, deficientes, aidéticos, marginais, engajados
socialmente, colonos, criminosos, solidários; enfim, todos os com e (ou) sem
alguma coisa não mais padronizados e violentados pela lógica da identidade
hegemônica.

O currículo e o trabalho pedagógico são construções de e para desiguais de acordo


com Rezende (2006). O desafio, então, é concretizar ações que não se limitem a conceber
processos educativos ditos “democráticos”, porque são “iguais” para todos, mas processos
que permitam convivência enriquecedora capaz de permitir vivências e saberes diversos.
Por outro lado, no campo educacional, um equívoco se refere aos processos de
formação. Nesse caso, encontram-se currículos fragmentados e disciplinas estanques.
Consequentemente, o trabalho pedagógico acompanha a mesma lógica. Os próprios
professores dão um tratamento, igualmente compartilhado, aos encaminhamentos das
diferentes atividades pedagógicas. Conforme Rezende (2006), isso equivale ao perverso,
comprometedor e reprodutor efeito em cadeia, difícil de ser rompido.
O professor deve, assim, perceber que o grau de consciência e criatividade dos
sujeitos sobre si mesmos e suas ações são diferenciados, logo a capacidade de criação e
apropriação do conhecimento é igualmente diferenciada. É essencial, dessa forma, conhecer
e compreender quem são os sujeitos que aprendem, seus saberes e o que valorizam. Esse
conhecimento prévio aproxima os saberes do senso comum aos conhecimentos científicos.
A partir desse raciocínio, constata-se a necessidade de leitura crítica e
contextualizada da realidade pelo docente a fim de compreendê-la em sua provisoriedade e
complexidade. O trabalho pedagógico deve ser visto como circunstancial, por isso é
importante o processo de ressignificação e reordenamento do conhecimento, dentro de uma
visão crítica-reflexiva, com postura da realidade educativa para direcionar das ações
educativas. Com isso, torna-se necessário perceber que

A abertura da instituição para diferentes vozes e o reconhecimento dos currículos


em circulação nas universidades envolve pluralizar as identidades dos sujeitos
que constituem o ambiente universitário e eliminar o processo educativo de
padrões fixos de desempenho. (MACEDO, 2003, p. 42).

Para Rey (2006), o caráter da aprendizagem vai obrigar o professor a pensar em suas
práticas pedagógicas sobre os aspectos que propiciem o posicionamento do aluno como
sujeito da aprendizagem. Isso implica o discente expondo suas experiências e idéias no
espaço de aprendizagem. O autor alerta que não haverá sentido subjetivo em uma atividade
53

despersonalizada. Isso se reflete também na avaliação que tem de estimular a reflexão do


aluno, a compreensão de aspectos que ainda não domina.
É nesse sentido que inovações no processo ensino aprendizagem tornam-se
indispensáveis para o desenvolvimento do portador de dislexia. Além do desenvolvimento
de relações que facilitam o posicionamento ativo e reflexivo desse aluno, deve-se ater,
também, ao tempo maior para avaliação e diversidade de questões que valorizem a
oralidade.
O professor deve possibilitar apoio ao aluno para que ele retome e reelabore sua
aprendizagem, reforça Tacca (2006). Em consonância com Vygotsky (1999), os conteúdos
deveriam ser os meios e não o fim da aprendizagem. Especialmente em se tratando de aluno
dislexo. Segundo o primeiro autor, para ensinar alguém, antes de tudo, é necessário
identificar seus motivos de aprender. Dessa forma,

O diálogo é o cerne da relação da aprendizagem, em que as partes envolvidas


fazem trocas e negociam os diferentes significados do objeto de conhecimento, o
que dá relevância ao papel ativo e altamente reflexivo, emocional e criativo do
aluno e do professor. (TACCA, 2006, p. 50).

Quando o docente utiliza diferentes estratégias pedagógicas para dialogar e conhecer


o processo de pensamento dos alunos, poderá verificar se eles já possuem conceitos básicos
e aprofundar ou incluir naturalmente aqueles que ainda são necessários. Tacca (2006, p. 62-
65) ressalta que

A atenção do professor e seu diálogo com o pensar do aluno lhe permitirão


identificar que tipo de estratégia seria conveniente para o discente prosseguir
constituindo sua aprendizagem. [...] O desafio é descobrir os canais e estratégias
pedagógicas que poderão atuar promovendo, de fato, o desenvolvimento.

Caso os estudantes se mostram incapazes de aprender adequadamente em ritmo


“normal”, podem ter progressos notáveis e alguns até conseguem superar seu próprio atraso
se colocados em condições adequadas ou ao utilizar métodos especiais de ensino. Esse
processo de desenvolvimento dos conceitos ou significados das palavras requer o
desenvolvimento de toda uma série de funções como atenção arbitrária, a memória lógica,
abstração, a comparação e discriminação e todos esses processos não podem ser,
simplesmente, memorizados ou assimilados.

Meireles (2002), em oposição à visão de leitura como “busca de significado”, propõe


a concepção de leitura como “construção de significados”. Assim, a escolha dos textos e
atividades a serem trabalhados deveria levar em conta a seleção da composição. Logo, isso
54

deve basear-se no grau de dificuldade gramatical e lexical, assim como na capacidade de


compreensão dos discentes dos dados explícitos e implícitos do texto.

É preciso lembrar, portanto, que o disléxico tem uma dificuldade de aprendizagem e


não uma impossibilidade. Além de que esse educando necessita de ensino mais condizente
com suas peculiaridades. Logo, a escola e os profissionais de educação precisam estar
integrados para favorecer o desenvolvimento do aluno que apresente esse distúrbio.
Nesse sentido, o professor deve motivar o aluno com dificuldades, percebendo suas
qualidades e potencialidades por meio da atenção, do carinho e de práticas pedagógicas
inovadoras. Caso essa motivação não ocorra, é possível que o estudante sinta-se em
condição de inferioridade sem conseguir a otimização da aprendizagem. Isso gera, então,
insegurança, bloqueios emocionais, timidez, agressividade e, especialmente, auto-conceito
negativo que o aluno pode levar para a sua vida profissional.

Davis (2004, p. 62), disléxico que enfrentou várias dificuldades na aprendizagem da


Língua Materna durante a vida acadêmica e conseqüentes preconceitos na escola, hoje é
escritor. No entanto, ele diz que o errado não é a pessoa ser disléxica, e sim a forma como a
escola tenta ensinar a ela os conteúdos. A formação de professor, nesse aspecto, bem como
a prática pedagógica, refletem os problemas de adequação da educação especial no Brasil.

2.7.1 O disléxico e o papel da escola

A dislexia ainda é uma disfunção pouco conhecida, porém sabe-se que é hereditária
e que interfere no registro, processamento da informação ou na elaboração da resposta. O
histórico escolar do aluno disléxico é muito semelhante, pois 80% deles têm sérias
dificuldades para ler e são quase sempre repreendidos pelos respectivos professores, por
essa limitação.
Esses docentes não conseguem compreender, na maioria das vezes, como por
exemplo, alguém esteja acima da média em Matemática e tenha sérias dificuldades de
alfabetização: escreve palavras ininteligíveis ou não consegue ler. Além disso, o disléxico é
acusado de ser desorganizado e esquecido e é definido, por conseguinte, como preguiçoso.
Segundo Baroja, Paret e Riesgo (2000), é freqüente que a dislexia se confunda com outros
problemas de adaptação escolar, principalmente com os de nível mental e apatia em relação
ao estudo. Segundo as autoras,
55

Isto é devido a uma visão superficial da problemática do aluno, sem que se tenha
estudado as causas que motivam sua falta de rendimento escolar, e a uma atitude
de espera de que, à medida que o discente vai amadurecendo psiquicamente, suas
deficiências resolvam espontaneamente. (BAROJA; PARET; RIESGO, 2000, p.
105).

Um dos grandes problemas para alguns disléxicos é a dificuldade de concentração.


Por isso, eles podem se tornar muito confusos e inconsistentes. Visto que há oscilação no
nível de capacidade de concentração, há dias em que elas podem melhor corresponder à
expectativa escolar de ensino-aprendizagem e outros em que não. Nesse último caso, o
aluno se mostra disperso e parece ter esquecido tudo o que aprendera até então. Com isso,
os docentes desinformados podem julgá-los de desatentos e negligentes, por não levarem
seus estudos a sério.
A criança que não sabe ler ou o adolescente que lê com dificuldade fracassa na
maioria das matérias escolares, como também afirmou Shaywitz (2006). São incapacitados
de interpretar textos ou exercícios com lógica e coerência. Conforme Condemarin e
Blomquist (1989, p. 16),

[...] aprender a ler é uma parte do desenvolvimento total da linguagem. Da


mesma forma, as dificuldades da leitura não podem considerar-se de maneira
isolada, mas formando parte de uma deficiência na estrutura e (ou) organização
da linguagem geral.

Para melhora no ensino-aprendizagem do aluno com dislexia, é importante a


aceitação e a adaptação do próprio disléxico às práticas pedagógicas adotadas pelo
educador. Isso se fundamenta na principal característica dos disléxicos que é a dificuldade
da relação entre a letra e o som (fonema e grafema).
Condemarin e Blomquist (1989) afirmam que os disléxicos com mais de doze anos
(incluindo os que cursam o ensino médio), normalmente, não revelam os sinais descritos na
sua leitura oral. No entanto, segundo elas, é fácil de detectá-los na leitura silenciosa.
Alertam que os alunos disléxicos, ao ler, realizam uma leitura subvocal, ou seja, murmuram
ou movem os lábios, pois se vêem obrigados a pronunciar as palavras para poder
compreendê-las. Consequentemente, por utilizarem a mesma técnica da leitura oral, a
velocidade torna-se muito lenta.
Devem-se, portanto, salientar métodos de ensino diferenciados que treinem a
memória imediata, a percepção visual e a auditiva. Dessa forma, é sugerida a adoção do
56

método multissensorial17, cumulativo e sistemático para que o aluno utilize todos os


sentidos.
Os disléxicos podem superar, consideravelmente, o distúrbio de aprendizagem. Mas,
isso depende de uma boa orientação pedagógica e de uma instrução organizada. Para esse
fim, o docente deve se preocupar em conhecer determinados princípios metodológicos que
possibilitem educar esses alunos. Condemarin e Blomquist (1989) propõem que os métodos
tradicionais devem ser substituídos por um sistema mais fonético ou analítico, a
aprendizagem visual deve ser reforçada, o material de leitura deve ser estimulante e
interessante (variando de acordo com a faixa etária do aluno) e, principalmente, o ensino
deve ser individual e intenso.
O docente, paralelamente ao psicólogo, deve trabalhar para a educação para a leitura
dos alunos portadores de dislexia. Porém, para que isso seja possível, o professor precisa
obter, em princípio, além do conhecimento do ensino de leitura básica e do conhecimento
dos métodos terapêuticos das dificuldades da leitura, investigações e teorias relativas à
leitura terapêutica e de algumas conclusões atuais da aprendizagem e das alterações desta.
O professor deve ter habilidade para organizar, adaptar ou criar materiais e aplicar
conhecimentos teóricos às necessidades do aluno e a seu problema específico. Destaca-se,
além disso, que se deve possuir capacidade de estabelecer uma relação positiva com os pais
dele, a fim de obter sua colaboração na solução das dificuldades da criança.
Conforme Estienne (2001), uma boa relação afetiva entre o “reeducador” e o aluno
disléxico é significativa para a recuperação das dificuldades de leitura. Leva-se em conta
que esse estudante, normalmente, é triste e, às vezes, deprimido. Também pode ocorrer em
menor proporção de ser agressivo devido a seus fracassos nos esforços para ler bem. Tanto
os pais como o professor tendem a considerar tais atitudes como negligência,
estigmatizando ainda mais o estudante.
Para que haja resultado positivo é necessário seguir determinadas recomendações. O
“reeducador”, sendo professor, deve evitar avaliar negativamente os erros disléxicos e fazer
as avaliações oralmente, na medida do possível. Além disso, a tarefa fundamental da
reeducação é descobrir, junto com a criança e o adolescente, as fontes de sua língua,
manipulando-as com ele. Dessa forma, reeducar os disléxicos, segundo Estiene (2001),

17
O método multissensorial busca combinar diferentes modalidades sensoriais no ensino da linguagem escrita
às crianças. Ao unir as modalidades auditiva, visual, cinestésica e tátil, este método facilita a leitura e a
escrita ao estabelecer a conexão entre aspectos visuais (a forma ortográfica da palavra), auditivos (a forma
fonológica) e cinestésicos (os movimentos necessários para escrever aquela palavra).
57

seria exercitar a linguagem em todas as suas formas, pois cada palavra tem um significado
(valor denotativo), mas também apresenta um eco ligado às vivências pessoais do
reeducador e do discente (valor conotativo). Isso demonstra que

Uma das tarefas do reeducador é reconciliar a criança consigo mesma e com a


linguagem. Sem dúvida, a reeducação é um em preendimento mais amplo e
profundo que a simples aprendizagem de uma língua, mas, na maior parte dos
casos, investir no potencial verbal da criança é também reinvestir nela, social e
psicologicamente. Dessa perspectiva, não se parte de um programa pré-
estabelecido a partir de lacunas constatadas, mas estimula-se a criança a
exprimir-se com suas próprias palavras. São estimulados todos os meios de
expressão (desenho, modelagem, texto livre etc). (ESTIENNE, 2001, p. 199).

Estienne (2001, p. 206) propõe ainda que, na reeducação dos disléxicos, devemos
pensar ao mesmo tempo:
• na abordagem do ato de ler e escrever;
• na definição e nas condições de sua aprendizagem;
• no conceito de dislexia, levando em conta diversas hipóteses e certezas;
• nas concepções de sua terapia, especificando os objetivos e os meios, também
justificando- os.

Além disso, Estienne (2001, p. 206) pondera que o especialista não deve limitar-se a
uma técnica ou a uma escola, a uma corrente de idéias, a uma opção definitiva. Ela afirma,
então, que o procedimento deve ser determinado por:
• objetivos precisos e mensuráveis, sujeitos a controle, no sentido de verificar se eles
foram alcançados;
• objetivos estabelecidos de comum acordo, por meio de um contrato mútuo por
escrito;
• tempo limitado para evitar tratamentos intermináveis;
• estudos estatísticos para objetivar e comparar os diferentes métodos de reeducação.

Valett (1990) alerta que as crianças disléxicas precisam que as escolas estejam
organizadas de forma a permitir e encorajar que elas aprendam e progridam em seus
próprios ritmos. Ainda afirma que o agrupamento tradicional baseado em idade é prejudicial
para elas e outras excepcionalidades. Logo, todas as criança devem ser colocadas em classes
e grupos de aprendizagem de acordo com a sua realização funcional. O agrupamento de
realização desenvolvimentista em leitura é, segundo o estudioso, essencial para portadores
de dislexia e deveria ser exigido em todas as escolas públicas. Conforme o autor,
58

Toda criança deve ter um Plano Educacional Individual projetado para atender às
suas necessidades. Este plano deve incluir objetivos instrucionais e estratégias de
aprendizagem. Todos os professores envolvidos necessitam conhecer este plano,
assim como os estudantes e os pais. Estes objetivos individuais precisam ser
reavalidados periodicamente e revisados. (VALETT, 1990, p. 281).
59

CAPÍTULO III. ATENDIMENTO AO JOVEM DISLÉXICO NO DISTRITO


FEDERAL

Neste capítulo, serão apresentadas e analisadas as informações colhidas no decorrer


da pesquisa. Inicialmente, apresentaremos o resultado do trabalho de campo realizado nas
duas escolas junto aos professores de Português e orientadores educacionais. Em seguida,
abordaremos o papel da família para o aluno que possui dificuldade de aprendizagem,
especialmente a dislexia. Por fim, falaremos a respeito da conduta no atendimento nas
instituições do Distrito Federal voltadas a estudantes da rede pública de ensino.

3.1 Os professores de Língua Portuguesa e a inclusão do disléxico

Para a realização da análise de dados das respostas dos questionários, primeiramente,


observamos a situação ocorrida em cada uma das escolas. Posteriormente, estudamos a
relação do conjunto. Dessa forma, além de podermos observar as diferenças da relação
professor/aluno de cada instituição escolar, houve a possibilidade, também, de termos uma
visão geral da situação. Não percebemos a necessidade de reproduzir, por meio de gráficos,
todas as informações obtidas no questionário, por isso apresentaremos os quais supomos que
sejam mais relevantes para alcançar os objetivos da investigação.
Tivemos como base para análise, as respostas aos questionários que abrangem 58%
do total de professores dos turnos matutino e vespertino das duas escolas investigadas. Uma
delas situa-se no Plano Piloto, que denominaremos, na análise dos resultados, de escola 1; e
a outra em Taguatinga, de escola 2. Setenta por cento desses professores pertencem ao
gênero feminino e 30% ao masculino.
60

100%

80%

60%
Escolas 1 e 2
40%

20%

0%
Há mais de Entre 5 e 10
10 anos anos

GRÁFICO 1: Tempo de graduação dos professores


FONTE: A autora

80%
70%
60%
50%
40% Escolas 1 e 2
30%
20%
10%
0%
Instituição Instituição
pública privada

GRÁFICO 2: Modalidade de administração acadêmica onde


os professores se graduaram
FONTE: A autora

A maioria dos docentes das duas escolas se graduou há mais de 10 anos e tem o
mesmo tempo de experiência docente. Entre eles, 70% se formaram em
faculdade/universidade particular (84% da escola 1 e 50% da escola 2). Porém, somente na
escola 2, a metade dos professores pesquisados graduou-se em instituição pública (16% da
escola 1 e 50% da escola 2).
61

120%

100%

80%
Escola 1
60%
Escola 2
40%

20%

0%
Abordado Não abordado

GRÁFICO 3: Abordagem da dislexia na graduação


FONTE: A autora

Todos os professores da escola 1 foram unânimes em responder que o tema da


dislexia não foi abordado em alguma disciplina da formação inicial. Por outro lado, 75%
dos docentes da escola 2 afirmaram o contrário. Esses professores demonstraram, ao mesmo
tempo, mais conhecimento a respeito do distúrbio no decorrer do questionário de pesquisa.
Com isso, percebe-se que esse tema, embora, possivelmente, não estivesse, nos
currículos da graduação de licenciatura em Letras, esteve em discussão, pelo menos nas
instituições públicas onde alguns docentes estudaram. Segundo a Resolução n° 2 para
educação especial (2001, p.5), professores capacitados para atuar em classes comuns com
alunos que apresentam necessidades educacionais especiais são aqueles que comprovem
que, em sua formação, de nível médio ou superior, tenham sido incluídos conteúdos sobre
educação especial adequados ao desenvolvimento de comportamentos e valores para:

• perceber as necessidades educacionais especiais do aluno e valorizar a educação


inclusiva;
• flexibilizar a ação pedagógica nas diferentes áreas de conhecimento de modo
adequado às necessidades especiais de aprendizagem;
• avaliar continuamente a eficácia do processo educacional para o atendimento de
necessidades educacionais especiais;
• atuar em equipe, inclusive, com professores especializados em educação especial.

Desse modo, a formação dos professores é crucial para lidar com alunos que
apresentem qualquer distúrbio, em especial, a dislexia. Segundo Ellis (2005), eles precisam
62

aprender a elaborar estratégias didáticas diferenciadas (tais como sublinhar, tomar notas ou
realizar resumos), para melhorar a velocidade e acuidade com a qual os indivíduos com
fraca compreensão lêem em voz alta e melhorar o seu entendimento do que lêem.
Setenta por cento dos docentes deixaram de ter oportunidade de estudar sobre a
dislexia na graduação. Por conseguinte, há o risco de terem conduzido suas aulas de maneira
inapropriada para os estudantes que tenham a disfunção. O conhecimento teórico adquirido
na formação inicial sobre a dislexia é fundamental para que o professor saiba lidar, de forma
eficiente, com a situação. Isso porque ele

[...] tem papel fundamental na assessoria do aluno disléxico, para estimulá-lo em


aulas de criatividade, não exigir bom desempenho em aulas muito teóricas, não
ridicularizá-lo nem permitir que seus colegas o ridicularizem por não acompanhar
a classe. [...] Portanto, ao relacionar-se com seu aluno disléxico, o professor deve
tratá-lo com a máxima dedicação. [...] Isso resolveria o problema no ensino de
praticamente todos os indivíduos com distúrbios de aprendizagem (dislexia ou
qualquer outro distúrbio). Porém isso, ao menos em curto prazo, parece ser uma
utopia. (OLIVIER, 2007, p. 71).

100%
90%
80%
70%
60%
50% Escolas 1 e 2
40%
30%
20%
10%
0%
Por meio de Por intermédio No curso de Junto à
leitura de textos de colegas que graduação coordenação
sobre o tema já tiveram e/ou orientação
alunos pedagógica
disléxicos

GRÁFICO 4: Informações sobre dislexia


FONTE: A autora

Na questão do questionário em que perguntamos como as informações a respeito da


dislexia foram obtidas, 90% do total de professores expuseram que ocorreu por meio da
leitura de textos sobre o tema. Como esse item possibilitou que os participantes da pesquisa
marcassem mais de uma alternativa, pudemos saber que 40% só conheceram o distúrbio por
intermédio de colegas, o que leva a crer na falta de instrução que poderia ter sido recebida
na formação inicial. Na escola 2, onde perceberam-se que 75% estudaram em instituição
pública, confirmou-se que o conhecimento foi adquirido, em princípio, na graduação.
63

Ainda que a maioria não tenha estudado o distúrbio na faculdade/universidade,


ninguém aprofundou o conhecimento em cursos de formação continuada no decorrer de
uma década de trabalho em sala de aula. Sendo que 20% dos professores garantiram ter tido
oportunidade de fazer isso junto à orientação pedagógica da escola.

80%

70%

60%

50%
Escola 1
40%
Escola 2
30%

20%

10%

0%
Detectou Não detectou

GRÁFICO 5: Presença de alunos com sintomas de dislexia


em sala de aula, no ensino médio
FONTE: A autora

Quando perguntados sobre a presença de alunos disléxicos no ensino médio,


percebemos que a maioria dos professores da escola 1 (75%) e 50% da escola 2 já
perceberam alunos com sintomas de dislexia em sala de aula. É importante notar que a
metade dos docentes da escola 1 se graduou em instituição pública e que a mesma
quantidade (75%) afirmou ter estudado dislexia na formação inicial.
Entretanto, mesmo aqueles participantes da pesquisa que nunca perceberam a
possibilidade da dislexia em sala de aula, consideram o disléxico um aluno especial. Isso
pode demonstrar que os professores entendem que esse estudante precisa de aulas de
Português conduzidas de forma diferenciada, já que afirmaram que o problema do disléxico
está mais centrado na dificuldade com a leitura e a escrita.
64

60%

50%

40%
Escola 1
30%
Escola 2
20%

10%
GRÁFICO 6 - Retorno do diagnóstico
FONTE:
0% A autora
Não Desconheço SR

GRÁFICO 6: Retorno do diagnóstico


FONTE: A autora

Na escola 2, os professores demonstraram ter mais contato com o serviço de


orientação educacional da escola e garantem que são instruídos a respeito da disfunção
dislexia, logo estariam mais bem preparados para lidar com os adolescentes que apresentam
o distúrbio. No entanto, isso se contradiz com as entrevistas realizadas com os profissionais
do setor de Orientação Pedagógica daquela escola, visto que esses demonstraram
desconhecimento do distúrbio.
A metade dos pesquisados das escolas 1 e 2 afirmou que, quando há a suspeita de
que um aluno seja portador de dislexia no ensino médio e que seja encaminhado para a
realização do diagnóstico, os professores não costumam receber o retorno desse ou do
tratamento ao qual o estudante deva ser submetido. Quarenta por cento do total dos
professores das duas escolas declararam, inclusive, desconhecer tal situação. Tal paradoxo
leva a supor, portanto, que muitos docentes podem até constatar sintomas do distúrbio em
algum aluno, na sala de aula, mesmo no ensino médio, mas podem se sentir descrentes com
as políticas públicas educacionais hoje existentes.
Entretanto, de acordo com a maioria dos questionários respondidos pelos professores
de Português, mesmo que não obtenham retorno dos diagnósticos e do tratamento dos
alunos com dificuldade de aprendizagem que sejam encaminhados à Orientação Pedagógica,
continuam encaminhando outros estudantes a esse setor. Apenas 10% afirmaram que não
encaminhariam novamente.
Essa situação é relevante, ao considerarmos que a falta de retorno do diagnóstico
seria o primeiro fator negativo para o aluno disléxico. Nesse caso, o professor ficaria
totalmente sem respaldo para que pudesse aprofundar seu conhecimento a respeito do
65

distúrbio para flexibilização do currículo escolar e conseqüente inovação das práticas


pedagógicas.
Nesse sentido, segundo Saviani N. (2003), o professor tornar-se-ia mediador entre o
aluno e o conteúdo a ser apropriado. Essa autora critica a função meramente reprodutora da
escola e diz que é preciso formar educador reflexivo, consciente, comprometido
politicamente, capaz de conscientizar os discentes. Para ela, o desenvolvimento cognitivo do
aluno deve servir de base para a estruturação do currículo. Cilene Ribero de Sá Leite Chakur
(apud Saviani N., 2003, p. 85) complementa:

O desenvolvimento do educador, no desenvolvimento do currículo escola, deve


partir da ação. [...] o conhecimento não pode ser transmitido, tem de ser
construído, conquistado. O comportamento manifesto do aluno traz subjacentes
estruturas cognitivas a serem levadas em conta no processo ensino-aprendizagem.
[...] Sem isso a escola pode tornar-se desnecessária e até prejudicial à vida
intelectual do sujeito e às suas atividades práticas.

80%
70%
60%
50%
Escola 1
40%
Escola 2
30%
20%
10%
0%
SR Apreensiva Apática

GRÁFICO 7: Reação dos pais


FONTE: A autora

A literatura ressalta a importância dos pais nos processos de encaminhamento,


diagnóstico e, especialmente, do tratamento de alunos com transtornos de aprendizagem.
Segundo a maioria dos professores participantes da pesquisa da escola 2, a reação dos pais a
respeito de suspeita de dislexia em seu filho, quando comunicada pela escola é apreensiva,
podendo também demonstrar até agressividade, ou apatia em relação ao comunicado. Mas,
na escola 1, percebemos insegurança ou falta de conhecimento a respeito da reação dos pais.
Isso porque 66% dos docentes deixaram os itens para resposta em branco, além de 16%
explicitarem ao lado da questão: “Não sei”.
66

Entretanto, a família é um elemento crucial em todas as etapas da vida do estudante


disléxico ou com qualquer outra dificuldade de aprendizagem. Ela pode possibilitar um
trabalho paralelo ao do professor para superação do distúrbio, e é também quem está
diretamente envolvida no processo de diagnóstico e tratamento do disléxico.

60%

50%

40%
Escola 1
30%
Escola 2
20%

10%

0%
Sim Não Às vezes

GRÁFICO 8: Diferenciação das práticas pedagógicas


FONTE: A autora

Trinta e três por cento dos professores da escola 1 e 25% da escola 2 costumam
diferenciar as práticas pedagógicas ao aluno portador de necessidades especiais no ensino
médio. Isso independe de que o estudante seja disléxico. Logo, num parâmetro geral, os
alunos com dificuldade de aprendizagem podem não ter auxilio adequado na escola por falta
de preparo do professor, o que vai de encontro com o que afirma Shaywitz (2006), ao
ressaltar a importância da individualização do ensino aos disléxicos, além de reiterar que a
aprendizagem deva ser ativa e flexível, com muitas interações entre o aluno e o professor.
67

80%

70%

60%

50%
Escola1
40%
Escola 2
30%

20%

10%

0%
Desconheço Sim Não SR

GRÁFICO 9: Favorecimento das práticas


pedagógicas pela escola
FONTE: A autora

90%
80%
70%
60%
50% Escola1
40% Escola 2
30%
20%
10%
0%
Desconheço Sim Não SR

GRÁFICO 10: Barreiras para implementar práticas


pedagógicas
FONTE: A autora

A metade dos professores da escola 1 diz desconhecer se a instituição de ensino


onde trabalha favorece as práticas pedagógicas ao aluno disléxico no ensino médio, sendo
que 16% deixaram em branco. Por outro lado, na escola 2, 25% marcaram que há apoio da
instituição escolar, contra 75% que responderam não existir.
Nesse contexto, deduzimos que ambas as escolas não favorecem tais práticas, assim
como a diversidade de métodos pedagógicos direcionados aos alunos disléxicos no ensino
médio. Além disso, oitenta e três por cento dos professores da escola 1 desconhecem se
existem barreiras para implementação de práticas pedagógicas que favoreçam a
aprendizagem de alunos disléxicos, no ensino médio e 16% deixaram a assertiva em branco.
Mas, na escola 2, 75% percebem esse problema contra 25% que não.
O exposto demonstra, mais uma vez, o quanto o professor de Português sai da
formação inicial despreparado para lidar com alunos na condição de disléxico. Josso (2004)
mostra a necessidade de o sujeito (o docente) no centro das preocupações sobre o
68

conhecimento e a formação. Além disso, ela diz que o campo da formação de formadores
não pode limitar-se apenas às dimensões técnicas e tecnológicas e necessita de uma
compreensão mais profunda dos processos por meio dos quais as pessoas se formam. Para a
autora,

A busca da identidade, que perpassa as narrativas de formação, leva-nos a pensar


que um dos desafios da formação é pôr em prática a criatividade em todas as
dimensões ao longo de um processo de individualização (significa o processo de
se tornar o ser único, singular, que cada pessoa é, o que não significa ser ‘egoísta’
ou ‘individualista’, mas sim procurar realizar a peculiaridade de seu ser.
(JOSSO, 2004, p. 46).

Vale lembrar, que o parágrafo único da Resolução n° 2 para educação especial


(2001, p 2) ressalta que os sistemas de ensino devem constituir e fazer funcionar um setor
responsável pela educação especial. Acrescenta ainda a necessidade de serem dotados de
recursos humanos, materiais e financeiros que viabilizem e dêem sustentação ao processo de
construção da educação inclusiva.

60%

50%

40%
Escola 1
30%
Escola 2
20%

10%

0%
Sim Não Às vezes

GRÁFICO 11: Distinção do modo e tempo de avaliação18


FONTE: A autora

Enquanto 50% dos professores de Português das duas escolas afirmaram que a
escola onde trabalham não possibilitam distinção no modo e no tempo de avaliações do
estudante disléxico, a mesma quantidade da escola 1 escreveu, por conta própria:
“Desconheço essa situação”, embora não houvesse o item correspondente; além de que 16%
disseram que não sabia responder à questão.
Professores escreveram, também, que a possibilidade de distinção de modo e tempo
de avaliação dos disléxicos “depende muito da atuação do orientador educacional”. Isso

18
Cinqüenta por cento dos professores da escola 1 preferiram escrever as respostas subjetivamente, por conta
própria, o que comentaremos no decorrer da análise.
69

pode revelar certa fragilidade do professor ao se perceber desamparado pela escola para
prestar um atendimento melhor ao aluno portador da disfunção.
Shaytwtz (2006, p.194) reforça a avaliação contínua, “medida tanto pela observação
informal quanto mais formal.” Percebe-se, dessa forma, que além da formação inicial para
aquisição de embasamento para o futuro docente, deve haver um constante aprimoramento
continuado, em que “a responsabilidade deve ser de um professor experimentado ou que
tenha recebido treinamento recente e tenha experiência em métodos científicos para o
ensino da leitura.”

3.1.1 O serviço de orientação pedagógica

O orientador pedagógico da escola 1 trabalha no turno vespertino, dando apoio a 1ª


série do ensino médio, há dois anos. Segundo ele, é muito lento o processo de
encaminhamento, diagnóstico e tratamento de um estudante com sintomas de dislexia. Além
disso, julga que os professores não sejam capazes de reconhecer esse distúrbio no corpo
discente da escola onde atua, ainda que sejam da área de Língua Portuguesa.
Segundo o orientador, nunca houve encaminhamento de alunos com suspeita do
distúrbio pelos docentes, mesmo observando que alguns estudantes persistem em não
aprender a ler ou a escrever. Entretanto, ela justifica que os professores do ensino médio
possuem uma carga horária de 12 a 15 horas semanais, desse modo não teriam tempo para
detectar todos os distúrbios, especialmente a dislexia que é pouco conhecida por eles.
De acordo com Pinto (1994), o apoio pedagógico é imprescindível para os estudantes
cujo rendimento se encontra aquém da média. A autora concorda que, caso haja alguma
falha na aprendizagem, a escola tem de ter condições de fazer o diagnóstico do aluno, e
reconhece que quanto mais cedo o diagnóstico, melhor. Porém a realidade é bem diferente
naquela escola, e quando se consegue detectar algum distúrbio de aprendizagem no
adolescente, segundo o orientador, o caso já se complicara. Daí, de acordo com a autora, o
problema torna-se também emocional, afetando o aspecto psicológico do aluno. “A escola é
inclusiva, mas precisa de preparo”, afirma.
Como é preciso uma bateria de testes para realizar um diagnóstico com os possíveis
disléxicos, e não há profissionais como fonoaudiólogos, psicólogos e neurologistas nas duas
instituições escolares investigadas, nem equipamentos adequados, esses estudantes são
encaminhados ao Compp, para o atendimento até o 3º ano do ensino médio.
70

Os entrevistados dizem que, geralmente, o diagnóstico e o respectivo tratamento são


muito demorados. Um dos orientadores exemplifica ao afirmar que, há um ano, tenta fechar
um diagnóstico de um aluno já repetente da 1ª série do ensino médio com suspeita de
deficiência mental leve, mas não consegue resultado algum. Nessa perspectiva, em mais
dois anos de espera, o aluno, supostamente, já teria concluído o ensino médio, sendo, desse
modo, prejudicado por fatores externos, em virtude da falta de políticas públicas que o
ampare.
Por outro lado, o segundo pedagogo entrevistado da escola 2, nos turnos matutino e
vespertino demonstrou mais desinformação em relação ao tema dislexia, passando,
literalmente, os problemas para os professores e reconhece:

O professor não encaminha porque sabe que o orientador educacional não dá


jeito. Encaminho ao Compp para ser atendido lá quando é deficiência de
aprendizagem. Tem sempre o retorno, mas é muito moroso porque não existem
profissionais suficientes. (PEDAGOGO DA ESCOLA 2).

Na escola 2, o orientador pedagógico, há 12 anos, também não costuma receber


encaminhamento de alunos com sintomas de dislexia. “Nunca, em um ano e meio,
encaminharam disléxico. Tenho certeza de que alunos com dificuldades de aprendizagem
penam e são prejudicados.” Ele afirma que apenas um dos professores de Português fala
sobre sintomas de dificuldade de aprendizagem dos estudantes. “Ele faz um trabalho
paralelo, coletando todos os dados dos alunos com dificuldade”, comenta. Segundo o
orientador, a dislexia nunca foi tema de debate e lamenta que o regimento das escolas
públicas priorizem somente as séries iniciais:

Parar para falar de dislexia é raro, apesar de que a baixa nota e o déficit de
aprendizagem tem a ver com dislexia. A gente fica extremamente solitária. Há
resistência dos profissionais em relação à inclusão. Me sinto impotente. Não
consigo nem atender os regulares, imagine os especiais! A gente é massacrado.
Não consegue ter tempo. É tão complicado! Essa dificuldade é porque tenho de
lidar com os problemas de aprendizagem de alunos de 54 turmas (45/50 alunos
em cada). A escola é boa, mas outros professores não querem vir para cá devido
ao número de alunos. Ninguém quer trocar escola classe por ensino médio por
falta de apoio. Não há suporte nenhum para o ensino médio, então, a qualidade
fica fragmentada. Aqui deveria ter pelo menos 10 orientadores. Me choca muito.
(ORIENTADOR PEDAGÓGIDA DA ESCOLA 2).
71

3.1.2 Os centros de apoio pedagógico: um exemplo

As escolas classes do Distrito Federal (do 1º ao 5º ano) contam com 170 centros de
apoio a alunos da rede pública com dificuldade de aprendizagem. Esses locais de
atendimento estão espalhados nas Regiões Administrativas e no Plano Piloto.
Os alunos das séries iniciais que possuem dificuldades de aprendizagem ou que
tenham sintomas de dislexia são encaminhados pelos professores ou pela orientação
pedagógica. Nesse caso, recebem atendimento imediato, sem burocracias. Isso demonstra
que a existência de políticas públicas viabiliza o processo de atendimento e tratamento do
estudante com problemas de aprendizagem. No entanto, não há nessa política, lei ou regra
que determine o atendimento a disléxicos. Aliás, os membros da equipe formada por um
psicólogo e um psicopedagogo nem sempre conhecem o distúrbio.
Uma experiência singular e inovadora foi iniciada pela equipe da sala de apoio do
Centro de Ensino Médio Ave Branca (Cemab), situado em Taguatinga (DF). Esse
atendimento existe desde 2007 e é o primeiro do DF com o trabalho voltado para educação
inclusiva de alunos do ensino médio. Duas pessoas atendem os estudantes, uma da área de
humanas e outra da área de exatas. A assistência é destinada a alunos de nove escolas
públicas, porém “o disléxico não está incluso nesse apoio. Só com deficiência mental e
física”, diz o entrevistado.
Os alunos especiais são encaminhados à sala de apoio depois do laudo médico.
Durante o atendimento se trabalha com projetos e atividades que desenvolvam as
habilidades do estudante com dificuldades. Se o professor passa um trabalho de pesquisa,
por exemplo, lá os profissionais de educação ajudam a conduzi-lo. O entrevistado afirma:

Às vezes, tiramos dúvidas até mesmo de Português. Quando não sabemos o


conteúdo, chamamos os professores que nos apóiam. Fazemos um trabalho em
equipe. Os alunos são atendidos em turno contrário ao da escola onde estudam.
Há uma aluna especial de 35 anos, que havia 19 que circulava de uma escola para
outra. No entanto, este ano é destaque no 2º ano, só sente dificuldade em
Matemática. (PSICÓLOGO DA SALA DE APOIO DO CEMAB).

3.2 A importância da família

Para Shaywitz (2006, p. 193), a intervenção dos pais é muito importante, pois “a
criança precisa de ajuda antes de fracassar.” O disléxico que recebe ajuda mais cedo pode
72

seguir o mesmo caminho de leitura de seus pares. “As crianças identificadas mais tarde
ressentem-se da falta de prática, que é essencial.”
Entretanto, o orientador pedagógico a escola 2 lamenta que os pais costumam não
ajudar nesse processo. Primeiramente, a escola informa os pais sobre quaisquer deficiências
do estudante, porém, esses apresentam, na maioria das vezes, rejeições: “Meu filho não é
bobo”, afirma o pedagogo.
Conforme o orientador, isso pode ocorrer por falta de instrução ou por preconceito.
Para ele, a participação dos pais, em anos anteriores, era maior que atualmente, “a família
não acompanha mais no ensino médio, acha que o filho já tem maturidade suficiente e não
colaboram devido talvez ao despreparo, e ainda dizem ‘meu filho já tem 17 anos, já falei
com ele para tomar as providências’.” O entrevistado sente que esse tipo de “abandono”
começa a partir do oitavo ano do ensino fundamental, quando o pai passa a “fingir” que não
percebe a situação escolar do filho. Além disso, há resistências e sentem vergonha em
relação aos distúrbios/doenças apresentados pelo estudante, o que os levam a esconder a
realidade do adolescente. Para o orientador, o problema com os pais é cultural, e afirma que,
se eles participassem mais, certamente, o seu trabalho se realizaria com muito mais
eficiência.
O orientador do Compp, por sua vez, citou uma situação em que o aluno disléxico
sentia vergonha porque não conseguia acompanhar a turma, na então 5ª série (atual 6º ano
do ensino fundamental). Contudo, quando a mãe procurou o departamento de orientação
pedagógica, e soube que o filho era disléxico ficou chateada. Sobre isso orientador disse:

Quando os pais têm um nível cultural melhor, percebem logo algum distúrbio, se
não acham que o filho é burro, não pode aprender nunca. Há aqueles que
começam a esconder o filho, e são os que nunca tiveram paciência de sequer ver
o caderno deles. Contudo, outros que encaminham seus filhos ao Compp
costumam dar continuidade ao tratamento. (ORIENTADOR PEDAGÓGICO DO
COMPP).

Os pais costumam dar continuidade ao tratamento até o fim, segundo informação do


Compp. Conforme as entrevistas, se faltam é porque acaba o dinheiro até para pagar ônibus,
pois são pessoas carentes. A maioria que consegue a primeira consulta, em quaisquer
instituições pesquisadas, conclui o tratamento. No HUB, o médico entrevistado aconselha os
profissionais de saúde e de educação a trabalharem de forma que a família possa entender o
que é dislexia,
73

porque, muitas vezes, ela não sabe do que se trata, né! Segundo, você tem que
provar para a família que seu filho tem dislexia e que conseqüências isso pode
trazer para a vida dessa criança ou do adolescente. Na grande maioria das vezes,
há resistência para que se possa encaminhar para o tratamento. Para que o
tratamento seja realizado, você precisa ter apoio da família e a criança precisa ter
apoio dos pais e da escola, né! A família tem de estar orientada até como a escola
tem de proceder, a fim de que se tenha um sucesso, porque o trabalho é um
trabalho em conjunto, é em cima de parcerias. (NEUROLOGISTA DO HUB).

Para o fonoaudiólogo do Compp, não há muita resistência dos pais em relação ao


diagnóstico, porém, às vezes, eles o antecipam antes mesmo de qualquer parecer dos
profissionais.

Acho que falta orientação, principalmente na questão tipo assim, ele tem um
distúrbio de aprendizagem ou tem um déficit de atenção leve ou alguma coisa
assim. Isso os pais não compreendem muito bem. Somente a minoria dos pais não
possibilita a conclusão do tratamento do filho com problema de aprendizagem.
Tem alguns que somem, mas provavelmente já melhorou ou a mãe não tem
dinheiro mais pra vir. Mas, normalmente, eles ficam sim. (FONOAUDIÓLOGO
DO COMPP).

3.3 Instituições de atendimento do aluno com suspeita de dislexia

3.3.1 O Compp: conduta no atendimento

O Centro de Orientação Médica Psicopedagógica (Compp), localizado na Escola


Normal de Brasília, no Plano Piloto, é uma instituição governamental e presta serviços à
demanda da Secretaria da Educação, da Secretaria da Saúde e da Tutelaria da Infância com
respeito aos casos de crianças e jovens com dificuldade de aprendizagem. Os
encaminhamentos de alunos com suspeita de dislexia, normalmente, são apenas de
estudantes do 6º ano ou do 7º ano do ensino fundamental, mas, raramente, do ensino médio.
Porém a equipe de profissionais de saúde do Commp, por iniciativa própria, está
tentando se aperfeiçoar no trabalho com disléxicos de todas as séries e, inclusive, já está
acompanhando palestras de membros da ABD. A instituição está em fase de organização
quanto ao programa e ao horário de atendimento aos alunos com dislexia no “Núcleo de
Dislexia”.
O projeto para o atendimento aos disléxicos começou recentemente, sob a
coordenação de um dos três neurologistas que trabalham no departamento. Estão ocorrendo
reuniões quinzenalmente para discussão e elaboração de um plano de atendimento e
74

tratamento do disléxico desde meados de 2007. Antes, segundo os participantes da pesquisa,


não havia essa preocupação a partir do 6º ano do ensino fundamental; ocorria apenas até o
5º ano.
Quando o aluno é encaminhado ao COMPP, passaria por algumas fases:
1ª) Acolhimento – momento em que um dos profissionais atende ao aluno para
escutar suas queixas e analisar o relatório de encaminhamento, elaborado pelo Setor de
Orientação Pedagógica da escola. Abre-se, então, o prontuário. São distribuídas 10 senhas
por turno para cada área disponível, para marcação de consulta, a partir das 7h da manhã,
pois há agenda específica para cada profissional. “Tem 800 crianças na lista de espera para
psicologia. Tem dia específico para marcação de consulta”, afirma a secretária do Compp.
Um dos neurologistas entrevistados e coordenador do grupo de dislexia, que trabalha há 25
anos no atendimento a alunos com dificuldades de aprendizagem, atende de 10 a 14 pessoas
diariamente, em 20 horas semanais de trabalho.

2ª) Sondagem/diagnóstico – atendimento ao aluno por cada um dos profissionais


competentes para diagnosticar a dislexia. Primeiramente, o estudante é atendido por um
pedagogo que procurará perceber quais são as deficiências de aprendizagem, se o indivíduo
tem problema muito sério de audição ou visão; se possui distúrbios como a disgrafia, a
disortografia, a dificuldade de ler e interpretar ou discalculia (dificuldade na interpretação
de símbolos, números e letras); em seguida, caso haja constatação de distúrbio, o indivíduo
é encaminhado a um dos sete psicopedagos da instituição que, por sua vez, o encaminhará a
um dos neurologistas. Por fim, o fonoaudiólogo entra em campo para juntar os pareceres
dos outros profissionais e chegar a uma conclusão sobre o que realmente provoca a
deficiência de aprendizagem. Caso constate a dislexia, esse profissional prescreve o
tratamento a partir do grau do distúrbio: se está no grau leve, grave ou severo. Assim, todos
os profissionais poderão estar envolvidos no processo ou não, além do psicólogo que tem a
incumbência de observar e tratar os problemas emocionais que normalmente são causados
devido aos constantes fracassos escolares e à perda da auto-estima.
Cada profissional acima, à medida que seja possível, dispõe de, pelo menos, quatro
encontros de uma hora cada, com o aluno que tenha suspeita de dislexia. Segundo o
pedagogo entrevistado, o intervalo entre um encontro e outro depende de disponibilidade de
vaga, e alega que isso ocorre por se tratar de “serviço público”, por não ter pessoal em
número suficiente para atender à demanda.
75

3º) Encaminhamento - depois do diagnóstico concluído, os profissionais de saúde


fazem o relatório dos resultados obtidos e, com base nas leis existentes sobre os direitos do
estudante com deficiência de aprendizagem, expõem recomendações à escola para que
aumentem o tempo para as avaliações e que essas sejam realizadas oralmente; além de que
solicitam que o aluno só lerá em voz alta, em sala de aula, diante da turma, se ele quiser e se
não lhe causar quaisquer constrangimentos.
Depois que o aluno passa pela triagem, os pais também recebem orientações para
facilitar o desenvolvimento do filho. No início, há o encaminhamento dos pais para uma
terapia em grupo junto aos profissionais do Compp, por dois meses, a fim de que saibam
lidar com as dificuldades de aprendizagem do filho. No encontro, são indicados livros sobre
distúrbios de aprendizagem.

3.3.2 O HUB: conduta no Atendimento

O Hospital da Universidade de Brasília (HUB) é uma das instituições públicas que


atende a alunos com sintomas de dificuldade de aprendizagem. Ele também está localizado
no Plano Piloto. Para conseguir atendimento no HUB, em princípio, os pais devem
conseguir marcar a primeira consulta que só ocorre por telefone em dias pré-determinados19.
É sugerido que, em princípio, os pais encaminhem o filho ao ambulatório de
pediatria (mesmo que esse seja adolescente, já que o atendimento é direcionado às faixas
etárias de um a 18 anos) e, dependendo da situação e dos sintomas apresentados, ele será
encaminhado à neurologia.
Mesmo que os professores da rede pública de ensino encaminhem alunos com
dificuldade de aprendizagem ou com sintomas de dislexia para o HUB, em vez do Compp,
não é possível que os estudantes tenham prioridade. Conforme o neurologista participante
da pesquisa:

São apenas três neurologistas no hospital. A gente tem aí em torno de 300 a 400
crianças na lista de espera, aguardando atendimento. Normalmente, esses
pacientes, quando conseguem se engajar no ambulatório, é um paciente que vai
ficar muito tempo. Às vezes, pegamos uma criança de seis anos e ela vai ter o
tratamento até os dezoito ou dezenove anos. O difícil é chegar ao primeiro
atendimento. Entrou na primeira consulta, certamente vai continuar seguindo, a
não ser que ele desista. Aqui tem uma norma, se a criança faltar três consultas
consecutivas, ela já é desligada do programa. (NEUROLOGISTA DO HUB).

19
A entrevista ocorreu em 26 de março de 2008, quando foi constatado que a próxima marcação para triagem
seria somente no dia 26 de maio. A última marcação aconteceu em 26 de fevereiro do mesmo ano.
76

A administração do HUB, segundo o entrevistado, não possibilita cursos de


atualização na área de dificuldade de ensino-aprendizagem, especialmente, a dislexia. Por
outro lado, segundo esse mesmo profissional, esse distúrbio faz parte da investigação dentro
da neurologia, visto que, na UnB, existe um núcleo de pesquisa em desenvolvimento
neurocomportamental da criança e do adolescente, e uma das linhas de pesquisa é o
distúrbio de aprendizagem, em que está inserido, indiretamente, a dislexia, “mas não como
uma subespecialidade, faz parte do universo do atendimento neurológico infanto-juvenil da
universidade”, garante o médico. Dessa forma, ele admite que não exista pesquisa
necessariamente a respeito da dislexia, “só de distúrbio de aprendizagem de modo geral”.

Aqui pra nós, não. Estamos num hospital-escola, né? Nós somos professores e
pesquisadores e a gente vai atrás, atualizando. A gente tem um núcleo de pesquisa
na Faculdade de Medicina, mas dizer que há incentivo financeiro ou alguma coisa
assim, não. (NEUROLOGISTA DO HUB).

3.3.3 O atendimento nas duas instituições públicas de saúde

A dificuldade de um estudante da rede pública de ensino de Brasília ser atendido


pelos profissionais de saúde é o primeiro obstáculo a ser enfrentado pelo disléxico e seus
familiares. O problema não fica restrito ao Compp, constata-se que hospitais públicos, como
o HUB, também dispõem de poucos profissionais e equipamentos para tanta demanda, além
da demora no atendimento.
O CNE/CEB Nº 2, de setembro de 2001, no parágrafo 1º, diz que as classes
hospitalares e o atendimento em ambiente domiciliar devem dar continuidade ao processo
de desenvolvimento e ao de aprendizagem de alunos matriculados em escolas da Educação
Básica, contribuindo para seu retorno e reintegração ao grupo escolar e facilitando seu
posterior acesso à escola regular. Além disso, no artigo 14, lêem-se:

Os sistemas públicos de ensino serão responsáveis pela identificação, análise,


avaliação da qualidade e da idoneidade, bem como pelo credenciamento de
escolas ou serviços, públicos ou privados, com os quais estabelecerão convênios
ou parcerias para garantir o atendimento às necessidades educacionais especiais
de seus alunos, observados os princípios da educação inclusiva. (BRASIL, 2001).

Para a mãe de uma criança com dificuldade de aprendizagem (com hiperatividade)


de 11 anos, que está no 4º ano do ensino fundamental, o que demorou, no Commp foi
77

somente a 1ª consulta. “Quase tive que dormir na fila, a equipe aqui é muito boa. Ficamos
esperando um ano e meio. Então, a escola de minha filha teve de pedir um ofício ao
Conselho Tutelar, pedindo uma consulta”, a mãe desabafa. Segundo ela, a filha já chegou ao
Compp com o diagnóstico realizado no Hospital do Gama. “Foi fácil, pois já tinha o
encaminhamento da escola, então foi rápido. Ela tem melhorado bastante em um ano”,
afirma.
Os profissionais de saúde entrevistados afirmam que os pais costumam acompanhar
a criança até o fim do tratamento. Mas, às vezes, as crianças é que não querem, pois
mostram resistência por achar que não têm “doença” nenhuma.
Olivier (2007, p. 68) mostra a importância de o professor e o pai estarem atentos
para que possam encaminhar o indivíduo com características disléxicas o quanto antes para
a avaliação psicopedagógica. Segundo a autora que, atualmente aprofunda seus estudos em
neuropsicologia, “quanto antes for iniciado o acompanhamento, melhores serão os
resultados”.
Por outro lado, a segunda mãe entrevistada leva o filho de oito anos, 2º ano (ensino
fundamental), estudante da Fundação Bradesco, ao Compp desde maio de 2007. Segundo
ela, não foi fácil, pois já teve de dormir no estacionamento da instituição por quatro vezes
para marcar as primeiras consultas.
Segundo essa mãe, se tivesse que pagar pelas consultas não teria condição
financeira, pois tem dois filhos para criar, além de ter de pagar o aluguel. “Meu marido
ganha R$ 480 por mês. Uma psicopedagoga em Taguatinga queria me cobrar R$ 180 só
para a consulta. Aqui meu filho já fez 10 sessões com psicopedagoga e neurologista”. No
caso dessa mãe, o filho foi encaminhado, primeiramente, ao psicopedagogo e ao
neuropediatra.

Aí dormi novamente para conseguir a consulta. A neuro encaminhou para a fono


e dormi de novo na fila, vim em novembro, para marcar a consulta. Se não
dormir não consegue não. Toda vez que cheguei à meia noite ainda peguei senha
16 ou 18 e, no dia da marcação, só tinha 20 vagas. Mas depois que a gente entra é
ótimo, os profissionais são excelentes, dedicados e carinhosos. Ele (o filho), no
primeiro bimestre estava ruim, mas só tem melhorado. Mas, a mãe tem de ter
vontade e garra [...] tem melhorado cada dia mais. (MÃE DE ALUNO COM
DEFICIÊNCIA DE APRENDIZAGEM).

Muitos pernoitam fora da instituição para conseguir uma senha, mas, depois que o
tratamento é agendado, o estudante permanece em terapia. A partir daí, o atendimento é
78

seguido à risca, conforme informações de pais de indivíduos com transtornos de


aprendizagem que fazem tratamento no Compp.
Um dos profissionais dessa instituição justifica a situação. Ele diz que, em caso,
principalmente de dislexia, em que a pessoa tem de fazer um tratamento que envolve pelo
menos quatro profissionais, é necessário que haja uma nova marcação de consulta e isso
exige muito tempo.

Às vezes, uma mãe ou pai precisa esperar até um ano para conseguir uma data
para a primeira consulta. Tem menino que está até dois anos esperando. Estamos
tentando uma coisa mais ágil. Só que nesta época (se referindo ao mês de Natal)
tá muito difícil. Queremos fazer um convênio. Estamos tentando parcerias com
hospitais públicos do Distrito Federal para viabilizar tratamento de disléxicos,
mediante atendimento com otorrinos e oftalmologistas, caso haja necessidade.
(PROFISSIONAL DO COMPP).

3.3.4 O diagnóstico e o tratamento da dislexia

O neurologita do Commp diz que os exames feitos por ele só servem como
referência em relação à conclusão do diagnóstico. Alega que essa parte é de
responsabilidade do psicólogo e do fonoaudiólogo, o que difere do neurologista do HUB,
que afirma que a etapa decisiva do diagnóstico para detectar se o aluno é ou não disléxico
cabe aos médicos do ambulatório de neurologia. Nesse caso, percebe-se a falta de consenso
entre os dois profissionais que possuem a mesma formação e lidam com os mesmos
problemas de saúde.
No entanto, reiteramos que a equipe do Compp iniciou, desde o ano passado, um
grupo de pesquisa e discussão a respeito da dislexia para tentar eliminar as lacunas. “Muitas
crianças ficavam sem diagnóstico específico. Daí, neste ano, surgiu a idéia do projeto do
“grupo de dislexia”, comenta um dos fonoaudiólogos entrevistados. Porém, ele alega que a
quantidade de profissionais não é suficiente e reclama da falta de políticas que favoreçam a
capacitação dos profissionais de saúde da instituição para realização mais precisa de
diagnóstico e tratamento do distúrbio:

Estamos pensando em fazer curso sobre dislexia na ABD. É coisa de interesse


da’gente, mas a gente não tem incentivo nenhum do governo. Quanto ao espaço
físico, a gente dá um jeito, espaço bom não tem não. A gente já tentou ver se tem
alguma lei. A gente não tá vendo respaldo concreto da Secretaria da Educação.
(FONOAUDIÓLOGO DO COMPP).
79

Nesse sentido, o fonoaudiólogo lamenta nunca ter tido apoio do governo ou da


instituição para fazer cursos de capacitação, especialmente, sobre dislexia, e acrescenta:

Aqui, se a gente vai fazer curso, a gente paga o dia com reposição. No ano
passado aconteceu isso, fui fazer um curso de processamento, que é com o que eu
trabalho aqui dentro, pagando do meu bolso, e ia só pegar a sexta à tarde, e tive
que repor o dia. Mas, isso é muito de órgão pra órgão, assim não é a Secretaria, é
o Compp. (FONOAUDIÓLOGO DO COMPP).

Cada profissional envolvido no diagnóstico e tratamento da dislexia procura


identificar sintomas que levem a alguma dificuldade de aprendizagem específica, para em
seguida, continuar encaminhando a profissionais de outras especialidades. O fonoaudiólogo
entrevistado afirmou:

Se a gente identifica alguns problemas que [...], por exemplo, se tem um na idade
um pouquinho mais avançada tipo oito, aí não lê, aí a gente começa a encaminhar
para as outras áreas, aí encaminha para a pedagogia, encaminha para
psicopedagogia, aí a gente vai encaminhando. Como agora a gente tá começando
com o grupo de diagnóstico de estudo de disléxico, a gente leva o caso para o
grupo. Aí, no caso, vai passando por vários profissionais. Quando não tinha esse
grupo, a gente fazia esse encaminhamento assim, para um para outro.
(FONOAUDIÓLOGO DO COMPP).

Visto que o “Núcleo de Dislexia” está apenas em formação no Compp, entendemos,


com o depoimento acima, que a criança e o adolescente disléxico fica a mercê da sorte para
receber o diagnóstico, já que cada profissional joga essa responsabilidade para o outro.
Quando questionado sobre quem dava o parecer sobre dislexia, o fonoaudiólogo respondeu
“Nunca a gente, quase nunca assim, eu pelo menos nunca fechei um diagnóstico: é
disléxico, não é disléxico”, o que demonstra a total insegurança e desconhecimento em
relação ao distúrbio. Ao informá-lo de que outros profissionais disseram que o
fonoaudiólogo ou o neurologista seriam os responsáveis pelo fechamento do diagnóstico,
ele ressaltou que, quanto ao diagnóstico, ele nunca fechou sozinho, pois quem faria isso
seria o pedagogo ou o neurologista. “Agora que a gente tá começando uma coisa mais
específica, entendeu? Porque entrou a neuro também, né? Então, depois que faz o
diagnóstico para ter o acompanhamento, aí depende, eu acho que é fono e pedagogo”, disse
inseguramente.
Em termos de equipamentos, segundo os entrevistados do Compp, são suficientes,
mas percebe-se que deixam a desejar e que há descrença em relação à situação atual. Além
disso, o espaço físico não supre as necessidades da instituição e dos profissionais de saúde.
O fonoaudiólogo entrevistado conta que
80

A gente tem audiometria, tem aparelhagem, cabine, tudo, mas não está montada
porque a gente não tem o local. Se tivesse esse aparelho a gente faria também o
exame de processamento auditivo que é uma coisa que a gente pode fazer o peso
e um contrapeso. Ele tá com dificuldade, mas ele processa muito mal o que
escuta, então a leitura também vai estar prejudicada. Aqui, também, nós estamos
aqui de favor, nosso lugar era lá (ela se refere ao antigo espaço do Compp na Asa
Norte). Bom, seria ótimo ter produtos de última geração, mas isso seria inviável.
(FONOAUDIÓLOGO DO COMPP).

O psicopedagogo participante da investigação, que trabalha no Compp, desde 1999,


com os ensinos fundamental e médio (zero a 18 anos incompletos) afirma já ter atendido
alunos do ensino médio com sintomas de dislexia, porém diz:

Não ouso fechar o diagnóstico, deixo para o fonoaudiólogo ou o neurologista.


Apenas indico que há suspeita de dislexia. Mas, a fono é mais preparada para
isso. Estou colocando isso por minha vivência. Nesse tempo todinho, eu diria que
seriam uns 10 com sintomas fortes de dislexia. Houve um menino de 11 ou 12
anos com suspeita de dislexia, não passou da 2ª série e foi para a aceleração que
nada adiantou, mas a fono não considerou. O nível mental era mediano, não tem
diagnóstico até hoje, só fechou como transtorno de desenvolvimento de
aprendizagem por falta de conhecimento do que realmente o aluno tinha, por falta
de um nome específico, usamos essa expressão. Eu sei que a mãe teve que se
virar, pelo menos aluno da rede oficial de ensino de 1ª a 4ª série tem apoio.
(PSICOPEDAGOGO DO COMPP).

Nesse caso, é importante ficarmos atentos à fala de Pinto (1999). A autora afirma que
a criança a qual lê devagar e abusando das pausas pode ser em virtude da sua pouca prática
de leitura. Logo, não deve ser designada como disléxica, aleatoriamente. Da mesma forma,
ela diz que não se devem chamar disléxicos adultos que lêem em voz alta com muita
dificuldade, em conseqüência de uma escolaridade muito reduzida. Assim, Pinto ressalta a
necessidade de conhecer muito bem as produções dos indivíduos em estudo antes de se
adotar uma denominação. E, segundo ela, se se tratar de uma perturbação acentuada da
leitura, será pertinente analisar qualitativamente os erros encontrados.
Para o psicopedagogo, a questão não é só a formação dos profissionais do Compp, e
alega, nesse caso, que o tema dislexia é confuso. Ele expõe que

A equipe ficou batendo a cabeça para determinar o CID (Classificação


Internacional de Doenças). Não existe número específico, não existe a expressão
dislexia para o CID. Para as deficiências mentais, tem números específicos que
determinam a doença. (PSICOPEDAGOGO DO COMPP).

A partir dessa exposição, percebe-se que a formação inicial desse profissional


poderia ter proporcionado uma melhor reflexão em torno dos distúrbios como a dislexia. O
81

psicopedagogo deveria entrar no mercado de trabalho seguro acerca de todos os problemas


que geram dificuldade de aprendizagem.
Massi (2007) se refere ao “Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais”
(DSM IV), 2000, que reconhece a dislexia, sob o código 315.00, como dificuldade de leitura
e escrita especificamente relacionada à infância e à adolescência. Além disso, a autora
enfatiza que a “Classificação internacional de doenças” (CID 10), passou pela décima
revisão, contando com a participação de 43 países, convocados pela Organização Mundial
de Saúde e realizada em Genebra, em 1989. Logo, consagra a dislexia sob o código F81.0,
como um “transtorno específico de leitura”20. De acordo com tal documento, a dislexia teria
as seguintes características:

[...] um comprometimento específico e significativo no desenvolvimento das


habilidades da leitura, o qual não é unicamente justificado por idade mental,
problemas de acuidade visual ou escolaridade inadequada. A habilidade de
compreensão de leitura, o reconhecimento de palavras na leitura, a habilidade de
leitura oral e o desempenho de tarefas que requerem leitura podem estar todos
afetados. Dificuldades para soletrar estão freqüentemente associadas a transtorno
específico de leitura e muitas vezes permanecem na adolescência, mesmo depois
de que algum progresso na leitura tenha sido feito [...] Crianças com transtorno
específico da leitura seguidamente têm uma história de transtornos específicos do
desenvolvimento da fala e da linguagem, e uma avaliação abrangendo
funcionamento corrente da linguagem muitas vezes revela dificuldades
contemporâneas sutis. Em adição à falha acadêmica, comparecimento escolar
deficiente e problemas com ajustamento social são complicações assíduas,
particularmente nos últimos anos do primário e do secundário. A condição é
encontrada em todas as linguagens conhecidas, mas há incerteza se a sua
freqüência é afetada ou não pela natureza do manuscrito. (ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DE SAÚDE, apud MASSI, 2007, p. 47-48).

Os dois documentos supracitados caracterizam a dislexia e a aceitam como uma


patologia que se apresenta assim que um aluno começa a ler e a escrever. Contudo, Massi
(2007) alerta que se deve ter cuidado ao utilizar essas classificações oficiais, já que o DSM
IV procura explicitar fatores causais para o que entende como dislexia, com base em
anormalidades no processamento cognitivo. Segundo a autora (2007, p. 49-50) “esse
enfoque não encontra evidências capazes de sustentar suas hipóteses;” e a CID 10 supõe que
transtornos na fala podem preceder problemas na escrita. Com isso, para Massi, parece que
desconsideram que a escrita diferencia-se da oralidade.
Mesmo assim, o pedagogo entrevistado, que trabalha no Compp há cinco anos,
ratifica a dificuldade de se conceber um diagnóstico preciso de dislexia. Segundo ele, às

20
Usa-se essa expressão para explicitar o fato de a dislexia não estar vinculada a qualquer etiologia, como
retardo mental, traumatismo ou doença cerebral, falta de oportunidade de aprendizagem, transtorno afetivo,
deficiência visual, entre outras.
82

vezes, dizem que é “Transtorno Especificado do Desenvolvimento das Habilidades


Escolares não Especificado”. “Preferem esta nomenclatura, porque ficam com medo de
bater o martelo. E, se não for?” Um dos pedagogos entrevistados afirma que, no Compp,
não faz distinção dos distúrbios. Nesse caso, conforme Caetano (1993, p.82), ainda que essa
categoria precise ser evitada,

[...] deve ser usada apenas para transtornos não especificados nos quais há uma
incapacidade de aprendizado que não pode ser justificada unicamente por retardo
mental, problemas de acuidade visual ou escolaridade inadequada. Inclui:
incapacidade de aquisição de conhecimento; incapacidade de aprendizagem;
transtorno de aprendizagem. (PEDAGOGO DO COMPP).

Assim, observamos a lacuna devido à falta de lei específica que consagre a dislexia,
especialmente, em se tratando de estudantes do ensino médio, para que seja possível
viabilizar o encaminhamento, o diagnóstico e o tratamento com mais eficiência e rapidez. O
pedagogo do Compp confirma isso, ao dizer:

A gente não tá treinado para fazer este tipo de trabalho. Na verdade, a rede
pública tem a mesma dificuldade que nós. As Secretarias de Educação não estão
preparadas. Já fui coordenadora desses núcleos no Buriti, não estamos preparados
e não temos nenhuma proposta no atendimento. Tudo com dificuldade de
aprendizagem, quando surgem dúvidas mandam para nós. O que está bem
estruturado é esse atendimento da parte pedagógica por meio dos núcleos. Falta
embasamento. Na hora em que começar a conhecer melhor vai ter a suspeita e a
segurança de fechar o diagnóstico. (PEDAGOGO DO COMPP).

Massi (2007, p.146) ressalta que as avaliações propostas para diagnosticar a dislexia
são, muitas vezes, “inconsistentes”. Para ela, os procedimentos de avaliação apresentados
em manuais que abordam essa suposta patologia não avaliam a escrita, por pautarem em
tarefas descontextualizadas e fragmentadas, por desconsiderarem as ações dos sujeitos e da
própria linguagem. A autora mostra que os indivíduos não se relacionam com um código
abstrato. De acordo com ela, os disléxicos não codificam e decodificam estruturas acabadas,
por isso,

[...] o professor, o fonoaudiólogo, o psicólogo, o médico ou qualquer profissional


diante de crianças ou adultos que estão se apropriando da leitura ou da escrita
devem considerar que esses sujeitos têm suas histórias de vida situadas em um
meio social. (MASSI, 2007, p. 66).

Santuário (2002, pp. 421-422) reforça a idéia de Massi ao dizer que a linguagem
realiza o efetivo acontecer hermenêutico não enquanto confinada ao estatuto reducionista de
83

gramática ou léxico, mas na atividade de deixar vir à fala a presença da tradição,


adequadamente interpretada. Assim, no caso de diagnóstico de dislexia, seria necessário que
os profissionais de educação e de saúde levassem em consideração que “A palavra que
produz e permite o vir à tona da interpretação é a palavra do intérprete e não a imanência
gramatical do texto interpretado.”
O participante da entrevista do HUB, professor/doutor em neurologia, trabalha há 12
anos como médico do hospital e professor da pós-graduação da Universidade de Brasília
(UnB) das disciplinas: Crescimento e Desenvolvimento, a de Pediatria Clínica, a de
Neurofisiologia Clínica e a Residência Médica. O médico afirmou que, nesse hospital, não
há atendimento específico para dislexia. Há atendimento em um ambulatório assistencial
para crianças e adolescentes com quaisquer distúrbios de aprendizagem, em que se
considera a dislexia, o déficit de atenção, a hiperatividade, a epilepsia, os transtornos
ortótipos etc. O neurologista afirma:

Aqui temos um atendimento especial ao adolescente com dificuldades de


aprendizagem, em encontro mensais. Talvez aqui no HUB seja o único serviço no
Brasil que tenha um atendimento neurológico diferenciado para o adolescente,
um ambulatório próprio para o adolescente. (NEUROGISTA DO HUB).

Existe, no HUB, o laboratório de neurologia neonatal que atende às pessoas de zero


a um ano de idade; de atendimento neurológico ao pré-escolar que vai de um ano até cinco
anos; ao escolar de cinco a dez anos; e o atendimento ao adolescente de 10 a 18 anos. O
atendimento é gratuito. Em princípio, o paciente é avaliado pelo pediatra. Se esse
profissional chega à conclusão de que o paciente precisa de um parecer de um neurologista,
automaticamente, é encaminhado para esse setor. A partir daí, tenta-se encaixá-lo na
agenda.
Então, é realizada uma avaliação neurológica para fazer um diagnóstico de exclusão.
“Em torno de 5 % da população do atendimento aqui de nossos pacientes são de dislexia. É
um número considerável, porque os que chegam pra gente já são pacientes triados, não são
de ambulatório geral, já são pacientes encaminhados”, afirma o neurologista participante da
pesquisa.
Massi (2007, p. 123) defende esse ponto de vista de ‘exclusão’ ao dizer que a
dislexia não tem uma via explicativa ou descritiva capaz de caracterizá-la com base em
alterações em processos lingüísticos e, menos ainda, capaz de relacioná-la a lesões
neurológicas. “Os testes-padrão se prestam a encaminhar, no máximo, um diagnóstico
84

classificatório”, ressalta a autora. Nesse sentido, o participante da pesquisa teria razão em


afimar:

A gente vai atrás de uma disfunção orgânica, porque a dislexia é um diagnóstico


de exclusão. Você tem de afastar várias outras possibilidades que podem ter um
quadro semelhante à dislexia e não ser, como por exemplo, o transtorno de déficit
de atenção, alguns tipos de epilepsia. Então, fechamos o diagnóstico apenas com
a avaliação neurológica, em seguida, é que se encaminha a criança ou o
adolescente ao fonoaudiólogo ou psicopedagogo. A gente não trata a dislexia
porque não tem uma medicação, mas tem-se de fechar o diagnóstico médico.
(MASSI, 2007, p. 123).

O tratamento, no HUB, é realizado por etapas. Depois de os neurologistas


constatarem que o indivíduo é disléxico, esse é encaminhado para o fononoaudiólogo e para
o psicopedagogo, caso seja necessário. Porém, isso se contradiz ao que sugere Olivier
(2007) ao dizer que antes de fechar o diagnóstico de um distúrbio, é necessário avaliar
muito bem todos os sintomas, realizar exames e ouvir outras opiniões. Conforme a autora,
quando detectadas as características típicas do disléxico, a primeira providência

[...] é encaminhá-lo a um psicopedagogo que é (ou deveria ser) um profissional


preparado para analisar um paciente dos pontos de vista físico e orgânico,
psicológico e mental e fatores ambientais e externos. Somente após analisar todos
esses fatores, é que se pode pensar em diagnosticar um distúrbio. (OLIVIER,
2007, p.67).

Segundo Olivier (2007), o psicopedagogo avaliará o paciente para detectar distúrbios


fonoauditivos, que exigirão encaminhamento a um fonoaudiólogo e a um otorrino. Caso
haja deficiência na visão, poderá ser indicado um oftalmologista. Além disso, afirma que a
pessoa que tenha sintomas de dislexia deve ser encaminhada a um neurologista para que se
tenha precisão no resultado do diagnóstico. Olivier alerta que, só depois de obter o resultado
de todos os exames necessários, é que será verificado se realmente há a dislexia, unindo
todos os profissionais citados (se for o caso) em um processo de tratamento e, em alguns
casos, re-alfabetização do indivíduo.
Já que o diagnóstico da dislexia, no HUB, é clínico, não é possível precisar o tempo,
mas é demorado porque, às vezes, solicitam-se alguns exames que dependem de
ambulatórios de outros setores do hospital. “Normalmente o eletro se consegue rápido, mas
de outras áreas não”, afirma o entrevistado.
O médico ainda diz que, não existe um aparelho que possa constatar a dislexia.
Segundo ele, há apenas equipamentos que afasta outras possibilidades. Embora o
neurologista lamente ainda não ter um exame neurológico preciso para detectar a dislexia,
85

há divergências na área neurológica quanto ao diagnóstico definitivo e irrefutável. Shaywitz


(2006), por exemplo, mostra que hoje já é possível, por meio de ressonância magnética,
identificar pontos específicos do cérebro que são utilizados por uma pessoa disléxica, na
hora da leitura:

Os estudos feitos a partir das imagens cerebrais identificaram pelo menos dois
caminhos neurais da leitura: um para quem está começando a ler e para a
verbalização lenta das palavras e outro, mais rápido, para quem já lê bem.
Segundo, porque o exame cuidadoso dos padrões de ativação cerebral revelou
uma falha nesse circuito para os leitores disléxicos. Estudos realizados no mundo
inteiro não deixam dúvida de que os leitores disléxicos usam caminhos cerebrais
diferentes. (SHAYWITZ, 2006, p. 70).

Há, dessa forma, conforme Shaywitz (2006), três caminhos neurais para a leitura,
sendo dois mais lentos e analíticos: o parietotemporal21 e o frontal22; e uma rápida, a
occipitotemporal23, que identificam as palavras instantaneamente. Além disso, os bons
leitores, quando lêem, ativam a parte superior do cérebro e, até certo ponto, a parte anterior.
Por outro lado, os leitores disléxicos demonstram uma falha no sistema que, segundo a
autora, trata-se da subativação de caminhos neurais (a marca neural da dislexia) na parte
posterior do cérebro. Ou seja, o leitor “normal” ativa sistemas neurais que estão, em sua
maioria, na parte posterior esquerda do cérebro, enquanto o leitor disléxico ativa sistemas do
lado direito e na parte frontal esquerda do cérebro.
A falha nos sistemas posteriores impede o reconhecimento rápido e automático das
palavras. Entretanto, o desenvolvimento do lado direito (e da parte anterior), como sistema
auxiliar, segundo Shaywitz (2006), permite que haja uma leitura precisa, ainda que muito
lenta. “Esses leitores disléxicos têm de depender de um sistema ‘manual’ em vez de um
sistema automático de leitura”, afirma.
Ellis (1995) já antecipava as idéias expostas por Shaywitz (2006) ao dizer que, nos
disléxicos profundos, a maior parte do hemisfério esquerdo foi completamente destruída e
que as capacidades residuais de leitura são mediadas pelo hemisfério direito da pessoa
(considerado não-verbal). Porém, segundo Ellis, nesse lado do cérebro se pode abrigar
certas habilidades limitadas de linguagem em alguns indivíduos, o que justificaria, por outro
lado, a alta capacidade criativa os indivíduos disléxicos.

21
Parte do cérebro responsável pela análise das palavras.
22
Parte do cérebro responsável por atribuir forma às palavras, utilizada principalmente por leitores iniciantes.
23
Parte do cérebro responsável por atribuir forma às palavras, utilizada principalmente por leitores
experientes.
86

O ideal para o diagnóstico da dislexia é que ocorra depois que completa o ciclo de
alfabetização, em torno do 3º ano do ensino fundamental (quando já se pode perceber se os
primeiros sinais da disfunção ainda persistem: a troca de letras, de sílaba, acréscimo ou
subtração de sílaba, caligrafia ininteligível) mesmo com acompanhamento escolar
adequado. O neurologista entrevistado disse que essa é uma época em que as informações
chegam ao cérebro para que sejam armazenadas na memória. Uma criança disléxica nessa
fase, por exemplo, terá esse armazenamento aquém de seus pares, de forma imprópria para a
faixa etária, e vai levando o problema por toda sua vida. Desse modo, o entrevistado alerta
que esse “descuido” pode gerar problemas também para estudantes a partir de séries mais
avançadas:

Quando essa criança chegar lá no ensino médio e precisar dessas informações


básicas, às vezes, ela não vai ter, ou vai ter de uma forma incompleta. Aí começa
o grande problema, então, o ideal é que a dislexia fosse diagnosticada no ensino
fundamental, após o quarto ano. (NEUROLOGISTA DO COMPP).

De acordo com o exposto, constatamos que tanto o Compp quanto o HUB não
priorizam o atendimento a alunos da rede pública de ensino. Ambos possuem equipes
competentes, porém despreparadas para lidar com a dificuldade de aprendizagem provocada
pela dislexia, ainda que haja boa vontade dos profissionais. Além disso, a viabilidade de
atendimento é muito morosa, levando o estudante e a família a um possível desgaste físico e
psicológico.
Além disso, essa situação seria desestimulante para o professor do respectivo aluno,
visto que, se se chega a detectar os sintomas de dislexia e faz o encaminhamento para o
diagnóstico e tratamento, sequer consegue obter um resultado. Como a pessoa encaminhada
precisa de aproximadamente um ano para conseguir uma consulta, o ano letivo,
conseqüentemente, já teria finalizado e o problema persistiria nas séries seguintes, caso os
próximos professores não dessem a mesma atenção à disfunção. Isso poderia ser, também, a
causa de os docentes e orientadores pedagógicos deixarem de encaminhar outros alunos.
87

CAPÍTULO IV. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho visou identificar estratégias para uma política educacional que
atenda a estudantes disléxicos no ensino médio. A partir da investigação realizada,
constatamos as lacunas existentes e, por meio das entrevistas individuais e dos
questionários, elaboramos as estratégias que podem ser benéficas.
Assim, ao contrário do que se imaginava no início da pesquisa, o professor do ensino
médio e a respectiva escola onde atua não estão diretamente relacionados aos processos de
diagnóstico e tratamento da dislexia no ensino médio ou mesmo no fundamental. As duas
instituições contam com orientadores pedagógicos, mas não dispõem de equipamentos e
equipe de profissionais capacitados que possam realizar o diagnóstico de dislexia ou de
quaisquer outros transtornos de aprendizagem.
A diferença na aquisição de conhecimento desses estudantes pode ser percebida em
sala de aula, mas é raro um docente encaminhá-los para exame e tratamento. No máximo,
percebem a dificuldade do aluno ao realizar tarefas escolares, então, sugerem o centro de
atendimento, Compp, fora do espaço escolar, onde visitamos e conhecemos como são feitos
os procedimentos. Porém, muitas vezes, os professores se precipitam em antecipar o
diagnóstico de dislexia, sem saber por certo do que se trata, rotulando o aluno e causando
mais problemas a ele.
Foram perceptíveis, nas respostas dos professores de Português, ao questionário de
pesquisa, que a escola não possibilita implementação de práticas pedagógicas que
favoreçam a aprendizagem do disléxico. Porém a culpa não está centrada no docente. Talvez
isso ocorra porque ele, geralmente, desconhece o distúrbio, logo não sabe como agir com
aquele aluno em sala de aula, embora possa ter intenção de ajudá-lo.
Por outro lado, no caso de encaminhamento, percebemos, por meio das respostas ao
questionário, que os docentes sequer obtêm respostas do diagnóstico em tempo hábil (no
mesmo ano), para que possam elaborar práticas pedagógicas que favoreçam os alunos com
deficiência de aprendizagem. E, se o distúrbio for dislexia, é ainda pior, pois, normalmente,
o Compp, único órgão específico de amparo às escolas de ensino médio, raramente fecha o
diagnóstico como dislexia. Desse modo, o professor não poderia especificar atividades que
88

atendam às necessidades desse aluno mesmo que tivesse recebido instruções na formação
inicial, sobre como lidar com estudantes disléxicos.
A dislexia é um fator que pode desencadear problemas de aprendizagem nos
estudantes tanto do ensino fundamental quanto do médio. Entretanto, caso esse distúrbio
seja diagnosticado precocemente e tratado com os profissionais de saúde em conjunto com
os de educação, a família e a comunidade, pode deixar de representar um risco à vida
acadêmica desses alunos.
Observamos, a partir das informações colhidas junto aos professores de Português
das duas escolas pesquisadas e dos depoimentos dos profissionais de educação e de saúde,
que há um desconhecimento muito grande acerca da dislexia. Além disso, a maioria dos
participantes demonstrou que não sabe diferenciar, com precisão, a dislexia de outros
distúrbios de aprendizagem. Constatamos ainda que, quando o estudante chega a ser
encaminhado para fazer o diagnóstico pode ser por apresentar pouco rendimento. E, muitas
vezes, o aluno pode apenas estar precisando recuperar conteúdos mal ministrados no ensino
fundamental. Enquanto o disléxico fica à mercê da sorte.
Os docentes, no máximo, percebem a dificuldade do aluno ao realizar tarefas
escolares, então, encaminham-no aos centros de atendimento (no caso de ensino médio, ao
Compp) fora das escolas. Muitas vezes, ainda se precipitam em antecipar o diagnóstico de
dislexia, sem saber por certo do que se trata, rotulando o aluno e causando mais problemas a
ele.
Também se chega à conclusão de que há urgência da necessidade de elaboração de
lei específica no Distrito Federal, que ampare o disléxico, aluno do ensino médio da rede
pública de ensino, de forma mais direta e precisa. Nesse sentido, já houve, no ano passado, a
iniciativa de um projeto de lei nº 1061, de 2004, do deputado distrital Rubens César Brunelli
Júnior, que “cria o Programa de Identificação e Acompanhamento da Dislexia” (PIAD), na
rede pública de ensino do Distrito Federal e dá outras providências. Embora, nessa região,
haja instituições que já atendem alunos do ensino médio, da rede pública de ensino, com
dificuldade de aprendizagem, há poucos profissionais e, ainda menos, que entendam com
profundidade e segurança o distúrbio dislexia. Por outro lado, são poucos pais que têm
condição de arcar com as despesas do diagnóstico e o tratamento em clínicas particulares.
Não se pode ignorar as leis que amparam os alunos que apresentem necessidades
educacionais especiais e requeiram atenção individualizada nas atividades da vida autônoma
e social. O recurso, a ajuda e o apoio são obrigações no âmbito educacional, assim como a
disponibilidade de escolas especiais para adaptações curriculares que atendam às
89

necessidades individuais dos alunos com dificuldade de aprendizagem. O artigo 10 do


CNE/CEB Nº 2, de 11 de setembro de 2001 afirma que o atendimento deve ser
complementado, sempre que necessário e de maneira articulada, por serviços das áreas de
Saúde, Trabalho e Assistência Social.
A conquista da cidadania corresponde à autoconsciência. A escola tem, portanto,
responsabilidade essencial no processo educativo para a aquisição dessa conquista. Logo,
ela precisa criar condições plenas para todos, pois o processo de autoconsciência só se dará
por meio do conhecimento e dos valores éticos e culturais. Além disso, o espaço escolar
deve permitir a consciência democrática de respeito a todas as diferenças, reforçadas pela
solidariedade e justiça social.

4.1 Recomendações

O disléxico apresenta uma condição (como nascer negro, ter olhos verdes ou cabelos
loiros), normalmente, possui o QI acima da média, e não é portador de problemas psíquicos
ou neurológicos graves que possam justificar por si só as dificuldades de aprendizagem.
Embora seja um problema que persiste até a vida adulta, pode ser atenuado com a ajuda dos
profissionais de educação, principalmente dos professores de Língua Portuguesa.
O cuidado com o estudante disléxico envolve atenção individualizada, práticas
pedagógicas inovadoras, além de vontade de democratização do ensino por parte do
professor. Por outro lado, a família e a comunidade também são cruciais para a viabilização
desse processo de emancipação da autonomia dos disléxicos no espaço escolar.
Para tanto, urge que o professor seja informado sobre a dislexia para conhecer como
proceder diante do problema. Logo, é preciso política pública que torne esse assunto parte
dos currículos de licenciatura tanto nas universidades públicas quanto nas particulares. Na
formação inicial, o profissional pode ter a oportunidade de acesso a bibliografias diversas,
além de ter um espaço adequado para troca de idéias sobre como agir em sala de aula com
alunos que apresentem esse distúrbio. Dessa forma, terão mais possibilidade de diversificar
os recursos didáticos em sala de aula, aprender dinâmicas de aprendizagem que não
exponham o aluno, projetar slides que estimulem a criatividade por meio de demonstrações
práticas. Sugerimos, nesse caso, a inserção, no currículo do curso de Licenciatura, de
matéria obrigatória: “Distúrbios causadores de deficiência de aprendizagem”; além de
cursos de capacitação permanentes para que os profissionais de educação sejam capazes de
perceber os sintomas da dislexia e acompanhar os estudos realizados sobre isso.
90

Essa política possibilitaria a viabilização do processo de identificação e


acompanhamento dos estudantes disléxicos nas escolas. Os profissionais de educação,
principalmente os professores e orientadores pedagógicos, sairiam dos cursos de formação
inicial com conhecimento básico sobre todos os fenômenos associados à dificuldade de
aprendizagem e, em particular, a dislexia.
Os profissionais da educação devem estar direcionados, também, a um ensino
voltado para a cultura de inclusão. Nesse aspecto, compreendem-se valores essenciais à vida
democrática, tais como: participação, igualdade, respeito aos direitos humanos, respeito à
diversidade cultural, liberdade, tolerância, diálogo, reconciliação, solidariedade,
desenvolvimento e justiça social. Assim, a escola de ensino médio deve contar com uma
política pública capaz de amparar os alunos disléxicos, e deve entendê-los como especiais.
Quanto à inclusão do estudante disléxico, para que ele adquira sua autonomia na
realização das tarefas, precisa de um ensino individualizado. Então, colocá-lo numa turma
de alunos especiais, seria importante, porém não suficiente para superar o problema. Dessa
forma, seria importante o atendimento dos mesmos, para acompanhamento pedagógico,
pelos menos duas vezes por semana, em turno contrário em centros de apóio criados para
esse fim, na própria escola.
Com uma política pública voltada para o atendimento do disléxico, poder-se-ia
agilizar e aprimorar a prestação de serviço. Para isso, seria necessário, também, que se
aperfeiçoassem os serviços públicos de atendimento a alunos com dificuldade de
aprendizagem. O MEC precisaria fazer parceria com os hospitais públicos do Distrito
Federal, preparar os profissionais (equipes multidisciplinares) para que entendam, com
profundidade, a dislexia. Assim, teríamos pessoas realmente qualificadas para lidar com o
distúrbio e, num sistema de rotatividade dentro das escolas públicas, os profissionais
poderiam esclarecer a disfunção junto aos educadores, elaborar o diagnóstico e acompanhar
o tratamento do aluno disléxico.
Mas, para que isso seja possível, precisa haver empenho conjunto dos governos
Estadual e Federal. Isso porque os profissionais de saúde não são suficientes para atender a
demanda nos próprios hospitais públicos. Para isso, seria primordial a contratação de mais
profissionais de saúde para o atendimento também nas escolas, tendo vínculo com a
Secretaria de Educação. Com essa ação, os alunos seriam encaminhados aos hospitais e
teriam prioridade no atendimento, o que não ocorre atualmente.
O papel da escola deve estar integrado à família e aos profissionais de saúde e de
educação como psicopedagogo, psicólogo, fonoaudiólogo, neurologista etc. Desse modo, o
91

disléxico pode progredir na escolaridade independentemente de suas dificuldades na leitura


e na escrita. Além do tratamento fora da escola, os professores de Português, em especial,
precisam dar mais importância às idéias dos alunos com dislexia do que aos erros de
ortografia, evitando descontar por erros meramente gramaticais, visto que a intenção
comunicativa funda o uso da língua e não a morfologia ou a gramática, sem um contexto
histórico da vida do aluno.
Além disso, o docente, em sala de aula, precisa motivar os disléxicos. Deve, então,
destacar os aspectos positivos nos trabalhos e provas realizados para incentivar esses alunos
e mostrar-lhes que são capazes de se organizarem e progredirem constantemente. Percebe-
se, também, que o professor deve evitar que o aluno disléxico tenha de ler em público e dar
a entender ao estudante disléxico que será feito o possível para ajudá-lo, dar-lhe atenção
especial individualizada e estimulá-lo a perguntar em caso de dúvida. A escola precisa
valorizar todo esforço e interesse demonstrado pelo aluno e respeitar seu ritmo de
aprendizagem.
Em caso de diagnóstico concluído, o professor deve estar atento ao planejar suas
aulas, para que o disléxico tenha cada vez mais autonomia. O docente terá que adotar
práticas pedagógicas diferenciadas como, por exemplo, ensinar a resumir as idéias, permitir
o uso de meios informáticos e de corretores, usar materiais que permitem visualizações
(figuras, gráficos, ilustrações, filmes) para que os estudantes disléxicos possam acompanhar
o texto impresso. Além disso, deve evitar a utilização de testes de múltipla escolha, pois
descontextualizam as informações e reduzem o tempo de execução, tornando-se muito
difíceis para o disléxico.
As avaliações precisam ser diversificadas. Os profissionais de educação devem
propor outras experiências que possam contribuir para o alcance dos objetivos previstos,
além das provas convencionais, que devem ser orais sempre que possível. Caso não sejam, é
importante que haja tempo maior disponível para a realização da prova e um ledor (ou
tutor). Também, para que a avaliação se torne mais justa, será importante que o professor,
ao final da avaliação, retome a prova com o aluno para verificar oralmente o que ele quis
expressar com o que escreveu, para não ser injusto com ele. Em sala de aula, é aconselhável
que a escola permita o uso de gravador, tabuada, máquina de calcular e, principalmente, os
recursos da informática como já é feito em vários países, como por exemplo, na Inglaterra.
O computador facilita a vida do disléxico, especialmente, porque é autocorretivo. Já
existe o leitor eletrônico vendido na ABD – DELTA TALK (www.micropower.com.br), que
lê textos e planilhas, facilitando a conferência dos dados. Nele são incluídas três vozes
92

diferentes. Assim, o programa de computador lê o texto digitado com voz humana.


Números, datas, abreviações e medidas são convertidos em fonemas e lidos com estilo e
entonação determinados automaticamente por meio de análises lingüísticas do texto, o que
possibilita um melhor desempenho do disléxico, já que seu maior problema é o de
decodificação das palavras durante a leitura. As pessoas consideradas “normais”, no aspecto
de ensino-aprendizagem, automatizam o reconhecimento das palavras, mas o disléxico não
o faz, exigindo, assim, maior esforço durante o processo de leitura.
Propomos, a partir do resultado da pesquisa, uma política pública que assegure a
igualdade de oportunidades para os estudantes disléxicos das escolas públicas do DF,
especialmente no ensino médio. Esses alunos estarão próximos do vestibular e de entrar no
mercado de trabalho; logo, em termos de conteúdo, independentemente do distúrbio,
concorrerão em igualdade de condições com seus pares. Com uma política específica no DF,
a escola poderia garantir condições adequadas para acompanhamento e desenvolvimento
dos alunos com dislexia, assegurando a eles a plena integração à vida escolar para a garantia
de formação de cidadãos plenos.
93

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98

APÊNDICE A - Questionário destinado aos professores de Língua


Portuguesa

Prezado professor (a):

Esta pesquisa visa obter mais informações sobre como é realizado o


diagnóstico e como são conduzidas as práticas pedagógicas aos alunos
disléxicos, nas escolas públicas de Ensino Médio, do Distrito Federal. O
questionário poderá revelar a realidade desses alunos e levar a uma
possível mudança no amparo legal. As informações solicitadas neste
questionário serão utilizadas em pesquisa científica. Sua contribuição é
muito importante para o desenvolvimento do estudo em questão.

Agradeço a colaboração!

Elizete Cristina de Souza (Mestranda em Educação, na Universidade Católica de Brasília)

• POR FAVOR, ASSINALE SEMPRE UMA ÚNICA ALTERNATIVA QUE MAIS


SE APROXIME DE SEU CASO.

1. Qual o seu gênero?


( ) feminino ( ) masculino

2. Quando se graduou?
( ) menos de cinco anos ( ) entre 5 e 10 anos ( ) mais de 10 anos
99

3. Você se formou em faculdade


( ) pública ( ) privada

4. No seu curso de graduação foi abordado o tema da dislexia, em alguma disciplina?


( ) sim ( ) não

5. As informações sobre o distúrbio da dislexia foram obtidas: (SE FOR O CASO,


ASSINALE MAIS DE UMA ALTERNATIVA)
( ) No curso de graduação.
( ) Por meio de cursos de educação continuada.
( ) Junto à coordenação pedagógica e/ou orientação educacional da escola.
( ) Por meio da leitura de textos sobre o tema.
( ) Nunca tive informações sobre o tema.

6. Você já detectou algum aluno com sintomas de dislexia, em sala de aula, no ensino
médio?
( ) sim ( ) não

7. Você considera o aluno disléxico


( ) um aluno normal ( ) um aluno especial ( ) um aluno doente

8. Qual a maior dificuldade que você reconhece no aluno disléxico?


( ) leitura ( ) escrita ( ) leitura e escrita
( ) não percebe nenhuma dificuldade

9. Quando há a suspeita de um aluno ser portador de dislexia e é encaminhado para a


realização do diagnóstico, você recebe sempre retorno do diagnóstico e do possível
tratamento ao qual o aluno considerado disléxico deve ser submetido?
( ) sim ( ) não ( ) desconheço tal situação

10. Mesmo se você não obtiver retorno do diagnóstico e do tratamento dos alunos com
dificuldade de aprendizagem encaminhados à orientação pedagógica, você continua
encaminhando outros estudantes a esse setor?
( ) sim ( ) não ( ) outros _________________________
100

11. A reação dos pais a respeito de uma suspeita de dislexia comunicada pela escola é
( ) tranqüila. ( ) apreensiva. ( ) agressiva. ( ) apática.

12. Você diferencia as práticas pedagógicas ao aluno portador de dislexia ou que apresente
sintomas do distúrbio?
( ) sim ( ) não ( ) às vezes

13. A escola favorece as práticas pedagógicas direcionadas aos alunos disléxicos ou com
sintomas de dislexia?
( ) sim ( ) não ( ) desconheço tal situação

10. Existem barreiras para implementação de práticas pedagógicas que favoreçam a


aprendizagem de alunos disléxicos?
( ) sim ( ) não ( ) desconheço tal situação

11. Há distinção no modo e tempo de avaliação desses alunos?


( ) sim ( ) não ( ) às vezes
101

APÊNDICE B - Roteiro de entrevista destinado aos orientadores


pedagógicos

1. Os professores de Língua Portuguesa do ensino médio costumam encaminhar alunos


com suspeita de dislexia a este setor?
2. Qual número de alunos com possível dislexia que é encaminhado para o setor de
orientação educacional (SOE) a cada ano, no ensino médio?
3. Existem casos de adolescentes disléxicos no ensino médio, em que a dislexia não havia
sido diagnosticada no ensino fundamental?
4. Como é realizado o processo de encaminhamento desses alunos e o diagnóstico?
5. Sua escola tem equipamentos e profissionais capacitados para fazer o diagnóstico?
6. Caso não, como é realizado?
7. Em quanto tempo o diagnóstico fica pronto?
8. Geralmente, o diagnóstico é efetivado?
9. Como costuma ser a reação dos pais a respeito de uma suspeita de dislexia, comunicada
pela escola?
10. Qual a importância dos pais para a superação do distúrbio?
11. Os pais costumam colaborar com o processo de diagnóstico e tratamento?
102

APÊNDICE C - Roteiro de entrevista destinado aos psicopedagogos,


fonoaudiólogos e neurologistas

1. Qual o número de alunos adolescentes do ensino médio, com possível dislexia, que é
encaminhado a esta instituição anualmente?
2. Existem casos de adolescentes disléxicos no ensino médio, em que a dislexia não
havia sido diagnosticada no ensino fundamental?
3. Como é realizado o processo de encaminhamento desses alunos e o diagnóstico?
4. Os estudantes da rede pública de ensino têm prioridade no atendimento?
5. Os pais precisam de encaminhamento da escola para marcar consulta nesta
instituição?
6. Esta instituição tem equipamentos e profissionais capacitados para fazer o
diagnóstico?
7. Descreva como o diagnóstico é realizado?
8. Em quanto tempo o diagnóstico fica pronto?
9. Geralmente, o diagnóstico é efetivado?
10. Como costuma ser a reação dos pais quando são informados que o filho é disléxico?
11. Qual a importância dos pais para a superação do distúrbio?
12. Os pais costumam colaborar com o processo de diagnóstico e tratamento?

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