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MESTRADO
ATENDIMENTO A DISLÉXICOS
NO ENSINO MÉDIO: EM BUSCA
DE UMA POLÍTICA PÚBLICA
Autor: Elizete Cristina de Souza
Orientador: Beatrice Laura Carnielli
2008
ELIZETE CRISTINA DE SOUZA
BRASÍLIA
2008
S729a Souza, Elizete Cristina de.
Atendimento a disléxicos no ensino médio: em busca de uma política
pública / Elizete Cristina de Souza – 2008.
92 f.: il. ; 30 cm.
CDU 376.36
Este estudo teve como objetivo investigar o encaminhamento dado ao aluno do ensino
médio, com suspeita de dislexia, pelas escolas do Distrito Federal. Para tanto, recorreu-
se à pesquisa exploratória desenvolvida em duas unidades de ensino médio da rede
pública, tendo como participantes orientadores pedagógicos e professores de Português.
A escolha dos professores dessa disciplina específica se justifica por serem eles os
primeiros capazes de detectarem os sintomas de dislexia, visto que exploram mais a
escrita e a leitura. Além disso, realizaram-se entrevistas com os profissionais de
educação e de saúde do Centro de Orientação Médico Psicopedagógico (Compp) e do
Hospital da Universidade de Brasília (HUB), que atendem alunos com transtorno de
aprendizagem. Verificou-se que, no caso de suspeita de dislexia, a escola encaminha o
aluno ao Compp ou HUB para a formulação do diagnóstico pertinente. Observou-se
também, que essas duas instituições não possuem pessoal em quantidade suficiente ou
com a experiência necessária para a definição ágil do diagnóstico, donde o longo espaço
de tempo entre a suspeita e o início do atendimento adequado, que pode comprometer o
êxito do procedimento necessário. Os docentes, por sua vez, desconhecem as facilidades
ou barreiras para a implementação de práticas pedagógicas que favoreçam a
aprendizagem do disléxico, pois a formação inicial dos professores de Língua
Portuguesa não os prepara para lidar com o aluno disléxico. Em face dessas
constatações, é recomendada uma política de atendimento eficaz para os distúrbios de
aprendizagem, em geral, e da dislexia, em particular, bem como, são apresentados
procedimentos a serem adotados pelos professores de Língua Portuguesa que podem
propiciar a superação do problema.
The study aimed at surveying the approach by the high schools in the Federal District
towards students supposed to suffer from dyslexia. Hence, it employed the exploratory
research that was developed in two public high schools, relying on the participation of
learning mentors and Portuguese language teachers. The selection of teachers of that
specific subject is due to the fact that they are the first teachers capable of perceiving the
symptoms of dyslexia, since they explore more reading and writing. Furthermore, the
survey interviewed education and health professionals of the Compp (Center of Psycho-
pedagogical and Medical Guidance) and of the Brasilia University Hospital (HUB) who
work with students suffering from learning disorders. It was found out that, in the event
of supposed dyslexia, the school refers the student to the Compp or HUB to the
pertinent diagnosis. It was also observed that both institutions miss personnel, either in
terms of quantity or with the required skill to promptly define the diagnosis, and that the
long time span between the suspicion and the starting of the proper treatment could
jeopardize the success of the required procedure. The teaching staff, in turn, is unaware
of the help or barriers faced to implement pedagogical practices capable of favoring the
dyslexic individual’s learning. That is so because the initial training of the Portuguese
Language teachers fails in preparing them to handle with dyslexic students. Such
findings lead to the recommendation of a policy towards providing efficient services to
individuals with learning disorders, in general, notably the dyslexic individuals.
Moreover, the research points out some procedures to be adopted by the Portuguese
Language teachers towards overcoming the problem.
PÁG
INTRODUÇÃO ....................................................................................................12
CAPÍTULO l.
O ESTUDO, SEUS OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS ................................14
CAPÍTULO II.
EXPOSIÇÃO DO REFERENCIAL TEÓRICO ................................................ 25
2.1 Por uma escola democrática ............................................................................ 25
2.4 Uma visão de Vygotsky sobre as relações sociais e o domínio da linguagem ...39
CAPÍTULO III.
ATENDIMENTO AO JOVEM DISLÉXICO NO DISTRITO FEDERAL ..... 59
CAPÍTULO IV.
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 87
neurologistas ...............................................................................................................102
LISTA DE GRÁFICOS
INTRODUÇÃO
Todavia, é possível que a rede pública ainda deixe muito a desejar em relação a
professores capacitados para lidar com portadores de necessidades especiais, especialmente
com disléxicos. A desinformação é tanta que um distúrbio como esse é ainda erroneamente
caracterizado como um problema surgido somente após a alfabetização ou como deficiência
mental. A dislexia pode ser causa ainda ignorada de evasão e uma das causas do
analfabetismo funcional.
Nesse contexto, percebe-se a necessidade de novas políticas de educação. Assim,
esta pesquisa visa a oferecer subsídios e sugestões para a ação dos gestores e educadores,
especialmente aos docentes da Língua Materna. Por meio deste trabalho, o leitor poderá
perceber as diferentes abordagens sobre o tema, dentro da perspectiva atual. Procurou-se
elucidar se as escolas da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal têm
diagnosticado e proporcionado tratamento adequado aos alunos disléxicos da rede pública.
Além disso, pretende-se verificar até que ponto os docentes de Português estão preparados,
a partir da formação inicial, para ministrar as aulas a esses alunos no ensino médio.
É oferecida uma série de leituras fundamentais que poderão ajudar os profissionais de
educação a refletirem sobre suas ações, tendo em vista a busca por uma política pública que
ampare os estudantes disléxicos no ensino médio. Como propõe Perrenoud (2002), a
autonomia e a responsabilidade de um profissional dependem de uma grande capacidade de
refletir em e sobre sua ação. Isso está no âmago do desenvolvimento permanente, em função
da experiência de competências e dos saberes profissionais que vão além da formação
inicial. Conforme o autor, a figura do profissional reflexivo está no cerne do exercício de
uma profissão, pelo menos quando considerados sob o ângulo da especialização e da
inteligência no trabalho.
No atual momento em que a dislexia tem sido mais discutida é importante apresentar
as diferentes visões sobre o assunto para que se possam determinar os melhores meios de
superar o problema. Embora em alguns países como os Estados Unidos e Nova Zelândia os
estudos sobre esse distúrbio já estejam avançados, no Brasil, ainda há muito a explorar.
14
precisa desenvolver a autoconfiança da criança e a sua crença de que ela será capaz de
aprender a ler. Com autoconfiança e sucesso crescentes, a ansiedade é dissipada
gradualmente. Por conseguinte, garantir-se-á uma boa convivência escolar (VALETT,
1990).
Dessa forma, a educação deve ocorrer por meio de troca de experiências, entre o
docente e o discente, o que, na maioria das vezes, não acontece em sala de aula. Chalita
(2001) ressalta que o docente deve agir com bom senso para desenvolver a autonomia dos
alunos. Assim, deve demonstrar entusiasmo, paixão e não discriminação. A aprendizagem
deve ter, portanto, cooperação com base na abordagem construtivista, assegurando, desta
maneira, a utilização do potencial do aluno, para respeitar e nutrir diversas inteligências. No
caso de dislexia, trata-se, então, de compreender como os professores possibilitam a
construção dos conceitos por meio de práticas pedagógicas adaptadas ao desenvolvimento
dos discentes com esse distúrbio.
A dislexia traz prejuízos à vida escolar e afetiva dos seus portadores, bem como afeta
a administração escolar, que teria de proceder a um esforço adicional para garantir, em
princípio, um desempenho mínimo de todos os alunos. Em que pese o percentual
relativamente elevado de portadores do distúrbio, principalmente na rede pública de ensino,
pouca atenção lhe tem sido dispensada, a começar pela dificuldade do seu diagnóstico, que
envolve uma equipe multidisciplinar.
A Sub-Secretaria de Educação Especial do Distrito Federal restringe sua
preocupação sobre dislexia apenas ao ensino fundamental. Necessariamente, há atendimento
especializado pela Equipe de Apoio de Aprendizagem só para os alunos de 1ª a 4ª séries, em
Diretorias de Regionais de Ensino, com a perspectiva de intervenção.
Urge, portanto, a criação de políticas educacionais sensíveis que respeitem tanto a
dignidade de todas as pessoas como os inerentes benefícios e a harmonia derivados da
ampla diversidade existente entre elas.
O mais recente documento versando sobre os portadores de deficiência é a Carta
para o Terceiro Milênio, aprovada no dia nove de setembro de 1999, em Londres, Grã-
Bretanha, pela Assembléia Governativa da Rehabilitation Internacional. A Carta proclama
que, para transformar os direitos humanos básicos em realidade, há que assegurar
oportunidades iguais para as pessoas com deficiência a fim de que tenham o acesso e a
plena inclusão, em todos os aspectos da sociedade. Ela alerta que a ignorância, o
preconceito, a superstição e, até mesmo, o medo ainda dominam grande parte das respostas
da sociedade à deficiência.
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A Carta expõe que, no século XXI, a sociedade precisa aceitar a deficiência como
uma parte comum da variada condição humana. Uma conseqüência alarmante do
preconceito é que, em países desenvolvidos e em desenvolvimento, nos hemisférios Norte e
Sul do planeta, a segregação e a marginalização têm colocado pessoas com deficiência no
nível mais baixo da escala sócio-econômica. Assim, segundo a Carta:
Esse documento complementa que todas as pessoas com deficiência devem ter
acesso ao tratamento, à informação sobre técnicas de auto-ajuda e, se necessário, à provisão
de tecnologias assistenciais e apropriadas. Propõe-se, assim, uma política que ampare o
aluno disléxico no ensino médio, nas escolas públicas do Distrito Federal.
Logo, este estudo procurou elucidar algumas questões pertinentes ao tema, quais
sejam: Que tipo de informação sobre a dislexia recebe a média dos professores na formação
inicial, que lhes permita suspeitar que o aluno seja portador do distúrbio? Quais são os
procedimentos adotados pelos órgãos públicos das áreas de educação e de saúde para
estabelecer o diagnóstico e tratamento dos eventuais disléxicos? Uma vez constatada a
presença do distúrbio, quais são as medidas administrativas e pedagógicas tomadas, visando
ao tratamento diferenciado de que o disléxico necessita? Dessa forma, pergunta-se: tem-se
dado tratamento diferenciado aos alunos portadores de dislexia em sala de aula? Até que
ponto os docentes de Língua Portuguesa estão qualificados para lidar com a dislexia no
ensino médio?
19
1.2 Objetivos:
1.2.2 Geral
1.2.3 Específicos
Embora seja uma condição neurológica e sem cura, a dislexia pode ser superada em
até 80% de seus sintomas com a ajuda do docente em sala de aula. Os professores que
conseguem suspeitar dos sintomas e sugerir um encaminhamento clínico para o estudante
precisam ir além e buscar novos significados para as práticas pedagógicas.
O problema pede que eles se dediquem muito ao aluno ao longo do tratamento, que
envolve em partes iguais a escola, a família e profissionais de saúde. As dificuldades de
aprendizagem devem ser, então, entendidas sob enfoque múltiplo, considerando fatores de
ordem psicológica, pedagógica e social.
A partir dessa lacuna, este estudo tornou-se relevante uma vez que sua proposição
orienta-se para uma investigação no ensino médio, haja vista o momento atual do cenário da
educação que, necessariamente, precisa capacitar profissionais para o processo de ensino-
aprendizagem em classes regulares, para todos os alunos escolarizáveis portadores de
necessidades educacionais especiais. Isso, embora a dislexia tenha sido ignorada até pelo
MEC, pois a palavra dislexia aparece apenas no Parecer CNE/CEB nº 17/20011, da
Resolução do CNE/CEB Nº 2, de 11 de setembro de 2001. Embora não imponha tratamento
diferenciado para alunos que possuem esse distúrbio, diz
O quadro das dificuldades de aprendizagem absorve uma diversidade de
necessidades educacionais, destacadamente aquelas associadas a: dificuldades
específicas de aprendizagem como a dislexia e disfunções correlatas;
problemas de atenção, perceptivos, emocionais, de memória, cognitivos,
psicolingüísticos, psicomotores, motores, de comportamento; e ainda há fatores
ecológicos e socio-econômicos, como as privações de caráter sociocultural e
nutricional. (BRASIL, 2001, p.20, grifo nosso).
1
Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/parecer17.pdf>. Acesso em 22 out 2007.
22
menos dispendioso que a entrevista, além de que os informantes podem se sentir mais
seguros em função de seu caráter anônimo desse instrumento. Dessa forma, sentem-se mais
à vontade para expressar pontos de vista que temam colocá-los em situação problemática ou
que julguem não ter aprovação.
No caso das entrevistas, como o entrevistador e a pessoa entrevistada estão presentes
no momento em que as perguntas são apresentadas e respondidas, existe oportunidade para
maior flexibilidade e obtenção de dados de alta qualidade, além da oportunidade de observar
comportamentos não-verbais e das informações sobre o contexto social do entrevistado
(ALLI, 1972, p.267).
As entrevistas permitem explorar questões que talvez sejam muito complexas para
serem trabalhadas por meios quantitativos. Desse modo, o método da entrevista permite que
o pesquisador tenha uma percepção mais detalhada do sujeito entrevistado, porque o
entrevistador valoriza as diferenças naturais que existem entre as pessoas, suas experiências
de vida e a realidade em que estão inseridas.
A análise de conteúdo das entrevistas foi feita segundo orientação de Bardin (1998),
para quem a pesquisa qualitativa consiste num processo de organização sistematizada dos
materiais acumulados. Conforme o autor, essa organização tem como objetivo auxiliar a
compreensão e interpretação dos dados.
25
Além disso, o artigo 1º afirma que o Estado democrático de direitos tem como
fundamentos: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do
trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. Visto que todo poder emana do povo e
que, por meio de representantes eleitos ou diretamente, pode provocar mudança na política,
ele pode construir uma sociedade livre, justa e solidária, o que constitui um dos objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil. Isso é ratificado pelo Artigo 205
(BRASIL, 2000, p. 118) em que se afirma:
2
Disponível em: < http://unesdec.unesco.org/images/0013/001093/139394.por.pdf>. Acesso em 14 abr 2007.
28
sujeito de direito e deveres. Trata-se daquele que está capacitado a participar da vida da
cidade literalmente e extensivamente, da vida da sociedade”.
Mello aponta que, para uma nova escola mais democrática, são necessários educadores
mais competentes para que cumpram melhor sua função. Contudo, isso só se tornará
possível se houver condições mínimas de trabalho e possibilidades de ampliação e de
atualização do conhecimento. É também importante o resgate da competência técnica do
docente na construção da Escola Pública Brasileira. Competência profissional exige o
domínio adequado do saber escolar a ser transmitido, juntamente com a habilidade de
organizar e transmitir esse saber de modo a garantir que ele seja efetivamente apropriado
pelo aluno. É também uma compreensão das relações entre o preparo técnico que o docente
recebera, a organização da escola e os resultados de sua ação.
Teixeira (1996) aborda a hipótese político-social que, segundo ele, ocorrerá a partir da
participação do indivíduo na elaboração dos valores da sociedade a que pertence. Para que
isso seja possível, são necessárias, portanto, condições apropriadas à sociedade, oferecendo-
lhe acesso aos meios de desenvolver suas capacidades para possibilitar maior participação
possível nos atos e nas instituições em que transcorra sua vida. Para o estudioso, a
participação é essencial à dignidade do ser humano e para que a hipótese político social seja
possível.
1. Idade Antiga
É o momento em que as sociedades eram mais primitivas, logo a visão do deficiente
mental relaciona-se cada vez mais com a sua própria subsistência. Nessa ocasião, havia
necessidade de vigor físico em uma sociedade guerreira como a espartana e isso justificaria
o sacrifício daqueles que nasciam privados de suas plenas faculdades físicas. Platão se
refere a eles em “República”
2. Idade Média
Pode ser caracterizada pela obra “Malleus Malleficarum”, publicada em 1482 por
dois dominicanos que diagnosticavam bruxas e feiticeiros. Isso levou milhares de
deficientes mentais às fogueiras da Inquisição, por terem sinais de malformação, física ou
mental. Tais características eram consideradas sinais de ligação com o demônio.
Nessa fase, o Cristianismo, passou-se a ver o deficiente mental como “Lês Enfants
du Bom Dieu”, ou seja, pela boca dos quais Deus falava, uma vez que representavam
inocência e pureza. Assim, nessa época, surgiram as primeiras leis de proteção ligadas às
questões institucionais.
Em 1325, surge a necessidade de que o Estado passe a gerenciar os bens dos
deficientes. Construiu-se, portanto, a idéia da Instituição que, sob a forma hospitalar, teve
suas origens no século XVI. Sem caráter lucrativo, na verdade, tinha por objetivo a exclusão
social, sem qualquer forma de assistência médica.
Krynski (1969 apud JUNIOR; SPOVIERI, 2000) diz que, por volta do século XIV,
surge uma lei que dá somente à região de Champagne a possibilidade de fornecer os
“bobos” para a corte real. Ironicamente, esse fato possibilitou, de certo modo, o processo de
aceitação da pessoa com deficiência mental na sociedade.
4. Século XX
A problemática passa a ser muito mais operacional e a questão custo-benefício passa
a ser vista de modo mais pragmático. Os Estados modernos passam a querer investir seu
dinheiro em indivíduos capazes de produzir.
Houve, nesse sentido, a contribuição do pedagogo e psicólogo francês Alfred Binet,
com seus conceitos de Idade Mental na revisão do termo de Quociente Intelectual, avaliando
o desempenho médio da criança e os possíveis graus de afastamento dessa média.
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• toda criança tem direito fundamental à educação, e lhe deve ser dada a oportunidade de
atingir e manter o nível adequado de aprendizagem;
• toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de
aprendizagem que são únicas;
• os sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam
ser implementados no sentido de se levar em conta a vasta diversidade de tais
características e necessidades;
• aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que
deveria acomodá-los dentro de uma pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer
tais necessidades.
Enfatiza-se o treinamento especializado do docente em educação especial que leve
às qualificações profissionais necessárias. Além disso, políticas de educação deveriam ser
integradas aos cursos de graduação como uma forma regular da formação de professores.
Nesse caso, é recomendado trabalhar prioritariamente nas seguintes áreas:
4
Devido às discussões a respeito do tema em questão surgiram o Programa de Ação Mundial para as Pessoas
Portadoras de Deficiência, aprovado pela Assembléia Geral das Nações Unidas (Resolução 37/52, de 3 de
dezembro de 1982); o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, "Protocolo de San Salvador" (1988); os Princípios para a Proteção
dos Doentes Mentais e para a Melhoria do Atendimento de Saúde Mental (AG.46/119, de 17 de dezembro de
1991); a Declaração de Caracas da Organização Pan-Americana da Saúde; a Resolução sobre a situação das
pessoas portadoras de deficiência no Continente Americano [AG/RES.1249 (XXIII-O/93)]; as Normas
Uniformes sobre Igualdade de Oportunidades para as Pessoas Portadoras de Deficiência (AG.48/96, de 20 de
dezembro de 1993); a Declaração de Manágua, de 20 de dezembro de 1993; a Declaração de Viena e Programa
de Ação aprovados pela Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, das Nações Unidas (157/93); a
resolução sobre a situação das pessoas portadoras de deficiência no Hemisfério Americano [AG/RES. 1356
(XXV-O/95)] e outros.
5
TÍTULO II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais – Capítulo I – Dos Direitos e Deveres Individuais e
Coletivos. Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, [...] (2000, p.15).
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avaliação serão, portanto, organizados de forma que, ao final do ensino médio, o educando
demonstre conhecimento das formas contemporâneas de linguagem. Dessa forma, o aluno
disléxico que, na maioria das vezes, apresenta mais dificuldades na aprendizagem da leitura
e da escrita, precisa receber estímulos da escola, que deve adotar metodologias de ensino e
de avaliação que estimulem a iniciativa dos estudantes (BRASIL, 2000).
A Resolução n° 2, de 19 de 11 de setembro de 2001, institui diretrizes nacionais para
a educação especial na educação básica. Entende-se por educação especial, para os efeitos
da legislação sobre educação dos portadores de necessidades especiais, a modalidade de
educação escolar para educandos portadores de necessidades especiais. As condutas típicas
se encaixam nesse quadro por serem manifestações de comportamento típicas de portadores
de síndromes (exceto Síndrome de Down) e quadros psicológicos, neurológicos ou
psiquiátricos. Esses distúrbios ocasionam atrasos no desenvolvimento e prejuízos no
relacionamento social em grau que requer atendimento educacional especializado. Segundo
o artigo 3° daquela Resolução:
O autor acrescenta ainda ser essencial que o indivíduo se insira num determinado
ambiente cultural para que ele se constitua como pessoa, pois as mudanças ocorridas
durante seu desenvolvimento, estão ligadas à interação dele com a cultura e a história da
sociedade da qual faz parte. Por isso, o aprendizado envolve a interação com outros
indivíduos e a interferência direta ou indireta deles.
Para Vygotsky (2001), as funções psicológicas superiores, características do ser
humano, estão ancoradas nas características biológicas da espécie humana e são
desenvolvidas ao longo de sua história social. Assim, é o grupo social que fornece os signos
e os instrumentos para o desenvolvimento das atividades psicológicas. Logo, deve-se
40
analisar o reflexo do mundo exterior no mundo interior dos indivíduos, a partir da interação
destes com a realidade.
6
. É uma deterioração da função da linguagem, devido a uma lesão na região parieto-occipital posterior,
depois de ter sido adquirida de maneira normal e sem déficit intelectual correlativo. Caracteriza-se por
dificuldade em nomear pessoas e objetos.
7
Diz-se especialmente da antiga escrita dos assírios, medas e persas.
42
8
Como por exemplo: para a palavra “equívoco”; o disléxico leria anteriormente pedestre e, depois,
“equitação”; em outro caso, para a “sofá”, ele leria “poltrona” e só em seguida perceberia “sofá” (LECOURS;
PARENTE, 1997, p. 22).
43
9
Cada um dos dois ossos que formam os lados da abóboda craniana.
10
Diz-se do osso ínfero-posterior da cabeça
44
Uma criança que não adquira um código primário (que não aprenda a ler e a falar),
durante os primeiros anos de vida, pode ser considerada biologicamente anormal.
Entretanto, Shaywitz (2006) afirma que uma criança lenta em todas as habilidades
cognitivas não seria classificada como disléxica. Segundo ela, para ter dislexia, a criança
precisa ter pontos fortes no que diz respeito à cognição e não apenas problemas nas funções
de leitura, ainda que a maior parte das informações sobre esse distúrbio tenha como base os
estudos com pessoas que já haviam sido identificadas como tendo um problema de leitura.
Quando se trata de distúrbios adquiridos de leitura e de escrita, após uma lesão no
lado esquerdo do cérebro, de origem súbita, algumas pessoas apresentam, no início, uma
“Afasia de Broca” que afeta quase todas as aptidões da fala e de leitura; e evoluem para um
quadro de agramatismo11 e de dislexia profunda. Nesse caso, nas demências orgânicas, a
leitura em voz alta e a escrita sob ditado podem, às vezes, estar temporariamente
preservadas, enquanto que a compreensão lingüística está quase totalmente abolida; e a
degeneração da escrita pode preceder a da leitura. Além do que alguns pacientes com lesão
cerebral occipital esquerda que apresentam uma alexia pura podem reconhecer palavras que
não podem nem ler em voz alta nem entender (LECOURS; PARENTE, 1997).
As dificuldades de leitura complicam o processo de ensino-aprendizagem e levam o
aluno ao fracasso escolar na maioria das disciplinas, segundo Condemarin e Blomquist
(1989). Torna-se impossível, dessa forma, desenvolver-se intelectualmente num meio que
lhe exige ler sinais, advertências, avisos, instruções, notícias etc. Por sua vez, o discente se
vê impedido de se desenvolver plenamente do ponto de vista intelectual, social e emocional.
Outras perturbações da aprendizagem podem ser observadas na pessoa disléxica.
Ela, geralmente, apresenta, além dos sintomas já citados, alterações na memória imediata ou
dificuldades para memorizar visualmente os objetos, palavras ou letras. Também pode
apresentar dificuldade para aprender séries (dias da semana, meses do ano e o alfabeto),
para se orientar com propriedade no espaço e aprender a noção de direita-esquerda. Com
isso, o disléxico pode se sentir confuso e frustrado, o que pode levar, como conseqüência,
além do fracasso escolar, a problemas emocionais, a atitude depressiva e (ou) agressiva.
Na maioria dos casos, apresenta-se disortografia, tendo o indivíduo dificuldades para
expressar idéias com boa sintaxe, seqüência e estrutura adequadas. No momento em que
11
O agramatismo é um aspecto linguístico particular da afasia de expressão caracterizado pela supressão quase
constante dos morfemas gramaticais (preposições, artigos, pronomes) e a redução das frases apenas à
sequência dos morfemas lexicais.
45
A dislexia pode estar associada a várias outras terminologias como: alexia (supressão
12
Inabilidade ou atraso no desenvolvimento da linguagem escrita, especialmente da cursiva. A caligrafia
costuma ser grafada com letras mal desenhadas, borradas ou incompletas, com tendência à letra de fôrma. Há
também os erros ortográficos, supressões ou substituições de letras, de sílabas ou de números, e as inversões
do sentido direcional de letras e de números (o que se chama de ‘escrita de espelho’).
13
Dificuldades com a linguagem Matemática em diferentes níveis e complexidades. É possível que se
evidencie ainda no aprendizado aritmético básico, assim como, na elaboração do pensamento matemático mais
complexo. Essas dificuldades podem se manifestar sem que haja inabilidade de leitura. As mais graves são
decorrentes da imprecisa percepção de espaço e tempo; na apreensão, coordenação e processamento de fatos
matemáticos em sua devida ordem; déficit de atenção – dificuldade de concentrar e de manter concentrada a
atenção em objetivo central, para discriminar, compreender e assimilar o foco central de um estímulo. Essa
deficiência pode manifestar-se isoladamente ou associada a uma linguagem corporal que caracteriza a
hiperatividade ou a hipoatividade.
14
Atividade psicomotora excessiva, com padrões diferenciais de sintomas. A criança ou o jovem hiperativo
fala sem parar e nunca espera por nada. Isso porque age sem pensar e sem medir as conseqüências de suas
ações. Assim, é comum que tenha muitos hematomas ou cortes na pele. Por outro lado, há um segundo tipo de
hiperatividade que apresenta características voltadas para dificuldade de foco de atenção, pois ocorre uma
superestimulação nervosa que leva a pessoa a passar de um estímulo a outro, e ela não consegue, então, focar
sua atenção em um único tópico. Logo, passa a impressão de que é desligada, sendo que, ao contrário, está
ligada a tudo ao mesmo tempo.
15
Nível baixo de atividade psicomotora, com reação lenta a qualquer estímulo. Normalmente, a pessoa parece
estar “no mundo da lua” ou “sonhando acordada”. Por falta de concentração, tem memória pobre e
comportamento vago, pouca interação social e apatia em sala de aula.
46
Desde a década de 30, do século passado, quando a dislexia começou a ser estudada,
de forma sistemática, surgiram várias teorias tentando explicar a gênese e desenvolvimento
do distúrbio. Condemarin e Blomquist (1989) apresentam algumas explicações sobre a
natureza dessa disfunção. Entre elas, tem-se a tese de Samuel Orton, entre 1925 e 1930, que
levantou a hipótese de uma inadequada instalação da dominância lateral do cérebro.
Segundo ele, a escrita em espelho, por exemplo, seria explicada por conflito e pela
predominância entre os dois hemisférios, o que seria a mesma explicação para o atraso na
linguagem e a gagueira. Para o estudioso, dislexia significava “símbolos invertidos”. Ele
recomendou um procedimento corretivo sistemático de tipo visual, auditivo e cinestésico.
Devido ao estudo de Bertil Hallgren, em 1950, com duzentos e setenta disléxicos,
chegou-se à conclusão de que a dislexia devia-se a um fator hereditário. Esse fator é
resultante de um gene monoíbrido dominante autossômico com manifestação praticamente
completa. Essa investigação mostrou que, em 80% dos casos, havia problemas de leitura
num ou mais membros da família. Nesse sentido, Shaywitz (2006) alerta que, além de as
dificuldades de leitura serem em geral ignoradas nas crianças que vivem em circunstâncias
desvantajosas, representa pelo menos 80% de todos os problemas de aprendizagem.
A dislexia trata-se de um dano neurológico mínimo que afeta sutilmente a
aprendizagem e a conduta, sem uma diminuição evidente da sua capacidade intelectual
geral. Acreditam-se hoje que essas deficiências podem ser o resultado de variações
genéticas, irregularidades bioquímicas, dano perinatal e cerebral (no momento do parto); ou
então, de doenças ou lesões originadas nos anos críticos para o desenvolvimento e
maturação do sistema nervoso central (SHAYWITZ, 2006).
Na visão neurológica, segundo Shaywitz (2006), podem ocorrer as disfunções
congênitas que se refletem na criança desde o nascimento; e a adquirida que é a repentina
perda da capacidade de ler. A última afeta principalmente adultos, pois ocorre após uma
lesão no lado esquerdo do cérebro (derrame ou tumor). A diferença entre as duas está no
momento em que se dá o rompimento dos sistemas neurais no cérebro. Na forma congênita,
há uma espécie de queda de energia nas conexões cerebrais durante o desenvolvimento
embrionário. Logo, o problema fica nas conexões neurais, confinado a determinado sistema
neural utilizado para leitura. Por outro lado, na adquirida, uma lesão bloqueia um sistema
neural que já está em funcionamento e pode também estender seu impacto a outros sistemas.
Vale ressaltar que a lesão cerebral mínima é muito confundida com o atraso
maturacional, conceito introduzido por Lauretta Bender, em 1957, citada por Condemarin &
47
Historicamente, segundo Mazzotta (2001), os pais têm sido uma grande força para as
mudanças no atendimento aos portadores de deficiência. Os grupos de pressão por eles
organizados têm seu poder político concretizado na obtenção de serviços e recursos
49
A Associação Brasileira de Dislexia (ABD) existe no Brasil, desde 1983, com sede
em São Paulo (SP), que atende pessoas de todo país. Trata-se de uma entidade filantrópica
que oferece orientação direcionada aos diferentes distúrbios de aprendizagem; atendimento
a pais, familiares, escolas, profissionais clínicos, imprensa, órgãos públicos e toda a
comunidade. Há também curso de formação em dislexia; simpósios nacional e internacional
(dislexia, cognição e aprendizagem) a cada dois anos; encontros com disléxicos e reunião
com pais; palestras em escolas, comunidades, clínicas etc; diagnóstico multidisciplinar de
exclusão; encaminhamento adequado a cada caso atendido; cadastro de profissionais e
clínicas especializadas; e desenvolvimento de pesquisas científicas e estudos quanto à
incidência e forma da dislexia no Brasil.
50
16
O paradigma da complexidade é um modelo capaz de guiar uma investigação, sem imposições, como
mudança de olhar, diferentes formas de olhar, procurando dar conta de uma faceta, de uma realidade.
52
Fica cada vez mais difícil ignorar que os espaços educativos constituem-se de
profunda e concreta diversidade – brancos, negros, índios, imigrantes, pobres,
ricos, homens, mulheres, sadios, deficientes, aidéticos, marginais, engajados
socialmente, colonos, criminosos, solidários; enfim, todos os com e (ou) sem
alguma coisa não mais padronizados e violentados pela lógica da identidade
hegemônica.
Para Rey (2006), o caráter da aprendizagem vai obrigar o professor a pensar em suas
práticas pedagógicas sobre os aspectos que propiciem o posicionamento do aluno como
sujeito da aprendizagem. Isso implica o discente expondo suas experiências e idéias no
espaço de aprendizagem. O autor alerta que não haverá sentido subjetivo em uma atividade
53
A dislexia ainda é uma disfunção pouco conhecida, porém sabe-se que é hereditária
e que interfere no registro, processamento da informação ou na elaboração da resposta. O
histórico escolar do aluno disléxico é muito semelhante, pois 80% deles têm sérias
dificuldades para ler e são quase sempre repreendidos pelos respectivos professores, por
essa limitação.
Esses docentes não conseguem compreender, na maioria das vezes, como por
exemplo, alguém esteja acima da média em Matemática e tenha sérias dificuldades de
alfabetização: escreve palavras ininteligíveis ou não consegue ler. Além disso, o disléxico é
acusado de ser desorganizado e esquecido e é definido, por conseguinte, como preguiçoso.
Segundo Baroja, Paret e Riesgo (2000), é freqüente que a dislexia se confunda com outros
problemas de adaptação escolar, principalmente com os de nível mental e apatia em relação
ao estudo. Segundo as autoras,
55
Isto é devido a uma visão superficial da problemática do aluno, sem que se tenha
estudado as causas que motivam sua falta de rendimento escolar, e a uma atitude
de espera de que, à medida que o discente vai amadurecendo psiquicamente, suas
deficiências resolvam espontaneamente. (BAROJA; PARET; RIESGO, 2000, p.
105).
17
O método multissensorial busca combinar diferentes modalidades sensoriais no ensino da linguagem escrita
às crianças. Ao unir as modalidades auditiva, visual, cinestésica e tátil, este método facilita a leitura e a
escrita ao estabelecer a conexão entre aspectos visuais (a forma ortográfica da palavra), auditivos (a forma
fonológica) e cinestésicos (os movimentos necessários para escrever aquela palavra).
57
seria exercitar a linguagem em todas as suas formas, pois cada palavra tem um significado
(valor denotativo), mas também apresenta um eco ligado às vivências pessoais do
reeducador e do discente (valor conotativo). Isso demonstra que
Estienne (2001, p. 206) propõe ainda que, na reeducação dos disléxicos, devemos
pensar ao mesmo tempo:
• na abordagem do ato de ler e escrever;
• na definição e nas condições de sua aprendizagem;
• no conceito de dislexia, levando em conta diversas hipóteses e certezas;
• nas concepções de sua terapia, especificando os objetivos e os meios, também
justificando- os.
Além disso, Estienne (2001, p. 206) pondera que o especialista não deve limitar-se a
uma técnica ou a uma escola, a uma corrente de idéias, a uma opção definitiva. Ela afirma,
então, que o procedimento deve ser determinado por:
• objetivos precisos e mensuráveis, sujeitos a controle, no sentido de verificar se eles
foram alcançados;
• objetivos estabelecidos de comum acordo, por meio de um contrato mútuo por
escrito;
• tempo limitado para evitar tratamentos intermináveis;
• estudos estatísticos para objetivar e comparar os diferentes métodos de reeducação.
Valett (1990) alerta que as crianças disléxicas precisam que as escolas estejam
organizadas de forma a permitir e encorajar que elas aprendam e progridam em seus
próprios ritmos. Ainda afirma que o agrupamento tradicional baseado em idade é prejudicial
para elas e outras excepcionalidades. Logo, todas as criança devem ser colocadas em classes
e grupos de aprendizagem de acordo com a sua realização funcional. O agrupamento de
realização desenvolvimentista em leitura é, segundo o estudioso, essencial para portadores
de dislexia e deveria ser exigido em todas as escolas públicas. Conforme o autor,
58
Toda criança deve ter um Plano Educacional Individual projetado para atender às
suas necessidades. Este plano deve incluir objetivos instrucionais e estratégias de
aprendizagem. Todos os professores envolvidos necessitam conhecer este plano,
assim como os estudantes e os pais. Estes objetivos individuais precisam ser
reavalidados periodicamente e revisados. (VALETT, 1990, p. 281).
59
100%
80%
60%
Escolas 1 e 2
40%
20%
0%
Há mais de Entre 5 e 10
10 anos anos
80%
70%
60%
50%
40% Escolas 1 e 2
30%
20%
10%
0%
Instituição Instituição
pública privada
A maioria dos docentes das duas escolas se graduou há mais de 10 anos e tem o
mesmo tempo de experiência docente. Entre eles, 70% se formaram em
faculdade/universidade particular (84% da escola 1 e 50% da escola 2). Porém, somente na
escola 2, a metade dos professores pesquisados graduou-se em instituição pública (16% da
escola 1 e 50% da escola 2).
61
120%
100%
80%
Escola 1
60%
Escola 2
40%
20%
0%
Abordado Não abordado
Desse modo, a formação dos professores é crucial para lidar com alunos que
apresentem qualquer distúrbio, em especial, a dislexia. Segundo Ellis (2005), eles precisam
62
aprender a elaborar estratégias didáticas diferenciadas (tais como sublinhar, tomar notas ou
realizar resumos), para melhorar a velocidade e acuidade com a qual os indivíduos com
fraca compreensão lêem em voz alta e melhorar o seu entendimento do que lêem.
Setenta por cento dos docentes deixaram de ter oportunidade de estudar sobre a
dislexia na graduação. Por conseguinte, há o risco de terem conduzido suas aulas de maneira
inapropriada para os estudantes que tenham a disfunção. O conhecimento teórico adquirido
na formação inicial sobre a dislexia é fundamental para que o professor saiba lidar, de forma
eficiente, com a situação. Isso porque ele
100%
90%
80%
70%
60%
50% Escolas 1 e 2
40%
30%
20%
10%
0%
Por meio de Por intermédio No curso de Junto à
leitura de textos de colegas que graduação coordenação
sobre o tema já tiveram e/ou orientação
alunos pedagógica
disléxicos
80%
70%
60%
50%
Escola 1
40%
Escola 2
30%
20%
10%
0%
Detectou Não detectou
60%
50%
40%
Escola 1
30%
Escola 2
20%
10%
GRÁFICO 6 - Retorno do diagnóstico
FONTE:
0% A autora
Não Desconheço SR
80%
70%
60%
50%
Escola 1
40%
Escola 2
30%
20%
10%
0%
SR Apreensiva Apática
60%
50%
40%
Escola 1
30%
Escola 2
20%
10%
0%
Sim Não Às vezes
Trinta e três por cento dos professores da escola 1 e 25% da escola 2 costumam
diferenciar as práticas pedagógicas ao aluno portador de necessidades especiais no ensino
médio. Isso independe de que o estudante seja disléxico. Logo, num parâmetro geral, os
alunos com dificuldade de aprendizagem podem não ter auxilio adequado na escola por falta
de preparo do professor, o que vai de encontro com o que afirma Shaywitz (2006), ao
ressaltar a importância da individualização do ensino aos disléxicos, além de reiterar que a
aprendizagem deva ser ativa e flexível, com muitas interações entre o aluno e o professor.
67
80%
70%
60%
50%
Escola1
40%
Escola 2
30%
20%
10%
0%
Desconheço Sim Não SR
90%
80%
70%
60%
50% Escola1
40% Escola 2
30%
20%
10%
0%
Desconheço Sim Não SR
conhecimento e a formação. Além disso, ela diz que o campo da formação de formadores
não pode limitar-se apenas às dimensões técnicas e tecnológicas e necessita de uma
compreensão mais profunda dos processos por meio dos quais as pessoas se formam. Para a
autora,
60%
50%
40%
Escola 1
30%
Escola 2
20%
10%
0%
Sim Não Às vezes
Enquanto 50% dos professores de Português das duas escolas afirmaram que a
escola onde trabalham não possibilitam distinção no modo e no tempo de avaliações do
estudante disléxico, a mesma quantidade da escola 1 escreveu, por conta própria:
“Desconheço essa situação”, embora não houvesse o item correspondente; além de que 16%
disseram que não sabia responder à questão.
Professores escreveram, também, que a possibilidade de distinção de modo e tempo
de avaliação dos disléxicos “depende muito da atuação do orientador educacional”. Isso
18
Cinqüenta por cento dos professores da escola 1 preferiram escrever as respostas subjetivamente, por conta
própria, o que comentaremos no decorrer da análise.
69
pode revelar certa fragilidade do professor ao se perceber desamparado pela escola para
prestar um atendimento melhor ao aluno portador da disfunção.
Shaytwtz (2006, p.194) reforça a avaliação contínua, “medida tanto pela observação
informal quanto mais formal.” Percebe-se, dessa forma, que além da formação inicial para
aquisição de embasamento para o futuro docente, deve haver um constante aprimoramento
continuado, em que “a responsabilidade deve ser de um professor experimentado ou que
tenha recebido treinamento recente e tenha experiência em métodos científicos para o
ensino da leitura.”
Parar para falar de dislexia é raro, apesar de que a baixa nota e o déficit de
aprendizagem tem a ver com dislexia. A gente fica extremamente solitária. Há
resistência dos profissionais em relação à inclusão. Me sinto impotente. Não
consigo nem atender os regulares, imagine os especiais! A gente é massacrado.
Não consegue ter tempo. É tão complicado! Essa dificuldade é porque tenho de
lidar com os problemas de aprendizagem de alunos de 54 turmas (45/50 alunos
em cada). A escola é boa, mas outros professores não querem vir para cá devido
ao número de alunos. Ninguém quer trocar escola classe por ensino médio por
falta de apoio. Não há suporte nenhum para o ensino médio, então, a qualidade
fica fragmentada. Aqui deveria ter pelo menos 10 orientadores. Me choca muito.
(ORIENTADOR PEDAGÓGIDA DA ESCOLA 2).
71
As escolas classes do Distrito Federal (do 1º ao 5º ano) contam com 170 centros de
apoio a alunos da rede pública com dificuldade de aprendizagem. Esses locais de
atendimento estão espalhados nas Regiões Administrativas e no Plano Piloto.
Os alunos das séries iniciais que possuem dificuldades de aprendizagem ou que
tenham sintomas de dislexia são encaminhados pelos professores ou pela orientação
pedagógica. Nesse caso, recebem atendimento imediato, sem burocracias. Isso demonstra
que a existência de políticas públicas viabiliza o processo de atendimento e tratamento do
estudante com problemas de aprendizagem. No entanto, não há nessa política, lei ou regra
que determine o atendimento a disléxicos. Aliás, os membros da equipe formada por um
psicólogo e um psicopedagogo nem sempre conhecem o distúrbio.
Uma experiência singular e inovadora foi iniciada pela equipe da sala de apoio do
Centro de Ensino Médio Ave Branca (Cemab), situado em Taguatinga (DF). Esse
atendimento existe desde 2007 e é o primeiro do DF com o trabalho voltado para educação
inclusiva de alunos do ensino médio. Duas pessoas atendem os estudantes, uma da área de
humanas e outra da área de exatas. A assistência é destinada a alunos de nove escolas
públicas, porém “o disléxico não está incluso nesse apoio. Só com deficiência mental e
física”, diz o entrevistado.
Os alunos especiais são encaminhados à sala de apoio depois do laudo médico.
Durante o atendimento se trabalha com projetos e atividades que desenvolvam as
habilidades do estudante com dificuldades. Se o professor passa um trabalho de pesquisa,
por exemplo, lá os profissionais de educação ajudam a conduzi-lo. O entrevistado afirma:
Para Shaywitz (2006, p. 193), a intervenção dos pais é muito importante, pois “a
criança precisa de ajuda antes de fracassar.” O disléxico que recebe ajuda mais cedo pode
72
seguir o mesmo caminho de leitura de seus pares. “As crianças identificadas mais tarde
ressentem-se da falta de prática, que é essencial.”
Entretanto, o orientador pedagógico a escola 2 lamenta que os pais costumam não
ajudar nesse processo. Primeiramente, a escola informa os pais sobre quaisquer deficiências
do estudante, porém, esses apresentam, na maioria das vezes, rejeições: “Meu filho não é
bobo”, afirma o pedagogo.
Conforme o orientador, isso pode ocorrer por falta de instrução ou por preconceito.
Para ele, a participação dos pais, em anos anteriores, era maior que atualmente, “a família
não acompanha mais no ensino médio, acha que o filho já tem maturidade suficiente e não
colaboram devido talvez ao despreparo, e ainda dizem ‘meu filho já tem 17 anos, já falei
com ele para tomar as providências’.” O entrevistado sente que esse tipo de “abandono”
começa a partir do oitavo ano do ensino fundamental, quando o pai passa a “fingir” que não
percebe a situação escolar do filho. Além disso, há resistências e sentem vergonha em
relação aos distúrbios/doenças apresentados pelo estudante, o que os levam a esconder a
realidade do adolescente. Para o orientador, o problema com os pais é cultural, e afirma que,
se eles participassem mais, certamente, o seu trabalho se realizaria com muito mais
eficiência.
O orientador do Compp, por sua vez, citou uma situação em que o aluno disléxico
sentia vergonha porque não conseguia acompanhar a turma, na então 5ª série (atual 6º ano
do ensino fundamental). Contudo, quando a mãe procurou o departamento de orientação
pedagógica, e soube que o filho era disléxico ficou chateada. Sobre isso orientador disse:
Quando os pais têm um nível cultural melhor, percebem logo algum distúrbio, se
não acham que o filho é burro, não pode aprender nunca. Há aqueles que
começam a esconder o filho, e são os que nunca tiveram paciência de sequer ver
o caderno deles. Contudo, outros que encaminham seus filhos ao Compp
costumam dar continuidade ao tratamento. (ORIENTADOR PEDAGÓGICO DO
COMPP).
porque, muitas vezes, ela não sabe do que se trata, né! Segundo, você tem que
provar para a família que seu filho tem dislexia e que conseqüências isso pode
trazer para a vida dessa criança ou do adolescente. Na grande maioria das vezes,
há resistência para que se possa encaminhar para o tratamento. Para que o
tratamento seja realizado, você precisa ter apoio da família e a criança precisa ter
apoio dos pais e da escola, né! A família tem de estar orientada até como a escola
tem de proceder, a fim de que se tenha um sucesso, porque o trabalho é um
trabalho em conjunto, é em cima de parcerias. (NEUROLOGISTA DO HUB).
Acho que falta orientação, principalmente na questão tipo assim, ele tem um
distúrbio de aprendizagem ou tem um déficit de atenção leve ou alguma coisa
assim. Isso os pais não compreendem muito bem. Somente a minoria dos pais não
possibilita a conclusão do tratamento do filho com problema de aprendizagem.
Tem alguns que somem, mas provavelmente já melhorou ou a mãe não tem
dinheiro mais pra vir. Mas, normalmente, eles ficam sim. (FONOAUDIÓLOGO
DO COMPP).
São apenas três neurologistas no hospital. A gente tem aí em torno de 300 a 400
crianças na lista de espera, aguardando atendimento. Normalmente, esses
pacientes, quando conseguem se engajar no ambulatório, é um paciente que vai
ficar muito tempo. Às vezes, pegamos uma criança de seis anos e ela vai ter o
tratamento até os dezoito ou dezenove anos. O difícil é chegar ao primeiro
atendimento. Entrou na primeira consulta, certamente vai continuar seguindo, a
não ser que ele desista. Aqui tem uma norma, se a criança faltar três consultas
consecutivas, ela já é desligada do programa. (NEUROLOGISTA DO HUB).
19
A entrevista ocorreu em 26 de março de 2008, quando foi constatado que a próxima marcação para triagem
seria somente no dia 26 de maio. A última marcação aconteceu em 26 de fevereiro do mesmo ano.
76
Aqui pra nós, não. Estamos num hospital-escola, né? Nós somos professores e
pesquisadores e a gente vai atrás, atualizando. A gente tem um núcleo de pesquisa
na Faculdade de Medicina, mas dizer que há incentivo financeiro ou alguma coisa
assim, não. (NEUROLOGISTA DO HUB).
somente a 1ª consulta. “Quase tive que dormir na fila, a equipe aqui é muito boa. Ficamos
esperando um ano e meio. Então, a escola de minha filha teve de pedir um ofício ao
Conselho Tutelar, pedindo uma consulta”, a mãe desabafa. Segundo ela, a filha já chegou ao
Compp com o diagnóstico realizado no Hospital do Gama. “Foi fácil, pois já tinha o
encaminhamento da escola, então foi rápido. Ela tem melhorado bastante em um ano”,
afirma.
Os profissionais de saúde entrevistados afirmam que os pais costumam acompanhar
a criança até o fim do tratamento. Mas, às vezes, as crianças é que não querem, pois
mostram resistência por achar que não têm “doença” nenhuma.
Olivier (2007, p. 68) mostra a importância de o professor e o pai estarem atentos
para que possam encaminhar o indivíduo com características disléxicas o quanto antes para
a avaliação psicopedagógica. Segundo a autora que, atualmente aprofunda seus estudos em
neuropsicologia, “quanto antes for iniciado o acompanhamento, melhores serão os
resultados”.
Por outro lado, a segunda mãe entrevistada leva o filho de oito anos, 2º ano (ensino
fundamental), estudante da Fundação Bradesco, ao Compp desde maio de 2007. Segundo
ela, não foi fácil, pois já teve de dormir no estacionamento da instituição por quatro vezes
para marcar as primeiras consultas.
Segundo essa mãe, se tivesse que pagar pelas consultas não teria condição
financeira, pois tem dois filhos para criar, além de ter de pagar o aluguel. “Meu marido
ganha R$ 480 por mês. Uma psicopedagoga em Taguatinga queria me cobrar R$ 180 só
para a consulta. Aqui meu filho já fez 10 sessões com psicopedagoga e neurologista”. No
caso dessa mãe, o filho foi encaminhado, primeiramente, ao psicopedagogo e ao
neuropediatra.
Muitos pernoitam fora da instituição para conseguir uma senha, mas, depois que o
tratamento é agendado, o estudante permanece em terapia. A partir daí, o atendimento é
78
Às vezes, uma mãe ou pai precisa esperar até um ano para conseguir uma data
para a primeira consulta. Tem menino que está até dois anos esperando. Estamos
tentando uma coisa mais ágil. Só que nesta época (se referindo ao mês de Natal)
tá muito difícil. Queremos fazer um convênio. Estamos tentando parcerias com
hospitais públicos do Distrito Federal para viabilizar tratamento de disléxicos,
mediante atendimento com otorrinos e oftalmologistas, caso haja necessidade.
(PROFISSIONAL DO COMPP).
O neurologita do Commp diz que os exames feitos por ele só servem como
referência em relação à conclusão do diagnóstico. Alega que essa parte é de
responsabilidade do psicólogo e do fonoaudiólogo, o que difere do neurologista do HUB,
que afirma que a etapa decisiva do diagnóstico para detectar se o aluno é ou não disléxico
cabe aos médicos do ambulatório de neurologia. Nesse caso, percebe-se a falta de consenso
entre os dois profissionais que possuem a mesma formação e lidam com os mesmos
problemas de saúde.
No entanto, reiteramos que a equipe do Compp iniciou, desde o ano passado, um
grupo de pesquisa e discussão a respeito da dislexia para tentar eliminar as lacunas. “Muitas
crianças ficavam sem diagnóstico específico. Daí, neste ano, surgiu a idéia do projeto do
“grupo de dislexia”, comenta um dos fonoaudiólogos entrevistados. Porém, ele alega que a
quantidade de profissionais não é suficiente e reclama da falta de políticas que favoreçam a
capacitação dos profissionais de saúde da instituição para realização mais precisa de
diagnóstico e tratamento do distúrbio:
Aqui, se a gente vai fazer curso, a gente paga o dia com reposição. No ano
passado aconteceu isso, fui fazer um curso de processamento, que é com o que eu
trabalho aqui dentro, pagando do meu bolso, e ia só pegar a sexta à tarde, e tive
que repor o dia. Mas, isso é muito de órgão pra órgão, assim não é a Secretaria, é
o Compp. (FONOAUDIÓLOGO DO COMPP).
Se a gente identifica alguns problemas que [...], por exemplo, se tem um na idade
um pouquinho mais avançada tipo oito, aí não lê, aí a gente começa a encaminhar
para as outras áreas, aí encaminha para a pedagogia, encaminha para
psicopedagogia, aí a gente vai encaminhando. Como agora a gente tá começando
com o grupo de diagnóstico de estudo de disléxico, a gente leva o caso para o
grupo. Aí, no caso, vai passando por vários profissionais. Quando não tinha esse
grupo, a gente fazia esse encaminhamento assim, para um para outro.
(FONOAUDIÓLOGO DO COMPP).
A gente tem audiometria, tem aparelhagem, cabine, tudo, mas não está montada
porque a gente não tem o local. Se tivesse esse aparelho a gente faria também o
exame de processamento auditivo que é uma coisa que a gente pode fazer o peso
e um contrapeso. Ele tá com dificuldade, mas ele processa muito mal o que
escuta, então a leitura também vai estar prejudicada. Aqui, também, nós estamos
aqui de favor, nosso lugar era lá (ela se refere ao antigo espaço do Compp na Asa
Norte). Bom, seria ótimo ter produtos de última geração, mas isso seria inviável.
(FONOAUDIÓLOGO DO COMPP).
Nesse caso, é importante ficarmos atentos à fala de Pinto (1999). A autora afirma que
a criança a qual lê devagar e abusando das pausas pode ser em virtude da sua pouca prática
de leitura. Logo, não deve ser designada como disléxica, aleatoriamente. Da mesma forma,
ela diz que não se devem chamar disléxicos adultos que lêem em voz alta com muita
dificuldade, em conseqüência de uma escolaridade muito reduzida. Assim, Pinto ressalta a
necessidade de conhecer muito bem as produções dos indivíduos em estudo antes de se
adotar uma denominação. E, segundo ela, se se tratar de uma perturbação acentuada da
leitura, será pertinente analisar qualitativamente os erros encontrados.
Para o psicopedagogo, a questão não é só a formação dos profissionais do Compp, e
alega, nesse caso, que o tema dislexia é confuso. Ele expõe que
20
Usa-se essa expressão para explicitar o fato de a dislexia não estar vinculada a qualquer etiologia, como
retardo mental, traumatismo ou doença cerebral, falta de oportunidade de aprendizagem, transtorno afetivo,
deficiência visual, entre outras.
82
[...] deve ser usada apenas para transtornos não especificados nos quais há uma
incapacidade de aprendizado que não pode ser justificada unicamente por retardo
mental, problemas de acuidade visual ou escolaridade inadequada. Inclui:
incapacidade de aquisição de conhecimento; incapacidade de aprendizagem;
transtorno de aprendizagem. (PEDAGOGO DO COMPP).
Assim, observamos a lacuna devido à falta de lei específica que consagre a dislexia,
especialmente, em se tratando de estudantes do ensino médio, para que seja possível
viabilizar o encaminhamento, o diagnóstico e o tratamento com mais eficiência e rapidez. O
pedagogo do Compp confirma isso, ao dizer:
A gente não tá treinado para fazer este tipo de trabalho. Na verdade, a rede
pública tem a mesma dificuldade que nós. As Secretarias de Educação não estão
preparadas. Já fui coordenadora desses núcleos no Buriti, não estamos preparados
e não temos nenhuma proposta no atendimento. Tudo com dificuldade de
aprendizagem, quando surgem dúvidas mandam para nós. O que está bem
estruturado é esse atendimento da parte pedagógica por meio dos núcleos. Falta
embasamento. Na hora em que começar a conhecer melhor vai ter a suspeita e a
segurança de fechar o diagnóstico. (PEDAGOGO DO COMPP).
Massi (2007, p.146) ressalta que as avaliações propostas para diagnosticar a dislexia
são, muitas vezes, “inconsistentes”. Para ela, os procedimentos de avaliação apresentados
em manuais que abordam essa suposta patologia não avaliam a escrita, por pautarem em
tarefas descontextualizadas e fragmentadas, por desconsiderarem as ações dos sujeitos e da
própria linguagem. A autora mostra que os indivíduos não se relacionam com um código
abstrato. De acordo com ela, os disléxicos não codificam e decodificam estruturas acabadas,
por isso,
Santuário (2002, pp. 421-422) reforça a idéia de Massi ao dizer que a linguagem
realiza o efetivo acontecer hermenêutico não enquanto confinada ao estatuto reducionista de
83
Os estudos feitos a partir das imagens cerebrais identificaram pelo menos dois
caminhos neurais da leitura: um para quem está começando a ler e para a
verbalização lenta das palavras e outro, mais rápido, para quem já lê bem.
Segundo, porque o exame cuidadoso dos padrões de ativação cerebral revelou
uma falha nesse circuito para os leitores disléxicos. Estudos realizados no mundo
inteiro não deixam dúvida de que os leitores disléxicos usam caminhos cerebrais
diferentes. (SHAYWITZ, 2006, p. 70).
Há, dessa forma, conforme Shaywitz (2006), três caminhos neurais para a leitura,
sendo dois mais lentos e analíticos: o parietotemporal21 e o frontal22; e uma rápida, a
occipitotemporal23, que identificam as palavras instantaneamente. Além disso, os bons
leitores, quando lêem, ativam a parte superior do cérebro e, até certo ponto, a parte anterior.
Por outro lado, os leitores disléxicos demonstram uma falha no sistema que, segundo a
autora, trata-se da subativação de caminhos neurais (a marca neural da dislexia) na parte
posterior do cérebro. Ou seja, o leitor “normal” ativa sistemas neurais que estão, em sua
maioria, na parte posterior esquerda do cérebro, enquanto o leitor disléxico ativa sistemas do
lado direito e na parte frontal esquerda do cérebro.
A falha nos sistemas posteriores impede o reconhecimento rápido e automático das
palavras. Entretanto, o desenvolvimento do lado direito (e da parte anterior), como sistema
auxiliar, segundo Shaywitz (2006), permite que haja uma leitura precisa, ainda que muito
lenta. “Esses leitores disléxicos têm de depender de um sistema ‘manual’ em vez de um
sistema automático de leitura”, afirma.
Ellis (1995) já antecipava as idéias expostas por Shaywitz (2006) ao dizer que, nos
disléxicos profundos, a maior parte do hemisfério esquerdo foi completamente destruída e
que as capacidades residuais de leitura são mediadas pelo hemisfério direito da pessoa
(considerado não-verbal). Porém, segundo Ellis, nesse lado do cérebro se pode abrigar
certas habilidades limitadas de linguagem em alguns indivíduos, o que justificaria, por outro
lado, a alta capacidade criativa os indivíduos disléxicos.
21
Parte do cérebro responsável pela análise das palavras.
22
Parte do cérebro responsável por atribuir forma às palavras, utilizada principalmente por leitores iniciantes.
23
Parte do cérebro responsável por atribuir forma às palavras, utilizada principalmente por leitores
experientes.
86
O ideal para o diagnóstico da dislexia é que ocorra depois que completa o ciclo de
alfabetização, em torno do 3º ano do ensino fundamental (quando já se pode perceber se os
primeiros sinais da disfunção ainda persistem: a troca de letras, de sílaba, acréscimo ou
subtração de sílaba, caligrafia ininteligível) mesmo com acompanhamento escolar
adequado. O neurologista entrevistado disse que essa é uma época em que as informações
chegam ao cérebro para que sejam armazenadas na memória. Uma criança disléxica nessa
fase, por exemplo, terá esse armazenamento aquém de seus pares, de forma imprópria para a
faixa etária, e vai levando o problema por toda sua vida. Desse modo, o entrevistado alerta
que esse “descuido” pode gerar problemas também para estudantes a partir de séries mais
avançadas:
De acordo com o exposto, constatamos que tanto o Compp quanto o HUB não
priorizam o atendimento a alunos da rede pública de ensino. Ambos possuem equipes
competentes, porém despreparadas para lidar com a dificuldade de aprendizagem provocada
pela dislexia, ainda que haja boa vontade dos profissionais. Além disso, a viabilidade de
atendimento é muito morosa, levando o estudante e a família a um possível desgaste físico e
psicológico.
Além disso, essa situação seria desestimulante para o professor do respectivo aluno,
visto que, se se chega a detectar os sintomas de dislexia e faz o encaminhamento para o
diagnóstico e tratamento, sequer consegue obter um resultado. Como a pessoa encaminhada
precisa de aproximadamente um ano para conseguir uma consulta, o ano letivo,
conseqüentemente, já teria finalizado e o problema persistiria nas séries seguintes, caso os
próximos professores não dessem a mesma atenção à disfunção. Isso poderia ser, também, a
causa de os docentes e orientadores pedagógicos deixarem de encaminhar outros alunos.
87
O presente trabalho visou identificar estratégias para uma política educacional que
atenda a estudantes disléxicos no ensino médio. A partir da investigação realizada,
constatamos as lacunas existentes e, por meio das entrevistas individuais e dos
questionários, elaboramos as estratégias que podem ser benéficas.
Assim, ao contrário do que se imaginava no início da pesquisa, o professor do ensino
médio e a respectiva escola onde atua não estão diretamente relacionados aos processos de
diagnóstico e tratamento da dislexia no ensino médio ou mesmo no fundamental. As duas
instituições contam com orientadores pedagógicos, mas não dispõem de equipamentos e
equipe de profissionais capacitados que possam realizar o diagnóstico de dislexia ou de
quaisquer outros transtornos de aprendizagem.
A diferença na aquisição de conhecimento desses estudantes pode ser percebida em
sala de aula, mas é raro um docente encaminhá-los para exame e tratamento. No máximo,
percebem a dificuldade do aluno ao realizar tarefas escolares, então, sugerem o centro de
atendimento, Compp, fora do espaço escolar, onde visitamos e conhecemos como são feitos
os procedimentos. Porém, muitas vezes, os professores se precipitam em antecipar o
diagnóstico de dislexia, sem saber por certo do que se trata, rotulando o aluno e causando
mais problemas a ele.
Foram perceptíveis, nas respostas dos professores de Português, ao questionário de
pesquisa, que a escola não possibilita implementação de práticas pedagógicas que
favoreçam a aprendizagem do disléxico. Porém a culpa não está centrada no docente. Talvez
isso ocorra porque ele, geralmente, desconhece o distúrbio, logo não sabe como agir com
aquele aluno em sala de aula, embora possa ter intenção de ajudá-lo.
Por outro lado, no caso de encaminhamento, percebemos, por meio das respostas ao
questionário, que os docentes sequer obtêm respostas do diagnóstico em tempo hábil (no
mesmo ano), para que possam elaborar práticas pedagógicas que favoreçam os alunos com
deficiência de aprendizagem. E, se o distúrbio for dislexia, é ainda pior, pois, normalmente,
o Compp, único órgão específico de amparo às escolas de ensino médio, raramente fecha o
diagnóstico como dislexia. Desse modo, o professor não poderia especificar atividades que
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atendam às necessidades desse aluno mesmo que tivesse recebido instruções na formação
inicial, sobre como lidar com estudantes disléxicos.
A dislexia é um fator que pode desencadear problemas de aprendizagem nos
estudantes tanto do ensino fundamental quanto do médio. Entretanto, caso esse distúrbio
seja diagnosticado precocemente e tratado com os profissionais de saúde em conjunto com
os de educação, a família e a comunidade, pode deixar de representar um risco à vida
acadêmica desses alunos.
Observamos, a partir das informações colhidas junto aos professores de Português
das duas escolas pesquisadas e dos depoimentos dos profissionais de educação e de saúde,
que há um desconhecimento muito grande acerca da dislexia. Além disso, a maioria dos
participantes demonstrou que não sabe diferenciar, com precisão, a dislexia de outros
distúrbios de aprendizagem. Constatamos ainda que, quando o estudante chega a ser
encaminhado para fazer o diagnóstico pode ser por apresentar pouco rendimento. E, muitas
vezes, o aluno pode apenas estar precisando recuperar conteúdos mal ministrados no ensino
fundamental. Enquanto o disléxico fica à mercê da sorte.
Os docentes, no máximo, percebem a dificuldade do aluno ao realizar tarefas
escolares, então, encaminham-no aos centros de atendimento (no caso de ensino médio, ao
Compp) fora das escolas. Muitas vezes, ainda se precipitam em antecipar o diagnóstico de
dislexia, sem saber por certo do que se trata, rotulando o aluno e causando mais problemas a
ele.
Também se chega à conclusão de que há urgência da necessidade de elaboração de
lei específica no Distrito Federal, que ampare o disléxico, aluno do ensino médio da rede
pública de ensino, de forma mais direta e precisa. Nesse sentido, já houve, no ano passado, a
iniciativa de um projeto de lei nº 1061, de 2004, do deputado distrital Rubens César Brunelli
Júnior, que “cria o Programa de Identificação e Acompanhamento da Dislexia” (PIAD), na
rede pública de ensino do Distrito Federal e dá outras providências. Embora, nessa região,
haja instituições que já atendem alunos do ensino médio, da rede pública de ensino, com
dificuldade de aprendizagem, há poucos profissionais e, ainda menos, que entendam com
profundidade e segurança o distúrbio dislexia. Por outro lado, são poucos pais que têm
condição de arcar com as despesas do diagnóstico e o tratamento em clínicas particulares.
Não se pode ignorar as leis que amparam os alunos que apresentem necessidades
educacionais especiais e requeiram atenção individualizada nas atividades da vida autônoma
e social. O recurso, a ajuda e o apoio são obrigações no âmbito educacional, assim como a
disponibilidade de escolas especiais para adaptações curriculares que atendam às
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4.1 Recomendações
O disléxico apresenta uma condição (como nascer negro, ter olhos verdes ou cabelos
loiros), normalmente, possui o QI acima da média, e não é portador de problemas psíquicos
ou neurológicos graves que possam justificar por si só as dificuldades de aprendizagem.
Embora seja um problema que persiste até a vida adulta, pode ser atenuado com a ajuda dos
profissionais de educação, principalmente dos professores de Língua Portuguesa.
O cuidado com o estudante disléxico envolve atenção individualizada, práticas
pedagógicas inovadoras, além de vontade de democratização do ensino por parte do
professor. Por outro lado, a família e a comunidade também são cruciais para a viabilização
desse processo de emancipação da autonomia dos disléxicos no espaço escolar.
Para tanto, urge que o professor seja informado sobre a dislexia para conhecer como
proceder diante do problema. Logo, é preciso política pública que torne esse assunto parte
dos currículos de licenciatura tanto nas universidades públicas quanto nas particulares. Na
formação inicial, o profissional pode ter a oportunidade de acesso a bibliografias diversas,
além de ter um espaço adequado para troca de idéias sobre como agir em sala de aula com
alunos que apresentem esse distúrbio. Dessa forma, terão mais possibilidade de diversificar
os recursos didáticos em sala de aula, aprender dinâmicas de aprendizagem que não
exponham o aluno, projetar slides que estimulem a criatividade por meio de demonstrações
práticas. Sugerimos, nesse caso, a inserção, no currículo do curso de Licenciatura, de
matéria obrigatória: “Distúrbios causadores de deficiência de aprendizagem”; além de
cursos de capacitação permanentes para que os profissionais de educação sejam capazes de
perceber os sintomas da dislexia e acompanhar os estudos realizados sobre isso.
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REFERÊNCIAS
ALLI, Jahoda et. Métodos de pesquisa nas relações sociais. São Paulo: Editora USP, 1972.
BAROJA, Fernanda Fernández; PARET, Ana Maria Llopis; RIESGO, Carmem Pablo de.
La dislexia – origem, diagnóstico e recuperação. Madrid: Gerneral Pardiñas, 2000.
_______. Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, 1975. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/dec_def.pdf>. Acesso em 30 de jun 2007.
CHALITA, Gabriel. Educação: a solução está no afeto. São Paulo: Editora Gente, 2001.
ELLIS, Andrew W. Leitura, escrita e dislexia – uma análise cognitiva. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1995.
GADOTTI, Moacir. Uma só escola para todos: caminhos da autonomia escolar. Petrópolis,
RJ: Vozes, 1990.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 1996.
MAZZOTTA, Marcos J.S. – Educação especial no Brasil - história e políticas públicas. São
Paulo: Cortez, 2001.
MORIN, Edigar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Traduzido por Catarina
F. da Silva e Jeanne Sawaya. São Paulo – Cortez, 2006.
SAVIANI, Dermeval. Da nova LDB ao novo Plano Nacional de Educação: por uma outra
política educacional/ Dermeval Saviani. Campinas, SP: Autores Associados, 1998.
Agradeço a colaboração!
2. Quando se graduou?
( ) menos de cinco anos ( ) entre 5 e 10 anos ( ) mais de 10 anos
99
6. Você já detectou algum aluno com sintomas de dislexia, em sala de aula, no ensino
médio?
( ) sim ( ) não
10. Mesmo se você não obtiver retorno do diagnóstico e do tratamento dos alunos com
dificuldade de aprendizagem encaminhados à orientação pedagógica, você continua
encaminhando outros estudantes a esse setor?
( ) sim ( ) não ( ) outros _________________________
100
11. A reação dos pais a respeito de uma suspeita de dislexia comunicada pela escola é
( ) tranqüila. ( ) apreensiva. ( ) agressiva. ( ) apática.
12. Você diferencia as práticas pedagógicas ao aluno portador de dislexia ou que apresente
sintomas do distúrbio?
( ) sim ( ) não ( ) às vezes
13. A escola favorece as práticas pedagógicas direcionadas aos alunos disléxicos ou com
sintomas de dislexia?
( ) sim ( ) não ( ) desconheço tal situação
1. Qual o número de alunos adolescentes do ensino médio, com possível dislexia, que é
encaminhado a esta instituição anualmente?
2. Existem casos de adolescentes disléxicos no ensino médio, em que a dislexia não
havia sido diagnosticada no ensino fundamental?
3. Como é realizado o processo de encaminhamento desses alunos e o diagnóstico?
4. Os estudantes da rede pública de ensino têm prioridade no atendimento?
5. Os pais precisam de encaminhamento da escola para marcar consulta nesta
instituição?
6. Esta instituição tem equipamentos e profissionais capacitados para fazer o
diagnóstico?
7. Descreva como o diagnóstico é realizado?
8. Em quanto tempo o diagnóstico fica pronto?
9. Geralmente, o diagnóstico é efetivado?
10. Como costuma ser a reação dos pais quando são informados que o filho é disléxico?
11. Qual a importância dos pais para a superação do distúrbio?
12. Os pais costumam colaborar com o processo de diagnóstico e tratamento?