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CAXIAS DO SUL/RS
NOVEMBRO
2020
GABRIELA PRISCILA DA SILVA
LAURA ELIZAMA SILVEIRA CALGARO
MANUELA TELES DA ROZA
TURMA BETA 2
Orientador (a) 1
Orientador (a) 2
Este trabalho é dedicado a todos
os Kaingang e seus descendentes.
Esta terra é sua e pedimos perdão
pelo nosso mau uso.
Primeiramente, agradecemos ao CETEC por nos oportunizar a feitura deste trabalho.
Obrigado aos professores Andréia Gobbi e Gustavo Siqueira, coordenadores do CETEC
Ciência, por nos encorajarem nesta jornada; aos professores Marisol Petry e Felipe
Zobaran, somos gratas por todo o auxílio com as correções.
Agradecemos aos professores Eliana Rela e Jerônimo Sartori que, mesmo longe, se fizeram
presentes e colaborativos.
Um obrigado especial às nossas orientadoras, Deise e Beatriz que, durante um ano,
dedicaram-se à este projeto conosco. Não há palavras o suficiente para agradece-las.
Obrigado às nossas famílias, por todo apoio. Amamos vocês!
RESUMO
Since the early days of American colonization, native peoples were indoctrinated, enslaved,
massacred and their culture was considered inferior. To survive, they yielded to acculturation, which
is still happening everyday and is often unnoticed by society. The tribes studied in this article are
located in the cities of Erechim and Farroupilha, in the southern state of Rio Grande do Sul, and they
are of the Kaingang group, a descendant people of the Macro - Jês, who have lived in the south of
Brazil since two centuries ago. The tireless struggle for the recognition of their rights, their
ancestrality and the social context in which they are inserted are the biggest similarities found among
these tribes. However, they both have a lot of differences when it comes to politics, economy, religion,
education and society, proceeding from biological and technological interferences or even the places
where they live. The tribe of Erechim, fortunately, due to an action called Programa de Inserção e
Permanência Indígena, by the Universidade Federal da Fronteira Sul, has bigger numbers of education
(individuals studying for a degree in college) than the tribe of Farroupilha, whose numbers are almost zero.
Economically, both tribes depend on subsistence agriculture and from handcraft for their living. Socially, they
are folks from the same ancestrality, even so, they show themselves extremely different. Habits, ways of living
and culture are, in general, the biggest differences between these tribes. The methods used were bibliographic
research, interviews and virtual questionnaires, with the purpose of gaining to know the tribes economically,
educationally and socially. The final results show that Erechim, economically focused on the agricultural and
textile production, has bigger levels of education and socialization than Farroupilha, an industrial city (focused
on the textile sector), whose economy is more developed than that Erechim. In fact, the tribe of Erechim has
more native individuals studying in collegesis than Farroupilha. Social and economically, both tribes have
stagnated in time. As a consequence, the hypothesis which meant the positive socialization between the native
and non-native societies was refuted. Even so, it was possible to perceived the existence of many projects of
interaction between the two societies but, as a negative result, most of them were unsuccessful, ending up at
process of acculturation, and leading the researchers to conclude that none of the processes suffered by the
tribes were positive for their preservation, as intended.
Keywords: Native People, Kaingang People, Farroupilha, Erechim, Development, Socioeconomics,
Education.
LISTA DE FIGURAS
Gráfico 1-Atividade Industrial de Farroupilha. Fonte: Portal da Prefeitura de Farroupilha RS. ..................... 61
Gráfico 2-População de Farroupilha. Fonte: IBGE ...................................................................................... 61
Gráfico 3-População por zona de habitação, Erechim. Fonte: Prefeitura de Erechim. ................................... 66
Gráfico 4-Dado estatístico contabilizado por SEBRAE, apresentado em Perfil demográfico de Erechim.
Fonte: Prefeitura de Erechim. ...................................................................................................................... 66
Gráfico 5-População de Farroupilha. Fonte: Prefeitura de Farroupilha ......................................................... 86
Gráfico 6- Religiões Farroupilha. Fonte: Prefeitura de Farroupilha. ............................................................. 88
Gráfico 7- Taxa de Escolarização. Fonte: IBGE. ......................................................................................... 92
Gráfico 8-- Taxa de Escolarização 02. Fonte: IBGE. ................................................................................... 92
Gráfico 9- Mátriculas Erechim. Fonte: UFFS. ............................................................................................. 93
Gráfico 10-Questionamento 1- Formulário 1. Fonte: Grupo. ........................................................................ 99
Gráfico 11-Questionamento 2- Formulário 1. Fonte: Grupo. ...................................................................... 100
Gráfico 12-Questionamento 3- Formulário 1. Fonte: Grupo. ...................................................................... 103
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
1. INTRODUÇÃO 12
2. REFERENCIAL TEÓRICO 15
Legenda: 50
5 DAS INSCRIÇÕES, RESULTADOS E PAGAMENTOS 76
[...] 5.2 Estará apto a solicitar o auxílio, o estudante que: 76
I - Estiver regularmente matriculado em curso de graduação da UFFS; 76
II - Comprovar sua situação de indígena. 76
5.3 Os documentos a serem apresentados pelo estudante no momento de sua inscrição são: 76
I - Termo de Compromisso Assinado; 76
II - Comprovante de conta-corrente individual em situação ativa; 76
III - Autodeclaração; 76
IV - Declaração de Pertencimento Étnico e de Anuência da Comunidade Indígena; 76
V - Declaração da Fundação Nacional do Índio (Funai) de que o estudante reside em comunidade indígena
ou comprovante de residência em comunidade indígena; 76
VI - Ficha de inscrição. (Edital Nº 110/GR/UFFS/2020) 76
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 95
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO 97
6. REFERÊNCIAS
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12
1. INTRODUÇÃO
Quanto à economia, houveram poucas mudanças com relação aos primórdios. Atualmente,
vivem da agricultura de subsistência, do artesanato, da caça, da pesca e, a minoria, do trabalho
nos centros urbanos do país.
Ladeados, a sociedade foi construída a partir da opressão e escravização destes povos. Em
pleno século XXI, ainda existe preconceito com tais etnias, sendo elas de fundamental importância
no desenvolvimento social, econômico e cultural do Brasil.
OS KAINGANG
Os Kaingang são um povo descendente do tronco línguistico Macro-Jê, que tivera contato
com os colonizadores apenas no século XVIII. Assim como todas as demais tribos indígenas dos
diversos troncos linguísticos e locais do país, foram catequizados e sofreram forte influência da
cultura ocidental.
Com o passar dos anos, surgiram expedições colonizadoras que objetivavam tomar posse
dos territórios Kaingang, inicialmente, mal sucedidas. Porém, no século XIX, estas retornaram à
ocorrer, desta vez, tendo muito sucesso. Os indígenas, em sua maioria, renderam-se aos
colonizadores, permanecendo em suas terras de origem. Aqueles que optaram por não o fazer,
foram dizimados. E, com dizimados, tem-se uma população três vezes menor do que a atual.
A intensificação da Pecuária fez com que os Kaingang se revoltassem contra os
portugueses, buscando ter, novamente, o domínio sobre as terras. Obviamente, tal revolta não fora
bem sucedida. Os europeus possuíam técnicas e armamentos bélicos muito mais eficientes que os
indígenas, o que ocasionou a morte de muitos nativos e a expulsão dos mesmos de tais territórios.
Com isso, migraram para os estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo e região norte do Rio
Grande do Sul, locais que, até hoje, são habitados por tribos Kaingang.
Atualmente, em todo o Brasil, existem cerca de 40.000 Kaingangs, distribuídos em 30
assentamentos, sendo encontrados em maior número no Rio Grande do Sul. É valido ressaltar que
cada tribo possui diferentes modos de viver, costumes, língua, divisão social, visão política,
econômica e, até mesmo, diferentes culturas. São povos semelhantes que herdaram costumes de
seus antepassados, porém, que se adaptaram as evoluções tecnológicas, as modificações
industriais e perceberam a viabilidade ou não de certos costumes, optando por mantê-los ou larga-
los, de acordo com as necessidades.
As tribos abordadas no presente artigo localizam-se nas cidades rio-grandenses de Erechim
e Farroupilha, cujos desenvolvimentos significativos deram-se, respectivamente, no âmbito
educacional e econômico, sendo os focos da pesquisa, por serem partes de uma mesma tribo e,
contudo, possuirem expressivas diferenças culturais.
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2. REFERENCIAL TEÓRICO
Os indígenas, nunca antes tendo tido contato com pessoas brancas e vestidas,
deslumbraram-se ao avistar as caravelas, sua tripulação e os objetos que carregavam. Culturas e
crenças distintas estavam prestes a cruzar-se e, obviamente, uma delas teria de ser submissa à
outra. Os indígenas eram milhões. Os portugueses, dezenas. Entretanto, os últimos carregavam
consigo armamentos bélicos e inúmeras doenças para dizimar a população de maior número (o
que, de fato, aconteceu).
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A ERA VARGAS
“O Brasil nada teme no Presente, orgulha-se do Passado e confia, serenamente, no Futuro.”.
Getúlio Vargas
Mil novecentos e trinta. O Brasil inicia seu processo (tardio) de industrialização, abdicando
do modelo primário - exportador (organização que conta com a interferência do Estado para
assegurar (socialmente) condições de trabalho às empresas monocultoras e a promover a criação
um espaço-nação nos limites das atividades produtoras) e acatando o modelo industrial, já
conhecido em outras partes do mundo (o ápice deste movimento é a Revolução Industrial, ocorrida
na Inglaterra dos séculos XIII e XIV). Até então, o Brasil era um país predominantemente rural e de
economia agrária (voltada, principalmente, para o comércio de algodão, borracha, cana- de-açúcar,
ouro e café) formando, assim, o Arquipélago Econômico Regional (configuração que demarcava
as regiões de grande atividade econômica – já que, na época, estas eram dispersas pelo país,
formando uma espécie de “ilhas,” originando a denominação “arquipélago”).
No ano, Getúlio Dornelles Vargas (1882-1954) acabou por iniciar um período denominado
Era Vargas, permanente por quinze anos (1930-1945) como regime de governança no Brasil e,
com ele, implementou a chamada “nacionalização da economia,” objetivando diminuir os fluxos
de importação do país e incentivando a estabilização da indústria. Com isso, é criada a
Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT – lei que assegura os direitos do trabalho) e empresas
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como a Companhia Vale do Rio Doce, atual Vale, exploradora de metais; Companhia Siderúrgica
Nacional (produtora de aço) e a Petrobras (produtora de energia).
Mil novecentos e trinta e sete. O ano em que se inicia o primeiro regime ditatorial da
história brasileira. Getúlio Vargas, então Presidente da República, fecha o Congresso e declara
como findados todos os partidos políticos brasileiros, intencionado a criar o chamado Estado
Novo, de modo a promover a integração e o desenvolvimento nacional. Nesta mesma época, do
outro lado do Oceano Atlântico, começara, também, a fixarem-se em solo europeu regimes
ditatoriais de extrema direita, como o Fascismo (cujo maior representante foi Benito Amilcare
Andrea Mussolini - 1883 – 1945), na Itália; o Salazarismo (Antônio de Oliveira Salazar, 1889-
1970) em Portugal; o Franquismo (Francisco Franco – 1882- 1975), na Espanha e, finalmente, o
Nazismo, na Alemanha, cujo líder foi Adolf Hitler (1889 - 1945). Deve-se frisar, também, que
movimento semelhante a estes ocorreu na chamada União Soviética (União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas – Estado socialista de 1922 até 1991, localizado na Eurásia), sendo este,
contudo, marcado pelo avanço da extrema esquerda, cujo principal líder foi Josef Stalin (1878 -
1953). Tais movimentos teriam contribuído para a promoção do Estado ditatorial de Getúlio
Vargas no Brasil.
O grande paradoxo da Era Vargas, entretanto, foi justamente a promoção das camadas
“inferiores” (pobres, indígenas, trabalhadores) na sociedade brasileira. Por conta disso, o
Presidente ficou conhecido como “Pai dos Pobres.”.
Getúlio Vargas
A Era Vargas (1930 – 1945) foi um período (econômico) glorioso para a história do Brasil:
Com a criação da CLT e com a obrigatoriedade da Carteira de Trabalho formal, a classe
trabalhadora cresceu. Até aquele momento, pode-se afirmar, também, que os indígenas passaram
a exercer o direito de (algumas) terras por origem, porém continuaram sendo vítimas de etnocídio
(causado pela imersão destes na cultura ocidental/ europeia, sendo obrigados a adaptarem-se à
realidade imposta). Com isso, para os nativos, a realidade não é extremamente alterada se não
pelo fato de que, mais do que nunca, foram obrigados a conviver com a classe dominante e forçados
a enquadrar-se em trabalhos formais para o “bem coletivo.”.
Em 1945, contudo, o Estado (que decidira juntar-se aos Aliados – França, Inglaterra,
Estados Unidos da América e União Soviética - contra o Eixo– Alemanha, Itália e Japão, na
Segunda Guerra Mundial), abriu espaço para críticas da oposição, que alegava o paradoxo da luta
do país contra regimes ditatoriais, sendo que, ele mesmo, encontrava-se em um.
Tudo isso levou, em 1945, ao fim do Estado Novo, que cedeu seu lugar (após Getúlio ter
sido deposto pelo Alto Comando do Exército - tendo concordado com a própria deposição) ao
Governo de José Linhares (na época, Presidente do Supremo Tribunal Federal) e, posteriormente,
através de eleições diretas (em janeiro de 1946), a Eurico Dutra.
Eurico Gaspar Dutra (1883-1974) foi o primeiro Presidente da República eleito através do
voto direto após a Era Vargas. Militar, aliou-se aos Estados Unidos da América durante a Guerra
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Fria (período compreendido entre 1947 e 1991, de tensões geopolíticas entre os EUA e a URSS)
e instaurou a perseguição comunista no país. Apesar de este período ser pouco explorado nos
livros didáticos sobre História do Brasil, para a questão indígena da época, foi decisivo: Com a
repreensão dos movimentos dos trabalhadores e sindicalistas, a causa indígena foi, mais uma vez,
taxada como incoerente e sem importância, levando esses povos de volta a condições de
isolamento social e discriminação.
Por muito tempo, apenas indigenistas e antropólogos aderiram à causa indígena, lutando
por seus direitos e reconhecimento social. Em contrapartida, esses povos pouco (ou nada)
participavam de encontros para discussões sobre seus futuros, posteriormente, encarados como de
promoção comunista e proibidos de acontecer pelo Governo. Durante esse período, as conquistas
e lutas indígenas foram interrompidas (por não serem vistas como de relevância social), fazendo
com que muitos desses fossem obrigados a viver em reclusão.
Dentre outras medidas tomadas pelos ditadores, a promulgação do AI-5 (Ato Institucional
Número 5), foi o mais duro golpe de todo o regime militar: Nele, foi declarado como fechado o
Congresso Nacional, retirados os direitos políticos dos cidadãos (bem como o confisco de alguns
de seus pertences – considerados ilegais pelos militares) e a suspensas as garantias de habeas-
corpus (De acordo com o art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal de 1988, “conceder-se-á habeas
corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua
liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”). Além disso, foram proibidos
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O AI-5 foi decretado no dia 13 de dezembro de 1968 (“O ano que não teve fim”), durante
o Regime de Artur da Costa e Silva (1899-1969), militar e político brasileiro, sob o pretexto de
que os movimentos estudantis (universitários) contra o Governo haviam atingido grandes
proporções e eram empecilhos para o desenvolvimento Nacional. Além disso, uma das maiores e
mais influentes instituições da época (A Igreja Católica Apostólica Romana), começara a
pronunciar-se contra os atos desumanos praticados pelos militares. Com isso, foi necessário, para
o Governo, cessar a liberdade de expressão que punha em risco o poder que havia “conquistado.”.
Segundo as historiadoras Lilia Schwarcz e Heloísa Starling, o AI-5 foi “uma ferramenta
de intimidação pelo medo, não tinha prazo de vigência e seria empregado pela ditadura contra a
oposição e a discordância.”. Já o historiador Kenneth P. Serbin, afirma que “por meio do AI-5, as
forças de segurança do governo tiveram carta branca para ampliar a campanha de perseguição
e repressão contra a esquerda revolucionária, oposição democrática e Igreja.”.
Através de dados catalogados pelo jornalista Rubens Valente (resgatados em sua obra, “Os
fuzis e as flechas”), a “repressão militar cometeu graves violações às comunidades nativas sob o
argumento de “integrar” essa parcela dos brasileiros à ala da cidade e não atrapalhar grandes
empreendimentos de infraestrutura.”.
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Figura 2-VIOLÊNCIA Com o objetivo de tomar terras indígenas para projetos de infraestrutura, muitas vidas foram ceifadas. Fonte:
Para os indígenas, esse período foi de genocídio populacional e enorme retrocesso a tudo
que haviam conquistado (mesmo que pouco). Anos após a Ditadura, a FUNAI fez um pedido
solicito de desculpas aos nativos por, durante anos, ter escondido os fatos que atingiram o seu
povo durante o Golpe.
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“O presidente Lula me deixou um legado, que é cuidar do povo brasileiro. Eu vou ser a mãe do
povo brasileiro.”
Entre os anos de 2003 e 2011, Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito Presidente da República.
Membro do Partido dos Trabalhadores (PT), partido de esquerda, assim como Getúlio Vargas,
ganhou o apelido de “Pai dos Pobres” por suas políticas a favor da classe trabalhadora.
Durante os anos de Governo Lula, foram criados programas que revolucionaram a situação
indígena no Brasil: A Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESI), por exemplo, desenvolve (até
hoje) “ações de atenção integral à saúde indígena e educação em saúde, em consonância com as
políticas e os programas do SUS e observando as práticas de saúde tradicionais indígenas; e realiza
ações de saneamento e edificações de saúde indígena.”. Atualmente, atende 34 Distritos Sanitários
Especiais Indígenas, 6.238 tribos e cerca de 760.350 índios;
Com o programa “Minha Casa Minha Vida,” 112 famílias conseguiram construir seu
próprio imóvel (o que gera discussões sobre ser essa mais uma forma de integração indígena a
cultura ocidental – o que pode acarretar em etnocídio). Por fim, o projeto “Bolsa Família” ajudou
as populações na estruturação de suas tribos.
Em 2015, ano do último senso realizado sobre a escolaridade fundamental para os nativos,
foi constatado que, no Brasil, existem 3.085 escolas indígenas que se dedicam a ensinar as línguas
indígena e portuguesa, a seguir calendários adaptados aos rituais indígenas e a cumprir com as
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tradições dessa cultura e a incluir a comunidade nas decisões que dizem respeito à educação.
Iniciativas e verbas para a fundação e manutenção dessas instituições foram um dos principais
feitos do Governo Petista ao país.
Após anos de Governo do PT, em 2018 foi eleito, como Presidente da República, Jair
Messias Bolsonaro (Partido Social Liberal). Dentre suas medidas para com os povos indígenas,
não é muito popular: Na aldeia de Piaraçu (Mato Grosso), indígenas uniram-se em protestos contra
o Governo, alegando que suas ameaças e falas de ódio estariam promovendo violência contra seu
povo. Além disso, cumprindo com uma de suas propostas governamentais, interrompeu os
processos de demarcação de terras indígenas e defende (até hoje) a abertura das mesmas para
atividades econômicas em larga-escala: “Os índios não podem continuar sendo pobres em cima
de terras ricas.".
O Presidente, também, reforça o discurso ditatorial militar que alega ser necessário integrar
os indígenas a sociedade nacional e, transferiu a Fundação Nacional do Índio (Funai) do
Ministério da Justiça para o Ministério da Agricultura, retirando do órgão a atribuição de demarcar
terras indígenas.
O primeiro registro Kaingang no Rio Grande do Sul ocorreu no século XVII, onde a
presença desse povo foi registrada no curso superior do Rio Uruguai.
Até o fim do século XVIII, a tribo indígena dos Kaingang não havia tido contato com a
população colonizadora, branca. Quando este, por sua vez, ocorreu, os Kaingang passaram a ser
catequizados na redução jesuítica de Santa Tereza (região de Passo Fundo), onde sofreram
influência direta da cultura ocidental.
Figura 4-– Famílias e subfamílias linguísticas. Os Kaingang descendem da família linguística Jê. Fonte:
Fapesp.
Durante este período, muitos chefes Kaingang aliaram-se aos expedicionários, facilitando
a conquista de seus povos e territórios. Em troca, recebiam subsídios oriundos do Governo.
Apesar de ser reconhecido o Território Indígena dos Pó Nãnh Mág, deve- salientar que
este não é oficializado como área demarcada pela união, segundo a Constituição de 1998.
Entretanto, o aldeamento é popularmente respeitado.
Figura 7-Território dos Pó Nânh Mág (vermelho). Fonte: Jonathan Busoli, 2015.
Dentre as hipóteses que buscam entender a permanência indígena Kaingang nas terras para
as quais migraram, a historiadora Marina Invernizzi afirma, em sua monografia “Historicidade
Kaingang na terra indígena Pó Nãnh Mág, em Farroupilha/RS”:
Ainda na década de 1940, no Rio Grande do Sul, os Kaingang passavam por um período
turbulento, em vista do avanço de extrativistas madeireiros e posseiros, que abusavam (de todas
as formas) dos indígenas, invadindo suas terras e marginalizando os povos. Neste contexto,
surgiram os Postos Indígenas de Assistência, Nacionalização e Educação, através do SPI (Serviço
de Proteção ao Índio), até então, pouco influentes na região sul.
Figura 8-Recorte de Jornal do Arquivo SEMEAR - visita de Getúlio Vargas à Ilha do Bananal. Fonte:
SEMEAR, 2005.
Na década de 1960, as crises iniciadas vinte anos antes ganharam forças com a Reforma
Agrária (definida pelo INCRA como o “conjunto de medidas para promover a melhor distribuição
da terra mediante modificações no regime de posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça
social, desenvolvimento rural sustentável e aumento de produção” - Estatuto da Terra - Lei nº
4504/64), de modo a diminuir e/ou destruir parte do território Kaingang, levando estes povos a
povoar outras regiões do estado (bacias hidrográficas do Taquari-Antas, Caí, Sinos e Lago
Guaíba).
Somente no Rio Grande do Sul, as populações Kaingang migraram para seis cidades
distintas, onde permanecem até hoje. As citações dessas tribos podem ser encontradas na
monografia da historiadora Marina Invernizzi, “Historicidade Kaingang na terra indígena Pó
Nãnh Mág, em Farroupilha/RS,” transcritos a seguir: o Foxá (Lajeado/RS), Jamã Tÿ Tãhn
(Estrela/RS), Pó Mỹg (Tabaí/RS), Pó Nãnh Mág (Farroupilha/RS), Por Fi Gâ (São Leopoldo/RS),
Jamã Fág Nhin/Lomba do Pinheiro (Porto Alegre/RS), Rhátéj/Morro Santana (Porto Alegre/RS)
e Jamã Tupẽ Pẽn/Morro do Osso (Porto Alegre/RS).
Figura 9-Tribos Kaingang no Rio Grande do Sul. Fonte: Jonathan Busolli, 2015.
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Com a duplicação da BR/386, iniciada pouco antes de 2010 e finalizada em 2018 (em
virtudes de questões financeiras e com a FUNAI), fora elaborada uma medida compensatória para
os povos Kaigang do local. Com isso, os Foxá iniciaram a sua migração, a começar pelo Cacique
e sua família, para a região de Farroupilha, fundando a Tribo dos Pó Nãnh Mág. Vale salientar
que Pó Nãnh Mág significa “pedra grande.”.
A tribo indígena dos Pó Nãnh Mág foi oficialmente fundada em 2006, no Bairro Nova
Vicenza, em Farroupilha, possuindo 22 hectares de extensão (área com 7.836m²). Como dito
anteriormente, a aldeia é fruto de uma indenização do DNIT (Departamento Nacional de
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A história da tribo em relação à terra que hoje habita em Farroupilha, entretanto, é ainda
mais antiga. Já no ano de 1980, a presença Kaingang era esperada, sendo que este grupo
deslocava-se até a cidade para vender artesanato, retornando, após algum tempo, para as suas
cidades (Nonoai, Ligeiro, Votouro, Cacique Doble). Este tipo de migração é denominado como
“transumância” e, consiste na mudança temporária de cidade, estado ou país de um determinado
grupo de pessoas, normalmente, em busca de trabalho. Segundo o pesquisador Roque Júnior,
durante este período, os Kaingang dormiam sob as marquises da rodoviária, visto a falta de
estrutura na cidade para sua recepção.
Após onze anos de moradia insalubre e de inúmeros ataques provindos da sociedade não
indígena, finalmente, em 2006, os Kaingang constituíram moradia no local onde hoje estão. Antes
disso, em 2002, fora cogitada a possiblidade de concessão de um terreno em um bairro industrial
para os indígenas, iniciativa falha, devido à desaprovação popular.
O local, apesar de lhes ter assegurado o direito a fixação na terra, impede, até hoje, práticas
tradicionais da cultura dos Pó Nãnh Mág, como a pesca (visto que o lago mais próximo – balneário
Santa Rita – alcançou níveis suficientes de poluição para impedir a vida de animais), a caça, a
coleta de ervas (a mata virgem fora completamente destruída) e a coleta de matéria-prima para a
fabricação de artesanato, sendo eles dependentes da “boa-vontade” dos vizinhos, proprietários de
áreas melhor preservadas, para a obtenção dos materiais. Estas informações foram extraídas do
trabalho de concussão de curso na Licenciatura em Música, “A MÚSICA NA TERRA INDÍGENA
KAINGANG PÃNÓNH MÁG E SETOR KẼTAJUG MÁG /FARROUPILHA –RS,” de
Cristiano Fagundes Cemin, pela Universidade de Caxias do Sul.
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Figura 12-Crianças da Tribo dos Pó Nãnh Mág . Fonte: Jonas Ramos / Agencia RBS.
Em razão disso, justifica-se a escolha dos Kaingang vindos do norte do estado a povoar o
município de Farroupilha: a cidade já era de seu conhecimento e contato há muito tempo. Com
isso, estabeleceram-se relações de afeto e tradição na terra, como abordado por Marina Invernizzi
em “HISTORICIDADE KAINGANG NA TERRA INDÍGENA PÓ NÃNH MÁG, EM
FARROUPILHA/RS” ao entrevistar um membro da tribo:
Abaixo, segue outro trecho do entrevistado, em que este afirma as necessidades que os
fizeram migrar para centros urbanos (econômicas, para subsistência da tribo) e, também, em que
declara já serem eles sabedores de que seu povo havia habitado tais terras no passado.
Aqui, finaliza-se o resgate histórico da criação da tribo dos Pó Nãnh Mág. Posteriormente,
serão abordados aspectos econômicos e sociais desta tribo na atualidade, em virtude dos
acontecimentos tratados neste e no capítulo anterior.
Através do Programa de Acesso e Permanência dos Povos Indígenas – PIN, a UFFS, com
o objetivo de “promover a inclusão social e étnica e buscar alternativas viáveis para o acesso e
a permanência de indígenas na educação superior, bem como seu envolvimento nas atividades de
ensino, pesquisa e extensão” (UFFS.edu.br) recebe, desde 2012, indígenas de comunidades
(Kaingang) próximas, no Curso Interdisciplinar em Educação do Campo: Ciências da Natureza.
Vale ressaltar que os indígenas participantes do programa não são naturais da cidade de
Erechim: suas aldeias concentram-se em cidades vizinhas. Comumente, integram a tribo
Kaingang, cuja história no estado fora abordada no capitulo anterior. Segundo dados retirados da
pesquisa “OS POVOS INDÍGENAS NA UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL,
CAMPUS ERECHIM - AFIRMAÇÕES E CONFLITOS: O Diagnóstico do Curso Interdisciplinar
em Educação do Campo: Ciências da Natureza,” de Viviane Marmentini Ascari, “hoje constam
165 indígenas com matrícula ativa no Curso CCIECCN – ER, oriundos das áreas indígenas
situadas em cidades como Benjamin Constant do Sul, Cacique Doble, Charrua, Constantina,
Engenho Velho, Erebango, Getúlio Vargas, Gramado dos Loureiros, Iraí, Liberato Salzano,
Nonoai, Planalto, Rio dos Índios, Ronda Alta, Sananduva, Seara, num raio de mais de 200 km de
distância.”. O mapa a seguir, ilustra as localidades destes grupos indígenas.
A UFFS é localizada no município de Erechim (Rio Grande do Sul), sito a Rodovia ERS
135, km 72, nº 200. Atualmente, o ingresso na Universidade é realizado através do SISU.
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O Curso foi criado sob justificativa de carência de bons profissionais em atuação nas zonas
rurais, relevância das atividades agrícolas para a população total da cidade e, mais importante,
pela ligação da fundação da própria Universidade com as lutas populares e movimentos sociais.
Ocorre que, apesar de originalmente pensado para atuantes não indígenas das áreas rurais,
o CCIECCN – ER, em 2016, já era predominantemente constituído por estudantes indígenas
vindos das cidades citadas anteriormente, já que muitos deles atuavam como professores em suas
aldeias e estavam em busca de aperfeiçoamento. A população não indígena, por sua vez, não
demonstrou tanto interesse no projeto.
Em entrevista com o Professor Jerônimo, este afirma estarem matriculados no Curso, até
2020, cerca de 120 estudantes indígenas. No decorrer da pesquisa, serão abordadas com maior
enfoque as especificidades do curso.
2. 4 A Cultura Kaingang
Os Kaingang pertencem à filiação genética do Tronco Macro-Jê – família Jê, juntamente
com os Xokleng (grupo indígena taxado pejorativamente por “bugres” e dizimado em dois terços
entre os anos de 1914 e 1943 pela população branca – “os bugreiros,” - através, principalmente,
de invasões em massa e de doenças como a gripe, a febre amarela e o sarampo. Atualmente, este
grupo prefere ser denominado por Laklãnõ, um de seus sub-grupos, que significa "gente do sol"
ou "gente ligeira". Lutam pela preservação de sua cultura, língua e mitologia.).
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Resumindo:
A língua
“A língua é o maior de todos os patrimônios de um povo”
A Música
você e eu,
você e eu
“motivos redondos” (a Oeste). É importante ressaltar que as divisões enfatizam os pontos cardeais,
por isso, leste e oeste.
Na música, não é diferente: também é dividida em Kamé e Kaiuru. Além disso, aborda a
classificação dos animais e de elementos da natureza, em virtude de acreditarem que, o passado,
o canto dos animais realizava a festa do Kiki, o Kikiko (hoje, ritual da cultura Kaingang).
Talvez a maior curiosidade sobre a música Kaingang é que ela possui apenas dois sons (Lá
e Mi), que se repetem. Segundo Lévi-Strauss no artigo “A Eficácia Simbólica,” povos de tradição
oral tendem a repetir estrofes em suas músicas, objetivando facilidade para decorá-las.
Canto da Formiga
Este é um (dos três exemplos) abordados a seguir sobre a música Kaingang. Nele, retrata-
se a felicidade de uma formiga ao ver grãos de milho sendo esmagados por uma mulher, cujos
farelos servirão de alimento para seus filhos durante o inverno. A primeira frase é repetida
inúmeras vezes.
Fonte: Cantos da Floresta.
Figura 22-Transcrição musical de Berenice de Almeida e Magda Pucci. Fonte: Cantos da Floresta.
47
Utilizando o arco de boca (instrumento abordado anteriormente), esta canção retrata o ciclo
de vida Kaingang. Seu ritmo pode ter sido influenciado pelo estilo “Fandango,” comum no Rio
Grande do Sul. Seu ritmo é agudo e há variações da resultante harmônica. Fonte: Cantos da
Floresta.
Figura 23-Transcrição musical de Berenice de Almeida e Magda Pucci. Fonte: Cantos da Floresta
É atualmente cantada como parte de revitalização de sua cultura, pois, remete à preparação
do povo Kaingang para lutar contra os Xokleng. Assemelha-se ao “rap” em virtude da fala
ritmada entoada em torno da nota si.
48
Figura 24-Transcrição musical de Berenice de Almeida e Magda Pucci. Fonte: Cantos da Floresta.
Expressões artísticas
“Temos a arte para não morrer da verdade.”.
A frase acima, escrita pelo filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900) retrata a
importância da arte para os seres humanos. Durante toda história, o homem procura, produz e
aprecia a arte. Na cultura Kaingang, portanto, não é diferente. Abrangendo as concepções
indígenas de mundo, as obras representam as satisfações humanas.
Simone Serpa Catafesta, em sua dissertação “O povo Kaingang: arte e cultura,” analisa o
quadro (reproduzido a seguir) de uma nativa: as partes Kamé e Kairu são representadas pelos traços
na pele da mulher, marcando as duas etnias. Apesar disso, a mulher pertence aos Kamé devido aos
traços de seu rosto e aos seus cabelos escuros (pretos) e alongados, características do povo. Mais
uma vez, é possível notar a importância desta divisão para os Kaingang.
50
Legenda:
Figuras
Linhas 23 – Pintura Kaingang
representando exposta
as divisões no Unochapecó.
Kamé e Kairu;Fonte: Acervo de Simone Serpa Catafesta (outubro de 2010).
Cabelos longos e escuros, elementos que afirmam o pertencimento da mulher aos Kamé.
A arte, neste sentido e de acordo com Simone, é o “ato de criar sob a necessidade
intelectual de quem a produz,” enquanto o artesanato é “o fruto do trabalho de pessoas que o
consideram como a sua arte, pois é produto de seu conhecimento e de sua cultura.”. O artesanato
(normalmente) está ligado à obtenção monetária (um dos principais meios de sobrevivência
indígena nos centros das grandes cidades), independentemente de ter sido confeccionado para fins
51
de utilidade ou apenas para decoração, enquanto a arte, é fruto de tudo o que pensa, sente e produz
o artista.
Não exclusividade dos Kaingang, a arte provém da própria natureza: das folhas de árvores
e das penas de pássaros, de sementes e tinturas providas de plantas específicas. Como abordado
anteriormente, o bambu é, também, um dos materiais mais utilizados pelos artistas e artesãos.
Além disso, todo o produto Kaingang fará, obrigatoriamente, referências ás divisões desse povo
(Kamé e Kairu) objetivando, assim, contar, difundir e preservar a sua história.
Na figura 26,
tem-se as
nomenclaturas
“ror” e “téi,”
como
denominações
para as partes
Kairu e Kamé,
respectivamente.
Além disso, o
grafismo
“ianhiá” Figura 26-Representação do grafismo Kaingang. Fonte:
Artesanato indígena.
52
Tabela 4-Síntese do estudo sobre a sintaxe da linguagem visual na cestaria Kaingang da TI Apucaraninha / PR.
Ẽg jóg tỹ Topẽ
Ũ nỹ ó hakari han24?
ó hakari han
ó hakari han
Ẽg jóg tỹ Topẽ
O Kiki (ou o ritual do Kikikoi) é a celebração aos mortos realizada por esse povo.
Antigamente, acompanhava o consumo da bebida Aquiqui (bebida alcoólica a base de milho),
porém, atualmente, é uma festividade exclusiva da Terra Indígena Xapecó (SC) e considerada
“antiquada” pelas outras tribos. Segundo reportagem sobre os Kaingang do site “Povos indígenas
do Brasil,” “O ritual consiste, fundamentalmente, na performance de dois grupos formados por
indivíduos pertencentes a cada uma das metades clânicas, Kamé e Kairu. A condução da vida
social kaingang, vimos, opera uma constante fusão das duas metades. Durante o Kiki, no entanto,
as metades atuam separadamente, formando grupos de ‘consangüíneos classificatórios ou
mitológicos’. Como nos mitos, o relacionamento entre os grupos que atuam no ritual é marcado
pela complementaridade e assimetria entre as metades Kamé e Kairu.”.
A partir de 1940, porém, por pressão da sociedade não – indígena, os Kaingang foram
obrigados a abdicar da festividade, tendo sido acusados de estarem manipulando mágica e
perigosamente a relação entre o ser humano, a natureza, a cultura e o sobrenatural. Algumas das
habitações desse povo foram, inclusive, vítimas da brutalidade branca, as queimando e destruindo.
Os xamãs (detentores de uma função religiosa que acessam outras dimensões) Kuiã
representam todos os portadores de conhecimento e cura dos Kaingang. São escolhidos através de
um ritual que compreende a confecção de um recipiente com materiais provindos da mata virgem
para armazenamento de água (posteriormente ingerida por um animal – que será o seu “guia”). O
poder do xamã dependerá do animal que o acompanha, sendo o gato do mato o mais importante
deles – devido ao seu poder de trazer à vida espíritos de pessoas seduzidas pelos mortos.
57
Sociedade e política
A sociedade tradicional Kaingang
Tradicionalmente, os Kaingang seguem uma linhagem que traz o homem como o centro
da sociedade e, a mulher, como “depositária e guarda da prole,” Teschauer (1927). Como tudo
nesta sociedade, há a divisão entre as metades Kamé e Kairu, cujas diferenças são vistas como
complementares e necessárias (para que ocorra um casamento, por exemplo, os noivos devem
pertencer a metades diferentes, afim de estabelecer uma relação dualista (ou seja, de forças
opostas) e, ao mesmo tempo, complementar.
Quando uma criança nasce, obrigatoriamente a sua metade será a qual pertence o pai. Por
exemplo: em uma união de mulher Kamé com um homem Kairu, a criança (independentemente
de gênero) pertencerá à metade Kairu, do mesmo modo que seu pai. Entretanto, após o casamento,
os noivos devem morar nos domínios do pai da noiva (mostrando, mais uma vez, que o centro da
sociedade é o homem, pois a mudança não se deve à mulher mas, sim, ao seu pai). Essa
característica, porém, não só é comum aos Kaingang, mas, também, à todos os Jês.
Há, também, a separação entre a família constituída pelo homem, sua mulher e seus filhos
e a sua família de origem (avós, irmãs e irmãos, primos, etc): a primeira é denominada por “família
nuclear,” enquanto, a segunda, é chamada de “grupo doméstico.”. A família deve,
obrigatoriamente, compartilhar uma habitação, porém, o “grupo doméstico” não segue a mesma
regra: não é necessário compartilhar moradia, mas, sim, o mesmo território.
O casamento entre Kingangues ainda é realizado de acordo com as duas metades Kamé e
Kairu, porém, atualmente, uniões desse povo com outras etnias é uma realidade. A isso, nomeou-
se “mestiços” aqueles nascidos da união entre um Kaingang e um branco, “misturados” filhos de
Kaingangues com indígenas de outras etnias, “indianos” os homens casados com mulheres
58
Kaingang e que decidem viver na e como tal a tribo e “cruzados” os filhos de mãe Kaingang e pai
branco e que não falam a sua língua de origem. Normalmente, os homens passam a morar com a
família da esposa após o casamento, porém, algumas exceções (de casais que constituem a própria
casa) são comuns: é importante lembrar que, apesar de morarem em casas separadas, o casal deve
permanecer no domínio da família, caso contrário, são expulsos da Tribo.
O cacique e o vice – cacique são os responsáveis por todas as decisões políticas, sociais,
de justiça e ética da tribo. O poder do cacique, por exemplo, deve ultrapassar os limites indígenas,
sendo comum tê-los concorrendo às eleições municipais. Existe, também, um conselho chamado
de “Liderança,” responsável por ajudar na tomada de decisões complexas na tribo. Segundo
estudos realizados entre os anos de 2000 e 2003, concluiu-se que há uma autoridade – política a
cada seis famílias Kaingang.
As eleições para cacique são contadas com votos de “grãos” (grãos de alimentos
específicos são utilizados para contagem – como o milho) e somente é permitido votar homens
maiores de 15 anos. O cacique é quem escolhe a sua equipe (vice – cacique e conselheiros) e é
candidato através de articulações entre as famílias de prestígio da Tribo.
Muitas vezes, as lideranças rígidas fazem com que os indígenas decidam abandonar a
Tribo para viver nas periferias dos centros urbanos.
Tabela 5-Sistema hierárquico e político da terra indígena de Chapecó. Fonte: Povos indígenas no Brasil.
59
Estudos sobre o tema respondem a preferência da tribo à região do Rio Grande do Sul, por
meio de afirmações da grande disponibilidade da caça, pela variedade das paisagens, e os frutos e
sementes locais oriundos da terra, como o pinhão.
Neste mesmo contexto, observa-se que o impacto da colonização na sua economia foi
muito menor em comparação a outros grupos, pelo fato da disposição das aldeias formarem
núcleos dispersos.
Com o crescimento do povoado e de sua economia baseada no comércio, nos serviços, mas
principalmente na agricultura e pecuária, em 30 de abril de 1918, através do Decreto nº 2343,
assinado por Borges de Medeiros (então governador do Estado do RS) o município de Erechim
fora emancipado.
Quanto à divisão populacional por zona de habitação, em 2013, cerca de 82.026 pessoas
viviam na zona urbana e 14.761 na zona rural. Logo, no ano de 2019, os habitantes da zona rural
diminuíram em, aproximadamente, 58% com relação aos dados anteriormente citados.
66
Quanto à composição populacional, no ano de 2000 Erechim era composta por 78.056
brancos (86,40%); 9.983 pardos (11,05%); 2.028 pretos (2,24%); 132 indígenas (0,15%); 55
amarelos (0,06%); além dos 93 sem declaração (0,10%). Neste ano, a cidade possuía cerca de
67
90.347 habitantes, sendo apenas 132 indígenas, o que corresponde à 0,15% da população total,
como anteriormente afirmado.
Algumas tribos da região norte do estado, como as localizadas nas cidades de Charrua e
Nonoai, caracterizam-se pelo extrativismo, agricultura de subsistência e trabalho associativo,
além do artesanato. Contudo, os Caingangues situados em Erechim, tem como base econômica o
artesanato.
Para garantir a renda e o sustento, muitas famílias partem de suas aldeias até os centros
urbanos para vender o artesanato, comumente balaios, cestas e “filtros dos sonhos”,
Dentro das aldeias, existem classes sociais, onde alguns são mais sucedidos que outros,
afinal, alguns trabalham em frigoríficos ou, aqueles mais escolarizados, nos postos de saúde da
aldeia.
No entanto, somente em 2012 foi criada uma lei que obriga as instituições de ensino
superior federais a reservarem vagas para indígenas que estudaram na rede pública, a chamada
Lei de Cotas (Lei 12.711). Nessa lei também são beneficiados negros e pardos de escolas públicas.
De acordo com a Lei, o número de vagas reservadas para indígenas, negros e pardos (todos
oriundos de escolas públicas), deve ser proporcional a quantidade das outras etnias em 50%.
Ainda segundo dados do Inep, no ano de 2017 nas “Matrículas nos Cursos de Graduação
Presenciais e a Distância, por Cor / Raça, segundo a Unidade da Federação e a Categoria
Administrativa das IES – 2017” a população indígena somou 56.750 mil do total de cotas
disponibilizadas, aproximadamente 8.286.663 milhões, em universidades federais, estaduais,
municipais e privadas em todo o Brasil, conforme mostra a figura a seguir:
gratuita. A oferta de ensino médio se dá a partir de 4 escolas da rede estadual de ensino (sendo
que uma atende apenas o noturno), um Instituto Federal e duas escolas particulares. Na questão
acadêmica, conta com três Instituições, duas particulares e uma federal (lei municipal nº 4.125,
de 10 de junho de 2015).
Observando os dados, podemos afirmar um maior preparo educacional da cidade nas fases
iniciais do desenvolvimento da criança, bem como incentivos para a capacitação dos profissionais
nessa área.
Segundo dados do FNDE, 2014, 11.644 alunos foram contemplados no Programa Nacional
de Alimentação Escolar (PNAE), em Farroupilha. A alimentação é municipalizada, ou seja, o
Município assume, perante o FNDE, o compromisso de atender os alunos matriculados na rede
estadual de ensino. Na Etapa Creche o valor é repassado em dinheiro à Fundação Nova Vicenza
de Assistência, nas demais etapas e em todas as modalidades da educação a forma de gestão é
centralizada (lei municipal nº 4.125, de 10 de junho de 2015). Veja:
O quadro acima é de extrema importância neste estudo, pois podemos observar a anulação
do nível de auxílio alimentar para escolas indígenas nas fases iniciais do desenvolvimento infantil.
Podendo afirmar a hipótese de que as crianças nativas não frequentam as etapas da creche e pré-
escola. No entanto, ainda que em número muito menor, frequentam o ensino fundamental e médio.
Com 3 instituições de ensino superior, Farroupilha está localizada junto ao polo regional
na área educacional. Esse contexto tem como base uma forte rede de ensino pré- escolas, Ensino
Fundamental, Ensino Médio e educação profissionalizante, que atendem à diversidade da
economia local nos setores de comércio, serviço e indústria (lei municipal nº 4.125, de 10 de junho
de 2015).
72
Segundo o pró-reitor de Ensino, Lucas Coradini, a instituição entende existir uma dívida
histórica do Estado brasileiro com os povos indígenas no que diz respeito à garantia dos seus
direitos constitucionais, dentre os quais, o direito à educação. O IFRS já oferece cotas para
estudantes autodeclarados indígenas em seu processo seletivo de estudantes convencional, as
denominadas cotas PPI – destinada a pretos, pardos e indígenas. No entanto, percebeu-se que os
indígenas concorrem em desvantagem com os demais candidatos em razão das diferenças
culturais, das distintas formas de socialização e escolarização em suas comunidades, e do
isolamento social e geográfico ao qual comumente estão submetidas essas comunidades, o que
requer um olhar diferenciado da instituição para esse público (IF- RS, 2019).
Figura 36-Imagens aéreas da Universidade Federal da Fronteira Sul, Campus Erechim. Fonte: UFFS.
Para ingressar nos cursos superiores, os indígenas passam por um Processo Seletivo
Exclusivo Indígena, no qual, são destinadas duas vagas suplementares a cada curso de Ciências
da Natureza, excetuando-se aqueles em que a instituição não possui autoridade para ofertar. Além
disso, na pós-graduação, são reservadas duas vagas nos cursos lato sensu (pós-graduação com
carga horária de, aproximadamente, 360 horas em que confere um certificado e não exige grandes
projetos de pesquisa) e stricto sensu (curso que confere diploma e título (mestre ou doutor), exige
a realização de grandes projetos de pesquisa) à aqueles autodeclarados indígenas que passaram
pelo processo de seleção.
Para receber este benefício, é necessário que o estudante nativo não ultrapasse dois
semestres do tempo regulamentar do curso de graduação em que estiver matriculado;
obrigatoriamente, precisa ter assinado um Termo de Compromisso; e seu cadastro deve estar
devidamente aprovado e mensalmente homologado pela instituição federal de ensino superior.
76
5.3 Os documentos a serem apresentados pelo estudante no momento de sua inscrição são:
III - Autodeclaração;
Fora realizada uma entrevista virtual com o professor mestre da UFFS, Jerônimo Sartori,
residente na cidade de Erechim e um dos coordenadores do Programa de Inserção e Permanência
Indígena da instituição. Aplicou-se, portanto, um questionário acerca do objetivo, aceitação por
parte dos estudantes não indígenas e impactos na vida econômica e social dos beneficiados.
77
Quanto ao primeiro contato da população não indígena com o programa e com os nativos,
segundo o professor, houve tentativas de cancelamento do projeto e muito preconceito.
Atualmente, todos estão adaptados e conseguem viver bem com as diferenças étnicas e culturais,
respeitando-se e vivendo em harmonia.
Para ser professor do projeto PIN, são exigidos licenciatura e mestrado em educação ou
ensino de ciências.
Anteriormente á eles, contudo, será realizado um resgate histórico dos primeiros contatos
entre os europeus e os povos indígenas, a fim de embasar comportamentos atuais com base em
processos históricos. Para tanto, fara-se-à uso de imagens e documentos, de modo a melhor
explicitar o assunto em questão.
Figura 39-Visão dos europeus aos rituais da cultura indígena. Fonte: Google.
A segunda imagem retrata a visão dos europeus aos rituais da cultura indígena:
antropofágicos, praticavam o canibalismo. Entretanto, esta relação não se dava ao desejo carnal
humano e, sim, as superstições destes povos: alimentavam-se de corpos de entes queridos e
partidos ou, então, de guerreiros ou prisioneiros de grande estima. Assim, a alma destas pessoas
seria repassada aos que se alimentassem dela. Para os europeus, que queimavam e festejavam a
morte de mulheres acusadas de bruxaria (durante a Santa Inquisição), ironicamente, tal ritual lhes
pareceu diabólico, tanto que o retratavam exageradamente e representavam os indígenas, muitas
vezes, com rostos e corpos destorcidos, como monstros.
O mapa acima representa os 30 primeiros anos da história do país após o seu “achamento”
pelos europeus (por já ser ocupado, o termo “descobrimento” é errôneo e será melhor abordado
posteriormente). Nele, parte do território já havia sido dividido pelos portugueses e, os indígenas,
eram os responsáveis pela extração do Pau-Brasil para ser levado á Europa. Sua tinta, de cor
avermelhada, era utilizada para a tintura de tecidos dos nobres da época.
Segundo relatos de Pero Vaz de Caminha, escrivão da primeira esquadra portuguesa em sua carta
ao Rei Dom Manuel de Portugal,
“Se os degredados, que aqui hão de ficar aprenderem bem a sua fala
e os entenderem, não duvido que eles, segundo a santa intenção de
Vossa Alteza, se hão de fazer cristãos e crer em nossa santa fé, à
qual praza a Nosso Senhor que os traga, porque, certo, esta gente é
boa e de boa simplicidade. E imprimir-se-á ligeiramente neles
qualquer cunho, que lhes quiserem dar. E pois Nosso Senhor, que
lhes deu bons corpos e bons rostos, como a bons homens, por aqui
nos trouxe, creio que não foi sem causa. Portanto Vossa Alteza, que
tanto deseja acrescentar a santa fé católica, deve cuidar da sua
salvação. Eprazerá a Deus que com pouco trabalho seja assim.”.
82
Apesar dos esforços indígenas, a força bélica do homem branco ainda era muito maior.
Deste modo, poucos resistiram á colonização e, os poucos que o fizeram, tiveram (e ainda tem)
que lutar por direitos que lhes pertencem, por dívida histórica.
Além disso, muitas mulheres indígenas foram sexualmente violentadas pelos europeus.
Com isso, atualmente, pode-se notar campanhas e iniciativas que promovem a conscientização
da real história do Brasil, vangloriar ou romantizar a realidade da miscigenação cultural.
83
Assim, conclui-se que os primeiros contatos dos povos indíegenas com a população
europeia não foi amigável ou pacífica, uma vez que resultou em processos de extinção etnológicos
e de aculturação, importantes para as reflexões a seguir, que abordam os desenvolvimentos sociais
de tribos Kaingang nas cidades de Farroupilha e Erechim.
84
Ainda sobre a fundação da cidade e o primeiro contato dos imigrantes para com a
população indígena local, pode-se destacar o apelido dado ao indígena que os ajudou no
reconhecimento da nova terra: “Luís Bugre.”. O termo “bugre” é oriundo de um movimento
herético da Europa, durante a Idade Média (também chamada de Idade das Trevas, uma vez que
a Igreja Católica Apostólica Romana condenava todo e qualquer ato de conhecimento para além
dos ditados por ela, dando início, assim, ao Tribunal da Santa Inquisição, movimento de extrema
intolerância e preconceito, que torturava até a morte os afrontosos da INCA). Os bugres eram os
indivíduos que iam contra os preceitos ditados pela Igreja, de modo a serem considerados
moralmente infiéis.
Com isso, explicita-se o “eurocentrismo” com que foi fundado o Brasil: a soberania do
homem branco e católico, de posses materiais elevadas. Não somente na cidade de Farroupilha
como, também, em todo o país, os indígenas foram brutalmente massacrados, seja no sentido
físico e/ou etnológico.
Em 1876, com o objetivo de atrair mais imigrantes para a região, foram construídos
barracões destinados á recepção dos mesmos na cidade, chamados, posteriormente, de Nova
Milano. No mesmo ano, imigrantes oriundos de Vicenza, na Itália, instalaram-se na região, á 12
km
85
ao norte do Barracão (assim denominada inicialmente a região dos barracões) dando origem,
assim, á Nova Vicenza. A região, devido a boa localização, prosperou.
Já em 1910, construiu-se uma estrada de ferro que ligava a cidade de Caxias do Sul á
capital do estado (Porto Alegre). Tal acontecimento fez com o núcleo da cidade fosse transferido
de Nova Vicenza para o sul da mesma, em 1911, um ano após a construção da estrada. Com isso
(e com a chegada de novas pessoas para a região), Nova Vicenza tornou-se o centro comercial da
região.
Atualmente, a situação pouco muda: ao contrário, mostra-se ainda mais agravada. Apesar
de terem conquistado o direito á terra para assim, viverem de acordo com seus costumes e crenças,
a maioria dos indígenas da região necessita recorrer ao trabalho informal, vendendo artesanato,
nas ruas da cidade de Farroupilha e em outras próximas (como Caxias do Sul). Não há nenhum
tipo de movimento que promova a integração das culturas indígena e não – indígena no município,
exceto por algumas festas e celebrações promovidas pela comunidade PÓ NÃNH MÁG, abertas
para a população local.
Outra dificuldade encontrada por estes povos é a língua: muitas vezes, poucos falam e
compreendem o Português, dificultando o contato verbal com a população urbana.
de modo a promover-lhes melhores condições de vida. A ação foi movida após fortes chuvas na
região, que alagou casas e escolas na região. O município investiu (aproximadamente) R$ 100
mil.
Segundo Maria, “isso (a construção de moradias) representa maior qualidade de vida para
o povo indígena. Fizemos casas mistas, poderíamos fazer somente casas de madeira, mas
preferimos casas mistas, boas e diferenciadas. Assim, hoje eles estão morando em um lugar
digno.”.
O cacique da tribo, Alexsander Candinho Ribeiro, afirma “Hoje é um dia de alegria por
estarmos recebendo essas casas. Todas as famílias que se mudaram para o lado de cima estão bem
abrigadas graças ao município.”.
Segundo dados da Prefeitura de Farroupilha, a aldeia conta com 133 indivíduos (entre
adultos e crianças) e 33 famílias. A maioria dos adultos trabalha na venda de artesanato, em
indústrias e em propriedades rurais.
Além disso, um dos mais notórios (e talvez curiosos) pontos da Aldeia - PÓ NÃNH MÁG,
é a Igreja que apresenta: Igreja Evangélica Assembléia de Deus. A cultura religiosa dos Kaingang,
originalmente politeísta, abre espaço para uma nova discussão: monoteístas, os evangélicos são
Cristãos, negam a existência de outros deuses e possuem características conservadoras.
Muito provavelmente, a influência dos moradores fora forte o suficiente para resultar na
construção de uma Igreja Evangélica na Aldeia. Conforme dados da Prefeitura de Farroupilha, a
religião Evangélica é a segunda mais praticada pelos farroupilhenses, perdendo, apenas, para a
Católica Apostólica Romana, como pode ser afirmado a seguir.
Figura 49- Visão geral via satélite de Erechim. Fonte: Google Maps.
90
Devido á este processo, Erechim tornou-se um município com maior interação entre as
populações indígena e não – indígena, de modo a passar por desenvolvimentos sociais
diferenciados ao restante do estado, que pouco (ou quase nada passou por isso).
A cidade foi colonizada em 1908 por um grupo de imigrantes vindo da região de Caxias
do Sul, sendo um Distrito de Passo Fundo. Em 1918, dez anos após a chegada dos primeiros
imigrantes, Erechim tornou-se município, caracterizado pela agricultura, pecuária, comércio e
serviços. É, ainda, a Capital da Amizade.
Em entrevista com Prof. Dr. Jerônimo Sartori, um dos responsáveis pela implementação e
manutenção do Curso na UFFS, realizada em vinte e um de abril de 2020, o mesmo afirma ter
sido, inicialmente, uma experiência desafiadora tanto para a comunidade letiva, quanto para o
corpo docente: “Precisamos entender as necessidades deles e nos adaptar ao seu estilo de vida. Foi
uma experiência interessante.”.
Ainda, Jerônimo conta que, logo na implementação do Curso, as vestimentas dos indígenas
causavam certo estranhamento na população local: sempre coloridas e esvoaçantes. Hoje, segundo
ele, todos já estão acostumados.
De igual forma, os docentes podem atuar em escolas em suas próprias aldeias, muito
comum de acontecer: ao saírem para estudar, retribuem a oportunidade par cooperar com o seu
povo.
91
Figura 50- Adilson Gãrkapej(cnetro) é aluno do Curso Interdisciplinar em Educação do Campo: Ciências da Natureza- Licenciatura, no Campus Erechim.
Fonte: UFFS.
Segundo registros históricos, a região do Alto Uruguai já era habitada há (pelo menos) 10
mil anos antes dos colonizadores lá chegarem. No século XIX, missionários já encontravam-se
atuando na área e, no século XX, já havia registros de processos de aculturação para com os
nativos, obrigados à catequização. Aqui, vale ressaltar o que já foi dito em “História Caingangue
no município de Erechim – RS” e que pode ser encontrado no site da Prefeitura de Erechim, na
sessão “Nativos”:
Este parágrafo apresenta características muito importantes, não só pelo fato de afirmar o
indígena como um ser quase que primitivo e animalesco, mas, também, recorre ao Eurocentrismo
– ou seja, apenas os costumes e modos de viver do homem europeu são corretos.
Nela, encontram-se trechos de extrema intolerância e racismo, uma vez que os europeus tratavam
os nativos como inferiores.
O trecho da Carta que segue, muito se assemelha ao parágrafo sobre os nativos de Erechim
abordado anteriormente. Pasme, está-se falando de, ao menos, quinhentos anos de diferença entre
as redações.
“Bastará dizer-vos que até aqui, como quer que eles um pouco
se amansassem, logo duma mão paraoutra se esquivavam,
como pardais, do cevadoiro. Homem não lhes ousa falar de
rijo para não se esquivarem mais; e tudo se passa como eles
querem, para os bem amansar.”
Mas, o que isto tem com a situação social dos indígenas em Erechim e com o programa
ofertado pela UFFS?
Além disso, ainda em entrevista com Jerônimo, foi-se afirmado que muitos traços de sua
cultura foram afetados em virtude de tal miscigenação: o uso de remédios naturais, por exemplo,
fora substituído por fármacos e drogas ocidentais. De tal forma, muitos indígenas foram obrigados
a deixar suas aldeias para conquistar “melhores condições de vida” e acabaram, entretanto,
deparando-se com um “mundo novo,” do qual não fazem parte e que possui indivíduos indispostos
a lhes dar qualquer tipo de oportunidade.
Durante a entrevista, foram citadas algumas falas que nos trouxeram diversos
questionamentos sobre a relação do povo não-indígena com as perspectivas de futuro dos
indígenas na sociedade, como: “Eles tem sonhos! Também querem comprar um carro e ter roupas
de marca!”. Por qual motivo a perspectiva de futuro dos indígenas seria uma surpresa?
Conclui-se aqui que a UFFS possui um importante papel na educação indígena, porém,
provoca episódios de aculturação perigosos quando se fala em um possível etnocídio – ou seja,
destruição de uma cultura (no caso, a Caingangue).
95
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Após, abordaram-se aspectos culturais dos Kaingang, de modo a dialogar e conhecer sua
cultura.
Em seguida, efetuou-se o estudo dos desenvolvimentos econômicos das cidades e suas
influências no modo de vida Kaingang. Na sessão seguinte, foram abordados os contextos
educacionais das tribos.
Para concluir a metodologia, realizou-se a pesquisa dos desenvolvimentos sociais dos
nativos nos municípios de Farroupilha, sendo descrita da seguinte maneira:
1. Resumo do contato indígena para com os europeus, desde 1500;
2. Histórias de fundação de ambas as cidades;
3. Panorama da integração indígena nos municípios e suas influências nos períodos
históricos anteriormente citados.
Utilizando-se de dados e fontes seguras (como o IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística, a FUNAI, sites como a BBC Brasil - British Broadcasting Corporation no Brasil e
os dados obtidos nas pesquisas acima), elaborou-se um estudo comparativo entre os diferentes
desenvolvimentos sociais e econômicos indígenas das tribos dos Kaingang (Farroupilha) e
Caingangues (Erechim).
97
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para os que responderam “sim” á pergunta anterior, foi pedido para se especificar
o que conheciam da tribo, totalizando 21 apontamentos (em um montante de 91 participantes, isso
significa que apenas 23% das pessoas que responderam á pesquisa, tem conhecimento a respeito
de algo da tribo de sua cidade).
Os resultados foram divididos em quatro sessões: nada/pouco, cultura, venda de
artesanato e outros, como podem ser vistos a seguir.
101
manter sua
sobrevivência.”
“Conheço muito
pouco, apenas os vejo na
cidade vendendo o seu
artesanato”.
Por fim, fora questionado se o grupo participante já tivera contato com alguma tribo
indígena. A maioria retorna positivamente, entretanto, não em sua cidade. As respostas
encontram-se a seguir.
104
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Conclui-se, pois, que a maioria da população não indígena das cidades de Caxias
do Sul, Farroupilha, Bento Gonçalves e Flores da Cunha, pouco (ou quase nada) conhece sobre
os indígenas de seu município. Ainda, pode-se notar certo preconceito trazido em diálogos
(naturais) da sociedade, bem como, a mentalidade eurocêntrica extremamente enraizada.
Em virtude da ampla formação, muitos acabam por não retornar ás suas tribos,
tentando encontrar espaço na cultura ocidental. Reflexo disso se deu em algumas discussões para
com os caciques dessas tribos que, por vezes, sentiram-se ameaçados perante o programa.
Retomando á entrevista com o Professor Jerônimo, da UFFS, resgata-se, um
excerto que muito chamou a atenção: o fato de a maioria dos estudantes do Curso serem mulheres,
enquanto, as mesmas pouco falam durante as aulas, ao contrário dos homens. Segundo o professor,
o modo de organização dessas tribos é, em sua maioria, patriarcal, fazendo com que as mulheres
não tenham tanto espaço para fala quanto os homens.
Uma das vantagens do Curso, todavia, é o fato de que, ao final do mesmo, nota-se
uma maior ocupação da fala feminina nas discussões universitárias, ofertando-as certo
entrosamento na sociedade.
A maior discussão que se pode obter daqui é o fato de o programa estar podendo
gerar processos de aculturação (ou/e extinção de culturas) nas comunidades Kaingang, o que
somente poderá ser provado com o passar dos anos, uma vez que a iniciativa é recente. Fica aqui,
contudo, o alerta.
5. CONCLUSÃO
6. REFERÊNCIAS
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Paulo, Papirus, 1990.
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Mág /Farroupilha –RS. 2017. 72f. Monografia referente ao trabalho de conclusão de Curso de
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