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Estudo da incorporação de resíduo de beneficiamento de mármore em

argamassas autoadensáveis
Incorporation of marble processing residue in self-compacting mortars.

Julia Cordeiro Zanotelli (1); João Luiz Guerini Arpini Filho (1); Ronaldo Pilar (2); Rudiele Aparecida
Schankoski (2).

(1) Estudante, Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes)


(2) Professor(a) Doutor (a), Departamento de Engenharia Civil, Universidade Federal do Espírito Santo
(Ufes)
Av. Fernando Ferrari, 514 - Goiabeiras, Vitória - ES, 29075-910

Resumo
Um dos principais objetivos da sociedade atual é promover um desenvolvimento que seja mais sustentável,
assim, a aplicação da economia circular é de grande importância, uma vez que ela tem como objetivo a
neutralização dos impactos ambientais de produtos e/ou materiais ao fim do seu ciclo de vida. Atualmente o
Brasil se destaca como exportador de rochas ornamentais, um segmento que a cada ano ganha proporções
maiores, e consequentemente, aumenta a geração de resíduos que, na maioria dos casos, não possui uma
destinação adequada. Diante desse cenário e somando a noção de que a indústria da construção civil
apresenta possibilidades de incorporação de coprodutos em seus ciclos, o presente trabalho buscou
investigar a utilização de resíduo de beneficiamento de rochas ornamentais como forma de adição mineral e
argamassas autoadensáveis, em teores de 10%, 15% e 20%. Para isso foram realizados ensaios de
caracterização do resíduo e ensaios tecnológicos nas misturas, tanto no estado fresco quanto endurecido.
Os resultados obtidos permitiram concluir que a incorporação de RBRO (Resíduo do Beneficiamento de
Rochas Ornamentais) não prejudica o desempenho das misturas apresentando maior resistência à
compressão em idades iniciais e maior tempo de início pega.
Palavra-Chave: Argamassa autoadensável. Resíduo do Beneficiamento de Rochas Ornamentais. Materiais Cimentícios
Suplementares.

Abstract
The main objective of today’s society is promote sustainable development, therefore, the practice of a
circular economy presents a great way to achieve this idea since it aims to neutralize the environmental
impacts of products and/or materials at the end of their life cycle. Nowadays, Brazil stands out as an
important exporter of ornamental stone, a segment that gains bigger proportions each year, which increases
the generation of waste that in most cases does not have an adequate destination. Adding in this scenario
the knowledge of circular economy and the notion that construction industry presents a great possibility to
incorporate co-products in their materials, the present work sought to investigate the application of waste
from natural stone processing as mineral addiction in self-compacting concrete mortars with percentages of
10%, 15% and 20%. In this study, residue characterization tests and technological tests were performed to
determine concrete characteristics in the fresh and hardened state. The results obtained allowed us to
conclude that the incorporation of OSW (Ornamental Stone Processing Waste) does not affect the
performance of the mixtures, presenting greater resistance and setting time at their initial ages.
Keywords: Self-compacting Concrete, Marble Processing Residue.

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1 Introdução
Ao fazer um panorama dos últimos anos, é possível perceber o potencial do setor de
rochas brasileiro como uma referência mundial. Desde seu início no mercado de rochas
ornamentais na década de 90, o Brasil experimentou um notável crescimento em todos os
segmentos desse setor e, hoje, aparece como sexto produtor mundial de rochas, com um
dos mais modernos parques tecnológicos do mundo (ABIROCHAS, 2019; ABIROCHAS,
2018).

Em relação ao cenário nacional, a concentração do mercado de rochas ornamentais se


encontra no estado do Espírito Santo, que apresentou, em 2019, cerca de 77% do total de
exportações, equivalente a 82% do faturamento total, o que chegou a representar cerca
de 10% do PIB capixaba (ABIROCHAS, 2020).

Apesar dos diversos avanços tecnológicos para extração e beneficiamento de pedras


naturais, cerca de 30% do produto extraído acaba se tornando resíduo na forma de pó
e/ou de fragmentos de rocha fora do padrão de comércio. Esse material acaba ficando
depositado nos pátios das marmorarias e serrarias sem possuir uma destinação ideal
(ROSATO, 2002 apud MOURA et al. 2017, CAMPOS et al., 2014). Conforme o art. 13 da
Lei nº 12.305/2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos e classifica os
resíduos sólidos quanto à origem e a periculosidade, esse tipo de material é classificado
como um resíduo de Classe II B, que são os denominados inertes e não perigosos.
Mesmo assim, a destinação desse material é um fator problemático, principalmente pela
dificuldade de encontrar áreas próprias para o descarte correto, além dos gastos com o
transporte desse resíduo até o local (BRASIL, 2010; MANHÃES, DE HOLANDA, 2007).

A questão ambiental e a necessidade de adequação de indústrias poluidoras, como a


mineração e a construção, à um novo modelo de desenvolvimento que busque a
sustentabilidade é inquestionável. Dentre os diferentes segmentos da cadeia produtiva da
construção civil, o segmento de materiais de construção apresenta um grande potencial
em absorver resíduos de diferentes processos.

Resíduos na forma pulverulenta (com diâmetro inferior a 75 µm) como é o resíduo de


beneficiamento de rochas ornamentais, quando utilizados em misturas cimentícias
convencionais podem alterar propriedades como consistência, densidade, absorção,
retração e resistência mecânica. Embora a incorporação de finos possa trazer benefícios
como coesão e auxiliar no empacotamento das misturas (KRUGER et al, 2020),
geralmente a introdução de grandes volumes desse material pulverulento em concreto
convencional acaba aumentando a demanda de água, o que pode gerar efeitos negativos
nas propriedades do concreto fresco e endurecido (baixa resistência, aumento de
porosidade e perda de adesão na interface cimento e agregado) (FELEKOGLU, 2007;
SCHANKOSKI et al, 2017).

Por outro lado, quando se fala de misturas autoadensáveis, a perspectiva se altera, já


que, para manutenção da estabilidade no estado fresco é necessária uma proporção

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maior de ultrafino, o que acaba tornando o incremento desse tipo de resíduo interessante
para esse caso (DEHWAH, 2012).

Nesse sentido, o trabalho em questão buscou avaliar a viabilidade técnica da utilização o


resíduo de beneficiamento de rochas ornamentais como fino suplementar para produção
de argamassas autoadensáveis, como forma de promover a sustentabilidade. Ou seja,
que a aplicação desse resíduo seja economicamente viável e ambientalmente
responsável, sem que o desempenho do composto cimentício seja prejudicado.

2 Metodologia
A metodologia adotada se baseou primeiramente na caracterização das propriedades
físicas dos materiais utilizados. Posteriormente, foram realizados ensaios na argamassa
fresca e, por fim, a determinação das propriedades no estado endurecido. Vale ressaltar
que foram feitos três grupos de argamassas: uma referência, que possui apenas cimento
Portland como finos; uma segunda de referência que além do cimento, apresenta também
um fíler calcário em sua mistura; e, finalmente, argamassas contendo porcentagens de
RBRO (Resíduo do Beneficiamento de Rochas Ornamentais) na mistura. Após a
conclusão de todos os ensaios, foram realizados estudos estatísticos para a validação
dos dados obtidos.

Os materiais utilizados para essa pesquisa foram o cimento Portland de Alta Resistência
Inicial (CP V ARI) como aglomerante, pelo fato de ser o cimento com menor teor de
adições em sua constituição, um aditivo superplastificante de terceira geração à base de
policarboxilato e areia natural proveniente da região de Linhares - ES como agregado.
Além desses materiais, foi utilizado um fíler calcário como balizador para verificação do
desempenho do RBRO e o resíduo de rocha ornamental proveniente do corte de
mármore.

Primeiramente, os materiais foram caracterizados. Para o aglomerante e o aditivo


aplicados os dados usados foram os fornecidos no laudo dos próprios fabricantes. Em
relação ao agregado, foram realizados ensaios de massa específica aparente conforme a
ABNT NBR NM 52:2009. Os finos (fíler calcário e RBRO) foram caracterizados por meio
de ensaios de granulometria, massa específica, área superficial e adsorção superficial,
conforme os métodos demonstrados no Tabela 1 e nas Figuras 1 e 2.

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Tabela 1 – Caracterização do fíler calcário e do RBRO.
Propriedade Método
Determinação do índice de finura por meio da ABNT NBR
peneira 75 µm (Nº 200) 11579:2012
Determinação da massa específica pelo ABNT NBR
método do picnômetro 16605:2017
Determinação da finura pelo método de ABNT NBR
permeabilidade ao ar (método de Blaine) 16372:2015
Determinação da adsorção superficial com o AASHTO TP
azul de metileno. 57:2000

O ensaio de adsorção de superficial foi realizado para verificação das características de


superfície dos finos. Por ser um procedimento prescrito em norma internacional, será o
único método a ser detalhado no presente trabalho.
O ensaio de adsorção inicial consiste na utilização de uma solução de azul de metileno
com água destilada em uma concentração de 5 g/L, conforme a Figura 2a, a fim de titular
uma solução contendo o material fino a ser analisado. Primeiramente a amostra é
peneirada em uma abertura de 0,075 mm, em seguida é separada uma fração de 10 g e
colocada em um béquer com 30 ml de água destilada para ser misturada com o agitador
magnético por cinco minutos. Em seguida, com o auxílio de uma pipeta graduada foi
adicionada ao béquer 0,5 ml de solução de azul de metileno com agitação de um minuto,
como ilustrado nas Figuras 2a e 2b. Ainda sem desligar o agitador magnético, foi retirada
uma pequena porção dessa suspensão e com um contador aplicado uma gota sobre a
superfície de um papel filtro. O procedimento seguiu essa sequência até o aparecimento
do halo azulado em torno da borda do local em que se situam as partículas sólidas em
suspensão permanecendo azulado em um prazo mínimo de cinco minutos, conforme
ilustrado na Figura 3.

(a) (b) (c)


Figura 1 - Ensaio de massa específica: (a) Aparelho retirando bolhas de ar. (b) Utilização de uma seringa
para completar o recipiente com água. (c) Controle de temperatura.

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Figura 2 - Ensaio de adsorção superficial: (a) Solução de azul de metileno na concentração de 5g/L. (b)
Utilização de uma pipeta graduada para aplicar a solução. (c) Processo de mistura usando o misturador
magnético.

Figura 3 - Difusão no papel filtro.

O resultado do teste foi obtido como valor do azul de metileno em miligramas de solução
por grama do material passante na peneira 0,075 mm que foi calculado conforme a
Equação 1.

(Equação 1)

Em que M é o valor de azul de metileno (mg) de solução por grama de material passante
na peneira 0,075 mm, C é o valor em mg de azul de metileno por ml de solução, nesse
caso 5g/L, V a quantidade em ml de solução de azul de metileno necessária para a
titulação e W, em gramas de material seco.

Após realizada a caracterização de todos os materiais anteriormente citados, foi feita a


determinação do traço da argamassa autoadensável referência (somente com cimento
Portland como fino) de forma que ela apresentasse boa estabilidade e trabalhabilidade.
Os traços pilotos foram baseados no estudo de MATOS et al. (2020).
O procedimento de mistura ocorreu em argamassadeira de eixo vertical. Primeiro foi
adicionada a água, o aditivo e o cimento aos poucos e misturado em velocidade baixa por
1 minuto, após colocar completamente esses materiais, foi realizada a mistura por mais
trinta segundos. Em seguida, foi adicionada a areia dentro de um tempo de um minuto e
mais trinta segundos para mistura da argamassa, sempre em velocidade baixa. Para
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promover uma homogeneização correta, com o auxílio de uma colher, foi realizada a
raspagem das paredes por um minuto e, por fim, procedia-se a mistura em velocidade alta
por um minuto. Essa metodologia de mistura foi aplicada em todas as argamassas
confeccionadas.

Após confirmação do proporcionamento da mistura, foram produzidos um total de cinco


argamassas autoadensáveis tal que, duas eram constituídas por misturas de referência,
uma com apenas CP V e uma segunda contendo um teor de 15% de fíler calcário em sua
constituição. Já as outras três argamassas eram compostas pelo RBRO em porcentagens
diferentes, com teores iguais a 10%, 15% e 20% do resíduo, em relação a massa de
cimento, com substituição em volume de areia. A Tabela 2 mostra a quantidade de
materiais aplicada na produção de 1 dm³ de argamassa.

Para conseguir avaliar a trabalhabilidade e o índice de consistência dessas argamassas,


foi realizado o ensaio do funil V de maneira adaptada da ABNT NBR 15823-5:2017.
Nesse caso, foi utilizado um mini funil V, que apresenta as seguintes dimensões: 300 mm
de altura, 265 mm de largura e 35 mm de profundidade, a parte inclinada possui 260 mm
e a parte final reta 65 mm, totalizando um volume de 1,152 dm³.

Tabela 2 – Quantidade de materiais para produção de 1 litro de argamassa, em gramas.


Traço Teor Cimento Fíler RBRO Areia Água Aditivo
CP V - 750 - - 1222,5 290,25 1,5
Fíler 0,15 750 112,5 - 116,8 290,25 1,5
RBRO 0,1 750 - 75 1149,95 290,25 1,5
RBRO 0,15 750 - 112,5 1113,7 290,25 1,5
RBRO 0,2 750 - 150 1077,45 290,25 1,5

Além de avaliar a trabalhabilidade e o índice de consistência do material, foram realizados


também ensaios de massa específica e teor de ar incorporado (NBR 13278, 2005). A fim
de verificar a interferência dos finos no processo de hidratação das misturas a base de
cimento foi realizado também um ensaio de calorimetria conforme metodologia de Betioli
et al (2009). Resumidamente, os ensaios realizados das propriedades em estado fresco
estão apresentados na Tabela 3.

Tabela 3 – Ensaios das propriedades em estado fresco.


Propriedade Método
Determinação do índice de ABNT NBR
consistência 13276:2016
Determinação do índice de
consistência e trabalhabilidade EFNARC (2002)
pelo mini funil V
Determinação de massa específica ABNT NBR
e teor de ar incorporado 13278:2005
Betioli et al.
Ensaio de calorimetria
(2009)

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Após isso, foram avaliadas também as propriedades do estado endurecido por meio da
moldagem de corpos de prova cilíndricos com dimensões 5x10 cm, que foram rompidos.
aos 7 e 28 dias, conforme ABNT NBR 5739:2018. Por fim, foi realizado um estudo
estatístico com os dados obtidos a fim de obter a validação dos dados obtidos por meio
da análise de variância (ANOVA) e teste de Tukey.

3 Resultados
3.1. Quanto à caracterização dos materiais
O CPV-ARI, apresentou em seu laudo uma massa específica aparente igual a 3,03 g/cm³.
A areia natural de cava aplicada no estudo apresentou massa específica aparente de 2,67
g/cm³, módulo de finura igual à 1,66 e uma dimensão máxima característica de 2,38 mm.

Em relação ao resíduo de beneficiamento de rochas ornamentais (RBRO), a massa


específica apresentou o resultado de 2,76 g/cm³, o que corrobora com valores de 2,80
g/cm³ apresentados por Matos et al. (2020) e Schankoski et al. (2017) e o valor de 2,53
g/cm³ apresentado por Vazzoler et al (2018). Em relação à área superficial pelo
permeabilímetro de Blaine o resultado encontrado foi de 1416,20 cm²/g que é um valor
significativamente menor ao esperado, já que Vazzoler et al (2018) encontrou valores
superiores a 6179 cm²/g, isso pode ser explicado pela grande variação do material
coletado nas empresas beneficiadoras de rochas.

Por fim, o ensaio de adsorção superficial de azul de metileno foi de 0,075 mg/g. Já o fíler
calcário, apresentou uma massa específica com valor de 2,82 g/cm3, o que se encontra
de acordo com o valor de 2,80 g/cm3 apresentado por Schankoski (2012). Já a área
superficial apresentou um resultado igual a 2112,64 cm2/g, que corrobora com o valor de
Schankoski (2012) de 2746 cm2/g. Por fim, o ensaio de adsorção superficial de azul de
metileno apresentou o valor de 1 mg/g, um valor ligeiramente menor que o apresentado
por Schankoski (2017) de 1,88 mg/g. Percebe-se que a maior finura do fíler calcário em
relação ao RBRO, refletiu na sua maior adsorção de azul de metileno.

3.2. Quanto ao estado fresco


Os ensaios foram realizados para cada argamassa estudada e os resultados encontrados
estão explicitados na Tabela 4.

Os valores encontrados de massa específica não se diferem muito estando situados entre
2,18 e 2,26 kg/dm³. Já o teor de ar incorporado apresenta uma variação maior, de 0,94 a
4,52%. A massa específica do material usado tem influência direta na futura aplicação do
material, ou seja, onde essa argamassa poderá ser utilizada (MELLO, 2019). Já o ar
incorporado, corresponde à vazios formados pela entrada de ar no interior da argamassa,
ele favorece à trabalhabilidade da mistura, mas pode atuar de forma desfavorável em
relação às resistências mecânicas (MANSUR, et al. 2007).

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Fazendo uma comparação entre as argamassas de RBRO, o valor de ar incorporado
diminuiu com o aumento da porcentagem de resíduos incorporados à mistura; enquanto a
sua massa específica apresenta um leve aumento, isso sugere que o fato do RBRO ser
um material fino, ele proporciona um maior empacotamento da mistura.

Tabela 4 – Quantidade de materiais para produção de 1 dm³ de argamassa, em gramas.


Leitura
Massa Teor de ar média Tempo de
Traço específica incorporado do flow escoamento
(kg/dm³) (%) table no funil (s)
(cm)
CP V 2,19 3,57 36,5 4,11
Fíler
2,18 4,52 33,8 6,2
15%
RBRO
2,23 2,09 34,8 10,77
10%
RBRO
2,24 1,6 28,8 7,89
15%
RBRO
2,26 0,94 26,5 4,57
20%

Em relação à leitura do flow table, para analisar o espalhamento e fluidez do sistema, é


possível perceber que até a aplicação de 10% do RBRO não há grande variação na
fluidez em relação às argamassas referências. Entretanto, quando se analisa misturas de
15% e 20% de adição de RBRO, o diâmetro do espalhamento do material cai
significativamente. Isso comprova o aumento da consistência da mistura conforme o
aumento da quantidade de finos pelo fato desses finos absorverem/adsorverem mais
água livre do sistema.

Já em relação ao ensaio do funil V, o tempo de escoamento no funil V diminuiu enquanto


o diâmetro de abertura do flow table também apresentou diminuição. Esse resultado está
de acordo com o apresentado por Schankoski (2017), que concluíu que as misturas que
apresentaram maiores diâmetros no ensaio de flow table apresentaram também maiores
valores de tensões de escoamento, o que não significa necessariamente que apresentem
uma maior viscosidade. O ensaio é responsável por medir indiretamente a viscosidade do
material, que está relacionada com a dissipação de energia no fluxo, tal que, quanto
menor a dissipação, maior será a velocidade de escoamento do material. Entretanto, caso
essa viscosidade seja muito reduzida a mistura pode apresentar segregação (ROMANO;
CARDOSO; PILEGGI, 2011).

Correlacionando os resultados apresentados, é possível dizer que estão de acordo com


Nielsson e Wallevik (2003), que afirma que tanto a tensão de escoamento quanto a
viscosidade estão atreladas para garantir a resistência à segregação, de forma que, caso
uma apresente valores muito baixos, a outra deve ser alta e vice-versa.

Por fim, para os ensaios de calorimetria, a Figura 4 apresenta os resultados para o ensaio
de misturas no intervalo de 24 horas. É possível observar que as curvas descrevem um
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comportamento semelhante apresentando temperaturas máximas de liberação entre 0,12
e 0,14 ℃/grama de cimento aplicado em um tempo entre 7 a 9 horas.

Os resultados encontrados estão de acordo com os apresentados por Matos et al. (2020)
que apresentam um tempo de pico entre 7 a 9 horas. Analisando o gráfico é possível
perceber que a mistura com o fíler é a que apresenta a menor liberação de calor,
entretanto em um período de tempo muito próximo do referencial que aplica apenas
cimento CP V em sua constituição. Analisando as três misturas com o resíduo RBRO,
pode-se observar que as três liberam uma mesma quantidade de calor/grama de cimento,
entretanto, o que apresenta uma constituição de 10% de RBRO demora um tempo maior
para o ganho de temperatura. Esse aumento do tempo sugere que essa mistura possui
um maior tempo de pega que as demais.

Figura 4 – Resultado do ensaio de calorimetria

3.3. Quanto ao estado endurecido


Para o estado endurecido foram analisadas as resistências à compressão axial de corpos
de provas com idades de 7 e 28 dias. Os resultados obtidos estão indicados na Tabela 5.

Comparando a resistência à compressão axial entre corpos de prova de mesma idade, é


possível perceber que para os corpos de prova de idade igual a 7 dias, foram obtidos
valores variando entre 54,44 e 59,32 MPa, enquanto para os CPs de 28 dias a variação
ficou entre 58,44 e 72,07 MPa. Em relação as amostras com 7 dias, conforme a
quantidade de RBRO incorporada aumentou, a resistência à compressão axial também
apresentou um crescimento, entretanto, o mesmo não foi observado em relação aos
corpos de prova de 28 dias.

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Tabela 5 – Resistência à compressão axial
7 dias 28 dias
Traço Resistência média Desvio Resistência média Desvio
(MPa) padrão (MPa) padrão

CP V 54,44 1,81 72,07 2,1


Fíler 55,05 1,06 58,44 0,93
RBRO
55,44 1,45 69,29 3,34
10%
RBRO
58,55 0,75 68,92 0,62
15%
RBRO
59,32 0,5 68,92 1,07
20%

Aplicando a análise de variância (ANOVA) e o teste de Tukey nos resultados obtidos, com
o auxílio do software Statistica, a fim de verificar se existe diferença significativa entre os
valores de resistência à compressão, percebe-se que os resultados das misturas
referência de CP V e da mistura com 10% de RBRO não apresentaram diferenças
significativas, com 95% de confiabilidade. Entretanto, as misturas contendo 15% e 20%
de RBRO apresentaram diferenças significativas e um resultado superior aos demais. Em
relação aos CPs de 28 dias não houve diferenças significativas entre os resultados das
misturas com RBRO incorporado e a mistura referência de CP V, com 95% de
confiabilidade. A mistura contendo fíler calcário apresentou resultados menores de
resistência à compressão que as demais, com 95% de confiabilidade.

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4 Conclusões
Após a realização do trabalho, foi possível concluir que a incorporação do resíduo de
beneficiamento de mármore em argamassas autoadensáveis não prejudica o
comportamento das misturas se comparado às misturas referências (confeccionadas
somente com cimento ou contendo 15% de fíler calcário) .

Em relação ao estado fresco da mistura foi possível concluir que a adição do resíduo
aumenta a massa específica da mesma e diminui o teor de ar incorporado, o que permite
um melhor empacotamento da mistura e uma possível diminuição na porosidade do
material endurecido. A respeito do espalhamento/fluidez e do tempo de escoamento, que
foram obtidos pelos ensaios de flow table e funil V, respectivamente, percebe-se que o
aumento do teor de resíduo incorporado pode facilitar o bombeamento desse material
sem a existência de segregação.

Em relação aos resultados obtidos pelo calorímetro, foi observado que o incremento do
resíduo com valores inferiores à 20% apresentam um tempo maior para chegar ao pico de
calor liberado pela mistura, o que sugere um aumento no tempo de pega. Já no ensaio
endurecido, os resultados mostram que a inserção do RBRO não apresentou menores
resistências à compressão, em comparação com a mistura referência (contendo somente
cimento), apresentando até mesmo um maior ganho de resistência à compressão axial
em duas idades iniciais, o que pode ser interessante para obras que necessitam esse
ganho de resistência inicial.

Assim, é possível perceber que a utilização do RBRO como fino suplementar para a
produção de argamassas autoadensáveis pode significar uma importante solução para a
futura diminuição dos rejeitos gerados pela indústria de beneficiamento de rochas
ornamentais. Sendo possível promover a sustentabilidade, principalmente quando se leva
em consideração o crescimento exponencial dessa indústria no país.

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