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All content following this page was uploaded by Izabel Lima dos Santos on 08 September 2017.
RESUMO
Toda a área do conhecimento que busca conhecer a trajetória daqueles que colaboraram para o seu
desenvolvimento e consolidação acaba por fortalecer-se e se torna mais capaz de enfrentar desafios
futuros sem repetir os erros do passado. Nesse sentido, este artigo, construído com base em revisão
de literatura, trata da trajetória de Ramiz Galvão a frente da Biblioteca Nacional (BN). Expõe as
atividades por ele desenvolvidas, destacando aquelas que mais colaboraram para o desenvolvimento
da BN sendo que algumas dessas atividades, mesmo atualmente, mantêm um forte caráter inovador.
ABSTRACT
The whole area of knowledge that seeks to know the history of those who contributed to its
development and consolidation be stronger and become more capable of facing future challenges
without repeating past mistakes. In this sense, this article, that was built based on literature review, is
about the trajectory of Ramiz Galvão on command of the Brazilian National Library. Exposes the
activities developed by him, highlighting those that contributed most to the development of the
Brazilian National Library, being that some of these activities, even today, maintain a strong innovative
character.
Modalidade: ORAL
1
1 INTRODUÇÃO
2
sua formação intelectual, tendo estudado no Colégio Pedro II, uma das mais
tradicionais e antigas instituições de ensino do país.
Ramiz Galvão tinha uma formação ampla, característica da época, atuou
como médico na Guerra do Paraguai, chegando inclusive a lecionar na Faculdade
de Medicina do Rio de Janeiro. Além disso, lecionou grego, retórica, poética e
literatura brasileira no Colégio Pedro II no período de 1869 - 1870. Tinha
conhecimentos de filologia, oratória e era um biógrafo e bibliófilo apaixonado e
dedicado aos livros.
Essa combinação ampla de conhecimentos o levou a assumir em 1870, aos
24 anos de idade, a direção da Biblioteca Nacional, atual Biblioteca Nacional, com a
missão de substituir Frei Camilo de Monserrate. Na época em que Ramiz Galvão
assumiu a biblioteca o título de “diretor” ainda não existia e “aquele que administrava
a biblioteca era chamado, simplesmente, bibliotecário1”. (CALDEIRA, 2010, p. 3).
Ao assumir a direção da Biblioteca Nacional, Ramiz Galvão deparou-se com
uma série de desafios. O primeiro, e mais preocupante, deles era o completo estado
de abandono no qual a biblioteca se encontrava. Tal situação deve-se ao fato dos
poucos recursos financeiros destinados à instituição. Essa situação fez com que
Ramiz Galvão escrevesse uma série de ofícios nos primeiros meses de sua gestão
descrevendo a situação e cobrando das autoridades investimentos que permitissem
melhorar a situação estrutural da biblioteca.
Ramiz Galvão dedicou-se com empenho a tarefa de melhorar a estrutura da
biblioteca a fim de que essa pudesse acomodar de forma mais adequada o acervo e
receber satisfatoriamente aqueles que faziam uso de suas dependências. Além de
“solicitar ao Império alguns contos de réis que seriam destinados a reformas naquele
estabelecimento” (CALDEIRA, 2010, p. 3), Ramiz Galvão também conseguiu que
modificações fossem feitas em um prédio próximo a biblioteca o que permitiu que ele
fixasse residência nas proximidades da mesma, uma vez que, como afirma Caldeira,
(2010, p. 4) “morar próximo àquele estabelecimento possibilitava que o bibliotecário
se dedicasse de maneira integral à organização do acervo da instituição”.
As modificações realizadas por Ramiz Galvão na Biblioteca Nacional não se
restringiram apenas a estrutura física da instituição. Ele também foi o responsável
1
É importante lembrar que Ramiz Galvão não era bibliotecário de formação, uma vez que o curso de
Biblioteconomia foi oficialmente criado no Brasil apenas em 1911, só começando a funcionar, de fato,
em 1915, na própria Biblioteca Nacional.
3
pela ampliação do horário de funcionamento da biblioteca. Foi a partir da aprovação,
pelo Ministério do Império, de seu pedido que a biblioteca ampliou seu
funcionamento no período diurno, passando a funcionar das 9 h às 15 h e também
passou a funcionar no período noturno, abrindo das 18 h às 21 h. A abertura da
biblioteca no período da noite foi acolhida positivamente pelo público, uma vez que
“logo no seu primeiro dia de funcionamento no novo turno, a instituição recebeu vinte
leitores, entre eles o próprio imperador” (CALDEIRA, 2010, p. 4); e comemorada por
Ramiz Galvão que no relatório relativo ao período de janeiro a setembro de 1872
destacava satisfeito o fato de a biblioteca ter recebido 6555 leitores nesse período,
sendo muitos dos quais só freqüentavam a instituição à noite.
Ramiz Galvão, como foi dito anteriormente, não era bibliotecário de formação,
entretanto “entre 1873 e 1874, [...] realizou uma longa viagem ao exterior, com a
missão oficial de estudar o funcionamento das bibliotecas públicas européias”
(TURAZZI, 2006, p.3) o que lhe permitiu tanto ampliar seus conhecimentos sobre
esse tipo de instituição como ficar a par das práticas e do funcionamento das
grandes bibliotecas européias, instituições essas que serviam de referência para as
demais naquele período.
Durante sua viagem a Europa, Ramiz Galvão adquiriu obras e documentos
que se somaram a outros itens adquiridos e “descobertos” por ele. Ramiz Galvão,
sem dúvida, foi um dos grandes responsáveis pelo crescimento da Biblioteca
Nacional, tanto no que se refere a sua estrutura como do seu acervo. Esse
crescimento, fez com que a surgissem novas necessidades e levaram o bibliotecário
Ramiz Galvão a adotar posturas e práticas inovadoras e até revolucionárias.
Nos doze anos que ficou a frente da Biblioteca Nacional, Ramiz Galvão
realizou um trabalho notável que, sem dúvidas, colaborou para que a atual Biblioteca
Nacional adquirisse a envergadura e significado mundial que possui atualmente.
Ramiz Galvão só deixou a direção da Biblioteca Nacional porque foi convidado pelo
Imperador D. Pedro II para ser preceptor de seus netos. Por todos os serviços
prestados Ramiz Galvão foi condecorado, em 1888, com o título de barão de Ramiz.
Após o inestimável trabalho realizado na Biblioteca Nacional, Ramiz Galvão
passou por outras instituições tais como a Academia Brasileira de Letras, onde
ocupou a cadeira de número 32 e chegou a ser presidente em 1934, a Academia
Nacional de Medicina e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Esse homem
4
culto e, aparentemente, incansável, faleceu no Rio de Janeiro em 9 de março de
1938, aos 91 anos de idade.
A trajetória de Ramiz Galvão enquanto bibliotecário nos mostra que mais que
um homem de formação ampla e erudita, comum aos intelectuais de sua época, ele
foi um visionário. Ramiz Galvão foi um bibliotecário que soube implementar, ainda
na época do Império, ações e práticas que só se tornariam recorrentes no século XX
ou que, em alguns casos, ainda estão distantes da realidade da maioria das
bibliotecas (públicas) brasileiras.
A preocupação demonstrada por ele com relação a melhoria contínua da
estrutura e dos serviços prestados pela biblioteca, por si só, já demonstra como seu
estilo administrativo possuía aspectos semelhantes a algumas das mais modernas
práticas administrativas contemporâneas.
No âmbito da estruturação física da Biblioteca Nacional, Ramiz Galvão lutou
incessantemente pela melhoria das instalações da biblioteca que na época ficava no
Largo da Lapa, número 46. Dentre as melhorias realizadas durante a gestão de
Galvão com o objetivo de melhorar a segurança e o acesso ao prédio, destaca-se a
instalação de iluminação a gás no prédio da biblioteca.
Com a iluminação a gás na biblioteca, outra mudança importante pôde ser
realizada por Ramiz Galvão: a ampliação do horário de funcionamento da biblioteca
para o período noturno, ou seja, das 18 h às 21 h. Essa mudança cresce ainda mais
em significado na medida em que nos lembramos do período em que foi realizada
(final do século XIX) e do fato de que até hoje às bibliotecas brasileiras são
criticadas por não possuírem um horário de funcionamento que permita que aquela
parcela do público que só poderia frequentá-las após o trabalho ou nos fins de
semana de fato o faça. É claro que a ampliação de horário proposta por Ramiz
Galvão, mostra-se tímida frente à realidade atual, mas, sem dúvida, ela é um marco
no que se refere à necessidade de moldar a biblioteca as demandas de seus
usuários.
As mudanças estruturais realizadas por Ramiz Galvão foram duplamente
indispensáveis. Em primeiro lugar colaboraram para a melhoria do prédio, uma vez
que o próprio Ramiz relatou “[...] que várias salas e corredores da biblioteca
5
encontravam-se arruinados e mesmo podres” (CALDEIRA, 2009, p. 40) o que, sem
dúvida, representava risco iminente para o acervo, frequentadores e funcionários da
biblioteca. Em segundo lugar, as mudanças realizadas colaboraram para a
ampliação da freqüência de público na Biblioteca Nacional, pois essa ficava situada
longe dos centros culturais do Rio de Janeiro. Após a realização de melhorias na
estrutura física e ampliar o horário de funcionamento a biblioteca conseguiu atrair
um maior número de frequentadores.
Outra mudança significativa realizada por Ramiz Galvão foi a criação de
seções especializadas na biblioteca. Tais seções foram implantadas por volta de
1876 e dentre as seções criadas destaca-se a seção de estampas, atualmente
denominada de seção de iconografia (MONTEIRO, 2005).
A divisão do acervo da Biblioteca Nacional em seções mostra outra faceta do
trabalho de Ramiz Galvão: o destaque dado à organização do acervo. Durante a
gestão de Galvão a biblioteca passou a investir mais fortemente nos processos de
catalogação e classificação. A biblioteca também elaborou um catálogo dos
manuscritos existentes em seu acervo. A produção desse catálogo somada a
constante divulgação em jornais da época das obras presentes no acervo da
Biblioteca Nacional, permitiu que o público tomasse conhecimento das obras que
compunham o acervo da instituição.
Foi também durante a gestão de Galvão que a Biblioteca Nacional abandonou
a postura de mera responsável pela salvaguarda de materiais e passou a portar-se
como uma instituição que deveria ser útil para os estudos, especialmente dos
intelectuais fluminenses. É importante destacar que no período em que Ramiz
Galvão esteve à frente da Biblioteca Nacional (1870 - 1882) o Brasil possuía um alto
índice de analfabetos o que fazia com que a biblioteca fosse frequentada apenas
pela pequena parcela letrada da população.
Ramiz Galvão dedicava-se intensamente a ampliação do acervo da Biblioteca
Nacional. Ele procurou, incessantemente, dentro e fora do país e também em
coleções particulares por documentos que tivessem significativo valor histórico para
o Brasil. Em ofícios e relatórios escritos por ele percebe-se sua incessante
argumentação sobre a necessidade do país adquirir tais documentos a fim de lançar
luz sobre sua história. Em documento intitulado Ofício do Bibliotecário da Biblioteca
Nacional ([1877-1879] apud CALDEIRA, 2010, p. 6), existente no Arquivo Nacional,
Ramiz Galvão argumenta que “indubitável é que sem documento não se escreve
6
história e que sem fazer sacrifícios para os haver não legaremos a posteridade mais
do que as trevas e a dúvida que já recebemos na herança de nossos maiores”.
Os esforços empreendidos por Ramiz Galvão tanto na busca dos documentos
como na obtenção de recursos para sua aquisição colaboraram para o crescimento
do acervo da Biblioteca Nacional. Em sua argumentação para a compra desses
materiais, Ramiz Galvão fazia constante alusão as grandes instituições européias,
especialmente a Biblioteca Nacional de Paris e o Museu Britânico.
A busca de Ramiz Galvão por informações sobre a administração de
bibliotecas é anterior a sua viagem a Europa, que só ocorreu em 1873. O
bibliotecário pedia a parentes e amigos que a esse continente se dirigiam que lhe
trouxessem informações sobre as bibliotecas, especialmente as relativas aos
processes de catalogação, classificação, conservação e restauração de materiais,
de forma que assim ele tivesse como basear o trabalho que desenvolvia na
Biblioteca Nacional nas práticas mais modernas de sua época.
Ramiz Galvão utilizava a experiência adquirida em outras áreas e instituições
como auxílio no seu trabalho de bibliotecário. Prova disso é que já tendo atuado “[...]
como jurado e relator de duas grandes exposições nacionais [...]” (TURAZZI, 2006,
p.3) utilizou tal experiência, além de sua enorme erudição, como base para a
realização “[...] das duas primeiras exposições da Biblioteca [Nacional]: a do
Tricentenário da morte de Camões (1880) e a de História do Brasil (1881) [...]”
(BIBLIOTECA NACIONAL, 1960, p. 13).
A primeira exposição realizada por ele na biblioteca era dedicada ao poeta
português Luís de Camões, exibiu para o público um valioso acervo iconográfico e
bibliográfico e contou com a presença do Imperador D. Pedro II nas cerimônias de
abertura e de encerramento. Em fala durante o evento, Ramiz Galvão (1880 apud
JOÃO, 2000) destacou a universalidade de Camões ao dizer que o poeta "não
cantou só as glorias do patrio ninho, - mas uma pagina brilhante da historia da
humanidade, que não é thesouro de um seculo, de um povo, de um vate, de uma
lingua, mas thesouro de todos os tempos e de todos os lugares".
A segunda exposição, dedicada à memória histórica e geográfica brasileira
surgiu da paixão de Ramiz Galvão pela documentação histórica e, principalmente,
de sua preocupação para com a sua preservação. Nessa exposição foi possível
tornar público algumas das muitas aquisições e “achados” realizados por Ramiz
Galvão, especialmente durante sua viagem a Europa, e que contribuíram para que o
7
acervo da biblioteca crescesse em quantidade e qualidade. Além disso, o
bibliotecário também solicitou que as províncias enviassem, ao menos a título de
empréstimo, materiais para compor a exposição. A exposição foi aberta no dia 02 de
dezembro de 1881, data do aniversário de 56 anos do Imperador D. Pedro II. A
Exposição de História do Brasil ainda “[...] previa a realização de uma série de
conferências de história e geografia do Brasil paralelamente à duração da mostra”
(TURAZZI, 2006, p.4), entretanto, devido ao baixo número de trabalhos inscritos as
conferências não aconteceram.
O catálogo da Exposição de História do Brasil foi publicado, dividido em dois
tomos, no volume nove dos Anais da Biblioteca Nacional. Até hoje essa catálogo é
considerado por muitos historiadores como sendo “[...] o maior monumento
bibliográfico já produzido no Brasil”. (TURAZZI, 2006, p.5).
A publicação dos Anais da biblioteca foi estabelecida por Ramiz Galvão
quando este voltou de viagem da Europa e criou um novo estatuto para a Biblioteca
Nacional (CALDEIRA, 2011). Percebe-se através dessa ação que durante suas
visitas as bibliotecas européias, Ramiz Galvão assimilou várias de suas práticas e,
ao retornar ao Brasil, buscou incorporá-las as práticas da instituição.
Enquanto Ramiz Galvão esteve à frente da Biblioteca Nacional, foram
editados e impressos nove volumes dos Anais da Biblioteca Nacional. O primeiro
volume desses Anais foi publicado em 1876 e nele, segundo Caldeira (2011, p. 7)
8
de divulgação do acervo da Biblioteca Nacional, atualmente eles servem tanto como
memória da própria biblioteca, como fonte de textos de importantes intelectuais da
época e como registro histórico de um período no qual o Brasil buscava se afirmar
frente às demais Nações do Mundo e anterior a fortes transformações políticas e
sociais.
Além dos Anais da Biblioteca Nacional, Ramiz Galvão também foi o
responsável pela reedição de Prosopopéia de Bento Teixeira e da Arte da Gramática
da língua brasílica da nação Kiriri, do Padre Mamiani (BIBLIOTECA NACIONAL,
1960, p. 13).
Apesar de ter sido definido por Viriato Correia, seu sucessor na Academia
Brasileira de Letras, como sendo “um trabalhador infatigável” (CORREIA, 1938),
Ramiz Galvão não poderia ter realizado tanto pela Biblioteca Nacional e pela
Biblioteconomia brasileira sem a ajuda de um quadro de funcionários tão infatigável
quanto ele.
Ramiz Galvão sabia da importância de que os funcionários da biblioteca
possuíssem um bom nível de instrução e fossem talentosos nas funções que
viessem a desempenhar. Ele chegou a escrever muitos relatórios ao Ministério sobre
“[...] a necessidade de contratar pessoas capacitadas e instruídas para trabalhar na
biblioteca.” (CALDEIRA, 2010, p. 4).
Foi com a intenção de gratificar os funcionários que já atuavam na biblioteca e
que com a ampliação de horário de funcionamento tiveram sua jornada ampliada,
além de, atrair pessoas qualificadas para atuarem na instituição que Ramiz Galvão
escreveu repetidas vezes exigindo de seus superiores um aumento salarial para os
funcionários da biblioteca. Após muita insistência, o Ministério autorizou o
pagamento da gratificação.
Além da conquista relativa à melhoria salarial, Ramiz Galvão também foi o
responsável por realizar, em 1879, o primeiro concurso para o cargo de bibliotecário
no Brasil (MADELLA, 2006; CALDEIRA, 2010). Concorreram a vaga quatro
candidatos que após a inscrição e comprovação de sua “idoneidade moral”
realizaram uma prova que pode ser definida de muitas maneiras, exceto como
simples. Caldeira (2009, p. 46) nos traz uma descrição da estrutura e conhecimentos
demandados no processo seletivo:
9
Os candidatos teriam quatro horas para fazer provas de quatro disciplinas:
história, geografia, literatura e filosofia. Passada esta etapa, eles seriam
submetidos a provas de tradução de textos em inglês, francês e latim. [...]
Após a prova de idiomas, os candidatos deveriam mostrar seus
conhecimentos arquivísticos e bibliográficos a partir do exercício de
classificação de um livro impresso, uma estampa e um manuscrito da
biblioteca.
4 CONCLUSÃO
10
REFERÊNCIAS
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