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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO -

UEMA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS


- CCSA CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
BACHARELADO
MÍDIA E PODER

ANDREZA PEREIRA BERREDO


ERYKA GIOVANNA DO NASCIMENTO DOS SANTOS
SANDRYMÁRIA SAMPAIO SANTOS

TRADIÇÃO JUNINA E O LUCRO DA MÍDIA


Análise crítica produzida a partir do descaso com os grupos tradicionais
maranhenses como Boi da Maioba e Cacuriá de dona Teté no São João da Thay.

São Luís
(2023)
Universidade Estadual do Maranhão- UEMA
Centro de Ciência Sociais Aplicadas – CCSA
Curso de Ciências Sociais Bacharelado
Mídia e Poder

Atividade avaliativa

Atividade avaliativa da unidade 3 para obtenção de nota


da disciplina de Mídia e Poder, ministrada pela Prof.
Rosirene Martins Lima.

São Luís
2023
INTRODUÇÃO

O São João é uma manifestação cultural do Estado do Maranhão, nordeste brasileiro.


Apesar de existir algumas formas de compreender o significado cultural da manifestação,
existem limitações na mensuração dos valores sistêmicos dessa experiência. O São João do
Maranhão, um dos mais conhecidos Bumba meu Boi é uma importante manifestação cultural
do Estado do Maranhão. Presente em várias regiões da baixada maranhense ou mesmo dos
bairros de São Luís. o Bumba meu Boi narra uma história de amor e devoção e assume uma
centralidade simbólica.
A história das comunidades é elemento essencial juntamente com identidade da região,
considerando as origens étnicas das comunidades, a fim de analisar a coerência entre as raízes
históricas e as manifestações culturais. O cenário da festa, pode também converter-se no espaço
das políticas de fortalecimento e da valorização do patrimônio cultural, das manifestações
populares e das comunidades que as produzem.
Sobre o Boi da Maioba, especificamente, é um grupo de Bumba-meu-boi do tipo “sotaque da
ilha”, também chamado de “boi de matraca”, principalmente por ser reconhecido como o grupo
desta categoria mais antigo, ostentando 123 anos de existência. Os agentes sociais da região da
Maioba decidiram fazer uma “brincadeira” com objetivos de homenagear os santos do período
junino. Desta forma, em virtude da utilização dos instrumentos como o pandeirão e a matraca
e do ritmo composto pelo grupo, foi categorizado como do tipo “sotaque da ilha”
Assim como o famoso Cacuriá da ilha que é nomeado de “Cacuriá de dona Teté”. A
tradição do Cacuriá em São Luís está legitimada enquanto um desdobramento da festa do
Divino Espírito Santo que nasceu 1973, e passou por grandes transformações até chegar no
Cacuriá que conhecemos hoje, mas sempre carregando seu valor simbólico. Dona Teté
conhecida como a rainha do Cacuriá e caixeira do Divino espírito santo aprendeu o Cacuriá
com Seu Lauro que se inspirou no carimbo do Divino, mas Dona Teté fez sua trajetória no
Cacuriá na casa Laborarte e deu continuidade ao Cacuriá da sua forma, inspirou muita gente na
época, compôs suas músicas para o Cacuriá e começou a difundir o Cacuriá nas escolas
públicas.
Neste sentido, a propaganda das festas juninas como elemento de atratividade turística
nas propagandas e mais recentemente no espaço virtual aparece como uma necessidade de
mercado, a cultura é a matéria prima para a criação de um produto comercializável perdendo
suas características singulares, ou seja, o significado da festa enquanto momento de celebração,
mobilização e participação popular. O chamado “São João da Thay” acompanha essa lógica
onde a tradição é vista como uma adequação mercadológicas e vem sofrendo um processo de
transformação quando as apresentações de grupos da cultura popular tornam-se
institucionalizadas.

A TRADIÇÃO COMO MANIFESTAÇÃO CULTURAL

BOI DA MAIOBA COMO RESISTÊNCIA


Fundado em 1897 por moradores do povoado Bom Negócio, na região do município de
Paço do Lumiar, próximo à capital São Luís, o Boi da Maioba é um dos grupos de bumba-meu-
boi mais antigos que ainda tem suas atividades ativas atualmente.
O Boi da Maioba é uma manifestação folclórica e cultural originária do estado do Maranhão,
no Nordeste do Brasil, e atualmente o grupo tem como presidente José Inaldo Ferreira, também
conhecido como “Zé Inaldo”, que herdou o Boi de seus pais e avós.
A história do Boi da Maioba está ligada a uma lenda popular maranhense, que conta a história
de um fazendeiro que tinha um boi muito valioso e estimado. Esse boi acabou sendo roubado
por um morador da comunidade chamado Pai Francisco, para sua mulher que estava grávida e
desejava a língua do boi, Catirina. Ao descobrir o roubo, o fazendeiro, conhecido como Piauí,
fica inconsolável e, com a ajuda de outros personagens, realiza uma busca para encontrar o boi.
Durante essa busca, há uma série de situações engraçadas e divertidas, que envolvem a interação
entre os personagens e o público. A história geralmente culmina com a captura do ladrão e a
ressurreição do boi, que é um momento de grande alegria e comemoração.
O Boi da Maioba é caracterizado pelas suas cores vibrantes, trajes ricamente decorados,
músicas animadas e coreografias elaboradas. Os grupos de Boi da Maioba são compostos por
cantadores, tocadores de instrumentos, dançarinos e atores que interpretam os personagens da
história.
Por sua grande quantidade de brincantes, são conhecidos como batalhão. O adjetivo tem uma
conotação voltada à luta, uma das principais bandeiras levantada pelos grupos de sotaque de
matraca. Esses bois resistem ao tempo e buscam por condições melhores de vida para sua
comunidade que são manifestadas através da cultura popular centenária.
A festa do Boi da Maioba costuma ocorrer durante o período das festas juninas,
especialmente em junho, e é uma das principais manifestações culturais do estado do Maranhão.
Além disso, ao longo dos anos, o Boi da Maioba tem se mantido vivo e ganhado popularidade,
sendo transmitido de geração em geração, preservando a cultura e a tradição maranhense.

CACURIÁ DE DONA TETÉ COMO REFERÊNCIA CULTURAL

Afinal, QUEM FOI DONA TETÉ?


Dona Teté cujo nome de batizado é Almerice da Silva Santos era caixeira da Festa do
Divino, nasceu em 1924 em São Luís e faleceu em 2011, era caixeira da Festa do Divino e fazia
parte do tambor de Crioula com seu Lauro criador do ritmo do Cacuriá lugar onde Dona Teté
se inspirou e encontrou sua paixão no Cacuriá.
Dona Teté iniciou a brincadeira do Cacuriá dentro do Casarão Laborarte, grupo artístico
independente criado em 1972 no centro de São Luís. Lugar onde Dona Teté ascendeu, o grande
sucesso alcançado pelo Cacuriá no Laborarte solidificou definitivamente a trajetória de Dona
Teté como a grande representante do Cacuriá. Atualmente o grupo de Dona Teté continua
fazendo sucesso e carregando o legado de Dona Teté. A maioria dos versos do Cacuriá são de
domínio popular, outros levados à roda foram escritos por Dona Teté. Há ainda alguns cantos,
conhecidos no grupo, compostos por Cecé Ferreira, a Cecézinha, e Rosa Reis.

O CACURIÁ
A dança do Cacuriá, da forma como é conhecida e dançada hoje no Maranhão, foi criada
no início da década de 70 em São Luís inspirada pela festa do Divino quando as caixeiras, após
os festejos, saiam para se divertir no carimbó de caixeiras. O primeiro grupo de Cacuriá a surgir
em São Luís foi liderado por seu Lauro, do bairro Ivar Saldanha. Sendo assim, uma tradição
que possui surgimento localizável, tendo se transformado em uma dança extremamente popular
em São Luís, onde é dançada em praticamente todos os bairros periféricos. Atualmente há
vários grupos de Cacuriá no Maranhão, com destaque para o Cacuriá de Dona Teté, para além
disso, o Cacuriá no contexto do divino passou a ser vivenciado em momentos de celebração
entre a comunidade e os brincantes, fazendo que todos se unissem a dança e tudo acabava em
Cacuriá.
O Cacuriá utiliza símbolos que foram conscientemente colhidos de um lugar tradicional
com o qual os agentes sociais tinham esse contato orgânico, como as Antigas cantigas de roda
da região somadas a canções e versos em contextos comunitários transformando de forma
criativa e tornando um elemento emblemático da cultura popular tradicional.
A PROMESSA DA MÍDIA E SUAS PROBLEMÁTICAS

Os meios de comunicação de massa desempenham um papel importante na divulgação


de informações, moldando a opinião pública e criando uma consciência política mais ampla.
No entanto, possui o poder de modernização e pode criar tensões e conflitos em sociedades
tradicionais que se adaptam a essa realidade e tentam preservar sua identidade cultural,
provocando mudanças positivas e negativas na sociedade tradicional. Abordando a
problemática do trabalho, o São João do Maranhão é uma tradição centenária com a maioria
dos ritmos e grupos comandados por pessoas negras da baixada maranhense e em quilombos,
em terras tradicionais. Festa religiosa onde os brincantes demonstram a sua devoção a tradição
e religião católica e de matriz africana como o Boi da Maioba e o Cacuriá de Dona Teté que
nasceu do Divino Espírito Santo. Manifestações como essas preservam os anciãos como fonte
de conhecimento, produzem trabalho social e cultural com crianças além, da função religiosa e
de interação face a face.
Em outro cenário, o recente evento chamado São João da Thay que acontece anualmente
já em sua 4ª edição, é feito pela influenciadora digital Thaynara OG. O objetivo é enaltecer a
cultura do Maranhão para as pessoas verem o lugar como uma potência turística e para ajudar
instituições locais, os shows ficam por conta das artistas brasileiras, além de atrações locais. O
evento conta com grandes patrocinadores
"Tenho patrocinadores e apoiadores, mas muita demanda de investimento meu. Esse ano vai
ser um evento que gira em torno de R$ 5 milhões ", diz Thaynara Og em entrevista para o UOL.
O evento já contou com famosos como Leo Santana, Alcione e Ivete Sangalo.
Em contrapartida ao objetivo do evento, grupos que fazem a festa tradicional acontecer
tem se posicionado apontando críticas e notas de esclarecimento em relação a festa. Na Edição
de 2022, onde as atrações apresentadas como principais eram Gloria Groove, Zé Felipe, Juliette
e Lucy Alves com horas de apresentações, o tradicional Boi da Maioba com 126 anos de
existência se manifestou nas redes sociais cancelando a sua participação no São João da Thay
pois o evento concedia ao grupo somente 2 minutos de apresentação para o grupo “não vamos
participar do arraial da Thay, por terem nos convidado em cima da hora e também ‘porque’ nos
concederam apenas 2 minutos para a nossa apresentação. E por esta razão entendemos não
aceitar ao convite ", diz o grupo na nota. Muitos comentários nas redes sociais surgiram dos
internautas abismados com o desrespeito com o grupo.
Fato importante é que apenas um ano depois foi postado nas redes sociais do São João
da Thay um vídeo onde a influenciadora e sem produtor expõe situações onde não mencionaram
o nome de nenhum grupo mas os internautas relacionavam com o caso com o Boi da Maioba.
no vídeo postado o produtor fala que o grupo ficou com “raivinha’ pelo tempo ofertado e
Thaynara Og diz “mais dessa vez não vão participar da grande festa, e nunca mais, não é só
dessa vez”
Em entrevista dada ao Blog Jacieny Dias, José Inaldo atual presidente do Boi da Maioba
diz “Quando nos avisaram, na semana do evento, que o Boi da Maioba teria 2 minutos pra se
apresentar, eu disse para a produção que dessa forma não iríamos” e segundo ele a produção
ainda pediu que desse “um jeitinho” continuando argumentou que “Eles falaram que foi o
cerimonial do evento que estipulou o tempo de 2 minutos. Nós não aceitamos. Mas isso não
aconteceu no dia do evento”, esclarece.
Inaldo afirmou também que com esse tempo "não dá nem pra cantar uma toada”. Sobre a fala
da influenciadora de que o Boi da Maioba nunca mais participaria do evento, acrescentou: “O
Boi da Maioba já atendeu vários pedidos dela, fizemos cinco apresentações para Thaynara OG
de graça, e nunca nos ofereceram nem um copo de água. Agora faz isso. Ela deveria respeitar
a instituição Maioba e não querer causar intrigas.”
Já em 2023, Camilla Reis, neta da memorável Dona Teté fundadora do famoso Cacuriá de Dona
Teté e umas das atuais cantoras e caixeiras do grupo, se manifestou em vídeo nas redes sociais.
A cantora inicia o vídeo falando que o São João é uma festa negra, dos descendentes de
africano que vieram ao Maranhão escravizados nascida na baixada maranhense, região de
quilombo e que hoje os grandes “bois” estão nos quilombos urbanos de São Luís, região negra
do local. E no final argumenta que o São João da Influencer (menção a Thaynara Og) é um
evento racista, pois os únicos que são “deixados de lado” são os grupos tradicionais onde a
maioria são formadas de pessoas negras. Camila Reis diz que “ano passado a gente ‘estava’
atrás do palco em um som ‘infernal ‘. a gente estava escutando toda a frequência que vinha
atrás, um grave muito pesado que ficava ressoando, ressoando, ressoando, sentados em simples
cadeiras de plástico com direito a água, isso com três horas de atraso” e o vídeo expõe que nos
dois anos de edições anteriores, o grupo passou pelas mesmas coisas. Diz também que não gosta
do evento pois “você paga artistas caríssimos e você não tem um lugar confortável pra colocar
uma apresentação dessa aqui que não é 10% do cachê desses artistas grandes aí, de Zé Felipe,
Zé Vaqueiro, Léo Santana, Ivete Sangalo e com três horas ainda tu não tens um lugar pra eu me
sentar e esperar a tua grande festa?” Ainda se manifesta sobre o vídeo postado pela influencer
onde fala “boi da Maioba não vai tocar nesse evento, mas vai continuar tocando’’ concluiu seu
pronunciamento,

CONCLUSÃO
Diante disso, o São João da Thay como um grande evento midiático, tem divulgado da
cultura do São João do Maranhão em modelos de grandes festivais com atrações renomadas e
menosprezando quem faz a festa acontecer que são os grandes grupos de brincantes e
renomados nomes da cultura popular, não hospedar humanamente o grupo e oferecer minutos
de apresentações onde o grupo não consegue nem afinar uns instrumentos é um descaso com
quem faz a grande festa junina viver. O poder da mídia faz com o que tradições remodelam
suas práticas para caber em programações pensadas somente na Elite cultural, onde mesmo o
evento movimentando milhões de reais, grupos tradicionais já se apresentaram gratuitamente e
com péssimas condições de acomodação.

REFERÊNCIAS:
A mídia e a modernidade. Uma teoria social da mídia. John, B Thompson
https://www.jacienydias.com.br/noticias/thaynara-og-afirma-que-boi-da-maioba-nunca-mais-
pisa-no-sao-joao-da-thay
RODRIGUES, Inara.Vem cá curiar o Cacuriá. São Luís: editora Aquarela, 2015.
SAHLINS, M. O pessimismo sentimental e a experiência etnográfica: porque a cultura não é
um objeto em via de extinção (Parte I). In: Revista Mana. Rio de Janeiro, v.03, nº01, 1997.

ASSUNÇÃO, Matthias Röhrig. Cultura popular e sociedade regional no Maranhão do século


XIX, América Latina: Imagens, Imaginação e Imaginário. Bessone, Tânia Maria Taveres e
Queiroz, Tereza Aline P. (orgs.). Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1997.

BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.

CANCLINI, Nestor Garcia. As Culturas populares no Capitalismo. São Paulo: Brasiliense,


1983.

HOBSBAWN, Eric J. A Invenção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
SAUAIA, Anuar. O boi da Maioba e a contemporaneidade. São Luís: Publicação Científica
do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão – UFMA,
2008.

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