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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – CAMPUS IV


COLEGIADO DE HISTÓRIA

Etnografia da Festa do Divino e da Marujada, em Jacobina-BA.1

Amanda Moreira Cunha2


Aislan Nascimento Pedroza3

No dia 28/05/2023, numa manhã de Domingo, às 08:00, ocorreu o festejo do Divino


Espírito Santo. Iniciou-se na Igreja da Missão (Capela de Bom Jesus da Glória) e teve o
cortejo até a Igreja da Matriz de Santo Antônio.
Nota-se que as pessoas envolvidas no festejo, em sua maioria, eram pessoas brancas e
de uma importância social e religiosa em Jacobina. Ou seja, igualmente nos descritos de
Martha Abreu, em O Império do Divino – Festas religiosas e cultura popular no Rio de
Janeiro (1830-1900), onde os mecanismos da festa detinha um controle por meio das
administrações públicas e órgãos religiosos, que tinha como objetivo a visibilidade aos rituais
monárquicos (ABREU, Martha, p. 254).
Suas vestimentas eram vermelhas e brancas, algumas com o acréscimo do dourado.
Tinha pessoas de todo o tipo de faixa etária, sendo crianças, bebês, adolescentes, adultos e
idosos. Além daqueles que estavam representando toda a corte/realeza portuguesa da época
colonial. A Rainha representada por uma criança branca de cabelos loiros, com vestimentas
toda de vermelho e dourado, com um guarda-chuva das mesmas cores e com um manto real,
junto com alguns ‘’servos’’ reais que seguram o seu manto.
A Virgem Maria com as suas roupagens azul, branco, dourado e vermelho,
representada por uma adolescente branca e de cabelos morenos. Jesus Cristo com roupa
branca e dourada, representado por um homem branco, com barba grisalha e cabelos longos
morenos. Moisés, representado por um homem negro com vestimenta similar à de um

1
Atividade avaliativa da disciplina de Cult. Gen. Afro brasileira e indígena, ministrada pelo
professor Marcos Gonçalves.
2
Amanda Moreira Cunha, discente do curso de licenciatura em História na Universidade do
Estado da Bahia, Campus IV – Jacobina, 2023.1.

3
Aislan Nascimento Alves Pedroza, discente do curso de licenciatura em História na Universidade
do Estado da Bahia, Campus IV – Jacobina, 2023.1.
camponês. Os 12 apóstolos representados por 12 meninas brancas e negras, vestidas todas de
vermelho e dourado. Os anjos foram representados por crianças brancas, vestidas de dourado
e com asas brancas. o Espírito Santo, por sua vez, foi representado por uma imagem de um
pombo branco grande, e houve a participação dos homens do exército também.

É possível notar, assim como Martha Abreu relata em Festas religiosas, cultura e
política no império do Brasil, a Festa do Divino abria um espaço de encontro de todos os
habitantes da cidade, e percebe-se que todos envolta que participaram do festejo estavam
bem-vestidos com as suas melhores roupas, tendo pessoas negras e brancas de todas as classes
e gêneros.
Coincidindo com as relações de Igreja e Estado (presente no respectivo festejo com a
presença da corte e dos elementos da Igreja) levando para a esfera social, criando um tipo de
‘’diálogo’’ e de conflitos culturais com as suas trocas. Afirmando, no entanto, uma
permanência de uma estrutura festiva que discorre entre os tempos e espaços do império até a
contemporaneidade, desde as misturas dos escravos com a população livre, até a mistura atual
da Igreja com as pessoas renomadas socialmente e com o povo de Jacobina. A utilização dos
fogos de artifício, dos batuques e das cantorias voltadas para o Espírito Santo eram notórios
no cortejo para a Igreja da Matriz de Santo Antônio.
Enquanto mais se aproximava da Igreja, mais via-se bastante pessoas à espera da
chegada da corte. Após a chegada, começa realmente os festejos com comidas, bebidas,
músicas, incensos e fogos (apesar que este foi presente em todo o período do cortejo). A Igreja
ficou lotada de pessoas, é muito notório a presença de pessoas brancas dentro da Igreja e fora,
não que as pessoas negras não estivesse, mas a maioria foram de brancos.
Contudo, a Festa do Divino é uma tradição religiosa da região que acontece todos os
anos como forma de uma representação cultural, onde vem sendo mantida desde a época
colonial, marcada por uma série de tradições e rituais que foram passados de geração em
geração, combinando os elementos culturais africanas e do catolicismo. Essas celebrações
demonstra a riqueza cultural do povo brasileiro, baiano e nordestino, juntamente com a sua
capacidade de se reinventar e preservar as tradições ao longo dos séculos.
No dia seguinte 29/05/2023, aconteceu também pela manhã às 09:00-10:00 horas a
Marujada, onde é uma festa popular que tem como base a devoção a São Benedito, um santo
preto que é considerado o padroeiro dos negros e das festas populares. A Marujada é um
festejo com quase 200 anos que vem sendo mantida até os dias atuais em Jacobina, tendo a
sua originalidade vinda dos portugueses em um contexto da vitória dos cristãos contra os
mouros e, em Jacobina, foi imersa pelas famílias negras e tornou um símbolo notório de
resistência e de misturas culturais católicos e africanos.
Neste dia começou com os representantes dos marinheiros fardados se reunindo na
praça da Igreja da Matriz de Santo Antônio, vestidos com roupas brancas e azuis, de onde saiu
às 9 horas em um desfile pela cidade cantando e celebrando sua tradição, mas segundo as
pessoas da comunidade, a Marujada acontece desde a alvorada (madrugada) e permanece até
a Santa Missa 11:00. Houve a presença de algumas pessoas de fé que acompanhavam e outras
paravam para observar o cortejo de fora.
Diferente da festa do divino, encontrava-se uma população maioritariamente preta, dos
marinheiros que estavam desfilando. A formação do desfile é composta por um violeiro, o
mestre, um contramestre, um general, um Capitão e em seguida as crianças todas de sexo
masculino que são chamados de calafates, esses auxiliavam nos agudos na cantoria e, em
seguida, tem os marujeiros com instrumentos de batuque, das castanholas e pandeiros
enfeitados de fitas coloridas. Além da presença das espadas que alguns marujos carregavam
no cortejo, sendo um simbolismo da Marujada, por representar a força, o domínio e o poder,
representando também as vitórias nas guerras (MIRANDA, Carmélia. p. 452).
A caminhada chegou na Igreja da Matriz de Santo Antônio por volta das 10:20, onde
entraram na Igreja e começaram com os festejos. Nisso, os marujos se encaminharam até a
frente do altar e começaram a cantar e dançar com músicas tradicionais em uma celebração
muito animada e devocional à São Benedito, enquanto a do Divino não teve muitas danças e
nem as cantorias foram tão animadas quanto a da Marujada. Depois, os marujos se sentaram
para assistir à Santa Missa nos bancos em que já tinham sido reservados pelos membros da
Igreja e, logo depois, terminou a aula de campo.
Logo, foi possível notar que a Marujada tem a participação de diversas comunidades e
grupos regionais. É uma festa que atraiu canais televisivos, repleta de apresentações de dança
e música, onde se mostra uma culturalidade muito rica e importante que representa a
resistência, a fé e a alegria dos povos pretos da região de Jacobina, além da sua tamanha
importância para a formação da identidade cultural da cidade.

Considerações finais.

Notamos que houve uma maior participação e o envolvimento da população de


Jacobina na Festa do Divino do que na Marujada, mesmo a Marujada sendo um festejo que
representa mais o povo do que a do Divino. Ambas são festejos vinculados com a religião
católica com São Benedito e o Espírito Santo, uma sendo mais embranquecida e a outra mais
voltada para os negros com uma maior presença de pessoas negras do que brancas. Além
disso, levantamos uma questão: por quê, na Festa do Divino, a Igreja da Matriz de Santo
Antônio estava praticamente impossível de entrar por ter ficado lotada, mas na Marujada não?
Mesmo a Marujada tendo cantos e danças muito atrativas, ricas de simbolismo e bastante
animado, não foi suficiente para chamar a atenção de uma quantia generosa da população ao
ponto de comparecerem nesse festejo. Será que o motivo é por ser uma festa de negros e de
um santo negro?
Por fim, a experiência vivida nesses dois festejos foi de muita relevância, pois fez com
que abrangêssemos as nossas visões sobre tudo aquilo que estavam ocorrendo, transpassando
uma colonialidade ainda viva e forte muito perto de nós, com as presenças dos simbolismos
ricos e coloridos que eles trazem. Tendo na sua essência uma cultura ancestral africana e
portuguesa vinda do império que se preservou até os dias atuais em suas mais diversas regiões
do Brasil.

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