Você está na página 1de 69

E-BOOK

TURMA DO PLANETA
SONHANDO ACORDADO

MEIO
EDUCAÇÃO AMBIENTE
Silvana Gontijo

Sonhando
acordado

Vol. 3
Aprendendo com os mais velhos
Embarque nessa aventura com a

ILUSTRAÇÕES DE

Mirella Spinelli
.
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. É PROIBIDA A REPRODUÇÃO.
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Silvana Gontijo

Sonhando
acordado
Aprendendo com
os mais velhos

Embarque nessa aventura com a

Vol. 3

ILUSTRAÇÕES DE Mirella Spinelli


TRADUÇÃO PARA O TUPI ARCAICO DE Kerexu Mirim
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Este livro é dedicado aos meus netos:


Cora, Cecília, Elias e Benjamim.

E aos seus primos: João Pedro, Dube, Giulia,


Nicholas, João Vitor, Duda, Lulu, Vitor, Bernardo, Biel,
Joana, Giovanna, Henrique, Madu, JP, Georgia, Lavínia,
Lipe, Bruna, Pedro Bernardo, Dudu, Thomás, Maria
Eduarda, Letícia, Luli, Gabriel, Bê e Ana.
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Copyright © 2023 Silvana Gontijo


Copyright desta edição © 2023 Autêntica Editora

Todos os direitos reservados pela Autêntica Editora Ltda. Nenhuma parte desta
publicação poderá ser reproduzida, seja por meios mecânicos, eletrônicos, seja
via cópia xerográfica, sem a autorização prévia da Editora.

EDITORA RESPONSÁVEL ILUSTRAÇÕES


Rejane Dias Mirella Spinelli
REVISÃO CONSULTORIA ÉTNICO-RACIAL
Lorrany Silva Tom Farias
PROJETO GRÁFICO LEITURA CRÍTICA
Diogo Droschi Leo Cunha
DIAGRAMAÇÃO Tina Correia
Guilherme Fagundes
CARACTERIZAÇÃO
CARACTERIZAÇÃO
DE PERSONAGENS
Bia Sales

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Gontijo, Silvana
Sonhando acordado : aprendendo com os mais velhos / Silvana
Gontijo ; ilustrações de Mirella Spinelli ; tradução para o tupi arcaico
de Kerexu Mirim.-- 1. ed. -- Belo Horizonte : Autêntica, 2023. -- (Tur-
ma do planeta ; 3)

ISBN 978-65-5928-279-1

1. Aventuras - Literatura infantojuvenil 2. Planeta Terra - Literatura


infantojuvenil I. Spinelli, Mirella. II. Título. III. Série.

23-153204 CDD-028.5

Índices para catálogo sistemático:


1. Literatura infantil 028.5.
2. Literatura infantojuvenil 028.5
Henrique Ribeiro Soares - Bibliotecário - CRB-8/9314

Belo Horizonte São Paulo


Rua Carlos Turner, 420 Av. Paulista, 2.073, Conjunto Nacional
Silveira . 31140-520 Horsa I . Sala 309 . Bela Vista
Belo Horizonte . MG 01311-940 . São Paulo . SP
Tel.: (55 31) 3465 4500 Tel.: (55 11) 3034 4468

www.grupoautentica.com.br
SAC: atendimentoleitor@grupoautentica.com.br
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Vinheta

As aventuras da Turma do Planeta sempre


começam quando alguém cisma em voltar no
tempo para decifrar algum enigma, geralmente
ligado à música – a paixão dessa galera. A curio-
sidade é contagiante, e não demora muito para
eles irem buscar no passado respostas sobre algum
instrumento musical, alguma partitura, algum som
ou algumas histórias sobre o território favorito
deles, a Floresta do Beija-Flor Azul. A primeira
viagem foi para tentar aprender como tocar um
instrumento que ninguém conhecia. E foi assim
que tudo começou.

.5.
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Casa
da Silvia e
do Zeca

Casa
da Bia,
do Paulão
e da Tília
Casa
do GUI

VEJA AQUI
onde vivem nossos amigos
da cidade. Todos eles
moram no mesmo bairro
Casa e estudam na EM PAZ
do king (Escola Municipal
fábio Planeta de A a Z).

.6.
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

ESCOLA
FLoresta
do
beija-flor
azul

Casa
da tinu

Casa
da
Petica

.7.
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

BIA é a mais nova da Turma e irmã do Paulão. É BIA


um gênio da música e toca violino na banda. Seus 6 anos
olhos não enxergam bem, mas sua sensibilidade
faz com que consiga ver mais do que a maioria de
nós. Ela é ligadíssima – o irmão diz que parece uma
antena que fala até com as paredes. Bia é a única
que conversa com animais e plantas e entende
tudo o que eles dizem. Suas maiores paixões são
a sua cadelinha Tília e o seu violino.

TíLIA TÍLIA é uma adorável cachorrinha lhasa apso,


raça sagrada do Tibete. Ela é a regente da ban-
da e a guia da Bia. Sua audição é espanto-
sa, e ela consegue escutar tudo, até os sons
mais distantes. Tília entende a linguagem da
natureza e distingue todos os instrumentos.
Presta muita atenção à conversa dos humanos
e adora a Bia.

GUI é muito alegre, extrovertido, solidário e fiel


GUI
8 anos
aos amigos e à família. Ele tem síndrome de Down
e estuda na mesma sala da Bia, e os dois estão
sempre se ajudando. Tudo o que ele aprende não
esquece mais. Foi assim com o cavaquinho, que
aprendeu a tocar com o Paulão. Uma das coisas
que o Jequitibá mais gosta é quando conta uma
história para o Gui e, no final, ele diz “conta mais!”.

.8.
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

ULÃ
PA14 anos O PAULÃO é o irmão mais velho da Bia. Ele
é um grande amigo, daqueles com quem
podemos contar nas horas mais impor-
tantes. Curioso, adora saber o porquê das
coisas. Na banda, é o tecladista, arranja-
dor e compositor, pois entende tudo dos
ritmos musicais brasileiros. Também fala e
escreve muito bem – não é à toa que é o
diretor do Jornal do Planeta. Ele aprende
qualquer língua com a maior facilidade e
adora um bom debate.

TIC
PE14 anos A

PETICA nasceu em Angola e veio


novinha para o Brasil. Talentosa, é
poeta de mão cheia – e por isso é ela
quem escreve as letras das canções
da banda – e arrasa quando canta ou
toca instrumentos de percussão de
mão. Petica também adora escrever
e é a editora do Jornal do Planeta.

.9.
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

KING
B
F1Á4 anoIsO

KING FÁBIO é o vocalista da


banda. Um atleta natural que está
sempre correndo de um lado para
o outro para resolver coisas ou ajudar
quem precisa. Ele tem esse nome porque
é o rei dos esportes da Turma e ganha quase
todas as competições da escola. Além disso,
seu cabelo tem as pontas parafinadas, que
lembram uma coroa. King sabe muito sobre
as mídias digitais e informática. Ele toca vio-
loncelo, guitarra e é um ótimo criador de raps.

T3I N U
anos
1

TINU é uma filha do vento pois é puro mo-


vimento! E, assim como ele, essa neta de in-
dígenas nunca para: é campeã de ginástica
olímpica e dançarina maravilhosa. Conhece
todas as lendas que seu avô conta sobre seus
antepassados, adora os instrumentos de so-
pro e sabe tocar uma porção deles. Sensível,
Tinu deixa sempre se guiar pela intuição.

. 10 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

LVI A
S i15 anos

SILVIA é a irmã mais velha do Zeca.


Muito vaidosa, adora andar na moda.
Mas, na verdade, o que ela mais gosta
é de cantar e tocar violão. Caprichosa e
organizada, seu sonho é ser uma estrela
da música brasileira. Ela é uma grande
desenhista e ilustra o Jornal do Planeta
sempre que precisam.

Z1E CA
1 nos
a
ZECA é o mais bem informado dos
amigos, além de ser muito alegre e
engraçado. Está sempre tão ligado
ao que acontece no mundo, que é
a ele que todos recorrem quando
querem saber uma notícia. Por isso
é o repórter do Jornal do Planeta.
Zeca também é o percussionista
da Turma. O tampo de uma mesa,
uma lata velha, as lixeiras de rua ou
qualquer outra caixa de ressonância
vira instrumento em suas mãos. Na
banda, ele toca bateria, atabaques, tambores,
surdo, tarol e qualquer instrumento de percussão.

. 11 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Jequitibá
Pedra
da Hebe

CAFOFO
dO
LEOPOLDO
ESCONDERIJO
DO PEDRO

. 12 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

A FLORESTA
DO BEIJA-FLOR AZUL
é um território mágico. Aqui a
comunicação é total: tudo e todos
falam, ouvem, trocam ideias,
opiniões e experiências – e quase
sempre se entendem. Veja onde
moram nossos amigos que vivem
neste paraíso.

CASA
DO BINGA

CASA DO
GASPER
PAL
CO
DO DA T
PLA URM
NE A
TA

. 13 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Uma árvore com quase seiscentos anos, JEQUITIBÁ


descendente direta das lecitidáceas, o
JEQUITIBÁ é uma das mais nobres estirpes
do reino vegetal. Adora que os amigos da
Turma do Planeta se reúnam sob sua copa
para ouvir suas histórias. Mas não pense que
ele fica parado assistindo a tudo. Nada disso:
ele também é músico. A passagem do vento
entre suas folhas e galhos produz um som
delicioso, e ele sabe muito bem como tocar
em harmonia com os outros integrantes da
banda.

G
B IN A
BINGA é um beija-flor muito valente e um
pouco encrenqueiro. Agitado, ele passa a
impressão de estar em todos os lugares ao
mesmo tempo. Esse pequeno gigante é o
diretor de cena da banda Turma do Planeta,
e ninguém ousa desobedecê-lo. Tem o dom
maravilhoso de conversar com os ventos
e pode, usando sua magia, conceder aos
amigos o poder de voar.

GASPER é o vaga-lume mais talentoso que ASPE


já se viu. Ele pode fotografar, filmar, projetar G
R

imagens, iluminar e até fazer efeitos especiais.


Por causa de todos esses dons, que conquis-
tou depois de um acidente de laboratório, é
ele quem cuida da iluminação dos shows da
banda, com a ajuda de um enorme enxame
de amigos vaga-lumes.

. 14 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

PEDRO é um jabuti filósofo muito tran-


E DRO
quilo e nada parece incomodá-lo. Ele já P
viveu quase duzentos anos e sabe muito
sobre a nossa História. Gosta tanto da Tília
que até serve como pódio para ela subir
e reger a banda. Muito observador, suas
maiores paixões são conversar, filosofar e
entrar na internet. Ele adora!

HEBE HEBE é a estrela da Floresta do Beija-Flor


Azul. Grande cantora, sua voz é poderosa e
muito afinada. Está sempre acompanhada
do coral As Pitangas Roxas. Juntas, essas
capivaras formam um grupo maravilhoso
de se ouvir, além de serem divertidíssimas
– ninguém resiste à gargalhada da Hebe.
O maior sonho dela é ser fotografada pelo
Gasper e sair na revista Garras.

Ah, o LEOPOLDO! Esse tamanduá O POL D


é o maior fã da Hebe. E foi essa pai- LE
O

xão que despertou seu interesse em


aprender música. Ele faz qualquer coisa
para agradar e chamar a atenção de
sua musa. Para se comunicar com os
amigos ele não fala, mas faz gestos, ca-
retas e usa o corpo. É a criatura mais
dengosa da nossa floresta… e acho que
das outras também!

. 15 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

A natureza
e você,
como fazer?

D epois de viajar no tempo para desvendar o enigma do tro-


cano, a Turma do Planeta resolveu investigar mais sobre o
passado do rio Carioca e da Floresta do Beija-Flor Azul em novas
aventuras.
Como o rio Carioca, que era tão limpo, ficou tão sujo?

Ouça a flauta
e a natureza

. 17 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

ILUSTRAÇÃO

Tinu e Zeca estavam frustrados. Tinham passado a tarde toda


tentando, mas sabiam que ainda estavam longe de conseguir tocar
a flauta e o trocano como os indígenas, que mandavam muito
bem! Na viagem no tempo para decifrar o enigma do trocano,
eles conheceram a grande nação Tupinambá antes da chegada
dos portugueses, e foi muito marcante para toda a Turma – e
mais ainda para os dois.

. 18 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Eles perceberam estar exatamente no mesmo lugar que co-


nheciam tão bem: a floresta original que abrigava o rio Carioca,
e foi mágico. Por isso mesmo, Tinu buscava o resultado que Bia
mostrara:
– Esse povo consegue imitar a fala do rio com a flauta. É muito
maravilhoso, Tinu. Para eles, música são os sons da natureza: o
vento, a chuva, o canto dos pássaros e a voz dos outros animais.
Eles imitam tudo direitinho.
– Eu não consigo, Bia.
– Consegue, sim. Preste atenção.
Bia pegou o violino e parecia que dele brotava um rio.
– Viu? Ouça a natureza e copie os seus sons.
– Vou tentar. E garanto que não sossego enquanto eu não
tocar como a corredeira.
Desde então, Tinu volta e meia passava horas ouvindo o rio e
buscando reproduzir sua melodia com sua flauta. Ela não desistia.

ILUSTRAÇÃO

. 19 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Tinu se lembrava do bisavô, o grande cacique Nheengatu, que


adorava contar histórias sobre seu povo e sabia muitas sobre o rio
Carioca. Quando ela era menor, foi com os pais para o Maranhão,
e o Bivô, já muito velhinho, contava que os primeiros homens
brancos que ficaram amigos dos Tupinambás, no Rio de Janeiro,
eram franceses. E conseguiu lembrar o nome do “cacique” deles:
Nicolas de Villegagnon.
– Os franceses eram inimigos dos portugueses e lutavam pelo
direito de serem eles os “donos do Brasil”, mas perderam a guerra
para aqueles outros caraíbas – explicava o Bivô. – Depois disso,
nosso povo precisou fugir em busca da Terra sem Mal. Mas, antes,
os tambores e as flautas tupinambás se uniram para proteger
nosso lugar de nascimento.
Essa parte da história deixava Tinu muito intrigada. Seria a
passagem secreta que protege a Floresta do Beija-Flor Azul?
O Bivô continuava:
– Seu pai também é francês, Tinu, e os antepassados dele
estiveram no Brasil naquela época e ficaram amigos do nosso
povo. Não é muito incrível que mais de quinhentos anos depois
um francês tenha vindo estudar no Rio de Janeiro, onde conhe-
ceu uma moça tupinambá, que também estava ali para estudar?
Apaixonaram-se, casaram e você nasceu.
– Verdade, Bivô, incrível mesmo! Conta mais, por favor.
Nem precisava pedir. Todas as noites, sentados em volta da
fogueira, crianças, jovens e idosos se reuniam para ouvir o cacique
Nheengatu. Ele contava as histórias com tantos detalhes que Tinu
praticamente via cada cena descrita.

. 20 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

. 21 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

ILUSTRAÇÃO

Depois que ele morreu, o grande cacique Moabaetê, seu avô,


foi o escolhido para substituí-lo com o compromisso de seguir a
mesma tradição. Tinu adoraria retribuir e contar sobre a viagem
no tempo que ela e a Turma do Planeta fizeram para conhecer o
trocano antes do descobrimento do Brasil, quando os Tupinambás
viviam perto do rio Carioca. Mas a menina sabia que não podia
revelar o segredo da Floresta do Beija-Flor Azul, e muito menos
o das viagens no tempo. Até porque, quem acreditaria?
Tinu esperava ansiosa a vinda do seu avô no fim do mês. Tanto
falou sobre isso para os amigos da Turma do Planeta que, no dia
que ele chegou, sua casa foi invadida pela galera. Todos queriam
conhecer o avô cacique da Tinu.

. 22 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Zeca não perderia a chance de fazer uma entrevista para o


Jornal do Planeta com o grande e famoso Moabaetê. Nem bem
chegou, ele foi surpreendido por um interrogatório sem fim.
Eram muitas perguntas.
Por que os Tupinambás deixaram essa terra?
Por que foram para o Maranhão?
Como chegaram lá sem avião, carro ou navio?
Como carregaram aqueles trocanos pesadíssimos?

Bitu, a mãe da Tinu, precisou dar uma acalmada no Zeca e


nos outros.
– Meus amores, o meu pai acabou de chegar de uma viagem
longa e cansativa. Ele precisa descansar um pouco, né, pai?
– Isso, minha filha. Eu vou ficar aqui uma semana e vocês
podem voltar todos os dias pra gente conversar em volta da
fogueira. Boa ideia?
– Podemos trocar a fogueira por uma roda em volta das redes da
varanda? Não queremos incomodar nossos vizinhos – propôs a Tinu.
– Claro, minha netinha! Você manda no seu vô. Hoje eu vou
contar só uma história, a que explica como nasceu o rio Carioca.
– Obaaaa! – Bia vibrava. Ela tinha ouvido do próprio rio a sua
versão e queria conferir.

. 23 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– Mas antes, vamos lanchar? Ouvi dizer que a Tinu e o Jean


Claude prepararam umas comidas deliciosas para nós e eu estou
faminto. É verdade, Jean Claude? – O pai da Tinu cozinha divina-
mente e adora as receitas brasileiras, e ela, que sempre o ajuda,
está ficando muito craque na cozinha.
Nem precisava chamar duas vezes. Num instante, estavam
todos se fartando de bijus, bolo de aipim com coco, suco de ta-
perebá, sorvete de cupuaçu e outras iguarias. Tudo divino! Depois
daquele banquete, era hora do show começar.

. 24 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Na rede com
o cacique

A varanda da casa da Tinu tem muitas redes, e foi lá que todos


se reuniram para ouvir a lenda que era contada de pai para
filhos há mais de mil anos sobre o nascimento do rio Carioca.
Tinu estava se sentindo a pessoa mais importante do mundo de-
pois que o avô reservou para ela o lugar a seu lado na rede principal.
– Em primeiro lugar, eu quero explicar o que significam os nomes
tupinambás. Isso é muito importante porque cada criança que
nasce é observada por todos da aldeia, e vamos descobrindo sua
forma de estar no mundo; no nosso caso, na natureza. É assim que
todos ajudam os pais a escolher o melhor nome para seus filhos.
“Vamos começar pelo seu nome, minha netinha? Tima Guaú
significa ‘aquela que sabe plantar e dançar como o vento’. O
apelido virou Tinu. A sua mãe recebeu o nome de Ajyra Ibitu,
que significa ‘filha do vento’, e o apelido dela é Bitu. A mãe da
sua mãe, sua avó e minha esposa, é Yepietá, que quer dizer ‘água
valiosa’. Assim, você carrega o vento, a água e a terra, porque
desde pequenininha seu corpo e seu espírito trazem a renovação,
o plantar, o regar, o nascer e crescer e o ar. Você sempre foi puro
movimento, como o vento. E continua sendo.”

. 25 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Tinu ouvia encantada a fala do avô e percebia que era exata-


mente como ela sentia as coisas, principalmente quando ele men-
cionou o vento. Nesse momento, para ajudar a melhorar ainda
mais o clima, Binga disfarçadamente produziu uma brisa suave.
Bia percebeu logo que tinha dedo, aliás asa, do amigo e ligou
aquele gesto à música.
– Não é à toa que você gosta de tocar flauta, né, Tinu? Você
venta dentro dela. – Todos riram da sacada da Bia.
– Mas vamos à história que veio com os nossos avós, bisavós,
trisavós… enfim, que foi sendo contada sempre, desde que o
mundo é mundo, e desde que o rio Carioca existe. Venha, Bitu,
você sempre gostou dessa história.
– Verdade, pai. Lembro que você e mamãe contavam para
nós, os seus filhos. Eu adorava ficar ouvindo.
– É uma lenda que faz chorar e também faz acreditar no amor.
Começa assim…

. 26 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

“Era uma vez um jovem indígena chamado Amanajé, um guer-


reiro muito corajoso e bonito que gostava de caçar na floresta. O
nome dele significava ‘o mensageiro’. Um dia, enquanto perseguia
uma caça, ele ouviu uma voz tão maravilhosa que
deixou tudo para ficar ali escutando. Era Amanari,
a ‘água de chuva’, uma linda jovem que cantava
tão bem como os azulões. E ela parecia encan-
tá-los: vinham todos e se juntavam a ela na
sua cantoria, formando um verdadeiro
coral. Amanajé ficou deslumbrado.”
– Que lindo. Estou ouvindo um aqui
bem perto da varanda. E ele está ado-
rando a nossa conversa – Bia revelou o que
King já estava gravando no seu celular.
Bitu seguiu contando a história do ponto que
Bia tinha interrompido o seu pai:

. 27 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Ouça o canto deles – Mas nem tudo era perfeito. Ela era
de um povo inimigo do dele, e isso era
um problema e tanto. Os dois se apai-
xonaram, mas não podiam ficar juntos
porque seus pais os proibiram. Eles se
comunicavam usando suas flautas em
mensagens que só os dois entendiam.
Bem que tentaram convencer suas fa-
mílias, mas em vão. Cada vez mais o ódio entre os dois povos
só aumentava. Um dia, já meio desesperados, resolveram fugir.
“Foram subindo, subindo, subindo um morro de pedra muito alto
e difícil de escalar. Quando chegaram lá no alto, acreditavam que es-
tavam livres, mas se viram diante do irmão de Amanari, Nauru, um
herói que lutava muito bem, mas que era muito autoritário. Ele era
o guerreiro mais importante de sua aldeia e estava sendo preparado
para ser o próximo cacique.
“Ao ver Amanajé fugindo com sua irmã, nem pensou muito. Pegou
uma flecha e acertou bem no meio do coração dele. Amanajé caiu lá
de cima, flutuando de braços abertos como um pássaro, e morreu.”
Bia, com lágrimas nos olhos, completou:
– Amanari ficou tão triste, tão triste, chorou tanto, que as lágri-
mas dela molharam a terra, fizeram brotar a floresta e se trans-
formaram nas águas do rio Carioca. Todo dia, Amanari ia cantar
para seu amado na beira do rio, até que uma tarde ela não voltou.
Dizem que virou uma linda ave e voou livre para bem longe, se
juntando a Amanajé.
Foi uma surpresa geral quando Bia terminou a história. Quem
podia imaginar que uma garotinha de seis anos que mal sabia ler
conhecia uma lenda como aquela?

. 28 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

. 29 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– Quem contou essa história para você, Bia? – Bitu estava


muito curiosa.
– Foi o próprio rio Carioca.
Os amigos não se espantaram nem um pouquinho, mas os adul-
tos não acreditaram nadinha e se entreolharam como quem diz:
“Essa menina adora uma fantasia”. Mal sabiam eles! Só o cacique
Moabaetê acreditou, mas preferiu ficar em silêncio. Foi a vez dos ami-
gos trocarem sinais como quem diz: “Melhor nem tentar explicar”.
Silvia lembrou o que aprendera na última viagem no tempo:
– Então é por isso que se acreditava que as águas do rio
Carioca teriam o poder de embelezar as mulheres que tomas-
sem banho nele.
– Verdade. E também de fortalecer a voz dos que bebessem
sua água – Paulão completou, sem explicar que tinha recebido
essa informação de um guerreiro tupinambá, que vivera ali uns
quinhentos anos atrás.

. 30 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

E antes que alguém contasse onde e como tinham aprendido


essas coisas e revelasse o segredo de suas aventuras no tempo e
da magia da Floresta do Beija-Flor Azul, Paulão já foi emendando:
– A gente aprendeu isso enquanto pesquisava para um traba-
lho sobre o rio Carioca, grande cacique.
Não era nada fácil guardar um segredo como aquele. Quanto
mais viagens faziam para o passado, mais aprendiam. Mas tam-
bém mais queriam aprender. O melhor era sempre explicar suas
descobertas como parte de um trabalho escolar.
– Bem, meus amigos estudiosos, por hoje é isso. Amanhã tem
mais. Ah, antes que eu esqueça: Zeca, assisti ao seu vídeo “O enig-
ma do trocano” e achei muito bom, parabéns! Você aprendeu a
tocar muito bem o seu tambor.
Fez-se um silêncio tenso. Ainda bem que tinham editado o
vídeo e apagado as cenas que poderiam comprometê-los.
O cacique continuou:
– Eu podia jurar que vocês tinham filmado em uma autêntica
aldeia tupinambá. Muito bom, muito bonito. – E se levantando
deu por encerrado o espetáculo. – Até amanhã!
Zeca ficou preocupado. Será que o sábio Moabaetê desconfiava
do que eles realmente tinham vivido? Vai saber... Melhor deixar
do jeito que estava.
Paulão tratou de mudar de assunto:
– Muito obrigado, Tinu, por dividir seu avô com a gente. Tchau,
Bitu e Jean Claude, o lanche estava uma delícia. Vamos, galera,
amanhã a gente volta.
E, depois de combinarem um ensaio na Floresta logo cedo no
dia seguinte, cada um foi para sua casa.

. 31 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

. 32 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Sonhos,
acredite neles!

O dia ainda não tinha amanhecido completamente quando Tinu


acordou assustada com o barulho da flauta batendo no assoa-
lho. Dormira segurando o instrumento, e sonhou com a Turma toda
correndo perigo em uma aldeia de inimigos dos Tupinambás. Estavam
amarrados com cipós e vigiados por vários guerreiros.
No sonho, a única forma de salvá-los seria se ela reproduzisse com a
flauta o som de um rio. Ela estava quase conseguindo, quando, PLAFT!
Tinu acordou apavorada.

. 33 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Mas estava tudo calmo, a cidade ainda dormia e dava para


ouvir bem o rio Carioca, que passava pertinho de sua casa e
naquele trecho gorgolejava por entre as pedras.
Ainda não sabia se era sonho ou realidade, pois poderia jurar
ter ouvido, vindo do jardim, o som do rio reproduzido por uma
flauta. Mas como?
A menina não hesitou: abriu a janela e pulou para o galho da
árvore mais próxima levando sua flauta. Dali para o chão a atleta
foi saltando de galho em galho, até que fincou os pés com firmeza
na grama e descobriu que não estava sozinha.
– Vô, o que o senhor está fazendo aqui a essa hora? E com
essa flauta?
– É a mesma pergunta que faço para você, criança.
– Eu preciso que, da minha flauta, saia a voz do rio.
– Precisa?
– Muito. É uma questão de vida ou morte, vovô.
– Se é tão importante assim, eu vou te ajudar. Fui eu que ensi-
nei o seu tio Mymbypissara. O nome dele quer dizer “o flautista
a tocar”. E foi ele quem fez essa flauta que está com você.
– Eu não sabia disso. Somos todos flautistas?
– Somos os guardiões desse conhecimento e dessa relíquia – dis-
se, mostrando uma flauta linda. – Foi o legado do grande cacique
Tanaíve, que lutou com todas as suas forças pela nossa liberdade. E,
para proteger a nação tupinambá, ele entregou a própria vida para
o inimigo. A sua única exigência foi que, dos ossos de suas pernas,
fossem feitas duas flautas Mimbyetês, flautas do rio, que deveriam
ser protegidas e entregues a quem soubesse usá-las para o nosso
bem. Desde que você nasceu, o espírito do grande Tanaíve aparece
em meus sonhos e me diz que essa aqui deve ser sua.

. 34 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– Miiiinha?! – Tinu quase desmaiou. Era muita responsabilida-


de e também muita coincidência. – Tem certeza, vovô? Tanaíve
era o nome desse cacique?
– Sim, Tanaíve. Quanto a ter certeza, vamos saber agora. Venha,
Tima Guaú, o sol está nos convidando.
O sol começava a nascer, colorindo o dia e deixando à mostra o
rio Carioca, que ali era sujo e malcheiroso. Uma tristeza. Moabaetê
estava desolado. Por que destruir o que é nosso? Não é o rio que
nos dá água e nos garante a vida? Ele não se conteve e tocou sua
flauta como um lamento. Era o rio chorando e pedindo socorro.
Tinu ouvia o rio e o avô tocando. Era o mesmo som, igual. Ela
reuniu toda sua coragem para acompanhar os dois, com tanta emo-
ção que a natureza toda silenciou. Agora eram três em uníssono.
Lágrimas escorriam no rosto do ancião e no da menina.
Quando o sol brilhou plenamente, e como se tivessem ensaiado,
os dois pararam de tocar na mesmíssima nota. Tudo tinha sido dito.
Eles se abraçaram e ficaram ali ouvindo o coração um do outro.

. 35 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– É sua, minha neta amada – ele disse e entregou a ela a relíquia


de sua gente, a flauta Mimbyetê. – Ouça sempre o seu coração
e toque para dar voz a todos os seres vivos que precisam de pro-
teção, principalmente o rio.
– Vô, eu juro que vou proteger essa flauta como a minha pró-
pria vida e também farei tudo para salvar nosso rio.
– Tenho certeza disso, minha neta. Estou em paz. Vamos agora?
Quando os dois entraram em casa, ninguém tinha acordado
ainda. Melhor, assim não precisavam explicar nada.
Tinu voltou a dormir, e foi acordada por seu pai chamando
para o café da manhã. Mais uma vez ele tinha caprichado nas
gostosuras. Depois de se fartar, a menina piscou para o avô e disse:
– Pai, mãe, tô indo ensaiar na Floresta. Hoje a gente vai começar
a salvar o nosso Carioca. – E saiu ventando, levando sua flauta
Mimbyetê, para se encontrar com os amigos e juntos subirem
para a Floresta do Beija-Flor Azul. Aquele dia estava prometendo.

. 36 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Na Floresta

O assunto do momento era o avô da Tinu. Que figura incrível


o grande cacique Moabaetê! E que história a da flauta do
Tanaíve. Ficaram todos perplexos. Seria ele o guerreiro que conhece-
ram na última viagem no tempo? Bia tinha certeza de que era, sim.
– Conta pra gente o que você sabe sobre isso, Jequitibá.
– Bem, o que eu lembro é que, para proteger a Floresta, os feiticei-
ros tupinambás criaram a passagem secreta e a senha. Eles já sabiam
que os homens brancos eram uma ameaça a ela. Com o tempo,
aprendemos que alguns tinham bom coração e boas intenções.

. 37 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– É por isso que só a essa Turma foi permitido cruzar a pas-


sagem secreta, e uma vez aqui, foi possível entender o que nós
falamos – explicou o Pedro.
– Eu entendo em todos os lugares – disse Bia.
– E eu só de vez em quando – Gui completou.
O Jequitibá era muito fã da Bia e não perdia a oportunidade
de deixar isso claro.

. 38 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– Bia, sua sensibilidade é um fenômeno. Graças a você estamos


todos juntos.
– Foi graças a mim. Eu que descobri a Turma tocando. Eu que fui lá
no precipício conversar com eles e fui euzinho que transportei pelos
ares os menores para o lado de cá. – Binga queria ser reconhecido.
– Humpf!! Eu, eu, eu… Tá certo, oh, grande herói!! – Hebe estava
sem paciência. – Você se acha, ufff!

. 39 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– Calma, pessoal! Cada um de nós teve um papel importante


nessa história e queremos que continue tendo, não é? – Paulão
tentava acalmar.
– É, sim. E é por ser assim que eu confiei a você, Paulão, a senha
da passagem secreta.
– Continua, por favor, Jequitibá? – Tinu pediu. – Eu quero
descobrir por que o rio Carioca, tão lindo e limpo como a gente
viu na última viagem, ficou imundo. Prometi ao meu avô que
farei de tudo para recuperar esse estrago de anos.
– Só você não, Tinu. Estamos todos juntos nessa! Pode contar
com cada um que está aqui. Confere, galera?
Todos apoiaram o King sem pestanejar.
– É isso aí, pessoal! – Jequitibá vibrou. – Continuando a história,
e essa é a parte que eu vivi: depois que os homens brancos che-
garam, foram muitas guerras, muitas doenças, e os Tupinambás
partiram, buscando a Terra sem Mal. Mas o rio continuou limpo
por muitos anos, e nós, protegidos pela passagem secreta.
– Se os Tupinambás foram embora daqui, quem contou para
o Pedro as palavras mágicas que mostram a passagem?
– Meu pai soube pelo pai dele, mas ele me pediu para só contar
a quem eu confiasse totalmente.
Eram muitos mistérios e uma certeza: seria impossível escla-
recer cada um deles sem viajar para aquele tempo; e a chave era
a flauta da Tinu.
– Bora viajar no tempo, maestrina? – Paulão propôs, e todos
toparam imediatamente.
– Bora lá, pessoal? Caprichando. Vamos visitar a última vez que
o trocano e a flauta Mimbyetê soaram por aqui. É 1, é 2 e é 3...
Tília estava empolgadíssima. A música foi esquentando de tal

. 40 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

maneira que ela, tomada de uma energia extraordinária, quase


em transe, chamou os elementos da natureza. Cada músico,
por sua vez, também estava completamente envolvido em sua
performance.
A força do conjunto dominava tudo. Primeiro as árvores co-
meçaram a balançar seus galhos, e que balanço, no maior swing!
Depois, os arbustos, e em seguida a vegetação rasteira foi libe-
rando todos os seus insetos, que chegavam na maior algazarra,
trazendo zumbidos, silvos, apitos, sssssiiiibiiiilosssss. Um alarido
de pura alegria.
Os outros animais foram dando sua contribuição: sapos coa-
xavam marcando o ritmo com Zeca. Roedores raspavam ruidosa-
mente rente, rente, rente, rente, rente, e os pássaros cantavam em
conjunto fazendo backing vocal para Hebe, Petica, King e Silvia.
Um a um, cada integrante da banda fazia sua performance
ensaiada. Primeiro em solo, para então se juntar ao conjunto.
A maestrina se sentia literalmente transportada pela música,
e sua concentração era tão grande que ela mal tocava o chão.
Quando a harmonia integrou todos os sons, foi a vez do Binga
trazer o vento, que começou a brincar com os elementos da na-
tureza. Ele passava sobre cada planta, da mais rasteira à mais alta,
tudo dentro da melodia, até o grande final, quando de brisa passou
a vento forte, e de repente era um vendaval trazendo nuvens de
chuva, ao mesmo tempo em que a música atingia o seu clímax.
Tília convocou os raios e os trovões, Tinu fez um solo na flauta,
e depois todos se juntaram num mesmo acorde. O ribombar de
trovões seguido de uma poderosa descarga elétrica desencadeou
uma explosão luminosa, que abriu o Portal do Tempo.

. 41 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

. 42 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Novo cenário

C hegaram numa encosta coberta pela deslumbrante Mata


Atlântica original. A diferença é que estavam numa serra...
– Não é o mesmo lugar. Aquele era mais plano – constatou
Silvia.
– Tem um rio aqui que pode ser o Carioca – Zeca alertou.
Tinu e King subiram cada um numa árvore bem alta para
avistar mais longe. Lá de cima foram descrevendo o que viam.
– Estou vendo muita fumaça e uma porção de mulheres la-
vando roupa no rio. Lá embaixo está a Baía de Guanabara. – Tinu
apontava na direção.
– E tem umas construções e umas caravelas ancoradas com a cruz
de Malta na bandeira – narrou King. – Vou tentar chegar mais perto.
Mas Paulão achava melhor ninguém se afastar do grupo, e foi
logo deduzindo:
– Hum, caravelas... E a cruz é... Ah, já sei: os portugueses já
estão por aqui.
– Sim. E se há construções, já estão em nossas terras há algum
tempo – completou Petica.
King continuava descrevendo o que podia enxergar.
– Desse galho consigo ver outro trecho do rio, e tem uma porção
de indígenas e negros enchendo uns potes com a água do rio. Nossa,

. 43 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

também tem uns caras maus pra caramba, que estão com uns
chicotes ameaçando, e acho que mandando eles andarem rápido.

King desceu da árvore, já dando a sua opinião.


– Pessoal, o Rio de Janeiro está sendo fundado. Os portugueses
estão construindo um montão de coisas, e sabem de onde vem
a água para todo mundo beber? Do rio Carioca. Vamos chegar
mais perto?
Foram caminhando cautelosamente, enquanto Binga e Gasper
voavam à frente e voltavam indicando o melhor caminho.
De repente, Bia e Tília ficaram estáticas.
– Tem alguém chorando por aqui. O som vem da mesma
direção da água.
Ao mesmo tempo que Bia contava o que estava ouvindo e
sentindo, Binga apareceu com mais novidades.
– Vcs n v acred. – Binga sempre cortava as palavras quando
estava muito ansioso.

. 44 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Percebendo isso, Gasper disse:


– Calma, Binga, respira. Tem uma moça chorando e um rapaz
consolando. São indígenas.
– Bem que a Bia avisou. Os portugueses não foram muito
bons com os indígenas brasileiros. Então é melhor a gente ir com
cuidado. Vamos observar primeiro – sugeriu Paulão.
Ele e Tinu foram se aproximando de onde vinha o som da
conversa e se esconderam atrás da vegetação.

. 45 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– Ela está dizendo que está muito triste por ter que ir embora.
Está explicando que seu nome é Yetê porque nasceu nesse rio. E,
veja, ela tem uma flauta igual à sua, Tinu! Já ele se chama Jurandir,
é o filho do cacique que morreu na guerra perdida contra os
Temiminós e os portugueses. Está muito triste, mas não pode
chorar como ela. Está dizendo para ela não se preocupar, porque
os pajés estão fazendo uma cerimônia para proteger a fuga deles
e que mais nenhum branco vai fazer deles escravos.
– Que coincidência! Ela tem o mesmo nome que os Tupinambás
me deram na última viagem, lembra, Paulão?
– Verdade – confirmou o Paulão.

. 46 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Naquele momento, Yetê começou a tocar a flauta, e os dois


aproveitaram para voltar para onde estava o grupo. Tinham
que demonstrar serem amigos e parceiros. O momento era
muito sensível.
A Turma decidiu pintar o corpo da mesma forma que tinham
visto nos jovens indígenas. Esse seria um dos sinais de identidade.
Tinu e Paulão já estavam prontos; Silvia achou melhor pintar Bia
também. E Pedro orientou sobre a melhor forma de fazer contato.
– Vamos repetir para ninguém errar e evitar riscos para o grupo
todo: Tinu faz contato tocando a flauta. Paulão imediatamente
entra e conversa em tupi, e em seguida apresenta todos nós.

. 47 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Fale exatamente o que o Paulão lhe ensinou, Tinu. Todos nós


usaremos nossos nomes tupinambás. Eu fico aqui traduzindo
pro pessoal. Combinado?
Todos assentiram com a cabeça, e assim foi.
Silvia terminava de pintar Zeca e Gui, e King seria o último.
De onde estavam, podiam observar a cena e viram a reação de
surpresa dos dois jovens.
– Ejapyxaka, ejepoyvu, Yetê! (Atenção, cuidado, Yetê!) –
gritou Jurandir.
E apontou sua lança na direção do Paulão, preparando-se para
defender sua amiga de um possível ataque.
Tinu deixou de tocar a flauta e disse:
– Ore ma ka’aguy re ronhangareko’i va’e kuery. (Somos
mensageiros da paz e protetores da floresta.)
– Ha’vy upe va’e jurua onhembojegua pa va’e? (Mas e esse
branco pintado?)
– Mamo gui tu peju? (De onde vocês vieram?) – Yetê não
estava muito convencida.
O mais impressionante é que ela e Tinu eram parecidíssimas.
As duas perceberam isso ao mesmo tempo. Espontaneamente
tocaram uma o rosto da outra; parecia que queriam saber se eram
reais. Paulão aproveitou o clima para falar, com a expressão mais
simpática de que era capaz:
– Penhemondyi rei eme. Roju ka’aaguy gui, ore ru kuery,
Kuaray ha’e gui Tupã ore repy a gui. Apy roin roipytyvõ aguã.
(Fiquem tranquilos. Viemos das florestas protegidas por nossos
pais, o Sol e o Trovão. Estamos aqui para ajudar e em paz.)
– Orepytyvõ aguã? Ayn? Peró ha’gui Temiminó kuery
ombovai pa tekoa’i kuery ha’e gui ojuka ore regua kuery.

. 48 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

(Ajudar? Agora? Os perós e os Temiminós destruíram as aldeias


e mataram nossa gente.1)
– Nda’evei ra’ga tein nderu omano’in ramo, va’eri hetarã
kuery oepy a’i rupi ae py. (Sinto muito pela morte do seu pai,
mas sei que foi com muita honra e defendendo o seu povo.)
– Ndeayvu porã ore ayvu py, va’eri ndee pa português terã
francês? (Falas bem a nossa língua, mas você é um português
ou um francês?)
– Petein regua he’yn, ore ma... (Nem uma coisa nem outra,
somos...)

1 Durante muito tempo os povos Tupinambás e Temiminós guerrearam. No livro O enigma


do trocano, a aventura da Turma do Planeta foi interrompida por um desses conflitos.
Depois da chegada dos portugueses, e dos franceses em seguida, essa situação foi ficando
mais grave: de um lado os Tupinambás aliados dos franceses, e do outro os Temiminós
aliados dos portugueses, e todos querendo a mesma coisa: dominar o território e todos os
seres vivos. Com a vitória dos portugueses – que os Tupinambás chamavam de perós – e
dos Temiminós, tanto os franceses como os Tupinambás tiveram que fugir para não serem
massacrados ou escravizados.

. 49 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– Ha’e kuery ko ha’everei Toriba ramymino. Aendu xepy’a


re. Rexa nha’a xegui ombopu porã ve a mimby? Ha’e gui exa,
imba’e voi Mimbyetê oguereko. (Eles são boas pessoas, ó neto
do grande Toriba. Sinto isso dentro do meu coração. Viu como
ela toca a flauta melhor do que eu? E veja, a dela também é uma
flauta Mimbyetê.) – Yetê estava convencida de ter encontrado
uma alma gêmea. E Tinu também.
Bia, que ouvia e entendia tudo, perguntou:
– Será que esse Toriba de que estão falando é o nosso amigo?
Nem acredito!
Pedro respondeu pensativo:
– Acho que sim. Se o neto dele está adulto, então já se passa-
ram pelo menos uns setenta ou oitenta anos.
Depois da fala emocionada da Yetê, Jurandir baixou a guar-
da, e essa foi a deixa para que todos fossem chegando mais
perto. Dava para ver e sentir que o clima era outro, bem mais
amigável.
Paulão foi apresentando um a um.
– Eu sou Tuxáuatingaeté e esses são... Pindáacanga, ou King;
Apicurumi, ou Zeca; Bicamiranga, ou Bia; Amyniu, ou Tília; Iraê, ou
Gui; Cunhanã, ou Petica; Potyra, ou Silvia; e Tima Guaú, ou Tinu.
E esses são nossos companheiros da Floresta Mágica: Capioriba,
ou Hebe; Ybitu, ou Binga; e Xuê, ou Pedro.
Assim que terminou de dizer “Pedro”, foram surpreendidos
por um som, agora bastante conhecido por todos.

PAUMMMMM PAUAUAUMMM
PAUAUAUMMMMMMMMMMMMMMMM

. 50 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– Trocanos! – Zeca estava indócil.


Jurandir e Yetê se prepararam para atender ao chamado dos
trocanos.
– Xeirun kuery jaje’oi ke. Peju orereve. Nhaneramõi kuery
nhanerenõi ma. Onhepyrun ta ma nheynxyron jaxa haguã tape
marã he’yn. (Vamos, amigos, venham conosco. Os pajés estão cha-
mando. Já vai começar a cerimônia para selar a passagem secreta.)
Ninguém nem de longe poderia imaginar uma aceitação tão
rápida e tão calorosa. Mas eram assim os Tupinambás. Em prin-
cípio, confiavam e sempre acolhiam os forasteiros.
E lá foram todos na direção do som dos trocanos.
Yetê, de mãos dadas com Tinu, contava que seu avô, o grande
cacique Tanaíve, sonhava sempre com uma moça que tocava
flauta. Tinu piscou para Hebe e disse:
– Muito fofo, né? – Hebe concordou com o olhar.

. 51 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

. 52 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Andaram e subiram mais ainda até chegarem na frente de


uma pedra enorme e muito conhecida da Turma do Planeta. Lá
estavam os pajés e todos os anciãos. Eles observavam atentamen-
te a chegada do grupo. Jurandir e Yetê foram logo explicando e
saudando os mais velhos:
– Xamoi tenondegua’i kuery, kova’e ma Tuxáuatingaeté.
(Grandes pajés, esse é Tuxáuatingaeté.) – Jurandir apontou para
o Paulão. – Ha’e ma ijayvu porã nhandeayvu. Ha’e kuery voi
ijayvu mymba’i kuery reve, pende orembo’e ague rami. (Ele
fala muito bem a nossa língua. Eles também conversam com os
animais, como vocês nos ensinaram.)
– Upeva’e kuery tu onhangareko kuaa kova’e ka’aguy re (Esses
humanos sabem como proteger essa Floresta) – Pedro completou.
– Tima Guaú ma imba’e pu kuaa raxa mimby py kova’e ramõ
aexa, pexa ke imymby. (E a Tima Guaú é a melhor flautista que
já conheci, vejam a sua flauta.)

. 53 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Nesse momento, Pocaruguara, o pajé mais sábio de todos,


aproximou-se da Tinu e pediu sua flauta. Então, a examinou
atentamente, devolveu-lhe e disse:
– Ayn ma aikuaa ma mba’e he’i pa ajexara’u ague, ayn
ma ainda porã ma. Ndee ma reju orepytyvõ aguã ha’egui ko
yvyrupa penemba’e avi ramo ronhangareko’i aguã. Pevaen
porã. (Agora sei o que meus sonhos diziam e estou em paz. Você
veio e trouxe ajuda para proteger nosso mundo que também é
de todos vocês. Sejam muito bem-vindos!)
Era mesmo um espanto. Naquele momento, houve uma
agitação. O grande cacique Toriba chegava acompanhado de
sua família. Era ele! Muito velhinho, mas com o mesmo tem-
betá e a mesma expressão de alegria e bondade.
Bia quase pôs tudo a perder. Num impulso, ela correu com a
Tília e abraçou seu velho amigo. Estranhamente os Tupinambás

. 54 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

não ficaram surpresos com aquela reação. Era sempre assim:


Toriba tinha esse dom de encantar a todos.
Paulão custou a se recuperar do susto e, por via das dúvidas,
não soltou mais a mão da Bia.
– Aendu ramo naneirun yma ae ma merami. (Sinto como
se fôssemos velhos amigos.)
Quanta alegria! Toriba estava adorando aquele encontro. O
que ele não sabia é que se tratava de um reencontro.
Pocaruguara veio receber o amigo e informou:
– Oin porã mba ma jaa aguã. Rojapo pa ma Toriba. Ayn
ma paven ma oendu kuaa petei tei ijayvua. Oata va’e ma
onhemboty aguã Tape marã he’yn. (Está tudo pronto para
nossa partida. Fizemos tudo, ó grande Toriba. Agora todos
entendem o que cada um fala. Só falta fechar a passagem
secreta.)
– Há’evete katu. Jaa ma’vy. Nhande yy akã oin porã ma.
Reroporandu ague ogueru nhanderu kuery aexara’u ague’i gui.
(Ótimo. Vamos logo. Nosso rio está salvo. E suas rezas trouxeram
os deuses dos meus sonhos.)
Gui estava com dificuldade de entender tanta novidade e
perguntou para Paulão:
– Foram eles ou foi a gente que veio?
– Eles já estavam aqui desde sempre, Gui, por isso acreditam
que fomos trazidos pelas rezas dos pajés. Nós sabemos que vie-
mos porque queremos descobrir o que aconteceu com o nosso
rio Carioca.
– Isso mesmo – Pedro confirmou. – Vamos lá que o Toriba,
aliás, o grande cacique Toriba, está nos chamando.

. 55 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Apoiado no seu cajado, diante da fenda que levava ao outro lado


daquele morro de pedra e rodeado por sua aldeia, Toriba falou:
– Rojae’o ma omano va’ekue’i kuery re ha’egui oreretarã
kuery ombo’a va’ekue romoemba. Petein ve ma Tupinambá
noin vai rã. Ayn ma há’eve ma jaa aguã nhaneretarã kuery
jaexa aguã. Nhanderuvixa Tanaíve, omano’in nhandereraa
jepe aguã, nanhandereja rivei. Nhambojerovia ha’egui nham-
boete rã. Jaa katu joupive jajou peve Yvy Marã He’yn. Eju
xeirun Jurumim. Ayvu ae kaguare’i kuery. Aexara’u jepi ae
ndee ramigua. Jaa koorupi he’i vy okuaven’e ipa’u a katy. (Já
choramos nossos mortos e libertamos todos os irmãos escraviza-
dos. Nenhum Tupinambá será desonrado. Agora podemos partir
e encontrar os nossos irmãos. O grande cacique Tanaíve, que deu
a vida para nos salvar de um massacre, não nos deixou em vão.
Vamos honrar sua morte como foi honrada a sua vida. Vamos
seguir em frente até encontrar a Terra sem Mal. Venha, meu amigo
Jurumim. Sempre gostei dos tamanduás. E sonho sempre com um
parecido com você. Vamos por aqui.) – E apontou para a fresta.
De novo os sonhos eram mais reais do que a realidade. Paulão
estava fascinado, assim como Bia, que disse baixinho só para ele:
– A nossa passagem! E eles acham que é a primeira vez que a
gente vem aqui; parece mesmo um sonho. Tô curiosa para ver
como era o precipício. Será que a ponte das pedras era visível?
– Logo saberemos, Bia. – E nem bem concluiu a frase, Paulão ex-
clamou: – UAU!!!!! Que chocante!!! Olha como é a passagem invisível...
– Visível! – devolveu Zeca.
– Iporã! Aexa va’e ty he’yn ita overa porã va’e. (Que incrí-
vel! Nunca vi uma pedra tão brilhante.) – Paulão, Tinu e King
estavam maravilhados.

. 56 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

– Nderexai rã. Mava’e ve ma ndoexaai rã kova’e ita, xei-


run Tuxáuatingaeté. Ayn ma ja ja’o ta. Xee ma anhanga-
reko ta xeretarã kuery re ha’e ndee ma neretarã kuery re.
Jaje’oi ma Tupinambá kuery. (Nem vai ver... Nunca mais
essa pedra será vista, amigo Tuxáuatingaeté. E agora vamos
nos separar. Eu sigo cuidando do meu povo, e você do seu.
Vamos, tupinambás.)
Zeca, curioso, queria saber se os trocanos ficariam para trás.
Então Paulão perguntou:
– Mba’exa tu trocano kuery ikuai ta, ndaperaa reguai pa
mba’emo porã? (O que vai acontecer com os trocanos? Vocês
não vão levá-los?)
– Rovoyi vaipa he’yn tein ha’eve. Rojapo kuaa avi ae am-
boae. (Não precisamos carregar tanto peso. Sabemos fazer
outros) – disse Jurandir se despedindo.
– Arandu ma nda’ipoyi, nha’ã? (O conhecimento não pesa,
não é?) – Pedro filosofava.
Ainda muito intrigado, Zeca tentava descobrir como foram
parar no Maranhão.
– Mamo katy tu peo ta? Marã rami? (Para onde vocês vão?
E como?) – Paulão traduziu a dúvida do amigo.
– Roo rã roguata roexa ra’u ague oereraa rupi, ko’em
nhavon rovaen peve Yvy Marã he’yn py. Ka’aguy oremon-
garu. Roiko porã rã ae ma, xeirun. (Vamos para onde os
sonhos nos levarem e caminharemos todos os dias buscando
a Terra sem Mal. A natureza nos alimenta. Estaremos bem,
meu amigo.)
Pedro sinalizou para Zeca parar com o interrogatório e apro-
veitar aquele momento tão mágico.

. 57 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

. 58 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Despedida

E ra uma cena impressionante.


Alinhados na beira do precipício estavam seis trocanos.
O pajé mais idoso orientava os outros cinco, que se preparavam
para tocar cada um o seu tambor. Muitos flautistas, homens e
mulheres, formavam um semicírculo ao redor dos trocanos. No
centro de tudo estava Toriba, trajando um manto de penas e um
cocar que chegava ao chão. Ele orientava o ritual.
– Vamos todos entoar as palavras mágicas, no ritmo dos nos-
sos trocanos e protegidos pelas flautas. É a nossa última vez aqui,
então toquem e cantem com o coração.
Paulão e Tília estavam a postos. A banda estava pronta para
começar, em sintonia com os Tupinambás.
– Tília, na última nota você chama os raios e os trovões. Tinu,
essa nota é sua.
Toriba levantou o cajado e, naquele momento, o vale do rio
Carioca ouviu e assistiu pela última vez ao espetáculo inesquecível
da grande nação tupinambá, acompanhada pela banda Turma
do Planeta.
Uma despedida para ficar na história, o fim de um tempo
para os Tupinambás e o começo da cidade que todos conhe-
cem como São Sebastião do Rio de Janeiro. Quatrocentos e

. 59 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

cinquenta anos depois, com mais de seis milhões de habitan-


tes, essa mesma cidade estava acordando para a necessidade
de recuperar seus rios, lagoas e mares. E quem estava fazendo
tudo para chamar a atenção para essa causa? A mesma Turma
do Planeta.
Foi com esse pensamento que Tinu tocou a sua nota e Tília
abriu o Portal, a tempo de todos voltarem para a Floresta do
Beija-Flor Azul.

. 60 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

A paz

Letra: Silvana Gontijo


Música: Marcelo Quintanilha

I ta ca ra y I ta ca ra y
I ta ve rá I ta ve rá
I ta po ssan ga i ta po ssan ga
I ta gua çu I ta gua çu

A paz cobrirá essa nação A paz


O amor será a luz da nova geração O vento
E pra celebrar essa união cobrirá essa nação
Vamos cantar numa só voz vai espalhar a melodia
E todos juntos dar as mãos O amor
Semente
I ta ca ra y será a luz da nova geração
I ta ve rá que irá brotar novas canções
I po ssan ga E
I ta gua çu Cantos
pra celebrar essa união
O vento vai espalhar a melodia pelos quatro cantos, noite e dia
Semente que irá brotar novas canções Vamos cantar numa só voz
Cantos pelos quatro cantos, noite e dia Que vão salvar o nosso mundo
Que vão salvar o nosso mundo E todos juntos dar as mãos
Unindo nossos corações Unindo nossos corações

. 61 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Jequitibá levou um susto com a chegada súbita dos amigos


e ficou mais espantado ainda com a aparência deles, completa-
mente pintados.
– Caramba, vocês estão imundos!
– Imundos não, somos obras da arte tupinambá. E vamos
eternizar esse momento. Venham aqui, pessoal, vamos registrar
essa aventura numa selfie.
King espichou bem o braço com o celular em mãos e todos
disseram “xis”!
Foi assim que Tinu pôde mostrar para o avô como eles fariam
para chamar a atenção para o problema do rio. Salvar o rio Carioca
era um sonho, e estava só começando.

. 62 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Atividade

Que tal responder aqui às perguntas do começo dessa história?

• Por que os Tupinambás deixaram essa terra?


• Por que foram para o Maranhão?
• Como chegaram lá sem avião, carro ou navio?
• Como carregaram aqueles trocanos pesadíssimos?

. 63 .
© Autêntica Editora 2023. Todos os direitos reservado. É proíbida a reprodução.

Sobre a autora

SILVANA GONTIJO
Além de escritora, ela faz um monte de outras coisas legais: é
diretora de arte, consultora de moda, desenhista industrial, ce-
nógrafa, jornalista, roteirista... ufa! Quando a Silvana era pequena,
vivia em contato com a natureza e com a arte brasileira, e isso
ajudou a descobrir o seu maior sonho: transmitir às crianças a
importância da nossa cultura, assim como as histórias, os mitos,
a música... Bacana, né?
A Silvana também está à frente do planetapontocom, uma
organização que busca soluções para a educação de crianças e jo-
vens por meio de experiências divertidas e prazerosas. A Turma do
Planeta faz parte dessa ideia e traz incríveis personagens que viajam
no tempo através da música e vivem grandes desafios ambientais,
éticos, científicos e muito mais.
Saiba mais em: https://planetapontocom.org.br/turma

. 64 .
Depois de viajar no tempo para desvendar o enigma
do trocano, a Turma do Planeta resolve investigar
mais sobre o passado do rio Carioca, abrigado pela
Floresta do Beija-Flor Azul. Como o rio, que era tão
limpo, ficou tão poluído? Influenciados pela lenda
contada por cacique Moabaetê, passada de pai para
filho há mais de mil anos, eles voltam no tempo
através da música outra vez e veem, de perto, como
os portugueses não foram bons para os indígenas
brasileiros, que tiveram de abandonar suas terras,
nem para as nossas riquezas naturais, que, aos
poucos, foram devastadas.

Leia também:
Como tudo começou (vol. 1)
ISBN 978-65-5928-279-1
O enigma do trocano (vol. 2)
Agitando a galera (vol. 4)
Nas águas do tempo (vol. 5)
Um rio que canta e encanta (vol. 6)
9 786559 282791

Você também pode gostar