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FACULDADE IPEMIG

KÊNIA ROBERTA PEREIRA VASCONCELOS

O TARÔ COMO CIÊNCIA SIMBÓLICA E FILOSÓFICA

BELO HORIZONTE – MG
2021
KÊNIA ROBERTA PEREIRA VASCONCELOS

O TARÔ COMO CIÊNCIA SIMBÓLICA E FILOSÓFICA

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado a FACULDADE IPEMIG,
como pré-requisito para obtenção do
título de especialista em Filosofia.

BELO HORIZONTE – MG
2021
PEREIRA VASCONCELO, Kênia Roberta. O Tarô como Ciência Simbólica
e Filosófica. Belo Horizonte: IPEMIG FACULDADE, 2021, especialista em Filosofia.

RESUMO

O estudo das ciências humanas as vezes se depara com aspectos do século XXI
que desvirtuam os fatos e informações, chegando mesmo a legar ao esquecimento fontes
de conhecimento que sempre estiveram na vanguarda dos saberes. Escavar
profundamente, retirar camadas de preconceitos e buscar estabelecer um elo entre as
ciências antigas e contemporâneas, faz parte do filosofar em um cotidiano tomado por
incertezas, progresso científico, mas vazio espiritual. A busca perene pela verdade passa
por este desafio insólito, que é criar uma ponte ou canal por onde possam fluir
continuamente o conhecimento humano de ontem e de hoje. O cartesianismo, o método
científico, o materialismo característico da época atual, não suportam disciplinas
extravagantes, indecifráveis por números ou medições. A simples ideia de uma natureza
simbólica acima das fórmulas matemáticas é irreal quando os gigas de memória são mais
importantes de que a memória popular. Fazer tal ponte, ainda que hercúleo trabalho, é
dever de todo filósofo. O amor a verdade é o amor completo, é o abandono dos
preconceitos, é trato servil a qualquer conhecimento, pois ao homem, sempre será
proposto um degrau a mais na escala da contemplação. Assim, contribuindo para este
caminho que liga o presente e o pretérito, fez-se aqui uma análise da filosofia e do
simbolismo do tarô desde um ponto de vista de ciência antiga, carregada de valores
aplicáveis em qualquer comunidade humana. Mais que um jogo de adivinhação, o tarô é
um sistema completo de doutrina, formulado ao longo dos séculos como espelho das
experiências humanas e, até mesmo; talvez; de uma revelação sobre-humana. Portanto,
tal estudo vem somar ao processo humano de conhecimento de si, do meio e mesmo das
verdades primeiras da existência, aquela metafísica inalcançável até aos mais
superpotentes computadores, mas tão familiar ao gênero humano quando este se coloca
como aprendiz.

Palavras-chave: tarô. conhecimento. filosofia. ciência. mística.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO............................................................... 05
2. DESENVOLVIMENTO.................................................. 08
2.1 A Cartomancia................................................................... 09
2.2 O Tarô................................................................................ 10
2.2.1 A Mística no tarô................................................................ 12
2.2.2 O sistema simbólico do Tarô.............................................. 13
2.2.3 A Jornada do Louco, um saber filosófico............................ 15
3. CONCLUSÃO................................................................. 20
4. REFERÊNCIAS.............................................................. 22
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1. INTRODUÇÃO

As estruturas que formam a rede de conhecimento humano são antigas. Desde a aurora
dos tempos, muitas foram as formas, perspectivas, fontes e meios de transmissão das muitas
facetas do desenvolvimento intelectual e espiritual dos homens.
Se em um primeiro momento, o conhecimento era vívido e oral, com o decurso das
eras, a linguagem simbólica foi sendo codificada em ritos iniciáticos e, a posteriori, reduzida a
escritos sagrados e manifestações culturais que pouco carregavam do conhecimento original.
Todas as tradições religiosas ou filosóficas, do Ocidente ao Extremo-Oriente, são
uníssonas em descrever os tempos pretéritos como uma “idade de ouro” da humanidade, onde
havia uma intrínseca e viva ligação entre os homens e o Sagrado, entre as verdades deste plano
terrestre e as realidades maiores da existência.
Fato, portanto, que o desenvolvimento material da humanidade, a comodidade de uma
época tecnológica e de prosperidade nunca antes vista, em sentido contrário, acabou por eclipsar
e lançar brumas naquele conhecimento originário. Hoje, o processo cartesiano e a
matematização da realidade, não deixam espaço para reflexões mais profundas quanto ao Ser e
a busca pela sophia perennis. A sistematização do conhecimento consegue medir com precisão
não apena os lados de um objeto, mas também os processos físicos, químicos, biológicos que
envolvem toda a estrutura da realidade, sem, contudo, jamais, apontar o motivo ou fonte
primeira de um determinado evento ou estudo.
Assim, as ciências tidas como “ocultas”, que em verdade nada têm de oculto, mas
carregam em si os resquícios de um conhecimento antigo, relegadas a um segundo ou terceiro
plano, hoje são vistas como superstições, fábulas, um folclore de outrora que nada pode
contribuir com o presente. E isto, é um erro.
Apresentar a soma de uma área no mapa, descrever as qualidades do solo, sua
inclinação, composição e mesmo posição em referência ao Sol afim de se conseguir melhor
iluminar uma futura habitação, tudo isso não concede ao interessado uma visão integral da
ligação de um determinado pedaço de terra com seu proprietários, com as comunidades
originárias do local ou com o Cosmo.
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Diz o poeta: “Há mais coisas entre o céu e a terra do que pode imaginar nossa vã
filosofia1”. Ou seja, todo o conhecimento humano ainda é pequeno diante da imensidão do
porvir. Nenhuma ciência, seja ela moderna ou antiga, por si, pode ser espelho de uma Verdade
imanente, pois, partindo da premissa da existência de um código universal que decodifica a
criação, está diante do próprio Ser divino, o que não deixa de ser um devaneio juvenil
dispensado àqueles filósofos e pretensos mestres embebecidos de si e que dão de costas ao
convite sempre presente que o conhecimento verdadeiro oferece.
É nesta perspectiva um tanto desanimadora que se pretende apresentar nas próximas
linhas um estudo sobre o Tarô. A ciência da cartomancia é antiga e advém daquele conjunto de
conhecimentos, ritos e símbolos de um passado distante, que resistiu ao tempo e foi sendo
reintroduzida e reinterpretada a partir de vários prismas.
O tarô como hoje conhecido, mais do que um jogo de adivinhações, é um conjunto
rico em simbolismo, que dá sedimento e estrutura para interpretações filosóficas dos vários
aspectos da vida humana e, portanto, sempre justificável seu estudo.
A filosofia, busca interminável pelas verdades essenciais da imensidão humana,
portanto, sempre está aberta a novas e mesmo antigas fontes de conhecimento e análise. Como
se verá no presente estudo, a interpretação das cartas por si já traz em seu bojo o simbolismo
de um pensamento em forma de síntese que muito diz quanto a experiência dos homens em sua
jornada terrestre.
As fontes do saber, tanto na Antiguidade, quando no século XXI, são diversas,
convergindo para um cume central imutável donde crê-se vir os mistérios acessíveis apenas aos
amantes da Verdade (“E conhecerão a verdade, e a verdade os libertará” 2).
Continuando, em respeito a metodologia acadêmica, mesmo que o tema do presente
estudo não seja o mais próximo das tidas ciências modernas, ater-se a estruturação dos manuais
e da ABNT é necessário para se posicionar no meio dos pares e fazer com que o conhecimento
possa transitar de maneira acessível ao maior número pessoas interessadas.
Neste sentido, optou-se como metodologia de pesquisa a remissão bibliográfica feita
em livros, artigos científicos e sites acadêmicos, tendo por norte os seguintes termos: tarô.
conhecimento. filosofia. cartomancia.

1
SHAKESPEARE, W. Hamlet. 1601. Disponível em: <https://www.pensador.com/frase/MjM3ODQ/>. Acesso
em 01 de jul. 2021.
2
JOÃO 8:32 (Bíblia Sagrada). Disponível em: <https://www.bibliaon.com/versiculo/joao_8_32/>. Acesso em 01
de jul. 2021.
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Em complemento, ainda tendo por norte a metodologia de pesquisa, como objetivo


geral, buscou-se por apresentar de maneira geral o Tarô como um esquema filosófico de busca
do conhecimento; um conhecimento que não advém de métodos empíricos ou cartesianos, mas
que tem seu valor no simbolismo das mensagens e sua representação na vida cotidiana. E, como
objetivos específicos: a) apresentar de maneira breve a cartomancia; b) apresentar o Tarô desde
uma ótica filosófica; c) demonstrar uma das possíveis interpretações do Tarô moderno e sua
correlação com uma unidade que transcende a matéria e garante ao homem uma visão integral
da sua realidade circundante.
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2. DESENVOLVIMENTO

É uma realidade que nos dias atuais há uma tendência em se confundir a Ciência com
as ciências. A primeira, imutável nos seus postulados, não pode ser orientada por conjecturas
de acordo com o tempo e as ideologias dominantes. O que era científico a pouco mais de 100
anos, está agora bem perto de se transformar em fábula (PAPUS, 1973).
No domínio das ciências, tudo se transforma a todo instante, de maneira que a uma
visão preconceituosa do passado acaba por colocar em xeque o próprio presente, na medida em
que o tempo não está a serviço do homem (SMITH, 2017).
Não se ignora que os cientistas contemporâneos dedicam tempo e recursos no melhor
dos estudos para lançar luzes a experiência humana, embora eles atribuam a sua ciência os
verdadeiros e valorosos progressos dos últimos séculos. Tal falácia, só prospera quando se tenta
sintetizar a ciência moderna como expressão total da verdade eterna, algo impossível para o
homem (SCHUON, 2014).
Kant ensinava que o homem não tinha acesso total a realidade de um objeto. Por
exemplo, determinado observador diante de um dado de seis lados, visualmente não teria
condições de observar todos os lados do objeto ao mesmo tempo. Vendo, porém, três lado,
poderia deduzir os demais. Poderia, ainda, manejar seu objeto de análise, descobrir sua
composição, medidas, ângulos. Contudo, a ideia de dado está além de qualquer possibilidade
de análise. Pode-se fazer todo o tipo de estudo científico de um dado sem nunca se chegar à
resposta de onde o dado veio (SMITH, 2017).
Platão também discorreu quanto a isto. Para ele tudo que existe neste mundo é um
esboço daquilo que existe em um plano superior, eterno e perfeito. Se o homem consegue medir
o dado, somente neste plano superior encontrará o real sentido deste objeto em sua fonte
originária (DOS SANTOS, 1966).
Portanto, todo o conhecimento material, todo o progresso que se iniciou na Revolução
Industrial, os avanços sociais advindo da Revolução Francesa e das posteriores lutas por direitos
civis, tudo isto é apenas um lado do intelecto humano atuando em prol do sociedade, nada se
opondo a existência de outras ciências que têm seu valor em descrever fenômenos de ordem
não-material e que independem de uma medida cartesiana probatória.
Nesta medida, utilizar-se de recursos simbólicos para edificar o conhecimento através
das ciências antigas é algo que não parece mais tão incongruente. Bem verdade, o conhecimento
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dos antigos é hoje inacessível e pouco se sabe o grau tecnológico das gerações passadas (LÉVI,
1966).

O capítulo IV de A Missão dos Judeus nos diz ainda: “O manuscrito de um monge de


Atos, Panselenus, revela, segundo os antigos autores iônicos, aplicação da química na
fotografia. O fato foi revelado a propósito do processo de Niepce3 e de Daguerre4. A
câmara escura, os aparelhos de ótica, a sensibilização de placas metálicas são descritas
com detalhe.
Quanto à química dos antigos, tenho sólidas razões para crer, baseado em alguns
conhecimentos alquímicos, que seriam muito superiores, teórica e praticamente, à
nossa química moderna. Mas como os fatos falam mais que as opiniões, ouçamos
ainda Dutens (cap. III do tomo II). “Os antigos egípcios conheciam a maneira de
trabalhar os metais, a douração, a pintura em cores da seda, a vidraria, o modo de
desenvolver o embrião num ovo, extrair óleos medicinais das plantas e preparar o
ópio, a cerveja, o açúcar de cana – que eles chamavam mel de caniço – e muitos
unguentos; eles ainda sabiam destilar e conheciam os alcalinos e os ácidos (PAPUS,
1973, p. 33).

Mensurar, portanto, desde um ponto de vista linear as épocas pretéritas e vindouras,


adornando cada uma sob o prisma de um crescente avanço científico, por hora, também é algo
não tão preciso quanto a “academia” quer deixar transparecer (SMITH, 2017).
Cada época histórica tem um conjunto próprio de conhecimento, uma cosmovisão de
mundo, uma estrutura que une e transmite aos homens noções quanto a existência e o lugar de
cada indivíduo dentro deste emaranhado de arranjos sociais, culturais, religiosos, sendo as
ciências uma parcela apenas do emaranhado (SCHUON, 1953).
Portanto, cada parte do conhecimento humano é essencial para se compreender a
espécie como um todo e a realidade que a cerca.

2.1. A Cartomancia

O estudo de fenômenos dos mais diversos através das cartas é algo presente no
Ocidente desde o final da Idade Média e o início do Renascimento. Nas palavras de Collin de
Plancy:

[...] Costumava-se dizer que as cartas tinham sido inventadas para divertir Carlos VI5
em sua loucura; mas Alliette, que escreveu sob o nome de Etteilla, garante que a
cartomancia é bem mais antiga. O autor faz remontar essa adivinhação ao jogo dos

3
Joseph Nicéphore Niépce (1765-1833), foi um inventor francês responsável por uma das primeiras fotografias
4
Louis Jacques Mandé Daguerr, (1787-1851), foi um pintor, cenógrafo, físico e inventor francês, tendo sido o
autor, em 1835, da primeira patente para um processo fotográfico, o daguerreótipo.
5
Carlos VI (1368-1422), também conhecido como o Bem Amado e o Louco, foi chefe da casa de Valois e Rei da
França de 1380 até sua morte em 1422.
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bastões de Alpha (nome de um grego exilado na Espanha); ele acrescenta que esta
ciência maravilhosa foi se aprimorando desde então. Passaram-se a utilizar tabuletas
pintadas; e quando Jacquemin Gringonneur ofereceu as cartas ao rei Carlos, o Bem-
Amado, ele teve apenas o trabalho de reproduzir em cartões o conhecimento [...].
[...]
É também natural que já fossem conhecidas na Espanha, visto que Alfonso XI proibiu-
as em 1332, nos estatutos da ordem de Banda. [...]. (COLLIN DE PLANCY, 2019, p.
210).

Ainda que a narrativa do enciclopedista francês aponte para nomes hoje pouco
conhecidos ou mesmo esquecidos das pesquisas históricas, as datas sustentam que a
cartomancia é uma arte mística que, tal como a Alquimia, a Astrologia e o Esoterismo, ressurgiu
no Ocidente no mesmo período histórico em que ruía o sistema feudal e com ele as crenças de
uma sociedade intimamente ligada a mística católica.
Isto diz muito da arte da cartomancia, pois, seu objetivo principal não era o de se buscar
respostas oraculares em um jogo de cartas. O jogo, rico em simbolismos e mística, era um
sistema científico tal como entendido na época, sendo que cada carta trazia consigo toda uma
reprodução dos padrões da vida humana, ou seja, a disposição das mesmas dava ao jogador
indícios de como atuar nas mais variadas situações (BANZHAF, 1991).
Seja como for, as cartas, a princípio toleradas, foram em seguida condenadas; e na
crença de algumas pessoas ainda subsiste a ideia de que quem faz uso de cartas, está em
conexão com forças malignas, sendo necessário sempre trazer novos olhares ao conhecimento
passado para oxigenar o presente e desvirtuar os preconceitos (WIGINGTON, 2018).

2.2. O Tarô

Embora os métodos de leitura do Tarô tenham mudado ao longo dos anos, e muitos
leitores adotem seu próprio estilo único para os significados tradicionais de um layout, em geral,
as próprias cartas não mudaram muito.
A variedade de tarôs existente é sem número. Desde seu surgimento, as cartas
ganhavam novas denominações, mantendo, contudo, uma filosofia hermética inalterável,
acessível desde prismas sociais e históricos diversos. Quanto a isto, definiu Collin de Plance:

Tarôs ou cartas ilustradas é o nome que se dá às cartas egípcias, italianas, alemãs; o


baralho compõe-se de 78 cartas, mediante as quais se lê a sorte de maneira mais
extensa do que com nossas cartas comuns. Há nesse baralho 22 tarôs propriamente
ditos. Nas cartas italianas, os tarôs são os quatro elementos (no velho estilo), o
Evangelho, a morte, o Juízo Final, a prisão, o fogo, Judas Iscariotes, etc.; nas cartas
alemãs, os tarôs são o louco, o mágico, o urso, o lobo, a raposa, o unicórnio, etc. Vêm
em seguida 56 cartas, a saber: quatro reis, quatro damas, quatro cavaleiros, quatro
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valetes; dez cartas do ás ao dez para os bastões (ou paus); dez para as espadas; dez
para as taças (copas); dez para as moedas de prata (ou ouros) (COLLIN DE PLANCY,
2019, p. 829).

A essência do Tarô e sua subdivisão tal como exposta por Collin de Plancy (2019) se
mantém, mas como bem observa Wigington:

Hoje, os cartões estão disponíveis para compra em centenas de designs diferentes.


Existe um baralho de tarô para praticamente qualquer praticante, não importa quais
sejam seus interesses. Quer você seja um fã de O Senhor dos Anéis ou de beisebol,
ame zumbis ou esteja interessado nos escritos de Jane Austen6, seja o que for,
provavelmente há um baralho para você escolher (WIGINGTON, 2018, s/p).

Logo, a composição simbólica das cartas pode ser aplicada a qualquer tempo, em
qualquer situação. Isto se dá pela enorme carga filosófica do tarô. A busca pela verdade pelo
filósofo moderno é pautada pelo hermetismo acadêmico, pelos métodos de pesquisa trazidos
pelos movimentos educacionais dos séculos XIX e XX, bem como pela preponderância hoje,
de um pensamento materialista que não considera fenômenos de ordem não-humanas como
possíveis variáveis do saber (SCHUON, 2014).
Tudo isto é entendível visto o progresso e a tecnologia experimentados nestes anos de
2021. Se a cartomancia e o próprio tarô se valem de signos e conhecimentos sintetizados em
parábolas humanas, tudo muito profundo, mas confuso as mentes desatentas, fácil é mensurar
o tamanho e propósito de um foguete que sai da órbita terrestre para explorar um espaço que
antes também só era acessível via simbolismos e metáforas filosóficas. Mas, mesmo a
exploração espacial com todo o seu conhecimento tecnológico não explica de maneira
matemática, física, química ou biológica o sentido da dualidade entre o sol e a lua, a proporção
do raio de suas circunferências desde um observador terrestre; enfim, tudo aquilo que fez parte
do conhecimento humano por séculos e que hoje parece ter sido esquecido entre cálculos
infinitesimal.
Voltando a análise do tarô, como visto no verbete referente a Cartomancia, as origens
ancestrais do que hoje se conhece como cartas do Tarô podem ser rastreados até o final do
século XIV, essencialmente com a divisão por naipes. Depois de uma ou duas décadas de uso,
em meados de 1400, os artistas italianos começaram a pintar cartas adicionais, fortemente
ilustradas, para adicionar aos naipes existentes (HOUDOUIN, 2014).

6
Jane Austen (1775-1817) foi uma escritora inglesa, considerada uma das maiores romancistas da literatura
inglesas do século XIX.
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Essas cartas de trunfo, ou triunfo, os Arcanos eram frequentemente pintadas para


famílias ricas. Membros da nobreza contratavam artistas para criar seu próprio conjunto de
cartas, apresentando familiares e amigos como as cartas de triunfo. Vários conjuntos, alguns
dos quais ainda existem hoje, foram criados para a família Visconti de Milão, que contava com
vários duques e barões entre seus números (BANZHAF, 1991).
Como nem todos podiam contratar um pintor para criar um conjunto de cartões
próprios, por alguns séculos, os cartões personalizados eram algo que apenas uns poucos
privilegiados podiam possuir. Apenas com o advento da prensa móvel é que cartas foram
disseminadas em número suficiente para que o tarô pudesse ser manejado por pessoas de
qualquer classe social (WEBER, 2020).
Tanto na França quanto na Itália, o propósito original do tarô era como um jogo de
salão, não como uma ferramenta divinatória. Estudos indicam que a adivinhação com cartas de
baralho, apesar de existirem desde o final do medievo, sua popularização se deu tardiamente no
século XVIII, quando partindo de linhas de conhecimento das mais variadas, pessoas
começaram a atribuir a cada carta um simbolismo próprio que poderia fazer parte de uma
conjectura maior quando associadas dentro de uma disposição revelada na mesa
(WIGINGTON, 2018).

2.2.1. A Mística no tarô

Em 1781, um maçom francês (e ex-ministro protestante) chamado Antoine Court de


Gebelin publicou uma análise complexa do Tarô, na qual revelou que o simbolismo do Tarô
era de fato derivado dos segredos esotéricos dos sacerdotes egípcios. De Gebelin continuou
explicando que esse antigo conhecimento oculto havia sido levado a Roma e revelado à Igreja
Católica e aos papas, que queriam desesperadamente manter esse conhecimento misterioso em
segredo. Em seu ensaio, o capítulo sobre os significados do Tarô explica o simbolismo
detalhado da arte do Tarô e o conecta às lendas de Ísis, Osíris e outros deuses egípcios
(BANZHAF, 1991).

O maior problema com o trabalho de Gebelin é que não havia realmente nenhuma
evidência histórica para apoiá-lo. No entanto, isso não impediu os europeus de
saltarem para o movimento do conhecimento esotérico e, no início do século XIX,
baralhos de cartas como o Tarô de Marselha estavam sendo produzidos com obras de
arte baseadas especificamente na análise de Gebelin (WIGINGTON, 2018, s/p).
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Em 1791, Jean-Baptiste Alliette, lançou o primeiro baralho de Tarô projetado


especificamente para fins divinatórios, em vez de um jogo de salão ou entretenimento. Alguns
anos antes, ele havia respondido ao trabalho de de Gebelin com um tratado de sua autoria, um
livro explicando como alguém poderia usar o Tarô para adivinhação. À medida que o interesse
pelo oculto no Tarô se expandiu, ele se tornou mais associado à Cabala e aos segredos do
misticismo hermético (WEBER, 2020).
Já no século XX, O ocultista britânico Arthur Waite se juntou à artista Pamela Colman
Smith e criou o baralho Rider-Waite-Smith, que foi publicado pela primeira vez em 1909. Por
sugestão de Waite, Smith usou a arte de Sola Busca7 como inspiração, e há muitas semelhanças
no simbolismo entre Sola Busca e o resultado final de Smith. Smith foi a primeiro artista a usar
personagens como imagens representativas nas cartas inferiores. Em vez de mostrar apenas um
agrupamento de xícaras, moedas, varinhas ou espadas, o Sola Busca incorporou figuras
humanas à obra de arte, e o resultado é o baralho icônico que todo apreciador do tarô conhece
nos dias atuais (BERTI, 2021).
As imagens são carregadas de simbolismo Cabalístico e, por causa disso, é
normalmente usado como o baralho padrão em quase todos os livros de instrução de tarô
atualmente. Hoje, muitas pessoas se referem a este baralho como o baralho Rider-Waite-Smith,
em reconhecimento à obra de arte duradoura de Smith; mais de cem anos desde o lançamento
do baralho, as cartas de Tarô estão disponíveis em uma seleção praticamente infinita de designs.
Em geral, muitos deles seguem o formato e estilo de Rider-Waite-Smith, embora cada um
adapte as cartas para se adequar ao seu próprio motivo (WEBER, 2020).

2.2.2. O sistema simbólico do Tarô

Para as pessoas não familiarizadas com a adivinhação, pode parecer que alguém que
lê as cartas do Tarô está "prevendo o futuro". No entanto, a maioria dos leitores de tarô dirá que
as cartas oferecem uma diretriz, e o leitor está simplesmente interpretando o resultado provável
com base nas forças atualmente em ação.
A interpretação das cartas do tarô segue um simbolismo preestabelecido. Cada carta,
portanto, tem um signo fixo, interpretável segundo sua posição no jogo. Os arcanos maiores

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O Tarô Sola-Busca é absolutamente original na história do Tarô: trata-se do único baralho do século XV que
chegou completo até hoje. Todas as cartas estão ilustradas com personagens, inclusive os arcanos menores,
alternativa que apenas se tornou comum a partir dos baralhos de Etteilla (1783), Lenormand (1828-40) e da difusão
do Tarô Rider-Waite-Smith
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representam vários aspectos da experiência humana, podendo ser divididos em três conjuntos
(BANZHAF, 1991).
As cartas de zero a sete, espelhão questões atinentes ao mundo material, situações que
têm correlação com o trabalho, educação, finanças, amor. As oito primeiras cartas dos arcanos
maiores representam: a) o Louco; b) o Mago; c) a Sacerdotisa; d) a Imperatriz; e) o
Rei/Imperador; f) o Papa; g) os Enamorados; h) a Carruagem (HOUDOUIN, 2014).
Enquanto a primeira seção dos Arcanos Maiores lida as interações no mundo material,
o segundo grupo de cartas concentra-se mais no ser individual, ao invés de questões sociais. Os
cartões de oito a quatorze são baseados nos sentimos e naquilo que cada pessoa pensa ou faz.
Essas cartas estão em sintonia com as necessidades do coração, bem como da busca pela fé e
verdade: i) a Justiça; j) o Eremita; k) a Roda da Fortuna; l) a Força; m) o Enforcado; n) a Morte;
o) a Temperança (BANZHAF, 1991).
O próximo grupo envolve a mente intuitiva e sentimentos. Este último grupo de cartas
nos Arcanos Maiores, as cartas de quinze a vinte e um, tratam de leis e questões universais.
Elas vão muito além dos sentimentos do indivíduo e das necessidades da sociedade. Esses
cartões tratam de circunstâncias que podem alterar para sempre nossas vidas e o caminho que
percorremos. São elas: p) o Diabo; q) a Torre; r) a Estrela; s) a Lua; t) o Sol; u) o Julgamento;
v) o Mundo (HOUDOUIN, 2014).
Quanto aos naipes, Espadas está associado a questões de conflito, tanto físicas quanto
morais. Também está conectado ao elemento ar e, posteriormente, à direção do Leste. Este
naipe é onde se encontrarão cartas relacionadas a conflito e discórdia, escolhas morais e dilemas
éticos (BANZHAF, 1991).
Copas está associado a questões de relacionamento e emoções. Como se pode esperar,
ele também está conectado ao elemento água e, posteriormente, à direção oeste. É onde estão
as cartas relacionados ao amor e sofrimento, escolhas e decisões relacionadas a emoções,
situações familiares etc. (WIGINGTON, 2018).
Ouros (frequentemente retratado como Moedas) é associado a questões de segurança,
estabilidade e riqueza. Também está conectado ao elemento terra e, posteriormente, à direção
do Norte. Este naipe onde se encontraram cartões relacionados à segurança no emprego,
crescimento educacional, investimentos, casa, dinheiro e riqueza (HOUDOUIN, 2014).
Por último, Paus é associado a questões de intuição, inteligência e processos de
pensamento. Também está conectado ao elemento fogo e, posteriormente, a direção do sul. Este
naipe está relacionado à criatividade, comunicação com outras pessoas e atividade física
(WIGINGTON, 2018).
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2.2.3. A Jornada do Louco, um saber filosófico

Uma interpretação: O Arcano do início e do fim. O Louco é a representação de uma


pessoa na beira do precipício, a deriva, um bobo da corte de um reino qualquer, que faz piadas
o tempo todo com as pessoas e os costumes da corte, até o dia em que desagrada o rei com uma
piada considerada por demais infame, sendo expulso do reino como castigo, podendo levar
consigo apenas uma pequena trouxa com aquilo que conseguiu dispor antes do degredo.
Expulso das terras onde tinha uma ocupação, mantinha vínculos e era protegido, o
Louco começa sua jornada em busca de um novo reino, uma nova corte onde possa prestar seus
serviços. Contudo, recomeçar sua vida como bobo da corte novamente era algo perigoso, pois
alguém poderia denuncia-lo ao antigo rei, trazendo assim consequências a sua nova vida, com
novas perseguições.
Assim, encontrando um novo local para residir, assume a figura do Mago. Por tudo
que havia vivido na corte, tinha o Louco conhecimento das coisas agradáveis aos homens,
incluindo as profecias, elixires, trabalhos de magia, tudo que causa ainda hoje curiosidade e
fascina; e abrindo sua trouxa de pertences, percebe haver ali elementos suficientes para ser um
Mago reconhecido, passando a ajudar muitas pessoas com sua nova arte.
Tempo depois, o agora Mago, percebe que também sua nova persona atingiu um certo
grau de potencialidade máximo e para continuar sua jornada, é necessário assumir um novo
papel, se tornando então a Sacerdotisa.
Neste personagem, assume as características de uma mulher muito preocupada com os
estudos, que busca um conhecimento profundo, leitora assídua, que vai repassar esse
conhecimento aos semelhantes. Todo conhecimento adquirido por esse Arcano, é bom, positivo
para transformação das pessoas, mas uma vez atingindo toda a potencialidade da Sacerdotisa,
o Louco assume então o lugar da Imperatriz.
O Louco, pela experiência vivida na primeira corte, sabia que quem de fato mandava
no reino era a Imperatriz, pois, o poder decisório máximo, mesmo pertencendo ao rei, a
influência da Imperatriz era, no final de tudo, aquilo que importava e refletia-se nas decisões
reais. A capacidade de gerar, costurar acordos, propor soluções, tudo isto parte deste Arcano.
Todavia, por mais influência que tivesse, a figura do rei ainda se impunha e, portanto,
decide o Louco se transmutar novamente, assumindo a figura do Imperador.
A carta do Imperador coloca o Louco de frente com as demandas do mundo. Cabe ao
Louco decidir, portanto os destinos de si e dos outros. O Rei, para ser justo, deve agir de acordo
com bons princípios, os quais manterão o reino em harmonia. Contudo, exercendo a função
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real, percebe o Louco que acima das demandas deste mundo há algo que se conecta ao sagrado,
algo maior e é assim ele assume o Arcano do Papa.
Nesta interpretação, a figura do Papa representa o acúmulo de sabedoria, bem como a
religião, aquilo que liga o homem a sua essência maior, a uma realidade superior. Assumindo
a figura do Papa, pode então o Louco auxiliar seus semelhantes não somente no plano material,
mas também espiritual. Isto é importante, pois o Rei, apesar de todo o seu poder, não detém
meios eficazes naquilo que são as “coisas do espírito”. A alma humana independe de um
soberano terrestre.
Porém, o Louco, já tendo atuado como soberano e líder espiritual, percebendo a
envergadura do conhecimento que agora detinha, passa a ser acometido de dúvidas, pois, eram
mesmo as dúvidas a maior preocupação das pessoas que o cercavam, sempre atrás de conselhos
sobre um emprego correto, o amor verdadeiro, o sentido da vida; e é neste momento onde ele
se associa a carta dos Enamorados.
Este Arcano representa o instinto humano na tomada de decisões momentâneas, que
deixam de lado a voz do coração ou a voz de uma razão interior que deve ser maturada, ouvida
em silêncio e reflexão. Amar determinada pessoa, situação, coisa, muitas vezes requer do ser o
abandono destas em prol de uma elevação do espírito. Uma vez que o Louco compreende a
necessidade de se ouvir a voz interior, ele assume então as características de mais uma carta, a
carta da Carruagem.
A Carruagem, representada normalmente por um carro conduzido pelo Louco e guiado
por dois cavalos de cores contrárias, simboliza o tomar de rédeas. A Carruagem é o próprio
destino humano e, uma vez que a pessoa consegue ouvir a sua voz interior, ela tem condições
de traçar o próprio destino, ascendendo a um plano superior de consciência.
Agora, podendo escolher com sabedoria seu destino, sendo ele próprio o condutor da
sua vida, o Louco assume então nova posição no tarô, se tornando o Arcano da Justiça.
A Justiça, no tarô se associa a Justiça Divina, a lei de causa e efeito. O Louco assumiu
decisões, praticou atos e tudo aquilo que um dia foi por ele motivado, terá reflexo nele próprio.
Mais, mesmo a inércia, a falta de ação, o deixar de agir em determinadas situações, também
acarreta resultados. Diante do abismo do seu ser, o Louco busca nova característica, vindo a se
torno o Ermitão.
A carta número nove, representa o afastamento. O Louco se retira da cidade na
expectativa de viver de maneira reclusa e refletir tudo o que já havia vivido. Anos se passaram
desde que iniciou sua jornada assumindo as alegorias dos Arcanos e, agora, apoiado em um
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bastão que sustentará suas decisões, iluminado pela lamparina que iluminará seu caminho,
percebe o personagem desta narrativa que tudo na vida é uma Roda.
A Roda ensina que a vida é movimento, que tudo é passageiro e nada pode se manter
estático. O eixo da vida se move neste giro contínuo de alegrias, tristezas, bons e maus
momentos. Tudo passa, tudo é efêmero. O Arcano da décima carta tem o signo da mudança,
dos ciclos. E a vida de todo indivíduo é cheia de ciclos. Trabalho, relacionamento, busca por
conhecimento, etc. Todos estes ciclos, nem sempre operam em harmonia, o que torna
importante a compreensão de cada um e a compreensão geral de todos, o macro e o micro que
se fundem no eu.
Sabendo disto, tomando consciência mais uma vez da sua posição perante si, perante
o mundo e perante o divino, o Louco se transmuta no Arcano da Força, carta que fala da
vontade, da fé. Quando se está por baixo nos ciclos da vida, é necessário fé, força de vontade
para modificar um panorama desvantajoso. Tento força, o destino gira em uma direção
favorável.
O próximo passo na jornada do Louco é a carta do Pendurado. É um momento de
incômodo, onde o Louco se pergunta sobre tudo o que tem vivido, aprendido, ensinado, e qual
o propósito desta jornada. Colocando alegoricamente de cabeça para baixo o Louco começa a
perceber o mundo por uma nova perspectiva, subindo mais um degrau na sua evolução e busca.
O Louco se transforma na Morte.
A carta da Morte, diferentemente do que alguns podem crer, não é uma alegoria sobre
o fim físico. A Morte simboliza o recomeço. É o momento em que o Louco está pronto para
repensar sua posição na jornada, repensar o próprio caminho percorrido até então. Questionar
o caminhar, as escolhas, os rumos, tudo isso é necessário para seguir em frente e adquirir a
Temperança.
O arcano da Temperança fala sobre os contrários. Luz e sombra são uma constante na
vida de qualquer indivíduo. Não há remédio ou veneno, é na intensidade das coisas que reside
a força de transformação, que opera segundo esta virtude. Compreender a intensidade, buscar
o equilíbrio, é disto que fala esta carta. E, uma vez detentor deste conhecimento, o Louco
assume a carta do diabo.
A carta número quinze fala de orgulho. O Louco pensa ter atingido o ápice do
conhecimento. Ele já passou por experiências de poder terrestre, já se viu sozinho, tomou as
rédeas de seu destino, ascendeu a um outro grau de consciência, sabendo dosar suas atitudes na
medida do equilíbrio. Isto o torna arrogante, seguro de si mesmo ao ponto de construir em torno
de si o próximo arcano, a Torre, a fortaleza de si mesmo.
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Contudo, todas as tradições humanas ensinam e professam a existência do Ser


supremo, o Criador, a Verdade, o Saber, o Tudo e vendo a arrogância do Louco, encastelado
no seu orgulho, Deus lança sua força sobre a Torre, que rui. O Louco então percebe que todo o
seu conhecimento é nada e é necessário humildade para continuar sua jornada. Tal como em
outros momentos de sua caminhada, o Louco busca uma transformação, a qual, diferente das
demais, vem mesmo de um contato com o Ser, com o infinito, o que permite ao Louco
abandonar as ruínas de um conhecimento passado e se tornar a Estrela.
Esta carta simboliza a luz que guia os homens no caminho da Verdade. Esta luz é uma
força sobre-humana e ele então compreende não ser possível que os homens se guiem a si
mesmos. O conhecimento não é expressão somente de verdades materiais, acessíveis pela
experiência sensível. O caminho do Louco passa a ser iluminado desde cima, por uma Força
suprema que lhe garante uma direção além do mundas experiências deste plano.
Iluminado em seu caminho, o próximo arcano a ser atingido é a Lua. O Louco se vê
rodeado pelos mistérios desta carta. Há novamente a ideia dos opostos, de um lado claro e um
escuro. É uma carta magnética, capaz de mudar coisas na Terra, como as marés e os ciclos das
mulheres. Neste momento, o Louco percebe que se ele puder explicar esta força para as pessoas
ele pode seguir com a sua jornada mostrando a todos que existem forças maiores e superiores
aos homens.
Passado este estágio, o Louco assume o signo do Sol. A décima nona carta do tarô,
simboliza uma força ainda mais, não atoa, sociedades antigas das mais diversas adoravam o sol.
Esta luz ainda maior guia as vidas, o horário de trabalho, os festejos, a própria marcação do
tempo. É a carta símbolo, portanto, de um poder além de qualquer controle humano, que não
pode ser subjugado.
Mais uma vez assimilando o conhecimento dos arcanos em sua jornada, o Louco se
torna a carta do Julgamento, momento em onde ele se encontra pronto para responder por toda
sua jornada. As escolhas feitas e não feitas. A adesão as ideias, as paixões, desilusões. A recusa
da Verdade, enfim, aquilo que cada pessoa percorreu em sua jornada lhe será posto em revista.
Não em um sentido de punição, mas como uma anamnese interior em busca de um diagnóstico
de tudo que se sucedeu até então.
Por fim, o Louco assume a carta do mundo, quando, após toda sua jornada ele encontra
o seu lugar no mundo, encontra o lugar onde tudo o que viveu se materializa e se reveste de
significado. É quando o ser tem consciência do seu propósito como indivíduo, como espécie,
como parte de um conjunto universal harmônico, maior, que o abarca e o transcende. O Louco,
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tomado das verdades, humilde em reconhecer-se como apenas um mortal, não mais tendo nada
a alcançar, volta a ser o bobo da corte, o Louco, para reiniciar nova jornada, nova vida.
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3. CONCLUSÃO

Como bem se demonstrou no decurso desde trabalho, o tarô, mais do somente um jogo
de cartas ou um microssistema de adivinhação que se daria por meio de um esquema pré-
ordenado (ou não) de interpretações, trata-se mesmo de uma ciência hoje escanteada pela
moderna percepção de mundo amparada pelo cartesianismo e pela reprodução do conhecimento
empírico/experimental.
O tarô, complexo como forma de expressão do conhecimento simbólico de várias
épocas, sintetiza em suas cartas conceitos existentes em todas as sociedades humanas, desde
aquelas associadas a vida terrestre, quanto também a busca de uma iluminação ou um estado
transcendente de existência.
Estas palavras, por si já garantiam o caráter filosófico da arte da cartomancia, mas pelo
que se viu, pode-se ir além, Ainda que os estudos historiográficos apresentados deem lastro
para consignar a prática cartomante a partir do final da Idade Média, a própria simbologia dos
Arcanos Maiores do tarô indicam que sua filosofia, tal como preconizado nos verbetes
disponíveis ao seus estudo em apartado da cartomancia, é muito mais antiga e sua interpretação
se associa aos conhecimentos humanos acumulados gerando uma síntese capaz de espelhar os
estados presentes da condição dos homens.
Tanto mais, sempre haverá fontes de saberes que destoam do meio dominante. E; se
até a modernidade o tarô era combatido como ciência oculta associada ao diabo ou forças
malignas e hoje continua a ser visto sob olhares suspeitos por não carregar em si um método
científico tal como as tidas ciências vigentes; isto serve como medida para aprofundamento na
filosofia do tarô, uma vez que haverão de passar os dias e com o evoluir das consciências, aquilo
que outrora foi combatido e hoje é relegado, haverá de compor o panteão do conhecimento
integral.
Como se viu pela análise da Jornada do Louco, o tarô traz uma análise filosófica da
vida humana, suas mazelas, fraquezas, paixões, virtudes, vitórias e derrotas. O lugar de cada
pessoa dentro desta jornada depende das experiências de cada indivíduo e do seu grau de
comprometimento em superar ou abandonar hábitos e costumes.
A busca pelo conhecimento, assim, abarca todas as pessoas, cada qual em sua forma,
cada qual em sua essência. A cartomancia e o tarô, podem e devem ser considerados na busca
desse eu interior, não acessível ao mundo puramente material.
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A pretexto da Filosofia do tarô, após uma apresentação histórica e introdutória, fez-se


uma interpretação pessoal da Jornada do Louco, para demonstrar a grandeza dos signos que
cada carta dos Arcanos maiores detém em si. O eterno retorno, a consciência das formas, a
intuição, o processo de ensino-aprendizagem, a necessidade daquele que busca o conhecimento
de muitas vezes se isolar em busca de uma sabedoria maior, todo esse material de cunho
filosófico e metafísico pode ser aprendido dentro do esquema cartomante do tarô.
A própria Jornada do Louco é, por si, um sistema de interpretação da realidade humana
e do sentido que cada indivíduo dá a sua vida, garantindo ao tarô o status de ciência filosófica.
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4. REFERÊNCIAS

BANZHAF, H. Manual do Tarô – Origens, definições e instruções para o uso do Tarô. São
Paulo: Editora Pensamento, 1991.

BÍBLIA SAGRADA. Tradução João Ferreira de Almeida. 2ª ed. Barueri/SP: Sociedade


bíblica do Brasil, 1988.

BERTI, G. O Tarô Sola-Busca emana um autêntico mistério. 2021. Disponível em: <
http://www.clubedotaro.com.br/site/h23_15_Sola_Busca.asp>. Acesso em 10 de jul. 2021.

COLLIN DE PLANCY, J. Dicionário Infernal. São Paulo: Edusp, 2019.

DOS SANTOS, M. F. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3ª ed. São Paulo: Editora
Matese, 1966.

HOUDOUIN, W. O Código Sagrado do Tarô. São Paulo: Editora Pensamento, 2014.

LÉVI, E. A Chave dos Grandes Mistérios. São Paulo: Editora Pensamento, 1996.

PAPUS. Tratado de Ciências Ocultas. Vol. 1. São Paulo: Editora Três, 1973.

SCHUON, F. Da Unidade Transcendente das Religiões. São Paulo: Livraria Martins Editora,
1953.

______. Raízes da Condição Humana. São José dos Campos/SP: Editora Kalon, 2014.

SMITH, W. A Sabedoria da antiga Cosmologia. Campinas/SP: Vide Editorial, 2017.

WEBER, C. A Arte de Ler o Tarô para Si Mesmo. São Paulo: Editora Pensamento, 2020.

WIGINGTON, P. A Brief History of Tarot. 2018. Disponível em: <https://www.learnreligi


ons.com/a -brief-history-of-tarot-2562770>. Acesso em 07 de jul. 2021.

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