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GERMINAÇÃO

G374 Germinação [recurso eletrônico] : do básico ao aplicado /


organizado por Alfredo Gui Ferreira e Fabian Borghetti. –
Dados eletrônicos. – Porto Alegre : Artmed, 2008.

Editado também como livro impresso em 2004.


ISBN 978-85-363-1648-2

1. Botânica – Germinação. I. Ferreira, Alfredo Gui. II.


Borghetti, Fabian.

CDU 581.142

Catalogação na publicação: Renata de Souza Borges CRB-10/Prov-021/08


Reimpressão

2004
© Artmed Editora S.A., 2004

Capa: Gustavo Macri


Preparação de originais: Cristiane Marques Machado
Leitura final: Priscila Michel Porcher
Supervisão editorial: Cláudia Bittencourt
Projeto gráfico e editoração eletrônica: TIPOS design gráfico editorial

Reservados todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, à


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IMPRESSO NO BRASIL
PRINTED IN BRAZIL
AUTORES

Alfredo Gui Ferreira – Doutor em Ciências pela Felipe Pimentel Lopes de Melo – Biólogo. Mes-
Universidade de São Paulo, com pós-doutorado no tre em Biologia Vegetal pela Universidade Federal
WPC – New Jersey – USA. Professor titular aposenta- de Pernambuco.
do da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
professor associado sênior da Universidade de Bra- Francisco Amaral Villela – Doutor em Agrono-
sília. Bolsista de Produtividade do CNPq – nível 1. mia pela Universidade Estadual de São Paulo. Profes-
sor adjunto do Departamento de Fitotecnia, Univer-
Fabian Borghetti – Doutor em Biologia Molecular sidade Federal de Pelotas.
pela Universidade de Brasília. Professor adjunto do
Departamento de Botânica da Universidade de Bra- Henk W. M. Hilhorst – Doutor em Biologia de
sília. Sementes pela Wageningen University and Research
Center. Professor adjunto, líder do Grupo de Biologia
de Sementes, Departamento de Fisiologia de Plantas,
Wageningen University and Research Center.
Alfredo Elio Cocucci – Doutor em Ciências Natu-
rais, Especialidade Biologia, pela Universidade Na- Henrique Pessoa dos Santos – Doutor em Bio-
cional de Córdoba. Professor emérito da Universida- logia Vegetal pela Unicamp. Pesquisador da Embrapa
de Nacional de Córdoba, Argentina. Uva e Vinho.

Antônio Venceslau de Aguiar Neto – Biólogo. Jarcilene Silva de Almeida-Cortez – Doutora


Aluno do Programa de Pós-Graduação em Biologia em Biologia (Ecologia Vegetal) pela Université de
Vegetal da Universidade Federal de Pernambuco. Sherbrooke – Canadá. Professora adjunta do Depar-
tamento de Botânica, Universidade Federal de Per-
Claudio J. Barbedo – Doutor em Agronomia pela nambuco.
Universidade de São Paulo. Pesquisador científico
5, Seção de Sementes, Instituto de Botânica de São Jorge Ernesto de Araujo Mariath – Doutor
Paulo. em Ciências pela Universidade de São Paulo. Profes-
sor titular do Departamento de Botânica, Universi-
Denise Garcia de Santana – Doutora em Esta- dade Federal do Rio Grande do Sul.
tística e Experimentação Agronômica pela Escola
Superior de Agricultura Luiz de Queiroz – USP. Pro- Kent J. Bradford – Doutor em Fisiologia de Plan-
fessora adjunta do Instituto de Ciências Agrárias, tas pela University of California – Davis. Professor
Universidade Federal de Uberlândia. titular do Department of Vegetable Crops. Diretor
do Seed Biotecnology Center, University of California
Eliana Akie Simabukuro – Doutora em Biologia – Davis.
Vegetal pela Universidade Estadual de Campinas.
Professora adjunta I do Departamento de Botânica, Lilian B.P. Zaidan – Doutora em Ciências pela
Universidade Federal de Pernambuco. Universidade Estadual de Campinas. Pesquisadora
científica 6, Seção de Fisiologia e Bioquímica, Institu-
Fatima Conceição Márquez Piña-Rodrigues to de Botânica de São Paulo.
– Doutora em Ciências pela Universidade Estadual
de Campinas. Professora adjunta da Universidade Marcelo Tabarelli – Doutor em Ecologia de Ecos-
Federal Rural do Rio de Janeiro. sistemas Terrestres e Aquáticos pela Universidade
6
vi FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)
AUTORES

de São Paulo. Professor adjunto II do Departamento adjunta do Departamento de Botânica da Universi-


de Botânica, Universidade Federal de Pernambuco. dade Federal do Rio Grande do Sul.

Márcia Balistiero Figliolia – Mestra em Ciências Marli A. Ranal – Doutora em Ciências pela Univer-
Florestais pela Universidade de São Paulo. Pesquisa- sidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho –
dora científica, MsC., Instituto Florestal de São Paulo. UNESP. Professora titular do Instituto de Biologia,
Universidade Federal de Uberlândia.
Marco Aurélio Silva Tiné – Doutor em Biologia
Celular pela Unicamp. Pós-doutorando do Instituto Renato Delmondez de Castro – Doutor em Fi-
de Botânica de São Paulo, Seção de Fisiologia e Bio- siologia de Plantas/Sementes pela Wageningen Uni-
química de Plantas. versity and Research Center. Pesquisador do Labora-
tório de Estudos em Meio Ambiente, Universidade
Marcos Pereira Marinho Aidar – Doutor em Católica do Salvador – Bahia.
Biologia Vegetal pela Unicamp. Biólogo da CETESB
em atividade no Instituto de Botânica de São Paulo, Sonia Cristina Juliano Gualtieri de Andrade
Seção de Fisiologia e Bioquímica de Plantas. Perez – Doutora em Ciências pela Universidade Fede-
ral de São Carlos. Professora adjunta do Departamento
Marcos Silveira Buckeridge – PhD Plant Bio- de Botânica, Universidade Federal de São Carlos.
chemistry pela University of Stirling – Escócia. Pes-
quisador científico VI do Instituto de Botânica de Victor José Mendes Cardoso – Livre-docente
São Paulo, Seção de Fisiologia e Bioquímica de Plan- em Fisiologia Vegetal pela Universidade Estadual Pau-
tas. lista. Professor adjunto do Departamento de Botânica,
Instituto de Biociências, Universidade Estadual Paulista
Maria Célia Peixoto – Engenheira florestal, Uni- “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Rio Claro.
versidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Técnica
de nível superior da Universidade Federal Rural do Wolmer Brod Peres – Doutor em Ciência e Tec-
Rio de Janeiro. nologia de Sementes pela Faculdade de Agronomia
“Eliseu Maciel”. Professor adjunto do Departamento
Maria Estefânia Alves Aqüila – Doutora em de Engenharia Agrícola, Universidade Federal de Pe-
Ciências pela Universidade de São Paulo. Professora lotas.
GERMINAÇÃO 7

Este livro dedicamos in memoriam de


Luiz Fernando Gouvêa Labouriau –
grande cientista e pesquisador da fisiologia
das sementes.
PREFÁCIO

Um grupo de estudiosos, liderado pelo entusias- compêndio apresentaram a proposta de produ-


mo do grande cientista L.G. Labouriau, costu- zir um livro de germinação. Argumentou-se
mava se reunir espontaneamente durante os que, embora existissem algumas obras publi-
congressos de botânica e de fisiologia vegetal cadas sobre germinação de sementes relativa-
para ouvi-lo dissertar sobre fisiologia das se- mente recentes, elas tratavam o tema sob um
mentes, termodinâmica da germinação e as- ponto de vista aplicado ou tecnológico. Um livro
suntos relacionados. Durante esses encontros nacional sobre germinação sob um ponto de
surgiu a idéia de criar um grupo voltado a discu- vista básico, a exemplo daquele escrito pelo
tir o tema germinação. Como a Sociedade Botâ- Prof. Labouriau, publicado em 1983 e já esgota-
nica do Brasil (SBB) possibilita e até incentiva do, não se encontrava no mercado. Necessitava-
a formação de grupos que tratem de temas es- se de uma obra atualizada, que abrangesse des-
pecializados no seio da sociedade, criou-se o de a formação do diásporo, mecanismos de con-
Núcleo de Especialistas em Germinação (NEG), trole da germinação, metabolismo, germinação
tendo como mote principal germinação de se- sob condições de laboratório e naturais, sem
mentes, esporos e outros propágulos. O mestre deixar de tratar sobre delineamento experimen-
Labouriau faleceu em 1996, entretanto, a idéia tal e aspectos tecnológicos. A idéia foi saudada
germinou e o NEG foi formalizado junto à SBB. com entusiasmo pelos participantes.
As reuniões iniciais, que tratavam de discu- A partir desse momento, passou-se a buscar
tir questões de germinação, tornaram-se cada apoio junto às editoras, e a Artmed acreditou
vez mais ambiciosas. Entre outras iniciativas, no projeto e entrou com sua competente equipe.
buscou-se a organização de um site onde pudes- Vários colaboradores de diferentes regiões do
sem ser encontradas citações de difícil acesso, Brasil foram convidados, buscando-se tornar a
trabalhos e resumos de congresso nem sempre lista de participantes bastante abrangente. Por
disponíveis aos leitores interessados. O endere- sua vez, os convidados tiveram a liberdade de
ço e as informações se encontram atualmente agregar outros colaboradores, entre estes, inclu-
na página da SBB/NEG. Ventilava-se, também, sive, autores estrangeiros. Este foi o caso do
a idéia de organizar um ou mais livros sobre Prof. Renato Castro, que preparou dois capítulos
germinação para estudantes e estudiosos, com em colaboração com H.W.M. Hilhorst e K.J.
uma linguagem clara e mais uniforme, visando Bradford e, com isso, teve trabalho dobrado,
ao mesmo tempo aproveitar de uma forma oti- pois a cada momento devia traduzir o texto para
mizada os estudos em andamento no meio aca- o inglês a fim de discuti-lo com os co-autores,
dêmico e os parcos recursos disponíveis para a e depois vertê-lo para o português, para apre-
ciência brasileira. sentá-lo aos organizadores. Neste particular,
Graças ao empenho dos membros do nú- com E.A. Cocucci não houve tal dificuldade,
cleo, e especialmente da Dra. Marli A. Ranal e pois o mesmo possui um bom entendimento
da Dra. Denise Santana, foi promovido o pri- da língua portuguesa.
meiro Simpósio Nacional sobre Germinação, Outra preocupação tida foi que os autores
realizado em junho de 2002 em Uberlândia, Mi- buscassem sempre que possível citar trabalhos
nas Gerais. Na ocasião, os organizadores deste feitos com espécies nativas, ou largamente cul-
10
x FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)
PREFÁCIO

tivadas no Brasil, de forma que os leitores estu- de algumas instituições, como a Universidade
dantes pudessem reconhecer as plantas men- Federal do Rio Grande do Sul e a Universidade
cionadas. Neste particular, sugeriu-se que, sem- de Brasília (Instituto de Ciências Biológicas),
pre que possível, se incluísse o nome popular que prestigiaram nosso trabalho desde o início.
junto ao binômio científico. Finalmente, os Agradecemos em particular a bióloga Letícia
colaboradores tiveram a liberdade de expressar Nonnemacher Azzarini, pela ilustração no Capí-
suas idéias e opiniões e de utilizar termos cien- tulo 16. Lamentamos os convidados que não
tíficos discordantes, como endosperma e xenó- puderam colaborar por diferentes razões, ou
fito, glicose e glucose, que os leitores observarão aqueles que até se dispuseram a escrever um
ao longo dos capítulos, decidindo qual adotar. ou outro capítulo, mas não puderam viabilizar
Assim surgiu o presente livro, para atender a a tarefa.
uma demanda crescente no meio acadêmico. Embora esta obra seja uma realização cole-
Aproveitamos a oportunidade para agrade- tiva, pedimos excusas por eventuais erros que
cer aos colegas do NEG pelo incentivo à execu- possam ter ocorrido, e que venham a ser encon-
ção deste trabalho, aos colaboradores, que na trados por nossos atentos leitores. Estas falhas
sua maioria dedicaram-se prioritariamente a es- devem ser creditadas a nós, os organizadores.
crever um ou mais capítulos, e o apoio recebido A todos, nosso muito obrigado.

ALFREDO G. FERREIRA

FABIAN BORGHETTI
GERMINAÇÃO 11

SUMÁRIO

Parte 1 Formação do diásporo

1 Gametogênese, fecundação, seleção do gametófito


mais apto, embriogênese e diásporo maduro ..................... 15
Alfredo Elio Cocucci
Jorge Ernesto Araujo Mariath

2 Acúmulo de reservas ......................................................... 31


Marcos S. Buckeridge
Marcos P. M. Aidar
Henrique P. dos Santos
Marco Aurélio S. Tiné

3 Desenvolvimento de sementes e conteúdo de água ........... 51


Renato Delmondez de Castro
Kent J. Bradford
Henk W. M. Hilhorst

4 Tipos de diásporos e suas origens ..................................... 69


Maria Estefânia Alves Aqüila

Parte 2 Dormência

5 Dormência: estabelecimento do processo .......................... 95


Victor José Mendes Cardoso

6 Dormência embrionária .................................................... 109


Fabian Borghetti

7 Envoltórios ....................................................................... 125


Sonia Cristina Juliano Gualtieri de Andrade Perez

8 Quebra de dormência em sementes ................................. 135


Lilian B.P. Zaidan
Claudio J. Barbedo

Parte 3 Germinação

9 Embebição e reativação do metabolismo ......................... 149


Renato Delmondez de Castro
Kent J. Bradford
Henk W.M. Hilhorst
12 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)
SUMÁRIO

10 Mobilização de reservas ................................................... 163


Marcos S. Buckeridge
Henrique P. dos Santos
Marco Aurélio S. Tiné
Marcos P.M. Aidar

Parte 4 Abordagem experimental

11 Delineamento experimental .............................................. 189


Marli A. Ranal
Denise Garcia de Santana

12 Análise estatística ............................................................ 197


Denise Garcia de Santana
Marli A. Ranal

13 Interpretação de resultados de germinação ...................... 209


Fabian Borghetti
Alfredo Gui Ferreira

Parte 5 Ecologia de regeneração

14 Dispersão e banco de sementes ....................................... 225


Jarcilene S. de Almeida-Cortez

15 Recrutamento e estabelecimento de plântulas ................. 237


Felipe Pimentel Lopes de Melo
Antônio Venceslau de Aguiar Neto
Eliana Akie Simabukuro
Marcelo Tabarelli

16 Interferência: competição e alelopatia .............................. 251


Alfredo Gui Ferreira

Parte 6 Tecnologia de sementes

17 Coleta, beneficiamento e armazenamento ........................ 265


Francisco Amaral Villela
Wolmer Brod Peres

18 Testes de qualidade ......................................................... 283


Fatima C. Márquez Piña-Rodrigues
Márcia Balistiero Figliolia
Maria Célia Peixoto

Glossário .................................................................................. 299

Índice ....................................................................................... 317


PA R T E 1

FORMAÇÃO
DO DIÁSPORO
C A P Í T U L O 1

GAMETOGÊNESE, FECUNDAÇÃO,
SELEÇÃO DO GAMETÓFITO
MAIS APTO, EMBRIOGÊNESE
E DIÁSPORO MADURO
Alfredo Elio Cocucci
Jorge Ernesto Araujo Mariath

Para compreender a gametogênese, a fecunda- ção gametofítica: as pteridófitas isospo-


ção e a embriogênese, é imprescindível consi- radas possuem gametófitos hermafrodi-
derar esses fenômenos à luz da interação entre tas, multicelulares, autotróficos, nutri-
o esporófito e o gametófito, característica das cionalmente independentes dos esporó-
plantas vasculares cuja geração dominante, no fitos (Filicales, Lycopodiales, etc.).
espaço e no tempo, é o esporófito. w A evolução das plantas vasculares em di-
Em 1851, Hofmeister dá a conhecer a al- reção à heterosporia estabelece o caráter
ternância de gerações nos ciclos biológicos de unissexual dos gametófitos para todas
musgos, samambaias, gimnospermas e angios- as plantas com sementes: essa condição
permas, tornando perfeitamente estabelecido varia nas pteridófitas heterosporadas e
os seguintes fatos fundamentais, a saber: as nas demais plantas vasculares, nas quais
plantas vasculares exibem uma marcada ten- os gametófitos tendem a ser paucicelu-
dência à simplificação da geração gametofítica; lares, tornando-se nutricionalmente de-
a evolução das plantas vasculares em direção à pendentes dos esporófitos.
heterosporia estabelece o caráter unissexual dos w As gerações gametofíticas de todas as
gametófitos para todas as plantas com semen- plantas com sementes passam a ser nu-
tes; as gerações gametofíticas de todas as plan- tricionalmente esporófito-dependentes,
tas com sementes passam a ser nutricionalmen- isto é, adquirem a condição parasítica: a
te esporófito-dependentes, isto é, adquirem a aparição da heterosporia implica a mu-
condição parasítica; a condição parasítica dos dança evolutiva do hermafroditismo à
gametófitos acarreta um alto grau de interação unissexualidade. Trata-se do estabeleci-
com a geração hospedeira, o esporófito (Figura mento de sexos separados em todas as
1.1). plantas com sementes. Paralelamente a
A seguir, fundamentaremos cada um dos esse importantíssimo evento da unisse-
fatos enumerados anteriormente (para maior xualidade, manifesta-se uma marcada
detalhamento, recomenda-se a leitura de Co- tendência à redução do número de célu-
cucci [1973] e Cocucci e Mariath [1995]): las vegetativas, o que permite o desen-
volvimento endospórico dos gametófitos
w As plantas vasculares exibem uma mar- em ambientes aquáticos, com a vanta-
cada tendência à simplificação da gera- gem óbvia de ter se protegido dos agen-
16 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Período anterior Novo período

ANDRÓFITO

GINÓFITO

ESPORÓFITO GAMETÓFITO ESPORÓFITO

XENÓFITO

 Figura 1.1
Diagrama esquemático das três gerações que integram o ciclo vital das angiospermas, em função do tempo.
As gerações foram representadas separadamente para evitar a confusão que surge pelo fato de todas elas se
desenvolverem dentro do âmbito do esporófito. A área listrada indica o xenófito (endosperma); a cinza, o
esporófito; e o desenho tracejado sobre o fundo branco, os gametófitos.

tes físicos externos pela esporoderme. As mais antigos e menos adequados, embora ain-
condições estão criadas para que, poste- da muito difundidos. As setas indicam “dão ori-
riormente, ocorra o desenvolvimento in- gem”, ou seja, o que eles produzem):
tra-esporangial e, eventualmente, se ad-
w Androsporângio (saco polínico) → an-
quira a condição parasítica típica das
drósporo (micrósporo, grão de pólen uni-
plantas com sementes.
nucleado) → andrófito (gametófito mascu-
w Devido à condição parasítica dos game-
lino, microgametófito, grão de pólen 2 ou 3-
tófitos, existe um alto grau de interação
nucleado) → anterozóides (gametas mas-
com a geração hospedeira, o esporófito:
culinos flagelados) ou gametas (gametas
o parasitismo dos gametófitos, usando
masculinos aflagelados), segundo o caso.
como hospedeiro o esporófito de sua
mesma espécie, converte-se em fator de w Ginosporângio (nucelo) → ginósporo
pressão evolutiva que atua de maneira (megásporo, saco embrionário uninucleado)
distinta segundo o caráter sexual de cada → ginófito (gametófito feminino, megaga-
um. metófito, saco embrionário maduro) →
oosfera esporofítica (oosfera, gameta fe-
No texto a seguir adotou-se, em geral, a ter- minino) e oosfera xenofítica (célula mé-
minologia proposta por Battaglia (1982), por dia, núcleo secundário), segundo o caso.
considerá-la mais adequada, mais simples e
coerente. Esta, em resumo, é como segue (em Os andrófitos das plantas com sementes se
negrito, estão os termos mais adequados; entre desenvolvem a partir de andrósporos haplóides
parênteses e em itálico, indicam-se os termos formados por meiose no interior dos andros-
GERMINAÇÃO 17

porângios dos estames. Em tais condições, ini- atividade lítica agressiva, aproveitando os teci-
cia-se o desenvolvimento do andrófito com a dos circundantes como fonte nutritiva.
primeira divisão mitótica formando um núme- O ginosporângio indeiscente se conserva,
ro reduzido de células protálicas (pteridófitas em grande parte, meristemático, crescendo por
heterospóricas e gimnospermas) ou apenas um lado enquanto é digerido pelo outro, por
uma célula vegetativa e uma célula-mãe dos conta do ginófito em desenvolvimento e, logo
gametas masculinos (angiospermas). Nessas a seguir, pelo embrião esporofítico, e pelo xe-
condições de desenvolvimento, pode ocorrer a nófito (endosperma), no caso das angiosper-
antese, e o pólen, contendo andrófitos em graus mas. Geralmente, o ginosporângio (nucelo) é
distintos de desenvolvimento, dependendo da totalmente consumido, embora, às vezes, per-
espécie, abandona o esporângio que lhe nutriu maneça um resquício convertido em tecido de
e é disperso, podendo ocorrer a polinização. reserva (perisperma) (para maiores detalhes,
Transportado a uma gota de polinização nas gim- ver Capítulo 4).
nospermas ou a um estigma receptivo nas an- O gineceu, verticilo floral que contém os
giospermas, renova seu desenvolvimento nutrin- rudimentos seminais (óvulos) com seu respec-
do-se dos tecidos esporofíticos de seu entorno. tivo ginosporângio, desenvolve uma série de es-
A pressão seletiva dos andrófitos atua de truturas especiais que garantem a fecundação.
maneira que as flores dos esporófitos têm ex- Estruturas como estigma, estilete, tecido trans-
perimentado mudanças graduais em associação missor e compito constituem especializações
com outros fatores externos de pressão evolu- que permitem o desenvolvimento parasítico do
tiva (interação entre agentes físicos externos e andrófito, determinando a trajetória segura
animais), de modo a desenvolver variadas es- para que ocorram o acoplamento, a cópula e a
truturas relacionadas à polinização. A conserva- singamia.
ção da parede especializada dos grãos de pólen
com suas múltiplas funções de adaptação aos
agentes polinizadores e à proteção contra os GAMETOGÊNESE
agentes físicos externos (seca, radiação UV, ação Devido ao caráter unissexual dos gametófitos
mecânica, etc.) constitui um fator relevante das plantas com sementes, derivado da especia-
para a sobrevivência do andrófito em seu deslo- lização manifestada na heterosporia, a andro-
camento do androsporângio até a estrutura re- gênese e a ginogênese serão consideradas sepa-
ceptiva. radamente.
Os ginófitos, diferentemente dos andrófi-
tos, se desenvolvem no seio de um esporângio Androgênese
muito particular, visto que exibe características A meiose que origina os andrósporos esta-
neotênicas, isto é, adquire maturidade repro- belece a condição haplóide de todas as células
dutiva ainda em estado meristemático. Produto que integram o andrófito, se considerarmos
do desenvolvimento, em geral, de um dos qua- tanto as células vegetativas como os gametas.
tro esporos resultantes da meiose em cada ru- Tal condição, como veremos mais adiante, não
dimento seminal, os ginósporos nunca aban- é compartilhada pela maioria dos ginófitos das
donam o esporângio, pois não diferenciam es- angiospermas. O número de células vegetativas
truturas que permitam sua deiscência. Os gi- nas plantas com sementes é variável, de 5 a 10
nósporos cuja diferenciação e cujo ulterior de- nas gimnospermas a apenas uma nas angios-
senvolvimento se dão no seio do ginosporângio permas. Seja como for, sempre se diferencia
já não necessitam de uma esporoderme tão es- uma célula como a responsável pela formação
pecializada como no caso dos andrófitos, de mo- do tubo polínico; se ocorrer mais de uma, as
do que essa estrutura não se diferencia. Porém, restantes alcançam um desenvolvimento muito
em seu lugar, os ginósporos desenvolvem uma limitado.
18 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Apenas duas ordens atuais de plantas com em um verdadeiro mosaico genético. Esses ti-
sementes formam gametas flagelados, Cycada- pos especiais de estruturas têm conseqüências
les e Ginkgoales. Trata-se de anterozóides piri- muito particulares, pois a dupla fecundação das
formes com um núcleo basal e uma coroa de angiospermas pode produzir um embrião espo-
flagelos na cúspide cônica da célula. Todas as rofítico com uma composição genética qualita-
demais plantas com sementes possuem células tivamente distinta do endosperma ou xenófito.
gaméticas aflageladas, os gametas. Estes exi- Isso pode provocar reações de incompatibilida-
bem uma variada gama de especializações ul- de que frustram a formação de sementes nor-
tra-estruturais, como proplastídios, promito- mais.
côndrios, dictiossomos, microtúbulos e, em de-
terminados casos, microfilamentos intranu-
cleares (Cocucci, 1988). Ainda é prematuro FECUNDAÇÃO
avançar em generalizações com implicações ta- Nas plantas com sementes, o fenômeno sexual
xonômicas; porém, o fato é que pouco se conhe- é um processo complexo, sujeito a situações
ce sobre esses aspectos, e tudo indica que a aleatórias que atuam como agentes de pressão
variabilidade ultra-estrutural e o comportamen- seletiva; estes conduzem a um espectro varia-
to dos gametas quanto à sua mobilidade são do de processos fisiológicos e mecânicos, com
mais diversos do que se podia imaginar. o objetivo de uma maior eficiência para a con-
Existem gametas que carecem de organelas cretização do ato sexual. Na consecução deste
citoplasmáticas de dupla membrana e DNA ato, distinguimos as quatro etapas que seguem:
próprio, de modo que, do ponto de vista da he- polinização, acoplamento, cópula e singamia
rança citoplasmática, sua contribuição é nula. (Figura 1.2).
Por outro lado, se os gametas são providos de
tais organelas, essa presença indica que pode Polinização
ocorrer uma contribuição masculina na herança A aproximação dos andrófitos com os ginó-
citoplasmática. fitos pode ser comparada a uma viagem de ris-
co, em que, dependendo de uma série de situa-
Ginogênese ções perigosas, o azar é um fator muito freqüen-
A meiose que origina os ginósporos apre- te. Isso é particularmente válido nos casos de
senta certas particularidades que não se obser- polinização cruzada (método preferido pela na-
vam na formação dos andrósporos. De fato, na tureza), mas nem tanto nos de autopolinização
maioria dos casos, a cariocinese meiótica é se- em espécies autocompatíveis.
guida por uma citocinese, resultando na forma- Os andrófitos abandonam os esporângios
ção de quatro células com o complemento ha- de origem sujeitos à ação de agentes físicos e
plóide de cromossomos. Tais núcleos, mesmo biológicos. A polinização por agentes físicos, ar
sendo todos haplóides, não são idênticos devido e água, é a mais onerosa para as plantas do pon-
ao intercâmbio genético operado durante a si- to de vista energético, pois acarreta uma perda
napse e a diacinese. Essas características ge- enorme de andrófitos que nunca alcançarão seu
nômicas são importantes de se ter em conta objetivo. A polinização por agentes biológicos,
em outros casos de formação de ginósporos, nos como insetos e mamíferos, é a mais especiali-
quais as cariocineses mitóticas não estão acom- zada e a menos onerosa do ponto de vista ener-
panhadas pelas respectivas citocineses, dando gético. Esse tipo de polinização implica a co-
lugar a cenócitos binucleados ou tetranuclea- evolução entre esporófito e agente polinizador,
dos, próprios dos ginófitos denominados de ori- de tal forma que são selecionadas estruturas
gem bispórica ou tetraspórica. Em geral, tais especiais no esporófito responsáveis por atrair
estruturas funcionam como uma unidade es- os agentes e captar o pólen para depositá-lo em
pórica, dando origem a ginófitos que resultam locais precisos, com o menor risco de perda.
GERMINAÇÃO 19

Meiose

Acoplamento

Polinização

Cópula

Singamia

Diásporo

 Figura 1.2
Ciclo biológico de Stenorhynchus demonstrando as cinco etapas da fecundação. Desenho em fundo negro
representa o esporófito; linha sobre o fundo branco evidencia os gametófitos.

Cumprida essa etapa, essas operações de Acoplamento


polinização podem não ser exitosas caso ocor- Com o estabelecimento de um grão de pó-
ram, na interface pólen/estigma, reações de in- len sobre o estigma receptivo compatível, ini-
compatibilidade esporofítica que possa frustrar cia-se a fase do acoplamento, isto é, o desen-
o desenvolvimento normal do tubo polínico. volvimento do tubo polínico, a cargo da célula
Tais reações tendem a prevenir a endogamia sifonogênica, até o contato com o aparelho fi-
ou a reduzir as possibilidades de hibridação. brilar do ginófito. Esse tubo se desenvolve em
20 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

associação com o tecido transmissor do estilete, da compatibilidade gametofítica; esse fenôme-


às vezes, até o próprio seio do ovário, nas pro- no é muito distinto da reação ao grão de pólen
ximidades dos rudimentos seminais. Existem sobre o estigma, visto que, nesse caso, o sistema
dois tipos genéricos de tecido transmissor: os de compatibilidade é gerado pelo esporófito.
secretores e os sólidos. Se a reação é compatível, o tubo polínico
Os tecidos transmissores secretores corres- rompe a barreira e a cópula se realiza mediante
pondem aos estiletes ocos, de modo que o canal a formação do tubo copulador. O comportamen-
é ocupado por uma secreção mucilaginosa que to desse tubo varia dependendo da espécie; em
contém aminoácidos e carboidratos. Essa secre- algumas, o tubo se abre apenas no contato com
ção é o meio pelo qual o tubo polínico crescerá a plasmalema da sinérgide, na qual descarrega
incorporando os nutrientes necessários para o uma boa parte do citoplasma, o núcleo da célula
seu desenvolvimento normal. vegetativa e os dois gametas (Cocucci, 1981);
Os tecidos transmissores sólidos são consti- em outras espécies (Cocucci e Venturelli, 1984),
tuídos por células especializadas, às vezes com- o tubo atravessa a sinérgide e continua cres-
preendendo paredes mucilaginosas ricas em cendo até se aproximar da oosfera e do núcleo
açúcares solúveis que constituem o meio pelo secundário (Figura 1.3). Seja como for, o con-
qual os tubos polínicos se deslocam, sem utili- tato entre os citoplasmas do tubo e a sinérgide
zação do protoplasto das células. Isso se deve sofre alterações muito profundas (Figura 1.4).
ao programa genético desses tubos, que não tem Tais alterações consistem na desagregação de
um sistema capaz de produzir enzimas líticas, todos os sistemas de membranas; os fosfolipí-
uma vez que o meio no qual se deslocam possui deos constituintes da bicamada perdem a coe-
per se os nutrientes solúveis à sua disposição. são que caracteriza esse mosaico semifluido, e
Em outros casos, as células desse tecido seus componentes se difundem homogenea-
acumulam reservas em forma de amido, que mente no âmbito celular. Em tal estado, o con-
sofrem lise, e os produtos de sua desintegração teúdo celular se converte em um meio semi-
são incorporados pelos tubos polínicos; esse tipo fluido onde não existem barreiras físicas que
de tubo, diferentemente do caso anterior, possui impeçam o deslocamento dos gametas. Con-
um sistema produtor de enzimas muito ativo, vém destacar que nem os gametas, nem a oos-
no qual são sintetizadas pectinases, celulases, fera ou a célula média, em íntimo contato com
amilases e proteases. esses restos celulares, são afetados. Por isso, se
Durante a primeira fase de desenvolvimen- infere que devem possuir um sistema de prote-
to do tubo polínico, predomina a função fágica; ção que lhes confira imunidade perante tais
porém, nas proximidades do aparelho fibrilar conseqüências catastróficas.
das sinérgides ou da oosfera, no caso em que O aparelho fibrilar é uma especialização da
faltem as sinérgides, entram em ação ferormô- parede celular, constituída pelo nítido engros-
nios que se difundem da estrutura pecto-hemi- samento da mesma pelo aporte de substâncias
celulósica do aparelho fibrilar e, em menor con- pécticas e hemicelulose, polímeros estes que
centração, das células vizinhas. Ocorre, então, formam cadeias relativamente curtas. Essa es-
o contato entre o tubo e o aparelho fibrilar, dan- pecialização da parede tem a propriedade de
do lugar à reação de reconhecimento. Tal reação reter fortemente a água e solutos que incluem
permitirá ou não a penetração do ginófito, con- aminoácidos, açúcares simples e ferormônios.
cluindo a etapa do acoplamento. A interface plasmalema-aparelho fibrilar com-
preende uma ampla superfície que se estende
Cópula ao longo de processos digitiformes que contri-
O acesso ao interior do ginófito somente buem para aumentar, em grandes proporções, a
será possível se a reação de reconhecimento for superfície de contato, a fim de permitir uma ma-
compatível. Trata-se de uma reação de compati- ciça transferência de materiais, particularmente
bilidade gerada pelo ginófito, sendo denomina- ferormônios, para a região do aparelho fibrilar
GERMINAÇÃO 21

Tp Tp Tp

Oo Oo

Tc
Tc

Cm Cm

A B C D

 Figura 1.3
Cópula em Strutanthus. (A) Vista frontal do aparelho oosférico e parte nucleada da célula média. (B-D) Vistas
laterais de A, porém em estádios progressivos de copulação. Abreviaturas: Cm, célula média; Oo, oosfera;
Tc, tubo copulador; Tp, tubo polínico.

em um tempo relativamente curto, correspon- w Cariogamia intermediária: O núcleo


dente ao período de receptividade do ginófito. gamético se associa ao da oosfera sem
penetrá-la, começa a incorporar cariolin-
Singamia fa, aumenta de tamanho, sem ultrapas-
O processo compreende a fusão dos cito- sar o da oosfera e começa a diferenciar
plasmas, a plasmogamia, e a fusão dos núcleos, um nucléolo menor do que o da oosfera;
a cariogamia. A plasmogamia tem conseqüên- apenas nesse momento ocorre a cario-
cias genéticas somente naqueles casos em que gamia. O resultado é um zigoto que, por
organelas celulares com DNA próprio, como um tempo, exibe dois nucléolos, um pe-
plastídios e mitocôndrias, pertencentes aos ga- queno, o masculino, e outro maior, o fe-
metas, se integram ao citoplasma oosférico. Tal minino (Figura 1.5).
situação não é freqüente em angiospermas. w Cariogamia pós-mitótica: Ocorre de
A cariogamia entre núcleos contra-sexua- tal maneira que o núcleo gamético incor-
dos apresenta três situações conhecidas (Ge- porado ao citoplasma oosférico não se
rasimova-Navashina, 1960), a saber: carioga- funde de imediato, passando por um pe-
mia pré-mitótica, cariogamia intermediária e ríodo em que reconstitui a cariolinfa e
cariogamia pós-mitótica. sintetiza unidades ribossômicas até
formar um nucléolo de tamanho equiva-
w Cariogamia pré-mitótica: O núcleo lente ao oosférico. Em tais condições de
gamético com o DNA extremamente igualdade morfológica, ambos os núcle-
condensado, desprovido de nucléolo e os recebem sinalização para mitose, e
com escassa cariolinfa se integra ao ci- ambas as cariotecas se desorganizam;
toplasma oosférico, se aproxima do nú- ocorre metáfase e anáfase; apenas na te-
cleo feminino e se incorpora ao mesmo lófase, durante a reconstrução da cario-
integrando seu genoma (Figura 1.5). teca zigótica, processa-se a integração de
22 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

i
e

f
g

 Figura 1.4
Esquema da organização ultra-estrutural de um ginófito pouco depois da cópula, visto do pólo micropilar: (a)
acoplamento do tubo polínico ao ginófito ou saco embrionário; (b) tubo copulador; (c) aparelho fibrilar; (d)
sinérgide não-penetrada; (e) célula média; (f) núcleos polares individualizados; (g) oosfera fecundada, evi-
denciando a cariogamia; (h) núcleo do tubo polínico; (i) núcleo da sinérgide penetrada; (j) sinérgide penetra-
da.

ambos os genomas e, por conseguinte, metas, embora essa peculiaridade não pareça
efetiva-se a cariogamia (Figura 1.5). ser universal.
Uma consideração especial merece a estru-
O segundo gameta masculino, que tem co- tura do gameta feminino-mãe do endosperma
mo destino o segundo gameta feminino do gi- (oosfera xenofítica ou endospérmica). O cito-
nófito, chamado de célula média devido à sua plasma deste gameta tão particular é vastíssi-
posição relativa, experimenta a plasmogamia mo, comparado com outras células do ginófito,
de modo semelhante à oosfera, na região estra- além de estar extremamente vacuolado e de seu
tégica onde convergem sinérgides, oosfera e cé- núcleo apresentar peculiaridades muito espe-
lula média. Existem algumas referências sobre ciais quanto ao grau de ploidia. De fato, em ca-
um possível dimorfismo dos gametas masculi- sos pouco freqüentes, o complemento cromos-
nos, indicativo de uma predestinação dos ga- sômico é haplóide; nos mais freqüentes, nos
GERMINAÇÃO 23

Pré-mitótica

Intermediária

Pós-mitótica

 Figura 1.5
Padrões de cariogamia zigótica. As séries pré-mitótica, intermediária e pós-mitótica demonstram diferentes
comportamentos do processo de cariogamia do núcleo do gameta masculino em relação ao da oosfera.

ginófitos tipo Polygonum, o complemento cro- SELEÇÃO DO GAMETÓFITO


mossômico é de 2n. Porém, ainda existem casos MAIS APTO
nos quais esse complemento é de 4n, 8n e 16n. Devido à condição parasita dos gametófitos, a
Se a esses valores se agrega o complemento n pressão seletiva do ambiente externo deixou de
dos gametas masculinos, deparamo-nos com o orbitar sobre essas estruturas, salvo no caso dos
núcleo desse zigoto particular com elevados andrófitos no período da polinização. Desse mo-
graus de ploidia. do, o ambiente interno do esporófito começou
Ao chegarmos a esse ponto, convém desta- a exercer outros condicionamentos, tais como
car que a poliploidia e a politenia são estratégias velocidade de crescimento, modo de orientação
comuns a muitos seres vivos para poderem ao objetivo, agressividade fágica, etc. Pouco se
produzir, em curto espaço de tempo, quantida- sabe a esse respeito, embora alguns exemplos
des maciças de uma mesma substância, tanto sirvam para chamar a atenção sobre esse inte-
proteínas enzimáticas como estruturais. ressante assunto que necessita ser mais bem
As modalidades de fusões dos núcleos são investigado.
variadas, tanto quanto aquelas observadas nas A seguir são apresentados três casos, siste-
oosferas que formarão embriões. Geralmente matizados com os seguintes títulos: milhares
se observam núcleos endospérmicos com tantos de pretendentes e somente quatro eleitos; an-
nucléolos quanto núcleos que se integraram, drófitos lentos e ginófitos com muita iniciativa;
mantendo sob uma mesma carioteca a indivi- os ginófitos não surgem se não há garantia de
dualidade dos genomas concorrentes. fecundação.
24 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Cálice
Corola
Androceu
Estigma
Tecido transmissor

 Figura 1.6
Seção longitudinal de uma flor de Ixorhea tschudiana (Heliotropiaceae) durante o processo da polinização.
Detalhe do estigma rodeado pelas anteras e do tubo corolínico que se estreita mais abaixo; grãos de pólen
germinados sobre os pêlos estigmáticos; tubos polínicos ascendendo pelas faixas periféricas do tecido trans-
missor e um deles descendo a coluna central (seta). Toda a estrutura rodeada pelo cálice. Fotomicrografia de
Di Fulvio (1980) e esquema dos autores. (Veja o esquema colorido na orelha deste livro.)
GERMINAÇÃO 25

w Milhares de pretendentes e somente


quatro eleitos: Na família Heliotropia-
ceae existem gêneros, como Ixorhea (Di
Fulvio, 1980), que possuem estigmas
muito elaborados (Figura 1.6), os quais
constituem um verdadeiro campo de
competição para os tubos polínicos. Esse
sistema se baseia em proporcionar uma
ampla superfície receptora para captar
milhares de grãos de pólen que come-
çam a transitar pelo tecido transmissor; A B
este, gradualmente, diminui sua super-
fície a ponto de permitir a passagem de
apenas quatro tubos polínicos, correspon-
dendo ao número de rudimentos semi-
nais que possui o ovário. Esses andrófitos
são mais fortes, mais rápidos e melhor
orientados que seus competidores. A mor-
fologia desses estigmas é a de um enorme
cone com o perímetro de sua base recepti-
va; o tecido transmissor sólido conecta to-
da a superfície receptiva e logo se estende
em direção à superfície cônica para ascen-
der até seu vértice; ali se encontra um ver-
dadeiro “gargalo de garrafa”, onde a pas-
sagem está limitada a apenas quatro -tu-
bos.
w Andrófitos lentos e ginófitos com muita
C D
iniciativa: Muitos gêneros na família Lo-
ranthaceae (ervas-de-passarinho) pos-  Figura 1.7
suem estiletes bastante longos e robus- Representação esquemática da seleção dos ginófitos
segundo o sistema de competição por disponibilidade
tos, apresentando um rico tecido trans-
de nutrientes. As áreas sombreadas representam o
missor amiláceo. Este é empregado não tecido nutritivo amilífero. (A e B) Seção longitudinal
pelos andrófitos, mas sim pelos ginófitos na interface estilete-ovário. (C e D) Seção longitudi-
que se insinuam dentro dele, até quase nal através do gineceu completo (A e B, Strutanthus;
chegar ao estigma (Figura 1.7). Ali espe- C e D, Tapinostema).
ram os andrófitos que têm apenas de su-
perar o estigma (Cocucci, 1990). Nesta
interface estilete-ovário, ocorrem algu- cundados. Efetuada a dupla fecundação,
mas variações quanto ao diâmetro do te- o zigoto endospérmico inicia seu descen-
cido transmissor nessa zona, de modo so até ingressar na cavidade ovariana;
que, nos gêneros em que esse diâmetro os zigotos embrionários se dividem in
é reduzido, apenas um ginófito pode pas- situ, primeiro longitudinalmente e, de-
sar: o de crescimento mais rápido. Em pois, transversalmente, dando lugar a
outros gêneros, o diâmetro é maior, de um suspensor bisseriado que cresce rapi-
modo que pode ingressar ao estilete um damente até chegar à cavidade ovariana.
bom número de ginófitos, que chegam Nessa tentativa, geralmente apenas um
(quase todos) ao estigma, sendo ali fe- chega primeiro, e de imediato se produz
26 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

uma ordem de abscisão na base do esti- muitas sementes desta família. A asso-
lete, eliminando, dessa maneira, todo ciação do pólen em polínias é um método
embrião que, por um motivo ou outro, que proporciona, durante a polinização,
não possa ingressar na cavidade ovaria- a chegada de abundantes grãos polínicos
na. Assim, encontra-se um método pelo para abastecer a demanda equivalente
qual se elege um em uma competição de ginófitos; uma polinização por poucos
entre muitos (Figura 1.8). grãos polínicos fracassaria o esforço re-
w Os ginófitos não surgem se não há ga- produtivo. Em espécies do gênero Epiden-
rantia de fecundação: Em Orchidaceae, drum (epidendro) observou-se (Cocucci
encontramos uma grande variedade de e Jensen, 1969) que, logo após a polini-
estruturas e sistemas muito especializa- zação, se produzem milhares de tubos
dos para garantir a fecundação dos mi- polínicos que se desenvolvem através de
lhares de ginófitos que produzem as um estilete oco, até as profundezas do
ovário, sem que, até esse momento, exis-
tam pelo menos rudimentos seminais.
São os andrófitos maduros que induzem
o desenvolvimento dos rudimentos se-
minais; eles esperam a ginosporogêne-
se, a formação do ginófito e a diferencia-
ção do aparelho fibrilar para, então, con-
cretizar a fecundação. Como o número
de andrófitos supera em abundância o
de ginófitos maduros, muitos morrem
virgens (Figura 1.9).

EMBRIOGÊNESE E
DIÁSPORO MADURO
Existe uma vasta literatura (Schnarf, 1931;
Wardlaw, 1955; Maheswari, 1950; Johri, 1984)
sobre as etapas da embriogênese, tendo-se reco-
nhecido tipos especiais conforme a seqüência
das divisões zigóticas e pós-zigóticas e a forma-
ção de um suspensor com diversos graus de es-
pecialização, que são característicos de diversas
taxas. Trata-se de um assunto muito extenso
em cujos detalhes não nos aprofundaremos, da-
da a natureza deste capítulo. Porém, conside-
raremos os fatores fisiológicos determinantes
dos estádios de desenvolvimento dos embriões
A B C
contidos nas sementes. Paralelamente, conside-
 Figura 1.8 raremos a origem das substâncias de reserva,
Representação esquemática de cortes longitudinais independentemente de sua natureza química
de gineceus de Loranthaceae que alojam vários gi-
nófitos no estilete. (A) fecundação; (B) desenvolvi-
(Capítulo 2).
mento descendente dos proembriões; (C) abscisão Reconhecem-se como fatores primordiais
do estilete promovida por um sinal químico gerado os seguintes: dormência, germinação e diferen-
pelo primeiro proembrião que chega ao fundo da ciação. Tais fatores atuam em determinados
cavidade ovariana. momentos da embriogênese e são os responsá-
GERMINAÇÃO 27

 Figura 1.9
Etapas do processo de fecundação de Epidendrum scutella. Parte superior, da esquerda para a direita: está-
dios progressivos de evolução da flor até o estádio de fruto maduro, em relação à escala de tempo (ao centro)
em meses. Parte inferior: ontogenia dos andrófitos e ginófitos culminando com a singamia. M = meiose; S =
singamia.

veis pelas características morfológicas e fisioló- o zigoto esporofítico entra em estado de dor-
gicas do embrião contido na semente. mência, enquanto o zigoto xenofítico germina,
A dormência pode afetar o zigoto, o embrião dividindo-se ativamente, dando início ao xe-
ou a semente como um todo (ver Parte 2). A nófito (endosperma) que capitaliza a função
germinação consiste na ruptura da dormência lítica dos tecidos do rudimento seminal. Assim
e no restabelecimento das atividades vitais, pri- que alcança a formação de um bom número de
mordialmente a mitose. A diferenciação con- células, produz-se a germinação do zigoto es-
siste na especialização de células meristemáti- porofítico. A partir daí, as divisões continuam
cas em primórdios de órgãos ou na formação igualmente em ambas as estruturas. Estabele-
de tecidos especiais (primórdios cotiledonares ce-se o termo “germinação” para essas duas ge-
ou foliares, procâmbio, tecido vascular, tecido rações, pois os zigotos formados somente con-
de reserva). tinuam seu desenvolvimento se vencerem as
Dependendo do momento do processo em- barreiras impostas pelo ambiente interno da
briogenético em que tais fatores atuam, determi- planta, à semelhança da germinação usualmen-
na-se a qualidade do conteúdo seminal quanto te conhecida, como fenômeno que mantém re-
ao estado de desenvolvimento do embrião. lações diretas com o ambiente externo.
Depois de formados os dois zigotos, o es- No curso da embriogênese esporofítica,
porofítico (embrionário) e o xenofítico (endos- identifica-se uma série de estádios particulares
perma), como resultado da dupla fecundação, pelos quais um embrião em gestação deve pas-
28 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

sar obrigatoriamente. Tais estádios são: globu- talhe indicativo do único cotilédone das mo-
lar, trapezoidal, cordiforme (para as dicotile- nocotiledôneas.
dôneas) ou entalhado (para as monocotiledô- O estádio cordiforme se identifica pelo fran-
neas), torpedo e embrião maduro (Wardlaw, co desenvolvimento dos cotilédones e pelo co-
1955; Johri, 1984). meço da diferenciação do ápice radicular e cau-
O estádio globular se caracteriza pela for- linar, além do início do desenvolvimento do pro-
mação de uma massa mais ou menos esférica câmbio. O estádio torpedo se caracteriza pelo
de células, conectadas a um suspensor que, co- desenvolvimento e pela diferenciação do hipo-
mumente, é um filamento unisseriado de pou- cótilo e da radícula e pela diferenciação inci-
cas células. Nesse estádio de desenvolvimento, piente do tecido vascular.
iniciam-se processos de diferenciação na massa Esses fatores seguem atuando até desenvol-
globular de células, sendo perceptível a forma- verem os cotilédones por completo, para che-
ção da protoderme, delimitando um meristema garem ao estádio de embrião maduro, momen-
fundamental. to em que todas as estruturas vivas da semente
Os processos de diferenciação se insinuam entram em dormência seminal.
no estádio trapezoidal, com a formação dos pó- O que foi descrito é uma situação muito
los de diferenciação dos cotilédones, no caso generalizada, visto que, na natureza, existe um
das dicotiledôneas, ou o surgimento de um en- amplo espectro na cronologia da embriogênese;

Z PROEMBRIÕES EMBRIÕES
I L G
I L
G O
N
O E B
T U TRAPE- CORAÇÃO TORPEDO
A L
O R A ZOIDAL
R

D
I
F
E
R
E
N
C
I
A D
Ç O
R
à M
Germinação O Ê Germinação
(rompimento da N (emergências da
C
dormência do zigoto) I radícula do embrião)
A

DESENVOLVIMENTO ONTOGENÉTICO
Endosperma Embrião

 Figura 1.10
Representação esquemática do desenvolvimento ontogenético do rudimento seminal desde a germinação
do zigoto até a emergência da radícula e sinalização de diferentes momentos em que a dormência seminal é
suplantada. A seqüência inclui zigoto, proembriões (linear e globular) e embriões (trapezoidal, coração e
torpedo).
GERMINAÇÃO 29

a dormência embrionária pode se manifestar É importante destacar aqui que, no caso das
em qualquer dos estádios descritos, sem que a gimnospermas, nas quais o ginófito alcança um
semente, como um todo, tenha completado seu desenvolvimento muito importante, as reservas
desenvolvimento e entrado em efetiva dormên- se acumulam em suas células; e, apesar de se-
cia seminal (Figura 1.10). Desse modo, o desen- rem consumidas, em parte, pelo embrião em
volvimento do embrião pode ser detido em desenvolvimento, perduram até alcançar a dor-
quaisquer dos estádios descritos anteriormente. mência seminal, constituindo o caso das se-
Assim, existem sementes maduras contendo mentes protálicas. Tais reservas são aproveita-
proembriões em estado globular (Maheswari, das pelo embrião esporofítico durante a germi-
1950), outras com embriões cordiformes ou tor- nação da semente.
pedo (Heuser, 1999) ou com cotilédones com-
pletamente desenvolvidos. Porém, existem ca-
sos nos quais o processo de diferenciação do REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
embrião avança além da formação do nó coti- BATTAGLIA, G. Embryological questions: gynogonium
ledonar e dos cotilédones; o processo não se versus archegonium and the generalization of the pre-
fixes andro- and gyno- in plant reproduction. Ann. Bot.,
detém, continuando a formar outros nós e seus
v.40, p.1-7, 1982.
primórdios foliares correspondentes. Resumin-
do, existem sementes contendo embriões pro- COCUCCI, A.E. Aspectos ultraestruturales de la
fertilización en angiospermas. Kurtziana, v,14, p.41-62,
embriônicos, uninodais e multinodais. 1981.
Entretanto, embora as divisões celulares
continuem a ocorrer, podem se apresentar casos _____. La embriologia en la taxonomia y la evolución
de las Lorantáceas. Monografias de la Acad. Nac. de Cienc.
nos quais os processos de diferenciação não se E. F. y Nat., v.5, p.83-88, 1990.
manifestem. Dessa forma, desenvolve-se uma
_____. Some suggestions on the evolution of
importante massa de células sem diferenciação
gametophytes on higher plants. Phytomorphology, v.23,
alguma, um cormo. Nesse estádio, essa massa n.1-2, p.109-124, 1973.
embrionária entra em dormência junto com ou-
_____. Ultrastructural aspects of Epidendrum male
tras estruturas da semente, demonstrando a
gametogenesis In: CRESTI, M.; GORI, P.; PACINI, E.
presença de sementes nas quais os processos de (Eds.). Sexual reproduction in higher plants. Berlin:
diferenciação atuam após a germinação seminal. Springer Verlag, 1988. p.251-256.
O xenófito ou endosperma se desenvolve
COCUCCI, A. E.; JENSEN, W.A. Orchid embryology: the
paralelamente ao embrião esporofítico. Algu- mature megagametophyte of Epidendrum scutella.
mas vezes, sua função é primordialmente lítica Kurtziana, v.5, p.23-38, 1969.
em relação aos tecidos do rudimento seminal
COCUCCI, A.E.; MARIATH, J.E.A. Sexualidade das
e, no momento da dormência seminal, perma- plantas. Ciência Hoje, v.18, n.106, p.49-61, 1995.
nece como um tênue saco, como dedo de luva
COCUCCI, A.E.; VENTURELLI, M. Sexualidad em es-
em torno do embrião esporofítico. Não existe pécies com vacuoma oosférico de polaridad invertida
informação se esse tipo de endosperma pode (Strutanthus, Loranthaceae). Kurtziana, v.5, p.9-24, 1984.
readquirir sua atividade lítica após a germina-
DI FULVIO, T.E. Sobre o pólen de Ixorhea tschundiana
ção da semente no caso daquelas reservas que (Heliotropiaceae). Bol. Soc. Arg. Botânica, v.19, n.1-2, p.83-
foram acumuladas em tecidos do rudimento se- 90, 1980.
minal como o nucelo (perisperma) ou o corpo
GERASSIMOVA-NAVASHINA, H. A contribution to the
basal. cytology and fertilization in flowering plants. Nucleus,
Uma situação muito difundida entre as an- v.3, p.111-120, 1960.
giospermas é que parte do endosperma se trans-
HEUSER, E.D. 1999. Embriogênese em Ilex paraguariensis
forma em tecido de reserva que é consumido A. St. Hil: aspectos do suspensor e endosperma. Porto
durante a germinação da semente (ver Capítulo Alegre, 1999. Tese (Doutorado) - PPGBotânica, UFRGS.
10). 145p.
30 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

HOFMEISTER, W. On the germination, development and MAHESWARI, P. An introduction of the embryology of


fructification of higher Cryptogamia and on the fructification angiosperms. New York: McGraw-Hill, 1950.
of Coniferae. London: [s.n.], 1862. Tradução para o in-
SCHNARF, K. Vergleichende Embryologie der Angispermen.
glês, por F. Curry, do original em alemão de 1851.
Berlin: Bornträger, 1931.
JOHRI, B.M. (Ed.). Embryology of angiosperms. Berlin:
WARDLAW, C.W. Embryogenesis in plants. London:
Springer Verlag, 1984.
Methuen, 1955.
C A P Í T U L O 2

ACÚMULO DE RESERVAS
Marcos S. Buckeridge
Marcos P. M. Aidar
Henrique P. dos Santos
Marco Aurélio S. Tiné

A maior parte do material bibliográfico sobre mica. No início deste século, foi considerado o
compostos de reserva de sementes se relaciona produto comercial economicamente mais impor-
a grupos extremamente restritos de espécies ve- tante depois do petróleo. Sementes de outras es-
getais de importância agronômica, pertencen- pécies (como Lycopersicum esculentum [tomate] e
tes ao grupo das gramíneas, como, por exemplo, Lactuca sativa [o conhecido alface]) também têm
Zea mays (milho), Triticum aestivum (trigo), sido extensivamente estudadas, mas, nesse caso,
Oryza sativa (arroz) e Hordeum vulgare (cevada), menos pela importância de suas reservas e mais
e leguminosas, como Phaseolus vulgares (feijão), para aumentar o conhecimento da fisiologia de
Pisum sativum (ervilha) e Glycine max (soja). Isso sua germinação e desenvolvimento. Mesmo as-
se deve ao fato de que essas espécies são utiliza- sim, conhecer os mecanismos de acúmulo e
das de diversas formas por populações huma- mobilização de reservas é fundamental para a
nas (Bewley, 1997). obtenção de plantas de maior vigor.
Historicamente, o arroz (na China), o trigo Com o desenvolvimento da biotecnologia,
(no Egito) e o milho (nas Américas) foram as as sementes têm sido estudadas quanto à com-
principais fontes de energia para o desenvolvi- posição química de suas reservas. Tal interesse
mento da civilização com base em grandes po- se dá não por seu teor nutritivo, mas por apre-
pulações. Essas gramíneas (coletivamente cha- sentarem propriedades físico-químicas especi-
madas de cereais), por se adaptarem a regiões ais, formando soluções altamente viscosas, sen-
abertas, apresentam altas taxas fotossintéticas do, por isso, úteis como aditivos na confecção
e, por esse motivo, devem ter sido mais apro- de alimentos industrializados. Ainda mais re-
priadas para efetuar um processo de seleção ar- cente é o interesse da sociedade por aspectos
tificial com o objetivo de aumentar o teor de relacionados ao meio ambiente. Nesse contexto,
carboidratos em suas sementes. As legumino- principalmente em países de megadiversidade
sas (feijão e soja, por exemplo), cujas sementes como o Brasil, torna-se relevante conhecer as-
naturalmente já apresentam teores protéicos pectos da composição química e da fisiologia
relativamente altos (espécies dessa família pos- das sementes de espécies nativas das florestas
suem estratégias para maximizar a assimilação tropicais, do Cerrado e de outros biomas. Tais
de nitrogênio), foram selecionadas para produ- informações são importantes para auxiliar, por
zir sementes como fonte de aminoácidos exemplo, a produção de mudas de alta quali-
(Chrispeels e Sadava, 1994). dade para tentar recuperar áreas que foram de-
Os cereais, sozinhos, fornecem cerca de 70% gradadas por atividades agrícolas e industriais.
de nossa dieta. O café (gênero Coffea, Rubiaceae) É nesse contexto, curiosamente antagônico
é outra semente de enorme importância econô- por fornecer as bases científicas para ações apa-
32 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

rentemente contrárias (tecnologia versus meio e se desenvolver em outro local, mas às custas
ambiente), que este capítulo sobre deposição de suas próprias reservas de nutrientes. É inte-
de reservas foi escrito. É impossível abordar tu- ressante observar que, nesse ponto da evolução,
do em um espaço restrito, mas tentaremos utili- ainda não havia nem flores nem frutos e, por-
zar exemplos que contemplem tanto as espécies tanto, as sementes podem ter evoluído graças
de grande importância econômica como as me- às alterações de tecidos originários de folhas.
nos conhecidas, mas também muito importan- Foi possivelmente a partir desse momento que
tes em biomas brasileiros. as plantas iniciaram o aperfeiçoamento de me-
canismos morfológicos, fisiológicos e bioquími-
A importância das reservas no surgimento das cos para acumular reservas e produzir a gran-
sementes durante a evolução. Por meio de ob- de diversidade biológica que vemos depois de
servações de plantas que persistiram ao longo milhões de anos de evolução.
da evolução, bem como de fósseis, hoje se acre- O fato de as reservas serem derivadas evo-
dita que as sementes tenham surgido entre 360 lutivamente de tecido foliar é relevante para
e 340 milhões de anos atrás (período devo- compreender por que as reservas têm a compo-
niano) com o aparecimento das gimnospermas. sição que conhecemos e também para entender
Em um fóssil desse período (Archaeosperma ar- os processos bioquímicos e fisiológicos envol-
noldii), foi observada a presença de um grande vidos na deposição e na mobilização de reservas
megásporo envolvido por uma camada de teci- em sementes. Um dos principais mecanismos
do, o integumento. Esse fato é importante por- de inovação ao longo da evolução é um processo
que, em grupos vegetais menos derivados, a re- de transferência ou intensificação de funções (Buc-
produção envolve a formação de um novo in- keridge e Reid, 1996). Esta hipótese propõe que
divíduo (esporófito) que tem que se manter li- uma função existente em um órgão ou tecido
gado à planta-mãe e dela depende para a obten- pode ser aproveitada em um contexto funcional
ção de nutrientes para o desenvolvimento. Não diferente em outro órgão ou tecido. No caso das
é possível precisar quando surgiu o integumen- reservas de sementes, os processos relacionados
to, que evolutivamente deu origem à casca das à síntese e à degradação de carboidratos, proteí-
sementes, mas é provável que este produto te- nas e lipídeos teriam sido gradativamente
nha sido o responsável pelo direcionamento de transferidos de um contexto de tecidos foliares
energia e carbono para o desenvolvimento de para um contexto de semente. Tal processo teria
um grande esporófito em um tecido com vári- transformado reservas metabólicas de curto
as camadas de células que deu origem às estru- prazo (na folha) em deposições de grandes quan-
turas que hoje chamamos de sementes. A prin- tidades por um longo período programado no
cipal vantagem de tal passo evolutivo foi a de ciclo de vida da planta (na semente). Essa hi-
que, naquela nova estrutura, havia mais espaço pótese é corroborada pelo fato de encontrarmos
para armazenar nutrientes e, ao mesmo tempo, grande similaridade entre folhas e sementes
o integumento oferecia um nível maior de pro- quanto aos processos bioquímicos relacionados
teção contra a perda de água e contra o ataque à síntese, à degradação e aos mecanismos de
de patógenos e herbívoros (Mauseth, 1998). controle metabólico das reservas. Outra evidên-
Apesar de este capítulo não enfatizar a evo- cia em favor da hipótese da transferência de
lução de sementes, tais hipóteses foram relata- funções aplicada às reservas de sementes é o
das para salientar que a possibilidade de acu- fato de que, em vários casos, são encontradas
mular reservas foi provavelmente um dos im- funções secundárias de certos compostos (pa-
portantes fatores no aparecimento e na evolu- rede celular, por exemplo) que existiam como
ção das sementes em plantas. Este foi o início função primária em tecidos de folhas, mas que
de uma seqüência de eventos no processo evo- ainda apresentam tal função ativa, porém se-
lutivo que possibilitou que um novo indivíduo cundária em relação à função principal que,
pudesse se tornar independente da planta-mãe hoje, é a de reserva.
GERMINAÇÃO 33

PRINCIPAIS COMPOSTOS DE a absorção de nutrientes. Porém, apesar de vá-


RESERVAS DE SEMENTES rias sementes já apresentarem plúmulas (folhas
As reservas das sementes têm basicamente em estágio inicial de crescimento), normalmen-
duas funções que se relacionam com a manu- te necessitam de um tempo maior para atingi-
tenção e o desenvolvimento do embrião até a rem a autotrofia. Talvez este seja o principal
formação de uma plântula que apresente a ca- motivo pelo qual as reservas encontradas em
pacidade de se manter de forma autotrófica. maior proporção nas sementes sejam aquelas
As reservas podem funcionar como fonte de relacionadas com a capacidade de suprir o car-
energia para manter processos metabólicos em bono e a energia para o desenvolvimento inicial
funcionamento e/ou como fonte de matéria da plântula. Também deve ser a principal razão
para a construção de tecidos vegetais que irão para esses compostos serem os mais estudados.
constituir a plântula. Em geral, os compostos
acumulados nas sementes podem servir aos
dois fins, pois os compostos de carbono normal- DE ONDE VÊM A ENERGIA E
mente acumulados em sementes (carboidratos, OS SINAIS PARA ENCHER OS
lipídeos e proteínas) podem ser utilizados tanto
GRÃOS?
para produzir energia como para construir fisi- Acredita-se que a razão sacarose/monossacarí-
camente as células. O Quadro 2.1 mostra os deos (S/M) funciona como um marcador do es-
principais compostos de reserva de sementes e tado fisiológico dos tecidos em desenvolvimen-
sua distribuição por função. to, sendo menor que 1 no período de divisão e
Há enorme variação na composição de se- crescimento celular e maior que 1 durante o
mentes, mas as substâncias armazenadas em processo de espessamento da parede. No início
grande quantidade constituem os carboidratos, do século XXI, houve um acúmulo de evidên-
os lipídeos e as proteínas. Os dois primeiros ser- cias em favor da hipótese de que os níveis en-
vem como fonte de energia e carbono para a dógenos de açúcares são importantes contro-
germinação das sementes e o desenvolvimento ladores do metabolismo vegetal, determinando
das plântulas, enquanto as proteínas têm como se o sistema deve ser encaminhado para o acú-
função armazenar principalmente nitrogênio mulo ou para a degradação de reservas. A pre-
e enxofre, essenciais para a síntese de proteínas, sença de grandes quantidades de sacarose ge-
ácidos nucléicos e compostos secundários na ralmente indica que há alguma fonte de energia
plântula em crescimento. importante em ação na planta, e isso é “inter-
É necessário lembrar que as plântulas, para pretado” pelo metabolismo como um sinal para
crescerem, precisam de macro e micronutrien- acumular reservas.
tes e, portanto, as sementes devem carregar re-
servas para o uso no início do desenvolvimento. DEPOSIÇÃO DE COMPOSTOS
Há um importante composto de reserva chama- DE RESERVA
do fitina (mio-inositol hexafosfato) que incrus-
ta os corpos protéicos das sementes e serve para Carboidratos
armazenar íons (fósforo, cálcio, magnésio, etc.). Os principais compostos derivados de car-
Estes íons desempenham importantes funções boidratos que atuam como reserva em semen-
no metabolismo, e o eixo embrionário precisa tes são a sacarose e os oligossacarídeos da série
de uma fonte até que a raiz esteja desenvolvida rafinósica, o amido e os polissacarídeos de pare-
o suficiente para extraí-los do substrato. de celular. Enquanto a sacarose é praticamente
O primeiro processo de desenvolvimento a universal, os oligossacarídeos da série rafinó-
ocorrer no final da germinação é a protrusão sica ocorrem em um grande número de semen-
da radícula. Esta raiz é razoavelmente desenvol- tes de dicotiledôneas. O amido é um dos com-
vida e tem a capacidade de iniciar rapidamente postos de reserva de mais larga ocorrência nos
34 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Quadro 2.1 Principais compostos de reserva e as características relevantes para as suas funções nas
sementes

Função principal
Composto de reserva como reserva Fase de utilização Funções secundárias Outras características

SACAROSE E SÉRIE Fonte de carbono Germinação Manutenção da Reserva de uso


RAFINÓSICA integridade de rápido para produção
membranas de energia
AMIDO Fonte de carbono Desenvolvimento — Alto
da plântula empacotamento e
menor solubilidade
POLISSACARÍDEOS Fonte de carbono Desenvolvimento Controle da Alto empacotamento
DE PAREDE da plântula embebição e e maior solubilidade
CELULAR propriedades
mecânicas de
cotilédones
LIPÍDEOS Fonte de carbono Germinação e — Insolúvel em água, mas
desenvolvimento produz mais energia por
da plântula molécula
PROTEÍNAS Fonte de carbono Germinação e — Alto empacotamento,
e nitrogênio desenvolvimento da já possui aminoácidos
plântula que podem ser
transportados
diretamente
FITINA Fonte de minerais Germinação e — Reserva essencial
desenvolvimento da altamente empacotada
plântula

vegetais superiores, e os polissacarídeos de pa- suas membranas e, com isso, poderem perma-
rede celular ocorrem em alguns grupos taxo- necer secas por um longo período, após o qual
nômicos em que geralmente atuam como germinam normalmente. Essa hipótese encon-
reserva, mas preservando funções secundárias tra suporte no fato de haver uma tendência
importantes como o controle de absorção e de maior de acúmulo de oligossacarídeos da série
distribuição da água nos diferentes tecidos das rafinósica em sementes ortodoxas em relação
sementes. às recalcitrantes.
Uma parte da sacarose que chega à semente
Sacarose e oligossacarídeos da série rafinósi- em formação pode ser utilizada como base para
ca. Em sementes ortodoxas, o período de enchi- a síntese de uma família de oligossacarídeos
mento do grão é sucedido por um período carac- chamada de série rafinósica. A biossíntese dos
terístico de secagem. A sacarose, principal com- oligossacarídeos desta série consiste em adicio-
posto de transporte de carbono dos órgãos fo- nar uma unidade de galactose ao carbono 6 da
tossintéticos até a semente em desenvolvimen- molécula de glucose da sacarose na forma de
to, pode ser acumulada em quantidades apre- ligação alfa. Tal transferência de galactoses pa-
ciáveis ao final do processo. rece ocorrer nos vacúolos, e as enzimas de sínte-
Esses oligossacarídeos são degradados logo se consistem em uma série de galactosil trans-
no início da germinação, e acredita-se, assim, ferases que apresentam afinidade pela sacarose
que sejam compostos de reserva. Porém, sua e também pelos próprios oligossacarídeos for-
principal função tem sido atribuída à proprieda- mados por sua ação. Os oligossacarídeos forma-
de das sementes ortodoxas de estabilizarem dos são: rafinose (sacarose + uma galactose),
GERMINAÇÃO 35

estaquiose (duas galactoses), verbascose (três tituintes como a organização destes em grânu-
galactoses) e ajugose (quatro galactoses). Esse los, considerando todos os aspectos de controle
parece ser o limite máximo de transferência de que possam estar presentes ao longo de seu
galactose para componentes da série. Enzimas anabolismo.
e genes já foram clonados para a rafinose sin- Dentre os constituintes, o amido pode ser
tase e a estaquiose sintase, e sabe-se que elas fracionado quimicamente em dois tipos de po-
são enzimas solúveis e não de membrana. límeros de glucose: amilose e amilopectina. A
amilose consiste, em média, de uma cadeia de
Amido. O amido é uma das mais importantes 1.000 resíduos de glucose ligados em α(1,4) e
formas de reserva de carbono nas plantas, em com disposição espacial em α-hélice, predomi-
termos de quantidade, universalidade de sua nantemente linear (Figura 2.1). Apesar da dis-
distribuição e importância comercial. Tanto em posição linear, as amiloses apresentam uma pe-
cereais, com seus endospermas amiláceos, quena freqüência de ramificações laterais (uma
quanto em raízes e tubérculos, o amido faz par- ramificação a cada 1.000 resíduos), as quais são
te da alimentação básica da população humana formadas por aproximadamente 300 resíduos
no mundo e supre uma grande parcela das ra- de glucose α(1,4)-ligados, presos à estrutura
ções de muitos animais, o que faz desse car- principal da amilose por ligações α(1,6). Consi-
boidrato um importante produto comercial. Em derando todo o volume de amido, a amilose cor-
função disso, a síntese do amido nos órgãos e responde a 30%, em média. Essa proporção po-
nos tecidos de reserva tornou-se objetivo de in- de variar, consideravelmente, entre espécies
vestigação em diversos laboratórios do mundo. (média de 11 a 35%), variedades (média de 20
Como conseqüência, nas últimas três décadas, a 36%), órgãos, estágios de desenvolvimento e
esses trabalhos têm proporcionado um grande diferentes condições de crescimento (Dethera-
avanço no conhecimento metabólico e estru- ge, Macmasters e Rist, 1955).
tural desse polissacarídeo, o qual será detalhado A amilopectina corresponde ao principal
a seguir. componente dos grânulos de amido (aproxima-
O amido é composto por polímeros de glu- damente 70%) e consiste de cadeias de glucose
cose1 dispostos em uma estrutura tridimensio- α(1,4)-ligadas, altamente ramificadas (Figura
nal, semicristalina, denominada grânulo de 2.1). As cadeias são formadas por aproximada-
amido (Figura 2.1). Esses grânulos tendem a mente 20 resíduos de glucose e são interligadas
apresentar grande variabilidade de tamanho e por ligações α(1,6), formando uma estrutura
de proporção entre os seus constituintes em altamente organizada e com um único final re-
função de fatores ambientais e das peculiarida- dutor livre. As cadeias mais longas, sem substi-
des de cada espécie, variedade e tecido em ques- tuições laterais, correspondem às cadeias “A”
tão. Devido à essa complexidade, a síntese de da amilopectina, enquanto as cadeias altamen-
amido envolve tanto a produção dos seus cons- te ramificadas correspondem às cadeias “B”.
Nos grânulos de amido, os quais podem va-
riar de <1 μm a >100 μm, as moléculas de ami-
lopectina são arranjadas radialmente, e as rami-
1
Neste capítulo, a nomenclatura dos carboidratos (principalmente ficações laterais, dentro dos agrupamentos de
a dos polissacarídeos) será utilizada de forma a facilitar a compreen-
são e agilizar a distinção entre compostos similares. Em vez de ramificações, podem formar dupla hélice entre
glicose, será utilizado o termo glucose. Isso visa distinguir termos si, o que aumenta a capacidade de empacota-
como glicosídeos (uma aglicona ligada a um açúcar qualquer) de
glucosídeos (uma aglicona ligada a uma molécula de glucose). Essa
mento e proporciona um grau de cristalinidade
designação permite utilizar o termo geral glicano(s) para polissa- nessas regiões (Figura 2.1). O grau de cristali-
carídeos compostos de qualquer mistura de monossacarídeos, ao nidade é determinado pelo comprimento das
contrário do termo glucanos, que será usado para designar polis-
sacarídeos compostos inteira ou predominantemente por moléculas ramificações na amilopectina e pela organiza-
de glucose, tais como a celulose, o amido, os glucanos de ligação ção espacial dessas estruturas, as quais podem
mista ou xiloglucanos.
formar duplas α-hélices entre duas ramifica-
36 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Anel de crescimento
amorfo
GRÂNULO

Anel de crescimento
semicristalino

Cadeia tipo A Agrupamentos (10 nm)


Região cristalina
AMILOPECTINA

Borda do grânulo
Final redutor

Cadeia tipo B Região amorfa

a-hélice

dupla a-hélice
AMILOSE

 Figura 2.1
Detalhe dos grânulos de amido e de seus constituintes (amilopectina e amilose). Foto de grânulos de amido
no endosperma de sementes de Triticum aestivum (trigo), em que podem ser classificados em tipo A (maiores)
e em tipo B (menores).

ções paralelas. As ramificações com 20 resíduos que se encontram confinados em regiões espe-
de glucose, em média, e com disposição orto- cíficas dos grânulos.
gonal proporcionam estruturas altamente com- O grau de ramificação e, conseqüentemen-
pactas, que são características de amidos de en- te, de cristalinidade dos grânulos de amido po-
dospermas de cereais (trigo e cevada). Em con- de variar de forma consistente mesmo entre ór-
trapartida, em Solanum tuberosum (batata), ob- gãos da mesma planta. Os grânulos de amido
serva-se estruturas mais abertas, contendo, em não são uniformemente cristalinos, possuindo
média, 22 resíduos de glucose e uma disposi- regiões amorfas intermediárias. Essas regiões,
ção frouxa e hexagonal. Essas diferenças estru- nas camadas semicristalinas e nas camadas
turais e, conseqüentemente, de cristalinidade amorfas, são formadas principalmente por ami-
dos grânulos são consideradas na classificação loses, em função das estruturas helicoidais sim-
dos tipos de amido. Desse modo, os cereais ples que este componente forma, e por ramifi-
apresentam o amido do tipo A, e a batata, o cações não-organizadas de amilopectinas (Fi-
amido do tipo B. Ambos os tipos de amido con- gura 2.1).
têm água em sua estrutura, principalmente o Grânulos de amido de órgãos de reserva são
tipo B. Amidos de outras espécies, como ervi- relativamente diferentes, em macroestrutura,
lha, apresentam os dois tipos de cristalinidade, dos grânulos de amido transitório presentes em
GERMINAÇÃO 37

folhas e tecidos primários. Os grânulos de ami- tizado transitoriamente em outros órgãos, como
do de reserva apresentam anéis de crescimento em células de meristemas; porém, o seu maior
interno semicristalino que são diferentes em acúmulo ocorre nos órgãos de reserva, incluin-
sensibilidade aos ataques enzimático e químico. do sementes, frutos, tubérculos e raízes de re-
As camadas mais densas e resistentes podem serva. Como o foco deste capítulo está direcio-
ser formadas pela maior interação de amilo- nado sobretudo à semente, e a maioria dos es-
pectinas paralelas nas regiões de maior freqüên- tudos estruturais tem utilizado amidos de ór-
cia de ramificações laterais. Esses anéis podem gãos de reserva, devido à facilidade para a sua
ser constituídos por diferenças periódicas na obtenção e à sua importância comercial, abor-
taxa de síntese do amido. No trigo, quando as daremos principalmente esse tipo de amido.
plantas são submetidas à iluminação constante, Contudo, cabe lembrar que alguns aspectos di-
o amido produzido no endosperma das semen- ferenciais entre os amidos transitórios e de re-
tes não apresenta os anéis que são vistos nas serva também serão mencionados ao longo do
plantas crescidas em condições de claro/escuro. capítulo.
Apesar dessa forte evidência de que o fotope- No interior das células, o amido é sintetiza-
ríodo pode determinar o padrão de anelamento do em plastídeos, os quais são denominados
do amido, isso não deve ser generalizado, pois amiloplastos em órgãos de reserva. Os amilo-
o padrão de anelamento pode ser influenciado plastos se desenvolvem diretamente dos pro-
por outros fatores, como oscilações de tempera- plastídeos e apresentam uma estrutura lamelar
tura ou disponibilidade hídrica. interna rudimentar. O amido também pode ser
Os grânulos de amido transitório são geral- sintetizado em plastídeos que apresentam ou-
mente menores do que em órgãos de reserva e tras funções específicas, como os cloroplastos
possuem macroestrutura distinta. Eles apresen- (fixação fotossintética de carbono), os plastí-
tam um centro cristalino rodeado por um man- deos de oleaginosas (veja, a seguir, a biossíntese
to amorfo, o qual é formado por glucanos me- de lipídeos) e os cromoplastídeos em raízes
nos ramificados. A maioria dos processos de (biossíntese de carotenóides, como em Daucus
síntese e de degradação desses amidos ocorre carota, a cenoura). Em alguns casos, por exem-
nessa porção amorfa dos grânulos, permane- plo, em cotilédones, de reserva de algumas
cendo o centro cristalino. leguminosas, os amiloplastos se desenvolvem a
Além da reserva de açúcares, os grânulos partir de cloroplastos. Isso reforça a idéia de que
de amido apresentam proteínas que atingem, os amiloplastos podem ser considerados cloro-
em média, de 0,05 (batata) a 0,5% (cereais) da plastos não-fotossinteticamente ativos, devido
sua massa. Essas proteínas incluem as enzimas ao fato de serem interconversíveis e exercerem
de síntese do amido e podem definir as dife- algumas funções metabólicas similares.
renças de aroma entre os amidos. Os grânulos Apesar do grande avanço nos estudos acer-
de amido também apresentam associações com ca do metabolismo de amido, a rota bioquímica
lipídeos atingindo valores de 0,1 (batata) a 1% exata para a síntese deste glucano ainda não
(cereais) de sua massa. A estrutura da amilose está completamente resolvida. Contudo, já se
facilita a associação com os lipídeos, fazendo pode definir uma rota geral de síntese, englo-
com que estes sejam distribuídos principalmen- bando em um esquema simplificado as três en-
te nas regiões amorfas dos grânulos, onde ocor- zimas básicas para esse processo: a ADP-glucose
re a maior proporção de amilose. pirofosforilase (ADPGPPase), o amido sintase
(AS) e a enzima ramificadora de amido (ERA)
Biossíntese do amido. O amido é sintetizado (Figura 2.2).
nas folhas, durante o dia, a partir da fixação Tanto a amilose quanto a amilopectina são
fotossintética de carbono, sendo mobilizado pa- sintetizadas a partir de ADP-glucose (ADP-G),
ra outros tecidos (em crescimento ou de reser- a qual é produzida por uma reação enzimática
va) à noite. Esse polissacarídeo também é sinte- catalisada pela ADPGPPase utilizando glucose-
38 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

ÓRGÃOS-FONTE

CH2OH CH2OH Amiloplasto


o o
4 1
o o
SACAROSE Amilopectina 6 CH2
CH2OH CH2OH CH2OH
o o o o

4 o o o 1
SS
ASS + ERA
CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH
o o o o o
+
FRU Amilose 4 1 o o o 1
ADP

ASL
UDP-Glc

ADP-Glc CH2OH
o
FRU-6-P + ATP
ADPGPPase OP
Glc-1-P Glc-1-P
THP
PGMase

Glc-6-P Glc-6-P

Citoplasma

 Figura 2.2
Representação esquemática do fluxo de carbono para os amiloplastos e a bioquímica de síntese de amilose
e amilopectina. A sacarose proveniente dos órgãos-fonte (folhas) é quebrada, principalmente pela enzima
sacarose sintase (SS), originando frutose (FRU) e UDP-glucose (UDP-Glc); estas culminam com a formação
de glucoses fosfato (Glc-1-P e Glc-6-P), as quais são interconvertidas pela enzima fosfoglucomutase (PGMase).
As hexoses fosfato são transportadas para o interior do amiloplasto pelos transportadores de hexose fosfato
(THP). No interior do amiloplasto, pela ação da enzima ADP-glucose pirofosforilase (ADPGPPase), a Glc-1-P é
convertida em ADP-Glc, a qual é substrato para a enzima amido sintase. Esta última apresenta as isoformas
ligadas (ASL), que são relacionadas com a síntese de amilose, e as isoformas solúveis (ASS), que, em conjunto
com a enzima ramificadora de amido (ERA), promovem a síntese de amilopectina. Todo esse processo enzi-
mático ocorre de modo sincronizado, resultando na formação dos grânulos de amido. Maiores detalhes no
texto.

1-P e ATP como substrato e liberando pirofos- zando um co-transportador ADP/ATP (Shüne-
fato (Figura 2.2). Para proporcionar o equilíbrio mann et al., 1993). A glucose-1-P também pode
a favor da síntese de ADP-G, o pirofosfato libe- ser suprida a partir do ciclo de Calvin e Benson,
rado é removido por uma pirofosfatase alcalina, na fotossíntese, por meio das enzimas fosfo-
que está provavelmente presente em todos os glucoisomerase e fosfoglucomutase (Martin e
plastídeos (Weiner, Stitt e Heldt, 1987). Smith, 1995). Entretanto, em tecidos não-fo-
A ADPGPPase é ativa dentro do plastídeo, tossintéticos (órgãos de reserva), os fotoassi-
necessitando que a glucose-1-P e o ATP estejam milados chegam por meio do floema, princi-
presentes dentro da organela. Nos cloroplastos, palmente na forma de sacarose, a qual é hidro-
o ATP pode ser fornecido pela fotossíntese reali- lisada pelas enzimas sacarose sintase ou inver-
zada no próprio plastídeo; porém, nos amilo- tases, resultando na liberação e na fosforilação
plastos, é necessário que esse nucleotídeo seja de glucose e, na seqüência, de trioses. Nessa
importado do citoplasma, provavelmente utili- etapa, ainda existem algumas controvérsias:
GERMINAÇÃO 39

não se sabe se as hexoses-P (glucose-6-P e glu- Parte da seletividade se deve ao fato de que a
cose-1-P) ou se as trioses-P é que são transpor- enzima quebra somente as cadeias de glucano
tadas para dentro dos amiloplastos. A glucose- que estão em uma conformação de dupla-hélice
1-P pode ser importada diretamente do cito- estável, a qual é uma estrutura que requer um
plasma ou sintetizada a partir da glucose-6-P comprimento mínimo da cadeia de glucano.
que, após importação, é convertida pela fosfo- Para compreender os pontos de regulação
glucomutase (PGMase, Figura 2.2) de plastí- na rota de síntese do amido, é necessária uma
deos. Foi demonstrado que, em amiloplastos caracterização geral das três etapas específicas.
de tecidos de reserva (tubérculos), ocorre a en- Primeiro, temos que considerar a necessidade
trada de glucose-1-P e de glucose-6-P, o que re- de uma fonte de carbono e a forma como essa
força a hipótese da entrada de hexose-P em fonte entra nos amiloplastos. Além de entrar
amiloplastos (Wischmann, Nielsen e Moller, no amiloplasto, é preciso que haja a síntese de
1999). ADP-G, pois somente a partir desse açúcar nu-
Na etapa seguinte, a amido sintase (AS) cleotídeo é que se dá o início da síntese de ami-
catalisa a síntese de uma ligação α(1,4) entre a do. Uma vez que há disponibilidade de subs-
ADP-G e o final não-redutor de um glucano trato (ADP-G), o controle sobre a síntese de
preexistente (seqüência primária), liberando a amido ocorre sobretudo nas reações catalisadas
ADP. AS é uma enzima ativada por K+ e que pelas AS e ERA, que compõem as duas últimas
apresenta isoformas solúveis (ASS) e isoformas etapas. Essas enzimas apresentam múltiplas
ligadas (ASL) à estrutura dos grânulos, as quais formas (isoenzimas) que, em conjunto, garan-
estão relacionadas, respectivamente, à síntese tem um elevado nível de complexidade ao
de amilose e à síntese de amilopectina (Figura metabolismo e à estrutura dessa reserva.
2.2). Em relação ao glucano preexistente, a AS De modo geral, o controle da síntese de
pode utilizar tanto a amilose como a amilopec- amido, em qualquer tecido, depende: (1) do
tina como substrato em condições in vitro; po- controle de fluxo de carbono para os amiloplas-
rém, até o presente momento, não se sabe como tos e para as enzimas de síntese do amido, e
é sintetizada in vivo essa seqüência primária. (2) do controle da estrutura, por meio de altera-
Existem algumas evidências bioquímicas para ções na quantidade e na estrutura fina dos cons-
algumas atividades especializadas, tanto em ve- tituintes do amido (amilose e amilopectina).
getais quanto em bactérias, que podem produzir Considerando que a fonte de carbono nas
seqüências primárias (primers) glucoprotéicas plantas é a fotossíntese, todos os fatores que
ou poliglucoprotéicas e servir de aceptores de afetam esse processo afetarão necessariamente
glucose para a enzima AS, durante as primei- a síntese de amido. Em contrapartida, se a dis-
ras etapas de síntese (Martin e Smith, 1995). ponibilidade de carbono se mantém, mas a taxa
As ligações α(1,6) e, conseqüentemente, as de mobilização e de distribuição entre os tecidos
ramificações observadas em amilose e sobretu- de reserva é atingida, há uma tendência de esti-
do em amilopectina são produzidas pela enzi- mular a síntese de amido transitório, principal-
ma ramificadora de amido (ERA). Esta enzima mente nos tecidos-fonte (folhas). Em tecidos
hidrolisa uma ligação α(1,4) no interior de uma de reserva, como as sementes, a proporção de
cadeia de glucose e catalisa a formação de uma amido sintetizada está diretamente relacionada
ligação α(1,6) entre o final redutor do glucano com a disponibilidade de carbono proveniente
“partido” e outro resíduo de glucose ou outro de outras partes da planta (folhas, caules, col-
glucano. Essas ramificações não são criadas mos, frutos, etc.). Acredita-se que a taxa de im-
aleatoriamente, uma vez que apresentam uma portação de carboidratos para um determinado
periodicidade média de 20 unidades de glucose. tecido (ou força de dreno) esteja atrelada à ati-
A ERA também apresenta alguma especifici- vidade de enzimas de hidrólise da sacarose, o
dade ao comprimento da cadeia de glucano que que salienta a importância da atividade das en-
será utilizado como substrato de sua reação. zimas invertase ou sacarose sintase (Sturm e
40 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Tang, 1999). Uma vez que ocorre a hidrólise da bientais e idade de desenvolvimento (Smith,
sacarose no tecido de reserva, a disponibilidade Denyer e Martin, 1997).
de carbono para a síntese de amido pode ser Além do controle da quantidade, discutido
controlada pelo transporte para o interior dos até então, a síntese de amido também apresenta
amiloplastos. Observa-se que, em endospermas um controle estrutural, alterando desde a pro-
de monocotiledôneas, a ADP-G é produzida porção entre a amilose e a amilopectina até o
principalmente no citoplasma, sendo transpor- tipo e a proporção de ramificações presentes
tada para o amiloplasto por um co-transporta- nesses constituintes. O caminho pelo qual a es-
dor de ADP-G/AMP e de ADP (Neuhaus e Emes, trutura do amido é estabelecida ainda não é
2000). Em contrapartida, em dicotiledôneas, conhecido. De modo geral, sabe-se que o cres-
raízes e tubérculos, a ADP-G é produzida princi- cimento dos grânulos ocorre em uma zona de
palmente nos amiloplastos e, necessariamente, sua superfície e que a síntese dos dois consti-
o fluxo de carbono é dado pelo co-transportador tuintes é função da existência, das propriedades
de hexose-P/Pi, principalmente de G-1-P e G- e da localização de múltiplas isoformas de AS
6-P (Wischmann, Nielsen e Moller, 1999). Nes- e ERA (Martin e Smith, 1995).
te último tipo, o controle pode ser dado pela O controle estrutural dos amidos também
disponibilidade de Pi, no interior, ou de hexose- depende da síntese e da organização das ami-
P no exterior do plastídeo. A disponibilidade lopectinas, que, por sua vez, dependem princi-
de Pi no interior do amiloplasto está atrelada palmente do tamanho e da freqüência de rami-
ao processo de síntese da ADP-G. Conforme vis- ficação. Atualmente, existem dois pontos de
to anteriormente, a ADP-G é o principal subs- vista acerca da determinação das características
trato para a síntese de amido, enquanto a en- de ramificações da amilopectina. O primeiro
zima que realiza a sua síntese (ADPGPPase) é, afirma que o padrão de ramificação é o reflexo
em certos casos, decisiva para a síntese de ami- exclusivo da atividade de isoformas da enzima
do, liberando Pi de sua reação. Em cloroplastos, ramificadora (ERA). O segundo defende o as-
a atividade dessa enzima é ativada pela disponi- pecto de que o padrão de ramificação de uma
bilidade de 3-PGA e inibida por Pi, o que pode amilopectina é a conseqüência de um balanço
estabelecer um controle do nível de ADP-G. das atividades das enzimas ramificadoras
Porém, esse nível de regulação pode ser subs- (ERA) e desramificadoras (isoamilase e pulu-
tancialmente distinto em amiloplastos. Recen- lanase) de amido. Conforme alguns estudos
temente foi demonstrado, em sementes e tu- com mutantes sugary-1, os quais apresentam
bérculos, que a proporção de ADP-G e a capaci- queda na atividade das enzimas desramifica-
dade de síntese de amido também podem ser doras, há um grande acúmulo de fitoglicogênio,
controladas pela enzima ADP-G pirofosfatase, em detrimento de amilopectina; o primeiro é
a qual catalisa a reação de quebra da ADP-G, um glucano com um grande número de rami-
produzindo glucose-1-P e AMP (Rodríguez- ficações aleatórias e sem organização espacial
López et al., 2000). definida (Kubo et al., 1999). Isso evidencia que
Alguns trabalhos também consideram a a estrutura altamente organizada das amilo-
amido sintase solúvel (ASS) como uma enzima pectinas pode necessitar de uma ação coordena-
mais limitante do que a ADPGPPase no controle da e controlada das enzimas ramificadoras, das
da taxa de síntese de amido em órgãos de re- enzimas desramificadoras e das amido sintases
serva. Com isso, ainda permanece indefinido o durante a sua síntese.
ponto de controle universal do fluxo de carbo-
no para a síntese de amido. De modo geral, o Polissacarídeos de reserva de parede celular.
controle do fluxo parece estar presente em to- Apesar das diferenças entre os mecanismos es-
das as enzimas ao longo da rota fonte-dreno, pecíficos de biossíntese e de degradação de cada
que pode diferir entre órgãos, condições am- um dos polissacarídeos de reserva de parede
GERMINAÇÃO 41

celular, há uma série de eventos pelos quais cretados para o espaço intercelular, onde ocorre-
essas substâncias são acumuladas e, posterior- rá a automontagem da parede celular por meio
mente, degradadas e utilizadas pelas plântulas da orientação das microfibrilas de celulose e da
em desenvolvimento (Buckeridge et al., 2000b). constituição dos diferentes domínios polis-
Durante a fase final da maturação das semen- sacarídicos da parede.
tes, em que estas se tornam quiescentes, os
principais fenômenos são as atividades de bios- Galactomanano, um modelo de polissacarídeo
síntese e de deposição dos polissacarídeos na de parede celular. Um dos polissacarídeos de
parede celular. Pouco se sabe sobre os mecanis- reserva de parede celular mais abundantes na
mos de controle desses processos, tais como natureza é o galactomanano. Além disso, é um
possíveis hormônios que poderiam estar envol- dos sistemas sobre o qual se tem maior conheci-
vidos, ou mesmo sobre os mecanismos de bios- mento acerca da biossíntese e da deposição; por
síntese (Buckeridge e Tiné, 2001). isso, exploraremos mais estes conhecimentos
A biossíntese dos polissacarídeos de parede e deixaremos de lado outros sistemas sobre os
celular requer nucleotídeo-açúcares como doa- quais se conhecem apenas alguns poucos as-
dores de monossacarídeos. A seguir são relacio- pectos (Buckeridge, Dietrich e Lima, 2000a).
nados alguns dos polissacarídeos de parede ce- Os galactomananos são polissacarídeos
lular e seus respectivos nucleotídeo-açúcares compostos por uma cadeia principal de manose
doadores. Os asteriscos indicam três dos polí- ligada beta-1,4, à qual se unem unidades de
meros que, ao longo da evolução, tiveram sua galactose por meio de ligações glicosídicas do
função como reserva intensificada nas sementes. tipo alfa-1,6 (Figura 2.4). Há um grande nú-
mero de espécies que acumulam galactomana-
Celulose UDP-glucose nos em suas sementes (predominantemente no
Calose UDP-glucose endosperma), e sua distribuição pode ser apre-
*Glucano de cadeia mista UDP-glucose ciada inclusive do ponto de vista taxonômico.
*Xiloglucano UDP-glucose, Eles estão presentes em Annonaceae, Astera-
UDP-galactose, ceae, Convolvulaceae, Palmae, Rubiaceae e Le-
UDP-xilose, guminosae, mas é nesta última família que há
GDP-fucose o maior número de espécies com sementes que
*Galactomanano GDP-manose, armazenam grandes quantidades de galacto-
UDP-galactose mananos. Considerando que Leguminosae é
Glucuronoarabinoxilano UDP-arabinose, uma das maiores famílias do Reino Vegetal (cer-
UDP-xilose, ca de 18.000 espécies) e que até o momento
UDP-ácido mais da metade das espécies de leguminosas
galacturônico examinadas apresentam galactomanano em
Ramnogalacturonano GDP-ramnose, suas sementes, é possível especular que este po-
UDP-ácido límero seja de larga ocorrência.
galacturônico Na natureza, o grau de ramificação dos ga-
lactomananos varia de polímeros em que qua-
As enzimas de biossíntese traduzidas no re- se todas as unidades de manose apresentam
tículo endoplasmático são transportadas para ramificação com galactose a polímeros em que
o complexo de Golgi, onde a maioria das reações nenhuma galactose é detectada. Em Trigonella
de biossíntese ocorre (Figura 2.3). Ao fim do foenum-graecum (feno grego), por exemplo, a ra-
processo de biossíntese e no início da produção zão manose:galactose é próxima de 1. Há po-
das vesículas secretoras, os resíduos de fucose límeros com uma unidade de galactose a cada
dos xiloglucanos e de metila das pectinas são 50 unidades de manose da cadeia principal
adicionados; os polissacarídeos são então se- (como o café). Esses galactomananos pouco ra-
42 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Retículo endoplasmático tradução das


sintetases
Produção e
interconversão de
UDP-açúcares transporte
nucleotídeo-açúcares

RG AGP
produção de
GCM Complexo de Golgi GAX glicanos

XG PGA
modificações
finais
Fuc-XG Me-PGA
GDP-fuc SAM

secreção
RG AGP

UDP-glc

CT
matriz fusão
membrana

citoplasmática
AGP
degradação XG
do polímero GCM
GAX

montagem

 Figura 2.3
Visão geral do processo e da localização da biossíntese de polissacarídeos de parede celular vegetal. As
sintetases traduzidas no retículo endoplasmático são transportadas para o complexo de Golgi, onde a maior
parte do processo de produção de polímeros ocorre. As vesículas secretoras se fundem com a membrana
citoplasmática e liberam os polissacarídeos da matriz, que é “montada” ao redor das microfibrilas de celulose
em fase de biossíntese. Na parede celular, os polímeros são degradados, fornecendo açúcares que irão servir
para a síntese de UDP e GDP-açúcares. As moléculas no complexo de Golgi aparecem separadamente por
conveniência. AGP = arabinogalactano-proteína; Fuc-XG = xiloglucano fucosilado; GAX = glucuronoarabi-
noxilano; Me-PGA = ácido poligalacturônico metil-esterificado; GCM=glucanos de cadeia mista; RG = ramno-
galacturonano; XG = xiloglucano; PGA = ácido poligalacturônico; CT = sítio de catalise; SAM = S-adenosil-
metionina. Adaptada de Buckeridge e Tiné (2001).

mificados (chamados de mananos puros) ocor- durante a biossíntese. Em Leguminosae, não


rem principalmente em espécies Rubiaceae e são encontrados mananos puros, mas o grau
Palmae. Acredita-se que, nesta última família, de ramificação é, no mínimo, de uma unidade
os mananos confiram dureza ao endosperma. de galactose a cada quatro unidades de manose.
Há evidências de que muitos mananos puros Acredita-se que a causa dessa variação nas ra-
são sintetizados como galactomananos, que zões manose:galactose entre 1 e 4 em Legumi-
têm suas ramificações com galactose retiradas nosae esteja relacionada à faixa de solubilida-
GERMINAÇÃO 43

HO OH HO OH Manose
O O
HO HO
OH O OH O OH OH

HO O HO O O HO O O HO O O HO OH
OH OH OH OH
HO O OH HO O OH HO O OH HO O OH
O O O O
OH OH OH O OH
HO
Galactose
O
HO OH

 Figura 2.4
Estrutura química do galactomanano. Adaptada de Buckeridge, Dietrich e Lima (2000a).

de dos galactomananos em água, pois acima cipal. Foram realizados experimentos demons-
de uma razão igual a 4 os galactomananos se trando que o grau de ramificação do galacto-
tornam insolúveis. manano pode ser manipulado in vitro pela varia-
As primeiras observações de mucilagens ção nas concentrações de GDP-manose no meio
presentes em endospermas de Colutea breviata, de incubação, em condições de saturação de
Indigofera hirsuta, Tetragonolobus purpureus e Tri- concentração de UDP-galactose.
gonella foenum-graecum foram feitas no fim do Em estudos comparativos envolvendo se-
século XIX. Tais observações indicavam que os mentes em desenvolvimento de três espécies
polímeros eram formados primeiramente no in- com galactomananos com graus de ramificação
terior da célula e, posteriormente, depositados alto (razão manose:galactose=1), médio (ra-
na parede celular do endosperma. Já no terço zão=2,5) e baixo (razão=3,5) (respectivamente
final do século XX, estudos sobre a deposição Trigonella foenum-graecum, guar e Senna occiden-
do galactomanano foram retomados e obser- talis), foram acompanhadas as atividades de
vou-se em sementes de Trigonella foenum-grae- manosil transferase (Mantran) e Galtran du-
cum que a síntese de galactomanano está asso- rante a maturação das sementes e viu-se que
ciada com os espaços entre as cisternas do retí- ambas as enzimas apresentavam um pico de
culo endoplasmático rugoso, sendo o polissa- atividade quando a velocidade de formação do
carídeo secretado para a parede celular via com- galactomanano era máxima. Enquanto as ra-
plexo de Golgi. zões entre manose e galactose nos polímeros
Mais tarde, foi demonstrado que prepara- de sementes de Trigonella foenum-graecum e guar
ções de membrana, obtidas de endospermas de eram constantes durante todo o período de de-
feno grego, eram capazes de transferir [14C]- senvolvimento, em sementes de Senna occiden-
manose a partir de GDP-[U-14C]-manose para talis o grau de ramificação com galactose dimi-
um polissacarídeo solúvel que não podia ser dis- nuiu. Essa diminuição está associada com o au-
tinguido de galactomanano. Preparações enzi- mento concomitante de uma α-galactosidase
máticas particuladas (de membrana), isoladas no endosperma. Verificou-se com isso que, em
de endosperma de Trigonella foenum-graecum e Trigonella foenum-graecum e guar, o controle ge-
Cyamopsis tetragonolobus (guar) em desenvolvi- nético da ramificação dos galactomananos com
mento, eram altamente efetivas na formação galactose tem base apenas no mecanismo de
de polissacarídeo a partir de GDP-manose ou biossíntese, enquanto em Senna occidentalis, o
por uma mistura de GDP-manose e UDP-ga- galactomanano produzido seria um resultado
lactose. No entanto, a atividade de galactosil- do mecanismo de biossíntese associado a um
transferase (Galtran) não foi observada sem a processo de desramificação parcial do polímero
presença de GDP-manose, indicando que a Gal- por uma α-galactosidase. Posteriormente, a α-
tran é dependente da formação da cadeia prin- galactosidase de endosperma em desenvolvi-
44 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

mento de Senna occidentalis foi clonada e como reservas de sementes. Os mais conhecidos
seqüenciada, e verificou-se que se tratava da são os xiloglucanos, presentes em sementes de
mesma enzima produzida durante o processo Hymenaea courbaril (jatobá), Copaifera langsdorffii
de hidrólise do galactomanano após a germi- (copaíba) e Tamarindus indica (tamarindo), e os
nação. Um fenômeno similar também foi veri- arabinogalactanos, presentes em sementes de
ficado em sementes de café. espécies do gênero Lupinus (tremoço), do café
Recentemente, o grupo do professor J. S. e de diversas espécies da família Vochysiaceae,
Grant Reid, na Escócia, purificou, clonou e se- característica do cerrado brasileiro (Mayworm,
qüenciou uma das enzimas da via de biossín- Buckeridge e Salatino, 2000).
tese do galactomanano produzido em sementes
de Trigonella foenum-graecum: a galactosil trans- Lipídeos
ferase (Galtran), que é capaz de adicionar uni- Os lipídeos são armazenados em organelas
dades de galactose a cadeias de manano. Utili- específicas conhecidas como corpos lipídicos,
zando sondas desenhadas a partir da seqüência que variam de 0,2 a 6 μm de diâmetro. Eles são
da Galtran de Trigonella foenum-graecum, o grupo depositados sob a forma de triglicerídeos, nos
conseguiu encontrar os genes que codificam quais três ácidos graxos estão ligados a um gli-
para a mesma enzima em sementes de Senna cerol (Figura 2.5). Embora a composição exata
occidentalis e Cyamopsis tetragonologus, esta última de ácidos graxos varie de espécie para espécie,
utilizada como uma das principais fontes de os ácidos palmítico (16:0), oléico (18:1 Δ9) e
espessantes para a indústria alimentícia. linoléico (18:2 Δ9,12) geralmente ocorrem em
Os polissacarídeos de reserva de parede ce- maior quantidade, podendo compor até 60% da
lular possuem propriedades hidrodinâmicas massa de algumas sementes oleaginosas.
que têm permitido seu uso em diversos setores Além dos nomes comuns, é possível utilizar
da indústria. Em solução aquosa, eles apresen- uma nomenclatura de ácidos graxos com base
tam alta viscosidade e, por isso, funcionam no comprimento da cadeia, no número e na
como espessantes em diversos produtos ali- posição das ligações duplas. Por esse método,
mentícios industrializados. Quando consumi- o ácido palmítico, por exemplo, é descrito como
dos por humanos, são importantes fibras ali- 16:0, ou seja, um ácido graxo de 16 carbonos e
mentares, pois evitam o excesso de absorção nenhuma insaturação (sem ligações duplas).
de gorduras e açúcares, interferindo assim em O ácido oléico é definido como 18:1 Δ 9, ou seja,
importantes doenças, como a hipercolestero- um ácido graxo de 18 carbonos com uma insa-
lemia e o diabetes (Buckeridge e Tiné, 2001). turação entre os carbonos 9 e 10 da cadeia. O
É importante lembrar que alguns dos polis- ácido linoléico, por sua vez, por ter duas ligações
sacarídeos de reserva de parede celular (mana- duplas (nos carbonos 9 e 12), é descrito como
nos e galactanos) são consumidos com alimen-
tos de origem vegetal e, portanto, são compo-
nentes importantes da dieta humana. Um exem-
O
plo é o café, em que ambos os polímeros citados
constituem mais de 50% dos sólidos solúveis. O CH2O C R1
Assim, compreender os processos de bios- R2 C OCH O
síntese de polissacarídeos de reserva de parede CH2O C R3
celular poderá ser de grande relevância no início
deste século, uma vez que será possível utilizar  Figura 2.5
os conhecimentos acerca da biologia molecular Estrutura de um triglicerídeo. As três cadeias de áci-
dos graxos estão ligadas a um esqueleto de glicerol
como ferramentas para alterar e adaptar esses (negrito). A carboxila ligada ao glicerol representa o
polímeros de forma a melhorar a saúde humana. carbono 1 da cadeia de ácido graxo, enquanto R1, R2
Além do galactomanano, outros polissaca- e R3 representam o resto da cadeia, que pode ou não
rídeos de parede celular podem ser acumulados ser diferente.
GERMINAÇÃO 45

18:2 Δ 9,12. Outros ácidos graxos que ocorrem enzima A ou a uma proteína carreadora (Bew-
em sementes são o ácido láurico (12:0), o ley e Black, 1994) (Figura 2.6).
petroselênico (18:1 Δ16) e ainda o ricinoléico, A biossíntese de triglicerídeos envolve di-
que possui uma cadeia de 18 carbonos com uma versas organelas. Os ácidos graxos são produzi-
hidroxila no carbono 12 e uma ligação dupla dos em plastídeos a partir de acetil-CoA, sendo
entre os carbonos 9 e 10 (12-OH 18:1 Δ 9). transferidos para o retículo endoplasmático liso
Os lipídeos não são depositados sob a forma (REL), onde sofrem modificações como forma-
de ácidos graxos livres, mas sob a forma de tri- ção de insaturações (ligações duplas) e adição
glicerídeos. Sua biossíntese envolve pelo menos de hidroxilas. Com isso, forma-se no REL um
três etapas: (1) a produção do esqueleto princi- banco de ácidos graxos que são transferidos por
pal de glicerol, (2) a formação dos ácidos graxos um carreador (CoA ou uma proteína carreado-
e (3) a esterificação do glicerol com as cadeias ra) para o glicerol, gerando os triglicerídeos que
de ácidos graxos. Durante todo o processo, não se acumulam na membrana (Figuras 2.6 e 2.7).
há nem glicerol nem ácidos graxos livres, mas Esse acúmulo de lipídeos na membrana gera
glicero 3-fosfato e ácidos graxos ligados à co- uma protuberância que, eventualmente, se se-

SEMENTE PLANTA-MÃE
sacarose sacarose fotossíntese

hexose-P triose-P glicerol 3-P citosol

PEP piruvato
CO2
mitocôndria
piruvato
OAA corpos lipídicos
acetil-CoA
malato triglicerídeos
acetato

hexose-P triglicerídeos
CO2
triose-P acetato plastídeo retículo endoplasmático

piruvato outras modificações

oleoil-ACP oleato oleoil-CoA


acetil-CoA
CO2
estearoil-ACP estearato estearoil-CoA
malonil-CoA
banco de
palmitoil-ACP palmitato palmitoil-CoA
ácido graxo-CoA
malonil-ACP

 Figura 2.6
Via de biossíntese de triglicerídeos em sementes. O carbono gerado pela planta-mãe, à qual a semente está
ligada, é importado pela semente na forma de sacarose. Uma vez nas células da semente, o carboidrato é
metabolizado, gerando os elementos necessários à síntese dos lipídeos de reserva. A biossíntese ocorre em
três etapas principais: a síntese do ácido graxo a partir de acetil-CoA (nos plastídeos), a produção de glicerol
3-fosfato (no citosol) e a ligação desses elementos, formando triglicerídeos (no retículo endoplasmático liso).
O acúmulo destes na membrana leva à protrusão do corpo lipídico a partir da membrana do REL. ACP=
proteína carreadora, CoA= coenzima A, OAA= oxalacetato; PEP= fosfoenol piruvato.
46 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

RE

RE RE
B ou CL

CL

oleosina triglicerídeo fosfolipídeo

 Figura 2.7
Formação de corpos lipídicos (CP) a partir do retículo endoplasmático (RE). (A) Os triglicerídeos são acumu-
lados na membrana do RE (cinza) e formam uma protuberância que eventualmente se destaca e forma uma
outra organela: o corpo lipídico que pode ou não estar ligado ao RE original; ou (B) esquema mostrando a
organização de um corpo lipídico. Além dos triglicerídeos originados na membrana do RE, a interface entre
as fases hidrofílica e hidrofóbica é estabilizada por proteínas (oleosinas). Os componentes não estão em
escala.

para do REL e forma um corpo lipídico. Em al- se varia durante a maturação da semente, o que
gumas espécies, essa separação das organelas faz com que a composição de lipídeos da se-
é total, mas em outras, uma ligação entre as or- mente não seja constante ao longo do processo
ganelas (REL e corpo lipídico) pode ser mantida. de deposição dos lipídeos.
Como o interior do corpo lipídico é composto Inseridas na membrana dos corpos lipídicos
por moléculas hidrofóbicas, há apenas uma ca- estão proteínas entre 15 e 26KDa, chamadas
mada de fosfolipídeos na membrana simples da oleosinas. Algumas funções foram propostas
organela (Bewley, 2001) (Figura 2.7). para essas enzimas, como, por exemplo, (1)
A composição de ácidos graxos varia pouco estabilização estrutural da membrana; (2)
entre sementes de uma mesma espécie. Um dos aumento da carga residual do corpo protéico, o
mecanismos que parece regular isso é a ativida- que impede que os corpos se fundam (ver Pro-
de da tio-esterase. Esta enzima hidrolisa o ácido teínas, a seguir); (3) possível sítio de ancora-
graxo do complexo de biossíntese, separando- mento das enzimas de degradação no corpo li-
o da proteína carreadora e liberando ácido graxo pídico durante a mobilização das reservas; e (4)
livre, que é, então, transportado para o REL. regulação da atividade das lipases sobre os tri-
Em cada planta, as isoformas de tio-esterase glicerídeos do corpo lipídico. De fato, a ativida-
possuem afinidades distintas por ácidos graxos de proteolítica sobre as oleosinas parece ser um
com diferentes comprimentos de cadeia. Se- importante ponto de controle da mobilização
mentes cuja tio-esterase tem afinidade por ca- dos triglicerídeos, o que sugere que a função
deias mais curtas tendem a acumular ácidos das oleosinas vai além da integridade estrutural
graxos de cadeia mais curta. Essa característica, do corpo lipídico.
associada às demais modificações que ocorrem
no REL, gera um padrão de composição lipídi- Proteínas
ca característico de cada espécie. É importante Síntese e deposição de proteínas de reserva
notar que a atividade dessas vias de biossínte- em sementes. O principal sistema de classifica-
GERMINAÇÃO 47

ção de proteínas vegetais, com base na solubili- nação de funções como reserva e proteção
dade em uma série de solventes (“frações de (Bewley, 2001).
Osborne”), foi desenvolvido por Osborne Os principais grupos de proteínas de reserva
(1924). Tal sistema classifica quatro grandes (PR) incluem as quatro frações de solubilidade
grupos de proteínas que estão presentes em vá- de Osborne. Prolaminas são as principais proteí-
rios tipos de tecidos vegetais, incluindo semen- nas de reserva em cereais e em gramíneas selva-
tes: (a) Albuminas, solúveis em água e coagu- gens. As Glutelinas estão presentes no trigo,
láveis por aquecimento. Apresentam-se em pe- no milho e em outros cereais e estão relaciona-
quenas quantidades em algumas sementes, in- das estruturalmente às Prolaminas, mas são in-
cluindo cereais e legumes. (b) Globulinas, in- solúveis em soluções alcoólicas devido à pre-
solúveis em água e solúveis em soluções sali- sença de ligações de enxofre. As Globulinas são
nas. Estão presentes em muitas sementes e as principais componentes das PR da maioria
podem ser obtidas facilmente em forma crista- das dicotiledôneas. Estas últimas são classifi-
lina. (c) Prolaminas, solúveis em álcool (60 a cadas em dois grupos em relação ao coeficiente
70% v/v), mas não em água nem em soluções de sedimentação: vicilinas (7-8S) e leguminas
salinas. Estão presentes em cereais e são ricas (11-12S). As Albuminas (2S) também são am-
em prolina e amidas. (d) Glutelinas, insolúveis plamente encontradas em dicotiledôneas, ocor-
em soluções aquosas neutras ou salinas e em rendo junto com as leguminas (Quadro 2.2).
álcool, mas podem ser extraídas em soluções No desenvolvimento das sementes de plan-
básicas (Shewry e Casey, 1999). tas superiores, o retículo endoplasmático (RE)
Classificações mais modernas baseiam-se é o local de síntese das PR, que são posterior-
em dois critérios: função e relações bioquímicas mente transportadas até seu local de acúmulo,
e moleculares. Em termos de função, podemos os vacúolos de reservas chamados corpos pro-
classificá-las em três classes principais: (a) pro- téicos. A síntese e a deposição dessas proteínas
teínas de reserva, cuja função é armazenar ni- estão sujeitas a uma regulação espacial e tem-
trogênio, carbono e enxofre; (b) proteínas es- poral, sendo que, em cada espécie, podem apa-
truturais e metabólicas (housekeeping), que são recer em diferentes estágios do desenvolvimen-
essenciais para o crescimento e a estrutura da to (Herman e Larkins, 1999).
semente; e (c) proteínas de proteção, que po- Na maioria das dicotiledôneas e das gim-
dem conferir resistência a patógenos microbia- nospermas, a formação dos corpos protéicos en-
nos, invertebrados ou dessecação. Em alguns volve a fragmentação de um grande vacúolo
casos, a proteína pode apresentar uma combi- central após as PR terem sido transportadas dos

Quadro 2.2 Distribuição dos tipos de proteínas de reserva em sementes de várias plantas
economicamente importantes

2S Albuminas 7 – 8S Globulinas 11 – 12S Globulinas Prolaminas

Componentes Leguminosae Leguminosae Leguminosae Cereais


principais Cruciferae Cruciferae
Asteraceae Asteraceae
Algodão Algodão
Castanha-do-pará Castanha-do-pará
Mamona
Palmae
Cacau
Componentes — Cereais Feijão Arroz
menores Aveia
48 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

locais de síntese. Em geral, o transporte das PR gem, formação de ligações dissulfídicas e pro-
pode ocorrer por meio do complexo de Golgi cessamento proteolítico. No local de síntese, is-
(glutelinas do arroz, algumas prolaminas de to é, no RE, as proteínas possuem peptídeos
trigo e globulinas das leguminosas), mas, em sinalizadores que as direcionam para o lúmen,
alguns cereais, ocorre a formação direta do cor- onde os sinalizadores são removidos por cliva-
po protéico a partir do retículo endoplasmático gem proteolítica. As proteínas são então dobra-
rugoso. Em monocotiledôneas, o corpo protéico das em sua estrutura tridimensional, e as liga-
pode ser simplesmente uma agregação de pro- ções dissulfídicas, quando presentes, são for-
teínas de reserva que são lançadas no citoplas- madas.
ma sem qualquer membrana de proteção. Pode Um aspecto importante do controle da ex-
ainda ser uma vesícula formada pela ruptura pressão gênica das PR é que esta é regulada
do RE, onde as proteínas de reserva são sinteti- pela nutrição da planta, sendo que as PR confi-
zadas. Há também outro tipo de vacúolo com o guram um forte dreno para o nitrogênio exce-
acúmulo de proteínas produzido ao longo do dente. Entretanto, a maioria das proteínas con-
desenvolvimento da semente. São os vacúolos tém enxofre na forma de cisteína e metionina,
líticos que contêm enzimas proteolíticas ácidas e a síntese de PR pode ser restrita sob condições
(hidrolases ácidas), cuja função é hidrolisar de baixa disponibilidade de enxofre. Talvez por
proteínas para o crescimento na fase pós-ger- isso, muitas sementes contenham grupos de PR
minativa, suportando o desenvolvimento inicial que são ricos ou pobres em enxofre, permitindo,
da plântula. desse modo, a manutenção de altos níveis de
A síntese das PR ocorre em períodos bem- síntese sob suprimento nutricional variado
definidos durante o desenvolvimento da se- (Bewley e Black, 1994).
mente, quando os mRNA que codificam as pro-
teínas estão presentes exclusivamente nos teci-
dos de reserva (cotilédones, endosperma, etc.). CONCLUSÕES
A compreensão da regulação dos genes de sínte- Ainda que incompleta, a visão apresentada
se das PR provém dos estudos de sua expressão permite apreciar as principais tendências evo-
em plantas transgênicas. Geralmente, os genes lutivas adotadas pelas plantas para armazenar
das PR são dirigidos por seus próprios promoto- compostos em suas sementes. Essencialmente,
res, que somente são expressos no tecido de o que se conhece é consistente, como a exis-
reserva apropriado da semente transgênica; por tência de um processo de transferência de fun-
exemplo, genes de PR de leguminosas transferi- ções de compostos preexistentes, nas plantas
dos para o tabaco são expressos principalmente sem sementes, para um conjunto de espécies
nos cotilédones e no período de desenvolvimen- que obtiveram extremo sucesso na colonização
to correto, indicando que as regiões reguladoras dos mais diversos ambientes da Terra. Assim,
de diferentes genes de PR carregam a mesma os processos já existentes em órgãos vegetais,
informação e podem ser reconhecidas por fato- como folhas, raízes e caules, teriam sido trans-
res de transcrição similares no núcleo de espé- feridos do sistema de síntese acoplado ao siste-
cies diferentes. Seqüências que controlam a re- ma fotossintético para um acúmulo de quanti-
gulação temporal da expressão e determinam dades apreciáveis de reservas dos principais
a especificidade dos tecidos foram identificadas compostos (proteínas, lipídeos, carboidratos e
para poucas PR, mas revelam que mais de um íons) a serem utilizados pelo embrião em cresci-
promotor é necessário para a expressão tempo- mento durante a germinação e o desenvolvi-
ral e espacial correta (Thomas, Okita e Rogers, mento inicial da plântula.
1996). Um aspecto importante da bioquímica dos
As PR, com poucas exceções, passam por mecanismos de deposição de reservas é que a
várias modificações durante ou após sua sínte- composição química varia muito pouco, mesmo
se, incluindo glicosilação, dobramento e monta- que a planta-mãe encontre variações ambien-
GERMINAÇÃO 49

tais significativas. Normalmente, tais variações cada vez melhor para o consumo alimentar. No
provocam apenas alterações quantitativas, mas início do século XXI, a humanidade sabe como
mantêm sob controle estrito a estrutura de seus manipular geneticamente as plantas, e tal me-
compostos de reserva. canismo poderá permitir o melhoramento de
Há poucos estudos com populações natu- compostos que usamos como alimentos ener-
rais, mas já se sabe, por exemplo, que em popu- géticos (amido e óleos), nutricionais (proteí-
lações distintas de Leucaena leucocephala, os teo- nas) e fibras alimentares (polissacarídeos de pa-
res de galactomananos variam nas sementes, rede). A compreensão dos mecanismos envol-
mas as razões manose:galactose se mantêm vidos nos controles estrutural e quantitativo dos
constantes (Buckeridge, Dietrich, Maluf, 1987). compostos de reserva por meio de estudos ca-
Por outro lado, quando examinamos popula- da vez mais aprofundados sobre a bioquímica,
ções de sementes de Copaifera langsdorffii, oriun- a fisiologia e a ecofisiologia possibilitará a uti-
das da Mata Atlântica e do Cerrado, observamos lização dessas novas tecnologias para auxiliar
que o grau de ramificação do xiloglucano (polis- a produção de melhores alimentos e uma in-
sacarídeo de reserva de parede celular desta serção ecológica mais segura do homem e sua
espécie) variou, sendo mais ramificado e, por- tecnologia na natureza.
tanto, mais solúvel em água no Cerrado do que
na Mata (Buckeridge et al., 1992). Essa obser-
vação indica que o sistema biossintético per- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
mite variações que alteram as propriedades de BEWLEY, J.D. Seed germination and dormancy. The
certos compostos de forma a melhorar o desem- Plant Cell, v. 9, p. 1055-1066, 1997.
penho da germinação (no caso, o xiloglucano _____. Seed germination and reserve mobilization.
em copaíba se correlaciona também com o pro- Encyclopedia of Life Sciences. Disponível em: <
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no Capítulo 10). BEWLEY, J.D.; BLACK, M. Seeds: physiology of
A característica de manter uma certa rigi- development and germination. 2nd ed. New York:
dez em relação aos mecanismos que determi- Plenum press, 1994
nam a estrutura química dos compostos de re- BUCKERIDGE, M.S.; REID, J.S.G. Major cell wall
serva parece estar relacionada ao fato de que storage polysaccharides in legume seeds: structure,
catabolism and biological functions. Ciência e Cultura, v.
eles terão que ser mobilizados quando da ger-
48 p. 153-162, 1996.
minação e do estabelecimento das plântulas. E
como isso ocorrerá em uma época distinta do BUCKERIDGE, M.S.; TINÉ, M.A.S. Composição
polissacarídica: estrutura da parede celular e fibra ali-
período de maturação, a composição e a estru-
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tura química dos compostos de reserva não po- DE PENNA, E.; MENEZES, E.W. Fibra dietética em
dem se alterar; se isso ocorresse, eles não pode- Iberoamérica: tecnologia y salud. Obtención,
riam ser mobilizados, uma vez que as enzimas caracterización, efecto fisiológico y aplicación en ali-
de hidrólise apresentam alta especificidade mentos. Projeto CYTED XI.6. São Paulo: Varela, 2001.
pelos compostos. Parece, portanto, existir uma p. 43-60.
ligação funcional entre os processos de deposi- BUCKERIDGE, M.S.; DIETRICH, S.M.C.; LIMA, D.U.
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a qual permite à semente assegurar máxima
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eficiência em seu estabelecimento no ambiente. 2000a. p. 283-316.
Estudos acerca dos processos de deposição
BUCKERIDGE, M.S.; DIETRICH,S.M.C.; MALUF, A.M.
de reserva são fundamentais do ponto de vista
Galactomananos de sementes de diferentes populações
tecnológico. Durante séculos, o homem vem de Leucaena leucocephala. Rev.Brasil.Bot., v. 10, p. 25-27, 1987.
aperfeiçoando o desempenho da maturação de
BUCKERIDGE, M.S.; ROCHA, D.C.; REID, J.S.G.;
frutos para produzir quantidades cada vez
DIETRICH, S.M.C. Xyloglucan structure and post-
maiores de compostos de reserva com qualidade
50 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

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C A P Í T U L O 3

DESENVOLVIMENTO DE SEMENTES
E CONTEÚDO DE ÁGUA
Renato Delmondez de Castro
Kent J. Bradford
Henk W. M. Hilhorst

O ciclo de vida em plantas superiores compre- 3.1C) tem contribuído com indícios sobre os pro-
ende o desenvolvimento de uma semente se- gramas regulatórios que controlam ambos os pe-
guido por sua germinação e o desenvolvimento ríodos (Chlan e Dure, 1983; Dure, 1985; Peng e
pós-germinativo por meio do crescimento da Harberd, 2002; Nambara e Marion-Poll, 2003).
planta. Conforme pode ser visto na Figura 3.1, Ao longo das décadas, diversas espécies tor-
ambos os períodos são marcados por eventos naram-se modelos para o estudo da biologia
fisiológicos específicos relacionados às mudan- da semente. Sementes da Pisum sativum (ervi-
ças distintas no peso fresco, no peso seco e no lha) foram usadas extensivamente para o estu-
conteúdo de água, além de padrões distintos do do desenvolvimento de sementes e da parti-
de expressão de genes representados pelo acú- ção de assimilados (Wang e Hedley, 1991).
mulo de mRNAs específicos. A água acaba por Grãos de cereais têm sido usados para revelar
ter um papel-chave em todos esses processos, as rotas e o controle da mobilização do endos-
na medida em que a semente muda de um esta- perma pela camada de aleurona. Em Zea mays
do metabolicamente ativo para um estado inativo (milho) e Triticum aestivum (trigo), estudos ex-
após a maturação, por efeito da dessecação, re- tensivos foram empreendidos para aprimorar
tornando depois ao estado metabolicamente ativo a qualidade da semente, tanto para a melhoria
durante a germinação (Bewley e Black, 1994; do estande como para o valor nutritivo (Fincher,
Kermode, 1995; De Castro e Hilhorst, 2000). 1989; Jones e Jacobsen, 1991). As sementes de
Os processos morfológicos e fisiológicos que Arabidopsis thaliana (arabidopsis) estão em uso
ocorrem durante o desenvolvimento e a germi- para estudos genéticos e moleculares, empre-
nação da semente têm sido extensivamente es- gando grandes grupos de mutantes (Feldman,
tudados e descritos (Figura 3.1A e B). Entretan- Malmberg e Dean, 1994; Meinke et al., 1998).
to, informações sobre os mecanismos regula- A semente de Lycopersicon esculentum (tomate)
tórios que controlam esses processos começa- tem sido usada para estudar a fisiologia e a bio-
ram a surgir somente após a introdução de téc- química do desenvolvimento da semente, a ger-
nicas genéticas e moleculares (Bewley e Black, minação e a dormência (De Castro e Hilhorst,
1994; Goldberg, De Paiva e Yadegari, 1994; 2000).
Harada, 1997; Raghavan, 1997). A análise das Com tudo isso, a compreensão sobre os pro-
mudanças nos padrões da expressão de genes cessos envolvidos no desenvolvimento e na ger-
que ocorrem durante o desenvolvimento da se- minação de sementes expandiu dramaticamen-
mente e o crescimento pós-germinativo (Figura te ao longo das últimas décadas. Contudo, há
52 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Desenvolvimento Germinação e crescimento

Histodiferenciação Crescimento
(morfogênese) Maturação Dessecação pós-germinativo
(expansão) Germinação
Semente
seca

A
Divisão celular Metabolismo Metabolismo Mobilização
reduzido reativado de reservas
Expansão celular Respiração,
Deposição de reservas síntese de ácidos
nucléicos e
proteínas
Quiescência
(semente seca madura) Alongamento
celular
Dormência
(em alguns casos) Divisão celular

Reparo de
membranas
e DNA

Intolerante à
Intolerante à dessecação Tolerante à dessecação dessecação

B
Conteúdo de água, % peso fresco (———)

C Peso fresco (— —) e peso seco (.........)

Constitutivos

Embrião-específico

Embriogênese
Proteínas LEA
inicial
Proteínas de reserva abundantes na
embriogênese tardia

LEA / germinação

Germinação-específico

 Figura 3.1
Desenvolvimento e germinação de sementes. Um esquema geral de eventos associados com as diferentes
fases de desenvolvimento, germinação e crescimento pós-germinativo de sementes, incluindo (A) ciclo celular,
eventos metabólicos e de reparo e períodos em que a semente (embrião) é intolerante ou tolerante à desse-
cação; (B) mudanças no peso fresco, no peso seco e no conteúdo de água de sementes inteiras; (C) padrão
de expressão de genes em estádios específicos, por meio de uma representação conceptual do acúmulo de
sete conjuntos de mRNA que ocorrem durante o desenvolvimento da semente. Adaptada a partir de Dure
(1985), Kermode (1995), Comai e Harada (1990) e De Castro e Hilhorst (2000).
GERMINAÇÃO 53

muito a ser aprendido sobre o controle do de- lativo ao peso seco) diminui, enquanto a maté-
senvolvimento, principalmente nos níveis mo- ria seca substitui a água nas células. Finalmen-
lecular e hormonal. Eventos como a dormência te, o desenvolvimento da maioria das sementes
(ver Parte 2) e a tolerância à dessecação, assim termina com uma fase pré-programada da seca-
como muitos outros assuntos de importância gem de maturação ou dessecação (Figura 3.1A
primordial na ciência da semente devem ser e B). Caracteristicamente, essas sementes são
ainda desvendados. Isso significa que muito es- chamadas ortodoxas porque se submetem a al-
tudo integrado e interdisciplinar ainda é reque- gum grau de secagem ou de dessecação caracte-
rido na ciência das sementes stricto sensu, a fim rístico em função de um declínio rápido do con-
de compreendermos melhor sua função e seu teúdo de água e da diminuição do peso fresco
comportamento. (Bewley e Black, 1994). Isso resulta em uma
redução gradual no metabolismo da semente,
e o embrião passa para um estado de metabolis-
FASES DO DESENVOLVIMENTO mo mínimo ou estado quiescente. Sementes or-
DE SEMENTES todoxas e outras estruturas tolerantes à desse-
Na maioria das sementes, o desenvolvimento cação, como esporos e grãos de pólen, são exclu-
pode ser dividido convenientemente em três fa- sivas quanto ao grau de perda de água tolerado:
ses confluentes (Figura 3.1). A primeira fase é 90 a 95% da água é removida durante o desen-
caracterizada pelo crescimento inicial devido volvimento e a dessecação (Black e Pritchard,
primeiramente à divisão celular e a um aumen- 2002). Nesse estado desidratado, a semente
to rápido no peso fresco da semente inteira e pode sobreviver aos estresses ambientais e, a
no conteúdo de água. Nessa fase, a água repre- menos que esteja dormente, recomeçará a ativi-
senta a maior parte do peso da semente (Figu- dade metabólica, o crescimento e o desenvolvi-
ras 3.1A e B). Como descrito no Capítulo 1, du- mento quando as circunstâncias condutoras à
rante essa etapa, a histodiferenciação e a mor- germinação e ao crescimento forem fornecidas
fogênese da semente acontecem à medida que (Figura 3.1), conforme revisto nos Capítulos 8
o zigoto unicelular se submete a divisões mitó- e 9.
ticas extensivas, e as células resultantes se di-
ferenciam para dar forma ao plano básico do
corpo do embrião (o eixo embrionário e os co- RELAÇÃO FONTE-DRENO NO
tilédones) (Yadegari e Goldberg, 1997). Simul- DESENVOLVIMENTO DE
taneamente, há a formação do endosperma (ou SEMENTES
xenófito, Capítulos 1 e 4) triplóide nas angios- As sementes são dependentes de outras partes
permas ou do megagametófito haplóide nas da planta como fontes de matéria-prima para
gimnospermas (Bewley e Black, 1994). A divi- o crescimento e o acúmulo de reservas (Egli,
são de células acaba relativamente cedo no de- 1998). Obviamente, as folhas são a fonte primá-
senvolvimento da semente. Depois disso, há ria de açúcares produzidos por meio da fotos-
uma fase intermediária de maturação, na qual síntese; mas, em algumas plantas, os tecidos
a semente aumenta de tamanho devido, princi- verdes do fruto também contribuem substan-
palmente, à expansão das células e à deposi- cialmente. Somada à fotossíntese atual, a re-
ção de reservas (normalmente proteínas junto mobilização de carboidratos e particularmente
com lipídeos ou carboidratos) inicialmente nos de aminoácidos (que contêm nitrogênio) de ou-
tecidos de armazenamento (nos cotilédones, no tras partes da planta também pode contribuir
endosperma ou no megagametófito) (Figura para o crescimento da semente. Nutrientes
3.1A e B). Durante essa fase, os vacúolos dimi- minerais são absorvidos pelas raízes e transpor-
nuem de tamanho à medida que os compostos tados principalmente pelo xilema para os brotos
de armazenamento se acumulam e o peso seco e as folhas. Nesses locais, entretanto, tais nu-
aumenta (Capítulo 2). O conteúdo de água (re- trientes são transferidos para a seiva do floema
54 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

e redistribuídos até a semente em desenvolvi-


mento. Todos esses processos são inteiramente
Membrana
dependentes da água e estão em balanço com apoplástica Alta concentração
a sua disponibilidade e com os mecanismos e semipermeável apoplástica de
rotas de absorção e circulação da água dentro solutos na testa

da planta. Como base de todos os processos bio-


lógicos, a água é essencial como carreador de
nutrientes, assim como para todos os proces-
H2O Solutos
sos metabólicos no desenvolvimento da semen-
te. Conseqüentemente, a água e os nutrientes SEMENTE

se movem da planta-mãe para a semente por Embrião


um processo metabolicamente ativo. Apoplasto
A matéria-prima para o crescimento da se-
mente chega quase que exclusivamente pela
seiva do floema. O transporte ou translocação Floema
de seiva via floema é dirigido pela pressão ge-
Solutos
rada por um gradiente osmótico no crivo dos
chamados elementos seletivos (ou células sele-
tivas) e pelas células companheiras do floema FOLHA
(Taiz e Zeiger, 1998). O floema é carregado de
açúcares e outros solutos pelos tecidos-fonte H2O
(como as folhas), causando um influxo da água
e a geração de pressão (Figura 3.2). Nos tecidos- Xilema
Transpiração
dreno (frutos e sementes), os solutos são des-
carregados do floema, resultando no efluxo da
água e em uma redução da pressão nos elemen-
tos seletivos e nas células companheiras do floe-
H2O
ma. O gradiente de pressão dos tecidos da fonte
para os tecidos do dreno conduz o fluxo maciço  Figura 3.2
de seiva do floema, disponibilizando a água e Relações fonte-dreno em sementes em desenvolvi-
os solutos para os tecidos do dreno (Figura 3.3). mento. Tanto água como solutos são transportados
O transporte do xilema para a semente é muito como seiva para a semente via floema. O descarrega-
mento do floema ocorre no tegumento da semente,
limitado, visto que a semente inclusa no fruto
e os solutos são então translocados e absorvidos pelo
geralmente não transpira e, conseqüentemente, embrião (e/ou endosperma) a partir do apoplasto. O
não extrai a água do xilema. De fato, há evidên- excesso de água é redistribuído para a planta via
cias indicando que o floema descarrega mais xilema, passando por uma membrana apoplástica se-
água na semente do que é transpirado, e que a mipermeável que retém os solutos. Adaptada a par-
água realmente recircula das sementes em de- tir de Bradford (1994).
senvolvimento de volta para a planta por meio
do xilema (Peoples et al., 1985). Sugere-se que
a recirculação da água de volta para a planta evaporação, a partir da superfície das estruturas
também seja parte do mecanismo e da rota da circunvizinhas da semente (Nechiporenko e Ry-
perda de água das sementes nos estágios mais balova, 1983; Goncharova et al., 1985).
tardios do desenvolvimento, durante o período Não se tem evidência de qualquer conexão
da secagem de maturação ou dessecação (Me- simplástica direta (citoplasmática) entre a testa
redith e Jenkins, 1975). Uma outra sugestão é ou tegumento da semente e o embrião ou en-
a existência de um mecanismo passivo por meio dosperma. Dessa forma, os tecidos do embrião
do qual a água é perdida principalmente por são separados do sistema simplástico da planta-
GERMINAÇÃO 55

Rota / sentido transportado primariamente como aminoácido,


sobretudo glutamina e asparagina. Os nutrientes
Fonte Dreno
minerais também chegam à semente pelo
floema, em alguns casos conjugados a proteínas
específicas, como no exemplo do acúmulo e do
transporte de ferro pela proteína ferritina.
O suprimento de assimilados tem um im-
pacto primordial no número de embriões fertili-
zados que continuam a se desenvolver até a ma-
turidade. A maioria das plantas produz muito
mais óvulos potenciais do que pode realmente
Yp alto Yp baixo
suportar para o desenvolvimento em sementes
 Figura 3.3 maduras. Fatores que reduzem a fotossíntese,
Mecanismo de fluxo de pressão do transporte via floe- tais como o estresse hídrico, o sombreamento
ma. Os solutos são carregados no floema pelos teci-
ou a desfoliação, podem diminuir drasticamen-
dos da fonte (como as folhas), criando uma concentra-
ção elevada que conduz o influxo osmótico de água, te o sucesso no vingamento das sementes. Des-
gerando uma pressão de turgor elevada (Ψp). Nos sa forma, estresses ambientais durante o
tecidos do dreno, o descarregamento de solutos re- florescimento e o desenvolvimento inicial da
sulta no movimento de água para fora do floema, re- semente podem ter efeitos drásticos no rendi-
duzindo a pressão de turgor. A diferença de pressão
mento potencial da planta e da lavoura por in-
entre os tecidos da fonte e do dreno conduz o movi-
mento da quantidade maciça de conteúdos do floema. duzirem o aborto de sementes imaturas. No mi-
Adaptada a partir de Wolswinkel (1992). lho, mesmo sendo relativamente suave, o es-
tresse hídrico logo após a polinização pode cau-
sar o aborto de um grande número de embriões,
mãe e devem receber todos os seus nutrientes enquanto o estresse hídrico mais tardio durante
por meio do apoplasto (espaço extracelular das o desenvolvimento da semente tem efeito me-
paredes celulares) em algum ponto nessa traje- nor (Westgate e Boyer, 1986). Isso acontece de-
tória. Isso ocorre no pericarpo, no pedicelo ou vido à redução no suprimento de sacarose ao
nos tecidos da calaza em monocotiledôneas ou ovário, visto que é possível verificar a inversão
nos tegumentos de dicotiledôneas. O descarre- desse efeito por meio da infusão artificial de
gamento do floema ocorre de forma simplástica sacarose diretamente no caule da planta, sem
por meio dos plasmodesmatas que conectam que as relações hídricas da planta sejam sig-
os citoplasmas de células adjacentes, mas even- nificativamente alteradas (Zinselmeier, Lauer
tualmente os açúcares, os aminoácidos e outros e Boyer, 1995). Estudos em diversas espécies
nutrientes devem ser liberados das células de de plantas indicam que um suprimento mínimo
efluxo para o apoplasto e reabsorvidos por célu- inicial de assimilados é necessário para o vin-
las de influxo no embrião e no endosperma (Pa- gamento da semente e que um suprimento
trick e Offler, 2001; Borisjuk et al., 2002). crescente de assimilados totais permite que um
A composição do fluido do floema varia, maior número de sementes vingadas continue
mas a sacarose é o principal açúcar transporta- a se desenvolver (Egli, 1998).
do na maioria das plantas. Nas monocotiledô-
neas, ela é convertida em glicose e frutose por
meio da enzima invertase enquanto é descar- FISIOLOGIA DO
regada do floema, sendo em seguida ressinte- DESENVOLVIMENTO
tizada após a absorção pelo embrião ou endos- DE SEMENTES
perma. Nas dicotiledôneas, a sacarose geral- Embora muito do interesse humano por semen-
mente não é quebrada durante a transferência tes esteja associado, do ponto de vista nutri-
do tegumento para o embrião. O nitrogênio é cional, à sua composição, a finalidade biológica
56 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

de uma semente é germinar e estabelecer uma maturação. O último componente da qualida-


nova planta. Assim, o desenvolvimento da ca- de da semente a se desenvolver é a habilidade
pacidade germinativa e, na maioria dos casos, de sobrevivência prolongada no estado seco, ou
a habilidade em manter essa capacidade após longevidade no armazenamento (Sanhewe e
a dessecação e a dispersão são aspectos impor- Ellis, 1996b).
tantes da maturação de sementes. Em geral, a
habilidade do embrião em germinar desenvol-
ve-se cedo se a semente for removida do fruto INTERRUPÇÃO DO
prematuramente, mesmo antes do acúmulo de DESENVOLVIMENTO:
peso seco máximo (Figura 3.4). Entretanto, CONTROLE MOLECULAR
nesse estágio, as sementes podem não sobrevi- E DORMÊNCIA
ver à desidratação ou à dessecação. A tolerância Uma vez que as sementes possuem capacidade
a esta desenvolve-se subseqüentemente à aqui- para germinar relativamente cedo ao longo do
sição de capacidade germinativa ou germina- desenvolvimento se removidas do fruto, o que
bilidade, enquanto o vigor da semente (isto é, então as impede de germinar prematuramente
a taxa de germinação) continua a aumentar. A quando ainda estão na planta-mãe? Uma expli-
desidratação prematura nessa fase pode inclu- cação baseia-se no fato de que muitas sementes
sive melhorar a germinação, comparada à de- tornam-se dormentes durante a fase interme-
sidratação de sementes extraídas diretamente diária de maturação, o que as impede de germi-
do fruto sem secagem. A desidratação (ou mes- nar até que estejam plenamente maduras e, fi-
mo uma perda de água relativamente ligeira) nalmente, dispersas. Em muitos casos, essa dor-
faz com que a semente mude o seu programa mência persiste após a dispersão e requer que
de expressão de genes do modo de desenvolvi- condições específicas sejam previamente en-
mento para o modo germinativo (Kermode, contradas para que a germinação ocorra.
1995). Dessa forma, mesmo que as sementes O tema dormência é extensivamente discu-
sejam colhidas prematuramente, depois de se- tido na Parte 2 deste livro. Entretanto, aborda-
cas e reidratadas, iniciarão a germinação em se aqui o controle molecular da dormência e
vez de continuar a expressar o programa de da interrupção do desenvolvimento das semen-
tes pelo hormônio ácido abscísico (ABA). A in-
terrupção do desenvolvimento e a dormência
têm sido associadas por muito tempo à presen-
100 ça do ABA durante o desenvolvimento da se-
Germinação mente (Finkelstein, Gampala e Rock, 2002;
80
% do valor máximo

Koornneef, Bentsink e Hilhorst, 2002). Carac-


60
Tolerância à teristicamente, os níveis de ABA elevam-se du-
dessecação
rante a primeira metade do desenvolvimento e
40 Vigor declinam durante os estágios mais tardios da
maturação, quando o conteúdo de água da se-
20 mente diminui (Figura 3.5). Às vezes ocorrem
Longevidade
dois picos de ABA, como acontece com o
Desenvolvimento após a antese
Phaseolus vulgaris (feijão) e a ervilha. O ABA é
detectado no embrião, no endosperma, na testa
 Figura 3.4 e em tecidos do fruto, como o pericarpo e o te-
Qualidade da semente durante o desenvolvimento.
cido locular que envolve as sementes (Berry e
A germinabilidade e a qualidade da semente aumen-
tam seqüencialmente durante o desenvolvimento. Em Bewley, 1992). Além da supressão da germina-
geral, a habilidade para germinar é a primeira a se ção precoce, a ação do ABA é relacionada tam-
desenvolver, seguida por tolerância à dessecação, vi- bém a vários outros processos do desenvolvi-
gor e longevidade no armazenamento. mento, incluindo-se a síntese de proteínas de
GERMINAÇÃO 57

100 5

Conteúdo de ABA (UA)


80 4
Germinação (%)
60 3

40 2

20 1

0 0

Histodiferenciação Maturação Dessecação

21 28 35 42 49 56 63 70
Dias de desenvolvimento após a antese

 Figura 3.5
Germinabilidade (curvas com círculos) e conteúdo de ABA (curvas com triângulos) durante o desenvolvimento
de sementes de tomate do tipo selvagem (símbolos fechados) e de tomate sitw mutante deficiente em ABA
(símbolos abertos). A germinabilidade das sementes do tipo selvagem aumenta durante a histodiferenciação
(embrião) e diminui durante a maturação devido à aquisição de dormência, em uma relação direta com o
aumento no conteúdo de ABA (Unidade Arbitrária – UA). Quando o conteúdo de ABA se torna mínimo, a
dormência é gradualmente perdida, e a germinabilidade volta a aumentar. As sementes sitw não adquirem
qualquer nível de dormência após a histodiferenciação, mantendo-se completamente germináveis, em uma
relação direta com o conteúdo de ABA, que é bastante baixo durante todo o desenvolvimento. O conteúdo de
ABA não foi medido durante a fase de dessecação em sementes sitw em função da ocorrência de viviparidade
após a maturação. Adaptada a partir de De Castro e Hilhorst (2000).

armazenamento, a indução de proteínas LEA ção de sementes sem dormência (Nambara et


(caracterizadas adiante) e a indução da tolerân- al., 2000; Koornneef, Bentsink e Hilhorst, 2002).
cia à dessecação. Estudos com plantas contendo A Figura 3.5 exibe os padrões do conteúdo de
mutações que inativam genes relacionados à ABA e de germinabilidade durante o desenvol-
biossíntese ou à percepção ao hormônio mos- vimento de sementes de tomate do tipo selva-
tram que o ABA é um importante regulador do gem ou silvestre (Lycopersicon esculentum cv.
desenvolvimento e da dormência de sementes Moneymaker) e de seu mutante deficiente em
(Koornneef et al., 1989). ABA (mutante sitiens – sitw). Os níveis de ABA
O ABA tem sido associado por muito tempo são até 10 vezes mais elevados em sementes de
com a dormência, principalmente porque o hor- tomate do tipo selvagem do que nas sementes
mônio foi detectado tanto em sementes em de- do mutante. As primeiras podem tornar-se
senvolvimento quanto em sementes maduras; completamente dormentes durante a fase de
sabe-se também que o mesmo é inibidor da ger- maturação, ao passo que as sementes do mu-
minação quando aplicado exogenamente. A tante deficiente em ABA mantêm plena ger-
disponibilidade de mutantes deficientes ou que minabilidade. Dessa forma, a deficiência de
não respondem ao ABA, especialmente em ara- ABA durante o desenvolvimento é associada à
bidopsis (Karssen et al., 1993), tomate (Groot e ausência de dormência primária em sementes
Karssen, 1992) e milho (Tan et al., 1997; White maduras (Capítulos 5 e 6). Essa associação
et al., 2000), demonstra claramente que a au- ocorre somente se o embrião contiver o alelo
sência ou a insensibilidade ao ABA durante o Aba dominante. Cruzamentos entre plantas dos
desenvolvimento da semente resulta na forma- tipos selvagem e mutante indicam que o ABA
58 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

materno (localizado em tecidos da testa e do vimento das mesmas, evitando a transição para
fruto) não tem nenhuma influência na dor- o estágio vegetativo ou de crescimento. Em
mência. O aumento no conteúdo de ABA du- outras palavras, as sementes dos mutantes que
rante o desenvolvimento da semente parece ser carecem desses genes tendem a progredir dire-
necessário para que haja a indução de dormên- tamente do padrão de desenvolvimento para o
cia. A manipulação do conteúdo de ABA de se- de crescimento pós-germinativo, sem a inter-
mentes por meio da transformação genética do rupção normal do desenvolvimento que prece-
Nicotiana tabacum (tabaco) mostra que a superex- de a dessecação.
pressão de zeaxantina epoxidase, uma das Existem atualmente muitas ferramentas
enzimas da rota de síntese do ABA, resulta em moleculares disponíveis com a finalidade de
fenótipos mais dormentes, ao passo que a su- analisar a função dos genes no desenvolvimen-
pressão do gene codificador para essa enzima to. A análise da inativação de genes específicos
rende fenótipos menos dormentes (Frey et al., e de mutantes (gene knockout and mutant analy-
1999). Um aumento similar em dormência foi sis) é um método revelador de um grande nú-
verificado quando uma outra enzima da rota mero de genótipos com características de dor-
de síntese do ABA, a 9-cis-epoxicarotenóide mência alteradas em suas sementes, mas que
dioxigenase (NCED), foi superexpressada (Qin possuem conteúdos normais de ABA durante
e Zeevaart, 2002). As sementes maduras do todo o desenvolvimento. Os mutantes são
mutante sitiens deficiente em ABA podem ger- exemplos de arabidopsis dos tipos abi3, leafy co-
minar dentro do fruto carnoso (germinação tyledon (lec1, lec2), que apresentam cotilédones
vivípara ou viviparidade) (Ni e Bradford, 1993; folhosos, e fusca (fus3), que acumulam anto-
Downie, Gurusinghe e Bradford, 1999) (Figura cianina nos cotilédones. Todos esses mutantes
3.5). Isso não ocorre nos frutos do tipo selva- apresentam inativação de um único gene e pos-
gem, apesar de os conteúdos de ABA no fim da suem fenótipos que são característicos do es-
maturação serem comparavelmente baixos em tado vegetativo da planta, tais como tolerância
ambos os genótipos. Assim, o ABA faz mais do reduzida à dessecação, meristemas ativos, ex-
que inibir diretamente a germinação. pressão de genes relacionados à germinação e
Além do conteúdo de ABA, a sensibilidade ausência de dormência. Os loci LEC1 e FUS3
a este também pode ter um papel na expressão provavelmente regulam a interrupção do de-
de dormência ou na inibição da germinação senvolvimento, visto que as mutações nesses
(Welbaum e Bradford, 1990; Still e Bradford, genes causam crescimento continuado em em-
1998). Existem cultivares de trigo e milho que briões imaturos (Parcy et al., 1997). A dormên-
exibem viviparidade sob condições ambientais cia controlada por ABA, observada nos mutan-
mornas e úmidas, evento conhecido na prática tes ABA e ABI, pode representar um mecanismo
como brotação pré-colheita. Cultivares suscep- diferente de impedimento da germinação, que
tíveis à viviparidade apresentam uma sensibili- ocorre tardiamente e é aditivo à interrupção do
dade reduzida ao ABA. Análises conduzidas em desenvolvimento controlada pelos genes LEC1
mutantes de arabidopsis e de milho que apre- e FUS3. Mostrou-se, em arabidopsis, que o ABI3
sentam viviparidade levaram à identificação de também é ativo durante processos vegetativos
genes responsivos ao ABA, os quais são respon- de quiescência em outras partes da planta, nas
sáveis por essas características fenotípicas, sen- quais suprime atividades meristemáticas
do codificados por ABI3 e VP1, respectivamente (Rohde, Kurup e Holdsworth, 2000). Uma vez
(Koornneef, Bentsink e Hilhorst, 2002). Esses que a maior parte da maturação é defeituosa
genes homólogos codificam fatores de trans- nos mutantes abi3, lec1, lec2 e fus3, nenhuma
crição com função na regulação da expressão dormência é iniciada, e as sementes podem
de genes. Foram identificados como sendo es- germinar precocemente (viviparidade), sobre-
senciais no desenvolvimento de sementes, e es- tudo quando combinadas com a deficiência de
tão envolvidos em manter o estado de desenvol- ABA (Nambara et al., 2000). Os mutantes fus3,
GERMINAÇÃO 59

lec1 e abi3 diferem em sua sensibilidade ao ABA; TOLERÂNCIA À DESSECAÇÃO


contudo, isso não parece estar correlacionado Adicionalmente às principais reservas de arma-
com a extensão de viviparidade de cada um zenamento (Capítulo 2), algumas proteínas e
desses genótipos. Deve-se anotar, entretanto, açúcares específicos são sintetizados de forma
que a ocorrência de viviparidade depende for- tardia no desenvolvimento da semente e po-
temente da umidade relativa (RH) do ar, o que dem estar associados ao desenvolvimento da
compromete conclusões claras. Dessa forma, é tolerância à dessecação ou à longevidade da se-
possível concluir que a indução de dormência mente. Conforme citado, algumas dessas pro-
durante o desenvolvimento é uma resposta so- teínas foram denominadas proteínas LEA (late
mente parcial ao ABA, devendo ser preferenci- abundant embryogenesis) por se acumularem nos
almente considerada como um evento de de- estágios tardios do desenvolvimento da semen-
senvolvimento. te (Figura 3.1C) (Hughes e Galau, 1991). Essas
Os mutantes mais conhecidos possuem ca- proteínas são amplamente conservadas entre
racterísticas alteradas de dormência, sendo, po- espécies de plantas e podem ser agrupadas em
rém, normais quanto ao conteúdo e à sensibili- diversas famílias homólogas (Wise, 2003). São
dade ao ABA. Os exemplos são o aberrant testa caracterizadas por uma composição de aminoá-
shape (ats), que apresenta formato aberrante de cidos hidrofílicos, o que as torna altamente so-
testa, e os mutantes transparent testa (tt), com lúveis em água e resistentes à denaturação em
testa transparente, em arabidopsis. O mutante altas temperaturas. Elas também se acumulam
com sementes do tipo ats tem uma testa com em outras partes da planta quando sujeitas à
espessura reduzida, germinando mais rapida- perda de água ou outros tipos de estresses
mente e em porcentagens mais elevadas do que ambientais, assim como em resposta ao ABA.
sementes do tipo selvagem. Esse mutante pro- O mecanismo preciso pelo qual atuam per-
duz óvulos em que os integumentos não se de- manece desconhecido, mas as proteínas LEA
senvolvem apropriadamente (Léon-Klooster- podem agir de modo a manter a conformação
ziel, Keijzer e Koornneef, 1994). Os mutantes de proteínas e/ou estabilidade de membranas
tt produzem sementes com defeitos na pigmen- durante a desidratação. Há evidência correla-
tação da testa. Essa modificação na testa da tiva considerável de que elas têm função na
semente pode realçar a absorção de água e oxi- adaptação para e na proteção contra a desidra-
gênio, assim como a lixiviação de substâncias tação e em outras circunstâncias estressantes
inibidoras a partir da semente (Debeaujon, (Wang, Vinocur e Altman, 2003).
Léon-Kloosterziel e Koornneef, 2000). Açúcares e oligossacarídeos específicos que
Nas sementes que amadurecem no interior podem estar associados à tolerância a estresses
de frutos carnosos, como no tomate e no Cucu- também se acumulam tardiamente no desen-
mis melo (melão), o conteúdo de umidade da volvimento da semente. Como visto no Capítulo
semente não declina de modo tão acentuado 2, a sacarose é o açúcar solúvel mais abundante
na maturidade, embora as sementes sejam tole- em sementes maduras, enquanto os açúcares
rantes à dessecação e também tenham capaci- redutores, como a glicose e a frutose, são vir-
dade germinativa (Welbaum e Bradford, 1990; tualmente ausentes. Muitas sementes também
Groot e Karssen, 1992; De Castro e Hilhorst, acumulam açúcares dos tipos rafinose, esta-
2000). Essas sementes são impedidas de germi- quiose, verbascose e oligossacarídeos correlatos
nar precocemente no fruto pelo controle hor- formados pela adição sucessiva de unidades de
monal durante os estágios intermediários do galactose à sacarose (Obendorf, 1997; Peterbauer
desenvolvimento (ABA), assim como pelo po- e Richter, 2001). O dissacarídeo trealose tem um
tencial osmótico do fruto nos estágios mais papel fundamental na tolerância à dessecação
tardios (Groot e Karssen, 1992; Ni e Bradford, em leveduras e em alguns outros organismos
1993). tolerantes à dessecação (Crowe, Hoekstra e
60 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Crowe, 1992). A molécula de trealose tem a es- longevidade de sementes secas (Leopold, Sun,
trutura apropriada para a interpolação entre os Bernal-Lugo, 1994; Buitink et al., 2000). Assim
grupos polares dos fosfolipídeos de membra- como no caso das proteínas LEA, as contribui-
nas enquanto ocorre a perda de água (Figura ções específicas dos oligossacarídeos para a to-
3.6). A substituição da água pela trealose faz lerância à dessecação e para a longevidade de
com que seja mantida a estrutura de bicamada sementes no estado seco permanecem sem es-
(ou camada dupla da membrana) quando no clarecimentos (Buitink, Hoekstra e Leprince,
estado seco. Similarmente, a trealose pode im- 2002; Gurusinghe e Bradford, 2001).
pedir o desenovelamento e a denaturação das Geralmente, o estágio final do desenvolvi-
proteínas durante o processo de desidratação. mento da semente é a dessecação ou desidrata-
Sementes não contêm trealose. No entanto, a ção do equilíbrio de umidade com o ambiente
sacarose, possivelmente junto com os (algumas exceções serão apontadas subseqüen-
oligossacarídeos, pode executar a mesma fun- temente). Assim, as sementes passam por di-
ção na preservação das estruturas de mem- versos níveis críticos de umidade que afetam a
branas e proteínas. Além disso, esses açúcares atividade metabólica e podem causar danos aos
podem promover a formação de um estado de tecidos intolerantes à desidratação (Figura 3.7)
gel, vítreo ou de vidro em tecidos secos. Um (Vertucci e Farrant, 1995; Walters et al., 2002).
estado de gel ou vítreo caracteriza-se por ser Em algumas sementes, a desidratação ocorre
um estado contínuo amorfo que tem viscosi- rapidamente durante apenas alguns dias, en-
dade muito elevada (vitrificação). A presença quanto em outras, sobretudo naquelas do in-
de um estado vítreo retarda extremamente as terior de frutos carnosos, ocorre durante um
reações químicas que podem conduzir à degra- período mais prolongado, podendo ser bem
dação de componentes da semente, impedin- menos acentuada (como no tomate, no melão,
do ainda a fusão de membranas e o conseqüen- etc.). A tolerância à dessecação contribui para
te rompimento da compartimentalização celu- a dispersão de sementes e permite que uma
lar (Buitink, Hoekstra e Leprince, 2002). O espécie sobreviva durante os períodos desfavo-
estado vítreo contribui provavelmente para a ráveis para o crescimento da planta. Muitas

Estado gel/vítreo
(bicamada seca)

Cristalino líquido Cristalino líquido


(bicamada hidratada) (bicamada hidratada)

Cristalino líquido
(bicamada seca com trealose)

 Figura 3.6
Ilustração do mecanismo de “substituição da água” por meio do qual açúcares estabilizam membranas fosfo-
lipídicas durante a secagem e a hidratação. O açúcar (trealose, sacarose, etc.) substitui a água durante a
dessecação, mantendo espaço apropriado entre as cabeças dos grupos polares das moléculas de fosfolipídeos.
Quando as membranas são reidratadas, elas não passam por uma fase de transição (fase gel para fase cristalino
líquido) e, dessa forma, não lixiviam conteúdos celulares. Adaptada a partir de Oliver, Crowe e Crowe (1998).
GERMINAÇÃO 61

5
semente muito recalcitrante
(e.g. Avicenia marina)
estresse
mecânico
enchimento de vacúolos vacuolização
afrouxa a área de superfície
cedendo ao volume
hidrólise de
NÍVEL DE HIDRATAÇÃO

4 proteínas de reserva
síntese de proteínas LEA

redução de monossacarídeos iniciação processos


e aumento de oligossacarídeos de reparo
síntese de proteínas a partir
dediferenciação de mRNAs armazenados
de organelas
(intacta seca)
catabolismo semente recalcitrante
(secagem rápida) mobilização
3 desregulado
de açúcares
rompimento proteção de
de membranas membranas

GERMINAÇÃO
GERMINÁVEL

2 atividade catabólica
vidro aquoso

destruição do vidro, perda da fase protetora


1
REINÍCIO
EXPRESSÃO DE GENES
RELACIONADOS À
GERMINAÇÃO

VACUOLIZAÇÃO
PÓS-ABSCISÃO*

PRÉ-DESSECAÇÃO*

DESSECAÇÃO*

QUIESCÊNCIA*

REINÍCIO DO
METABOLISMO*
DIFERENCIAÇÃO DO
EIXO E
DESENVOLVIMENTO

ACÚMULO DE
MATÉRIA SECA

EMBEBIÇÃO E REATIVAÇÃO
DE MEMBRANAS E
ENZIMAS*

PROTUSÃO RADICULAR E
CRESCIMENTO

DESENVOLVIMENTO

 Figura 3.7
Diagrama esquemático da tolerância à dessecação em sementes em relação a eventos de desenvolvimento.
Cinco níveis de hidratação são representados em relação a eventos de desenvolvimento em sementes ortodo-
xas e recalcitrantes. A linha sólida representa o nível de umidade abaixo do qual a secagem é letal para
sementes ortodoxas; a linha pontilhada representa sementes recalcitrantes. Processos de desenvolvimento
(ao longo da abscissa) que estão marcados com asterisco (*) não ocorrem em sementes recalcitrantes. Adap-
tada a partir de Vertucci e Farrant (1995).

sementes também exibem mecanismos de dis- SEMENTES RECALCITRANTES


persão relacionados à dessecação de tecidos, Embora a maioria das sementes seja tolerante
como os que ejetam as sementes do fruto ao se à dessecação na maturidade, sementes de mui-
completar a secagem; existem ainda os meca- tas espécies não o são. Estas têm, em geral, pe-
nismos que permitem que as sementes sejam ríodos de vida muito limitados no armazena-
carregadas pelo vento ou pelos animais (Capí- mento, morrendo devido à secagem. Essas se-
tulo 14). mentes, denominadas “recalcitrantes” devido
62 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

à dificuldade de armazená-las, incluem muitas ocorridos durante a desidratação, para assim


lavouras perenes economicamente importan- fornecer indícios dos mecanismos pelos quais
tes, incluindo o Theobroma cacao (cacau), o Citrus a tolerância à dessecação é alcançada em se-
sp. (citrus), a Mangifera indica (manga), a Hevea mentes ortodoxas (ou seja, sementes tolerantes
brasiliensis (seringueira), a Elaeis sp. (palma de à desidratação). Revisões recentes identificam
óleo) e o Cocos nucifera (coco) (Roberts e King, diversos fatores que podem contribuir para a
1980). A maior parte das sementes recalcitran- tolerância à dessecação de tecidos de planta
tes se adapta aos climas tropicais, mas há mui- (Pammenter e Berjak, 1999; Buitink, Hoekstra
tas espécies de árvores das zonas temperadas, e Leprince, 2002): (1) características físicas das
como de Quercus robur (carvalho), que também células, como o volume vacuolar reduzido; (2)
produzem sementes recalcitrantes, sendo geral- regulação das rotas metabólicas para impedir
mente grandes em tamanho (Hendry et al., a geração de compostos prejudiciais durante a
1992; Finch-Savage, Pramanik e Bewley, 1994). desidratação; (3) sistemas antioxidantes para
A vida curta de sementes recalcitrantes causa impedir os danos causados por radicais reativos
sérios problemas para a conservação de germo- de oxigênio ou radicais livres; (4) acumulação
plasma dessas espécies em longo prazo (Capítu- de proteínas e solutos protetores, como proteí-
lo 17). nas LEA, açúcares e moléculas anfipáticas; (5)
Na verdade, o termo recalcitrante abrange mecanismos para impedir a fusão de membra-
uma larga escala de tolerância à dessecação e nas; e (6) operação de sistemas de reparo du-
de comportamento das sementes quanto ao ar- rante a reidratação.
mazenamento. Nas formas mais extremas, As sementes recalcitrantes são freqüente-
como as espécies que ocorrem nos mangues, o mente deficientes em um ou mais desses meca-
desenvolvimento da semente prossegue direta- nismos. Por exemplo, muitas delas têm con-
mente da maturação para a germinação, esca- teúdos de água elevados na maturidade, apre-
pando da fase de desidratação, germinando sentando grandes vacúolos nas células. Durante
muitas vezes quando ainda unida à planta-mãe. a desidratação, a própria perda de volume pode
Em outros casos, a semente consegue tolerar resultar em danos mecânicos estruturais que
uma extensão limitada de desidratação, poden- não são corrigidos durante a reidratação. Se-
do ser armazenada por semanas ou meses, mas mentes recalcitrantes também são aparente-
não pode ser seca ao equilíbrio com umidade mente incapazes de regular seus processos me-
relativa nem ser congelada. Algumas semen- tabólicos durante a desidratação de modo a im-
tes, como Coffea sp. (café) e Azadiracta indica pedir os desequilíbrios metabólicos que podem
(nim), são classificadas como “intermediárias” resultar na geração de compostos danosos,
por apresentarem um tipo de comportamento como radicais livres (Hendry et al., 1992). Al-
em que podem ser desidratadas a conteúdos ternativamente, podem faltar sistemas antio-
de água relativamente baixos, mas ainda as- xidantes eficientes para impedir os danos de
sim apresentam longevidade relativamente cur- tais compostos oxidantes. Algumas sementes
ta, podendo ser também altamente sensíveis a recalcitrantes não acumulam proteínas do tipo
danos de embebição ou a temperaturas baixas LEA (Finch-Savage, Pramanik e Bewley, 1994;
(Ellis, Hong e Roberts, 1990; Sacandé et al., Farrant et al., 1996). Da mesma forma, há uma
1996a). Parece existir uma larga escala de com- escala de acúmulo de açúcares e de oligos-
portamentos de tolerância à dessecação e de sacarídeos em sementes recalcitrantes (Lin e
armazenamento entre a diversidade de espéci- Huang, 1994). Assim, é difícil identificar cau-
es classificadas como recalcitrantes (Kermode sas específicas para a intolerância à dessecação
e Finch-Savage, 2002). em sementes recalcitrantes, o que pode ser o
As sementes recalcitrantes têm sido estuda- resultado de uma combinação dos fatores men-
das a fim de identificar as causas dos danos cionados.
GERMINAÇÃO 63

QUALIDADE DA SEMENTE: mente imaturas e a longevidade reduzida de


EFEITOS DA MATURIDADE tais sementes.
A qualidade máxima da semente (com respeito Os efeitos da maturidade na qualidade da
à germinação e ao vigor) é tradicionalmente semente são particularmente evidentes em es-
associada à acumulação do peso seco máximo pécies de crescimento indeterminado, nas quais
(chamado também de maturidade fisiológica o florescimento e a produção de sementes se
ou maturidade de massa) (Egli, 1998). Esse estendem por um período longo. Em brassicas,
ponto marca a supensão do transporte do floe- como em Brassica napus (canola) e em Brassica
ma à semente, e, em alguns casos, mudanças oleracea (repolho), o florescimento progride da
específicas ocorrem nos tecidos que ligam a se- base (extremidade proximal) para o ápice (ex-
mente à planta-mãe (por exemplo, a formação tremidade distal) de uma inflorescência indi-
da camada preta em pedicelos de milho). A in- vidual, e inflorescências múltiplas são produ-
terrupção da importação da seiva do floema e/ zidas em momentos diferentes na mesma plan-
ou a separação da semente da planta-mãe na ta (Still e Bradford, 1998) (Figura 3.8). Assim,
região do funículo podem ser o sinal para o iní- sementes de vários estágios de desenvolvimen-
cio da fase final (pré-abscisão) do desenvolvi- to estão presentes na planta de forma simultâ-
mento da semente. Logo após esse ponto, as nea. Similarmente, o florescimento em Daucus
sementes que estão secas na maturidade come- carota (cenoura) progride das umbelas primá-
çam a perder água. Entretanto, a qualidade da rias para as umbelas secundárias e terciárias
semente, medida por sua longevidade no ar- durante o desenvolvimento reprodutivo (Oliva,
mazenamento, continua a aumentar após o Tissaoui e Bradford, 1988). Em tais casos, os
ponto de peso seco máximo. Conforme a espé- efeitos da maturidade na qualidade da semente
cie, os últimos 5 a 10 dias do desenvolvimento são exarcebados pelo fato de que nessas espé-
da semente, antes da desidratação, assim como cies as sementes são dispersadas ao amadure-
a taxa de secagem têm uma influência impor- cer. Desse modo, torna-se um risco retardar a
tante na qualidade e no vigor subseqüentes da colheita para permitir a maturação das semen-
semente (Demir e Ellis, 1992; Sanhewe e Ellis, tes tardias no desenvolvimento, visto que pode
1996a,b). ocorrer deiscência e perda de sementes que já
Os efeitos do desenvolvimento na qualida- se encontram maduras antes da colheita. Por
de da semente podem ser observados em se- outro lado, antecipar a colheita resulta em um
mentes de melão (Welbaum e Bradford, 1989; número maior de sementes imaturas de baixa
Welbaum, 1999). Perto da colheita, sementes qualidade que podem ser difíceis de remover
jovens (menos de 45 dias após a antese) germi- por métodos tradicionais de limpeza e classifi-
nam pouco em função de dormência, que é ra- cação durante a etapa de beneficiamento (Capí-
pidamente perdida durante o armazenamento tulo 17).
pós-colheita. Entretanto, após seis anos de ar- A supermaturação (ou maturação excessi-
mazenamento com conteúdo de umidade de va) também pode ser prejudicial à qualidade
6% e temperatura de 10oC, as sementes relativa- da semente. Em sementes que secam natural-
mente imaturas perdem viabilidade, enquanto mente durante a colheita, a maturação excessi-
as sementes maduras não. Quando estas são va não tem significado de desenvolvimento, e
submetidas a condições controladas de deteri- se a semente não for colhida de imediato, o en-
oração (alta temperatura e umidade por um pe- velhecimento e a deterioração podem ocorrer
ríodo curto), somente as sementes colhidas aos enquanto ela ainda estiver na planta. Isso acon-
50 dias ou mais após a antese mantêm a viabi- tece quando a temperatura e a umidade são
lidade elevada. Esse exemplo ilustra, ao mes- elevadas. Para as sementes que amadurecem
mo tempo, o efeito benéfico de curto prazo do dentro de um fruto carnoso, como as de abóbo-
armazenamento seco sobre sementes relativa- ra e melão, a maturação excessiva é geralmente
64 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Distal Síliqua Grupo Brassica


100
Grupo
1-20 1 na síliqua
80

Conteúdo de água (%PF)


1
21-40 2 2
60 3
4
41-60 3 5
40

61-80 4
20

81-100 5
0
33 40 48 54 61

Proximal Dias após o


florescimento completo

 Figura 3.8
Padrão indeterminado de florescimento em um racemo de Brassica. O diagrama à esquerda mostra que o
florescimento progride da extremidade proximal para a distal em uma dada inflorescência ou racemo. A
figura à direita mostra que a maturidade das sementes (conforme indicado pelo conteúdo de água decrescente)
também progride da extremidade proximal para a distal do racemo. Adaptada a partir de Still e Bradford (1998).

prejudicial à qualidade da semente. O atraso in embryo growth and seed maturation. Development, v.
na colheita de frutos de melão (a ponto de co- 129, p. 1595-1607, 2002.
meçarem a se deteriorar no campo) causa perda BRADFORD, K.J. Water stress and the water relations
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C A P Í T U L O 4

TIPOS DE DIÁSPOROS
E SUAS ORIGENS
Maria Estefânia Alves Aqüila

Em pesquisas que envolvem fruto e semente é Gaertner, em 1788, definiu fruto “o ovário
muito comum a utilização imprecisa de con- desenvolvido, portando, as sementes já feitas”
ceitos, observável em frases facilmente encon- (Font-Quer, 1977). Constata-se que essa defi-
tradas na literatura como as que seguem: “os nição exclui os frutos partenocárpicos. Ao longo
endocarpos germinaram em 30 dias”; “as se- do tempo, outros conceitos foram propostos,
mentes foram escarificadas pela remoção da le- dentre eles o de Barroso e colaboradores (1999),
ma e da pálea”; “as dosagens de açúcares foram que definem fruto “como o último estádio de
feitas nos cotilédones e no embrião”. Essa uti- desenvolvimento do gineceu fecundado ou
lização incorreta da nomenclatura conduz a não”. Essa definição já inclui os frutos parte-
equívocos tanto na compreensão do texto como nocárpicos, mas continua sendo apenas mor-
na reutilização da informação. fológica.
Outro aspecto que envolve a nomenclatura As duas definições fornecidas excluem to-
dessa área é o uso de termos que se consagra- das as estruturas classificadas como pseudo-
ram, mas nem por isso são os mais adequados frutos (Vidal e Vidal, 2003) e dificultam a ca-
ou corretos para conceituar as estruturas que racterização da unidade experimental quando
identificam, como endosperma, óvulo, ovário, essas estruturas são estudadas em seu aspecto
entre outros. Um erro não deixa de ser um erro, funcional, ecológico ou tecnológico. Devido à
e repeti-lo mil vezes não o transforma em um essa dificuldade, no início do século XX, Sin-
acerto: apenas perpetua a ignorância. nott (1945) e, mais tarde, Nitsch (1965) propu-
Confundir fruto com semente tem sido seram uma definição funcional, na qual “um
uma constante desde o século XVIII (Font- fruto consiste daqueles tecidos que contêm os
Quer, 1977). Por isso, este capítulo tem por obje- óvulos da planta sendo fisiologicamente depen-
tivo analisar alguns dos conceitos mais utiliza- dentes das mudanças que ocorrem nos mes-
dos e propor aquele que seria o mais adequado mos”. Por essa definição, os pseudofrutos são
em condições experimentais. Os assuntos es- considerados frutos, mas os partenocárpicos,
tão organizados na seguinte ordem: conceito não, pois estes carecem de óvulos.
de diásporo, sua classificação e sua origem. As Semente, na conceituação morfológica, é
citações entre aspas são transcrições literais. definida como o último estádio de um rudimen-
to seminal (óvulo) fecundado e plenamente de-
senvolvido. Essa definição é ontogenético-es-
CONCEITO DE DIÁSPORO trutural e não satisfaz o aspecto funcional, uma
Não se pode falar em diásporo sem esbarrar nas vez que nem sempre as estruturas que exercem
dificuldades conceituais encontradas nas áreas a função de disseminar uma angiosperma se
morfológica, fisiológica, ecológica e tecnológica. enquadram nessa definição de semente.
70 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

A inexistência de uma definição apropriada Nas definições de Overbeck e Müller não


para as áreas fisiológica, ecológica e tecnológica está implícita a necessidade de existir um em-
acarreta as impropriedades já mencionadas na brião para que uma estrutura vegetal seja consi-
introdução, quando estruturas como frutos se- derada um diásporo, diferindo, quanto a esse
cos, “caroço” e até flores são designadas como aspecto, das conceitualizações de Sernander e
sendo sementes. Ferreira. Por outro lado, as definições de Over-
Alguns pesquisadores mais cuidadosos, in- beck e Müller podem ser confundidas com o
comodados com essas impropriedades, passa- conceito de propágulo, definido por Ferreira
ram a utilizar o termo diásporo para identificar (1994) como: “designação de orgânulo desti-
as unidades funcionais e experimentais. Contu- nado a multiplicar vegetativamente as plantas,
do, esse termo merece ser analisado antes de e que pode ser: sorédio (liquens), estolho (fane-
ser empregado de forma indiscriminada. rógamas), bulbilhos (agaváceas), fragmentos
Para Overbeck, citado por Angely (1959), de talo (liquens), corpúsculos especiais, etc.”.
“diásporo é qualquer órgão vegetal que serve pa- O conceito de diásporo, proposto por Fer-
ra espalhar e disseminar uma espécie, não im- reira (1994), coincide com a visão fisiológica,
portando se de origem sexuada ou assexuada”. ecológica e tecnológica de semente, uma vez
Font-Quer (1977) cita duas definições de que, nessas áreas, as sementes são as estruturas
diásporo: a de Sernander (1927) que definiu que têm por função garantir a sobrevivência, a
diásporo como “a estrutura constituída de um disseminação e a variabilidade genética de uma
ou vários embriões acrescidos do complexo or- espécie, constituindo a forma mais compacta e
gânico que os rodeia, e que a planta separa de eficiente de preservação de um genoma, sendo
si para sua propagação”; e a de Müller, que, em este conceito, por sua abrangência, adequado
1933, o definiu como “um complexo orgânico para a caracterização genérica das unidades ex-
autônomo formado pela planta e destinado à perimentais utilizadas nessas áreas de pesquisa.
propagação e à preservação”. Concluindo, fica a sugestão de utilização
Ferreira (1994) define diásporo como a do termo diásporo sempre que as unidades ex-
“unidade orgânica destinada à propagação das perimentais não forem tão-somente uma se-
plantas superiores, e que consiste essencial- mente, mas abrigarem um embrião.
mente no embrião, acompanhado de estruturas
acessórias, podendo ser uma semente, um fru-
to, um bulbilho, etc.”. Nesse elenco de exemplos, CLASSIFICAÇÃO DOS
o bulbilho não está adequado, uma vez que essa DIÁSPOROS
estrutura é definida pelo próprio Ferreira como: Não existe uma classificação para os diásporos,
“(1) pequeno bulbo imaturo que nasce na base uma vez que esse conceito abriga, sob a mesma
ou nos catafilos de um bulbo adulto, (2) qual- definição, estruturas muito diferentes quanto
quer tubérculo pequeno, como os de algumas à sua ontogenia e morfologia, mas que são fun-
begônias e aspargos, (3) gema aérea que nasce cionalmente iguais.
na axila da folha, sobre esta, ou na inflores- As classificações propostas para os frutos
cência, e origina um novo indivíduo”. Segundo podem ser utilizadas para classificar os diás-
Font-Quer (1977), “bulbilho é uma gêmula epí- poros, não se perdendo de vista o fato de que
gea (gema aérea) transformada em órgão de as inúmeras propostas de classificação surgidas
multiplicação vegetativa com a parte axial e os nos últimos 200 anos produziram muitos con-
catáfilos mais ou menos engrossados e ricos em ceitos utilizados de forma diferente pelos ana-
substâncias de reserva; nascem da axila de uma tomistas (Esau,1974; Fahn, 1982; Mauseth,
folha comum (Ficaria, Dentaria, Saxifraga), nas 1988; Cutter, 1971; Appezzato-da-Glória e Car-
inflorescências (diversos tipos de Allium) ou so- mello-Guerreiro, 2003) e pelos morfologistas
bre as próprias folhas (em várias pteridófitas)”. (Spjut, 1994; Barroso et al., 1999). Dentre essas
GERMINAÇÃO 71

classificações, os frutos secos indeiscentes e mo- O caroço típico das drupas não é semente
nospérmicos são os mais confundidos com se- porque não se ajusta à definição das mesmas,
mentes, porque, com freqüência, constituem as uma vez que, nessa estrutura, as células do en-
unidades experimentais nos ensaios de germi- docarpo se transformam em macroesclereídeos
nação. durante o desenvolvimento do fruto, formando
O Quadro 4.1 relaciona estruturas que de- uma estrutura difícil de ser removida (Souza,
veriam ser chamadas de diásporos quando utili- Moscheta e Mourão, 2003).
zadas como unidades experimentais, uma vez A etimologia do termo endocarpo diz que
que, conceitualmente, é mais apropriado dizer endo equivale a interno, e carpo, do grego χαρπóς,
que os diásporos de alface germinaram em 12 significa fruto. Literalmente, o termo endocar-
horas do que chamar aquênio (um tipo de fruto po significa um fruto interno, sendo utilizado
seco) de semente. para identificar a camada mais interna do pe-
As espiguetas fazem parte da inflorescência ricarpo, que pode se formar pela metamorfose
das gramíneas. Nesse caso, quando o tratamen- sofrida pela epiderme interna (adaxial) da folha
to pré-germinativo é a remoção das glumas, po- carpelar durante a transformação do ovário em
de-se estar, de fato, colocando a semente para fruto. Tanto pelo significado da palavra endo-
germinar, de forma que é inadequado dizer que carpo como pelo fato de este ser formado por
a semente foi escarificada pela remoção das glu- um tecido que pode estar morto, no caso dos
mas. Nenhuma semente é escarificada pela re- caroços, não é apropriado usá-lo como sinôni-
moção das partes florais. mo de semente ou mesmo de diásporo. Nesse
Caroço, do latim core, “coração, núcleo”, é caso específico, fica estranho estudar a germi-
o termo que identifica o núcleo, lenhoso e mui- nação de um tecido morto.
to duro, dos frutos do tipo drupa (Ferreira, Barroso e colaboradores (1999) usam o ter-
1986). mo pirênio como sinônimo de endocarpo le-

Quadro 4.1 Exemplos de estruturas que deveriam ser chamadas de diásporo, segundo a conceituação
de Sernander (1927; apud Font-Quer, 1977), em ensaios de germinação, armazenamento e tecnologia

Tipo Taxa Autor

Semente* Feijão, Limão, Pitanga, Abacate Geral


Aquênio Alface, Girassol Geral
Glande Quercus, Carvalho Fahn (1982)
Cariopse Milho Geral
Espigueta Paspalum, Arroz, Trigo, Centeio Geral
Sâmara Tipuana, Casuarina, Cavanillesia, Ulmus Fahn (1982)
Caroço Pêssego, Manga Fahn (1982)
Palmeiras Fahn (1982), Spjut (1994)
Ocotea puberula
Nectandra megapotamica Souza et al. (2003)
Cipsela Asteraceae
Noz Valleriana, Tillia Fahn (1982)
Esquizocarpo do tipo mericarpo Malvaceae Fahn (1982)
Cremocarpo Umbeliferae Fahn (1982)
Samarídeos Tipuana, Bamebeya, Serjania Barroso et al. (1999)
Cremocarpo indeiscente Lilaeopisis Barroso et al. (1999)
Coca indeiscente Sebastiania, Hura Barroso et al. (1999)
Mericarpo indeiscente Sida Barroso et al. (1999)
Pinhão Araucaria angustifolia Aqüila e Ferreira (1984)

*São sementes por se enquadrarem na definição morfológica de semente.


72 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

nhoso. Contudo, em grego, pirênio (πνρητον) depende de fatores fisiológicos, ligados ou não
é diminutivo de pireno, termo que significa um- a ritmos que desencadeiam a floração. Para que
bigo (Font-Quer, 1977), tendo sido usado, por uma planta floresça, são necessários um ama-
analogia, para designar o caroço devido à posi- durecimento fisiológico e um estímulo ambien-
ção central que o mesmo ocupa no fruto. Assim, tal, o qual pode ser o comprimento da noite
para os pesquisadores que têm dificuldade em (curta ou longa) ou a alternância de tempera-
utilizar o termo caroço, por considerá-lo banal, tura ou de umidade (estação seca e chuvosa).
recomenda-se o uso do termo pireno como si- Os fatores internos e externos agindo em
nônimo de caroço. conjunto determinam a fenologia da planta.
Como exemplo, temos Senna macranthera (ma-
duirana) e Leucaena leucocephala, espécies que,
ORIGEM DOS DIÁSPOROS em Porto Alegre, florescem no início do verão.
A definição de diásporos envolvendo a presen- Observou-se que o lado da árvore que recebe o
ça de um embrião mostra que os mesmos têm sol da manhã floresce antes daquele que recebe
origem no processo de reprodução sexuada, im- o sol da tarde, e que, se essas espécies forem
portantíssima para a manutenção da variabili- submetidas a um verão quente e seco, de forma
dade genética das espécies, sendo impossível que a árvore sofra um grande estresse hídrico
falar em origem dos diásporos sem referir-se (fique murcha), produzirão uma florada extra
às estruturas esporofíticas que compõem a flor. no final da primavera. As sementes produzidas
Embora para Font-Quer (1977), em termos na florada extra serão menos dormentes que as
botânicos, não exista flor stricto sensu, essas es- produzidas na florada habitual.
truturas são definidas como o conjunto de hip- O ponto inicial da ontogenia de um diás-
sófilos coloridos (ou antófilos do perianto, mais poro pode ser definido de uma forma ampla ou
ou menos vistosos) acompanhados ou não de restrita. De forma ampla, o diásporo começa
estames e pistilos. no estabelecimento da flor, e qualquer evento
Assim, todos os eventos envolvidos no apa- que impeça o desenvolvimento desta também
recimento e no desenvolvimento das flores, di- impedirá sua formação. De forma mais restrita,
reta ou indiretamente, interferem na formação o diásporo começa com a dupla fecundação que
dos diásporos, cuja origem está na metamorfose ocorre dentro do ginófito (saco embrionário);
sofrida pela flor após os eventos de polinização portanto, para se entender a origem dos diás-
e fecundação. poros, deve-se compreender a origem das se-
Esses eventos fazem parte da dinâmica ca- mentes, a qual está vinculada à planta feminina
racterística do processo de reprodução sexuada, que se forma dentro da estrutura conhecida
que envolve uma alternância de geração, for- como pistilo, no qual é possível reconhecer as
mada por organismos (seres) distintos quanto seguintes partes: o estigma, o estilete e o ovário.
à estrutura e à forma de reprodução (Cocucci e Um ou mais pistilos constituem o gineceu.
Mariath, 1995). Dentro do ovário, formam-se estruturas
Dentro dessa seqüência, nas espermatófitas, usualmente denominadas óvulos. Contudo, Lin-
o organismo denominado esporófito é autótrofo, né (apud Font-Quer, 1977) propôs que tais es-
independente, possui genoma diplóide e repro- truturas fossem nominadas rudimentos semi-
dução assexuada mediante a produção de nais. Assim, levando em consideração a etimo-
esporos. Os outros organismos, denominados logia das palavras, o termo rudimento seminal
andrófito e ginófito, têm vida parasitária, ge- é o mais correto para identificar com mais pre-
noma haplóide e se reproduzem sexuadamente cisão essas estruturas formadas pelo ginospo-
mediante a produção de gametas (Capítulo 1). rângio (nucelo) envolto pelos tegumentos, re-
O aparecimento da geração gametofítica presentando o início de uma semente. Em um
depende da expressão de genes relacionados estágio mais avançado, o ginosporângio origina
com a determinação do sexo, que, por sua vez, o ginófito.
GERMINAÇÃO 73

A Figura 4.1 é um esquema que mostra a integumento no que se refere a rudimento se-
estrutura de um rudimento seminal e a correla- minal e tegumento no que se refere à semente.
ção existente entre essa estrutura e a da semen- O prefixo “in” significa interno; por isso, é ade-
te que originará, usando-se como modelo Senna quada sua associação ao termo tegumento, uma
macranthera. vez que o mesmo sempre é interno por recobrir
Observando-se o esquema apresentado na o rudimento seminal, que nunca deixa o gine-
Figura 4.1, nota-se a possibilidade de se dis- ceu antes de se transformar em semente. Al-
tinguir, no rudimento seminal, as seguintes es- guns livros nominam de primina e secundina
truturas, de fora para dentro: funículo, integu- os integumentos do rudimento seminal, tratan-
mentos delimitando a micrópila e o ginófito. A do-se, respectivamente, do integumento inter-
seguir, serão abordados alguns aspectos da me- no e do integumento externo.
tamorfose dessas estruturas. Micrópila é um pequeno poro formado pelo
encontro de um ou ambos os integumentos.
Funículo → hilo Quando não estão em linha reta, diz-se que a
O funículo é uma estrutura auxiliar, sendo micrópila está em ziguezague.
o órgão que une o rudimento seminal à placenta Embora haja muita variação quanto ao nú-
desenvolvida no ovário. É a via por onde o rudi- mero de integumentos que recobrem o ginos-
mento seminal é vascularizado. Comparado porângio, esse caráter apresenta grande estabi-
com os animais, seria uma espécie de cordão lidade dentro dos diferentes taxa (Maheshwa-
umbilical. Apresenta uma grande variedade de ri, 1950). Segundo Bauman (1984), os rudimen-
formas (La Rue, 1954; Gunn, 1981), sendo uma tos seminais podem ser unitégmicos, bitégmi-
estrutura geralmente efêmera, deixando na se- cos ou atégmicos. Na Tabela 4.1 são apresenta-
mente uma cicatriz conhecida como hilo. Nos dos estes dados.
casos em que permanece, pode originar os arilos Durante o desenvolvimento, os integumen-
(van Der Pijl, 1982). tos que cobrem o ginosporângio podem sofrer
uma simplificação drástica, de forma que, na
Integumentos → tegumentos semente, o tegumento fica reduzido a uma pelí-
Para evitar confusão entre rudimento se- cula delgada ou desaparece totalmente (Mau-
minal e semente, quando se está tratando dos seth, 1988). Nesse último caso, as funções do
envoltórios, é aconselhável o uso dos termos tegumento são exercidas por tecidos do espo-

A B
c
a x

p
y
s r
n z

o
t
e
f m

 Figura 4.1
Esquema mostrando a correspondência entre a estrutura do rudimento seminal (A) e a da semente madura
(B), ambas em corte longitudinal mediano usando Senna macranthera como modelo. p = primina (tegumento
externo do rudimento seminal) s = secundina (tegumento interno do rudimento seminal), c = calaza, a =
antípodas, n = núcleo secundário, o = ovocélula, t = sinérgides, f = funículo, x = testa (tegumento da
semente), e = xenófito (endosperma), y = embrião, m = micrópila, r = nucelo, z = nervura dos cotilédones
(Aqüila, 1995).
74 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Tabela 4.1 Distribuição de rudimentos seminais, nas duas divisões das angiospermas, com base no
número de integumentos (os dados estão em porcentagem do número de famílias estudadas)

Número de famílias Bitégmicos Unitégmicos Atégmicos

Monocotiledôneas 69 100 0 0
Dicotiledôneas 341 70,57 28,26 1,17

Dados de Davis, 1966, organizados por Bauman, 1984.

rófito. Contudo, o mais freqüente é o desenvol- origina a testa, que também pode apresentar
vimento dos integumentos do rudimento semi- três capas: a endotesta (que é adjacente ao exo-
nal produzirem, na semente madura, um te- tégmen), a mesotesta e a exotesta (que é a ca-
gumento estruturalmente mais complexo, for- mada mais externa do tegumento) (Aqüila,
mando um verdadeiro complexo histológico 1995).
(Foster e Gifford, 1974). No início do desenvolvimento da semente,
O número de tegumentos que a semente as células da exotesta estão em divisão, tanto
apresenta na maturidade, bem como a comple- peri quanto anticlinal (Figura 4.3A, C, E).
xidade dos mesmos dependem tanto da sua ori- Quando o embrião atinge a fase globular, as cé-
gem quanto da sua ontogenia. A complexidade lulas da exotesta começam a alongar no sentido
também depende do tipo de vascularização anticlinal (Figura 4.3E), originando as células
apresentada pelo rudimento seminal. de Malpighi, que formam a camada em paliça-
A ontogenia dos tegumentos da semente é da (Figura 4.4H).
afetada pelo aumento progressivo do volume No rudimento seminal, a mesotesta é for-
que eles limitam, ajustando-se constantemente mada por três estratos na região não-micropilar,
às tensões tangenciais progressivas criadas pela e as células se dividem nos sentidos anticlinal
expansão da semente. Essa expansão é, em par- e periclinal (Figura 4.3B, C, D). Durante o de-
te, devida ao aumento do número de células e, senvolvimento da semente, há um aumento no
em parte, ao alongamento das mesmas. Para número desses estratos. Esse número é maior
acompanhar o crescimento da estrutura que li- na região por onde passa o feixe vascular, na
mita, o tegumento aumenta seu comprimen- região do hilo e da micrópila (Figura 4.3B). Du-
to, com um maior número de células por divi- rante o desenvolvimento da semente, na região
sões periclinais, e sua espessura, por divisões basal (calazal), ocorre a diferenciação dos os-
anticlinais (Figura 4.2D). Se não ocorrem divi- teoesclereídeos (Figura 4.4E). Na semente ma-
sões periclinais em número e velocidade sufi- dura, a mesotesta é formada por nove estratos
cientes para acompanhar a expansão da se- de osteoesclereídeos cujas paredes não têm es-
mente, há a eliminação da capa onde a atrofia pessamento em forma de vidro de relógio, mas
está ocorrendo. são pontuadas (Figura 4.4H).
Segundo Corner (1976), o integumento in- Na seqüência ontogenética da formação do
terno do rudimento seminal origina o tégmen, tegumento, primeiro ocorre a divisão celular,
que pode ou não ser formado por três capas, o seguindo-se o seu alongamento e só depois sua
endotégmen, na confluência com o ginospo- diferenciação (Figuras 4.2, 4.3, 4.4). O alonga-
rângio, o mesotégmen e o exotégmen, junto à mento pode ocorrer em todas as direções, pro-
testa. O integumento externo formará a testa, duzindo células isodiamétricas e estreladas, em
que também pode ou não ter três capas (exo- direções diferentes ou em apenas uma direção,
testa, mesotesta e endotesta). originando tecidos em paliçada. Embora as di-
Em Senna macranthera, o rudimento seminal ferentes capas que compõem o tegumento te-
é formado por apenas duas capas (Figura 4.2). nham uma confluência íntima, seu limite pode
O integumento externo do rudimento seminal ser distinguido pela presença de cutícula, que
GERMINAÇÃO 75

A B

C D

 Figura 4.2
Fases iniciais da formação da semente de Senna macranthera em corte longitudinal mediano. (A) rudimento
seminal em formação; (B) rudimento seminal maduro ou semente recém-fecundada; (C) semente em formação
com zigoto em repouso; (D) semente com embrião globular. Legenda: a= saco embrionário, b= mesofilo da
folha; carpelar, c= calaza, d= epiderme adaxial da folha carpelar, e= xenófito nuclear, f= funículo, g= tégmen,
k= endocarpo em diferenciação, l= cavidade gasosa do fruto, n= nucelo, o= epiderme do nucelo, p= primina
(integumento externo), r= capuz nucelar, s= secundina (integumento interno), t= mesotesta, u=mesocarpo,
v= feixe vascular, x= exotesta, y= endotesta; a seta branca indica micrópila. As barras negras no canto
superior esquerdo são as escalas e representam, para A e D, 6 μm, e para B e C, 10 μm.
76 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

A B

C D

E F

 Figura 4.3
Seqüência inicial da formação do xenófito de Senna macranthera. Sementes em formação em corte longitudinal
mediano. (A) fecundação; (B) zigoto em repouso e xenófito no início da formação; (C) detalhe da região
mediana da semente mostrando os núcleos do sincício; (D) pólo calazal da semente; (E) região basal de uma
semente com embrião globular e núcleos do xenófito se agrupando em nódulos; (F) região mediana da
semente mostrando o início da celularização do xenófito. Legenda: c= calaza, d= nódulos endospérmicos,
e=xenófito, g= tégmen, i = xenófito inicial, n’= núcleo do xenófito próximo à coluna hipostática, n= fusão
para formação do núcleo endospérmico, o= nucelo, t’= mesotesta, t= testa, x= exotesta, z= zigoto, seta
branca = coluna hipostática, setas pretas = parede do saco embrionário. As barras negras do canto superior
esquerdo são as escalas e representam, para A e C, 6 μm, e para B,D,E e F, 10 μm.
GERMINAÇÃO 77

A B

C D

E G H

 Figura 4.4
Detalhes de algumas estruturas que se formam durante o desenvolvimento do xenófito de Senna macranthera.
Cortes longitudinais medianos. (A) região mediana da semente quando o embrião está na fase de torpedo;
(B) região calazal quando o embrião já está totalmente diferenciado; (C) região calazal quando o embrião está
na fase de torpedo adiantada; (D) em detalhe, fragmento da parede de transferência e de alguns núcleos da
célula apical do haustório; (E) detalhe da região calazal quando o embrião está terminando a fase de torpedo;
(F) detalhe da região limítrofe da célula haustorial com o nucelo; (G) tegumento lateral da semente quando o
embrião está em torpedo e (H) quando o embrião já está totalmente formado. Legenda: e= região celularizada
do xenófito, f= feixe vascular na calaza em corte transversal, f´= rafe em corte longitudinal, h= haustório, i=
célula basal do haustório, j= célula apical do haustório, l= linea lúcida, n= núcleos hipertróficos da célula
basal do haustório, o= nucelo, p= parede da célula haustorial, r= região clara ao redor do xenófito, t= testa,
u= epiderme do nucelo, v= região de células ricas em fenóis, x= exotesta. As barras negras do canto supe-
rior esquerdo são as escalas e representam, para A, B e C, 24 μm, para C e G, 40 μm, e para D e F, 8 μm.
78 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

ocorre entre as capas da testa, entre esta e o mento que abriga os feixes vasculares e que,
tégmen, entre o tégmen e o nucelo e até entre entrando pelo funículo, se estende até a calaza,
este e o xenófito. Devido ao caráter hidrofóbico e como anti-rafe a região do tegumento relacio-
da cutina, a presença desta substância na cutí- nada ao prolongamento do feixe vascular para
cula funciona como uma barreira à difusão da além da calaza. Rudimentos seminais com vas-
água, dificultando a penetração de fixadores e cularização reticulada têm uma grande proba-
de substâncias utilizadas na inclusão de semen- bilidade de originar sementes pericalazais. Es-
tes nas técnicas histológicas. Por outro lado, sas sementes possuem uma vascularização in-
esta pode ser uma das causas da dormência im- tensa e, em conseqüência, uma calaza exten-
posta pelos tegumentos (Capítulo 7). sa, provinda de rudimentos seminais anátropos
Na semente, a composição ontogenética do cujo revestimento passa a ser a paquicalaza,
tegumento depende da região que se analisa, uma estrutura complexa, construída pela mul-
uma vez que pode diferir na micrópila, na calaza tiplicação das células dos dois integumentos
e na região lateral (Figuras 4.2C, D; 4.3D, F). fundidos entre si e ao ginosporângio. Só na re-
Bhojwani e Bhatnagar (1974) descreveram gião da micrópila é possível distinguir os dois
a ontogenia de Gossypium sp. (algodão), um ru- tegumentos.
dimento seminal com dois integumentos, no Em S. macranthera, a vascularização não está
qual ambos contribuem para a formação do diferenciada no rudimento seminal (Figura
tegumento da semente, mostrando que a 4.2A), notando-se um aumento no número de
ontogenia da endotesta tem valor taxonômico, estratos na região onde se diferencia o feixe vas-
uma vez que pode ser utilizada para distinguir cular (Figura 4.2C). Na fase do desenvolvimen-
a espécie G. arboreum, na qual permanece to da semente, marcada pela presença de um
uniestratificada, das espécies G. hirsutum (que embrião globular, o feixe vascular já está total-
possui dois estratos) e G. herbaceum (que possui mente diferenciado (Figura 4.2D), localizando-
três estratos). As fibras usadas comercialmente se na mesotesta e sendo formado por protoxi-
se formam na exotesta, constituídas por células lema com espessamento anelado. Esse feixe pe-
simples com paredes finas cujo comprimento netra na semente pelo funículo (Figura 4.3D),
pode atingir 45 mm (~5 cm). sendo uma continuação do feixe vascular que
Segundo Barroso e colaboradores (1999), forma a nervura ventral da folha carpelar. Nes-
as Loasaceae possuem rudimentos seminais sa fase, a anti-rafe ainda não está diferenciada
com apenas um integumento, enquanto as se- e, em seu lugar, observam-se células de pro-
mentes maduras têm apenas exo e endotesta. câmbio em divisão (Figura 4.3D). Quando o
As canas possuem rudimentos seminais parci- embrião começa a diferenciação dos cotilédo-
almente integumentados, mas as sementes ma- nes, a anti-rafe é visível e percorre a semente
duras são recobertas por um tecido multiestra- até a sua metade, no lado oposto ao da rafe.
tificado. Em magnólia, o integumento interno Beltrati e Paoli (2003) mencionam que já
forma o tégmen, que é de fato a camada prote- foram encontrados estômatos na testa em 30
tora, enquanto o integumento externo forma famílias de angiospermas. Segundo Corner
uma exotesta carnosa (sarcotesta) e brilhante, (1976), estômatos na exotesta foram registra-
rica em lipídeos, cuja função é auxiliar a disper- dos em Canna maculata, Cochiospermaceae,
são das sementes (Bhojwani e Bhatnagar, 1974). Malvales, Geraniaceae, Magnoliaceae, Papave-
A vascularização do rudimento seminal se raceae, Amarylidaceae, Leguminosae (Bauhinia),
dá pela entrada de um ramo advindo da vascu- Bombacaceae, Juglandaceae, Myristicaceae e
larização do carpelo, que entra nessa estrutura Euphorbiaceae, enquanto, na endotesta, sua
pelo funículo (Figura 4.2D). O padrão de vas- presença só foi registrada em Purskia (Rosa-
cularização do rudimento seminal interfere no ceae).
padrão de vascularização da semente. Corner A estrutura e as substâncias acumuladas
(1976) denomina como rafe a região do tegu- no tegumento podem posteriormente interferir
GERMINAÇÃO 79

na germinação da semente (Labouriau, 1983), Ginófito


causando o que Barton (1965) classificava como
dormência imposta pelos tegumentos, Bewley
Embrião (2n) Xenófito (3n a xn)
e Black (1978), como dormência estrutural, e
Baskin e Baskin (1998), como dormência física.
Os tegumentos são órgãos multifuncionais Esporófito
porque: (1) protegem tanto o embrião quanto
o xenófito da dessecação, de injúrias, tempera-
turas desfavoráveis, ataque de patógenos e pre-
dadores; (2) nutrem a semente em formação, ginófito originar o embrião e o xenófito. O pri-
conectando-a à planta-mãe por meio dos feixes meiro, pela fecundação da oosfera; e o segundo,
vasculares, via de entrada para os fotoassimi- pela fecundação da célula central. Dessa forma,
lados; (3) participam na dispersão das semen- a ploidia da célula central é fundamental, pois
tes, quando apresentam modificações estrutu- determina a ploidia do xenófito.
rais relacionadas a essa função (Capítulo 14). O caso do xenófito – mais conhecido por
endosperma, é um dos muitos em que um ter-
Ginófito → embrião e xenófito mo mal cunhado ganhou popularidade, impon-
Denomina-se ginosporângio (nucelo) a es- do-se ao longo do tempo. A etimologia da pa-
trutura interna do rudimento seminal. É forma- lavra endosperma mostra que a mesma não
do por um tecido meristemático, limitado por conceitua de forma apropriada a estrutura à
uma epiderme, que pode ou não conter cutina. qual serve de identificador e/ou nominador,
No tecido meristemático do ginosporângio, for- uma vez que endo significa interno e sperma é
mam-se os ginósporos (esporos femininos). O um radical grego que significa semente; portan-
ginosporângio pode ou não ser consumido du- to, a tradução literal da palavra endosperma é
rante a formação da semente. Caso permaneça, “semente interna”. Isso contradiz tanto a sua
origina o perisperma, que, muitas vezes, é con- origem como a sua função, uma vez que essa
fundido com o xenófito. estrutura passa a existir quando os núcleos po-
O ginófito (saco embrionário) é a planta lares da célula central do ginófito se fundem com
feminina que se origina da metamorfose de um o segundo gameta masculino, tendo uma ori-
ginósporo haplóide. Nesse caso, o esporo não gem semelhante à do embrião, e deixa de existir
germina, uma vez que nenhuma das fases ca- durante a germinação, quando é consumida pelo
racterísticas desse processo pode ser identifi- embrião em crescimento. Devido a isso, Cocucci
cada na ontogenia do ginófito, que inicia quan- (1986) propôs o termo xenófito para designar
do o núcleo do ginósporo entra em atividade. essa estrutura, pois xeno significa diferente e fito
O desenvolvimento do ginófito é sempre en- quer dizer planta, de forma que xenófito signi-
dospórico, pois a planta feminina nunca aban- fica “planta diferente”, conceituando perfeita-
dona o ginosporângio e o pistilo. mente essa estrutura única, tanto na sua cons-
Maheshwari (1950) considerava o ginófito tituição genética como na sua posição interme-
como um cenócito octo a polinucleado. Hoje já diária entre o velho e o novo esporófito.
se sabe que essa estrutura cenocítica se forma Na fase inicial do desenvolvimento, todas
no início da metamorfose do ginósporo, quando as sementes possuem xenófito. Contudo, no
ocorrem três ciclos de divisão mitótica que en- transcorrer do desenvolvimento, este pode ser
volvem apenas os núcleos. Subseqüentemente, totalmente absorvido pelo embrião, de forma
ocorre a celularização, originando uma estrutu- que, em muitas espécies, a semente madura ca-
ra formada por sete células, seis mononuclea- rece deste tipo de tecido de reserva.
das e uma, a célula central, bi ou polinucleada. Devido à sua origem, nas angiospermas, o
A importância dessa estrutura para o de- xenófito é uma planta que varia de triplóide
senvolvimento do diásporo reside no fato de o (3n) a poliplóide. O desenvolvimento do xenó-
80 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

fito ocorre em sincronia com o desenvolvimento Quadro 4.2 Famílias e espécies em que foi
do embrião, em vez de simultaneamente. Nas registrado o xenófito celular
espécies em que já foi estudada a ontogenia das Família Espécies
sementes, o zigoto entra em repouso logo após
Acanthaceae Barleria cristata, Dipteracanthus
a fecundação, só saindo desse estado quando o patulus, Thumbergia alata,
xenófito assume um certo grau de desenvolvi- Ruellia tuberosa
mento, mesmo nas Faboideae, espécies exal- Cyrillaceae Cliftonia monophylla, Cyrilla
buminosas cujo embrião assume a liderança do racemiflora
Gesneriaceae Boschniakia himalaica, Klugia
desenvolvimento muito precocemente. notoniana, Platystemma
O xenófito, como já foi dito, começa com a violoides
fecundação dos núcleos polares (separados ou Loasaceae Blumenbachia hieronymi, B.
já fundidos), com o segundo gameta masculino insignis, Mentzelia laevicalulis
Scrophulariaceae Alectra thomsoni, Celsia
originando o núcleo endospérmico. O passo se- coromandeliana, Chelone
guinte é muito variável nos diferentes taxa, mas glabra, Isoplex canariensis,
segundo os mais respeitados embriologistas, o Melampyrum lineares,
núcleo endospérmico pode seguir três tipos de Orthocarpus luteus,
Scrophularia marylandica,
desenvolvimento, originando assim os três ti- Tetranema mexicanum
pos ontogenéticos básicos de xenófito, a saber:
celular, nuclear e helobial. Dados extraídos de Maheshwari (1950 e 1963), Chopra e Sachar
(1963) e Johri, Ambergaokar e Srivastava (1992).
No xenófito celular, a célula central entra
em citocinese logo após a primeira cariocinese,
o mesmo acontecendo para todas as subseqüen-
tes divisões, de forma que o xenófito é celular nocíticos antes de começar o processo de celu-
desde o início. Existem poucos estudos histo- larização (Aqüila, 1995).
químicos e ultra-estruturais sobre esse tipo de Em poucos taxa os núcleos e o citoplasma
xenófito e, segundo Vijayaraghavan e Prabha- têm distribuição uniforme ao longo de toda a
kar (1984), em vários taxa as células xenofíti- célula cenocítica. Em geral, concentram-se nos
cas da calaza, da micrópila ou de ambas têm a pólos calazal e micropilar (Bhatnagar e Sawh-
tendência de formar haustórios. O Quadro 4.2 ney, 1981; Mauseth, 1988). Nesse processo, as
fornece alguns exemplos em que esse tipo de cariocineses podem ou não ser sincrônicas, sen-
xenófito pode ser encontrado. do possível encontrar núcleos em diferentes fa-
No xenófito nuclear, as cariocineses não são ses de divisão (Maheshwari, 1963). Os nucléo-
acompanhadas pelas citocineses corresponden- los dos núcleos cenocíticos são muito variáveis
tes, de forma que, no início do seu desenvolvi- quanto à forma, ao tamanho e ao número, es-
mento, o xenófito é constituído por uma célula tando esta última variável associada à viabili-
cenocítica (Mauseth, 1988), com os núcleos dade do xenófito. Jensen, Schulz e Ashton
distribuídos em uma matriz citoplasmática que (1977) observaram que os rudimentos seminais
rodeia um grande vacúolo central (Vijayara- de Gossypium hirsutum que abortavam tinham
ghavan e Prabhakar, 1984), como pode ser vis- um número menor de nucléolos que aqueles
to na Figura 4.3B. que completavam seu desenvolvimento.
Essa célula pode se tornar muito grande, Um fenômeno comum nesse tipo de onto-
como no caso de Cocos nucifera, em que a parte genia é a formação de grupos isolados de nú-
branca seria o cenócito, e o líquido (água de cleos, aos quais Chopra e Sachar (1963) chamam
coco), o suco vacuolar dessa célula gigantesca de vesículas citoplasmáticas, e Fahn (1982), de
(Mauseth, 1988). A quantidade de núcleos des- nódulos. Esses grupamentos resultam da ativi-
se cenócito pode variar de centenas a milhares dade isolada de alguns núcleos que podem se
(Chopra e Sachar, 1963). Em Senna macranthera dividir mais rapidamente que outros (Schulz e
(Figuras 4.2 e 4.3) formam-se 36 núcleos ce- Jensen, 1974), podendo ou não originar núcleos
GERMINAÇÃO 81

hipertróficos, principalmente no pólo calazal, e o protoplasma comprimido no interior das cé-


uma vez que esses núcleos gigantes podem se lulas forma um todo contínuo devido à comuni-
formar por cariocinese direta (crescimento ver- cação ocorrida por meio dos plasmodesmos (Fi-
dadeiro) ou por fusão de vários núcleos gura 4.6G). O xenófito nuclear é o mais comum,
(Maheshwari, 1950). As Figuras 4.5 e 4.6 exem- tendo sido registrado para 161 famílias, incluin-
plificam esses acontecimentos registrados pa- do mono e dicotiledôneas (Mauseth, 1988). O
ra S. macranthera (Aqüila, 1995). Quadro 4.3 lista algumas espécies que possu-
O xenófito nuclear pode continuar cenocí- em esse tipo de xenófito.
tico até o final da sua ontogenia, porém, o mais O xenófito helobial se forma quando a ca-
comum é ocorrer a celularização, dependendo riocinese do primeiro núcleo endospérmico é
da fase em que se encontra o embrião. A celu- acompanhada de citocinese, formando duas cé-
larização pode ocorrer em todo o xenófito, res- lulas desiguais. A célula menor é voltada para
tringir-se à periferia ou acontecer apenas na re- o pólo calazal e pode ou não se dividir para for-
gião micropilar. Segundo Maheshwari (1963), mar uma estrutura celular. A célula maior é vol-
nas famílias Cruciferae, Cucurbitaceae, Legu- tada para o pólo micropilar, cresce rapidamente,
minosae e Proteaceae, o xenófito é sempre ce- e a ocorrência de cariocineses livres origina um
nocítico, uma vez que não se forma nenhum cenócito que, mais tarde, sofre celularização pe-
tipo de parede. Essa generalização, como qual- lo aparecimento de paredes celulares no sentido
quer outra em se tratando de sementes, não é centrípeto (Vijayaraghavan e Prabhakar, 1984).
adequada, pois Senna macranthera, uma legu- Esse tipo de xenófito é muito raro e parece ocor-
minosa Caesalpinioideae, possui, segundo rer apenas em monocotiledôneas (Swamy e
Aqüila (1995), um xenófito cenocítico (nas fa- Krishnamurthy, 1973). Segundo Johri, Amber-
ses iniciais do desenvolvimento da semente) e gaokar e Srivastava (1992), esse tipo de xenó-
um celular (quando maduro) (Figuras 4.3, 4.5 fito foi descrito em: Halophila ovata, Trillium un-
e 4.6). dulatum, Juncus prismatocarpus, Asphodelus tenui-
Durante o desenvolvimento do xenófito, folius, Najas flexilis, Najas marina, Potamogeton no-
pode acontecer a formação de estruturas muito dosus e Haemanthus katherinae.
estranhas denominadas haustórios. Em Senna Além desses três tipos ontogenéticos de xe-
macranthera, o haustório é formado por duas nófito, existe um quarto, chamado xenófito ru-
células muito grandes. Ambas possuem núcle-
os hipertróficos (Figuras 4.4A, 4.5D, E, F) e pa-
redes de transferência (Figuras 4.4D e 4.5F). A
célula mais apical do haustório une-se à epis- Quadro 4.3 Exemplo de gênero e de espécies
tase formada pelo ginosporângio bem abaixo que apresentam o xenófito nuclear
do feixe vascular calazal (Figuras 4.4E e 4.5B). Família Espécies
À medida que a celularização progride, o haus-
tório desaparece. Durante todo o desenvolvi- Cucurbitaceae Scleria foliosa, Blastania garcini,
Melothira maderaspatana,
mento, o xenófito é um tecido mixoplóide, pos- Trichosanthes anguina,
suindo núcleos hipertróficos na região celula- Cucurbita pepo, C. sativus,
rizada contígua ao haustório (Figuras 4.4A, Benincasa cerifera, Cucumis
4.5E e 4.6C). A celularização é centrípeta (Figu- melo, Luffa aegyptica, Melothria
heterophylla
ra 4.3F), o mesmo se dando com a deposição Leguminosae Mimosa pudica, Calliandra sp.
da substância de reserva. O galactomanano é e os gêneros: Cassia,
depositado na parede das células do xenófito, Cyamopsis, Desmodium
de tal forma que, na semente madura, forma Palmae Cocos nucifera
Proteaceae Lomatia polymorpha, Grevillea
uma massa na qual é difícil a distinção dos li- robusta
mites das células (Figuras 4.6E, F, H). Esse xe-
Dados extraídos de Johri, Ambergaokar e Srivastava (1992).
nófito é vivo (cora facilmente pelo tetrazólio),
82 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

D
C

E F

 Figura 4.5
Sementes de Senna macranthera em corte longitudinal mediano. (A) detalhe da região mediana mostrando
parte do xenófito celularizado e início da formação do haustório; (B) semente mostrando embrião na fase de
coração, xenófito celular na parte basal e haustório na parte apical; (C) detalhe da região celularizada do
xenófito e embrião na fase de torpedo; (D) visão do eixo embrionário e xenófito celular com haustório na
região apical da semente; (E) e (F) detalhe da célula basal do haustório. Legenda: c = calaza, d = cotilédones
e eixo do embrião, e = xenófito celular, f = feixe vascular na calaza, h = haustório, i = célula basal do
haustório, j= célula apical do haustório, o= nucelo, p= embrião na fase de coração, r= região clara que
rodeia o embrião, t= testa. As barras negras do canto superior esquerdo são as escalas e representam, para
A, 24 μm, para B, C e D, 40 μm, para E, 12 μm, e para F, 8 μm.
GERMINAÇÃO 83

A B

E H

G I

 Figura 4.6
Detalhes do xenófito de Senna macranthera em sementes em corte longitudinal mediano. (A) coração; (B)
torpedo; (C) final de torpedo; (D) totalmente formado; (E) quase no tamanho final; (F) antes do início da
dessecação; (H) semente quiescente; (G) mesmo que H com mais detalhe; (I) pericarpo. Legenda: c=
citpolasma, e = endocarpo, p = parede espessada, q = células com parede começando a espessar pela
deposição de galactomanano, t = pontuação, u = mesocarpo. As barras negras do canto superior esquerdo
são as escalas e representam, para A, B, D e F, 12 μm, para C e G, 8 μm, e para E, 24 μm.
84 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

minante. Foi estudado pela primeira vez por do Vijayaraghavan e Prabhakar (1984), a poli-
Voigt, em 1888 (Vijayaraghavan e Prabhakar, ploidia é a principal causa do aumento no tama-
1984). Sua formação não está ligada à ontoge- nho nuclear, induzindo o aumento na produção
nia do xenófito, mas à forma como ocorre o de metabólitos essenciais ao crescimento tanto
desenvolvimento dos tegumentos durante a do xenófito como do embrião (Kaltsikes, 1973).
formação da semente. Estruturalmente, é um A amitose é outro processo de produção de
mosaico no qual os tecidos da semente se entre- núcleos hipertróficos, é menos freqüente que a
laçam. Forma-se em qualquer dos três tipos on- poliploidia e foi observada em Gossypium hirsu-
togenéticos de xenófito (Mauseth, 1988). Foi tum (Wang e Chien, 1957), Vicia faba e Lathyrus
encontrado xenófito ruminante em Celsia cora- variegatus (Hristov e Moskov, 1957). Tandon e
mandeliana, Elytraria acaulis, Andrographis serpyl- Kapoor (1961) observaram cinco tipos diferen-
lifolia, Andrographis echioides e Artabotrys odoratis- tes de amitose em trigo.
simus (Chopra e Sachar, 1963). Perisperma: denomina-se perisperma o te-
Independentemente da ontogenia, a celu- cido de reserva da semente formado pelo ginos-
larização do xenófito é um assunto controverti- porângio persistente. Em geral, o ginosporângio
do. Para Newcomb (1973), a compartimentali- (nucelo) é consumido durante a ontogenia do
zação do xenófito é interpretada como um pro- rudimento seminal. Contudo, em algumas famí-
cesso eficiente de acumular carboidratos inso- lias como Amaranthaceae, Cannaceae, Cappa-
lúveis, em que a parede pode ser muito espessa ridaceae, Piperaceae, Portulacaceae e Zingibe-
no xenófito maduro, inclusive mostrando cam- raceae, ele é persistente e se transforma no teci-
pos primários de pontuação ou pontuações do de reserva da semente, ficando o xenófito co-
(Cutter, 1971). mo um tecido intermediário (Bhojwani e Bhat-
No início, o xenófito tem a ploidia do núcleo nagar, 1974) entre o perisperma e o embrião.
endospérmico, mas, no decorrer de sua forma-
ção, independendo do tipo ontogenético ao qual
pertence, torna-se uma estrutura mixoplóide CLASSIFICAÇÃO DAS
devido à endoploidia (Vijayaraghavan e Prab- SEMENTES
hakar, 1984), de tal forma que D’Amato (1952) Existem muitas propostas de classificação para
já sugeria uma demarcação do xenófito com as sementes, as quais podem ser agrupadas em
base na ploidia ou politenia nuclear. Segundo diferentes níveis. A seguir, estão sintetizadas
Prabhakar (1979), as diferenças citológicas ob- algumas dessas propostas.
servadas nos pólos calazal e micropilar se de-
vem a diferenças no ambiente interno, sendo Classificação de Cocucci (tipo de
causadas, no pólo calazal, pelo descarregamen- semente, levando-se em conta o
to do feixe vascular e pela intensa proliferação tipo de rudimento seminal)
dos tecidos próximos à calaza e, no pólo micro- Como as sementes se originam dos rudi-
pilar, pela presença do suspensor. mentos seminais, na maioria dos casos, elas
Enquanto o xenófito se forma, os núcleos mantêm o mesmo tipo destes.
de suas células aumentam de tamanho, apare- Cocucci (1992), ampliando os conceitos de
cendo núcleos hipertróficos altamente poliplói- Bocquet e Bersier (1969), propôs uma classifi-
des. Segundo Mauseth (1988), núcleos 9n são cação para o rudimento seminal, levando em
comuns, mas Bhojwani e Bhatnagar (1974) de- consideração o alinhamento da calaza e o da
tectaram núcleos 24576n em Arum maculatum. micrópila, a dobradura do ginófito e a posição
Esses núcleos aparecem preferencialmente na do corpo basal. Adotando esses conceitos, uma
região calazal. A hipertrofia nuclear em Zea semente pode ser ortótropa quando vier da me-
mays foi descrita por Duncan e Ross (1950) tamorfose de um ginófito reto e quando o fu-
como sendo um processo endomitótico causado nículo não sofrer nenhuma curvatura, de forma
pela politenia, mas não pela poliploidia. Segun- que a micrópila e a calaza fiquem opostas e ali-
GERMINAÇÃO 85

nhadas na mesma reta. Esse alinhamento é vis- Quadro 4.4 Alguns exemplos de gêneros e de
to no tegumento da semente onde hilo e mi- famílias em que é possível encontrar sementes
classificadas dentro da proposta de Corner (1976)
crópila são opostos. Em uma semente hemi-
campilótropa, o feixe vascular tem uma curva- Tipo de semente Taxon
tura de 90o, ângulo verificável pela localização
Obcampilótropa Bauhinia, Barklya, Cercis,
do hilo e da micrópila no tegumento da semen- Vitaceae
te, o ginófito sofreu uma curvatura, e o corpo Campilótropa Psidium, Caparidaceae,
basal está localizado entre o ginófito e o tég- Papaveraceae, Cactaceae,
Leguminosae
men. Na semente ananfítropa, o feixe vascular
Hilar Papilionaceae como Canavalia
sofreu uma curvatura de 180o, de forma que o e Erythrina
hilo e a micrópila ficam bem próximos, o ginó- Anátropa com Connaraceae, Dysoxylon
fito também sofreu curvatura, e o corpo basal pré-rafe cauliflorum
Anátropa com rafe Ilauraceae, Monimiaceae,
está localizado entre o tégmen e a testa.
Buxaceae, Ebenaceae
Segundo o proposto por Cocucci (1992), ru- Pericalazais Annonaceae, Hortonia
dimentos seminais dos tipos anátropo, anacam- (Monimiaceae), Cryptocarya
pilótropo e ananfítropo originariam sementes (Lauraceae), Aglaia e Lansium
(Meliaceae), Vitaceae
anátropa, anacampilótropa e ananfítropa. Con-
Paquicalazais Meliaceae, Sapindaceae,
tudo, segundo Beltrati e Paoli (2003), um rudi- Lauraceae, Annonaceae,
mento seminal anátropo pode originar uma se- Myristicaceae, Cocos, Canna,
mente campilótropa ou uma semente obcam- Ricinus
Ortótropa Urticaceae, Proteaceae,
pilótropa. Essa afirmação não especifica os au-
Flacourtiaceae, Piperaceae,
tores dos conceitos empregados, e isso é funda- Polygonaceae
mental nessa área, uma vez que os mesmos di-
Nos taxa Magnoliaceae, Dilleniaceae, Mimosaceae, Theales, e
ferem de acordo com os autores. Clusiaceae, não ocorrem sementes ortótropas.

Classificação proposta por


Corner (1976)
Corner (1976) classifica as sementes levan- cularizada, a qual, tanto no rudimento seminal
do em conta a localização e o desenvolvimento como na semente, é ampla, envolvendo respec-
da vascularização, o desenvolvimento do hilo tivamente todo o nucelo ou o ginófito com um
(Quadro 4.4) e também a posição e a estrutura capuz ou uma faixa localizada na região media-
da capa mecânica principal. na do tegumento. As sementes paquicalazais
Nas sementes, a vascularização ocorre na são revestidas pela paquicalaza, uma estrutura
mesotesta. Contudo, há casos em que ela está complexa construída pela multiplicação das cé-
localizada na exotesta, de forma que Corner lulas dos dois tegumentos fundidos entre si e
(1976) classifica as sementes em exadérmicas, ao nucelo e uma calaza muito extensa; só na
quando a vascularização ocorre apenas na epi- região da micrópila é possível distinguir os dois
derme ou na capa mais externa da exotesta, e tegumentos. As sementes hilares possuem o
em subdermais, quando a vascularização fica hilo muito grande e, em geral, advêm de um
localizada na hipoderme, a camada mais inter- rudimento seminal anátropo e podem possuir
na e facultativa da exotesta. pré-rafe, paquicalaza ou apenas rafe.
Segundo Corner (1976), uma semente ob- De acordo com a posição e a estrutura da
campilótropa tem a rafe mais desenvolvida que capa mecânica principal da semente madura,
a anti-rafe, enquanto as campilótropas possu- Corner (1976) classifica as sementes em exo-
em a anti-rafe mais desenvolvida. As sementes testais, mesotestais, endotestais, exotégmicas
pericalazais têm uma calaza muito extensa, e endotégmicas. Entende-se por capa mecânica
sendo que o integumento interno fica unido principal aquela que apresenta o maior número
ao externo em toda a extensão da região vas- de estratos celulares, podendo ou não ser ligni-
86 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

ficada. Embora a construção do tegumento seja bosa, irregular, lenticular, navicular, obo-
essencialmente testal, pode-se encontrar se- vóide (ovóide invertida) ou ovóide.
mentes com tégmen bem-desenvolvido nas or- w Contorno (obtido projetando-se o con-
dens mais evoluídas. torno da semente em um papel) – cu-
Segundo Beltrati e Paoli (2003), a classifica- neiforme, elíptico, espatulado, lanceola-
ção proposta por Corner (1976) vem sendo bas- do, oblanceolado (lanceolado invertido),
tante utilizada pelos anatomistas, embora, na linear, ovado, obovado (ovado invertido),
prática, mostre-se difícil, uma vez que, nas se- orbicular, quadrado, reniforme, rômbico,
mentes maduras, é geralmente difícil distinguir flaciforme (em forma de foice), triangu-
a capa multiplicativa ou camada mecânica, lar ou subtriangular (em forma de cimi-
existindo mais de uma capa com células mecâ- tarra).
nicas e podendo acontecer inúmeras combina- w Transepto – isto é, o formato do contorno
ções entre as diferentes possibilidades. Assim, obtido em corte transversal mediano: cir-
o mais simples é especificar se a semente tem cular (terete), comprimido (sendo o com-
uma testa (ou um tégmen) bem-desenvolvi- primento o dobro da largura) ou trian-
da(o). gular.
w Superfície da semente – lisa, rugosa, es-
triada, costada (enfeitada com nervuras
DESCRITORES DOS ou costelas), sulcada, reticulada, glan-
DIÁSPOROS
dulosa, pontuada, pilosa, viscosa, espon-
As sementes podem ser identificadas por um josa, glabra, mucilaginosa, vesiculosa,
conjunto de estruturas internas e externas de espinhosa, aculeada ou papilosa.
fácil visualização, que deveriam constar da ro- w Presença de partes associadas – arilo, ca-
tina de qualquer trabalho com sementes. A se- rúncula, brácteas, estrofíolo (devendo-
guir, apresentamos o conjunto desses descrito- se indicar a coloração e a textura), alas,
res, retirado de três trabalhos: Martin (1946), papus, lente, funículo circinótropo (ro-
para os embriões, Bhojwani e Bhatnagar (1974) deia toda a semente, sendo encontrado
e Groth e Liberal (1988) para as demais estrutu- em Opuntia e Plumbago), ejaculador, tam-
ras. bém conhecido como retináculo (é uma
estrutura formada pelo crescimento do
Descritores externos funículo ao lado da micrópila, sendo ca-
w Cor – além da cor em si, informar se esta racterística das sementes das Acantha-
ocorre de forma uniforme ou variegada ceae – Barroso et al., 1999).
e se a semente possui apenas uma ou w Hilo – localização, tamanho (bem-visível
mais de uma cor. a quase invisível), cor (homocrômico,
w Tamanho – comprimento, largura, espes- tem a mesma cor das sementes, ou hete-
sura. rocrômicos tem cor diferente da das se-
w Peso – das sementes individuais ou de mentes), forma (puntiforme, oblonga,
um certo número, uma vez que o peso elíptica, linear, circular) e presença de
pode variar de microgramas (sementes para-hilo (pequena área que cerca o hi-
de orquídeas pesam, em média, 20 μg) lo); nas gramíneas, o hilo é indicado pela
a quilos (diásporos de coco pesam, em mancha hilaris (Barroso et al., 1978).
média, 2 kg). Seria interessante que esse w Micrópila – localização (perto do hilo ou
peso fosse sempre das sementes frescas, oposta a este) e tamanho.
isto é, recém-colhidas. w Rafe – linha visível no tegumento que
w Forma – alada, angulosa, carenada, ci- indica o percurso do feixe vascular, indo,
líndrica, cônica, curva, discóide, elipsói- em geral, do hilo até a calaza. Sua niti-
de, esférica, espiralada, fusiforme, glo- dez é bastante variável e, nas legumino-
GERMINAÇÃO 87

sas, pode ser bem-desenvolvida, forman- – axial: ocupa boa parte do eixo longi-
do uma cinta larga e colorida que contor- tudinal da semente ou ocupa comple-
na a semente (Barroso et al., 1999). tamente a cavidade da semente
– basal: o embrião está restrito à metade
Descritores internos inferior da semente
– lateral: o embrião ocupa uma posição
Tecido de reserva basal, mas lateral na semente (Poa-
w Ausente – sementes exalbuminosas, o ceae)
xenófito não está mais presente (Phaseo- w Forma
lus vulgaris, Erythrina crista-galli). – linear
w Presente – sementes albuminosas (en- – espatulado
dospérmicas): Ricinus comunis, Senna ma- – circinado (embrião cilíndrico com os
cranthera, Mimosa bimucronata; pode ser cotilédones enrolados em espiral)
um xenófito ou um perisperma (nucelo – espiralado (semelhante ao circinado,
persistente), sendo que a distinção entre porém menos enrolado)
ambos só pode ser estabelecida pela on-
togenia da semente; na dúvida, deve-se Eixo embrionário
indicar apenas a presença do tecido de w Tamanho – curto ou longo
reserva. Como sugestão, pode ser interes- w Posição – reto ou dobrado
sante voltar a utilizar, nesses casos, o ter- w Forma – cilíndrico, cônico, elíptico
mo albúmen, uma vez que o mesmo não
se atém nem à origem nem à composição Em alguns casos, o eixo pode adquirir um
química do tecido presente na semente desenvolvimento muito grande e, assim, além
acompanhando o embrião. de poder acumular reservas, os cotilédones são
w Textura do tecido de reserva: carnosa, rudimentares.
córnea, farinácea, mucilaginosa ou olea-
ginosa. Cotilédones
w Consistência: dura, firme ou mole. w consistência – membranáceos, semicar-
w Coloração. nosos, carnosos (crasso)
w cor – branco, verde ou amarelo
Embrião w textura – lisos ou enrugados
w Posição em relação ao espaço interno que w forma – retos ou dobrados
ocupa dentro da semente, não em rela- w apresentando ou não nervuras. As ner-
ção à substância de reserva (Martin, vuras cotiledonares são formadas por cé-
1946): lulas procambiais que se mostram mais
– pequenos: ocupam menos de 1/4 do alongadas em relação às meristemáticas,
espaço interno da semente que formam as folhas cotiledonares.
– embriões 1/4: ocupam 1/4 do espaço
interno da semente
– médios não-dominantes: ocupam a ASPECTOS FISIOLÓGICOS
metade do espaço interno da semente Uma semente em formação é uma engrenagem
– médios dominantes: ocupam 3/4 do complexa, cujas estruturas envolvidas têm uma
espaço interno da semente relação muito pouco entendida.
– dominantes: ocupam todo o espaço Estudos sobre a nutrição do embrião come-
interno da semente çaram com o surgimento da cultura in vitro,
w Posição em relação ao tecido de reserva: quando se passou a usar água de coco nos meios
– periférico: o embrião rodeia a substân- de cultivo. Essa água é um xenófito líquido, e
cia de reserva sua composição se revelou rica em nutrientes
88 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

(íons, aminoácidos, açúcares) e fitormônios. Kallarackal, 1980). Entretanto, Mauseth (1988)


Composição semelhante foi encontrada para acredita que a absorção se dá através de toda a
xenófitos de outras espécies (Bhojwani e Bhat- superfície do xenófito.
nagar, 1974). O papel do xenófito como nutridor do em-
Para Goebel (1933), o relacionamento entre brião é controvertido. Segundo Schulz e Jensen
as estruturas da semente, durante seu desen- (1974), o xenófito jovem necessita de uma nu-
volvimento, seria de autoparasitismo, uma vez trição adequada ao seu próprio desenvolvimen-
que uma vive às expensas da outra. Na opinião to, não estando apto a alimentar o embrião. Al-
de Vijayaraghavan e Prabhakar (1984), somen- guns estudos envolvendo histoquímica e ultra-
te estudos realizados por meio de imunolocali- estrutura tornam questionável o papel do xe-
zação podem solucionar o problema da aquisi- nófito no início do desenvolvimento da semente
ção de nutrientes pelas diferentes estruturas (Vijayaraghavan e Prabhakar, 1984). Nessa fa-
da semente em formação. se, sua atividade metabólica é intensa, e as or-
Após a fecundação, as sinérgides podem ganelas observadas parecem estar ligadas à pro-
permanecer funcionais, exercendo um impor- dução de substâncias de reserva (Vijayaraghavan
tante papel na nutrição do embrião de Phaseolus e Prabhakar, 1984) ou de substâncias que pare-
coccineus no início do seu desenvolvimento cem interferir no crescimento e na morfogênese
(Yeung e Clutter, 1978). do embrião (Raghavan e Srivastava, 1982).
As cisternas de retículo endoplasmático li- Nas fases mais adiantadas da embriogêne-
so, que se formam junto à parede do ginófito se, o xenófito já possui uma grande quantidade
de Phaseolus vulgaris, sugerem que a mesma se de substâncias de reserva (que faltam nos está-
modifique a fim de auxiliar na absorção de nu- dios iniciais), as quais podem ser utilizadas pelo
trientes para o endosperma em desenvolvimen- embrião (Vijayaraghavan e Prabhakar, 1984).
to (Vijayaraghavan e Prabhakar, 1981). Essa hipótese foi levantada depois que análises
O suspensor mostrou-se indispensável para da zona clara que circunda o embrião mostra-
o desenvolvimento de embriões de Lupinus po- ram a presença de substâncias e de partículas
lyphyllus (Palamarchuk,1959) e de Phaseolus coc- nitidamente pertencentes ao endosperma dige-
cineus (Lorenzi et al., 1978). Essa estrutura in- rido (Raghavan, 1966; Newcomb, 1973).
fluencia a morfogênese do embrião e produz Para Smith (1973), a manutenção de um
ácido giberélico (Alpi et al., 1979) e citocinina gradiente de pressão osmótica faz parte das
(Lorenzi et al., 1978). Para Raghavan e Srivas- funções desempenhadas pelo xenófito. Jensen
tava (1982), o suspensor, o qual denominam (1968) explica a diminuição do zigoto, no início
complexo endosperma/suspensor, pode funcio- do desenvolvimento da semente, como uma
nar como o principal local de entrada de subs- conseqüência da alteração no gradiente osmó-
tâncias para o embrião em desenvolvimento. tico. O rápido crescimento do xenófito faz com
O papel do nucelo na nutrição do xenófito que a água saia do vacúolo do zigoto, indo para
e do embrião é bastante controvertido. Para o xenófito. Assim, uma osmorregulação apro-
Brink e Cooper (1947) e Norstog (1974), as cé- priada é uma das mais importantes funções do
lulas do ginosporângio entram em lise, e suas xenófito nos estágios iniciais do desenvolvi-
substâncias são absorvidas pelo xenófito e utili- mento da semente.
zadas em seu próprio desenvolvimento. Tam- Um meio com potencial osmótico alto é
bém não se sabe como o xenófito absorve os essencial para o desenvolvimento normal do
nutrientes liberados do ginosporângio desinte- embrião (Stafford e Davies, 1979), podendo pre-
grado (Folson e Cass, 1988). Os haustórios, es- venir sua germinação precoce (Norstog e Klein,
truturas muito diferentes que aparecem em al- 1972).
guns xenófitos, parecem ser a região por onde Schnarf (1929) já declarava que o xenófito
se daria a absorção dos nutrientes (Bhatnagar e tem a função de liderança no início do desen-
GERMINAÇÃO 89

volvimento da semente, sendo sua presença im- do de formação. Segundo o autor, sete dias de-
prescindível mesmo em sementes pseudogâmi- pois da polinização, o embrião de Phaseolus pos-
cas (Rutishauser, 1954). Essa liderança, entre- suiria 24.533 células, enquanto o xenófito,
tanto, depende da capacidade do xenófito de 19.357 células. Essa diferença no número de
estabelecer e manter uma dominância fisiológi- células foi interpretada como o embrião assu-
ca em relação ao tecido materno que o rodeia. mindo, desde cedo, a dominância do desenvol-
Isso porque, no início do desenvolvimento da vimento da semente, sendo esse padrão consi-
semente, o tegumento é maior e mais ativo, de derado o mais comum nas sementes exalbu-
forma que o xenófito e o embrião competem minosas.
com ele pelos nutrientes disponíveis (Cooper e No início do desenvolvimento, os frutos e
Brink, 1940). as sementes estão conectados ao resto da planta
A interação xenófito/tegumento impõe por meio do sistema vascular. Os tecidos do fru-
uma coerção fisiológica ao crescimento da se- to e o tegumento da semente, nesse momento,
mente, determinando a extensão na qual o po- exercem um papel importante na nutrição das
tencial genético do embrião será expresso (Hed- sementes, passando posteriormente ao papel
ley e Ambrose, 1980). de proteção (Lin et al., 1990).
Dentro do equilíbrio delicado existente nas A parte vegetativa da planta contribui com
condições iniciais do desenvolvimento da se- os nutrientes que serão acumulados como re-
mente, seria necessário um mecanismo que in- serva no interior da semente. A separação espa-
clinasse o balanço em favor do xenófito. A dupla cial e temporal entre os locais de descarga des-
carga cromossômica, recebida por meio da fe- sas substâncias e sua utilização sugere uma
cundação secundária, é uma adaptação que fa- certa autonomia entre os dois processos (Thor-
cilita ao xenófito o exercício de suas funções, ne, 1985). Na descarga dos fotoassimilados, vá-
em sua posição intercalar entre os esporófitos rios tecidos e estruturas estão envolvidos (Mur-
velho e novo (Cooper e Brink, 1940). A dupla ray, 1989). Na região da rafe, os solutos impor-
fecundação foi interpretada como um mecanis- tados passam simplasticamente do floema para
mo para aumentar a competitividade do xenó- um ou mais tecidos maternos, antes de serem
fito, conferindo a este a vantagem fisiológica conduzidos por uma via apoplástica até as cé-
da hibridação (Brink e Cooper, 1947). lulas onde serão acumulados como reservas
Brink e Cooper (1947) concluíram que o (Rees, 1984).
sucesso no desenvolvimento da semente de- É difícil estabelecer qualquer generalização
pende da proporção da ploidia (número de cro- para a fisiologia das sementes, mas um grande
mossomos) existente entre o xenófito, o em- número de trabalhos detectou que o floema é
brião e os tecidos da planta-mãe (tegumento e o tecido que leva água e nutrientes para a se-
nucelo). Assim, o desenvolvimento da semente mente, enquanto o xilema atua na drenagem
depende diretamente da constituição genética do excesso de água (Thorne, 1985). Em muitas
do xenófito, e sua poliploidia é fundamental sementes, a sacarose não é metabolizada na tes-
para a conclusão do processo. ta como acontece com os aminoácidos (Mur-
Outro fator apontado como fundamental ray, 1989), podendo constituir a fonte mais efi-
para o sucesso do desenvolvimento da semente ciente de carbono para o embrião em formação
é a correlação entre xenófito e embrião. Com (Raghavan e Srivastava, 1982).
base nisso, Erdelská (1984) propôs um sistema Flinn e Pate (1968) estabeleceram os níveis
para agrupar os diferentes tipos de desenvolvi- de proteína e aminoácidos para todos os tecidos
mento das sementes. Nesse sistema, os tipos da semente e da vagem de Pisum arvense duran-
são caracterizados de acordo com o número de te o seu desenvolvimento. Observaram que o
células que o xenófito e o embrião possuem ganho de compostos nitrogenados pelo em-
quando a semente está na metade do seu perío- brião, durante a embrionênese, era muito maior
90 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

que a perda pela vagem, pelos tegumentos e Paulo, 1995. Tese (Doutorado) – Universidade de São
pelo endosperma, sugerindo que o embrião es- Paulo. 212p.
taria sintetizando substâncias. Essa idéia é cor- AQÜILA, M.E.A.; FERREIRA, A.G. Germinação de se-
roborada por duas observações. Uma nota que mentes de Araucaria angustifólia em solo. Ciência e Cultura,
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PA R T E 2

DORMÊNCIA
C A P Í T U L O 5

DORMÊNCIA:
ESTABELECIMENTO DO PROCESSO
Victor José Mendes Cardoso

A SEMENTE QUIESCENTE E ramente é preciso que as condições dos ambien-


DORMENTE tes químico e físico sejam favoráveis a esse pro-
Na grande maioria das espermatófitas, no final cesso. Assim, por exemplo, é necessário que a
do período de maturação da semente, os pro- disponibilidade de água, a temperatura e a con-
cessos de troca energética entre esta e o meio centração de oxigênio no meio não limitem o
ambiente reduzem-se a níveis mínimos, prati- metabolismo germinativo. Uma semente quies-
camente imperceptíveis, já que, nessa fase, cer- cente é aquela que inicia e completa o processo
ca de 90% da água originalmente presente nos germinativo quando não existe insuficiência de
tecidos da semente é removida. Labouriau fatores do ambiente e não há a presença de ele-
(1983) utilizou o termo criptobiose para designar mentos tóxicos (como inibidores químicos) ca-
esse estágio do desenvolvimento, situado entre pazes de impedir a germinação. Em suma, des-
o fim da maturação e o início da germinação, de que não haja restrições do meio, uma semen-
quando o embrião passa por uma suspensão te quiescente germinará em um período relati-
temporária do crescimento. vamente curto, produzindo uma plântula.
A semente criptobiótica pode ser classificada Entretanto, há muito constatou-se que al-
como um organismo altamente evoluído, já que, gumas sementes não germinam mesmo quan-
além de atingir um alto grau de independência do colocadas em condições ambientais aparen-
das flutuações do meio em que se encontra, pode temente favoráveis. Tais sementes – denomina-
perceber e reagir a tais flutuações, alterando seu das dormentes – apresentam alguma restrição
desenvolvimento. Nessa condição, portanto, a interna ou sistêmica à germinação, restrição es-
produção de entropia pela semente, que é uma ta que deve ser superada a fim de que o processo
decorrência de sua atividade metabólica, pode germinativo ocorra. Assim, a dormência em se-
variar em função das condições externas e/ou mentes é causada por um bloqueio situado na
internas do sistema. No primeiro caso, o indiví- própria semente ou unidade de dispersão, ao
duo “espera” um ambiente favorável para se de- contrário da quiescência, que é provocada pela
senvolver, enquanto, no segundo, há uma “blin- ausência ou insuficiência de um ou mais fa-
dagem” que protege o sistema, amortecendo os tores externos necessários à germinação.
efeitos de eventuais flutuações do meio.
Uma vez dispersa da planta-mãe, a semente
representa um organismo autônomo, sendo CONCEITO DE DORMÊNCIA:
que a continuidade do desenvolvimento do em- DORMÊNCIA RELATIVA E
brião dependerá de uma série de fatores, seja
ABSOLUTA
da própria semente, seja do ambiente. Para que Embora se reconheçam algumas de suas cau-
o crescimento do embrião possa ser retomado sas, ainda não há uma definição precisa de dor-
– isto é, para que ocorra a germinação –, primei- mência em sementes, tendo em vista o pouco
96 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

conhecimento a respeito dos mecanismos en- (Figura 5.1). Desse modo, a dormência corres-
volvidos. Além disso, as discussões sobre o tema ponderia à faixa de sensibilidade térmica da se-
baseiam-se principalmente em pesquisas reali- mente, não dependendo da temperatura exter-
zadas com sementes de espécies de regiões tem- na. Ampliando-se esse conceito de modo que
peradas, na maioria plantas de interesse ele envolva outros fatores, como a luz, a dor-
econômico. mência pode ser definida como uma caracterís-
Em uma das primeiras tentativas de classi- tica ou estado da semente que determina os
ficar o fenômeno, Harper (1959, in Vleeshou- requisitos necessários para a germinação. Se as
wers, Bouwmeester e Karssen, 1995) reconhe- condições ambientais atenderem a tais requisi-
ceu três tipos de dormência em sementes: (a) tos, a germinação ocorrerá. Assim, enquanto
dormência inata, que ocorre antes da dispersão em seu conceito original a dormência imposta
da semente; (b) dormência induzida, que se ins- é causada por uma condição desfavorável do
tala na semente após a dispersão; e (c) dormên- meio, nesse novo conceito a dormência está re-
cia imposta, quando a semente não germina de- lacionada à capacidade da semente em respon-
vido a uma condição adversa do ambiente. Co- der às flutuações ambientais.
mo se pode perceber, de acordo com esse concei- A dormência relativa representa essa variação
to, a dormência imposta seria equivalente à na sensibilidade da semente a fatores ambien-
quiescência, ou seja, não constituiria uma ver- tais. Em diversas gramíneas, como Brachiaria
dadeira dormência. Dessa classificação emergiu brizantha (braquiarão), quanto mais dormente
uma definição menos genérica, segundo a qual
dormência é uma incapacidade temporária de
germinação em uma determinada condição
ambiental que não impede a germinação da
semente não-dormente.
Vegis (1964) relacionou dormência com a
capacidade da semente germinar em resposta TM

à temperatura. Assim, quanto mais dormente


Temperatura

a semente, mais estreita a faixa térmica na qual


ela germina, até a condição de dormência total
ou absoluta, quando ela não germina em ne-
nhuma temperatura. Inversamente, a interrup-
ção (quebra) da dormência é acompanhada de
um alargamento do intervalo de temperaturas Tm

no qual a germinação ocorre. Nesse conceito –


que se assemelha ao de dormência imposta –,
uma semente parcialmente dormente pode ger-
jan mai set dez
minar desde que colocada em uma temperatura
mês
adequada, vinculando-se assim a dormência às
 Figura 5.1
condições às quais a semente está exposta.
Esquema mostrando uma hipotética variação na am-
Um modelo utilizado para explicar a perio- plitude térmica de germinação, representada pela fi-
dicidade de emergência de plantas daninhas gura trapezoidal de uma espécie anual. As faces supe-
anuais propôs que esta seria o resultado da va- rior e inferior do trapézio representam, respectivamen-
riação sazonal da temperatura no campo e da te, as variações de temperatura máxima (TM) e mí-
amplitude térmica de germinação (Karssen, nima (Tm) de germinação. A linha traçada em forma
de parábola representa a flutuação média da tempera-
1982). Assim, a germinação ocorre apenas tura ambiente. As retas verticais indicam o período
quando há uma sobreposição entre a tempera- propício à germinação, quando a amplitude térmica
tura no campo (fator ambiental) e a faixa térmi- da semente e a temperatura externa coincidem. Adap-
ca de germinação da semente (fator endógeno) tada de Vleeshouwers, Bouwmeester e Karssen (1995).
GERMINAÇÃO 97

o lote de sementes, menor a faixa de temperatu- da radícula – esta sim, uma resposta “tudo ou
ra dentro da qual elas germinam. A dormência nada” –, ocorrerá em função do grau de dor-
relativa manifesta-se também em sementes mência da população ou lote de sementes, ou
sensíveis à luz. Em Cucumis anguria (maxixe), seja, de sua sensibilidade e das condições am-
por exemplo, observa-se que, com o armaze- bientais atuais.
namento da semente, a luz branca passa a exer-
cer um efeito inibitório sobre a germinação (No-
ronha, Vicente e Felippe, 1976). Em sementes DORMÊNCIA PRIMÁRIA E
que dependem da luz para germinar (fotoblas- SECUNDÁRIA
tismo positivo), como algumas variedades de A dormência é normalmente classificada de
Lactuca sativa (alface) e Rumex obtusifolius (lín- acordo com sua origem ou com os prováveis
gua-de-vaca), o tratamento com temperaturas mecanismos envolvidos. Quanto à origem, com
altas (≅30 oC) pode aumentar (no caso de base na classificação de Harper já mencionada,
Rumex) ou diminuir (na alface) a sensibilidade são reconhecidas atualmente duas modalidades
da semente ao fitocromo, pigmento responsável de dormência: primária (equivalente à dormên-
pela percepção da luz (Takaki, 1991). Outras cia inata) e secundária (ou induzida) (Figura 5.2).
manifestações de dormência relativa ocorrem
em diversas Melastomataceae, como Tibouchina Dormência primária
spp., cujas sementes maduras exibem fotoblas- A dormência primária instala-se durante a
tismo positivo. Entretanto, tais respostas à luz fase de desenvolvimento e/ou maturação, de
podem ser influenciadas pelas condições am- modo que a semente é dispersa da planta-mãe
bientais no período de maturação da semente. já em estado dormente, exigindo, portanto, tra-
Esse comportamento também pode ser afetado tamentos ou condições específicas para se tor-
pela temperatura durante a germinação, como nar quiescente. A estratificação – exposição da
em Cosmos sulphureus, em que, a 20oC, parte das semente hidratada a temperaturas baixas ou
sementes requer luz branca para germinar, e, a altas – é um exemplo de tratamento requerido
30oC, a germinação é indiferente à luz (Borghetti por algumas sementes com dormência primá-
e Labouriau, 1994). Já em Sida cordifolia (guan- ria, como Ilex paraguariensis (erva-mate) e Acer
xuma), as unidades de dispersão podem exibir spp. (Capítulo 6).
fotoblastismo negativo dependendo da tempe- Após a dispersão, a dormência primária
ratura de germinação (Cardoso, 1991). pode diminuir de intensidade em um processo
Desse modo, a dormência relativa – exem-
plificada pela chamada dormência fotoblástica
e pela sensibilidade térmica – caracteriza-se pe-
la variação da capacidade de resposta do em- Dormência
Quiescência Germinação
primária
brião a diferentes doses de um dado estímulo
ambiental, capacidade esta determinada princi- Pós-maturação
palmente pelas condições de maturação e/ou
germinação da semente.
Uma análise dos casos de dormência relati-
va mostra que tanto a entrada como a saída da Dormência
secundária
dormência exibem uma gradação, não consti-
tuindo uma resposta tipo “tudo ou nada”. Em
 Figura 5.2
sementes dormentes de maçã, por exemplo, Transições entre os estados de dormência e quies-
quanto mais longo o tempo de estratificação cência em sementes. Setas em negrito indicam a ação
(pré-tratamento com temperatura baixa), mai- de processos relacionados à quebra da dormência
or a germinação a 25oC (Labouriau, 1983). A (pós-maturação). Adaptada de Hilhorst e Karssen
germinação visível, representada pela protrusão (2000).
98 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

conhecido como pós-maturação (Capítulo 8). Em ciam a dormência da semente, enquanto, em


geral, o termo pós-maturação é aplicado a se- outras espécies (tais como beterraba), o genótipo
mentes “secas” (com até cerca de 20% de água), materno responde pela influência genética na
sendo uma função das condições ambientais, capacidade de germinação. Já o fotoblastismo
do regime de temperatura, do teor de água na positivo de certas variedades de alface é controla-
semente e do tempo. Outros autores fazem uma do por um gene paterno (contido no pólen).
distinção entre esse tipo de pós-maturação (“a
seco”) e aquele que ocorre em sementes hidra- Indução da dormência primária
tadas (estratificação). Exemplos de pós-matu-
ração a seco são comuns em diversas gramíneas Aspectos fisiológicos
tropicais, tais como capim-braquiária (Brachia- Durante seu desenvolvimento, a semente
ria decumbens), cuja dormência é menor em se- pode adquirir a capacidade de germinar logo
mentes armazenadas do que em recém-colhi- no início da fase de maturação, o que é demons-
das (Lima e Cardoso, 1996). trado experimentalmente pelo cultivo de em-
Os mecanismos envolvidos na transição do briões isolados em meio nutritivo. Assim, na
estado dormente para o estado não-dormente grande maioria dos casos, existem fatores res-
(pós-maturado) ainda não são totalmente com- ponsáveis pelo controle do desenvolvimento do
preendidos, mas, no caso de sementes de embrião, os quais impedem a germinação da
tabaco, devem envolver alterações na expres- semente na planta-mãe. Quando não há essa
são de enzimas (β-1,3-glucanases) que, hidro- restrição, pode ocorrer o fenômeno conhecido
lisando componentes das paredes celulares, au- como viviparidade, que é o crescimento ininter-
mentam a capacidade de embebição da semen- rupto do embrião com a semente ainda ligada
te (Leubner-Metzger, 2003). à planta. Por outro lado, a persistência dos fato-
A presença do fator hereditariedade na dor- res restritivos da germinação após a semente
mência primária tem sido mostrada em inúme- ter atingido a maturidade e após sua dispersão
ras espécies, sendo quase todos os casos refe- caracteriza a dormência primária.
rentes às dormências física e fisiológica (ver Assim, a dormência primária parece ter
“Mecanismos de dormência”). Estudos gené- duas “funções” básicas: impedir a germinação
ticos, com base no cruzamento de variedades precoce da semente durante a fase de matura-
ou linhagens dormentes e não-dormentes, ção na planta e – estendendo-se após a disper-
mostram que o número de genes envolvidos são da semente madura – prevenir a germina-
na dormência pode variar, dependendo da espé- ção sincronizada das sementes, ou seja, evitar
cie. Em Vicia, por exemplo, a dormência – rela- que germinem todas ao mesmo tempo.
cionada à impermeabilidade do tegumento – é Não se conhece ainda o principal fator –
controlada por dois pares de alelos, sendo que ou fatores – responsável pela supressão da ger-
sementes com genótipo aabb são dormentes. minação precoce e, por conseguinte, pelo esta-
Nesse caso, tegumentos permeáveis são produ- belecimento da dormência, embora se acredite
zidos apenas quando o gene B é dominante (Bb que o ácido abscísico (ABA) participe do proces-
ou BB) e o gene A é duplamente recessivo (aa). so. Evidências experimentais obtidas a partir
Considerando-se que o embrião é diplóide de mutantes deficientes ou pouco sensíveis ao
(50% do genoma é materno, e 50%, paterno), o ABA – principalmente Arabidopsis thaliana, Ly-
endosperma é triplóide (dois terços do genoma copersicum esculentum e Zea mays – fortalecem a
são maternos, e um terço, paterno) e os envol- hipótese de que a ausência de ABA e/ou a insen-
tórios (como o tegumento e o endocarpo) são sibilidade a esse hormônio durante a fase de
diplóides e de origem totalmente materna, a he- desenvolvimento resultam em sementes sem
rança da dormência pode envolver diferentes ge- dormência primária.
nótipos. Em Sinapis arvensis, tanto o genótipo do A busca por genes associados à dormência
embrião como o componente materno influen- cuja expressão é modificada pelo ABA (ou outro
GERMINAÇÃO 99

hormônio) vem sendo objeto de inúmeras pes- ou seja, quanto mais madura a semente, maior
quisas. Experimentos nesse sentido sugerem o grau de dormência, requerendo períodos de
que a manutenção da dormência seja um pro- estratificação proporcionalmente mais longos.
cesso ativo governado por um ou mais genes
(Hilhorst, 1998). Alguns desses genes aparente- Efeito das condições ambientais durante a
mente envolvidos na indução da dormência fo- maturação
ram identificados; entretanto, ainda não existe A dormência primária depende não só do
uma relação causal entre sua expressão e a ma- genótipo como também das condições de ma-
nutenção da dormência. turação, mostrando que essa modalidade de
Outros hormônios, particularmente as gi- dormência pode ser induzida. Em Chenopodium
berelinas (GAs), também devem estar envolvi- album, por exemplo, sementes amadurecidas
dos no controle da dormência primária, além em dias curtos possuem tegumentos finos e
de fatores como o meio ambiente osmótico da embebem e germinam relativamente bem, en-
semente. Considerando-se que a ação do ABA quanto as de dias longos apresentam tegumen-
pode ser antagonizada pelas GAs, os níveis e/ tos mais impermeáveis e maior grau de dor-
ou a sensibilidade dos tecidos embrionários ou mência. Sementes de Avena fatua maturadas sob
extra-embrionários a esses hormônios podem estresse hídrico exibem menor dormência, ao
contribuir com o grau de dormência em uma contrário de Cenchrus ciliaris (uma gramínea pe-
ação interativa com outros fatores endógenos rene de regiões áridas e semi-áridas), cujas se-
(genótipo, meio osmótico, etc.) e externos (luz mentes produzidas sob deficiência hídrica ten-
e temperatura). dem a apresentar maior dormência (Murdoch
Além dos aspectos fisiológicos e molecula- e Ellis, 2000). Já em algumas espécies arbóreas
res (Capítulo 6), outros fatores localizados nos de Cerrado, sementes dispersas na estação seca
tecidos extra-embrionários devem participar do tendem a apresentar maior velocidade de ger-
controle da dormência na semente intacta, minação do que sementes disseminadas na es-
como no caso da dormência tegumentar ou de tação chuvosa, as quais apresentam maior dor-
cobertura (ver “Mecanismos de dormência”), mência (Oliveira, 1998).
que é influenciada principalmente pelas ca- A qualidade e/ou a quantidade de luz du-
racterísticas anatômicas dos envoltórios (Ca- rante a maturação também podem influenciar
pítulo 7). Sementes que desenvolvem tegumen- o grau de dormência. Em Cucumis anguria
tos impermeáveis são capazes de embeber e ger- (Cardoso, 1995), sementes amadurecidas em
minar quando coletadas no ponto de maturida- dias curtos (fotoperíodo de 8 h) germinam mais
de fisiológica, antes do início da fase de desse- rapidamente do que em dias longos (16 h), as-
camento. Assim, a impermeabilidade dos tegu- sim como ocorre com aquênios de Bidens sulphu-
mentos se desenvolve durante a rápida fase de rea (Borghetti, 1998). Em algumas Leguminosae,
desidratação, sendo que ela se estabelece com o o fotoperíodo durante a fase final de maturação
conteúdo de água na semente variando de 2 a pode influenciar a germinação, agindo sobre o
21% (Baskin e Baskin, 1998). desenvolvimento do tegumento. Em Ononis si-
Dependendo da espécie, a dormência pri- cula, por exemplo, o aumento da germinabili-
mária pode se instalar já nas fases iniciais do dade de sementes amadurecidas em dias curtos
desenvolvimento, como em Avena fatua, ou no está relacionado ao fato de as sementes apre-
final do período de maturação, como em Sida sentarem o tegumento menos espesso e mais
spinosa, na qual mudanças no tegumento pare- permeável à água (Gutterman, 2000).
cem ser as responsáveis pelo estabelecimento A percepção da luz pela semente ocorre por
da dormência (Bewley e Black, 1994). Diversas intermédio do pigmento fitocromo, uma cromo-
pesquisas também mostraram que embriões de proteína com peso molecular ao redor de 125
maçã apresentam um aumento quantitativo da kDa (quilodaltons). Em plantas mantidas no
dormência em função do tempo de maturação, escuro, esse pigmento é encontrado sob duas
100 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

formas: Fv, considerada inativa do ponto de vis- rando sua capacidade de germinação. Como
ta fisiológico, cujo pico de absorção de luz (ao exemplos de tais fatores – coletivamente trata-
redor de 660 nm) situa-se na região vermelha dos como fatores maternos – podem ser destaca-
(V) do espectro radiante; e Fve, forma biologica- dos: (a) posição da flor ou inflorescência na
mente ativa, com absorção máxima no verme- planta; (b) posição da semente na inflorescên-
lho extremo (região do espectro situada entre cia ou no fruto; e (c) idade da planta-mãe du-
700 nm e 800 nm). Essas duas formas do fito- rante a indução floral ou maturação da semen-
cromo são interconversíveis, ou seja, Fv é con- te. Em Bidens pilosa (picão-preto), por exemplo,
vertida pela luz vermelha em Fve, e esta é con- há um dimorfismo morfológico dos frutos, com
vertida em Fv pelo vermelho extremo. Compri- aquênios longos no centro e aquênios curtos
mentos de onda ricos em vermelho extremo na periferia do capítulo. Nesse caso, observou-
(VE) em geral inibem a germinação de semen- se que os aquênios longos germinam melhor
tes fotossensíveis devido à fotoconversão do Fve do que os curtos, os quais possuem tegumentos
na forma Fv, inativa. A luz filtrada pelo dossel mais grossos e maior dormência – provavel-
(com baixa razão V/VE) reduz o fotoequilíbrio ou mente relacionada à redução na taxa de difusão
estado fotoestacionário do fitocromo (razão Fve/ de oxigênio para o interior da semente. Deve-
Fitocromo total), inibindo assim a germinação se ressaltar, entretanto, que mesmo esse fator
de sementes expostas a essas condições. Do “materno” é influenciado pela condições am-
mesmo modo, a ação da cobertura vegetal e dos bientais, já que a proporção de aquênios longos
tecidos que envolvem a semente durante sua e curtos varia conforme a estação, e mais frutos
maturação na planta-mãe pode fazer com que curtos por capítulo são produzidos em dias lon-
o fotoequilíbrio no embrião seja baixo ao final gos (Forsyth e Brown, 1982). Em Commelina
de seu desenvolvimento. Portanto, uma semente virginica (trapoeraba), observa-se a produção de
amadurecida em um ambiente rico em VE (como flores aéreas (casmogâmicas) e subterrâneas
sob dossel) pode apresentar maior dormência. (cleistogâmicas), sendo que essas últimas pro-
A exposição de aquênios de Bidens pilosa por 1 h duzem sementes maiores e com maior germi-
ao VE, por exemplo, é suficiente para inibir sua nabilidade do que as sementes originadas de
germinação no escuro (Gutterman, 2000). A res- flores aéreas. Estas, por sua vez, são indiferen-
posta das sementes à qualidade da luz durante tes à luz, enquanto as sementes subterrâneas
a maturação na planta-mãe também pode estar apresentam fotoblastismo positivo (Cardoso,
relacionada à espessura do tecido clorofilado que Beltrati e Paoli, 1994).
envolve a semente nessa fase, aumentando a A posição da semente no fruto também po-
incidência de VE no embrião. de conferir um polimorfismo fisiológico. Um
Na maior parte dos casos relatados, o au- exemplo clássico é Xanthium strumarium, no
mento da temperatura durante a fase de ma- qual cada fruto contém duas sementes: a que
turação tende a produzir sementes com menor ocupa a porção proximal (em relação ao pedún-
grau de dormência, ou seja, quanto maior a culo) exibe uma dormência muito maior do que
temperatura, maior a capacidade de germina- a da semente distal (Esashi et al., 1983).
ção. Entretanto, essa resposta não constitui A idade da planta-mãe também pode afetar
uma regra geral, estando provavelmente rela- a germinabilidade de sua progênie, como no
cionada à fenologia da planta, à sua tolerância caso de Amaranthus retroflexus, uma herbácea
a temperaturas mais elevadas e ao tempo de anual cuja germinabilidade diminui com a ida-
exposição ao estímulo térmico. de da planta-mãe no momento em que ocorre
a indução floral. Plantas adultas jovens de
Efeito de fatores maternos Spergularia diandra produzem sementes mais pe-
Além dos fatores abióticos, fatores biológi- sadas e com dormência menor do que sementes
cos também influenciam diretamente o grau produzidas já no estágio de senescência (Gut-
de dormência primária de uma semente, alte- terman, 2000).
GERMINAÇÃO 101

Os mecanismos pelos quais a planta-mãe in- natureza principalmente quantitativa, estando


fluencia as características germinativas da pro- relacionada ao estágio em que se encontra o
gênie envolvem – além da herança genética, tan- ciclo celular antes da indução da dormência.
to cromossômica como extracromossômica – a Assim, enquanto a primária é induzida duran-
movimentação de substâncias químicas, como te o desenvolvimento, quando a síntese de DNA
inibidores de crescimento, dos tecidos maternos está aparentemente interrompida, a secundária
para a semente em desenvolvimento. deve ser induzida após o início desse processo
(Castro et al., 2001).
Dormência secundária
A expressão “dormência secundária” é pre- Os fatores ambientais e a indução da
ferível à “dormência induzida”, considerando dormência secundária
que a dormência primária também pode ser in- Além de se instalar na semente quiescente,
duzida. A dormência secundária instala-se em é comum também que a dormência secundária
uma semente quiescente, após a dispersão, seja induzida em uma semente com algum tipo
quando esta encontra um ambiente desfavorá- de dormência primária. Algumas sementes que
vel ou estressante para a germinação, principal- necessitam de luz para germinar, como as de
mente quanto aos fatores água, temperatura, diversas espécies invasoras de culturas, quando
luz e oxigênio. Sementes de Xanthium struma- mantidas no escuro por períodos relativamente
rium, por exemplo, adquirem dormência quan- longos (por exemplo, em caso de enterramen-
do embebidas em uma condição de anoxia (au- to), podem vir a apresentar dormência secun-
sência de oxigênio). Não apenas ambientes des- dária, perdendo a capacidade de germinar mes-
favoráveis, mas também condições de toxici- mo quando colocadas em presença de luz. Além
dade (como a presença de substâncias quími- da resposta à luz, a resposta à temperatura tam-
cas) podem induzir dormência secundária. bém pode ser alterada. Sementes recém-disper-
Esta questão ainda permanece sem respos- sas de Sisymbrium officinale – uma Brassicaceae
ta: até que ponto as dormências primária e se- potencialmente invasora de culturas e comum
cundária diferem entre si em termos fisiológi- no hemisfério Norte – apresentam dormência
cos? Estudos realizados em Lycopersicum esculen- primária, germinando melhor em temperaturas
tum mostram que sementes com dormência pri- altas do que em baixas. Quando essas sementes
mária mantidas no escuro não exibem qual- permanecem enterradas por períodos longos
quer atividade do ciclo celular (seqüência de (acima de 5 meses), adquirem dormência secun-
eventos necessários para a expansão e a divisão dária, passando a germinar mais em tempera-
celular) e nem respondem a tratamentos com turas baixas (Vleeshouwers, Bouwmeester e
luz e giberelina. A sensibilidade a esses trata- Karssen, 1995). Assim, uma semente pode ter
mentos é aumentada quando a dormência pri- seu grau de dormência, ou seja, sua faixa de sen-
mária é quebrada por resfriamento, levando à sibilidade a um determinado estímulo ambiental
formação de microtúbulos, um dos pré-requi- alterada pelas condições do ambiente (dormên-
sitos para o início do ciclo celular. Por outro la- cia relativa). Um outro exemplo interessante é
do, em sementes com dormência secundária in- o de sementes de Taraxacum megalorrhizon, cuja
duzida por vermelho extremo, verifica-se a pre- dormência primária foi quebrada por estratifi-
sença de microtúbulos, sugerindo que a indu- cação e que se tornam novamente dormentes se
ção ocorre após a ativação do ciclo celular, ou forem armazenadas a seco, sendo que essa dor-
seja, quando o processo de germinação já está mência secundária pode ser absoluta ou relativa,
em andamento. Como as sementes de tomate dependendo da temperatura de armazenamento.
com dormência secundária respondem mais à A dormência secundária pode ser atenuada
luz e à giberelina do que as com dormência pri- desde que as condições ambientais permane-
mária, propõe-se que, nesse caso, a diferença çam favoráveis, propiciando assim a germina-
entre as duas modalidades de dormência é de ção da semente. Por outro lado, estudos realiza-
102 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

dos principalmente em espécies invasoras de prio embrião – mas que eventualmente pode
culturas de regiões temperadas mostram que a envolver tecidos extra-embrionários – , poden-
indução e a atenuação da dormência secundária do ser dividida em: fisiológica, morfológica e
podem se suceder com as estações do ano. Essa morfofisiológica (Quadro 5.1).
variação sazonal da dormência secundária é co-
nhecida como dormência cíclica. Em geral, a dor- Dormência fisiológica (DF)
mência é quebrada durante a estação desfavo- É causada por mecanismos inibitórios en-
rável à germinação e, se porventura a germina- volvendo os processos metabólicos e o controle
ção não ocorrer por insuficiência de um fator do desenvolvimento. Na DF operam diversos
promotor, a dormência é reinduzida na estação mecanismos, localizados não só no embrião
de crescimento (verão, para as anuais de verão, propriamente dito, mas também nos tecidos e
ou outono, para as anuais de inverno), fazendo nas estruturas adjacentes, tais como o tegu-
com que a semente não germine mesmo em mento e o endosperma. Esses mecanismos ain-
condições favoráveis (Hilhorst, 1998). da não são totalmente conhecidos, o que muitas
No Brasil, não há muitos estudos sistemáti- vezes gera alguma confusão na literatura cientí-
cos sobre a ocorrência de dormência cíclica em fica a respeito do enquadramento de casos de
sementes. Segundo um trabalho pioneiro de DF. Fatores responsáveis pela DF, como a sensi-
Silberschmidt (1956), entretanto, é possível bilidade a reguladores químicos e o fotoequilí-
que flutuações endógenas possam contribuir brio do fitocromo, devem estar localizados ex-
para a periodicidade na dormência de sementes clusivamente no embrião. Entretanto, também
enterradas, como sugerido para sementes de são considerados responsáveis pela DF fatores
Hedychium gardnerianum e Leonurus sibiricus, cujas relacionados aos tecidos extra-embrionários.
sementes armazenadas parecem exibir oscila- Como exemplo, pode-se destacar a restrição fí-
ções periódicas em seu potencial germinativo. sica e/ou mecânica, provocada pelo tegumento
e/ou endosperma, e a ação exercida por inibi-
dores de crescimento (como compostos fenóli-
MECANISMOS DE DORMÊNCIA cos) presentes no endosperma, na testa ou no
Com base nos mecanismos presumivelmente pericarpo. Pesquisas recentes sugerem que di-
envolvidos, a dormência de sementes pode ser versas modalidades de DF resultam da intera-
classificada em dois grandes grupos: endógena ção entre o potencial de crescimento do embrião
e exógena. Seguimos aqui a classificação adotada e as restrições impostas pelos tecidos que o en-
por Baskin e Baskin (1998). Outros autores, volvem. Alterações nesse potencial podem en-
como Bewley e Black (1994), consideram ape- volver mudanças na sensibilidade de tecidos do
nas dois tipos de dormência: embrionária, quan- embrião a substâncias inibidoras e/ou a expres-
do o embrião não germina mesmo quando iso- são de enzimas capazes de hidrolisar as paredes
lado do restante da semente, e imposta pelos en- celulares do endosperma (Capítulos 6 e 10).
voltórios ou de cobertura (coat-imposed), quando Dentro da DF, costuma-se distinguir três
o bloqueio à germinação se origina dos tecidos níveis, dependendo principalmente de sua du-
que envolvem o embrião, o qual cresce normal- ração e dos tratamentos necessários para que-
mente quando isolado. Entendemos que a clas- brar a dormência: não-profundo ou de curta du-
sificação a seguir reflete um pouco mais a com- ração, intermediário e profundo. Nos níveis não-
plexidade e nosso pouco conhecimento do fenô- profundo e intermediário, em geral, o embrião
meno da dormência. germina e produz plântulas normais quando
isolado do restante da semente, enquanto, na
Dormência endógena dormência profunda, o embrião não se desen-
A dormência endógena, que também pode volve mesmo quando isolado. A dormência pro-
ser chamada de embrionária, é causada por al- funda, freqüentemente encontrada em espécies
gum bloqueio à germinação relacionado ao pró- arbóreas de regiões temperadas, localiza-se ex-
GERMINAÇÃO 103

Quadro 5.1 Classificação dos principais tipos de dormência (Baskin e Baskin, 1998; Carvalho, 1994)

Tipo Natureza Causa Mecanismos prováveis Exemplos

ENDÓGENA
Fisiológica Primária ou Inibição de natureza • inibidores químicos Ocotea puberula
secundária fisiológica envolvendo • resistência dos envoltórios e Tibouchina spp.
uma interação entre o potencial de crescimento do
embrião e os tecidos embrião
adjacentes, mas controlada • fotoequilíbrio do fitocromo
primariamante pelo embrião • balanço hormonal
Morfológica Primária Embrião indiferenciado ou • embrião continua em fase de Phoenyx dactylifera
subdesenvolvido (rudimentar crescimento lento após a
ou em estágio de torpedo) dispersão, sob a influência de
fatores do meio ambiente
Morfofisiológica Primária Dormência fisiológica em • embrião precisa atingir um Annona crassiflora
embrião com dormência tamanho crítico
morfológica • balanço entre promotores
e inibidores
• mobilização de reservas ao
embrião
• inibidores químicos (ABA?)
EXÓGENA
Física Primária ou Estrutura do tegumento e/ou • resistência dos envoltórios à Adenanthera
secundária do pericarpo difusão de água e/ou gases pavonina
ao embrião
• impermeabilidade dos
envoltórios à água e/ou aos
gases
Química Primária Inibidores químicos presentes • inibição do processo de Vitis vinifera
na semente e/ou no fruto germinação de embriões
não-dormentes
Mecânica Primária Estrutura lenhosa/pétrea do • resistência mecânica impede Berthollettia
endocarpo ou mesocarpo crescimento do embrião excelsa

clusivamente no embrião, aparentemente não Dormência morfológica (MO)


sofrendo influência dos envoltórios. Nos níveis Relaciona-se às sementes que são dispersas
intermediário e não-profundo, o controle da com o embrião não-diferenciado (estágio de
dormência situa-se fundamentalmente no em- pré-embrião) ou não completamente desenvol-
brião, mas existe uma interação com os tecidos vido (estágio de “torpedo” ou linear). Desse
adjacentes (tegumentos, endosperma, etc.). É modo, o embrião deverá passar por um período
o caso, por exemplo, da dormência fotoblástica de maturação na semente separada da planta-
(como em Piper spp.) e da restrição mecânica mãe, até adquirir a condição de quiescência.
imposta pelo endosperma (como em certas va- Assim, o desenvolvimento da semente, nesse
riedades de Lactuca sativa). caso, ocorre em duas fases, sendo a segunda
Na semente intacta, dependendo do nível, na semente já dispersa. Principalmente em es-
a DF tende a desaparecer com os seguintes tra- pécies tropicais, esse crescimento do embrião é
tamentos: armazenamento a seco, estratifica- praticamente contínuo no ambiente natural, fi-
ção, imersão em água quente ou escarificação. cando muitas vezes difícil separar os processos
Alternância térmica, aplicação de hormônios de quebra da dormência e de germinação pro-
(como o ácido giberélico e o etileno) e nitrato priamente dita. O termo pós-maturação tem si-
também são normalmente utilizados para in- do aplicado de um modo genérico (lato sensu)
terromper a dormência (Capítulo 8). na comunidade científica, referindo-se ao con-
104 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

junto de transformações que a semente sofre Quadro 5.2 Algumas famílias de plantas de
durante a passagem do estado de dormência ocorrência tropical com pelo menos uma espécie
cujas sementes apresentam dormência morfológica
para o de quiescência, e não apenas aos casos
(modificado de Baskin e Baskin, 1998)
de pós-maturação morfológica do embrião
(pós-maturação stricto sensu). Esta, por sua vez, Amaryllidaceae Amborellaceae
é afetada pelas condições ambientais, principal- Annonaceae Araceae
Araliaceae Arecaceae
mente temperatura, umidade e luz. Heracleum
Aristollochiaceae Buxaceae
sphondyllum, por exemplo, apresenta pós-ma- Cannaceae Cycadaceae
turação apenas se passar por um período de bai- Daphniphyllaceae Degeneriaceae
xas temperaturas, enquanto Elaeis guineensis re- Iridaceae Loranthaceae
Liliaceae Magnoliaceae
quer temperaturas na faixa de 35 a 40°C. Esta
Monimiaceae Myristicaceae
última espécie deve apresentar também dor- Oleaceae Piperaceae
mência fisiológica, já que as sementes respon- Santalaceae Winteraceae
dem à estratificação com temperaturas elevadas
(Baskin e Baskin, 1998).
Dormência morfológica tem sido observada
Dormência exógena
em representantes de diversas famílias vegetais,
A dormência exógena, ou extra-embrioná-
algumas das quais são listadas no Quadro 5.2.
ria, é causada primariamente pelo tegumento,
São escassos os trabalhos tratando dessa moda-
pelo endocarpo, pelo pericarpo e/ou por órgãos
lidade de dormência em espécies brasileiras, re-
extraflorais, em geral com pouca ou nenhuma
latada quase que exclusivamente em Annona-
participação direta do embrião na sua quebra.
ceae, Mimosaceae e Aquifoliaceae. Estudos nes-
Em geral, os mecanismos responsáveis por essa
se sentido devem envolver um cuidadoso traba-
modalidade de dormência estão relacionados
lho de anatomia associado à fisiologia, pesqui-
à impermeabilidade, ao efeito mecânico e/ou à
sando-se a eventual ocorrência de DF e acompa-
presença de substâncias inibidoras dos tecidos.
nhando-se o crescimento do embrião durante
Pode ser dividida em: física, química e mecânica.
a fase de pós-maturação.

Dormência física (FI)


Dormência morfofisiológica (MF)
Nessa modalidade, a semente apresenta Esta dormência é causada pela impermea-
dormência morfológica e fisiológica. Para que bilidade dos tecidos da semente e/ou do fruto,
a germinação ocorra, é preciso que o embrião restringindo total ou parcialmente a difusão de
atinja um determinado tamanho crítico, variá- água ao embrião. Algumas pesquisas sugerem,
vel conforme a espécie, e que a DF seja quebra- todavia, que tegumentos e envoltórios da se-
da por estratificação ou outro tratamento. Nes- mente também podem restringir a difusão de
se caso, a pós-maturação do embrião e a quebra oxigênio para o interior da semente, conside-
da DF podem ou não requerer as mesmas con- rando que os tegumentos embebidos constitu-
dições ambientais e ocorrer ou não ao mesmo em um “filme” contínuo de água ao redor do
tempo, dependendo da espécie. Portanto, em embrião. Quanto maior a temperatura, menor
algumas espécies, a DF precisa ser quebrada a solubilidade e, portanto, menor a disponibili-
antes de o embrião entrar em pós-maturação dade de oxigênio para o embrião (Capítulo 7).
morfológica ou stricto sensu, enquanto, em ou- Como exemplos, em Serenoa repens (Arecaceae),
tras, ambos os processos (quebra de dormência a dormência da semente é causada pela imper-
e pós-maturação morfológica) ocorrem ao mes- meabilidade do tegumento e do endocarpo ao
mo tempo. Sementes de Annona crassiflora, o co- oxigênio, e em sementes pós-maturadas de al-
nhecido araticum (Rizzini, 1973), provavel- gumas gramíneas, como Brachiaria brizantha,
mente se enquadram nessa categoria. ocorre uma dormência tegumentar causada por
tecidos da cariopse (lema e pálea), os quais pro-
GERMINAÇÃO 105

vavelmente diminuem a disponibilidade de oxi- batimão) e Hymenaea courbaril (jatobá) (ver se-
gênio ao embrião. ção “Dormência em espécies tropicais”).
Em geral, a impermeabilidade à água é cau-
sada pelo tegumento e/ou pelo endocarpo. Em Dormência química (DQ)
Fabaceae, a resistência principal à entrada de Inicialmente, considerou-se DQ aquela cau-
água é conferida pela testa, que apresenta uma sada por inibidores de crescimento presentes
camada de células paliçádicas com paredes se- unicamente no pericarpo. A definição foi poste-
cundárias grossas e lignificadas (esclereídeos), riormente estendida para substâncias produzi-
impregnadas com substâncias de natureza hi- das tanto dentro como fora da semente que,
drofóbica, tais como lipídeos, suberina, cutina, translocadas para o embrião, inibem a germina-
substâncias pécticas e lignina. Em Anacardia- ção. Aquênios de Bidens pilosa (picão-preto), por
ceae, algumas espécies apresentam FI causada exemplo, germinam melhor quando submeti-
por tecidos do fruto (endocarpo e pericarpo). dos a uma lavagem com água corrente, sugerin-
O tegumento também pode conter uma muci- do a presença de inibidores no fruto. No caso
lagem que se expande na presença de água, for- do picão, entretanto, é possível que esses inibi-
mando uma barreira à difusão de oxigênio e dores atuem reduzindo, via oxidação, a disponi-
diminuindo a velocidade de germinação, como bilidade de oxigênio ao embrião.
provavelmente ocorre em sementes de Magonia Tem sido bastante comum a detecção –
pubescens (Joly, 1979). A deficiência de oxigênio principalmente por intermédio de bioensaios –
(hipoxia) causada pela hidratação da testa mu- de inibidores de crescimento tanto no fruto co-
cilaginosa também pode provocar dormência mo na semente, embora seu papel no controle
secundária do embrião, como deve ocorrer em endógeno da germinação raramente fique esta-
sementes de Sisymbrium officinale (Baskin e Bas- belecido. É preciso também determinar uma
kin, 1998). distinção entre a DQ (um tipo de dormência
Em condições naturais, a embebição de se- exógena) e a dormência fisiológica, tendo em
mentes com tegumento rígido ocorre por meio vista que, em muitos casos, unidades de dis-
de estruturas especializadas localizadas na sua persão com inibidores químicos também apre-
superfície, tais como a lente (ou estrofíolo), o sentam dormência fisiológica. Um exemplo é
hilo, a calaza e a micrópila, as quais impedem dado por Rosa rugosa, em que lixívia de aquênios
a passagem de água e/ou gases para o interior dormentes inibe a germinação de embriões iso-
da semente dormente. Dependendo das condi- lados de sementes dormentes dessa espécie,
ções ambientais – principalmente da água e da mas não é capaz de inibir a germinação de em-
temperatura –, tais vias de acesso são desblo- briões não-dormentes (Baskin e Baskin, 1998).
queadas, permitindo que a semente controle a Nesse sentido, diversos autores enquadram
entrada e a saída de água. Em um trabalho clás- como DF toda dormência provocada por inibi-
sico de 1954, Hyde (in Labouriau, 1983) obser- dores de crescimento. Como mencionado ante-
vou que, em sementes de Trifolium pratense e riormente, a DF está relacionada fundamental-
Lupinus arboreus, o hilo funcionava como uma mente ao embrião, envolvendo, entre outros
válvula higroscópica, mantendo-se fechado em processos, mudanças na produção e/ou na sen-
casos de aumentos bruscos e transientes da sibilidade do tecido a substâncias de crescimen-
umidade, e abrindo – permitindo a embebição to, necessitando ser quebrada por tratamentos
da semente – apenas quando a umidade exter- específicos, como a estratificação. Por outro la-
na aumentava gradualmente. do, na DQ, o embrião está em estado de quies-
A dormência física é considerada uma das cência, e o inibidor deve simplesmente impedir
formas mais comuns de dormência em semen- seu crescimento. Assim, a rigor, a expressão DQ
tes de espécies tropicais. Exemplos típicos são: deveria ser aplicada apenas às espécies cujas
Schizolobium parahyba (ficheira), Erithrina spe- sementes não apresentam dormência fisioló-
ciosa (eritrina), Dimorphandra mollis (falso bar- gica.
106 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Dormência mecânica (DM) sões alguns dos diversos casos estudados. As-
Por definição, sementes com DM apresen- sim, por exemplo, são freqüentemente classi-
tam o endocarpo ou o mesocarpo pétreo, cuja ficados como dormência fisiológica casos em
rigidez impede a expansão do embrião. Um que o fator de restrição está provavelmente lo-
exemplo é a semente de oliveira. Por outro lado, calizado no tegumento ou no pericarpo, consi-
sobretudo em espécies tropicais, faltam estudos derando-se o tratamento realizado para que-
para determinar até que ponto a DM atua como brar a dormência. Além disso, são inúmeros os
um mecanismo efetivo de restrição da germina- trabalhos que, ao pretender abordar e discutir
ção. É possível que esse tipo de dormência seja a dormência, acabam tratando apenas da ger-
acompanhado por algum bloqueio situado no minação de sementes.
próprio embrião, como na DF. Em outras palavras, A partir de compilações realizadas por Bas-
estando o embrião quiescente e em condições ade- kin e Baskin (1998), elaborou-se a Tabela 5.1,
quadas de água, oxigênio e temperatura, não ha- que trata da distribuição dos vários tipos de dor-
veria um impedimento mecânico efetivo ao seu mência em espécies de diferentes fisionomias
crescimento, por parte dos tecidos adjacentes. florestais em regiões tropicais. Os autores infe-
riram os tipos de dormência de acordo com da-
dos sobre o tempo necessário para o início da
DORMÊNCIA EM germinação – foram consideradas dormentes
ESPÉCIES TROPICAIS as espécies cujas sementes demoraram mais de
Apesar da riqueza quanto à diversidade de espé- quatro semanas para começar a germinar – e
cies, são relativamente recentes os estudos so- sobre as características morfológicas da semen-
bre os mecanismos e as modalidades de dor- te e do embrião. De modo geral, considerando-
mência em espécies tropicais, sendo o maior se um gradiente que vai desde o ambiente mais
volume de dados obtido a partir de pesquisas úmido (floresta tropical úmida) até o mais seco
realizadas na Malásia e na América Central, em (savana/cerrado), nota-se que os casos de dor-
florestas tropicais úmidas. Por falta, talvez, de mência fisiológica e morfológica decrescem e
uma melhor fundamentação conceitual e pa- os casos de dormência física aumentam à medi-
dronização metodológica, a caracterização da da que diminui a disponibilidade de água. Isso
dormência assume muitas vezes uma caráter é válido tanto para as espécies arbóreas como
arbitrário, sendo, portanto, passíveis de revi- para as herbáceas. Esses dados sugerem um

Tabela 5.1 Distribuição de tipos de dormência em espécies de diferentes fisionomias de florestas


tropicais (Baskin e Baskin, 1998)

Floresta Floresta Floresta


tropical semi- tropical Savana/
úmida decídua decídua cerrado

Espécies arbóreas (porcentagem do total de casos de dormência registrados)


Dormência fisiológica 52% 40% 33% 24%
Dormência física 18% 40% 67% 70%
Dormência morfológica ou morfofisiológica 30% 20% – 6%

Espécies invasoras/herbáceas (porcentagem do total de casos de dormência registrados)


Dormência fisiológica 100% 65% 70% 25%*
Dormência física – 30% 28% 75%*
Dormência morfológica ou morfofisiológica – 5% 2% –

* Arbustos.
GERMINAÇÃO 107

“investimento” maior em mecanismos de dor- 100


pioneiras
mência tegumentar em ambientes sujeitos a não-pioneiras
80
maiores flutuações ambientais.

porcentagem
Em um levantamento feito com base em 60
dados de espécies arbóreas da flora brasileira,
cujas sementes exibem algum tipo de dormên- 40

cia (Tabela 5.2), observa-se uma predominância


20
(aproximadamente 63%) de dormência física
ou mecânica em relação aos demais tipos, sendo 0
que a DF respondeu por pouco mais de 30% DF FI DM DQ MO DF/FI
dos casos. Em uma distribuição dos tipos de tipo de dormência
dormência considerando o grupo sucessional  Figura 5.3
Distribuição de diferentes tipos de dormência (DF =
da espécie, observa-se – além da predominância
fisiológica; FI = física; DM = mecânica; DQ = quími-
de FI – que a dormência fisiológica é mais co- ca; MO = morfológica) em algumas espécies arbóreas,
mum no grupo das não-pioneiras, enquanto a pioneiras e não-pioneiras, de florestas brasileiras.
dormência física tende a ocorrer mais nas espé-
cies consideradas pioneiras (Figura 5.3). Exem-
plos dos demais tipos de dormência foram obser- formações reunidas por Carvalho (1994) sobre
vados apenas nas não-pioneiras. A partir das in- uma centena de espécies arbóreas nativas, nota-

Tabela 5.2 Tipos de dormência de algumas espécies arbóreas brasileiras (Carvalho, 1994)

DF MO FI DQ DM DF MO FI DQ DM

Alchornea triplinervia X Adenathera pavonina


Amburana cearensis X Mimosa bimucronata X
Annona cacans X Mimosa scabrella X
Apuleia leiocarpa X Myracrodruon urundeuva X
Bauhinia forticata X Nectandra lanceolata X X
Caesalpinea leiostachya X Ochroma pyramidale X
Calophyllum brasiliense X Ocotea odorifera X X
Cassia grandis X Ocotea porosa X X
Colubrina glandulosa X Ocotea puberula X
Copaifera langsdorfii X Peltophorum dubium X
Cordia trichotoma X Qualea grandiflora
Croton floribundus X Rapanea ferruginea X
Didymopanax morototoni X Schizolobium parahyba X
Dipteryx alata X Sclerolobium paniculatum X
Enterolobium contortisiliquum X X Senna multijuga X
Gleditsia amorphoides X Talauma ovata X
Hymenaea courbaril X Tibouchina sp. X
Ilex paraguariensis X Trema micrantha X
Miconia cinnmomifolia X Vochysia bifalcata X

DF= dormência fisiológica; MO= dormência morfológica; FI= dormência física; DQ= dormência química; DM= dormência mecânica.
108 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

se que as sementes da maioria das espécies (cer- GUTTERMAN, Y. Maternal effects on seeds during
development. In: FENNER, M. (Ed.). Seeds: the ecology of
ca de 63%) não apresentam qualquer tipo de dor-
regeneration in plant communities. 2nd ed. Wallingford:
mência, o que praticamente coincide com o le- CABI, 2000. p 59-84.
vantamento realizado por Baskin e Baskin (1998) HILHORST, H.W.M. The regulation of secondary dormancy:
com essências arbóreas não-pioneiras de flores- the membrane hypothesis revisited. Seed Science Research,
tas tropicais úmidas de todo o planeta. Em ecos- v.8, p.77-90, 1998.
sistemas mais secos, como desertos quentes, por HILHORST, H.W.M.; KARSSEN, C.M. Effect of chemical
outro lado, a proporção de espécies com semen- environment on seed germination. In: FENNER, M. (Ed.).
Seeds: the ecology of regeneration in plant communities.
tes dormentes é bastante alta (cerca de 80%),
2nd ed. Wallingford: CABI, 2000. p 293-309.
mostrando o caráter adaptativo da dormência.
JOLY, C.A. Fisiologia da germinação e aspectos taxonômicos do
gênero magonia (Sapindaceae). Campinas, 1979. Disserta-
ção (Mestrado) - Instituto de Biologia, Unicamp.
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C A P Í T U L O 6

DORMÊNCIA EMBRIONÁRIA
Fabian Borghetti

A regeneração de comunidades vegetais a partir rentes conceitos em função do campo de inves-


de sementes depende, em grande parte, destas tigação. No conceito agronômico ou tecnológi-
se encontrarem em uma condição fisiológica co, considera-se germinação a emergência de
apropriada para germinar e em local e momen- parte da planta no solo ou a formação de uma
to adequados para o desenvolvimento da futu- plântula vigorosa sobre algum tipo de substra-
ra planta. Para algumas espécies, a estratégia to. Esse critério é bastante apropriado para estu-
de regeneração é germinar logo após a semente dos conduzidos em condições de campo. Já o
ser dispersa da planta-mãe, bastando que os critério botânico considera germinadas as se-
requisitos básicos para a germinação sejam sa- mentes em que uma das partes do embrião
tisfeitos (ver a seguir). Para outras espécies, en- emergiu de dentro dos envoltórios, acompanha-
tretanto, mesmo que as condições ambientais da de algum sinal de metabolismo ativo, como
estejam apropriadas para a germinação, as se- curvatura da radícula (Labouriau, 1983). O cri-
mentes podem sobreviver por longos períodos tério botânico é mais apropriado para investigar
no solo, apresentando uma germinação lenta e aspectos metabólicos associados especificamen-
intermitente de partes da população. Para que te à germinação, sem envolver eventos relacio-
esse padrão de germinação aconteça, mecanis- nados ao crescimento inicial da plântula. Como
mos internos devem modular a germinação não será observado ao longo deste capítulo, a germi-
apenas em função das condições ambientais nação da semente e o desenvolvimento inicial
vigentes, mas principalmente em função de ca- da plântula são processos fisiológicos distintos.
racterísticas intrínsecas, espécie-específicas, Conforme a espécie em estudo, o processo
que permitirão a germinação em momentos de germinação pode se estender de horas a dias.
mais apropriados para o desenvolvimento do A hidratação dos tecidos durante a embebição
futuro indivíduo. Esse mecanismo de controle promove, entre outros eventos, reorganização
da germinação tem sido chamado de dormên- de organelas e membranas, aumento na ativi-
cia. dade respiratória, síntese e consumo de ATP,
Neste capítulo, serão tratados aspectos me- síntese de proteínas e de mRNAs e ativação de
tabólicos da dormência em sementes. Uma dis- enzimas. Isso resulta no início da mobilização
cussão mais geral sobre esse tema e, em particu- de reservas, entre outros processos, o que pro-
lar, sobre a dormência imposta pelos tegumentos move o acúmulo de solutos e subseqüente en-
e pelos mecanismos de quebra da dormência é trada de água nas células, cuja expansão culmi-
tema dos Capítulos 7 e 8, respectivamente. na no alongamento embrionário (Bewley e
Black, 1994; Obroucheva e Antipova, 2000). Per-
cebe-se, pois, que a germinação engloba even-
O QUE É GERMINAÇÃO?
tos bioquímicos diversos, e a protrusão de uma
Antes de buscar definir dormência, seria apro- das partes do embrião para fora da semente
priado tratar sobre o que se entende por ger- reflete, sob um ponto de vista metabólico, o fi-
minação. O termo germinação apresenta dife- nal da germinação.
110 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

O QUE É DORMÊNCIA? pedimento à germinação se encontra no próprio


De uma forma simples, a dormência pode ser embrião, caracteriza-se a dormência fisiológica,
interpretada como uma falha de uma semente refletindo um impedimento metabólico ao
intacta e viável em germinar sob condições apa- alongamento embrionário. A dormência pode
rentemente favoráveis à germinação (Bewley, ainda ser categorizada em dois tipos quanto à
1997; De Castro e Hilhorst, 2000). Entende-se sua origem. Se o bloqueio à germinação é esta-
por condições favoráveis (ou essenciais) o su- belecido durante a maturação do diásporo ain-
primento de água, oxigênio e temperatura da aderido à planta-mãe, caracteriza-se a dor-
adequados ao alongamento embrionário. É cla- mência primária. Nesse caso, o diásporo já é
ro que o “suprimento adequado” para uma es- disperso dormente. Quando a dormência se es-
pécie pode não ser para outra, principalmente tabelece após a dispersão do diásporo, como po-
no que se refere a fatores como luz e tempera- de acontecer com algumas espécies quando as
tura, visto que espécies de diferentes locais e sementes encontram condições inapropriadas
origens podem requerer distintas condições à germinação, caracteriza-se a dormência se-
para a germinação (Labouriau, 1983). No en- cundária (Bewley e Black, 1994; Baskin e
tanto, oxigênio e água são elementos necessá- Baskin, 1998).
rios para a germinação das sementes da grande
maioria das espécies.
Quando uma semente encontra condições
DORMÊNCIA EMBRIONÁRIA
apropriadas para a germinação e, de fato, ger- Quando se trata de sementes, a dormência fisio-
mina, considera-se que ela estava quiescente. lógica pode ser também denominada dormên-
Quando uma semente é disposta sob condições cia embrionária, pelo fato de o bloqueio à germi-
adequadas para germinar, mas não germina, nação se localizar nas estruturas do embrião.
considera-se que ela se encontra dormente. Considera-se o embrião dormente quando ele
Uma forma de estimar o grau de dormência de apresenta metabolismo ativo durante a embe-
determinado lote de sementes é subtrair da bição, mas não apresenta diferenciação nem
quantidade de sementes viáveis a quantidade crescimento (Bewley, 1997). A não-germinação
de sementes germinadas. Essa diferença repre- pode resultar da imaturidade do embrião, quan-
senta a proporção de sementes do lote que se do este não se encontra formado e metabolica-
encontram dormentes sob determinada condi- mente apto a germinar, ou da presença, no em-
ção experimental (Murdoch e Ellis, 2000). Sen- brião maduro, de impedimentos metabólicos
do uma medida quantitativa bastante simples, ao alongamento embrionário (Figura 6.1). Se-
essa relação não apresenta informações sobre rão brevemente discutidos e exemplificados ti-
a natureza e as características qualitativas do pos de dormência embrionária antes de uma
tipo de dormência presente na semente. abordagem sobre mecanismos metabólicos en-
volvidos no controle da germinação.

TIPOS DE DORMÊNCIA
Diversos tipos de dormência têm sido identifi- IMATURIDADE DO EMBRIÃO
cados conforme o mecanismo de bloqueio à ger- Diversas espécies produzem sementes que são
minação (Capítulo 5). De modo geral, o blo- dispersas com o embrião imaturo. Em alguns
queio à germinação imposto pelos tegumentos casos, é possível identificar no embrião os coti-
da semente, seja restringindo a embebição, as lédones e o eixo embrionário, o que indica que
trocas gasosas e/ou a expansão do embrião, ca- houve diferenciação; contudo, o desenvolvi-
racteriza a dormência tegumentar ou física (Ca- mento foi incompleto. Nesse estágio, o embrião,
pítulo 7). Os embriões removidos dessas se- em dicotiledôneas, pode apresentar um aspecto
mentes germinam prontamente quando embe- cordiforme. Em casos mais extremos, ele não
bidos sob condições apropriadas. Quando o im- passa de uma massa de células indiferenciadas,
GERMINAÇÃO 111

Embriogênese Pós-maturação
e e
maturação germinação
C Embrião
imaturo
Condições
ambientais E
apropriadas Embrião
Influências do maduro
genótipo e do D Embrião maduro,
dormência não-dormente
ambiente
primária

F
Formação Embrião maduro, Germinação
da semente dormência
secundária F
G B
Sinais Condições
ambientais adversas para
específicos a germinação Condições
apropriadas
para a
Embrião germinação
maduro
A não-dormente

 Figura 6.1
Relação entre os tipos de dormência fisiológica. Durante a embriogênese, o embrião pode atingir sua maturi-
dade morfofisiológica (A) e, eventualmente, germinar sob condições apropriadas (B). Caso se encontre imaturo
(C) ou dormente (D), será necessário um período de pós-maturação para que o embrião atinja sua maturidade
(E). Estando dormente ou não, o embrião pode adquirir dormência secundária (F) caso as condições para a
germinação sejam inapropriadas. Sinais ambientais específicos são necessários para a superação da dormência
secundária (G) e a promoção da germinação (Bewley e Black, 1994).

caracterizando o estágio globular. Os estágios Diversas espécies de ocorrência em biomas


de desenvolvimento embrionário são abordados brasileiros produzem sementes com embriões
no primeiro capítulo, e aspectos mais gerais so- imaturos. Sementes de Ilex paraguariensis (erva-
bre este tipo de dormência são discutidos no mate), uma espécie de ampla ocorrência na re-
Capítulo 5 deste livro. gião sul do Brasil e em outras regiões subtropi-
Sementes com embriões imaturos não ger- cais da América do Sul, apresentam embriões
minam logo após a dispersão. Torna-se necessá- que, quando dispersos, se encontram ainda no
rio um período adicional para o completo de- estágio globular (Ferreira et al., 1991). Tais em-
senvolvimento do embrião, período este deno- briões necessitam de um período de baixa tem-
minado pós-maturação (Capítulo 8). Alguns peratura e alta umidade para seu completo de-
autores têm classificado esse tipo de bloqueio senvolvimento. Sementes de Annona crassiflora
como dormência morfológica, visto que o em- (araticum), uma espécie de ocorrência no Cer-
brião não se encontra totalmente desenvolvido. rado, também apresentam embriões imaturos.
Entretanto, a imaturidade do embrião pode não As sementes necessitam de alguns meses de
ser apenas morfológica, mas implicar também pós-maturação sob alta temperatura e umida-
a presença de barreiras fisiológicas ou requeri- de para o completo desenvolvimento embrioná-
mentos metabólicos que precisam ser supridos rio e germinativo (Rizzini, 1973). Sementes ma-
antes de o embrião se encontrar apto para ger- duras de Parkia pendula (angelim), uma árvore
minar. Essa “combinação de bloqueios” tem si- de ocorrência principalmente nas Florestas de
do denominada dormência morfofisiológica Terra Firme (Amazônia) e na Mata Atlântica,
(Baskin e Baskin, 1998). também apresentam embriões imaturos no mo-
112 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

mento da dispersão (Rizzini, 1977). Acredita- diferentes durante a formação do embrião e sua
se que as condições adequadas (ou necessárias) germinação (Laux e Jürgens, 1997).
ao desenvolvimento completo do embrião refli-
tam características climáticas predominantes
na região de ocorrência da espécie durante o DORMÊNCIA EM EMBRIÕES
período de pós-maturação das sementes MADUROS
(Baskin e Baskin, 1998). Grande parte das espécies produz sementes
As causas do desenvolvimento incompleto com embriões maduros cujas estruturas
do embrião durante a formação da semente na básicas, como cotilédones, eixo embrionário,
planta-mãe não estão bem-elucidadas. Estudos plúmula, escutelo, entre outras, se encontram
conduzidos com o gênero Ilex, entre outros, diferenciadas (Capítulo 4). Entretanto, nem
mostraram que o bloqueio do desenvolvimen- sempre sementes viáveis germinam quando
to embrionário pode ocorrer em diferentes es- dispostas sob condições apropriadas, o que indi-
tágios durante a embriogênese. Isso resulta ca que as mesmas se encontram dormentes. Em
em que as sementes, quando dispersas, possam um embrião maduro, esse tipo de dormência
apresentar embriões cuja imaturidade pode va- pode resultar de um impedimento metabólico
riar entre o estágio globular e o torpedo. A ultra- localizado tanto no eixo embrionário como nos
estrutura e os eventos celulares (e, provavel- cotilédones.
mente, os bioquímicos), durante a embriogêne-
se, são bastantes similares entre diferentes es- Dormência originada nos
pécies (Hu e Ferreira, 1989), mostrando certo cotilédones
grau de conservação no padrão de formação do O conhecimento de que certos embriões são
embrião (Laux e Jürgens, 1997). impedidos de germinar pelos cotilédones não
As estruturas da semente que envolvem o é recente. Entretanto, a maior parte dos exem-
embrião estão entre os principais agentes de plos de espécies que apresentam dormência in-
controle da embriogênese. No gênero Ilex, por duzida pelos cotilédones é de clima temperado,
exemplo, sabe-se que inibidor(es) presente(s) como Corylus avellana (avelã), Fraxinus excelsior
no endosperma atua(m) bloqueando o desen- e Pirus malus (maçã). A demonstração de que
volvimento embrionário (Hu e Ferreira, 1989). os cotilédones podem estar envolvidos na ini-
No caso de espécies como Pirus malus (maçã) e bição do alongamento embrionário é resultado
Helianthus annuus (girassol), o ácido abscísico de estudos conduzidos com embriões de maçã.
presente na semente tem sido considerado o Embriões isolados de sementes recém-colhidas
principal responsável pela inibição do desenvol- não germinam a 20oC. Contudo, a remoção pro-
vimento embrionário (Bewley e Black, 1994). gressiva de um ou dois cotilédones promove o
Assim como a dormência em embriões ma- alongamento embrionário (Figura 6.2).
duros, a imaturidade do embrião pode ser en- A inibição do alongamento embrionário
carada como uma forma de restringir a vivipa- pelos cotilédones sugere a difusão de substân-
ridade ou mesmo a germinação imediata após cias inibidoras para o eixo, mantendo-o na con-
a dispersão. Apesar de o ácido abscísico estar dição dormente. No caso da maçã, o ácido abs-
envolvido na dormência tanto em embriões ima- císico é o principal agente envolvido nesse blo-
turos quanto maduros, acredita-se que os me- queio (Bewley e Black, 1994).
canismos relacionados ao controle desses tipos A presença de cotilédones que inibem o
de dormência sejam distintos. Estudos mostram alongamento embrionário não exclui a possi-
que genes atuantes durante diferentes etapas bilidade de o próprio eixo embrionário estar dor-
na embriogênese são, em grande parte, distin- mente também. Em embriões de maçã, a re-
tos daqueles envolvidos na germinação, o que moção dos cotilédones promove a germinação,
identifica a execução de programas genéticos mas esta não passa dos 50% em sementes re-
GERMINAÇÃO 113

C
50

Germinação (%)
40

30
B

20

10
A

0
0 20 40 60
Tempo (dias)

 Figura 6.2
Germinação de embriões de Pirus malus (maçã) a 20oC. (A) embriões intactos; (B) embriões com um ou parte
dos dois cotilédones removidos; (C) embriões com os dois cotilédones removidos (Bewley e Black, 1994).

cém-colhidas (Figura 6.2). Alguns meses de ar- será visto adiante, em resposta aos fitormônios,
mazenamento sob baixas temperaturas e alta diferentes genes e proteínas são ativados em
umidade são necessários para que maior por- embriões dormentes e germinantes, resultando
centagem de germinação seja atingida. ou não no alongamento embrionário.
Diversas espécies comuns em biomas brasi-
Dormência localizada no eixo leiros produzem sementes dormentes (Quadro
embrionário 6.1). Como os tratamentos utilizados para a
Sementes de diversas espécies apresentam quebra da dormência não dizem respeito ape-
embriões cuja dormência não se origina nos co- nas à escarificação, isso sugere que as espécies
tilédones. Talvez um dos exemplos mais ilus- citadas produzem sementes com algum tipo de
trativos seja o caso do girassol. Estudos revelam dormência localizada no embrião.
que a remoção dos cotilédones não interfere no
grau de dormência do embrião, implicando que
o bloqueio à germinação está localizado especi- DORMÊNCIA SECUNDÁRIA
ficamente no eixo embrionário. Isso sugere a Dormência secundária corresponde àquela que
existência, no eixo embrionário, de mecanis- se estabelece após a dispersão da semente. Essa
mos de controle da germinação que podem ser condição pode ser induzida quando uma se-
ativados e mantidos tanto por sinais provenien- mente não-dormente encontra condições cli-
tes de outras partes da semente como por sinais máticas inapropriadas para a germinação, ou
provenientes do próprio eixo. por influência de substâncias inibidoras da ger-
Na prática, a dormência embrionária mani- minação presentes no meio, como fenóis e ou-
festa-se durante a embebição da semente, tros metabólitos secundários (Hilhorst, 1998).
quando a reidratação dos tecidos promove a A dormência secundária pode ser tanto induzi-
reativação do metabolismo celular, não resul- da quanto removida pelas condições ambientais
tando, contudo, no alongamento embrionário. nas quais a semente se encontra, e esse fenôme-
O direcionamento do metabolismo, para a ger- no pode ocorrer durante as sucessivas estações
minação ou para a dormência, reflete em parti- do ano (Figura 6.1). Autores têm associado esse
cular o balanço entre fitormônios promotores comportamento “cíclico” entre os estados de dor-
e inibidores da germinação (Figura 6.3). Como mência e quiescência das sementes aos padrões
114 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Indução (por GAs) do


enfraquecimento dos
tegumentos, degradação
de reservas, acúmulo de
Aumento da solutos – alongamento
respiração, embrionário
Conteúdo de água da semente metabolismo de
aminoácidos e
síntese de
mRNAs
e proteínas

Metabolismo da
Síntese e
germinação suprimido
degradação de
(por ABA) –
mRNAs e
manutenção
proteínas e síntese
da dormência
de fitormônios

Tempo

 Figura 6.3
Eventos metabólicos associados à embebição da semente, resultando na germinação ou na manutenção da
dormência no embrião. Adaptada de Bewley (1997) e Obroucheva e Antipova (2000).

de germinação observados sob condições am- bromélias que ocorrem em ecossistemas de


bientais, e esse tipo de comportamento encontra- Restinga produzem sementes que requerem luz
se entre os determinantes da dinâmica do banco para a germinação (Mercier e Guerreiro Filho,
de sementes no solo (Baskin e Baskin, 1998). 1990; Pinheiro e Borghetti, 2003). Espécies de
Não está bem-definido se a dormência se- ocorrência em campos abertos, como Cuphea
cundária difere fisiologicamente da dormência carthagenensis (Rosa e Ferreira, 1998), requerem
primária. Com freqüência, os sinais ambientais temperaturas alternantes para atingirem uma
que levam à remoção da dormência primária alta germinabilidade. Outras espécies podem
não são os mesmos da secundária; nem mesmo ter a dormência quebrada por KNO3, como é o
o principal agente envolvido no estabelecimen- caso da gramínea Erechtites valerianaefolia, po-
to da dormência primária, o ácido abscísico, pa- pularmente conhecida como capiçova (Zayat e
rece estar envolvido na indução da dormência Ranal, 1997). Os exemplos mostram que os tra-
secundária (Bewley e Black, 1994). Conside- tamentos relacionados à quebra da dormência
rando que as sementes, após dispersas, encon- podem variar entre luminosos, térmicos e quí-
tram-se no solo, acredita-se que entre os princi- micos. Embora os eventos metabólicos envol-
pais fatores ambientais envolvidos no controle vidos na manutenção da dormência durante a
da dormência secundária estejam o potencial os- embebição sejam ainda desconhecidos, esses
mótico e a temperatura (Hilhorst, 1998). resultados permitem postular ao menos duas
possibilidades quanto à natureza da dormência,
não mutuamente exclusivas: (1) existem diver-
QUEBRA DA DORMÊNCIA sos tipos de dormência embrionária nas semen-
Tanto sementes que apresentam embriões ima- tes, cada qual requerendo tratamentos especí-
turos quanto as que apresentam embriões ma- ficos para sua quebra; (2) existe um tipo básico
duros, porém dormentes, requerem determi- e conservado de bloqueio metabólico à germi-
nados tratamentos para a quebra da dormência. nação cuja quebra, entretanto, pode ser media-
Citando exemplos de espécies nativas, certas da por tratamentos tão diversos quanto tempe-
GERMINAÇÃO 115

Quadro 6.1 Espécies que produzem sementes dormentes e sinais envolvidos na quebra da dormência

EMBRIÃO IMATURO
Agente de quebra
Espécie Família Ocorrência da dormência Referência

Annona crassiflora Annonaceae Cerrado Armazenamento Rizzini, 1973


Ilex paraguariensis Aquifoliaceae Matas (de altitude, Armazenamento Ferreira et al., 1991
de pinhais) (?)

Parkia pendula Leguminosae- Floresta Amazônica, Armazenamento Rizzini, 1977


Mimosoideae Mata Atlântica (?)

EMBRIÃO MADURO

Bidens gardneri Asteraceae Cerrado Luz ou Felippe, 1990


armazenamento

Bromelia antiacantaha Bromeliaceae Matas de galeria Armazenamento Rosa e Ferreira,


a 5 ou 25oC 1998

Cuphea carthagenensis Lythraceae Campos abertos Temperaturas


alternantes

Cereus jamacaru Cactaceae Caatinga Luz Prisco, 1966

Clidemia hirta Melastomataceae Cerrado, borda de Pós-maturação Pereira-Diniz, 2003


matas (no solo)

Erechtites valerianaefolia Asteraceae Ambientes úmidos, KNO3 Zayat e Ranal,


perturbados 1997

Solanum lycocarpum Solanaceae Cerrado Lavagem, Borghetti, 2000


temperatura
alternante

Aloysia gratissima Verbenaceae Formações florestais Luz Rosa e Ferreira,


Psychotria leicocarpa Rubiaceae e secundárias Temperatura 2001
alternante

Aechmea nudicaulis e Bromeliaceae Restinga Luz Pinheiro e


Streptocalyx floribundus Borghetti, 2003

Aechmea distinchantha e Bromeliaceae Restinga Luz Mercier e


Neuregelia cruenta Guerreiro Filho,
1990

Três espécies de Cecropia, Cecropiaceae, Floresta Tropical Luz Válio e Scarpa,


Três de Solanum, Croton Solanaceae, (Mata Atlântica) 2001
floribundus e Miconia Euphorbiaceae e
chamissois Melastomataceae

Eupatorium Asteraceae Capoeira e orla Temperatura Maluf e Wizentier,


vauthierianum de Mata e luz 1998
116 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

ratura e agentes químicos. Evidências têm leva- a atividade de diversas enzimas do metabolis-
do à idéia de que mecanismos comuns e conser- mo são bastante similares em embriões dor-
vados de controle da germinação, pela percep- mentes e germinantes (Bewley e Black, 1994;
ção de sinais ambientais e variações no balanço Ballard, Foley e Bauman, 1996). Esses resulta-
hormonal, modulam a germinação de diversas dos sugerem que a passagem da condição dor-
espécies (Bewley, 1997). mente para a germinante envolve variações “dis-
cretas” no metabolismo embrionário durante a
embebição (Figura 6.3).
FITORMÔNIOS E DORMÊNCIA
Nas sementes, o estabelecimento da dormência
durante a formação do propágulo é um processo MEMBRANAS E O
ativo, isto é, envolve síntese protéica, ativida- CONTROLE DA DORMÊNCIA
de respiratória e consumo de ATP (Bewley e Diversas hipóteses têm tentado explicar meca-
Black, 1994). Estudos comprovaram que o fitor- nismos de controle da dormência embrionária.
mônio ácido abscísico (ABA) é o principal agen- Por exemplo, foi proposto que a restrição ao
te envolvido no estabelecimento da dormência alongamento embrionário em sementes de ma-
embrionária durante a maturação da semente çã poderia decorrer, ao menos em parte, de uma
na planta-mãe. O uso de inibidores da síntese limitação no fornecimento de monossacarídeos
do ABA, durante a embriogênese, resultou na e da baixa eficiência de rotas metabólicas clássi-
formação de embriões não-dormentes (Hilhorst, cas como a glicólise (Lewak, Bogatek e Zarska-
1995), e o uso de mutantes deficientes, na sín- Maciejewska, 2000). A “carência de substra-
tese ou percepção ao ABA, produziu sementes tos” (em particular para a via das pentose-fos-
não-dormentes (Karseen, 1995). Além da sua fatos) também estaria envolvida no desenvolvi-
participação no estabelecimento da dormência mento anormal dos cotilédones dos embriões
durante a embriogênese, verificou-se também germinantes. Entretanto, como os próprios au-
que, durante a embebição, a síntese desse fitor- tores salientam, essa hipótese não explica even-
mônio é necessária para a manutenção da dor- tos primários observados na quebra da dormên-
mência no embrião (Garello et al., 2000). Esses cia embrionária, como mudanças na estrutura
resultados mostram que o ABA tanto induz a e nas propriedades das membranas, variações
dormência durante a maturação quanto blo- na síntese de proteínas específicas e nos níveis
queia a germinação durante a embebição. hormonais durante a passagem da dormência
A quebra da dormência, por outro lado, en- para a germinação (Lewak, Bogatek e Zarska-
volve tanto a redução nos tecidos embrionários Maciejewska, 2000).
da concentração de inibidores da germinação, A “hipótese da membrana” sugere que a
como o ABA, quanto a síntese de fitormônios quebra da dormência envolve efeitos (particu-
promotores da germinação. Entre os principais larmente da temperatura) nas propriedades das
fitormônios envolvidos na quebra da dormência membranas, alterando características como sua
em sementes se encontram as giberelinas (GAs) fluidez e integridade, o que se reflete principal-
(Karseen, 1995) e o gás etileno (Kepczynski e mente na atividade e na disponibilidade de recep-
Kepczynska, 1997). Ambos os fitormônios mo- tores protéicos associados às mesmas (Hilhorst,
dulam o metabolismo celular de maneira a pro- 1998). Entre estes poderiam se incluir recepto-
mover o alongamento embrionário. res ao nitrato e proteínas que interagem com o
Intrigante, entretanto, é o fato de que gran- fitocromo (como será visto adiante). De acordo
de parte dos eventos metabólicos que ocorrem com esse conceito, a indução da dormência se-
durante a embebição em sementes dormentes ria decorrente da inativação de receptores-cha-
também ocorre em sementes germinantes; as ve presentes nas membranas, enquanto a que-
taxas respiratórias, os perfis de síntese de pro- bra da dormência resultaria do aumento na ati-
teínas e ácidos nucléicos, o consumo de ATP e vidade e/ou na probabilidade de interação entre
GERMINAÇÃO 117

receptores e agentes quebradores da dormência, nases e fosfatases, entre outras proteínas,


tanto externos (nitrato) como parceiros intrace- atuando, assim, na expressão gênica. Essas ob-
lulares de reação (fitocromo). Dessa interação servações abrem a possibilidade de incluir no-
iniciaria uma cascata de transdução de sinais vas alternativas de abordagem dos mecanismos
que envolveria a síntese de fitormônios promo- envolvidos no controle da germinação.
tores da germinação (GAs) e da ativação do
metabolismo voltado ao alongamento embrio-
nário (Hilhorst, 1998). Por sua natureza, essa DA MEMBRANA AO NÚCLEO –
hipótese é aplicável principalmente ao caso de QUEBRA DA DORMÊNCIA E
indução e remoção da dormência secundária GERMINAÇÃO
em sementes. Estudos mostraram que a indu- A propagação intracelular de sinais provenien-
ção da dormência secundária é caracterizada tes de receptores localizados na membrana
pela perda da sensibilidade a agentes quebra- plasmática ao aparato genético envolve agentes
dores da dormência como luz e nitrato (Bewley tão diversos quanto adenilato ciclase, ácidos
e Black, 1994), fatos estes que argumentam em fosfatídicos, MAPKs1 , lipoxigenase e mesmo re-
favor da hipótese. ceptores de membrana que apresentam ativida-
Observações experimentais de que substân- de quinase. Grande parte desses agentes ocorre
cias tão diversas quanto álcoois e ácidos orgâni- no citoplasma. Eles são ativados em resposta a
cos quebravam a dormência de sementes de di- diversos sinais intra e extracelulares que inte-
versas espécies levaram à formulação da “hipó- ragem com os respectivos receptores. A propa-
tese dos anestésicos” (revisada por Cohn e gação do sinal é realizada por reações específi-
Hilhorst, 2000). Essa denominação foi dada em cas que seguramente envolvem a atividade de
virtude de os efeitos de tais agentes nas mem- quinases e fosfatases. Estas enzimas, por sua vez,
branas serem similares aos gerados pelos anes- atuam na regulação de fatores de transcrição
tésicos. Considerando que vários desses agentes cuja interação com sítios promotores leva à ini-
químicos quebradores de dormência apresen- bição ou à ativação da expressão gênica, modu-
tam um certo grau de solubilidade em lipídeos, lando, assim, o metabolismo conforme o tipo
essa hipótese sugere que a quebra da dormência de sinal atuante (Ladyzhenskaya e Protsenko,
passaria pela interação dessas substâncias com 2002).
as membranas, alterando propriedades como
permeabilidade, fluidez, estrutura e atividade ABA e manutenção da dormência
de receptores, de forma similar aos efeitos pro- Estudos revelaram que a transdução do sinal
movidos pela temperatura, levando à germina- gerado pelo ABA inicia com sua ligação a recep-
ção. Recentemente, observou-se que a quebra tores (ainda desconhecidos) supostamente lo-
da dormência por agentes químicos, como os calizados na membrana plasmática ou em mem-
álcoois, requer que os mesmos ingressem na branas situadas no citosol. Ao interagir com es-
célula e sejam catabolizados, modificando o ses receptores, o ABA promove eventos-cascata
metabolismo celular, elicitando a quebra da dor- que envolvem a ativação de proteínas-G e a par-
mência (Cohn e Hilhorst, 2000) ampliando a ticipação de mensageiros secundários como
gama de efeitos mediados por esses agentes no inositol-3 fostato, fosfatases e quinases, o que
controle da germinação. resulta na ativação e/ou repressão de diversos
Diversos genes e proteínas estão envolvidos genes, além de modificações na concentração
na decisão entre germinar ou permanecer dor- intracelular de cálcio e calmodulina (Finkelstein,
mente. Sabe-se que agentes quebradores da Gampala e Rock, 2002).
dormência (tão diversos quanto luz, GAs e eti-
leno, assim como agentes envolvidos no estabe-
lecimento e na manutenção da dormência, co- 1
MAPK: Mitogen-Activated Protein Kinases, quinases ativadas por
agentes mitogênicos (Jonak, Heberle-Bors e Hirt, 1994).
mo o ABA) modulam a atividade de várias ki-
118 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

O ABA induz e bloqueia a expressão de di- versos desses transcriptos “inibidores” da ger-
versos genes, entre eles, os que codificam po- minação (como o RGL2) desaparecem sob tra-
lipeptídeos com domínio de ligação ao RNA (Ni- tamento com GAs exógenas (Peng e Harberd,
colás et al., 1997) e proteínas diversas (Barduche 2002). Em contrapartida, foram identificados
et al., 1999). Embora se desconheça a identi- genes (CTS) ativados pelas GAs que atuam na
dade dos transcriptos, acredita-se que eles estão promoção da germinação e na repressão da dor-
envolvidos na dormência e que a inibição da mência embrionária (Russel et al., 2000).
síntese e/ou a remoção ativa dos mesmos sejam As GAs promovem a síntese de enzimas en-
necessárias para a progressão da germinação volvidas no enfraquecimento dos tegumentos
(Nicolás et al., 1997). O ABA também inibe a (endo-β-mananases, expansinas) e/ou a hidró-
expressão de genes que codificam enzimas en- lise de reservas (amilases), eventos relaciona-
volvidas na degradação de reservas como ami- dos principalmente à protrusão da radícula
lases e proteinases, cuja síntese é promovida (Bewley e Black, 1994). Esses resultados indi-
pelo ácido giberélico (Barduche et al., 1999). cam que as GAs agem tanto na quebra da
Assim, o ABA atua tanto promovendo a sínte- dormência, por atuar no silenciamento de genes
se de proteínas “inibidoras” da germinação co- envolvidos na manutenção da dormência
mo inibindo a síntese de enzimas envolvidas (Koornneef, Bentsink e Hilhorst, 2002), como
na mobilização de reservas. Isto permite supor na progressão do alongamento embrionário,
que a quebra da dormência passa pelo silen- por promover a síntese de enzimas envolvidas
ciamento desses genes e pela remoção ativa de na mobilização de reservas (Bewley, 1997). Es-
proteínas inibidoras da germinação. De fato, di- sas observações têm colocado as GAs como o
versos polipeptídeos sintetizados em resposta principal agente envolvido na quebra da dor-
ao ABA desaparecem durante a germinação, e mência em sementes (Peng e Harberd, 2002).
uma das ações desse fitormônio, em sementes, A rota intracelular de transdução de sinal
é o bloqueio da atividade de diversas proteina- do etileno inicia na interação deste gás com re-
ses (Barduche et al., 1999). ceptores de membrana (codificados por genes
tipo o ETR1) e, por meio da modulação da ativi-
Fitormônios e a quebra da dormência dade de quinases (como o CTR1), regula a ex-
As giberelinas (GAs) apresentam um per- pressão de diversos genes como o EIN3. Em par-
fil de ação intracelular similar ao do ABA, en- ticular, o gene CTR1 codifica um polipeptídeo
tretanto, de efeito antagônico no metabolismo (~90 kDa) com grande similaridade estrutural
embrionário. Este fitormônio se liga a um re- e funcional ao grupo das serina-treonina quina-
ceptor de membrana, que interage provavel- se, que atua negativamente na rota de resposta
mente com proteínas-G também associadas à a este fitormônio. Acredita-se que a ligação do
membrana plasmática. Diversos genes que co- etileno ao receptor resulta na sua ativação, que,
dificam polipeptídeos envolvidos na rota de si- por sua vez, atua inibindo a atividade do CTR1
nalização das GAs foram identificados por es- (Bleecker, 1999). Há evidências que apontam
tudos conduzidos com plantas mutantes para a participação de MAPK quinases no me-
(Olszewski, Sun e Gubler, 2002). Entre eles, canismo de transdução de sinal do etileno.
genes que codificam fatores de transcrição que Muitas questões permanecem em aberto
atua especificamente no controle da germina- quanto às etapas envolvidas entre a percepção
ção foram identificados em Arabidopsis thaliana, ao etileno e a quebra da dormência. Recentes
Lycopersicum esculentum (tomate) e Nicotiana estudos mostraram que o etileno e o ácido abs-
tabacum (tabaco) (Peng e Harberd, 2002). O císico partilham elementos de transdução de
interessante é que parte desses fatores de trans- sinal. Beaudoin e colaboradores (2000) verifica-
crição atua como inibidores da germinação, e ram que o etileno regula negativamente o grau
as GAs parecem promover a germinação supri- de dormência em A. thaliana por suprimir a ex-
mindo a ação de tais polipeptídeos. De fato, di- pressão de genes envolvidos na sinalização do
GERMINAÇÃO 119

ABA. Em contrapartida, verificou-se que o eti- Nesse esquema, foram desconsideradas as


leno promove a síntese de uma cisteína-pro- diversas formas intermediárias entre o Fv e o
teinase durante a germinação de sementes de Fve (Bewley e Black, 1994). Essa fotorreversi-
Cicer arietinum, acúmulo este inibido pelo ABA bilidade é dinâmica, e a forma ativa, quando
(Cervantes, Rodriguez e Nicolás, 1994). O uso atinge determinada concentração, elicita a res-
de um inibidor específico (lactacistina) da ati- posta em questão. Sabe-se que os requerimen-
vidade do complexo multicatalítico proteasoma tos de luz para a germinação dependem, em
mostrou que a quebra da dormência por etileno grande parte, das condições luminosas experi-
envolve a proteólise seletiva mediada por essa mentadas pelas sementes durante sua matu-
macromolécula (Borghetti, Noda e Sá, 2002). ração, quando ainda estavam presas à planta-
Esses resultados revelam que a ação do etileno mãe (Capítulo 5). Por outro lado, a composição
na remoção da dormência em sementes envol- espectral da luz, sob condições naturais, varia
ve tanto a síntese como a degradação de deter- em função de diversos fatores, como horário
minadas proteínas. Lembrando que outros agen- do dia e grau de cobertura vegetal. Essa varia-
tes promotores da germinação, como as GAs, ção permite às sementes, via fitocromo, iden-
também induzem a síntese de proteinases du- tificarem sua posição no solo (se enterradas ou
rante a germinação (Asano et al., 1999), tais re- na superfície) e sua localização no ambiente
sultados sustentam a hipótese de que tanto o (se sob a copa das árvores ou em ambiente aber-
silenciamento de genes envolvidos na dormência to). Uma discussão mais geral sobre a interfe-
como a remoção de polipeptídeos inibidores da rência da luz na germinação é encontrada no
germinação fazem parte do processo de remoção Capítulo 8.
da dormência em sementes. Não se sabe ao certo quais são os passos
metabólicos intermediários entre a ativação do
Outros agentes envolvidos na fitocromo e a resposta fisiológica. Tratando-se
quebra da dormência de uma proteína com atividade quinase, acredi-
O pigmento fitocromo tem sido considera- ta-se que o fitocromo atua sobre diversos subs-
do o principal agente envolvido na percepção tratos e, por meio de um ou mais parceiros de
do sinal luminoso que induz à germinação. Essa reação presentes no citoplasma, modula a trans-
proteína (~124 KDa) apresenta um cromóforo dução de sinais e a expressão gênica. Na sua
ligado covalentemente, ocorre como um dímero forma ativa (Fve), o fitocromo migra para o nú-
no citosol e está envolvida no controle de diver- cleo, interage com fatores de transcrição e con-
sos eventos, como floração, ritmos circadianos, trola a expressão de genes cuja transcrição é
nastismos e germinação. O fitocromo encontra- regulada pela luz, elicitando assim distintas res-
se sob duas formas principais: uma inativa, Fv, postas nas células (Smith, 2000).
que, ao absorver luz vermelha (660 nm), se Entre os tipos de fitocromos conhecidos,
transforma na forma ativa, Fve; e esta, que, aquele codificado pelo gene PHYA parece ser o
por sua vez, absorve luz na região vermelho- principal envolvido no controle da germinação
extremo do espectro (730 nm), transformando- pela luz. Recentes estudos mostraram que o fi-
se novamente na forma inativa. tocromo promove a germinação por meio da
síntese de giberelinas (Peng e Harberd, 2002).
→ →
Tais resultados indicam que a ação da luz na
↑ ↓
germinação pode passar pela modulação, via
Fv Fve → → germinação
fitocromo, da concentração intracelular desse
↑ ↓
fitormônio na semente.
← ←
Outros agentes que quebram a dormência
foram identificados nas plantas, entre eles, os
brassinoesteróides (BRs). Os BRs representam
uma família com mais de 40 hormônios este-
120 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

roidais encontrados em diversas espécies vege- permas ancestrais pudessem deixar os ambien-
tais, principalmente no pólen e nas sementes. tes úmidos, invadir e se estabelecer em ambien-
São reconhecidos por regularem múltiplas res- tes mais secos e até então não-colonizados (Ma-
postas nas plantas, como o alongamento e a pes, Rothwell e Haworth, 1989). Postula-se,
divisão celular, o desenvolvimento do tubo po- pois, que a dormência inicialmente tenha surgi-
línico e o crescimento de plantas no escuro do com uma função morfogenética – organiza-
(skotomorfogênese). Entretanto, recentes estu- ção temporal e espacial do desenvolvimento da
dos sugeriram que os BRs podem atuar de for- planta – antes de tornar-se também um meca-
ma similar às GAs, tanto por quebrarem a dor- nismo de restrição do alongamento embrioná-
mência imposta pelo ABA como por estimula- rio sob situações climáticas desfavoráveis (Ma-
rem a germinação (Steber e McCourt, 2001). pes, Rothwell e Haworth, 1989; Viémont e
Observou-se que os BRs promovem a germina- Crabbé, 2000).
ção de sementes de plantas mutantes cuja rota Espécies vegetais pertencentes aos mais
de síntese (ou sensibilidade às GAs) foi supri- diversos taxa, de ocorrência nos mais variados
mida. Acredita-se, contudo, que o efeito de res- ecossistemas, produzem sementes com alguma
gatar a germinação em plantas mutantes resul- forma de bloqueio da germinação (Capítulo 5).
ta da ação dos BRs em promover a expansão Embora existam diversas modalidades de dor-
do hipocótilo, logo, é um efeito específico no mência (Baskin e Baskin, 1998), sua origem
alongamento embrionário. em grupos ancestrais e a redundância de boa
Pouco se conhece sobre a rota de transdução parte dos genes relacionados ao seu controle
de sinais dos brassinoesteróides. Foi identificado (Peng e Harberd, 2002) sugerem certo grau de
um gene (BRI1) que codifica uma proteína de conservação nos mecanismos envolvidos no
membrana com atividade kinase, sugerindo tra- controle da germinação.
tar-se de um receptor aos BRs, e estudos mostra- Acredita-se que a dormência em sementes
ram que a rota de transdução de sinais dos BRs seja um evento programado básico. A embebi-
interage com a sinalização mediada por ABA, ção da semente ativa diversos processos fisioló-
GAs e auxinas (Steber e McCourt, 2001). gicos e bioquímicos e induz, direta ou indireta-
mente, a expressão de genes (tipo RGL2) que
restringem a germinação e mantêm a dormên-
EPÍLOGO – ORIGENS DA cia. Sinais ambientais (temperatura, luz) indu-
DORMÊNCIA E MECANISMOS zem a síntese de GAs que, por sua vez, blo-
DE REGULAÇÃO queiam a expressão de genes repressores da ger-
INTRACELULAR DA minação (RGL2, SPY) e/ou promovem a degra-
GERMINAÇÃO dação dos respectivos produtos (mRNAs e pro-
Acredita-se que a dormência tenha surgido nas teínas), aumentando assim o potencial de ger-
gemas há cerca de 400 milhões de anos (devo- minação do embrião. Ao mesmo tempo, GAs
niano inferior) como um mecanismo restritivo sintetizadas de novo iniciam sinais por meio
da ramificação e do crescimento das plantas de fatores de sinalização (GCR1, SLY, CTS) que,
sob condições ambientais desfavoráveis, como por sua vez, promovem a síntese de enzimas
pouca disponibilidade de nutrientes. Cerca de hidrolíticas que modificam a parede celular, en-
100 milhões de anos mais tarde (devoniano su- fraquecem o tegumento e possibilitam a germi-
perior), começaram a aparecer as primeiras se- nação (Peng e Harberd, 2002).
mentes com embriões dormentes, o que inicial- Pouco a pouco, os mecanismos envolvidos
mente possibilitou que a fertilização e a em- na manutenção da dormência vêm sendo iden-
briogênese sucedessem sem necessidade de tificados, e uma compreensão mais ampla do
água no meio externo (Viémont e Crabbé, controle da germinação está sendo adquirida. O
2000). Essa parada temporária do desenvolvi- esquema a seguir procura integrar recentes in-
mento embrionário permitiu que as gimnos- formações quanto aos componentes celulares
GERMINAÇÃO 121

LUZ
GAs VERMELHA
ABA BRs

ETILENO ? ?
PTN-G P PTN-G P BRI1
ETR1 P
? SLY1
P

ABI-1 PHYA
MEMBRANA
PLASMÁTICA
CTS RGL2

CTR1 ?
P EIN2
ABI3 SPY

P Atividade quinase
CITOPLASMA

Setas indicam efeitos promotores;


traços truncados, efeitos inibidores.
GERMINAÇÃO

 Figura 6.4
Esquema integrando as rotas de transdução de sinais dos principais agentes envolvidos na manutenção e na
quebra da dormência em sementes. Etileno e giberelinas (GAs) não participam na regulação da dormência
durante a maturação, mas estão envolvidos na quebra da dormência durante a embebição (Beaudoin et al.,
2000; Finkelstein, Gampala e Rock, 2002). Etileno: pode promover a germinação por interferir diretamente na
sinalização do ABA (Ross e O’Neill, 2001); assim como ETR1, EIN2 é um regulador positivo da sinalização do
etileno e inibe a sinalização do ABA (EIN2 suprime ABI1); CTR1 é regulador negativo da rota do etileno, ativa
ABI-1 e mantém a dormência (não indicado). ABA: receptor ainda não foi identificado, interage supostamente
com proteínas-G (PTN-G) e está associado à membrana plasmática ou presente no citosol. Os genes codificados
por ABI-1 ao ABI-5 (apenas ABI-1 indicado) são reguladores negativos da rota do ABA. ABI3 e ABI4 (não
indicado) codificam fatores de transcrição que atuam positivamente na sinalização do ABA (inibindo a germina-
ção). GAs: rota de transdução é pouco conhecida, receptor ainda não foi determinado, poucos intermediários
identificados. GAs sozinhos não cobrem todos os efeitos ambientais que atuam na dormência e na germina-
ção. RGL2 e RGL1 (não indicado) codificam fatores de transcrição nucleares e são reguladores negativos da
germinação; SPY é um regulador negativo da rota que leva à germinação. CTS promove germinação e reduz
a dormência. SLY1 é fator-chave na recepção à GA, suprime a sinalização do ABA (Koornneef et al., 2002).
Fitocromo: sinais mediados pelo fitocromo induzem a síntese de GAs (Peng e Harberd, 2002), sugerindo a
participação de GAs na promoção da germinação pela luz. PHYA parece codificar o fitocromo envolvido na
sinalização em sementes (Smith, 2000). Brassinoesteróides: BRI1 codifica um receptor de membrana com
propriedades quinase (Kende, 2001). Os brassinoesteróides (BRs) não são absolutamente requeridos para
germinação. Não se sabe se BRs estimulam síntese ou ação das GAs, mas sabe-se que BRs resgatam a
germinação de plantas mutantes deficientes na produção e/ou na resposta às GAs. Além disso, BRs mutantes
são sensíveis ao ABA e poderiam intermediar efeitos da luz e do frio na promoção da germinação. BRs
parecem promover expansão do embrião (Steber e McCourt, 2001). Partilhar rotas de transdução de sinais faz
com que menos elementos sejam necessários para a sinalização hormonal geral (Ross e O’Neill, 2001).

identificados na sinalização que leva à manuten- Como a ponta de um iceberg, este esquema mos-
ção da dormência e à germinação e suas prová- tra apenas os primeiros passos das descobertas
veis interações em nível intracelular (Figura 6.4). que os novos rumos de investigação prometem.
122 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

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C A P Í T U L O 7

ENVOLTÓRIOS
Sonia Cristina Juliano Gualtieri de Andrade Perez

A semente é uma estrutura na qual o embrião w funciona como uma barreira contra a en-
de uma planta, em geral totalmente desenvolvi- trada de microrganismos na semente;
do, é disperso. Essa estrutura permite ao em- w regula a velocidade de embebição das se-
brião sobreviver durante o período compreendi- mentes;
do entre a maturação da semente e o estabeleci- w controla a velocidade das trocas gasosas;
mento da plântula, iniciando a próxima gera- w regula a germinação, ocasionando a dor-
ção. mência.
Segundo Carvalho e Nakagawa (2000), as
sementes das angiospermas são constituídas A dormência das sementes é uma forma
pela estrutura protetora (tegumento), pelo em- natural de distribuir a germinação no tempo e
brião (com um, dois ou mais cotilédones, eixo no espaço e de permitir que a semente inicie a
embrionário) e pelo tecido de reserva, que, às germinação quando as condições ambientais
vezes, pode estar ausente. Em relação ao aspec- vierem a favorecer a sobrevivência das plântu-
to funcional, pode-se dizer que as sementes são las. Sementes viáveis que não germinam sob
formadas pelo tegumento (casca), pelo(s) teci- condições apropriadas são consideradas dor-
do(s) de reserva (cotilédone[s], endosperma, pe- mentes (Capítulo 5). A dormência e a germina-
risperma) e pelo eixo embrionário (Capítulo 4). ção são características adaptativas complexas,
Denomina-se popularmente de casca o en- influenciadas tanto por genes como por fatores
voltório externo que define a semente, podendo ambientais, sendo determinadas pela ação do
ser constituído somente pelo tegumento, como potencial de crescimento do embrião e das res-
também pelo pericarpo. O tegumento pode in- trições impostas pelos envoltórios que circun-
cluir estruturas de cobertura como gluma, le- dam o mesmo (Koornneef, Bentsink e Hilhorst,
ma, pálea, fruto, testa e mesmo camadas mais 2002). Quando a dormência está relacionada
profundas como o endosperma. Aparentemen- aos envoltórios, é denominada dormência im-
te, existe uma associação entre a espessura da posta pela casca. Nesse caso, os envoltórios fun-
casca e o grau de domesticação da espécie, uma cionam como uma barreira à germinação que
vez que muitas espécies selvagens apresentam o embrião não consegue superar.
tegumentos mais espessos. Além disso, os en- A dormência imposta pelos envoltórios tem
voltórios sofrem influência do ambiente, que os seguintes efeitos sobre o embrião (Bewley e
provoca alterações em sua espessura e em sua Black, 1994):
composição. w interferência na absorção da água;
A casca desempenha as seguintes funções: w interferência no alongamento embrioná-
w protege as partes internas contra abra- rio;
sões e choques; w interferência nas trocas gasosas;
w impedimento à saída de inibidores e/ou
fonte de inibidores da germinação.
126 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Assim, a inibição do processo germinativo várias partes dos tegumentos. Em particular,


pode ser devida à ação de um ou mais dos fatores partes do tegumento da semente nas quais a
recém-listados. Sob condições naturais, a dor- fita hidrofóbica está localizada mais superficial-
mência das sementes é um processo importante mente tendem a ser mais impermeáveis à água
na dinâmica das populações naturais, uma vez do que certas partes da chalaza, na qual essa
que está relacionada à adaptação das plantas à fita hidrofóbica está localizada mais profunda-
heterogeneidade do ambiente (Capítulo 8). mente dentro da camada de células paliçádicas
As sementes dormentes têm sua longevi- (Figura 7.1).
dade aumentada, permanecendo no solo, sem A casca e suas estruturas, como o hilo, a
germinar, até que sejam umedecidas o suficien- micrópila, o estrofíolo e a chalaza, se constitu-
te para permitir a penetração de água, as trocas em em barreiras à entrada de água ou em áreas
gasosas ou a neutralização de inibidores quími- de fraqueza, onde a embebição se inicia. O ca-
cos. A germinação de sementes de algumas es- minho do movimento de água para dentro das
pécies pode ser favorecida pela exposição ao fo- sementes pode ser traçado usando ácido ósmi-
go, ao ataque de microrganismos, ou após a pas- co, corantes ou iodo. Estudos ontogenéticos in-
sagem pelo trato digestivo de animais. O tempo dicam que a impermeabilidade à água ocorre
de duração da dormência pode variar desde al- no final do desenvolvimento das sementes. Essa
gumas semanas até vários anos, dependendo característica pode ser manipulada durante o
da espécie e das condições ambientais (Morris, período de maturação das mesmas, em decor-
Tieu e Dixon, 2000). rência de variações na duração do dia, na nu-
A seguir, serão analisados isoladamente os trição mineral ou na disponibilidade hídrica.
diferentes efeitos dos envoltórios sobre o em- Bewley e Black (1994) ressaltam a presença
brião. das estruturas como o hilo, a micrópila e o es-
trofíolo na casca das sementes pertencentes à
família Fabaceae. A micrópila é aparentemente
INTERFERÊNCIA NA permeável em algumas espécies, mas não em
ABSORÇÃO DE ÁGUA outras. No caso de Phaseolus lunatus, ela está
A casca espessa e/ou impermeável é responsável obstruída, e a pequena fissura do hilo permane-
pelo impedimento da absorção de água, sendo ce fechada até que a semente fique exposta a
bastante comum entre espécies da família Fa- baixos teores de umidade. O estrofíolo perma-
baceae, assim como em Cannaceae, Convolvu- nece intacto até que as sementes sejam expos-
laceae, Chenopodiaceae, Geraniaceae, Liliaceae, tas a condições que ocasionem a ejeção desta
Malvaceae e Solanaceae. estrutura.
A entrada de água pode ser bloqueada por Dessa forma, a casca é um tecido muito efi-
várias partes dos envoltórios, como, por exem- ciente no bloqueio à entrada de água. A com-
plo, uma cutícula serosa, a suberina, o tecido preensão das características físicas e anatômi-
paliçádico e as camadas de macroesclereídes. cas do tegumento permite, a curto prazo, a apli-
(Capítulo 4). cação do melhor tratamento para promover a
Conforme descrito por Serrato-Valenti, Ferro germinação das sementes e, a longo prazo, a
e Modenesi (1990), várias espécies do gênero manipulação, por meio de cruzamento entre
Prosopis apresentam uma fita hidrofóbica na ca- espécies de diferentes procedências, e a alteração
mada de células paliçádicas, que funcionam co- das características dos envoltórios das sementes.
mo uma barreira à entrada da água. Os autores A escarificação mecânica é uma técnica em-
afirmam também que a posição e a estrutura pregada para sobrepor os efeitos de uma cober-
das células paliçádicas, no interior da casca, di- tura impermeável à água e aos gases. Esse tipo
ferem de acordo com a sua localização. Essas de escarificação pode ser realizado rolando-se
diferenças podem ser responsáveis por varia- as sementes entre duas lixas de papel, usando
ções na permeabilidade à água exibida pelas um estilete, uma faca ou um bisturi para rom-
GERMINAÇÃO 127

hm r hm r
A1 A2 B

ch r ch r
2,5 mm 15 μg

 Figura 7.1
Sementes de Prosopis juliflora. A: Visão do lado achatado (A1) e do lado estreito (A2); hm r = região hilo-
micrópila; ch r = região da chalaza. B: Células paliçádicas maceradas, com as setas indicando as diferentes
localizações de tiras hidrofóbicas e as diferentes alturas das células paliçádicas (Serrato-Valenti, Ferro e
Modenesi, 1990).

per os seus envoltórios. Porém, deve-se tomar A escarificação também pode ser realizada
cuidado para não injuriar o embrião. Para isso, misturando-se as sementes com areia grossa.
é preciso abrir algumas sementes e, com o uso Essa mistura é colocada dentro de um recipien-
de uma lupa, determinar a localização exata te hermeticamente fechado, que será agitado
do embrião no interior das mesmas. Pode ser vigorosamente durante um certo período tanto
tomada como referência a micrópila, que é o maior quanto mais espesso for o tegumento.
primeiro ponto de ligação da semente ao fruto. Altas pressões, da ordem de 50 a 200 MPa,
Sementes grandes são facilmente escarifi- também ocasionam fissuras nos envoltórios,
cadas com uma faca ou bisturi. A punção do aumentando assim a permeabilidade das se-
tegumento, feita do lado oposto ao da emissão mentes à água e aos gases.
da radícula, embora seja um método bastante O uso de calor seco pode promover uma
trabalhoso, produziu incrementos na velocida- retração do tegumento em várias espécies. O
de e na porcentagem de germinação em espé- aquecimento em estufas é mais adequado do
cies como Chorisia speciosa (paineira) (Fanti, que o uso de um fogão convencional. Para tra-
2001) e Pterogyne nitens (amendoim do campo) tar a casca das sementes dessa forma, utilizam-
(Nassif e Perez, 1997). se recipientes refratários rasos para acomodar
O uso de lixa para escarificar os envoltórios as sementes, colocando-os em uma estufa pré-
pode ser eficiente para algumas espécies de Sen- aquecida. O tempo de permanência e a tempe-
na (Baskin, Nan e Baskin, 1998) e de Cassia (Ro- ratura de exposição dependem da espécie em
driguez, Aguiar e Sader, 1990), mas ineficiente questão. Após o tratamento, as sementes de-
em outros casos, por exemplo, ao provocar a vem ser resfriadas imediatamente e semeadas.
contaminação por fungos, como ocorreu em Entretanto, esse tratamento não é efetivo para
Stryphnodendron polyphyllum (barbatimão) as sementes de amendoim do campo (Nassif e
(Tambelini, 1994). Muitas vezes, é difícel pro- Perez, 1997), Schizolobium atterrimum (mucuna
duzir uma escarificação homogênea em toda a preta) (Maeda e Lago, 1986) e Copaifera langs-
casca da semente e, como conseqüência, pode- dorffii (copaíba) (Perez e Prado, 1993).
se deixar algumas sementes ainda impermeá- Quando a temperatura de aquecimento es-
veis à água e danificar outras. tiver entre 60 e 70oC, é possível que o trata-
128 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

mento com água quente, à mesma temperatura a germinação das sementes com casca dura. É
e durante o mesmo período, produza resultados possível que as espécies com essa característica,
semelhantes. dentro de uma mesma área geográfica, difiram
Em sementes com casca espessa, também bastante no tipo de resposta às flutuações de
se pode empregar o calor úmido como forma temperatura. Essa diversidade de resposta oca-
de amolecimento do tegumento. Aconselha-se siona diferenças na distribuição das espécies
um banho das sementes secas em hipoclorito em campo e contribui para a diferenciação dos
de sódio (5 a 10%) durante 15 minutos, antes nichos em populações que coexistem na mesma
do pré-tratamento. Em sementes de Peltopho- comunidade.
rum dubium (canafístula), a exposição durante Sementes de outras espécies que possuem
24 a 48 horas à temperatura de 45oC e 100% de casca espessa apresentam valores mais elevados
umidade promove o amolecimento do tegu- de porcentagem e velocidade de germinação
mento. Esse fato propicia um aumento signifi- quando submetidas ao fogo. Em experimentos
cativo na porcentagem e na velocidade de ger- conduzidos em comunidades naturais, More-
minação, em relação ao grupo que não recebe no-Casasola, Grime e Martinez (1994) descre-
nenhum pré-tratamento (Perez, Fanti e Casali, veram a germinação induzida pelo fogo nas se-
1999). mentes com casca espessa e associaram esse
Ainda em relação ao calor, as flutuações de fenômeno a uma exposição a altas temperatu-
temperatura no ambiente são as principais fon- ras. Esses estudos revelaram que a duração do
tes de alterações na estrutura da casca de mui- aquecimento, a profundidade na qual as se-
tas espécies, por exemplo, as anuais de inver- mentes estão enterradas e o teor de umidade
no da Austrália e da Califórnia. Segundo Rols- do solo afetam a resposta de germinação. As
ton (1978), existem espécies como Lulinius va- sementes localizadas mais próximas à superfí-
rius, Ornithopus compressus e Stylosanthes humilis cie são as mais estimuladas pelo fogo em com-
cuja casca só amolece sob flutuações de tem- paração com aquelas enterradas mais profun-
peratura, associadas a uma baixa umidade re- damente. Em algumas espécies de legumino-
lativa, em torno de 8,5%. Além disso, nem o sas, os envoltórios espessos estão relacionados
número de ciclos de flutuações de temperatura com a alta longevidade das sementes enterra-
nem a amplitude das flutuações, salientando das e parecem restringir a germinação onde a
que deve ser superior a 15oC, são mais impor- vegetação preexistente foi destruída pelo fogo.
tantes que a temperatura máxima diária à que Tratamentos empregando ácidos ou bases
a semente fica exposta. são usados para provocar fissuras no tegumento
Em duas espécies de Vicia (ervilhaca), V. sa- das sementes que possuem casca impermeável.
tiva e V. grandiflora, Thompson e Grime (1983) Os lotes de sementes são colocados em recipien-
observaram que a impermeabilidade do tegu- te apropriado, enquanto o ácido ou a base con-
mento é revertida com temperaturas alternadas centrados são despejados sobre as sementes. O
com o uso do par 4,5 e 21oC, mas não com a tempo de permanência nessas substâncias é de
combinação de 21 e 32oC; porém, em V. angusti- grande importância, pois as sementes devem ser
folia, ambos os regimes de temperatura são efi- retiradas imediatamente antes que o ácido ou a
cazes na reversão da impermeabilidade da cas- base penetrem nos tegumentos. Quando o tem-
ca. A reversibilidade natural sob altos teores po de exposição é excedido, pode ocorrer desde
de umidade das sementes também ocorre, e isso uma descamação do tegumento e conseqüente
implica que o amolecimento da casca está con- ataque por fungos até danos no eixo embrioná-
dicionado ao grau de dessecação da semente e rio, os quais resultariam em perda do vigor e da
da temperatura máxima. viabilidade das sementes (Quadro 7.1).
Há vários casos na literatura que indicam O ácido ou a base são utilizados em tempe-
a existência de grande diversidade do papel da ratura ambiente, por um período de poucos mi-
temperatura como um mecanismo que propicia nutos até algumas horas, dependendo da espé-
GERMINAÇÃO 129

Quadro 7.1 Efeitos de distintos agentes químicos na escarificação de sementes de diversas espécies

Espécie Agente Tempo de exposição Referência

Cassia bicapsularis (caruaru de pito) Ácido sulfúrico 2h Rodriguez, Aguiar e


Sader (1990)
Cassia javanica (cássia javanessa) Ácido sulfúrico 2h Rodriguez, Aguiar e
Sader (1990)
Cassia speciosa (aleluia) Ácido sulfúrico 2h Rodriguez, Aguiar e
Sader (1990)
Stryphnodendron pulcherrimum (faveira) Ácido sulfúrico 2 a 5 min Varela, Brocki e Sá
(1991)
Acacia bonariensis (acácia) Ácido sulfúrico 10 min Ferreira, Lipp e
Heuser (1992)
Mimosa cesalpinaepholia (sansão do campo) Ácido sulfúrico 10 a 13 min Martins, Carvalho e
Oliveira (1992)
Senna macranthera (manduirana) Ácido sulfúrico 15 min Santarem e Aquila
(1995)
Peltophorum sp. (canafístula) Ácido sulfúrico 15 a 20 min Perez, Fanti e Casali
(1999)
Cassia excelsa (cássia do nordeste) Ácido sulfúrico 25 a 30 min Jeller e Perez (1999)
Copaífera sp. (copaíba) Acetona 20 min Perez e Prado (1993)
Stryphnodendron adstringents (barbatimão) Acetona 75 a 90 min Tambelini (1994)
Senna marilandica (sena selvagem) Álcool etílico – Baskin, Nan e Baskin
(1998)
Senna obtusifolia Álcool etílico – Baskin, Nan e Baskin
(1998)
Sinapsis avensis (mostarda) Hidróxido de potássio – Duran e Tortosa
(1985)
Sinapsis avensis (mostarda) Ácido sulfúrico – Duran e Tortosa
(1985)

cie. Durante o tempo de exposição, as sementes cutícula e da exposição das camadas de ma-
devem ser misturadas com o auxílio de um bas- croesclereídes.
tão de vidro. Terminado esse tempo, devem ser Além de ácidos ou bases, a estrutura da cas-
lavadas em água corrente por alguns minutos ca pode ser atacada com o uso de éter e acetona
até que o reagente remanescente seja totalmen- (Quadro 7.1). Mayer e Poljakoff-Mayber (1989)
te removido. Após a lavagem, as sementes po- relatam haver um aumento na permeabilidade
dem ser semeadas, ou secas e armazenadas da casca de várias espécies com a utilização do
durante vários meses. Como essas substâncias álcool etílico e da acetona. O uso desses sol-
são corrosivas, deve-se tomar precauções, como ventes orgânicos reduz a espessura da camada
o uso de roupas adequadas, luvas e proteção de cera do envoltório das sementes, a qual cons-
para os olhos. titui uma barreira à difusão da água.
Egley (1989) apontou, como uma barreira Uma outra forma de amolecimento do te-
à entrada de água nas sementes, a presença de gumento rígido é com uma cobertura de palha
ceras e compostos graxos na superfície ou de sobre as sementes recém-semeadas em campo.
camadas de células abaixo da cutícula, os Pode-se conseguir um efeito bastante rápido
macroesclereídes. Acredita-se que a ação do áci- se essa cobertura de palha for inoculada com
do sulfúrico no amolecimento do tegumento compostos que desencadeiam a ação microbia-
da semente possa ser resultado da remoção da na. Nesse caso, as sementes e o meio em que
130 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

elas estão não podem ser tratados com fungi- exemplo, os genótipos termotolerantes apre-
cida. Se esse tratamento for realizado no início sentaram maior atividade de mananases e
da primavera ou do verão e o meio estiver úmi- maior porcentagem de germinação quando
do, haverá uma emergência rápida e sincrônica comparados aos genótipos termossensíveis
das plântulas; porém, o transplante de mudas (Cantife et al., 2000).
será muito mais difícil do que com o uso das Morris, Tieu e Dixon (2000) verificaram a
sementeiras. presença de dormência imposta pelos envoltórios
em duas espécies de Grevillea linearifolia e G.
wilsonii (grevíleas); porém, a extensão na qual a
INTERFERÊNCIA NO casca das sementes restringiu a germinação foi
ALONGAMENTO diferente nas duas espécies. A ocorrência de
EMBRIONÁRIO germinação, quando a casca é removida, denota
Muitas vezes, os envoltórios que circundam o a existência de uma barreira mecânica para o
embrião permitem a entrada de água, mas fun- embrião e/ou do impedimento da saída de ini-
cionam como uma barreira física que impede o bidores. Em particular, em embriões de G.
alongamento embrionário. Como exemplo, são wilsonii, foi detectado um componente de dor-
citadas várias espécies das famílias Fabaceae, mência interna ou endógena (Capítulo 5), visto
Rosaceae, Protaceae e Myosporaceae, as quais que a remoção de parte da casca permitiu a ger-
apresentam estruturas muito rígidas, que impe- minação de um pequeno percentual de semen-
dem a germinação das sementes. Lemas e pá- tes. A exposição à fumaça promoveu um aumento
leas presentes nas sementes de gramíneas, por na proporção de sementes (com a casca removida)
exemplo, nos gêneros Paspalum e Setaria, atra- que germinaram, sobrepondo, assim, uma possí-
sam ou impedem a germinação. vel dormência embrionária (Capítulo 6).
A germinação é um processo que se inicia
com a embebição das sementes. Durante essa
fase, ocorre a síntese e a ativação de várias en- INTERFERÊNCIA NAS
zimas, resultando na mobilização de reservas e TROCAS GASOSAS
principalmente na digestão de parede celular, Os envoltórios que circundam o embrião podem
enfraquecendo-a e permitindo que a raiz rompa impedir a entrada de oxigênio e a saída de gás
o tegumento. O enfraquecimento de tecidos ad- carbônico e, dessa forma, inibir a respiração.
jacentes ao ápice radicular (como a micrópila) Esse fato pode ser comprovado quando se raspa
precede a emergência da raiz primária em várias ou perfura a casca da semente. Um furo através
espécies, como Lycopersicom esculentum (toma- do endosperma, próximo à radícula das semen-
te), Lactuca sativa (alface), Capsicum annum (pi- tes de alface, ou através do pericarpo de semen-
menta), Picea glauca (abeto-branco) e Nicotiana tes de cereais pode desencadear a germinação
tabacum (fumo) (Carvalho et al., 2001). Em se- por permitir a difusão de oxigênio até o embrião.
mentes de Sesamum indicum (gergelim), Carva- Conforme relatam Bewley e Black (1994),
lho e colaboradores (2001) detectaram a ma- observou-se em vários casos que a permeabili-
nose como o principal monossacarídeo no en- dade da casca das sementes ao oxigênio é me-
dosperma. Porém, um aumento na atividade nor que a de uma camada de água de espessura
da enzima endo-β-mananase, na região micro- equivalente. Essa impermeabilidade resulta
pilar do endosperma, só foi verificado em tem- provavelmente dos constituintes químicos da
peratura supra-ótima de germinação. casca, como os compostos fenólicos. Os envol-
Bewley (1997) afirma que a ausência de tórios podem consumir o oxigênio em difusão,
germinação de determinadas espécies pode ser provavelmente graças à oxidação enzimática de
devida à inatividade de enzimas como a β-ma- vários compostos químicos que aí ocorrem. Por
nanase e outras hidrolases, o que dificulta o exemplo, a pálea presente em muitos cereais
enfraquecimento dos envoltórios. Na alface, por impõe a dormência por consumir o oxigênio.
GERMINAÇÃO 131

Em vários cultivares de arroz, a atividade da camada de aleurona, a oxidação de fenóis e a


peroxidase pode fazer parte de um complexo formação de mucilagem, que dificultam a difu-
consumidor de oxigênio. Rolston (1978) cita são do oxigênio. Além do bloqueio aos gases
que foi observada também uma relação entre a respiratórios, pode haver também uma restrição
coloração da semente, o grau de impermeabi- à difusão do etileno, envolvido em vários aspec-
lidade da casca, os altos níveis de compostos tos metabólicos da germinação.
fenólicos e o seu nível de oxidação. A oxidação
dos fenóis é catalisada pela enzima catecol oxi-
dase, que chega a ser muito ativa em algumas FORNECIMENTO E REVENÇÃO
espécies durante a fase da dessecação. À SAÍDA DE INIBIDORES
Se realmente existe uma redução no teor Inibidores de diferentes categorias químicas po-
de oxigênio disponível para o consumo pelo em- dem ser encontrados em sementes de várias es-
brião, é necessário saber o quanto o metabolis- pécies (Quadro 7.2).
mo embrionário necessita deste gás. Segundo Observa-se, pelo quadro, que o ácido abs-
Bewley e Black (1994), os embriões muitas ve- císico é o inibidor mais comum entre as espé-
zes necessitam de baixa pressão parcial de cies listadas, embora sua localização nas semen-
oxigênio para a manutenção da respiração. En- tes seja bastante variável. Além disso, fica cla-
tão, a explicação para uma inibição da germina- ro que os tegumentos podem atuar no bloqueio
ção poderia ser a presença de inibidores em à germinação pelo fornecimento de inibidores.
sementes, sendo que esses inibidores só seriam Nesse sentido, foi observado em sementes de
oxidados sob altas concentrações de oxigênio. Xanthium que o inibidor é capaz de se difundir
Além disso, eles também poderiam se difundir de embriões isolados, mas não de sementes in-
do embrião isolado, porém não atravessariam tactas. No caso de sementes de aveia, a pálea
a casca de sementes intactas. Parece provável impõe a dormência mecânica, mas o embrião
que a remoção da casca beneficie o embrião por germina quando é removido da semente e
permitir principalmente o escape de inibidores, colocado sobre papel de filtro úmido. A absor-
e não apenas por propiciar uma maior disponi- ção de água não é afetada pela pálea, mas pa-
bilidade de oxigênio. rece que o movimento de substâncias da cario-
Ballard (1973) sugere a ocorrência de ou- pse está sendo impedido por essa estrutura.
tros processos nos tegumentos, como a alta ati- Muitas barreiras são impostas pelos envol-
vidade respiratória em certas porções como a tórios das sementes ao embrião e, para que este

Quadro 7.2 Relação de espécies que apresentam inibidores em diferentes porções da semente (Bewley
e Black, 1994)

Espécie Localização do inibidor Inibidor

Acer negundo Pericarpo ABA


Avena fatua Indeterminada ABA
Beta vulgaris Pericarpo Ácidos fenólicos, ácidos graxos de cadeia curta,
íons inorgânicos, cis –ciclohexano-1,2-dicarboxiamida
Corylus avelana Testa, embrião ABA
Eleagnus angustifolia Pericarpo, testa, embrião Cumarina
Fraxinus americana Pericarpo, embrião ABA
Mendicago sativa Endosperma ABA
Prunus domestica Embrião ABA
Rosa canina Pericarpo, testa ABA
Taxus baccata Embrião ABA
Triticum spp. Pericarpo, testa ABA

ABA = ácido abscísico.


132 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

os penetre, é necessário haver uma certa pres- Um tratamento mais drástico pode ser em-
são de crescimento. A habilidade de crescer do pregado para sementes com casca muito rígida.
embrião está relacionada, entre outros fatores, Utiliza-se a água em ebulição, e o tempo de per-
com a diminuição da concentração de inibido- manência das sementes nessas condições pode
res na semente e/ou com o aumento da con- variar de um minuto a vários, dependendo da
centração nos tecidos de agentes promotores rigidez do tegumento. Decorrido o período dese-
da germinação, como o ácido giberélico, o ni- jado de imersão em água em ebulição, as se-
trato de potássio e a tiouréia. A concentração e mentes devem ser removidas e colocadas para
a duração do tratamento dependem da espécie resfriar em água fria. Baskin, Nan e Baskin
a ser tratada, e a principal vantagem desses (1998) relataram que a água fervente pode cau-
compostos químicos é a facilidade de utilização sar um incremento na permeabilidade da casca
e a rapidez na obtenção de resultados. da semente ao dissolver ou deslocar um ou mais
A cinza de troncos queimados tem sido uti- elementos estruturais da barreira impermeável.
lizada com bons resultados para neutralizar ou Entretanto, sementes de certas espécies, como
adsorver inibidores de germinação. Ela pode ser a canafístula (Perez, Fanti e Casali, 1999) e a
preparada com a queima de madeira, podendo paineira (Fanti, 2001), não suportam a imersão
ser previamente moída para produzir um talco em água fervente, mesmo por curtos períodos
uniforme e ser adicionada às placas de Petri de tempo (um a cinco minutos).
contendo as sementes. As cinzas também po- Em qualquer tratamento com a utilização
dem ser obtidas pelo uso de mufla. de água, alguns cuidados devem ser tomados,
Em geral, usa-se a água corrente quando como evitar o uso de recipiente de alumínio ou
se deseja amolecer o tegumento e/ou remover água salobra. Após o uso de alguns desses trata-
inibidores hidrofílicos, com o conseqüente au- mentos, as sementes podem ser semeadas ime-
mento da permeabilidade dos envoltórios e do diatamente, não devendo ser armazenadas.
potencial germinativo, o que resulta em maior Uma vez que os envoltórios representam a
velocidade de embebição e de germinação. A interface entre a semente e o ambiente, qual-
duração do período de permanência das semen- quer interferência neles afeta também a inte-
tes em água varia em função das características ração entre o ambiente e o embrião. Os meios
do tegumento. Por exemplo, a permanência de de reverter os efeitos dos envoltórios sobre os
sementes de Enterolobium contortisiliquum (ore- embriões têm importância econômica para o
lha-de-negro) por 72 horas em água corrente processo de produção de mudas e importância
foi eficiente para promover 100% de germina- ecológica para o entendimento da dinâmica do
ção (Capelanes, 1991). banco de sementes no solo e do processo de
Quando se trabalha com sementes de tama- regeneração das comunidades naturais. Assim,
nho pequeno ou médio, o uso de água quente pesquisadores e produtores de mudas utilizam
é um tratamento muito mais prático do que a vários métodos artificiais para permitir a absor-
lixa ou a punção dos envoltórios. A utilização ção de água e uma posterior germinação sincro-
de água quente é mais eficaz quando as semen- nizada. Entre esses métodos, os mais utilizados
tes ficam mergulhadas na água pré-aquecida são: a escarificação, o calor ou frio seco, o fogo,
(cerca de 70 a 80oC) em volume maior do que o a água quente ou corrente, o ácido e outros
seu. Elas podem ficar imersas na água até o compostos químicos, a estratificação seca e a
esfriamento ou em banho-maria para manu- úmida. Cabe ao interessado identificar o mé-
tenção da temperatura de trabalho. Por exem- todo mais eficiente para a espécie em questão.
plo, Zpevak (1994) utilizou água a 70oC para Como pode ser visto na Tabela 7.1, os testes
promover a embebição e a germinação de se- de escarificação mostraram que os envoltórios
mentes de Dimorphandra mollis (faveira). En- impedem a absorção de água das sementes de
tretanto, esse tratamento não foi eficiente para canafístula. Os valores de porcentagem e veloci-
sementes de paineira (Fanti, 2001). dade de embebição foram baixos nas sementes
sdsd

GERMINAÇÃO 133

Tabela 7.1 Porcentagem de embebição (Emb%) e velocidade de embebição (Vemb), porcentagem (G) e
velocidade de germinação (V) e entropia informacional (E) para sementes de Peltophrum dubium submetidas
a diferentes tratamentos pré-germinativos antes da incubação a 27oC (Perez, Fanti e Casali, 1999)

Pré-tratamento Emb (%) Vemb (Dias-1 ) G(%) V ( dias-1) E (Bits)

Controle 59,20 0,26 40,80 0,11 3,09


Acetona 30 minutos 96,67 0,43 75,00 0,17 2,62
Acetona 60 minutos 95,60 0,73 26,12 0,18 1,11
Éter etílico 30 minutos 85,96 0,30 65,61 0,16 2,87
Éter etílico 60 minutos 81,46 0,47 61,58 0,20 2,71
Água corrente 24 horas 52,44 0,27 35,27 0,10 3,04
Água corrente 48 horas 68,08 0,49 34,59 0,11 3,16
Água corrente 72 horas 58,58 0,30 16,93 0,08 2,39
Água fervente 5 minutos 100 0,99 0,0 0,0 0,0
Água fervente 10 minutos 100 1,00 0,0 0,0 0,0
Lixa 94,06 0,65 75,15 0,28 1,74
Punção do tegumento 100 1,00 82,27 0,33 2,80
Ácido sulfúrico 5 minutos 79,24 0,33 74,24 0,14 2,01
Ácido sulfúrico 10 minutos 97,81 0,59 82,13 0,19 1,49
Ácido sulfúrico 15 minutos 100 0,98 92,30 0,39 1,20
Ácido sulfúrico 20 minutos 100 1,00 76,19 0,39 0,83
Ácido sulfúrico 25 minutos 100 1,00 80,78 0,43 1,56
Ácido sulfúrico 30 minutos 100 0,99 66,93 0,32 2,66
Frio seco 24 h 3oC 52,61 0,25 28,86 0,15 2,22
Calor seco 24 h 65oC 66,60 0,37 39,26 0,19 1,72
Calor seco 24h 100oC 100 1,00 0,0 0,0 0,0

intactas (controle). Quando vários tratamentos Uma ressalva importante deve ser feita
pré-germinativos são aplicados, verifica-se um quando se trabalha com espécies nativas. Como
aumento na porcentagem de embebição e/ou os envoltórios sofrem influência genética e do
germinação. A escolha do melhor tratamento ambiente durante a ontogenia das sementes, é
requer uma combinação de valores mais eleva- necessário confirmar o tipo e a eficácia do tra-
dos de porcentagem e velocidade de germina- tamento pré-germinativo indicado na literatu-
ção e menores valores de variância de germina- ra em uma amostra do lote de sementes, antes
ção ou entropia informacional (Capítulo 13). de aplicar esse tratamento a todo o lote.
Quando se obtêm elevados valores de porcenta-
gem de germinação, isso significa que os trata- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
mentos aplicados possibilitaram a embebição
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C A P Í T U L O 8

QUEBRA DE DORMÊNCIA
EM SEMENTES
Lilian B.P. Zaidan
Claudio J. Barbedo

A dormência de sementes tem fundamental que sempre houvesse a possibilidade de produ-


importância para a perpetuação e o estabeleci- zir uma nova planta tão logo as condições do
mento de muitas espécies vegetais nos mais va- meio fossem favoráveis.
riados ambientes. Embora ocorra mais freqüen- A grande maioria das plantas cultivadas
temente em sementes tolerantes à dessecação, atualmente com fins agrícolas é formada de va-
as chamadas ortodoxas, há registros de sua riedades, cultivares ou híbridos geneticamente
ocorrência também em sementes que precisam melhorados, que passaram por processos de se-
manter elevado teor de água, ou seja, as recalci- leção nos quais a dormência das sementes foi
trantes (Capítulo 3). Contudo, os processos se- progressivamente sendo eliminada. Isso porque
letivos impostos às espécies vegetais com se- o modelo agrícola ainda predominante é fa-
mentes dormentes que resistiram até a atuali- vorecido quando a germinação das sementes e
dade provavelmente tiveram como base a exis- as demais fases da produção ocorrem de forma
tência de mecanismos capazes de atravessar pe- rápida e uniforme, sobretudo nas culturas de
ríodos adversos ao crescimento vegetativo. ciclo anual. Contudo, ainda hoje há muitas es-
No que se refere à existência ou não de dor- pécies, cultivadas ou não, que têm sementes
mência nas sementes, independentemente da dormentes, algumas das quais se valem dessa
tolerância à dessecação, a exigência de que as dormência para sobreviver.
sementes produzidas pela planta-mãe germi- Diversas plantas invasoras de campos agrí-
nassem paulatinamente ao longo do tempo foi colas apresentam sementes que têm sua dor-
provavelmente fundamental para que, em vá- mência quebrada de forma progressiva. Assim,
rias regiões, as espécies pudessem passar por freqüentemente se verificam novas plântulas
períodos com condições desfavoráveis ao seu emergindo durante o desenvolvimento da cul-
estabelecimento, tais como temperatura muito tura agrícola, dificultando seu manejo e, por
baixa ou seca prolongada. A germinação rápida vezes, trazendo prejuízos econômicos. Essa ca-
e uniforme de todas as sementes produzidas racterística, porém, tem evitado a erradicação
em um determinado momento poderia resultar da espécie. Por outro lado, várias plantas culti-
na morte subseqüente de todas as plântulas vadas apresentam sementes dormentes por não
imediatamente após sua emergência. Dessa for- terem sido submetidas a intenso melhoramento
ma, a seleção natural das espécies deve ter ocor- genético com essa finalidade.
rido no sentido de favorecer aquelas que produ- O uso de espécies nativas arbóreas para pro-
ziram sementes com diferentes graus de dor- gramas de reflorestamento em manejo susten-
mência, ou seja, que tiveram sua dormência tado ou, ainda, para a arborização urbana vem
quebrada em diferentes momentos, garantindo se intensificando nos últimos anos. Dentre es-
136 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

sas espécies, muitas apresentam mecanismos ciclo curto. O atraso na germinação pode, ainda,
de dormência, dificultando o planejamento dos diminuir o número de ciclos econômicos por ano.
viveiristas para a obtenção de mudas. Algumas espécies são utilizadas como fonte
de adubação verde para culturas agrícolas. Elas
são semeadas para que desenvolvam grande
NECESSIDADE DE QUEBRA DA massa vegetal, que será incorporada ao solo
DORMÊNCIA EM SEMENTES antes do plantio da espécie principal. Isso re-
Se, por um lado, a dormência das sementes se sulta em enriquecimento nutricional do solo,
apresenta vantajosa para a perpetuação das es- principalmente com nitrogênio. Contudo, al-
pécies, ampliando a possibilidade de estabeleci- gumas espécies que têm alto valor nutricional
mento de novos indivíduos ou colonização de como adubo verde apresentam sementes com
áreas por distribuir a germinação no espaço e diferentes graus de dormência. Isso acarreta
no tempo (Kigel e Galili, 1995; Carvalho e Na- dois problemas para os agricultores: primeiro,
kagawa, 2000), por outro, pode trazer desvanta- a necessidade de grande número de sementes,
gens, principalmente considerando a explora- pois nem todas germinarão na época de produ-
ção vegetal. A agricultura tradicional atual é ção de massa verde; segundo, muitas sementes
facilitada quando as práticas culturais podem germinarão durante o desenvolvimento da cul-
ser aplicadas de forma contínua e uniforme. tura agrícola e, assim, serão consideradas plan-
Para isso, há necessidade de uniformidade de tas invasoras e entrarão em competição por luz,
desenvolvimento entre as plantas da mesma água e nutrientes com as plantas da cultura
cultura, o que se inicia na germinação das se- principal.
mentes e na emergência das plântulas. Portan- Finalmente, até mesmo a correta avaliação
to, um determinado lote com sementes dor- da qualidade fisiológica de lotes de sementes
mentes poderá resultar em campos de produção pode ser dificultada pela existência de dormên-
irregulares, com plantas em diferentes estádios cia. Testes de germinação realizados com espé-
de desenvolvimento. Nesse caso, a dormência cies que têm sementes dormentes podem pro-
é desvantajosa, tanto mais quanto menor o ciclo duzir resultados insuficientes para a correta
da cultura. Além disso, quanto maior o tempo previsão do comportamento das mesmas após
de permanência das sementes no solo sem ger- sua semeadura. Isso porque são registradas, nos
minar, maiores as chances de perdê-las, seja por boletins de análise, a porcentagem de sementes
deterioração ou predação. que germinaram e a de sementes dormentes
O atraso na germinação, algumas vezes, po- (ISTA, 1985). Estas últimas, após a semeadura,
de resultar em falhas na produção agrícola. Al- podem germinar no campo em períodos prati-
gumas plantas podem não estar suficientemen- camente imprevisíveis. Assim, tornam-se ne-
te desenvolvidas na época em que devem rece- cessários tratamentos para quebra da dormên-
ber estímulos ambientais para, por exemplo, cia após sua constatação nos testes de germina-
florescer ou acumular reservas em órgãos ve- ção. Contudo, dependendo da espécie, nem
getativos. Além disso, quando esses estímulos sempre há suficiente informação quanto ao mé-
são recebidos, o atraso na germinação pode pro- todo mais adequado ou eficiente para a quebra
duzir atraso na colheita, acarretando desvalo- da dormência das sementes.
rização do produto no mercado. Isso porque Deve-se salientar, porém, que, mesmo
muitos produtos agrícolas apresentam oscila- quando se pensa em utilização das sementes
ções de preço, regulados aos períodos de safra pelo homem, a dormência pode representar
e entressafra. A colocação de um produto agrí- vantagens. Em muitas sementes, a impermea-
cola no mercado antes da entrada da safra prin- bilidade do tegumento à água, por exemplo, é
cipal muitas vezes significa obtenção de preço o principal mecanismo de manutenção de bai-
mais elevado do produto. Esse fato é impor- xos teores de água no interior da semente, o
tante, por exemplo, para algumas hortaliças de que evita o metabolismo mais intenso, reduz a
GERMINAÇÃO 137

respiração e, assim, diminui o consumo de re- sensibilidade das sementes aos processos de su-
servas, fundamentais para a germinação e o peração de dormência (Egley, 1995), o que pode
crescimento inicial da plântula. O mesmo po- provocar maior ou menor sucesso da aplicação
deria ser dito quanto à impermeabilidade a dos métodos. Para cada tipo de dormência e
gases, evitando a entrada de O2 e a saída de para cada condição na qual as sementes estão
CO2. Além disso, mantendo-se baixo o teor de inseridas haverá um ou mais métodos mais
água nas sementes, dificulta-se o desenvolvi- adequados e eficientes.
mento de microrganismos causadores de dete- Quando a dormência é causada pela im-
rioração, bem como o ataque mais intenso de permeabilidade do tegumento à água (Capítulo
insetos e roedores. Em sementes de Hymenaea 7), os métodos a serem empregados deverão
courbaryl (jatobá) e de Lathyrus nervosus (espé- promover aberturas neste, permitindo a embe-
cie forrageira nativa do Brasil), por exemplo, a bição, como ocorre com as escarificações ou cor-
escarificação do tegumento, impermeável à tes do tegumento. Nesse caso, é importante
água, pode resultar em deterioração mais rápi- identificar as vias e os mecanismos de entrada
da (Franke e Baseggio, 1998; Guimarães et al., da água na semente, pois o tipo e a posição da
1995), conforme ilustrado na Figura 8.1. Por- abertura podem causar maior ou menor eficiên-
tanto, a dormência das sementes muitas vezes cia do método, algumas vezes chegando a pre-
contribui para sua melhor conservação e arma- judicar a germinação. Por exemplo, o desponte
zenamento (Capítulo 17). (corte na extremidade) da semente de Attalea
funifera (piaçaveira) pode dificultar a entrada
de água por remover, parcialmente, o feixe de
ESCOLHA DO MÉTODO DE fibras que funciona como eficiente captador de
QUEBRA DE DORMÊNCIA água (Melo, 2001). Por outro lado, em sementes
A dormência das sementes pode ter diversas de jatobá, quando a escarificação é feita na late-
causas (Capítulo 5). Assim, antes da tomada ral da semente, a embebição é mais rápida do
de decisão quanto ao método a ser adotado para que quando feita na região do hilo, o que prova-
a quebra da dormência, deve-se identificar, tan- velmente está relacionado à maior superfície
to quanto possível, suas causas. Além disso, é de contato com a água e à abertura de novas
necessário considerar a existência de ciclos de vias de entrada para esta (Santos, 2002).

Germinação Sementes mortas

75 75

50 50
(%)

(%)

25 25

0 0
Testemunha Escarificação Escarificação Testemunha Escarificação Escarificação
mecânica química mecânica química

 Figura 8.1
Germinação e deterioração de sementes de Hymenaea courbaryl (coluna preta) e Lathyrus nervosus (coluna
cinza) submetidas ao processo de escarificação mecânica ou química. Fontes: Franke e Baseggio (1998),
Guimarães et al. (1995).
138 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Quando a dormência é ocasionada por um ciente apenas um planejamento de utilização


balanço desfavorável entre promotores e inibi- do lote de sementes. Por exemplo, em semen-
dores de germinação (Capítulo 6), métodos que tes de Styzolobium aterrimum (mucuna-preta),
aumentem a concentração de estimuladores da uma leguminosa bastante empregada como
germinação ou que atuem impedindo a ação adubo verde, a separação das sementes em cate-
dos inibidores deverão ser empregados, como gorias de tamanho pode ser um procedimento
é o caso da estratificação, da aplicação direta útil para controlar a dormência (Barbedo, Na-
de substâncias como giberelinas e citocininas kagawa e Machado, 1988). As sementes maio-
e, ainda, da lixiviação. res dessa espécie perdem a dormência mais ra-
Nos casos em que há impedimento à entra- pidamente que as menores (Figura 8.2). Por-
da de oxigênio para o embrião, causado por tanto, seria possível adquirir sementes suficien-
substâncias presentes na superfície das semen- tes para dois ciclos, guardando-se as sementes
tes, uma simples lavagem permitirá a quebra pequenas para um segundo plantio.
da dormência. Em outros casos, há necessidade A eficiência na quebra de dormência é, sem
de se fornecer maiores quantidades de O2. Para dúvida, uma das principais características a
algumas sementes, a dormência é resultante considerar na escolha do método. Na literatura,
do impedimento físico de estruturas mais exter- encontram-se diversos trabalhos nos quais mais
nas, que impedem a expansão dos tecidos do de um método resulta em grande porcentagem
embrião. Nesses casos, muitas vezes há necessi- de sementes que têm sua dormência quebra-
dade de remoção completa das estruturas que da. Contudo, muitas vezes há diferenças na
conferem a resistência mecânica à germinação, eficiência dos métodos. Além das variações que
como em Ocotea corymbosa, popularmente co- podem existir na sensibilidade das sementes
nhecida por canela-preta ou canela-fedida (Bi- de uma mesma espécie, conforme citado ante-
lia, Barbedo e Maluf, 1998). riormente (Egley, 1995), é preciso considerar
Uma vez identificadas as causas da dor- as diferentes condições nas quais esses méto-
mência, outros fatores devem ser considerados dos são aplicados, tais como as condições cli-
antes de se escolher o método de quebra da dor- máticas, a habilidade do executor e o equipa-
mência. Em função de sua causa pode ser sufi- mento e o material disponíveis. Em sementes

Germinação Sementes duras

100 60

75
40
(%)

(%)

50
20
25

0 0
3 meses 11 meses 24 meses 3 meses 11 meses 24 meses

 Figura 8.2
Germinação e dormência (impermeabilidade do tegumento à água) de sementes de Styzolobium aterrimum
(mucuna preta) de diferentes tamanhos, após 3, 11 e 24 meses de armazenamento. Coluna preta, sementes
sem separação de tamanho; coluna cinza, sementes grandes; coluna branca, sementes pequenas. Até o
terceiro mês de armazenamento, o grupo das sementes pequenas apresentou maior proporção de sementes
duras (que não embeberam). No decorrer do tempo de armazenamento, a proporção de sementes duras
diminuiu em todos os grupos, e a germinação passou a ser uniforme e elevada. Fonte: Barbedo, Nakagawa e
Machado (1988).
GERMINAÇÃO 139

de Senna macranthera (manduirana), árvore 100


nativa de grande potencial ornamental, e em
Mimosa caesalpiniaefolia (sansão-do-campo, sa- 75

biá), as escarificações química e mecânica, em


diferentes experimentos (Martins, Carvalho e 50

Oliveira, 1992; Santarém e Aquila, 1995;


25
Eschiapati-Ferreira e Perez, 1997; Nascimento
e Oliveira, 1999), apresentaram respostas di-
0
ferentes quanto à eficiência dos métodos (Fi-
S1 S2 M1 M2
gura 8.3). Assim, antes de se optar por um mé-
todo de quebra de dormência, deve-se ter em  Figura 8.3
mente o grau de eficiência desejado para atingir Germinação de sementes de Senna macranthera (S1
e S2) e de Mimosa caesalpiniaefolia (M1 e M2) sub-
um objetivo, com elevado grau de reprodutibi-
metidas às escarificações química e mecânica, em
lidade. dois experimentos: S. macranthera, S1 = Santarém
Nem sempre o método eficiente é o mais e Aquila, 1995; S2 = Eschiapati-Ferreira e Perez, 1997;
adequado à situação. Um fator importante na M. caesalpiniaefolia, M1 = Nascimento e Oliveira,
escolha é a viabilidade do uso. Muitas vezes, 1999; M2 = Martins, Carvalho e Oliveira, 1992. Colu-
na preta: testemunha; coluna branca: ácido sulfúri-
um método eficiente exige condições ou recur-
co por 10 min; coluna cinza: escarificação mecânica.
sos de execução que não estão à disposição do
usuário, tais como equipamento adequado,
mão-de-obra suficientemente qualificada e,
ainda, custo acessível de reguladores de cresci- bra de dormência nos casos de impermeabili-
mento. dade do tegumento à água. Contudo, para es-
Como exemplo, pode-se citar o caso do sa- carificar grandes quantidades de sementes, há
biá (Martins, Carvalho e Oliveira, 1992; Nasci- necessidade de equipamentos específicos, pois
mento e Oliveira, 1999), cujas sementes, quan- a escarificação manual demandaria quantidade
do colocadas em água a 80oC por 5 minutos, tão grande de tempo e de mão-de-obra que in-
têm sua germinação aumentada; contudo, a viabilizaria o processo. Muitas vezes, porém,
elevação dessa temperatura para 100oC, mes- tais equipamentos não existem ou são de difícil
mo que por apenas 3 minutos, resulta em mor- aquisição, quer por sua pequena disponibilida-
te de todas as sementes (Tabela 8.1). de no mercado, quer por seu custo elevado.
Um outro exemplo é a escarificação mecâ- Um outro fator a ser considerado na escolha
nica das sementes, que tem se apresentado co- do método de quebra de dormência é o seu grau
mo um dos mais eficientes métodos para que- de periculosidade. Escarificações ácidas, por

Tabela 8.1 Germinação e morte de sementes de Mimosa caesalpiniaefolia submetidas ao


pré-tratamento com água a 80 ou 100oC

Tratamento Tipo de semente Germinação (%) Fonte

Testemunha 1 com casca 31,5 1


sem casca 38,0 1
Testemunha 2 com casca 14,5 2
sem casca 17,0 2
Água a 80oC por 5 minutos com casca 38,0 1
sem casca 73,0 1
Água a 100oC por 3 minutos com casca 0 2
sem casca 0 2

Fontes: 1. Nascimento e Oliveira (1999); 2. Martins, Carvalho e Oliveira (1992).


140 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

exemplo, são bastante eficientes para muitas dades de dispersão) por meio dos tipos de agen-
sementes. Contudo, a manipulação do produto, tes que atuam nesse processo. Serão abordados
principalmente quando é necessário o uso de a seguir alguns métodos de superação da dor-
ácidos concentrados, exige mão-de-obra alta- mência, agrupados segundo sua principal for-
mente qualificada para que se evitem riscos à ma de atuação na semente.
saúde dos usuários. Ainda assim, os riscos de
acidentes tornam tais métodos pouco recomen- Agentes mecânicos
dáveis em escala comercial. Não é difícil imaginar que uma semente
Há estudos sobre quebra de dormência de com tegumento rígido, impermeável à água, só
sementes de várias espécies. Em alguns casos, poderá germinar se for aplicado algum tipo de
já se tem tecnologia adequada e difundida, com tratamento que possibilite a remoção total ou
técnicas e procedimentos bem-estabelecidos e parcial da casca, facilitando a entrada de água
de amplo domínio público (ISTA, 1985), como na semente, de modo a permitir sua embebição,
as estratificações feitas em sementes de frutei- etapa inicial da germinação. A casca da semente
ras de clima temperado ou as escarificações me- também pode agir como barreira às trocas gaso-
cânicas em várias leguminosas arbóreas tropi- sas ou à entrada de luz, como impedimento à
cais. Em outras situações, porém, os estudos saída de inibidores endógenos ou, ainda, forne-
não são ainda conclusivos ou, mesmo, não há cendo inibidores para o embrião, impedindo
estudos. Nesses casos, além dos cuidados des- assim a germinação.
critos anteriormente, também pode ser de gran- A ocorrência de tegumentos rígidos, resis-
de ajuda analisar as características do ambiente tentes, provocando uma resistência mecânica,
no qual a espécie ocorre naturalmente, sua re- é muito comum nas Leguminosae, principal-
gião de origem, formas de dispersão, etc. Tais mente nas Faboideae. Em sementes de determi-
observações podem fornecer informações im- nadas espécies, a entrada de água e oxigênio é
portantes para a escolha do método de quebra impedida por uma tampa de suberina, seme-
de dormência, tais como período de baixas tem- lhante a uma rolha (estrofíolo), localizada em
peraturas após a dispersão natural das semen- uma pequena abertura na casca (Salisbury e
tes, passagem das sementes pelo trato digestivo Ross, 1992). A agitação vigorosa das sementes
de animais, entre outras. pode deslocá-la e permitir a entrada de água,
levando à germinação. Esse tratamento é co-
nhecido como quebra de dormência por impac-
MÉTODOS PARA QUEBRA DE tação e é aplicado em sementes de Melilotus alba
DORMÊNCIA EM SEMENTES (trevo-doce, trevo-doce-branco) e Crotallaria
A dormência das sementes consiste na incapa- aegyptica (crotalária), espécies utilizadas como
cidade de germinação do embrião devido a al- adubo verde. A remoção total ou parcial da cas-
gum problema inerente à semente. Quando ca da semente por tratamentos diversos é de-
todas as condições necessárias à germinação nominada escarificação.
são oferecidas e mesmo assim a semente não A escarificação mecânica é feita com mate-
germina, existe uma forte possibilidade de ela riais cortantes, como facas, canivetes, estiletes,
apresentar algum tipo de bloqueio que deve ser alicates, ou com materiais abrasivos, como li-
removido ou superado para que o processo da mas, lixas, areia, etc. Na maioria das vezes, não
germinação ocorra. Para que se perca a dormên- é necessário retirar todo o tegumento da se-
cia, a semente deve sofrer a ação de algum fator mente, basta uma leve escarificação, suficiente
ambiental e/ou metabólico. Desse modo, a que- para permitir a entrada de água a fim de que a
bra da dormência está relacionada a fatores ex- germinação venha a ocorrer. Exemplos de se-
ternos e internos à semente. mentes que necessitam desse tipo de tratamen-
Para fins didáticos, costuma-se estudar a to: as plantas arbóreas do bioma Cerrado, como
quebra da dormência de sementes (ou de uni- jatobá, Dipteryx alata (baru) e Stryphnodendron
GERMINAÇÃO 141

barbadetimam (barbatimão); Rumex obtusifolius que a germinação em canteiro sob temperatura


(língua-de-vaca, espécie invasora), Xanthium ambiente (ao redor de 25oC) foi de 40% após 7
strumarium (espécie muito utilizada em estu- a 10 meses; em embriões isolados, entre 35 e
dos de floração), várias leguminosas, como Cae- 39oC, a germinação ocorreu após oito dias, atin-
salpinia ferrea (pau-ferro), Bauhinia forficata (pa- gindo 90% (Felippe e Silva, 1984). Em algumas
ta-de-vaca) e Schizolobium parahyba (guapuru- plantas de Cerrado, temperaturas relativamen-
vu), conforme Felippe e Silva (1984), Lorenzi te altas (cerca de 35oC) podem acelerar a germi-
(1992) e Guimarães e colaboradores (1995). A nação. Esse efeito da temperatura não deve ser
semente de Eugenia dysenterica (cagaita), espécie confundido com o efeito de água quente na
do Cerrado, apresenta uma testa coriácea, gros- quebra de dormência em algumas sementes.
sa, permeável à água, mas que se torna pouco Nessas, como em guapuruvu, para que ocorra
permeável ao oxigênio quando fica saturada de a germinação, é preciso ferver as sementes por
água; nesse caso, é necessário perfurar ou reti- alguns minutos. A fervura vai apenas retirar
rar a testa da semente para acelerar a germi- as ceras presentes no tegumento da semente,
nação (Rizzini, 1970). A escarificação mecânica diminuindo sua impermeabilidade e permitin-
também pode ser feita por agentes químicos do a entrada de água e as trocas gasosas.
fortes, como o ácido sulfúrico concentrado. A exposição a um calor intenso, como nas
queimadas, pode provocar a ruptura da testa
Temperatura de algumas sementes. Esse efeito é descrito em
As sementes de várias espécies não-tropi- Acacia melanoxylon, uma espécie das savanas
cais podem ter sua dormência quebrada quando africanas, e em Calluna vulgaris (urze européia),
hidratadas ou expostas a baixas temperaturas. não sendo confirmado em sementes de plantas
Esse efeito também é conhecido como estrati- do Cerrado. Sementes de Albizzia lophanta, uma
ficação. Esta é uma prática comum em horti- leguminosa de pequeno tamanho que ocorre
cultura e silvicultura, e o nome advém da forma na Austrália, germinam quando expostas à pas-
como as sementes são colocadas, em camadas, sagem do fogo e, quando isso não ocorre, ape-
no substrato umedecido, para receber o trata- nas 5% das sementes germinam (Salisbury e
mento de baixa temperatura. É fácil imaginar Ross, 1992).
como a estratificação se dá em condições natu- Finalmente, é importante mencionar os
rais, durante o inverno, quando as sementes efeitos de temperatura alternada na quebra de
são expostas por vários dias a temperaturas dormência de sementes, como ocorre em algu-
entre 1 e 10oC e têm sua dormência quebrada, mas espécies de Rumex (Metivier, 1979). Em
vindo a germinar no início da primavera. Al- Bidens gardneri (picão-do-cerrado), uma herbá-
guns pinheiros (Pinus spp.), espécies do gênero cea ocorrente em áreas abertas e marginais de
Pyrus (macieira e pereira), cereais como Avena Cerrado, temperaturas alternantes de 20 a 30oC
sativa (aveia), Rosa spp. (rosa) e Vitis vinifera (vi- durante o armazenamento de aquênios com
deira) são exemplos de plantas cultivadas cujas teor alto de água aumentam a germinação no
sementes requerem frio para germinar (Meti- escuro e, portanto, alteram a resposta fotoblás-
vier, 1979; Bewley e Black, 1994). tica (Rondon et al., 2001). Esse efeito explicaria
Mais raramente, outras espécies requerem a germinação dos aquênios presentes em solo
temperaturas altas para que ocorra a quebra de Cerrado, onde oscilações diárias de tempera-
de dormência. Porophyllum lanceolatum, uma As- tura nessa faixa podem ocorrer. O efeito da al-
teraceae que ocorre no Cerrado, apresenta ternância de temperatura é uma resposta difícil
aquênios que germinam bem a 25oC, em pre- de ser quantificada, pois pode ser extremamen-
sença de luz; aquênios mantidos no escuro e te variável em termos de tempo de exposição,
que receberam choques de temperatura entre magnitude da variação entre a temperatura alta
34 e 42oC germinaram na total ausência de luz. e a baixa, número de ciclos de exposição, etc.
Em Andira humilis (mata-barata), observou-se Em algumas espécies, a alternância de tempe-
142 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

ratura pode substituir o efeito da luz na germi- Os reguladores de crescimento exercem um


nação. papel primordial na eliminação da dormência.
As giberelinas (geralmente o ácido giberélico,
Lixiviação GA3, mas também GA4 e GA7) as citocininas
O efeito físico da água na quebra de dor- (principalmente a cinetina e a benziladenina)
mência pode ser entendido quando ela exerce e o etileno são os compostos mais relacionados
o papel de agente de lixiviação (lavagem) de à quebra da dormência. Em geral, as sementes
inibidores de crescimento presentes na semen- que necessitam de estratificação, luz ou um pe-
te. Em condições naturais, tal efeito pode ser ríodo de pós-maturação respondem bem a apli-
obtido quando ocorre uma chuva torrencial ou cações de hormônios que, freqüentemente, ace-
mesmo chuvas freqüentes. Em laboratório, cos- leram a germinação de sementes não-dormen-
tuma-se deixar as sementes que necessitam tes. Entre os efeitos de reguladores de cres-
desse tipo de tratamento por um certo período cimento, estaria o de aumentar o nível endó-
de tempo sob água corrente, antes de colocá- geno desses compostos ou antagonizar o efeito
las para germinar. Lembramos aqui que semen- de inibidores no metabolismo embrionário. Em
tes presentes no solo ou na serapilheira estão língua-de-vaca, as sementes necessitam de luz
sujeitas à ação de inúmeros tipos de inibidores constante para germinar, a qual pode ser subs-
presentes em outras sementes, em folhas e mi- tituída por um choque de luz durante uma hora
crorganismos. Nesses casos, a ocorrência de ou um choque de temperatura a 40°C pelo mes-
chuvas pode atuar na lixiviação de inibidores, mo período (Tabela 8.2). Foi observada a exis-
propiciando a germinação (Capítulo 16). tência de inibidores endógenos cuja concentra-
ção diminui após os choques de luz e de tem-
peratura, que, concomitantemente, provoca-
Agentes químicos e reguladores do
crescimento
ram aumento significativo do teor de gibereli-
Dentre estes, destacam-se os ácidos fortes, nas das sementes. Em outras situações, uma
como o ácido sulfúrico, que, quando em contato embebição prévia no escuro por um período va-
com os tegumentos duros de uma semente, po- riável pode quebrar a dormência. Aquênios de
de levar à ruptura da testa, como anteriormente Acanthospermum hispidum (carrapicho-de-car-
mencionado. O tempo que as sementes ficam neiro) necessitam de um período de pós-ma-
expostas ao efeito corrosivo do ácido varia de turação para a interrupção da dormência, o que
acordo com a espécie. As sementes de legumi- é obtido quando são embebidos no escuro por
nosas arbóreas, como sabiá, Cassia spp., Mimosa 10 a 20 dias (Garcia e Sharif, 1995).
bimucronata (maricá) e Dimorphandra mollis (fal- As giberelinas constituem o grupo de regu-
so-barbatimão, farinheiro), são exemplos de se- ladores de crescimento que tem o mais amplo
mentes cuja dormência pode ser quebrada por espectro de ação em relação à quebra de dor-
ácido sulfúrico (Lorenzi, 1992; Martins, Car- mência em sementes. O efeito na germinação
valho e Oliveira, 1992; Jeller e Perez, 1999). de alface é um dos mais conhecidos, tendo tam-
Imersão em hipoclorito de sódio (NaClO3),
ácido nítrico (HNO 3), nitrato de potássio
(KNO3), etanol (para remoção de ceras do te- Tabela 8.2 Efeito do choque de luz e de
gumento) ou água oxigenada (H2O2) é prática temperatura na germinação de Rumex obtusifolius L
comum, usada para superar a dormência. Es- Tratamento Germinação (%)
ses agentes químicos podem atuar em vários
Escuro 25oC 15,3
processos do metabolismo das sementes, como
Escuro 25oC (1h a 40oC) 75,3
nos processos oxidativos, no ciclo das pentoses Escuro 25oC (1h de luz) 88,0
e na respiração. Luz constante 25oC 89,3

Fonte: Felippe et al. (1970).


GERMINAÇÃO 143

bém sido observado em língua-de-vaca (Tabela timo comprimento de onda fornecido (Tabela
8.3). 8.4). Por meio desse e de outros estudos se es-
As citocininas parecem ser menos eficientes tabeleceu que a luz é absorvida por um pigmen-
e podem induzir uma germinação anormal, por to, denominado fitocromo, que se converte em
exemplo, com a emissão dos cotilédones antes duas formas, ativa e inativa.
da protrusão da radícula. Em geral, as aplica- As duas formas do fitocromo podem ser
ções exógenas de reguladores de crescimento simbolizadas por Fv e Fve. A primeira, inativa,
são mais eficazes quando fornecidas juntamen- absorve luz vermelha, com pico de absorção má-
te com outro fator, como a luz, ou com outro xima em 660 nm. Quando o Fv é ativado pela
regulador de crescimento, combinados entre si luz vermelha, converte-se na segunda forma,
em termos de concentração. Assim, em Cheno- o Fve (pico de absorção máxima em 730 nm),
podium album (ançarinha-branca), a aplicação que é a forma ativa e, para a maior parte das
de etileno estimula a germinação com maior sementes fotoblásticas, promove a germinação.
eficácia na presença de luz e de giberelina O esquema clássico que explica essa conversão
(Bewley e Black, 1994). mútua está apresentado a seguir (Bewley e
Black, 1994):
Luz
luz vermelha
Em 1954, Borthwick e colaboradores (apud, Fv Fve
Quebra da
dormência
Bewley e Black, 1994), estudando os efeitos de luz vermelho-extremo
diferentes comprimentos de onda na germina-
escuro
ção, estabeleceram o espectro de ação para a
germinação de sementes de alface (Lactuca sa-
tiva), cultivar Grand Rapids (Bewley e Black, Sob efeito do tratamento luminoso, tanto
1994). A maior germinação foi encontrada na a passagem de Fv para Fve como o inverso ocor-
faixa de 660 nm, e a inibição desta foi encontra- rem rapidamente. A conversão de Fve para Fv
da em 730 nm. Esses comprimentos de onda pode ocorrer também no escuro, porém essa
referem-se, respectivamente, à luz vermelha e reação é mais lenta. Além disso, sob luz branca,
à luz vermelho-longo ou vermelho-extremo. há maior conversão de Fv para Fve (pois a luz
Esta última situa-se entre o vermelho e o infra- branca apresenta maior proporção de vermelho
vermelho. Por volta dessa mesma época, obser- que o vermelho-extremo), o que explica o su-
vou-se também que os efeitos desses compri-
mentos de onda antagonizavam-se mutuamen-
Tabela 8.4 Fotorreversibilidade do fitocromo na
te, ou seja, a resposta à exposição seqüencial
quebra de dormência de sementes de Lactuca
de sementes de alface a irradiações de luz ver- sativa (alface) Grand Rapids. As sementes foram
melha e de vermelho-extremo dependia do úl- embebidas no escuro e expostas à luz vermelha (V)
por 1,5 min e à luz vermelho-extremo (VE) por 4
min, na seqüência mostrada. As sementes foram
colocadas no escuro por 24 h, sendo avaliada a
Tabela 8.3 Efeito de diferentes concentrações de germinação
GA3 na germinação de sementes de Rumex
obtusifolius no escuro Irradiação Germinação (%)

Tratamento Germinação (%) Escuro 4


V 98
Controle (água) 9 VE 3
GA3 1 mg mL-1 36 V, VE 2
GA3 2,5 mg mL-1 20 V, VE, V 97
GA3 5 mg mL-1 14 V, VE, V, VE 0
GA3 10 mg mL-1 4 V, VE, V, VE, V 95

Fonte: Felippe et al. (1970). Fonte: Bewley e Black (1994).


144 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

cesso de vários autores em utilizar luz branca de rochas, também podem sofrer uma escarifi-
para a quebra da dormência de sementes, como cação mecânica ou lixiviação.
em sementes de pereira (Maeda et al., 1997) e Como apresentado anteriormente, trata-
de espécies florestais (Borges e Rena, 1993). mentos térmicos utilizados experimentalmente
As Regras para análise de sementes (Brasil, 1992) na quebra da dormência ocorrem de forma na-
e o Manual técnico de sementes florestais (Figliolia tural no ambiente onde a semente se encontra.
e Piña-Rodrigues, 1995) também sugerem o uso Temperaturas alternantes, altas temperaturas
da luz na condução de testes de germinação de ou mesmo o próprio fogo são comuns em am-
algumas espécies. bientes abertos, formações savânicas, e, para
A luz pode ser considerada um fator impor- uma dada semente, podem servir como um in-
tante na quebra de dormência em sementes. A dicativo do tipo de ambiente ou da época do
ação de diferentes comprimentos de onda sobre ano em que a mesma se encontra.
o fitocromo constitui um dos fatores mais rele- De maneira similar, a luz pode servir como
vantes para a germinação de sementes. Sendo um excelente indicativo da localização da se-
o fitocromo um cromóforo ligado a uma proteí- mente no ambiente. Sabe-se que a composição
na (Capítulo 6), os efeitos da luz na quebra de do espectro luminoso varia em função de diver-
dormência podem ser dependentes da tempera- sos fatores, como o horário do dia, o grau de
tura. Algumas sementes, como certos cultivares cobertura vegetal e a profundidade do solo. A
de alface, são indiferentes à luz a 20°C, mas luz solar, em ambiente aberto, apresenta maior
em temperaturas mais elevadas (em torno de quantidade de vermelho que vermelho-extre-
35°C) tornam-se fotoblásticas. Sementes de pi- mo na maior parte do dia. Entretanto, a passa-
cão-do-cerrado e de Porophyllum lanceolatum, gem da luz solar através da copa das árvores
ambas herbáceas de Cerrado, necessitam de luz inverte essa relação, visto que boa parte do ver-
para germinar; no entanto, quando armazena- melho é absorvido pelas clorofilas, resultando
das, vão perdendo gradativamente essa caracte- no fato de que a luz que atinge o sub-bosque
rística, vindo a germinar também na ausência apresenta maior proporção de vermelho-extre-
de luz (Felippe e Silva, 1984). A escarificação mo. Uma semente enterrada a poucos centíme-
de sementes, além de ser necessária para permi- tros de profundidade recebe mais vermelho-
tir a entrada de água ou as trocas gasosas, tam- extremo que vermelho, pois este comprimento
bém pode servir como uma quebra de barreira de onda tem maior poder de penetração entre
à entrada de luz. as partículas do solo. Todas essas variações po-
dem ser percebidas por meio do pigmento fito-
cromo, identificando a posição e o tipo de am-
CONSIDERAÇÕES FINAIS biente em que a semente se encontra, gerando
Grande parte dos mecanismos de quebra de assim respostas fisiológicas distintas (germina-
dormência descritos ocorre na natureza. A que- ção ou dormência) em função das condições
bra de tegumentos rígidos por diversos agen- ambientais predominantes.
tes acontece em condições naturais, talvez mais As sementes possuem características mor-
lentamente. Além da degradação por micror- fológicas e fisiológicas que devem ser considera-
ganismos, a passagem pelo trato digestivo de das quando se estudam os bancos de sementes
animais durante a dispersão, especialmente de do solo (Capítulo 14). São essas características
aves que possuem moela rígida para a trituração que aumentarão suas chances de permanência
de alimentos, pode ser caracterizada como uma no banco, facilitando ou não a germinação
forma de escarificação mecânica. Em diversos quando houver condições ambientais para isso.
animais, a escarificação química pode ocorrer Antes de serem consideradas empecilhos,
no trato digestivo. Sementes levadas por uma as barreiras à germinação presentes nas semen-
corredeira, onde a água percorre áreas cobertas tes devem ser encaradas como mecanismos de-
GERMINAÇÃO 145

senvolvidos de proteção ao embrião e de impe- FRANKE, L.B.; BASEGGIO, J. Superação da dormência


dimento à germinação em locais ou momentos de sementes de Desmodium incanum DC. e Lathyrus
nervosus Lam. Revista Brasileira de Sementes, v. 20, p. 420-
desfavoráveis; se não existissem, o recrutamen-
424, 1998.
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PA R T E 3

GERMINAÇÃO
C A P Í T U L O 9

EMBEBIÇÃO E REATIVAÇÃO
DO METABOLISMO
Renato Delmondez de Castro
Kent J. Bradford
Henk W. M. Hilhorst

Muitas sementes concluem seu desenvolvi- ABSORÇÃO DE ÁGUA


mento com uma etapa chamada “secagem ou EM UMA CÉLULA
dessecação de maturação”. Conforme descrito Todas as substâncias têm uma energia interna,
no Capítulo 3, isto é característico das sementes dita energia livre, que permite que elas realizem
ortodoxas, as quais, quando dispersas da plan- alguma forma de trabalho. Essa energia livre
ta-mãe, apresentam baixo conteúdo de água, na água é elevada, sendo chamada de potencial
em torno de 5 a 10% de seu peso fresco. Em químico da água, o qual é freqüentemente ex-
sementes recalcitrantes, geralmente não se ve- presso em unidades de pressão (MPa), como
rifica uma etapa característica de dessecação potencial hídrico (Ψ). A água pura tem um po-
ao final do desenvolvimento e da dispersão da tencial químico elevado, podendo dissolver so-
semente, podendo o conteúdo de água ser man- lutos e hidratar substâncias. Quando solutos
tido relativamente elevado, em torno de 60 a (açúcares e/ou sais) são adicionados à água,
70% de seu peso fresco. Sob baixos conteúdos esta usa a energia para dissolvê-los, diminuindo
de água, a atividade metabólica é reduzidíssi- assim seu potencial químico. Quanto mais so-
ma, sendo evidente que a água deve ser reab- lutos a água dissolve, mais baixo torna-se o seu
sorvida antes que a atividade metabólica possa potencial. Pela definição, a água pura tem um
recomeçar. Em algumas sementes, a testa e/ou potencial hídrico igual a zero (Ψ=0). Assim,
os tegumentos impermeáveis impedem a absor- toda e qualquer solução deve ter um potencial
ção de água (ver Capítulo 7), estendendo o pe- hídrico negativo (sinal -). A diferença entre o
ríodo seco das mesmas até que a resistência seja potencial da água pura e o da água mais soluto
superada por exposição ao tempo ou por ação é chamada de potencial osmótico ou Ψπ. A água
biológica (ver Capítulo 8), tornando-as permeá- ganha energia quando sob pressão, de forma
veis à absorção de água e à hidratação. Outras que o Ψ se torna mais positivo (sinal +). A di-
sementes se hidratam muito rapidamente ferença entre o potencial da água pura e o da
quando em contato com água. Assim, a taxa água sob pressão é chamada de potencial de
inicial de embebição pode variar extensamente, pressão ou Ψp. Portanto, o potencial da água
dependendo das características da testa e/ou pode ser expresso em função das forças negati-
do pericarpo que cerca o embrião. Para com- vas e positivas a que é sujeita:
preender a força dirigida de absorção de água
por organismos vivos, é necessária alguma com- Ψ = Ψπ + Ψp (valores absolutos)
ou Ψ = (-Ψπ) + Ψp (valores reais)
preensão dos princípios básicos de relações hí-
dricas (Taiz e Zeiger, 1998). Ψπ tem um valor negativo
Ψp tem um valor positivo
150 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Uma célula viva consiste de diversos com- vivo (dicotiledôneas) ou morto (monocotiledô-
partimentos separados por membranas semi- neas), pelo perisperma, pela testa ou tegumen-
permeáveis seletivas. Canais nas membranas, tos, ou mesmo pelo pericarpo, dependendo da
formados por proteínas, permitem a passagem espécie (ver Capítulo 4). Todas as células dos
da água, mas impedem a de solutos. Por causa tecidos embrionários e dos demais tecidos apre-
disso, existem gradientes de potencial hídrico sentam potencial hídrico, que pode ser específi-
entre o meio externo e o interno à membrana, co a cada tecido, célula ou até mesmo a cada
que propiciam o movimento da água, sempre compartimento celular, conforme visto ante-
do potencial hídrico mais elevado para o mais riormente. Conseqüentemente, a semente co-
baixo ou mais negativo. O potencial hídrico de mo um todo pode comportar-se como uma célu-
uma célula corresponde a Ψcélula=Ψπ + Ψp (va- la gigante, apresentando relações hídricas es-
lores absolutos). O Ψπ do líquido no vacúolo pecíficas. Ao monitorar o conteúdo de água de
assume valor negativo em função dos solutos sementes secas submetidas a embebição em
que contém. Se a célula é envolvida por água água, muito freqüentemente se observa um pa-
em um Ψ mais elevado, esta então flui para drão típico trifásico de absorção de água e hi-
dentro ao longo do gradiente de potencial dratação (Figura 9.1; Bewley e Black, 1994). A
hídrico (do potencial elevado para o baixo). Os fase inicial de embebição ou de absorção de
solutos não podem fluir para fora porque o água, ou fase I, é um processo dirigido pelo gra-
plasmalema e o tonoplasto são seletivamente diente de potencial hídrico (ψ) entre a semente
permeáveis. À medida que a água entra na cé- e seu ambiente. Como em células individuais,
lula, o volume aumenta, mas é contido pela rí- o potencial hídrico da semente consiste dos três
gida parede celular, resultando em pressão hi- componentes que contribuem para a força di-
drostática ou Ψp. Quando essa pressão de turgor rigida de absorção de água:
é igual à diferença entre o Ψ externo e o Ψπ
(por exemplo, Ψp = Ψ – Ψπ), a absorção líqui- Ψsemente = Ψπ + Ψm + Ψp (valores absolutos)
da de água é zero (o fluxo de saída da água é
igual ao de entrada), fazendo com que haja um ou
equilíbrio dinâmico. Se o Ψ externo=0 MPa, a
célula torna-se então completamente túrgida. Ψsemente = (-Ψπ) + (-Ψm) + Ψp (valores reais)
Matrizes (paredes celulares, componentes inso-
lúveis na célula, tais como amido e algumas em que:
proteínas) absorvem a água. O potencial de Ψπ = potencial osmótico (depende do
absorção desta é então chamado de potencial número de moléculas dissolvidas;
matricial ou Ψm. A água perde energia enquan- valor negativo)
to é absorvida, fazendo com que o Ψm assuma Ψm = potencial matricial (depende do
um valor negativo. Isso não constitui fator em número de sítios de ligação de água;
células inteiramente hidratadas, mas em situ- valor negativo)
ações secas (por exemplo, sementes), faz com Ψp = potencial de pressão ou de turgor (valor
que as matrizes absorvam água. Nessa situação, positivo).
o Ψcélula é determinado primariamente pelo Ψm
(Ψcélula = Ψπ + Ψp + Ψm) (Taiz e Zeiger, 1998). Em geral, a fase I é rápida, dirigida sobre-
tudo pelo potencial matricial da semente seca
(Figura 9.1). É um processo puramente físico,
ABSORÇÃO DE ÁGUA EM que depende somente da ligação da água à ma-
SEMENTES triz da semente. Isso ocorre em qualquer mate-
Em geral, as sementes consistem de um em- rial, morto ou vivo, que contém sítios de ligação
brião e de tecidos circunvizinhos, que podem ou de afinidade pela água. Quando todas as ma-
ser representados pelo xenófito ou endosperma trizes atingem hidratação plena (e o Ψm se tor-
GERMINAÇÃO 151

Fase I Fase II Fase III


absorção intervalo de preparação germinação
de água ativação metabólica crescimento
Conteúdo de água, (%) peso fresco

80
Yp
9
Yp
60 Ym
8
6 7 Yp = Yp
5
4
40 3
2

20 1
Tolerante
Tolerante Intolerante
Intolerante
a dessecação
à dessecação a àdessecação
dessecação

Tempo de embebição

 Figura 9.1
Representação esquemática do padrão trifásico de absorção de água durante a embebição de sementes, em
relação aos conteúdos aproximados de água em que os diferentes eventos do processo germinativo são
iniciados. (1) Respiração e acúmulo de ATP. (2) Síntese de mRNA e reparo de DNA. (3) Ativação de polissomos.
(4) Síntese de proteínas a partir de mRNAs recentemente sintetizados. (5) Síntese e duplicação de DNA (2C a
4C). (6) Início da degradação de reservas (tecidos de revestimento começam a enfraquecer). (7) As células da
radícula alongam-se. (8) Protrusão da radícula. (9) Mitose. Nota-se que, na fase I da embebição, a semente
inicialmente seca acumula água e aumenta em volume e tamanho em função do potencial matricial (Ψm). A
duração da fase II é variável, dependendo principalmente da temperatura. Nesta fase, a semente encontra-se
túrgida, não havendo influência de Ψm. Portanto, a absorção de água é mínima, e o potencial hídrico total da
semente é zero (Ψsemente = 0) quando a embebição acontece em “água pura”. Conseqüentemente, o potencial
osmótico encontra-se em equilíbrio com o potencial de pressão ou turgor (Ψπ = Ψp). Durante a fase III, a
semente absorve água em função de o potencial de pressão da semente ser menor que o potencial osmótico
do embrião (Ψp < Ψπ) quando considerados os “valores absolutos” (desconsiderando os sinais + ou -). Ou
seja, nessa fase, o valor absoluto de Ψπ do embrião é maior (ou valor real mais negativo) que o potencial de
pressão (ou valor real mais positivo), fazendo com que o potencial total da semente se torne menor que zero
(Ψsemente < 0). Quanto mais negativo, maior a capacidade de absorver água. Observa-se também que as
sementes podem ainda ser secas desde que não seja iniciada a fase III, momento em que se tornam intoleran-
tes à dessecação.

na zero), o Ψπ se torna a força que faz a água rior das sementes não podem absorver mais
continuar se movendo para dentro da semente água porque não podem mais expandir; o
até que seja balanceada pelo turgor ou Ψp. Nes- Ψsemente = 0 (se estiver em água pura) e, conse-
sa situação, o conteúdo de água da semente, qüentemente, o Ψπ = Ψp. Isso pode ter duas
em geral, alcança um nível de platô, mantido causas: ou as paredes celulares das células em-
relativamente constante, ou aumenta pouco e brionárias estão demasiadamente rígidas ou as
muito lentamente por um período conhecido estruturas que cercam o embrião impedem sua
como intervalo ou fase de preparação e ativação expansão. Entretanto, em muitos casos, o em-
do metabolismo, ou apenas fase II da embebi- brião absorverá água quando isolado da semen-
ção (Figura 9.1). Nesta fase, as células no inte- te, indicando que as estruturas (ou tecidos) que
152 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

o envolvem estão limitando a sua expansão concomitante com divisão celular e conseqüen-
(Haigh e Barlow, 1987; Dahal e Bradford, 1990; te alongamento embrionário – protrusão da ra-
Welbaum e Bradford, 1990). Isso indica que o dícula), conforme visto anteriormente. Uma vez
potencial hídrico embrionário, em um determi- iniciado o crescimento, as sementes perdem ra-
nado momento, pode ser negativo, ao passo que pidamente sua tolerância à desidratação (Le-
o Ψ total da semente intacta é zero (Ψsemente = prince et al., 2000). Assim, a iniciação da emer-
0), mesmo quando a pressão externa exercida gência (ou protrusão da radícula) geralmente
pelos tecidos de revestimento é diminuída ou marca um “ponto sem retorno” para a semente,
perdida (Welbaum et al., 1998). Assim, para que se encontra então comprometida com a ger-
que seja reiniciada a absorção de água durante minação e com o desenvolvimento da plântula.
a fase III da embebição, o Ψπ do embrião deve Esse é um dos estágios mais críticos no ciclo de
se tornar um valor real mais negativo, e/ou o vida de uma planta, visto que as plântulas são
Ψp, menos positivo. Em valores absolutos (des- altamente vulneráveis aos estresses ambientais
considerando os sinais + ou -), isso implica que (ver Capítulo 15).
o Ψπ do embrião torna-se maior que o Ψp. Exis-
tem evidências para ambos os casos. O Ψπ pode
tornar-se mais negativo (maior em valor ab- TEMPERATURA DE
soluto) quando as macromoléculas, tais como EMBEBIÇÃO E INTEGRIDADE
as proteínas e os carboidratos, são quebradas DE MEMBRANAS
em componentes menores, aumentando a con- A taxa inicial de embebição e a temperatura po-
centração de solutos nas células; o Ψp pode tor- dem alterar acentuadamente a germinação e a
nar-se menos positivo (menor em valor abso- qualidade da semente (vigor), sobretudo em
luto) quando as estruturas circunvizinhas são sementes grandes. Tem-se observado por mui-
enfraquecidas e/ou afrouxadas, a exemplo do to tempo que algumas sementes, como Phaseolus
processo de degradação enzimática das paredes vulgaris (feijão) e Zea mays L. (milho), são da-
celulares dos tecidos que envolvem o embrião, nificadas pela embebição rápida em temperatu-
ilustrado na Figura 9.7. ras baixas, evento este conhecido como “dano
Durante a fase II, são ativados os processos de embebição” (Pollock e Toole, 1966). Se essas
metabólicos requeridos para o crescimento do sementes estiverem demasiado secas quando
embrião e a conclusão do processo germinativo colocadas na água, podem sofrer danos irrepa-
(momento em que há emergência ou protrusão ráveis no nível do sistema de membranas, o que
da radícula). A duração dessa fase depende leva à lixiviação de conteúdos celulares, afe-
principalmente da temperatura (T), mas tam- tando negativamente a germinação. Tempera-
bém do Ψsemente, sendo que a T e o Ψsemente baixos turas baixas aumentam esses danos (Wolk et
(pouco negativos) estendem-na. Da mesma al., 1989). Esse efeito prejudicial pode ser redu-
maneira, quando as sementes estão dormentes, zido retardando-se a taxa de absorção de água,
a duração da fase II pode ser consideravelmente permitindo que a hidratação inicial da semente
prolongada (ver Capítulo 6), assim como em ocorra com a fase de vapor d’água, quando na
sementes submetidas a tratamentos de envi- presença de umidade relativa elevada, ou re-
goramento por meio de tecnologias de embe- vestindo a semente para retardar a taxa inicial
bição controlada ou priming (Figura 9.8). Du- do influxo de água.
rante essa fase, as sementes também tendem a Pesquisas recentes sobre a estrutura de
se manter tolerantes à desidratação ou à des- membranas em relação ao conteúdo e à tempe-
secação (Bradford, 1995). ratura da água fornecem uma explanação do
A fase III da embebição é marcada por um fenômeno “dano de embebição”. As membra-
aumento no conteúdo de água da semente, que nas celulares são compostas de uma camada
acontece devido à absorção associada com a ini- dupla (ou bicamada) de fosfolipídeos. As extre-
ciação do crescimento do embrião (expansão midades hidrofílicas das moléculas são voltadas
GERMINAÇÃO 153

para fora, enquanto as cadeias hidrofóbicas se dratação, interpolando-se entre os grupos pola-
associam à parede interna da membrana (Oli- res que encabeçam as moléculas de fosfolipí-
ver, Crowe e Crowe, 1998). Esta estrutura é de- deos, mantendo a estrutura cristalina líquida
pendente da presença da água para manter a (Buitink, Hoekstra e Leprince, 2002). Essenci-
orientação hidrofóbica/hidrofílica. Visto que a almente, esse é o mesmo efeito no caso de a
água é removida durante a desidratação, a temperatura ser mais elevada. Assim, quando
membrana então muda normalmente do esta- secas na presença dos açúcares, as membranas
do mais fluido, ou estado cristalino líquido, para fosfolipídicas assumem temperaturas muito
o estado menos fluido, mais seco, ou estado de mais baixas de transição do estado cristalino
gel. Nessa condição, há um efeito de empaco- líquido para o estado de gel. A quantidade ele-
tamento e aproximação das moléculas, restrin- vada de sacarose presente na maioria das se-
gindo seu movimento. Assim sendo, as mem- mentes maduras parece estar envolvida no pro-
branas de uma semente seca podem estar cesso de tolerância à dessecação (como discu-
primeiramente no estado de gel, o que não tido no Capítulo 3) e na prevenção dos danos
constitui uma boa barreira à lixiviação de con- de embebição, mantendo a estrutura cristalina
teúdos celulares. Se as sementes embeberem líquida da membrana mesmo quando em tem-
muito rapidamente em água, não haverá tempo peraturas mais baixas.
suficiente para que as membranas possam vol-
tar ao estado cristalino líquido, situação em que
ocorrem danos celulares e lixiviação (Figura REATIVAÇÃO DA RESPIRAÇÃO
9.2A). A transição entre os estados de gel e cris- E METABOLISMO
talino líquido também depende da temperatu- A atividade respiratória é rapidamente iniciada
ra. Se as membranas secas forem aquecidas, uma vez que a semente começa a embeber, a
elas poderão entrar em estado de “derretimen- partir de um conteúdo de água ao redor de 20%,
to”, passando para o estado cristalino líquido. seguindo um padrão similar àquele da absorção
Se a água for então introduzida, acontecerá de água (Figura 9.3; Bewley e Black, 1994).
pouca lixiviação ou dano à semente (Figura Diversas rotas e ciclos, como o ciclo de Krebs,
9.2B). Hidratação com vapor d’água também são ativados. Uma temperatura mais baixa ou
permite a transição de estado da membrana o potencial hídrico reduzido atrasam ou redu-
antes que a água líquida seja introduzida (Figu- zem a taxa absoluta de respiração, mas o pa-
ra 9.2C). Isso explica por que o dano de embe- drão geral é consistente (Dahal, Kim e
bição é maior em temperaturas mais baixas e Bradford, 1996). É dessa forma que, na maioria
como a pré-hidratação em temperaturas baixas dos casos, mitocôndrias sobrevivem ao período
aumenta o conteúdo de umidade das sementes seco, mantendo-se intactas e capazes de fosfo-
antes da embebição, reduzindo os danos. Em rilação oxidativa logo após a embebição, ainda
temperaturas mais quentes, as membranas da que danos durante o armazenamento prolon-
semente já se encontram no estado cristalino gado possam reduzir ou retardar o desenvolvi-
líquido e, assim, podem tolerar o influxo rápi- mento da função mitocondrial (McDonald,
do de água. O mesmo vale para sementes com 1999). A quantidade de trifosfato de adenosina
conteúdos de água mais elevados em tempera- (ATP) em sementes secas é extremamente bai-
turas mais baixas. Os dados existentes são, por- xa, mas aumenta depressa durante a
tanto, bastante convincentes sobre o fato de que embebição, seguindo a atividade respiratória
a transição de estado de membranas contribui aeróbica (Figura 9.3), que é a principal fonte
para o “dano de embebição” (Crowe, Hoekstra de ATP antes da emergência da radícula. Os
e Crowe, 1989). níveis de ATP são mantidos constantes duran-
Carboidratos como a trealose (nos animais te o intervalo entre a absorção de água e o con-
e leveduras) ou a sacarose (nas plantas) podem sumo de oxigênio, apresentando valor global
substituir as moléculas de água durante a desi- dinâmico, como resultado de síntese e utiliza-
154 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

A
60
Cristalino líquido
(bicamada hidratada)
40

A embebição de sementes
secas em temperaturas baixas
20 provoca a transição do estado
de gel para o cristalino líquido,
causando danos nas
0 membranas e lixiviação.

Gel (bicamada seca)


20
0 5 10 15 20 25
Temperatura de transição da membrana (oC)

B
60
Cristalino líquido
(bicamada hidratada)
40
O aquecimento das sementes
secas, antes da embebição,
permite que a transição do
20 estado de gel para o cristalino
líquido aconteça antes que a
água seja introduzida, estando
as membranas prontamente
0 no estado cristalino líquido.

Gel (bicamada seca)


20
0 5 10 15 20 25

C
60
Cristalino líquido
(bicamada hidratada)
40
Alternativamente, as sementes podem ser
hidratadas em vapor d´água quando em
temperaturas baixas, elevando o conteúdo
20 de água da semente antes de expô-la à
presença de água líquida. Isso também
permitirá que as membranas estejam
prontamente no estado cristalino líquido
0 antes que a embebição aconteça.

Gel (bicamada seca)


20
0 5 10 15 20 25

Conteúdo de água da semente (%)


 Figura 9.2
Transições de estado da membrana (bicamada fosfolipídica) durante a embebição da semente. (A) A embebição
rápida em temperatura baixa causa a transição imediata do estado de gel (bicamada seca) ao estado cristalino
líquido (bicamada hidratada), resultando em danos e em lixiviação. (B) A embebição rápida em temperaturas
mais mornas não é prejudicial, pois as membranas se encontram prontamente no estado cristalino líquido.
(C) Mesmo em uma temperatura mais baixa, as sementes podem se hidratar com a fase de vapor d’água,
causando a mudança de estado da membrana antes que a água líquida seja introduzida.

ção contínua do ATP. Quando as sementes são mitocôndrias. Quando colocado de volta na pre-
postas em uma atmosfera de nitrogênio (sem sença do ar, o valor de ATP é restabelecido com
oxigênio), o ATP é rapidamente usado (em pou- rapidez (Pradet, 1982; Bewley e Black, 1994).
cos minutos), sem haver reposição de ATP de- O ATP é requerido para os processos que exigem
vido à parada da oxidação terminal nas energia e que são associados à iniciação do cres-
GERMINAÇÃO 155

1,4 INICIAÇÃO DA SÍNTESE DE


DNA, RNA E PROTEÍNAS
1,2 8
Absorção de oxigênio (mmol/min)

A síntese de DNA, RNA e proteínas pode ocorrer


Absorção de água (g/g semente)

ATP (nmol/g semente ´ 10-2)


1,0 em um conteúdo de água de aproximadamente
água 50%. As primeiras atividades em sementes em
6
0,8
nitrogênio
embebição são associadas ao reparo dos danos
0,6
acumulados durante a secagem e o período de
ATP
4 armazenamento das sementes, como o reparo
0,4 oxigênio do DNA. A formação de polissomos a partir de
ribossomos livres também acontece cedo du-
0,2 2
rante a embebição, de modo a criar o maqui-
nário para a tradução de RNAs mensageiros
0 4 8 12 16 20
(mRNAs) em proteínas (Bewley e Black, 1994).
Tempo a partir do início da embebição (h)
A síntese de proteínas é iniciada usando, em
 Figura 9.3 primeiro lugar, os mRNAs preexistentes acu-
Curso de tempo dos aumentos na absorção de água mulados durante o desenvolvimento e a ma-
(círculos abertos), no consumo de O2 (círculos fecha- turação das sementes, mas, posteriormente,
dos) e no conteúdo de ATP (quadrados abertos) em
trocando-os pelos novos mRNAs, recentemen-
sementes de Lactuca sativa (alface). A seta indica o
momento de transferência das sementes para uma
te sintetizados durante a embebição. Como
atmosfera de nitrogênio; e a linha pontilhada, o de- exemplo, nas primeiras horas de embebição, a
clínio imediato e rápido do conteúdo de ATP ao nível síntese de proteínas em embriões de rabanete
zero em pouquíssimos minutos, indicando que a ab- é insensível à cordicepina (um composto quí-
sorção de O2 está relacionada à respiração. mico inibidor da síntese de RNA), indicando
que o mRNA já existente é que está sendo usa-
do (Figura 9.4). Entretanto, depois de algumas
cimento do embrião (Perl, 1986). Em alguns horas, esse mRNA é degradado, e a síntese de
casos, a penetração do oxigênio no embrião é proteínas torna-se dependente do mRNA novo,
restringida pelos tegumentos da semente, sen- recentemente sintetizado (Figura 9.4; Bewley
do a geração inicial de ATP feita por meio da e Black, 1994). Muitas das enzimas requeridas
glicólise e/ou da respiração anaeróbica, resul- para a mobilização de reservas são sintetizadas
tando no acúmulo de etanol (Pradet e Raymond, de novo, sendo alguns dos produtos iniciais da
1983). No último caso, há a produção de etanol, síntese de proteínas (Bewley, 1997).
um processo natural que pode durar de algu-
mas horas a vários dias. A maioria das sementes
é equipada com enzimas capazes de neutralizar INICIAÇÃO DO CICLO CELULAR
o potencial tóxico do etanol. A respiração mito- O alongamento da radícula embrionária dentro
condrial é iniciada nesses casos somente a partir da semente ocorre, em geral, por alongamento
da emergência da radícula, quando o embrião ou expansão das células, seguido pela diferen-
fica em contato direto com a atmosfera. Os ciação e pelo crescimento da plântula, como re-
substratos iniciais para a respiração são açúca- sultado tanto de expansão como de divisão ce-
res solúveis (sacarose e oligossacarídeos), mas lular. Entretanto, geralmente a preparação para
reservas, como amido e lipídeos, também são a divisão celular ocorre bem antes que a pro-
logo utilizadas (Akazawa e Miyata, 1982), como trusão da radícula, visto que requer a iniciação
descrito em detalhes no Capítulo 10. O ATP e a do ciclo celular (Bino et al., 1992; De Castro et
nicotinamida adenina de fosfato (NADPH), ge- al., 1995). A relação do estado em que se encon-
rados via respiração, são utilizados para iniciar tra o DNA com o ciclo celular é ilustrada na
a síntese de ácidos nucléicos e de proteínas. Figura 9.5. Imediatamente após a divisão celu-
156 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

100
Síntese de proteínas
80
Quantidade relativa a partir de embriões

60 S G2
de sementes secas – controle (%)

4C

40 + cordicepina

20
A
0 2C
Conteúdo de mRNA G1 M
140

água
100

60

B + cordicepina
20  Figura 9.5
0 2 4 6 8 Diagrama simplificado para ilustrar as configurações
do DNA nuclear durante o ciclo celular. Após a divisão
Tempo a partir do início da embebição (h)
celular ou mitose (M*), as duas “células-filhas” apre-
 Figura 9.4 sentam seus cromossomos na configuração 2C. As
Declínio na quantidade de proteínas sintetizadas in células crescem durante a primeira fase de cresci-
vivo, codificadas pelo mRNA atual, presente em em- mento (G1), preparando-se para a subseqüente fase
briões secos de sementes de Raphanus sativus (raba- de síntese (S) do DNA e para a duplicação dos cro-
nete). (A) nova síntese de RNA durante o período ex- mossomos na configuração 4C. Posteriormente, ocor-
perimental foi impedida pela adição de cordicepina; re uma segunda fase de crescimento (G2), seguida
(B) conteúdo de mRNA em embriões de rabanete du- pela fase mitótica (M), que mais uma vez origina duas
rante a germinação, na presença ou na ausência de células-filhas, cada uma com o conteúdo de DNA e o
cordicepina. número de cromossomos reduzido de 4C para 2C.

lar (mitose), os cromossomos estão em sua con- DNA acontece sem que seja requerida a indução
figuração 2C. A partir daí, as células crescem subseqüente da citocinese. Evidentemente, a
normalmente (fase de crescimento 1 ou fase fração de células com DNA 4C aumenta com o
G1, representação em inglês para Gap phase 1), decorrer da embebição e da germinação (pro-
preparando-se para a fase subseqüente de sín- trusão da radícula). Como exemplo, em radí-
tese do DNA. Esta etapa (fase S) resulta na du- cula de embriões de Lycopersicon sculentum (to-
plicação dos cromossomos em uma configura- mate), a fração de células com DNA 4C aumen-
ção 4C. Depois disso, um segundo período pre- ta já durante as primeiras 12 horas de embebi-
parativo de crescimento (fase G2) ocorre, sendo ção (mas sem citocinese), visto que a primeira
seguido pela fase mitótica ou mitose (M), que semente com protrusão da radícula é observa-
reduz novamente o conteúdo de DNA de 4C da após 24 horas (Figura 9.6) (De Castro et al.,
para 2C em cada uma das células produzidas. 1995). Tem sido observado em muitas sementes
As fases G1 e G2 podem ser bastante longas. que o período entre as fases S e G2 é de cerca de
Isso significa que células com núcleos conten- 9 a 12 horas. A iniciação do ciclo celular envolve
do DNA 2C e 4C podem coexistir sem que haja não somente a síntese de DNA, mas também a
mitose imediata. Em geral, embriões dentro de regeneração do citoesqueleto. O principal com-
sementes maduras secas contêm células com ponente deste consiste de microtúbulos que são
DNA 2C e uma pequena fração das células com subestruturas celulares formadas essencial-
DNA 4C (Bewley e Black, 1994; Liu et al., 1997). mente por polipeptídeos α e β da proteína cha-
Assim, nas células com DNA 4C, a síntese do mada tubulina. Microtúbulos têm um papel im-
GERMINAÇÃO 157

portante nos processos de expansão celular, 100


A

Sementes germinadas (%)


assim como em guiar os cromossomos na posi- 80
ção correta durante as fases de crescimento G1
e G2 ou durante a subseqüente mitose. Em se- 60
mentes de tomate, acontecem divisões celulares
40
na radícula embrionária antes da sua protrusão
(De Castro e Hilhorst, 2000). Contudo, em ou- 20
tras espécies, a germinação parece independer
da ocorrência de mitose, visto que as sementes 0
B
germinam na presença de inibidores da mitose 15

Núcleos com DNA 4C (%)


(Labouriau e Spillmann, 1989). A embebição
de sementes de Brassica oleracea (repolho) em
10
solução aquosa de hidroxiuréia, um inibidor es-
pecífico da síntese de DNA, acontece sem efeito 5
inibidor sobre o acúmulo de tubulina e a expan-
são celular (Górnik et al., 1997), mostrando que 0
a mitose não é aparentemente essencial à pro-
24 48 72
trusão radicular.
Tempo a partir do início da embebição (h)

 Figura 9.6
INICIAÇÃO DO (A) Germinação e (B) aumento na fração de células
CRESCIMENTO DO EMBRIÃO com núcleos contendo DNA 4C em radículas de se-
E ENFRAQUECIMENTO DOS mentes de tomate. A seta indica a protrusão da radí-
TECIDOS DE REVESTIMENTO cula da primeira semente da população.
Durante a fase II de absorção de água, uma se-
mente viável ativa sistemas de produção de
energia, repara os danos acumulados durante vestimento, que podem controlar o sincronismo
o armazenamento ou dispersão e prepara-se pa- de emergência da radícula, e/ou (b) o aumento
ra iniciar o crescimento do embrião. Conforme do potencial de crescimento, ou turgor, por par-
visto anteriormente, o crescimento inicial po- te do embrião, para superar a resistência exer-
de envolver expansão celular e divisão celular, cida pelos tecidos de revestimento (quando Ψp
dependendo da espécie. Em alguns casos, a pro- < Ψπ, considerando-se valores absolutos, ou se-
trusão inicial do embrião através dos tecidos ja, desconsiderando-se os sinais + ou -), permi-
de revestimento envolve apenas a expansão das tindo assim o alongamento (ou expansão celu-
células existentes, enquanto, em outros, pode lar). Em inúmeras sementes contendo endos-
ocorrer um número substancial de divisões ce- perma (xenófito, ver Capítulo 1), enzimas hi-
lulares e morfogênese antes da protrusão e da drolíticas ou hidrolases que degradam a parede
emergência, como acontece em sementes de to- celular tornam-se ativas no próprio tecido de
mate e de Daucus carota (cenoura) (De Castro e endosperma, principalmente na região designa-
Hilhorst, 2000; Homrichhausen, Hewit e da cápsula de endosperma, a qual cerca a extre-
Nonogaki, 2003). Em muitas sementes, os teci- midade da radícula embrionária (Figura 9.7;
dos circunvizinhos que cobrem o embrião (xe- Bradford et al., 2000). Os produtos da degrada-
nófito ou endosperma, perisperma, testa ou te- ção enzimática da parede celular são, em geral,
gumentos, pericarpo) podem restringir mecani- carboidratos (conforme será visto no Capítulo
camente a emergência da radícula. Para que 10) que, por sua vez, são transportados à extre-
ocorra a expansão desta e a germinação, é ne- midade da radícula, contribuindo muito prova-
cessário haver: (a) o enfraquecimento e/ou velmente para o aumento no valor absoluto do
afrouxamento dos tecidos circunvizinhos de re- potencial osmótico das células radiculares (Ψπ
158 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Cápsula de endosperma
Embrião Enfraquecimento das
paredes celulares:
Testa mananase
poligalacturonase
celulase
Endosperma arabinosidase
expansina

GAs hidrolases

GAs Enfraquecimento

Embrião

Testa
(radícula) Potencial de crescimento Ruptura

Cápsula
de
Endosperma
(região da micrópila)

 Figura 9.7
Representação esquemática da germinação de uma semente de dicotiledônea contendo endosperma como
tecido de reserva e retenção, ilustrando as possíveis forças que conduzem à protrusão da radícula. A radícula
embrionária produz um promotor, giberelinas (GAs), que é lançado no endosperma. Esse promotor induz
enzimas hidrolíticas (hidrolases) que atuam na degradação de paredes celulares, enfraquecendo o tecido na
cápsula de endosperma. Observa-se então a geração de um potencial de crescimento embrionário e a ruptura
do endosperma. Algumas das hidrolases estão listadas.

mais negativo). Assim, a degradação das rígidas 1983; Baskin e Baskin, 1998). As sementes po-
paredes celulares trabalha em ambos os senti- dem também requerer luz e nutrientes para que
dos: enfraquecendo o tecido do endosperma e a germinação seja bem-sucedida. Fica claro que
aumentando o potencial de crescimento do em- a exigência de um conjunto específico de condi-
brião, permitindo a protrusão da radícula (Figu- ções para a germinação está relacionada às ca-
ras 9.1 e 9.7). racterísticas particulares de cada espécie. Con-
forme abordado nos Capítulos 5 e 8, há espécies
que crescem sob um dossel ou cobertura vegetal
O CONTROLE DA GERMINAÇÃO espessa e geralmente não requerem muita luz
As sementes germinam quando as condições para germinar. Ao contrário, espécies que re-
para o crescimento são favoráveis e elas não querem luz para o crescimento desenvolvem-
apresentam algum tipo de dormência (ver Parte se freqüentemente em clareiras, locais abertos
2). Obviamente, a primeira exigência para a ger- sem cobertura vegetal sobreposta, exigindo
minação é a água. Além disso, a germinação quantidades relativamente maiores de luz para
ocorre em determinada faixa de temperatura. que ocorra a germinação. Dessa maneira, as se-
Existem temperaturas mais apropriadas para mentes podem detectar a presença de concor-
a germinação, assim como temperaturas limi- rentes potenciais. De modo semelhante, elas
tantes, dependendo da espécie (Labouriau, são capazes de perceber plantas vizinhas, visto
GERMINAÇÃO 159

que estas podem ter usado determinados nu- as GAs reduzem a expressão e a ação de certos
trientes no solo, que são requeridos para a ger- genes e proteínas que bloqueiam o crescimento
minação. Com esses mecanismos, as espécies re- e a germinação (Fu et al., 2002; Peng e Harberd,
duzem a probabilidade de competição e aumen- 2002). Mesmo quando embebidas e hidratadas,
tam a de sobrevivência (Baskin e Baskin, 1998). algumas enzimas hidrolíticas essenciais são
Os sinais do ambiente são traduzidos em inibidas em sementes dormentes (ou em se-
sinais internos na semente, que assim inicia o mentes que tenham sido expostas a condições
processo de germinação. Os sinais externos naturais ou artificiais de indução de dormên-
(ambientais) percebidos pela semente desenca- cia), por exemplo, quando expostas à luz ver-
deiam sinais internos em nível molecular, que melho-distante (Quadro 9.1).
podem induzir a ativação ou a inativação de
compostos e/ou reações metabólicas diversas.
As giberelinas (GAs), entre estas o ácido gibe- PREPARAÇÃO PARA O
rélico, constituem uma classe de hormônios ve- CRESCIMENTO DA PLÂNTULA
getais (fitormônios) envolvidos na iniciação do Embora a germinação stricto sensu termine com
crescimento. Sementes percebem sinais am- a protrusão da radícula, o processo germina-
bientais específicos que induzem a síntese e/ tivo também pode envolver a preparação para
ou a ativação de GAs, que, por sua vez, induzem o crescimento da plântula. Sob circunstâncias
a síntese e/ou a ativação das enzimas hidrolíti- naturais, as sementes podem germinar abaixo
cas ou hidrolases, responsáveis pela degradação da superfície do solo. A plântula em crescimen-
das paredes de células do endosperma, entre to tem que cumprir uma determinada distân-
outros efeitos no metabolismo. GAs podem cia até a superfície; em seguida, a luz induz a
também estar envolvidas no aumento do poten- síntese de clorofila e o começo da fotossíntese.
cial de crescimento embrionário e na degrada- A partir daí, a plântula em crescimento torna-
ção de reserva da semente. No tomate, a expres- se um organismo autotrófico. Entretanto, até
são de enzimas hidrolíticas acontece principal- esse momento, o crescimento da plântula é
mente na região da cápsula de endosperma que abastecido pelos carboidratos derivados das re-
reveste a ponta da radícula, levando à degrada- servas da semente. Tanto o amido como os li-
ção de reservas e ao conseqüente enfraqueci- pídeos são convertidos em sacarose, que é re-
mento e/ou afrouxamento dessa região do en- querida como a fonte de energia para o cresci-
dosperma, de modo a permitir a protrusão da mento. Nesse estádio, a plântula em crescimento
radícula (Figura 9.7, Quadro 9.1; Bewley, 1997; é essencialmente um organismo heterotrófico
Bradford et al., 2000). Em geral, a inibição da que confia na disponibilidade de energia dos te-
síntese de GAs em sementes por determinados cidos de reserva da semente. Embora geralmente
compostos químicos inibe a germinação. O considerado um evento pós-germinativo, o iní-
fitormônio ácido abscísico (ABA) tem efeito cio da mobilização desses alimentos de reserva
inibidor sobre a germinação. O ABA não impe- ocorre bem antes da protrusão da radícula.
de o enfraquecimento do endosperma em se-
mentes intactas, mesmo inibindo a expressão
de algumas enzimas hidrolíticas (Quadro 9.1; PRIMING DE SEMENTES
Chen e Bradford, 2000; Toorop, Van Aelst e O termo priming, do inglês, significa em portu-
Hilhorst, 2000; Wu et al., 2001). Parece que, guês dar início a, começar, preparar, etc. É de co-
enquanto as GAs estimulam a germinação, in- nhecimento geral que muitos eventos do pro-
duzindo o enfraquecimento do endosperma, o cesso de germinação são iniciados mesmo em
ABA inibe a germinação por meio de outro pro- conteúdos limitados de água na semente. Esse
cesso qualquer, ainda não completamente elu- conhecimento acabou sendo posto em prática
cidado (Nambara e Marion-Poll, 2003) (ver por muitas companhias de sementes com a fi-
Capítulo 6). Resultados recentes indicam que nalidade de aumentar sua qualidade (Halmer,
160 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Quadro 9.1 Algumas enzimas cujos genes foram clonados de sementes de tomate durante a
embebição, antes da protrusão da radícula, estão listados à esquerda, junto ao correspondente DNA-
complementar (cDNA). Se conhecida, é indicada a localização do tecido de expressão do gene (CAP,
cápsula do endosperma; LAT, endosperma lateral; RE, radícula do embrião; RSE, restante da semente). Se
conhecidos, são indicados também os efeitos qualitativos de GAs, ABA, potencial hídrico baixo (Baixo Ψ,
pouco negativo), luz vermelho-distante (FR) e dormência primária. Símbolos indicam: (+) promove a
expressão; (o) nenhum efeito sobre a expressão; (–) inibe a expressão; (espaço em branco) informação
indisponível

Localização Regulagem da expressão do gene


Enzima cDNA de tecido GAs ABA Baixo Ψ FR Dormência

Endo-β-mananase LeMAN2 CAP, LAT + o – o –


LeMAN1
Celulase Cel55 CAP, RE, RSE + o – – –
Poligalacturonase LeXPG1 CAP, RE o –
Arabinosidase LeARA1 CAP, LAT + o – –
Expansina LeEXP4 CAP + o – –

2000). A técnica do priming baseia-se em colo- Em geral, a fase I de absorção de água aconte-
car as sementes para embeber em uma solução cerá normalmente, uma vez que é dirigida pelo
osmótica (de polietilenoglicol ou solução sali- potencial matricial muito elevado da semente
na), na qual a hidratação acontece, mas de for- (valor real muito negativo). Entretanto, na fase
ma restrita, limitada, permitindo que alguns II, quando o Ψπ da solução osmótica é aproxi-
eventos metabólicos do processo germinativo mado ao do Ψembrião, a fase II torna-se relativa-
aconteçam sem que a germinação seja comple- mente mais extensa, de modo que a iniciação
tada (Figura 9.8; Bray, 1995; McDonald, 2000). da fase III será atrasada. Em outra situação,
quando o Ψπ da solução for mais negativo que
o Ψembrião, a fase III então não ocorrerá, sendo o
processo germinativo mantido continuamente
Conteúdo de água, (%) peso fresco

na fase II. A extensão desta permite que as se-


0 MPa
80 mentes ativem inúmeros eventos do processo
-0,5 MPa
germinativo, sem que ocorra a protrusão da radí-
60 cula ou germinação propriamente dita, incluindo
-1 MPa eventos como o reparo e a síntese de DNA (S a
40 G2). O processo de germinação não pode ser com-
pletado, na medida em que é requerida absorção
20 de água adicional para iniciar a fase III. Isso per-
mite que as sementes mais lentas “alcancem”
as mais rápidas. Nesse momento, as sementes
Tempo de embebição ainda são tolerantes à dessecação, podendo então
 Figura 9.8 ser apropriadamente secas e armazenadas sem da-
Absorção de água por sementes embebidas em água nificar o embrião e sem que tenham entrado na
(0 MPa), em uma solução osmótica com potencial fase III. Esse método de (pré-)tratamento ou de
osmótico próximo do potencial hídrico do embrião (pré-)condicionamento osmótico é chamado de
(-0,5 MPa) e em outra com potencial osmótico mais
priming (McDonald, 2000). É fato que as semen-
negativo que o potencial hídrico do embrião (-1,0
MPa), situação na qual se verifica a completa inibição tes “(pré-)iniciadas” com este método germinam
da protrusão radicular. A linha pontilhada indica a pro- mais rapidamente, de modo mais simultâneo e
trusão da radícula (no conteúdo de água de aproxima- uniforme, do que as sementes sem priming; por
damente 60%). MPa = Mega Pascal, em que 1 MPa isso, podem também ser chamadas (inconclu-
equivale a aproximadamente 10 bars. sivamente) de sementes envigoradas.
GERMINAÇÃO 161

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C A P Í T U L O 10

MOBILIZAÇÃO DE RESERVAS
Marcos S. Buckeridge
Henrique P. dos Santos
Marco Aurélio S. Tiné
Marcos P. M. Aidar

Há diversas visões possíveis para se examinar POR QUE AS SEMENTES


o fenômeno de mobilização de reservas em se- ARMAZENAM E MOBILIZAM
mentes, mas duas delas têm sido consideradas RESERVAS?
mais freqüentemente. Pode-se abordar o fenô- A resposta a essa pergunta já foi, em parte, tra-
meno do ponto de vista agronômico-biotecno- tada no Capítulo 2, que aborda o acúmulo de
lógico, em que o enfoque é mostrar os aspectos reservas. Nele foram descritas a composição e
relevantes para aplicações tecnológicas impor- a estrutura dos principais compostos de reserva
tantes em nossa economia, tais como a produ- de sementes e discutidos os prováveis mecanis-
ção e a melhoria da qualidade de alimentos ou mos evolutivos que levaram as plantas superio-
ainda o melhoramento genético de sementes res a produzir sementes. Essencialmente, as re-
de espécies cultivadas para obter melhores per- servas são armazenadas dentro e principalmen-
formances. Outra abordagem possível é aquela te ao redor de um embrião que pode apresentar
sob um ponto de vista puramente biológico, em diferentes níveis de diferenciação. Após a ma-
que tentamos compreender aspectos ecológicos, turação e o enchimento do grão, a semente seca
fisiológicos, celulares e bioquímicos dos dife- é dispersa nos ambientes naturais ou coletada
rentes processos de mobilização de reservas de e armazenada, no caso de produtos agrícolas.
sementes com o objetivo final de entender como No ambiente natural, as reservas serão uti-
a evolução moldou as diversas estratégias de lizadas como fonte de matéria e energia para a
adaptação das plantas ao seu ambiente natural. germinação e principalmente para o desenvol-
No entanto, após examinarmos uma amos- vimento de uma plântula a partir do crescimen-
tra do conteúdo de informações sobre os proces- to embrionário (Buckeridge e Reid, 1996; Buc-
sos de mobilização de reservas em sementes, keridge et al., 2000b). No caso de produtos agrí-
veremos que a aplicação ou a forma como se colas (Triticum aestivum [trigo], Zea mays [mi-
pretende utilizar os conhecimentos sobre os di- lho], Phaseolus vulgaris [feijão] e Oryza sativa [ar-
ferentes processos pode ser considerada de me- roz]), a mobilização de reservas nem chega a
nor importância, pois as descrições dos fenôme- ocorrer, pois as sementes são utilizadas para o
nos de mobilização de reservas de carboidratos, consumo ou para a confecção de produtos in-
proteínas e lipídeos continuam sendo as mes- dustrializados. É importante lembrar que, em
mas, independentemente da aplicação que se algumas aplicações, tais como a produção de
pretenda. Em outras palavras, a aplicação do bebidas alcoólicas como o uísque, a mobilização
conhecimento é relevante, mas tem papel se- das reservas de amido (ou pelo menos parte do
cundário na compreensão dos fenômenos bioló- processo) é fundamental, pois os compostos bá-
gicos em si. sicos do malte (maltose e maltodextrinas) dão
164 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

início ao processo de confecção da bebida. Por ção no Capítulo 2) que também são rapidamen-
outro lado, o consumo de produtos agrícolas te degradados para a produção de energia. Essas
depende, em muitos casos, da produção de reservas normalmente se encontram em toda a
plantas por meio de sementes e, nessa situação, semente, inclusive no embrião, e são degrada-
a mobilização de reserva é essencial para a ob- das logo após a hidratação dos tecidos (Bewley
tenção de plantas mais vigorosas. e Black, 1994) (Figura 10.1).
Tanto no caso de produções agrícolas como Não há informações precisas sobre a locali-
em ambientes naturais, a razão para as semen- zação celular desses oligossacarídeos no mo-
tes mobilizarem suas reservas é a formação de mento da reidratação da semente, mas, com
uma nova planta, e as funções principais são base em experimentos com reagentes que co-
fornecer energia e matéria para que tal processo ram açúcares em sementes de leguminosas e
ocorra. Assim, o processo de mobilização de re- de extração a partir de partes separadas das se-
servas é fator determinante do vigor da plântula mentes, pode-se especular que eles estejam nos
produzida no final do processo, e a compreen- vacúolos de praticamente todas as células de
são de aspectos relacionados aos mecanismos todos os tecidos das sementes. Dessa forma, pa-
de controle hormonal, genético e bioquímico rece haver pouca necessidade de transporte de
da mobilização nos níveis celular e ecofisioló- açúcares, uma vez que cada célula tem sua cota
gico é de importância fundamental para o ho- de reserva de sacarose e oligossacarídeos da sé-
mem no que concerne às questões tecnológicas rie rafinósica para iniciar o processo de reidra-
e ambientais que hoje se apresentam. tação, reparo de tecidos e desenvolvimento.
Com isso, é possível que a semente como um
todo apresente grande eficiência energética, re-
O PROCESSO GERAL DE parando os tecidos que possam ter sido danifi-
MOBILIZAÇÃO DE RESERVAS cados durante a secagem e possibilitando que
EM SEMENTES todos os tecidos atinjam os níveis de atividade
Apesar de existirem distintos compostos de re- metabólica necessários para sustentar o desen-
serva nas sementes, é possível visualizar a mo- volvimento do embrião. O processo de degrada-
bilização de reservas de uma forma genérica ção ocorre na presença de enzimas hidrolíticas,
(Figura 10.1). Primeiro, devem-se distinguir sendo a invertase a enzima responsável pela hi-
dois tipos de reservas: as reservas de produção drólise da sacarose e pela produção de glucose
principal de energia no início da germinação e frutose livres, e a alfa-galactosidase, a enzima
(sacarose e oligossacarídeos da série rafinósica) responsável pela hidrólise das unidades de ga-
e as reservas que são usadas pelas plântulas em lactose dos oligossacarídeos da série rafinósica.
crescimento e que servem para a transferência Na maioria dos casos, as hidrolases relaciona-
de matéria (carbono e nitrogênio, principal- das ao metabolismo desses compostos foram
mente) dos tecidos de reserva para as estruturas detectadas nas sementes quiescentes, de forma
em desenvolvimento na plântula. que devem ter sido sintetizadas ainda durante
No início da germinação, a reidratação dos a maturação.
tecidos da semente está normalmente relacio- É durante ou a partir desse ponto que tem
nada ao reparo de estruturas que podem ter início o crescimento embrionário, cujo fim é pro-
sido danificadas durante a secagem (desseca- duzir um indivíduo autotrófico. Porém, até que
mento), como membranas e ácidos nucléicos a autotrofia seja atingida, o embrião dependerá
(ver Capítulo 9). Tal processo envolve um gasto das reservas da semente (Buckeridge e Dietrich,
de energia considerável e, na grande maioria 1996; Tiné, Cortelazzo e Buckeridge, 2000). Para
dos casos, as sementes quiescentes armazenam melhor compreender essa relação entre a mobi-
entre 2 e 5% do peso seco como sacarose. Em lização de reservas, o crescimento e o desenvol-
muitos casos, sementes também acumulam oli- vimento do embrião, dividiremos didaticamente
gossacarídeos da série rafinósica (ver composi- as sementes em três classes (Figura 10.1):
GERMINAÇÃO 165

Maturação Germinação e estabelecimento da plântula

Enchimento do grão Embebição Germinação Desenvolvimento da plântula


e secagem
Imaturo-eutróficas

Síntese e mobilização de Mobilização das


reservas de C e N reservas de C e N

Fotossíntese

Formação do tecido embrionário Pós-maturação do embrião Fotossíntese


Maturo-eutróficas

Síntese de Mobilização de
Sementes

Mobilização de
reservas de C e N sacarose e série polissacarídeos

Planta
rafinósica (reservas de C e N)
Fotossíntese

Maturação do embrião Fotossíntese


Maturo-oligotróficas

Síntese de Mobilização de Mobilização de


reservas de C e N sacarose e série polissacarídeos
rafinósica (reservas de C e N)
Fotossíntese

Maturação do embrião Fotossíntese

 Figura 10.1
Esquema hipotético contendo os principais eventos da germinação e os períodos de mobilização de reservas
de espécies que adotam sistemas dos tipos imaturo-eutróficas, maturo-eutróficas e maturo-oligotróficas. O
período para a ocorrência de cada fase varia conforme a espécie. São mostrados os eventos relacionados à
maturação (fotossíntese na planta-mãe, síntese e mobilização de reservas e maturação do embrião), à germina-
ção e ao estabelecimento da plântula (pós-maturação do embrião, mobilização de reservas e fotossíntese
pela plântula formada).

w Imaturo-eutróficas: em sementes de Pal- w Maturo-eutróficas: neste caso (por exem-


mae (Phoenix dactylifera, por exemplo), o plo, Glycine max [soja], feijão e arroz),
embrião presente nas sementes quies- que compreende a maioria das sementes,
centes é uma massa indiferenciada de o embrião se apresenta com estruturas
células que se desenvolve à medida que radicular rudimentar (radícula) e foliar
as reservas são mobilizadas lenta e local- (plúmula) pré-formadas. Durante o de-
mente. Esse fenômeno é chamado de senvolvimento da plântula, o alonga-
pós-maturação (Capítulo 8). Nesses ca- mento da radícula e a expansão das fo-
sos, o desenvolvimento do eixo embrio- lhas são sustentados pela mobilização de
nário não é completado durante a ma- reservas, que, no caso das dicotiledôneas,
turação da semente, e a reserva principal podem ser armazenadas em estruturas
é o manano de parede celular (ver Capítu- especiais como o endosperma (xenófito,
lo 2), que confere dureza e proteção ao ver Capítulo 1), o perisperma ou os coti-
embrião em formação dentro da semente lédones, que são folhas especialmente
(veja detalhes a seguir). Pode-se pensar, adaptadas para armazenar reservas.
nesse caso, que uma parte do processo w Maturo-oligotróficas: há diversas se-
de maturação foi transferida para o pe- mentes (por exemplo, Caesalpinia echinata
ríodo que se chama de germinação. [pau-brasil], Inga sp. [ingá] e Piptadenia
166 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

gonoacantha [pau-jacaré]) que possuem com estratégias maturo-eutróficas, seguidas de


relativamente pouca reserva de carbono imaturo-eutróficas; sabe-se relativamente pouco
para o desenvolvimento da plântula. sobre as maturo-oligotróficas. Por isso, ao longo
Nesses casos, o embrião se encontra em do capítulo, descrevemos principalmente o que
um estágio proporcionalmente mais de- se conhece sobre os processos bioquímicos e ce-
senvolvido, e os cotilédones são mais pa- lulares em sementes dos dois primeiros tipos.
recidos com folhas, apresentando-se ver- É importante lembrar que, em todos os casos,
des, expandindo-se e iniciando rapida- as reservas de sacarose (quase sempre também
mente a fotossíntese com o desenvolvi- rafinose) e proteínas estão presentes.
mento. Espécies que adotaram essa es-
tratégia durante a evolução coincidem
com as sementes que normalmente cha- O CONTROLE DA
mamos de recalcitrantes, pois não resis- MOBILIZAÇÃO DE RESERVAS
tem ao dessecamento e têm baixa lon- Como a mobilização das reservas tem a finalida-
gevidade (Capítulo 3). Elas têm que ger- de de subsidiar o crescimento e o desenvolvi-
minar, e seus cotilédones devem estabe- mento, é essencial que os dois processos sejam
lecer a fotossíntese rapidamente, de for- sincronizados. Tal sincronismo é feito por meio
ma que a principal fonte de carbono e de um sistema de comunicação entre os tecidos
energia para o crescimento vem, em úl- que permite aumentar a eficiência do processo
tima análise, do processo fotossintético. como um todo. Porém, o sistema de controle
No entanto, como esse processo fornece não é tão rígido, e parece haver uma faixa ótima
apenas carbono, tais sementes devem de sincronismo entre a taxa de mobilização nos
apresentar reserva de proteínas e fitina tecidos de reserva e a taxa de crescimento do
para lhes fornecer nitrogênio e sais mi- embrião. Isso depende de um sistema de co-
nerais. Há indícios de que, nos sistemas municação interno entre os órgãos da semente
maturo-oligotróficos, as reservas de car- e da plântula. Os sinais, nesse caso, são quími-
bono da semente tenham sido total ou cos e normalmente envolvem os níveis inter-
parcialmente consumidas ainda duran- nos e o transporte de hormônios, carboidratos
te a maturação. Nesse caso, a maturação e compostos nitrogenados. De modo geral, a
do eixo embrionário e a formação da se- mobilização das reservas inicia a partir de um
mente ocorreriam ao mesmo tempo, ge- sinal que vem do embrião (no caso de cereais,
rando uma semente com eixo em- as giberelinas e, em leguminosas, a auxina).
brionário já bastante desenvolvido; o es- Com isso, o processo de degradação dos com-
tágio de mobilização de reservas aconte- postos de reserva tem início pela ativação da
ceria ainda no fruto imaturo, ao con- transcrição dos genes que originam as hidro-
trário do que ocorre nas imaturo-eutró- lases, a conseqüente produção e o transporte
ficas, nas quais os dois processos de ma- das enzimas até o local de ação (Bewley, 2001).
turação se dão em momentos diferentes, O metabolismo dos compostos de reserva
separados pela dessecação da semente e acaba gerando uma grande quantidade de sa-
a germinação. carose e aminoácidos no tecido de reserva, e
estes são transportados para os tecidos em cres-
Há uma imensa quantidade de variações cimento. No caso da mobilização de carboidra-
na natureza, e tal divisão é essencialmente di- tos e lipídeos, se a taxa de crescimento do em-
dática. Porém, ela serve para mostrar três das brião for compatível com a produção e o trans-
principais estratégias adotadas pelas plantas porte de sacarose nos tecidos de reserva, o
para se adaptarem ao ambiente. Há um conhe- acompanhamento da mobilização se mostrará
cimento proporcionalmente maior sobre os pro- como um processo contínuo; mas, se o desen-
cessos de mobilização de reservas em sementes volvimento da plântula for descontínuo, o pro-
GERMINAÇÃO 167

cesso de mobilização poderá ser interrompido cose1. Nesse processo, destacam-se as enzimas
de forma a evitar acúmulo de excesso de açú- α-amilase, β-amilase e amido fosforilase. Des-
cares por toda a plântula, o que aumenta os ní- tas, somente a α-amilase é capaz de atacar di-
veis de radicais livres e o consumo de energia retamente os grânulos de amido, o que a carac-
para manter os tecidos vivos. Em alguns casos teriza como a primeira enzima no processo de
em que o desenvolvimento da plântula leva degradação do amido (Figura 10.2). A α-ami-
vários dias, a mobilização de reservas pode apre- lase é uma endoenzima que hidrolisa aleato-
sentar sincronismo com a fotossíntese durante riamente as ligações α-(1,4), ao longo dos po-
o estabelecimento nas folhas em expansão. límeros de amilose e amilopectina (Manners,
Aparentemente, o controle dos níveis endóge- 1985), liberando maltose e moléculas maiores
nos de açúcares nas plântulas em desenvolvi- contendo ligações α-(1,6), as dextrinas (Figura
mento é importante, pois sabe-se que, se o pro- 10.2).
cesso de desenvolvimento for interrompido ou A β-amilase é uma exoglucanase que ataca
modificado pela excisão da alguma parte im- somente os terminais não-redutores dos consti-
portante da plântula, verifica-se um acúmulo tuintes do amido, liberando moléculas de mal-
de amido transitório em tecidos, o que acar- tose (Figura 10.2). As β-amilases são capazes
reta uma diminuição drástica nos níveis inter- de hidrolisar completamente os polímeros ou
nos de sacarose (Buckeridge et al., 2000b). Sa- fragmentos de amilose. Em contrapartida, a
be-se muito pouco sobre a existência de um sis- amilopectina só pode ser digerida parcialmente,
tema de controle análogo para os aminoácidos pois as ligações α-(1,6) não são atacadas, o que
oriundos da mobilização de reservas de proteí- também resulta na liberação de dextrinas.
nas, mas é muito provável que tal sistema exista As moléculas de maltose liberadas pelas
e controle a distribuição dos compostos ni- amilases raramente se acumulam durante a de-
trogenados na plântula em desenvolvimento. gradação do amido. Isso se deve à ação hidrolí-
O mecanismo descrito é bastante similar tica da enzima maltase, uma α-glucosidase que
ao que ocorre com as reservas na planta adulta, libera duas moléculas de α-D-glucose como
e é possível especular que, do ponto de vista produtos de sua reação (Figura 10.2).
fisiológico, a plântula estabelece durante o seu A amido fosforilase é uma exoglucanase
desenvolvimento um sistema homeostático mui- que degrada o amido pela liberação de glucose-
to similar ao que irá operar na planta adulta. 1-fosfato (G-1-P) a partir dos terminais não-
A seguir, serão descritos e discutidos os me- redutores (Figura 10.2). Essa é uma enzima
canismos de mobilização de alguns dos princi- “fosforolítica”, e a reação pode ser reversível in
pais compostos de reservas em sementes. Neste vitro. Apesar dessa possível reversibilidade, a ati-
capítulo, serão usados exemplos de compostos vidade catalítica tende a ser a mais relevante,
mais conhecidos e que são acumulados em pois, dentro dos plastídeos, a concentração de
grandes quantidades. Para maior aprofunda- Pi (H2PO4) tende a ser 100 vezes maior do que
mento, indicam-se artigos, trabalhos de revisão
e outros livros e capítulos que abordam os diver-
sos assuntos de forma mais detalhada. 1
Neste capítulo, a nomenclatura dos carboidratos (principalmente
dos polissacarídeos) será utilizada de forma a facilitar a compreen-
são e agilizar a distinção entre compostos similares. Em vez de
glicose, será utilizado o termo glucose. Isso visa distinguir termos
BIOQUÍMICA DA como glicosídeos (uma aglicona ligada a um açúcar qualquer) de
DEGRADAÇÃO DE AMIDO glucosídeos (uma aglicona ligada a uma molécula de glucose). Esta
designação permite utilizar o termo geral glicano(s) para polissa-
Para que o amido de reserva seja degradado e carídeos compostos de qualquer mistura de monossacarídeos, ao
passível de utilização pelo metabolismo, é ne- contrário do termo glucanos, que será usado para designar polis-
sacarídeos compostos inteira ou predominantemente por moléculas
cessário que os grânulos sejam desmembrados de glucose, tais como a celulose, o amido, os glucanos de ligação
em estruturas menores, como a maltose e a glu- mista ou os xiloglucanos.
168 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

1 1

GCLL GCLR
2

2
1
1 1 3 4
GCCL
CH2OH CH2OH CH2OH CH2OH
O O O O
CH2OH CH2OH
4 O O O OH O O
CH2OH CH2OH
O O 2 O
1 CH2OH CH2OH
O O O OH
O OH
6 CH2
CH2OH CH2OH CH2OH
a-maltose
O

3 4 O O O O
b-maltose
4 O O O OH
CH2OH
O
5 Dextrinas
CH2OH CH2OH oP 5
CH2OH O O OH
O

oP
O Glc-1-P
CH2OH b-maltose
O
Glc-1-P CH2OH
O
OH
OH
Glc 5
Glc

CH2OH
O

OH

Glc

 Figura 10.2
Representação esquemática da degradação de amido, enfocando os pontos de ação das respectivas enzimas
e os seus substratos preferenciais. A, grânulo de amido; GCLL, glucano de cadeia longa linear; GCLR, glucano
de cadeia longa ramificada; GCCL, glucano de cadeia curta linear; Glc, glucose; Glc-1-P, glucose 1-fosfato. (1)
α-amilase; (2) enzimas desramificadoras; (3) amido fosforilase; (4) β-amilase; (5) α-glucosidases.

a concentração de G-1-P, o que força a reação pululanase, isoamilase e dextrinase (Manners,


no sentido da degradação do amido. Assim co- 1985). A ação dessas enzimas sobre as ramifica-
mo ocorre com as amilases, a amido fosforilase ções α-(1,6) do amido proporciona a liberação
apresenta grande afinidade pelos polímeros de de finais redutores, que são facilmente acessados
amilose, mas também não é capaz de quebrar pelas exoenzimas (β-amilase e amido fosforila-
as ligações α-(1,6) das amilopectinas. se), resultando na degradação total dos grânulos
Na seqüência catalítica do amido, desta- de amido em maltose, glucose ou glucose-1-P.
cam-se também as enzimas desramificadoras, Em contraste a outros tecidos, as reservas
as quais atacam as ligações α-(1,6), transfor- de endosperma estão depositadas em células
mando as amilopectinas e as dextrinas em ami- mortas, em gramíneas. Portanto, exigem a cola-
loses com pequenas cadeias de glucose (Figura boração de tecidos adjacentes para que a mo-
10.2). As plantas contêm três tipos de enzimas bilização das reservas de amido possa ocorrer.
desramificadoras, que diferem em relação aos No endosperma, a ausência de detecção das en-
tipos de polímeros que são capazes de atacar: zimas necessárias para a degradação pode ser
GERMINAÇÃO 169

explicada de três modos: (1) não estão presen- ocorrer o predomínio funcional de um tecido
tes; (2) estão inativas; ou (3) estão ligadas aos sobre outro (Halmer, 1985). A indução da sín-
grânulos de amido e, conseqüentemente, sem tese de novo nesses tecidos está relacionada,
atividade. Além disso, as reservas de amido no principalmente, com a disponibilidade de áci-
endosperma são degradadas exclusivamente do giberélico (GA, Figura 10.3A). Esse hormô-
por reações hidrolíticas, principalmente pelo fa- nio é produzido pelo eixo embrionário e difun-
to de que o principal produto da degradação dido até o escutelo e a camada de aleurona,
dos constituintes do amido é a maltose, e não a onde atua como um ativador primário na casca-
glucose-1-P (Beck e Ziegler, 1989). Sendo assim, ta de sinais, que culmina com a indução de um
as amilases, as desramificadoras e as maltases fator de transcrição (o GAMyb) e a expressão
ou α-glucosidases são as principais enzimas do gênica das enzimas amilolíticas (Jacobsen e
processo de degradação em cereais. Beach, 1985; Ueguchi-Tanaka et al., 2000). Re-
As α-amilases, com algumas poucas exce- centemente, observou-se em sementes de ceva-
ções, não estão presentes nas sementes dor- da que a tiorredoxina h, uma proteína de 12
mentes e quiescentes de cereais. Desse modo, kDa, é capaz de coordenar esse fornecimento
é necessário que essas enzimas sejam sintetiza- de GA pelos tecidos do embrião logo após a em-
das de novo em tecidos por células vidas e se- bebição (Wong et al., 2002).
cretadas para o endosperma (Figura 10.3A) du- O ácido abscísico (ABA) também tem sido
rante a germinação. demonstrado como um importante fator no
Dentre os tecidos que desempenham tal controle da síntese de novo da α-amilase, sendo
função, destacam-se o escutelo e a camada de capaz de inibir os efeitos de GA no nível de
aleurona, podendo, em algumas espécies, transcrição gênica (Jacobsen, Gubler e Chadler,

A B
H+ Ale
Cot

Amido
4
End
(+) Amido
2
1
Glc
1
Glc-P
2 Th
5 Sac Esc Emb
(+) Sac
5
2 3
(+) 1 1
2 Emb 1
2
(+) 5
Crescimento

GA

 Figura 10.3
Representação esquemática do metabolismo de degradação de amido em monocotiledôneas (A) e dicotile-
dôneas (B).  α-amilase;  enzimas desramificadoras;  amido fosforilase;  β-amilase;  α-glucosidases;
 proteases e  β-glucanases. GA, ácido giberélico; Th, tiorredoxina h; Glc, glucose; Sac, sacarose; H+,
prótons de hidrogênio; Ale, camada de aleurona; End, endosperma; Esc, escutelo; Emb, embrião; Cot, coti-
lédones. (+) ativação. Detalhes no texto.
170 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

1995). Além disso, o ABA pode afetar a estabi- Contudo, embora os níveis de β-amilase sejam
lidade dos mRNAs de α-amilase e, conseqüen- relativamente altos durante a germinação dos
temente, reduzir a produção da enzima. Recen- cereais, e a sua função na degradação de mal-
temente, em Hordeum vulgare L. (cevada), foi tose seja bem evidente, ainda existem contro-
observado que o ABA bloqueia a cascata de si- vérsias sobre a sua real importância, e ela é
nais, ativada por GA, antes da formação do fa- considerada até como uma reserva de proteína.
tor de transcrição GAMyb, por meio de uma Em sementes de Oryza sativa L. (arroz), du-
proteína quinase que é induzida por ABA, a rante a germinação, observa-se uma alta ativi-
PKABA1 (Zentella, Yamauchi e Ho, 2002). dade de uma enzima desramificadora (pulula-
Como conseqüência dessa inibição, a trans- nase) que, por sua vez, é formada durante a
crição gênica das enzimas hidrolíticas não ocor- maturação das sementes (Yamada, 1981). Essa
re e paralisa a degradação. Apesar do grande enzima é depositada na forma inativa, sendo
avanço na compreensão do controle hormonal, liberada e ativada por proteases durante a germi-
deve-se ter cautela em generalizações, pois exis- nação. Essa ativação de formas insolúveis de
tem outros controles que precisam ser consi- pululanases também foi observada em outros
derados e podem ser relevantes no catabolismo cereais, tais como Avena sativa L. (aveia), Triti-
de reserva em certas espécies. cum aestivum L. (trigo), Hordeum vulgare L. (ceva-
Outro ponto de controle na degradação do da) e Secale cereale L. (centeio). Em contraparti-
amido é a secreção das enzimas dos tecidos vi- da, as demais enzimas desramificadoras e as
vos adjacentes para o endosperma. Estudos com α-glucosidades são sintetizadas de novo e secre-
imunofluorescência e marcação com ouro co- tadas, principalmente da camada de aleurona,
loidal (Beck e Ziegler, 1989) demonstraram que em conjunto com a α-amilase e em resposta à
a secreção de α-amilase e de outras enzimas disponibilidade de GA (Figura 10.3A).
ocorre inicialmente por vesículas do complexo Durante a degradação do amido, ainda po-
de Golgi, liberando as enzimas para fora das de ocorrer a regulação enzimática pelo acúmu-
células (apoplasto) da camada de aleurona ou lo do produto final, como a maltose e/ou a glu-
escutelo. Uma vez formadas e no apoplasto, as cose (Figura 10.3A). Em cevada, foi demons-
enzimas são conduzidas até os grânulos de ami- trado que a maltose pode inibir a habilidade
do, no endosperma, pela ação conjunta de pro- que a α-amilase tem de se ligar aos grânulos
teases e β-glucanases, as quais irão abrir cami- de amido (Weselake e Hill, 1983). Em cotilé-
nhos degradando paredes celulares, membra- dones de Glycine max L. (soja), também se obser-
nas e complexos protéicos (Figura 10.3A). Du- vou que a glucose e principalmente a maltose
rante essa etapa de secreção, a disponibilidade inibem a atividade de β-amilase, pois esses açú-
de cálcio torna-se importante, pois pode propor- cares se ligam ao sítio catalítico da enzima
cionar uma regulação diferencial na produção (Nomura, Mikami e Morita, 1986). Nesse con-
de isoenzimas de α-amilase, no transporte in- texto, as α-glucosidases são consideradas
tracelular e na liberação dessas enzimas no en- enzimas de “ativação” ou de ação sinérgica com
dosperma (Akazawa e Hara-Nishimura, 1985). as amilases, pois podem tanto degradar a mal-
Ao contrário das demais enzimas, a β-ami- tose quanto atacar diretamente os grânulos na-
lase pré-formada encontra-se depositada nos tivos de amido (Sun e Henson, 1990).
tecidos dormentes das sementes, nas formas Em sementes de muitos cereais, também
livre e ligada (ou latente) às reservas protéicas tem sido observada a presença de proteínas ini-
(Beck e Ziegler, 1989). As formas livres são ati- bidoras de α-amilase, sendo estas ativas princi-
vas e podem ser importantes nas primeiras eta- palmente contra as enzimas endógenas para
pas do processo de degradação de amido, en- evitar a degradação precoce e inapropriada das
quanto as formas ligadas de β-amilase necessi- reservas de amido. Dentre essas proteínas ini-
tam da ação de enzimas proteolíticas (protea- bidoras, a melhor caracterizada é a proteína bi-
ses) para tornarem-se ativas (Figura 10.3A). funcional α-amilase/subtilisina de sementes de
GERMINAÇÃO 171

cevada, mas outros cereais possuem proteínas Apesar de isso ser uma especulação, pode ser
análogas (Beck e Ziegler, 1989). coerente no controle metabólico de reservas em
O processo de degradação do amido no en- cotilédones que se tornam fotossintéticos e que
dosperma de cereais é um dos mais conhecidos necessitam de grandes quantidades de energia
do ponto de vista bioquímico e molecular. En- durante a transição heterotrófica-autotrófica.
tretanto, esse sistema não serve como modelo Estudos recentes também têm demonstra-
para o mesmo processo em tecidos vivos, tal do a importância da enzima desproporciona-
como ocorre em cotilédones de dicotiledôneas. dora (ou enzima-D), a qual catalisa a transfe-
Nos tecidos vivos, a degradação do amido e a rência de oligossacarídeos de glucose (com liga-
síntese de sacarose ocorrem na mesma célula, ções α-1,4) por meio dos finais redutores de am-
exigindo um controle integrado e ainda mais bas as cadeias, ou seja, é uma enzima glucano-
preciso. Nesse panorama, as particularidades e transferase (Smith et al., 2003). Dentre as pro-
as complexidades aumentam, o que impede as váveis funções que essa enzima poderia apre-
generalizações desses processos em células vi- sentar, destacam-se duas especulações, as quais
vas. Apesar disso, é possível caracterizar as pos- podem também estar presentes no metabolis-
síveis rotas de degradação do amido em mo do amido em cotilédones. Primeiro, essa en-
plastídeos de células vivas, como em coti- zima pode auxiliar na degradação do amido,
lédones, levando-se em conta o conhecimento produzindo glucanos de cadeias longas a partir
sobre as propriedades catalíticas das enzimas de maltotrioses, que podem ser resíduos da ação
que atuam nesse processo (Figura 10.3B). catalítica de outras enzimas e, por sua vez, não
É possível que os sistemas presentes em são degradadas pelas enzimas β-amilase e ami-
mono e dicotiledôneas difiram principalmente do fosforilase. Estas enzimas atuam preferen-
no acoplamento com o metabolismo de saca- cialmente sobre substratos maiores do que mal-
rose. Enquanto, nos cereais, a função de degra- totrioses e, portanto, são beneficiadas pela ação
dar as reservas de amido foi transferida exclusi- das enzimas-D (Takaha et al., 1993). A segunda
vamente para o endosperma, que não é vivo, função seria na síntese de amido, na qual as
nas dicotiledôneas, representadas principal- enzimas-D podem contribuir na formação e na
mente por leguminosas, o sistema de mobili- aglomeração dos constituintes dos grânulos de
zação de amido permaneceu acoplado ao meta- amido, em conjunto com as enzimas desrami-
bolismo de sacarose e, evolutivamente, mais ficadoras (Myers et al., 2000).
próximo ao que ocorre em folhas. Nos cotilédones, a degradação das reservas
No metabolismo de amido em cotilédones, também se apresenta como um processo orde-
há uma tendência de acúmulo de glucose-1-P nado espacialmente, sendo que o início tende
ou trioses-P, como produtos finais da degrada- a ser sempre nas células próximas aos feixes
ção (Beck e Ziegler, 1989). Isso salienta a ativi- vasculares (Bewley e Black, 1994). Essa ordena-
dade da enzima amido fosforilase na degrada- ção na degradação tem sido relacionada aos
ção do amido nesses tecidos, em relação às hi- processos de morte programada de tecidos ve-
drolases, como no endosperma de cereais. En- getais (Pennell e Lamb, 1997), uma vez que os
tretanto, tem-se observado a necessidade da cotilédones mudam gradativamente do estado
ação conjunta de uma α-amilase para que possa vegetativo para o estado de senescência durante
ocorrer a degradação completa pela enzima a germinação e o crescimento inicial da plân-
amido fosforilase (Smith et al., 2003). Além dis- tula. A senescência em plantas é um processo
so, existe a hipótese de que, em tecidos vivos, controlado geneticamente e envolve o turnover
as ações de hidrolases e amido fosforilases de- ativo e a recaptura dos materiais celulares para
finam, respectivamente, o direcionamento dos utilização em outros tecidos (Mohr e Schopfer,
produtos de degradação do amido para a síntese 1995). Nesse processo, é comum o desenvolvi-
de sacarose (exportada) ou para o metabolismo mento de vacúolos líticos (com pH ácido e rico
respiratório da própria célula (Stitt et al., 1985). em proteinases, glicosidases, fosfatases e nu-
172 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

cleases), os quais desempenham uma mobili- POLISSACARÍDEOS DE


zação controlada dos constituintes celulares RESERVA DE PAREDE
(por autofagia), antes que ocorra o rompimento CELULAR
do seu tonoplasto e a degradação generalizada Os polissacarídeos de reserva de parede celular
e sem controle específico (autólise), que coinci- (PRPC) são classificados em três grupos distin-
de com a morte celular. Em cotilédones de Vigna tos: os mananos, os xiloglucanos e os (arabi-
mungo L., foi observado que a degradação dos no)galactanos (Buckeridge e Reid, 1996). Essa
grânulos de amido é realizada pela autofagia classificação baseia-se essencialmente na estru-
dessas estruturas de reserva por vacúolos líticos, tura química desses polímeros, sendo os ma-
ricos em α-amilases, que são formados durante nanos subdivididos em: mananos puros, glu-
a germinação das sementes (Toyooka, Okamoto comananos e galactomananos (Quadro 10.1).
e Minamikawa, 2001). Esse tipo de mobilização Os modelos mais recentes de parede celular
se apresentou relacionado com o processo de propõem que esta seja formada de três domí-
senescência dos cotilédones e estreitamente co- nios independentes (celulose-hemicelulose,
ordenado pelo eixo embrionário, uma vez que pectinas e proteínas). Nesses modelos, os três
os cotilédones isolados não foram capazes de domínios formam um compósito com caracte-
produzir os vacúolos líticos e, conseqüentemen- rísticas semelhantes a um cristal líquido. Na
te, degradar os grânulos de amido. Esses pro- Figura 10.4 estão representados modelos de pa-
cessos ocorrem possivelmente em cotilédones rede celular. Neles, a parede é vista em corte
de outras espécies e podem ser a explicação da transversal como um compósito de polímeros
localização extraplastidial de isoenzimas, que em que as microfibrilas de celulose são envol-
são relacionadas com a degradação das reservas vidas por hemiceluloses, e a rede se interliga
de amido (Beck e Ziegler, 1989). por esses polímeros. Esse domínio está imerso

Quadro 10.1 Algumas das características dos principais polissacarídeos de reserva de parede celular
(adaptado de Buckeridge et al., 2000b)

Polissacarídeo Açúcar na Açúcares nas Hidrolases envolvidas Ocorrência


cadeia principal ramificações na mobilização em sementes

Manano Manose Ocasionalmente Endo-β-mananase Palmae, café, gergelim


galactose
Glucomanano Manose e glucose Ocasionalmente Endo-β-mananase Alface, tomate
galactose Endo-β-glucanase
α-galactosidase
Galactomanano Manose Galactose Endo-β-mananase Leguminosae,
α-galactosidase Convolvulaceae,
Exo-β-mananase Annonaceae
Xiloglucano Glucose Xilose, galactose, Xiloglucano endo Leguminosae,
fucose, arabinose Transglicosilase (XET), Tropaeolaceae,
β-galactosidase, Myrcinaceae
α-xilosidase,
β-glucosidase,
α-fucosidase
Glucanos de Glucose Não há Endo-β-glucanase e Apenas em cereais
ligação mista β-glucosidase
(β-glucanos)
(Arabino) Galactose Arabinose Exo-galactanase, Leguminosae,
galactano α-arabinosidase Vochysiaceae, café
GERMINAÇÃO 173

A B

Ligação cruzada Microfibrila

Domínio
de
pectinas Hemicelulose Hemicelulose
fortemente ligada fracamente ligada
à celulose à celulose

Lamela Parede Membrana


média celular plasmática

Parede de reserva
característica de
arabinogalactanos
presentes em
sementes de
lupino e café

Parede primária Parede de reserva


com pectinas

Parede de reserva
característica de
mananos,
galactomananos,
glucomananos,
xiloglucanos e
beta-glucanos

Parede primária Parede de reserva


com hemicelulose

 Figura 10.4
Representação esquemática da parede celular primária (A) em corte transversal. As microfibrilas de celulose
estão cobertas por hemiceluloses (xiloglucanos, arabinoxilanos ou mananos) que podem estar forte ou fraca-
mente ligadas à celulose (B). O domínio celulose-hemicelulose está embebido em um domínio péctico (A).
Em C está representada a parede de reserva cujo polímero acumulado é derivado das pectinas (arabinoga-
lactanos em sementes de lupino e de café). Nesse caso, é possível que ainda existam algumas microfibrilas e
hemiceluloses embebidas por grande quantidade de polissacarídeos pécticos. Em D estão representadas as
paredes cujo polímero de reserva é o galactomanano ou o xiloglucano. Essas representações assumem que
as “amplificações” de hemiceluloses ou pectinas ainda possuem algumas microfibrilas juntamente com pe-
quenas quantidades de outros polissacarídeos típicos da parede celular. Adaptada de Buckeridge e colaborado-
res (2000b).
174 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

em uma matriz de polissacarídeos pécticos, a Nas sementes de Phoenix dactylifera, um pe-


qual “cimenta” todo o sistema. queno “embrião” de forma cônica se desenvolve
Os PRPC podem ser vistos como variações des- lentamente. Seu cotilédone é transformado em
se modelo (Figuras 10.4C e D), em que um domí- um haustório, o qual absorve os produtos de
nio ou um de seus polissacarídeos tenha sido de- degradação das reservas do endosperma duran-
positado em maior quantidade em relação aos de- te a germinação. Nessas sementes, uma endo-
mais (Buckeridge et al., 2000a). Os arabinoga- β-mananase e uma β-manosidase foram detec-
lactanos são depósitos de polímeros derivados das tadas na zona de dissolução próxima ao haus-
pectinas, enquanto os mananos e os xiloglucanos tório. As enzimas são produzidas no endosper-
são depósitos de polímeros de hemicelulose (Fi- ma, mas suas células necessitam de um sinal
guras 10.4C e D, respectivamente). proveniente deste.
Em muitos casos, o processo de deposição Mananos já foram detectados em sementes
dos PRPC parece ser derivado do metabolismo de espécies como pimenta, aipo, tomate, alface
de biossíntese da parede celular primária (Capí- e café, sendo que, em todas elas, foi observada
tulo 2). Com base nisso, é possível propor que a presença de atividade de endo-β-mananase
eles tenham surgido ou por diminuição na sín- como enzima de degradação. Essas espécies
tese de celulose ou por síntese de hemiceluloses apresentam endospermas menos espessos em
em maior intensidade do que os polissacarídeos relação às palmeiras, e essa presença tem sido
dos demais domínios. Ainda não está claro se correlacionada com a restrição mecânica para
a celulose permanece nos depósitos de reserva a protrusão da radícula. Na maioria dos casos,
da parede celular, mas há fortes indícios de que a degradação do manano pode ser induzida por
isso ocorre, pois, em alguns casos, já foi obser- ácido giberélico, que promove a germinação, e,
vado que materiais fibrosos se tornaram apa- em alguns, inibida por ácido abscísico.
rentes após a mobilização do polímero de reser- Uma demonstração direta de que os ma-
va. É certo, no entanto, que a proporção de celu- nanos estão relacionados com a dureza do en-
lose é muito pequena, e isso pode facilitar o dosperma foi obtida pela observação de que os
processo de mobilização, o qual seria considera- mananos presentes na região endospérmica
velmente mais complexo se proporções “nor- próxima à extremidade da raiz de tomate exer-
mais” de celulose estivessem presentes. cem papel crucial na protrusão da radícula. Já
foi demonstrado que o amolecimento do en-
Ocorrência, estrutura e dosperma, induzido pela adição de giberelina
metabolismo dos PRPC e reversível pela adição de ABA, facilitou a ger-
minação. Paralelamente, outros autores afir-
Mananos mam que os mananos presentes em endosper-
Os mananos puros são artificialmente defi- ma de sementes de tomate e de café são com-
nidos como contendo mais de 90% de manose pletamente degradados após a germinação, o
formando uma cadeia linear do tipo β-1,4 sem que os caracteriza como compostos de reserva.
ramificações, podendo ou não o restante estar As observações anteriores sobre os mana-
ramificado com galactose (Buckeridge et al., nos de mono e dicotiledôneas, exceto legumi-
2000a). Assim, os mananos são estruturalmen- nosas, sugerem que esse polímero seja uma mo-
te relacionados aos galactomananos, os quais lécula bifuncional. O manano, nesse caso, exer-
apresentam alto grau de interatividade inter- ceria as funções de constritor e protetor mecâni-
molecular, formando cristais na parede celular, co do embrião e também de polissacarídeo de
o que confere dureza e diminui sua solubilida- reserva.
de. Os mananos são encontrados em endosper-
mas de sementes de espécies de monocotile- Galactomananos
dôneas (Phoenyx dactylifera e Phytelephas macro- Embora muitas espécies tenham sido rela-
carpa) e dicotiledôneas (Coffea arabica – café). tadas como acumuladoras de galactomanano
GERMINAÇÃO 175

em suas sementes, apenas algumas delas tive- no endosperma. O fornecimento de manose e


ram seu metabolismo pós-germinativo estuda- galactose marcadas radioativamente a embriões
do em detalhe (Buckeridge et al., 2000a). de C. tetragonolobus em crescimento demonstrou
Dentre as leguminosas, as espécies mais estu- que os produtos da mobilização do galactoma-
dadas são Cyamopsis tetragonolobus (cujo galac- nano são usados em vários processos bioquí-
tomanano é conhecido comercialmente como micos durante o crescimento da plântula.
goma guar), Trigonella foenum-graecum e Cerato- Em todas as espécies de leguminosas estu-
nia siliqua (que produz a goma caroba). dadas, a mobilização do galactomanano inicia
Nas sementes de T. foenum-graecum e C. te- após a germinação (protrusão da radícula). Foi
tragonolobus, as células endospérmicas não são demonstrado que, em endospermas de semen-
vivas, sendo que, durante a maturação, o cito- tes de Trigonella foenum-graecum e Ceratonia sili-
plasma é reduzido em função da deposição ma- qua, as enzimas endo-β-mananase, para a pri-
ciça do galactomanano nas paredes celulares. meira espécie, e α-galactosidase, para ambas
Essas sementes apresentam uma camada de as espécies, são sintetizadas de novo. Esses fatos
aleurona, a qual acredita-se ser responsável pela levaram à sugestão de que a mobilização é in-
produção das enzimas hidrolíticas que promo- duzida durante ou após a germinação por al-
vem a degradação dos polissacarídeos de reser- gum fator.
va da parede celular durante a germinação. Por Até o momento, as poucas tentativas de in-
outro lado, em sementes de Ceratonia siliqua, as duzir a degradação de galactomananos em Le-
células endospérmicas são vivas, e o galacto- guminosae utilizando ácido giberélico falha-
manano pode ser visto como um espessamento ram, o que sugere que os sistemas das legumi-
da parede. Nesse caso, não há uma distinção nosas têm um controle metabólico diferente
clara entre o endosperma e a camada de aleu- quando comparados com as sementes que ar-
rona, e as enzimas são provavelmente produzi- mazenam mananos. Por outro lado, o ácido jas-
das e liberadas dentro da parede celular pelas mônico e seu precursor, o ácido linolênico, são
próprias células endospérmicas. capazes de inibir a degradação do galactoma-
A mobilização de galactomananos foi estu- nano em C. siliqua e T. foenum-graecum.
dada em outras espécies de leguminosas, sendo O ácido abscísico é um potente inibidor da
detectada a presença de três enzimas hidrolíti- degradação do galactomanano em T. foenum-
cas (α-galactosidase, endo-β-mananase e β- graecum, C. siliqua e Sesbania marginata. É possí-
manosidase), confirmando que a mobilização vel especular que o ABA tenha um papel geral
do galactomanano ocorre por meio da hidrólise. (em leguminosas e não-leguminosas) como um
Em todos os casos estudados, o polissacarídeo modulador das interações bioquímicas e fisioló-
é degradado até seus monossacarídeos consti- gicas entre o endosperma e o embrião durante a
tuintes (manose e galactose) ao mesmo tempo germinação e o crescimento inicial da plântula.
em que há produção de sacarose (Figura 10.5). A presença do ABA inibe a degradação do ga-
Aparentemente, a sacarose é o açúcar de trans- lactomanano, e somente quando o hormônio é
porte que levará os produtos da mobilização da degradado e metabolizado a transferência de car-
reserva até o embrião em crescimento. Paralela- bono e energia entre os órgãos pode ser iniciada.
mente à degradação de galactomanano no en- Além do papel de reserva, o galactomanano
dosperma, o amido é produzido transitoriamen- influencia o fluxo de água devido a sua maior
te nos cotilédones (Figura 10.5). Estudos sobre solubilidade nos primeiros estágios da germina-
o destino dos produtos da mobilização do galac- ção. Esse polissacarídeo absorve, proporcional-
tomanano de C. tetragonolobus revelaram a pre- mente, grande quantidade de água e a distribui
sença de atividade das enzimas fosfomanoiso- ao redor do embrião. Os endospermas embebi-
merase e fosfoglucoisomerase, que seriam res- dos protegem o embrião contra a perda de água
ponsáveis pela epimerização da manose em glu- por meio de um efeito conhecido como “tampão
cose; esta seria usada na síntese de sacarose de água” durante períodos de seca pós-embe-
176 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Hormônio
ativador

Órgãos-dreno
Núcleo

PAREDE CELULAR
mRNA
Polissacarídeos

Retículo
Hidrolases endoplasmático

Sacarose
Monossacarídeos

Monossacarídeos Amido

 Figura 10.5
Esquema geral contendo as reações envolvidas na hidrólise de reservas de parede celular. Normalmente, a
hidrólise apresenta controles em vários níveis, mas os órgãos em desenvolvimento podem produzir hormônios
que intensificam a transcrição dos genes que codificam para as hidrolases de parede celular. As hidrolases
são secretadas para a parede, onde hidrolisam os polissacarídeos aos seus monossacarídeos constituintes.
Estes são internalizados e, no interior da célula, são metabolizados à sacarose, que é transportada para os
órgãos em crescimento. Parte dessa sacarose também pode ser utilizada para consumo energético da pró-
pria célula do tecido de reserva (não-indicado).

bição. Outras leguminosas tropicais (Dimor- quenas de galactomanano), mas nenhum estu-
phandra mollis e Sesbania marginata) apresentam do nesse sentido foi realizado. Experimentos
um comportamento similar. desse tipo seriam importantes para a compre-
As funções de reserva e embebição parecem ensão das funções ecológicas do galactomanano
estar associadas quase que exclusivamente às na germinação das sementes e no crescimento
leguminosas, ao passo que, em espécies não- da plântula, bem como do mecanismo de sele-
leguminosas, é mais evidente a função de dure- ção desempenhado durante a evolução que le-
za e proteção do embrião. No entanto, é possível vou a esses tipos de adaptações.
que a função de dureza esteja ainda preservada O grau de ramificação dos mananos define
em leguminosas (sementes de soja, por exem- suas relações estrutura-função. Quanto menos
plo, armazenam quantidades relativamente pe- ramificado, maior a indicação de que a função
GERMINAÇÃO 177

biológica está relacionada com a dureza e a pro- zindo o polímero aos seus monossacarídeos
teção do embrião. Isso pode ser visto claramen- constituintes.
te em Arecaeae. Por outro lado, quanto maior Em sementes de duas populações diferen-
o grau de ramificação, mais solúvel o polissa- tes de copaíba, originárias de Mata Atlântica e
carídeo e maior a participação deste em funções Cerrado, não foram encontradas diferenças sig-
como a manutenção das relações hídricas. No nificativas na velocidade de mobilização de xi-
entanto, não se sabe ao certo qual dessas funções loglucano entre as duas populações. Em todas
é a primária: reserva, dureza ou relações hídricas. as espécies estudadas, observou-se que o xilo-
É certo, por outro lado, que os mananos e os glucano é mobilizado após a germinação e, ao
galactomananos são moléculas multifuncionais, mesmo tempo, há a produção de frutose, glu-
desempenhando suas funções durante fases dis- cose e sacarose (Figura 10.5).
tintas do crescimento e do desenvolvimento das De forma similar ao amido, o controle da
plantas. Como isso pode ter ocorrido durante a mobilização também pode ser feito no nível da
evolução será discutido posteriormente. bioquímica da degradação. Em jatobá e copaíba,
a β-galactosidase do sistema tem pH ótimo em
Xiloglucanos 3,2, enquanto as demais hidrolases de xiloglu-
Xiloglucanos de sementes apresentam uma cano são ativas em pH 4,5. Essas enzimas são
cadeia principal de β-D-(1→4)-glucano rami- um importante ponto de controle do metabo-
ficada com ligações α-(1→6) por resíduos de lismo de xiloglucanos, pois, em todos os estudos
D-xilopiranosídeos ou β-D-galactopiranosídeo- efetuados, nenhuma β-galactosidase livre de
(1→2)-D-xilopiranosídeos. Exceto pela ausên- atividade de endo-glucanase apresentou ativi-
cia de terminais fucosil ligados [α-L-(1→2)] dade sobre o polímero, hidrolisando apenas os
nos grupos β-D-galactosídeos, existe uma gran- oligossacarídeos (Alcântara, Dietrich e Bucke-
de semelhança entre xiloglucanos de reserva ridge, 1999).
(em sementes) e xiloglucanos estruturais de pa- Assim, o controle da desmontagem do xi-
redes primárias em tecidos vegetativos de di- loglucano na parede é exercido por mudanças
cotiledôneas. no pH da parede e com base na diferença de
A função de reserva dos xiloglucanos em co- pH ótimo das enzimas. Quanto ao nível hor-
tilédones foi demonstrada de forma circunstan- monal, o controle da mobilização de xilogluca-
cial em sementes de Tropaeolum majus (capuchi- no em cotilédones é feito por auxinas. Os coti-
nho), Tamarindus indica (tamarindo), Copaifera lédones tornam-se receptivos ao hormônio so-
langsdorffii (copaíba) e Hymenaea courbaril mente dentro de um certo período, sendo pro-
(jatobá), nas quais a mobilização de xiloglucano vável que a auxina module as relações entre o
in vivo foi acompanhada pelo incremento e pela crescimento da plântula e a mobilização das re-
queda da atividade de quatro hidrolases: β- servas dos cotilédones. Em jatobá, a mobiliza-
galactosidase, endo-β-(1→4)-glucanase (ou ção do xiloglucano está sob o controle da auxina
xiloglucano endo transglicosilase – XET), α- produzida na parte aérea da plântula em desen-
xilosidase e β-glucosidase. volvimento. A mobilização nos cotilédones ocor-
A XET e a β-galactosidase são as únicas en- re predominantemente à noite, pois, durante o
zimas capazes de atacar o polímero. Sob baixas dia, a principal fonte de carbono é proveniente
concentrações de oligossacarídeos de xiloglu- da fotossíntese das folhas em expansão.
cano (receptores), a atividade hidrolítica da Embora nenhuma evidência direta tenha
XET predomina. Assim, quando em contato sido produzida indicando que os xiloglucanos
com xiloglucano de alto peso molecular, essa de sementes tenham dupla função, essa propo-
atividade hidrolítica produz oligossacarídeos sição pode ser feita com base no fato de que
que são prontamente atacados pelas exo-gli- eles possuem propriedades hidrodinâmicas
cosidades (α-xilosidase e β-glucosidase), redu- muito semelhantes às encontradas em galac-
178 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

tomananos, isto é, os xiloglucanos teriam fun- chave na mobilização de polissacarídeos de re-


ções no controle da embebição de água e xero- serva de parede em cotilédones de L. angustifo-
proteção. É interessante observar que, como ci- lius após a germinação (Buckeridge e Reid,
tado para os galactomananos, as relações entre 1994). Ela possui alta especificidade para β-
estrutura e função em xiloglucano estão nas (1→4)-galactanos, o componente estrutural
mudanças da estrutura fina, que também são dominante nas paredes de reserva. A atividade
relacionadas com o posicionamento das galac- de galactanase acompanha a mobilização das
toses na molécula. reservas de polissacarídeo na parede. Quando
a galactanase pura foi incubada in vitro, a enzi-
Galactanos ma liberou 82% da galactose total do galactano
Esses polímeros são formados por ligações solúvel e 63% da galactose total da parede in-
β-(1→3),(1→6) com algumas ligações β-(1→4) tacta (Buckeridge e Reid, 1996).
(chamados de arabinogalactanos do tipo I); As modificações pós-germinativas na pare-
outro tipo, mais freqüente, é composto por li- de das células cotiledonares, como um todo, vão
gações β-(1→4) com ramificações de L-arabi- além da mobilização da reserva. O colapso da
nofuranose a cada 16 a 21 resíduos da cadeia parede em certas regiões do cotilédone com a
principal (chamado de arabinogalactano do formação simultânea de aerênquima após a
tipo II). Até o momento, esse tipo de polímero mobilização do galactano implicam a degrada-
foi observado em sementes de Leguminosae, ção de componentes de parede primária. Isso
Rubiaceae e Vochysiaceae (Mayworm, Bucke- sugere que pectinases e talvez celulases possam
ridge e Salatino, 2000), mas sua mobilização estar ativas durante o período de formação do
foi estudada principalmente nas sementes de aerênquima. As ramificações neutras do ram-
espécies do gênero Lupinus (tremoço) que acu- nogalacturonano regulam, até certo ponto, a
mulam arabinogalactano II. Em sementes de expansão e a morfogênese dos cotilédones. Por-
café, os arabinogalactanos do tipo I são com- tanto, pode ser apropriado caracterizar o ga-
ponentes de grande relevância, conferindo in- lactano também como uma molécula de múlti-
clusive características importantes à bebida. No plas funções, sendo tanto reserva quanto um
entanto, a mobilização desse polímero tem sido importante elemento na modulação da expan-
negligenciada em relação a estudos de mobili- são cotiledonar ao longo do desenvolvimento.
zação dos mananos, que as sementes também Assim, uma comparação entre os mecanis-
acumulam. mos de degradação e o controle dos galacto-
Em cotilédones de Lupinus angustifolius, an- mananos, xiloglucanos e arabinogalactanos
tes da germinação, o material de parede dos mostra que todos eles se encaixam em um pro-
cotilédones é rico em unidades de galactose cesso cujas características gerais estão descritas
(71%) e arabinose (20%), sendo o restante com- na Figura 10.5. Há também um grande número
posto por pequenas quantidades de glucose, áci- de pontos de analogia entre os mecanismos de
do urônico e ramnose. Após a germinação, a degradação e controle dos PRPC e os do amido,
maior parte da galactose e da arabinose é removi- indicando que os níveis de complexidade en-
da da parede, deixando um material residual en- contrados nos processos bioquímicos e fisiológi-
riquecido em ramnose, ácido urônico e glucose. cos de mobilização de reservas são praticamente
Duas enzimas parecem ser as responsáveis os mesmos que os observados em outras partes
pela degradação dos galactanos: α-arabinosi- da planta.
dases e três β-galactosidases. Essas enzimas au-
mentam sua atividade após a germinação, e
estão associadas com a mobilização de reservas, MOBILIZAÇÃO DE LIPÍDEOS
mas há também a possibilidade de que o ga- DE RESERVA EM SEMENTES
lactano esteja envolvido no controle da expan- Os lipídeos são acumulados nas sementes sob
são celular. A exo-galactanase é uma enzima- a forma de triglicerídeos e armazenados em or-
GERMINAÇÃO 179

ganelas denominadas corpos lipídicos. Sua de- A hidrólise dos triglicerídeos é feita por li-
gradação envolve etapas inversas à sua deposi- pases que são sintetizadas após a germinação.
ção: (1) hidrólise dos triglicerídeos liberando Algumas sementes quiescentes apresentam ati-
glicerol e ácidos graxos livres (AGL); (2) uso vidade de lipase, mas a atividade ótima dessas
do glicerol como fonte de carbono para a síntese enzimas ocorre em pH 4 e diminui após a ger-
de glucose; e (3) degradação do ácido graxo minação, quando ocorre a mobilização dos tri-
livre gerando acetil, que também será usado glicerídeos; isso sugere que tais lipases não es-
na síntese de glucose. Em geral, as hexoses tão associadas à mobilização dos triglicerídeos.
geradas serão utilizadas na síntese de sacarose, Já as lipases com atividade ótima em pH neutro
a qual é transportada para o eixo embrionário aumentam de atividade durante a mobilização
em crescimento (Figura 10.6). dos triglicerídeos, isto é, após a germinação. Na

corpo lipídico

triglicerídeos glicerol glicerol-P


glicerol + AGL

glioxissomo
citosol
b-o

AGL AGL AG-CoA


xid

CoA

ão

oxalacetato
malato Acetil-CoA
MS
citrato
glioxilato
isocitrato
ICL
succinato

mitocôndria
succinato glicerol-P

fumarato malato oxalacetato DHA-P

citosol
oxalacetato

sacarose
PEP
neoglicogênese
UDP-glc glc-1P fru-6P

 Figura 10.6
Catabolismo dos triglicerídeos depositados nos corpos lipídicos das sementes. Os triglicerídeos são
hidrolisados por lipases liberando ácidos graxos e glicerol. Este é fosforilado e convertido a di-hidroxiacetona-
fosfato na mitocôndria e exportado para o citosol, onde entra na via glicolítica no sentido da síntese de
hexose (neoglicogênese), que é usada na síntese de sacarose para a exportação para o eixo embrionário. Os
ácidos graxos livres são convertidos a succinato no glioxissomo (por β-oxidação e via do glioxilato), e os
intermediários (malato e succinato) são exportados para o uso na neoglicogênese. As reações são apenas
esquemáticas e não estão balanceadas, e nem todos os substratos e produtos aparecem (ATP, NAD, FAD e
CO2 envolvidos nas reações não são mostrados). AGL= ácido graxo livre, AG-CoA= ácido graxo ligado à
coenzima-A, ICL= isocitrato liase, ML= malato sintase, PEP= fosfoenol piruvato, DHA-P= di-hidroxiacetona-
fosfato, fru-6P= frutose 6-fosfato, glc-1P= glucose 1-fosfato, UDP-glc= glucose ligada à uridinadifosfato.
180 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

maioria das espécies, a atividade dessas lipases (1) os triglicerídeos são hidrolisados nos cor-
se encontra solúvel no citosol ou nos glioxisso- pos lipídicos (como descrito anteriormente);
mos, e não nos corpos lipídicos (Bewley e Black, (2) os ácidos graxos livres são convertidos a suc-
1994). cinato nos glioxissomos; (3) o succinato é con-
A forma como essas enzimas acessam seu vertido a malato ou oxalacetato na mitocôndria;
substrato (triglicerídeos) no interior do corpo e (4) o malato (ou oxalacetato) é exportado
lipídico através da membrana de fosfolipídeos para o citosol, onde será utilizado na neoglico-
ainda não é conhecida. Sabe-se que a mobili- gênese. As enzimas necessárias à neoglicogê-
zação dos lipídeos está associada à hidrólise das nese geralmente também ocorrem em plastí-
oleosinas (proteínas entre 15 e 26 KDa inseridas deos, mas a atividade nestes é muito baixa para
na membrana dos corpos lipídicos – ver Capítu- justificar a produção de sacarose. A atividade
lo 2 para maiores detalhes) em pontos específi- no citosol, por outro lado, é alta o suficiente
cos, e, na maioria das espécies, essa proteólise para explicar a síntese de hexose que ocorre mas
parcial é importante para a mobilização dos tri- sementes. O oxalacetato é o principal substrato
glicerídeos, pois os corpos lipídicos se tornam para a transaminação que envolve o glutamato
mais susceptíveis à hidrólise após a ação de pro- (principal produto da assimilação de nitrogê-
teases. É possível que a remoção do domínio nio) e o aspartato por meio das enzimas aspar-
hidrofílico das oleosinas (voltado para o citosol) tato aminotransferase (ou glutamato-oxaloa-
seja importante para permitir a ação das lipases, cetato transaminase) e asparagina sintetase,
por um lado permitindo o acesso ao seu subs- que produz asparagina (o principal aminoácido
trato e, por outro, servindo de ponto de ancora- utilizado no transporte) a partir de aspartato.
gem na superfície do corpo lipídico. A suscepti- Essas duas transformações compõem os princi-
bilidade diferencial das oleosinas às proteases pais passos na distribuição do nitrogênio (amô-
pode explicar as diferenças na meia-vida dos nia) assimilado pelo sistema enzimático da GS-
corpos lipídicos. GOGAT (glutamina sintetase – glutamato sin-
A conversão do glicerol em hexose começa tase) ou pelo processo de mobilização de proteí-
com a sua fosforilação no citosol. Nos passos nas de reserva (veja a seguir) na planta.
seguintes, o glicerol-P é convertido a di-hidro- O metabolismo dos ácidos graxos começa
xiacetona-P na mitocôndria e exportado de vol- nos glioxissomos. Estas organelas constituem
ta ao citosol (Figura 10.6). A di-hidroxiacetona- uma classe de peroxissomos, e suas característi-
P é um dos intermediários da via glicolítica e cas, como tamanho e composição, são bastante
segue nessa via na direção de formação de he- conservadas entre as espécies. De fato, nos ca-
xoses (neoglicogênese). sos em que a reserva de lipídeos ocorre em co-
Os ácidos graxos livres geralmente não são tilédones epígeos que se tornarão fotossintéti-
acumulados na célula. Tal acúmulo ocorre ape- cos após a mobilização das reservas (maturo-
nas em alguns casos de sementes imaturo-eu- eutróficas), os glioxissomos não desaparecem,
tróficas (Arecaeae) nas quais o haustório se de- sendo convertidos em peroxissomos. Essa mu-
senvolve para dentro do endosperma e absorve dança ocorre pela troca das enzimas presentes
os lipídeos produzidos por hidrólise dos trigli- na organela que inativam as vias do glioxissomo
cerídeos. Apenas nas células do haustório o áci- (β-oxidação e via do glioxilato) e ativam as vias
do graxo livre é metabolizado, podendo ser res- típicas de peroxissomos em tecidos fotossin-
pirado, convertido a sacarose e transportado téticos.
para o eixo embrionário ou até mesmo conver- Nos glioxissomos, os ácidos graxos livres
tido novamente em triglicerídeo para armaze- são inicialmente degradados em um processo
namento temporário. chamado β-oxidação. A primeira etapa é a ati-
O processo de formação de hexoses a partir vação do ácido graxo ligando-o a uma coenzi-
de lipídeos envolve diversas etapas (Figura ma-A. A etapa seguinte é chamada de “β” por
10.6). Podemos reduzi-lo aos seguintes passos: ocorrer no segundo carbono a partir do fim da
GERMINAÇÃO 181

molécula. No caso de a degradação ocorrer no passos de descarboxilação do ciclo do ácido


primeiro carbono, o processo é chamado de α- tricarboxílico, possibilitando a manutenção
oxidação. Por ocorrer no segundo carbono, o desses carbonos no succinato, que pode ser
processo libera produtos de dois carbonos (ace- usado na neoglicogênese, passando pela
til-CoA) que podem ser utilizados tanto na res- mitocôndria e terminando no citosol, como des-
piração celular para a produção de energia crito anteriormente (Figura 10.6).
quanto na síntese de hexose. Durante a mobi- É possível que haja um mecanismo de
lização dos lipídeos de reserva, no entanto, al- transferência de triglicerídeos diretamente do
gumas enzimas do catabolismo de acetil-CoA corpo lipídico para o glioxissomo, além do me-
têm sua atividade reduzida (em especial a pi- canismo proposto de transferência de ácidos
ruvato desidrogenase e a isocitrato desidroge- graxos livres via citosol. Isso explicaria a ativi-
nase) até o estabelecimento da fotossíntese (no dade de lipases no glioxissomo. Nesse caso, os
caso de órgãos fotossintéticos). Isso direciona triglicerídeos seriam hidrolisados e imediata-
o acetil-CoA preferencialmente para a neogli- mente ativados por ligação a uma coenzima-
cogênese (Bewley e Black, 1994). A, enquanto os fosfolipídeos seriam integrados
No caso de ácidos graxos de cadeia ímpar, à membrana dos glioxissomos.
é gerado ao final do processo um composto de As proteínas necessárias ao funcionamento
três carbonos (propionil-CoA). Esse propionil dos glioxissomos são sintetizadas após a em-
pode ser usado diretamente na neoglicogênese bebição a partir de polirribossomos livres no ci-
ou como precursor na síntese de coenzima-A tosol. A abundância de mRNA se correlaciona
(CoA). A β-oxidação pode ser importante para bem com a atividade, o que sugere que uma
converter ácidos graxos de cadeias ímpares em parte importante da regulação da atividade en-
cadeias pares, permitindo a total conversão do zimática seja feita no nível de transcrição. Ge-
ácido graxo em acetil-CoA ou vice-versa, au- ralmente não há processamento pós-traducio-
mentando a produção de propionil-CoA. nal das enzimas, e ainda não foi identificado
A degradação dos ácidos graxos insaturados um sinal claro de endereçamento das proteínas
(que possuem ligações duplas em sua estrutu- para o glioxissomo. Algumas enzimas, no en-
ra) ocorre basicamente da mesma forma. O tanto, são glicoproteínas, o que sugere que se-
processo requer apenas um passo adicional de jam sintetizadas em polirribossomos, glicosi-
isomerização, uma vez que, em uma das fases ladas e importadas pelo glioxissomo.
da β-oxidação, há a formação de uma ligação A taxa de expressão de isocitrato liase e ma-
dupla. A ligação formada durante a β-oxidação, lato sintase aumenta muito durante a mobili-
no entanto, apresenta conformação trans, en- zação dos lipídeos. Embora possa haver glio-
quanto a conformação nas cadeias dos ácidos xissomos durante a maturação da semente, a
graxos é cis. Uma isomerase pode converter uma taxa de expressão dos genes da via do glioxilato
conformação em outra e permitir a oxidação (em especial, a isocitrato liase) é praticamente
do ácido graxo. No caso do ácido ricinolênico zero. Portanto, apesar de se formarem durante
(12-OH 18:1 Δ 9), o ácido graxo gerado durante a maturação da semente por “brotamento” a
a β-oxidação (2-OH 8:1 Δ 2) é descarboxilado partir do retículo endoplasmático, geralmente
para que a cadeia possa continuar sendo meta- já no seu tamanho final, os glioxissomos só se
bolizada por β-oxidação. tornam funcionais, com suas vias metabólicas
O acetil-CoA gerado entra no ciclo do glio- características, após a germinação.
xilato, que conecta a geração de precursores de
dois carbonos (acetil-CoA) com a neoglicogê-
nese. O ciclo é bastante semelhante ao do áci- MOBILIZAÇÃO DE PROTEÍNAS
do tricarboxílico (ciclo de Krebs), mas difere DE RESERVA EM SEMENTES
em duas enzimas: isocitrato liase e malato sin- De forma similar aos demais compostos de re-
tase (Figura 10.6). Estas permitem pular os dois serva, a mobilização de proteínas inicia com o
182 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

desenvolvimento do embrião, normalmente su- síntese de proteinases ocorre principalmente na


portando o crescimento da plântula até que ela camada de aleurona. Os aminoácidos resultan-
se torne autotrófica. Desse modo, as reservas tes da hidrólise são convertidos a amidas (glu-
de proteínas serão mobilizadas também para a tamina e asparagina) e então transportados pa-
estruturação dos processos que conferem capa- ra o eixo em crescimento. Em sementes de di-
cidade de absorver nutrientes e de realizar fo- cotiledôneas, os cotilédones são os principais
tossíntese. Nesse caso, porém, há uma peculi- órgãos de reserva, e a hidrólise enzimática das
aridade: por serem os únicos compostos de re- proteínas inicia-se nos corpos protéicos como
serva em sementes que possuem nitrogênio em indicado na Figura 10.7 (Osborne, 1924). Tam-
sua composição, as proteínas de reserva não são bém aqui os principais aminoácidos transpor-
mutuamente exclusivas em relação a nenhum tados são as amidas. Com o fim da proteólise,
outro composto de reserva, como acontece en- os corpos protéicos vazios são fundidos forman-
tre o amido, os PRPCs e os lipídeos. Elas ocor- do grandes vacúolos, onde uma variedade de
rem e são essenciais provavelmente em todas hidrolases é secretada, transformando-se em
as sementes. vesículas autofágicas responsáveis pela senes-
A hidrólise das proteínas de reserva aos cência e degeneração dos cotilédones (Thomas,
seus aminoácidos constituintes é realizada por Okita e Rogers, 1996; Shewry e Casey, 1999).
proteases classificadas de acordo com sua ativi- A transformação dos aminoácidos produzi-
dade hidrolítica (Figura 10.7). dos pela digestão das proteínas de reserva em
As endopeptidases atacam ligações peptí- amidas é realizada principalmente por meio da
dicas internas ao polipeptídeo, produzindo oli- enzima dependente de ATP asparagina sinte-
gopeptídeos que são reduzidos aos seus ami- tase (AS). As leguminosas são conhecidas pelas
noácidos constitutivos pelas peptidases: ami- sementes freqüentemente ricas em nitrogênio,
nopeptidases, que atacam o terminal amino que pode ser estocado como proteínas de reser-
(N), e carboxipeptidases, que atacam o termi- va convencionais ou proteínas tóxicas, aminoá-
nal carboxílico (C) do peptídeo (Muntz et al., cidos não-protéicos ou outros compostos nitro-
2001).Em sementes de cereais, o endosperma genados de defesa. A forma de reserva não tem
é o principal local de acúmulo de proteínas, e a efeito sobre o crescimento da plântula, pois os

CORPO PROTÉICO CITOPLASMA

aminoácidos amidas eixo

A A+B Am + Ps

oligopeptídeos
proteína
de reserva

COTILÉDONES

 Figura 10.7
Generalização da via de mobilização de proteínas de reserva nos corpos protéicos em sementes de dicotile-
dôneas. A proteína (legumina insolúvel com ligações bissulfídicas) é inicialmente atacada pelas proteinases
A, B (endopeptidases) e C (carboxipeptidase) para produzir polipeptídeos menores e mais solúveis e, finalmente,
aminoácidos que são transportados para o citoplasma. Oligopeptídeos no citoplasma são atacados por ami-
nopeptidases (Am) e peptidases (Ps) produzindo aminoácidos. Estes últimos são convertidos a amidas (glu-
tamina e asparagina), as quais são transportadas para o eixo em crescimento. Adaptada de Bewley (2001).
GERMINAÇÃO 183

seus aminoácidos são convertidos geralmente celular, principalmente, sugere que os eventos
a amidas após a hidrólise do composto. Em co- metabólicos hoje presentes em sementes te-
tilédones de leguminosas, o principal aminoá- nham sido transferidos, ao longo da evolução,
cido exportado é geralmente a asparagina. Le- a partir de eventos anteriormente existentes em
guminosas são conhecidas pelo seu “estilo de outros órgãos dos vegetais. Os eventos teriam,
vida rico em nitrogênio”, estratégia que é de- assim, sido parte de um processo gradativo de
senvolvida no início do seu ciclo de vida e que transferência de função que culminou em me-
requer, desde cedo, grande quantidade desse canismos eficientes de mobilização de reservas
nutriente, tendo influenciado os tipos de germi- que garantem o vigor das plântulas produzidas
nação adotados pelas espécies, que, por sua vez, pelo processo germinativo em plantas superio-
estão muito relacionados às estratégias de esta- res. Pode-se dizer, com boa margem de seguran-
belecimento da plântula (Mickey, 1994). A es- ça, que o processo de germinação e estabeleci-
tratégia mais comum é o rápido estabelecimen- mento da plântula tenha sido um dos fatores
to de aparatos fotossintéticos ricos em nitrogê- preponderantes no sucesso que as mono e as
nio nos cotilédones, que rapidamente supor- dicotiledôneas obtiveram no decorrer dos últi-
tam o desenvolvimento das primeiras folhas (- mos 100 milhões de anos, ocupando grande
Figura 10.1). Essa estratégia estende as vanta- parte da vegetação de nosso planeta.
gens energéticas de possuírem folhas ricas em De modo geral, os processos de mobilização
nitrogênio no início do desenvolvimento da consistem em sincronizar o desenvolvimento
planta, conferindo acelerado crescimento e da plântula, oriunda da germinação, no sentido
permitindo que a planta se torne rapidamente de produzir um indivíduo autotrófico que seja
auto-suficiente. Nesse grupo podemos incluir capaz de se adaptar e responder às condições
as espécies Piptadenia gonoacantha (Mimosoi- ambientais vigentes. Os resultados disponíveis
deae, com cerca de 40% do peso seco da semen- até então mostram claramente que a mobiliza-
te em proteínas) e Sesbania virgata (Caesalpi- ção de reservas nas sementes está totalmente
nioideae, com cerca de 45% em proteínas), am- integrada ao processo de desenvolvimento da
bas típicas de florestas tropicais do Brasil. Outra plântula. A semente e a plântula possuem me-
estratégia é típica de leguminosas com cotilé- canismos sensores das condições ambientais vi-
dones de reserva não-fotossintéticos, em que o gentes (temperatura e luminosidade, principal-
tempo para atingir a autotrofia é dilatado pela mente) e são capazes de efetuar a transmissão
presença de reservas. Nesse grupo podemos en- desses sinais para o seu metabolismo. Os pro-
contrar as seguintes espécies brasileiras: Hyme- cessos de germinação e de desenvolvimento da
naea courbaril (jatobá) e Copaifera langsdorffii (co- plântula acontecem em um microambiente
paíba), ambas Caesalpinioideae, com cerca de cujas condições ambientais não são exatamente
12 a 14% do peso seco da semente em proteínas as mesmas em que a planta adulta ocorre. Uma
de reserva. vez que a dormência é quebrada, os eventos fi-
siológicos e bioquímicos que se iniciam compre-
endem um sistema altamente sofisticado de co-
CONCLUSÕES municação entre as diferentes partes das se-
As breves descrições e discussões sobre os even- mentes, de forma a controlar o fluxo de produ-
tos relacionados à mobilização de reservas em tos finais da mobilização de reservas (ver Parte
sementes mostraram que, durante a evolução, 2 deste livro).
as plantas encontraram diferentes meios de ar- Os experimentos efetuados para estudar o
mazenar reservas em suas sementes e, com isso, funcionamento desses processos ainda não per-
também desenvolveram formas distintas de mitem uma abordagem integrada de todos eles.
mobilizar essas reservas dos locais de acúmulo Por enquanto, a maioria do que se encontra na
até os de uso. Uma comparação entre o metabo- literatura compreende experimentos isolados
lismo de amido e o de polissacarídeos de parede em que sementes são submetidas, por exemplo,
184 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

à ação de um hormônio, e seus efeitos são medi- of Copaifera langsdorffii Desf. (Leguminosae). Plant
dos pela dosagem de atividades enzimáticas e Physiology & Biochemistry, v.37, n.9, p.653-663, 1999.
das proteínas correspondentes pelo aumento AKAZAWA, T.; HARA-NISHIMURA, I. Topographic
de transcrição de genes, etc. Abordagens mais aspects of biosynthesis, extracellular secretion, and
abrangentes já permitem a visualização da intracellular storage of proteins in plant cells. Annu.
Rev. Plant Physiol., v. 36, p. 441-472, 1985.
transcrição de milhares de genes ao mesmo
tempo e a comparação de uma mesma semente BECK, E.; ZIEGLER, P. Biosynthesis and degradation
em resposta a fatores ambientais e/ou metabóli- os starch in higher plants. Annu. Rev. Plant Physiol. Plant.
Mol. Biol., v. 40, p. 95-117, 1989.
cos. Essa abordagem é chamada de transcrip-
tômica. Como ela permite visualizar apenas os BEWLEY, J.D. Seed germination and reserve mobiliza-
tion. In: Encyclopedia of life sciences. Nature Publishing
genes que estão ativos em um dado momento,
Group www.els.net, 2001.
a informação sobre as proteínas que eles pro-
duzem não se torna disponível com essa téc- BEWLEY, J.D.; BLACK, M. Seeds: physiology of develop-
ment and germination. 2nd ed. New York: Plenum, 1994.
nica. Porém, podem-se visualizar processos des-
se ponto de vista utilizando a técnica denomi- BUCKERIDGE, M.S.; DIETRICH, S.M.C. Mobilisation
nada proteômica, em que a série de proteínas of the raffinose family oligosaccharides and galacto-
mannan in germinating seeds of Sesbania marginata
presentes em um dado momento pode ser abor-
Benth. (Leguminosae-Faboideae). Plant Science, v.117,
dado. Em conjunto com a metabolômica, pela p.33-43, 1996.
qual se podem detectar vários dos metabólitos
BUCKERIDGE, M.S.; REID, J.S.G. Major cell wall
presentes em um tecido ao mesmo tempo em
storage polysaccharides in legume seeds: structure,
um dado momento, é possível que se comecem catabolism and biological functions. Ciência e Cultura, v.
a visualizar propriedades emergentes do siste- 48, p.153-162, 1996.
ma que ainda não puderam ser detectadas devi- _____. Purification and properties of a novel b-galacto-
do às limitações que o sistema experimental sidase or exo-b-(1 4)-galactanase from the cotyledons
utilizado no século XX propiciou. of germinated Lupinus angustifolius L. seeds. Planta, v.192,
É bastante provável que os próximos expe- p.502-511, 1994.
rimentos incluam análises paralelas dos even- BUCKERIDGE, M.S.; DIETRICH, S.M.C.; LIMA, D.U.
tos ocorrendo nos níveis de transcrição, síntese Galactomannans as the reserve carbohydrate in legu-
de proteínas e presença de compostos ao mes- me seeds In: GUPTA, A.K.; KAUR, N. Carbohydrate reser-
mo tempo e ao longo do período no qual o even- ves in plants: synthesis and regulation. Amsterdam:
Elsevier, p. 283-316. 2000a.
to biológico acontece. Essa visão integrada
possibilitada pelas técnicas modernas disponí- BUCKERIDGE, M.S.; TINÉ, M.A.; SANTOS, H.P.; LIMA,
veis no início deste século possivelmente per- D.U. Polissacarídeos de reserva de parede celular em
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ta. Do mesmo modo, tais informações permiti-
rão desenvolver tecnologias ainda mais sofisti- JACOBSEN, J.V.; BEACH, L.R. Control of transcription
of a-amilase and rRNA genes in barley aleurone proto-
cadas, e talvez até ambientalmente seguras,
plasts by gibberellin and abscisic acid. Nature, v. 316,
para melhorar ainda mais os alimentos, os quais p.275-277, 1985.
têm a semente e suas reservas como base.
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GERMINAÇÃO 185

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PA R T E 4

ABORDAGEM
EXPERIMENTAL
C A P Í T U L O 11

DELINEAMENTO EXPERIMENTAL
Marli A. Ranal
Denise Garcia de Santana

Escrever sobre planejamentos ou delineamen- cas próximas, sendo portanto, oriundo de uma
tos experimentais não é muito fácil, uma vez mesma espécie, variedade ou cultivar, subme-
que muita literatura boa tem sido acumulada tidas às mesmas práticas culturais e condições
nos últimos anos. Para a área agronômica, o edafo-climáticas. As sementes dessa população
delineamento experimental faz parte do dia-a- são submetidas à primeira triagem para a retira-
dia, em função da necessidade econômica de da das danificadas e de outras impurezas e para
se determinar os tratamentos que propiciam a a separação por tamanho. Após esse processa-
melhor e a maior produtividade. Isso, associado mento, porções uniformes quanto a tamanho
à importância das predições, faz do delinea- e danos são retiradas para outras avaliações.
mento a ferramenta primordial da agronomia. Cada porção uniforme de sementes quanto a
Para as ciências biológicas, o planejamento ex- essas características, e dentro de tolerâncias
perimental assume um perfil diferente. Primei- permitidas pelas Regras para Análise de Semen-
ro, porque a maioria dos cursos de ciências bio- tes – RAS (Brasil, 1992), é denominada lote.
lógicas não tem uma disciplina específica para Um lote de sementes assim constituído segue
tratar do assunto como ocorre na agronomia; para um laboratório de análise de sementes
segundo, porque o material biológico não é uni- para receber o laudo técnico. No laboratório,
forme e nem sempre está disponível em gran- uma amostra de sementes, denominada amos-
des quantidades. tra média, é retirada desse lote, de acordo com
No sentido de tentar auxiliar o jovem pes- os procedimentos descritos nas RAS (Brasil,
quisador a tomar decisões, neste capítulo serão 1992), podendo essa retirada ser feita por amos-
tratados alguns aspectos referentes ao delinea- tragem simples ou composta. Da amostra mé-
mento experimental. Maiores detalhes referen- dia, é retirada uma amostra, conforme padrões
tes ao assunto poderão ser obtidos em alguns preestabelecidos, denominada amostra de tra-
bons livros, como os de Cochran e Cox (1957), balho. As sementes restantes da amostra mé-
Scheffé (1959), Steel e Torrie (1980), Snedecor dia, depois de separada a de trabalho, são deno-
e Cochran (1989), Banzatto e Kronka (1989), minadas amostra de arquivo e devem ser ar-
Pimentel-Gomes (1990) e Sokal e Rohlf (1997). mazenadas de acordo com os procedimentos
Apesar de o delineamento experimental ser prescritos para a espécie (Brasil, 1992). Cabe
uma técnica estatística que segue parâmetros agora ao laboratório que emitirá o laudo do lote
e modelos predeterminados comuns a várias de sementes recebido retirar da amostra de tra-
áreas do conhecimento, as designações confe- balho subamostras para os testes de pureza, de
ridas à amostra podem variar entre tecnologis- umidade e de germinação, sendo que cada um
tas de sementes, fisiólogos e ecólogos. Entre os deles também tem procedimentos específicos
tecnologistas, a população é um conjunto de para cada cultura quanto a tamanho da amos-
sementes que possui características agronômi- tra (número de repetições e de sementes por
190 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

repetição), manuseio das sementes, equipa- perimental. Assim, define-se delineamento ex-
mentos, recipientes, substâncias e tratamentos perimental como o desenho do experimento no
utilizados, critério de contagens, cálculos e limi- campo, na casa de vegetação ou outro local
tes de tolerância (Brasil, 1992). Da amostra de (Banzatto e Kronka, 1989). A forma como os
trabalho, além dos testes padronizados descri- tratamentos são dispostos na área experimental
tos nas RAS, o pesquisador também pode retirar define o tipo de delineamento.
subamostras para outros procedimentos experi- Em experimentação, três princípios básicos
mentais não-padronizados. devem ser atendidos – a repetição, a casualiza-
Em estudos de ecofisiologia da germinação, ção e o controle local. A repetição consiste na
a população de plantas das quais serão coleta- reprodução do experimento básico e tem por
das as sementes normalmente é formada por finalidade propiciar a obtenção de uma
um conjunto de indivíduos submetidos a condi- estimativa do erro experimental ou resíduo. A
ções bióticas e abióticas muito similares. De al- casualização tem por objetivo propiciar a todos
guns desses indivíduos, selecionados ou não de os tratamentos a mesma probabilidade de se-
acordo com algum critério, são tomadas porções rem alocados em qualquer ponto da área
de sementes que, misturadas, formam uma experimental. O controle local, específico para
única amostra. Esta pode então ser dividida em alguns delineamentos, como em blocos casua-
subamostras para experimentos específicos ou lizados, tem a finalidade de dividir um ambien-
pode ser estudada dessa única forma se o nú- te heterogêneo em subambientes homogêneos,
mero de sementes não for muito grande. O es- tornando o delineamento mais eficiente pela
tudo pode ainda ser feito utilizando-se amos- redução do erro experimental.
tras retiradas de cada indivíduo e mantidas
separadas para a avaliação da variabilidade in-
tra-específica quanto à germinação. A popula- DELINEAMENTO
ção de sementes é então constituída por todas INTEIRAMENTE
as sementes dos indivíduos da espécie que cres- CASUALIZADO (DIC)
cem em determinado ambiente, conceito este O delineamento inteiramente casualizado é o
similar ao adotado na tecnologia de sementes. mais simples e utiliza apenas os princípios da
Tanto para tecnologistas quanto para eco- casualização e da repetição. Portanto, deve ser
fisiologistas, se o interesse está centrado em empregado quando as condições experimentais
uma população específica de sementes, o pri- são consideradas homogêneas. Detectar homo-
meiro passo é o estudo da distribuição (normal, geneidade ou heterogeneidade na área experi-
binomial ou outra) da variável a ser analisada mental nem sempre é muito fácil, mesmo para
(germinação). Esse estudo, realizado a partir um pesquisador mais experiente. Às vezes, a
de amostras tomadas de uma única população, heterogeneidade existente no local de trabalho
permite fazer inferências sobre essa população, não é controlável, como, por exemplo, variações
utilizando-se intervalos de confiança e testes quanto à irradiância e à temperatura em uma
de hipóteses (para médias e proporções). Medi- mesma prateleira de uma câmara de germina-
das descritivas como média, mediana, moda, ção. Nesse caso, é importante que o pesquisador
desvio padrão, variâncias, entre outras, sinteti- esteja ciente de que o erro experimental cres-
zam a informação em uma única medida e são cerá com o aumento da heterogeneidade, levan-
úteis nas inferências sobre a população. No en- do à perda na precisão. Assim, dois tratamentos
tanto, se o interesse é dividir a amostra, subme- podem ser considerados iguais quanto à carac-
tendo-a a vários métodos cujo efeito se deseja terística estudada em decorrência das condições
medir ou comparar, têm-se definidos os trata- não-controláveis do ambiente (erro experimen-
mentos que, quando dispostos em condições tal), e não dos tratamentos. Deve-se pensar em
experimentais predeterminadas, diz-se que es- homogeneidade também com relação à mão-
tão arranjados dentro de um delineamento ex- de-obra envolvida na coleta dos dados. Depen-
GERMINAÇÃO 191

dendo do experimento e do tipo de dado a ser A casualização do delineamento pode ser


coletado, esse delineamento exige que apenas feita de várias formas, entre elas o sorteio, uti-
um manipulador esteja envolvido. lizando-se uma urna com os números das par-
O modelo matemático desse delineamento celas, tabelas de números aleatórios ou outro
(yij = μ + αi + eij, onde yij é o valor da parcela método, desde que o sorteio seja garantido. Para
que recebeu o tratamento i na repetição j; μ é a a utilização de números aleatórios em um expe-
média geral do experimento; αi é o efeito do i- rimento com nove tratamentos (T1, T2, T3, T4,
ésimo tratamento; eij é o erro da parcela que T5, T6, T7, T8 e T9) e cinco repetições (R1, R2,
recebeu o tratamento i na repetição j) mostra R3, R4 e R5), montados em duas prateleiras
que cada observação recebe o efeito da média homogêneas entre si, os seguintes passos de-
geral do experimento, do tratamento e do erro vem ser seguidos:
experimental. Por isso, cabe ao pesquisador de-
cidir sobre a redução ou não do erro experimen- 1o Passo: Numerar o croqui de 1 a 45, números
tal ou resíduo. Quanto maior ele for, mais difícil estes correspondentes ao número de parcelas
será detectar diferenças entre tratamentos, por- do experimento;
que esse erro sobrepuja o efeito do tratamento,
que normalmente se deseja medir. Prateleira 1
Para esse tipo de delineamento, realizado 1 2 3 4 5 6 7 8
na área agronômica, recomenda-se que o nú- 9 10 11 12 13 14 15
mero de parcelas do experimento (número de
16 17 18 19 20 21 22
tratamentos multiplicado pelo número de repeti-
ções) não seja inferior a 20 e que o número de
Prateleira 2
graus de liberdade do erro experimental não seja
inferior a 10. Essa informação é melhor visuali- 23 24 25 26 27 28 29 30
zada quando se monta a primeira coluna do qua- 31 32 33 34 35 36 37 38
dro da análise da variância, de tal forma que: 39 40 41 42 43 44 45

Fontes de variação gl
Tratamento t–1 2o Passo: Sortear 45 números aleatórios, de pre-
Erro experimental (resíduo) t (r – 1) ferência com três dígitos, para evitar empates;
Total tr – 1
525 204 975 928 039 164 915 021 114
gl: graus de liberdade; t: número de tratamentos; r: número
de repetições. 072 561 186 053 728 327 817 138 777

715 218 098 180 183 993 147 472 173


Como o conhecimento que se tem para es-
pécies nativas é pequeno, esses números míni- 037 613 819 983 639 584 189 152 791
mos exigidos na área agronômica passaram a
194 190 801 987 996 415 123 490 178
ser adotados também na área biológica.

3o Passo: Numerá-los em ordem crescente (ou decrescente);

525 → 27 204 → 21 975 → 41 928 → 40 039 → 3 164 → 12 915 → 39 021 → 1 114 → 7

072 → 5 561 → 28 186 → 17 053 → 4 728 → 33 327 → 23 817 → 37 138 → 9 777 → 34

715 → 32 218 → 22 098 → 6 180 → 15 183 → 16 993 → 44 147 → 10 472 → 25 173 → 13

037 → 2 613 → 30 819 → 38 983 → 42 639 → 31 584 → 29 189 → 18 152 → 11 791 → 35

194 → 20 190 → 19 801 → 36 987 → 43 996 → 45 415 → 24 123 → 8 490 → 26 178 → 14


192 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

4o Passo: Distribuir os tratamentos com as repetições, seguindo qualquer seqüência. Para faci-
litar, recomenda-se que sejam distribuídos em ordem, ou seja, T1R1 até T1R5; T2R1 até T2R5 e
assim por diante. Veja que, nesse momento, a seqüência dos números aleatórios é mantida (a 1a
coluna do 3o passo e a 1a coluna do 4o passo têm a 27a posição dos números sorteados, seguida da
5a posição, da 32a e assim por diante).
27 → T1R1 21 → T2R1 41 → T3R1 40 → T4R1 3 → T5R1 12 → T6R1 39 → T7R1 1 → T8R1 7 → T9R1

5 → T1R2 28 → T2R2 17 → T3R2 4 → T4R2 33 → T5R2 23 → T6R2 37 → T7R2 9 → T8R2 34 → T9R2

32 → T1R3 22 → T2R3 6 → T3R3 15 → T4R3 16 → T5R3 44 → T6R3 10 → T7R3 25 → T8R3 13 → T9R3

2 → T1R4 30 → T2R4 38 → T3R4 42 → T4R4 31 → T5R4 29 → T6R4 18 → T7R4 11 → T8R4 35 → T9R4

20 → T1R5 19 → T2R5 36 → T3R5 43 → T4R5 45 → T5R5 24 → T6R5 8 → T7R5 26 → T8R5 14 → T9R5

5o Passo: Alocar cada tratamento e repetição, é que, ao se deslocar uma placa de Petri posi-
associando a distribuição do 4o passo com a nu- cionada no meio de uma lâmpada fluorescente
meração do croqui do 1o passo. Assim, T1R1 para a sua extremidade, as sementes que antes
será alocado na parcela 27 do croqui; T2R1 na estavam recebendo irradiância, por exemplo,
parcela 21 e assim por diante, até o final da de 55 μmol m-2 s-1 passarão a receber 35 μmol
distribuição de todas as parcelas. m-2 s-1. Como não se sabe qual a resposta das
sementes a essas irradiâncias e qual o tempo
Prateleira 1 que elas gastam para alterar seu metabolismo
T8R1 T1R4 T5R1 T4R2 T1R2 T3R3 T9R1 T7R5 com essa mudança na quantidade de luz rece-
1 2 3 4 5 6 7 8 bida, é recomendável que a posição da placa
T8R2 T7R3 T8R4 T6R1 T9R3 T9R5 T4R3 não seja alterada. Provavelmente a velocidade,
9 10 11 12 13 14 15 a sincronia e a homogeneidade de germinação
T5R3 T3R2 T7R4 T2R5 T1R5 T2R1 T2R3 sofram, de maneira não-controlada, forte efeito
16 17 18 19 20 21 22 dessas mudanças contínuas de irradiância ao
longo do experimento, e isso, apesar de ser uma
Prateleira 2 aparente homogeneização, aumenta ainda mais
o erro experimental. Mesmo que uma repetição
T6R2 T6R5 T8R3 T8R5 T1R1 T2R2 T6R4 T2R4 fique sob a luz mais forte e a outra, na extremida-
23 24 25 26 27 28 29 30
de mais fraca da lâmpada ao longo do período
T5R4 T1R3 T5R2 T9R2 T9R4 T3R5 T7R2 T3R4 experimental, essa variação no processo de ger-
31 32 33 34 35 36 37 38
minação, que será registrada em cada placa, in-
T7R1 T4R1 T3R1 T4R4 T4R5 T6R3 T5R5
formará sobre o grau de homogeneidade do local
39 40 41 42 43 44 45
do experimento e, portanto, sobre a precisão dos
dados obtidos. Quanto mais homogêneas forem
as condições experimentais, mais fielmente se
Uma prática antiga, ainda utilizada em al- medirá a heterogeneidade do material biológico
guns laboratórios, recomenda que periodica- em estudo. Se as condições experimentais forem
mente o local das parcelas seja mudado (“escra- muito heterogêneas, o valor do quadrado médio
vo de Jó” ou a dança das placas). Essa é uma do resíduo que mostra a grandeza do erro experi-
prática não-recomendada e contrária ao que de- mental aumentará, diminuindo o valor do F da
termina o delineamento inteiramente casuali- análise da variância e reduzindo a chance de ser
zado, ou seja, a posição de cada unidade experi- detectada diferença significativa entre os trata-
mental ou parcela deve ser fixa, do início até o mentos (F=quadrado médio do tratamento/qua-
final do experimento. A justificativa para isso drado médio do resíduo).
GERMINAÇÃO 193

Essas colocações fornecem subsídio para a tratamento; βj é o efeito do j-ésimo bloco; eij é o
tomada de certas decisões. Por exemplo, em erro da parcela que recebeu o tratamento i no
uma câmara de germinação com lâmpadas fluo- bloco j) mostra que cada observação leva con-
rescentes de 1,50 m, verticais na porta e no fun- sigo o efeito da média geral do experimento,
do, tem-se uma variação de irradiância ao longo do tratamento, do bloco e do erro experimental.
das prateleiras, com irradiâncias baixas nas pra- Nesse tipo de delineamento, há perda dos graus
teleiras localizadas nas extremidades das lâm- de liberdade do erro experimental, mas, em
padas e altas nas prateleiras de posição me- contrapartida, a variação devida ao efeito do
diana. Também, em uma mesma prateleira, as bloco não é incorporada ao resíduo ou erro ex-
mais altas irradiâncias ocorrem na frente e no perimental, garantindo a eficiência do delinea-
fundo, ficando o meio com irradiâncias mais mento. Assim, esse tipo de delineamento tem
baixas. O que fazer nessa situação? A primeira a vantagem de levar em conta a heterogeneida-
coisa é tomar medidas dos fatores físicos pre- de do local do experimento, separando-a e evi-
sentes no local (luz, temperatura, umidade e tando que as diferenças ambientais dificultem
outros). Segundo, distribuir as parcelas do ex- a detecção de diferenças entre os tratamentos,
perimento em pontos similares quanto aos fato- ou seja, conduz a uma estimativa mais exata
res físicos mencionados. No exemplo dado da do erro experimental. Em cada bloco deve exis-
câmara de germinação, escolhe-se duas ou três tir uma parcela de cada tratamento, de tal for-
prateleiras próximas, efetuando-se o sorteio. ma que todos os tratamentos estejam represen-
Melhor ainda se as placas puderem ser dispos- tados no bloco que retrata uma condição
tas apenas nas fileiras do fundo e da frente, homogênea, dentro da heterogeneidade da área
evitando-se o meio com menor irradiância. O experimental. Contudo, se um mesmo trata-
mesmo procedimento deve ser efetuado quan- mento for designado mais de uma vez em um
do se trabalha com câmaras tendo luz apenas bloco, isso deverá acontecer para os demais tra-
na porta, com mais de uma câmara, com banca- tamentos, e o delineamento passa a se denomi-
das diferentes em uma casa de vegetação ou nar delineamento em blocos casualizados, com
com porções de solo diferentes em testes de repetição dentro do bloco.
emergência de plântulas. Caso as parcelas não Utilizando ainda o exemplo das câmaras de
caibam no espaço uniforme, o melhor é optar germinação, pode-se montar um bloco em cada
pelo delineamento em blocos casualizados. prateleira, um bloco em cada câmara ou mesmo
um bloco em cada posição da mesma prateleira
(frente, meio e fundo). Às vezes, não se pode
DELINEAMENTO EM BLOCOS optar por esse tipo de delineamento por falta
CASUALIZADOS (DBC) de espaço físico, material ou mão-de-obra. Is-
O delineamento em blocos casualizados é uti- so porque o espaço disponível para se montar
lizado em experimentos quando as condições um bloco (espaço homogêneo) pode ser muito
experimentais são heterogêneas e a heteroge- pequeno em cada prateleira da câmara, por
neidade ocorre em um único sentido (a hete- exemplo. Nesse caso, se for necessário optar pe-
rogeneidade em dois sentidos é própria para lo DIC, é importante que a interpretação dos
delineamento em quadrado latino). Por isso, resultados obtidos leve em consideração que as
inclui, além dos princípios da casualização e placas foram submetidas a uma heterogenei-
da repetição, também o do controle local, que dade que dificulta detectar diferenças entre tra-
trabalha com as diferenças da área experimental. tamentos.
O modelo matemático desse delineamento O sorteio do delineamento em blocos ca-
(yij = μ + αi + βj+ eij, onde yij é o valor da parcela sualizados é feito por bloco, e não para todas
que recebeu o tratamento i no bloco j; μ é a média as parcelas do experimento. Assim, para um
geral do experimento; αi é o efeito do i-ésimo experimento com seis tratamentos (T1, T2, T3,
194 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

T4, T5 e T6) e quatro blocos (repetições), tem- Bloco IV


se os seguintes passos para o sorteio do bloco I: 1→T4 3→T6 5→T3

2→T5 4→T1 6→T2


1o Passo: Numerar o croqui do bloco I de 1 a 6,
números estes correspondentes aos tratamentos;
1 3 5
ENSAIOS FATORIAIS
2 4 6
Muitas vezes, o pesquisador tem interesse em
analisar no mesmo experimento dois fatores,
2o Passo: Sortear seis números aleatórios cor- como, por exemplo, o tamanho de semente e o
respondentes ao número de tratamentos; local de produção. Essa análise pode ser feita
781 273 142 612 846 329 independentemente do tipo de delineamento.
Pode-se ter, então, DIC em esquema fatorial,
3o Passo: Numerá-los em ordem crescente (ou DBC em esquema fatorial ou outro delineamen-
decrescente); to. Nesse caso, o número de tratamentos é o
total de combinações entre os dois fatores. Por
781→5 273→2 142→1 612→4 846→6 329→3
exemplo, sementes de Gossypium hirsutum L.
(algodoeiro) de peneiras 8 e 11, oriundas de
4o Passo: Distribuir, seguindo qualquer seqüên- três municípios diferentes, serão comparadas
cia, os seis tratamentos; quanto à germinabilidade, ao tempo, à veloci-
5→T1 2→T2 1→T3 4→T4 6→T5 3→T6 dade, à uniformidade e à sincronia de germina-
ção. O fator tamanho de semente tem, portanto,
dois níveis (peneira 8 e peneira 11), enquanto
5o Passo: Alocar os tratamentos, associando a
o fator local de produção tem três níveis (os
distribuição do 4o passo com a numeração do
três municípios produtores). Isso significa que
croqui do 1o passo;
o experimento tem seis tratamentos (sementes
Bloco I de peneira 8 do município A, peneira 8 do mu-
1→T3 3→T6 5→T1 nicípio B, peneira 8 do município C e o mesmo
para peneira 11). Esses seis tratamentos defini-
2→T2 4→T4 6→T5 rão o número de repetições do experimento,
que, no caso, deverá ser de no mínimo quatro,
6o Passo: Repetir os passos de 1 a 5 para cada totalizando 24 parcelas com 18 graus de liber-
um dos demais blocos. Após o sorteio para todos dade para o erro experimental. A primeira per-
os blocos, tem-se: gunta que deve ser respondida é se há ou não
Bloco I
interação entre os dois fatores. Nesse exemplo,
é importante saber se o município A tem se-
1→T3 3→T6 5→T1 mentes de boa qualidade independentemente
2→T2 4→T4 6→T5 do tamanho ou se ele é bom produtor apenas
de sementes menores. Ao desconsiderar a
Bloco II estrutura fatorial do experimento, converten-
do-o em um DIC ou DBC com apenas um fator
1→T1 3→T6 5→T2
(tratamentos), perde-se a informação do fator
2→T5 4→T3 6→T4 que mais influencia a variável em estudo e a
de se os fatores interagem entre si, detectan-
Bloco III do-se apenas o(s) melhor(es) tratamento(s).
1→T6 3→T2 5→T1 Como mencionado, os tratamentos de en-
saios fatoriais com dois fatores são combinações
2→T1 4→T4 6→T3
dos níveis de cada fator, de tal forma que o fator
GERMINAÇÃO 195

Lote 1 Lote 2 Lote 3 Lote 4

M1 M2 M3 M1 M2 M3 M1 M2 M3 M1 M2 M3

L1M1 L1M2 L1M3 L2M1 L2M2 L2M3 L3M1 L3M2 L3M3 L4M1 L4M2 L4M3

Tratamento 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

lote (L1, L2, L3 e L4) e o fator métodos de supe- resultados, principalmente pelo maior número
ração de dormência (M1, M2 e M3), por exem- de interações.
plo, têm as seguintes combinações, correspon-
dentes aos 12 tratamentos (ver esquema acima).
Se esse experimento com 12 tratamentos CONSIDERAÇÕES GERAIS
(4 lotes x 3 métodos) e cinco repetições for Independentemente do tipo de delineamento
montado em delineamento inteiramente casua- e do número de fatores em análise, um ponto
lizado ou em blocos casualizados, os graus de importante a ser considerado é o número de
liberdade das causas da variação serão respecti- sementes por repetição. Se, em uma placa de
vamente: Petri, forem colocadas para germinar duas se-
mentes e apenas uma delas germinar, a porcen-
DIC
tagem final de germinação dessa unidade ex-
Fontes de variação gl perimental será de 50%; se forem colocadas
Lote 3 = no de lotes –1 quatro sementes, para alcançar essa mesma
Método 2 = no de métodos –1 porcentagem, será necessário o registro de duas
Lote*Método 6 = (no de lotes –1) (no de métodos –1)
Resíduo 48 = (59-3-2-6) sementes germinadas, e, se utilizadas 50 se-
mentes, 25 delas precisarão germinar para que
Total 59= no de parcelas –1
se registre 50% de germinação. Isso significa
gl: graus de liberdade. que quanto menor for o número de sementes,
e maior será o peso de cada uma delas, devendo-
DBC se ainda levar em conta o risco de se ter uma
Fontes de variação gl
semente atípica, o que complica ainda mais a
interpretação do resultado final. Com um pe-
Lote 3 = no de lotes –1
Método 2 = no de métodos –1
queno número de sementes, mas com a possibi-
Lote*Método 6 = (no de lotes –1) (no de métodos –1) lidade de instalação de um experimento com
Bloco 4 = (no de blocos –1) mais de um tratamento, é preferível trabalhar
Resíduo 44 = (59-3-2-6-4)
com um número menor de tratamentos e maior
Total 59= no de parcelas –1 de sementes por repetição do que o contrário.
gl: graus de liberdade. Quando não se tem limite nem de sementes
nem de espaço ou mão-de-obra, o emprego de
Nos dois delineamentos, os graus de liber- 50 ou 100 sementes por repetição é mais indica-
dade referentes ao tratamento foram desdobra- do.
dos em três causas de variação (Lote, Método e Nos experimentos com germinação, alguns
Lote*Método). Esse desdobramento permite sa- fatores não permitem, por motivos práticos, a
ber a contribuição individual (Lote e Método) casualização. O exemplo mais comum é a tem-
e conjunta (interação, designada Lote*Método) peratura, que, quando considerada um fator da
desses fatores na medida de germinação. análise e, portanto, um efeito a ser testado, im-
Quando o número de fatores aumenta, possibilita a casualização das parcelas. A prática
cresce também o número de combinações ou usual é manter, dentro de cada germinador ou
tratamentos, dificultando a interpretação dos câmara, uma temperatura fixa, variando o nú-
196 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

mero de germinadores de acordo com as tempe- zando-se estatísticas como t de “Student” e


raturas a serem testadas. A implicação é que Mann-Whitney, desde que o quadrado médio
os resíduos do modelo para o efeito da tempera- do resíduo dentro de cada época ou local seja
tura passam a não ser mais independentes pela mantido.
falta de casualização (Capítulo 12). No caso do É importante destacar ainda que, em al-
exemplo, cada germinador tem a precisão de guns casos, o insucesso da análise estatística
seu funcionamento associada a um dos trata- dos dados se deve ao planejamento inadequado
mentos (temperatura). Assim, se um dos ger- do experimento, associado ao uso de técnicas
minadores ou câmaras apresentarem maior va- estatísticas não-aplicáveis a certos conjuntos de
riação da temperatura regulada em relação aos dados.
demais germinadores, as repetições desse trata- As informações aqui apresentadas são váli-
mento poderão originar um valor médio subes- das para quaisquer unidades de dispersão, se-
timado ou superestimado de germinação. Isso jam sementes, frutos, esporos ou gemas.
ocorreria até em um delineamento casualizado
e, nesse caso, o efeito da temperatura, mesmo
que variável, poderia ser isolado do resíduo, mas REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
no delineamento não-casualizado esses efeitos BANZATTO, D.A.; KRONKA, S.N. Experimentação agríco-
podem ser confundidos. la. Jaboticabal: FUNEP, 1989. p. 247.
Além da temperatura, fatores como época BRASIL. Ministério da Agricultura e Reforma Agrária.
e local, amplamente estudados por pesquisado- Regras para análise de sementes. Brasília: SNDA/DNDV/CLV,
res, também podem impossibilitar a casualiza- 1992. p. 365.
ção. Esses fatores surgem como uma fonte de COCHRAN, W.G.; COX, G.M. Experimental designs. 2nd
variação da análise estatística quando experi- ed. New York: John Wiley, 1957. p. 617.
mentos independentes, em diferentes épocas PIMENTEL-GOMES, F. Curso de estatística experimental.
ou locais, são analisados conjuntamente. São São Paulo: Nobel, 1990. p. 468.
exemplos, experimentos nos quais os mesmos SCHEFFÉ, H. The analysis of variance. New York: John
tratamentos e repetições são instalados em dife- Wiley, 1959. p. 447.
rentes locais. Nesses casos, técnicas estatísticas SNEDECOR, G.W.; COCHRAN, W.G. Statistical methods.
específicas são aplicadas, como a análise con- 8th ed. Ames: Iowa State University, 1989. p. 593.
junta de experimentos e os esquemas de parce-
SOKAL, R.R.; ROHLF, F.J. Biometry. 3rd ed. New York:
las subdivididas no tempo ou no espaço (Pi- W.H. Freeman, 1997. p. 897.
mentel-Gomes, 1990). Além dessas técnicas,
STEEL, R.G.D.; TORRIE, J.H. Principles and procedures of
comparações binárias entre diferentes épocas
statistics. 2nd ed. New York: McGraw-Hill, 1980. p. 633.
ou locais também podem ser efetuadas, utili-
C A P Í T U L O 12

ANÁLISE ESTATÍSTICA
Denise Garcia de Santana
Marli A. Ranal

A análise estatística de dados obtidos a partir cativo entre αi e βj, ou seja, o efeito do trata-
de parcelas ou unidades experimentais que fo- mento (αi) interage com o efeito do bloco (βj).
ram arranjadas seguindo delineamentos pré- Isso também pode ocorrer nos modelos de en-
planejados (experimentais) inicia-se com os saios fatoriais em delineamento inteiramente
testes das pressuposições do modelo da análise casualizado (DIC) ou delineamento em blocos
da variância (ANOVA). Independente do deli- casualizados (DBC), e um efeito não-aditivo en-
neamento experimental, os principais efeitos tre os fatores pode tornar a estatística F da in-
do modelo devem ser aditivos; os resíduos (eij), teração ineficiente devido ao aumento no efei-
independentes e normalmente distribuídos; e to da interação (Sokal e Rohlf, 1997). O método
as variâncias, homogêneas. Essas condições são mais comumente aplicado para testar a não-
fundamentais para a eficiência da estatística F aditividade é o de Tukey (1949). Para esse teste,
da análise da variância, mas não são necessárias quando a hipótese de aditividade é rejeitada, a
para os testes não-paramétricos (Figura 12.1). transformação logarítmica pode ser aplicada na
Das pressuposições, a única não testável é a in- tentativa de tornar os efeitos aditivos.
dependência dos resíduos, mas esta é garanti-
da pela casualização (Steel e Torrie, 1980).
Em situações experimentais pouco fre- TESTES DE
qüentes, os principais efeitos do modelo podem NORMALIDADE
não ser aditivos, mas multiplicativos, por exem- E HOMOGENEIDADE
plo. Nos modelos de delineamentos inteiramen- Dos testes de normalidade, o de Kolmogorov-
te casualizados, com apenas um fator principal Smirnov não tem restrição quanto ao tamanho
(yij = μ + αi + eij, onde yij é o valor da parcela da amostra ou número de parcelas, além de não
que recebeu o tratamento i na repetição j; μ, a perder informação devido ao agrupamento,
média geral do experimento; αi, o efeito do i- como o teste de aderência ou qui-quadrado
ésimo tratamento; eij, o erro da parcela que rece- (Campos, 1983). O teste de Lilliefors é uma va-
beu o tratamento i na repetição j), a aditividade riação do de Kolmogorov-Smirnov para os casos
não precisa ser testada, pelo fato de μ ser cons- em que a média e a variância populacionais des-
tante e os erros serem independentes. Nos mo- conhecidas são estimadas por meio dos dados
delos de delineamentos em blocos casualizados da amostra (Lilliefors, 1967). Esse teste tam-
(yij = μ + αi +βj + eij, , onde yij é o valor da bém não tem restrição quanto ao tamanho da
parcela que recebeu o tratamento i no bloco j; amostra ou ao número de parcelas. Por outro
μ, a média geral do experimento; αi, o efeito do lado, o de Shapiro-Wilk (Shapiro e Wilk, 1965)
i-ésimo tratamento; βj, o efeito do j-ésimo bloco; é recomendado quando o tamanho da amostra
eij, o erro da parcela que recebeu o tratamento e/ou o número de parcelas do experimento são
i no bloco j), pode ocorrer um efeito multipli- pequenos (n < 50). Como os modelos de análi-
198 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Delineamento inteiramente Delineamento em blocos


casualizado (DIC) casualizados (DBC)

Coleta e organização
dos dados
para análise

Teste de aditividade

Teste de normalidade

Resíduos normais Resíduos não-normais

Teste de Transformação Estatística


homogeneidade dos dados não-paramétrica

Variâncias Variâncias Kruskal-Wallis Friedman


homogêneas heterogêneas DIC DBC

Análise
da variância

DIC DBC

 Figura 12.1
Fluxograma da seqüência da análise estatística paramétrica e não-paramétrica.

se da variância exigem resíduos, e não dados tativa de todos os tratamentos. O teste de Bartlett
com distribuição normal, esses testes devem ser (1937), apesar de exigir normalidade dos resí-
aplicados aos resíduos do modelo. Nos delinea- duos, é o mais recomendado para testar a ho-
mentos inteiramente casualizados, os resíduos mogeneidade entre as variâncias quando se tem
são calculados por eij = yij – y i., onde yij é o valor mais de duas amostras ou tratamentos. O méto-
da parcela que recebeu o tratamento i na repeti- do proposto por Hartley (1950), apesar de fácil
ção j, e y i. é a média do tratamento i. Nos mode- aplicação, é pouco eficiente (Sokal e Rohlf,
los de delineamentos em blocos casualizados, 1997), menos sensível que o teste de Bartlett
os resíduos são calculados por eij = yij – y i. – y .j + (Snedecor e Cochran, 1989), exigindo também
y .., onde yij é o valor da parcela que recebeu o normalidade dos resíduos (Neter, Wasserman e
tratamento i no bloco j; y i. é a média do trata- Kutner, 1985). Por isso, no fluxograma (Figura
mento i; y .j é a média do bloco j; e y .., a média 12.1), o teste de homogeneidade aparece após o
geral do experimento. de normalidade e deve ser aplicado somente
A homogeneidade entre as variâncias (ou quando os resíduos têm distribuição normal.
homocedasticidade) também é uma condição Quando as hipóteses de aditividade, nor-
para a aplicação da maioria dos testes estatísti- malidade e homogeneidade são atendidas, o
cos (Sokal e Rohlf, 1997), tendo importância teste F da análise da variância pode ser aplicado
ainda maior na análise da variância. Isso porque, e tem maior poder. Na Tabela 12.1 estão apre-
nessa análise, qualquer efeito de tratamento é sentadas algumas opções para testes de aditi-
comparado com o quadrado médio do resíduo, vidade, normalidade e homogeneidade, segui-
que é a variância média do experimento, e, por- das da expressão mais usual e das referências
tanto, ela deve ser homogênea por ser represen- para consultas mais detalhadas.
Tabela 12.1 Resumo de alguns testes de pressuposições para a análise da variância, com as expressões mais usuais e as referências correspondentes

Teste de aditividade1 Característica/condição Expressão Referências

Tukey para não-aditividade A não-aditividade dos efeitos principais SQBL * TRAT Tukey (1949); Neter, Wasserman e
do modelo é pouco freqüente SQBL.TRAT = Kutner (1985); Sokal e Rohlf (1997)
SQBL + SQTR
r t

Teste de normalidade2
2
Shapiro-Wilk n < 50 g m Shapiro e Wilk (1965); Gill (1978);
Wc = , sendo: g = å ai,n (en-i+1 – ei) Santana e Ranal (2004)
SQR i=1

Kolmogorov-Smirnov n de qualquer tamanho 1 ^ Campos (1983); Sokal e Rohlf


Dmáx = gmáx + , sendo: g = F (zi) – F0,5 ; (1997); Santana e Ranal (2004)
2n
(i – 0,5)
F0,5 =
n

Lilliefors Variação do teste de Kolmogorov-Smirnov; D = sup F(Z) – S(Z) , sendo:

n de qualquer tamanho zi Lilliefors (1967); Campos (1983)


k
F(zi) = P(z ³ zi) = ò f(z)dz S(zi)=
-¥ n

Teste de homogeneidade3
2
F máximo de Hartley Exige resíduos com distribuição normal; smáx Hartley (1950); Neter, Wasserman
conhecido por ter baixa eficiência; Fmáx = 2 e Kutner (1985); Sokal e Rohlf
s mín
aplicável para qualquer número de (1997); Santana e Ranal (2004)
amostras ou tratamentos
a a
2 2 2
Bartlett Exige resíduos com distribuição normal; c = å (ni – 1)ln s – å (ni – 1)ln si , sendo Bartlett (1937); Neter, Wasserman
número de amostras ou tratamentos maior i=1 i=1 e Kutner (1985); Sokal e Rohlf
que dois (1997); Zar (1999); Santana e Ranal
2 2 (2004)
s = å (ni – 1) si å (ni – 1)
i i

1
SQBL*TRAT: soma de quadrados da interação do bloco com o tratamento; SQBL: soma de quadrados de blocos; SQTR: soma de quadrados de tratamentos; r: número de repetições;
GERMINAÇÃO

t: número de tratamentos.
2
SQR: soma de quadrados do resíduo; a: coeficientes tabelados para o teste de Shapiro-Wilk (Gill, 1978); e: erro experimental ou resíduo; n: número de parcelas; gmáx: maior diferença
absoluta de g; ^ F(zi): função de distribuição normal acumulada; i: número da amostra; k: número de observações a partir da primeira até o valor de zi encontrado, inclusive.
3 2
199

s máx: maior variância entre os tratamentos; s2mín: menor variância entre os tratamentos; ni = ri: número de repetições do tratamento i; s2i: variância do tratamento i.
200 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

A Tabela 12.2 apresenta o resultado da aná- terística analisada. Os resultados da análise da


lise das pressuposições do modelo de um deli- variância para a germinabilidade (Tabela 12.3)
neamento inteiramente casualizado para ger- e para o tempo médio de germinação (Tabela
minabilidade, tempo médio, velocidade média 12.4) das sementes de couve-da-Malásia mos-
e sincronia de germinação de sementes de Bras- tram que há, pelo menos, duas médias estatis-
sica chinensis L. var. parachinensis (Bailey) Sins- ticamente diferentes para ambas as caracterís-
kaja (couve-da-Malásia), oriundas de plantas ticas avaliadas.
com deficiência nutricional. As probabilidades Outra forma de analisar estatisticamente
(valores entre parênteses) maiores que o valor as medidas de germinação obtidas a partir de
nominal (α = 0,01) indicam que todas as ca- valores ponderados, como é o caso do tempo
racterísticas das sementes estudadas seguem médio e da velocidade média de germinação, é
as pressuposições do modelo para a análise da a análise da variância com peso de pondera-
variância (P > 0,01). A tabela mostra ainda que, ção. Nesse caso, a média ponderada é calculada
apesar de a germinabilidade ser uma medida para o conjunto de unidades de dispersão do
expressa em porcentagem, não necessita da tratamento. A Tabela 12.5 apresenta o quadro
transformação dos dados, porque, nesse caso, de análise da variância para o tempo médio de
as pressuposições para o modelo da ANOVA fo- germinação de esporos de Pteris denticulata Sw.
ram atendidas. Isso significa que dados em por- (Pteridaceae, Pteridophyta), submetidos a qua-
centagem só precisam ser transformados para tro temperaturas (18,5; 22,2; 25,2 e 29,8oC), em
valores angulares quando essas pressuposições que o peso de ponderação é o número de espo-
não forem atendidas. ros germinados (Ranal, 1999). O valor da pro-
babilidade (P < 0,05) indica que o tempo médio
de germinação difere, pelo menos, para duas
ANÁLISE DA VARIÂNCIA temperaturas estudadas.
Garantidas as pressuposições para essas medi- Como nesse caso cada unidade de dispersão
das de germinação, a análise da variância pode representa uma parcela do experimento, isso
ser realizada tendo como hipótese nula que as aumenta os graus de liberdade do resíduo em
médias dos tratamentos são iguais para a carac- comparação com a ANOVA não-ponderada,

Tabela 12.2 Padrão de germinação das sementes de Brassica chinensis L. var. parachinensis (Bailey)
Sinskaja (couve-da-Malásia), oriundas de plantas com deficiência nutricional (dados fornecidos por E.F.M.
Pereira, W.Z. Gonçalves, C.C. Borges e M.A. Ranal). Médias de cinco repetições
Medidas1
Tratamento G (%) t (hora) v (hora –1) E (bit)

T1 96,00 29,304 0,0342 2,11994


T2 94,04 22,926 0,0440 1,60728
T3 94,24 22,406 0,0448 1,44244
T4 92,37 24,854 0,0403 1,86042
T5 96,40 28,230 0,0357 2,00552
T6 94,00 21,726 0,0461 1,34852
T7 98,81 23,771 0,0423 1,43858
T8 94,40 29,054 0,0345 2,12136
T9 98,80 28,022 0,0358 2,07688
2
Shapiro-Wilk (W) 0,964 (0,2732) 0,938 (0,0252) 0,950 (0,0766) 0,953 (0,1045)
Bartlett (X 2) 6,586 (0,5819) 4,939 (0,7641) 5,324 (0,7224) 5,754 (0,6750)
1
G: germinabilidade; t : tempo médio de germinação (Labouriau, 1983); v : velocidade média de germinação (Labouriau, 1970);
E : índice de sincronização (Labouriau e Valadares, 1976).
2
Valores entre parênteses referem-se à probabilidade; quando são maiores que 0,01, indicam normalidade dos resíduos ou
homogeneidade entre as variâncias.
GERMINAÇÃO 201

Tabela 12.3 Análise da variância para a germinabilidade das sementes de Brassica chinensis L. var.
parachinensis (Bailey) Sinskaja (couve-da-Malásia), oriundas de plantas com deficiência nutricional

Fontes de variação gl1 Soma de quadrados2 Quadrado médio3 F4 Probabilidade

Tratamento t–1=8 SQT = 199,1130 QMT = 24,8891 2,63 0,0222


Resíduo t ( r – 1) = 36 SQR = 340,4216 QMR = 9,4562
Total tr – 1 = 44 SQTO = 539,5346
1
gl: graus de liberdade; t: número de tratamentos; r: número de repetições; 2SQT = y2i. / r-(y..)2 / tr; SQTO = y2ij – (y..)2 /tr;
SQR = SQTO – SQT, onde yi.: é o total do tratamento i; y..: total geral; yij: valor da parcela que recebeu o tratamento i na repetição
j; 3 QMT = SQT / t – 1; QMR = SQR / t (r – 1); 4 F = QMT / QMR.

ampliando a eficiência da estatística F (aumen- hipótese nula, ou seja, indicaria que não há di-
to do valor do F) e, conseqüentemente, a chance ferença significativa entre os tratamentos a 0,01
de se detectarem diferenças entre os tratamen- de probabilidade.
tos. Esse aumento nos graus de liberdade pode
ser exemplificado quando se comparam, para
o mesmo experimento, as Tabelas 12.5 e 12.6. TRANSFORMAÇÃO DE DADOS
Uma das maiores dificuldades de interpre- Uma tentativa de aplicar a análise da variância,
tação de uma análise da variância é o entendi- quando uma ou mais pressuposições do modelo
mento do valor da probabilidade. Depois de es- não são atendidas, é a transformação de dados,
tabelecido o valor da significância, α = 0,05, escolhida de acordo com a natureza da caracte-
por exemplo, valores de probabilidade acima rística em estudo (contagem, porcentagem, no-
desse valor nominal (P > 0,05) indicam a região tas, etc.). A principal finalidade da transforma-
de aceitação da hipótese de que os tratamentos ção de dados é estabilizar as variâncias entre os
são iguais (RAHo); caso contrário (P < 0,05), tratamentos e, como conseqüência, garantir a
indicam a região de rejeição dessa hipótese normalidade dos resíduos (Neter, Wasserman e
(RRHo), e o teste é dito significativo (Figura Kutner, 1985). Segundo esses autores, quando
12.2). O valor da estatística F e o da probabilida- os resíduos apresentam distribuição normal, a
de a ela associada, apresentados na Tabela 12.3, transformação das observações que estabiliza a
mostram que a hipótese nula foi rejeitada e que, variância pode afetar a normalidade. Essa con-
portanto, há diferença significativa entre os tra- sideração justifica a necessidade de novamente
tamentos (dados da Tabela 12.2). Se o valor α se testar a normalidade para as observações trans-
estabelecido fosse menor (α = 0,01), o teste formadas (Figura 12.1).
teria sido mais rigoroso, e o valor calculado da A heterogeneidade entre as variâncias sur-
probabilidade estaria mostrando a aceitação da ge quando um ou mais tratamentos apresen-

Tabela 12.4 Análise da variância para o tempo médio de germinação das sementes de Brassica
chinensis L. var. parachinensis (Bailey) Sinskaja (couve-da-Malásia), oriundas de plantas com deficiência
nutricional. O tempo médio (Labouriau, 1983) foi calculado para cada placa de Petri (repetição), sendo
então processada a ANOVA

Fontes de variação gl1 Soma de quadrados2 Quadrado médio3 F4 Probabilidade

Tratamento t–1=8 SQT = 373,4034 QMT = 46,6754 13,30 0,0000


Resíduo t ( r – 1) = 36 SQR = 126,3630 QMR = 3,5101
Total tr – 1 = 44 SQTO = 499,7664
1gl: graus de liberdade; t: número de tratamentos; r: número de repetições; 2SQT = y2 / r-(y )2 / tr; SQTO = y2 – (y )2 /tr;
i. .. ij ..
SQR = SQTO – SQT, onde yi.: é o total do tratamento i; y..: total geral; yij: valor da parcela que recebeu o tratamento i na repetição
j; 3 QMT = SQT / t – 1; QMR = SQR / t (r – 1); 4 F = QMT / QMR.
202 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Tabela 12.5 Análise da variância com peso de ponderação para o tempo médio de germinação de
esporos de Pteris denticulata Sw. (Pteridaceae, Pteridophyta) estudados por Ranal (1999). O tempo médio
foi calculado para o conjunto de esporos germinado em cada temperatura5

Fontes de variação gl1 Soma de quadrados2 Quadrado médio3 F4 Probabilidade

Temperatura t–1=3 SQT = 1112,3992 QMT = 370,7997 130,430 0,0000


Resíduo n – t = 1157 SQR = 3289,2192 QMR = 2,8429
Total n – 1 = 1160 SQTO = 4401,6184
1
gl: graus de liberdade; t: número de tratamentos; n: número total de esporos germinados; 2SQT = Σ (niti)2 / ni – (Σ niti)2 / n;
SQTO = Σ ni (ti)2 – (Σ niti)2 / n; SQR = SQTO – SQT, onde ni: é o número de esporos germinados no tratamento i; ti: tempo médio
do tratamento i; 3 QMT = SQT / t – 1; QMR = SQR / n – t; 4 F = QMT / QMR; 5a análise da variância com peso de ponderação é
executada por alguns programas estatísticos, entre eles, o SAS (1990) e o SPSS (1999).

tam maior variabilidade que os demais do ex- de plântulas normais, de esporófitos e outros,
perimento, gerando efeitos discrepantes, ou a transformação do tipo raiz quadrada ( x ou
quando existe dependência entre a média e a x + k) é mais apropriada. A constante k =
variância ou desvio padrão. No primeiro caso, 0,5 proposta por Bartlett (1936) é preferida, es-
a heterogeneidade é do tipo irregular, e o me- pecialmente quando há um grande número de
lhor procedimento para tentar estabilizar a va- dados iguais a (ou próximos de) zero (Zar,
riância é a retirada dos tratamentos discrepan- 1999). Transformações do tipo logarítmica, log
tes para a análise (Steel e Torrie, 1980). O se- (x) ou log (x+k) são sugeridas para corrigir a
gundo caso retrata o tipo regular de heteroge- não-aditividade dos efeitos (Zar, 1999), e não
neidade, e esta pode ser corrigida pela transfor- para estabilizar variâncias.
mação dos dados. Apesar da recomendação de muitos esta-
A transformação angular (arcoseno % 100 ) tísticos de que dados transformados não devem
é própria para estabilizar variâncias de trata- ser substituídos por suas médias originais, tec-
mentos quando a variável em estudo é uma pro- nologistas, ecólogos e fisiólogos discordam des-
porção (varia entre 0 e 1) ou porcentagem (varia sa recomendação. Como a porcentagem de ger-
entre 0 e 100%). Dados de contagem que geram minação em escala angular não permite uma
proporções são conhecidos por seguirem a dis- interpretação prática, os pesquisadores da área
tribuição binomial em vez da normal, sendo os de germinação recomendam que a apresenta-
desvios entre as duas distribuições maiores para ção e a discussão dos resultados sejam baseadas
pequenas (0 a 30%) e grandes (70 a 100%) por- na escala em que os dados foram coletados.
centagens (Zar, 1999; Snedecor e Cochran, Uma alternativa para associar as questões esta-
1989). Para dados de contagem, como o número tísticas teóricas com as práticas é apresentar a

Tabela 12.6 Análise da variância para o tempo médio de germinação de esporos de Pteris denticulata
Sw. (Pteridaceae, Pteridophyta) estudados por Ranal (1999). O tempo médio foi calculado para cada
repetição (área de 1 cm2), em um total de quatro repetições por tratamento

Fontes de variação gl1 Soma de quadrados2 Quadrado médio3 F4 Probabilidade

Temperatura t – 1 =3 SQT = 16,8365 QMT = 5,6122 13,793 0,0003


Resíduo t (r – 1) =12 SQR = 4,8830 QMR = 0,4069
Total tr – 1 = 15 SQTO = 21,7195
1gl: graus de liberdade; t: número de tratamentos; r: número de repetições; 2SQT = y2 / r – (y )2 / tr; SQTO = y2 – (y )2 /tr;
i. .. ij ..
SQR = SQTO – SQT, onde yi.: é o total do tratamento i; y..: total geral; yij: valor da parcela que recebeu o tratamento i na repetição
j; 3 QMT = SQT / (t – 1); QMR = SQR / t (r – 1); 4 F = QMT / QMR.
GERMINAÇÃO 203

P > 0,05
RAHo
0,95
P < 0,05

a = 0,05

RRHo

F F F
P > 0,05 0,05 P < 0,05

 Figura 12.2
Distribuição F mostrando as regiões de aceitação (RAHo) e rejeição (RRHo) da hipótese Ho à significância 0,05.

tabela nas duas escalas, como fizeram Ferreira dade é menor que o valor da significância (α)
e Ranal (1999). estabelecido (P < α).
A Tabela 12.7 apresenta o resultado da aná-
lise não-paramétrica de medidas de germinação
TESTES NÃO-PARAMÉTRICOS para sementes da couve-da-Malásia, submeti-
Se uma ou mais pressuposições não são aten- das à ação de extratos obtidos a partir de folhas
didas, mesmo com a transformação dos dados, e cascas de Copaifera langsdorffii Desf. (Ranal e
testes não-paramétricos devem ser utilizados. Santana, 2002).
As versões não-paramétricas do delineamento Os valores de probabilidade associados ao
inteiramente casualizado e dos blocos casuali- valor da estatística H de Kruskal-Wallis indicam
zados são os testes de Kruskall-Wallis e Fried- que há diferença significativa entre os trata-
man, respectivamente, não exigentes quanto mentos (P < 0,05) para todas as características
às pressuposições da análise da variância para- estudadas, exceto para o coeficiente de variação
métrica. A desvantagem dos testes não-para- do tempo (P > 0,05).
métricos é que extraem menos informação do Outros testes paramétricos e não-paramé-
que a disponível no conjunto de dados (Steel e tricos são apresentados na Tabela 12.8, segui-
Torrie, 1980). dos da expressão mais usual e das referências
Mesmo utilizando uma estatística de postos para consultas mais detalhadas.
ou ranks, como é a estatística não-paramétrica, Tanto o teste F da análise da variância para
as hipóteses de nulidade e alternativa têm o o DIC ou o DBC quanto as estatísticas dos testes
mesmo objetivo das hipóteses da análise da va- de Kruskal-Wallis e Friedman, ao rejeitarem a
riância, ou seja, o de não detectar ou o de de- hipótese Ho, indicam apenas que pelo menos
tectar diferenças entre os tratamentos. Os tes- duas amostras ou tratamentos são diferentes,
tes não-paramétricos não apresentam análise mas não apontam os tratamentos que diferem
da variância, e as estatísticas H de Kruskal- entre si. A literatura é abrangente no que se
Wallis e X2 de Friedman, da mesma forma que refere aos testes para comparações entre os tra-
o teste F, têm a hipótese de nulidade rejeitada tamentos, e cada teste tem sua especificidade
quando os valores H ou X2 são maiores ou iguais e seu rigor. Entretanto, um ponto importante é
ao valor crítico ou, ainda, quando a probabili- saber se os testes serão escolhidos independen-
204 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Tabela 12.7 Medidas de germinação (valores médios) para sementes de Brassica chinensis L. var.
parachinensis (Bailey) Sinskaja (couve-da-Malásia) submetidas à ação de extratos obtidos a partir de folhas
e cascas de Copaifera langsdorffii Desf. (Ranal e Santana, 2002). Médias de quatro repetições

Tratamento
Medida Alcalóide2 Alcalóide2 Alcalóide2 Extrato3
(unidade)1 Água 62,5 mg mL-1 125,0 mg mL-1 250 mg mL-1 Bruto H4 P

G (%) 96,33 100,00 100,00 98,67 22,67 23,256 0,0001



t (h) 35,96 32,10 33,76 50,92 88,47 19,832 0,0005

v (h-1) 0,0313 0,0315 0,0309 0,0203 0,0115 19,818 0,0005
VE (sem.h-1) 1,701 1,771 1,743 1,136 0,165 19,901 0,0005

E (bits) 2,508 2,301 2,561 3,058 2,716 12,215 0,0158
CVt (%) 35,38 31,60 35,18 31,80 45,12 9,269 0,0547
1 – –
G: germinabilidade; t : tempo médio de germinação – (Labouriau, 1983); v: velocidade média de germinação (Labouriau, 1970);
VE: velocidade de emergência (Maguire, 1962); E : índice de sincronização (Labouriau e Valadares, 1976); CVt: coeficiente de
variação do tempo (Ranal e Santana, 2002).
2
Solução aquosa de alcalóide salino à base de cloreto de amônio.
3
Extrato aquoso de folhas (1:10 massa/volume).
4
Estatística do teste de Kruskal-Wallis; valores em negrito indicam diferença significativa entre os tratamentos.

temente do resultado do experimento. A razão Tabela 12.9, pode-se observar a característica


é que existem testes apropriados para compara- mais importante do teste Scott-Knott, que é a
ções pré-planejadas, como os contrastes, e não- separação das médias em grupos exclusivos
planejadas, como as comparações múltiplas (apenas uma letra para cada média).
(Sokal e Rohlf, 1997). O teste de Mann-Whitney, apesar de com-
parar tratamentos ou amostras duas a duas,
não se baseia na variabilidade geral do experi-
TESTES PARA mento (quadrado médio do resíduo), como o
COMPARAÇÕES fazem os testes de Tukey, Duncan e Scott-Knott.
MÚLTIPLAS Por isso, não é apropriado para comparar pares
Os chamados testes para comparações múlti- de tratamentos ou amostras de um conjunto
plas (paramétricos) são apropriados para com- maior que dois. Uma alternativa de teste não-
parações não-planejadas de tratamentos e, em paramétrico para comparar pares de tratamen-
geral, exigem as mesmas pressuposições dos tos e manter a variabilidade geral do experi-
modelos da análise da variância (Zar, 1999). mento é o teste de Dunn (Zar, 1999).
Em todos os testes de comparações múltiplas, Uma forma de comparação entre tratamen-
o máximo poder e a máxima consistência são tos pouco utilizada em germinação de sementes
alcançados quando o tamanho da amostra ou é o uso de regressão, recurso disponível quan-
o número de repetições é igual para todos os do os tratamentos são atributos quantitativos
tratamentos ou amostras (Zar, 1999). como doses, níveis, tempo, temperatura, entre
A Tabela 12.9 apresenta o resultado de tes- outros. Das análises estatísticas, a regressão é
tes paramétricos para comparações múltiplas a de mais difícil interpretação e, portanto, os
dos dados de velocidade média de germinação modelos são pouco aplicados. Talvez, por isso,
de sementes de couve-da-Malásia. A diferença os pesquisadores tratem os atributos quantitati-
de rigor entre os testes de Tukey, Duncan e vos como qualitativos e apliquem os testes para
Scott-Knott pode ser observada para os trata- comparações múltiplas.
mentos T4 e T9, cujas médias de velocidade não A Tabela 12.10 apresenta alguns dos testes
diferiram significativamente para o Tukey, mas de comparações múltiplas mais utilizados e fre-
diferiram para Duncan e Scott-Knott. Ainda na qüentes nos trabalhos científicos.
Tabela 12.8 Principais expressões e referências de testes paramétricos e não-paramétricos

Análise paramétrica Características/condições Expressão Referências

Análise da variância (DIC) Aplicável a condições experimentais homogêneas; segue os QMT Cochran e Cox (1957);
F=
princípios da repetição e da casualização QMR Scheffé (1959); Snedecor e
Cochran (1989); Steel e
Análise da variância (DBC) Aplicável a condições experimentais heterogêneas; segue os QMT Torrie (1980);
princípios da repetição, da casualização e do controle local F= Neter, Wasserman e Kutner
QMR
(1985); Banzatto e Kronka
(1989);
Análise da variância (DIC São testados os efeitos principais (fatores) e a interação QMA QMB QMA*B Pimentel-Gomes (1990);
F= ; F= ; F=
ou DBC) com dois fatores entre eles QMR QMR QMR Sokal e Rohlf (1997)

Análise da variância com Condições experimentais homogêneas; número de unidades QMT SAS (1990), SPSS (1999)
peso de ponderação de dispersão germinadas em cada repetição como peso de F=
QMR
ponderação

Análise não-paramétrica
2
Kruskal-Wallis Versão não-paramétrica do delineamento inteiramente 12 t Ri Friedman (1937);
H= å – 3 (n + 1)
casualizado n(n+1) i=1 ni Friedman (1940);
Mann e Whitney (1947);
Friedman Versão não-paramétrica do delineamento em blocos 2 12 2 Kruskal e Wallis (1952);
c = å Ri – 3n (r + 1)
casualizados nr (r+1) i Siegel (1975);
Campos (1983);
Mann-Whitney Versão não-paramétrica do teste t de Student n1 (n1 + 1) Neter, Wasserman e Kutner
U = n1 n2 + – R1
2 (1985); Zar (1999);
Santana e Ranal (2004)
n2 (n2 + 1)
U = n1 n2 + – R2
2

Análise fatorial não- Versão não-paramétrica da análise da variância com dois SQA SQB Scheirer et al. (1976;
paramétrica ou mais fatores H= ;H= ; citados por Zar, 1984)
QMTO QMTO

SQA*B
H=
QMTO
GERMINAÇÃO

QMT: quadrado médio do tratamento; QMR: quadrado médio do resíduo; QMA: quadrado médio do fator A; QMB: quadrado médio do fator B; QMA*B: quadrado médio da interação
entre os fatores A e B; n: número de parcelas do experimento; Ri: soma dos postos do tratamento i; ni = r: número de repetições do tratamento i; R1: soma dos postos do tratamento 1;
R2: soma dos postos do tratamento 2; n1: número de repetições do tratamento 1; n2: número de repetições do tratamento 2; SQA: soma de quadrados para o fator A; SQB: soma de
205

quadrados para o fator B; SQA*B: soma de quadrados da interação entre os fatores A e B; QMTO: quadrado médio total.
206 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)


Tabela 12.9 Testes para comparações de velocidades médias (v) de germinação de sementes de
Brassica chinensis L. var. parachinensis (Bailey) Sinskaja (couve-da-Malásia), oriundas de plantas com
deficiência nutricional (dados fornecidos por E.F.M. Pereira, W.Z. Gonçalves, C.C. Borges e M.A. Ranal)

Tratamento v (hora-1) Tukey Duncan Scott-Knott

T6 0,0461 0,0461 a 0,0461 a 0,0461 a


T3 0,0448 0,0448 a 0,0448 a 0,0448 a
T2 0,0440 0,0440 a 0,0440 ab 0,0440 a
T7 0,0423 0,0423 a 0,0423 ab 0,0423 b
T4 0,0403 0,0403 ab 0,0403 b 0,0403 b
T9 0,0358 0,0358 bc 0,0358 c 0,0358 c
T5 0,0357 0,0357 bc 0,0357 c 0,0357 c
T8 0,0345 0,0345 bc 0,0345 c 0,0345 c
T1 0,0342 0,0342 c 0,0342 c 0,0342 c
1
médias seguidas por letras diferentes na coluna diferem entre si pelos testes de Tukey, Duncan e Scott-Knott (P < 0,05);

v : velocidade média de germinação (Labouriau, 1970).

ENSAIOS FATORIAIS o estudo dos níveis do outro, podendo-se efetuar


Os exemplos apresentados e discutidos ante- esse estudo por meio de um teste para compara-
riormente envolveram apenas um fator. Entre- ções múltiplas ou regressão. A segunda situação
tanto, o pesquisador pode comparar dois ou ocorre quando a interação não é significativa e,
mais fatores, nos chamados ensaios fatoriais portanto, é desprezada; um estudo de cada um
(planejamento discutido no Capítulo 11). Nos dos fatores pode ser realizado isoladamente.
ensaios fatoriais com dois fatores, duas situa- Como os ensaios fatoriais, em geral, não
ções distintas quanto à significância podem são tratados dessa forma pelos biólogos e ecó-
ocorrer. A primeira (e a mais esperada) é o re- logos, ou seja, cada fator e a sua interação não
sultado da interação entre os fatores, que, quan- são mantidos em separado, mas analisados co-
do significativa, estabelece uma relação de de- mo se fossem apenas um fator (tratamentos),
pendência entre eles. Nesse caso, o procedimento recomenda-se para maior detalhamento dessas
é o chamado desdobramento da interação, que estruturas os trabalhos de Banzatto e Kronka
consiste na fixação dos níveis de um fator para (1989) e de Pimentel-Gomes (1990).
Tabela 12.10 Testes para comparações múltiplas e contrastes para comparação entre tratamentos

Comparações múltiplas Característica/condição Expressão Referências

LSD Primeiro teste para comparações de médias LSD = t 2 QMR/d Newman (1939);
duas a duas; conhecido como diferença de Keuls (1952);
mínimos quadrados Tukey (1953);
Duncan (1955);
Tukey Compara médias duas a duas; mais rigoroso; DMS = D = qa(t,v) QMR/d O´Neill e Wetherill (1971);
não recomendável para mais de 20 tratamentos Scott e Knott (1974);
ou amostras Steel e Torrie (1980);
Zar (1999)
SNK Compara médias duas a duas; rigor intermediário DMSi = Ki = qa(t,v) QMR/d
entre Tukey e Duncan

Duncan Compara médias duas a duas; menos rigoroso


DMSi = Di= za(t,v) QMR/d
que Tukey e SNK

p Bo t
Scott-Knott Separa os tratamentos em grupos exclusivos l= sendo: s
ˆo2 = å (yi. – y)2 + vs2 (yi) /(t+v)
2 (p – 2) ˆo2
s i=1

Contrastes

Teste t de Student Testa contrastes envolvendo duas ou mais médias; å ci2 Scheffé (1953);
as comparações devem ser planejadas antes do DMS = T = t Vˆ (yˆ ) sendo: Vˆ (yˆ ) = QMR Dunnett (1955);
d
acesso aos dados; os contrastes devem ser Steel e Torrie (1980);
ortogonais Zar (1999)

Teste F Exige contrastes ortogonais e mutuamente (å ciyi.)2 QMŷ


ortogonais SQyˆ = 2
; F=
dåci QMR
2
Scheffé Testa contrastes envolvendo mais de duas médias; ˆ åci
exige F da análise da variância significativo DMS = S = (t – 1) FaVˆ (yˆ ) sendo: V(yˆ ) = QMR
d
Dunnett Compara individualmente a testemunha com 1 1
qualquer outro tratamento tD = yi. – yc ( + ( QMR
ri rc

DMS: diferença mínima significativa; qα (t,v): valor da amplitude total estudentizada da tabela de Tukey, à significância α; obtido em função do número de médias envolvidas e do número
GERMINAÇÃO

de graus de liberdade do erro (v); d: número de observações de cada amostra ou tratamento normalmente coincide com o número de repetições; zα (k,v): valor da amplitude total
estudentizada da tabela de Duncan, à significância α; obtido em função do número de médias envolvidas no teste (k) e do número de graus de liberdade do erro (v); t: valor da distribuição

de Student; QMR: quadrado médio do resíduo; ci: coeficientes do contraste; yi.: total do tratamento i; Fα: valores tabelados da distribuição de Snedecor para a significância α; yi.: média

207

do tratamento i; yc: média do tratamento controle ou testemunha; ri: número de repetições do tratamento i; rc: número de repetições do tratamento-controle ou testemunha.
208 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

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of two random variables is stochastically larger than the
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C A P Í T U L O 1 3

INTERPRETAÇÃO
DE RESULTADOS DE
GERMINAÇÃO
Fabian Borghetti
Alfredo Gui Ferreira

CRITÉRIOS DE GERMINAÇÃO A primeira contagem, as demais (se neces-


A interpretação dos dados obtidos em estudos sárias) e a final variam de espécie para espécie
acerca da germinação das sementes depende e estão listadas nas RAS (Regras para Análise
inicialmente do critério de germinação adotado. de Sementes, Brasil, 1992). Nessas regras, a
No “critério agronômico ou tecnológico”, maioria das plantas cultivadas está contempla-
considera-se germinação a emergência da plan- da. O intervalo entre as contagens intermediá-
ta no solo ou a formação de uma plântula vigo- rias também varia em função da espécie, sen-
rosa no substrato utilizado. Entretanto, esse cri- do mais comum de três em três dias ou a cada
tério inclui não apenas o processo germinativo semana, dependendo da velocidade de germi-
per se, mas também a velocidade de crescimento nação das sementes.
e a profundidade da semente no solo, fatores O “critério botânico ou morfológico” con-
que influem consideravelmente na emergência sidera a germinação como a protrusão de uma
da plântula. Observa-se que tal critério mistura das partes do embrião de dentro dos envoltó-
dois fenômenos fisiológicos interdependentes, rios, associada a algum sinal de real crescimen-
porém diferentes, a germinação da semente e to, como a curvatura geotrópica da raiz e/ou a
o crescimento inicial da plântula. A diferença parte aérea, a síntese de pigmentos, etc. Tanto
se estabelece no momento em que, para a ger- fatores abióticos, como a temperatura e a umi-
minação, muitos genes são acionados e trans- dade, quanto bióticos, como a presença de subs-
criptomas e proteomas são formados e regula- tâncias tóxicas produzidas por plantas vivas ou
dos pelas condições vigentes. No crescimento mortas presentes no local (como resíduos ve-
inicial, outros genes são acionados, e alguns da getais), têm influência na germinação. É evi-
germinação, desligados ou reprimidos (Capítu- dente que, se o estudo está sendo realizado em
lo 6). Para estudos de “germinação” sob condi- laboratório, em uma placa de petri ou gerbox
ções de campo, entretanto, esse critério é bas- com substrato de papel, a influência biótica não
tante apropriado. Assim, a forma de contagem é significativa. Porém, em solo, ela pode tornar-
e os índices usados diferem. Por exemplo, a pri- se crítica (Capítulo 16).
meira contagem de germinação que analisa o Há ainda o “critério bioquímico”, que, por
vigor da(s) amostra(s) pode ser muito útil na meio de diferentes procedimentos experimen-
avaliação de amostras ou lotes de sementes. En- tais, quantifica variações no metabolismo geral
tretanto, quando se examina sob o ponto de do diásporo, como, por exemplo, testes de ativi-
vista da ecofisiologia da germinação, essa infor- dade enzimática e medidas de consumo de oxi-
mação torna-se insuficiente (ver a seguir). gênio. Um teste bastante empregado em se-
210 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

mentes é o uso de soluções aquosas de 2,3,5 mesmo de 6 horas (testes-piloto podem dar
tri-fenil tetrazólio. Esse sal, incolor em solução uma idéia da cinética do processo). Por exem-
aquosa, quando colocado em contato com as plo, a 22oC, todo um lote de diásporos de alface
sementes viáveis é reduzido por desidrogenases pode germinar em 48 ou, no máximo, em 72
do tecido vivo, adquirindo a cor avermelhada horas. Intervalos menores entre observações
na semente. A coloração adquirida é proporcio- são apropriados em particular para experimen-
nal à atividade enzimática, sendo utilizada tos de germinação conduzidos em temperaturas
como uma estimativa do grau de viabilidade supra-ótimas, em que os processos metabólicos
da semente. Embora apropriado para estimar se encontram acelerados.
o grau de viabilidade, esse teste não permite As medidas de germinação podem ser re-
identificar se a semente vai ou não germinar, presentadas graficamente. As mais comuns re-
visto que sementes dormentes também podem lacionam germinação com temperatura, dispo-
apresentar expressiva atividade enzimática (Ca- nibilidade de água, luminosidade e concentra-
pítulo 6). Os critérios citados, assim como al- ção de fitormônios ou reguladores de cresci-
guns efeitos de origem biótica e abiótica na ger- mento. Quando plotadas em uma relação dose-
minação estão listados no Quadro 13.1. dependência, tais curvas representam o com-
portamento germinativo de dada espécie em
função do tratamento aplicado, assim como
GERMINAÇÃO E DORMÊNCIA permitem comparar a germinação de diferentes
Associada à germinação está a dormência das espécies sob efeito de um mesmo tratamento.
sementes. Esse mecanismo regula o início da Contudo, antes de dar continuidade a esta dis-
germinação, tem uma forte relação espécie-es- cussão, vale relembrar algumas medidas bási-
pecífica e depende muito do tipo de ambiente cas utilizadas para quantificar a germinação.
em que a espécie ocorre (Labouriau, 1983). De
fato, a dormência determina o momento e o
local de germinação, além dos requerimentos MEDIDAS DE GERMINAÇÃO
e características desse evento. Em estudos em Múltiplas formas de medir a germinação fo-
que se investiga a cinética da germinação, deve ram desenvolvidas por diversos autores (Labou-
haver medidas diárias, de preferência na mes- riau, 1983). Dentre elas, a “germinabilidade”
ma hora, de forma que os intervalos entre obser- (%G) talvez seja a mais simples, representan-
vações se aproximem de 24 horas (o que é bas- do a porcentagem de sementes germinadas em
tante comum). Porém, dependendo da veloci- relação ao número de sementes dispostas a ger-
dade de germinação, observações e contagens minar sob determinadas condições experimen-
devem realizar-se em intervalos de 12, 8 ou tais:

Quadro 13.1 Fatores abióticos e bióticos que podem influenciar o critério de germinação de diásporos

Critério Fatores abióticos Fatores bióticos

Bioquímico Água, temperatura. Fitormônios.


Morfológico Temperatura, luz, água, vento, Microrganismos, aleloquímicos.
potencial matricial do substrato,
pH, nitratos.
Agronômico Todos os itens anteriores mais a Microrganismos (tanto por doenças como por
compactação do substrato. interferências químicas externas ao diásporo),
Presença de outras plantas aleloquímicos, presença de outras plantas, predação.
(competição e fatores físicos) e
fatores físicos do solo. Enterramento
muito profundo.
GERMINAÇÃO 211


%G = (∑ni . N-1) . 100 2
tS =[∑ni . (ti – t )2] / (∑ni – 1)

onde ∑ni é o número total de sementes germi- onde ni é o número de sementes germinadas

nadas em relação ao número de sementes dis- entre as observações ti-1 e ti, e t é o tempo mé-
postas para germinar (N), dados expressos em dio de germinação. A variância do tempo médio
porcentagem. A germinabilidade informa o nú- de germinação reflete a distribuição temporal
mero total de sementes germinadas, entretan- desta em torno da média, o que permite avaliar
to, não reflete quanto tempo foi necessário pa- se a germinação de dado conjunto de sementes
ra que as sementes atingissem tal porcentagem é uniforme (pequena variância) ou desunifor-
de germinação. Se dois ou mais lotes de se- me e irregular (grande variância).
mentes apresentam germinabilidade seme- Outra forma utilizada para quantificar a ci-
lhante, isso não quer dizer que o seu comporta- nética da germinação é o cálculo da velocidade

mento germinativo seja o mesmo. Os tempos e média (v ), que é simplesmente o inverso do
a distribuição da germinação podem ser dife- tempo médio de germinação:
rentes. Podem existir lotes ou sementes que ger- – –
v = 1 / t = ∑ni / ∑ni.ti
minam (ou emergem) mais rapidamente (em
geral, mais vigorosas) e outras cuja germinação A velocidade é expressa geralmente em ho-
é mais lenta. Para essas situações, existem me- ras-1. Naturalmente, a velocidade média tam-
didas que quantificam a germinação sob um bém tem sua variância (vS2):
ponto de vista cinético, isto é, informam quanto
2 2 – 4
tempo foi necessário para determinado lote de vS = tS . (v )
sementes germinar. Um parâmetro bastante
– A variância da velocidade média é dada em
utilizado é o tempo médio de germinação (t ),
calculado pela equação a seguir: horas-2.
– Outro índice freqüentemente usado é o ín-
t = ∑ni . ti / ∑ ni dice de velocidade de germinação (Maguire,
1962), simbolizado por IVG, em que o número
onde ni é o número de sementes germinadas de sementes ou plântulas normais é contabili-
dentro de determinado intervalo de tempo ti-1 zado a cada dia:
e ti. Essa informação é comumente expressa
– IVG = G1/N1 + G2/N2 + ... Gn/Nn
em horas. O tempo médio (t ) corresponde à
média do tempo necessário para um conjunto
de sementes germinar, dando ao processo um Quando se considera o critério agronômico,
caráter cinético. Como será visto adiante, essas o IVG é substituído por IVE (índice de velocidade
medidas fornecem tanto as informações quanto de emergência); entretanto, o cálculo permane-
as vias metabólicas envolvidas no processo e ce o mesmo. Assim:
podem, por outro lado, permitir inferências G1, G2, ... Gn = número de diásporos
sobre estratégias de germinação de determina- germinados ou (no caso do IVE)
do lote ou mesmo de espécies sob diferentes E1, E2, ...En = número de plântulas normais
condições ambientais. Sendo a média uma me- na primeira, segunda até enésima ob-
dida de tendência central de um dado conjun- servação.
to de valores (no caso, o número de sementes N1, N2, ... Nn = número de dias (ou horas)
germinadas), existem medidas que quantifi- após a semeadura.
cam a dispersão dos valores em torno da mé-
dia, como a variância e o desvio-padrão. No caso Embora esse índice seja freqüentemente ex-
da germinação das sementes, esse parâmetro é presso sem unidade, a equação relaciona o nú-
a variância do tempo médio (tS2), expressa em mero de diásporos germinados – G (ou plântulas
horas2: emergidas – N) – por unidade de tempo. Quanto
212 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

maior o IVG (IVE), maior a velocidade de ger- Sendo o caso, o CVG ou CVE deve ser calcu-
minação, o que permite inferir que mais vigoro- lado para cada repetição, e o resultado será um
so é o lote de sementes (Nakagawa, 1999). valor médio das repetições em porcentagem.
A velocidade de germinação também pode Quanto maior o valor numérico do CVG (ou
ser calculada pela fórmula apresentada por Ed- CVE), maior a velocidade de germinação, indi-
mond e Drapalla (1958), simbolizada por VG: cando que mais vigoroso é o lote ou a amostra
de diásporos em estudo (Nakagawa, 1999). Ob-
VG = (N1 G1 + N2 G2 +...+ Nn.Gn) /
serve que a interpretação a partir desses índices
(G1 + G2 +...+ Gn)
pode ser similar à interpretação obtida a partir

onde: do cálculo de v mostrado anteriormente.
G1, G2, ... Gn = número de sementes (ou
plântulas) germinadas no dia da obser-
INTERPRETAÇÃO DOS
vação (nas últimas 24 horas se as ob- RESULTADOS DE
servações forem diárias). GERMINAÇÃO
N1, N2, + ... + Nn = número de dias (horas)
Além da necessidade de estabelecer um deli-
após a semeadura.
neamento experimental apropriado para inves-
Essa equação também pode ser expressa tigar efeitos de tratamentos diversos na germi-
por: nação (Capítulo 11), também é fundamental,
K K
para chegar a conclusões corretas do trabalho,
VG =å Ni. Gi / å i=1 Gi uma apropriada interpretação dos resultados
i=1
obtidos. Essa etapa, com certa freqüência, não
Examinando-se cuidadosamente a fórmula recebe a atenção devida. O propósito deste ca-
de VG, verifica-se que ela é idêntica à fórmula pítulo não é ensinar ao leitor como interpretar
– os resultados, mas sugerir formas de interpreta-
de t ; logo, as interpretações também podem ser
similares (Santana e Ranal, 2000). Assim, ção, atentar para aspectos pouco observados na
– análise de gráficos e tabelas e buscar associar
quanto menor a VG ou o t , mais vigorosa poderá
ser considerada a amostra. Para cada repetição, resultados obtidos com experimentos de germi-
– nação a outros campos de investigação, como
calcula-se a VG ou o t e, ao final, tem-se um
valor médio entre as repetições do experimento a ecologia e a bioquímica.
(desde que realizadas sob as mesmas condi-
ções).
CURVAS DE GERMINAÇÃO
Quanto à velocidade de germinação, outra
maneira de quantificá-la, além da descrita ante- Conforme descrito, a germinabilidade (%G) re-
riormente, é pelo coeficiente de velocidade de presenta o número total de sementes germina-
germinação (CVG) ou de emergência (CVE), das sob determinada condição experimental.
sugerido por Kotowski (1926): Nesse contexto, tal medida pode ser utilizada
na comparação da germinação sob diferentes
k k
CVG ou CVE = [ å fi / å fi.xi] . 100 temperaturas de incubação, por exemplo (Fi-
i=1 i=1
gura 13.1).
Verifica-se, pelas curvas de germinação, que
onde: as quatro espécies apresentam germinabilida-
fi = número de sementes germinadas no des diferentes em função da temperatura de
i-ésimo dia. incubação. Por exemplo, a 25oC, sementes de
xi = número de dias contados desde a se- Salvia hispanica apresentam germinabilidade
meadura até o dia da leitura (i). próxima dos 60%, enquanto sementes das ou-
k = último dia de observação. tras espécies têm valores próximos de 100%.
GERMINAÇÃO 213

100

80
Vicia graminea
Germinabilidade (%)

Pereskia aculeata
60
Calotropis procera
40 Salvia hispanica

20

0
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45
o
Temperatura ( C)

 Figura 13.1
Curvas de germinação de sementes de Calotropis procera (Labouriau e Valadares, 1976), Pereskia aculeata
(Dau e Labouriau, 1974), Salvia hispanica (Labouriau e Agudo, 1987) e Vicia graminea (Labouriau, 1970) em
um gradiente de temperatura.

Germinabilidade abaixo de 100% pode indicar característica adaptativa de V. graminea, visto


que as sementes não-germinadas encontram- que essa leguminosa ocorre em regiões de cli-
se inviáveis ou dormentes. Testes de viabilidade ma temperado como o extremo sul do Brasil, a
podem mostrar o que, de fato, está limitando a Argentina e o Chile. A distribuição geográfica
germinação sob dada condição. Se as sementes das espécies depende, em grande parte, da ca-
se encontram viáveis, pode-se concluir que es- pacidade das suas sementes de germinar sob
tão dormentes. as condições climáticas predominantes.
Em outras temperaturas de incubação, ob- Ademais, como a germinabilidade depende
serva-se que a germinabilidade varia conforme do tempo de incubação, a duração dos ensaios
a espécie, havendo inclusive temperaturas (p. de germinação é importante para o estabeleci-
ex., 5, 15, 35oC) nas quais nem todas as espécies mento dos pontos cardeais. Pré-tratamentos,
germinam. Para cada espécie, existem tempera- como escarificação, também podem alterar as
turas-limite de germinação, isto é, temperatu- respostas (Labouriau, 1970). A não-germinação
ras abaixo ou acima das quais a germinação pode indicar que as sementes estão fora da faixa
não ocorre. Elas são chamadas de temperatu- de temperatura apropriada para a germinação,
ras cardeais (Labouriau, 1983) e definem, para acima da temperatura máxima ou abaixo da
cada espécie, a faixa de temperatura na qual a mínima. Para verificar se as sementes não-ger-
germinação é possível. Tais intervalos são espé- minadas nas temperaturas extremas estão mor-
cie-específicos, o que reflete as características tas ou dormentes, sugere-se transferi-las para
de germinação da espécie e permite inferir a a faixa ótima de germinação e aguardar o resul-
procedência ou o local de ocorrência da espécie tado. Se germinarem, isso indica que a tempe-
em estudo (Figura 13.1). Por exemplo, semen- ratura não era apropriada para a germinação.
tes de Pereskia aculeata, uma cactácea que ocorre Se não germinarem e, ao mesmo tempo, não
em comunidades de restinga, germinam bem se apresentarem deterioradas, recomenda-se
em altas temperaturas (Dau e Labouriau, 1974). testes de viabilidade (Capítulo 18) para identi-
Em contraste, sementes de Vicia graminea não ficar se elas estão mortas ou dormentes.
toleram altas temperaturas, mas germinam em A germinabilidade pode ser utilizada de for-
temperaturas abaixo de 5oC (Labouriau, 1970). ma similar em outros tipos de investigação, co-
Possivelmente, esses parâmetros refletem uma mo o efeito de fitormônios e luminosidade na
214 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

germinação das sementes. No exemplo a seguir, mentos conduzidos com sementes coletadas em
sementes de Schefflera (Didymopanax) morototoni, apenas uma época de produção, especialmente
coletadas em diferentes épocas do ano, foram de um único material genético (planta), podem
dispostas a germinar na presença do fitormônio induzir a erros ou interpretações limitadas.
cinetina (uma citocinina) na luz e no escuro Apesar de a germinabilidade oferecer infor-
(Figura 13.2). mações importantes sobre as características de
Essa análise permite identificar, por exem- germinação de um conjunto de sementes face
plo, qual a eficácia de um tratamento hormonal a determinado tratamento, ou mesmo permitir
em promover (ou inibir) a germinação de deter- uma discussão mais profunda sobre procedên-
minada espécie e, de maneira análoga aos efei- cia/local de ocorrência da espécie, uma análise
tos da temperatura descritos no exemplo ante- da germinação sob um enfoque cinético requer
rior, pode-se comparar o comportamento ger- outras formas de abordagens. Nesse sentido,
minativo de diferentes espécies ao fitormônio as curvas de tempo médio e de velocidade mé-
aplicado. Nesse caso, a aplicação de citocinina dia de germinação permitem interpretações
promoveu a germinação, quando comparada ao adicionais desse processo fisiológico.
controle em água (C). Além disso, observa-se
que, na presença do fitormônio, as sementes
coletadas em junho apresentaram-se fo- TEMPO MÉDIO DE
toblásticas negativas, enquanto as coletadas em GERMINAÇÃO
setembro apresentaram-se afotoblásticas. Es- O tempo necessário para determinada amostra
sas observações permitem extrair outras infor- de sementes germinar depende, primariamen-
mações a partir da análise do gráfico. O foto- te, da espécie em estudo e das condições expe-
blastismo depende da época de coleta das se- rimentais ou ambientais nas quais as mesmas
mentes. Para plantas que apresentam uma fru- se encontram. Curvas de germinação que tra-
tificação que se estende por longa parte do ano, tam sobre o tempo médio ou o seu recíproco, a
como é o caso da espécie utilizada, o local e a velocidade média, podem ser plotadas sob dife-
época em que as sementes são produzidas tam- rentes maneiras. Quando, para efeitos de com-
bém são importantes (Figura 13.2). Esses resul- paração, o número de tratamentos é grande,
tados mostram que dados pontuais de experi- como o é o número de medidas de tempo médio
(ou velocidade média), costuma-se apresentar
tais medidas em função do tratamento aplica-
40 do. Esse caso pode ser exemplificado pela Fi-
C – Controle
35 L – Luz gura 13.3, que relaciona a velocidade de germi-
E – Escuro nação de sementes de Peltophorum dubium, uma
Germinabilidade (%)

30
25 espécie de ampla distribuição nas matas de ga-
20
leria do Brasil Central, em função da tempera-
15
tura de incubação.
10
Como se pode observar, a velocidade média
de germinação cresce com o aumento da tem-
5
peratura até um máximo próximo dos 23oC. Em
0
C L L E L E temperaturas acima desse valor, a velocidade
Abril Junho Setembro começa a diminuir até a temperatura limite de
germinação, que se localiza entre 37 e 39oC.
 Figura 13.2
Efeito da cinetina (1 mg.L-1) na germinação de semen-
Esse tipo de estudo tem sido conduzido com
tes de Schefflera morototoni coletadas em diferentes diversas outras espécies cultivadas e nativas
meses do ano, incubadas sob condição de luz (L) e (Labouriau, 1983; Lima, Borghetti e Sousa,
escuro (E). C – controle em água. Adaptada de Franco 1997; Santos e Cardoso, 2001) e mostra que a
e Ferreira (2002). velocidade de germinação, assim como a ger-
GERMINAÇÃO 215

100 30

25
80

Velocidade média de
Germinabilidade (%)

germinação (h-1. 10-3)


20
60
15
40
10

20
5

0 0
11 14 18 20 23 26 29 33 36 39
Temperatura (oC)

 Figura 13.3
Germinabilidade (%) e velocidade média de germinação (h-1.10-3) de sementes de Peltophorum dubium
coletadas no ano de 1998 no campus da Universidade de Brasília (L.A.Z Andrade et al., inédito).

minabilidade, depende das condições de incu- (-0,156 MPa) ficou em 32 horas, enquanto, sob
bação das sementes. estresse grave (-0,414 MPa), aumentou para
Das curvas de germinação podem ser obti- 40 horas. Percebe-se, pois, que os parâmetros
dos tanto o tempo médio de germinação quanto de tendência central em estudos de germinação
outros parâmetros de tendência central, como podem variar de forma distinta em função do
a moda (Figura 13.4). tratamento aplicado.
Embora não haja diferenças significativas A partir das medidas de tempo médio (e
entre os tratamentos quanto ao parâmetro ger- velocidade média) de germinação, diversas in-
minabilidade (entre 94 e 99%), observa-se na terpretações são possíveis. Por exemplo, pode-
Figura 13.4 que, sob estresse osmótico, o tempo se inferir que germinação rápida é característica
médio de germinação (identificado pelas barras de espécies cuja estratégia é se estabelecer no
verticais) de sementes de Mimosa bimucronata ambiente o mais rápido possível ou quando
é progressivamente aumentado. Por outro lado, oportuno, aproveitando condições ambientais
no controle e com estresse moderado, a moda favoráveis ao desenvolvimento do novo indiví-

60
Controle
Número de sementes

50
(-0,156MPa)
germinadas

40 (-0,414MPa)
30

20

10

0
0 24 32 40 48 56 64
Tempo (horas)

 Figura 13.4
Germinação de sementes escarificadas de Mimosa bimucronata. As barras verticais representam o tempo
médio de germinação para cada tratamento. Os potenciais osmóticos foram gerados com NaCl (Rodrigues,
Passini e Ferreira, 1999).
216 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

duo. Essa situação pode ser criada, por exemplo, 1.000


com a formação de clareiras ou a ocorrência de
800
chuvas. Em contrapartida, a germinação rápida
pode ser imprópria ou não-estratégica ao esta- 600
belecimento de uma espécie, por exemplo,
germinar em resposta a chuva errática e isolada

Entalpia de ativação (kJ . mol-1)


400
durante a estação seca. As sementes germina-
das poderiam perecer na continuidade da seca. 200
Efeitos da temperatura na cinética da ger-
0
minação podem ser abordados também sob um
290 300 310 320
ponto de vista bioquímico. Sabe-se que a ativi-
-200
dade de enzimas (assim como de qualquer ou- Temperatura (K)

tro evento metabólico que envolva proteínas) -400


tem uma forte dependência da temperatura de
incubação. Existem temperaturas nas quais a -600
velocidade de reação (enzimática) é máxima,
e outras nas quais o processo ocorre muito len- -800

tamente ou se encontra inibido. Consideran-


-1.000
do-se que a germinação das sementes pode ser
encarada como um somatório de reações par- -1.200
ciais concatenadas envolvendo enzimas diver-
sas, a velocidade desse processo fisiológico se-  Figura 13.5
Variação de entalpia de ativação em função da tempe-
rá também dependente da temperatura de in- ratura na germinação de sementes de Sesamum in-
cubação das sementes, apresentando tempera- dicum (P.G. Carvalho e F. Borghetti, inédito).
turas nas quais a velocidade de germinação é
máxima, e outras nas quais a velocidade é re-
duzida ou em que a germinação não ocorre (Fi- se que a inibição da germinação em temperatu-
gura 13.3). Em uma abordagem termodinâmica ras abaixo do mínimo é reversível, enquanto o
(Labouriau, 1978; Labouriau e Labouriau, bloqueio da germinação por temperaturas de
1997), foi proposto que a desnaturação de pro- incubação acima do máximo é irreversível (Car-
teínas e a transição de fase de membranas po- valho et al., 2001).
deriam estar entre os fatores limitantes da ger- Curvas de velocidade média de germinação
minação nas temperaturas próximas dos li- também podem ser representadas em função
mites mínimos e máximos de germinação. Am- do tempo de duração do experimento. Esse pro-
bos os eventos envolvem grande variação de cedimento é apropriado quando se pretende in-
entalpia de ativação, concordando com os va- vestigar a germinação não apenas em função
lores de entalpia calculados para as velocida- da velocidade média, mas também quanto à
des de germinação nas temperaturas infra e su- distribuição da germinação ao longo do tempo.
pra-ótimas da germinação para diversas espé- Nesse caso, as curvas podem ser apresentadas
cies (Labouriau e Osborn, 1984; Labouriau e ao menos sob duas formas: curvas cumulativas
Pacheco, 1979), como, por exemplo, Sesamum ou não-cumulativas da germinação. Como
indicum, o conhecido gergelim (Figura 13.5). exemplo do primeiro caso, pode-se observar a
De fato, foi comprovado experimentalmente curva de germinação de sementes de duas bro-
que a transconformação de proteínas está en- mélias de ocorrência em comunidades de res-
volvida na restrição da germinação, próximo tinga (Figura 13.6).
tanto da temperatura mínima (Labouriau, O gráfico representa o número acumulado
1980) como da temperatura máxima de germi- de sementes germinadas de duas espécies de
nação (Labouriau, 1977). Além disso, observou- bromélias a cada dia de observação. Diferente-
GERMINAÇÃO 217

100

80
Germinabilidade (%)

60

40
Luz vermelha

20

0 48 96 144 192 240 288 336 384 432

Tempo (horas)

 Figura 13.6
Germinação cumulativa de sementes de Aechmea nudicaulis (linha contínua) e Streptocalyx floribundus
(tracejado) sob temperaturas alternantes de 20 a 30oC. As sementes foram incubadas sob luz vermelha (sím-
bolos abertos) ou no escuro (símbolos pretos). Após 240 horas de incubação no escuro, as sementes foram
expostas à luz vermelha (Pinheiro e Borghetti, 2003).

mente do exemplo anterior, a Figura 13.6 per- contagem é somado ao número de sementes
mite visualizar a distribuição da germinação ao germinadas contadas previamente. No preparo
longo do tempo, o que possibilita identificar o de curvas não-cumulativas, os dados de cada
início e o fim da germinação para cada espécie observação não são adicionados aos anteriores.
e/ou tratamento considerado. Por exemplo, a Aqui cabe uma nota de advertência. Recomen-
germinação das sementes de Aechmea nudicaulis, da-se remover as sementes germinadas da placa
sob tratamento luminoso, iniciou-se após 96 de Petri (gerbox, sementeira, etc.) para evitar
horas de incubação, estendendo-se até aproxi- dupla contagem de uma semente germinada.
madamente 240 horas após o início do experi- A partir das curvas de freqüência cumulati-
mento. Comparando essa espécie com Strepto- vas e não-cumulativas, diversas informações
calyx floribundus, observa-se que o período de podem ser extraídas. O que pode informar um
germinação de A. nudicaulis foi mais amplo, ini- ou outro tipo de curva? Em si, a mesma coisa;
ciando antes e finalizando após o período de porém, dependendo do que se quer destacar no
germinação de S. floribundus. Com esse gráfico, comportamento germinativo, usa-se uma ou
pode-se também verificar a germinabilidade outra (Figura 13.7).
(para o caso de A. nudicaulis foi cerca de 100%). Observa-se, no gráfico A, que a germinação
Além disso, é possível a comparação dos efeitos de sementes de Talinum patens a 25oC apresenta
de diferentes tratamentos (luz versus escuro), uma distribuição próxima à sigmóide, caracteri-
mostrando que a luz é necessária para a germi- zando uma distribuição normal da germinação.
nação de ambas as espécies. A germinação das sementes a 35oC apresenta-
O uso de curvas de freqüência absoluta ou se similar àquela ocorrida a 25oC, embora não
relativa da germinação é apropriado quando se tenha um aspecto sigmoidal. No entanto, quan-
pretende analisar a distribuição da germinação do a germinação é distribuída em freqüência
ao longo do tempo de duração do experimento. não-acumulada (B), a curva de germinação a
Para a construção de curvas cumulativas, o nú- 35oC apresenta um padrão trimodal, bastante
mero de sementes germinadas em determinada distinto de uma distribuição normal (como
218 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

35

Número de sementes 30

25
germinadas

20
o
15 25 C

10 35oC

0
0 3 6 9 12 15 18 21

Tempo (dias)

B
15 o
25 C

o
12 35 C
Número de sementes

9
germinadas

0
0 3 6 9 12 15 18 21

Tempo (dias)

 Figura 13.7
Germinação de sementes de Talinum patens sob duas temperaturas de incubação. (A): dados acumulados;
(B): dados não-acumulados ou freqüências (Rosa e Ferreira, 1998).

aquela apresentada a 25oC), sugerindo perda mentos é similar (o que é recomendável). En-
da sincronia no controle do processo (Labou- tretanto, quando o número de sementes utiliza-
riau, 1983). das nos tratamentos é diferente, sugere-se o
As Figuras 13.6 e 13.7 mostram o número uso de freqüência relativa de germinação. Para
absoluto de sementes germinadas em função tal, o número de sementes germinadas a cada
do tempo de incubação. Esse tipo de gráfico po- dia (ou intervalo de tempo utilizado) é dividido
de ser utilizado quando o número de sementes pelo número total de sementes germinadas, mi-
dispostas para germinar nos diferentes trata- nimizando assim efeitos de diferenças no tama-
GERMINAÇÃO 219

nho das amostras e na interpretação do resul- diferentes em função dos fatores que afetam a
tado. temperatura do substrato.
As curvas de germinação podem-se apre- Uma grande variância de germinação suge-
sentar sob as mais diversas formas; entretanto, re que, sob condições naturais, a germinação
elas podem ser identificadas por modelos de pode se estender de dias a meses, desde que os
curvas já existentes. Por exemplo, a distribuição diásporos se mantenham viáveis no substrato
temporal da germinação pode apresentar um em que se encontram. Espécies que apresentam
padrão normal (ou gaussiano), conforme o esse tipo de comportamento tendem a estabele-
exemplo mostrado na Figura 13.7 (25oC). Alter- cer bancos de sementes persistentes, isto é,
nativamente, a curva pode apresentar uma dis- aqueles cujo recrutamento ocorre de forma bas-
tribuição leptocúrtica, quando a germinação tante espaçada no tempo. Esse tipo de banco é
das sementes ocorre mais concentrada no tem- comum em formações savânicas, desertos e am-
po (o que resulta em uma baixa variância de bientes que apresentam estresses ambientais,
germinação), ou uma distribuição platicúrtica, como estação seca, e/ou imprevisíveis, como
quando a germinação se apresenta bastante es- queimadas (Leck, Parker e Simpson, 1989). Se-
palhada no tempo (refletindo uma grande va- mentes de Solanum lycocarpum, uma espécie de
riância de germinação). Um exemplo de distri- ampla distribuição no Cerrado, apresentam esse
buição platicúrtica é o comportamento germi- tipo de comportamento; a germinação se es-
nativo de M. bimucronata sob potencial osmótico tende por meses, e a viabilidade se mantém alta
mais negativo (Figura 13.4). Assim, conforme por anos (F. Borghetti, inédito). Em contraste,
o tratamento recebido, uma mesma espécie sementes com germinação rápida e uniforme,
pode apresentar diferentes padrões de distribui- o que reflete uma variância de germinação pe-
ção da germinação (Figura 13.8). quena, em geral estabelecem bancos de semen-
Estudos de germinação conduzidos com se- tes transientes, isto é, de curta duração. Esse
mentes de Cassia excelsa, uma leguminosa da tipo de comportamento é típico de espécies que
Caatinga amplamente utilizada na ornamenta- ocorrem em ambientes úmidos, como flores-
ção urbana, mostram que, em temperaturas ex- tas; normalmente as sementes são de curta
tremas, a germinação tende a apresentar um viabilidade e germinam prontamente quando
comportamento platicúrtico, enquanto, próxi- dispersas (Leck, Parker e Simpson, 1989). Di-
ma da faixa ou temperatura ótima, há uma ten- versas espécies da Amazônia apresentam esse
dência da distribuição da germinação tornar- comportamento (I. Ferraz, comunicação pes-
se meso ou mesmo leptocúrtica. Polígonos de soal). Assim, a variância de germinação permite
freqüência têm sido utilizados amplamente prever ou postular o comportamento germina-
para avaliar efeitos de tratamentos diversos (em tivo de dada espécie sob condições naturais. A
especial da temperatura) na distribuição tem- dinâmica do banco de sementes é discutida no
poral da germinação para diversas espécies (La- Capítulo 14.
bouriau e Valadares, 1976; Lima, Borghetti e Por outro lado, as curvas de distribuição
Sousa, 1997). De modo geral, a análise dos temporal da germinação sob diferentes tempe-
polígonos de freqüência mostra que a variância raturas (ou outros tratamentos) permitem infe-
da germinação, assim como a velocidade mé- rir sobre mecanismos moleculares envolvidos
dia, também depende da temperatura de incu- no controle do processo. Sabe-se que a distri-
bação das sementes. Se for considerado que a buição normal (gaussiana) reflete a máxima
temperatura no solo varia em função de diver- incerteza de um sistema ou entropia informa-
sos fatores, como profundidade, tipo e cor do cional. A informação fornecida por esse tipo de
solo e incidência luminosa, a velocidade e a dis- curva sobre o sistema em estudo é mínima. En-
tribuição temporal da germinação das semen- tretanto, se a distribuição das freqüências é sig-
tes in situ também poderão ser completamente nificativamente diferente de uma normal, isso
220 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

o
80 12 C
60 Nt = 9
40 Tm = 19,08
20
0
80 15oC
60 Nt = 164
40 Tm = 12,37
20
0
80 o
18 C
60
Nt = 187
40
Tm = 6,11
20
0
80 o
60 21 C
40 Nt = 188
Freqüência relativa (%)

Tm = 4,12
20
0
80
24oC
60
Nt = 177
40 Tm = 3,05
20
0
80
60 27oC
40 Nt = 185
20 Tm = 3,13
0
80
30oC
60 Nt = 193
40 Tm = 7,72
20
0
80
33oC
60
Nt = 187
40
Tm = 8,87
20
0
80
60 36oC
Nt = 174
40
Tm = 11,92
20
0
0 3 6 9 12 15 18 21 24 27

Tempo (dias)
 Figura 13.8
Freqüências de germinação das sementes de Cassia excelsa sob diferentes temperaturas de incubação (Jellez
e Perez, 1999). Nt = número total de sementes; Tm = tempo médio de germinação (dias).

implica a existência de sinais que se sobrepõem está ocorrendo ao acaso no lote em estudo, mas
ao ruído (térmico) aleatório no controle da ger- respondendo a algum mecanismo de controle
minação (Labouriau, 1983). Esse caso se ma- da germinação que resulta na sincronização do
nifesta, por exemplo, em padrões de germina- processo.
ção leptocúrticos, quando grande parte das se- Diversos estudos têm estimado o grau de
mentes germina em um curto espaço de tempo. sincronismo na germinação das sementes, nor-
Esse tipo de curva sugere que a germinação não malmente sob diferentes temperaturas de incu-
GERMINAÇÃO 221

Tabela 13.1 Alguns parâmetros da distribuição de freqüências isotermas dos tempos médios de
germinação de sementes de Salvia hispanica (Labouriau e Agudo, 1987)

Índice de Kolmogorov-
Temperatura Moda sincronização Smirnov
(oC) (horas) (U, em bits) Dmax.105 Assimetria (G1) Curtose (G2)

4,2 1198 2,05 47336 * 2,273 4,785


6,7 384 6,47 16948 * 1,129 0,860
9,9 184 5,57 20036 * 1,208 0,365
12,0 96 3,67 11215 * -0,275 -0,764
13,9 72;88 3,66 17915 * 0,751 -0,876
16,2 56 3,42 30592 * 1,597 1,517
18,4 40 2,95 34666 * 2,074 3,720
22,2 32 2,33 32297 * 1,583 1,445
23,2 24 2,27 31828 * 1,750 1,595
24,8 24 1,99 34339 * 2,778 8,051
26,7 24 2,03 35473 * 2,680 7,566
28,1 16 1,80 36301 * 1,405 0,004
30,2 16 1,70 33957 * 1,576 1,173
32,3 16 1,76 34404 * 1,570 1,175
35,2 24 2,03 25735 * 1,101 -0,046
37,9 24 2,83 14129 NS -0,991 1,185
39,3 64 2,94 27312 * 0,461 -1,578

bação. De modo geral, o sincronismo é menor sicos que precisam ser respeitados em uma aná-
sob temperaturas extremas e tende a ser maior lise, a habilidade em “ver” o que não está tão
quanto mais próxima a temperatura de incuba- evidente nos dados torna a interpretação dos
ção estiver da faixa ótima para a germinação resultados muito mais rica e a discussão do tra-
(Tabela 13.1). balho muito mais interessante e inovadora.
O predomínio de distribuições de freqüên-
cia não-gaussianas (e polimodais) da germina-
ção das sementes sob temperaturas extremas REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
mostra, por exemplo, a heterogeneidade fisioló- ASTARITA, L.V.; FERREIRA, A.G.; BERGONCI, J.I. Mi-
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Interpretar dados de germinação é, como
germination in Pereskia aculeata Mill. Anais Academia
qualquer outra atividade, uma tarefa que não Brasileira de Ciências, v. 46, p. 311-322, 1974.
requer apenas um conhecimento prévio do que
EDMOND, J.B.; DRAPALLA W.J. The effects of
se está estudando, mas principalmente criati-
temperature, sand and soil, and acetone on germination
vidade e capacidade de observação do investiga- of okra seed. Proceedings of the American society for
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222 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

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PA R T E 5

ECOLOGIA
DE REGENERAÇÃO
C A P Í T U L O 1 4

DISPERSÃO E BANCO
DE SEMENTES
Jarcilene S. de Almeida-Cortez

A dispersão de sementes representa uma impor- qüentemente são alados ou possuem estruturas
tante fase do ciclo reprodutivo das plantas, sen- (plumas) que aumentam a razão superfície/vo-
do também crítica na regeneração de popula- lume, reduzindo a velocidade de queda. Diás-
ções e comunidades naturais (Janzen, 1970). poros dispersos por animais comumente apre-
Dispersão refere-se à retirada ou liberação dos sentam apêndices comestíveis ou algum tipo
diásporos, partes reprodutivas da planta-mãe de polpa que servem de atrativos aos agentes,
como frutos, sementes, bulbos e plântulas, e o que os ingerem como parte de sua dieta e, mais
seu deslocamento para outros sítios (Howe e tarde, liberam as sementes no ambiente; as se-
Smallwood, 1982). A dispersão aumenta as mentes podem ainda ser coletadas, escondidas
chances de sobrevivência de sementes e plân- (enterradas) e, por vezes, esquecidas pelo co-
tulas, tanto por evitar condições freqüentemen- letor. Outros diásporos são dispersos aderidos
te desfavoráveis encontradas próximas à plan- ao pêlo do animal por meio de estruturas espe-
ta-mãe (como a elevada competição entre plân- cializadas como ganchos e envoltório aderente.
tulas e o ataque de patógenos e predadores) As síndromes de dispersão são definidas com
como também por aumentar as chances de re- base nas características estruturais dos frutos
crutamento em locais propícios para o estabele- e sementes. Pode-se também classificar os
cimento de novos indivíduos (Capítulo 15). Os agentes de dispersão em abióticos (vento, água,
processos envolvidos na dispersão criam pa- peso) e bióticos (mamíferos, aves, répteis, pei-
drões de distribuição espacial das plantas adul- xes, formigas).
tas, que, em contrapartida, dependem desses
processos. Portanto, a dispersão de sementes é
uma estratégia que aumenta a probabilidade SÍNDROMES DE DISPERSÃO
de recrutamento em ambientes ou locais mais Existem diversas síndromes de dispersão, fre-
apropriados para o desenvolvimento da futura qüentemente associadas a pelo menos um de-
planta (Willson e Traveset, 2000). terminado agente dispersor.
Considerando a dispersão como um evento
vantajoso, pode-se esperar que os diásporos Anemocórica
apresentem adaptações que a facilitem. Carac- É o tipo de dispersão que utiliza as correntes
terísticas morfológicas associadas à dispersão de ar para o transporte de diásporos leves e que
freqüentemente são evidentes nos diásporos, apresentam adaptações morfológicas para re-
sendo interpretáveis de imediato. Entretanto, duzir seu peso específico, como papus (modifi-
algumas características, como a presença de flu- cação do cálice, como ocorre em espécies de As-
tuadores (sementes dispersas pela água), podem teraceae), cálice persistente, alas membraná-
ser menos óbvias (Willson e Traveset, 2000). ceas circulares ou parciais (como ocorre em Kiel-
Sementes e frutos transportados pelo vento fre- meyera coriacea – pau-santo – e Tabebuia spp. –
226 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

ipês), pêlos longos ou cerdas (como em Erio- Hidrocoria


theca sp.) entre outras adaptações. A anemoco- Sementes dispersas pelo deslocamento da
ria ocorre em um grande número de famílias e água da chuva, nos rios, em enchentes e corren-
está distribuída na maior parte dos habitats (- tes marítimas, possuem estruturas adaptadas
Oliveira e Moreira, 1992; Griz, Machado e Ta- à dispersão pela água, como câmaras de reten-
barelli, 2002). Algumas espécies, como diversas ção de ar ou camadas de células especializadas
orquídeas, produzem sementes extremamente para isso. Em relação ao transporte dos diás-
pequenas como forma de se beneficiarem da poros pelas correntes marítimas, destacam-se
ação das correntes de ar. As unidades de disper- as espécies de Arecaceae, sendo o representante
são anemocóricas podem ser classificadas, se- mais conhecido o coco (Cocus nucifera). Espécies
gundo Augspurger (1986), em: flutuante (Pseu- de manguezais (Rhizophora mangle e Laguncu-
dobombax pubescens – Bombacaceae), planadora laria racemosa) e da Amazônia (Swartzia polyphy-
(Aspidosperma macrocarpon, A. pyrifolium – Apo- lla, Pentaclethra macroloba) também utilizam esse
cynaceae), autogiro (Banisteriopsis latifolia, Ja- mecanismo de dispersão. Em alguns casos, os
nusia schwannioides – Malpighiaceae), autogiro diásporos também podem envolver a participa-
rotativa (Dalbergia violacea – Papilionoideae; Pa- ção de agentes como peixes (Ficus spp., Bertho-
rapiptademia zehntneri – Mimosoideae), helicóp- lletia excelsa), caracterizando assim a zoocoria.
tero (Eremanthus glomerulatus – Asteraceae; My-
racrodruon urundeuva – Anacardiaceae) e acro- Zoocoria
bata (Combretum pysonioides – Combretaceae). Dispersão feita por animais, podendo ser
dividida em epizoocoria e endozoocoria. A pri-
Balística
meira compreende plantas produtoras de fru-
Dispersão que ocorre por meio de mecanis- tos e sementes com mecanismos especiais como
mos especiais ligados à abertura das valvas do ganchos, pêlos ou substâncias pegajosas que
propágulo, que, ao se romperem, expelem as se prendem ao pêlo do animal a fim de serem
sementes para longe da planta-mãe (Bauhinia transportados. Como exemplo, temos Pavonia
bongardi, Indigofera truxillensis). Griz e Machado spp., Sida spp. e Desmodium spp. (carrapicho e
(2001), estudando síndromes de dispersão em pega-pega) e Bidens spp. (picão). A endozooco-
uma área de caatinga, observaram que espécies ria está representada por espécies que produ-
de Euphobiaceae apresentaram dispersão “ba- zem diásporos com algum atrativo ao consumo,
lística pela chuva”. As autoras constataram que como arilo ou polpa carnosa, por exemplo,
este tipo de dispersão está relacionado com a Caryocar brasiliensis (pequi), Xylopia aromatica,
umidade do habitat em floresta tropical seca. Miconia spp., Psychotria spp., Eugenia dysenterica
(cagaita), etc. Podem também servir de atrati-
vos cores vistosas, como o vermelho e o preto
Barocoria
em sementes de tento (Ormosia paraensis), ou o
A barocoria caracteriza-se pela separação do
azul-escuro e o branco em sementes de Abarema
diásporo da planta-mãe por ação do seu peso.
sp., leguminosas de ocorrência na Amazônia.
Para muitos pesquisadores, esse processo não ca-
Outras espécies produzem diásporos com cheiro
racteriza um tipo de dispersão, por não envolver
forte, como a lobeira (Solanum lycocarpum). To-
nenhum tipo de agente ambiental. Está repre-
das essas estratégias visam atrair animais que
sentada por aquelas plantas possuidoras de fru-
ingerem os frutos e sementes e as transportam
tos pesados que, normalmente, caem junto da
para outros sítios normalmente distantes da
planta-mãe, e ali as sementes germinam (Ana-
planta-mãe. Aves e mamíferos são os agentes
denanthera colubrina). Uma vez no chão, entre-
dispersores de sementes mais comuns nos
tanto, as sementes podem ser transportadas para
neotrópicos. A relação entre os vertebrados e
outros locais por animais, geralmente roedores,
as plantas frutíferas é tão importante que, em
caracterizando uma forma ativa de dispersão.
algumas áreas tropicais, cerca de 90% das es-
GERMINAÇÃO 227

pécies arbóreas são zoocóricas. Dentre os ma- zam a dispersão primária e a secundária. A dis-
míferos dispersores, os ungulados são particu- persão primária ocorre quando o diásporo se
larmente importantes na distribuição de gran- desprende da planta-mãe e atinge um de-
de quantidade de sementes, transportando-as terminado sítio por meio de apenas um agente
a grandes distâncias. No Quadro 14.1, estão dispersor. Quando o processo de dispersão en-
listados tipos de dispersão, grupo(s) taxonô- volve mais de um agente, o segundo agente ca-
mico(s) envolvido(s) e algumas características racteriza a dispersão secundária, pois é um mo-
dos diásporos associados ao tipo de dispersão. vimento que sucede a primária. Como exem-
Vale lembrar que os carnívoros também são plo, temos as sementes de lobeira. Os frutos
dispersores e se deslocam a grandes distâncias, dessa planta são consumidos pelo lobo-guará,
como Chrysocyon brachyurus, o conhecido lobo- que defeca em ambientes normalmente abertos
guará (Lombardi e Motta-Júnior, 1993), embo- (dispersão primária). As sementes presentes
ra existam poucos estudos relatando a disper- nas fezes do lobo podem tanto germinar como
são por carnívoros que usam frutos em sua dieta. ser removidas por formigas cortadeiras (Atta
spp.) e transportadas aos respectivos formiguei-
ros (dispersão secundária), onde pode ocorrer
DISPERSÃO PRIMÁRIA E o recrutamento de indivíduos de lobeira (Pin-
DISPERSÃO SECUNDÁRIA to, 1998). Plantas que apresentam síndrome do
Às vezes, a dispersão de frutos e sementes é tipo barocórica (primária) geralmente têm seus
bem mais complexa do que se pode imaginar, frutos transportados por roedores (secundária),
podendo envolver mais de uma etapa até atingir isto é, quando as sementes de exocarpo duro
um local para a germinação e o estabelecimento são carregadas a outros sítios. Sementes que
de um novo indivíduo. Essas etapas caracteri- foram previamente enterradas podem ser de-

Quadro 14.1 Síndromes de dispersão zoocóricas de acordo com o grupo taxonômico responsável pela
dispersão

Síndrome Agente Características dos propágulos

Ornitocórica aves Frutos bacóides ou drupóides, de cores vistosas como vermelho,


amarelo a laranja, azul a roxo, preto e branco, recobertos por arilo ou
polpa, ricos em lipídeos e/ou proteínas
Mamaliocórica mamíferos Presença de proteção resistente à mastigação, com arilo ou polpa
carnosa e freqüentemente aromática; ricos em proteínas, carboidratos
e/ou lipídeos, cores como marrom, verde, laranja, amarelo e branco
Quiropterocórica morcegos Diásporos grandes ou pequenos, geralmente pendentes, polpa
carnosa aromática, comumente verde ou verde-amarelada, amarela,
branca
Primatocórica primatas Frutos grandes (> 14 mm), de cor marrom, verde, laranja ou amarela,
geralmente protegidos por uma película
Saurocórica répteis Típico de espécies basicaulicárpicas, frutos se desenvolvem no caule,
próximos ao chão
Diszoocórica pequenos roedores Geralmente são plantas arbustivas portadoras de bagas ou pequenas
drupas que são consumidas e transportadas, podendo, por vezes, ser
enterradas
Mirmecocórica formigas Com elaiossomo ou arilo, ricos em lipídeos; tanto dispersão
primária como secundária
Antropocórica ser humano Em geral, têm importância econômica
228 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

senterradas e enterradas novamente em outros um parâmetro importante para a eficiência da


locais. Nem as sementes que passaram pelo tra- anemocoria. Quanto maior a altura de libera-
to digestivo dos dispersores vertebrados esca- ção da semente, maior o tempo de vôo e maior
pam do transporte para outros locais por car- a distância de dispersão. De modo geral, a ve-
nívoros que se alimentam dos herbívoros ou locidade do vento também aumenta com a dis-
por animais que usam as fezes como fonte de tância do solo, tanto que, em ambiente de flo-
recurso alimentar. resta tropical, a anemocoria está associada a
A importância da dispersão secundária é o árvores emergentes, trepadeiras e lianas (Jan-
rearranjo do padrão de distribuição espacial das zen, 1980; Gentry, 1983; Mantovani, 1993). Em
sementes, favorecendo, com isso, o recruta- áreas de clima sazonal, a dispersão pelo vento
mento em pequenos habitats com maiores é mais comum durante a estação seca, pois a
chances de sobrevivência, o que pode gerar um umidade dificulta a liberação das sementes e
grande impacto nos padrões de estabelecimento afeta a estrutura das alas e das plumas carac-
das plantas (Capítulo 15). Em contrapartida, di- terísticas desse tipo de síndrome. Formações
versos roedores pequenos costumam enterrar vegetais em ambientes de sazonalidade bem-
suas sementes em buracos profundos ou em definida, como o Cerrado, apresentam maior
troncos ocos, os quais definitivamente não são freqüência de anemocoria durante a estação
locais favoráveis ao estabelecimento de plântulas. seca, em contraste com a maior frutificação de
espécies zoocóricas durante a estação chuvosa
(Oliveira e Moreira, 1992; Griz e Machado,
SÍNDROMES DE DISPERSÃO 2001; Barbosa, Silva e Barbosa, 2002; Griz,
NOS DIFERENTES HABITATS Machado e Tabarelli, 2002).
O predomínio de determinado mecanismo de A anemocoria provavelmente surgiu de for-
dispersão em dado habitat sugere que pressões ma independente entre as famílias de lenhosas
proporcionadas pelos agentes dispersores e pe- tropicais, visto ocorrer em grupos filogenetica-
las condições físicas do ambiente tenham atua- mente distantes como Apocynaceae, Bignonia-
do na seleção das espécies com determinadas ceae, Bombacaceae, Caesalpinoideae, Combre-
estratégias de dispersão (Howe e Smallwood, taceae, Dipterocarpaceae, Faboideae, Malpi-
1982). Na vegetação tropical úmida, como a ghiaceae, Mimosoidae, Papilionoidae, Sapinda-
Floresta Amazônica e a Mata Atlântica, a dis- ceae e Sterculiaceae (Janzen, 1980; Barbosa,
persão ocorre com maior freqüência por meio Silva e Barbosa, 2002; Griz, Machado e Tabarelli,
biótico que por vetores abióticos. Nas florestas 2002). A convergência no formato dos diáspo-
tropicais secas, principalmente no período de ros é bastante notável, e uma grande varieda-
estiagem, há maior percentual de espécies com de de estruturas contribui para os mecanismos
síndromes de dispersão associadas a meios de vôo e flutuação (Oliveira e Moreira, 1992;
abióticos, como o vento. Griz, 1996). Em florestas pluviais tropicais, as
A dispersão pelo vento em formações tropi- sementes dispersas pelo vento, em geral, são
cais está geralmente associada às espécies pio- encontradas nas espécies de dossel, em trepa-
neiras (Janzen, 1988), aos ambientes mais se- deiras e epífitas. No estrato inferior, a anemo-
cos e/ou sazonais (Oliveira e Moreira, 1992; Griz coria não ocorre pelo simples fato de haver es-
e Machado, 2001; Barbosa, Silva e Barbosa, cassez de vento nesse ambiente. Entretanto, há
2002), às áreas de vegetação mais abertas várias trepadeiras tropicais cujas sementes são
(Howe e Smallwood, 1982; Marques, 2001), aos dispersas pelo vento quase independentemente
estratos superiores da vegetação (Mantovani, do seu habitat, como em Apocynaceae, Ascle-
1993) ou, ainda, a determinadas formas de vida piadaceae e Bignoniaceae (Janzen, 1980).
(Janzen, 1980; Gentry, 1983; Marques, 2001). A anemocoria envolve pouco investimento
Oliveira e Moreira (1992) observaram que, no energético por parte da planta-mãe na formação
Cerrado, a altura da liberação das sementes é do propágulo e não fica na dependência de ani-
GERMINAÇÃO 229

mais dispersores. Todavia, não está claro até que (1993) inferiu que, por mais eficiente que seja
ponto a (normalmente maior) quantidade de a forma de dispersão, há normalmente um acú-
sementes dispersas pelo vento compensa a perda mulo de sementes próximas à planta-mãe, o
de exatidão e direcionamento conseguidos por que atrai grande número de herbívoros, favore-
outros mecanismos de dispersão, como a zoo- ce a ação de patógenos e acarreta uma competi-
coria. Houve uma forte seleção para a ocorrência ção intra-específica intensa entre as plântulas.
de sementes grandes – característica morfológica Diversos fatores ecológicos podem ter seleciona-
que não favorece a dispersão pelo vento – em do formas de dispersão, e algumas hipóteses
ambientes de floresta, visando aumentar a ca- visam explicar as vantagens da dispersão (Qua-
pacidade de a plântula sobreviver ao desfolha- dro 14.2). Essas hipóteses não são excludentes
mento, à baixa luminosidade e à competição por e todas podem ser aplicadas às espécies como
recursos (Janzen, 1980; ver Capítulo 15). vantagens da dispersão.
Em florestas neotropicais, de 50 a 90% das Se, por um lado, a mortalidade de plântulas
árvores de dossel e aproximadamente 100% dos sob a copa da planta-mãe é grande, devido
arbustos e árvores de sub-bosque possuem fru- inclusive à alta densidade de sementes nesses
tos adaptados à dispersão por animais (Howe locais, por outro, em distâncias crescentes a par-
e Smallwood, 1982). O predomínio de zoocoria tir da planta-mãe, a mortalidade tende a dimi-
entre plantas lenhosas da Mata Atlântica foi nuir, mas também a densidade de sementes
encontrado por diversos autores (Mantovani, (Figura 14.1; Janzen, 1970). Isso pode favorecer
1993; Silva e Tabarelli, 2000; Marques, 2001). e explicar o estabelecimento de plântulas de
Silva e Tabarelli (2000) constataram que, na diferentes espécies em uma mesma área, resul-
Mata Atlântica, ao norte do rio São Francisco, tando em uma diversidade cujos efeitos têm
33,8% das espécies estavam associadas à disper- magnitude variada para cada espécie (Capítulo
são por grandes vertebrados. Mantovani (1993) 15). Todavia, a mortalidade de sementes e plân-
observou que espécies típicas de sub-bosque da tulas em uma relação densidade-dependente
Mata Atlântica, no Estado de São Paulo, apre- não tem sido suficiente para explicar a grande
sentavam síndromes de dispersão zoocórica, se- diversidade de espécies em florestas tropicais.
ja através de frutos carnosos ou de sementes Em se tratando das hipóteses da dispersão
com estruturas favoráveis a esse tipo de disper- (Quadro 14.2), a “hipótese de fuga” propõe que
são. Em um estudo acerca da dinâmica de dis- pequenos habitats sob e fora da copa de árvores
persão em espécies ocorrentes em uma área de em frutificação são idênticos, exceto para inte-
planície litorânea, Marques (2001) observou rações bióticas formadas pela grande quantida-
que 74 e 49% das espécies da floresta de restinga de de sementes caída próxima do indivíduo pa-
e de restinga arbustiva, respectivamente, eram rental. Nesse sentido, seria estratégico que a
dispersas por animais, destacando a família espécie evitasse a dispersão muito próxima da
Myrtaceae, cujas espécies presentes na área de planta-mãe (Howe e Smallwood, 1982).
estudo eram 100% zoocóricas. No Cerrado, em A “hipótese de colonização ou perturbação”
particular nas matas de galeria, a zoocoria (es- propõe que a maior vantagem da distância na
pecialmente a ornitocoria) também foi observa- disseminação de sementes é a ocupação de ha-
da como uma síndrome de dispersão predomi- bitats diferentes daqueles onde os parentais se
nante (Mantovani e Martins, 1988; Melo, Bento encontram (Howe, 1986). Algumas espécies
e Oliveira, 2003). têm requerimentos especiais para a germinação
e o estabelecimento, que são encontrados ape-
nas em raros locais, como uma clareira no dos-
CONSEQÜÊNCIAS DA sel da floresta ou uma área perturbada no sub-
DISPERSÃO DE SEMENTES bosque (Howe e Smallwood, 1982). Espécies
Analisando a estrutura e a dinâmica de espécies colonizadoras podem apresentar duas estraté-
em trechos da Floresta Atlântica, Mantovani gias para ocupar rapidamente locais abertos:
230 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Quadro 14.2 Hipóteses que visam explicar as da planta-mãe ou de espécies competitivas pre-
vantagens da dispersão de propágulos sentes no local. Associada à dormência, a dis-
Hipótese de fuga: dispersão a maiores distâncias tende
persão tende a aumentar a probabilidade de
a afastar a progênie da alta mortalidade comum nas que, pelo menos, alguns descendentes encon-
proximidades dos indivíduos parentais. trem locais apropriados para seu estabeleci-
Hipótese de colonização: ocupação de áreas abertas e mento.
outros habitats ainda não colonizadas pela espécie, au- A terceira hipótese, da “dispersão direcio-
mentando as chances de estabelecimento de novos in- nada”, questiona a eficiência da dispersão ao
divíduos.
acaso (como a anemocoria) e as implicações des-
Hipótese de dispersão direcionada: ocupação de pe- se processo caso as sementes não se depositem
quenos habitats normalmente raros no ambiente e, às
em local favorável ao estabelecimento da plân-
vezes, necessários para o estabelecimento de plântulas
de determinadas espécies. tula. Normalmente, não é aplicada às espécies
zoocóricas, exceto para as espécies com dispersão
secundária, como por formigas (Howe, 1986).

(1) sementes pequenas, típicas de diversas es-


pécies herbáceas, que permanecem dormentes CHUVA DE SEMENTES
no solo até que um evento imprevisível, como A chuva de sementes compreende os eventos
a abertura de clareira devido à queda de uma relacionados à dispersão de diásporos e a área
árvore (Holthuijzen e Boerboom, 1982), o fogo abrangida por esse processo até o estabeleci-
ou o desabamento de terra, promova a germina- mento da plântula. A síndrome de dispersão
ção; (2) sementes grandes que germinam e per- varia enormemente de acordo com seu poten-
manecem, como plantas jovens, no sub-bosque, cial. Os fatores relacionados à dispersão pelo
prontas para continuarem a crescer tão logo ha- vento e por vertebrados podem virtualmente
ja a abertura de uma clareira. Sementes sem levar sementes a grandes distâncias da planta-
dormência também precisam ser dispersas, pois mãe, enquanto a dispersão por formigas e a ba-
o estabelecimento é pouco provável sob a copa lística geram chuvas de semente mais curtas.
Willson (1983) demonstrou que, em espécies
herbáceas, o pico e a distância máxima de dis-
Alta persão são grandes e que a curva da distribui-
Densidade de sementes
ção de sementes é menos abrupta para as es-
pécies anemocóricas e balísticas, comparadas
com as espécies que não dispõem de diásporos
com artifícios especiais de dispersão. Vale salien-
Probabilidade de sobrevivência
tar que existe uma grande variação no potencial
de dispersão dentro de cada mecanismo conheci-
do. A anemocoria sofre significativa influência
Densidade da estrutura física do ambiente em relação a ou-
de plântulas tros tipos de dispersão, como a biótica, que são
mais influenciadas pela densidade inicial da
Baixa
Distância da planta-mãe chuva de sementes, pela proximidade da planta-
mãe e pelas condições biológicas do meio.
 Figura 14.1
Em espécies que apresentam dispersão zoo-
Gráfico representativo da distância ótima de dispersão
para o estabelecimento de plântulas de acordo com córica, as características dos diásporos e os hábi-
a “hipótese de fuga”. Densidade de sementes (–). Pro- tos dos animais influenciam a chuva de semen-
babilidade de sobrevivência (- - - -). Relação sobre- tes. O tamanho relativo das sementes e das es-
vivência de semente/plântula (.....). Adaptada de truturas das asas ou plumas pode ter um efei-
Barbour e colaboradores (1999). to bem mais evidenciado na chuva de semen-
GERMINAÇÃO 231

tes das espécies anemocóricas (Sacchi, 1987).


A composição química e o tamanho do elaios- Chuva de sementes
somo, em sementes mirmecóricas, podem in-
fluenciar a sua taxa de remoção, bem como o
grupo de formigas dispersoras e a direção da
dispersão (Horvitz e Schemske, 1986). A disper-
são de frutos suculentos por vertebrados forra-
geadores gera chuvas de sementes distintas da-
Banco de sementes
quelas produzidas por frugívoros alados, como
aves e morcegos (Howe, 1986).
Acredita-se que as plantas exercem um cer-
to tipo de controle sobre a chuva de sementes
produzida pelos frugívoros, por meio de com-
postos secundários de ação laxativa ou consti- Germinação Danos físicos
pativa presentes na polpa do fruto, afetando o
tempo de retenção no trato digestivo do dis-
persor. Esse tempo, associado a outros fatores
Perda da viabilidade Predação
(Traveset, 1998), pode afetar também os parâ-
metros de germinação, como a germinabilidade
e a taxa de germinação dos diásporos ingeridos.  Figura 14.2
Esquema da dinâmica do banco de sementes no solo.
Adaptada de Luken (1990).

BANCO DE SEMENTES
Banco de sementes pode ser definido como sen-
do o estoque de sementes viáveis existentes no As entradas e as saídas do banco contro-
solo, desde a superfície até as camadas mais lam diretamente a densidade, a composição de
profundas, em uma dada área e em um dado espécies e a reserva genética. Geralmente, uma
momento. O acúmulo de sementes no banco (ou poucas) espécie(s) predomina(m) no ban-
varia de acordo com a entrada (dispersão) e saí- co (Holthuijzen e Boerboom, 1982; Garwood,
da (germinação, morte) de sementes (Figura 1989). O predomínio de sementes de gramí-
14.2). O banco pode ser formado por sementes neas, de espécies arbustivas e de herbáceas no
alóctomas (originárias de outros locais) e/ou banco de florestas tropicais reflete o importante
autóctomas (sementes das espécies do local). papel dessas formas de vida na composição da
A incorporação de novas sementes ao banco vegetação nos primeiros estágios da sucessão
varia amplamente ao longo do ano, e a suces- (Young, Ewel e Brown, 1987).
são é provavelmente regulada por padrões sa- A composição do banco de sementes varia
zonais de ingresso de sementes (Young, Ewel e ao longo das estações do ano. Além disso, em
Brown, 1987). Além das saídas do banco, por função da longevidade dos diásporos, os bancos
exemplo, via germinação, processos bióticos e podem ser caracterizados como transitórios, ou
abióticos podem ocasionar nova dispersão ou seja, formados por sementes de curta viabilida-
movimentação das sementes às camadas mais de, e persistentes, compostos por sementes de
profundas do solo. Predação, patógenos e enve- maior longevidade sob condições naturais.
lhecimento natural podem ocasionar a mortali- Estudos efetuados por Gorresio-Roizman
dade de sementes, reduzindo, assim, a densida- (1993) no banco de sementes, em trechos de
de no banco. O banco de sementes é, portanto, florestas pluviais tropicais em São Paulo indica-
produto dos eventos bióticos e abióticos que ram que, no banco de semente transitório, ha-
ocorrem no ambiente. via um predomínio de sementes grandes, com
232 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

curta longevidade, altas taxas de recrutamento um banco persistente tornam-se muito impor-
de plântulas e elevada taxa de mortalidade, en- tantes para o estabelecimento em clareiras onde
quanto o banco persistente era composto predo- não houve chuva recente de sementes. No en-
minantemente por sementes de espécies arbóreas. tanto, para a maioria das espécies, a regenera-
Diferenças nas características de dispersão ção a partir de sementes enterradas a uma certa
e de dormência das sementes refletem as varia- profundidade depende de algum tipo de pertur-
ções espacial e temporal na composição do ban- bação do solo, pois sementes muito pequenas
co de sementes. Por meio de uma revisão da só conseguem emergir se estiverem na superfí-
literatura acerca dos padrões de síndromes de cie ou a poucos centímetros de profundidade
dispersão e do banco de sementes do ecossis- (Holthuijzen e Boerboom, 1982; Baider, Taba-
tema caatinga, Barbosa, Silva e Barbosa (2002) relli e Mantovani, 1999). Estudando a influên-
concluíram que as espécies autocóricas e zoo- cia da densidade e a composição de espécies
córicas apresentaram características relaciona- lenhosas no banco de sementes na Mata Atlân-
das à formação de banco de sementes perma- tica, no sudeste do Brasil, Baider, Tabarelli e
nente, ao contrário das anemocóricas, que ge- Mantovani (2001) constataram que o banco
ralmente não formam banco de sementes. não continha sementes médias e grandes de
Sementes presentes no solo de florestas tro- espécies lenhosas tolerantes à sombra, sendo a
picais podem ser uma fonte importante de re- maioria de tamanho pequeno pertencente às
crutamento após a perturbação e influenciar o espécies pioneiras herbáceas/sublenhosas das
direcionamento da regeneração da floresta, famílias Asteraceae, Poaceae, Malvaceae e
bem como a sucessão secundária. Baider, Solanaceae. Portanto, a composição de espéci-
Tabarelli e Mantovani (1999) concluíram que, es presentes no banco sugeriu que este teria
após a abertura de clareiras naturais em floresta sua contribuição para a regeneração da Mata
Atlântica Montana, no sudeste brasileiro, o Atlântica em termos de grupos ecológicos, mas
banco de sementes contribuiu para o estabeleci- não no restabelecimento da riqueza de espéci-
mento de espécies da família Melastomataceae, es lenhosas, daí a necessidade de sementes
principal grupo de árvores e arbustos pioneiros oriundas de outros locais para a regeneração
observados nas clareiras da área estudada. das sementes que formavam o banco (Baider,
A redução da densidade e da riqueza de es- Tabarelli e Mantovani, 2001).
pécies no banco de sementes com o aumento A disponibilidade de sementes no banco
da profundidade do solo foi demonstrada (Hol- para a regeneração após uma perturbação pode
thuijzen e Boerboom, 1982; Dalling, Swainel e ser influenciada por padrões temporais de pro-
Garwood, 1997; Baider, Tabarelli e Mantovani, dução, modos de dispersão e longevidade das
2001). As densidades encontradas por Baider, sementes (Grubb, 1977). A avaliação de padrões
Tabarelli e Mantovani (2001), em áreas de flo- de estocagem de sementes no solo durante a
resta Atlântica em diferentes idades de rege- sucessão em floresta na Costa Rica e a habili-
neração, sugerem um decréscimo no estoque dade de a vegetação de diferentes idades res-
de sementes no solo com o avanço da regene- ponder à perturbação foram estudadas por
ração e com a profundidade do solo; trechos Young, Ewel e Brown (1987). Os autores cons-
dessa floresta em regeneração, com cinco e 27 tataram que, imediatamente após uma pertur-
anos, respectivamente, apresentaram 67,4 e bação na floresta, o número de sementes no
56,9 % de sementes enterradas até 2,5 cm de solo caiu vertiginosamente devido à mortalida-
profundidade. Por outro lado, os autores encon- de, ao pequeno ingresso de novas sementes e à
traram uma correlação positiva entre a idade germinação. À medida que a vegetação crescia,
da floresta e a riqueza de sementes de espécies o número de sementes no banco aumentava e,
lenhosas no banco. Dalling e colaboradores após atingir um pico, decresceu gradualmente
(1997, 1998) observaram que sementes enter- até uma quantidade próxima à existente no
radas em maiores profundidades e que formam banco antes da perturbação. A alta freqüência
GERMINAÇÃO 233

desses períodos resulta no decréscimo de rique- rindo assim no recrutamento de novos indiví-
za de espécies, no domínio por espécies de se- duos (Howe, 1977).
mentes de longevidade alta e no estabelecimen- A predação de sementes e plântulas pode
to de novas plântulas a partir do banco (Young, influenciar a abundância de plantas se a den-
Ewel e Brown, 1987). sidade estiver reduzida. Silva e Tabarelli (2001)
A resistência a patógenos é outro fator que constataram que a dispersão e a demografia de
pode ter influência na composição do banco, uma palmeira, Bactris acanthocarpa, em um frag-
determinando de forma diferenciada a longe- mento da Mata Atlântica, foram influenciadas
vidade das sementes. Infelizmente, poucos es- pela extinção local de frugívoros vertebrados.
tudos são realizados in situ, especialmente sobre Os autores também observaram um aumento
bancos de espécies de florestas neotropicais. na taxa de infestação por bruchídeos dos fru-
Augspurger e Kelly (1984) investigaram a in- tos ainda verdes. A predação de sementes na
fluência de patógenos na taxa de mortalidade pré e pós-dispersão pode estar entre os deter-
em banco de plântulas e constataram o efeito minantes dos genótipos que comporão a po-
direto no aumento da mortalidade em plântulas pulação. Se isso realmente acontecer, as carac-
estabelecidas sob a copa da planta-mãe em ár- terísticas que favorecem as sementes de esca-
vores de florestas tropicais. par da predação podem conflitar com caracte-
rísticas que favorecem o estabelecimento. As-
sim sendo, os herbívoros poderiam influenciar
O EFEITO DA FRAGMENTAÇÃO diretamente os genótipos estabelecidos em uma
SOBRE A DISPERSÃO E O população. Em plântulas ou plantas jovens, a
BANCO DE SEMENTES habilidade competitiva (Dirzo, 1984) e o cres-
Atualmente, a fragmentação dos ecossistemas cimento (Coley, 1986) estão inversamente
tropicais representa a maior causa de extinção correlacionados com as resistências, ao menos
local de populações (Wilcox e Murphy, 1985). em algumas espécies. Essa relação entre a re-
Mesmo as áreas de preservação tornaram-se sistência ao ataque enquanto semente e a re-
ilhas em virtude da expansão de cidades, da sistência, a taxa de crescimento, e a habilidade
abertura de estradas e do desenvolvimento so- competitiva enquanto plântula ainda é desco-
cial desorganizado; conseqüentemente, deter- nhecida, sendo necessários mais estudos, es-
minadas espécies têm desaparecido. Quanto pecialmente acerca de ecossistemas em avan-
menor é a área da reserva, mais acelerado é esse çado processo de fragmentação, como a Mata
processo (Howe, 1984). Em florestas tropicais, Atlântica, o Cerrado e a Amazônia.
onde as inter-relações são tênues e frágeis e
cada caso pode ter uma conotação particular,
qualquer distúrbio antrópico torna as interações AGRADECIMENTOS
muito vulneráveis (Futuyma, 1973). Por exem- À professora Dilosa C. A. Barbosa (Departamen-
plo, a extinção local de frugívoros (caça, etc.) to de Botânica da UFPE) pela revisão e pelas
reduz o recrutamento de árvores zoocóricas por sugestões efetuadas no manuscrito.
afetar a taxa de dispersão e reprodução e, conse-
qüentemente, aumentar o risco de extinção lo-
cal de espécies focais. Com a fragmentação, os REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
primeiros grupos a desaparecer são freqüente- AUGSPURGER, C.K. Morphology and dispersal
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C A P Í T U L O 1 5

RECRUTAMENTO
E ESTABELECIMENTO
DE PLÂNTULAS
Felipe Pimentel Lopes de Melo
Antônio Venceslau de Aguiar Neto
Eliana Akie Simabukuro
Marcelo Tabarelli

Uma plântula é um indivíduo vegetal desenvol- que afetam o estabelecimento, o desenvolvi-


vido a partir de uma semente. Em um sentido mento e a sobrevivência de plântulas. A impor-
estritamente fisiológico, um indivíduo será uma tância relativa desses fatores, como disponibili-
plântula (1) enquanto depender da reserva de dade de luz, fogo, estresse hídrico e herbivoria,
sua semente, (2) enquanto uma porção signifi- varia entre populações, entre espécies em um
cativa da sua biomassa for oriunda das reservas mesmo ecossistema e entre os ecossistemas,
da semente ou (3) quando apresentar alguma pois há diferenças significativas nos padrões de
estrutura funcional produzida a partir das reser- perturbações naturais a que cada ambiente está
vas da semente. Na prática, nem sempre é pos- submetido, como incêndios, inundações, aber-
sível identificar essas condições. Como conse- turas de clareiras e ataque de patógenos. Toda-
qüência, há uma tendência de se reconhecer via, as espécies tendem a apresentar respostas
como plântulas os indivíduos jovens com até adaptativas similares a determinados fatores,
50 cm de altura. Dessa forma, uma plântula independentemente de suas relações filogené-
consiste inicialmente de radícula, hipocótilo, ticas e do ecossistema onde ocorrem (conver-
cotilédone(s) e gema plumular, que posterior- gência adaptativa). Cada conjunto de adapta-
mente darão origem à raiz, aos caules e às fo- ções define uma estratégia de regeneração que
lhas. é parte integrante da história de vida de cada
Dentro do ciclo de vida das plantas com se- espécie vegetal.
mentes, o recrutamento, o desenvolvimento e Neste capítulo serão abordados alguns dos
a sobrevivência das plântulas são eventos cru- fatores que afetam o estabelecimento, o desen-
ciais para o crescimento e/ou manutenção das volvimento e a sobrevivência de plântulas. As
populações. Recrutamento significa o ingresso principais estratégias de regeneração serão dis-
de indivíduos em uma categoria qualquer e, no cutidas, e a importância relativa de fatores e
caso de plântulas, esse evento depende da ger- estratégias presentes nos principais ecossiste-
minação de sementes – emissão da radícula – e mas brasileiros será analisada com base em
do estabelecimento das plântulas – emissão das estudos desenvolvidos com espécies vegetais
superfícies fotossintéticas. nativas. Por fim, será discutida a importância
Os ecossistemas tropicais terrestres com- de investigar como os fatores de natureza an-
partilham muitos dos fatores físicos e biológicos trópica podem afetar o recrutamento de espé-
238 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

cies vegetais e ameaçar uma parcela significa- casos, se as reservas contidas na semente foram
tiva da diversidade biológica brasileira. Este ca- totalmente utilizadas durante a expansão da
pítulo apresenta um enfoque ecológico e res- plântula, essa fase pode ser inconspícua ou ine-
tringe-se à discussão dos aspectos citados para xistente (plântulas que apresentam cotilédones
plântulas de espécies lenhosas tropicais (sobre- fotossintetizantes). Na fase juvenil, os tecidos
tudo árvores e arbustos), em função da impor- formados na etapa de utilização das reservas
tância desse grupo na flora brasileira e tropical. possibilitam que a planta se torne independente
dos cotilédones, mesmo que estes ainda estejam
ligados a ela. Entre os fatores que afetam o esta-
FATORES MORFOFISIOLÓGICOS belecimento, o desenvolvimento (fases 2 e 3) e
E AMBIENTAIS QUE INFLUENCIAM a sobrevivência de plântulas estão: (1) quanti-
O ESTABELECIMENTO, O dade e qualidade das reservas das sementes,
DESENVOLVIMENTO E A (2) morfologia funcional dos cotilédones, (3)
SOBREVIVÊNCIA DE PLÂNTULAS fatores abióticos e (4) interações com outras
São muitos os fatores que afetam o estabeleci- espécies.
mento, o desenvolvimento e a sobrevivência das
plântulas, como patógenos (Janzen, 1970), es- Reservas das sementes e morfologia
tresse hídrico, danos mecânicos, herbivoria e funcional dos cotilédones
competição intra e interespecífica. A maneira A quantidade e a qualidade das reservas
como cada espécie vegetal responde a esses fa- energéticas das sementes estão positivamente
tores é determinada, em parte, por adaptações associadas à morfologia funcional do cotilédone
das plântulas, as quais representam respostas (monocotiledôneas) ou dos cotilédones (dico-
evolutivas aos mesmos. Em outras palavras, en- tiledôneas) e afetam de forma significativa o
tender essas adaptações significa compreender estabelecimento e o desenvolvimento das plân-
como as plântulas interagem com o ambiente tulas. A reserva contida nas sementes provê
físico e com os outros organismos que as cer- energia e nutrientes para que elas possam
cam. emergir da serrapilheira, crescer em ambientes
De acordo com Garwood (1996), espécies com baixa disponibilidade de luz, propiciar a
lenhosas tropicais apresentam cinco estádios substituição de tecidos mortos ou removidos
ontogenéticos (ou fases) que podem ser reco- por herbívoros ou mesmo proporcionar energia
nhecidos: (1) semente, (2) expansão ou alonga- para a produção de compostos secundários para
mento da plântula, (3) utilização das reservas, a defesa contra herbívoros e patógenos. O perío-
(4) juvenil e (5) adulto. Apesar de não ser espe- do de esgotamento das reservas deve coincidir
cificamente tratada neste capítulo, a fase 1 é com o estádio em que as plântulas apresentam
de extrema importância para a compreensão sistema radicular e estruturas fotossintéticas
do desenvolvimento da plântula, uma vez que bem-desenvolvidas; caso contrário, as plântulas
sua estrutura e sua morfologia revelam muito tendem a morrer (Kitajima, 1992).
sobre a estrutura e a morfologia inicial da res- O total de reservas disponíveis para uma
pectiva plântula. A fase de alongamento da plântula não é determinado somente pela mas-
plântula (2) ocorre imediatamente após a ger- sa da semente, mas é influenciado também pela
minação e vai até a emissão do primeiro tecido composição química da mesma. Três tipos bási-
fotossintetizante. Nessa fase, a plântula utiliza cos de reserva são freqüentemente encontrados
somente os recursos provenientes dos tecidos nas sementes (Capítulo 2): carboidratos (se-
de reserva da semente. A fase 3 é aquela na mentes amiláceas), proteínas (sementes pro-
qual a plântula faz uso dos tecidos de reserva téicas) e lipídeos (sementes oleaginosas). Em-
da semente ou das estruturas desenvolvidas a bora os cotilédones sejam a estrutura mais co-
partir de recursos previamente transferidos des- nhecida, fazem parte dos tecidos de reserva o
tes para a plântula em expansão. Em alguns endosperma (xenófito, ver Capítulo 1) e o pe-
GERMINAÇÃO 239

risperma. A variação entre as espécies na con-


centração de minerais é pequena se comparada
à variação no tamanho das sementes, apesar A
de a concentração de nutrientes estar relaciona-
da ao peso das mesmas.
De forma geral, durante a embebição, os
cotilédones absorvem recursos do endosperma
da semente. Durante e após a geminação, eles B

transferem reservas para os tecidos em forma-


ção, como caule, folhas e raízes. O padrão de
utilização e alocação dessas reservas depende
muito da posição e da morfologia funcional dos
cotilédones. Parte da diversidade morfológica
das plântulas pode ser considerada como adap-
tação a fatores bióticos ou abióticos, uma vez
que a sobrevivência nessa fase de vida de uma
planta é essencial para o sucesso reprodutivo
da espécie (Garwood, 1996). Há, na verdade,
grande variação morfológica das plântulas, que 1 cm
podem ter desde poucos milímetros até 0,5 m
de altura. Variações na morfologia dos cotilé-
 Figura 15.1
dones também são muito grandes e podem for- Morfotipos funcionais de cotilédones em plântulas
necer importantes pistas sobre a estratégia de com aproximadamente a mesma idade. A) Plântula
regeneração de uma espécie. Há uma enorme de Eschweilera ovata com cotilédone do tipo de reser-
gama de classificações elaboradas e utilizadas va nutritiva (seta) e B) plântula de Mabea ocitendalis
por vários autores. Todavia, todas têm em co- com cotilédones foliáceos fotossintetizantes (seta).
(Foto dos autores).
mum o fato de separar as plântulas em grupos
ecológicos de acordo com a morfologia, a função
e a posição dos cotilédones. Resumidamente,
podem-se distinguir dois grandes grupos nessas cotilédones fotossintetizantes se desenvolvem
classificações: as plântulas possuidoras de co- mais rapidamente que as possuidoras de coti-
tilédones fotossintetizantes e aquelas com co- lédones de reserva. Portanto, a reserva das se-
tilédones de reserva nutritiva (Figura 15.1). mentes e o tipo funcional dos cotilédones interfe-
Os cotilédones foliáceos e fotossintetizantes rem, significativamente, no estabelecimento e
estão associados a sementes com baixo conteú- no desenvolvimento das plântulas (Figura 15.2).
do de reservas (sementes pequenas), e seu esta-
belecimento praticamente consome as reservas Fatores abióticos
da semente. Todavia, esses tipos de cotilédones Luz, temperatura e umidade estão entre os
são capazes de suprir as demandas energéticas principais fatores que interferem no crescimen-
iniciais das plântulas, caso haja disponibilidade to das plântulas. A radiação solar que alcança
de luz adequada para a realização de fotossín- a superfície da Terra apresenta comprimento
tese (Kitajima, 1992). Em contraste, os cotilé- de ondas que variam entre 290 e 3.000 nm, sen-
dones de reserva garantem energia e nutrientes do que ondas com comprimento entre 400 e
para o desenvolvimento da plântula enquanto 700 nm compõem a radiação fotossintetica-
a produção de fotossintatos é limitada. Além mente ativa (RFA). Tanto a quantidade como a
desse fato, existe uma associação entre o tipo qualidade da luz podem ser alteradas antes de
funcional de cotilédone e a velocidade de germi- atingirem o solo (e as plântulas). Por exemplo,
nação das sementes, visto que as plântulas com ao passarem pelo dossel das árvores, certos
240 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Em geral, espécies de crescimento rápido


Tamanho Concentração de
da semente nutrientes na respondem positivamente à luz (i.e. aumento
semente da radiação fotossinteticamente ativa, ou RFA),
aumentando as taxas de germinação, as de re-
Morfologia crutamento e a velocidade de desenvolvimento
funcional dos
cotilédones das plântulas. Em ambientes iluminados, as ta-
xas de respiração e fotossíntese aumentam tan-
Alongamento to nessas espécies quanto nas de crescimento
da plântula
lento (Chazdon, Lee e Fetcher, 1996). Entre-
Tamanho da plântula Duração das reservas tanto, a magnitude do aumento é determina-
antes da abertura da semente da pelo que se denomina plasticidade fotossin-
das folhas
tética, que pode ser definida como a amplitude
das taxas máximas de fotossíntese, ou seja, o
Aclimatação Alocação
à luz de carbono quanto a plântula pode aumentar sua taxa fo-
tossintética quando estimulada por mais luz.
Espécies de crescimento rápido, quando subme-
Sobrevivência Taxa máxima
à sombra de crescimento tidas à alta intensidade luminosa, aumentam
em várias vezes a taxa de assimilação de car-
 Figura 15.2 bono; da mesma forma, essas taxas podem di-
Esquema geral demonstrativo dos fatores morfofisio- minuir bruscamente quando submetidas à bai-
lógicos que influenciam o desenvolvimento da plân- xa luminosidade, caracterizando uma grande
tula. Adaptada de Kitajima (1996). plasticidade fotossintética (Strauss-Debenedetti
e Bazzaz, 1991). Por outro lado, espécies de
crescimento lento possuem uma amplitude
comprimentos de onda, em particular na re- muito menor de variação na taxa fotossintética
gião do vermelho e do azul do espectro lumino- quando comparadas às de crescimento rápido,
so, são absorvidos pelas folhas, resultando em indicando adaptação a ambientes sombreados.
que a luz (filtrada) que chega até o solo da mata Da mesma forma que a luz, as temperaturas
apresenta menor irradiância e, ao mesmo tem- próximas à superfície do solo podem variar bas-
po, maior proporção de luz vermelho-extremo tante entre os ambientes e afetar as plântulas.
em relação ao vermelho, quando comparada Grandes clareiras nas florestas tropicais, por
com a luminosidade sob sol pleno. Nesses am- exemplo, podem apresentar maiores amplitu-
bientes sombreados, as plantas de sol, por ação des térmicas do que locais sombreados do sub-
do fitocromo predominantemente na forma bosque. O aumento da temperatura resulta em
inativa (Fv) (ver Capítulos 6 e 8), apresentam altas taxas de respiração na maioria das semen-
alongamento do internó, redução da área foliar tes, diminuindo assim o tempo de dormência e
e das ramificações e emissão de folhas de cor a quiescência (Baskin e Baskin, 2001). Altas
verde-clara, caracterizando o estiolamento. Pa- taxas de respiração também são desencadeadas
ra compensar reduções na quantidade e mu- nas plântulas devido ao aumento de temperatu-
danças na qualidade da luz, plântulas mantidas ra nos ambientes onde estas se encontram.
em sombreamento ampliam a eficiência da cap- Plântulas que não são capazes de suprir as per-
tura de luz com o aumento da razão clorofila b/ das de carbono via altas taxas de respiração ter-
a, aumento da razão de área foliar e redução minam por dessecar e morrer.
da razão raiz/parte aérea. Essas mudanças mor- A disponibilidade de água é outro fator que
fofuncionais caracterizam um maior investi- pode ser considerado limitante para o cresci-
mento por parte das plântulas em aproveitar o mento das plântulas. Mais especificamente, o
pouco de luz disponível no sub-bosque. balanço entre o ganho de água por meio da ab-
GERMINAÇÃO 241

sorção pelas raízes e a perda de água por eva- das, clorose e necrose apical são comuns, caso
potranspiração determina a probabilidade de as plântulas não possuam adaptações para a
sobrevivência das plântulas. Nos trópicos, as salinidade, como ajuste osmótico, glândulas de
plantas desenvolveram mecanismos para evitar sal ou compartimentalização iônica (Cordazzo,
a perda excessiva de água, como a queda das 1999).
folhas durante a estação seca e o fechamento
dos estômatos em períodos críticos ao longo do Interações entre espécies
dia (como períodos mais quentes). O fecha- De modo geral, a quantidade de plântulas
mento temporário dos estômatos é uma estraté- recrutadas para a fase juvenil é impressionan-
gia capaz de manter o turgor do mesófilo, sendo temente menor do que a que germinou. Esse
bem-documentada tanto para espécies que se “controle” das populações vegetais é, em mui-
estabelecem em ambientes de baixa disponibili- tos casos, exercido por patógenos (fungos, bac-
dade luminosa (Mukley, Smith e Wright, 1991) térias, helmintos) e herbívoros (insetos e ma-
quanto para aquelas que se desenvolvem em míferos). A remoção de cotilédones e de folhas
ambientes de luz solar direta (Fetcher, 1979). nos primeiros dias após a emergência, por
Todavia, o regime de fechamento/abertura exemplo, (1) reduz o peso dos nódulos que ocor-
estomático parece variar bastante entre as espé- rem em espécies de Leguminosae; (2) causa
cies, tornando difícil estabelecer um padrão ge- decréscimo na taxa de crescimento das plân-
ral entre elas. Até mesmo espécies com taxas tulas; (3) reduz a capacidade de as plântulas
fotossintéticas idênticas podem apresentar pa- produzirem brotação nas axilas cotiledonares;
drões distintos de fechamento e abertura dos e (4) aumenta as taxas de mortalidade, pois
estômatos, sugerindo diferentes graus de efi- carboidratos, proteínas, lipídeos e enxofre, en-
ciência no uso da água (Press et al., 1996). Nas tre outros, são translocados dos cotilédones
espécies que demandam elevada disponibilida- para a plântula. Em ambientes úmidos, vários
de de luz para crescer, uma menor relação mas- fungos, principalmente os presentes nas se-
sa foliar/área foliar produz uma folha menos mentes, inibem a germinação e provocam a
densa se comparada àquelas que demandam mortalidade de muitas plântulas. Os fungos pa-
pouca luz, aumentando assim a taxa fotossin- recem atuar como fonte de mortalidade na fase
tética e a ventilação. Em geral, as plântulas de plântula, não afetando significativamente
morrem por dessecação se submetidas a estres- os estádios posteriores.
se hídrico antes de ter seu sistema radicular Esses fatos denotam a importância das in-
bem-desenvolvido, ou seja, especialmente na terações entre espécies para o sucesso do esta-
fase de expansão. belecimento, do desenvolvimento e da sobrevi-
Se, por um lado, a baixa disponibilidade de vência das plântulas. As respostas morfofisio-
água resulta em menor massa da parte aérea e, lógicas das plantas, como rápida expansão da
conseqüentemente, emergência lenta das plân- folha, desenvolvimento de compostos secundá-
tulas (Paulilo, Felippe e Dale, 1993), por outro, rios, associação com formigas por meio de nec-
a saturação hídrica é superada por adaptações tários e domáceas, produção sincrônica de fo-
que incluem: (1) formação de lenticelas lhas e retardamento da coloração esverdeada
hipertróficas, (2) raízes adventícias, (3) inibi- (delayed greening), são consideradas defesas con-
ção do alongamento dos entrenós, (4) acelera- tra a herbivoria. Para se ter uma idéia da magni-
ção da senescência e abscisão foliar e (5) dete- tude das respostas à herbivoria: as espécies de
rioração das raízes (por ação de microrganis- florestas tropicais podem apresentar entre 5 e
mos), com substituição por outras mais espes- 20% do peso seco das folhas formado por com-
sas e pouco ramificadas (Medri et al., 1998). postos secundários, como taninos, alcalóides e
Além de luz, temperatura e umidade, o estresse terpenos, o que significa que as plantas inves-
salino também pode afetar o desenvolvimento tem uma grande quantidade de energia na ela-
e a sobrevivência das plântulas. Folhas enrola- boração desses compostos. Em muitos casos, da-
242 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

nos por herbivoria ocorrem concentrados em parte de sua energia no esforço reprodutivo, em
plântulas e folhas jovens, porque são mais tenras, detrimento de investimentos na manutenção
nutritivas e podem conter menor quantidade de dos indivíduos (defesa química e estrutural
defesas químicas (Coley, Bryan e Chaplin, 1985). contra herbivoria). As espécies k apresentam
Um dos aspectos mais interessantes da padrão de alocação de energia de forma inversa.
mortalidade de plântulas causada pela ação de Assim, cada estratégia compartilha um conjunto
patógenos e de herbívoros é a relação com a de atributos comuns que se referem a regenera-
distância da planta-mãe. Janzen (1970) e Con- ção, crescimento, esforço reprodutivo, modo de
nell (1971) caracterizaram a mortalidade de polinização e dispersão de sementes, entre outros
plântulas próximas aos adultos co-específicos (Whitmore, 1990). No caso de árvores e arbustos
como uma função densidade-dependente, ou das florestas tropicais, as estrategistas r e k cor-
seja, o adensamento das plântulas próximas à respondem com freqüência às plantas pioneiras
matriz facilitaria o ataque de patógenos e herbí- e às tolerantes à sombra, respectivamente. Cada
voros e possivelmente aumentaria a competição grupo de espécies compartilha atributos comuns,
intra-específica (modelo Janzen-Connell). Os como descrito a seguir.
níveis de predação de sementes e de mortalida-
de de plântulas próximas das plantas matrizes Pioneiras
seriam tão drásticos que inviabilizariam a subs- Entre as características das espécies pionei-
tituição de uma árvore adulta por outro adulto ras estão: (1) produção abundante de sementes,
da mesma espécie nas proximidades. (2) sementes pequenas e com pouca reserva
energética, (3) sementes com dormência, (4)
produção de plântulas pequenas e dotadas de
ESTRATÉGIAS DE cotilédones fotossintetizantes, (5) dispersão
REGENERAÇÃO DE abiótica ou conduzida por vertebrados de há-
PLANTAS LENHOSAS bito alimentar generalista, (6) polinização abió-
TROPICAIS tica ou pouco especializada, (7) ciclo de vida
O estabelecimento, o desenvolvimento e a so- curto e (8) necessidade de luz solar direta (al-
brevivência de plântulas são afetados por diver- tos níveis de RFA) para germinação, recruta-
sos fatores morfofisiológicos e abióticos e por mento, desenvolvimento e sobrevivência de
interações biológicas, como descrito na seção plântulas, indivíduos jovens e adultos.
anterior. A forma como as espécies respondem A principal interpretação dessas caracterís-
a esses fatores determina o sucesso ou a falha ticas é que elas representam adaptações à colo-
no estabelecimento de um conjunto de plân- nização de habitats efêmeros, como clareiras
tulas capazes de se desenvolver e atingir os pró- naturais e áreas de deslizamentos de terra, onde
ximos estádios do ciclo de vida. Dá-se o nome temporariamente há maior disponibilidade de
de estratégia de regeneração ao conjunto de luz. Uma outra característica desse tipo de ha-
atributos fisiológicos e morfológicos que con- bitat é a imprevisibilidade de sua ocorrência no
ferem às espécies vegetais a capacidade de esta- tempo e no espaço (Alvarez-Buylla et al., 1996).
belecer novos indivíduos no ambiente (sensu Por exemplo, em florestas tropicais úmidas, as
Swaine e Whitmore, 1988). Mais especifica- clareiras naturais ocupam cerca de 1 a 5% da
mente, trata-se de atributos das sementes, das área total (Clark, 1990), e qualquer árvore da
plântulas e dos indivíduos jovens. floresta pode ser atingida por um raio, rachar e
De maneira geral, podemos distinguir as cair abrindo uma clareira natural. A produção
plantas quanto a duas grandes estratégias de um grande número de sementes aumenta a
biológicas: as estrategistas r e as estrategistas k probabilidade de algumas delas alcançarem os
(sensu Pianka, 1974). De forma muito sucinta, sítios favoráveis à germinação ou permanece-
estrategistas r são plantas que alocam grande rem dormentes no solo enquanto não ocorre
GERMINAÇÃO 243

alguma perturbação natural ou antrópica que quantidade de reservas, (3) dispersão de se-
incremente a disponibilidade de luz (Baskin e mentes por vertebrados, (4) plântulas com co-
Baskin, 2001). tilédones de reserva e (5) ciclo de vida longo.
Por outro lado, é energeticamente possível Para serem dispersas, sementes grandes ge-
produzir grande quantidade de sementes ape- ralmente precisam de um vetor biológico, como
nas se estas apresentarem quantidades limita- mamíferos e aves, que pode também facilitar o
das de reserva. Nesse caso, a redução na quan- processo de germinação por meio da escarifi-
tidade de reservas pode ser, em contrapartida, cação física ou química durante a manipulação
compensada por cotilédones fotossintetizantes, ou até mesmo pelo processo de enterramento
os quais incrementam a produção de fotos- das sementes. Além disso, os vertebrados são
sintatos para as plântulas. Elevada atividade fundamentais para dispersar as sementes dire-
fotossintética é essencial para o rápido desen- tamente em sítios adequados ao recrutamento
volvimento da plântula e do indivíduo jovem e (hipótese da dispersão direta sensu Howe e
para que o adulto entre na fase reprodutiva an- Smallwood, 1982).
tes que novas perturbações ocorram ou que A grande quantidade de reserva energética
plantas tolerantes à sombra dominem o ambi- nas sementes de plantas tolerantes à sombra
ente (Whitmore, 1990). Árvores e arbustos pio- possibilita o estabelecimento e o desenvolvi-
neiros das florestas tropicais participam, dessa mento de plântulas maiores que emergem da
forma, dos estágios iniciais da regeneração da serrapilheira e conseguem captar a pequena
floresta após a abertura de clareiras naturais quantidade de luz que alcança o chão da flores-
ou depois de qualquer perturbação que desen- ta. Em muitos casos, a luz que consegue atra-
cadeie o processo de regeneração. vessar a copa das árvores permite taxas fotos-
Alguns exemplos de espécies de árvores sintéticas que apenas compensam as perdas de
pioneiras são bem-conhecidos para diversos carbono com a respiração, sendo que as plân-
ecossistemas brasileiros. Na região amazônica, tulas enfrentam um período crítico quando
destacam-se as espécies de Cecropia (Moraceae) ocorre os esgotamento das reservas. Em muitas
e Vismia (Guttiferae), as quais dominam os situações, elas apresentam desenvolvimento
estágios iniciais da regeneração das florestas expressivo (incremento de matéria seca) so-
de terra firme (Mesquita, Delamônica e Lau- mente quando ocorre um crescimento
rance, 1999). Na Mata Atlântica, espécies de significativo da disponibilidade de luz solar,
Melastomataceae, Flacourtiaceae e Myrsina- com aumento na proporção vermelho/verme-
ceae, entre outras, são citadas como pioneiras lho longo. O desenvolvimento lento torna esse
e ocorrem em estágios iniciais de regeneração tipo de plântula vulnerável ao ataque de pató-
da floresta em clareiras naturais e em áreas de genos e herbívoros e, dessa forma, ela precisa
agricultura abandonadas (Tabarelli e Manto- investir parte de sua energia em defesas quími-
vani, 2000). Na Caatinga, a freqüência de pio- cas e estruturais.
neiras também é elevada, destacando-se espé- Pode-se deduzir, a partir dessas característi-
cies de Mimosa, Caesalpinia, Jatropha e Cnidosculus cas biológicas, qual o tipo de habitat é ocupado
(Leguminosae e Euphorbiaceae). por esse grupo de espécies. Também conhecidas
como espécies “clímax”, as espécies que conse-
Tolerantes à sombra guem germinar e se estabelecer sob condições
Espécies tolerantes à sombra podem ser re- de pouca luminosidade são os componentes
conhecidas por algumas características gerais mais conspícuos dos estágios mais avançados
como: (1) germinação de sementes, estabeleci- da regeneração das florestas tropicais e dos tre-
mento e desenvolvimento das plântulas em chos de floresta madura (Swaine e Whitmore,
ambientes com baixa disponibilidade de luz so- 1988). Exemplos de espécies tolerantes à som-
lar, (2) produção de sementes com grande bra são fáceis de encontrar em qualquer dos
244 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

ecossistemas brasileiros. Na Amazônia Central, 900 mm e de estações secas com duração entre
árvores com grandes sementes das famílias 7 e 11 meses. Em algumas regiões, secas com
Lecythidaceae, Chrysobalanaceae e Sapotaceae mais de 12 meses de duração ocorrem periodi-
ocorrem com muita freqüência nas florestas de camente. Segundo Barbosa (2003), a maioria
terra firme. Na Mata Atlântica, são comuns as das espécies lenhosas apresenta recrutamento
espécies de Lauraceae e Myrtaceae (Tabarelli e de plântulas no início da estação chuvosa, e al-
Mantovani, 1999). gumas espécies apresentam plântulas com
Apesar da validade e da utilidade do concei- adaptações fisiológicas e morfológicas para en-
to de pioneiras e tolerantes à sombra, é preciso frentar períodos de escassez de água no solo.
ressaltar que estudos têm identificado espécies, Dentre essas adaptações, pode-se salientar: (1)
nas florestas tropicais, com requerimentos in- crescimento rápido da raiz principal ou axial,
termediários de luz e que compartilham carac- que pode atingir as camadas inferiores do solo,
terísticas biológicas comuns a ambos os grupos e (2) desenvolvimento de raízes tuberosas com
(veja Thompson, Stocker e Kriedermann, 1998). fibras gelatinosas, capazes de armazenar água
Muitas espécies de árvores tropicais que ocor- e amido. Entre as espécies que apresentam es-
rem na floresta madura, mais exatamente no sas adaptações estão árvores comuns na Caatin-
dossel e no extrato emergente, possuem elevada ga, como Anadenanthera colubrina (Legumino-
exigência de luz, seja na fase de germinação, sae), Myracroduon urundeuva (Anacardiaceae) e
de estabelecimento ou de crescimento (Clark, Schinopsis brasiliensis (Anacardiaceae). No caso
1986). Em alguns casos, árvores emergentes de A. colubrina, Barbosa e Barbosa (1996) cons-
chegam a cessar o seu crescimento em determi- tataram que a tuberização está restrita ao está-
nada fase da vida, retomando-o novamente gio de plântula, o que evidencia a importância
quando uma clareira é aberta e quando ocorre do estresse hídrico nesse estádio de desenvolvi-
maior disponibilidade de luz solar direta. Uma mento das plantas.
síntese das características de sementes e plân- Dois outros fatores podem ser importantes
tulas de espécies lenhosas tropicais tolerantes à na Caatinga: o ataque de patógenos e a herbi-
sombra e pioneiras encontra-se no Quadro 15.1. voria por caprinos. Experimentos realizados em
caso de vegetação com Auxema oncocalyx (Bora-
ginaceae) indicam que o ataque de fungos pode
ESTABELECIMENTO, afetar significativamente o desenvolvimento e
DESENVOLVIMENTO E a sobrevivência de plântulas. Silveira (2002)
SOBREVIVÊNCIA DE constatou que plântulas com até 75% da área
PLÂNTULAS EM cotiledonar atacada por fungos acumularam
ECOSSISTEMAS apenas 15% do total de matéria seca acumulada
BRASILEIROS por plantas sadias, e 75% delas morreram até o
Os fatores que afetam o estabelecimento, o de- quinto mês de vida, enquanto as plântulas sa-
senvolvimento e a sobrevivência de plântulas dias apresentaram 100% de sobrevivência no
de espécies lenhosas nos ecossistemas brasilei- mesmo período.
ros têm importâncias relativas distintas. No A população caprina no Brasil é de cerca
caso da Caatinga, a deficiência de água no solo de 12 milhões de cabeças, sendo que 92% en-
(estresse hídrico) parece ser um dos fatores que contram-se nos estados do Nordeste, principal-
mais interfere no sucesso do estabelecimento mente na região semi-árida coberta por vegeta-
e na sobrevivência das plântulas. A Caatinga é ção de Caatinga (Medeiros et al., 2000). No que
um mosaico vegetacional composto por flores- se refere à herbivoria por caprinos, ainda não
tas secas e porções de vegetação arbustiva (sa- existem estudos quantitativos sobre o impacto
vana-estépica, sensu Veloso, Rangel-Filho e desses animais sobre o estabelecimento e a so-
Lima, 1991), em decorrência de níveis de pre- brevivência de plântulas na Caatinga. Todavia,
cipitação média anual que variam entre 240 e um estudo recente (Leal, Vicente e Tabarelli,
GERMINAÇÃO 245

Quadro 15.1 Características de sementes e plântulas de espécies lenhosas tropicais tolerantes à


sombra e pioneiras (adaptado de Kitajima, 1996)

Espécies
Características tolerantes à sombra Pioneiras

Tamanho da semente grande pequeno


Conteúdo lipídico ou de nitrogênio na semente variável variável
Germinação em ambiente de clareira baixa alta
Função primária dos cotilédones armazenamento fotossintética
Tempo de utilização da reserva longo curto
Tamanho inicial da plântula grande pequeno
Alocação de recursos para substâncias de defesa alta baixa
Velocidade de aclimatação lenta rápida
Plasticidade fotossintética baixa alta
Sobrevivência de plântulas à sombra alta baixa

2003), realizado com base em entrevistas com madas mais úmidas de solo e, no caso de Kiel-
criadores na região de Xingó, Alagoas, indica meyera coriacea (árvore, Guttiferae), o conhecido
que esses animais consomem quase todos os pau-santo, isso pode acontecer somente após o
tipos de tecidos e estruturas vegetais disponí- quinto ano de vida das plântulas.
veis, o que inclui, além de folhas, flores, fru- Mas, ao contrário da Caatinga, as formas
tos, sementes, cascas e plântulas de espécies savânicas do Cerrado são submetidas a incên-
lenhosas. De acordo com o estudo de Leal, Vi- dios periódicos (naturais ou antrópicos) que
cente e Tabarelli, 2003), cerca de 30% das es- ocorrem com intervalos entre um e cinco anos
pécies de árvores e arbustos da região têm suas (Moreira, 2000). Freqüentemente, trata-se de
plântulas consumidas pelos caprinos, que po- incêndios rápidos, de superfície, que queimam
dem atingir densidades de 0,5 a 1,2 animal/hec- o componente herbáceo da vegetação e a bio-
tare. Dessa forma, é razoável supor que os ca- massa morta sobre o solo (Moreira, 2000). Hoff-
prinos não só afetam a sobrevivência de plân- mann (1999) registrou as taxas de mortalidade
tulas (impacto demográfico), mas também de plântulas por fogo para cinco espécies de ár-
constituem um fator de seleção natural impor- vores e arbustos que ocorrem no Cerrado. A
tante para as plantas lenhosas nesse ecossiste- taxa de mortalidade variou entre 33% para
ma. Dois outros aspectos do recrutamento de plântulas de Rourea induta (arbusto, Connara-
plântulas lenhosas ainda carecem de investiga- ceae) e 100% das plântulas de Miconia albicans
ção na Caatinga: o efeito da salinidade e a im- (arbusto, Melastomataceae). No caso de M. al-
portância da dispersão de sementes por agentes bicans, Hoffmann (1999) estimou que seria ne-
bióticos como formigas. cessário um período de cinco anos sem a ocor-
Como a Caatinga, o Cerrado é um mosaico rência de incêndios para que essa espécie apre-
vegetacional composto por savanas, florestas sentasse um recrutamento significativo de indi-
secas, florestas de galeria e campos. Nos tipos víduos provenientes de sementes (i.e., reprodu-
savânicos, a deficiência de água no solo durante ção sexual).
a estação seca afeta o estabelecimento e a so- Em outro estudo, Hoffmann (2000) avaliou
brevivência das plântulas, sendo comuns plân- a capacidade de sobrevivência de plântulas a
tulas com estruturas de reserva como xilopódios incêndios, comparando plantas lenhosas típicas
(Rizzini, 1975). Oliveira e Silva (1993) argu- das formas savânicas e aquelas consideradas
mentaram, por exemplo, que várias espécies do espécies florestais. O autor concluiu que: (1)
Cerrado apresentam plântulas que perdem a as espécies florestais apresentam plântulas
parte área todos os anos. Caules definitivos só mais susceptíveis ao fogo (nenhuma plântula
são emitidos quando as raízes alcançam as ca- sobreviveu) e (2) entre as espécies de savana,
246 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

a susceptibilidade das plântulas ao fogo está níveis de RFA. Esse incremento de matéria seca,
inversamente correlacionada com o peso das associado à disponibilidade de luz, é conse-
sementes (R2 = 0,6), pois essa característica qüência do aumento na atividade fotossintéti-
está associada com a capacidade de rebrotar das ca, que atinge seu máximo no nível de 20% de
plântulas. No caso de K. coriacea, o percentual RFA. A competição intra-específica por luz é,
de sobrevivência das plântulas em parcelas sem dúvida, um dos fatores que explicam a
queimadas variou entre 40 e 100%, dependendo mortalidade de plântulas de palmiteiro superior
da quantidade de vegetação lenhosa nas parce- a 80%, visto que essa espécie forma densos ban-
las. Além da capacidade de rebrotar, o recruta- cos com dezenas de milhares de plântulas por
mento de plântulas no início da estação chuvo- hectare (Conte et al., 2000).
sa é outra característica que pode minimizar o Embora a disponibilidade de luz seja um
impacto do fogo sobre o estabelecimento e a fator-chave nas florestas tropicais, doenças, her-
sobrevivência das plântulas, pois os incêndios bivoria, danos mecânicos e alagamentos perió-
ocorrem preferencialmente no final da estação dicos podem afetar, de forma isolada, combina-
seca (Moreira, 2000). da ou sinérgica, o destino das plântulas nas flo-
Nas florestas tropicais, como a Mata Atlân- restas Atlântica e Amazônica. Isso decorre, em
tica e a Floresta Amazônica, a quantidade e a parte, da elevada riqueza de organismos que ha-
composição da luz que chega ao chão da floresta bitam o chão dessas florestas e que desenvolve-
parecem ser um dos fatores mais importantes ram habilidades para explorar sementes e plân-
para o estabelecimento e a sobrevivência de tulas como fonte de alimento (p. ex., ungulados
plântulas de espécies lenhosas, principalmente e roedores) e da enorme heterogeneidade do
em porções dessas florestas sem estação seca ambiente físico no interior destas florestas.
definida. De acordo com Chazdon e Fetcher A combinação de fatores agindo sobre a so-
(1984), entre 0,5 e 4% de radiação fotossinteti- brevivência de plântulas está bem-descrita para
camente ativa (RFA) alcança o chão da flores- algumas espécies de árvores do gênero Pouteria
ta. Dessa forma, muitas espécies de árvores da (Sapotaceae) que ocorrem nas florestas de ter-
floresta madura têm como estratégia de regene- ra firme na Amazônia brasileira. Spironello
ração a formação de “banco de plântulas”, as (1999) acompanhou durante 15 meses a mor-
quais permanecem com desenvolvimento lento talidade de plântulas de Pouteria platyphylla e P.
até que ocorram mudanças significativas na rostrata, ambas árvores do dossel da floresta. No
disponibilidade de RFA. Baider (1994) registrou primeiro caso, 58% das plântulas morreram,
um banco de plântulas com até 23 indivíduos/ entre as quais 96,5% devido a doenças e 3,5%
m2 em trechos da Mata Atlântica, no sudeste devido aos danos causados pela queda de ga-
do Brasil, e concluiu que grande parte da flora lhos e folhas. No segundo caso, a mortalidade
de árvores da floresta madura estava represen- foi devida à ação de patógenos (89% das mor-
tada nesses bancos. tes), à herbivoria por insetos (7,3%) e à
Talvez uma das espécies da Mata Atlântica herbivoria por vertebrados (3,7%). Todavia, es-
mais conhecidas do ponto de vista de sua rege- ses padrões podem variar drasticamente entre
neração natural seja a Euterpe edulis (Palmae), coortes distantes poucos metros entre si, ou en-
vulgarmente conhecida como palmiteiro. O pal- tre coortes estabelecidas sob a copa das árvo-
miteiro é uma espécie típica de sub-bosque e res-matrizes e outras estabelecidas fora da zona
ocorre de forma abundante nos trechos mais de copa. Spironello (1999) encontrou evidên-
úmidos dessa floresta, entre a Bahia e o Rio cias de mortalidade associada à distância da
Grande do Sul. De acordo com Paulilo (2000), planta-matriz, estando de acordo com o modelo
de 0,5 a 4% do total de RFA é limitante para o Janzen-Connell.
crescimento das plântulas de palmiteiro, que Dois estudos desenvolvidos em fragmentos
são capazes de incrementar a produção de ma- da Mata Atlântica, no nordeste do Brasil, reve-
téria seca à medida que ocorre aumento nos laram mecanismos relacionados aos padrões de
GERMINAÇÃO 247

mortalidade, associados à proximidade da plan- a formação de lenticelas hipertróficas e de raízes


ta-matriz. No caso de Attalea oleifera, palmeira adventícias (veja Lobo e Joly [2000] para uma
freqüente em clareiras e em bordas de floresta, síntese).
as elevadas taxas de mortalidade de plântulas Conforme Parolin (2001), a intensidade e
próximas das matrizes – que podem chegar a o tipo das respostas ou adaptações que as plân-
100% (Pimentel, 2002) – estão associadas com tulas apresentam dependem de certas caracte-
a intensa queda de folhas velhas que as abafam. rísticas físico-químicas das águas de inundação.
Em outra situação, as plântulas de Protium hep- Para dar um exemplo, o aparecimento de es-
taphyllum (árvore, Burseraceae) são intensa- clerofilia foi observado em plântulas estabele-
mente cortadas por formigas saúvas (Atta sexdens) cidas em áreas inundadas de igapó, e não em
e, apesar de as plântulas apresentarem capaci- áreas de várzea na Amazônia Central. É interes-
dade de rebrota, os níveis de mortalidade alcan- sante que muitas espécies de árvores abundan-
çam mais de 90% durante seu primeiro ano de tes em florestas ciliares, como Talauma ovata,
vida (Silva, 2002). Três aspectos merecem aten- têm sementes que são incapazes de germinar
ção nessa relação entre a P. heptaphyllum e as em anaerobiose, mas suas plântulas apresen-
formigas: (1) as saúvas estabelecem suas colô- tam tolerância à inundação (Lobo e Joly, 1996).
nias e cortam as plântulas embaixo das copas Em contraste com os mecanismos de adaptação
matrizes, (2) 50% das árvores reprodutivas das plântulas, algumas espécies de árvores que
apresentam colônias e (3) as formigas não utili- ocorrem em florestas periodicamente inunda-
zam as plântulas para o cultivo de fungos, e das podem apresentar frutificação, recrutamento
sim o arilo das sementes dos frutos que caem e desenvolvimento das plântulas durante a es-
no chão da floresta e se acumulam próximos tação seca, como forma de evitar os problemas
às colônias. Dessa forma, embora as plântulas causados pela submersão (Lobo e Joly, 2000).
sejam ricas em compostos secundários, como Esse pequeno conjunto de estudos desen-
terpenos (Bandeira et al., 2001), a presença volvidos com espécies de arbustos e árvores na-
dessas substâncias não impede a ação devasta- tivas dos ecossistemas brasileiros demonstra a
dora das formigas, que parecem estabelecer co- enorme variedade de fatores que afetam o re-
lônias próximas às árvores mais produtivas. crutamento, o desenvolvimento e a sobrevivên-
Em contraste com as florestas de terra fir- cia de plântulas e a diversidade de características
me, nas porções de floresta periodicamente adaptativas apresentadas pelas espécies para mi-
inundadas, a submersão é um dos fatores que nimizar alguns de seus impactos negativos.
afetam significativamente o destino de semen-
tes e plântulas. Em florestas de várzea e de iga-
pó, na Amazônia, por exemplo, o nível médio FATORES ANTRÓPICOS,
dos rios pode aumentar mais de 15 metros na RECRUTAMENTO DE
época de inundação, o que pode deixar plântu- PLÂNTULAS E CONSERVAÇÃO
las submersas por até sete meses (Parolin, 2001). DA BIODIVERSIDADE
A inundação resulta em solos anóxicos, na re- Um dos grandes paradigmas sobre recrutamen-
dução da luminosidade e da disponibilidade de to e sobrevivência de plântulas de espécies le-
nutrientes e, muitas vezes, no soterramento das nhosas nas florestas tropicais é o modelo Jan-
plântulas. Esses quatro fatores geralmente acar- zen-Connell, o qual propõe que a predação de
retam redução de crescimento, decomposição sementes e a mortalidade de plântulas estão
de clorofila e perda de folhas. As plântulas não- diretamente associadas à distância da planta-
adaptadas tendem, assim, a sofrer altos níveis matriz. Além das implicações demográficas pa-
de mortalidade. Estudos com Astrocaryum jauari, ra populações, esse modelo representa um pos-
Hevea brasiliensis (seringueira), Tabebuia avella- sível mecanismo para a manutenção da elevada
nedae (ipê) e Inga affinis (inga) identificaram riqueza de árvores dessas florestas (98 a 307
adaptações à submersão total ou parcial, como espécies/ha; Tabarelli e Mantovani, 1999), pois
248 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

um indivíduo teria pouca probabilidade de ser mente pela perda e dissecação do habitat, pelo
substituído por outro da mesma espécie. Esse aumento nas populações de lianas e por pertur-
paradigma tem catalisado a atenção de grande bações em interações com polinizadores e dis-
parte dos ecólogos, estimulando o desenvolvi- persores de sementes (Araújo e Tabarelli, 2002).
mento de dezenas de estudos no sentido de tes- Tabarelli, Marins e Silva (2002) apresen-
tar sua validade para diversas espécies e ecos- tam um modelo sintético descrevendo como a
sistemas (Harms et al., 2000). fragmentação de habitats, a eliminação de dis-
Todavia, novas demandas de conhecimento persores de sementes, a extração de madeira e
surgem à medida que atividades humanas o efeito de borda agem de forma isolada, combi-
transformam os ecossistemas terrestres tropi- nada ou sinérgica sobre o recrutamento e a so-
cais em arquipélagos de fragmentos ou “ilhas”, brevivência de plântulas, jovens e adultos de
cercados por ambientes hostis aos elementos espécies de árvores nas florestas neotropicais,
da biota original, como áreas urbanas ou agríco- principalmente nas florestas Atlântica e Ama-
las (Gascon, Willianson e Fonseca, 2000). Frag- zônica (Figura 15.3). O resultado desses proces-
mentação e perda de habitat, extração de ma- sos sobre plântulas, jovens e adultos é o declínio
deira, incêndios florestais e caça tendem a ocor- de populações, extinção local (i.e., fragmento),
rer de forma sinérgica e ameaçar grande parte regional e global de espécies. As grandes árvores
dos organismos das biotas fragmentadas (Law- tolerantes à sombra que ocupam o dossel e o
rance e Cochrane, 2001). Com a fragmentação estrato emergente da floresta (além das que
das florestas tropicais, por exemplo, espécies produzem madeiras nobres) são particularmen-
de plantas lenhosas podem ser extintas direta- te susceptíveis.

Fragmentação
da floresta

Caça Extração Efeito


(eliminação dos dispersores) de madeira de borda

Alteração da estrutura física


da floresta
Invasão de plantas ruderais

Incêndios
florestais

Redução do Redução do recrutamento e


recrutamento da sobrevivência de
plântulas, jovens e adultos

Declínio de populações

 Figura 15.3
Relações entre fragmentação, caça, extração de madeira, efeito de borda, incêndios florestais e declínio de
populações de árvores em florestas neotropicais. Adaptada de Tabarelli, Martins e Silva (2002).
GERMINAÇÃO 249

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C A P Í T U L O 1 6

INTERFERÊNCIA:
COMPETIÇÃO E ALELOPATIA
Alfredo Gui Ferreira

Este tópico não é comumente abordado nos interação


animal PLANTA
compêndios que se dedicam à germinação. Mas
quando se examina a ecologia da regeneração
das plantas, essa matéria é de fundamental im-
interferência
portância. Na maioria dos casos, quando o fenô-
meno germinação é examinado, tenta-se o iso-
lamento de fatores. Amiúde os ensaios são re-
PLANTA
alizados em laboratório, examinando um, dois
ou, no máximo, três variáveis e a interação en-
tre aspectos abióticos que podem influenciar a
germinação. Essa forma analítica do exame não competição alelopatia

está errada, mas propicia uma visão limitada


de como o fenômeno germinação ocorre na na-
tureza. Nesta, além de vários fatores abióticos,
há a influência de fat ores bióticos e a interação FATORES ABIÓTICOS FATORES BIÓTICOS
entre eles. É evidente que isso torna o estudo
muito mais complexo.

competição alelopatia
INTERAÇÃO
A interação tem sido muitas vezes interpreta-
da apenas como a relação planta-animal. De MICRORGANISMOS NO SOLO
fato, desde a polinização até a dispersão do
diásporo, diferentes taxa de animais são impor-
tantes e, por vezes, a planta tem dependência COMPETIÇÃO
acentuada dessa interação (Capítulos 14 e 15). A competição entre plantas pode ser intra-espe-
No entanto, aqui se dará destaque para a inte- cífica (indivíduos da mesma espécie) ou inter-
ração existente entre plantas e, por isso, deve específica (espécies diferentes). Adotaremos o
ser designada por “interferência”, seja por conceito de que a “interferência” é entre indi-
“competição” (fatores abióticos), seja por “ale- víduos (da mesma espécie ou de espécies dife-
lopatia” (fatores químicos produzidos por outro rentes) por exploração de um mesmo local de
indivíduo) na germinação. A seguir, pode-se fatores abióticos como “competição”. Ela po-
observar como essas relações se hierarquizam. derá ser por meio de:
252 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

w Luz: há sementes que necessitam de luz plantas mais tolerantes e que utilizam
para germinar (Capítulo 8) ou de sua au- os poucos recursos existentes, por exem-
sência para disparar o processo germi- plo, de nitrogênio (N) e de fósforo (P).
nativo. As plantas competem em um A não ser para certos grupos de plantas,
mesmo local, no qual outra planta pode como muitas gramíneas nas quais a pre-
estar sombreando uma semente ou alte- sença de nitratos estimula a germinação,
rando a qualidade e a composição espec- a competição por nutrientes entre plan-
tral da radiação, funcionando aí a relação tas só se manifesta após a instalação da
entre Fv/Fve, seja favorecendo, em al- planta.
guns casos, ou inibindo, em outros, a
germinação; a própria intermitência pelo Ademais, plantas sofrendo uma interferên-
sombreamento temporário pode interfe- cia negativa por competição podem produzir
rir no processo. Após a germinação, no menos sementes e/ou sementes de menor quali-
entanto, é que a interferência pode ser dade, e isso poderá determinar o sucesso de ins-
mais drástica, pois o processo de fotos- talação do futuro indivíduo. Sabe-se que a his-
síntese e de todo o controle morfogené- tória da planta-mãe, com os percalços que ocor-
tico pode ser alterado pela quantidade rem durante a formação e o amadurecimento
e/ou pela qualidade da luz incidente. da semente, pode alterar a qualidade e o sucesso
w Temperatura: o sombreamento, além de germinação das sementes da prole.
de mudar a qualidade espectral da ener-
gia radiante, ameniza as variações térmi-
cas. Há várias sementes que necessitam ALELOPATIA
do (ou são sinalizadas a germinar quan- A alelopatia pode ser definida como a interfe-
do há) aumento das variações térmicas rência positiva ou negativa de compostos do
em um curto espaço de tempo, como 24 metabolismo secundário produzidos por uma
horas. Isso pode favorecer um tipo de se- planta (aleloquímicos) e lançados no meio. Esta
mente ou indivíduo em detrimento de interferência sobre o desenvolvimento de outra
outro no mesmo local. planta pode ser indireta, por meio da transfor-
w Água: a quantidade limitada de preci- mação destas substâncias no solo pela atividade
pitação pode propiciar que os indivíduos de microrganismos.
já instalados ou os que têm capacidade Os aleloquímicos chegam ao ambiente por
de sobreviver em lugares onde o poten- meio aéreo (como os terpenos, que são volá-
cial hídrico é mais negativo, competindo teis), pelo lixiviado das plantas ou por restos
pelo recurso, alijam ou não permitam a destas, em resteva de culturas ou na serrapi-
germinação e o desenvolvimento de ou- lheira que cobre o chão das matas (no caso dos
tras plantas. que são solúveis).
w Vento: importante para as sementes pe- A vegetação de uma determinada área pode
quenas que podem ter seus microssítios ter um modelo de sucessão condicionado às
modificados, podendo ser enterradas ou plantas preexistentes e às substâncias químicas
desenterradas, o que influi decisivamen- que elas liberaram no meio conforme seu tem-
te na germinação. po de residência. Assim, a distribuição e a ocor-
w pH e nutrientes: o pH do solo em ge- rência de associação ou exclusão de plantas po-
ral tem níveis que permitem que uma dem estar condicionadas às parcerias em ambi-
grande quantidade de plantas se desen- entes naturais. Quando se cultivam plantas, a
volva. No entanto, algumas plantas que alelopatia pode ser um fator determinante do
estão na faixa extrema de tolerância do sucesso ou insucesso da cultura.
pH, já estressadas, podem sofrer mais ou Alguns aleloquímicos que podem ser usados
ser inviabilizadas pela ação de outras como defensivos agrícolas são substâncias que
GERMINAÇÃO 253

aparecem e se conservaram na evolução das que esse efeito dependia da época do ano em
plantas e que representam alguma vantagem que as folhas eram coletadas (Tabela 16.1) ou
contra a ação de microrganismos, vírus, insetos de a espécie ser ou não sensível ao efeito alelo-
e outros patógenos e herbívoros, seja inibindo a pático (Jacobi e Ferreira, 1991).
ação destes, seja estimulando o crescimento das Muitas vezes, o efeito alelopático não se dá
plantas ou ainda oferecendo vantagens ao indi- sobre a germinabilidade (percentual final de
víduo (ou espécies) na competição com outros germinação), mas sobre a velocidade de germi-
vegetais (Rodrigues, Passini e Ferreira, 1999). nação ou sobre outro parâmetro do processo,
como pode ser visto na Figura 16.1. O efeito
Alelopatia na germinação alelopático pode provocar alterações na curva
A germinação é menos sensível aos alelo- de distribuição da germinação (que passa de
químicos do que o crescimento da plântula. Po- distribuição normal para uma errática, alon-
rém, a quantificação experimental é muito mais gando a curva através do eixo do tempo [Figu-
simples, pois, para cada semente, o fenômeno ra 16.2]) ou um padrão polimodal de distribui-
é discreto, germinando ou não. Nesse contexto, ção de germinação das sementes devido ao ruí-
substâncias alelopáticas podem induzir o apare- do informacional (interferências ambientais
cimento de plântulas anormais, sendo a necrose que bloqueiam ou retardam o andamento de
da radícula um dos sintomas mais comuns. processos metabólicos). Dessa forma, o acom-
Assim, a avaliação da normalidade das plântu- panhamento da germinação deve ser diário ou
las é um instrumento valioso e qualitativo. em períodos mais curtos que 24 horas.
Abordaremos apenas alguns problemas re- Essas alterações no padrão de germinação
levantes acerca da germinação de sementes, podem resultar de efeitos sobre a permeabili-
como época do ano de coleta de material com dade de membranas, a transcrição e tradução
possível efeito alelopático e distribuição da cur- do DNA; do funcionamento dos mensageiros
va germinativa. secundários; da respiração, por seqüestro de
Observou-se que extratos aquosos de folhas oxigênio (fenóis); da conformação de enzimas
de Mimosa bimucronata (maricá) inibiam a ger- e de receptores ou, ainda, da combinação des-
minação de algumas espécies de hortículas e ses fatores (Rizvi e Rizvi, 1992).

Tabela 16.1 Efeito de extratos aquosos de folhas de Mimosa bimucronata em duas concentrações
sobre a germinação de seis espécies hortículas. Dados em percentual dos controles

Época do ano Concentração gr. Germinabilidade (%)


Folhas/mL água Alface Arroz Cenoura Chicória Repolho Tomate

Primavera 01:08 100 100 94 102 96 104


01:04 100 99 90 90 102 103

Verão 01:08 91 99 93 85 100 82


01:04 73* 100 69* 72* 93 46**

Outono 01:08 79* 105 97 83 103 97


01:04 61** 101 75* 62** 105 37**

Inverno 01:08 91 103 95 105 105 81*


01:04 67** 101 65** 75** 98 36**

Significativamente diferente do controle ao nível de 5% (*) ou 1% (**).


Adaptada de Jacobi e Ferreira (1991).
254 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

100
a
Percentagem de germinação 90 a
80
70
60
50
40
30 Controle
20 Ext. (-0,156)
10
0
0 24 32 40 48 56 64 72 84 92 100

Tempo (horas)

 Figura 16.1
Percentuais de germinação acumulada de sementes de Mimosa bimucronata (maricá) no extrato (ext.) das
folhas dessa espécie na concentração osmótica de –0,156 MPa. Observe que, após 90 horas, a germinabilidade
é estatisticamente igual. Adaptada de Astarita, Ferreira e Bergonci (1996).

Germinação de sementes em laboratório O uso da temperatura entre 22 e 28oC é o pro-


Os testes de germinação são simples; no en- cedimento mais comum. Deve-se cuidar para
tanto, há uma série de cuidados que devem ser que as placas não sequem. A colocação de duas
tomados para que se possa ter respostas repro- ou três folhas de papel-filtro ou absorvente no
duzíveis. Os testes podem ser realizados em la- fundo da placa diminui o problema. Colocar al-
boratório a temperatura ambiente, porém, godão sob o papel ou uma fina camada de es-
como a temperatura influi sobre a germinação ponja neutra desinfestada pode ser uma boa
e a ação alelopática, o controle desta é desejável. alternativa. O uso de ágar-gel também é uma

45
Germinação (%) não-acumulada

40 Controle

35 Ext. (-0,156)
30
25
20
15

10
5

0
16 24 32 40 48 56 64 72 84 92 100

Tempo (horas)

 Figura 16.2
Germinação de sementes de Mimosa bimucronata no extrato (ext.) de folhas desta espécie na concentração
osmótica de –0,156 MPa. Observe que os dados do controle têm distribuição próxima da normal, enquanto,
no extrato, além do retardo no início da germinação, a curva de distribuição não se aproxima da normal
(Ferreira e Aquila, 2000).
GERMINAÇÃO 255

possibilidade interessante, mas, nesse caso, o (alface) são duas espécies em que as “semen-
gel deve ser de boa qualidade para que não tes” (alface é um aquênio) são facilmente en-
acrescente mais fontes de interferência. Deve- contradas e bastante sensíveis a vários alelo-
se evitar o alagamento das placas para impedir químicos.
que as sementes bóiem. O uso de películas plás- A germinação deve ser verificada diaria-
ticas vedando as tampas das placas ou caixas- mente ou em intervalos menores para contabi-
gerbox também auxilia. Por último, a colocação lizar as sementes germinadas. O critério pode
de uma ou mais vasilhas com água no interior ser o aparecimento da curvatura geotrópica da
da câmara pode evitar problemas de secamento radícula ou o seu tamanho ser no mínimo 50%
das placas. Esses cuidados são fundamentais, do tamanho da semente para evitar falsa germi-
pois a evaporação dos extratos torna-os mais nação por expansão do embrião com a embe-
concentrados, o que pode falsear os resultados. bição. Muitas vezes, o possível alelopático ape-
As sementes-teste podem ser de espécies nas retarda o processo germinativo (Figura
que se encontrem no local a campo. Como as 16.3A, B). Alface, gergelim e tomate, em geral,
espécies nativas, amiúde, possuem algum tipo germinam em 72 horas, dependendo da tempe-
de dormência, o uso de sementes de espécies ratura. A análise da velocidade e do comporta-
cultivadas de boa qualidade é aconselhável. Ly- mento da curva acumulada de germinação (Ca-
copersicon esculentum (tomate) e Lactuca sativa pítulo 13) pode fornecer indicações importantes

A
80
70
Controle
% de germinação

60
50 Extrato

40
30
20
10
0
12 24 36 48 60
Tempo (horas)

B
100
Controle
80
Extrato
% de germinação

60

40

20

0
8 16 24 32 40 48
Tempo (horas)

 Figura 16.3
(A) Comportamento germinativo de aquênios de alface em resposta à ação de extratos (4%) de folhas de
Myrciaria cuspidata (camboim), a uma temperatura constante de 20oC (adaptada de Rodrigues, 2002). (B)
Comportamento germinativo de sementes de Sesanum indicum (gergelim) na presença de extrato (1%) de
folhas de Solanum lycocarpum (lobeira) a uma temperatura de 30oC (Oliveira, 2003).
256 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Bomba

 Figura 16.4
Sistema de lixiviar: A – bandeja plástica de 55x40x15 cm com inúmeras perfurações e cheia de água, de
forma a ocorrer um gotejamento contínuo; B – o mesmo tipo de bandeja, com material de serrapilheira ou
material picado e seco da planta que se deseja estudar; C – bandeja sem furos, para coleta do lixiviado, com
bomba de recalque, de forma a reconduzir a substância ao nível A. Adaptada de Chou (1999).

sobre o alelopático. O controle do pH e da dos, podem ser utilizados, mas fumigações de-
concentração dos extratos brutos é fundamen- vem ser evitadas para estudos de alelopatia.
tal, pois pode haver neles substâncias como Então, ao utilizar substrato natural sem esterili-
açúcares, aminoácidos e ácidos orgânicos, os zação, deve-se assumir que há uma dinâmica
quais influem na concentração iônica e são os- de transformações no solo difícil de acompa-
moticamente ativos. nhar e reproduzir. A germinação será acompa-
Com o uso de rolo de papel ou solo, a vi- nhada pela emergência da plântula na superfí-
sualização da radícula não é o critério utilizado cie do substrato, uma vez que a semente pode
para contabilizar a germinação. Para testes ale- estar enterrada. Nesse caso, se houver dormên-
lopáticos, recomenda-se o critério morfológico cia regida pela luz, será necessário um pré-tra-
(emergência da radícula) como primeira aborda- tamento para sua quebra. Aliás, quaisquer ti-
gem, devendo ser seguido por testes de germina- pos de dormência eventualmente existentes
ção em solo ou areia. Tendo sido inicialmente (ver Parte 2) devem ser quebrados antes do tes-
usado rolo de papel para verificar a germinação, te de alelopatia.
se houver desconfiança de alelopatia, deve-se Com a utilização de vasos ou canteiros, dois
realizar os testes em placas conforme foi descrito. procedimentos mais usuais são seguidos: (1)
adicionar o material que se suspeita tenha o
Germinação em casa de vegetação ou alelopático, incorporando-o ao substrato; (2)
canteiro lixiviar o material repetidas vezes, obtendo-se
Areia lavada (que tem menor interação com assim um percolado que contenha o(s) alelo-
as substâncias-teste) e/ou solo, após esteriliza- químico(s). Na Figura 16.4, tem-se um modelo
GERMINAÇÃO 257

usado para extrações de aleloquímicos. O lixi- rais, não atuariam como alelopáticos; (2) ma-
viado também pode ser obtido de plantas vice- cerar o material vegetal, pois isso poderia estar
jando em vasos, conforme se observa na Figura liberando substâncias que não estariam ativas
16.5. Quando o aleloquímico é volátil, ele pode se o processo natural fosse observado, com que-
ser testado usando-se o procedimento de colo- da ao solo, desidratação e decomposição
car o material em frascos menores e estes den- gradativa do material. A maceração é um ata-
tro de um frasco maior, o qual será tampado, lho que pode levar a maximizar o fenômeno
após a colocação de placas forradas com um alelopático. No entanto, havendo alguma indi-
substrato úmido com as sementes dos bioen- cação de aleloquímicos no material vegetal, a
saios. O(s) volátil(eis) liberado(s) poderá(ão) extração com solventes orgânicos pode ser usa-
influir na germinação. da para sua caracterização química.
Dois procedimentos não são recomenda-
dos: (1) extrair o aleloquímico com solventes Alelopatia no desenvolvimento inicial
orgânicos (clorofórmio, éter, álcool, etc.), pois A emergência da plântula e o seu cresci-
na natureza isso não ocorre e poder-se-ia estar mento são as fases mais sensíveis na ontogê-
liberando compostos que, em condições natu- nese do indivíduo. A massa seca da raiz ou parte

Solução nutritiva

Plantas com
aleloquímico

Vaso com substrato

Ar

Resina retentora

Suporte para resina

Bomba

 Figura 16.5
Sistema de fluxo contínuo para seqüestrar exsudados de raízes intactas não-perturbadas. O substrato contido
no vaso é retido por filtro apoiado sobre a coluna de resina “Amberlite XAD-4”. A substância filtrada pela
resina é recalcada e oxigenada, servindo para umedecer o topo do vaso. Adaptada de Friedman e Waller
(1985).
258 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

aérea e o comprimento das plântulas ou radí- o(s) aleloquímico(s) já estar(em) no meio


culas são os parâmetros mais usados para ava- aquoso, sem a necessidade de liberação de com-
liar o efeito alelopático sobre o crescimento. A plexos com a matriz do solo.
quantidade de pêlos absorventes também é um Alface é a planta mais comum como espé-
parâmetro bastante sensível, particularmente cie-alvo para examinar alelopatia entre as hi-
em Zea mays (milho), no qual eles são muito drófitas, devido ao pequeno período requerido
conspícuos (Tabela 16.2). tanto para a sua germinação (24 a 48 horas)
Os testes podem ser realizados seguindo os quanto para o seu crescimento. As reservas que
procedimentos expostos para a germinação, a semente de alface possui, no entanto, não per-
desde que, nos de laboratório, alguns cuidados mitem um desenvolvimento expressivo da
sejam observados rigorosamente, como não dei- plântula sem o uso de nutrientes externos, o
xar secar e concentrar muito, pela evaporação, que é uma limitação. Por outro lado, oferecem
os extratos em teste. Placas de Petri têm a res- uma vantagem extra de ela poder ser cultivada
trição da sua pouca altura e, como a parte aé- em soluções hidropônicas, o que pode ser
rea tem gravitropismo negativo, o desenvolvi- manejado para a exploração de algum proble-
mento nos extratos pode ser limitado pela ma de alelopatia.
tampa da placa.
É interessante, quando se testam extratos, Mecanismo de ação, compostos
não realizar a sua germinação, colocando as se- secundários e outros intervenientes
mentes para germinar previamente em água no fenômeno de alelopatia
destilada e só depois transferindo as plântulas
que tiverem um certo tamanho de radícula, por Mecanismo de ação
exemplo, cinco milímetros, para a solução-tes- O efeito morfológico dos aleloquímicos so-
te. Com isso, pode-se uniformizar a amostra e bre as plantas é somente uma sinalização se-
obter resultados dos efeitos alelopáticos mais cundária de mudanças anteriores. Assim, os es-
uniformes, o que facilita as análises pela dimi- tudos sobre o efeito de aleloquímicos sobre a
nuição da variabilidade, além da possível obten- germinação e/ou o desenvolvimento da planta
ção de amostras do mesmo tamanho. são manifestações secundárias de efeitos ocorri-
A maioria das plantas de interesse econô- dos inicialmente em níveis molecular e celular.
mico são angiospermas terrestres. No meio ter- Ainda há poucas informações sobre esses me-
restre, as interações das plantas com o substrato canismos.
são difíceis de seguir e testar. Assim, foram pro- O modo de ação dos aleloquímicos pode ser
postos alguns testes em meio líquido, mais fá- grosseiramente dividido em ações direta e indi-
ceis de manipular e analisar sob vários aspec- reta. Nestas últimas, podem-se incluir altera-
tos experimentais. A principal vantagem é de ções nas propriedades do solo, em suas condi-

Tabela 16.2 Efeito dos extratos de frutos de Ilex paraguariensis (p/v) e PEG 6000 (MPa) na mesma
concentração dos extratos (n=10) em plantas de milho (4 dias após semeadura)

Variável de crescimento Controle -0,24 MPa 1:16 p/v -0,48 MPa 1:8 p/v -0,96 MPa 1:4 p/v

Comprimento da parte aérea (cm) 7,1a 5,5b 3,8d 4,6c 2,9e 2,0f 1,9f
Comprimento da 1a folha (cm) 4,2a 3,3a 1,1c 2,6b 0,8c 0,6c 0,3c
Massa seca da parte aérea (mg) 26,0a 21,0b 18,0cd 20,0bc 15,0d 11,0e 11,0e
Massa seca da raiz (mg) 32,0a 33,0a 23,0b 32,0a 21,0b 26,0b 11,0c
Comprimento da raiz primária (cm) 14,9a 14,8a 2,2d 11,8b 1,8d 8,0c 1,4d
Número de pêlos absorventes 27,0a 22,6ab 4,7c 19,7b 3,0c 5,7c 0,1c

Média seguida pela mesma letra na linha não-significante pelo teste de Tukey (5%). Adaptada de Miró, Ferreira e Aquila (1998).
GERMINAÇÃO 259

ções nutricionais e em populações e/ou ativi- diferentes horas do dia, tem repercussões no
dade dos microrganismos. O modo de ação di- metabolismo secundário (Figura 16.6).
reto ocorre quando o aleloquímico se liga às
membranas da planta receptora ou penetra nas Potencial osmótico
células, interferindo diretamente no seu me- Nos estudos de alelopatia, o potencial os-
tabolismo. mótico é um aspecto pouco considerado e que
As alterações do aleloquímico podem ser pode mascarar o fenômeno alelopático. Os efei-
pontuais, mas, como o metabolismo consiste tos do potencial osmótico podem ser notados
em uma série de reações com vários controles no comportamento germinativo pelo atraso na
do tipo feedback, rotas inteiras podem ser alte- velocidade de germinação. Também podem ser
radas, mudando processos. verificados sobre o crescimento da plântula
(Tabela 16.3), na qual se observou que, além
Compostos secundários do efeito osmótico provocado pelo PEG 6000,
Os recentes avanços na química de produ- que não penetra nas células, houve efeito ale-
tos naturais, por meio de métodos modernos lopático do extrato de folhas de Mimosa bimu-
de extração, isolamento, purificação e identifi- cronata. O efeito osmótico provocou um cresci-
cação, têm contribuído para um conhecimento mento relativo diferencial entre raiz/parte aé-
mais acurado de inúmeros compostos secundá- rea. Quanto mais negativo o potencial, mais a
rios, que podem ser agrupados de diversas for- planta alongou suas raízes em detrimento da
mas (Quadro 16.1). Muitos desses compostos parte aérea (Figura 16.7).
são potencialmente aleloquímicos. Eles variam
na planta em concentração, localização e com- Nitrogênio e outros elementos
posição, podendo ser liberados para o meio no As plantas terrestres estão fixadas ao solo,
solo ou no ar de forma ativa ou simplesmente de onde retiram, além de água, a maior parte
lixiviados. O tempo de residência, a persistên- dos nutrientes minerais. Para essas plantas, os
cia e a transformação podem aumentar, dimi- aleloquímicos provêm de restos de plantas vi-
nuir ou fazer cessar o seu efeito alelopático pela zinhas (advindos de folhas, flores, frutos e pó-
ação de microrganismos no solo (Inderjit, len que formam a serrapilheira) e de compostos
Dakshini e Foy, 1999). Inclusive, o próprio an- lixiviados pela ação da chuva sobre as copas e
damento diário do metabolismo primário, com os troncos. Podem vir também dos exsudados
formação de cadeias carbonadas que variam nas

Tabela 16.3 Efeitos de extratos aquosos de folhas


Quadro 16.1 Principais tipos de compostos
de Mimosa bimucronata em duas concentrações ou
secundários
de PEG nas mesmas concentrações sobre a plântula.
Dados em percentual dos controles
1 Ácidos
2 Alcalóides Comprimento (cm)
3 Aminoácidos não-protéicos
4 Antocianinas Tratamento Plântula Radícula Hipocótilo
5 Cianohidrinas e cianohidrinas-glicosídeos Controle 6,56a 3,20a 3,29a
6 Esterol e esteróides PEG (-0,158) MPa 5,63b 2,84b 2,72b
7 Fitoalexinas Extrato 1:8 (p/v) 2,93c 1,13c 1,82c
8 Flavonóides, isoflavonóides, chalconas, PEG (-0414) MPa 5,71b 3,79d 1,90c
auronas e xantinas Extrato 1:4 (p/v) 2,34d 0,85c 1,39d
9 Naftoquinonas, quinonas, estilbeno e fenantrenos
10 Poliacetilenos Nas colunas, valores com mesma letra, diferenças não-significa-
11 Policetonas tivas (LSD de 5%).
12 Saponinas * PEG 6000 – Poliotileno Glicol, que pode ter moléculas maiores
13 Taninos ou menores. Os mais usuais são PEG 4000, 6000 e 8000.
14 Terpenos (mono, di, tri e poli) e sesquiterpenos Adaptada de Jacobi e Ferreira (1991).
260 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Morfina – média diária = 4,93%

200 HO

150
O
100 N–CH3
HO
50
Morfina
0

Codeína – média diária = 0,72%


Conteúdo de alcalóides (%)

300
H3CO

200
O
N–CH3
100 HO
Codeína

Tebaína – média diária = 0,51%

150 H3CO

100 O
N–CH3
50
CH3O

Tebaína
0

Horas do dia

 Figura 16.6
Mudanças diárias no conteúdo de alcalóides na planta de Papaver somniferum. Adaptada de Waller, Flug e Fujii
(1999).

das raízes. Os aleloquímicos são transformados seca e o nitrogênio é de aproximadamente C:N


pela ação dos microrganismos e de vários or- 30:1. Isso pode levar a uma deficiência tempo-
ganismos que vivem no estrato superior do solo rária de N disponível para as plantas devido à
(minhocas, insetos, fungos, etc.). Na serrapi- alta atividade e à quantidade de microrganis-
lheira em degradação e na camada superficial mos que utilizam esse elemento para seu pró-
do solo logo abaixo dela, onde convivem comu- prio metabolismo, formando uma cadeia de
nidades multivariadas, há, por parte dos micror- eventos que pode ser resumida da seguinte ma-
ganismos, uma grande demanda de nitrogênio neira: moléculas orgânicas → alta atividade de
(N). A relação entre o carbono (C) de matéria microrganismos → privação temporária de
GERMINAÇÃO 261

Comprimento da plântula
64

60
Porcentagem y = 2,4229x + 44,32
56 R2 = 0,9922

52 Raíz

48 Parte aérea
y = -2,4x + 55,6
44
R2 = 0,9919
40
0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5
Potencial osmótico (-MPa)

 Figura 16.7
Percentuais de alongamento de plântulas de Mimosa bimucronata em diferentes potenciais osmóticos provo-
cados por PEG 6000, depois de 90 horas de tratamento. Adaptada de Astarita, Ferreira e Bergonci (1996).

nitrogênio → crescimento limitado das plan- CONSIDERAÇÕES FINAIS


tas. Isso não é efeito alelopático. De outra par- A interferência de uma planta sobre outra pode
te, os aleloquímicos podem influir sobre a ati- se dar por competição ou alelopatia. O fenô-
vidade desses decompositores, especialmente meno da germinação pode sofrer inúmeras in-
sobre bactérias dos gêneros Nitrosomas, que oxi- terferências de natureza abiótica (competição)
dam amônia a nitrito, e Nitrobacter, que oxidam e biótica (alelopatia), podendo ser impedido ou
nitrito a nitrato. Há evidências de que a baixa apenas retardado. Essa dificuldade de instala-
concentração de nitratos em áreas-clímax é, ção pode ser a determinante do sucesso ou não
muitas vezes, devida à inibição alelopática da de uma certa espécie em um local. Muitas vezes,
nitrificação (Rice, 1984). mesmo germinando, a plântula não consegue
Finalmente, deve-se mencionar que meta- vencer as interferências e se instalar. A análise
bólitos secundários inertes sob o ponto de vista cuidadosa das curvas de germinação não-acu-
alelopático podem ser ativados pela ação dos mulada, do tempo médio de germinação e do
decompositores. vigor da plântula recém-germinada pode prever
Compostos fenólicos inibiram o crescimen- o sucesso ou o fracasso da instalação de uma
to de fixadores de nitrogênio dos gêneros Azo- espécie, quer como cultura, quer como elemen-
tobacter sp., Enterobacter sp. e Clostridium sp. Es- to agregado à flora espontânea.
ses compostos também influenciam o acúmu-
lo e a disponibilidade de fosfato, uma vez que
competem pelos sítios de absorção nas micelas REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
das argilas. A textura e a composição do solo, ASTARITA, L.V.; FERREIRA, A.G.; BERGONCI, J.I. Mi-
como decorrência do que foi exposto, têm in- mosa bimucronta: allelopathy and osmotic stress.
Allelopathy Journal, v.3, p. 43-50, 1996.
fluência no efeito alelopático. Em solos areno-
sos, há menor adsorção que nos solos coloidais, CHOU, C.H. Methodologies for allelopathic research:
e, nesse caso, os aleloquímicos liberados seriam from fields to laboratory. In: MACIAS, F.A.; GALINDO,
J.C.G.; MOLINILLO, J.M.G., CUTLER, H.G. Recent
mais efetivos por ficarem livres na fase aquosa advances in allelopathy. [S.l.]: IAS, 1999. p. 3-24.
do solo. Embora os efeitos possam ocorrer sobre
FERREIRA, A.G.; AQUILA, M.E.A. Alelopatia: uma área
a germinação, o mais comum é eles aconte-
emergente da ecofisiologia. Revista Brasileira de Fisiolo-
cerem sobre a plântula em instalação. gia Vegetal, v.12, p. 175-204, 2000. Volume especial.
262 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

FRIEDMAN, J.; WALLER, G.R. Allelopathy and auto- RICE, E.R. Allelopathy. New York: Acad. Press, 1984. p. 442.
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RIZVI, S.J.H.; RIZVI, V. Allelopathy: basic and applied
INDERJIT; DAKSHINI, K.M.M.; FOY, C.L. Principles and aspects. London: Chapman & Hall, 1992. p.480
practices in plant ecology. Boca Raton: CRC, 1999. p. 589.
RODRIGUES, B.N.; PASSINI, T.; FERREIRA, A.G. Research
JACOBI, U.S.; FERREIRA, A.G. Efeitos alelopáticos de on allelopathy in Brazil. In: NARWALL, S.S. Allelopathy
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PA R T E 6

TECNOLOGIA
DE SEMENTES
C A P Í T U L O 1 7

COLETA, BENEFICIAMENTO
E ARMAZENAMENTO
Francisco Amaral Villela
Wolmer Brod Peres

COLETA DE SEMENTES lação deve ser tomado aleatoriamente, em de-


A redução da variabilidade genética de popula- trimento do conjunto das sementes colhidas.
ções, causada pela atividade humana, pelo acen- Certamente, existe considerável variação gené-
tuado desenvolvimento tecnológico e pela ex- tica nas populações tanto naturais como do-
ploração agropastoril irracional, gera a neces- mésticas; por isso, a amostragem precisa incluir
sidade de estabelecer estratégias adequadas a máxima quantidade de variabilidade genética
para a preservação das reservas de genes ainda útil, com manutenção da coleta de amostras
disponíveis, por meio de coletas periódicas e dentro de limites práticos. Entretanto, quando
da adequada conservação das amostras, com se pretende verificar a variabilidade genética
manutenção de alelos e de complexos gênicos. em uma população de plantas, as coletas devem
Na composição de uma amostra de semen- ser realizadas separadamente por planta.
tes, para assegurar a representatividade, de- Inevitavelmente, os procedimentos de coleta
vem-se coletar sementes de maior número pos- de amostras são passíveis de erro em decorrência
sível de plantas genitoras, tomadas ao acaso, da heterogeneidade do produto. Assegurar que
colhendo preferencialmente igual número de determinado produto possua as características
sementes de cada planta. Em espécies alóga- indicadas é tarefa difícil. A preservação da identi-
mas, as quais predominam em florestas tropi- dade começa na escolha da área de coleta e da
cais, a colheita de pequeno número de sementes semente, estende-se pelas etapas de produção,
de maior número de plantas tem representati- colheita, secagem, beneficiamento, armazena-
vidade maior em comparação a um grande nú- mento, transporte e comercialização e encerra
mero de sementes colhido de reduzido número no consumidor final. A preservação efetiva da
de plantas (Vencovsky, 1987). identidade de lotes individuais pressupõe a ras-
Assim, por exemplo, a representatividade treabilidade por meio de procedimentos de veri-
genética da coleta de 3.000 sementes de 100 ficação e certificação em todas as etapas, tornan-
plantas (30 sementes/planta) é maior quando do de fundamental importância a coleta de
comparada a 5.000 sementes tomadas de 50 amostras e a avaliação da qualidade. O monito-
plantas (100 sementes/planta). Da mesma for- ramento formal e rotineiro para garantir o iso-
ma, na coleta de 3.000 sementes, é preferível a lamento e a rastreabilidade introduz custos adi-
amostragem de 100 plantas, coletando-se 30 cionais no processo produtivo, os quais se tor-
sementes por planta, do que de 50 plantas, to- nam, muitas vezes, insignificantes comparativa-
mando 60 sementes por planta. mente aos custos de descarte, rebeneficiamento,
Convém destacar que, na coleta de amos- devolução ou rejeição do produto, sem levar em
tras, o conjunto das plantas genitoras da popu- conta a perda de reputação, de custo inestimável.
266 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Persistentes esforços devem ser feitos para Empregado para sementes acondicionadas em
assegurar que a amostra represente, de maneira sacarias, deve ter comprimento total não infe-
fidedigna, a composição do lote. Por mais minu- rior a 50 cm.
cioso e preciso que seja o procedimento técnico O amostrador do tipo duplo consiste de um
empregado na análise de laboratório, os resulta- tubo cilíndrico metálico, oco, que se ajusta in-
dos podem não indicar, de fato, a qualidade do ternamente a outro tubo cilíndrico, com extre-
lote caso a amostra não tenha sido adequada- midade afilada. Os dois tubos apresentam aber-
mente coletada, manuseada e conservada. turas que podem ser justapostas por meio de
Entende-se por amostra determinada quan- rotação, com ou sem divisões internas. Confor-
tidade de um produto retirada do lote, capaz me as dimensões, pode ser empregado para se-
de representar, com segurança, os atributos des- mentes em sacaria (comprimento de 76,2 cm)
te. Cada porção individual, retirada de diferen- ou a granel (comprimento até 2 m).
tes partes constituintes do lote, é denominada A amostragem de sementes armazenadas
amostra simples. As amostras simples reunidas a granel ou durante o beneficiamento deve
em um recipiente adequado, uma vez homo- atender à seguinte exigência mínima quanto
geneizadas, originam a amostra composta, que, às intensidades de amostragem:
apropriadamente dividida, forma a amostra
w lotes de sementes de até 500 kg: não me-
média a ser encaminhada ao laboratório de aná-
nos de cinco amostras simples;
lise. Amostras destinadas à determinação de
w lotes de sementes de 501 a 3.000 kg: uma
umidade devem ser enviadas ao laboratório se-
amostra simples de cada 300 kg, porém
paradamente das que serão usadas para outros
não menos de cinco amostras simples;
fins e acondicionadas em recipientes herméticos,
w lotes de sementes de 3.001 a 20.000 kg:
impermeáveis e completamente cheios.
uma amostra simples de cada 500 kg, po-
As amostras retiradas a campo não devem
rém não menos de 10 amostras simples.
ser expostas a temperaturas elevadas, sendo ne-
cessária sua conservação em ambiente com bai-
Para sementes acondicionadas em sacos
xa temperatura (manutenção em caixas térmi-
(na recepção em sacaria ou nas pilhas em arma-
cas com sistema de resfriamento).
zéns convencionais), devem ser retiradas amos-
O técnico responsável pela amostragem de-
tras simples em diferentes sacos:
ve retirar as amostras simples de posições varia-
das, sempre ao acaso, evitando a tendenciosi- w lotes de sementes de até cinco sacos: ca-
dade, verificada ao selecionar, por exemplo, lo- da saco deve ser amostrado, coletando-
cais de fácil acesso. Ao se proceder à amostra- se, no mínimo, cinco amostras simples;
gem, os princípios básicos da representativida- w lotes de sementes de 6 a 30 sacos: uma
de e da aleatoriedade devem ser atendidos. amostra simples de cada três sacos e não
Uma amostra apresenta maior representativi- menos de cinco amostras simples;
dade do lote conforme aumenta a homogenei- w lotes de sementes de 31 a 400 sacos uma
dade dos seus componentes. amostra simples a cada cinco sacos, e
As amostras simples devem ser retiradas não menos de 10 amostras simples;
do lote, sempre que possível, por meio de amos- w lotes de sementes de 401 ou mais sacos:
tradores do tipo simples ou duplo. Para semen- uma amostra simples a cada sete sacos
tes que não deslizam com facilidade, a coleta e não menos de 80 amostras simples.
de amostras deve ser preferencialmente realiza-
da de forma manual. Os pesos máximos dos lotes e mínimos das
O amostrador do tipo simples consta de um amostras médias de sementes das diferentes
tubo cilíndrico apontado, oco, com cabo perfu- espécies são indicados nas Regras para Análise
rado para o descarregamento das sementes. de Sementes (Brasil, 1992).
GERMINAÇÃO 267

SECAGEM de de investimentos em infra-estrutura para se-


Na colheita, as sementes apresentam, geral- cagem artificial, apresenta diversas vantagens,
mente, teor de água inadequado para o arma- como redução de perdas no campo, planeja-
zenamento. mento da colheita, compatibilizando as capaci-
A maturidade fisiológica representa o mo- dades de colheita e secagem, manutenção do
mento em que é alcançada a máxima produção produto por período mais prolongado, com re-
e a melhor qualidade do produto, com as se- dução da velocidade de deterioração e obtenção
mentes apresentando o máximo peso de maté- de produto de qualidade superior e com teor
ria seca. de água adequado ao armazenamento.
Permanecendo na planta após a maturida- Para cada binômio umidade relativa do ar
de fisiológica, as sementes ficam expostas à e temperatura, a semente alcançará um teor
ação das flutuações de temperatura, umidade de água denominado ponto de equilíbrio hi-
relativa, orvalho e/ou chuvas, que, em proces- groscópico (Tabela 17.1). A relação entre a umi-
sos alternados de sorção (ganho) e dessorção dade relativa do ar e a umidade da semente a
(perda) de água, potencializam a probabilida- uma determinada temperatura mostra varia-
de de ocorrência de deterioração. ções pronunciadas na umidade de equilíbrio em
O planejamento e a adequada condução da baixas e em altas umidades relativas, e modera-
colheita exercem significativa influência na das na faixa de 25 a 70%.
qualidade e na quantidade de sementes produ- Os principais fatores, além da umidade re-
zidas. A antecipação da colheita poderá ocasio- lativa do ar, que influem no ponto de equilíbrio
nar baixas produtividade e qualidade fisiológica higroscópico das sementes são:
pela presença de sementes imaturas. Por outro w Constituição química – as sementes ricas
lado, colheitas tardias são potencialmente pre- em amido apresentam maior teor de
judiciais às sementes que cedo atingiram a ma- água de equilíbrio do que as ricas em
turidade fisiológica e permaneceram por perío- óleo, a uma mesma condição climática,
dos consideráveis no campo. porque os carboidratos têm maior afini-
A antecipação de colheita, embora envolva dade higroscópica do que os lipídeos. As
aumento no custo de produção, pela necessida- proteínas são compostos mais higroscó-

Tabela 17.1 Teor de água (%) de equilíbrio de sementes em diferentes umidades relativas e tempe-
ratura do ar de 25oC

Umidade relativa do ar (%)


Espécie (nome científico) 15 30 45 60 75 90

Abóbora (Cucurbita spp.) 3,7 5,6 7,4 9,0 10,8 –


Algodão (Gossypium spp.) 3,9 6,0 7,5 9,1 11,2 17,8
Amendoim (Arachis hypogaea) 2,6 4,2 5,6 7,2 9,8 13,0
Arroz (Oryza sativa) 6,8 9,0 10,7 12,6 14,4 18,1
Aveia (Avena sativa) 5,7 8,0 9,6 11,8 13,8 18,5
Cebola (Allium cepa) 5,6 8,0 9,5 11,2 13,4 –
Ervilha (Pisum sativum) 6,4 8,6 10,1 11,0 15,0 –
Feijão (Phaseolus vulgaris) 5,6 7,7 9,2 11,1 14,5 18,6
Linho (Linum usitatissimum) 4,4 5,6 6,3 7,9 10,1 15,2
Milho (Zea mays) 6,4 8,4 10,5 12,9 14,8 19,1
Soja (Glycine max) 4,3 6,5 7,4 9,3 13,1 18,8
Tomate (Lycopersicon esculentum) 4,2 6,3 7,8 9,2 11,1 –
Trigo (Triticum aestivum L.) 6,3 8,6 10,6 11,9 14,6 19,7
268 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

picos do que os carboidratos, enquanto rada apenas a determinação gráfica, utilizan-


os lipídeos são essencialmente hidrófobos; do-se o gráfico psicrométrico (Figura 17.1). As
w Temperatura ambiental – o aumento da propriedades psicrométricas do ar mais utiliza-
temperatura causa redução da umidade das são:
da semente a uma determinada umida-
de relativa. As variações extremas de w Temperatura do bulbo seco (TBS) – é a
temperatura durante o armazenamento temperatura indicada por um termôme-
podem ocasionar variações na umidade tro, expressa em oC. Representada por
de equilíbrio de até dois pontos percen- linhas perpendiculares à base da figura,
tuais; a TBS é determinada na parte inferior
w Histerese – as sementes no processo de do gráfico;
sorção (ganho) de água entram em equi- w Temperatura do bulbo úmido (TBU) – é
líbrio higroscópico a teores de água mais a temperatura obtida por um termôme-
baixos em relação ao processo de dessor- tro, com o bulbo revestido com uma gaze
ção (perda) de água, podendo causar dife- úmida cujo contato com uma corrente
renças de até dois pontos percentuais; de ar proporciona a vaporização da água,
w Integridade física da semente – as se- que, dependendo de sua intensidade,
mentes danificadas atingem teores de baixará mais ou menos a temperatura.
água de equilíbrio mais elevados do que A TBU é determinada pelas linhas mais
as sementes fisicamente íntegras. oblíquas, e sua leitura é realizada no lado
externo da parte curva do gráfico;
As propriedades físicas do ar podem ser de- w Ponto de orvalho (PO) – é a temperatura
terminadas por meio de métodos analíticos, do ar atingida quando a umidade relativa
gráficos ou tabulares; entretanto, será conside- do ar chega a 100%. Obtido por resfria-
5
11

35 37 39
33

30
0
10
o
ec

30
C

27
o
rs

Razão de mistura – g água/kg ar seco


ido
ea

úm
85
gd

24
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21
ura

25
pia

70

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40

12
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25
20

10 100
15
10

6
10

5
5

0
3
0

-5
-5

0
-10 -5 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70

0,75 0,80 0,85 Temperatura 0,90 Volume específico 0,95


bulbo seco oC m3/kg ar seco

 Figura 17.1
Gráfico psicrométrico (Peres, 2001).
GERMINAÇÃO 269

mento à razão de mistura constante, é quantidade de calor necessária para aquecer o


representado por linhas horizontais cuja ar será de 19 kJ/kg (E em B – E em A).
leitura é realizada no lado externo da O vapor d’água contido na semente tende
parte curva do gráfico; a ocupar todos os espaços intercelulares dispo-
w Umidade relativa (UR) – expressa a quan- níveis, gerando pressões em todas as direções,
tidade de água existente no ar em relação inclusive na interface entre a semente e o ar,
à quantidade máxima que esse ar pode- denominada pressão parcial de vapor d’água
ria conter a uma determinada tempera- na superfície da semente. Por sua vez, a água
tura. Por exemplo, se o ar possui 18 g e presente no ar sob a forma de vapor exerce,
pode conter 30 g de água/kg de ar seco a também, uma pressão parcial, designada pres-
uma mesma temperatura, a umidade são parcial de vapor d’água no ar.
relativa é de 60%; O processo de secagem envolve a retirada
w Razão de mistura (RM) – indica a massa parcial de água da semente pela transferência
de água do ar em relação à unidade da simultânea de calor do ar para a semente e de
massa de ar seco. Representada por li- água, por meio de fluxo de vapor, da semente
nhas horizontais, a leitura é feita na li- para o ar.
nha vertical à direita da figura e expressa A secagem de sementes mediante convec-
em gramas de água/kg de ar seco; ção forçada do ar aquecido compreende, essen-
w Volume específico (VE) – expressa o vo- cialmente, dois processos simultâneos:
lume ocupado pelo ar seco em relação à
unidade de massa de ar seco. O VE é re- w Transferência (evaporação) da água su-
presentado por linhas oblíquas cuja lei- perficial da semente para o ar circun-
tura é feita na parte mais externa da base dante, causada pelo gradiente de pressão
da figura, sendo expressa em m3 de ar parcial de vapor entre a superfície da
seco/kg ar seco; semente e o ar de secagem;
w Entalpia (E) – função termodinâmica re- w Movimento de água do interior para a
presentativa da energia total associada superfície da semente, em virtude de
à unidade de massa de ar seco. Determi- gradiente hídrico entre essas duas re-
nada no prolongamento das linhas mais giões.
oblíquas, sua leitura é feita no lado exter-
O derramamento hidrodinâmico sob a ação
no mais distante da parte curva da figura.
da pressão total interna e/ou um processo de
O conhecimento dos processos e dos parâ- difusão resultante de gradientes internos de
metros psicrométricos permite estabelecer o temperatura e teor de água é capaz de explicar
consumo energético e o tempo de secagem. o transporte de água do interior para a superfí-
Por exemplo, considerando um ambiente cie da semente durante a secagem (Lasseran,
em que um psicrômetro fornece TBS = 17oC e 1978).
TBU = 15oC, tem-se o estado A (UR = 80%; A forma mais utilizada para aumentar o di-
RM = 10 g/kg ar seco e E = 42 kJ/kg). Quando ferencial entre as pressões de vapor da superfí-
o ar é aquecido até 35oC, a razão de mistura cie da semente e do ar de secagem é o aqueci-
permanece constante e, dessa forma, atinge o mento deste último, diminuindo, em conse-
estado B (UR = 30% e E = 61 kJ/kg). Se o ar, qüência, a sua UR, que, dessa forma, adquire
ao sair do secador, após atravessar a massa de maior capacidade de retirada de água.
sementes, atingir a TBS = 25oC em um proces- Em termos práticos, a UR tem sido utilizada
so isentálpico, teremos o estado C (UR = 70%, como referência para inferir se a semente irá
RM = 14 g/kg e TBU = 21oC). perder (secagem), ganhar (umedecimento) ou
A quantidade de água retirada será igual a manter sua umidade (equilíbrio higroscópico)
4 g/kg de ar seco (RM em C – RM em B), e a sob determinada condição atmosférica. Confor-
270 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

me aumenta a temperatura do ar, a UR diminui, ambiente ou parcialmente aquecido, sendo o


elevando a sua capacidade de retenção de água. mesmo forçado através da camada de sementes.
De acordo com o mecanismo de movimenta- Na secagem sob alta temperatura, o ar sofre
ção do ar (movimento relativo do ar e da semen- acentuada elevação de temperatura e, conse-
te), com o aquecimento do ar e com o tempo de qüentemente, ocorre pronunciada redução em
exposição da semente ao ar de secagem, têm-se sua umidade relativa, elevando sua capacidade
diferentes métodos de secagem (Figura 17.2). de retenção de água.
A secagem natural utiliza as energias solar A secagem em camada fixa consiste basica-
e eólica para a remoção da água da semente. É mente em forçar o ar através da massa de se-
realizada na própria planta, no período compre- mentes que permanece sem movimento. Na se-
endido entre a maturidade fisiológica e a colhei- cagem de fluxo cruzado, o ar é movimentado
ta, ou empregando recursos complementares, perpendicularmente à direção de movimento da
como terreiros, tabuleiros ou encerados, nos semente no interior do secador. O ar e as semen-
quais as sementes são esparramadas. A depen- tes avançam paralelamente no interior do seca-
dência das condições psicrométricas do ar e a dor nas secagens concorrente e contracorrente,
lentidão do processo representam as principais apesar de os sentidos serem, respectivamente,
limitações, enquanto a simplicidade técnica e iguais ou opostos. Na secagem contínua, a se-
o baixo custo operacional são aspectos positivos mente fica o tempo todo sob a ação do ar aqueci-
do método. do, até que seu teor de água alcance o valor pre-
A secagem artificial realizada com movi- tendido. Por sua vez, na secagem intermitente, a
mentação mecânica do ar pode ser sob baixa semente sofre a ação do ar aquecido por interva-
ou alta temperatura. A secagem sob baixa tem- los regulares, intercalados por períodos de equali-
peratura pode ser feita com ar à temperatura zação (sem exposição ao ar em movimento).

Camada fixa
NATURAL Cruzado
Quanto ao
fluxo Concorrente

Alta temperatura Contracorrente

Quanto à Contínuo
operação Intermitente

Ar ambiente forçado
Baixa temperatura
Aquecimento complementar

ARTIFICIAL

Em combinação

Seca-aeração

 Figura 17.2
Métodos de secagem.
GERMINAÇÃO 271

Na secagem em combinação, emprega-se de água da semente e a velocidade de secagem.


a secagem sob alta temperatura, ocasião em que Na secagem com ar aquecido forçado, é reco-
a semente apresenta elevado teor de água, se- mendável o emprego de temperaturas do ar
guida de secagem sob baixa temperatura para crescentes na fase inicial e decrescentes no fim
complementar o processo até o teor de água da secagem para minimizar os danos térmicos
desejado. A etapa de complementação pode es- decorrentes da rápida remoção de água no iní-
tender-se por longos períodos, dependendo da cio e do excessivo aquecimento do eixo embrio-
espécie, da umidade da semente, da espessura nário/embrião no final (Peske e Villela, 2003).
da camada, do fluxo de ar e das propriedades A secagem estacionária em silo-secador
psicrométricas do ar. com camada espessa estabelece gradientes tér-
A seca-aeração utiliza inicialmente o méto- mico e hídrico na massa de sementes, com a
do sob alta temperatura para a secagem da se- formação de uma região de transição, na qual
mente com até dois ou três pontos percentuais ocorre retirada de água pelo ar, denominada zo-
acima do teor de água de armazenamento, se- na de secagem (Figura 17.3). Nessa secagem,
guido de um período de equalização que varia o avanço da frente de secagem é bastante influ-
de seis a oito horas num silo e, por fim, de uma enciado pelo fluxo e pela umidade relativa do
complementação de secagem mediante ar de secagem. Reduções no gradiente de umi-
movimentação forçada de ar à temperatura am- dade podem ser obtidas com diminuição da es-
biente. pessura da camada de sementes.
A secagem sob alta temperatura pode exer- Em secador intermitente, a semente sofre
cer influência prejudicial à qualidade fisiológica a ação de elevado fluxo de ar aquecido por pe-
da semente. Os principais fatores envolvidos ríodos regulares na câmara de secagem, interca-
são a temperatura alcançada pela semente, o lados por períodos sem exposição ao ar em movi-
tempo de exposição a essa temperatura, o teor mento na câmara de equalização (Figura 17. 4).

Ar úmido

Semente úmida

Zona de secagem

Ventilador

Aquecedor
Semente seca

Plenum Fundo falso

 Figura 17.3
Secador de camada fixa.
272 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

A intermitência possibilita o deslocamento de Sua flexibilidade depende do tipo de produto,


água do interior para a superfície da semente da sua natureza e do grau de contaminação. É
no período de equalização. Dessa forma, maio- muito importante atender aos padrões estabele-
res taxas de remoção de água são obtidas com- cidos (padrões de sementes e controle interno
parativamente à secagem em silo-secador. de qualidade).
As sementes de espécies ortodoxas apresen- As sementes e os materiais indesejáveis são
tam acentuada variação quanto à sensibilidade separados com base na diferença de suas carac-
aos danos térmicos decorrentes da secagem. terísticas físicas, sendo utilizada para isso uma
Essa variabilidade é influenciada por fatores variedade de máquinas que, em adequada se-
como espécie, cultivar, teor de água da semente, qüência, possibilita que cada máquina remova
método de secagem, temperatura de secagem uma porção específica de impurezas. A remoção
e tempo de exposição. das impurezas que acompanham o produto
(com o mínimo de perda de material) melhora,
assim, os atributos do lote com o mínimo de
BENEFICIAMENTO dispêndio de trabalho (Vaughan, Gregg e De-
O beneficiamento consiste na remoção de ma- louche, 1976).
terial inerte, de sementes com características O adequado beneficiamento ocorre com a
indesejáveis (danificadas, chochas, deformadas escolha entre um grande número de equipa-
e ardidas) ou de sementes de outras espécies mentos que separam materiais distintos entre
cultivadas ou invasoras. O processo de benefi- si por diferenças de tamanho (largura, espessura
ciamento envolve a amostragem, a recepção, o e comprimento), peso, forma, massa, textura su-
pré-condicionamento, a limpeza, a classifica- perficial, cor, condutividade elétrica, entre outras
ção, o tratamento e a embalagem. propriedades físicas. As características físicas
A disposição das máquinas, denominada mais comumente utilizadas na separação entre
linha de beneficiamento, não deve ser estática. sementes e impurezas são o peso e o tamanho.

Câmara de equalização

Ventilador

Câmara de secagem

Ar aquecido

 Figura 17.4
Secador intermitente.
GERMINAÇÃO 273

Em razão da reduzida quantidade, as se-


mentes de espécies não-cultivadas são freqüen-
temente submetidas à limpeza em peneiras ma-
nuais e/ou em soprador. Todavia, as sementes
de espécies cultivadas são limpas nesses equipa-
mentos ou em máquinas de ar e peneiradas de-
pendendo da quantidade a ser beneficiada. Se-
mentes de plantas invasoras e de outras plantas
cultivadas, caso não sejam removidas, represen-
tam sérios problemas de contaminação, assim
como sementes quebradas e ardidas prejudicam
o armazenamento e colocam em risco a qualida-
de do produto.
Toda empresa que deseja um produto de
qualidade deve possuir um conjunto de equipa-
mentos em adequada seqüência que proporcio-
ne o aprimoramento da qualidade do lote de
sementes.  Figura 17.5
Um componente importante no beneficia- Máquina de ar e peneiras.
mento de sementes é o operador da unidade,
que deve ser uma pessoa treinada, conhecedora
dos padrões de qualidade e especializada na Existe, no mercado, uma grande variedade
identificação das características físicas, limi- de marcas e modelos de equipamentos, que
tações e potencialidades dos equipamentos, compreendem desde máquinas com duas pe-
resultando na remoção das impurezas e na me- neiras planas, sem separação por ar, até equipa-
lhor classificação do produto. mentos providos de oito peneiras e quatro sepa-
A máquina de ar e peneiras (MAP) realiza rações por ar. Para executar um trabalho efici-
a separação das sementes com base nas dife- ente, necessita-se de, no mínimo, uma MAP
renças de tamanho e de peso. A largura e a es- com duas peneiras. Entretanto, para aprimorar
pessura são as características mais usadas na a qualidade do produto final, normalmente uti-
separação entre sementes e impurezas. A sepa- liza-se uma MAP com quatro peneiras planas
ração pela espessura é realizada em peneiras e duas separações por ar. Também são encontra-
com perfuração oblonga, e a pela largura, em das máquinas com uma ou duas peneiras cilín-
peneiras de perfuração redonda. A MAP pode dricas, utilizadas tanto na pré-limpeza como
ser utilizada tanto na pré-limpeza, em que a na classificação de diversos tipos de sementes.
prioridade é a quantidade do material benefi- A MAP deve trabalhar sempre em sua má-
ciado, como na limpeza, na qual se prioriza a xima capacidade, pois os custos de energia e
qualidade do produto final (Figura 17.5). manutenção são fixos. O tipo de semente, o
A MAP emprega correntes de ar na separa- grau de contaminação, bem como o número
ção dos materiais leves e peneiras na separação de peneiras e o tamanho das perfurações das
pelo tamanho, por meio de diferentes formas e telas utilizadas influenciam a capacidade da
dimensões da malha das telas. Ela é considera- máquina. Em geral, os equipamentos são di-
da um equipamento básico e de utilização obri- mensionados em função da área de telas. Na
gatória no fluxo do beneficiamento de sementes limpeza das sementes, procura-se deixar por
da maioria das espécies. Uma série de peneiras maior tempo o material em contato com a pe-
de perfurações redonda e/ou oblonga pode ser neira, dando a oportunidade de ele atravessar
utilizada em uma única máquina para a obten- as perfurações, o que aumenta sua eficiência
ção de diferentes tipos de separação. em detrimento da capacidade.
274 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

A maior dificuldade relacionada com o con- pelos alvéolos e retirados da massa. A rotação
trole de qualidade na MAP está associada às do cilindro produz uma força centrífuga capaz
peneiras utilizadas no beneficiamento. É conve- de manter as sementes ou partículas curtas no
niente ter, na unidade de beneficiamento, pe- interior dos alvéolos até o ponto em que haja
neiras pequenas (20 x 20 cm) do mesmo tipo e inversão suficiente da posição destes, permi-
tamanho das perfurações das peneiras usadas tindo que elas caiam dos alvéolos para dentro
na MAP. Com uma amostra do lote, são reali- da calha receptora pela força da gravidade. O
zados testes que permitem determinar a esco- formato e o tamanho dos alvéolos e das semen-
lha correta das peneiras. Estas são constituí- tes (textura superficial, teor de água e massa)
das de chapas metálicas perfuradas com orifí- apresentam efeito combinado que faz certas se-
cios redondos, oblongos ou triangulares, ou de mentes permanecerem nos alvéolos (Harmond,
malhas de arame entrelaçado com aberturas Branderburg e Klein, 1968).
quadradas ou retangulares. Cada cilindro possui alvéolos de mesmo ta-
Os separadores de cilindro alveolado e de manho, embora sua variação possa ser obtida
disco são os equipamentos utilizados na indús- com a troca dos cilindros. O tamanho do alvéolo
tria de sementes para separar materiais confor- é designado por seu diâmetro junto à borda su-
me as diferenças de comprimento. Ambas as perior.
máquinas efetuam a separação levantando a fra- Devido ao fato de serem utilizados somente
ção de material curto de uma mistura contendo um tamanho e um formato de alvéolo em cada
materiais curtos e compridos (Figura 17.6). cilindro, as separações são feitas principalmente
O separador de cilindro alveolado consiste na base da modificação da velocidade de rotação
em um cilindro rotativo inclinado, contendo do cilindro, aumentando ou diminuindo a força
uma calha receptora de separação ajustável em centrífuga, e do ajuste da posição da calha recep-
seu interior. A superfície interna do cilindro tora das sementes levantadas. As sementes, após
possui uma série de alvéolos semi-esféricos ou serem separadas por espessura e largura, na má-
cônicos bem-próximos uns aos outros. Em fun- quina de ar e peneiras, e pelo comprimento, em
cionamento, as sementes entram no cilindro separador de cilindro alveolado, apresentam ta-
por um lado e saem pela extremidade oposta. manho similar, não necessitando, na maioria das
No fundo do cilindro, fica a massa de semen- vezes, de uma seleção mais apurada.
tes a ser separada. Com a rotação, as sementes A qualidade das sementes é a freqüente
curtas e outros materiais curtos são levantados busca dos produtores. Procurando aprimorar

Sementes curtas
Calha coletora

Sementes compridas

Mistura de
Cilindro alveolado sementes curtas
e compridas

 Figura 17.6
Vista em corte de separador de cilindro alveolado, mostrando a separação das sementes curtas das compridas
e sua deposição na calha.
GERMINAÇÃO 275

cada vez mais o produto, são utilizados métodos


e técnicas científicas modernas em equipamen-
tos que, muitas vezes, por uma única caracterís-
tica física, realizam com precisão a separação
de sementes.
À disposição do produtor de sementes exis-
te, no mercado, um equipamento que, adequa-
damente operado, realiza uma das mais eficien-
tes operações na unidade de beneficiamento, a
separação das sementes pela diferença de den-
sidade na mesa densimétrica ou mesa de gravi-
dade. Corpos de mesmo material podem apre-  Figura 17.7
sentar densidades e massas específicas diferen- Mesa densimétrica.
tes, logo, sementes de mesmo tamanho poderão
ter massas diferentes e, conseqüentemente,
densidades diferentes (Figura 17.7). sementes leves na parte mais baixa do equipa-
A mesa de gravidade consiste em uma pla- mento; o movimento para cima faz com que as
taforma fixada a uma sólida fundação. Por meio sementes mais pesadas tenham maior contato
de dois diferentes eixos, é realizada a regulagem com a superfície da mesa, o que, combinado
das inclinações lateral e longitudinal. Um siste- com o movimento para a frente, direciona-as à
ma de polia excêntrica, regulável, fornece à mesa parte mais alta. No movimento para baixo, ins-
um movimento oscilatório contínuo, de cima pa- tantaneamente as sementes perdem o contato
ra a frente e de baixo para trás. Na parte inferior com a mesa; o movimento para trás não lhes
da mesa, uma série de ventiladores centrífugos, muda a direção (Gregg e Fagundes, 1975).
com regulagens individuais por meio de diafrag- Para atingir uma adequada separação, a
ma, provoca uma corrente de ar ascendente de máquina possui duas ações importantes, a se-
pressão uniforme que, ao atravessar a cobertura paradora e a estratificadora. O movimento os-
da mesa, flui na massa de sementes. Essas regu- cilatório determina uma força resultante que
lagens criam condições para que as sementes produz o efeito de separação sobre as sementes
sejam estratificadas, em camadas sobrepostas em contato com a superfície da mesa. Com a
contendo sementes leves e pesadas, enquanto inclinação desta, as sementes tendem a descer,
fluem sobre a mesa. Na parte inicial da mesa, acompanhando a direção fornecida pela incli-
no lado mais alto, uma bica de descarga permite nação. Embora a tendência das sementes seja
a remoção de pedras e materiais pesados. Na descer devido a esta, o movimento oscilatório
parte final da mesa, extremidade mais baixa, da mesa transporta as sementes para cima.
divisores ajustáveis permitem separar o lote de O fluxo de ar proveniente dos ventiladores
sementes geralmente em três frações – material separa, por diferença de densidade, sementes
pesado, material intermediário e material leve – leves e pesadas, fazendo com que estas perma-
e dirigi-los a diferentes bicas de descarga. neçam em contato com a superfície, acompa-
Devido às regulagens que fazem com que a nhando a mesma direção de movimento de vi-
mesa densimétrica se incline em duas direções bração, sendo retiradas na parte terminal mais
(lateral e longitudinal), bem como ao movi- alta da mesa de gravidade. Os materiais de
mento oscilatório variável, as sementes desli- maior densidade serão os primeiros a ser sepa-
zam na superfície da mesa em quatro direções: rados, portanto, pedras e torrões de mesmo ta-
para cima, para a frente, para baixo e para trás. manho das sementes e que não foram separa-
O movimento de oscilação, acompanhado da dos nas operações anteriores serão descartados
inclinação da mesa, determina a descarga das nas bicas laterais da mesa de gravidade.
276 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

A escolha da cobertura da superfície para tuais de água e muita sensibilidade a baixas


cada tipo de semente é de fundamental impor- temperaturas. São sementes comuns de plantas
tância. Para sementes grandes, recomenda-se de florestas tropicais úmidas. Já as de baixa re-
a utilização de chapas metálicas perfuradas ou calcitrância exibem tolerância à retirada de ele-
tela de arame, com abertura de tamanho menor vados pontos percentuais de água, reduzida
que a semente e nervuras paralelas colocadas sensibilidade a baixas temperaturas e baixa ger-
acima da tela para diminuir o fluxo de sementes minação quando não-umedecidas. São exem-
e manter uma camada uniforme. Para sementes plos as sementes de determinadas plantas de
pequenas, recomenda-se o cobrimento da tela clima temperado e subtropical, como a araucá-
com tecido que possibilite a passagem do ar, ria e o Coffea arabica (café) (ver Capítulo 3).
sem que ocorra a travessia das sementes. As sementes ortodoxas podem ser secas até
Sementes com grande diferença de peso es- baixos teores de água (5 a 7%) e armazenadas
pecífico permitem o aumento considerável da em ambientes com baixas temperaturas. Após
capacidade da máquina, reduzindo a zona de a colheita, podem sofrer secagem artificial e ser
estratificação e facilitando a separação das fra- armazenadas por longos períodos, preferencial-
ções pesada, intermediária e leve. O excesso de mente a baixas temperaturas; são resistentes
ar ocasiona mistura de sementes pesadas e le- às adversidades no período de latência e, em
ves, impossibilitando a estratificação. condições adequadas, germinam. São facilmen-
te armazenadas em regiões de clima frio, neces-
sitam de alguns cuidados no armazenamento
ARMAZENAMENTO em regiões de clima temperado e exigem in-
O armazenamento das sementes deve ser ini- tenso controle das condições de armazenamen-
ciado na maturidade fisiológica, e o maior de- to em regiões tropicais.
safio é conseguir que as sementes, após um cer- As sementes que apresentam comporta-
to período, ainda apresentem elevada qualida- mento ortodoxo quando armazenadas com teor
de fisiológica. Assim sendo, o objetivo é manter a de água entre 9 e 13%, mas que, ao serem secas
qualidade das sementes durante o período em que a 7%, perdem significativamente a viabilidade
ficam armazenadas, visto que seu melhoramento são classificadas como subortodoxas ou inter-
não é possível mesmo sob condições ideais. mediárias.
Quanto ao comportamento em relação ao A deterioração das sementes envolve uma
armazenamento, as sementes são classificadas série de alterações fisiológicas, bioquímicas e fí-
em recalcitrantes e ortodoxas. sicas que, eventualmente, causam a morte da se-
As sementes recalcitrantes não podem ser mente. As alterações são progressivas e determi-
secas abaixo de determinado teor de água sem nadas por fatores genéticos, bióticos e abióticos
que ocorram danos fisiológicos. Por exemplo, (clima, insetos e microrganismos), procedimen-
os diásporos de Araucaria angustifolia perdem a tos de colheita, de secagem, de beneficiamento,
viabilidade ao serem secos a teores de água infe- de manuseio e de armazenamento (Figura 17.8).
riores a 37%. Não podem ser secos pelos méto- Dentre as principais alterações envolvidas
dos tradicionais de secagem e, quando armaze- na deterioração das sementes, destacam-se o
nados com elevado teor de água, perdem a via- esgotamento das reservas alimentares, a alte-
bilidade em curto espaço de tempo. ração da composição química, como a oxidação
Grande número de espécies frutíferas e flo- dos lipídeos e a quebra parcial das proteínas, a
restais possui sementes recalcitrantes, o que alteração das membranas celulares, com redu-
complica a conservação do germoplasma pela ção da integridade, aumento da permeabilidade
dificuldade de armazenamento. Essas semen- e desorganização, as alterações enzimáticas e
tes podem apresentar alta ou baixa recalcitrân- as alterações de nucleotídeos.
cia. Sementes de alta recalcitrância apresentam O tamanho, a forma e a localização das es-
tolerância à retirada de poucos pontos percen- truturas reprodutivas na semente estão relacio-
GERMINAÇÃO 277

Vírus Nematóides

Bactérias Ácaros

Fungos Insetos

Maturidade Roedores e
da semente pássaros
SEMENTES
E
Temperatura IMPUREZAS Umidade
o
45-0 C 10-25%

Temperatura SEMENTES Umidade


45-0oC DETERIORADAS 10-25%

Cor Oxigênio
e odor Gás carbônico

Peso Toxicidade

Germinação Vigor

 Figura 17.8
Fatores biológicos e físicos determinantes da qualidade fisiológica de sementes armazenadas.

nados com a susceptibilidade aos danos mecâ- bretudo pelo teor de água e pela temperatura
nicos. Por exemplo, nas sementes de Glycine max ambiental (Figura 17.9).
(soja), o eixo embrionário está saliente, protegi- Regras empíricas indicam que a longevida-
do por fino tegumento, ficando exposto a im- de da semente é duplicada a cada 1% de dimi-
pactos que facilmente poderão causar danos nuição no seu teor de água (válido para teores
mecânicos. de água de 5 a 15%) ou a cada 5,5oC de diminui-
As fissuras nos tegumentos ocorrem devido ção na temperatura (válido para temperaturas
às flutuações de umidade e à secagem excessiva de 0 a 40oC).
da cobertura protetora, facilitando a penetração A temperatura influencia as atividades res-
de microrganismos e a perda da capacidade de piratórias das sementes e dos microrganismos
regulação das trocas hídricas e gasosas nas se- presentes, bem como a atividade, o desenvol-
mentes. vimento e a reprodução de insetos. Condições
É importante ressaltar que sementes de te- de ambiente seco e frio são mais favoráveis ao
gumento duro podem ser armazenadas por armazenamento de sementes ortodoxas.
mais tempo comparativamente às de tegumento A aeração é a operação de passagem de um
brando. Sementes imaturas geralmente sofrem, fluxo de ar ambiente na massa de sementes,
no armazenamento, redução de qualidade mais proporcionando o esfriamento e a homogenei-
rapidamente do que sementes maduras. zação da umidade das sementes armazenadas.
A longevidade da semente é bastante influ- Visa modificar as condições de armazenamento
enciada pelas condições de armazenamento, so- do produto pela redução e/ou uniformização da
278 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

40

Temperatura do grão (oC) 30

20

C D

10 A

grão seco grão úmido


0
5 10 13 15 20 25

Teor de umidade (%, b.u.)

A Zona de boa conservação C Germinação


B Insetos D Fungos

 Figura 17.9
Gráfico da conservação de sementes de cereais.

temperatura da massa de sementes e pela re- sofre resfriamento, acarretando a condensação


moção do excesso de etileno, gás carbônico e da umidade na parte superior central da cama-
outros gases, favorecendo a manutenção da da de sementes armazenadas.
qualidade das sementes. A aeração não é o único meio de conserva-
Sementes armazenadas em silos e arma- ção de sementes e, portanto, não deve ser tra-
zéns graneleiros, embora estocadas com umida- tada de maneira isolada, mas aliada a eficiente
de recomendável, podem sofrer deterioração processo de secagem, tratamento fitossanitário
devido às variações diárias da temperatura; es- e acompanhamento da temperatura da massa
tas provocam aumento de umidade em deter- de sementes e do ar do ambiente externo. Para
minados pontos do silo, influindo no aumento manter a temperatura homogênea nas semen-
de perdas por deterioração. O ar quente res- tes e similar à temperatura externa, efetua-se
fria-se ao passar por regiões mais frias, sofre a aeração com determinado volume de ar am-
aumento de umidade relativa, formando o fe- biente e sem aquecimento até que ocorra ho-
nômeno denominado migração de umidade. mogeneidade da temperatura na massa de se-
Em um silo contendo sementes com umi- mentes (Figura 17.10).
dade de 12% a uma determinada temperatura, A aeração em sementes é possível pelo fato
com a variação da temperatura externa, as se- de constituir um leito “poroso” com determina-
mentes em contato com as paredes do silo ten- da porcentagem de “vazios” intersticiais por on-
dem a adquirir essa temperatura mais rapida- de o ar circula. A natureza da semente, a forma,
mente do que as que estão no interior do silo, o teor de água e a compactação influem no coe-
acarretando a formação de zonas com diferen- ficiente de porosidade, que varia de 10 a 50%.
tes temperaturas. Isso ocasiona uma movimen- Esse valor é indicativo da quantidade de energia
tação do ar existente entre as sementes, de necessária para vencer as perdas de carga ou con-
modo que o ar mais quente sobe e, ao encontrar trapressões ocasionadas pela resistência à circu-
as sementes mais frias na parte superior do silo, lação forçada do ar. As perdas de carga podem
GERMINAÇÃO 279

11 tar o poder secante do ar. A aeração de manu-


tenção é empregada no armazenamento inter-
10 mediário para sementes com teores de água su-
Aeração possível, com riscos de
Diferença de temperatura entre grãos e ar exterior (oC)

condensação e secagem excessiva periores a 15% enquanto é aguardada a seca-


9
gem. A aeração de resfriamento é utilizada no
8
armazenamento convencional, em sementes
com teores de água de 13%, sendo aplicada em
7 doses freqüentes para evitar o aquecimento da
massa de sementes e/ou para manter resfriado
6 Aeração o lote destas.
recomendada
Sempre que as condições climáticas forem
5
adequadas, deve-se realizar preventivamente a
4
aeração das sementes armazenadas, procuran-
Aeração do que a massa seja mantida a temperaturas
3 possível inferiores a 18oC.
No controle da aeração, constata-se que as
2 Aeração sem camadas aeradas são esfriadas sucessivamente.
interesse
Observa-se o início de aquecimento nas cama-
1
das mais distantes com o desprendimento de
calor da semente, podendo ocasionar o desen-
30 40 50 60 70 80 90 100 volvimento de fungos e a perda de qualidade.
A velocidade de progressão da frente de res-
Umidade relativa do ar exterior (%)
friamento deve ser tal que a última camada de
 Figura 17.10 sementes seja atingida pelo ar frio antes de ser
Gráfico do uso da aeração para cereais com umida- aquecida. Ao atingir a camada mais distante, é
de normal, para armazenamento e comercialização.
aconselhável manter a aeração até seu completo
resfriamento, ou seja, até que a temperatura
dessa camada de sementes se iguale à tempera-
também variar segundo a vazão de ar aplicada, tura do ar de aeração.
a espessura da massa de sementes, as dimensões O desconhecimento e/ou a negligência dos
e a concepção do sistema de distribuição. responsáveis técnicos pelas unidades armaze-
Para o dimensionamento de uma instalação nadoras acarreta a perda da qualidade das se-
de aeração, é indispensável o conhecimento das mentes por aquecimento, infestação de insetos,
propriedades biológicas e físicas das sementes proliferação de fungos, ocasionando a redução
que serão conservadas e das características téc- de vigor na semente.
nicas dos materiais a serem utilizados, levando Os fatores de perdas de sementes armaze-
em consideração que a aeração é um meio para nadas podem ser agrupados em: autodecom-
favorecer a conservação de produtos deteriorá- posição, ataque microbiano, ataque de pragas
veis, como as sementes. É necessário salientar e físicos. Embora haja estreita relação entre eles,
que a aeração tem aplicações múltiplas, confor- é possível estabelecer predominância de carac-
me a natureza e o teor de água das sementes, terísticas diferenciadas para cada origem.
desempenhando um importante papel na su- O êxito no controle das pragas que atacam
cessão das operações de condicionamento e as sementes armazenadas requer a correta
conservação. identificação dos insetos presentes na massa
A aeração de sementes apresenta múltiplas de sementes para a escolha do inseticida e da
funções. A aeração secante é utilizada para uma dose a ser utilizada. O resultado da ação de inse-
lenta secagem, podendo ser combinada com tos em sementes armazenadas traduz-se em
aquecimento suplementar, que permite aumen- perdas de peso e poder germinativo, desvalori-
280 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

zação comercial do produto, disseminação de inferior a 10oC. Apresenta elevada umidade re-
fungos e surgimento de bolsas de calor durante lativa do ar, o que pode ocasionar aumento da
o armazenamento. umidade das sementes caso não sejam acondi-
A adequada e permanente higienização das cionadas em embalagens impermeáveis.
instalações de armazenamento é a prática mais A câmara seca apresenta controle de umi-
eficiente e imprescindível para combater os dade relativa do ar ao redor 40 a 45%, empre-
insetos que atacam as sementes armazenadas. gando dessecantes químicos, como sílica gel e
Antes de iniciar uma nova safra ou receber no- alumina ativada. As sementes devem ser acon-
vos produtos, uma correta limpeza das instala- dicionadas em embalagens permeáveis.
ções, de preferência com ar comprimido e as- Na câmara fria e seca, a temperatura e a
piradores pneumáticos, deve ser efetuada, e os umidade relativa do ar são mantidas em valores
detritos, queimados ou enterrados. específicos por meio de refrigeração e desumi-
É fundamental que seja realizada uma revi- dificação. As condições recomendadas para o
são completa em telhados, calhas, dutos, ralos e armazenamento em longo prazo são tempera-
galerias a fim de eliminar eventuais goteiras, va- tura de 5 a 10oC e umidade relativa de 40 a 45 %.
zamentos e/ou inadequado escoamento de águas Na conservação de sementes ortodoxas em
pluviais. Fendas e rachaduras nos pisos, paredes bancos de germoplasma, são recomendadas
e calçadas poderão abrigar grãos e resíduos infes- temperaturas abaixo de 0oC e umidade relativa
tados, bem como infiltrações nas épocas chuvo- do ar inferior a 25 ou 30% para a preservação
sas. É importante verificar as áreas externas das da qualidade fisiológica das sementes por lon-
unidades armazenadoras para evitar a ocorrência gos períodos.
de vegetação que possa servir de abrigo ou ali- A preservação da qualidade fisiológica de
mentação a insetos, ratos e outras pragas. sementes sob determinadas condições ambien-
Adequadas condições de armazenamento tais de temperatura e umidade relativa do ar é
para a conservação de sementes podem ser obti- influenciada pelo tipo de embalagem utilizada.
das pela localização dos armazéns em locais As embalagens, quanto à permeabilidade ao va-
onde as condições climáticas sejam favoráveis, por d’água, podem ser classificadas em permeá-
sendo necessária a secagem da semente até o veis, semipermeáveis e impermeáveis.
teor de água seguro. Por outro lado, se as condi- As embalagens permeáveis permitem a tro-
ções climáticas forem desfavoráveis ou se o pe- ca de vapor entre as sementes e o ambiente ex-
ríodo de armazenamento for prolongado, a al- terno circundante. Por isso, o teor de água das
ternativa será a modificação artificial das con- sementes sofre flutuações com as variações de
dições ambientais. umidade relativa do ar. Os principais materiais
Os armazéns convencionais são unidades empregados comercialmente na confecção de
de piso plano destinados ao armazenamento embalagens permeáveis de sementes são papel,
de sementes em sacos, dispostos em pilhas so- algodão, juta e polipropileno trançado.
bre estrados. As embalagens semipermeáveis mostram-
Os silos são unidades destinadas ao arma- se resistentes à troca de vapor d’água entre as
zenamento a granel, construídos de concreto, sementes e o ambiente externo circundante.
alvenaria, madeira ou metal. Podem ser verti- Para a conservação de sementes em embalagens
cais, quando apresentam altura superior ao di- semipermeáveis, o teor de água das sementes
âmetro, ou horizontais (armazéns graneleiros), deve ser de 2 a 3 pontos percentuais inferior ao
caso a altura seja inferior às dimensões da base. empregado nas embalagens permeáveis. Os
Dentre os sistemas de conservação em am- materiais utilizados nesse tipo de embalagem
biente controlado artificialmente, destacam-se são polietileno de baixa espessura e combina-
a câmara fria, a câmara seca e a câmara fria e ções de lâminas de papel e outro material (papel
seca. A primeira destina-se à conservação de se- aluminizado, plastificado e com película de as-
mentes sob temperatura controlada, geralmente falto).
GERMINAÇÃO 281

As embalagens impermeáveis impedem o HARMOND, J.E.; BRANDERBURG, N.E.; KLEIN, L.M.


intercâmbio de vapor d’água entre as sementes Mechanical seed cleaning and handling. Agricultural
Handbook, n. 354, 1968.
e o meio externo. Geralmente, são empregados
sacos de polietileno espesso, de média e alta LASSERAN, J.C. Princípios gerais de secagem. Revista
Brasileira de Armazenamento, n.3, p. 17-45, 1978.
densidades, envelopes de alumínio, embala-
gens metálicas de alumínio e folhas de flandres PERES, W.B. Manutenção da qualidade de grãos e sementes.
Pelotas: UFPel, 2001. 78p.
com sistema de recravação e recipientes de vi-
PESKE, S.T.; VILLELA, F.A. Secagem de sementes. In:
dro com gaxeta de vedação na tampa.
PESKE, S.T.; ROSENTHAL, M.D.; ROTA, G.R.M. Semen-
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C A P Í T U L O 1 8

TESTES DE QUALIDADE
Fatima C. Márquez Piña-Rodrigues
Márcia Balistiero Figliolia
Maria Célia Peixoto

O estabelecimento de testes de avaliação da e Cohn, 1998). Dessa maneira, a metodologia


qualidade de sementes passa, inicialmente, pela de avaliação da qualidade das sementes teve
definição do próprio termo. Tecnicamente de se adaptar e evoluir no mesmo ritmo vertigi-
“qualidade” refere-se às características relativas noso, muitas vezes antecipando-se ao uso em
às propriedades genéticas, físicas, fisiológicas larga escala de novas técnicas de produção.
e sanitárias das sementes e dos lotes (Carvalho No Brasil, esse processo ocorre de forma
e Nakagawa, 2000). mais lenta, sendo, no entanto, visível nos traba-
Enquanto nas décadas de 1970 e 80 as lhos publicados na Revista Brasileira de Semen-
pesquisas enfatizaram a produção, os métodos tes1 e em outros veículos de difusão científica.
de melhoramento genético e os de avaliação da Apesar disso, as Regras para Análise de Semen-
qualidade das sementes, a partir de 1993, os tes (RAS) (Brasil, 1992), publicação oficial que
temas passaram a abordar aspectos da biolo- preconiza os métodos de avaliação da qualidade
gia, em especial sobre mecanismos fisiológicos de sementes, ainda não incorporam os avan-
envolvidos na germinação, na deterioração, na ços da pesquisa nas regiões tropicais, sobretu-
dormência e na interação ecológica entre a se- do de espécies florestais brasileiras.
mente e o ambiente (USDA, 1997). Considerando essa lacuna, foi iniciado um
O advento da biotecnologia tem como con- processo de aferição de metodologias de análise
seqüência direta o aumento do custo da semen- definindo como prioritárias as espécies flores-
te, transformada em um produto tecnológico. tais que apresentassem maior volume de pes-
Por outro lado, isso gera a necessidade de me- quisas e que fossem produzidas pelo maior nú-
lhor estabelecimento das plantas e de avaliação mero de instituições2 .
dessa semente e de sua habilidade de produzir
plantas de alta qualidade. Assim, o aumento
do custo das sementes estimulará mais pesqui-
sas que possam estimar essa qualidade, seja ex-
pressa por sua germinação ou pelo vigor das
sementes ou das plantas no campo (Taylor et 1 A Revista Brasileira de Sementes é o principal veículo de divulgação
al., 1998). técnico-científico da Associação Brasileira de Tecnologia de Semen-
Apesar das mudanças temáticas, a questão tes (ABRATES), vinculada à ISTA (International Seed Testing As-
sociation), e que congrega pesquisadores de vários setores das áre-
principal, ao longo dos 25 anos de pesquisa, as agrícola, biológica e florestal.
continuou sendo a produção, a avaliação da 2 O processo vem sendo realizado pelo Comitê Técnico de Análise

qualidade, a melhoria do seu desempenho e o de Sementes Florestais da Associação Brasileira de Tecnologia de


Sementes (CTSF/ABRATES) e pelas Redes de Sementes Florestais,
entendimento da biologia e da ecologia como criadas por intermédio do Fundo Nacional do Meio Ambiente, pe-
base para a tecnologia de sementes (Bradford los Editais 04/2000 e 01/2001, do Ministério do Meio Ambiente.
284 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

AS REGRAS PARA ANÁLISE populações (Bradford e Cohn, 1998). Mesmo


DE SEMENTES (RAS) em espécies altamente melhoradas, das quais
A avaliação da qualidade de um lote requer que se espera maior homogeneidade genética, as
se utilizem metodologias padronizadas, de mo- variações fisiológicas entre sementes (indiví-
do que os testes sejam reproduzíveis em qual- duos da população) são muito maiores do que
quer laboratório, com o mesmo material gené- geralmente vem sendo apresentado (Still e
tico. As Regras para Análise de Sementes (RAS) Bradford, 1997). Por outro lado, os estudos ge-
estabelecem e especificam padrões a serem uti- néticos conduzidos até agora têm encontrado
lizados, desde o tamanho da amostra até instru- menos variação do que se esperaria para mate-
ções para realização das análise de qualidade riais genéticos não-domesticados como os de
de sementes (Marcos Filho, Cicero, Silva, 1987; espécies florestais (Kageyama et al., 2003a).
Carvalho e Nakagawa, 2000). No Brasil, as atu- Para espécies melhoradas, a pureza genética é o
ais RAS fundamentam-se nas Regras Interna- objetivo principal, em que a composição gené-
cionais da ISTA (International Seed Testing As- tica do material melhorado e, posteriormente,
sociation, 1993, 1999) e da AOSA (Association multiplicado pelo produtor deve ser mantida.
of Official Seed Analysis, 1983), que regulam
os métodos a serem empregados na análise de Métodos de avaliação da qualidade
sementes no comércio internacional. Muitas es- genética
pécies florestais, ornamentais e medicinais da Entre os testes mais utilizados, está a ele-
região neotropical não apresentam metodolo- troforese (Rosa et al., 2000a), descrita em mai-
gias padronizadas. ores detalhes por Alfenas (1998). Os testes de
As RAS apresentam padrões e metodologias pureza genética utilizando o método de géis ele-
definidos para espécies exóticas de alto valor troforéticos têm sido criticados por se restringi-
comercial para o Brasil, como os gêneros Pinus, rem a poucas enzimas que produzem diferentes
Acacia e Eucalyptus, mas para poucas espécies padrões de polimorfismo para cada pai envolvi-
consideradas como nativas brasileiras, como do. Autores como McDonald (1998) conside-
Araucaria angustifolia. Nesse sentido, o Comitê ram que essa ferramenta não apresenta a acu-
Técnico de Sementes Florestais (CTSF) da rácia necessária para discriminar diferenças en-
Associação Brasileira de Tecnologia de Semen- tre variedades, uma vez que a composição de
tes (ABRATES) vem, desde 1987, promovendo nucleotídeos de um gene é determinada ape-
a publicação de manuais que visam orientar a nas indiretamente por seu produto, a enzima.
realização de testes de qualidade de sementes Além disso, inexiste uma correlação que permi-
florestais. Em função disso, vários trabalhos fo- ta analisar se o padrão de variação obtido se
ram publicados com o objetivo de disponibilizar reflete em características da planta, pois não
informações sobre essas espécies (Piña-Rodri- se sabe quais dessas características são contro-
gues, 1988; Oliveira, Piña-Rodrigues e Figliolia, ladas pelas enzimas estudadas (McDonald,
1989; Piña-Rodrigues, Costa e Reis, 1989; 1990). No entanto, essa técnica foi utilizada
Aguiar, Piña-Rodrigues e Figliolia, 1993; Silva, com sucesso na estimativa de parâmetros gené-
Piña-Rodrigues e Figliolia, 1995; Figliolia e ticos para populações de Araucaria angustifolia
Piña-Rodrigues, 1995a). por Sousa (2000).
O teste de DNA polimórfico amplificado ao
acaso, conhecido como RAPD (Random Ampli-
QUALIDADE GENÉTICA fication of Polymorphic DNA), com base na rea-
Os testes de qualidade genética devem conside- ção em cadeia da polimerase (PCR), tem sido
rar que a semente é o produto de uma popula- adotado na comprovação de pureza varietal e
ção, ou seja, de um conjunto de indivíduos, e na identificação de cultivares por ser uma téc-
seus delineamentos experimentais devem in- nica simples, de baixo custo, acessível e que não
cluir a variabilidade existente dentro e entre requer nenhuma informação prévia sobre se-
GERMINAÇÃO 285

qüências de nucleotídeos do genoma de qual- sua origem. Já a utilização de marcador


quer espécie em análise (Binneck, Nedel e De- molecular RAPD foi eficiente na discriminação
lagostin, 2002). O princípio da análise RAPD das matrizes, separando-as em quatro grupos
baseia-se na utilização de um primer (oligonu- distintos.
cleotídeo) de seqüência aleatória que poderá, Outra técnica adotada para avaliar a pureza
ao acaso, complementar algumas seqüências- genética é a conhecida como RFLP. Os marca-
alvo, distribuídas ao longo do genoma. Poste- dores genéticos usados na técnica de RFLP (Res-
riormente, os loci que passam a apresentar duas triction Fragment Length Polymorphisms) são co-
seqüências-alvo em fitas opostas são amplifica- dominantes, o que permite a distinção entre
dos pelo processo de reação em cadeia da poli- homozigotos e heterozigotos, propiciando a ob-
merase (PCR). Cada um dos fragmentos ampli- tenção de vasta informação genética de um
ficados representaria diferentes loci, de tama- simples locus. No entanto, seu principal incon-
nhos variáveis, que poderiam ser distintos entre veniente para a adoção em larga escala baseia-
si utilizando-se a eletroforese (Ferreira e Gratta- se na necessidade de alta quantidade de DNA, o
paglia, 1996) e que, teoricamente, seriam consi- que torna a automação do processo de mapea-
derados como polimórficos. Porém, é nesse pro- mento gênico uma atividade difícil (McDonald,
cesso que vários autores questionam a técnica, 1998). Para sobrepor essas dificuldades, várias
em especial por se desconhecer os parâmetros técnicas têm sido estudadas, entre elas métodos
que governam os eventos de ampliação na aná- que empregam microssatélites e marcadores
lise RAPD (Binneck, Nedel e Delagostin, 2002). genéticos (fingerprints). No entanto, todas essas
Os principais problemas da utilização des- técnicas têm esbarrado com a necessidade de
sa técnica são a sua baixa reprodutibilidade e a agilizar seu uso com a adoção de processos de
pequena resolução das bandas e da caracteri- análise automatizada e produzir marcadores e
zação da homologia dos produtos. O uso dessa microssatélites em escala que permita criar um
metodologia tem adeptos por ser considerada mapa genotípico específico.
de baixo impacto ambiental, além de requerer
equipamentos bastante semelhantes aos em-
pregados no estudo de eletroforese (Ferreira e QUALIDADE FISIOLÓGICA
Grattapaglia, 1996; McDonald, 1998).
A avaliação da pureza varietal que emprega Teste de germinação
o método marcador RAPD é utilizada para mui- O teste de germinação consiste em determi-
tas espécies agrícolas, como Glycine max (soja), nar o potencial germinativo de um dado lote
Gossypium hirsutum (algodão), Arachis hipogea de forma a avaliar a qualidade fisiológica das
(amendoim), Triticum aestivum (trigo) (McDo- sementes para fins de semeadura e produção
nald, 1995) e Zea mays (milho) (Zhang, McDo- de mudas (Brasil, 1992; Carvalho e Nakagawa,
nald e Sweeney, 1996). O uso mais freqüente 2000). Como se trata de um teste de controle
da análise RAPD tem sido a identificação de de qualidade, deve ser realizado em ambiente
cultivares de diferentes espécies de interesse de laboratório, sob condições controladas de
nas regiões tropicais, como Lycopersicum esculen- temperatura, teor de água e luz. Dessa forma,
tum (tomate) (Noli et al., 1999) e Carica papaya é possibilitado às sementes expressarem seu
(mamão) (Stiles et al., 1993). máximo poder germinativo e vigor sem que ha-
Para espécies florestais, os testes genéticos ja interferências externas indesejáveis. Os testes
têm como principal finalidade avaliar a diver- de germinação em condições de laboratório ob-
sidade intra e interpopulacional (Kageyama et jetivam qualificar e quantificar o valor das se-
al., 2003a, 2003b). Com esse objetivo, Leite mentes vivas, capazes de produzir plantas nor-
(2001) constatou alta diversidade morfométrica mais sob condições favoráveis de campo (Fi-
nos diásporos de Syagrus romanzoffiana, mas que gliolia, Oliveira e Piña-Rodrigues, 1993). Eles
não permitiu agrupar as matrizes com base em devem ser realizados de acordo com as reco-
286 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

mendações ou prescrições estabelecidas nas autoclave a 1 atm por 30 minutos ou em estufa


Regras para Análise de Sementes (RAS). Con- com circulação de ar forçado a 105oC por 24
siderações práticas sobre o teste de germinação horas ou a 150oC por 8 horas. As RAS prescre-
com espécies florestais foram feitas por Figliolia vem outros substratos, como areia e rolo de
e Piña-Rodrigues (1995b), que apresentaram papel, que não são muito utilizados pelos labo-
as melhores condições de temperatura e subs- ratórios de análise de sementes florestais.
trato obtidas em levantamento de literatura. Os recipientes mais usados para as semen-
tes pequenas são as tradicionais caixas plás-
Condições e equipamentos ticas transparentes (gerbox) prescritas nas RAS.
Em conformidade com as RAS, a literatura Para as sementes de tamanho médio e grande,
evidencia que, para a maioria das espécies tropi- são empregados recipientes maiores e transpa-
cais e subtropicais, a faixa ótima de temperatu- rentes, de plástico ou de vidro, com ou sem tam-
ra para a germinação se dá entre 15 e 30oC, com pa, de tamanhos variados como 20 × 30, 20 ×
temperaturas alternadas de 20 a 30oC e de 10 a 25, 20 × 20, 20 × 15 centrímetros.
30oC. Para a manutenção das temperaturas, são
utilizados equipamentos (germinadores ou câ- Instalação do teste
maras) com sistema de controle automático. Embora as RAS prescrevam o uso de 400
No regime de alternância, as sementes são sementes para o teste de germinação, nem sem-
mantidas na temperatura mais baixa por 16 pre isso é possível para as espécies florestais,
horas e na mais alta por 8 horas. basicamente por dois motivos: primeiro, pelo
Estudos revelaram que o teor de água e o tamanho das sementes e, segundo, pela baixa
tipo de substrato exigido pelas sementes variam produção das mesmas, muito comum pelo fato
muito de acordo com as características ecológi- de a maioria das espécies não estar domestica-
cas (Oliveira, Piña-Rodrigues e Figliolia, 1989). da, e sim ocorrer em sua área natural. Isso re-
Espécies com sementes de tamanho médio a quer necessariamente a redução do número de
grande e que ocorrem nas encostas úmidas e sementes por repetição e, em conseqüência,
nas margens de rios preferem substratos mais padrões de tolerância com mais cuidados. Nes-
granulados e úmidos. Para esse grupo, é reco- ses casos, os técnicos do setor florestal adotam
mendado o uso de vermiculita e teores de água o uso de 100 sementes (4 repetições de 25 se-
variando de 60 a 90 ml. Por outro lado, para as mentes ou 5 × 20 sementes). Como exemplo,
espécies de locais mais secos, como as florestas citamos Centrolobium tomentosum, Dipteryx alata
semideciduais e o Cerrado, e com sementes e Ocotea porosa, que apresentam cerca de 100,
pequenas, recomenda-se o uso de papel-filtro 60 e 500 sementes por quilograma, respectiva-
e teores de água variando de 6 a 10 ml. É im- mente, e, por outro lado, têm produção restrita.
portante salientar que o meio em que a semente A semeadura pode ser feita sobre ou entre
é colocada para germinar deve permanecer os substratos. Para minimizar a ação de fungos
sempre úmido para não haver interferência no do ambiente, recomenda-se usar a semeadura
desenvolvimento da plântula. A vermiculita entre vermiculita ou areia. No caso de vermi-
(argila mineral expandida) tem sido o substrato culita, a quantidade normalmente utilizada é de
mais empregado em espécies florestais pelos 30 g/gerbox ou 90 a 150 g por pirex, conforme o
excelentes resultados demostrados. Apresenta, tamanho descrito anteriormente. Independen-
porém, a necessidade de se empregar recipien- temente do substrato escolhido, é importante
tes de maiores dimensões e, com isso, maior manter um espaçamento amplo entre as semen-
volume de substrato. Sua inclusão nas RAS de- tes a fim de evitar contaminação de fungos ou
pende da fixação e da padronização das granu- bactérias entre elas. O espaçamento adequado é
lometrias a serem utilizadas para cada tipo de de 1,5 a 5 vezes o tamanho da semente.
semente. Assim como outros substratos, a ver- A duração do teste varia muito entre as es-
miculita deve ser esterilizada antes do uso, em pécies, podendo ser de 10 dias para os ingás
GERMINAÇÃO 287

(Inga spp.) e angicos (Parapiptadenia spp.), de 1994). O princípio do teste baseia-se na reação
20 dias para os ipês (Tabebuia spp.) e de 60 dias do sal 2,3,5 trifenil tetrazólio com íons de H+
para algumas palmeiras. As contagens são fei- resultantes do processo de respiração das se-
tas em intervalos de 3 a 4 dias para as espécies mentes, formando um composto, o formazan,
que germinam rapidamente e de sete dias para que apresenta coloração avermelhada (Piña-Ro-
os períodos mais longos. drigues e Valentini, 1995). Tecidos deteriorados,
A avaliação e a interpretação dos testes se- no entanto, apresentam danos nas membranas,
guem os conceitos descritos nas RAS, de plân- liberando íons H+ e substâncias que reagem de
tulas normais, anormais, sementes duras, fir- modo intenso com o sal, conferindo aos tecidos
mes, dormentes, mortas e chochas. Considera- uma coloração vermelho-intensa (Marcos Filho,
se normal toda plântula que apresenta as es- Cicero e Silva, 1987; Vieira e Carvalho, 1994).
truturas essenciais do seu embrião desenvolvi- Embora o teste apresente um princípio sim-
das e em condições de produzir uma planta nor- ples, requer treinamento dos analistas e aplica
mal no campo. No entanto, há casos como o de critérios bastante subjetivos, com base na colo-
Platyciamus regnelli e Piptadenia gonoacantha, que ração dos tecidos e na localização e extensão
apresentam a raiz e o hipocótilo reduzidos, não das manchas coloridas. Quando as sementes
compatíveis com a descrição de plântula normal são dormentes, o TZ pode apresentar resulta-
das RAS, mas que têm desenvolvimento nor- dos maiores do que os observados no teste de
mal em viveiro. Os resultados são expressos em germinação, enquanto, para sementes duras,
porcentagem ou em número de plântulas nor- a barreira à penetração do sal nos tecidos pode
mais por unidade de peso (g), como é o caso de levar a uma subestimação dos resultados (Piña-
muitos Eucalyptus sp., Tibouchina mutabilis e T. Rodrigues e Valentini, 1995).
granulosa e de outras espécies que possuem se- O teste pode ser instalado em amostras de
mentes muito pequenas. sementes (100 sementes divididas em repeti-
Um dos grandes problemas é a contamina- ções) que devem ser pré-condicionadas em pa-
ção das sementes por patógenos nas condições pel-filtro umedecido por 16 a 24 horas, à tempe-
de campo. Estudos recentes têm apontado a ratura de 25oC. O procedimento visa permitir a
ocorrência da contaminação da semente já na embebição lenta das sementes de modo a esti-
ocasião de sua formação e de seu desenvolvi- mular o processo de germinação e o preparo
mento (Arguedas, 1997). Para minimizar ou até das mesmas. As sementes podem ser utiliza-
mesmo evitar a contaminação, recomenda-se das inteiras ou preparadas para o teste, realizan-
a esterilização dos germinadores, dos recipien- do-se punção do tegumento, corte ou seccio-
tes e dos utensílios empregados com hipoclorito namento da semente, retirada do tegumento
e álcool e a limpeza diária do ambiente do labo- ou extração do embrião. Essas práticas têm por
ratório. objetivo facilitar o contato do sal com os tecidos
das sementes. Finda a fase de preparação, es-
Testes bioquímicos tas são imersas na solução de sal de tetrazólio3
preparado a concentrações que variam de
Teste de tetrazólio
O teste de tetrazólio (TZ) é um dos testes mais
tradicionais na avaliação da qualidade e do vi-
gor de sementes, tendo sido mais divulgado a 3 A solução de tetrazólio deve manter o pH neutro (6,5 a 7). Caso

partir dos trabalhos de Liberal (1980). Sua prin- seja necessário, o pH pode ser corrigido utilizando-se uma solução-
tampão preparada em quatro etapas: (A) KH 2PO 4 (9,078 g)
cipal vantagem é a rapidez com que fornece re- dissolvido em 1 l de água destilada; (B) Na2HPO42H2O (11,876 g)
sultados confiáveis sobre as sementes, além de em água destilada até completar 1 l; (C) mistura de 400 ml da
não ser afetado pela presença de fungos e bacté- solução A com 600 ml da solução B e, finalmente, (D) dissolução
de 10 g de tetrazólio na solução C. Essa mistura originará uma
rias que constantemente mascaram os resulta- solução-estoque com volume de aproximadamente 1000 ml, con-
dos dos testes de germinação (França-Neto, centração de 1% e pH 7.
288 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

0,075% para soja (Kryzanowski, Vieira e Fran- com tecidos com perda de turgescência e brilho
ça-Neto, 1999) até 1% para espécies florestais representam áreas em deterioração. Zonas não-
(Aguiar, Piña-Rodrigues e Figliolia, 1993). As coloridas podem significar tecidos mortos ou
sementes permanecem na solução de tetrazólio procedimentos inadequados para a coloração
no escuro, uma vez que o tetrazólio também dos tecidos; (b) a localização das manchas – a
reage com a luz. São colocadas à temperatura presença de danos (áreas não-coloridas ou de
de 35 a 40oC, conforme a espécie, por período vermelho-intenso) em zonas críticas das se-
variável de 150 a 180 minutos até 36 horas. mentes, tais como radícula e eixo embrionário,
Quando atingem a coloração ideal, as semen- deve ser avaliada cuidadosamente pelo analista,
tes podem ser retiradas, lavadas e analisadas associada à sua extensão e à intensidade de co-
em lupa estereoscópica (aumento de 4 a 6 ve- loração; (c) a presença de fraturas e turgência
zes). Caso não sejam analisadas imediatamen- dos tecidos – esses fatores estão ligados à inte-
te, podem ser conservadas em refrigerador. gridade dos tecidos. Com base nesses parâme-
A interpretação dos resultados depende de tros, o analista classifica as sementes em viáveis
padrões definidos para algumas espécies, como e inviáveis, calculando a percentagem de viabi-
os apresentados por Vieira e Carvalho (1994), lidade a partir do número de sementes utiliza-
ISTA (1999), Kryzanowski, Vieira e França- das e da quantidade classificada como viável.
Neto (1999) e, para florestais, por Piña-Rodri- Na Tabela 18.1 são apresentados métodos em-
gues e Valentini (1995). Na avaliação do teste, pregados no teste de tetrazólio. O procedimento
são consideradas: (a) a coloração dos tecidos – específico para espécies do gênero Pinus é ilus-
sementes com vermelho-vivo e túrgidos bri- trado nas Figuras 18.1 a 18.3, nas quais são
lhantes são consideradas sadias; zonas das se- apresentadas as estruturas completas (Figura
mentes de cor vermelho-intenso, quase grená, 18.1) e o método de preparo e a avaliação das

Tabela 18.1 Instruções para o preparo de sementes para emprego do teste de tetrazólio, de acordo com
recomendações de Piña-Rodrigues e Valentini (1995) e de outros autores

Espécie Montagem do teste

Araucaria angustifolia Extração do embrião e imersão em solução a 1% por 4 a 5 horas


Bactis gasipae Extração do embrião e imersão em solução a 0,1% por 4 horas ou a 1%
por 5 horas
Dalbergia nigra Pré-condicionamento por 6 horas; corte longitudinal das sementes,
imersão em solução a 0,5% por 2 a 4 horas
Leucaena leucocephalla Pré-condicionamento por 6 horas; corte longitudinal das sementes,
imersão a 0,5% por 1 a 3 horas
Manilkara salzmani Pré-condicionamento por 5 horas; desponte ou corte das sementes,
imersão em solução a 0,5% por 5 horas
Parapiptadenia rigida Pré-condicionamento por 180 minutos, imersão das sementes inteiras em
solução a 0,5% por 3 horas
Pinus cariabaea Pré-condicionamento por 3 horas; corte longitudinal das sementes,
imersão em solução a 0,5% por 2 horas
Tabebuia spp. Pré-condicionamento por 1 hora; imersão das sementes inteiras em
solução a 0,5% por 3 horas
Virola surinamensis Pré-condicionamento por 5 horas, corte longitudinal das sementes,
imersão em solução a 0,5% por 5 horas
Pterodon pubescens Pré-condicionamento por 14 horas após as sementes serem seccionadas
na extremidade apical, excisão dos embriões e imersão em solução de
tetrazólio 0,075%, na temperatura de 30oC por 6 horas
GERMINAÇÃO 289

3x Corte com 9x
bisturi
9x 1/
3
2/
3
Asa Tegumento externo

Semente
Embrião

(1)
Gametófito feminino

Micrópila

(1) Estilete
18x 9x
(2) 9x
Corte no
Cotilédones tegumento

Ponto
Hipocótilo
de
punção

(3)
(2)
Radícula

 Figura 18.2
(3) Método de preparo das sementes de espécies do
gênero Pinus para realização do teste de tetrazólio.
 Figura 18.1 (1) Preparo das sementes com utilização de cortes.
(1) Estruturas da semente, (2) corte longitudinal da Corte longitudinal da semente com regiões indicadas
semente indicando as estruturas do embrião e (3) da para realização de corte com bisturi; (2) Preparo das
plântula de espécies do gênero Pinus analisadas du- sementes por punção – ponto indicado para a reali-
rante a realização do teste de tetrazólio. (Aumento zação da punção com estilete; (3) vista lateral do pon-
indicado na figura.) to de punção (aumento de nove vezes).

sementes (Figura 18.2). As classes 1 a 4 e a (Peske e Amaral, 1994). O teste pode ser realiza-
classe 7 são consideradas viáveis (Figura 18.3). do individualmente (por sementes) ou em con-
junto (teste massal).
Teste de pH do exsudado A substância indicadora mais empregada
Como o de tetrazólio, esse método bioquí- é composta por carbonato de cálcio e fenolfta-
mico baseia-se nas reações químicas que ocor- leína (Na2CO3 + C20H14O4) dissolvidos em água
rem no processo de deterioração e que podem destilada em proporções que podem variar de
determinar a redução da viabilidade das semen- 7,5 a 9,5 g por litro da solução indicadora. Essa
tes. Seu surgimento deriva da necessidade de solução é misturada na proporção de 1:1 com
obtenção rápida de padrões de qualidade das outra solução composta por 5 g de fenolftaleína
sementes para atender às exigências de merca- dissolvida em 500 ml de álcool etílico absoluto
do. Seu princípio decorre da reação bioquímica (C2H5OH), misturada a 500 ml de água destila-
entre as sementes com soluções indicadoras da e fervida. Antes da montagem do teste, as
que reagem com os íons H+ liberados das célu- sementes são cortadas longitudinalmente e em-
las, contribuindo para a acidificação do meio bebidas em água destilada. O volume utilizado
290 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

(1) (2) (3) (4) (5)

(6) (7) (8) (9) (10)

 Figura 18.3
Ilustração de diferentes níveis de viabilidade de sementes do gênero Pinus. Classes 1 a 4 – sementes viáveis
e vigorosas; Classes 5 e 6 – sementes não-viáveis, com danos no eixo embrionário; Classe 7 – sementes
viáveis porém não-vigorosas; Classes 8 a 10 – sementes que não germinam.

dependerá da quantidade de sementes. Durante lução de 8 g/l de Na2CO3 e 5 g/l de C20H14O4,


o período de imersão na substância indicadora, com pH 10,51.
as sementes são mantidas em temperaturas de
20 a 25oC. Testes de vigor
A avaliação do teste é efetuada de acordo A avaliação da qualidade das sementes por
com o tempo em que as sementes permanecem meio dos testes de germinação permite que elas
com a mesma coloração. Quanto maior a viabi- expressem sua máxima germinação sob condi-
lidade das sementes, maior será o tempo que o ções favoráveis. Entretanto, em situações natu-
exsudado permanecerá com a coloração rosa- rais, as sementes estão submetidas a uma série
forte (Santana et al., 1998). Por suas caracterís- de pressões, como variações na umidade do so-
ticas, esse teste também pode ser empregado lo, radiação e competição, condições desfavorá-
como teste de vigor, comparando a qualidade veis para que a semente expresse todo seu po-
entre lotes de sementes, como foi efetuado por tencial germinativo (Hilhorst et al., 2001). Os
Carvalho (2001). primeiros testes de vigor surgiram com o objeti-
Cabrera e Peske (2002) utilizaram 3 ml de vo de identificar os lotes com melhor comporta-
água destilada em testes de sementes indivi- mento no campo.
duais de milho e 50 ml em ensaios com 50 se- O vigor de sementes é definido pela AOSA
mentes. Os dados obtidos pelos autores per- (Association of Official Seed Analysis, 1983)
mitiram a correlação entre o teste de germina- como uma das propriedades das sementes que
ção e o de pH do exsudado após 20 minutos de determina seu potencial para uma emergência
imersão das sementes empregando-se uma so- rápida e uniforme com o desenvolvimento de
GERMINAÇÃO 291

plântulas normais em uma ampla faixa de con- para espécies agrícolas por Vieira e Carvalho
dições ambientais. (1994) e Kryzanowski, Vieira e França-Neto
Os métodos de avaliação do vigor podem (1999). Já para as espécies florestais, utilizam-
ser classificados em diretos, quando realizados se os propostos por Valentini e Piña-Rodrigues
no campo ou em condições de laboratório que (1995). Embora apresente variações entre espé-
simulem fatores adversos de campo, ou indire- cies, o princípio do teste é o de submeter as
tos, quando realizados em laboratório, mas sementes a altas temperaturas (de 40 a 45oC),
avaliando as características físicas, fisiológicas sob condições de umidade relativa de 90 a
e bioquímicas que expressam a qualidade das 100%, por períodos variáveis de 24 a 72 horas.
sementes. Findo o tempo preconizado, as sementes são
Nos últimos anos, os testes de vigor vêm submetidas aos testes-padrão de germinação
sofrendo aperfeiçoamentos resultantes de pes- conforme as RAS (Brasil, 1992) ou de acordo
quisas sobre os processos bioquímicos envolvi- com metodologias propostas para espécies flo-
dos na deterioração. Durante o envelhecimen- restais nativas por vários autores, como Piña-
to dos tecidos, várias alterações bioquímicas e Rodrigues e Vieira (1988), Silva, Piña-Rodri-
fisiológicas ocorrem, como a redução da pro- gues e Figliolia (1995).
dução de etileno (Nascimento, 2000), altera- O uso do EA para avaliar o vigor de semen-
ções na replicação celular e na síntese de DNA tes requer a utilização de uma estufa de enve-
e RNA (Cruz-Garcia et al., 1995) e formação de lhecimento (waterjacket incubator), comerciali-
radicais livres (Ferguson, Tekrony e Egli, 1990). zada em todo o Brasil. O método mais simples
Esses processos podem promover efeitos como é a colocação das sementes sobre telas em cai-
radículas anormais nas plântulas de Lycopersicon xas plásticas tipo gerbox adaptadas, contendo
esculentum (tomate), observadas por Van Pijlen ao fundo 40 ml de água destilada. Todo esse
e colaboradores (1995), perdas da viabilidade de conjunto pode ser mantido em estufa incubado-
sementes, como em Pinus elliottii Engelm. var. ra BOD pelo tempo recomendado (Kryzanow-
elliottii (Márquez-Millano, Elam e Blanche, 1991) ski, Vieira e França-Neto, 1999).
e danos aos cotilédones, como observados para A principal vantagem do teste é a sua facili-
Lactuca sativa (alface) (Smith, 1989). dade de controle e de padronização das condi-
ções ambientais na estufa de envelhecimento
Testes de resistência (McDonald, 1998). Como resultado, várias pes-
quisas têm sido realizadas para determinar as
Envelhecimento acelerado (EA) condições a serem adotadas para a utilização
O teste de envelhecimento é um método do EA como teste de vigor (Martins, 2001). É
indireto que simula condições de estresse nas um teste aplicável apenas para a comparação
sementes, gerando uma alta taxa de respiração entre lotes, mas que apresenta boa correlação
e consumo das reservas e acelerando os proces- com o desempenho no campo (Martins, 2001;
sos metabólicos que levam à sua deterioração. Vanzolini e Carvalho, 2002).
Baseando-se no conceito de Heydecker (1972),
de que sementes com alto vigor apresentam Teste de frio
maior tolerância e resistência às condições de O teste de frio foi desenvolvido para simular
estresse, o teste compara lotes identificando condições desfavoráveis em regiões tempera-
aqueles que apresentam melhor comportamen- das. Atualmente, seu uso tem por base o princí-
to germinativo após serem submetidos às con- pio de que sementes mais vigorosas resistem a
dições do envelhecimento acelerado. condições adversas (Marcos-Filho, Cicero e Sil-
Os métodos mais empregados para a reali- va, 1987; Vieira e Carvalho, 1994). Nos testes
zação do EA são os preconizados pela AOSA de frio, são utilizados como substrato o solo da
(1983). No Brasil, são utilizados os descritos área de plantio da cultura ou misturas de terra
292 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

e areia na proporção de 2:1 a 1:4 (Gomes et al., se teste considera que sementes mais vigorosas
2001; Menezes, Lersch-Cunha e Storck, 2002). apresentariam plântulas também mais vigo-
Em outra modalidade, utiliza-se o método de rosas. Muito utilizados, os testes de vigor por
rolo de papel. Em ambos os casos, as sementes meio da análise de plântulas foram propostos
são postas a 100C por sete dias; após esse perío- pela International Seed Testing Association
do, são submetidas ao teste de germinação con- (ISTA, 1993, 1999) e pela AOSA (1983) e, para
forme prescrições das RAS. Por sua facilidade, espécies brasileiras, por vários autores como
esse teste tem ampla aplicação com sementes Vieira e Carvalho (1994) e Kryzanowski, Vieira
de culturas agrícolas como soja (Martins et al., e França-Neto (1999).
2000) e milho (Rosa et al., 2000b). Em função de relacionar tamanho com vi-
gor, esse teste exige que sejam utilizadas se-
Testes de vigor com base na análise mentes de tamanhos uniformes para que essa
de germinação variável não interfira no resultado final. Embo-
Os testes mais simples para determinação ra existam controvérsias sobre o efeito do tama-
de vigor são os de velocidade de desenvolvimento, nho sobre a qualidade das sementes (Carnei-
cujos resultados podem ser obtidos pela análi- ro, Guedes e Anaral, 2001), sementes maiores
se-padrão de germinação. Os mais utilizados de espécies como Euterpe espiritosantensis apre-
são o tempo médio de germinação, o índice de sentam maior vigor, o que pode afetar a reali-
velocidade de germinação, a primeira contagem zação de testes com base no desenvolvimento
do teste de germinação e a análise de plântulas das plântulas (Martins et al., 2000).
(Capítulo 13). Todos esses testes são classifica- A instalação dos testes de análise de plân-
dos como indiretos por serem realizados em tulas pode ser efetuada pelo método de rolo de
condições de laboratório. papel ou sobre papel-filtro (ver teste de germi-
O princípio desses testes baseia-se no pres- nação). Na montagem pelo método rolo de pa-
suposto de que sementes mais vigorosas germi- pel, recomenda-se que seja efetuada em papel
narão mais rapidamente do que outras em con- do tipo filtro (Vieira e Carvalho, 1994). As se-
dições inferiores (Vieira e Carvalho, 1994). Com mentes são depositadas sobre duas folhas de
isso, mesmo sementes com igual germinabi- papel, distribuídas ao longo de uma linha tra-
lidade poderiam apresentar velocidades distin- çada no terço superior do substrato, utilizando-
tas de germinação em função do seu vigor. A se de 10 a 20 sementes por repetição. Caso seja
padronização e a uniformidade do lote a ser necessário, podem ser traçadas duas linhas,
avaliado são necessárias para que fatores como mantendo-se um espaçamento regular entre
tamanho das sementes, sanidade e condições elas. A seguir, assim como no teste de germina-
de germinação (água, luz e substrato) não se- ção, as sementes são cobertas com uma tercei-
jam fontes de variação dentro do teste, além ra folha de papel-toalha, enroladas, protegidas
das inerentes ao próprio vigor (Valentini e Piña- por um saco plástico e depositadas no
Rodrigues, 1995). germinador.
Os testes devem ser instalados seguindo as Outra alternativa é a instalação do teste em
condições preconizadas pelas Regras para Aná- papel-filtro utilizando a metodologia sobre-pa-
lise de Sementes (Brasil, 1992) ou, como no pel. O gerbox ou o recipiente são dispostos no
caso das espécies florestais, por recomendações germinador mantendo um ângulo de 45o com
já publicadas e em uso corrente (Oliveira, Piña- a bandeja (Vieira e Carvalho, 1994). Findo o
Rodrigues e Figliolia, 1989; Silva, Piña-Rodri- tempo preconizado pelas contagens, as plân-
gues e Figliolia, 1995). tulas normais obtidas são medidas, simultane-
Os testes de vigor que utilizam a análise de amente, em suas diversas estruturas (radícula,
plântulas fornecem dados adicionais que enri- hipocótilo, epicótilo, cotilédones). Além de da-
quecem o teste de germinação, permitindo dis- dos biométricos das plântulas, pode-se obter o
tinguir graus variados de vigor. O princípio des- peso seco. As plântulas, sem suas reservas co-
GERMINAÇÃO 293

tiledonares, são secas em estufa a 80oC por 24 sua forma de uso, recomenda-se a leitura de
horas e depois pesadas em balança de precisão AOSA (1983) e de Vieira e Carvalho (1994).
de três a quatro casas decimais (Vieira e Carva- Para espécies florestais, esse teste apresenta
lho, 1994; Kryzanowski, Vieira e França-Neto, problemas devido à necessidade de padronizar
1999). Caso se deseje efetuar análises quími- o volume de água no qual as sementes serão
cas posteriores, as plântulas devem ser secas a imersas, uma vez que muitas têm tamanho
60oC por 24 a 36 horas, conforme a espécie. Os grande, em que apenas 75 ml não são suficien-
resultados podem ser expressos em peso seco tes para manter as sementes sob imersão. Ava-
médio em mg. liações efetuadas com sementes de Dalbergia ni-
gra (jacarandá-da-bahia) indicaram que o volu-
Testes rápidos de vigor me de água (100 e 125 ml) utilizado apresenta
O teste de condutividade elétrica (CE) analisa diferença significativa na realização do teste CE
a quantidade de exsudados que são lixiviados e que, isoladamente, o número de sementes não
das sementes e tem sido bastante empregado afetou o resultado obtido, mas o período de
na avaliação do vigor de lotes de soja (Vanzolini imersão dependeu do volume de água utilizado
e Carvalho, 2002). O teste CE pode ser instala- e do número de sementes (Marques, Paula e
do em dois sistemas: o de condutividade em Rodrigues, 2002a,b,c).
massa, que analisa um conjunto de sementes
de uma só vez, ou a análise individual, cujo pro-
QUALIDADE FÍSICA
cedimento é idêntico ao anterior, porém as se-
mentes são analisadas individualmente em ban- Determinação de umidade
dejas com células individuais (Vieira e Carvalho, O teste de umidade visa determinar o con-
1994). A técnica mais empregada atualmente teúdo de água presente nas sementes com o
no Brasil tem sido a condutividade em massa. objetivo de estabelecer parâmetros adequados
De modo geral, a técnica consiste em imer- para a manutenção da qualidade fisiológica das
gir as amostras de sementes previamente pesa- sementes para fins de armazenamento e, princi-
das (100 sementes divididas em várias repeti- palmente, para a comercialização (Silva, 1988).
ções) em um recipiente de plástico ou vidro com Os testes são realizados de acordo com as
75 ml de água deionizada (≅ 2 μmhoms/cm de recomendações ou prescrições das RAS, as quais
condutividade), mantida em germinador a 25oC nem sempre são adequadas a determinadas es-
por 24 horas. Findo esse prazo, a solução de pécies, dadas as grandes variações morfológicas
embebição é ligeiramente agitada, e efetuada e fisiológicas das sementes e/ou unidades de
a leitura da condutividade elétrica empregan- dispersão existentes entre as espécies florestais.
do-se um condutivímetro (Digimed cd-21, ASA
610 ou modelos similares). A cada leitura, o
Métodos de estufa
aparelho deve ser calibrado em uma solução
Podem ser empregadas as temperaturas de
de KCl4 . O resultado obtido deve ser dividido
105oC por 24 horas (mais utilizada no Brasil),
pelo peso em gramas das sementes, obtendo-
103oC por 17 horas ou 130oC por 4 horas. Como
se o resultado em μmhoms/cm/g. Para maiores
variação pode-se utilizar o método de estufa a
detalhes sobre o teste e sobre as variações na
70oC até peso constante.
Esse método é utilizado pelos laboratórios
em caráter experimental e realizado comparati-
vamente ao método de estufa a 105oC por 24
4 Vieira e Carvalho (1994) recomendam que a calibragem seja efe- horas. Tem sido testado para as sementes de
tuada utilizando-se 0,745 g de KCl puro e seco a 150oC por 1 hora e tamanho grande e para as contidas dentro de
resfriado em dessecador, dissolvido em 1 L de água deionizada. Na
calibragem, o aparelho deverá marcar 1273 μmhoms/cm) a 20oC frutos indeiscentes.
ou 1408 μmhoms/cm a 25oC.
294 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Figliolia e Silva (1999), ao compararem os por Figliolia, Oliveira e Piña-Rodrigues (1993).


diferentes métodos, constataram não haver di- As amostras médias devem ser enviadas ao la-
ferenças significativas para Myracrodruon urun- boratório em embalagens de natureza imper-
deuva e Copaifera langsdorffii, embora tenham meável e hermeticamente fechadas, de modo
apresentado diferenças acima do permitido que o conteúdo de água das sementes perma-
pelas RAS. Por outro lado, Acacia polyphylla, My- neça inalterado até a realização do teste.
roxylon peruiferum e Tabebuia roseo-alba demos- O peso da amostra de trabalho deve ser ob-
traram diferenças bem-acentuadas entre os tido pela redução da amostra média, por inter-
métodos, sendo recomendada a aferição das médio de divisores de amostra. As RAS prescre-
técnicas. vem o peso mínimo das amostras médias e para
Nessas metodologias, as amostras médias análise de sementes das espécies de clima tem-
devem ser enviadas ao laboratório em embala- perado e Eucalyptus spp. Sobretudo no caso des-
gens de natureza impermeável e hermetica- ta última espécie, o tamanho recomendado pra-
mente fechadas, de modo que o conteúdo de ticamente inviabiliza o teste, pois demanda um
água das sementes permaneça inalterado até a período muito longo para a execução da aná-
realização do teste. As RAS prescrevem o peso lise. Na prática, tem sido empregada amostra
mínimo das amostras médias nos métodos de de trabalho de 1 g, conforme proposto por Már-
estufa de 100 g para as espécies que devem ser quez e Kageyama (1980). No entanto, para as
moídas e de 50 g para as demais espécies que espécies brasileiras, com exceção de Cedrela spp.,
não necessitam de moagem. Essas quantida- não há recomendação. Oliveira, Piña-Rodrigues
des nem sempre são possíveis para grande nú- e Figliolia (1989) sugeriram tamanhos de
mero de espécies arbóreas com sementes gran- amostras médias compatíveis para a realização
des, como é o caso de Dypterix alata, que possui, dos testes como proposta para padronização das
em média, 60 sementes por quilograma. análises de sementes nativas.
Figliolia e Piña-Rodrigues (1995b) sugeriram Figliolia, Oliveira e Piña-Rodrigues (1993)
tamanhos de amostras médias compatíveis apresentam os equipamentos empregados na
para a realização dos testes. análise de pureza de sementes de tamanho pe-
queno e médio. Para as sementes de tamanho
Teste de pureza grande como Araucaria angustifolia, Dipterix alata,
Para as espécies florestais, o aspecto mais Centrolobium robustum, Centrolobium tomentosum
importante do teste de pureza é a proporção e Terminalia catappa, todo o processo é feito ma-
entre sementes puras e impurezas (Figliolia, nualmente.
Oliveira e Piña-Rodrigues, 1993). Os testes são As RAS descrevem de maneira bem clara
realizados de acordo com as recomendações ou as definições de sementes puras, outras semen-
prescrições das RAS, porém, na maioria das ve- tes e material inerte. É importante enfatizar que
zes, com adequação dada às variações morfo- as expansões aladas de sementes de espécies
lógicas e fisiológicas das sementes e /ou unida- florestais que se encontrem partidas e destaca-
des de dispersão existentes entre as espécies das, expansões que são facilmente removidas
florestais. Casos mais difíceis de padronização como as de Pinus elliottii, P. caribaea hondurensis,
são os frutos tipo legume indeiscente que são P. taeda, P. palustris e P. oocarpa, devem ser
comercializados na forma de fruto. consideradas material inerte.
Para se obter um resultado confiável, é ne- Todos os procedimentos sobre o cálculo de
cessário que o lote e a amostra a serem analisa- sementes puras e a informação dos resultados
dos sejam devidamente homogeneizados, pois constam nas RAS. O resultado é expresso nor-
os componentes tendem a se depositar na parte malmente em porcentagem. Para as espécies
inferior do recipiente. Isso pode ser feito ma- com sementes muito pequenas, como Eucalyp-
nualmente, no caso de sementes grandes, ou tus, Tibouchina mutabilis e Tibouchina granulosa,
por equipamentos, conforme já mencionado o resultado é expresso em número de plântulas
GERMINAÇÃO 295

por peso da amostra. Para Eucalyptus citriodora, gia útil: Revista Brasileira de Sementes, v.24, n.1, pp.183-
cujas sementes apresentam cerca de 2 a 3 mm 196, 2002.
de comprimento, o resultado normalmente é BRADFORD, K.J.; COHN, M.A. Seed biology and
expresso em porcentagem. technology: at the crossroads and beyond. Introduction
to the Symposium on Seed Biology and Technology:
apllications and advances and a prospectus for the
future. Seed Science Research, v.8, pp.153-160, 1998.
QUALIDADE SANITÁRIA
A possibilidade de disseminação de doenças e BRASIL. Ministério da Agricultura e Reforma Agrária.
Regras para análise de sementes. Brasília:SNDA/DNDV/
pragas via semente é uma ameaça notória e CLAV, 1992. 365 p.
constantemente abordada pelos especialistas
CABRERA, A.C.; PESKE, S.T. Testes do ph exsudado
(Lucca-Filho, Porto e Maia, 1999; Aguiar, Piña-
para sementes de milho. Revista Brasileira de Sementes,
Rodrigues e Figliolia, 2001). v.24, n.1, pp.134-140, 2002.
O método mais adotado para avaliar a qua-
CARNEIRO, J.W.P.; GUEDES, T.A.; AMARAL, D. Des-
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GLOSSÁRIO

ABA – ver ácido abscísico. mais externa do endosperma, também chama-


da de “camada de aleurona”.
ABI – classe de genes (ABI1, ABI2...) envolvidos
na regulação da rota de sinalização do ABA. Amitose – termo que desígna a divisão direta,
sendo o processo mais elementar de divisão,
Ácido abscísico – hormônio vegetal de ocor- nele não se forma o fuso nem se observam as
rência geral dentro das plantas vasculares e em demais fases que ocorrem na meiose e na mi-
alguns fungos, composto de 15 carbonos-ses- tose. Consiste de uma constrição do núcleo se-
quiterpeno com um anel benzeno e uma cadeia guida ou não por uma constrição do citoplasma.
lateral. Esse termo também é usado para designar uma
divisão nuclear direta.
Ácido fosfatídico – precursor da síntese de gli-
cerolipídeos, como fosfatidilinositol (PI) e dia- Amostra composta – é uma combinação de
cilglicerol (DAG) – que, por sua vez, é precursor amostras simples retiradas de um lote.
da fosfatidilcolina (PC).
Amostra de arquivo – é a amostra de sementes
Adenilato ciclase – enzima que catalisa a pro- que sobra da amostra média, depois de retirada
dução de cAMP. a amostra de trabalho, armazenadas em reci-
pientes e condições apropriadas.
Aditividade – é a característica de um modelo
matemático de somar os efeitos principais, além Amostra de sementes – quantidade limitada
da constante (μ) e do erro ou resíduo. de sementes retirada de um lote capaz de re-
presentar, com segurança, os atributos de quali-
Albúmem – termo utilizado como sinônimo de dade do lote.
endosperma e xenófito. O termo albúmem, que
em latim significa clara do ovo, foi criado para Amostra de trabalho – é a amostra obtida no
designar os tecidos nutricionais da semente de- laboratório, por homogeneização e redução da
vido à sua semelhança com a clara do ovo. amostra média, até as massas mínimas reque-
ridas pelas Regras para Análise de Sementes
Alelopatia – interferência provocada por um (RAS).
indivíduo, pela produção de substâncias quími-
cas lançadas no meio, sobre outro. Amostra média – é uma amostra resultante
da homogeneização e redução de uma amostra
Aleloquímicos ou substâncias alelopáticas – composta, podendo ser a própria quando a sua
substâncias químicas produzidas por uma plan- massa estiver de acordo com o exigido para a
ta e lançadas no meio, que são capazes de inter- espécie. Essa amostra é enviada aos laboratórios
ferir sobre os organismos próximos. de análises de sementes para emissão do laudo
do lote e deve ter massa mínima compatível
Aleurona – do grego aleuron, farinha, é um ma- com as recomendações das Regras para Análise
terial protéico, geralmente na forma de peque- de Sementes.
nos grânulos, que ocorre na camada celular
300 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Amostra simples – é uma pequena porção de Anfipática – uma molécula que tem regiões hi-
sementes retirada, por meio de um amostrador drofóbicas e hidrofílicas.
ou com a mão, de diferentes recipientes ou pon-
tos de amostragem do lote. Angiospermas – do grego Angio, vaso, contai-
ner, plantas que apresentam as sementes (sper-
Amostra – é uma parte representativa da po- ma) encerradas em um recipiente, o ovário, que
pulação. dará origem ao pericarpo (fruto), e que produ-
zem flores.
AMP, ADP, ATP – nucleotídeos constituídos
de uma adenina, uma ribose e um (AMP), dois Antera – são as estruturas que contêm os an-
(ADP) ou três (ATP) grupos fosfato. O ATP, cor- drosporângios. Parte do estame que representa
responde à maior fonte de energia disponível o conjunto dos androsporângios.
no metabolismo, liberando essa energia com a
hidrólise dos grupos fosfato, transformando- Antófitos – plantas que produzem flores.
se em ADP e AMP.
Antropocoria – dispersão feita pelo ser humano.
Anabolismo – palavra de origem grega (ana,
mais + bolismo, metabolismo) que representa Apoplasto – do grego apo, separado + plastos,
a parte de síntese do metabolismo. Ou seja, é o moldado, corresponde aos espaços intercelula-
total de reações químicas envolvidas na bios- res de um tecido vegetal ou a continuidade da
síntese. parede celular.

Anaerobiose – condição de um processo fisio- Aquênio – fruto seco, indeiscente, monospér-


lógico que ocorre sob a ausência de oxigênio. mico com o pericarpo não soldado à semente.

Andrófito – planta sexuada masculina formada Arilo – expansão originada perto do funículo.
pela metamorfose do andrósporo. Sua ontoge- Revestimento acessório da semente, geralmen-
nia começa dentro do androsporângio e pode te formado por uma proliferação de células na
se completar fora dele. Quando atinge a maturi- base do óvulo.
dade, é liberada para o ambiente, pela deiscên-
cia do androsporângio; nesse ponto, a planta Arilóide – qualquer excrescência das sementes,
está protegida pela esporoderme formada por incluindo a carúncula, independentemente da
esporopolenina e é chamada de grão de pólen. sua origem.
Sinônimo de microgametófito, gametófito mas-
culino, pólen no estágio tricelular. Armazenamento de sementes – operação uni-
tária destinada à preservação da qualidade da
Androsporângio – esporângio que produz an- semente, que se estende da maturidade fisioló-
drósporo. Sinônimo de microsporângio, saco gica à semeadura.
polínico.
Asas – são estruturas muito finas e leves, em
Andrósporo – esporo masculino formado geral formadas pela expansão das células de
dentro do androsporângio que, ao germinar, exotesta, podendo se localizar apenas de um
origina o andrófito. Sinônimo de micrósporo, lado da semente (Tipuana tipu) ou em toda sua
pólen no estágio unicelular, esporo do qual se volta (Tabebuia sp.), ocorrem nas sementes ane-
originará o andrófito. mocóricas.

Anemocoria – dispersão de diásporos mediada Autofagia – do grego autos, próprio + phagein,


por correntes de ar. comer, corresponde a um processo de endoci-
tose, ou seja, as células ou organelas englobam
os materiais externos através de invaginações
GERMINAÇÃO 301

de membranas, em cujo interior ocorre a diges- ao funículo, onde terminam os feixes vasculares
tão. Se o material for sólido, é dito fagocitose, se da planta e de onde partem ramificações vas-
for líquido, é denominado pinocitose. culares para os tegumentos.

Autólise – do grego autos, próprio + lyses, que- Capas – são estruturas que possuem vários
bra, perda, corresponde a um processo de au- estratos, isto é, são formadas por várias cama-
todegradação que normalmente ocorre nos te- das de células empilhadas.
cidos em senescência.
Capítulo – inflorescência formada por flores
Autoploidia – quando o poliplóide contém mais sésseis sobre um receptáculo curto, mais ou me-
de dois conjuntos de cromossomos homólogos nos dilatado e, muitas vezes, ligeiramente con-
em suas células somáticas. vexo.

Balística – tipo de dispersão feita através de Cápsula de endosperma – região do tecido de


mecanismos especiais ligados à abertura de val- endosperma que reveste a radícula do embrião,
vas do diásporo, que se rompem repentinamen- localizada na região da micrópila.
te e têm suas sementes expelidas para longe
da planta-mãe. Carboidrato – do latim carbo, borralho + hydro,
água, é um composto orgânico constituído de
Banco de sementes – corresponde ao conjunto uma cadeia de átomos de carbono nos quais o
de sementes viáveis na serrapilheira ou incor- hidrogênio e o oxigênio estão ligados na propor-
poradas ao solo, apresentando potencial para ção 2:1, respectivamente. Como exemplos, desta-
recrutamento de novos indivíduos. cam-se os açúcares solúveis, o amido e a celulose.

Barocoria – caracteriza-se pela separação do Carcérulos – tipo de fruto típico das famílias
fruto da árvore-mãe devido à ação da gravidade. Labiatae, Boraginaceae e Cruciferae.

Basicaulicarpia – desenvolvimento de frutos Cariocinese – separação dos cromossomos du-


na base do caule, freqüentemente próximo ao rante a divisão celular.
chão.
Cariogamia – fusão de núcleos que têm pola-
Beneficiamento de sementes – seqüência de ridades diferentes. Em geral, ocorre logo após
operações unitárias destinada ao aprimoramen- uma plasmogamia.
to dos atributos do lote de sementes.
Cariopse – fruto seco, indeiscente, monospér-
Beta-1,3-glucanase – enzima da classe das hi- mico, semelhante à noz e ao aquênio, mas com
drolases que participa da hidrólise de glucanos o pericarpo soldado ao tegumento das semen-
(hemiceluloses) da parede celular. tes. Ocorre em algumas gramíneas, como o mi-
lho.
Bloco – representa a repetição de um delinea-
mento em blocos casualizados; é a fração homo- Casualização – é a distribuição casual e aleató-
gênea do delineamento e nele estão distribuídos ria das unidades experimentais no local de
todos os tratamentos. condução do experimento, geralmente realiza-
da por meio de algum tipo de sorteio.
BRI – gene que codifica suposto receptor de
membrana dos brassinoesteróides. Caviomorfos – animais que habitam tocas no
chão.
Calaza (ou chalaza) – região situada na base
do rudimento seminal, onde o óvulo se prende Chalaza – ver calaza.
302 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Chuva de sementes – evento que compreen- Condicionamento osmótico – termo referente


de a dispersão de diásporos e a área abrangida à embebição de sementes em soluções osmóti-
por estes até o estabelecimento da plântula. cas.

Ciclo celular – seqüência dos processos que Contraste – é uma comparação entre grupos
acontecem durante a divisão celular. de médias de tratamentos, ou seja,
t
Cipsela – é um aquênio proveniente de um
^
y= å ciyi.
i=1
ovário ínfero como o das Compositae (Astera-
ceae) e Dipsacaceae. Segundo alguns autores, onde: ci: coeficiente do contraste; yi. : média do
é um fruto seco, indeiscente, monospérmico, tratamento.
formado a partir de um ovário ínfero, de forma
que o pericarpo fica envolvido por tecidos flo- Contraste ortogonal – é o contraste cuja soma
rais, sendo característico de Asteraceae. dos coeficientes é zero, ou seja, Σ ci = 0.

Cisteína-proteinase – classe de proteinases que Controle local – é a divisão de um ambiente


apresentam o resíduo cisteína no sítio catalítico. heterogêneo em subambientes homogêneos,
com a finalidade de tornar o delineamento
Citocinese – sinônimo de clivagem, significa experimental mais eficiente em decorrência da
partir, separar, e refere-se à divisão celular. redução do erro experimental.

Citoesqueleto – uma rede de filamentos de Coorte – indivíduos de uma população origi-


proteínas (tubulinas) que se estende através do nados de um mesmo evento reprodutivo.
citoplasma das células eucarióticas, fornecendo
estrutura e sustentação à célula, sendo também Cordicepina – inibidor químico da síntese de
responsáveis pelos movimentos celulares. RNA.

Competição – exploração do meio abiótico Cotilédones – do grego kotyledon, em forma de


pelos mesmos recursos, num mesmo local. xícara e oco, correspondem às folhas do em-
Quando é entre indíduos da mesma espécie, brião. Entre suas funções encontra-se o acúmu-
denomina-se intra-específica, quando de espé- lo de reservas (típico nas dicotiledôneas) e a
cies diferentes, interespecífica. absorção de reservas da semente (monocotile-
dôneas – no caso denominado de escutelo),
Complexo de Golgi – conjunto de dictiosso- para nutrição do embrião.
mos ou corpúsculos de uma célula interligados
por uma série complexa de túbulos, e que estão Co-transporte – transporte através de membra-
envolvidos nos processos de secreção celular e, nas no qual a transferência de um soluto
principalmente, na síntese de componentes da depende da transferência simultânea ou se-
perde celular. quencial de um segundo soluto.

Compostos fenólicos – classe de substâncias Cremocarpo – frutos das Umbeliferae, prove-


com um grupo hidroxila fixado diretamente em nientes de um ovário ínfero, ou os samarídios,
um anel benzeno. provenientes de um ovário súpero.

Compostos secundários – substâncias deri- CTR1 – Constitutive triple response – gene que co-
vadas a partir do metabolismo secundário, difica uma quinase envolvida na rota de trans-
como terpenos, alcalóides e compostos fenóli- dução de sinal do etileno.
cos, cujos precursores são provenientes do me-
tabolismo fundamental (ou primário), como CTS – gene envolvido na rota de transdução
açúcares, lipídeos, proteínas e ácidos nucléicos. de sinal das GAs.
GERMINAÇÃO 303

Cumarinas – conjunto de compostos de nature- Desvio padrão – é a raiz quadrada da variância,


za fenólica e derivados da fenilalanina, freqüen- expressa na mesma unidade dos dados e deter-
temente inibidoras da germinação. minada por
n
Curvatura gravitrópica = geotrópica – mu-
dança de direção de crescimento por força da
å (xi – x) 2

i=1
s=
ação gravitacional. Pode ser positiva, como nas n –1
raízes; ou negativa, parte aérea. onde n: tamanho da amostra; xi: i-ésimo valor
da amostra e x : média da amostra.
Cutina – polímero constituído de diversos áci-
dos graxos de cadeia longa unidos por ligações Diásporo – unidade de dispersão de uma plan-
ésteres, criando uma estrutura de proteção cha- ta, pode ser a semente, o fruto contendo a(s)
mada cutícula. semente(s), etc.

Delineamento em quadrado latino – é o dese- Dicotiledônea – é uma das duas grandes clas-
nho do experimento para condições experimen- ses das angiospermas, Dicotyledoneae, que se ca-
tais heterogêneas, sendo esta heterogeneidade racterizam por ter normalmente dois cotilédo-
direcionada de duas maneiras: linha e coluna. nes, folhas com venação reticulada e partes flo-
rais em múltiplos de quatro ou cinco.
Delineamento experimental – é o planejamen-
to de um experimento, incluindo a definição Dispersão – retirada ou liberação do diásporo
do número de tratamentos, número de repeti- a partir da planta-mãe, até determinado desti-
ções, número de sementes ou plantas por repe- no.
tição e a forma como as parcelas do experimen-
to serão distribuídas na área experimental. Esse Dispersão secundária – re-alocação das se-
delineamento inclui também a decisão do pes- mentes que eventualmente sucede a dispersão
quisador quanto ao controle do erro experimen- primária, até o destino final do diásporo.
tal. Dentre os tipos existentes estão o delinea-
mento inteiramente casualizado, o delineamen- Distribuição binomial – se forem realizadas n
to em blocos casualizados, o delineamento em tentativas independentes, com apenas dois
quadrado latino, e outros. resultados possíveis, e a probabilidade de suces-
so for constante, diz-se que a variável aleatória
Desdobrar a interação – significa fixar os ní- tem distribuição binomial.
veis de um ou mais fatores e estudar outro fator
por meio de testes para comparações múltiplas, Distribuição normal – é uma das mais impor-
contrastes, regressão ou outro. tantes distribuições com aplicação em pesqui-
sas científicas e tecnológicas. Apresenta como
Dessecação – ato de remover água das semen- característica a simetria, a forma campanular,
tes, secagem, desidratação, geralmente por coincidência entre os valores médio, mediano
meios artificiais. e modal, com dois pontos de inflexão, além de
ser assintótica em relação aos eixos das abscis-
Dessecação por maturação – processo natural sas.
de perda de água, conforme acontece na fase
final de desenvolvimento e maturação de se- DNA-complementar (cDNA) – fragmento de
mentes ortodoxas. DNA que é complementar a uma molécula de
mRNA, sintetizada in vitro pela transcritase
Dessorção de água – diminuição da quantida- reversa.
de de água na semente determinada por gra-
diente positivo de potencial hídrico entre a su- Dormência – é o período ou condição em que
perfície da semente e o ar circundante. uma semente viável fica sem germinar mesmo
304 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

estando sob condições ambientais propícias à Ensaio fatorial – experimento em que mais de
germinação. um fator é analisado simultaneamente.

Efeito de borda – alterações resultantes das Entalpia de ativação – quantidade de energia


interações entre dois ecossistemas adjacentes necessária para que dada reação ou passo me-
separados por uma transição abrupta (borda); tabólico ocorra no sistema.
podem ser relacionados efeitos abióticos (p. ex.,
alterações de penetração luminosa, umidade do Entropia informacional – fornece indicações
ar e solo), biológicos diretos (p. ex., alterações do grau de desordem de um sistema, onde me-
da composição e densidade de organismos) e nores valores indicam um sistema mais organi-
biológicos indiretos (p. ex., alterações nas rela- zado.
ções tróficas, taxas de herbivoria e predação).
Envigoradas – termo utilizado para sementes
EIN – Ethylene insensitive, classe de genes (EIN1, que foram submetidas a pré-tratamentos ou
EIN2, EIN3...) envolvidos na rota de transdução pré-condicionamentos de priming.
de sinal do etileno; codificam fatores de trans-
crição, entre outras proteínas. Epicótilo – porção da plântula localizada aci-
ma da região de inserção dos cotilédones.
Elaiossomo – excrescência do tegumento
externo que envolve a semente e se abre elasti- Epizoocoria – dispersão feita através da adesão
camente, libertando, de forma violenta, as se- de diásporos portadores de estruturas especiais,
mentes. Ocorrem no gênero Oxalis. como ganchos e pêlos, ao corpo dos animais.

Embebição – processo inicial de absorção de Erro ou resíduo experimental – é a variabili-


água que antecede a germinação. dade devida a condições não-controladas do ex-
perimento.
Endocarpo – parte do fruto que corresponde à
camada interna do pericarpo. Escutelo – do latim scutella, escudo pequeno, é
o cotilédone vestigial do embrião das gramí-
Endoploidia – aumento no conteúdo de DNA neas, sendo um tecido especializado na absor-
de um núcleo; pode ser causado por poliploidia, ção dos produtos da degradação das reservas
amitose ou politenia. presentes no endosperma.

Endosperma lateral – toda a porção do tecido Espécie exótica – em sentido amplo, plantas
de endosperma, excluindo a região da cápsula introduzidas de outros países; em sentido restri-
de endosperma. to, plantas introduzidas em regiões não abran-
gidas por sua distribuição natural.
Endosperma – do grego endon, dentro +
sperma, sementes, é o tecido triplóide que acu- Espécie nativa – no sentido amplo, plantas que
mula reservas e se desenvolve a partir da união ocorrem naturalmente no Brasil; em sentido
entre o núcleo de um gameta masculino e os restrito, plantas que ocorrem naturalmente no
dois núcleos polares da célula central do óvulo. local, ou em determinada região fitogeográfica.
É um tecido exclusivo das angiospermas.Ver
xenófito. Espermatófitas – plantas que produzem se-
mentes. Sinônimo de antófitas e embriófitas
Endozoocoria – dispersão feita por animais sifonógamas.
após ingestão do diásporo.
Espigueta – inflorescência típica das Grami-
Energia livre – refere-se à energia química de neas, constituída por um eixo muito curto, em
substâncias diversas. cuja base se encontram duas brácteas (excep-
GERMINAÇÃO 305

cionalmente 3 ou 6) chamadas glumas (ou Estrofíolo – pequena protuberância encontra-


paleas), que escondem a flor, composta, em da em algumas sementes, junto ao hilo, que se
geral, por três estames e o gineceu. As espi- forma a partir do funículo ou da rafe.
guetas se agrupam de diferentes modos para
formar as espigas, os racemos e as panículas. Etileno – fitormônio gasoso, classificado como
olefina.
Esporófito – na alternância de geração, são as
plantas que formam os esporos assexuados. É ETR – Ethylene triple response – classe de genes
o termo oposto a gametófito. (ETR1, ETR2...) que codificam receptores de
membrana do etileno.
Esquizocarpos – são frutos indeiscentes origi-
nados por um gineceu bi ou pluricarpelar, não Evento pós-germinativo – que acontece após
soldados que, ao amadurecer, se decompõem a germinação ou protrusão radicular.
em monocarpos. Este tipo de frutos engloba os
cremocarpos, biaquênios, poliaquênios (pteró- Expressão do gene – Quando o gene é trans-
dio), regma, sâmaras. crito em RNA mensageiro (mRNA).

Estádio – do grego stadio e do latim stadium, Extração – retirada de uma determinada subs-
denominava os campos destinados aos jogos tância de uma mistura.
esportivos; significava também fase, período,
época, estação. Etapas definidas que constitu- Fase G1 – primeira fase de crescimento (Gap
em um processo progressivo como o desenvolvi- phase 1) do ciclo celular.
mento vegetal.
Fase G2 – segunda fase de crescimento (Gap
Estado cristalino líquido – estado hidratado phase 2) do ciclo celular.
das membranas celulares.
Fase I de embebição – fase inicial de absorção
Estado de gel – estado seco das membranas de água antes da germinação.
celulares, estado vítreo.
Fase II de embebição – fase da embebição de
Estágio – do francês estage, significa estudo, sementes na qual são ativados os processos me-
aprendizado, situação transitória; cada uma das tabólicos em preparação para a protrusão radi-
etapas sucessivas em que se desenvolve um tra- cular ou germinação.
balho, ou durante o desenvolvimento de uma
estrutura ou mesmo um organismo. Fase III de embebição – fase posterior à
protrusão radicular ou germinação.
Estame – são os órgãos das angiospermas que
carregam os sacos polínicos, sendo possível Fase mitótica – fase do ciclo celular em que
distinguir duas estruturas diferentes: o filete e são originadas duas células-filha idênticas e
a antera. com mesmo conteúdo cromossômico da célula
original.
Estrato – são camadas que possuem a espessura
de apenas uma célula. Fase S – fase do ciclo celular responsável pela
síntese e duplicação do conteúdo de DNA.
Estresse – condição metabólica ou fisiológica
gerada devido a uma condição adversa qual- Fenotípica – soma total das propriedades es-
quer. truturais e funcionais de um organismo; produ-
to da integração entre o genótipo e o meio am-
Estresse hídrico – diz-se da perturbação num biente.
sistema provocada pela falta de água.
306 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Final redutor – todos os monossacarídeos apre- Gametângio – estruturas no interior das quais
sentam um grupo de aldeído ou de acetona no se diferenciam os gametas.
carbono 1, os quais são grupamentos com um
alto poder redutor. Sendo assim, quando o car- Gametas – células diferenciadas haplóides que
bono 1 de um monossacarídeo está livre em um se fundem para formar um novo indivíduo.
polissacarídeo, considera-se esse carbono como
o final redutor da cadeia glicosídica. Gametófito – planta sexuada produtora de ga-
metas.
Fitocromo – cromoproteína fotorreversível de
ocorrência intracelular, envolvida na interme- GAs – ver giberelinas.
diação dos efeitos da luz em processos fisioló-
gicos como floração e germinação. GCR1 – gene envolvido na rota de sinalização
das GAs.
Fosfolipídeos – componentes da membrana
celular constituídos de duas cadeias de hidro- Gene – um segmento de DNA que codifica uma
carbonos (usualmente ácidos graxos) ligados cadeia polipeptídica ou uma molécula de RNA.
por um grupo polar contendo fosfato.
Genótipo – totalidade dos fatores que formam
Fosforilases – enzimas com capacidade de des- a constituição genética de um indivíduo.
fosforilar outras proteínas, comumente envolvi-
das na condução intracelular de sinais. Gerbox – caixa plástica utilizada para experi-
mentos de germinação de sementes e/ou cres-
Fotoblastismo – atributo do diásporo que ca- cimento inicial de plântulas.
racteriza efeitos da luz na germinação. Foto-
blastismo positivo significa que a germinação Germinabilidade – número final de diásporos
é promovida pela luz, fotoblastismo negativo germinados sob determinadas condições expe-
caracteriza diásporos cuja germinação é inibida rimentais, expressa em porcentagem.
pela luz. Afotoblásticos são diásporos que ger-
minam independentemente da presença de luz. Germinação – conjunto de processos fisiológi-
cos no embrião que se inicia na embebição e
Fotoperíodo – do grego photos, luz, corresponde culmina na protrusão da radícula dos envoltó-
ao período de luz a que um determinado orga- rios da semente.
nismo é submetido.
Giberelinas – classe de fitormônios diterpenos,
Frugívoros – animais que se alimentam de fru- são conhecidos mais de 110 tipos, nem todos
tos. ativos. Atuam em geral como promotoras do
desenvolvimento.
Frutos bacóides – fruto simples carnoso, for-
mado pela parede carnosa do ovário com um Gineceu – representa a porção feminina das
ou mais carpelos, contendo diversas sementes. flores, podendo ser constituído por um ou mais
carpelos. Numa flor completa (hermafrodita),
Frutos drupóides – fruto simples carnoso, constitui o quinto verticilo.
derivado de um único carpelo, geralmente com
apenas uma semente. Ginófito – na planta sexuada, representa a ge-
ração sexuada feminina, cujas estruturas re-
Fv/Fve – as duas formas principais do fitocro- produtivas são o gameta feminino (oosfera) e
mo, capazes de absorver o espectro radiante a célula média. Sinônimo de megagametófito,
entre 340 a 760 nanômetros, mudando sua for- macrogametófito, gametófito feminino ou, ain-
ma entre Fv, cujo pico de absorção é em 660 da, saco embrionário maduro.
nm, e Fve, com pico em 730 nm. Ver fitocromo.
GERMINAÇÃO 307

Ginogônio – gametângio feminino. Sinônimo Hidrofílica – com afinidade por água; substân-
de arquegônio. cia solúvel em água.

Ginosporângio – esporângio produtor de gi- Hidrofóbica – sem afinidade por água; subs-
nósporo. Sinônimo de megasporângio. É tam- tância insolúvel em água.
bém conhecido por nucelo.
Hidrólise – do grego hydro, água + lysis, quebra,
Ginósporo – esporo que dará origem a um corresponde à quebra de uma molécula em
ginófito. duas pela adição de íons H+ e OH- da água.

Glande – sinônimo de bolota (bellotas em Hilo – é a cicatriz deixada no tegumento da se-


espanhol e acorn em inglês), são aquênios poli- mente, indicando a região de contato do óvulo
cárpicos muito grandes, possuindo pericarpo com o funículo.
coriáceo e tendo a base envolvida em maior ou
menor grau por tecidos de origem axial. Hipertrofia – crescimento exagerado de um
órgão, ou de uma parte do todo.
Glucano – polissacarídeo formado pela ligação
de inúmeras moléculas de glucose, como celu- Hipocótilo – a porção do caule, no embrião,
lose e amido. situada abaixo do nó cotiledonar.

Gluma – cada um dos hipsófilos estéreis en- In vivo – ao vivo.


contrados na base das espiguetas das Poaceae
(gramíneas), também são chamados de paleas. Índice de velocidade de emergência (IVE) –
A inserção de uma das glumas é ligeiramente similar ao IVG quanto ao cálculo, difere por
superior à da outra, sendo, por isso, identifi- considerar não o número de sementes germi-
cadas por gluma inferior e gluma superior. nadas (G), mas o número de plântulas forma-
das (E) entre as observações.
Glumela – cada uma das pequenas peças esca-
miformes que rodeiam a flor das Poaceae (gra- Índice de velocidade de germinação (IVG) –
míneas); acompanham as glumas, distinguin- é uma medida quantitativa da germinação que
do-se a glumela inferior (lema) e a glumela relaciona o número de sementes germinadas
superior (palea). A glumela inferior é uma brác- pelo número de dias de semeadura (IVG = G1/
tea tectriz de cuja axila brota uma flor (glumela N1 + G2/N2 + ... Gn/Nn).
superior, antófila) ou um ramo florífero (glu-
mela superior, profílica). Integumentos – tecidos de cobertura natural;
camada mais externa, de revestimento e pro-
Grão de pólen – estrutura que contém o an- teção de sementes, podendo ser chamado tam-
drófito das angiospermas. Andrófito protegido bém de testa.
por uma capa dura e resistente constituída prin-
cipalmente por esporopolenina. Interação – influência de um indivíduo sobre
outro, modificando seu aspecto ou funciona-
Graus de liberdade – para amostra gl=n-1; mento.
para tratamento gl=t-1.
Interação entre fatores – é o estudo do efeito
Herbívoros – animais que se alimentam de de um fator sobre a ação de outro fator. Quando
plantas. significativa, indica que o efeito de um fator
está condicionado à presença do outro fator;
Hidrocoria – tipo de dispersão feita por água quando não-significativa, os efeitos dos fatores
de chuvas, rios, enchentes e correntes maríti- são independentes um do outro.
mas.
308 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Interferência – competição por fatores abióticos Lote – quantidade uniforme e definida de se-
ou bióticos entre indivíduos, com prejuízos para mentes, identificada por número, letra ou
um ou para os dois competidores. combinação dos dois.

Intervalo de confiança – é o intervalo deter- Luz vermelho-distante – luz no comprimento


minado por dois números obtidos a partir dos de onda acima de 710 nm, tida como indutora
valores da amostra que, estabelecida uma deter- de dormência em várias espécies vegetais.
minada probabilidade, deve conter o parâmetro
populacional (média, desvio, entre outros). Maltose – carboidrato formado por duas molé-
culas de glucose ligadas por uma ligação glico-
Intolerância à dessecação – característica, sídica α(1,4).
processo ou fase em que as sementes não tole-
ram a secagem, a exemplo de sementes recal- Mamaliocoria – tipo de dispersão feita por ma-
citrantes, ou sementes que tenham iniciado ger- míferos.
minação por meio da protrusão radicular.
MAPK – Mitogen Activated Protein Kinases – proteí-
Jaculador – comum nas Acanthaceae, é um nas quinases ativadas por agentes mitogênicos.
gancho dorsal e lignificado que se forma no fu-
nículo e atua na dispersão das sementes. Massa seca – utilizada também, erroneamen-
te, como peso seco. É a massa em gramas de
Kinases ou quinases – enzimas com capaci- sementes, substrato, etc., que resta após a re-
dade de fosforilar outras proteínas, comumente moção da água.
envolvidas na condução intracelular de sinais.
Material inerte – sementes e pseudo-semen-
KNO3 – nitrato de potássio. tes de espécies cultivadas e silvestres não per-
tencentes à espécie em exame e outros mate-
Lactacistina – inibidor específico e irreversível riais estranhos que não sejam sementes.
da atividade do proteasoma.
Média ponderada – é uma medida de posição,
Lema – estrutura escamiforme, escariosa ou pa- obtida a partir de observações com pesos dife-
leácea situada na base da flor das Poaceae (gra- rentes, calculada por
míneas). n
å xi wi
i=1
Lente – no rudimento seminal, excrescência x= n
que se forma junto ao hilo, em algumas semen- å wi
tes. i=1

onde xi: é o valor da i-ésima observação; wi: é o


Lignina – polímero ramificado de natureza fe- peso de ponderação.
nólica que impregna a parede celular em alguns
tecidos vegetais. Média – é uma medida de tendência central
ou de posição que tem a finalidade de sintetizar
Lipooxigenase – enzima envolvida na conver- a informação contida na amostra. É calculada
são de fosfolipídeos de membrana em eicosa- pela razão entre a soma de todos os valores da
nóides (prostaglandinas, leucotrienos), agentes amostra e o número total de elementos que a
de sinalização intracelular. constituem; assim,
n

Lixiviação ou extravazamento – perda de ma- å xi


i=1
téria solúvel de células através de membranas x=
n
celulares danificadas. onde n: é o tamanho da amostra; xi: é o valor
da i-ésima observação.
GERMINAÇÃO 309

Mediana – é uma medida de tendência central efeitos de tratamentos e pela interação entre
que deixa 50% dos valores da amostra abaixo eles, como nos ensaios fatoriais, e pelo erro ou
dela e 50% acima quando eles estão ordenados. resíduo experimental.

Meiose – divisão reducional em que uma célula Monocotiledônea – planta cujo embrião tem
2n produz quatro células n. apenas um cotilédone. Corresponde a uma das
duas grandes classes das angiospermas: Monoco-
Mensageiros secundários – substâncias pro- tyledoneae.
duzidas ou introduzidas nas células e que
alteram e permitem a propagação intracelular Monossacarídeo – do grego monos, único +
da mensagem. sakharon, açúcar, são açúcares simples, forma-
dos por uma cadeia de átomos de carbono liga-
Mesocarpo – no fruto, corresponde à porção dos à hidrogênio e oxigênio na proporção 1:2:1,
intermediária, situada entre o epicarpo e o en- respectivamente, e que não podem ser disso-
docarpo. ciados em açúcares menores. Os monossacarí-
deos podem ser descritos pela fórmula
Metabolismo – do grego metabole, mudança, (CH2O)n, onde n = 3 (trioses) ou um número
corresponde à soma de todos os processos bio- maior (tal como cinco, pentoses e seis, hexo-
químicos que ocorrem dentro de uma célula ou ses).
organismo vivo.
mRNA – é um tipo de ácido nucléico formado
Micrópila – pequena abertura existente nos te- a partir do DNA cromossômico, que transfere
gumentos de um óvulo ou rudimento seminal. a informação genética do gene para os ribosso-
mos, onde ela é traduzida em proteínas. É cons-
Microtúbulos – componente subcelular do cito- tituído de cadeias de fosfato, moléculas de açú-
esqueleto, formado pela polimerização de tu- car (ribose) e bases púricas e pirimídicas.
bulinas (geralmente α- e β-tubulina) em uma
estrutura oca e rígida de cerca de 25 nm de di- Mucilagem – substância vegetal viscosa, seme-
âmetro, que participa do processo de organiza- lhante em composição e propriedades às gomas.
ção da parede celular.
Nastismo – movimentos reversíveis apresenta-
Mirmecocoria – tipo de dispersão feita por for- dos por estruturas de plantas, como folhas, em
migas. resposta a sinais ambientais, como luz.

Mitose – divisão celular não reducional, pois Normalidade – os erros ou desvios (eij) decorren-
mantém o número de cromossomos, isto é, uma tes do efeito de fatores não controlados, distri-
célula n origina duas células n, uma célula 2n buídos de acordo com a curva de Gauss, ou seja,
origina duas células 2n, etc. Às vezes é empre- com distribuição normal de probabilidades.
gado como sinônimo de citocinese.
Noz – fruto seco indeiscente, mono ou pluri-
Mixoplóide – tecido em que as células não pos- carpelar, procedente de ovário súpero ou ínfero,
suem a mesma ploidia, isto é, diferem quanto mono ou polispérmico. Gênero de frutos muito
ao número de cromossomos ou de núcleos. variados, em geral, as nozes são monocarpelares
e monospérmicas. Constitui o fruto de Corylus
Moda – é o valor mais freqüente de uma amos- avellana, dos olmos, abetulas e das leguminosas
tra. do gênero Onobrychis, os aquênios ou utrículos
do gênero Carex.
Modelo matemático – equação que representa
os efeitos dos fatores de um delineamento Nucelo – vem do termo latino que representa
experimental, formada pela constante μ, pelos o diminutivo de noz, é o tecido que forma o
310 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

interior do rudimento seminal; tem como sinô- Partenocarpia – termo formado por parteno
nimos megagametófito, megasporângio e gi- (do grego parthénos = virgem, não fecundado)
nosporângio. e carpo (do grego Karpós e do latim Carpu =
fruto). Pela etimologia, significa formação de
Oligossacarídeos – polímeros pequenos consti- um fruto sem fecundação prévia dos rudimen-
tuídos por poucos açúcares. tos seminais, não havendo, portanto, semen-
tes, ou sendo elas estéreis.
Opérculo – é uma estrutura que se origina pela
proliferação das células do tégmen localizadas Pascal (Pa) – unidade de pressão do Sistema
nas proximidades da micrópila. Estas células, Internacional de Unidades (SI), equivalente à
após o processo de diferenciação, originam uma força de 1 Newton por metro quadrado; 120325
única estrutura em forma de cúpula. As células pascals = 1 atmosfera, 1 megapascal (MPa) ou
do opérculo podem possuir paredes muito es- 105 pascals aproximadamente 1 bar.
pessadas.
Pastadores – indivíduos que se alimentam es-
Ornitocoria – tipo de dispersão feita por aves. sencialmente de plantas, principalmente fo-
lhas.
Ovário – o mesmo que megasporófilo ou ma-
croesporófilo. Concrescimento basal das folhas Patógenos – organismos que invadem os teci-
carpelares ou parte do gineceu que contém os dos vegetais, podendo causar doenças e lesões.
rudimentos seminais (óvulos ou ovulários), e
que origina o fruto. PEG – ver polietilenoglicol.

Óvulo – do latim ovulum, pequeno ovo. Termo Percolado – líquido ou substância que atra-
usado, de forma imprópria, como sinônimo de vessa uma camada de substrato.
rudimento seminal. Esta associação nasceu pela
analogia que os botânicos do século XVIII fazi- Pericarpo – parte do fruto que envolve a(s) se-
am entre as estruturas das plantas com as dos mente(s), podendo ser dividido em epicarpo
animais. Ver ginosporângio e ginófito. (parte mais externa ou casca), mesocarpo (par-
te intermediária) e endocarpo (parte mais in-
Pálea – glumela superior das espiguetas das terna, que normalmente reveste a semente).
Poaceae (gramíneas).
Perisperma – tecido de origem materna, po-
Papilas – são produções superficiais granulosas dendo existir transitoriamente durante a for-
e mais ou menos translúcidas. mação de sementes, ou ser mantido em semen-
tes maduras como tecido de reserva, a exemplo
Parcela – é a unidade experimental que vai re- do endosperma.
ceber o tratamento e fornecer os dados que de-
verão refletir o efeito do que está sendo estuda- PHYA – gene que codifica o fitocromo de típica
do. Pode ser uma planta, uma semente, um gru- ocorrência em sementes.
po delas, uma placa de Petri com sementes, um
vaso com sementes ou plantas, um canteiro Pioneiras – classe sucessional constituída por
com sementes ou plantas, etc. espécies vegetais que inicialmente colonizam
áreas abertas, como campos ou clareiras.
Parede celular – envoltório relativamente
rígido, externo à membrana plasmática, cons- Pistilo – do latim pistilum, semelhante à mão
tituído principalmente por polímeros de açú- do almofariz. Conceitualmente diz respeito à
cares, como a celulose, e presente em células folha carpelar, distinguindo-se na sua forma o
vegetais. estígma (parte superior), o estilete (a parte in-
termediária) e o ovário (parte basal hipertrófi-
GERMINAÇÃO 311

ca). Num gineceu apocárpico, cada um dos car- Poder do teste – definido como 1–β, poder é a
pelos que o formam constitui um pistilo; en- probabilidade de rejeitar a hipótese nula, quan-
quanto um gineceu sincárpico é formado por do esta é de fato falsa e deve ser rejeitada.
um pistilo composto devido à soldadura dos vá-
rios carpelos. Esse termo é usualmente empre- Polietilenoglicol (PEG) – polímero com gru-
gado como sinônimo de gineceu. pamentos laterais polares, que confere caracte-
rística hidrofílica, empregado na composição
Planta-mãe – a planta onde está acontecendo de soluções osmóticas.
o desenvolvimento do fruto e da semente.
Polímero – uma molécula grande compostas de
Plantas forrageiras – plantas que servem ao várias subunidades moleculares semelhantes.
consumo de animais domésticos.
Poliplóide – célula com um grande número de
Plantas medicinais – plantas com proprieda- conjuntos de cromossomos.
des químicas empregadas na cura de doenças.
Polissacarídeos – polímero composto de mui-
Plantas mutantes – plantas que apresentam tas unidades de monossacarídeos unidos em
um ou mais genes que sofreram mutação. uma cadeia longa, como o amido e a celulose.

Plantas tóxicas – plantas que contêm substân- Polissomos – série de ribossomos traduzindo
cias oriundas do seu metabolismo secundário uma mesma fita de RNA mensageiro (mRNA).
e são capazes de causar distúrbios neurológicos,
respiratórios e/ou gástricos ou provocar alergias Pontos cardeais – denominação dada às tem-
nos animais. peraturas máxima e mínima, acima ou abaixo
das quais não ocorre germinação, assim como
Plântula – planta pequena ou jovem, muda, à temperatura ou faixa ótima de temperatura
oriunda de uma semente recém-germinada. na qual a germinação é máxima.

Plasmogamia – fusão dos citoplasmas de dois População – conjunto de indivíduos de uma


gametas que possuem polaridade diferente. espécie que ocupa uma determinada área. Tam-
bém se denomina assim o conjunto de semen-
Plastídio – organela celular característica de tes submetidas às mesmas condições. Nesse
células vegetais, delimitada por duas membra- sentido, todas as sementes de uma árvore po-
nas (externa e interna com invaginações), onde dem ser consideradas uma população se esta
ocorre a síntese e armazenagem de substâncias. árvore for o único representante da espécie na
Os plastídios podem ser interconversíveis entre área de estudo. População também pode ser o
os diferentes tipos e funções que desempenham conjunto de sementes produzido por várias ár-
e são classificados com base no tipo de pigmen- vores de uma mesma espécie, desde que todas
tos que contêm: cloroplastos (clorofila), cromo- as árvores estejam submetidas às mesmas con-
plastos (carotenóides), leucoplastos (sem pig- dições bióticas e abióticas.
mentos, p. ex., amiloplastos) e proplastídios
(indiferenciados e incolores, são os precurso- Potencial de pressão (Ψp) – diferença entre o
res dos demais tipos de plastídios. potencial químico da água pura sob condições
normais e da água sob alguma forma de tensão.
Ploidia – termo que se refere ao número de con- A pressão pode ser positiva, gerando turgor, ou
junto cromossômico por célula, haplóide (n), negativa, gerando tensão.
diplóide (2n), poliplóide (xn).
Potencial hídrico (Ψ) – representa a energia
livre da água, podendo ser também chamado
de potencial químico da água, representado por
312 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Ψ, que para a água pura tem valor equivalente Pureza genética – representa o alto grau de me-
a zero (Ψ = 0). lhoramento genético de uma espécie, podendo
atingir o mais elevado grau de homozigose e ho-
Potencial matricial (Ψm) – potencial de absor- mogeneidade das características dos indivíduos.
ção de água por matrizes (paredes celulares,
componentes insolúveis na célula: amido, algu- Quadrado médio do resíduo – é a variância
mas proteínas, etc.). média atribuída ao erro experimental.

Potencial osmótico (Ψπ) – capacidade de re- Quiropterocoria – tipo de dispersão feita por
tenção de água por solutos dissolvidos, valor morcegos.
sempre negativo, pois reduz a energia livre da
água pura. Radícula – porção do eixo embrionário que após
a germinação se desenvolve na raiz primária
Predação – ataque físico a outro organismo, da planta.
retirando um pedaço ou o consumindo total-
mente. Raiz adventícia – raiz na qual não se distingue,
nem pela forma, nem pela posição, uma raiz
Primatocoria – tipo de dispersão feita por pri- principal. Ocorre devido a um evento de atrofia
matas. precoce da raiz (radícula) principal após a ger-
minação.
Priming – técnica de causar funcionamento de;
técnica de (pré-)tratamento ou (pré-)condicio- Receptores – estruturas normalmente de cons-
namento utilizada em tecnologia de sementes tituição protéica e em geral localizadas em
para induzir a pré-iniciação do processo ger- membranas, atuam no reconhecimento especí-
minativo, podendo ser também chamada de en- fico de substâncias ou grupos químicos presen-
vigoramento, ou condicionamento osmótico, tes no meio.
dentre outros.
Regma – são os esquizocarpos característicos
Procedência – local de origem de um grupo das Gesneriaceae.
de indivíduos, de uma amostra, etc.
Repetição – é a reprodução de uma unidade
Progênie – conjunto de indivíduos originados experimental, dentro do mesmo tratamento.
da mesma planta-mãe.
Resíduo – em estatística, é o erro experimental.
Proteasoma – complexo multicatalítico (20S
e 26S) constituído por diversos polipeptídeos e Resteva – restos de plantas deixadas sobre o
envolvido na degradação de proteínas diversas solo para melhoria da quantidade de matéria
(20S) ou na hidrólise seletiva de proteínas ubi- orgânica e estrutura do solo.
quitinadas (26S).
RGL2 – gene envolvido na regulação negativa
Proteínas – polipeptídeos constituídos de uma da rota de sinalização do ABA.
única cadeia de aminoácidos.
Rigor do teste – é a capacidade do teste em
Proteínas G – proteínas heterotriméricas que detectar diferenças apenas relativas ao fator em
interagem com receptores de membrana, en- estudo e não aquelas atribuídas aos fatores ca-
volvidas na transdução intracelular de sinais. suais.

Protrusão radicular – quando a radícula do em- Ritmo circadiano – padrão de desenvolvimento


brião rompe a testa ou integumentos, germi- ou respostas diversas das plantas que apresen-
nação. tam uma freqüência diária.
GERMINAÇÃO 313

RNA – ácido ribonucléico, constituído por uma apropriada, uma vez que a estrutura que identi-
ribose fosfato e distintas bases nitrogenadas, fica não é um saco de embriões. De fato, refere-
como adenina, guanina, citosina e uracila. se ao gametófito feminino, também designado
por megagametófito. Ver ginófito.
RNA mensageiro – polímero de RNA que,
quando lido pelo ribossomo, determina a pro- Saco polínico – é a estrutura dos antófitos que
teína a ser sintetizada. carrega os grãos de pólen, sendo homólogo dos
microsporângios das Pteridófitas heterospora-
Robustez do teste – é a capacidade do teste de das. Sinônimo de androsporângio.
manter sua eficiência ou poder de aceitação e
rejeição de uma hipótese, mesmo quando for Sais – substâncias produzidas a partir da reação
aplicado sob condições não ideais. entre ácidos e bases, tendo seu potencial higros-
cópico utilizado como meio de dessecação ou
Rudimento seminal – mais conhecido por óvu- desidratação de sementes.
lo, é a estrutura formada pelo ginosporângio
envolto em tegumentos. Termo criado por Linné Sâmara – são aquênios alados, isto é, possu-
para identificar e conceituar as estruturas pre- em estruturas membranáceas laterais. Existem
sentes no interior dos megasporófilos e que sâmaras com uma única asa (gêneros Tipuana,
originavam as sementes. Esta nomenclatura foi Ailantus, Fraxinus), mas podem existir sâmaras
muito utilizada pelos embriologistas do século com mais de uma asa, como em Ulmus campestris.
XVIII, sendo mais correta, pelo seu significado
etimológico, que óvulo, palavra que literalmen- Saurocoria – dispersão de diásporos mediada
te significa um ovo pequeno. Ver ginosporângio. por répteis.

Ruído informacional – alterações ou dificul- Savana – formação vegetal típica de regiões


dades produzidas numa cadeia de eventos (p. tropicais, caracterizadas por estações secas de-
ex., rota metabólica) e que tornam lento seu finidas, e predomínio de vegetação herbácea e
funcionamento. arbustiva.

Ruído térmico aleatório – sinal de temperatura Secagem de sementes – processo de remoção


reconhecido pelo sistema, que resulta numa de água da semente por meios diversos, como
determinada resposta metabólica, no caso dos ventilação em ar seco.
diásporos, pode levar à germinação.
Sementes alóctomas – sementes presentes no
Sacarose sintase – é uma enzima citosólica banco de sementes, mas oriundas de plantas
com a capacidade catalítica reversível de sínte- localizadas em outras regiões.
se e degradação de sacarose, conforme a seguin-
te reação: Sacarose + UDP ↔ Frutose + UDP- Sementes ardidas – sementes inteiras ou par-
Glucose. A denominação sintase foi atribuída er- tidas que perderam a cor característica pela ação
roneamente, pois a principal rota catalítica des- de calor e de umidade ou pela fermentação.
sa enzima é a degradação de sacarose. Além
disso, evidências experimentais indicam que é Sementes autotócomas – sementes presen-
a principal degradadora de sacarose em órgãos tes no banco de sementes e oriundas de plan-
que armazenam amido (p. ex., sementes e tu- tas localizadas na região.
bérculos) ou em tecidos em período de rápido
crescimento, em que ocorre a rápida conversão Sementes chochas – sementes malformadas
de sacarose em polissacarídeos de parede celular. por deficiência de desenvolvimento.

Saco embrionário – nomenclatura consagra- Senescência – estádio de desenvolvimento de


da pelo uso, o que não a torna nem certa nem um tecido, estrutura ou planta, caracterizado
314 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

por uma série de eventos de degradação e/ou Skotomorfogênese – padrão de crescimento


hidrólise, e que levará à morte de partes especí- e diferenciação apresentado por plantas man-
ficas (p. ex., folhas) ou de todo o organismo. tidas no escuro.

Serapilheira ou serrapilheira ou liteira – SLY – gene envolvido na rota de transdução


camada de folhiço e outros restos de plantas das GAs, interfere também na sinalização do
encontrada especialmente no chão das matas. ABA.

Sifonogamia – fecundação mediante a forma- SNK – em estatística, são as iniciais do teste


ção de um tubo ou sifão, como na maioria das proposto por Student, Newman e Keuls.
gimnospermas e todas as angiospermas.
Sorção de água – aumento da quantidade de
Significativo – é todo teste estatístico que apre- água na semente determinado por gradiente
sentou a hipótese nula rejeitada. positivo de potencial hídrico entre o ar circun-
dante e a superfície da semente.
Simplasto – do grego syn – junto com + plasto,
moldado, corresponde ao interior das células SPY – gene envolvido na regulação negativa
de um tecido vegetal, ou seja, são os protoplas- da rota de sinalização do ABA.
tos interconectados através de seus plasmodes-
mas. Stricto sensu – senso estrito, restrito àquele.

Sincário – fusão de dois núcleos muito rela- Suberina – polímero de natureza lipídica, se-
cionados. melhante às graxas.

Sincronia de germinação – é a medida da in- Substrato – meio físico onde são colocadas as
certeza da distribuição de freqüências de ger- sementes (areia, solo, papel, ágar).
minação, calculada segundo a expressão
Tempo médio de germinação – é a média
k ponderada dos tempos de germinação, calcu-
E = – å fi log2 fi, sendo
ni
fi = lada pela expressão
i=1 k
å ni k
i=1 å ni ti
i=1
t= k
onde fi: freqüência relativa de germinação; ni:
número de sementes germinadas no dia i; e k: å ni
i=1
último dia de observação.
onde ti: tempo do início do experimento até a
Síndromes de dispersão – características mor- ith observação (dia ou hora); ni: número de
fológicas, fisiológicas e fenológicas dos diáspo- unidades de dispersão germinadas no tempo ti
ros associados a um determinado tipo de agente (número correspondente à ith observação), que
dispersor. representa o peso de ponderação para o cálculo
do tempo médio; k: último tempo de germina-
Singamia – união de dois gametas para formar ção.
um embrião.
Testa – mesmo que integumentos.
Sinzoocoria: tipo de dispersão na qual os diás-
poros são carregados deliberadamente por ani- Testes para comparações múltiplas – são
mais, em geral na boca. testes de comparações de médias, duas a duas.
GERMINAÇÃO 315

Tolerância à dessecação – característica, pro- Variância – é uma medida de dispersão que


cesso ou fase em que as sementes toleram a pode ser calculada para qualquer tamanho de
secagem, a exemplo de sementes ortodoxas. amostra maior que 1, pela expressão
n
Tradução – cópia de RNA para proteína.
å (xi – x) 2

2 i=1
Transcrição – cópia de um gene em RNA através s =
n–1
de uma RNA polimerase dependente de DNA.
onde n: tamanho da amostra; xi: i-ésimo valor
Transformação angular – é a conversão de da amostra e x média da amostra.
uma proporção ou porcentagem em um arco,
cujo seno equivale a esta proporção ou porcen- Velocidade de germinação (VG) – medida que
tagem. quantifica a cinética da germinação em função
do tempo de observação. Há vários índices
Tratamento – é o método, substância ou utilizados para seu cálculo. Por exemplo,
material cujo efeito se deseja medir ou compa- Edmond e Drapala (1958) desenvolveram a se-
rar em um experimento. guinte fórmula: VG = (N1 G1 + N2 G2 +...+
Nn.Gn) / (G1 + G2 +...+ Gn), que também pode
3-PGA – uma triosefosfato formada por um ser representada como
gliceraldeído com um fosfato ligado no carbo-
K K
no 3. É um açúcar-fosfato altamente energético å i=1 Ni.Gi / å i=1 Gi
que participa como transportador de esqueleto
de carbono e energia, como observado entre os Também encontrado na literatura é o coeficien-
cloroplastos e o citoplasma. te de velocidade de germinação (CVG) ou de
emergência (CVE), desenvolvido por Kotowski
Trioses – do grego tries, três + ose, sufixo (1926), e expresso através da equação:
indicando um carboidrato, corresponde a qual-
K K
CVG ou CVE = [å i=1 fi / å i=1 fi.xi] . 100
quer açúcar composto de três carbonos.

Tubérculos – do latim tuber, dilatação, caule


Além destes, a velocidade de germinação pode
subterrâneo, curto e volumoso, rico em reser-
ser calculada através do inverso do tempo mé-
vas, como a batatinha.
dio de germinação, segundo Labouriau (1983):
v = 1 / t = ∑ni / ∑ni.ti.
Tubulina – proteínas do citoesqueleto que,
quando polimerizadas, constituem os microtú-
Velocidade média de germinação – é o
bulos.
recíproco do tempo médio de germinação, cal-
culada pela expressão
Ubiquitina – polipeptídeo (8,5KDa) que se liga
1
a proteínas, marcando-as para degradação atra- v=
vés do proteasoma 26S. t
onde t : tempo médio de germinação.
Unidade de dispersão – estrutura responsá-
vel pela disseminação ou dispersão de uma es- Vermelho-extremo – região do espectro
pécie, podendo ser uma semente, para a maio- radiante situada entre a luz vermelha e o infra-
ria das espécies, mas também um mericarpo, vermelho.
drupa, aquênio, gema ou esporo.
Vigor – propriedades da semente que determi-
Unidade experimental – ver parcela. nam o potencial para uma emergência rápida
e uniforme e para o desenvolvimento de plân-
316 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

tulas normais sob um largo espectro de condi- Xilopódio – órgãos tuberosos subterrâneos, de
ções ambientais em nível de campo. origem normalmente radicular, com a função
de armazenamento de água e nutrientes.
Vingamento – desenvolver e prosperar em
função da viabilidade e crescimento pós-germi- Zigoto – célula resultante da fecundação da
nativo. oosfera, representa a primeira célula de qual-
quer ser vivo policelular. Origina o embrião, o
Xenófito – termo proposto para substituir os qual, nas plantas espermatófitas, originará o
termos albúmem e endosperma, pois, por sua novo esporófito.
etimologia, ambos não representam o que esta
estrutura de fato é. Xenófito é a planta formada Zoocoria – dispersão de diásporos feita através
pela fecundação da célula central do ginófito, de animais.
sendo um organismo tri ou poliplóide, com ciclo
de vida ligado ao do embrião, e desaparecendo
durante a germinação da semente.
ÍNDICE

A Alelo 57 Apoplasto 54-55


Alelopatia 251-261 Apuleia leiocarpa 107
ABA 56-59, 114, 116-121
Aleloquímicos 252-253, 255-256, Arabidopsis thaliana 51, 98, 118
Abarema sp. 226
258-259, 261 Arachis hipogea 285
Aberrant testa shape 59
Aleluia 129 Arachis hypogaea 267
Abeto 130
Alface 130, 253, 255, 258 Araticum 111
ABI 58
Alfafa 128 Araucaria angustifolia 71, 276, 284, 288
ABI3 58
Aloysia gratissima 115 Arecaceae
abi3 58-59
Allium 70 Cocos nucifera 226
Abióticos 251
Allium cepa 267 Areia 256
Abóbora 63
Amaranthus retroflexus 100 Arilo 73
Absorção de água 126-132
Amazônia 111 Armazenamento 266-281
Acacia 284
Amburana cearensis 107 Arroz 131
Acacia bonariensis 129
Amendoim do campo 127 Artabotrys odoratissimus 84
Acacia melanoxylon 141
Amido 33-40, 49, 150, 155, 159, 163, Asparagina 55
Acacia polyphylla 294
167-172, 175-179, 182-183 Asphodelus tenuifolius 81
Acanthospermum hispidum 142
Amilases 118 Aspidosperma macrocarpon 226
Acer 97
Amilopectina 35-40 Assimilados 51, 55
Acer negundo 130
Amilose 35-40 Associação 252
Acer spp. 97
Aminoácidos 53, 55, 59, 259 Asteraceae
Acetona 129, 133
Amostra média 189 Eremanthus glomerulatus 226
Ácido 126, 128-129, 131-133
Amostragem 265-266, 272 Astrocaryum jauari 247
Ácido abscísico 56, 112, 114, 116,
Amotra de trabalho 189 Atividade respiratória 109, 116
118, 131, 159
Anacardiaceae 244 ATP 109, 116
Ácido giberélico ou giberelinas
Myracrodruon urundeuva 226 Ats 59
(GAs) 118, 132, 158-159
Anadenanthera colubrina 226, 244 Atta sexdens 247
Ácidos fosfatídicos 117
Análise da variância 197 Atta spp. 227
Ácidos nucléicos 155
Andira humilis 141 Attalea funifera 137
Ácidos orgânicos 117, 256
Andrófito 16 Attalea oleifera 246
Acúmulo de reservas 31-50
Androgênese 17 Autocórica 232
Adenanthera pavonina 103, 107
Andrographis echioides 84 Autotrófico 159
Adenilato ciclase 117
Andrographis serpyllifolia 84 Auxema oncocalyx 244
Aechmea distinchantha 115
Androsporângio 16 Auxinas 120
Aechmea nudicaulis 115, 217
Andrósporo 16 Aveia 131
Aeração 277-279
Anemocórica 225-226 Avena fatua 99, 130
Ágar-gel 255
Anfipática 62 Avena sativa 141, 170, 267
Agentes dispersores
Angelim 111 Avicenia marina 71
abióticos (vento, água, peso) 225,
Angiospermas 53 Azadiracta indica 62
228, 231
Annona cacans 107 Azotobacter 261
bióticos (mamíferos, répteis,
Annona crassiflora 103-104, 111, 115
peixes, formigas) 225, 231
Anterozóides 16
Aglaia 85
Antioxidante 62 B
Água 125-133
Antocianina 58 B. insignis 80
Albizzia lophanta 141
Antropocórica 227 Bactis gasipae 288
Albumina 19, 47
Apocynaceae Bactris acanthocarpa 233
Álcoois 117
A. pyrifolium 226 Balística 226, 230
Alchornea triplinervia 107
Aspidosperma macrocarpon 226 Bamebeya 71
Alectra thomsoni 80
Apoplástica 54
318 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Banco de sementes 114, 144 Calliandra coiled 81 Cnidosculus 243


persistente 231-232 Calluna vulgaris 141 Coco 226
transitório 231 Câmara 255 Cocos 85
Banisteriopsis latifolia 226 Canafístula 128-129, 132-133 Cocos nucifera 62, 80, 81, 226
Barbatimão 127, 129 Canavalia 85 Coffea 31
Barklya 85 Canna 85 Coffea arabica 174
Barleria cristata 80 Canna maculata 78 Coffea sp. 62
Barocoria 226 Cannaceae 126 Coleta de sementes 266-281
Bars 160 Canteiros 256 Colubrina glandulosa 107
Base 128-129 Capacidade germinativa 56, 59 Colutea breviata 43
Basicaulicarpia 227 Capiçova 114 Combretaceae
Bauhinia 78, 85 Capim-braquiária 98 Combretum pysonioides 226
Bauhinia bongardi 226 Capsicum annum 130 Commelina virginica 100
Bauhinia forficata 107, 141 Cápsula de endosperma 157-160 Compartimentalização celular 60
Beneficiamento 63, 266-281 Carência de substratos 116 Competição 251-253, 261
Benincasa cerifera 81 Carica papaya 285 Compostos fenólicos 261
Berthollettia excelsa 103 Carrapichos, picão, pega-pega 226 Compostos secundários 259
Beta vulgaris 130 Caruaru de pito 129 Concentração iônica 256
Beterraba 98 Caryocar brasiliensis 226 Condicionamento osmótico 160
Bidens gardneri 115, 141 Cassia 81, 127, 129 Controle local 190
Bidens pilosa 100, 105 Cassia bicapsularis 129 Convolvulaceae 126
Bidens spp. 226 Cássia do Nordeste 129 Copaíba 127, 129
Bidens sulphurea 99 Cassia excelsa 129, 219-220 Copaifera langsdorffii 44, 49, 107, 127,
Bióticos 251 Cassia grandis 107 177, 183, 203, 294
Blastania garcini 81 Cassia javanica 129 Copaífera sp. 129
Blumenbachia hieronymi 80 Cassia speciosa 129 Cópula 20
Boschniakia himalaica 80 Casualização 190-191 Cordia trichotoma 107
Brachiaria brizantha 96, 105 Casuarina 71 Cordicepina 155-156
Brachiaria decumbens 98 Cavanillesia 71 Corpo lipídico 45, 46
Braquiarão 96 Cecropia 115, 243 Corylus avelana 130
Brassica 64 Cecropia sp. 243 Corylus avellana 112
Brassica chinensis 200 Cedrela spp. 294 Cosmos sulphureus 97
Brassica napus 63 Celsia coramandeliana 80, 84 Cotilédones 53, 58, 110, 112-113, 116
Brassica oleracea 63, 157 Célula 53-55, 62 Critério agronômico 209, 211
Brassicas 63 Células companheiras 54 Critério bioquímico 209
Brassinoesteróides 119-120 Células seletivas 54 Critério botânico 209
BRI1 120-121 Cenchrus ciliaris 99 Critério de germinação 209-210
Bromelia antiacantaha 115 Cenoura 63 Cromóforo 119
Bromélias 114, 216 Centrolobium tomentosum 286 Crotallaria aegyptica 140
Brotação pré-colheita 58 Ceratonia siliqua 175 Croton floribundus 107, 115
BRs 119-121 Cercis 85 Cryptocarya 85
Bulbilho 70 Cereus jamacaru 115 CTR1 118, 121
Bulbo 70 Cerrado 111, 115, 219, 228-229, 233 CTS 118, 120-121
Cicer arietinum 119 Cucumis anguria 97, 99
Ciclo celular 52, 155-156 Cucumis melo 81
C Ciclo de Krebs 153 Cucurbita spp. 267
Caatinga 219, 226, 232 Cinética da germinação 210, 216 Cuphea carthagenensis 114-115
Caesalpinea leiostachya 107 Cinetina 214 Curcubita pepo 81
Caesalpinia 243 Cinzas 132 Curcubita sativus 81
Caesalpinia echinata 165 Cisteína-proteinase 119 Curva acumulada 255
Caesalpinia ferrea 141 Citocinese 156 Curvas cumulativas 216-217
Caesalpinia sp. 243 Citocinina 143 Curvas de freqüência cumulativas 217
Caesalpinoideae 228 Citoesqueleto 156 Curvas de germinação 212-215, 218
Calaza 55 Citrus sp. 62 Cutícula 126, 129
Cálcio 117 Clareira 229, 230, 232 CVE 212
Calmodulina 117 Clidemia hirta 115 CVG 212
Calophyllum brasiliense 107 Cliftonia monophylla 80 Cyamopsis 81
Calor 127-128, 132-133 Clorofila 159 Cyamopsis tetragonolobus 43-44, 175
Calotropis procera 213 Clostridium 261 Cyrilla racemiflora 80
GERMINAÇÃO 319

Chalaza 126 endógena 102 Erro experimental 190


Chelone glabra 80 exógena 104-105 Erva-mate 97
Chenopodiaceae 126 física 104-107 Ervilhaca 128
Chenopodium album 99, 143 fisiológica 102-107, 110-111 Erythrina 85
Chorisia speciosa 127 imposta 96 Erythrina crista-galli 87
Chrysocyon brachyurus 227 inata 96-97 Escarificação 126-127, 129, 132,
Chuva de sementes 230-231 induzida 96, 101 139-140
mecânica 106 Escutelo 112
morfofisiológica 104, 111 Eschweilera ovata 239
D morfológica 103-104, 106 Espécies pioneiras 232
Dalbergia nigra 288, 293 primária 97-101, 110-111, 114 Esponja neutra 254
Dalbergia violaceae 226 química 105 Estabelecimento 165, 167, 181, 183, 184
Daucus carota 37, 63, 157 relativa 95-97, 101 de plântulas 228-230
Decompositores 261 secundária 97, 101-102, 105, Estado cristalino líquido 60, 153-154
Deiscência 63 110-111, 113-114, 117 Estado de gel 60, 153-154
Delineamento em blocos tegumentar 110 Estaquiose 59
casualizados 193 Dormente 110-117, 120 Estratificação 97-99, 101, 103, 106, 141
Delineamento experimental 189 Dreno 54-55 Estresse 53, 55, 59, 61, 152
Delineamento inteiramente Dypterix alata 294 osmótico 215
casualizado 190 Dysoxylon cauliflorum 85 Estrofíolo 126, 140
Denaturação 59-60 Éter 129, 133
Dentaria 70 Etileno 116-119, 121
Desenovelamento 60 E ETR1 118, 121
Desfoliação 55 EIN3 118 Eucalyptus 284
Desidratação 56, 59-60, 62-63 Eixo embrionário 53, 110, 112-113 Eucalyptus sp. 287, 294
Desmodium 81 Elaeis guineensis 104 Eugenia dysenterica 141, 226
Desmodium spp. 226 Elaeis sp. 62 Eupatorium vauthierianum 115
Desnaturação de proteínas 216 Elaiossomo 227 Euphobiaceae 226
Dessecação 51-54, 56-62, 149, 151- Eleagnus angustifolia 130 Euterpe edulis 246
153, 160 Elementos seletivos 54 Euterpe espiritosantensis 292
Dessecação de maturação 149 Elytraria acaulis 84 Evento pós-germinativo 51-52, 58, 159
Deterioração 63 Embalagem 272, 280 Exclusão 252
Devoniano 120 Embebição 61-62, 125-126, 130, Expressão de genes 51-52, 56, 58,
Diásporo 69, 225-227, 230-231, 251 132-133, 149-157, 160 61, 160
Dicotiledônea 55, 150, 158 Embrião 27, 109-116, 120-121 Expressão gênica 117, 119
Didymopanax morototoni 107, 214 imaturo 110-112, 115 Exsudados 257, 259
Dimorphandra mollis 105, 132, 142, 176 Embriogênese 26, 111-112, 116, 120 Extrações 256
Dipteracanthus patulus 80 Endosperma 125, 130-131, 150, 157-160
Dipterocarpaceae 228 Endosperma 51, 53-56
Dipteryx alata 107, 140, 286 lateral 160 F
Dispersão 251 Endozoocoria 226 Fabaceae 126, 130
Dispersão de sementes Endo-β-mananases, expansinas 118 Faboideae 228
primária 227-228 Energia livre 149 Falso barbatimão 105
secundária 227-228, 230 Ensaios fatoriais 194, 204 Fase G1 156
Dissacarídeo 59 Entalpia de ativação 216 Fase G2 156
Distribuição 252-254 Enterobacter 261 Fase I 150-151, 160
normal 217 Enterolobium contortisiliquum 107, 132 Fase II 151-152, 157, 160
temporal da germinação 211, Envigoradas 161 Fase III 151-152, 160
218-219 Envoltórios 125-128, 130, 132-133 Fase mitótica 156, 158
Diszoocóricas 227 Enzimas 216, 253 Fase S 156
DNA 52, 151, 155-157, 160 hidrolíticas 157-159 Fator de transcrição 58
DNA-complementar (cDNA) 160 Epidendrum 26 Faveira 129, 132
Dormência 51-53, 56-59, 63, 95-108, Epidendrum scutella 27 Fecundação 18
125-126, 130-131, 158-160, 210 Epizoocoria 226 Feijão 56
absoluta 95-97, 101 Equilíbrio higroscópico 267-268, 270 Fenótipos 58
cíclica 102 Erechtites valerianaefolia 114-115 Fertilização 120
de cobertura 99, 102 Eremanthus glomerulatus 226 Ficaria 70
embrionária 102, 104, 109-110, Eriotheca sp. 226 Ficus 226
113-114, 116, 118 Erithrina speciosa 105 Ficheira 105
320 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Fitina 33, 34 Giberelinas (GAs) 116, 118-119, 142 Hordeum vulgare 31, 170
Fitocromo 116-117, 119, 121, 143 Gimnospermas 53 Hormônio 56-57
Fito-hormônios 113-114, 116-121 Ginófito 16 Hortonia 85
Floema 53-55, 63 Ginogênese 18 Hura 71
Floração 119 Ginosporângio 16 Hymenaea courbaril 44, 105-107, 137,
Florescimento 55, 63-64 Ginósporo 16 177, 183
Florestas Girassol 112-113
atlântica 228-229, 232-233 Gleditsia amorphoides 107
florestas de galeria 229 Glicólise 116 I
montana 232 Glicose 55, 59 Ilex 112
tropicais secas 228 Glioxilato 179-181 Ilex paraguariensis 97, 107, 111, 115, 258
Fogo 126, 128, 132 Glioxissomos 180-181 Imaturidade do embrião 110-112
Fonte 54-55 Globulina 47-48 In vivo 156
Formas de vida 228, 231 Gluma 125 Inativação de genes 58
Fosfatases 117 Glutamina 55 Indigofera hirsuta 43
Fosfato 261 Glutelina 47-48 Indigofera truxillensis 226
Fosfolipídeos 60, 152 Glycine max 31, 165, 170, 267, 285 Inflorescência 63-64
Fotoblastimo 143 Gossypium arboreum 78 Inga 165
Fotorreversibilidade 143 Gossypium herbaceum 78 Inga affinis 247
Fotossíntese 159 Gossypium hirsutum 78, 80, 84, 194, 285 Inga spp. 287
Fr/Fre 252 Gossypium sp. 78, 267 Inibidores 125-126, 130-132
Fragmento 233 Gradiente 54 inositol-3 fostato 117
Fraxinus americana 130 Grãos de pólen 53 Insetos 253, 260
Fraxinus excelsior 112 Graus de liberdade 195, 200 Integumento 59
Frequência relativa de germinação Gravitropismo 258 Interação 251-252, 256
217-218, 220 Grevílea 130 Interferência 251-252
Fruto carnoso 58, 63 Grevillea 130 Intolerância à dessecação 62, 151
Frutos Grevillea linearifolia 130 Isoplex canariensis 80
bacóides 227 Grevillea robusta 81 IVE 211
drupóides 227 Grevillea wilsonii 130 IVG 211-212
Frutose 55, 59 Guanxuma 97 Ixorhea tschudiana 24
Fumigações 256
Fumo 130
Funículo 63, 73 H J
fus3 58 Haemanthus katherinae 81 Janusia schwannioides 226
Fusão de membranas 60, 62 Halophila ovata 81 Jatobá 105
fusca 58 Haplóide 53 Jatropha 243
Haustório 81 Juncus prismatocarpus 81
Hedychium gardnerianum 102
G Helianthus annuus 112
Galactano 44 Heracleum sphondyllum 104 K
Galactomanano 41-44, 49 Herbívoros 228-229, 233 Kielmeyera coriacea 225, 245
Gametogênese 17 Heterotrófico 159 Kinase 117-121
Gaussiana 219 Hevea brasiliensis 62, 247 Klugia notoniana 80
GCR1 120 Hidratação 50-61, 149-150, 152-153, 160 KNO3 115-116
Gene 51-52, 56-58, 61, 112-113, 117- Hidrocoria 226
120, 159-160 Hidrofílica 59, 152-153
Genótipo 58-59 Hidrofóbica 153 L
Geotrópica 255 Hidrolases 130 Lactacistina 119
Geraniaceae 126 Hilo 73, 126-127 Lactuca sativa 31, 97, 103, 130, 143,
Gerbox 255 Hipótese da membrana 116 155, 255, 291
Gergelim 130, 216, 255 Hipótese de colonização ou Laguncularia racemosa 226
Germinabilidade 56-57, 200, 210- perturbação 229-230 Lansium 85
215, 217 Hipótese de dispersão direcionada 230 Lathyrus nervosus 137
Germinação 51-53, 56-58, 61-63, 151- Hipótese de fuga 229-230 Lathyrus variegatus 84
152, 156-160, 163-165, 169-172, Hipótese dos anestésicos 117 LEA 52, 57, 59-62
174-179, 181, 183, 227, 229-232 Hipótese nula 201 Leafy cotyledon 58
precoce 56 Histodiferenciação 52-53, 57 LEC1 58
Germoplasma 62 Homocedasticidade 198 lec1 58-59
GERMINAÇÃO 321

lec2 58 Melilotus alba 140 Nitrificação 261


Leguminosae 241 Melothria heterophylla 81 Nitrobacter 261
Lema 125, 130 Melothria maderaspatana 81 Nitrogênio 252, 259-261
Leonurus sibiricus 102 Membranas 109, 116-117 Nitrosomas 261
Leptocúrtica 219 Mendicago sativa 130 Nutrientes 252, 258-259
Leucaena leucocephala 49, 72, 288 Mensageiros secundários 253
Lilaeopisis 71 Mentzelia laevicalulis 80
Liliacaeae 126 Mesa de gravidade 275-276 O
Língua-de-vaca 97 Metabolismo 52-53, 61 Ocotea corymbosa 138
Linum usitatissimum 267 celular 113, 116-117 Ocotea odorifera 107
Lipídeos 32-34, 37, 44-46, 48, 53, secundário 252, 259 Ocotea porosa 107, 286
155, 163, 166, 178, 180-182 Miconia albicans 245 Ocotea puberula 71, 103, 107
Lipoxigenase 117 Miconia cinnmomifolia 107 Ochroma pyramidale 107
Lixiviação 59, 64, 142, 152-154 Miconia chamissois 115 Oleosinas 46
Lixiviado 252, 256, 259 Miconia spp. 226 Oligossacarídeos 59-62, 155
Lomatia polymorpha 81 Micrópila 74, 126-127, 130, 158 Ononis sicula 99
Longevidade 56, 59-60, 62-63, 231-233 Microrganismos 251-253, 258-260 Oosfera 16
Lote 189 Microtúbulos 156 Opuntia 86
Luffa aegyptica 81 Milho 51, 55, 57-58, 63 Ormosia paraensis 226
Lulinius varius 128 Mimosa 243 Ornithopus compressus 128
Lupinus 44, 178 Mimosa bimucronata 87, 107, 142, Ornitocórica 227
Lupinus angustifolius 178 214-215, 253-254, 259, 261 Orquídeas 226
Lupinus arboreus 105 Mimosa caesalpiniaefolia 129, 139 Orthocarpus luteus 80
Lupinus polyphyllus 88 Mimosa pudica 81 Oryza sativa 31, 163, 170, 267
Luz 252 Mimosa scabrella 107 Osmótico 54-55, 59
Luz vermelho-distante 159-160 Mimosa sp. 243 Ovário 55, 72
Lycopersicom esculentum 31, 51, 57, 98, Mimosoideae Oxidante 62
101, 118, 130, 255, 267, 285, 291 Parapiptademia zehntneri 226
Lycopersicon sculentum 156 Mirmecocórica 227, 231
Mitose 151, 156-157 P
Mobilização 163-168, 171-172, Paineira 127, 132
M 174-175, 177-183 Palha 129
Mabea ocitendalis 239 Modelo matemático 191 Paliçádico 126
Maçã 112-113, 116 Morfogênese 52-53 Papaver somniferum 260
Macroesclereídes 126, 129 Mostrada 129 Papilionoideae
Magonia pubescens 105 mRNA 51-52, 61 Dalbergia violaceae 226
Malpighiaceae mRNAs 109, 114, 120 Parapiptademia zehntneri 226
Baristeriopsis latifolia 226 Mucuna preta 127 Parapiptadenia rigida 288
Janusia schwannioides 226 Mutantes 51, 57-59 Parapiptadenia spp. 287
Malvaceae 126, 232 Myosporaceae 130 Parede celular 32-34, 40-44, 49, 55,
Mamaliocórica 227 Myracrodruon urundeuva 107, 226, 244, 294 150, 157, 165, 172-176, 183
Mananases 130 Myrciaria cuspidata 255 Parkia pendula 111, 115
Mangifera indica 62 Myroxylon peruiferum 294 Parte aérea 258-259, 261
Manguezais 226 Myrtaceae Paspalum 71, 130
Manilkara salzmani 288 Eugenia dysenterica 226 Patógenos 225, 229, 231, 233, 253
MAPKs 117-118 Pavonia spp. 226
Máquina de ar e peneiras 273-274 Pedicelo 55, 63
Maricá 253-254 N PEG 6000 258-259, 261
Massa seca 257-258 Najas flexilis 81 Pêlos absorventes 258
Maturação excessiva 63 Najas marina 81 Peltophorum dubium 107, 128, 133,
Maturidade de massa 63 Nastismos 119 214-215
Maturidade fisiológica 63 Necrose 253 Peltophorum sp. 129
Maxixe 97 Nectandra lanceolata 107 Pentose-fosfatos 116
Mecanismo de ação 258-259 Nectandra megapotamica 71 Percolado 256
Mega Pascal (MPa) 160 Neuregelia cruenta 115 Pereskia acuelata 213
Megagametófito 53 Nicotiana tabacum 58, 118, 130 Pericarpo 55-56, 125, 130-131, 149-
Melampyrum lineares 80 Nicotinamida adenina de fosfato 150, 157
Melão 59-60, 63-64 (NADPH) 155 Perisperma 84, 150, 157
Melastomataceae 232 Nitrato 116-117 Peroxidase 131
322 FERREIRA & BORGHETTI (ORGS.)

Persistência 259 Prosopis juliflora 127 Ricinus comunis 87


Peso seco máximo 56, 63 Protaceae 130 Ritmos circadianos 119
pH 252, 256 Proteasoma 119 RNA 155-156
Phaseolus 89 Proteínas 52-53, 55, 57, 59-62, 109, RNA mensageiro 155
Phaseolus coccineus 88 113-114, 116-121, 150-152, 155- Rosa canina 130
Phaseolus lunatus 126 156, 159, 163, 166, 167, 170-172, Rosa rugosa 105
Phaseolus vulgares 31, 56, 87-88, 152, 180-184, 216 Rosaceae 130
163, 267 Proteínas de reserva 46-48 Rourea induta 245
Phoenix dactylifera 103, 165, 174 Proteinases 118-119 Ruellia tuberosa 80
PHYA 119, 121 Proteínas-G 117-118, 121 Ruído informacional 253
Phytelephas macrocarpa 174 Protium heptaphyllum 247 Ruído térmico aleatório 221
Picea glauca 130 Protrusão 151-152, 156-160 Rumex 141
Pimenta 130 Prunus domestica 130 Rumex obtusifolius 97, 141-143
Pinus 284 Pseudobombax pubescens 226
Pinus cariabaea 288 Psidium 85
Pinus elliottii 291 Psychotria leicocarpa 115 S
Pinus spp. 141 Psychotria spp. 226 Sacarose 55, 59-60, 153, 159
Piper 103 Pteris denticulata 200 Saco embrionário 72
Piptadenia gonoacantha 165, 183, 287 Pterodon pubescens 288 Salvia hispanica 212, 213, 221
Pirus malus 112-113 Pterogyne nitens 127 Sansão do campo 129
Pisum sativum 31, 51, 267 Pureza genética 284 Sapindaceae 228
Planta receptora 258 Purskia 78 Saurocórica 227
Planta-mãe 109-110, 112, 116 Pyrus 141 Saxifraga 70
Plantas mutantes 118, 120-121 Scleria foliosa 81
Plântula 152, 155, 159, 225, 228- Sclerolobium paniculatum 107
230, 232, 233 Q Scrophularia marylandica 80
Platicúrtica 219 Qualea grandiflora 107 Schefflera morototoni 214
Platyciamus regnelli 287 Qualidade genética 284 Schinopsis brasiliensis 244
Platystemma violoides 80 Quebra da dormência 137 Schizolobium atterrimum 127
Ploidia 79 Quercus 71 Schizolobium parahyba 105-107, 141
Plumbago 86 Quiescência 52, 58, 61, 95-97, 103- Sebastiania 71
Plúmula 112 104, 106 Secagem 53-54, 56, 60-61, 63, 267-272
Poaceae 232 Quiescente 110 Secale cereale 170
Pólen 53 Quiropterocórica 227 Seiva 53-54, 63
Polietilenoglicol 160 Semente 51-64, 149-161, 163-167,
Polígonos de freqüência 219 169, 170, 172-184
Polinização 18 R Sementes alóctomas 231
Polissomos 151, 155 Racemo 64 Sementes autócomas 231
Polygonum 23 Radicais livres 62 Sena selvagem 129
População 189 Radicais reativos de oxigênio 62 Senna 127, 129
Porophyllum lanceolatum 141, 144 Radícula embrionária 155, 157-158 Senna macranthera 72-77, 80-82, 81,
Pós-abscisão 61 Radículas 253, 255-259 87, 90, 129, 139
Pós-maturação 97-98, 104 Rafe 78 Senna marilandica 129
Potamogeton nodosus 81 Rafinose 34-35, 59 Senna multijuga 107
Potencial de pressão (Ψp) 150-151 Raiz 257-259 Senna obtusifolia 129
Potencial hídrico (Ψ) 149-153, 160 Rapanea ferruginea 107 Senna occidentalis 43-44
Potencial matricial (Ψm) 150-151, 160 Raphanus sativus 156 Seqüestro de oxigênio 253
Potencial osmótico (Ψπ) 149-151, Recalcitrantes 61-62 Serenoa repens 105
157, 160, 259, 261 Receptores 253, 258 Serina-treonina kinase 118
Pouteria platyphylla 246 Regeneração 225, 232, 251 Serjania 71
Pouteria rostrata 246 Reparo 52, 61-62 Sesamum indicum 130, 214, 216, 255
Predação de plântulas 233 Repetição 190 Sesbania marginata 175-176
Predação de sementes Reserva 31-41, 44-49, 109, 114, 118 Sesbania virgata 183
pós-dispersão 233 Resteva 252 Setaria 130
pré-dispersão 233 Restinga 114-115, 213 Sida 71
Predadores 225, 233 Restinga arbustiva 229 Sida cordifolia 97
Primatocóricas 227 RGL2 118, 120-121 Sida spinosa 99
Priming 152, 159-161 Rhizophora mangle 226 Sida spp. 226
Prolamina 47-48 Ricinus 85 Sigmóide 217
GERMINAÇÃO 323

Simplástica 54-55 Tempo médio 200, 211, 214-221 Ungulados 227


Sinapis arvensis 98, 129 Tempo médio de germinação 292 Unidades de dispersão anemocóricas
Sincronização 221 Terpenos 252, 259 acrobata 226
Síndromes de dispersão 225-229 Testa 54, 56, 58-59, 74, 149-150, autogiro 226
Singamia 21 157-158 autogiro rotativa 226
Síntese protéica 116 Teste de condutividade elétrica 293 flutuante 226
Sisymbrium officinale 101, 105 Teste de envelhecimento 291 helicóptero 226
Sitiens 57-58 Teste de frio 291 planadora 226
sitw 57 Teste de germinação 285
Skotomorfogênese 120 Teste de homogeneidade 198
Solanaceae 126, 232 Teste de tetrazólio 287 V
Solanum 115 Teste de umidade 293 Vacúolo 53, 61-62
Solanum lycocarpum 115, 219, 226, 255 Teste de vigor 290 Valleriana 71
Solanum tuberosum 36 Testes de normalidade 197 Variância da velocidade média 211
Solo 251-252, 256-261 Testes não-paramétricos 203 Vegetativo 58
Soluções hidropônicas 258 Testes para comparações múltiplas 204 Velocidade 253, 255, 259
Solutos 54-55, 62, 64 Tetragonolobus purpureus 43 Velocidade de germinação 211-212,
Solventes orgânicos 257 Tetranema mexicanum 80 214, 216
Sorteio 191 Tetrazólio 210, 288 Velocidade média 200, 211, 214-216
Spergularia diandra 100 Theobroma cacao 62 Verbascose 59
SPY 120-121 Thumbergia alata 80 Vicia 98, 128
Stenorhynchus 19 Tibouchina 97, 103, 107 Vicia angustifolia 128
Sterculiaceae 228 Tibouchina granulosa 287 Vicia faba 84
Streptocalyx floribundus 115, 217 Tibouchina mutabilis 287 Vicia graminea 213
Stricto sensu 53, 159 Tibouchina sp. 97, 103, 107 Vicia grandiflora 128
Strutanthus 21, 25 Tillia 71 Vicia sativa 128
Stryphnodendron adstringents 129 Tipo selvagem 57-59 Vigna mungo 172
Stryphnodendron barbadetimam 140 Tipuana 71 Vigor 56, 63, 261, 290, 292
Stryphnodendron polyphyllum 127 Tolerância à dessecação 53, 56-57, Virola surinamensis 288
Stryphnodendron pulcherrimum 129 59-62, 151, 153 Vírus 253
Stylosanthes humilis 128 Tomate 51, 57, 59-60, 253, 255 Vismia 243
Styzolobium aterrimum 138 Tradução 253 Vitis vinifera 103, 141
Suberina 126 Transcrição 253 Vitrificação 60
Substrato 256-258 Transdução de sinais 117, 119-121 Viviparidade 98, 112
Sucessão 231-232 Transformação 259 Vochysia bifalcata 107
Supermaturação 63 Transformação de dados 201 Volátil 257
Swartzia polyphylla 226 Transição de fase 216 vp1 58
Syagrus romanzoffiana 285 Transparent testa 59
Tratamento luminoso 217
Trealose 59-60 X
T Trema micrantha 107 Xanthium 130
Tabebuia avellanedae 247 Trichosanthes anguina 81 Xanthium strumarium 100-101, 141
Tabebuia roseo-alba 294 Trifolium pratense 105 Xenófito 79
Tabebuia spp. 225, 288 Trifosfato de adenosina (ATP) 153 Xilema 53-54
Talauma ovata 107, 247 Trigo 51, 58 Xiloglucano 36, 41-42, 44, 49
Talinum patens 217 Trigonella foenum-graecum 41, 43-44, 175 Xylopia aromatica 226
Tamarindus indica 44, 177 Trillium undulatum 81
Tapinostema 25 Triticum aestivum 31, 36, 51, 163,
Taraxacum megalorrhizon 101 170, 267, 285 Z
Taxa 251 Triticum spp. 130 Zea mays 31, 51, 98, 152, 163, 267, 285
Taxus baccata 130 Tropaeolum majus 177 Zeaxantina epoxidase 58
Tecido locular 56 Tt 59 Zoocórica 227-230, 233
Tégmen 74 Tubulina 156
Tegumento 54-55, 59, 64, 139, 149,
155, 157
Temperatura 127-128, 130, 132, 252, U
254-255 Ulmus 71
Tempo de residência 259 Umbelas 63

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