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Página Textos da Reforma

Sola Scriptura, Sola Gratia, Sola Fide, Solus Christus, Soli Deo Gloria
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Responsável: Dawson Campos de Lima
E-mail: dawson@samnet.com.br

PROPOSTAS PARA MELHORAR A SITUAÇÃO DA IGREJA


Philipp Jakob Spencer, Th.D.

1. Uso mais extensivo das Escrituras


É necessário pensar como a Palavra de Deus deve ser usada
mais extensivamente em nosso meio. Sabemos que, por natureza,
não somos bons. Se algum bem existe em nós, vem de Deus. E o
meio poderoso para isso acontecer é a Palavra de Deus, uma vez
que a fé se desperta pelos Evangelhos, a lei regulamenta as boas
obras e freia os nossos impulsos mundanos. Quanto mais perto
estamos da Palavra de Deus, mais fé e mais frutos teremos.
Pode parecer que estamos familiarizados com a Palavra de
Deus, pois em muitos lugares existem pregações diárias ou muito
freqüentes. Não desaprovo a pregação na qual é lido e explicado
um texto bíblico, pois eu mesmo faço isso. Mas não é o suficiente.
Em primeiro lugar, sabemos que “toda a Escritura é inspirada por
Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção,
para a educação na justiça” (II Tm 3.16). Toda a Escritura, sem
exceção, deve ser conhecida pela comunidade, se quisermos ter
todos os benefícios necessários. Se colocarmos juntos todos os
textos bíblicos lidos e explicados a uma comunidade, ao longo de
muitos anos, apenas uma pequena parte da Escritura será
compreendida. O restante não é ouvido pela comunidade, ou é
ouvido apenas um ou outro verso citado isoladamente, no decorrer
de uma prédica, sem a indispensável explicação do contexto. Em
segundo lugar, o povo tem pouca aptidão para compreender o
significado das Escrituras, exceto naqueles textos a ele expostos.
Menos capacidade ainda tem para praticá-las, como a edificação
espiritual de cada um requer. Apesar de a leitura bíblica, a sós,
em casa, ser uma prática altamente recomendável, não é
praticada pelo povo.
Deve-se pensar que se não é chegada a hora de a Igreja ser
alertada a apresentar ao povo novas maneiras de ler as Escrituras,
que não seja os costumeiros sermões baseados em textos do
calendário litúrgico anual.
Isso deve ser feito, em primeiro lugar, pela leitura sistemática
das Sagradas Escrituras, especialmente o Novo Testamento. Não
será difícil para um chefe de família Ter uma Bíblia, ou pelo menos
um Novo Testamento, e lê-lo diariamente para sua família. Se não
puder ler, qualquer outro membro da família pode fazê-lo [...].
Uma segunda sugestão a ser feita para encorajar o povo a ler
privativamente a Bíblia: nos cultos públicos, os livros seriam lidos,
um após o outro sem maiores comentários (a menos que alguém
queira apresentar um breve resumo). Isso seria feito para a
edificação de todos, em especial para aqueles que definitivamente
não podem ler ou não têm o seu próprio exemplar das Escrituras.
A terceira sugestão é a reintrodução do antigo e apostólico
modelo de assembléia da Igreja. Além de nossos costumeiros
cultos, outras reuniões seriam realizadas, como o apóstolo Paulo
as descreve em I Coríntios 14.26-40. Ninguém se levantaria para
pregar, mas aqueles abençoados com dádivas e conhecimentos
podem falar e apresentar opiniões piedosas, fazendo sugestões a
seres eventualmente discutidas por todos. Contudo, isso deve ser
feito em ordem, para evitar tumulto e confusão. Os diversos
pastores do local têm a obrigação de estar presentes à reunião,
ou, pelo menos, alguns irmãos mais instruídos nas letras
sagradas, reunidos sob a liderança de um pastor piedoso, a fim de
aumentar seus conhecimentos das Escrituras. Lendo-as junto e
discutindo fraternalmente o sentido de cada verso, serão capazes
de nele discernir seu significado e utilidade para a edificação de
todos. Aqueles que não estiverem satisfeitos com a compreensão
da matéria, poderiam expressar suas dúvidas e pedir mais
explicações. Por outro lado, os que tivessem feito mais progresso
(incluindo os pastores) teriam o direito de expor ao povo sua
compreensão do texto. Então, tudo o que for exposto, na medida
em que acordam com o Espírito Santo, nas Escrituras, deve ser
examinado pelos outros irmãos (especialmente os pastores) e
aplicado para a edificação de todos os que freqüentam a reunião.
Tudo deve ser preparado, levando-se em conta a glória de Deus, o
crescimento espiritual dos participantes e também suas limitações.
Qualquer sinal de discórdia, polêmica, autoprojeção, deve ser
evitado ou eliminado, especialmente pelo pastor que dirige a
reunião.
Esperam-se grandes benefícios dessas reuniões. Os pastores
conhecerão melhor os membros de sua comunidade, suas
fraquezas e crescimento na doutrina e na piedade. Um elo de
confiança entre pastor e comunidade pode ser estabelecido, o que
será de interesse para ambos. O povo tem uma excelente
oportunidade para exercitar seu amor pela Palavra de Deus, fazer
perguntas (que na maioria das vezes não têm coragem de discutir
com seus pastores) e obter respostas. Em pouco tempo, hão de
crescer em suas experiências pessoais, tornando-se capazes de
dar melhor instrução religiosa a seus filhos e empregados. A
ausência de tais reuniões, as prédicas não são compreendidas
adequada e plenamente, pois não há tempo e oportunidade para a
reflexão ou, quando o sermão termina, grande parte de seu
conteúdo já foi esquecido (o que não acontece numa discussão). A
leitura da Bíblia, pessoal ou em casa, onde quem pode ajudar na
compreensão do significado e propósito de cada verso, está
ausente, o leitor não consegue a explicação que gostaria de Ter. O
que falta nesses momentos (pregação pública e leitura pessoal)
pode ser encontrado nas reuniões propostas. Não será uma carga
pesada para os pastores, nem para o povo, mas assim estará
sendo cumprida a exortação do apóstolo Paulo (Cl 3.16): “Instrui-
vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria, louvando
a Deus com salmos, hinos e cânticos espirituais, com gratidão em
vossos corações”. De fato, sejam entoados cânticos nas reuniões,
para o louvor de Deus e inspiração dos participantes.
O diligente uso da Palavra de Deus não consiste apenas em
ouvir sermões, mas, também, na sua leitura, meditação e
discussão (Sl 1.2), principais instrumentos de reforma dos
costumes religiosos e sociais, que ocorram da forma proposta ou
de qualquer outra. A Palavra de Deus é a semente da qual todo o
bem cresce. Se conseguirmos que o povo busque, com diligência,
no livro da vida, sua alegria, a vida espiritual, será
maravilhosamente fortalecido e transformado.
O que mais Lutero queria era conduzir o povo à diligente
leitura da Bíblia. Hesitou muito em deixar seus escritos serem
publicados, com receio de que isso desviasse o povo da leitura da
Bíblia.
Um dos principais erros que levou a política papal ao fracasso
foi conservar o povo na ignorância e controlar as consciências,
proibindo a leitura da Escritura (na medida em que ainda podem,
essa proibição é mantida). Por outro lado, um dos principais
propósitos da reforma foi devolver ao povo a Palavra de Deus,
escondida na sacristia (e a Palavra foi o meio mais poderoso pelo
qual Deus abençoou a reforma). Essa continua sendo o principal
instrumento, agora que a Igreja deve ser colocada em melhores
condições, superar a aversão que muitos têm da Escritura e
negligência de seu estudo, estimulando o buscar ardente e zeloso
de seus ensinamentos.

2. Exercitamento do sacerdócio universal


Martinho Lutero sugere um outro meio, completamente
compatível com o primeiro. A Segunda proposta é o
estabelecimento e prática diligente do sacerdócio universal. Não se
podem ler os escritos de Lutero, com certo cuidado, sem se
observar que ele advoga o sacerdócio universal, segundo o qual
todos os cristãos (e não apenas pastores) foram feitos sacerdotes
pelo Salvador, ungidos pelo Espírito Santo e dedicados para o
exercício de atos espirituais-sacerdotais. O apóstolo Pedro não
estava se dirigindo aos pastores quando escreveu (I Pe 2.9): “Vós
sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade
exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que
vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz...” Que quiser
saber com profundidade qual a opinião de nosso reformador sobre
as funções espirituais, precisa ler seus tratados aos boêmios (De
instituendis ministris Ecclesiae ad Clarissimum Senatum
Praggensem Bohemiae, W A 12,169-196) sobre como os pastores
devem ser escolhidos e empossados em suas funções. Ali se pode
ver como ele demonstra, esplendidamente, que as funções
espirituais espirituais estão abertas a todos os cristãos, sem
exceção. Apesar de as tarefas regulares e públicas serem
atribuídas aos pastores escolhidos para isso, podem também ser
desempenhadas por outros, em casos de emergência,
especialmente aquelas exercitadas nos lares.
Por uma obra do amaldiçoado demônio, junto ao papado, todas
as funções foram atribuídas, com exclusividade, ao clero,
excuindo-se delas o resto da cristandade, com se não fosse
adequado aos leigos o estudo da Escritura, a instrução, a
admoestação, conforto do próximo. Não se podia fazer
privativamente aquilo que os pastores realizavam em público,
como se fosse exclusividade do clero. Como conseqüência, os
leigos se afastaram daquilo que, por direito, lhes pertencia,
ocorrendo grandes ignorâncias e desordem na vida do laicato. Por
outro lado, os membros do estamento espiritual podiam fazer o
que queriam, pois ninguém se importava, nem levantava objeção.
Esse pressuposto monopólio do clero, juntamente com a proibição
de ler a Bíblia, é um dos principais instrumentos pelos quais o
papado estendeu seu poder sobre os pobres cristãos e, se as
condições lhe forem favoráveis, ainda os oprime. O maior
sofrimento que se pode causar ao papado é, como Lutero fez,
proclamar que todos os cristãos foram chamados para o
exercitamento das funções espirituais (apesar de não chamados
para o exercitamento público das funções, pois isso exigiria
autorização prévia da comunidade). Isso não lhes é permitido,
mas, se desejam ser verdadeiramente cristãos, são obrigados a
desempenhar tais funções.
Cada cristão não é só compelido a oferecer-se a si mesmo e o
que possui, suas orações, ações de graças, boas obras, ofertas
etc; como, também, a estudar com seriedade a Palavra do
Senhor, ensiná-la a outros, com o Dom que lhe foi dado,
especialmente os que habitam sob o seu teto, orientar, exortar,
converter e edificá-los; observar suas vidas, orar por todos e, na
medida do possível, preocupar-se com a salvação deles. Se isso é
verdade no que se refere ao interesse do cristão para com os
outros, também é verdade no que se refere a si mesmo. Ele deve
cuidar-se e dedicar-se ao que é importante para a sua própria
edificação. Por outro lado, a complacência existente no momento
decorre do fato de que esse ensinamento não é praticado.
As pessoas pensam que isso não lhes diz respeito. Imaginam
que, como eles foram chamados para seus trabalhos, no
escritório, negócio ou comércio, e como o pastor não foi chamado
para essas coisas, nada têm a ver com as coisas espirituais. O
pastor, segundo eles imaginam, é chamado para o exercitamento
dos atos dessa natureza, ocupando-se com a Palavra de Deus,
orando, estudando, ensinando, admoestando, confortando,
orientando, etc., enquanto ele não se envolvem com tais coisas.
Imaginam que estariam se envolvendo indevidamente nas tarefas
exclusivas do pastor. Nem se menciona o fato de pensarem que
não devem cuidar de seus pastores, admoestando-os
fraternalmente quando eles negligenciam algo, e apoiando-os em
seus esforços.
Nenhum pastor será prejudicado se os membros de sua
comunidade exercitarem esse sacerdócio universal. Uma das
razões pelas quais o pastor não pode fazer tudo, é porque se
sente muito fraco e sem apoio. É incapaz de fazer tudo o que deve
ser feito para a edificação de muitas pessoas, confiadas ao seu
cuidado pastoral. Todavia, se os sacerdotes leigos fazem a sua
parte, o pastor, como dirigente e irmão mais velho, sente-se
apoiado e fortalecido para realizar suas obrigações e atos
pastorais. Assim, o fardo não será tão pesado.

3. Prática e conhecimento do Cristianismo


Juntamente com essas duas propostas, existe uma terceira: o
povo deve ser levado e acostumado a crer que isso não são meios
suficientes para o conhecimento da fé cristã, pois o Cristianismo
consiste fundamentalmente em prática. O nosso Salvador
repetidamente identificou o amor com a marca distintiva dos
cristãos (Jo 13.34-35; 15.12; 1 Jo3.10,18; 4.7-8,11-13,21). Em
sua velhice, João costumava dizer pouco mais do que isso: “Filhos,
amai-vos uns aos outros” (Jerônimo.In: Comentário da Epístola
aos Gálatas, III,6). Seus discípulos e ouvintes queriam saber a
razão dessa repetição interminável e perguntaram-lhe por que
insistia sempre nessa exortação. Ele respondeu: “Porque é o
mandamento do Senhor e é suficiente, se for cumprido”. Sem
dúvida, o amor é tudo na vida do homem que tem fé e que é salvo
por sua fé. O cumprimento da lei de Deus é o amor.
Se podemos despertar um ardente amor entre os cristãos,
primeiramente aos irmãos, depois a todos os homens (pois os
dois, amor fraternal e amor, em geral, devem complementar-se
segundo 2 Pe 1.7) e colocar isso em funcionamento, praticamente
tudo o que desejamos será realizado. Todos os mandamentos são
resumidos no amor (Rm 13.9). O povo não pode apenas ser
ensinado a amar o próximo, nem só advertido sobre os perigos do
amor-próprio, mas, sobretudo, exortado a praticar o amor. Os
cristãos devem acostumar-se a não perder oportunidade de servir
o outro com atos de amor e a sondar seus corações para saber se
o motivo que os impulsiona é o verdadeiro amor, ou qualquer
outro. Se não agredidos, ofendidos, convém controlarem seu
sentimento de vingança, abrirem mão de seus direitos e temerem
que seus corações possam traí-los com sentimentos de
hostilidade. Devem buscar oportunidade de fazer o bem a seus
inimigos, a fim de que tal autocontrole possa ferir o velho Adão,
sempre inclinado à vingança, e implantar no coração de seus
inimigos o mesmo amor que os move.
Para esse fim e para o crescimento do Cristianismo, seria bom
se aqueles que resolverem seguir fielmente o caminho de Cristo,
entrarem em contato confidencial com seus confessores ou com
outros cristãos experientes e sábios, contando suas novas
maneiras de viver, as oportunidades que têm de praticar o amor
cristão e como foram aproveitadas ou negligenciadas. Isso é
importante, pois oferece a possibilidade de avaliar a própria
conduta e receber instruções sobre novas formas de
procedimento. Decidam-se firmemente a obedecer os conselhos
dados o tempo todo, de acordo com a vontade de Deus.
Se alguém ficar em dúvida sobre fazer ou não para o próximo, é
sempre melhor fazer do que deixar de fazê-lo.

[...]

6. Pregação e edificação
Além desses exercitamentos que pretendem desenvolver a vida
cristã dos estudantes, é necessário que os professores se
preocupem com aquilo que seus alunos vão precisar quando se
tornarem pastores. Por exemplo, treine-se o estudante a instruir
os ignorantes, consolar os enfermos e, especialmente, preparar
bons sermões. Seja-lhes mostrado que, no sermão, todas as
coisas devem convergir para um propósito. Como Sexta proposta,
a fim de que se encorage a Igreja Evangélica a buscar melhores
condições, eu diria que o sermão deve estar voltado para esse
propósito, e alcance o coração do ouvinte da maneira mais eficaz
possível.
Há provavelmente poucos lugares em nossa Igreja nas quais
não haja muitos sermões sedo pregados. Porém, as pessoas
piedosas reconhecem que pouco se tem aproveitado de tais
prédicas. Existem pregadores enchendo-se de tantas informações,
que convencem os ouvintes de que são homens muito instruídos,
contudo, os que os ouvem não conseguem entender o que dizem.
Incluem nelas muitas palavras estrangeiras, embora,
possivelmente, nenhum ouvinte conheça tais línguas. Muitos
pregadores não se preocupam com o assunto escolhido e em
desenvolvê-lo de tal modo que, pela graça de Deus, a
congregação possa dele aproveitar para a vida e a morte. Pelo
contrário, preocupam-se com a introdução, com sua boa forma e
com um clímax de efeito, e que as partes sejam tratadas de
acordo com as regras da oratória e cheias de beleza, etc. Isso não
pode acontecer. O púlpito é um instrumento divino para a
salvação das pessoas. Por isso, nele todas as coisas devem ser
direcionadas para esse propósito. As pessoas comuns, das quais a
comunidade é composta em sua grande maioria, não podem ser
esquecidas pelo pregador preocupado em agradar os letrados que
são poucos e, geralmente, não comparecem ao culto.
O Pequeno Catecismo, de Lutero (1529), que contém os
primeiros rudimentos do Cristianismo e do qual as pessoas
aprenderam a fé, deve continuar a se usado, só que mais
diligentemente na instrução das crianças e também dos adultos (a
kinderlehre era a reunião para estudos do catecismo, dirigido
especialmente para as crianças, feita no Domingo à tarde). O
pregador não pode abandonar essa prática. Pelo contrário, deve
lembrar às pessoas, em seus sermões, aquilo que aprenderam no
catecismo. Não precisa envergonhar-se de fazer isso.
Deixo de lado alguns comentários adicionais a respeito dos
sermões. Considero isso como fundamental: a nossa religião cristã
é composta de homens regenerados, cujas almas estão repletas
de fé e expressam-se em frutos da vida. Assim, o sermão não
pode Ter outro objetivo a não ser cultivar a fé e seus frutos. Por
outro lado, os preciosos benefícios de Deus, dirigidos ao homem
interior, devem estar presentes de forma que a fé se fortaleça
cada vez mais. Por outro lado, não podemos contentar-nos em
afastar as pessoas dos vícios exteriores e levá-los à prática de
virtudes exteriores, coisa que a ética dos pagãos também pode
fazer. Nosso objetivo é despertar e cultivar a fé e seus frutos.
Tudo aquilo que não proceder desse fundamento é mera
hipocrisia. Devemos, pois, acostumar as pessoas a voltarem-se
para as coisas interiores (amor a Deus e ao próximo) e depois
procurarem agir corretamente.
Enfatize-se que o significado divino da Palavra e sacramentos
se relacionam no homem interior. Então, não é suficiente ouvir a
Palavra com o ouvido exterior. Ela deve penetrar em nosso
coração para que possamos escutar o Espírito de Deus. Em outras
palavras, o Espírito fala ao nosso coração na medida em que nele
faz morada. O homem sente vibrante emoção e conforto no selo
do Espírito (Ef 1.14; 4.30) e no poder da Palavra. Igualmente, não
é suficiente ser batizado, pois o homem interior (onde Cristo é
colocado no ato do batismo – Gl 3.27) deve conservar e
testemunhar Cristo na vida exterior. Tampouco, não é suficiente
receber a Santa Ceia exteriormente, mas o homem interior deve
ser, em verdade, nutrido com aquele alimento abençoado. Da
mesma maneira, não é suficiente orar de modo superficial, só com
a boca, pois a melhor e verdadeira oração vem do homem
interior; ela tanto pode expressar-se com palavras, como pode
permanecer muda no fundo da alma. No último caso, Deus
encarregar-se-á de achá-la e levá-la ao seu trono. Finalmente, não
é suficiente adorar Deus num templo exterior, pois o homem
interior adora melhor a Deus em sua alma, aconteça isso num
templo exterior ou não (1 Co 3.16).
Concluindo, convoco insistentemente o gracioso Deus e doador
de todas as boas coisas, que no passado permitiu que a boa
semente de sua Palavra fosse semeada por seus fiéis servos, e
que poderosamente abençoou muitas daquelas sementes, caídas
em corações piedosos, para que dessem muitos frutos; [...] que
muitos, com corações piedosos, busquem a sua edificação, nos
domingos, nesses sermões e nas Escrituras Sagradas; possam,
finalmente, entregar a Deus os frutos produzidos, com ação de
graças. Oro, também, para que os pastores sejam reavivados em
suas pregações e voltam-se ao coração do Cristianismo [...] com
simplicidade e poder. Tudo seja para a glória de Deus e o
progresso de seu Reino, por amor de Jesus Cristo. Amém.

Frankfurt am Main,
24 de março de 1675.

SPENER, Pilipp Jakob.


Pia Desideria: um clássico do pensamento protestante.
São Bernardo do Campo: Imp. Metodista:
Programa Ecumênico de Pós Graduação em Ciências da Religião, 1985.

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