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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

FACULDADE DE FÍSICA

Renato Bertoni Lardosa Santos

Introdução à Espectroscopia Vibracional Raman.

BELÉM

2011
SUMÁRIO

Capítulo 1 – Introdução ........................................................................................ 1


Capítulo 2 – Arranjos Atômicos em Cristais
2.1 – Modelo Molecular Aproximativo para Vibrações............................... 4
2.2 – Movimentos Atômicos........................................................................ 8
2.3 – Arranjos Cristalinos............................................................................. 11
2.3.1 – A Rede Cristalina................................................................. 11
2.3.2 – A Rede Recíproca................................................................. 15
2.4 – A Célula de Wigner-Seitz................................................................... 17
2.5 – A Primeira Zona de Brillouin.............................................................. 18
Capítulo 3 – Vibrações em Redes e Ralações de Dispersão
3.1 – Vibrações em Redes............................................................................ 20
3.2 – Potencial Eletrostático entre Sítios da Rede........................................ 21
3.3 – Modos Normais de uma Rede e Relações de Dispersão..................... 22
3.3.1 – Cadeia Monoatômica............................................................ 23
3.3.1 – Cadeia Diatômica................................................................. 27
3.4 – Fônons................................................................................................. 33
Capítulo 4 – Simetria Molecular e Teoria de grupos
4.1 – Simetria Molecular.............................................................................. 35
4.1.1 – Elementos de Simetria.......................................................... 35
4.1.2 – Operações de Simetria.......................................................... 36
4.1.3 – Grupos de Ponto.................................................................... 40
4.2 – Teoria de Grupos................................................................................. 41
4.2.1 – Propriedades dos grupos....................................................... 41
4.2.2 – Caráter de Transformações e Representações de Grupos..... 42
4.2.3- Tabelas de Caracteres............................................................. 43
4.2.4.- Propriedades das Tabelas de Caracteres............................... 44
4.2.5 – Modos Normais em Espécies de Simetria............................ 45
Capítulo 5 – Teoria do Espalhamento Raman
5.1 – A radiação Eletromagnética e sua Interação com a Matéria............... 47
5.1.1 - Espalhamento de Radiação Eletromagnética......................... 50

i
5.2 – Teoria da Espectroscopia Molecular Vibracional Raman................... 51
5.2.1 – Descrição do Espalhamento Raman..................................... 52
5.2.2 – A Elipsoide de Polarizabilidade........................................... 57
5.2. – A Atividade em Raman...................................................................... 60
5.2.1 – Regras de Seleção para Níveis Fundamentais...................... 61
5.3 – Geometria da Atividade em Raman ................................................... 62
Referências Bibliográficas..................................................................................... 66
Apêndice A – Solução de Sistemas Acoplados Através de Modos Normais...... 69
Apêndice B – A Luz como Onda Eletromagnética.............................................. 75
Apêndice C - Modos Normais de Vibração e Atividade em Raman para 81
Apêndice D - História da Espectroscopia por Espalhamento de Luz............... 85

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CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO

A presente obra é fruto dos estudos realizados pelo autor como bolsista PIBIC/CNPq-
AF durante o período 08/2009 – 08/2011 na área de espectroscopia Raman na Universidade
Federal do Pará.

No primeiro ano de bolsa foram realizados estudos acerca de espectroscopia


vibracional Raman empregada no estudo de óleos vegetais, com ênfase nos óleos nativos da
região amazônica. E no segundo ano de bolsa, realizaram-se estudos sobre a espectroscopia
vibracional Raman empregada ao estudo de óxidos cerâmicos do tipo perovskita, com ênfase
no material cobaltita de lantânio, LaCoO3; ou seja, cristais de estado sólido.

Com isso, estudaram-se os dois tipos principais de materiais analisados por


espectroscopia Raman, óleos e cristais. Para cada tipo a técnica Raman difere apenas em sua
abordagem no que se refere à análise dos espectros obtidos. Ao se estudarem óleos, existe a
impossibilidade de previsão teórica a respeito do comportamento da cadeia molecular tal
como é feito para cristais, que posem ser analisados teoricamente como redes cristalinas.
Desta forma, a análise do espectro de óleos exige maior destreza por parte do
espectroscopista, pois se deve considerar que a complexidade da composição química do óleo
pode produzir espectros difíceis de discernir com relação a que se devem os picos exibidos.
Neste caso, a abordagem empregada é a se considerar não somente o que está no espectro,
mas também o que não está, assim como o que deveria estar, relacionando com estimativas da
composição química da amostra e suas respectivas porcentagens. Podendo estas estimativas
obtidas por alguma técnica auxiliar, por exemplo, a cromatografia. Esse tipo de abordagem é
essencialmente procurar os picos que se relacionem a grupos funcionais cujos picos
característicos já estejam tabelados, que são muitos. Esta técnica é a utilizada por químicos,
pois é a mais objetiva a seus propósitos de analisar a estrutura molecular das amostras.

Contudo, devido ao fato de não se poder realizar uma análise por meio de rede
cristalina, estudar óleos por meio dos métodos de análise física estabelecidos pela Física do
estado sólido torna-se inviável. O que não é o caso para cristais. Estes podem ser estudados

1
teoricamente e analisados sob a ótica das vibrações de rede, enquadrando-se perfeitamente no
escopo de trabalho da Física da matéria condensada.

Neste contexto, esta obra visa tratar da teoria de que envolve o estudo de cristais via a
espectroscopia por espalhamento de radiação eletromagnética, mais precisamente, a
espectroscopia vibracional Raman. Uma técnica moderna e muito prática, que permite o
estudo de amostras de maneira não destrutiva, possível de se realizar in situ, e com resultados
imediatos. Esta técnica tem sido continuamente aperfeiçoada devido aos avanços realizados
em sua instrumentação, tal como lasers e outros instrumentos óticos. Porém, a pesar de
atualmente empregar instrumentos capazes de produzir feixes de luz coerente e
monocromática de maneira controlada, bem como análise de feixes espalhados por meio de
interferômetros, a técnica de espalhamento da luz nasceu dos desenvolvimentos realizados por
muitos cientistas ao longo de mais de 400 anos, contando desde as primeiras publicações de
estudos sobre a polarização da luz e de sua decomposição em cores componentes nos
trabalhos de, respectivamente, Erasmus Bartholinus (1625 – 1698) e Isaac Newton (1643 –
1727). Sendo esta técnica de espalhamento da luz provida de solidez e tradição, adquirida
desde seu estabelecimento por John William Strutt (1842 – 1919), o barão de Rayleigh, e
complementada pelo efeito Raman, estabelecido por Chandrasekhara Venkata Raman (1888 –
1970).

Contudo, no capítulo 1 encontra-se a descrição dos arranjos atômicos em moléculas e


suas propriedades, bem como o a descrição dos modelos de rede, cristalina e recíproca. O
capítulo 2 apresenta o estudo das vibrações nas redes e as relações de dispersão dos fônons
presentes na rede. Com o capítulo 4 discorre-se acerca do emprego da teoria de grupos no
estudo dos modos de vibração de cristais. E no capítulo 5 tem-se a descrição da teoria do
espalhamento de luz por materiais por efeito Raman.

Complementando, têm-se quatro apêndices. O apêndice A trata de um exemplo de um


problema vibracional de oscilador acoplado, resolvido via coordenadas normais. No apêndice
B tem-se uma demonstração de como se obtém a velocidade de uma onda luminosa a partir
ondas eletromagnéticas, que é a grande descoberta de James Clerk Maxwell (1831 – 1879).
No apêndice C tem-se um exemplo de resolução de modos normais de vibração de uma
molécula de água, assim como a determinação de sua atividade em Raman. E no apêndice D
tem-se a descrição da história da espectroscopia por espalhamento da luz devido ao efeito

2
Raman, desde as primeiras indagações relatadas pelos gregos até a comprovação experimental
de C. V. Raman.

Recomenda-se que o leitor tenha alguns conhecimentos pré-requisitos, que são


adquiridos em cursos regulares de graduação em Física, tais como: Álgebra Linear, Mecânica
Clássica I e II, Eletromagnetismo Clássico I, Física Básica IV, Física Moderna I e II, Física do
Estado Sólido, e Mecânica Quântica I.

Espera o autor, com esta obra, acrescer à quantidade de conhecimento disponível em


língua portuguesa a respeito dos assuntos aqui tratados, bem como prover outros estudantes,
sobretudo iniciantes, na área de espectroscopia por espalhamento de luz, de uma visão ampla
e razoavelmente detalhada da teoria que embasa a técnica.

Belém, 25 de dezembro de 2011.

Renato Bertoni Lardosa Santos.

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CAPÍTULO 2
ARRANJOS ATÔMICOS EM CRISTAIS

2.1- Modelo molecular aproximativo para vibrações

Uma molécula pode ser considerada como um arranjo de um número limitado de


átomos mantidos juntos por forças interatômicas, essencialmente covalentes. É uma unidade
mínima da divisão de uma substância que ainda retém suas propriedades físico-químicas.
Uma molécula pode ser pensada como uma célula cuja estrutura física representa a substância
em sua totalidade.

Uma ligação covalente se forma caso os átomos se coloquem num estado de menor
energia total ao entrar em ligação. Tais ligações ocorrem quando dois orbitais de valência de
dois átomos se sobrepõem, interferindo construtivamente. O aumento da amplitude da função
de onda, , que descreve esse orbital interatômico implica uma diminuição de energia. Com o
aumento da amplitude há um aumento da densidade de probabilidade, | |, de localização
espacial do elétron nessa região.

Em termos de forças, essa ligação é uma interação entre átomos na qual dois átomos
compartilham elétrons através de atração eletrostática por parte dos dois núcleos. Este tipo de
ligação é direcional, o que significa que há uma orientação preferencial dos dois átomos um
em relação ao outro. Desta orientação entre os núcleos emerge a forma da molécula e ângulos
entre ligações, para moléculas não lineares. Se na ligação houver átomos homonucleares, a
ligação é não polar; caso contrário, para heteronucleares, tem-se polaridade na ligação. Caso
haja grande diferença de eletronegatividade entre certos elementos que se ligam (não metais e
metais alcalinos e alcalinos terrosos), tem-se uma ligação iônica.

Os elétrons compartilhados passam a ter uma distribuição espacial que envolve ambos
os núcleos, formando uma nuvem eletrônica. Considerando que as distribuições eletrônicas de
cada átomo formam os orbitais atômicos, quando átomos se ligam, esses orbitais formam os
orbitais moleculares, que envolvem toda a molécula. Em moléculas poliatômicas os orbitais
moleculares de valência são descritos por uma combinação linear dos orbitais atômicos de
valência, ∑ ; é um fator de normalização. Desta maneira, a nuvem eletrônica
4
total é descrita pelo determinante de Slater, que considera as contribuições individuais dos
orbitais moleculares ocupados, | ( ) ( ) |. Este é resultado do princípio da
conservação de orbitais, que estabelece que a partir de n orbitais atômicos definem-se n
orbitais moleculares. Uma propriedade importante é que o orbital de menor energia, e maior
amplitude, menor número de nodos (amplitude zero), é o que possui caráter ligante acentuado.
E o de maior energia, possui caráter antiligante, e maior número de nodos. Logo, quanto
menos nodos, mais forte a ligação. Contudo, o estudo da ligação covalente pode ser feito sem
referência a orbitais moleculares. O comportamento da nuvem eletrônica é de interesse ao se
considerar a propriedade molecular da polarização eletrônica (GILE,1992).

Em moléculas poliatômicas há a ocorrência de ângulos entre as ligações. Tais ângulos


tornam a solução de problemas envolvendo a energia da molécula, dependente da geometria
molecular, algo muito demorado. Porém, com certas aproximações concernentes à dinâmica
molecular, bem como o uso de propriedades de simetria, podem-se obter resultados
satisfatórios dependendo da precisão desejada.

Resolver problemas envolvendo energia em espectroscopia significa encontrar a


solução para equação de Schrödinger de autoestados e autovalores,

̂| ⟩ | ⟩ ( )

Na formulação da Mecânica Quântica perde-se a noção de localidade espacial para os objetos


físicos estudados, tudo que se pode obter é uma probabilidade de encontrá-lo em certa região.
Além disso, a própria medição da grandeza física (observável físico) influir no estado do
objeto de tal maneira a alterá-lo de forma significativa (PINHEIRO, 2011). Os estados de
energia possíveis para um objeto físico é representado pelas autofunções de energia, | ⟩, que
são uma combinação linear de todos os estados possíveis ao sistema, | ⟩ ∑ | ⟩, em que
é a amplitude de probabilidade para uma autofunção | ⟩. E o observável físico que mede a
energia de um sistema físico é o operador hamiltoniano, ̂ .

O operador hamiltoniano para um sistema molecular pode ser expresso como,

̂ ∑ ∑ ∑∑ ∑∑ ∑ ( )

Ou ainda (TUCKERMAN,2011),

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̂ ̂ ̂ ̂ (⃗ ) ̂ ( ⃗) ̂ ( ) ( )

Os termos do hamiltoniano são (BERNARTH, 1996):

 ̂ é a energia cinética nuclear;

 ̂ é a energia cinética eletrônica;

 ̂ ( ⃗ ) é a energia potencial coulombiana de repulsão núcleo-núcleo;


 ̂ ( ⃗ ) é a energia potencial coulombiana de atração elétron-núcleo;

 ̂ ( ) é a energia potencial coulombiana de repulsão elétron-elétron.

Onde , são coordenadas que descrevem os elétrons, ⃗ ⃗ ⃗ , são as

coordenadas que descrevem os núcleos atômicos. Que resulta na seguinte equação de


autoestado,

̂ ( ⃗) ( ⃗) ( )

A solução da equação com esse hamiltoniano é em tese a solução de todos os


problemas em espectroscopia, se não fosse o fato da sua insolubilidade exata com métodos até
hoje conhecidos. Contudo, há a possibilidade de se empregarem aproximações de maneira a
se obter uma solução próxima da exata, dentro de certa precisão. Em problemas moleculares,
uma aproximação eficaz na modelagem molecular é a aproximação de Born-Oppenheimer.

A aproximação de Born-Oppenheimer permite a simplificação do hamiltoniano, por


meio da consideração de o núcleo atômico ser muito mais massivo que o elétron, podendo-se
assim mantê-lo fixo. Isso permite que uma separação de variáveis, antes inviável por causa do
termo ̂ ( ⃗ ), que depende das coordenadas eletrônicas e nucleares simultaneamente,
sejam separáveis. Possibilitando, assim, separarem-se as autofunções em um produto de duas,
uma relativa à energia eletrônica, e outra à energia nuclear,

( ⃗) ( ⃗ ) (⃗ ) ( )

Isso é feito através de uma parametrização de ̂ ( ⃗ ), onde depende de ⃗ , sendo

este fixado. O resultado é um ̂ ( ⃗ ) dependente apenas de , podendo ser agrupado com


os outros termos do hamiltoniano que dependem desta coordenada, para assim se obter a
energia relativa aos elétrons,

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̂ ̂ ̂ ( ⃗) ̂ ( ) ( )

A equação de autoestado, parametrizada por núcleos fixos, correspondente é,

̂ ( ⃗) (⃗ ) ( ⃗) ( )

Desta obtêm-se as soluções ( ⃗ ), autovalores de energia eletrônica, em que cada


resulta numa superfície de energia potencial eletrônica, chamadas superfícies de Born-
Oppenheimer, que são superfícies nas quais ocorre a dinâmica molecular (GILE, 1996).

Figura 2.1: Superfície de potencial para uma molécula de . O ângulo exibe a geometria da molécula.

Fonte: BERNATH, 1995, p.353.

Esses autovalores são usados para solucionar a energia nuclear, onde atuam os termos
do hamiltoniano relativos aos núcleos,

[̂ ̂ (⃗ ) ( ⃗ )] ( ⃗ ) (⃗ ) ( )

O termo ̂ ( ⃗ ) na equação acima será sempre um valor constante, determinado pelo

estabelecimento de ⃗ na parametrização no início da solução. Os ( ⃗ ) são autoestados de


energia da molécula relacionados aos núcleos, e envolvem vibrações, rotações e translações.
Desta maneira, pode-se obter a evolução no tempo da dinâmica molecular sobre a superfície
de potencial ao se resolver uma equação de Schrödinger dependente no tempo,

[̂ ̂ (⃗ ) ( ⃗ )] ( ⃗ ) (⃗ ) ( )

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Uma limitação dessa aproximação é que não se podem ocorrer transições de nível
eletrônico. Uma condição de validade da aproximação é que, para um sistema a uma
temperatura T, para dados dois níveis eletrônicos, e , deve-se ter,

| (⃗ ) ( ⃗ )| ( )

Caso contrário, se próximo de , os chamados efeitos não adiabáticos ocorrem, e há


acoplamento entre níveis eletrônicos, situação na qual não se tem o mesmo comportamento
descrito pelas expressões deduzidas acima. Essa aproximação é assim também referida como
aproximação adiabática (PATTERSON et al., 2007 ), devido ao fato de os elétrons proverem
a energia potencial dos núcleos enquanto estes se movimentando continuamente deformam a
função de onda dos elétrons, sem haver troca efetiva de energia entre eles; e sem causarem-
lhes mudanças súbitas (PATTERSON et al., 2007 ).

Em suma, os movimentos dos núcleos atômicos e seus respectivos elétrons são


separados. Considera-se que, devido ao núcleo ser mais massivo e lento que o elétron, o
núcleo é tido como fixo em relação aos elétrons, que são arrastados pelos núcleos, e se
movimentam em relação a outros núcleos. Assim, os átomos podem ser vistos como um ponto
de concentração de massa com certas propriedades elétricas. Átomos podem se configurar
com polarização resultante permanente, ou serem polarizados por ação de campos elétricos
externos. Dos movimentos relativos entre núcleos surgem os espectros vibracionais, pois os
elétrons, que interagem com os fótons incidentes, respondem instantaneamente, segundo a
aproximação de Born-Oppenheimer, aos movimentos nucleares.

2.2 – Movimentos Atômicos

Estas considerações levam a um modelo molecular simplificado do qual se podem


obter previsões teóricas baseados em parâmetros do modelo que façam referência a
parâmetros experimentais, tais como a magnitude e outras características das ligações
químicas. Para fins de visualização, tais ligações podem ser idealizadas como molas sem
massa; aproximando a molécula de um sistema regido pela lei de Hooke; como exibido na
figura 2.2. Embora esta aproximação não seja útil em todos os casos, junto com as outras
considerações, permite um tratamento clássico do sistema molecular.

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Figura 2.2: Modelo de corpos unidos por molas sem massa para sistemas atômicos.

Na molécula cada átomo pode executar três tipos de movimentos: rotacional,


vibracional e translacional. Resultando em graus de liberdade (em e ), para
átomos. Desses, interessam apenas os vibracionais, o que permite a desconsideração de
graus de liberdade relativos a rotações e translações. Sendo assim, para moléculas não lineares
(cujos átomos não estão distribuídos em uma linha) existirão graus de liberdade, e
para a lineares, pois não há rotação em torno do eixo sobre o qual a molécula está
disposta (SALA,2008).

Na descrição das posições dos átomos em uma molécula, duas coordenadas são muito
importantes. Uma é a coordenada interna, que serve para localizar átomos um em relação ao
outro, dispostos nas ligações químicas. As coordenadas internas são úteis na descrição de
movimentos vibracionais da molécula em termos de ligações interatômicas e seus ângulos,
que são partes estruturais facilmente reconhecíveis; um exemplo é visto na figura 2.3.

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Figura 2.3: Movimentos de uma molécula ( ) descritos por: , comprimentos de estiramento entre átomos, e
, a variação entre o ângulo entre essas ligações.

Normalmente ligações são representadas por e ângulos por . Seu movimento


vibracional pode ser descrito como (SALA,2008),

( ) ( )

Outra coordenada é a coordenada normal, que é a descreve partes da molécula que


vibram com a mesma frequência, ou seja, vibrações coletivas dos átomos. Esta coordenada é
uma combinação linear das coordenadas internas, o que significa descrever a molécula como
um todo para uma dada frequência que ela esteja vibrando, embora os átomos possam ter
amplitudes de oscilação diferentes uns dos outros. Estas coordenadas são exemplificadas na
figura 2.4, considerando duas dimensões. Em (a) tem-se os estiramentos de e ,
promovidos por oscilações dos átomos 2 e 3, com 1 oscilando na direção y. Em (b) tem-se
e inalterados, e oscilação dos átomos 2 e 3 de modo a se ter variação de , o átomo 1 oscila
na direção y. Em (c) Os átomos 2 e 3 promovem estiramentos em e , e o átomo 1 oscila
na direção x. Em que os movimentos de (a), (b) e (c) ocorrem com uma frequência
característica para cada situação.

Figura 2.4: (a) Estiramento de e . (b) Variação em . (c) Estiramento de e , com sítio 1 oscilando na
direção x.

Matematicamente (SALA,2008),

( ) ( )

Considerando , com fator de normalização (calculado quando se considera a


função de onda),

∑ ∑ ( ) ∑ ( )
( )

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2.3 – Arranjos Cristalinos

Átomos podem-se agrupar formando moléculas, e essas moléculas por sua vez podem-
se agrupar formando arranjos sólidos regulares denominados cristais. O processo de formação
desses cristais pode ser natural (minerais encontrados na natureza) ou sintetizado em
laboratório quimicamente (TEIXEIRA,2009).

A descrição matemática de um cristal pode ser feita de duas maneiras, uma


considerando sua geometria, e outra considerando sua periodicidade; as duas são análogas em
seus resultados. Tais descrições levam ao que se define por rede. A rede baseada em
características físicas do cristal é a rede cristalina, ou direta. A rede baseada na periodicidade
do cristal é a rede recíproca.

A utilidade estrutural das redes é de facilitar o estudo das propriedades do cristal.


Normalmente sendo estas propriedades estudas por métodos em que radiações
eletromagnéticas interagem com as nuvens eletrônicas dos átomos e das moléculas. Desta
maneira, a localização dos átomos, e em consequência, da densidade eletrônica, permite
inferirmos a respeito dos possíveis comportamentos exibidos pelo cristal ao interagir com a
radiação.

2.3.1 – A Rede Cristalina

Uma rede cristalina é uma forma de uma, duas ou três dimensões estabelecida por
pontos, nos quais se situam os átomos; esses pontos também são referidos por sítios atômicos.
Cada um desses pontos é descrito por um vetor de translação que atua a partir de um ponto de
origem. Em condições ideais, essas translações são infinitas, levando a uma repetição de
agrupamentos atômicos idênticos; cada agrupamento é denominado de base. Uma rede fica
bem definida a partir do estabelecimento dos vetores que descrevem um agrupamento atômico
mínimo que se repete: a célula primitiva; tais vetores são denominados vetores primitivos. A
figura 2.5 (a) exibe exemplos de escolhas possíveis de vetores primitivos para uma rede.
Pode-se localizar um átomo na estrutura cristalina a partir dos vetores primitivos,

⃗ ( )

11
Em que os vetores são os vetores primitivos, são números inteiros que localizam o
átomo na direção de seus respectivos vetores relacionados. Cada célula primitiva contém um
ponto da rede cristalina em sua extensão espacial, porém, na forma de frações dos pontos que
limitam os vetores primitivos, devido ao fato de adjazer a outras células primitivas.

Figura 2.5: (a) rede bidimensional com possíveis escolhas de vetores primitivos, porém, excetuando-se e

, pois estes vetores não descreveriam o vetor adequadamente. (b) Exibe uma rede tridimensional com
vetores primitivos , e formando uma célula primitiva.

Fonte: KITTEL, 2006, p.5.

Devido ao fato de as redes cristalinas serem regulares, uma rede cristalina pode ter sua
geometria mapeada em si própria através de operações de simetria, tais como translações,
rotações, espelhamentos e inversões, que atuam em pontos da rede. Contudo, uma observação
importante é que no contexto de uma rede, uma célula primitiva não pode possuir um
mapeamento através de uma rotação de ou , pois isto implicaria haver espaços não
ocupados por células primitivas na rede. Quando consideradas em conjunto, as operações de
simetria associáveis a pontos de uma rede formam o chamado grupo de ponto. A figura 2.6
exibe exemplos de elementos de simetria em redes (KITTEL,2006).

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Figura 2.6: (a) e (b) exibem dois planos de simetria, respectivamente, paralelo e diagonal às faces de um cubo.
(c), (d) e (e) exibem eixos de simetria de um cubo.

Fonte: KITTEL, 2006, p.7.

As redes tridimensionais são classificadas em 7 sistemas de redes que totalizam 14


tipos diferentes, as redes de Bravais. Esta classificação é baseada nas relações entre os eixos
dessas redes, que podem não ser os vetores primitivos, e definem a geometria da célula. Estas
relações podem ser entre seus comprimentos relativos ou ângulos relativos entre eixos.

A figura 2.7 exibe os 14 tipos diferentes de redes de Bravais. A tabela 2.1 relaciona os
7 sistemas aos 14 tipos de redes da figura 2.1.

Tabela 2.1: Relações entre ângulos e entre eixos para cada sistema de rede.

Sistema (relação Número Relações entre os ângulos Relações entre eixos


com a fig. 2.1) de redes
Triclínico (1) 1
Monoclínico (2,3) 2
Ortorrômbico 4
(4,5,6,7)

13
Tetragonal (10,11) 2
Cúbico (12,13,14) 3
Romboédrico 1
(trigonal) (9)
Hexagonal (8) 1

Figura 2.7: Tipos de redes tridimensionais.

14
Fonte: http://www.civil.pdn.ac.lk/Materials/crystals/crystalline/crystalline.htm

Dessa maneira, as redes de Bravais não se constituem necessariamente de células


primitivas. Estas redes são uteis ao se considerarem as simetrias de ponto de um cristal, de
maneira mais conveniente, em certas situações, do que com uma célula primitiva.

Uma forma muito útil de se especificar regiões das redes de Bravais é a fornecida
pelos índices de Miller, que descrevem planos situados em uma rede de Bravais. Nesta
determinam-se as orientações de planos a partir de três pontos onde um dado plano intercepta
os três eixos da rede de Bravais. Com esses três valores, extraem-se seus recíprocos (seus
valores consigo no denominador) e obtém-se o menor número que ao multiplicar os três
valores, simultaneamente, mantêm-nos na mesma proporção. Valores negativos são escritos
com uma barra em cima. A figura 2.7 exibe exemplos de planos em uma rede.

Figura 2.8: Índices para alguns planos em uma rede cúbica.

Fonte: KITTEL, 2006, p.7.

2.3.2 – A Rede Recíproca

A rede recíproca provê a maneira mais útil de se estudar interações entre radiações
eletromagnéticas e um cristal. Ela faz uso das regularidades dos cristais para definir as

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densidades eletrônicas distribuídas pelo cristal. Com isso pode-se saber por análise teórica a
respeito da amplitude da onda eletromagnética espalhada por um cristal.

A rede recíproca é obtida por uma transformada de Fourier da função espacial da rede
direta (a rede cristalina). Onde esta função espacial é dada por uma onda que expressa a
regularidade do cristal.


Considerando um conjunto de pontos localizados por ⃗ e uma onda plana , para ⃗
que escolhidos convenientemente descrevem a periodicidade da rede de Bravais. Em que

(⃗ ) (⃗ ), pela relação de Euler. Desta maneira, o conjunto de vetores ⃗
que exprimem a periodicidade de uma dada rede de Bravais dá-se o nome de rede recíproca
(ASHCROFT, 1976). Os vetores ⃗ da rede recíproca devem satisfazer a propriedade

⃗ ( ⃗) ⃗

⃗ ⃗ ⃗ ⃗

⃗ ⃗

Que indica que a onda plana tem a mesma periodicidade para todo ⃗ da rede de Bravais.
Logo, sendo ⃗ estabelecido pela rede de Bravais específica, o conjunto de vetores ⃗ é
limitado pelo tipo de rede de Bravais escolhida.

O vetor ⃗ pode ser escrito em termos da base de vetores primitivos da rede recíproca,
⃗ ⃗ ⃗ . Que permite escrever um vetor na rede recíproca como sendo uma combinação
linear dos vetores da base,

⃗ ⃗ ⃗ ⃗ ( )

A relação entre as bases de vetores primitivos da rede direta e da rede recíproca é dada
pelas expressões (ASHCROFT, 1976),

⃗ ( )
( )

⃗ ( )
( )

16
⃗ ( )
( )

Se considerarmos a concentração de elétrons ( ⃗ ), ou seja, em função da posição na


rede de Bravais, com a invariância em relação à translação, tem-se ( ⃗ ⃗) ( ⃗ ). Sobre
esta periodicidade aplica-se a série de Fourier

⃗ ⃗
(⃗ ) ∑ ⃗ ( )

Onde ⃗ são vetores da rede recíproca. Comumente o espaço da rede recíproca é referido
como espaço dos k (ou espaço k), em alusão ao fato de as distâncias entre pontos serem
expressa por vetores de onda. De maneira análoga, o espaço da rede direta pode ser referido
como espaço dos r (ou espaço r) (ASHCROFT, 1976).

2.4 – A Célula Primitiva de Wigner-Seitz

Uma maneira útil de se obter uma célula primitiva é pelo método de Wigner-Seitz.
Com este método obtém-se uma região do espaço que se situa mais próxima a um dado ponto
de rede do que a qualquer outro. Esta célula possui invariância tranlacional, formando uma
rede contínua sem que uma célula se sobreponha a outra, ou deixe espaços não preenchidos
dentre si. Esta célula não faz referências à escolha de vetores primitivos, e é tão simétrica
quanto a rede de Bravais o é.

A construção da célula é feita traçando-se linhas ligando um ponto da rede aos seus
primeiros vizinhos. Em seguida traçam-se retas perpendiculares às retas ligando os pontos, de
maneira a se dividir essas últimas retas ao meio. Ou seja, as retas perpendiculares bissecam as
retas que ligam cada dois pontos. Com isto, a região formada pela circunscrição das retas
perpendiculares é a célula de Wigner-Seitz. Esta região é mais próxima do ponto de rede
central a ela do que a outro ponto da rede. Na figura 2.9 tem-se um exemplo de construção de
uma célula de Wigner-Seitz para uma rede bidimensional.

17
Figura 2.9: Em (a) tem-se o primeiro passo na construção da célula de Wigner-Seitz, unir um ponto aos seus
primeiros vizinhos. Em (b) traçam-se as retas perpendiculares que dividem as retas de (a) em duas de mesmo
comprimento. Em seguida, destaca-se a área interna.

2.5 – A Primeira Zona de Brillouin

No contexto de uma rede recíproca, uma célula de Wigner-Seitz é denominada como a


primeira zona de Brillouin; apesar de serem construções geométricas idênticas. No caso de se
fazer refência à primeira zona de Brillouin de uma rede de Bravais específica, quer-se referir à
célula de Wigner-Seitz da rede recíproca da rede de Bravais (ASHCROFT, 1976).

Na teoria de difração de ondas é de fundamental importância a relação entre vetores da


rede recíproca e planos da rede direta. Numa determinada rede de Bravais, define-se como
plano de rede um plano contendo pelo menos três pontos não colineares da rede de Bravais.
Adicionando a essa ideia, podemos definir como sendo uma família de planos de rede um
conjunto de planos paralelos igualmente espaçados contendo todos os pontos da rede de
Bravais.

Um importante teorema (ASHCROFT, 1976), afirma que para qualquer família de


planos distanciados por , há vetores de rede perpendiculares aos planos, cujo plano de menor
comprimento é de . De maneira inversa, para qualquer vetor de rede ⃗ , há uma família
de planos normais a ⃗ e separados por uma distância d, onde é o comprimento do vetor
da rede recíproca mais curto paralelo a ⃗ .

Daí tem-se que vetores da rede recíproca são vetores de ondas planas, que nos pontos
da rede de Bravais possuem valor unitário. Essas ondas planas têm o mesmo valor em todos
os pontos sobre uma família de planos perpendiculares ao seu respectivo vetor de onda e
separado por um número inteiro de comprimentos de onda. (ASHCROFT, 1976).

18
Os índices de Miller atuam de maneira importante na descrição da orientação dos
planos da rede recíproca. Os índices de Miller auxiliam na determinação dos vetores da rede
recíproca, de comprimento mínimo, que são normais às famílias de planos. Sendo esses
índices: , um vetor da rede recíproca pode ser escrito por

⃗ ⃗ ⃗ ⃗ ( )

Como exemplo, a figura 2.10 exibe uma rede de Bravais cúbica de corpo centrado (a),
que possui um sítio em seu centro, e em (b) exibe sua respectiva célula de Wigner-Seitz
tridimensional, a primeira zona de Brillouin.

Figura 2.10: (a) Rede de Bravais de corpo centrado (sítio central). (b) Primeira zona de Brillouin.

Fonte: KITTEL, 2006, p.32.

19
CAPÍTULO 3
VIBRAÇÕES EM REDES E RALAÇÕES DE DISPERSÃO

3.1 – Vibrações em Redes

Embora se imagine uma rede estaticamente, deve-se ter em mente o fato de ela estar
em constante movimento. E apesar de esses movimentos serem difíceis de serem analisados,
podem-se ser feitas considerações que facilitem uma análise aproximativa.

Essa aproximação baseia-se em duas premissas mutuamente relacionadas. A primeira


é que a rede deve manter sua estrutura, não obstante os movimentos dos íons em seus
respectivos sítios. Com isso, um sítio da rede de Bravais, descrito por um vetor ⃗ , expressa a
posição média de um íon que oscila em seu entorno; sua posição de equilíbrio. A segunda
premissa estabelece que os movimentos iônicos em relação suas respectivas posições de
equilíbrio sejam diminutos em comparação às distâncias interatômicas. Esta última premissa
estabelece também a aproximação harmônica para a descrição dos movimentos iônicos
(ASHCROFT, 1976).

Denotemos um sítio na rede de Bravais por ( ⃗ ). No caso de uma rede estática a


posição desse sítio seria dada por ( ⃗ ) ⃗ . Porém, devido ao fato de o íon estar em

constante oscilação em torno de ⃗ , tem-se

(⃗ ) ⃗ ⃗ (⃗ ) ( )

Onde ⃗ ( ⃗ ) representa a distância do íon de sua respectiva posição de equilíbrio; ou, o seu
desvio desta (ASHCROFT, 1976).

20
Figura 3.1: (a) Vetor ⃗ localiza um ponto na rede. (b) Vetor ( ⃗ ) localização do ponto deslocado.

Na figura 3.1, em (a) tem-se uma rede estática onde ⃗ localiza um ponto; em (b) ( ⃗ )
localiza o mesmo ponto, porém com posição deslocada, indicada pelo ponto laranja. A figura
3.2 (a) mostra a relação entre os vetores ⃗ e ( ⃗ ), e (b) mostra em detalhe o vetor ⃗ ( ⃗ ).

Figura 3.2: (a) Destaque do deslocamento em relação à posição de equilíbrio. (b) Ampliação do deslocamento.

No estudo de dinâmica de rede as coordenadas tidas como canônicas, referência para


descrição, é o ⃗ ( ⃗ ); em que ⃗ ( ⃗ ) (⃗ ) ⃗ . Isto implica na descrição de cada íon com

uma origem diferente, sua posição de equilíbrio.

3.2 – Potencial Eletrostático entre Sítios da Rede

21
Se considerarmos dois sítios de uma rede de Bravais dados por ⃗ e ⃗ , cujos desvios
de suas respectivas posições de equilíbrio são dados por ⃗ ( ⃗ ) e ⃗ ( ⃗ ), podemos estabelecer o
potencial eletrostático entre estes dois pontos.

Sendo a distância entre os dois sítios, ou seja, ⃗ ⃗ , e a distância entre seus

desvios ⃗ (⃗ ) ⃗ ( ⃗ ). Podemos, para ⃗ ( ⃗ ) pequeno o bastante para que o sítio não


sofra influência de outros sítios além do qual estamos considerando, expandir o potencial em
série de Taylor, resultando em

( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )

Para um potencial de os dois sítios oscilando, tem-se

∑ (⃗ ⃗ ) ∑ [ (⃗ ) ( ⃗ )] ∑ [⃗ ( ⃗ ) ⃗ ⃗ (⃗ ) ⃗] ( )
⃗⃗ ⃗⃗ ⃗⃗

No caso de sítios estáticos, teríamos, para N íons estáticos,

∑ (⃗ ⃗ ) ∑ ( ⃗) ( )
⃗⃗ ⃗

Substituindo o potencial pela sua série de Taylor temos

∑ (⃗ ) ∑[ ⃗ ( ⃗ ) ⃗ ( ⃗ )] (⃗ ⃗ ) ∑[ ⃗ ( ⃗ ) ⃗ (⃗ ) ] (⃗ ⃗ )
⃗ ⃗ ⃗⃗

( ) ( )

Onde ( ) no primeiro termo representa o potencial constante, na posição de equilíbrio


(SANTOS, 2011). O termo ( ) representa a força exercida por cada átomo sobre o átomo
⃗ . Esse termo é igual a zero, pois não há força exercida sobre átomos em equilíbrio. O único
termo restante é o quadrático, de maneira que o potencial é escrito, pela aproximação
harmônica como .

3.3 – Modos Normais de uma Rede e Relações de Dispersão

22
Há fenômenos físicos, como a condutividade térmica ou interação de dipolos elétricos,
que são regidos pelos movimentos dos íons em uma rede cristalina. E embora a melhor
abordagem para problemas relacionados a objetos de tamanho microscópico seja a mecânica
quântica, para determinadas situações, como oscilações harmônicas, um tratamento clássico
tem seu valor, pois é possível resolvê-lo exatamente.

As vibrações em uma rede são descritas pelos modos normais de vibração, que são
deslocamentos conjuntos dos íons em uma rede em certa frequência. Um modo normal de
vibração implica, assim, a rede ter todos os seus sítios incorrendo deslocamentos em relação
às suas respectivas posições de equilíbrio simultaneamente.

Nesta análise utiliza-se o modelo de massa mola para uma rede unidimensional com
uma base contendo dois íons por célula primitiva. Sendo assim, os íons dessa rede são
considerados como se ligados por molas sem massa e com constante de força , obedecendo
à lei de Hooke. Pela aproximação de Born-Oppenheimer todos os movimentos de uma rede,
ao exibirem amplitudes pequenas, podem ser tratados pela lei de Hooke, seja qual for a
origem da interação interatômica (PATTERSON et al., 2007).

Desta forma, a análise dos modos normais de vibração de uma rede consiste em se
determinarem os deslocamentos dos íons relativos às suas posições de equilíbrio utilizando a
segunda lei de Newton e a lei de Hooke.

3.3.1 – Cadeia Monoatômica

Consideremos uma cadeia atômica formando uma rede unidimensional cuja célula
primitiva é constituída de um átomo, uma cadeia monoatômica, como exibida na figura 3.3.

23
Figura 3.3: Na parte superior tem-se a cadeia monoatômica estática, e na parte inferior um instantâneo de seu
deslocamento.

Desta maneira, pontos da rede de Bravais são localizados por ⃗ . Os


deslocamentos iônicos são representados por ⃗ ( ), onde é um número inteiro, e éa
distância entre os íons.

A energia potencial harmônica, descrita pela equação (3.7), pode ser escrita para este
caso, considerando interações entre vizinhos,

[⃗ ( ) ⃗ (( ) )] [⃗ ( ) ⃗ (( ) )] ( )

Cuja simplificação é

{⃗ ( ) ⃗( ) ⃗ (( ) ) ⃗ (( ) )}

{⃗ ( ) ⃗( ) ⃗ (( ) ) ⃗ (( ) )}

{ ⃗ ( ) ⃗( ) ⃗ (( ) ) ⃗( ) ⃗ (( ) ) ⃗ (( ) )

⃗ (( ) )}

Derivando o potencial em relação à posição de equilíbrio, tem-se

⃗ ( ) ⃗ (( ) ) ⃗ (( ) ) ( )
⃗( )

Com ( ); o potencial entre dois sítios da rede. As equações de movimento são


descritas pela 2ª lei de Newton definidas como o negativo do gradiente do potencial,

̈( ) ⃗( ) ⃗ (( ) ) ⃗ (( ) ) ( )
( )

Estas equações descrevem o movimento de um corpo acoplado a dois vizinhos.

24
Para um dado sítio estabelecido como , seus vizinhos são e .
Trocando a notação ⃗ ( ) por , para facilitar as manipulações, podemos reescrever a
equação (3.11) como sendo

̈ ] ( )

Como solução para estas equações diferenciais de segunda ordem tem-se soluções
oscilatórias, em função da posição de do tempo (ALVES, 2011),

( ) (⃗ )
( )

(⃗ )
̈ ( ) ( )

Substituindo em (3.12), levando em conta os respectivos valores de n,

(⃗ ( ) ) (⃗ ( ) ) (⃗ ( ) ) (⃗ ( ) )
* +

(⃗ ) (⃗ )
* +

(⃗ ) (⃗ )
* +

O sinal negativo em ambos os lados é removido, e o sinal de dentro dos colchetes são postos
em evidência, de maneira que

(⃗ ) (⃗ )
* + ( )

Neste ponto utiliza-se a relação de Euler nas exponenciais,

(⃗ ) (⃗ ) ⃗ ⃗ ⃗ ⃗ ⃗

Substituindo em (3.15), tem-se

[ ⃗ ]

[ ⃗ ]

√ [ ⃗ ] ( )

25
Utiliza-se propriedade trigonométrica no cosseno, de modo que

⃗ ⃗

De volta a (3.16) tem-se

√ [ ⃗ ]

√ [ ⃗ ]

(⃗ ) √ | ⃗ | ( )

Tem-se assim o valor da frequência de vibração em função do vetor de onda. Esta


relação é conhecida como relação de dispersão. A periodicidade dessa função faz com que os
únicos valores discerníveis fisicamente ocorram para valores entre ⃗ , que é a primeira

zona de Brillouin (OLIVEIRA; JESUS, 2005).

Para cada valor de , indo de , tem-se uma solução com uma frequência única
( ⃗ ). A solução exprime ondas que se propagam ao longo da rede. Duas propriedades

importantes dessas ondas são a sua velocidade de fase, ⃗


, e sua velocidade de grupo, ⃗
.

Um modo útil de se analisar graficamente ondas se propagando em redes é pela curva de


dispersão, na qual a frequência é desenhada contra o vetor de onda. A figura 3.4 mostra uma
curva de dispersão.

26
Figura 3.4: Curva de dispersão para a cadeia monoatômica para a região de ⃗ .

Para comprimentos de onda longos, ⃗ , sendo ⃗ , tem-se , e isto

equivale ao comprimento de uma onda propagando-se por um meio contínuo, uma onda
acústica. Daí esse modo de vibração ser chamado de modo acústico. Estes modos têm a
características de exibirem frequência igual a zero no ponto central da primeira zona de
Brillouin (ASHCROFT, 1976).

3.3.2 – Cadeia Diatômica

Se ao invés de uma cadeia monoatômica, tivermos uma cadeia diatômica formada de


dois átomos, que constituem uma base, a solução das frequências se torna mais trabalhosa.
Este problema é similar a de dois osciladores do tipo massa mola acoplados, normalmente
resolvidos através de coordenadas normais para se desacoplarem as equações de movimento;
para uma solução desse tipo, ver o Apêndice A.

Aqui continuamos a utilizar a energia potencial para determinar os modos normais e


suas frequências em função do vetor de onda. A figura 3.5 exibe o esquema de uma rede
unidimensional formada por uma célula primitiva de dois átomos. Suponhamos os átomos de
mesma massa, porém, ligados por forças com constantes de força diferentes, e .

27
Figura 3.5: Cadeia formada por uma repetição contínua de uma célula primitiva contendo dois átomos.

Com isso, a energia potencial para cada sítio será determinada através da interação
entre o sítio e seus vizinhos imediatos, sendo que o potencial para cada vizinho será diferente.
Assim, tem-se um potencial do tipo

∑ ⃗ ( ) ⃗ ( )] ∑[ ⃗ ( ) ⃗ (( ) )] ( )

Para o sítio ⃗ ( ) este potencial tomará a forma descritiva da relação desse sítio com seus
vizinhos, ou seja,

⃗ ( ) ⃗ ( )] [⃗ ( ) ⃗ (( ) )] ( )

A expansão dos termos para facilitar a derivação é dada por

⃗ ( ) ⃗ ( )⃗ ( ) ⃗ ( )]

[⃗ ( ) ⃗ ( ) ⃗ (( ) ) ⃗ (( ) )]

Dessa maneira, a derivada do potencial é

⃗ ( ) ⃗ ( )] [ ⃗ ( ) ⃗ (( ) )]
⃗ ( )

⃗ ( ) ⃗ ( )] [⃗ ( ) ⃗ (( ) )] ( )
⃗ ( )

Para o sítio ⃗ ( ), tem-se

⃗ ( ) ⃗ ( )] [⃗ ( ) ⃗ (( ) )] ( )

28
Expandido resulta em

⃗ ( ) ⃗ ( )⃗ ( ) ⃗ ( )]

[⃗ ( ) ⃗ ( ) ⃗ (( ) ) ⃗ (( ) )]

Para este potencial, a derivada é

⃗ ( ) ⃗ ( )] [⃗ ( ) ⃗ (( ) )] ( )
⃗ ( )

A solução das frequências é dada por um sistema que inclui a oscilação dos dois sítios,
que á dado por

⃗̈ ( ) ⃗ ( ) ⃗ ( )] [⃗ ( ) ⃗ (( ) )]
{ ( )
⃗̈ ( ) ⃗ ( ) ⃗ ( )] [⃗ ( ) ⃗ (( ) )]

Utilizaremos soluções do tipo

⃗ ( ) ( )
⃗̈ ( ) ( )
{ ( )
⃗ ( ) ( )
⃗̈ ( ) ( )

Considerando ⃗ ( ) para facilitar o desenvolvimento.

Substituindo (3.24) em (3.23), considerando os valores de , e eliminando-se os sinais


negativos, tem-se

( ( ) ) ( ( ) ) ( ( ) ) ( ( ) ) ( ( ) )
[ ] [ ]
{
( ( ) ) ( ( ) ) ( ( ) ) ( ( ) ) ( ( ) )
[ ] [ ]

Prossegue-se com uma série de simplificações,

( )
[ ] [ ]
{ ( )
[ ] [ ]

( )
[ ] [ ]
{ ( )
[ ] [ ]

] [ ]
{
] [ ]

29
{

( ( )) ( )
{ ( )
( ) ( ( ))

A solução deste sistema é obtida pelo seu determinante característico (ou secular), de maneira
que

( ( )) ( )
| | ( )
( ) ( ( ))

Cuja solução é

[( ( )) ( ( ))] [( )( )]

[( ( )) ( ( ))] [( )( )] ( )

O segundo termo é simplificado,

( )

Utilizando a relação de Euler

( ) ( )

( )

Substituindo em (3.27),

[( ( )) ( ( ))]

( ( ))

30
( ) √

( )
√ ( )

Lembrando que até aqui denominamos ⃗ ( ) para simplicidade.

Dois casos principais de ⃗ , que determinam os valores de ( ⃗ ) O primeiro é quando


⃗ , para o qual não possui dependência em ⃗ . Ou seja,

( )

( )
√( )

( ) ( )

( )
√ ( )

O segundo caso, é para o comportamento das frequências quando ⃗ . Para o qual

( )

( )

( )

( )
√( )

( )
√( )

( ) ( )

31
√ √ ( )

Para N íons tem-se graus de liberdade na rede, totalizando modos normais de


vibração, considerando valores de ⃗ . Na figura 3.6 veem-se duas curvas de dispersão,
denominadas ramos da relação de dispersão. A curva inferior está associada ao modo
acústico, simbolizada por A. A curva superior está associada ao modo ótico, simbolizada por
O.

Curvas do ramo acústico exibem dependência em ⃗ , o que é característico de ondas


sonoras, pois têm a forma (⃗ ) ⃗ , para ⃗ pequeno. Já as curvas de dispersão do ramo

( )
ótico não exibem esta dependência. Esta curva inicia em √ e desce a √

na fronteira da primeira zona de Brillouin. Os ramos óticos são assim chamados devido ao
fato de os cristais cujas redes exibem este ramo poderem interagir com ondas
eletromagnéticas (ASHCROFT, 1976).

Figura 3.6: Curva de dispersão para a cadeia diatômica. Ramo ótico O e ramo acústico A para a região ⃗ .

Embora não se discuta aqui o caso para redes tridimensionais, vale ressaltar algumas
características. Não somente o comportamento das frequências ( ⃗ ) é relevante, mas
(⃗ )
também, tanto as direções de polarização dos vetores nas ondas solução
32
quanto a direção de ⃗ . Onde é o vetor polarização do modo normal, que descreve a direção
na qual os íons se movem.

No caso de um meio isotrópico (dimensões regulares e proporcionais em todas as


direções) podem-se escolher três soluções ̂ ̂ ̂ para um dado ⃗ , de maneira

que se terá um ramo paralelo à propagação de ⃗ (o ramo longitudinal, ⃗ ), e dois

perpendiculares (os ramos transversais, ⃗ ).

Outra característica muito importante é que para casos de cristais anisotrópicos,


podem-se ter simplificações para as relações dos vetores e ⃗ , caso ⃗ seja invariante para
determinadas operações de simetria aplicáveis à geometria do cristal.

De modo geral, redes tridimensionais possuem modos: transversais acústicos ( ),


longitudinais acústicos ( ), transversais óticos ( ) e longitudinais óticos ( ). Para uma
célula primitiva com átomos, a relação de dispersão deverá conter ramos. Destes, 3
ramos acústicos e ramos óticos. Desta maneira, considerando que um cristal com
células primitivas, tem-se modos acústicos, devidos a graus de liberdade do cristal, e
( ) modos óticos (KITTEL, 2006).

3.4 – Fônons

Com o intuito de descrever fenômenos físicos regidos pelas vibrações de rede, deve-se
considerar a teoria quântica para dinâmica de redes. Na solução do movimento de íons tem-
se uma superposição (combinação linear) de modos normais de vibração, cada um com
sua frequência característica.

Para se conhecer os níveis de energia de um cristal de íons, deve-se conhecer a


contribuição dos osciladores independentes, os modos normais. Cada modo normal, ⃗ ,

com frequência angular ( ⃗ ) pode assumir apenas valores discretos, dados por ( ⃗

) ( ⃗ ). Sendo ⃗ o número de excitação energética dos modos normais ⃗ . Para o cristal

como um todo, a energia total será dada pela soma das energias de cada modo normal, ou seja
(ASHCROFT, 1976),

33
∑( ⃗ * (⃗ ) ( )

Neste contexto de quantização de estados excitados, é conveniente utilizar uma


linguagem mais prática para se descrever interações dos modos normais com outros sistemas,
em especial, com ondas eletromagnéticas. Para isso, usa-se uma descrição análoga à que é
feita na teoria quântica do campo eletromagnético, na qual o número de excitações é referido
simplesmente como número de fótons. Deste modo, ao se referir a um modo normal do ramo
com vetor de onda ⃗ em seu estado excitado ⃗ , diz-se que há ⃗ fônons do tipo s com

vetor de onda ⃗ presentes no cristal (ASHCROFT, 1976).

De maneira sintetizada, os fônons são quanta do campo de deslocamento iônico de


uma rede.

34
Capítulo 4
SIMETRIA MOLECULAR E TEORIA DE GRUPOS

4.1 – Simetria Molecular

As funções que descrevem os modos normais de uma molécula são frequentemente


complicadas devido ao fato de envolverem o deslocamento simultâneo de muitos ou todos os
átomos em uma molécula. Para simplificar isto é conveniente aproveitar as simetrias exibidas
pelas moléculas. Simetria, em geometria, deve ser vista como a correspondência entre
elementos situados em lados opostos a pontos, planos ou eixos (FERRARO; NAKAMOTO;
BROWN, 2004).

Uma propriedade importante é a de que a energia potencial e cinética de uma molécula


permanece inalterada sob a ação de transformações que mantém a molécula em uma
configuração geométrica indistinguível da que possuía antes da transformação. Nesse
contexto, tais transformações são denominadas transformações de simetria.

Essa propriedade de simetria leva ao fato de que os modos normais de vibração de


moléculas descritos por vetores, ao serem transformados, por exemplo, por: rotações,
espelhamentos, inversões ou translações, permanecem ou inalterados ou têm seus sinais
invertidos. De modo resumido, as coordenadas normais são ou simétricas ou assimétricas com
relação às operações de simetria (BARROW, 1962).

4.1.1 – Elementos de Simetria

A simetria de moléculas é discutida em termos de elementos de simetria que uma


molécula exibe quando em equilíbrio. Estes elementos constituem cinco propriedades
geométricas sobre as quais atuam as operações de simetria. De modo que a toda operação de
simetria há um elemento de simetria na molécula através do qual a molécula é transformada
pela operação de simetria. Com isso, elementos de simetria são pontos de inversão, planos de

35
espelhamento e eixos de rotação localizados na geometria da molécula que os possui; seja um
ou mais de um destes.

Figura 4.1: (a) Centro de inversão. (b) Eixo de rotação. (c) Plano de espelhamento.

A figura 4.1 exibe os três tipos mais comuns de operações de simetria. Em (a) tem-se o
centro de inversão, onde um átomo em um dos vértices do cubo pode trocar de lugar com um
átomo no vértice que está além do ponto na mesma linha reta ligando os dois vértices. Em
(b) tem-se um eixo de rotação em torno de , cujo ângulo de rotação depende da simetria da
molécula; o valor subscrito a que é o resultado da divisão entre 360 pelo ângulo mínimo de
rotação que mantém os átomos da molécula em suas posições não iniciais, porém idênticas
geometricamente. Em (c) tem-se um plano de espelhamento , este plano divide a molécula
em duas partes, em que uma é a imagem refletida da outra.

Outros dois elementos de simetria são a identidade , que tem o efeito de manter todos
os átomos inalterados, e a rotação imprópria , que combina uma rotação de seguida
de espelhamento. A tabela 4.1 sumariza os elementos de simetria e suas operações
respectivas.

Tabela 4.1: Relação entre elementos e operações de simetria

Elementos de simetria
Símbolo Descrição Operações de simetria
Identidade Nenhuma mudança
Plano de simetria Reflexão através do plano
Centro de simetria Inversão através do centro

36
Eixo de simetria Rotação de em torno do eixo
Eixo de simetria de rotação-reflexão Rotação de em torno do eixo
seguida de reflexão através do plano
Fonte: BARROW, 1962, p.160.

Para uma descrição mais detalhada com exemplos recomenda-se ao leitor que leia o
capítulo 4 de HOUSECROFT (2008, p.88).

Contudo, é importante ressaltar que em uma molécula seu eixo de maior simetria é
convencionado como o eixo . E é o eixo de maior importância nas considerações de simetria.

4.1.2 – Operações de simetria

Utilizando uma descrição cartesiana para os movimentos moleculares torna possível a


aplicação das operações de simetria descritas em forma matricial. Quando estas matrizes
atuam sobre os vetores das moléculas duas possibilidades podem ocorrer: o vetor pode manter
sua direção, para casos simétricos, ou podem assumir direção oposta, para os casos
assimétricos.

Considere a situação da figura 4.2, na qual uma rotação de é operada sobre uma
molécula de água.

Figura 4.2: (a) Molécula de antes de sofrer rotação. (b) Após rotação, sítios 1 e 2 trocaram de posição.

Fonte: SALA, 2008, p.96

37
Na figura 4.2 (a) tem-se a configuração da molécula antes de passar pela
transformação, cada sítio está descrito por três vetores cartesianos mutuamente ortogonais.
Em (b), após a rotação de , nota-se a troca de posição entre os sítios 1 e 2. Com essa
rotação, alguns dos vetores que descreve os sítios mudam de orientação, apenas os vetores
sobre o eixo de rotação permanecem inalterados, os . Ou seja, todos os vetores, exceto os
, tiveram seus sinais invertidos.

Matricialmente, podemos representar essa transformação como sendo

[ ] ( )

Que atua nos vetores dos sítios , com , de maneira simbólica,

()
* + *( ) +[ ] ( )
()

Esta expressão representa as assimetrias dos sítios 1 e 2, bem como a simetria do sítio 3. Os
parênteses indicam o fato de o sítio 1 e 2 terem trocado suas posições um com o outro. De
modo que, a representação das transformações de todos os átomos é

( )

[ ][ ]
[ ]

Na equação (4.3) as colunas da matriz transformação indicam os sítios, e o fato de a


transformação estar situada na segunda coluna da primeira linha indica que o átomo 1
transformado será colocado no sítio 2. Análogo ocorre para o segundo átomo, onde sua
transformação leva-o para o sítio 1.

38
Outras operações possíveis para a molécula de água são: a identidade, presente em
todas as moléculas; , um plano de espelhamento na direção e consequentemente
paralelo a , razão pela qual se pode denominá-lo de plano vertical, ou ; e outro plano
vertical orientado na direção . Suas respectivas representações matriciais são (SALA,
2008):

[ ] [ ] [ ]

As matrizes das transformações tomam uma dimensão de para coordenadas


cartesianas. Para o caso da molécula de , as três transformações acima também tomam
uma forma . A transformação identidade não envolve permutações de sítios, sua forma é

( )

[ ]

Para também não há permutações, a molécula é atravessada pelo plano, de modo que a
transformação apenas espelha a coordenada dos átomos, sendo assim

( )

[ ]

No caso de , um plano que divide a molécula em duas, onde de um lado fica o sítio 1 e do
outro o sítio 2. Quando ocorre o espelhamento, esses dois sítios permutam, e o efeito nas
coordenadas dos átomos é o de inversão das coordenadas . Sendo assim,

39
( )

[ ]

Devido ao fato de as coordenadas , e terem sido usadas na determinação das


representações para as transformações de simetria, estas coordenadas são ditas a base da
representação. Da mesma maneira, outras coordenadas poderiam ter sido usadas, como as
coordenadas internas ou as coordenadas normais. Contudo, se duas representações para uma
mesma operação de simetria, cujas bases são combinação linear uma da outra, são ditas
equivalentes (WILSON et al., 1980).

4.1.3 – Grupos de ponto

O conjunto de todas as operações de simetria que atuam sobre uma molécula forma
um grupo, o grupo de ponto. Assim denominados, pois quando associados a elementos de
simetria mantêm um ponto da molécula fixo, o centro de massa da molécula, ponto de
interseção de todos os elementos de simetria (BERNATH, 1995). Vale ressaltar que em
estudos de cristais frequentemente defronta-se com o termo grupo espacial, significando que
para algumas operações de simetria a molécula (ou uma célula unitária) incorre translação a
outro local do cristal (BARROW, 1962). A tabela 4.1 exibe alguns grupos de ponto e seus
elementos constituintes.

Tabela 4.2: Exemplos de grupos de ponto.

Grupo de ponto Elementos de simetria Exemplos


,
, , ,
, , , , ,
, , , ,
Fonte: BARROW, 1962, p.162.

40
Ressaltam-se na tabela 4.2 os elementos de um grupo de ponto que apresentam um
coeficiente. Estes indicam que se trata de um agrupamento de elementos iguais, e o
coeficiente indica quantos são. Cada elemento de um grupo de ponto forma uma classe, e o
coeficiente indica quantos elementos compõem dada classe a qual eles pertencem.

Daqui por diante, referir-se-á aos elementos de um grupo de ponto pelas ações que
sobre eles atuam, as operações de simetria.

4.2 – Teoria de Grupo

O conceito de grupos de ponto faz parte de uma teoria mais ampla da matemática, a
teoria de grupo. Nela, um grupo é um conjunto de elementos que se combinam de acordo com
quatro axiomas (HALL, 1967). Um grupo constituído de elementos de um grupo de ponto
possui representações, como será visto, que permitem distinguir e classificar os níveis de
energia de moléculas a partir de considerações de simetria.

A teoria de grupos permite também que se obtenham informações a respeito da


possibilidade de ocorrerem transições entre esses níveis de energia. As simetrias das
moléculas permitem classificar as transições entre níveis vibracionais como permitidas ou não
por dipolo elétrico (BERNATH, 1995).

4.2.1 – Propriedades dos grupos

Para dados elementos , e pertencentes a um grupo , os quatro axiomas


(propriedades) que definem as relações permitidas entre elementos de um grupo são
(BASSALO, 1987) (HALL, 1967):

1. Fechamento. Para quaisquer dois elementos de um grupo, o produto dos dois resulta
em outro elemento único do grupo, que também pertence ao grupo;
2. Associativa. Quando na multiplicação de três elementos de um grupo, a ordem da
efetuação das multiplicações não torna o resultado diferente, ou seja,
( ) ( )
3. Identidade. Dentre os elementos de um grupo há um elemento de identidade, denotado
, cuja propriedade é de ao multiplicá-lo a um elemento , o resultado é o próprio .
41
4. Inversa. Todo elemento de um grupo possui um inverso (ou recíproco) , de
maneira que

Observe-se que a comutatividade não figura entre as propriedades, porém, caso um


grupo tenha tal propriedade, trata-se de um grupo comutativo, ou abeliano (BASSALO,1987).
É também possível que embora um grupo não seja abeliano, alguns elementos que comutem
com todos os outros elementos (HALL,1967). Como exemplo disso tem-se o elemento
identidade, .

Se para três elementos de um grupo , e é verdadeiro diz-se que e


são conjugados, ou equivalentes. Elementos conjugados formam classes de operações em
grupos. O número de classes presentes em um grupo constitui a ordem do grupo (SALA,
2008).

4.2.2 - Caráter de Transformações e Representações de Grupos

Em um grupo de operações de simetria, as representações matriciais para cada


operação de simetria podem ser simplificadas através do seu traço, ou caráter, que consiste na
soma dos elementos da diagonal principal da matriz. O caráter de duas representações, para
uma operação de simetria, equivalentes é igual.

Representações como a (4.6) constituem as denominadas representações redutíveis,


devido ao fato de possuírem elementos fora da diagonal. Dessa maneira, é possível
transformá-las em matrizes diagonais, através das transformações de similaridade. Estas
transformações operam a matriz da representação redutível com outra matriz de mesma
ordem e sua inversa ,

Em que é uma representação equivalente à representação . Porém, caso ainda não


esteja diagonalizada, são possíveis outras operações até que se tenha uma matriz diagonal
equivalente à representação . Neste caso, a representação diagonal é denominada irredutível.
Representações irredutíveis são formadas por blocos nas suas diagonais. E a soma dos

42
caráteres desses blocos é consequentemente o caráter da representação irredutível, que por sua
vez é igual ao caráter da representação redutível.

Representações são denotadas pela letra . As representações irredutíveis de um grupo


estão relacionadas com a redutível pela relação

( ) ( )
∑ ( )

Onde p é uma representação redutível, é o número de vezes que a representação p aparece


na representação redutível. O símbolo indica que se trata de uma soma direta entre as
representações irredutíveis, o que significa que elas não se misturam (BERNATH, 1995).

4.2.3- Tabelas de Caracteres

É possível montar uma tabela com os caráteres das representações para cada operação de
simetria, estas são as tabelas de caracteres, ou de caráteres. Estas tabelas são um modo prático
de se exibir as simetrias de uma molécula pertencente a um determinado grupo de ponto.

Tabela 4.3: Tabela de caracteres para o grupo de ponto .

movimentos
1 1 1 1
1 1 -1 -1
1 -1 1 -1
1 -1 -1 1
Fonte: BARROW, 1962, p.169.

A tabela 4.3 exibe a tabela de caracteres para a molécula de Esta tabela é


montada a partir dos comportamentos das coordenadas dos sítios atômicos sob a atuação das
operações de simetria e translações e rotações. As linhas da tabela, da segunda para baixo
listam as espécies de simetria, que representam maneira pelas quais os diferentes movimentos
de uma molécula, sejam rotações, translações e vibrações, se transformam. Assim como os

43
vários orbitais eletrônicos, como consequência dos movimentos moleculares
(BARROW,1962). As células com valores numéricos representam os caráteres dos blocos das
representações irredutíveis das respectivas operações de simetria.

Segundo BRAND e SPEAKMAN (1975, p.31), a designação das espécies de simetria


(representações irredutíveis) segue as seguintes regras:

i. indica simetria em relação ao eixo de maior simetria ( ).


ii. indica antissimetria em relação a ( ).
iii. indica espécies duplamente degeneradas.
iv. (ou ) indica uma espécie de tripla degenerescência.
v. Os subscritos e indicam, respectivamente, simetria e antissimetria em relação a
um centro de simetria.
vi. Os subscritos e denotam, respectivamente, simetria e antissimetria com relação ao
eixo de rotação (ou rotação-reflexão) outro que não ( ), ou, em alguns grupos de
ponto onde não há segundo eixo, em relação a um plano de simetria.

A obtenção de uma tabela de caracteres para um determinado grupo de ponto, ou grupo


espacial para cristais, não necessariamente requer os laboriosos cálculos e análises de simetria
para se chegar às representações irredutíveis, a publicação de Rousseau; Bauman; Porto
(1981) contém uma compilação de tabelas de caracteres para todos os grupos espaciais e
métodos de se obter os modos vibracionais de um determinado cristal.

4.2.4.- Propriedades das Tabelas de Caracteres

Uma propriedade importante das tabelas de caracteres é que as linhas da tabela, as


representações irredutíveis, comportam-se como vetores ortonormalizados. Isto quer dizer que
as representações são ortogonais entre si, e que os caráteres representam componentes de
vetores normalizados. Da mesma forma são as colunas entre si. Outra propriedade é a de que
o número de classes na tabela é igual ao número de representações irredutíveis.

Com essas propriedades, pode-se estabelecer as algumas relações. A ordem de um grupo pode
ser expressa como sendo (SALA, 2008)

44
∑ ( )] ( )

E o valor de n na expressão (4.7) é determinado pela expressão

( )
∑ ( )

Na qual é a ordem do grupo, é o número de operações de simetria na classe , éo


caráter da representação irredutível para a classe e representação , e é caráter da
representação redutível para a classe (SALA, 2008).

4.2.5 – Modos Normais em Espécies de Simetria

Para utilização das propriedades de ortogonalidade dos grupos, falta detalhar uma
característica das propriedades de simetria. Essas podem ser agrupadas em dois tipos, próprias
e impróprias. As operações próprias são as que somente executam rotações quando aplicadas.
As impróprias envolvem rotação-reflexão. Na tabela 4.4 listam-se as operações e seus ângulos
equivalentes.

Tabela 4.4: Classificação das operações de simetria quanto a rotações.

Operações Ângulo de atuação Operações Impróprias Ângulo de atuação


Próprias
Rotações ( ) Reflexões ( ) ou .
Identidade ( ) ou . Centro de inversão ( )
Rotações-reflexões ( )

A partir dessas propriedades das operações de simetria, pode-se construir uma


representação redutível que servirá de base formada pelas coordenadas cartesianas de
deslocamento, que com a equação (4.9) será possível isolar, por meio da relação , as
coordenadas vibracionais de um cristal, as coordenadas normais (SALA, 2008)
(NAKAMOTO, 2009).

45
Para construir a base é necessário calcular seus caráteres. Cada elemento do
grupo, as operações de simetria, contribuirá com um caráter. As operações de simetria
próprias têm seus caráteres calculados por

( ) ( )

Cada operação imprópria têm seus caráteres calculados por

( ) ( )

Onde é seu ângulo de rotação ou equivalente da operação calculada. Nas duas expressões,
significa o número de átomos cujas posições não mudam de sítio quando na atuação de
determinada operação, os que permanecem na diagonal da matriz.

O resultado será

( )
∑ ( )

( )
Onde é o caráter da representação relativo à operação .

Tendo pode-se, a partir da tabela de caracteres, calcular com a equação (4.9) a


representação para os movimentos moleculares, algo do tipo

∑ ( )

Que é a soma direta da contribuição de todas as espécies de simetria, e é a quantidade de


vezes que dada espécie aparece da representação .

De posse de prossegue-se por eliminar as contribuições de rotações e translações.


Isto é feito por inspeção na tabela de caracteres, que na coluna à direita exibe os tipos de
movimentos, e , com . Exclui-se de uma espécie de simetria para cada e
, totalizando 6 exclusões. E as espécies restantes são as relativas a vibrações, os modos
normais de vibração do cristal, e formam a representação , .

O Apêndice C mostra a aplicação deste método para a molécula de .

46
CAPÍTULO 5
TEORIA DO ESPALHAMENTO RAMAN

5.1 – A radiação eletromagnética e sua interação com a matéria

Da teoria clássica do eletromagnetismo, tem-se que uma carga elétrica sob a ação de
forças deve emitir energia em forma de radiação eletromagnética. Como os átomos possuem
cargas elétricas dispostas como dipolos, durante uma vibração destes dipolos, que é um
movimento com aceleração e desaceleração alternantes, deverá haver emissão de radiação. E
a frequência desta emissão será a mesma da vibração (HERZBERG, 1956).

Na atuação de um campo elétrico externo, uma molécula é submetida a um momento


de dipolo induzido. Disto duas possibilidades ocorrem, se a molécula estiver em repouso, a
emissão da radiação será a mesma frequência da incidente, porém, caso a molécula esteja
vibrando quando incidida pelo campo elétrico, a frequência da radiação emitida será
modulada pela frequência de vibração (SALA, 2008).

A radiação eletromagnética em sua descrição ondulatória estabelecida por James C.


Maxwell (1831 – 1879) pode ser descrita por dois vetores variantes que descrevem a
oscilação em fase dos campos elétrico e magnético durante a progressão da onda no espaço ao
decorrer do tempo. É então normalmente vista como composta de duas ondas perpendiculares
plano-polarizadas. Na figura 5.1 (a) tem-se uma representação gráfica de uma onda
eletromagnética com suas componentes elétrica polarizada na direção e sua componente
magnética polarizada na direção . Em (b) desta figura tem-se representações de algumas
características da componente elétrica, seu comprimento de onda e amplitude.

47
Figura 5.1: (a) Onda eletromagnética que se propaga na direção . (b) Características do componente elétrico da
onda eletromagnética.

Fonte: HOLLER, 2009, p.147.

De acordo com a formulação de J. Maxwell ficou estabelecido que as ondas


eletromagnéticas obedecem a duas equações que descrevem a relação entre os campos elétrico
e magnético. Para o campo elétrico, pela terceira equação de Maxwell, a Lei de Faraday,


∮⃗ ( )

Que para ondas progressivas, também vale a quarta equação de Maxwell, a lei de Ampère,

⃗⃗⃗
∮⃗ ( )

A terceira equação de Maxwell exprime o fato de que a variação no tempo do fluxo


magnético por uma região produzirá o aparecimento de um campo elétrico no entorno dessa
região. De maneira inversa, a quarta equação exprime que a variação temporal de um fluxo
elétrico numa região produzirá um campo magnético ao seu redor. Ver apêndice B para
dedução da velocidade de uma onda eletromagnética.

Contudo, a componente elétrica é a única considerada, pois é a responsável pelos


fenômenos ópticos tratados neste trabalho; tal como o espalhamento de luz.

Como uma onda, o campo elétrico de uma radiação eletromagnética possui


propriedades ondulatórias, como: comprimento de onda ( ), frequência ( ) e energia ( ).

48
Uma grandeza importante usada em espectroscopia vibracional é o número de onda ( ̃),
definido como,

̃ ( )

Onde a dimensão de ̃ é centímetros recíprocos ( ).

Considerando o caráter corpuscular da onda eletromagnética (pacotes de fótons), a


quantizado da radiação eletromagnética, como descrita por Albert Einstein (1879-1955) na
descrição do efeito fotoelétrico, pode-se fazer uso da relação de energia. E conveniente na
expressão da relação entre o comprimento de onda e a variação de energia,

̃ ( )

Sendo , a variação de energia entre dois estados durante uma transição molecular,
.E é a constante de Planck. A energia também pode ser escrita como . Em

que e é a frequência angular. Essas transições moleculares são provocadas pela

interação da radiação eletromagnética e a matéria na qual incide, neste caso, a molécula.

A radiação eletromagnética tem sua origem em movimentos não lineares de cargas


elétricas. De maneira geral, na oscilação de dipolos elétricos de moléculas, ou em transições
eletrônicas nos átomos. Isto depende da magnitude de energia envolvida. Energias mais
baixas são capazes de acelerar elétrons livres até provocar vibrações nas moléculas. Energias
mais altas provocam transições nos orbitais atômicos, dos mais externos aos mais internos, até
a fissão do núcleo, ao se aumentar a energia. A energia envolvida no fenômeno determinará a
frequência da radiação eletromagnética irradiada como consequência. A radiação, ao incidir
na matéria, tende a ter efeitos na matéria semelhantes aos que provocaram a radiação
incidente. A figura 4.2 exibe as faixas de radiações eletromagnéticas e os comportamentos da
matéria que são capazes de produzi-las com determinada frequência.

As regiões espectrais são faixas do espectro eletromagnético subdividido seguindo o


critério energético. O espectro eletromagnético estende-se desde as radiofrequências até às
radiações gama, em ordem crescente de energia. Maior energia implica maior frequência e
menor comprimento de onda.

49
Figura 4.2: Relação entre faixas de radiações eletromagnéticas e suas fontes.

Fonte: http://www.novafisica.net/projetos/microondas/conteudo.html

No que concerne à espectroscopia vibracional, é de interesse a região óptica,


considerada como abrangendo do ultravioleta ao infravermelho próximo. Mais precisamente,
de uma parte da região visível até a região do infravermelho a energia de radiação
eletromagnética ao interagir com a molécula provoca-lhe o efeito de vibrar, provocando o
efeito de transição de um nível vibracional para outro mais elevado. Evitando, contudo,
provocar-lhe transição eletrônica.

5.1.1 – Espalhamento de Radiação Eletromagnética

Através de experimentos utilizando interação de radiação eletromagnética incidentes


sobre um cristal, é possível que se obtenha informações detalhadas a respeito das relações de
dispersão ( ⃗ ) dos modos normais de um cristal (ASHCROFT, 1976).

Dessa interação, informação direta do espectro de modos normais (fônons) pode ser
medida pela variação da energia incidente e espalhada, por meio da conservação da energia,

50
∑ ⃗ ⃗ ( )

Onde os subscritos em indicam, respectivamente, espalhado e incidente. Considerando que


ao antes da incidência de radiação o cristal esteja em um estado no qual os fônons ocupam o
nível ⃗ , e após esteja em ⃗ . Logo,

⃗ ⃗ ⃗ ( )

Outra lei de conservação que atua na interação é a da conservação do momento do


cristal de um fônon. Momento de um cristal é apenas o nome dado à quantidade resultante de
multiplicado pelo vetor de onda ⃗ , e não sendo então um momento de fato. Esta quantidade
somente é conservada no espaço k, na rede recíproca.

Ambas as leis de conservação serão discutidas contextualizadas na seção seguinte.

Considerando-se o número de fônons absorvidos ou transmitidos entre um fóton e o


cristal, pode-se classificar o tipo de espalhamento: zero fônon, um ou mais fônons. Em
espalhamento com zero fônon trocado corresponde a se ter o espalhamento elástico de fótons.
No caso de um ou mais fônons, o fóton pode ser espalhado absorvendo ou transferindo fônons
em sua interação com o cristal, configurando o espalhamento inelástico.

Dois processos de espalhamento inelástico da luz permitem que se obtenham relações


de dispersão dos fônons que interagem com fótons. Ambos os processos fornecem informação
apenas da região próxima do centro da zona de Brillouin, ⃗ , pois o vetor de onda dos
fótons (da ordem de ) é pequeno quando comparados à zona de Brillouin (da ordem
de ). Um processo é o espalhamento de Brillouin, cujos fônons absorvidos e
emitidos são os de frequência acústica. O outro é o espalhamento Raman, para interações de
fótons com fônons de frequência ótica (ASHCROFT, 1978).

5.2 – Teoria da espectroscopia molecular vibracional Raman

Pesquisas espectroscópicas têm como objetivo o estudo estrutural e de propriedades


físicas da matéria, mais especificamente, seus arranjos atômicos, as moléculas. Porém
moléculas grandes têm dimensões pequenas demais para serem vistas diretamente. Para
51
contornar essa impossibilidade empregam-se os métodos espectroscópicos, com os quais se
podem realizar medições de propriedades físicas de moléculas indiretamente, através do
comportamento molecular sob a influência de radiação eletromagnética. Essa influência é
realizada por transferência de energia, que leva a molécula a exibir certo comportamento, e
que dois parâmetros principais governam: energia incidente e características próprias à
molécula.

Para cada método espectroscópico há um método de transferência de energia à


molécula e detecção do comportamento da molécula. No caso da espectroscopia vibracional
Raman, a molécula recebe energia de modo a fazê-la mudar seu modo vibracional. A detecção
das mudanças na molécula é feita pela detecção de radiação eletromagnética (na região do
visível, luz, ou infravermelho próximo) espalhada pela molécula.

Ressalta-se que se está lidando com objetos microscópicos, de dimensões cuja


descrição é mais bem realizada pela mecânica quântica, que envolve núcleos atômicos,
elétrons e seus movimentos relativos uns com os outros. Contudo, de maneira a se estudar
apenas as vibrações das moléculas, podem-se realizar algumas aproximações que tornem
possível uma descrição com um mínimo de mecânica quântica, mantendo-se assim um
modelo semi-clássico.

5.2.1 – Descrição do espalhamento Raman

Considerando a radiação monocromática incidente em uma molécula como descrita


pelo seu campo elétrico

⃗ ( ) ( )

Este campo interagirá com a molécula ocasionando-a um momento de dipolo induzido. A


suscetibilidade de o momento de dipolo da molécula ser variado por um campo elétrico
externo é denominado de polarizabilidade, ⃡. Esta relaciona o campo elétrico incidente ao
vetor do momento de dipolo induzido,

⃗ ⃡⃗ ( )

52
Este vetor oscila no tempo com uma sobreposição de frequências, do campo externo e da
molécula (WILSON; DECIUS; CROSS, 1980) (SALA, 2008). Em uma consideração harmônica,
pode-se aproximar ⃡ por uma expansão em série de Taylor truncada no segundo termo em
função de uma coordenada normal de vibração da molécula,

⃗ ( ) ( )

Tem-se,


⃡ ⃡⃗⃗⃗ ( ) ( )

O vetor de momento induzido resulta,


⃗ ⃡⃗⃗⃗ ( ) ( ) * ( ) ] ( ) ] ( )

O primeiro termo da direita representa o espalhamento Rayleigh, onde a frequência de


oscilação da radiação espalhada é a mesma da radiação incidente. O segundo termo representa
o espalhamento Raman. O ( ) ] indica oscilação de espalhamento com frequência
mais baixa do que , a frequência da radiação incidente, denominado banda Stokes. O
( ) ] representa espalhamento com frequência mais alta do que a radiação
incidente, este é a banda anti-Stokes.

O elemento ⃡ é denominado tensor de polarizabilidade (ou tensor Raman). Trata-se de


uma matriz simétrica ,( ), que descreve a transição vibracional da molécula.
Matricialmente, a expressão do momento de dipolo induzido pode ser escrita como

* + [ ]* + ( )

⃡⃗
A condição de variação da polarizabilidade é expressa por ( ) , que deve ser

diferente de zero, para deslocamentos nas proximidades da posição de equilíbrio (SANTOS,


2011) (NAKAMOTO, 2009). A figura 5.3 mostra a região de validade da aproximação em
série de Taylor.

53
Figura 5.3: Aproximação de uma curva de potencial por uma parábola, uma aproximação harmônica.

Os potenciais de ligação molecular são curvas como vista acima, e essas curvas
graduadas em subníveis energéticos, os subníveis de energia vibracional, com espaçamento
. Durante o efeito Raman, o processo de absorção e emissão (espalhamento) de
energia por radiações são realizadas por meio de fótons, ocorrendo transições entre níveis
vibracionais. O esquema da figura 5.4 ilustra a ideia. Se fótons emitidos tiverem a mesma
energia dos absorvidos, denomina-se o processo de espalhamento elástico de luz, caso tenham
energia diferente, denomina-se espalhamento inelástico de luz.

Figura 5.4: Poços de potencial para cada tipo de espalhamento da luz.

Na figura 5.4 vê-se o esquema de uma secção do potencial com três níveis, o
fundamental, um excitado e o estado virtual no qual a molécula reside durante a excitação da
fonte laser. O diagrama (a) ilustra o efeito Raman-Stokes, onde a energia do fóton
54
incidente eleva a molécula a um nível vibracional virtual, e quando a molécula retorna a um
nível estacionário ela emite um fóton com a energia excedente; como o nível inicial e de
maior energia que o inicial, a energia do fóton emitido será menor do que o absorvido, sendo
a diferença igual à diferença de energia entre esses níveis. No diagrama (b) tem-se o
espalhamento Rayleigh, o qual consiste em absorção e emissão de fótons de mesma energia.
Em (c) representa-se o Raman-anti-Stokes. Neste, a molécula já estando em um nível
energético excitado absorve energia de um fóton, e ao retornar do estado virtual estaciona em
um estado de menor energia que o inicial, emitindo um fóton com a energia do incidente
acrescida da diferença entre os níveis inicial e final. Nos dois casos de espalhamento Raman,
o termo é a energia vibracional da molécula.

Considerando a conservação da energia e momento, pode-se estabelecer a energia


absorvida pelo material na produção de fônons. Com a conservação da energia,

(⃗ ) ( )

Em que e são as energias dos fótons espalhado e incidente, respectivamente, e


( ⃗ ) é a energia do fônon. O sinal de mais e menos indica se se tem espalhamento Stokes
(menos), ou anti-Stokes (mais). Pela conservação do momento do cristal

⃗ ⃗ ⃗ ( )

Em que ⃗ , ⃗ e ⃗ são os vetores de onda da radiação espalhada, incidente e do fônon. A


figura 5.5 exibe uma representação das relações entre os vetores de onda, em (a) para o
espalhamento Raman-Stokes, e em (b) para o Raman anti-Stokes.

55
Figura 5.5: (a) Espalhamento Raman-Stokes. (b) Espalhamento Raman anti-Stokes.

Considerando que os vetores de onda podem ter orientações diferentes, o ângulo


formado entre os vetores da onda incidente e espalhado influencia o estabelecimento da
magnitude do vetor de onda do fônon, bem como a sua direção (ASHCROFT, 1976). A
direção de ⃗ é determinada pela soma ou diferença dos vetores de onda incidente e
espalhado, como exemplificado na figura 5.6, onde se têm as direções do vetor de onda do
fônon, em (a) no processo anti-Stokes, e em (b) o Stokes.

Figura 5.6: (a) ⃗ no Raman anti-Stokes. (b) ⃗ no Raman Stokes.

A banda anti-Stokes é muito menos intensa do que a Stokes. Isso é explicado devido
ao fato de a população de moléculas no estado fundamental ser muito maior do que a
população em um estado excitado. A figura 5.7 ilustra a diferença entre as intensidades
espalhadas, ainda que fora de escala. Sendo assim, as moléculas excitadas antes da incidência
de radiação emitirão mais energia ao irem do estado excitado inicial para o fundamental final.
Porém, uma descrição quantitativa é realizada por mecânica quântica.

56
Figura 5.7: Representação da diferença de intensidade das três possibilidades de espalhamento.

Outro tipo de representação para os processos de absorção e emissão de energia por


espalhamento elástico e inelástico é o representado por diagramas de Feynman, como exibido
na figura 5.8. Em (a) tem-se a incidência de um fóton que interage com o elétron levando-o a
um estado vibracional | ⟩ excitado, a rede absorve um fônon e retorna ao estado | ⟩, emitindo
um fóton de menor energia que o incidente. Em (b) processo similar ocorre, porém, neste o
estado | ⟩ é mais elevado, com isso o elétron recua a um estado mais baixo, | ⟩, emitindo um
fóton de maior energia que o incidente.

Figura 5.8: Diagramas de Feynman para o espalhamento da luz. (a) Representa o espalhamento Raman-Stokes.
(b) Tem-se o espalhamento Raman-anti-Stokes. Em (c) o espalhamento Rayleigh.

5.2.2 – A Elipsoide de polarizabilidade

A polarização de uma molécula se dá devido à interação da molécula com o campo


elétrico incidente. O movimento oscilatório dos núcleos e dos elétrons devido à oscilação dos
polos do campo elétrico causa nas moléculas uma distorção nas nuvens eletrônicas. A
separação entre as cargas positivas (núcleos) e negativas (elétrons) produz um momento de
dipolo
57
⃗ ⃡⃗ ( )

E considerando cada direção, esta toma a forma ⃗⃗ ⃡ ⃗ , com . Neste caso


não se está considerando os efeitos de polarização do campo elétrico e sua interação com as
componentes do tensor de polarizabilidade, apenas mostra-se a distinção entre direções
diferentes para as interações (NAKAMOTO, 2009).

Desta maneira, quando o campo elétrico interagir com a molécula, provocar-lhe-á


movimentos relativos entre os núcleos, que com os modos normais de vibração da molécula,
haverá variação nos momentos de dipolo, exemplificado na figura 5.9, para a molécula de
.

Figura 5.9: Relação entre a distância dos núcleos e variação do momento de dipolo.

Fonte: NAKAMOTO, 2009, p.33.

Porém, o espalhamento Raman está relacionado com a polarizabilidade da molécula.


Por isso, é útil utilizar-se de um modelo que exiba variações dessa propriedade. Este modelo é
a elipsoide de polarizabilidade. A elipsoide é um sólido esférico deformado de modo a
apresentar raio diferente em determinadas direções, contudo, ainda assim uma forma
simétrica. A figura 5.10 mostra em (a) a polarização, como por exemplo, de uma molécula
em uma configuração, e em (b) em outra.

58
Figura 5.10: Variação da polarizabilidade em relação a um eixo de coordenadas.

Quando há variação da polarizabilidade durante a interação da radiação


eletromagnética e a molécula, ocorre o espalhamento Raman. E termos mais precisos, uma
vibração molecular é ativa em Raman quando a elipsoide de polarizabilidade muda de
tamanho, forma ou orientação, para os dois extremos da oscilação.

Figura 5.11: (a) Molécula de . (b) Molécula de .

Fonte: NAKAMOTO, 2009, p.33.

A figura 5.11 mostra duas moléculas com representações gráficas para as mudanças
na polarização em cada modo normal. Em (a) todos os modos normais são ativos em Raman.
Porém, em (b) apenas o modo é ativo em Raman. A atividade Raman para a molécula de
pode ser ilustrada melhor considerando-se um gráfico para as duas possibilidades para

59
⃡⃗ ⃡⃗
( ) . Na figura 5.12 têm-se dois gráficos para as suas possibilidades de ( ) . Se diferente

de zero, significa que não se trata de um ponto de mínimo para a polarização em função da
⃡⃗
coordenada normal de vibração. Já para quando ( ) , sim, e isto configura o fato de a

molécula ter sua polarizabilidade alterada para intervalos pequenos da coordenada normal;
que é o intervalo da aproximação harmônica.

Figura 5.12: Relação da polarização com a variação da coordenada normal.

Fonte: NAKAMOTO, 2009, p.34.

5.2. – A Atividade em Raman

De modo mais descritivo, a atividade em Raman é regida pelo tensor de


polarizabilidade. Normalmente o tensor de polarizabilidade é representado por uma matriz
simétrica, ou seja, na matriz, há igualdade dos elementos acima da diagonal principal com os
elementos abaixo desta. E quando pelo menos um dos elementos do tensor for diferente de
zero haverá atividade Raman.

A expansão da polarizabilidade em série de Taylor resulta na expressão (SALA, 2008)


( ) ( ) ∫ ( ) ∫ ( )

60
Para o espalhamento Raman, a ortogonalidade entre as funções da primeira integral à direita
faz com que esse termo seja zero; caso contrário, serão funções do mesmo estado vibracional,
e consequentemente tratar-se-á de espalhamento Rayleigh. No segundo termo tem-se que a
derivada deve ser diferente de zero, situação que há variação da polarizabilidade com a
vibração. Sendo assim, a expressão para a atividade em Rama é


( ) ( ) ∫ ( )

Na quantização da energia, seus estados são descritos por funções de onda escritas em
função de coordenadas normais, ou seja, ( ). Transições entre dois estados quaisquer,
cujos números quânticos, anterior e posterior, sejam e , respectivamente, são dadas
considerando-se os componentes do tensor de polarizabilidade. Isto é expresso por

( ) ∫ ( ) ( ) ( )

Esta expressão determina a atividade de um modo normal cuja coordenada normal é . Outra
maneira de se expressar essa integral é pela notação de Dirac, na qual se tem

( ) ⟨ ( )| | ( )⟩ ( )

No qual o operador atua sobre ( ) e é representado na base ( ), resultando na


amplitude de probabilidade de uma superposição dos dois modos, de se encontrar ( ) no
nível ( ).

5.2.1 – Regras de seleção para níveis fundamentais

Para o caso de transições a partir do nível fundamental ( ) e o primeiro estado


excitado ( ) podem-se usar as propriedades de ortogonalidade entre representações
irredutíveis das tabelas de caracteres. Suponha-se uma transição

( ) ⟨ ( )| | ( )⟩ ( )

Esta equação pode ser escrita como (BERNATH, 1995) (SALA, 2008) (BARROW, 1962)
(NAKAMOTO, 2009)

61
∑ ( )

Esse produto triplo deve ser diferente de zero para que se tenha transição. O estado
vibracional fundamental é totalmente simétrico e invariante para qualquer operação de
simetria, este é o . A autofunção ( ) tem a mesma simetria de , logo, assume a
mesma representação irredutível, representada por . Consequentemente, para que a
transição seja permitida, diferente de zero, deve ser diferente de zero. Isso somente
ocorre caso essas duas representações não sejam ortogonais, que implica elas serem a mesma.

A representação é obtida de maneira similar à utilizada na seção 4.2.5. Porém, na


montagem da representação redutível as operações de simetria têm seus caráteres
determinados por:

 Próprias: ( ) ( )
 Impróprias: ( ) ( )

Ressalta-se, porém, que ao se aplicar a equação (4.9) os valores de apenas têm


significado útil para o fato de serem nulos ou não. Caso sejam nulos, a espécie de simetria
respectiva a não possui atividade em Raman (SALA, 2008).

Na segunda parte do apêndice C a atividade em Raman para a molécula de é


exemplificada.

5.3 – Geometria da Atividade em Raman

A atividade em Raman de um cristal é influenciada tanto pelas direções de polarização


da radiação incidente quanto pela orientação do cristal (as direções de suas ligações químicas)
na qual esta radiação incide, ou seja, da sua simetria (HERZBERG, 1956). Por essa razão, as
direções de orientação do campo eletromagnético incidente podem não coincidir com as
direções de polarização do cristal (NAKAMOTO, 2009). Consideremos na figura 5.12 uma
elipsoide de polarizabilidade de um cristal.

62
Figura 5.12: Elipsoide de polarizabilidade

Considere-se também que os eixos de orientação da elipsoide coincidam com os eixos


do cristal, formando os eixos principais de polarização. Da expressão (5.8) tem-se a relação
entre a polarização de um cristal sob a ação de um campo elétrico, ⃗ ⃡ ⃗ O tensor ⃡ está
relacionado com a facilidade de o cristal reagir ao campo elétrico, resultando na polarização.

De maneira detalhada a expressão (5.12) pode ser expressa, de outra maneira, como

, ( )

Em que os , com , chamadas constantes de proporcionalidades características


ao cristal (BRAND; SPEAKMAN, 1975). Esta propriedade está relacionada com a
capacidade de o cristal em despolarizar a radiação que nele incide (SALA, 2008). Isto porque
a radiação espalhada oscila com a mesma polarização, nos mesmos planos orientados, que
oscila o dipolo induzido (BRAND; SPEAKMAN, 1975). Considere que se tenha um campo
elétrico na direção , , isto fará que a expressão (5. 21) seja reduzida a

, ( )

O que mostra que a polarização da molécula pode ocorrer em direções diferentes da do campo
incidente. E se , ,e , consequentemente, a radiação espalhada será
despolarizada, pois será nulo, mas e não.

63
Com isto é notório o fato de que se podem obter informações adicionais acerca do
cristal com o emprego de radiação polarizada e diferentes direções de incidência; as ditas
medidas de polarização (SALA, 2008). Por exemplo, com este tipo de medida pode-se ter a
intensidade de espalhamento por um cristal para direções de polarização paralelas ou
perpendiculares.

Na descrição das medidas de despolarização, é necessária a utilização de uma notação


que informe as direções de incidência e detecção da radiação, esta é a notação de Porto. Nesta
notação indica-se a direção de incidência, entre parênteses indica-se a polarização da radiação
incidente e da espalhada, seguido direção de observação. Em caso de observação na mesma
direção de incidência utiliza-se uma barra sobre a letra.

Por exemplo, ( ) , que informa que a radiação incide na direção , polarizada na


direção , e é detectada em , polarizada na direção (relacionada ao componente ).
A figura 5.12 mostra um esquema de espalhamento para medidas de despolarização para o
exemplo da notação de Porto.

Figura 5.12: Medida da despolarização da luz, denotada segundo Porto como ( ) .

Uma vez conhecido os componentes para o tensor de polarizabilidade associados a


uma dada espécie de simetria, que pode ser obtida a partir da tabela de caracteres, pode-se
estimar a atividade em Raman para dada espécie de simetria. A intensidade de espalhamento
Raman é proporcional à (PORPORATI et al., 2009)

| ̂ ⃡ ̂ | ( )
64
Onde ̂ é o vetor (linha) unitário de polarização da radiação incidente, e ̂ é o vetor (coluna)
unitário da radiação espalhada; em coordenadas cartesianas. E ⃡ é o tensor de
polarizabilidade.

A maneira de se calcular é, para uma espécie de simetria ativa em Raman, calcular o


produto do tensor de polarizabilidade ⃡ com o vetor coluna ̂ , e em seguida multiplicar o
vetor resultante pelo vetor linha ̂ .

Nas tabelas de caracteres, como as listadas em Rousseau; Bauman; Porto (1981) o


tensor de polarizabilidade é expresso para suas componentes diferentes de zero, pois o valor
exato dependerá do cristal (BRAND; SPEAKMAN, 1975). Basta montar uma matriz
substituindo-se os elementos diferentes de zero por variáveis. Nas tabelas, as componentes de
mesmo valor são indicadas por uma soma, as de valores diferentes são separadas por vírgulas,
e as matrizes diferentes para uma mesma espécie de simetria são separadas por parênteses e
vírgula.

Por exemplo, para o grupo , sua tabela de caracteres listada em Rousseau;


Bauman; Porto (1981, p.288) exibe para a espécie de simetria as componentes do tensor
como sendo , uma matriz de duas variáveis, uma para e , e outra para
. Para a espécie exibe ( ), ( ), que analogamente resultam em
duas matrizes, uma para ( ), com duas variáveis, e outra para ( ),
também com duas variáveis.

As matrizes podem então ser definidas como sendo:

( ) ( +

( + ( +

( ) ( +

65
REFERENCÍAS

Alves, Van Sérgio da Silva. Notas de Aula de Métodos da Física Matemática II. Faculdade de
Física. UFPA. 2011.

Ashcroft, Neil W.; Mermin, N. David. Solid State Physics. Harcourt College Publishers.
1976.

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Bassalo, José M. F. Introdução à Teoria de Grupos. Universidade Federal do Pará. 1987.

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Brand, J. C. D.; Speakman, J. C. Molecular Structure: The Physical Approach. 2a ed. John
Wiley & Sons. 1975.

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1996.

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2009.

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66
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Perovskite-like Manganites. J. Raman Spectrosc. 32, 805-811. 2005.

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Física. 2005.

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Wilson, E. Bright; Decius, J. C.; Cross, P. C. Molecular Vibrations: The theory of Infrared
and Raman Vibrational Spectra. Dover Publications. 1980.

68
Apendice A
SOLUÇÃO DE SISTEMAS ACOPLADOS ATRAVÉS DE MODOS
NORMAIS

A descrição do movimento de moléculas poliatômicas pode ser feito de maneira geral


ao se resolver osciladores acoplados. Durante a resolução aparecem conceitos essenciais, que
mostram relação com a simetria molecular. Conceitos como frequências características
advindas do determinante característico do sistema linear acoplado, e de sua relação com os
modos normais de vibração. Estes últimos permitem a aplicação de coordenadas normais, que
relacionadas à simetria molecular, permitem a desacoplamento dos osciladores. E daí a
necessidade de se conhecer acerca da configuração espacial de molécula. No estudo da
simetria molecular conceitos importantes devem ser conhecidos, assim como a notação
própria usada na sua descrição. Dentre estes conceitos estão os elementos de simetria sobre os
quais agem as operações de simetria. E o agrupamento dessas operações nos chamados grupos
de ponto.

Oscilações Acopladas

O objetivo aqui é encontrar uma descrição para o sistema no qual cada oscilador
acoplado possa ser especificado quanto à sua oscilação. Para tanto, utiliza-se um exemplo de
dois osciladores acoplados, ligados por molas tanto entre si quanto a extremidades fixas,
como exibido na figura A.1.

Figura A.1: Sistema massa mola de dois corpos e três molas sem massa.

69
Consideram-se massas iguais, M, para ambos os corpos, e as ligações das
extremidades com mesma constante de força. Com isso têm-se os deslocamentos e para
e , respectivamente. Aplicando a segunda lei de Newton e a lei de Hooke,

̈
{
̈

Ao se agrupar esse sistema de forma a evidenciar e e igualando-os a zero, tem-se

̈ ( )
{
̈ ( )

Resolve-se esse sistema utilizando-se uma solução oscilatória do tipo ( ) .


Cuja segunda derivada é ̈ . Substituindo-a no sistema tem-se

( )
{
( )

Elimina-se o exponencial, resultando em

( )
{
( )

Daqui agrupam-se os termos, de maneira a explicitar e , de maneira que

( )
{
( )

A partir desse arranjo do sistema, pode-se montar um determinante com os


coeficientes de e . Esse determinante é chamado de determinante característico, dado
como

( )
| |
( )

Cujo cálculo leva a

( ) ( )

( ) ( )

√( ) √( )
70
Explicitando-se ,

Este divide-se em dois por causa do . Logo,

√ √

Estes dois ’s são chamados de frequências características do sistema. E delas pode-se


estabelece a seguinte solução geral para o movimento do sistema

( )
{
( )

Em que se tem uma combinação linear de casos particulares regidos pelas frequências
características encontradas. As equações de movimento ficam

( )
{
( )

Pode-se saber como o sistema se comporta de acordo com cada frequência ao se substituir
cada uma na equação acima.

Para √

( (√ ) ,

( (√ ) ,
{

( )
{
( )

71
{

Subtraindo-se uma equação da outra

Ou seja, se √ as amplitudes e têm deslocamentos em sentidos opostos

e magnitudes iguais.

Para √

( (√ ) ,

( (√ ) ,
{

( )
{
( )

E com √ as amplitudes e tem deslocamento no mesmo sentido e

magnitudes iguais.

Com as relações pode-se reescrever a soluções gerais para o


movimento de maneira simplificada

( )
{
( )

De oito coeficientes na solução anterior, agora figuram apenas quatro.

72
O que será feito agora é definir um sistema de coordenadas que exatamente agrupe os
deslocamentos regidos por e , separando-os. Para tanto, estabelecem-se as seguintes
coordenadas

Ou de maneira reversa

( )

( )

Substituindo essas novas coordenadas na equação de movimento inicial,

̈
{
̈

Agrupando e

̈ ( )
{
̈ ( )

Na segunda equação aplica-se o artifício ( ) ( ), resultando em

̈ ( )
{
̈ ( )

( ̈ ̈ ) ( )
{
( ̈ ̈ ) ( )

Que após simplificações resulta

̈ ( )
{
̈

Tem-se agora um sistema de duas equações desacopladas, cuja solução geral é

( )
{
( )

73
As coordenadas e são as coordenadas normais do sistema, pois oscilam numa
frequência única e bem definida. O diagrama da figura A.2 ilustra a separação por frequência
que foi realizada.

Figura A.2: Dois modos normais exibidos pelo sistema.

Quando tem-se um movimento assimétrico dos corpos, o que


caracteriza um modo normal de vibração associado a , e é descrito pela coordenada normal
. Quando tem-se um movimento simétrico dos corpos, caracterizando
outro modo normal de vibração, já este, associado a , e descrito pela coordenada normal
. Cada modo normal de vibração tem assim uma coordenada normal que o descreve.

REFÊNCIAS

Marion, Jerry B. Classical Dynamic of Particles and Systems. 2a ed. Academic Press. 1970.

Santos, Elinei P dos. Notas de Aula de Mecânica Clássica I. UFPA. 2011.

74
Apendice B
A LUZ COMO ONDA ELETROMAGNÉTICA

Aqui se descreve o processo de obtenção da velocidade da luz a partir de ondas


eletromagnéticas baseado em Halliday (1988, p.73).

Considera-se que as frentes de onda que atingem um objeto são planas, o que pode ser
devido à distância, ou às dimensões do objeto. Essas frentes de onda são definidas pelos
campos ⃗ e ⃗ . As linhas de força do campo ⃗ são paralelas ao eixo e perpendiculares ao
eixo y; as do campo ⃗ são perpendiculares a e paralelas a . As componentes não nulas
desses campos | ⃗ | ̂ e | ⃗ | ̂ para os campos ⃗ e ⃗ , respectivamente. Esta onda plana tem uma
evolução no tempo e na direção ̂, dependendo, assim, de e .

Desta forma, escrevem-se os elementos não nulos como sendo

⃗ ( )

⃗ ( )

Onde é a frequência angular da onda, e é o número de onda. Os dois

relacionam-se de maneira que , onde c é a velocidade da onda no vácuo, .

Tendo-se ondas propagando-se em fase, ambos os campos terão seus máximos


atingidos simultaneamente. O retângulo descrito por , é fixo no espaço, e por ele
atravessa a onda. Segundo a lei de Faraday, com a variação do fluxo magnético, que é a
variação da intensidade do campo na região retangular, tem-se o aparecimento de campos
elétricos induzidos em torno do retângulo, de intensidade ⃗ ⃗ . Este campo é o
componente elétrico da onda.

A relação entre os dois campos pode ser descrita aplicando-se a terceira equação de
Maxwell, relativa à lei de indução de Faraday,

∮⃗

75
Esta integral de caminho é em torno do retângulo de lados direito e esquerdo,
respectivamente, ⃗ e ⃗ ⃗ , e parte inferior e superior igual a .

Cuja solução é

∮⃗ ∮( ̂ ) ( ̂ ̂ )

∮( ̂ ) ( ̂ ̂ )

∫ ( )( ̂ ) ∫ ( ̂ )( ̂ ) ∫ ( )( ̂ ) ∫( ̂ ̂ )( ̂ )

∫ ∫ ( ) ( ) ( )( )

∮⃗

Tem-se o fluxo do campo magnético através do retângulo expresso por ⃗( ).


Cuja derivada no tempo pode ser expressa por

Substituindo os resultados na lei de indução, tem-se


⃗ ⃗

76

Tanto ⃗ quanto ⃗ são funções de ambos x e t. Porém ao se deduzir , supõe-se t como

constante. Analogamente para , para o qual x é tido constante. Isto leva a uma expressão

com derivadas parciais, que resulta em

⃗ ⃗

A diferença de sinal expressa o fato de que quando ⃗ se afasta de x, ou seja, tem maior
intensidade, ⃗ se aproxima de x, ou seja, tem menos intensidade.

Realizando-se as derivações de ⃗ e ⃗ , em relação a e a , respectivamente, tem-se


( )] ( )


( )] ( )

Sendo assim,

⃗ ⃗
( ) ( )

Que pode ser escrito como

( )
( )

Ou,

⃗ ⃗

Tem-se assim que a velocidade da onda é igual à razão das amplitudes dos campos.

A análise do fluxo do campo elétrico é feito de maneira similar à feita para o fluxo do
campo magnético. Nesta, utiliza-se a equação da lei de Ampère estendida por Maxwell
(quarta equação de Maxwell),

∮⃗ ( *

77
Levando em conta que , pois não há corrente de indução em ondas eletromagnéticas
propagando-se no vácuo. Sendo assim,

∮⃗

Esta equação mostra que a variação do fluxo de um campo elétrico produz um campo
magnético ao redor de .

A integração no caminho fechado resulta,

∮⃗ ∮( ̂) ( ̂ ̂ )

∮( )̂ ( ̂ ̂ )

∫ ( )( ̂ ) ∫ ( ̂)( ̂ ) ∫ ( )( ̂ ) ∫ ( ̂ ̂)( ̂ )

∫ ∫ ( ) ( ) ( )( )

∮⃗

Sendo o fluxo do campo elétrico através do retângulo ( )( ) sua derivada resulta


em
78
Desta maneira, a quarta equação de Maxwell resulta em

⃗ ⃗

Em derivadas parciais,

⃗ ⃗

O sinal negativo é devido ao mesmo motivo da equação com derivação parcial anterior. A
variação positiva de ⃗ no tempo é acompanhada de uma variação negativa de ⃗ no espaço.

Efetuando-se as derivações parciais, tem-se


( )] ( )


( )] ( )

Logo,

⃗ ⃗
( ) ( )

( )
( )

79
O valor resultante de c, após se substituírem as constantes, é o valor da velocidade da
luz no vácuo. Esta velocidade foi obtida nesta dedução a partir de considerações para ondas
eletromagnéticas.

REFÊNCIAS

Halliday, D.; Resnick R. Física 4. 4ª ed. LTC. 1988.

80
APENDÍCE C
MODOS NORMAIS DE VIBRAÇÃO E ATIVIDADE EM RAMAN PARA

Como exemplo do que foi exposto na seção 4.2.5 tomemos a molécula de água .
Ela pertence ao grupo de ponto , e sua tabela de caracteres é mostrada na tabela C1.

Tabela C1: Caráteres para a molécula de água.

1 1 1 1
1 1 -1 -1
1 -1 1 -1
1 -1 -1 1

Fonte: SALA, 2008, p.113.

Para obtermos a representação redutível para as coordenadas de deslocamentos


seguimos o procedimento da seção 4.2.5

Considerando a figura 4.2, quando a operação atua na molécula os três


átomos permanecem em seus respectivos sítios. Para os átomos 1 e 2 trocam de posição,
mas 3 permanece imóvel. Para , ocorrem a mesma troca, e 3 também permanece imóvel.
Quando atua, nenhum átomo muda de lugar. . Desta forma, tem-se na tabela C2 os
caráteres para cada elemento do grupo.

Tabela C1: Caráteres para a representação .

própria própria imprópria imprópria

( ) ( ) ( ) ( )

81
Embora facilmente identificável por inspeção, a ordem do grupo é dada pela aplicação
da equação (4.8), que fornece, tomando ,

∑ ( )] ]

Todas as classes possuem apenas um elemento, logo, é igual a para todos os


elementos do grupo. Com estes valores podem-se calcular os modos que possuem a mesma
simetria que cada espécie. Sendo assim, coma equação (4.9), tem-se

( )
( ) ]

( )
( ) ( ) ( ) ]

( )
( )( ) ( ) ]

( )
( )( ) ( ) ]

Com estes resultados podemos montar a representação redetível para os movimentos


da molécula,

( )

Porém, em (C.1) estão inclusos todos os movimentos, ou seja, translações,


rotações e vibrações. Por inspeção da tabela de caracteres obtém-se que: a espécie contém
um movimento translacional, ; a espécie possui um movimento rotacional, ; a espécie
contém e ; e a espécie contém e . Excluindo-se uma unidade nos coeficiente
das espécie em para cada ou relacionado como uma espécie de simetria, tem-se
assim apenas os modo vibracionais, , cuja representação é

( )

Estes são as simetrias para os três modos normais de vibração para a molécula de .
Sendo assim, os modos normais de vibração dessa molécula se transformam de acordo com
estas representações irredutíveis do grupo de ponto (BARROW, 1962).

82
Para conhecermos quais espécies de simetria possuem atividade em Raman,
prosseguimos com que é exposto em 5.2.

Primeiro deve-se obter a base , construída pelas relações (5.22) e (5.23). Sendo
assim,

própria própria imprópria imprópria

( ( ( (
) ) ) )

Por já se ter informações de e , segue-se por calcular quais modos são ativos,
deste modo

( )
]

( )
( ) ( ) ]

( )
( ) ( ) ]

( )
( ) ( ) ]

Os valores para encontrados, por serem diferentes de zero, indicam que todas as
espécies de simetria possuem atividade em Raman.

Considerando que para as vibrações tem-se , os três modos normais


de vibração da molécula de são ativos em Raman.

REFERÊNCIAS

83
Barrow, Gordon M. Introduction to Molecular Spectroscopy. McGraw-Hill. 1962.

Bernath, Peter F. Spectra of Atoms and Molecules. Oxford University Press. 1995.

Brand, J. C. D.; Speakman, J. C. Molecular Structure: The Physical Approach. 2a ed. John
Wiley & Sons. 1975.

Sala, Oswaldo. Fundamentos da Espectroscopia Raman e no Infravermelho. 2ª ed. Unesp.


2008.

84
APENDÍCE D
HISTÓRIA DA ESPECTROSCOPIA POR ESPALHAMENTO DE LUZ

A história da espectroscopia inicia-se, principalmente, com duas curiosidades do ser


humano. Uma em entender o que é a luz, e a outra entender um fenômeno luminoso muito
comum: o arco-íris. Um arco-íris pode ser descrito como um espectro de cores dispersas,
porém, sua descrição como tal e entendimento científico, foi resultado de séculos de
indagações e estudos. Que é o desenvolvimento da própria óptica e o entendimento da
interação da luz com a matéria.

Um dos primeiros filósofos, devido a registros escritos, a tentar explicar porque


ocorrem os arco-íris foi Aristóteles (384 a.C. – 322 d.C.) . Este considerava o fenômeno como
reflexão de luz solar por gotículas de água em suspensão na atmosfera, que eram os
causadores das variações nas cores dos raios luminosos. Aristóteles observou ainda que tais
reflexões ocorriam para um ângulo determinado. Apenas em 1304 que um monge alemão,
Teodorico de Freiberg (1250 – 1310), realizou uma experiência com esferas ocas cristalinas,
estabelecendo que o arco-íris é devido a uma combinação de reflexão e refração dos feixes
luminosos por cada gotícula de água, e que em conjunto resultava no fenômeno observado.
Apesar de não apresentar explicações acerca do que leva ao aparecimento das cores
(BASSALO, 1992).

O filósofo Alexandre de Afrodísias (~200 a.C.) foi um grande estudioso de Aristóteles,


e que adicionou ao conhecimento do grande filósofo, no que se refere a óptica, ao observar
um segundo arco-íris que se formava acima do segundo, porém com a ordem das cores
invertidas; o arco-íris secundário. Também relatou uma região entre os dois arco-íris, na qual
não há fenômeno, e a esta chamou de região escura, pois é uma região ligeiramente mais
escura que o céu azul; ficando conhecida como região escura de Alexandre (BRITANNICA,
2011) (ROCHA, 2002).

Um cientista polonês chamado Erazmus Ciolek Witelo (1225 – 1275) escreveu um dos
mais importantes tratados sobre óptica do período medieval. Nele, Witelo realizou
experiências similares as de Teodorico, com as quais conseguiu reproduzir o arco-íris

85
secundário e os ângulos relativos entre a incidência da luz sobre as gotículas de água e o
ângulo de observação. Estabeleceu o ângulo em aproximadamente 42 graus para o arco-íris
primário e 50 graus para o secundário (BASSALO, 1992).

O fenômeno de dispersão da luz em suas cores componentes foi descrito com o rigor
científico por Isaac Newton (1643 – 1727). Em 1672, relatou à Royal Society experiências
realizadas em 1665 com prismas vendidos em mercados como brinquedos. Uma descrição
mais completa foi publicada em 1704 em sua obra Opticks. Nesse famoso experimento, I.
Newton fez incidir um feixe luminoso, proveniente de uma pequena fenda, sobre um prisma,
localizado num recinto escuro. O feixe luminoso emergente do prisma foi projetado num
anteparo, onde se observou a decomposição da luz em suas cores componentes. Essa imagem
seguia uma ordem, do vermelho ao violeta, da qual Newton estabeleceu os diferentes índices
de refração para cada cor. A essa imagem projetada pelo prisma I. Newton chamou de
espectro; introduzindo o termo. I. Newton experimentou impor dispersão, com um prisma, a
feixes de cores individuais advindas de outro prisma, porém não houve decomposição.
Newton conseguiu ainda refinar seu experimento com o uso de uma lente colimadora
promovendo a melhora do espectro resultante (WILLIAMS, 1976) (PARK, 2006).

Além da dispersão, outro fenômeno de grande importância na ótica é o a difração, o


qual exprime o desvio de um feixe de luz que se propaga através de um obstáculo. Este foi
descoberto pelo padre italiano Francesco M. Grimaldi (1618 – 1663). F. Grimaldi realizou
vários experimentos estudando o comportamento da luz face a diversos tipos de obstáculos e
os estranhos padrões de sombras que se formavam. Publicou estas experiências em seu livro
Physico Mathesis de Lumine Coloribus et Iride. I. Newton realizou vários experimentos
baseados no trabalho de F. Grimaldi e os publicou em seu Opticks (ROCHA, 2002)
(BASSALO, 1992).

Um físico, matemático e médico dinamarquês chamado Erasmus Bartholinus (1625 –


1698) realizou vários experimentos de óptica com um cristal chamado na época de espato-da-
islândia, atual calcita. E. Bartholinus observou que este cristal tinha a capacidade de duplicar
as imagens que lhe atravessassem, a este fenômeno chamou de dupla refração; também
conhecido como birrefringência. Mais ainda, quando este cristal era rotacionado, uma das
imagens permanecia parada, porém a outra girava junto com o cristal. E. Bartholinus não
soube explicar o fenômeno. Contudo, considerando que as duas imagens eram uma partição
do feixe incidente, chamou o feixe emergente estacionário de ordinário, e o que rotacionava
86
de extraordinário. O feixe ordinário demonstrou comportamento compatível com a lei de
Snell-Descartes. E. Bartholinus publicou seus estudos (ROCHA, 2002).

Ao ter conhecimento dos resultados das pesquisas de E. Bartholinus, Christiaan


Huygens (1629 – 1725) empreendeu a tarefa de desvendar o misterioso do comportamento
das imagens refratadas pelo cristal. C. Huygens realizou experimentos com dois cristais
alinhados sendo atravessados por um feixe luminoso. E observou que conforme a rotação
relativa dos cristais os feixes emergentes variavam em número, de dois a quatro, com
intensidades também variantes. Conquanto não conseguisse estabelecer uma razão pela qual
este fenômeno acontecia, C. Huygens conseguiu determinar o fenômeno como sendo de
polarização. Termo cunhado por ele mesmo, e que descreve a situação de feixes luminosos
sofrem seleção, em sua intensidade, nas direções nas quais as ondas oscilam. De acordo som
sua própria teoria ondulatória da luz na qual a luz realiza oscilações similares a ondas na
superfície da água. Os trabalhos de Robert Hooke (1635 – 1703) publicados em seu
Micrographia, em 1665, influenciaram as ideias de C. Huygens a respeito do modelo de
frente de onda e da luz ser como esferas oscilações que se propagam de maneira crescente. Os
resultados de C. Huygens foram publicados em seu Tratado da Luz, de 1678 (ROCHA, 2002)
(BASSALO, 1992) (NYE, 2002).

Em 1800, Friedrich Wilhelm Herschel (1738 – 1822) ao realizar experimentos com


dispersão de luz por prismas notou que um termômetro colocado para medir a temperatura de
cada cor media-as com temperaturas diferentes, crescentes do violeta até o vermelho, sendo
que a maior temperatura era registrada na região contígua além do vermelho; que não possui
luz visível (WILLIAMS, 1976). A esta região chamou de infravermelho. Ele foi levado a
realizar esses experimentos quando notou que vidros de cores diferentes usados em
telescópios apresentavam temperaturas diferentes. Ele também demonstrou que esses raios,
que denominou de calóricos, podiam ser refletidos e refratados (NYE, 2002).

A descoberta de atividade no outro limite do espectro é creditada a Johann Wilhelm


Ritter (1776 – 1810), que realizou experimentos sobre os efeitos químicos da luz. Ele
acreditava que a polaridade da natureza se manifestaria de modo a haver um simétrico aos
raios quentes de Herchel. Ele tinha conhecimento que o cloreto de prata escurecia ao ser
exposto à luz, e que para a luz azul este escurecimento era ainda mais pronunciado. J. Ritter
realizou então experimentos com cada faixa de luz e descobriu que o cloreto de prata
apresentava escurecimento mais acentuado para cada cor com aumento indo do vermelho para
87
o azul. E ao colocar papéis tratados com cloreto de prata na região contígua ao violeta em que
nenhuma luz é visível, notou que o escurecimento da placa era ainda maior. Denominou
então esta região de ultravioleta (WILLIAMS, 1976) (NYE, 2002).

Baseado nos trabalhos de R. Hooke e C. Huygens, Thomas Young (1773 – 1829)


realizou seu clássico experimento com a passagem de um feixe de luz por dois orifícios
projetando um padrão de interferência em um anteparo. Nesse período também divulgou seu
princípio da interferência, o qual exprime que o efeito resultante de duas ondas de fontes
diferentes se propagam, próxima- ou exatamente sobre a mesma direção é uma combinação
do movimento de cada uma. Apesar de muitos fenômenos terem sido explicados pela teoria
ondulatória, a ideia newtoniana de luz corpuscular não foi rejeitada (ROCHA, 2002).

Um dos que subscreviam à ideia de luz formada por corpúsculos era Étienne-Louis
Malus (1775 – 1812). Em experiências tentou encontrar fundamentos corpusculares no
fenômeno da polarização. E. Malus propunha um modelo de composição dos raios por
partículas não esféricas, porém arredondadas, que ele denominava de moléculas luminosas. A
esses corpúsculos ele associou três eixos ortogonais que seriam orientáveis na direção da luz.
Com esse modelo ele tentou explicar a polarização da luz em termos de paralelismo ou não
entre os feixes e os eixos das moléculas luminosas. Contudo, foi a teoria ondulatória que viria
a explicar melhor tanto a polarização quanto a dupla refração. Ainda que não tenha tido êxito
no que pretendia, seus esforços levaram-no a descobrir em 1809 que feixes luminosos eram
polarizados ao refletirem em vidros de janelas que analisava (ROCHA, 2002) (NYE, 2002).

Se por um lado a ideia corpuscular da luz não explicava o fenômeno da polarização, a


teoria ondulatória avançava. Em 1816, Dominique-François-Jean Arago (1786 – 1853) e
Augustin-Jean Fresnel (1788 – 1827) relataram observações a respeito do fato de os raios
ordinários e extraordinários não produzirem padrões de interferência. Dos experimentos
inferiram que os raios estavam polarizados perpendicularmente. Isto levou a T. Young, em
1817, a estabelecer que a luz é uma onda transversal, ou seja, que vibra transversalmente
(ROCHA, 2002).

David Brewster (1781 – 1868) em suas extensas pesquisas a respeito da


polarizabilidade publica em 1816 em seu trabalho, D. Brewster (1816, p.156), a respeito de
um fenômeno que descobrira: a fotoelasticidade. Este fenômeno explica o aparecimento de
propriedades polarizadoras em materiais que naturalmente não as têm, e que passam a tê-las

88
sob a ação de estresse. Em seu artigo ele descreve em forma de várias proposições como
diversos materiais, minerais, animais e vegetais, apresentam tais propriedades em certas
condições (BREWSTER, 1816).

Um grande avanço na história da ótica foi dado por Joseph Fraunhofer (1787 – 1826).
Inicialmente soprador de vidro, teve a oportunidade de ser aprendiz de grandes mestres até se
tornar um dos maiores oculistas de sua época. Muito hábil no trato de vidros, produziu
prismas e outros instrumentos óticos de altíssima qualidade. Com suas experiências a respeito
da dispersão de luz alcançou um nível de detalhes dos espectros nunca antes obtidos, o que
lhe permitiu encontrar várias linhas escuras no espectro solar, as Linhas de Fraunhofer
(FRAUNHOFER, 1817). Apesar da descoberta, não pode explicá-las. Ele encontrou próximo
de 700 linhas e classificou as mais pronunciadas por linhas de A até H. Estas linhas tornaram-
se padrões em medições de espectros. Fraunhofer também estendeu a ideia do experimento de
fenda única de T. Young e criou a rede de difração (1823). Sua habilidade grande e consegui
fabricar uma rede de transmissão em vidro com uma ponta de diamante e um processo
mecanizado, esta foi a primeira deste tipo. Suas redes de difração eram tão eficientes que
permitiram as melhores medições do comprimento de onda das cores componentes da luz até
então feitas. Na produção de seus instrumentos óticos de qualidade excelente J. Fraunhofer
também contada com artesãos habilidosos de um monastério dominicano local (WILLIAMS,
1976) (BRITANNICA, 2011) (ASIMOV, 1966) (NYE, 2002).

A primeira medida de absorção de luz, do infravermelho, foi feita por John Friedrich
William Herschel (1792 – 1871), filho de Friedrich Wilhelm Herschel, em 1840. Nesse
experimento, ele demonstrou que a absorção de radiação térmica da água é diferente da
absorção exibida por certas bebidas constituídas de álcool (WILLIAMS, 1976).

Os desenvolvimentos técnicos de J. Fraunhofer propiciaram muitas melhorias nos


instrumentos óticos, e por volta do século 19 muitas pesquisas foram feita acerca dos
espectros de emissão de chamas e centelhas. Dentre muitas vale mencionar o trabalho de
Jean-Bernard-Léon Foucault (1819 – 1868). J. Foucault, em 1848, notou que uma chama que
emitisse linhas D (linha de Fraunhofer) absorveria linhas D de outra fonte de luz localizada
atrás da chama de sódio. Estes resultados, junto com os de outros pesquisadores, formaram
uma relação entre os espectros de emissão e absorção e suspeitas de relação com a
composição química das chamas (WILLIAMS, 1976).

89
A explicação dessa relação entre absorção e emissão foi dada por Gustav Robert
Kirchhoff (1824 – 1887). G. Kirchhoff estudou a emissão a luz solar e de chamas de vários
elementos químicos, bem como absorções, e inferiu uma lei, a lei de Kirchhoff. Esta lei
exprime que a razão entre a emissividade (poder de emissão) e a absortividade (poder de
absorção) de um mesmo comprimento de onda é constante para todos os corpos a uma mesma
temperatura. Isto implica o fato de um gás que emite um tipo de espectro com determinadas
linhas, deve possuir um espectro de absorção exibindo absorção das mesmas linhas. Fato que
consequentemente explicou as Linhas de Fraunhofer, cujas linhas escuras eram devidas a
absorções pelas camadas gasosas mais externas do sol. G. Kirchhoff associou-se ao químico
Robert Wilhelm Bunsen (1811 – 1899) cuja cooperação iniciou a análise química por
espectros de muitos elementos, bem como da atmosfera solar. Esta cooperação é o início da
história da espectroscopia como técnica de análise da constituição da matéria, tanto na Terra
quanto com o auxílio de um telescópio para estudar corpos fora da Terra. Com esses estudos
ficou estabelecido que cada elemento químico possui um espectro característico, solucionando
assim a questão das Linhas de Fraunhofer (WILLIAM, 1976) (BRITANNICA, 2011)
(ASIMOV, 1966). Em um artigo os dois fundamentaram o novo método de análise baseado
nos espectros, Kirchhoff; Bunsen (1861, p.452): “Pode-se basear na existência dessas raias
um método de análise qualitativa que alarga consideravelmente o domínio das investigações
químicas e permite resolver problemas até aqui inabordáveis”.

Outra questão era a respeito da cor azul do céu. John Tyndall (1820 – 1893), em uma
série experimentos (TYNDALL, 1869), mostra que o azul que obtinha de líquidos
vaporizados iluminados por uma lâmpada elétrica poderia estar relacionado com o azul
exibido pelo céu. Os experimentos de J. Tyndall consistiam de medir os ângulos de
polarização da luz emitida por nuvens luminosas azuis exibidas quando líquidos vaporizados
contidos em um tudo de vidro eram iluminados por um filamento elétrico. Como resultado,
observou que para todos os tipos de substâncias tinham uma polarização preferencial que era
em ângulos retos em relação ao feixe incidente, e que era possível, caso se fizesse com que as
partículas ficassem finas o suficiente, obter que todas as substâncias exibissem um tom de
azul que Tyndall (1869, p. 387) referiu-se como “... uma cor rivalizável ao mais puro céu
italiano”. De acordo com ele, Tyndall (1869, p. 394), “a ideia de que a luz do céu seja devida
à ação de matéria finamente reduzida, deixando a atmosfera um meio túrbido através do qual
observamos a escuridão do espaço, data tão longe quanto Leonardo da Vinci”. Em seus
experimentos, J. Tyndall utilizava um instrumento chamado prisma de Nicol, assim chamado
90
em referência ao seu desenvolvedor. Este instrumento fazia uso das propriedades das calcitas
em polarizar luz. O prisma consistia de duas partes de calcita coladas por uma camada de
resina, chamada de balsamo do Canada, montado de maneira que se pode facilmente
determinar o plano de polarização da luz proveniente da outra parte de calcita (ASIMOV,
1966) (TYNDALL, 1869).

O problema que havia em se entender as relações entre os feixes incidentes e emitidos


pelas supostas partículas em suspensão na atmosfera terrestre teve uma solução proposta por
John William Strutt (o terceiro barão de Rayleigh) (1842 – 1919). Em seu artigo escrito a
respeito da luz do céu, sua polarização e cor (STRUTT, 1871), o barão de Rayleigh ressaltou
que havia equívocos no uso dos termos usados. Como exemplo citou o artigo de J. Tyndall
(TYNDALL, 1869), no qual aponta que o uso impreciso dos termos reflexão e refração levam
a conclusões erradas, pois esses dois termos não se aplicam ao caso em que os comprimentos
de onda da luz sejam maiores que as dimensões das partículas. Segundo ele (STRUTT, 1871,
p.88) “Certamente não há nada na etimologia da reflexão e refração que proíba suas
aplicações neste sentido; porém, as palavras adquiriram significados técnicos, e tornaram-se
associadas a certas leis bem conhecidas estabelecidas segundo esses termos”, e “A ideia de
polarização por reflexão está consequentemente fora de lugar”. Com isso ele estabelece o uso
do termo espalhamento para os casos em que os corpos que interagem com a luz são menores
do que o comprimento de onda, chegando à sua lei para o espalhamento da luz: “Quando luz é
espalhada por partículas que são muito pequenas comparadas com qualquer dos
comprimentos de onda, a razão das amplitudes das vibrações das luzes incidente e espalhada
varia inversamente como o quadrado do comprimento de onda, e a intensidade das próprias
luzes como o inverso da quarta potência” (STRUTT, 1871, p.91). Firmando a base do
espalhamento de luz (STRUTT, 1871, p.95): “O princípio da energia esclarece que a luz
emitida lateralmente não é uma criação, mas apenas desviada do raio principal. Se eu
representar a intensidade da luz primária após atravessar uma espessura do meio túrbido,
tenho , onde é a constante independente de ”. Dessa relação ele
determinou que a luz espalhada tende para o amarelo e finalmente para o vermelho com o
aumento da espessura do meio.

Até por volta de 1870 os estudo de espectros eram feito visualmente e com desenhos
manuais, com os instrumentos chamados espectroscópios. A partir de 1870 placas fotográficas

91
tornaram-se mais acessíveis, e com isso os espectroscópios foram melhorados, dando origem
aos espectrógrafos (WILLIAMS, 1976).

Fazendo uso de um espectrógrafo, o barão de Rayleigh realizou experimentos, em


1871, e determinou que os espectros fotográficos dos comprimentos de onda da luz espalhada
por meios mais densos continham menor intensidade de cores de comprimento de onda
menor. Com isso explica-se não somente o azul do céu, mas também o vermelho do céu ao
pôr do sol (STRUTT, 1871).

O grande momento de consagração da teoria ondulatória da luz veio quando James


Clerk Maxwell (1831 – 1879) em 1865 publicou seu trabalho onde expôs as quatro leis que
regem o eletromagnetismo. Seu intento era dar forma matemática ao extenso trabalho
experimental de Michael Faraday (1791 – 1867). A partir de suas quatro equações (as leis de
Gauss para o campo elétrico e magnético, a lei de Ampère, e a lei da indução de Faraday), J.
Maxwell foi capaz de estabelecer a igualdade entre a velocidade de uma onda eletromagnética
e a velocidade da luz (LOPES, 1992) (BRITANNICA, 2011) (HALLYDAY, 1988).

A comprovação da teoria de J. Maxwell a respeito das ondas eletromagnéticas foi feita


por Heinrich Hertz (1857 – 1894) em 1887. H. Hertz montou um circuito oscilador pequeno
que produzia ondas hertzianas (ondas de rádio) e outro circuito similar que as detectava.
Demonstrou com isso que as ondas produzidas apresentavam todas as propriedades das ondas
eletromagnéticas de J. Maxwell, incluindo os fenômenos exibidos pela luz como: reflexão,
refração, difração, polarização e interferência (ROCHA, 2002) (TIPLER, 2003).

Outro avanço feito na maneira de se medir espectros foi feito com a invenção dos
interferômetros. Os interferômetros são instrumentos que permitem medições precisas de
feixes luminosos quanto aos seus comprimentos de onda. São os mais relevantes aqui: o de
Michelson, construído por Albert Abraham Michelson (1852 – 1932), em 1893; o outro o de
Fabry-Perot, construído por Charles Fabry (1867 – 1945) e Alfred Perot (1863 – 1925), em
1896 (BRITANNICA, 2011). O advento dos interferômetros propiciou mais uma melhoria
nos instrumentos de medição de espectros, dando origem aos espectrômetros.

No final do século 19, Wilhelm Konrad Röntgen (1845 – 1923), quando


experimentava com fluxos de corrente elétrica, descobriu que um estranho tipo de radiação
causava fluorescência em platinocianeto de bário. Após experimentos, ele descobriu que
muitos materiais se comportavam de maneira transparente a estes raios, raios que denominou
92
Raios-X. Desde então estes raios começaram a ser utilizados no estudo da estrutura interna de
materiais (BRITANNICA, 2011) (TIPLER, 2003).

Após a formulação de J. Maxwell com a qual ficou demonstrado que a luz é uma onda
eletromagnética, em 1905, Albert Einstein (1879 – 1955) estabeleceu que a luz interage com a
matéria comportando-se como um feixe de partículas, os quanta, que são pacotes com
quantidade determinada de energia. Essas partículas, denominadas fótons, são capazes de
provocar a ejeção de elétrons da superfície de metais, quando os quanta possuem energia
(frequência) mínima para tal, o chamado efeito fotoelétrico (LOPES, 1992) (BRITANNICA,
2011) (TIPLER, 2003).

Max von Laue (1879 – 1960), em 1912, sugeriu que os raios-x de W. Röntgen teriam
comportamento ondulatório cujos comprimentos de onda seriam de mesma ordem de
magnitude que o espaçamento dos materiais, o que permitiria que um cristal regular
funcionasse como uma rede de difração tridimensional. No mesmo ano, William Henry Bragg
(1862 – 1942) estabeleceu um método de análise de raios-x difratados por cristais. Propôs que
os cristais seriam formados por planos atômicos de espaçamento regular, os planos de Bragg,
e que raios difratados por esses planos interfeririam uns com os outros, para ângulos de
espalhamento iguais para os feixes incidente e espalhado. Deduziu assim a célebre lei de
Bragg (BRITANNICA, 2011) (TIPLER, 2003).

A ideia de que o espalhamento de raios-x ocorria por colisões entre os fótons dos
raios-x com os elétrons do material foi proposta por Arthur Holly Compton (1892 – 1962) em
1922 (publicado em 1923). A. Compton propôs que o espalhamento dos raios-x seriam
colisões entre um fóton e um elétron obedecendo às leis da mecânica relativística. Em seus
experimentos, observou também que os comprimentos de onda dos feixes espalhados eram
em geral maiores, ou seja, havia um deslocamento em frequência do feixe espalhado, e
estavam em função do ângulo de incidência (LOPES, 1992) (TIPLER, 2003).

Ao estudar a interação de luz com a matéria Léon Nicolas Brillouin (1889 – 1969), em
1922, previu que a frequência da radiação espalhada pelo meio sofreria deslocamentos devido
a variações na densidade do meio. Esta variação seria em consequência de deslocamentos
relativos entre os planos de Bragg ocasionados por ondas de baixa frequência, ou seja,
acústicas, presentes no meio. Os deslocamentos na frequência espalhada são explicados por
efeito Doppler associado aos deslocamentos dos planos, que funcionam como uma rede de

93
difração. A descoberta desse fenômeno iniciou o ramo da acusto-ótica, que estuda os efeitos
de ondas acústicas no índice refrativo dos materiais e suas consequências na interação de
ondas de luz com esse material (PIKE, 2002) (SHELBY; et al, 1985) (ASHCROFT, 1976).

Outra previsão teórica acerca de espalhamento de luz foi realizada por Adolf Gustav
Smekal (1895 – 1959) em 1923. A. Smekal previu que o espalhamento inelástico de luz
monocromática incidente sobre gases, líquidos ou sólidos sofre deslocamento em frequência.
Ele estudava a dependência da velocidade da luz em um meio em relação ao índice de
refração desse meio, e por consequência a dependência em relação ao comprimento de onda
da luz; o que é conhecido por dispersão de ondas. Considerando em seus estudos o princípio
da correspondência de Bohr e uma estrutura quântica para a luz, ele determinou que a luz
espalhada exibiria um feixe de mesma frequência que o feixe incidente, bem como dois feixes
com deslocamento em frequência, um com frequência maior e outro com frequência menor
(MOMBER, 2010) (SINGH, 2002).

As previsões de A. Smekal sobre o espalhamento de luz vieram a ser comprovadas


experimentalmente por Chandrasekhara Venkata Raman (1888 – 1970), em 1928, apesar de
que C. Raman não tivesse sido influenciado pelos trabalhos de A. Smekal. As pesquisas de C.
Raman foram influenciadas principalmente pelos trabalhos de Herman von Helmholtz (1821 –
1894), do barão de Rayleigh e pelos resultados obtidos por A. Compton (SIGNH, 2002)
(VENKATARAMAN, 1995). Contudo, C. Raman não aceitara a explicação do barão de
Rayleigh para a cor azul do céu, e em um artigo, em 1922, demonstrou utilizando a fórmula
de Einstein-Smoluchowski que o azul do céu era devido à difração da luz pelos oceanos;
conquanto a relação do poder de espalhamento varie da mesma maneira que o barão de
Rayleigh previra em 1871 (STRUTT, 1871), como sendo inversamente com a quarta potência
do comprimento de onda (SIGNH, 2002). C. Raman e seus colaboradores realizaram vários
experimentos no período de 1922 a 1927 com vários materiais, vapores, líquidos e sólidos.
Ele procurava o que ele acreditava ser um análogo para os fótons ao que acontecia com o
efeito Compton para os raios-x, no qual os fótons espalhados possuíam deslocamentos nas
frequências; segundo ele próprio afirmou em sua publicação após receber o prêmio Nobel em
1930, Raman (1930, p.270).

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Resumo dos acontecimentos históricos:

1665 – Difração da luz (F. Grimaldi)

1665 – Estudos sobre a dispersão da luz por prismas (I. Newton)

1665 – Luz como esferas crescentes rapidamente oscilatórias (R. Hooke)

1669 – Dupla refração em Calcita (E. Bartholinus)

1678 – Descrição da polarização da luz (C. Huygens)

1800 – Descoberta da radiação infravermelha (J. Herschel)

1801 – Interferência da luz (T. Young)

1803 – Descoberta da radiação ultravioleta (J. Ritter)

1808 – Polarização da luz por reflexão (E. Malus)

1815 – Comportamento fotoelástico de materiais (D. Brewster)

1817 – Linhas espectrais solares (J. Fraunhofer)

1823 - Rede de transmissão (J. Fraunhofer)

1840 – Primeira medida de absorção de infravermelho (J. Herschell (filho))

1848 – Estudo de emissão e absorção do sódio (J. Foucault)

1859 – Relação entre absorção de emissão de luz pela matéria (G. Kirchhoff)

1860 – Estudos espectroscópicos sobre emissão e absorção de luz por elementos químicos (G.
Kirchhoff e R. Bunsen)

1865 – Equações do Eletromagnetismo (J. C. Maxwell)

1869 – Polarização de luz emitida e relação com o tamanho das partículas (J. Tyndall)

1870 – Disponibilidade de placas fotográficas

1881 – Estabelecimento da teoria do espalhamento da luz (barão de Rayleigh)

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1887 – Produção e detecção de ondas eletromagnéticas (H. Hertz)

1893 – Interferômetro de Michelson (A. Michelson)

1895 – Descoberta dos raios-X (W.K. Röntgen)

1896 – Interferômetro de Fabry- Pérot (C. Fabry e A. Pérot)

1905 – Efeito fotoelétrico e caráter corpuscular da luz (A. Einstein)

1912 – Difração de Raios-X por cristais (W. L. Bragg)

1922 – Espalhamento inelástico da luz por ondas acústicas no material (L. Brillouin)

1923 – Efeito Compton, raios-X constituídos de fótons que colidem com os elétrons (A.
Compton)

1923 – Previsão do deslocamento de frequências de luz espalhada por materiais por


espalhamento inelástico (A. Smekal)

1928- Comprovação experimental das previsões de Smekal, efeito Raman (C. Raman)

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