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10.37885/211106649
RESUMO
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
INTRODUÇÃO
ASPECTOS METODOLÓGICOS
Delineamento do estudo
Local do estudo
A Bahia corresponde a uma área territorial de 564.760,427 km², sendo o 5º maior estado
das 27 unidades federativas do Brasil (IBGE, 2020). Conforme a proposta de regionalização
da saúde adotada no Estado, o Plano Diretor de Regionalização (PDR) divide o espaço
geográfico do estado em 28 regiões de saúde (assim definidas por dispor, no mínimo de
ações e serviços de atenção primária; urgência e emergência; atenção psicossocial; aten-
ção ambulatorial especializada e hospitalar; e vigilância em saúde) que se aglutinam em 09
Macrorregiões de Saúde e abrange 417 municípios. Destas, 14 possuem mais de 100 mil
habitantes e foram incluídas, quais sejam: Salvador, Feira de Santana, Vitória da Conquista,
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
Camaçari, Juazeiro, Itabuna, Ilhéus, Teixeira de Freitas, Jequié, Barreiras, Alagoinhas, Porto
Seguro, Paulo Afonso, Santo Antônio de Jesus (tabela 1).
Tabela 1. Regiões de Saúde e municípios baianos com população superior a 100.000 habitantes avaliados no período
compreendido entre 2010 à 2020.
Quantidade de mu-
Total de municípios ads-
Região de Saúde nicípios com mais de Munícipios
critos
100.000 habitantes
Candeias, Itaparica, Lauro de Freitas, Madre de Deus,
Salvador 10 municípios 2 Salvador, Santo Amaro, São Francisco do Conde, São
Sebastião do Passé, Saubara e Vera Cruz
Amélia Rodrigues; Anguera; Antônio Cardoso; Baixa Grande;
Candeal; Capela do Alto Alegre; Conceição do Jacuípe;
Coração de Maria; Feira de Santana; Gavião; Ichu; Ipecaetá;
Feira de Santana 28 municípios 1 Ipirá; Irará; Mundo Novo; Nova Fátima; Pé de Serra; Pintadas;
Rafael Jambeiro; Riachão do Jacuípe; Santa Bárbara;
Santanópolis; Santo Estêvão; São Gonçalo dos Campos; Serra
Preta; Tanquinho; Teodoro Sampaio; Terra Nova
Anagé; Barra do Choça; Belo Campo; Bom Jesus da Serra;
Caetanos; Cândido Sales; Caraíbas; Condeúba; Cordeiros;
Vitória da Conquista 19 Municípios 1 Encruzilhada; Maetinga; Mirante; Piripá; Planalto; Poções;
Presidente Jânio Quadros; Ribeirão do Largo; Tremedal e
Vitória Da Conquista.
Camaçari; Conde; Dias D’ávila; Mata de São João; Pojuca e
Camaçari 6 Municípios 2
Simões Filho
Campo Alegre de Lourdes; Canudos; Casa Nova; Curaçá;
Juazeiro 10 Municípios 1 Juazeiro; Pilão Arcado; Remanso; Sento Sé; Sobradinho e
Uauá.
Almadina; Aurelino Leal; Barro Preto; Buerarema; Camacan;
Coaraci; Floresta Azul; Gongogi; Ibicaraí; Ibirapitanga; Itabuna;
Itabuna 22 Municípios 1 Itaju do Colônia; Itajuípe; Itapé; Itapitanga; Jussari; Maraú; Pau
Brasil; Santa Cruz da Vitória; São José da Vitória; Ubaitaba
e Ubatã.
Arataca; Canavieiras; Ilhéus; Itacaré; Mascote; Santa Luzia;
Ilhéus 8 Municípios 1
Uma e Uruçuca.
Alcobaça; Caravelas; Ibirapuã; Itamaraju; Itanhém; Jucuruçu;
Teixeira de Freitas 13 Municípios 1 Lajedão; Medeiros Neto; Mucuri; Nova Viçosa; Prado; Teixeira
De Freitas e Vereda.
Aiquara; Apuarema; Barra do Rocha; Boa Nova; Brejões;
Cravolândia; Dário Meira; Ibirataia; Ipiaú; Irajuba; Iramaia;
Jequié 26 Municípios 1 Itagi; Itagibá; Itamari; Itaquara; Itiruçu; Jaguaquara; Jequié;
Jitaúna; Lafaiete Coutinho; Lajedo do Tabocal; Manoel Vitorino;
Maracás; Nova Itarana; Planaltino e Santa Inês.
Angical; Baianópolis; Barreiras; Brejolândia; Catolândia;
Cotegipe; Cristópolis; Formosa do Rio Preto; Luís Eduardo
Barreiras 15 Municípios 1
Magalhães; Mansidão; Riachão das Neves; Santa Rita de
Cássia; São Desidério; Tabocas do Brejo Velho; Wanderley.
Acajutiba; Alagoinhas; Aporá; Araçás; Aramari; Cardeal da
Silva; Catu; Crisópolis; Entre Rios; Esplanada; Inhambupe;
Alagoinhas 18 Municípios 1
Itanagra; Itapicuru; Jandaíra; Ouriçangas; Pedrão; Rio Real
e Sátiro Dias.
Belmonte; Eunápolis; Guaratinga; Itabela; Itagimirim; Itapebi;
Porto Seguro 8 Municípios 2
Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália.
Abaré; Chorrochó; Glória; Jeremoabo; Macururé; Paulo
Paulo Afonso 9 Municípios 1
Afonso; Pedro Alexandre; Rodelas e Santa Brígida.
Amargosa; Aratuípe; Castro Alves; Conceição do Almeida; Dom
Macedo Costa; Elísio Medrado; Itatim; Jaguaripe; Jiquiriçá;
Laje; Milagres; Muniz Ferreira; Mutuípe; Nazaré; Presidente
Santo Antônio de Jesus 22 Municípios 1
Tancredo Neves; Salinas Da Margarida; Santa Teresinha;
Santo Antônio de Jesus; São Felipe; São Miguel das Matas;
Ubaíra e Varzedo.
Fonte: elaborada pelos autores. Regiões de Saúde do Estado da Bahia. Disponível em: <http://www1.saude.ba.gov.br/mapa_bahia/
indexch.asp>. Acesso: 23 de fevereiro de 2021.
Coleta de dados
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
No presente estudo foram utilizados dados secundários disponíveis no DATASUS,
por meio do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/ SUS),
para obtenção do número de ICSAP por condição cardiovascular, cujo diagnóstico princi-
pal se referia a um dos seguintes códigos da Décima Revisão da Classificação Estatística
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10): hipertensão arterial
(I10 e I11); angina (I21; I24); insuficiência cardíaca (I50); e doenças cerebrovasculares (I63,
I64, I67; G45). Estes agravos constam na Lista Brasileira de Condições Sensíveis à Atenção
Primária, instituída pela Portaria MS/SAS no 221, de 17 de abril de 2008.
Os registros das internações foram obtidos do Sistema de Informações Hospitalares do
SUS (SIH/SUS-http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sih/cnv/sxuf.def) e tabulados pelo
programa Microsof Excel®. Os dados da população residente foram obtidos das estimativas
de população realizadas pela Rede Interagencial de Informações para a Saúde (RIPSA) e
pelo IBGE, acessíveis no sítio eletrônico do Departamento de Informática do SUS (DATASUS
-http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=02). A cobertura populacional pela
Estratégia Saúde da Família anual, a variável cobertura da ESF, definida como a proporção
da população coberta pelo programa em cada município, foi elaborada mediante informações
fornecidas pelo Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde (DAB) referentes
ao mês de outubro de 2020 (última data de atualização no site (https://egestorab.saude.gov.
br/paginas/acessoPublico/relatorios/relHistoricoCoberturaAB.xhtml).
RESULTADOS
Tabela 2. Variação no número de Internações Totais e Internações por Condições Cardiovasculares Sensíveis à Atenção
Primária em regiões de saúde do Estado da Bahia, Brasil, 2010-2020.
Ano de Internação
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
A causa de internação geral mais frequente, excluindo-se as causas obstétricas
(26,10%), foi por doença do aparelho circulatório, representando 453.258 (11,18%) das
hospitalizações, destas internações por doenças do aparelho circulatório, 70,89% (321.321)
foram por CSAP. Dessa forma, ao analisar o número de internações por todas as causas, veri-
ficou-se que houve uma redução de 28,04% do ano de 2010 para o ano de 2020. Já as ICSAP
por DCV tiveram um decréscimo de 34,07%. Em 2010, as ICSAP por DCV representaram
8,23% de todas as causas por internação, já em 2020 há uma queda para 7,54% (Tabela 2).
Ao analisar ano a ano, verifica-se, que não houve alteração significativa na taxa das
internações por ICSAP no decorrer dos anos, com o ano de 2011 apresentando o maior
coeficiente de todos os anos, com 5,4 internações a cada 1.000 habitantes. Em 2020 ob-
serva-se um decréscimo na taxa das internações por ICSAP (Gráfico 1).
Gráfico 1. Taxa (por 1000 pessoas) das internações por condições sensíveis à atenção primária por Doenças Cardiovasculares
em regiões de saúde do estado da Bahia, Brasil, no período de 2010 a 2020.
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
Tabela 3. Caracterização das ICSAPs segundo sexo e grupo de causas e diagnósticos. Regiões de Saúde da Bahia com mais
de 100 mil habitantes, Brasil, 2010 a 2020.
Ao analisar o comportamento das internações, segundo faixa etária por condições car-
diovasculares, observa-se que houveram quedas da taxa em todas as faixas consideradas
(Gráfico 2). No ano de 2010 a faixa etária de 80 anos ou mais teve 40,6/1.000 hab. de taxa
de internação, sendo a maior do ano; seguida pela faixa de 70 a 79 anos com 27,1/1.000
hab. Já no ano de 2020, observou-se que essas faixas etárias continuam com o primeiro
e segundo lugar, respectivamente, entretanto suas taxas de internação variaram, sendo
21/1.000 hab. Para a faixa etária de 80 anos ou mais, e 13,5/1.000 hab. a faixa etária de 75
a 79 anos. Além disso, é possível observar que todas as faixas etárias obtiveram quedas
em sua frequência como observado (Gráfico 2).
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
Gráfico 2. Taxa de hospitalização por condições sensíveis à atenção primária (CSAP) por Doenças Cardiovasculares (por
1000 habitantes), segundo faixa etária, Regiões de Saúde da Bahia, Brasil, 2010-2020
Sistema de informações hospitalares do SUS (SIH/SUS), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2021.
Fonte: elaborada pelos autores.
DISCUSSÃO
O presente estudo revelou que houve uma redução de 34,07% nas Internações por
Condições Cardiovasculares Sensíveis à Atenção Primária na década analisada. Essa queda
ocorreu na maioria das regiões de saúde, principalmente nas regiões de Jequié, Ilhéus, Santo
Antônio de Jesus e Itabuna. Sabendo que a análise da evolução das ICSAP contribui para
avaliar indiretamente a qualidade do sistema de saúde, especialmente a Atenção Primária,
uma vez que um melhor acesso à APS está associado a menos internações por CSAP
(BOING, 2012), e considerando sua associação com a expansão da cobertura da ESF na
região da Bahia, que atinge uma cobertura de 77,68% em outubro de 2020 (BRASIL, 2021),
a oferta mais adequada de serviços de saúde pode ter importante responsabilidade nesse
resultado. Segundo Macinko (2015), a expansão da ESF tem sido associada à redução da
mortalidade por causas cardiovasculares e cerebrovasculares, a reduções nas taxas de
hospitalização para condições sensíveis a cuidados ambulatoriais e a diminuição nas taxas
de complicações de algumas condições crônicas (MACINKO e HARRIS, 2015).
Em um estudo realizado por Zarlotti (2017) demonstraram forte correlação inversa entre
ICSAP e cobertura da ESF, uma vez que o aumento da cobertura do PSF foi acompanhado
por grande redução das ICSAP no período de 1999-2013, em Petrópolis, Rio de Janeiro.
Outra pesquisa realizada por Boing (2012) identificou redução substancial nas internações
por CSAP no Brasil entre 1998 e 2009, período em que o Brasil vivenciou forte expansão
da ESF, especialmente a partir do final da segunda metade da década de 1990. A cobertu-
ra populacional da ESF aumentou de 6,6% em 1998 para 50,7% em 2009 (BOING, 2012).
Demonstrando a capacidade da ESF em evitar ou reduzir a ocorrência de internações, mos-
trando-se um meio eficaz, comprovando que realmente estas internações podem ser evitadas.
O estudo de Mendonça e Albuquerque (2014), e o de Brasil e Costa (2016) demonstram
uma redução das ICSAP no Pernambuco e em Florianópolis, respectivamente, concordando
com os dados do presente estudo a respeito da diminuição das ICSAP; como visto em rela-
ção a queda de internação por IC - principal causa de internação em 2010 - e a diminuição
geral dos números de internação (32.291 em 2010 para 24.027 em 2020). Contudo, como
abordado por Malvezzi (2018), em revisão de literatura nacional, existe limites para a coleta
dos dados, e limites para a utilização do indicador como a avaliação da APS; além de que
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
os dados são secundários por serem processados a partir da Autorização de Internação
Hospitalar - AIH; acrescenta também a ausência de emissão AIH para as internações em
Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e outras unidades de saúde não hospitalares que
mantém o paciente por período maior que 24 horas. Assim, ao se analisar o perfil de aten-
dimento nessas unidades existem indicativos de aumento da prevalência das ICSAP se
esses dados fossem incorporados às internações. “Estudo específico sobre a validação e
sensibilidade do sistema SIH/SUS, utilizando o prontuário como padrão ouro, aponta que
o referido sistema deixa de captar cerca de 18% das verdadeiras ocorrências de ICSAP”
(MALVEZZI, 2018, p.7).
Ademais, apesar desta redução das hospitalizações por CSAP ocasionadas por DCV,
observa-se que das internações por doenças do aparelho circulatório, principal responsável
pela ocupação de leitos hospitalares, 70,89% são consideradas evitáveis. Refletindo, desta
forma, na qualidade da assistência ofertada, visto que a falta de acesso a APS de qualidade
e resolutiva pode levar à manutenção de taxas elevadas de internações por CSAP (BOING,
2012). Além de as menores taxas de internações por CSAP estão associadas com maior
disponibilidade de médicos generalistas por habitantes, melhor avaliação do serviço por parte
do usuário, continuidade da assistência com o mesmo médico de família, maior número de
consultas preventivas e regiões com centros de saúde (BOING, 2012).
É visto que, quando comparado ano a ano, nota-se uma pequena alteração das taxas
de ICSAP com redução significativa apenas no ano de 2020. Essa queda na taxa de inter-
nações por CSAP decorrente das DCV, deve-se ao fato que durante o ano de 2020, em
decorrência da pandemia da COVID-19, no Brasil, houve redução da assistência à saúde
cardiovascular da população brasileira atendida pelo SUS, que teve como consequências a
redução do número de internações por DCV e o aumento da taxa de letalidade intra-hospi-
talar decorrente dessas (NORMANDO, 2021).
Observa-se que as faixas etárias mais avançadas são as que apresentam maior taxa
de internação. Em estudo ecológico de Magalhães e Morais Neto (2017) que analisou dados
de internação da cidade de Goiânia, a faixa etária de 60 anos ou mais apresentou maior
taxa de internação (intervalo que engloba as subdivisões de faixas etárias que mais se des-
tacaram em nosso estudo). O mesmo estudo também encontrou as doenças do aparelho
circulatório como as condições mais prevalentes, tendo a IC e angina como os principais
grupos de causa (MAGALHÃES, 2017). A IC também ocupou o segundo lugar com 15,5%
das internações, na cidade de Cotia-SP no estudo exploratório de Torres e Ciosak (2014).
Ferreira (2014) identificaram que as doenças do aparelho circulatório foram responsá-
veis por 41,5% das causas das ICSAP, sendo os diagnósticos de IC (14,8%), angina (14,1%),
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
doenças cerebrovasculares (9,7%) e hipertensão (2,9%) os mais encontrados (FERREIRA,
2014). Todos esses estudos estão em concordância com o presente artigo.
Todas as faixas etárias tiveram queda da taxa de internação ao se comparar os anos
de 2010 e 2020. Segundo Normando (2021), todas as internações hospitalares por razões
cardiovasculares, apresentaram decréscimo entre os anos 2019 e 2020 para todas as faixas
etárias, principalmente, nos meses de abril e maio, possivelmente um reflexo da pandemia
da COVID-19. Uma vez que, o receio da população em contrair o vírus e a sistematiza-
ção da assistência, priorizando a pandemia, justificam esse impacto durante este período
(NORMANDO, 2021).
Com o avançar das faixas etárias, aumentaram-se as internações, mesmo com o curso
se voltando a diminuição das ICSAP no período. Com base no estudo de Rodrigues-Bastos
(2013) que avaliou o município de Juiz de Fora de 2002 a 2009, percebe-se semelhan-
ças de resultados:
“As doenças do aparelho cardiovascular (insuficiência cardíaca, angina pectoris e
doenças cerebrovasculares) surgem como mais frequentes de ICSAP na faixa de 25-39
anos em ambos os sexos e ausentes nas faixas etárias inferiores. [...] Na faixa etária acima
de 60 anos, houve queda das hospitalizações por doenças cardiovasculares e pulmonares
(de 1,0/mil hab. nas internações por insuficiência cardíaca, 1,9/mil hab. por doenças cere-
brovasculares, 1,11/ mil hab. por angina pectoris e 1,11/mil hab. por doenças pulmonares)
[...].” (RODRIGUES-BASTOS, 2013, p.123)
Isso pode ser visto nos gastos das ICSAP, como abordado por Souza e Peixoto (2017),
em estudo descritivo que avaliou os gastos das ICSAP no Brasil de 2000 a 2013, houve re-
dução geral na proporção dos gastos. Entretanto, chamou a atenção para a persistência da
elevada proporção atribuída às DCV e o aumento da contribuição da internação por angina
(SOUZA e PEIXOTO, 2017).
Avaliando os sexos, para Gouveia (2016), em estudo ecológico realizado em municípios
mineiros com mais de 100 mil habitantes, entre 2000 a 2013, ocorreu redução das ICSAP por
1000 habitantes, sendo até 2003 mais frequentes a internação entre mulheres e a partir de
2004 mais frequente em homens. Na análise discutida em nosso estudo, os homens também
lideram essas internações mesmo com a diminuição geral em ambos os sexos. Já em estudo
ecológico realizado por Lentsck, Latorre e Mathias (2015) que avaliou as Internações por
Condições Cardiovasculares Sensíveis à Atenção Primária no estado do Paraná de 2000
a 2011, mostrou também declinou da taxa de internação em ambos os sexos e nas faixas
etárias de 35 a 74 anos, além das taxas serem maiores no sexo masculino.
Em relação aos óbitos por condições cardiovasculares sensíveis à APS apresenta
tendência crescente com o aumento da idade, visto que as DCV afetam os segmentos
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
de faixa etária mais velha, tendo o Acidente Vascular Cerebral, Não Especificado como
Hemorrágico ou Isquêmico como principal causa dos óbitos que poderiam ser evitados, se-
guido de Insuficiência Cardíaca e Infarto Agudo do Miocárdio. Na década analisada houve
redução no número absoluto de óbitos em decorrência das Condições Cardiovasculares
Sensíveis à Atenção Primária, quando comparado o ano de 2010 e o ano de 2020, poden-
do ser reflexo da falta de notificação adequada no período da pandemia do COVID-19 em
2020 e da falta de estrutura do sistema de saúde em atribuir a causa do óbito relacionado
à COVID-19 como cardiovascular, apesar da interação COVID-19 e sistema cardiovascular
atualmente ser bastante reconhecida (NORMANDO, 2021).
Embora a cobertura populacional pela ESF tenha aumentado em todas as CIR avalia-
das no período, esta não ocorreu de forma homogênea e não é seguro explicar, sozinha, a
redução das ICSAP. Haja visto que a internação hospitalar também pode ser explicada pela
morbidade, fatores socioeconômicos e geográficos, prática médica, sistema de saúde, além
da oferta de leitos hospitalares. A exemplo, têm-se as quatro CIR com maior taxa de cober-
tura da ESF - Teixeira de Freitas, seguida por Porto Seguro, Santo Antônio de Jesus e por
Juazeiro - possuem taxa de internação de 4,3/1.000 hab., 3,39/1.000 hab., 4,93/1.000 hab.
e 3,99/1.000 hab., respectivamente. Essas regiões ficam atrás de Paulo Afonso (1,66/1.000
hab.) e Feira de Santana (2,46/1.000 hab.) em taxa de cobertura de ESF e, mesmo assim,
apresentam resultados melhores. Já grandes centros urbanos do estado, como Salvador
(3,7/1.000 hab.), Feira de Santana (3,2/1.000 hab.), Vitória da Conquista (5,7/1.000 hab.) e
Jequié (8,5/1000 hab.) - em que se espera que haja melhor assistência com mais hospitais,
maior oferta de leitos, funcionamento de unidades de atendimento 24 horas e maior número
de consultas - apresentam as maiores taxas de internação da década.
Como se observa por Resende e Barbieri (2017), as ICSAP podem ser influenciadas
por fatores econômicos, sociais e de acesso aos serviços de saúde, embora a implantação
da ESF esteja associada à redução das ICSAP no Brasil e nos estados. Buscando analisar
esse impacto, foi realizado por ÖZÇELIK (2020) que verificou o impacto do Programa Mais
Médicos do Brasil (PMM) nas hospitalizações por doenças cerebrovasculares e hipertensão
usando dados municipais que cobrem o período de 2009-2017, e mostrou que o PMM se
correlacionou com menos hospitalizações por doença cerebrovascular a partir do terceiro
ano de implantação do programa.
A partir disso, constata-se que apesar da correlação inversa entre a cobertura da ESF
e ICSAP, é necessário que a assistência à saúde seja ofertada com qualidade, para se obter
menores taxas de internações por CSAP, e, consequentemente, contribuir para a redução
de gastos, uma vez que as ICSAP por DCV corresponderam a 12% (549.286.744,19) de
todos os gastos com internações na década estudada. Ademais, os grupos diagnósticos que
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
foram responsáveis por mais de 50% dos gastos com ICSAP foram Doenças Isquêmicas
Agudas do Coração, IC e Infarto Agudo do Miocárdio.
Os resultados de um estudo realizado por Ferreira (2014) demonstraram que nos três
anos analisados, os maiores gastos nas ICSAP ocorreram com os diagnósticos de angina
(35,7%), IC (22,5%) e doenças cerebrovasculares (13,4%). Ou seja: 71,6% dos recursos
financeiros gastos pelo SUS com o ICSAP na Região de saúde de São José do Rio Preto-SP
referiram-se às doenças do aparelho cardiocirculatório (TORRES e CIOSAK, 2014).
Altos valores de ICSAP podem representar fragilidades e/ou baixa resolutividade na
porta de entrada do sistema. A identificação dos grupos mais prevalentes entre as popula-
ções permite a reestruturação de políticas e programas, bem como a reformulação de ações
direcionadas às patologias em regiões específicas, o que, entre outras vantagens, poderá
subsidiar o planejamento e a tomada de decisões nessas localidades.
Os achados do presente estudo podem ser de grande valia para a gestão dos serviços,
especialmente nas áreas prioritárias em que houve aumento, melhorando a assistência à
população e com grande potencial de promover a melhoria tanto da qualidade das informa-
ções futuramente prestadas quanto das propostas para avaliação das políticas de saúde.
Alguns estudos sugerem que a expansão da ESF foi associada a melhorias na saúde da
população (BASTOS, 2017), enquanto as reduções no acesso aos serviços de APS podem
levar a aumentos na carga de mortalidade devido a condições de saúde sensíveis ao acesso
oportuno e adequado à atenção primária (FRANCESCONI, 2020).
Entre as limitações da pesquisa, ressalta-se, primeiramente, a cautela a se ter na
interpretação de seus resultados e os aspectos comuns aos estudam que utilizam dados
secundários como o SIH-SUS, sujeitos à subnotificação e erros de digitação, em especial
no ano de 2020 com o advento da pandemia da COVID-19. Ademais, o cálculo de taxas de
internação por habitante depende de dados populacionais que, para o período estudado,
resultam de projeções e estimativas. Contudo, os aspectos relacionados às limitações do
uso de bases dos sistemas de informação no Brasil não invalidam a importância das infor-
mações geradas, pois a sua abrangência estadual permite a visualização de um panorama
amplo das condições de saúde.
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