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Internações por Condições


Cardiovasculares Sensíveis à Atenção
Primária em municípios do estado da
Bahia, 2010 - 2020

Jefersa Arienne de Carvalho Faria da


Silva
UFBA

Mirele Alves da Silva


UFBA

Nília Maria de Brito Lima Prado


UFBA

10.37885/211106649
RESUMO

OBJETIVO: caracterizar as internações por condições cardiovasculares sensíveis à


APS, em regiões de saúde (CIR) do estado da Bahia com mais de 100 mil habitantes,
entre o período de 2010 a 2020. METODOLOGIA: trata-se de um estudo de natureza
quantitativa, descritivo e exploratório, no qual foram utilizados dados do DATASUS, para
obtenção do número de ICSAP por condição cardiovascular. Foram calculadas as taxas
de ICSAP para mil habitantes e as causas mais frequentes analisadas por sexo e faixa
etária. RESULTADOS: Das internações por doenças do aparelho circulatório, 70,89%
foram ICSAP. O maior percentual se referiu a IC (27,82%). Constatou-se redução nas
taxas em todas as faixas etárias consideradas. Observou-se um aumento na cobertura
ofertada pelas equipes da ESF em todas as CIR avaliadas no período, mas esta não
ocorreu de forma homogênea e não é seguro explicar, sozinha, a redução das ICSAP.
CONCLUSÃO: A partir disso, constata-se que apesar da correlação inversa entre a
cobertura da ESF e ICSAP, é necessário que a assistência à saúde seja ofertada com
qualidade, para se obter menores taxas de internações por CSAP, e, consequentemente,
contribuir para a redução de gastos.

Palavras-chave: Atenção Primária de Saúde, Doenças Cardiovasculares, Indicadores de


Saúde, Hospitalização.

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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
INTRODUÇÃO

As doenças cardiovasculares (DCV) são as principais causas de mortalidade e mor-


bidade no mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), com destaque para a
Doença Isquêmica Coronariana e a Doença Cerebrovascular.
No Brasil, elas constituem a segunda causa de internação hospitalar, excluindo
partos, correspondendo a 1.190.392 internações no ano de 2019, segundo os dados do
Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). Isso se deve ao
fato de os indivíduos com doenças do aparelho circulatório serem mais propensos à hospi-
talização, considerando-se o maior risco de comprometimento funcional, eventos adversos
relacionados à ação dos fármacos e reações do paciente, e a ocorrência de comorbidades
(LENTSCK e MATHIAS, 2015).
A maioria das internações por doenças cardiovasculares poderiam ser prevenidas por
meio da prevenção dos fatores de risco, evitando o aparecimento do problema de saúde;
do diagnóstico precoce dos episódios agudos, diminuindo gravidade e aparecimento de
complicações; e do controle adequado das doenças crônicas no âmbito da atenção primária,
evitando a necessidade de internação (PINTO JUNIOR, 2014). Sendo assim, essas altas
taxas de internações por DCV, podem refletir a falta de acesso e de qualidade na Atenção
Primária à Saúde (APS), visto que essas patologias do aparelho circulatório, como hiperten-
são arterial, angina, insuficiência cardíaca e doenças cerebrovasculares são consideradas
condições sensíveis à APS.
As internações por condições sensíveis à atenção primária (ICSAP) são um conjunto
de doenças e agravos cujas hospitalizações são consideradas evitáveis se as ações de-
senvolvidas na atenção primária à saúde forem oferecidas oportunamente e terem caráter
resolutivo (PINTO JUNIOR, 2020). Tais internações representam um indicador indireto para
a avaliação e monitoramento da efetividade desse nível de atenção do sistema de saúde
(NEDEL, 2010). Logo, podem revelar fragilidades no sistema de saúde, e, consequentemen-
te, auxiliar na inserção de políticas públicas e ações de prevenção e promoção de saúde.
No Brasil, em abril de 2008, foi criada uma lista de internações por condições sensíveis
à atenção primária (ICSAP) como ferramenta para medir o desempenho do sistema de saú-
de, baseada no modelo proposto por Caminal-Homar e Casanova-Matutano (ALFRADIQUE,
2009), sendo adaptada às condições mais prevalentes no país, visto que até o momento, não
havia um indicador validado para avaliar a efetividade da APS, e, principalmente, o impacto
da Estratégia da Saúde da Família (ESF) no sistema de saúde brasileiro. Com a ampliação
da cobertura da ESF no Brasil, o acesso aos serviços de saúde precisa ser avaliado, de
forma que os dados possam ser estudados e propostas implementadas para a melhora do
Sistema Único de Saúde (SUS) (CAMELO e REHEM, 2019).
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população
estimada do estado da Bahia é de 14.930.634 pessoas, sendo o quarto estado com maior 201
Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
população residente, em que 55,7% é formada por pessoas com mais de 25 anos de ida-
de (BRASIL, 2020). Essa parte da população é a mais exposta às Condições Sensíveis à
Atenção Primária consideradas neste estudo (hipertensão arterial, angina, insuficiência car-
díaca e doenças cerebrovasculares). Sabe-se que, as Doenças Crônicas Não Transmissíveis
(DCNT), entre elas as DCV, crescem com o passar dos anos e entre os idosos atingem
75,5% da população (69,3% entre os homens e 80,2% entre as mulheres), podendo gerar
limitações funcionais e incapacidades (SCHENKER e COSTA, 2019).
Estudos anteriores demonstram que a expansão da ESF levou a melhorias no desem-
penho do sistema de saúde (BASTOS, 2017; HONE, 2017) com reduções substanciais nas
hospitalizações por condições sensíveis à atenção primária (CAVALCANTE, 2018; MACINKO,
2010; MACINKO, 2011) e mortes devido a doenças cerebrovasculares e cardiovasculares
entre adultos (RASELLA, 2014).
Nesse contexto, considerando a adoção das ICSAP como indicador de avaliação da
APS no Brasil, justifica-se a realização de estudos de investigação do comportamento destas
internações em determinado território. Por se tratar de um valioso indicador para o monitora-
mento, sua avaliação e utilização devem buscar contemplar os contextos regionais. Sendo
assim, este estudo tem como objetivo caracterizar as internações por condições cardiovas-
culares sensíveis à atenção primária, em regiões de saúde do estado da Bahia, no período
compreendido entre os anos de 2010 a 2020.

ASPECTOS METODOLÓGICOS

Delineamento do estudo

Trata-se de um estudo de natureza quantitativa, descritivo e exploratório, tendo como


subsídios informações das regiões de saúde do estado da Bahia, utilizando dados secundá-
rios do Sistema de Informações de municípios com mais de 100 mil habitantes, no período
de outubro de 2010 a outubro de 2020.

Local do estudo

A Bahia corresponde a uma área territorial de 564.760,427 km², sendo o 5º maior estado
das 27 unidades federativas do Brasil (IBGE, 2020). Conforme a proposta de regionalização
da saúde adotada no Estado, o Plano Diretor de Regionalização (PDR) divide o espaço
geográfico do estado em 28 regiões de saúde (assim definidas por dispor, no mínimo de
ações e serviços de atenção primária; urgência e emergência; atenção psicossocial; aten-
ção ambulatorial especializada e hospitalar; e vigilância em saúde) que se aglutinam em 09
Macrorregiões de Saúde e abrange 417 municípios. Destas, 14 possuem mais de 100 mil
habitantes e foram incluídas, quais sejam: Salvador, Feira de Santana, Vitória da Conquista,
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Camaçari, Juazeiro, Itabuna, Ilhéus, Teixeira de Freitas, Jequié, Barreiras, Alagoinhas, Porto
Seguro, Paulo Afonso, Santo Antônio de Jesus (tabela 1).

Tabela 1. Regiões de Saúde e municípios baianos com população superior a 100.000 habitantes avaliados no período
compreendido entre 2010 à 2020.
Quantidade de mu-
Total de municípios ads-
Região de Saúde nicípios com mais de Munícipios
critos
100.000 habitantes
Candeias, Itaparica, Lauro de Freitas, Madre de Deus,
Salvador 10 municípios 2 Salvador, Santo Amaro, São Francisco do Conde, São
Sebastião do Passé, Saubara e Vera Cruz
Amélia Rodrigues; Anguera; Antônio Cardoso; Baixa Grande;
Candeal; Capela do Alto Alegre; Conceição do Jacuípe;
Coração de Maria; Feira de Santana; Gavião; Ichu; Ipecaetá;
Feira de Santana 28 municípios 1 Ipirá; Irará; Mundo Novo; Nova Fátima; Pé de Serra; Pintadas;
Rafael Jambeiro; Riachão do Jacuípe; Santa Bárbara;
Santanópolis; Santo Estêvão; São Gonçalo dos Campos; Serra
Preta; Tanquinho; Teodoro Sampaio; Terra Nova
Anagé; Barra do Choça; Belo Campo; Bom Jesus da Serra;
Caetanos; Cândido Sales; Caraíbas; Condeúba; Cordeiros;
Vitória da Conquista 19 Municípios 1 Encruzilhada; Maetinga; Mirante; Piripá; Planalto; Poções;
Presidente Jânio Quadros; Ribeirão do Largo; Tremedal e
Vitória Da Conquista.
Camaçari; Conde; Dias D’ávila; Mata de São João; Pojuca e
Camaçari 6 Municípios 2
Simões Filho
Campo Alegre de Lourdes; Canudos; Casa Nova; Curaçá;
Juazeiro 10 Municípios 1 Juazeiro; Pilão Arcado; Remanso; Sento Sé; Sobradinho e
Uauá.
Almadina; Aurelino Leal; Barro Preto; Buerarema; Camacan;
Coaraci; Floresta Azul; Gongogi; Ibicaraí; Ibirapitanga; Itabuna;
Itabuna 22 Municípios 1 Itaju do Colônia; Itajuípe; Itapé; Itapitanga; Jussari; Maraú; Pau
Brasil; Santa Cruz da Vitória; São José da Vitória; Ubaitaba
e Ubatã.
Arataca; Canavieiras; Ilhéus; Itacaré; Mascote; Santa Luzia;
Ilhéus 8 Municípios 1
Uma e Uruçuca.
Alcobaça; Caravelas; Ibirapuã; Itamaraju; Itanhém; Jucuruçu;
Teixeira de Freitas 13 Municípios 1 Lajedão; Medeiros Neto; Mucuri; Nova Viçosa; Prado; Teixeira
De Freitas e Vereda.
Aiquara; Apuarema; Barra do Rocha; Boa Nova; Brejões;
Cravolândia; Dário Meira; Ibirataia; Ipiaú; Irajuba; Iramaia;
Jequié 26 Municípios 1 Itagi; Itagibá; Itamari; Itaquara; Itiruçu; Jaguaquara; Jequié;
Jitaúna; Lafaiete Coutinho; Lajedo do Tabocal; Manoel Vitorino;
Maracás; Nova Itarana; Planaltino e Santa Inês.
Angical; Baianópolis; Barreiras; Brejolândia; Catolândia;
Cotegipe; Cristópolis; Formosa do Rio Preto; Luís Eduardo
Barreiras 15 Municípios 1
Magalhães; Mansidão; Riachão das Neves; Santa Rita de
Cássia; São Desidério; Tabocas do Brejo Velho; Wanderley.
Acajutiba; Alagoinhas; Aporá; Araçás; Aramari; Cardeal da
Silva; Catu; Crisópolis; Entre Rios; Esplanada; Inhambupe;
Alagoinhas 18 Municípios 1
Itanagra; Itapicuru; Jandaíra; Ouriçangas; Pedrão; Rio Real
e Sátiro Dias.
Belmonte; Eunápolis; Guaratinga; Itabela; Itagimirim; Itapebi;
Porto Seguro 8 Municípios 2
Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália.
Abaré; Chorrochó; Glória; Jeremoabo; Macururé; Paulo
Paulo Afonso 9 Municípios 1
Afonso; Pedro Alexandre; Rodelas e Santa Brígida.
Amargosa; Aratuípe; Castro Alves; Conceição do Almeida; Dom
Macedo Costa; Elísio Medrado; Itatim; Jaguaripe; Jiquiriçá;
Laje; Milagres; Muniz Ferreira; Mutuípe; Nazaré; Presidente
Santo Antônio de Jesus 22 Municípios 1
Tancredo Neves; Salinas Da Margarida; Santa Teresinha;
Santo Antônio de Jesus; São Felipe; São Miguel das Matas;
Ubaíra e Varzedo.
Fonte: elaborada pelos autores. Regiões de Saúde do Estado da Bahia. Disponível em: <http://www1.saude.ba.gov.br/mapa_bahia/
indexch.asp>. Acesso: 23 de fevereiro de 2021.
Coleta de dados

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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
No presente estudo foram utilizados dados secundários disponíveis no DATASUS,
por meio do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/ SUS),
para obtenção do número de ICSAP por condição cardiovascular, cujo diagnóstico princi-
pal se referia a um dos seguintes códigos da Décima Revisão da Classificação Estatística
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10): hipertensão arterial
(I10 e I11); angina (I21; I24); insuficiência cardíaca (I50); e doenças cerebrovasculares (I63,
I64, I67; G45). Estes agravos constam na Lista Brasileira de Condições Sensíveis à Atenção
Primária, instituída pela Portaria MS/SAS no 221, de 17 de abril de 2008.
Os registros das internações foram obtidos do Sistema de Informações Hospitalares do
SUS (SIH/SUS-http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sih/cnv/sxuf.def) e tabulados pelo
programa Microsof Excel®. Os dados da população residente foram obtidos das estimativas
de população realizadas pela Rede Interagencial de Informações para a Saúde (RIPSA) e
pelo IBGE, acessíveis no sítio eletrônico do Departamento de Informática do SUS (DATASUS
-http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=02). A cobertura populacional pela
Estratégia Saúde da Família anual, a variável cobertura da ESF, definida como a proporção
da população coberta pelo programa em cada município, foi elaborada mediante informações
fornecidas pelo Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde (DAB) referentes
ao mês de outubro de 2020 (última data de atualização no site (https://egestorab.saude.gov.
br/paginas/acessoPublico/relatorios/relHistoricoCoberturaAB.xhtml).

Análise dos dados

O desfecho primário é o número de internações por município de residência por con-


dições cardiovasculares sensíveis à atenção primária por 100.000 habitantes. Para análise,
optou-se por adotar as seguintes variáveis: (1) grupo de diagnósticos, (2) faixa etária adulto
e idoso categorizada como: 20 a 29 anos, 30 a 39 anos, 40 a 49 anos, 50 a 59 anos, 60 a
69 anos, 70 a 79 e 80 anos e mais. As taxas de ICSAP foram calculadas para mil habitan-
tes e as causas mais frequentes analisadas por sexo e faixa etária, comparando-se os dois
períodos. Foi considerado outubro de 2010 a outubro de 2020 para avaliar a década - pela
disponibilidade de dados até o mês de outubro no DATASUS; e para o cálculo da taxa de
internação foi considerado todo o ano de 2010 com objetivo de tornar o cálculo mais fidedigno.
O coeficiente de ICSAP, variável dependente, seguiu a classificação da lista brasileira
de condições sensíveis à atenção primária. Foram consideradas “não-ICSAP” as demais
internações que não coincidiram com os diagnósticos considerados pela lista brasileira de
condições sensíveis.
Inicialmente, foi descrita a frequência de ICSAP entre todas as hospitalizações ocorridas
no período e a evolução da cobertura da ESF para o estado, regiões e os municípios com
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mais de 100 mil habitantes. Também foi calculada a proporção de ICSAP entre todas as
hospitalizações ocorridas no período, para as regiões de saúde do estado da Bahia, assim
como a taxa de ICSAP (por 1.000 hab.). O cálculo da taxa de internação foi feito pela divi-
são do número de ICSAP pela população estimada pelo IBGE para o período entre 2010 a
2020. Posteriormente, as características demográficas e clínicas dos pacientes internados
foram sumarizadas.
As variáveis foram agrupadas de forma a possibilitar a análise das ICSAP sob distintas
perspectivas: (1) internações gerais por ano de ocorrência, (2) ICSAP por ano de ocorrência,
(3) grupos diagnósticos por ICSAP, (4) grupos diagnósticos por ICSAP segundo faixa etária,
(5) grupos diagnósticos por ICSAP segundo sexo, (6) óbitos por CSAP por ano de ocorrên-
cia, (7) óbitos por CSAP segundo grupos diagnósticos, (8) óbitos por CSAP segundo faixa
etária, (9) óbitos por CSAP segundo sexo, (10) valor total gasto em internações gerais, (11)
valor total gasto por ICSAP.
Para processamento e análise dos dados utilizou-se estatística descritiva e as varia-
ções percentuais foram calculadas da seguinte forma: obteve-se primeiramente a diferença
entre os valores registrados no último (2020) e primeiro ano (2010), em seguida dividiu-se
tal resultado pelo valor registrado no primeiro ano (2010) e, por último, multiplicou-se o
resultado por 100.
A análise foi realizada sobre dados secundários, de acesso público, sem possibilida-
de de identificação individual das informações. Assim, consoante as recomendações da
Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) nº 466, de 12 de dezembro de 2012,
foram respeitados os princípios éticos de pesquisas que envolvem seres humanos, sendo
dispensada a aprovação do comitê de ética em pesquisa.

RESULTADOS

No período entre outubro de 2010 a outubro de 2020 o SIH/SUS registrou a ocorrência


de 4.055.553 internações por todas as causas nas regiões de saúde (CIR) da Bahia com
mais de 100 mil habitantes, nos pacientes com mais de 20 anos de idade, entre as quais
330.371 (8,15%) hospitalizações constituíram CSAP por DCV (Tabela 2).

Tabela 2. Variação no número de Internações Totais e Internações por Condições Cardiovasculares Sensíveis à Atenção
Primária em regiões de saúde do Estado da Bahia, Brasil, 2010-2020.

Ano de Internação

2010 2020 Out 2010 - Out2020


Internações Totais 393.925 283.453 4.055.553
Internações por CSAP 32.422 21.363 330.371
Fonte: elaborada pelos autores. Sistema de informações hospitalares do SUS (SIH/SUS). 2020.

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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
A causa de internação geral mais frequente, excluindo-se as causas obstétricas
(26,10%), foi por doença do aparelho circulatório, representando 453.258 (11,18%) das
hospitalizações, destas internações por doenças do aparelho circulatório, 70,89% (321.321)
foram por CSAP. Dessa forma, ao analisar o número de internações por todas as causas, veri-
ficou-se que houve uma redução de 28,04% do ano de 2010 para o ano de 2020. Já as ICSAP
por DCV tiveram um decréscimo de 34,07%. Em 2010, as ICSAP por DCV representaram
8,23% de todas as causas por internação, já em 2020 há uma queda para 7,54% (Tabela 2).
Ao analisar ano a ano, verifica-se, que não houve alteração significativa na taxa das
internações por ICSAP no decorrer dos anos, com o ano de 2011 apresentando o maior
coeficiente de todos os anos, com 5,4 internações a cada 1.000 habitantes. Em 2020 ob-
serva-se um decréscimo na taxa das internações por ICSAP (Gráfico 1).

Gráfico 1. Taxa (por 1000 pessoas) das internações por condições sensíveis à atenção primária por Doenças Cardiovasculares
em regiões de saúde do estado da Bahia, Brasil, no período de 2010 a 2020.

Sistema de informações hospitalares do SUS (SIH/SUS), Instituto Brasileiro de Geografia


e Estatística. 2020.
Fonte: elaborada pelos autores.

Quanto aos diagnósticos que derivaram as internações, a condição cardiovascular das


ICSAP com maior percentual foi a Insuficiência Cardíaca (IC), com 27,82% das hospitaliza-
ções durante o período estudado. O grupo com menor associação às internações foi o Infarto
Cerebral com 1,90% das internações (Tabela 3). Em 2010, a IC foi responsável por 33,76%
das internações por CSAP consideradas no estudo, e sua taxa de internação correspondeu
a 1,7/1.000 hab. No ano de 2020, a IC representou 21,38% das internações, sendo sua taxa
de internação 0,7/1.000 hab. O Acidente Vascular Não Especificado como Hemorrágico ou
Isquêmico ultrapassou a IC com 30,75% e taxa de internação de 1/1.000 hab. (Tabela 3).

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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
Tabela 3. Caracterização das ICSAPs segundo sexo e grupo de causas e diagnósticos. Regiões de Saúde da Bahia com mais
de 100 mil habitantes, Brasil, 2010 a 2020.

Categoria 2010 2020 2010 a 2020

Grupos de causas e diagnósticos de ICSAP n % n % n %


Acidentes vasculares cerebrais isquêmicos transitórios
1.414 4,38 494 2,06 9.038 2,73
e síndromes correlatas
Hipertensão essencial 5.972 18,5 1.988 8,28 46.649 14,12
Outras doenças hipertensivas 1.215 3,76 731 3,04 11.031 3,14
Infarto Agudo do miocárdio 2.903 8,99 4.270 17,77 42.308 12,81
Outras doenças isquêmicas do coração 2.536 7,85 2.893 12,04 35.038 10,61
Insuficiência Cardíaca 10.903 33,76 5.137 21,38 91.905 27,82
Infarto cerebral 849 2,63 436 1,81 6.279 1,9
Acidente Vascular Cerebral não especificado como
5.520 17,1 7.389 30,75 76.765 23,24
hemorrágico ou isquêmico
Outras doenças cerebrovasculares 979 3,03 689 2,87 11.346 3,43
TOTAL 32.291 100 24.027 100 330.359 100
Sexo n % n % n %
Masculino 15.589 48,28 12.456 51,84 164.212 49,71
Feminino 16.702 51,72 11.571 48,16 166.147 50,29
TOTAL 32.291 100 24.027 100 330.118 100
Fonte: elaborada pelos autores. Sistema de informações hospitalares do SUS (SIH/SUS). 2020.

Ao analisar o comportamento das internações, segundo faixa etária por condições car-
diovasculares, observa-se que houveram quedas da taxa em todas as faixas consideradas
(Gráfico 2). No ano de 2010 a faixa etária de 80 anos ou mais teve 40,6/1.000 hab. de taxa
de internação, sendo a maior do ano; seguida pela faixa de 70 a 79 anos com 27,1/1.000
hab. Já no ano de 2020, observou-se que essas faixas etárias continuam com o primeiro
e segundo lugar, respectivamente, entretanto suas taxas de internação variaram, sendo
21/1.000 hab. Para a faixa etária de 80 anos ou mais, e 13,5/1.000 hab. a faixa etária de 75
a 79 anos. Além disso, é possível observar que todas as faixas etárias obtiveram quedas
em sua frequência como observado (Gráfico 2).

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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
Gráfico 2. Taxa de hospitalização por condições sensíveis à atenção primária (CSAP) por Doenças Cardiovasculares (por
1000 habitantes), segundo faixa etária, Regiões de Saúde da Bahia, Brasil, 2010-2020

Sistema de informações hospitalares do SUS (SIH/SUS), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 2021.
Fonte: elaborada pelos autores.

Na década estudada houveram 166.147 internações do sexo feminino, enquanto


164.212 internações do sexo masculino foram registradas, não existindo diferenças signifi-
cativas (Tabela 3).
Nos homens, a principal causa de internações em 2010 foi a IC com 36,61% das inter-
nações, seguido por Acidente Vascular não Especificado como Hemorrágico ou Isquêmico
com 17,19%. Ao se observar as mulheres, têm-se 31,11% para IC e 23,37% para Hipertensão
Essencial. No ano de 2020, o Acidente Vascular não Especificado como Hemorrágico ou
Isquêmico se torna a principal causa de internações no sexo masculino com 30,03%, seguido
pela IC com 21,65%. Já para as mulheres, no ano de 2020, o perfil foi semelhante ao dos
homens, com Acidente Vascular Cerebral não Especificado como Hemorrágico ou Isquêmico
liderando as internações 31,54%, seguido pela IC com 21,09%.
É importante notar que, embora em 2020 o mesmo perfil de causas se repetiu nos dois
sexos, mesmo sendo proporcionalmente maiores no sexo masculino, ao se calcular a taxa
de internação: o Acidente Vascular não Especificado como Hemorrágico ou Isquêmico foi de
1,1/1.000 hab. prevalente nos homens e 0,9/1.000 nas mulheres; enquanto a IC foi 0,8/1.000
hab. nos homens e 0,6/1.000 hab. nas mulheres. Em 2010, a prevalência de IC nos homens
foi de 1,9/1.000 hab. e nas mulheres de 1,5/1.000 hab.
Segundo o sexo, verifica-se que, no grupo das ICSAP, a relação entre os sexos dos
pacientes e os óbitos por CSAP não foi significativa, 18.025 óbitos ocorreram no sexo
masculino, e 18.271 ocorreram no sexo feminino. Os óbitos das ICSAP apresentaram uma
tendência crescente com o aumento da faixa etária, dessa forma, os pacientes com 80 anos
ou mais representam o grupo com maior número de óbitos (10.889; 30%).
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
Do total de 14.863 óbitos registrados nos prontuários, no ano de 2010, 20,75% (2.972,6)
foram do grupo das ICSAP por doenças cardiovasculares. Já em 2020 o número de óbitos
registrados nas regiões de saúde da Bahia foram 18.031, 15,29% correspondiam aos óbi-
tos por CSAP por DCV. Ao se analisar o número absoluto de mortes por DCV, houve um
decréscimo de 7,25% no total entre o ano de 2010 em comparação ao ano de 2020. Dos
óbitos por CSAP na década analisada, a maior frequência de óbitos foi por Acidente Vascular
Cerebral não Especificado como Hemorrágico ou Isquêmico (39,85% dos óbitos) seguido
de Insuficiência Cardíaca (28,24%) e Infarto Agudo do Miocárdio (14,03%).
Após o agrupamento dos municípios, observou-se, em todas as regiões de saúde
avaliadas, que o coeficiente de ICSAP por mil habitantes diminuiu quando comparado o
ano de 2010 ao ano de 2020, exceto na região Camaçari, que houve um pequeno aumento
na taxa de internação de 2,81/1.000 hab. para 2,91/1.000 hab. As regiões que obtiveram
maior índice de redução foram Jequié, com queda de quase metade do seu coeficiente de
internação por CSAP, seguido de Ilhéus, Santo Antônio de Jesus e Itabuna.
Nas regiões de saúde, no período estudado, ao se analisar as internações, segundo
o município verifica-se que Salvador, Jequié, Vitória da Conquista e Feira de Santana fo-
ram as regiões que apresentaram maior frequência absoluta de hospitalizações por CSAP
cardiovasculares na década estudada, correspondendo a 29,48%, 9,48%, 8,23% e 8,20%,
respectivamente. Ao avaliar a taxa das internações desses 4 municípios observou-se que
Jequié é a região da Bahia com maior taxa de internação (8,5/1.000 hab.), em segundo lugar
encontra-se Vitória da Conquista com 5,7 internações a cada 1.000 habitantes, seguido de
Salvador (3,7/1.000 hab.) e Feira de Santana (3,2/1.000 hab.).
Em relação aos gastos totais com ICSAP cardiovasculares no período estudado, a
CIR da Bahia com mais de 100 mil habitantes, totalizou 549.286.744,19 reais, representan-
do 12,01% de todos os gastos com as internações por todas as causas. As doenças com
os mais altos custos no período por ICSAP foram Outras Doenças Isquêmicas Agudas do
Coração, com 28,71%, IC, com 21,08%, Infarto Agudo do Miocárdio, com 19,52%. Esses três
grupos de diagnósticos representam, juntos, 69,31% dos gastos totais com ICSAP. Já em
relação a região de saúde da Bahia que apresentou maior gastos com as hospitalizações
por CSAP, foram Salvador com 46,32% (254.939.789,26 reais), seguido de Feira de Santana
com 7,30% (40.082.893,61 reais), Vitória da Conquista com 7,01% (38.583.941,76 reais) e
Itabuna com 5,40% (29.733.534,09 reais).
A cobertura populacional estimada ofertada pelas equipes de atenção primária na
Estratégia de Saúde da Família (ESF) cresceu no estado da Bahia no período estudado: em
outubro de 2010 a cobertura da ESF era de 59,75%, já em outubro de 2020, a cobertura da
ESF chegou a 77,68%. Ao considerar as CIR com mais de 100 mil habitantes se destaca a
209
Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
de Teixeira de Freitas (96,12%), seguida por Porto Seguro (93,58%), Santo Antônio de Jesus
com 93% e por Juazeiro (90,38%). Em comparação aos anos de 2010 e 2020, as regiões que
mais cresceram foram Juazeiro (+28,46%), Barreiras (+27,85%) e Salvador com (+23,32%);
observa-se que Teixeira de Freitas foi a única região a diminuir a cobertura (-0,88%).

DISCUSSÃO

O presente estudo revelou que houve uma redução de 34,07% nas Internações por
Condições Cardiovasculares Sensíveis à Atenção Primária na década analisada. Essa queda
ocorreu na maioria das regiões de saúde, principalmente nas regiões de Jequié, Ilhéus, Santo
Antônio de Jesus e Itabuna. Sabendo que a análise da evolução das ICSAP contribui para
avaliar indiretamente a qualidade do sistema de saúde, especialmente a Atenção Primária,
uma vez que um melhor acesso à APS está associado a menos internações por CSAP
(BOING, 2012), e considerando sua associação com a expansão da cobertura da ESF na
região da Bahia, que atinge uma cobertura de 77,68% em outubro de 2020 (BRASIL, 2021),
a oferta mais adequada de serviços de saúde pode ter importante responsabilidade nesse
resultado. Segundo Macinko (2015), a expansão da ESF tem sido associada à redução da
mortalidade por causas cardiovasculares e cerebrovasculares, a reduções nas taxas de
hospitalização para condições sensíveis a cuidados ambulatoriais e a diminuição nas taxas
de complicações de algumas condições crônicas (MACINKO e HARRIS, 2015).
Em um estudo realizado por Zarlotti (2017) demonstraram forte correlação inversa entre
ICSAP e cobertura da ESF, uma vez que o aumento da cobertura do PSF foi acompanhado
por grande redução das ICSAP no período de 1999-2013, em Petrópolis, Rio de Janeiro.
Outra pesquisa realizada por Boing (2012) identificou redução substancial nas internações
por CSAP no Brasil entre 1998 e 2009, período em que o Brasil vivenciou forte expansão
da ESF, especialmente a partir do final da segunda metade da década de 1990. A cobertu-
ra populacional da ESF aumentou de 6,6% em 1998 para 50,7% em 2009 (BOING, 2012).
Demonstrando a capacidade da ESF em evitar ou reduzir a ocorrência de internações, mos-
trando-se um meio eficaz, comprovando que realmente estas internações podem ser evitadas.
O estudo de Mendonça e Albuquerque (2014), e o de Brasil e Costa (2016) demonstram
uma redução das ICSAP no Pernambuco e em Florianópolis, respectivamente, concordando
com os dados do presente estudo a respeito da diminuição das ICSAP; como visto em rela-
ção a queda de internação por IC - principal causa de internação em 2010 - e a diminuição
geral dos números de internação (32.291 em 2010 para 24.027 em 2020). Contudo, como
abordado por Malvezzi (2018), em revisão de literatura nacional, existe limites para a coleta
dos dados, e limites para a utilização do indicador como a avaliação da APS; além de que
210
Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
os dados são secundários por serem processados a partir da Autorização de Internação
Hospitalar - AIH; acrescenta também a ausência de emissão AIH para as internações em
Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e outras unidades de saúde não hospitalares que
mantém o paciente por período maior que 24 horas. Assim, ao se analisar o perfil de aten-
dimento nessas unidades existem indicativos de aumento da prevalência das ICSAP se
esses dados fossem incorporados às internações. “Estudo específico sobre a validação e
sensibilidade do sistema SIH/SUS, utilizando o prontuário como padrão ouro, aponta que
o referido sistema deixa de captar cerca de 18% das verdadeiras ocorrências de ICSAP”
(MALVEZZI, 2018, p.7).
Ademais, apesar desta redução das hospitalizações por CSAP ocasionadas por DCV,
observa-se que das internações por doenças do aparelho circulatório, principal responsável
pela ocupação de leitos hospitalares, 70,89% são consideradas evitáveis. Refletindo, desta
forma, na qualidade da assistência ofertada, visto que a falta de acesso a APS de qualidade
e resolutiva pode levar à manutenção de taxas elevadas de internações por CSAP (BOING,
2012). Além de as menores taxas de internações por CSAP estão associadas com maior
disponibilidade de médicos generalistas por habitantes, melhor avaliação do serviço por parte
do usuário, continuidade da assistência com o mesmo médico de família, maior número de
consultas preventivas e regiões com centros de saúde (BOING, 2012).
É visto que, quando comparado ano a ano, nota-se uma pequena alteração das taxas
de ICSAP com redução significativa apenas no ano de 2020. Essa queda na taxa de inter-
nações por CSAP decorrente das DCV, deve-se ao fato que durante o ano de 2020, em
decorrência da pandemia da COVID-19, no Brasil, houve redução da assistência à saúde
cardiovascular da população brasileira atendida pelo SUS, que teve como consequências a
redução do número de internações por DCV e o aumento da taxa de letalidade intra-hospi-
talar decorrente dessas (NORMANDO, 2021).
Observa-se que as faixas etárias mais avançadas são as que apresentam maior taxa
de internação. Em estudo ecológico de Magalhães e Morais Neto (2017) que analisou dados
de internação da cidade de Goiânia, a faixa etária de 60 anos ou mais apresentou maior
taxa de internação (intervalo que engloba as subdivisões de faixas etárias que mais se des-
tacaram em nosso estudo). O mesmo estudo também encontrou as doenças do aparelho
circulatório como as condições mais prevalentes, tendo a IC e angina como os principais
grupos de causa (MAGALHÃES, 2017). A IC também ocupou o segundo lugar com 15,5%
das internações, na cidade de Cotia-SP no estudo exploratório de Torres e Ciosak (2014).
Ferreira (2014) identificaram que as doenças do aparelho circulatório foram responsá-
veis por 41,5% das causas das ICSAP, sendo os diagnósticos de IC (14,8%), angina (14,1%),

211
Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
doenças cerebrovasculares (9,7%) e hipertensão (2,9%) os mais encontrados (FERREIRA,
2014). Todos esses estudos estão em concordância com o presente artigo.
Todas as faixas etárias tiveram queda da taxa de internação ao se comparar os anos
de 2010 e 2020. Segundo Normando (2021), todas as internações hospitalares por razões
cardiovasculares, apresentaram decréscimo entre os anos 2019 e 2020 para todas as faixas
etárias, principalmente, nos meses de abril e maio, possivelmente um reflexo da pandemia
da COVID-19. Uma vez que, o receio da população em contrair o vírus e a sistematiza-
ção da assistência, priorizando a pandemia, justificam esse impacto durante este período
(NORMANDO, 2021).
Com o avançar das faixas etárias, aumentaram-se as internações, mesmo com o curso
se voltando a diminuição das ICSAP no período. Com base no estudo de Rodrigues-Bastos
(2013) que avaliou o município de Juiz de Fora de 2002 a 2009, percebe-se semelhan-
ças de resultados:
“As doenças do aparelho cardiovascular (insuficiência cardíaca, angina pectoris e
doenças cerebrovasculares) surgem como mais frequentes de ICSAP na faixa de 25-39
anos em ambos os sexos e ausentes nas faixas etárias inferiores. [...] Na faixa etária acima
de 60 anos, houve queda das hospitalizações por doenças cardiovasculares e pulmonares
(de 1,0/mil hab. nas internações por insuficiência cardíaca, 1,9/mil hab. por doenças cere-
brovasculares, 1,11/ mil hab. por angina pectoris e 1,11/mil hab. por doenças pulmonares)
[...].” (RODRIGUES-BASTOS, 2013, p.123)
Isso pode ser visto nos gastos das ICSAP, como abordado por Souza e Peixoto (2017),
em estudo descritivo que avaliou os gastos das ICSAP no Brasil de 2000 a 2013, houve re-
dução geral na proporção dos gastos. Entretanto, chamou a atenção para a persistência da
elevada proporção atribuída às DCV e o aumento da contribuição da internação por angina
(SOUZA e PEIXOTO, 2017).
Avaliando os sexos, para Gouveia (2016), em estudo ecológico realizado em municípios
mineiros com mais de 100 mil habitantes, entre 2000 a 2013, ocorreu redução das ICSAP por
1000 habitantes, sendo até 2003 mais frequentes a internação entre mulheres e a partir de
2004 mais frequente em homens. Na análise discutida em nosso estudo, os homens também
lideram essas internações mesmo com a diminuição geral em ambos os sexos. Já em estudo
ecológico realizado por Lentsck, Latorre e Mathias (2015) que avaliou as Internações por
Condições Cardiovasculares Sensíveis à Atenção Primária no estado do Paraná de 2000
a 2011, mostrou também declinou da taxa de internação em ambos os sexos e nas faixas
etárias de 35 a 74 anos, além das taxas serem maiores no sexo masculino.
Em relação aos óbitos por condições cardiovasculares sensíveis à APS apresenta
tendência crescente com o aumento da idade, visto que as DCV afetam os segmentos
212
Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
de faixa etária mais velha, tendo o Acidente Vascular Cerebral, Não Especificado como
Hemorrágico ou Isquêmico como principal causa dos óbitos que poderiam ser evitados, se-
guido de Insuficiência Cardíaca e Infarto Agudo do Miocárdio. Na década analisada houve
redução no número absoluto de óbitos em decorrência das Condições Cardiovasculares
Sensíveis à Atenção Primária, quando comparado o ano de 2010 e o ano de 2020, poden-
do ser reflexo da falta de notificação adequada no período da pandemia do COVID-19 em
2020 e da falta de estrutura do sistema de saúde em atribuir a causa do óbito relacionado
à COVID-19 como cardiovascular, apesar da interação COVID-19 e sistema cardiovascular
atualmente ser bastante reconhecida (NORMANDO, 2021).
Embora a cobertura populacional pela ESF tenha aumentado em todas as CIR avalia-
das no período, esta não ocorreu de forma homogênea e não é seguro explicar, sozinha, a
redução das ICSAP. Haja visto que a internação hospitalar também pode ser explicada pela
morbidade, fatores socioeconômicos e geográficos, prática médica, sistema de saúde, além
da oferta de leitos hospitalares. A exemplo, têm-se as quatro CIR com maior taxa de cober-
tura da ESF - Teixeira de Freitas, seguida por Porto Seguro, Santo Antônio de Jesus e por
Juazeiro - possuem taxa de internação de 4,3/1.000 hab., 3,39/1.000 hab., 4,93/1.000 hab.
e 3,99/1.000 hab., respectivamente. Essas regiões ficam atrás de Paulo Afonso (1,66/1.000
hab.) e Feira de Santana (2,46/1.000 hab.) em taxa de cobertura de ESF e, mesmo assim,
apresentam resultados melhores. Já grandes centros urbanos do estado, como Salvador
(3,7/1.000 hab.), Feira de Santana (3,2/1.000 hab.), Vitória da Conquista (5,7/1.000 hab.) e
Jequié (8,5/1000 hab.) - em que se espera que haja melhor assistência com mais hospitais,
maior oferta de leitos, funcionamento de unidades de atendimento 24 horas e maior número
de consultas - apresentam as maiores taxas de internação da década.
Como se observa por Resende e Barbieri (2017), as ICSAP podem ser influenciadas
por fatores econômicos, sociais e de acesso aos serviços de saúde, embora a implantação
da ESF esteja associada à redução das ICSAP no Brasil e nos estados. Buscando analisar
esse impacto, foi realizado por ÖZÇELIK (2020) que verificou o impacto do Programa Mais
Médicos do Brasil (PMM) nas hospitalizações por doenças cerebrovasculares e hipertensão
usando dados municipais que cobrem o período de 2009-2017, e mostrou que o PMM se
correlacionou com menos hospitalizações por doença cerebrovascular a partir do terceiro
ano de implantação do programa.
A partir disso, constata-se que apesar da correlação inversa entre a cobertura da ESF
e ICSAP, é necessário que a assistência à saúde seja ofertada com qualidade, para se obter
menores taxas de internações por CSAP, e, consequentemente, contribuir para a redução
de gastos, uma vez que as ICSAP por DCV corresponderam a 12% (549.286.744,19) de
todos os gastos com internações na década estudada. Ademais, os grupos diagnósticos que
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Ciências da Saúde: desafios, perspectivas e possibilidades - Volume 3
foram responsáveis por mais de 50% dos gastos com ICSAP foram Doenças Isquêmicas
Agudas do Coração, IC e Infarto Agudo do Miocárdio.
Os resultados de um estudo realizado por Ferreira (2014) demonstraram que nos três
anos analisados, os maiores gastos nas ICSAP ocorreram com os diagnósticos de angina
(35,7%), IC (22,5%) e doenças cerebrovasculares (13,4%). Ou seja: 71,6% dos recursos
financeiros gastos pelo SUS com o ICSAP na Região de saúde de São José do Rio Preto-SP
referiram-se às doenças do aparelho cardiocirculatório (TORRES e CIOSAK, 2014).
Altos valores de ICSAP podem representar fragilidades e/ou baixa resolutividade na
porta de entrada do sistema. A identificação dos grupos mais prevalentes entre as popula-
ções permite a reestruturação de políticas e programas, bem como a reformulação de ações
direcionadas às patologias em regiões específicas, o que, entre outras vantagens, poderá
subsidiar o planejamento e a tomada de decisões nessas localidades.
Os achados do presente estudo podem ser de grande valia para a gestão dos serviços,
especialmente nas áreas prioritárias em que houve aumento, melhorando a assistência à
população e com grande potencial de promover a melhoria tanto da qualidade das informa-
ções futuramente prestadas quanto das propostas para avaliação das políticas de saúde.
Alguns estudos sugerem que a expansão da ESF foi associada a melhorias na saúde da
população (BASTOS, 2017), enquanto as reduções no acesso aos serviços de APS podem
levar a aumentos na carga de mortalidade devido a condições de saúde sensíveis ao acesso
oportuno e adequado à atenção primária (FRANCESCONI, 2020).
Entre as limitações da pesquisa, ressalta-se, primeiramente, a cautela a se ter na
interpretação de seus resultados e os aspectos comuns aos estudam que utilizam dados
secundários como o SIH-SUS, sujeitos à subnotificação e erros de digitação, em especial
no ano de 2020 com o advento da pandemia da COVID-19. Ademais, o cálculo de taxas de
internação por habitante depende de dados populacionais que, para o período estudado,
resultam de projeções e estimativas. Contudo, os aspectos relacionados às limitações do
uso de bases dos sistemas de informação no Brasil não invalidam a importância das infor-
mações geradas, pois a sua abrangência estadual permite a visualização de um panorama
amplo das condições de saúde.

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