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Mapeando a nova filantropia e o estado heterárquico:

o Movimento pela Base Nacional Comum Curricular no Brasil

Marina Avelar e Stephen J. Ball

Resumo:
Neste artigo, focamos num caso específico para investigar como as redes de governança
e os processos concomitantes de “heterarquização” operam na prática, em educação.
Analisamos então a relação entre o Governo Federal brasileiro e uma coalização que
advoga os padrões nacionais de aprendizagem, chamada de Movimento pela Base
Nacional Comum (MBNC). Fazemos uso de etnografia de redes, com gráficos de redes
sociais, entrevistas e trabalho de campo, para estabelecer de que modo o MBNC tem se
configurado como um espaço de colaboração entre a nova filantropia e o estado, bem
como um espaço de políticas públicas em seu próprio direito. Investigamos como esse
espaço e a rede de relações que o constitui podem ser vistos como um exemplo do
estado heterárquico na prática, ilustrando como, dentro de tal heterarquia, novos espaços
de políticas públicas são criados, desenvolvidos e reconfigurados ao longo do tempo.
Também pretendemos demonstrar como o método de etnografia de rede pode facilitar a
análise desses espaços de políticas públicas e de redes.

1. Introdução
As relações mutáveis entre o estado e a sociedade são um fenômeno
internacional, a despeito de haver, sobre isso, bastante variação. Falando em termos
gerais, atualmente os estados têm, cada vez mais, compartilhado com outros atores
sociais o trabalho de governar (Bevir, 2011). Os processos de tomada de decisão e os
sistemas de implementação que usualmente antes eram executados principalmente pelo
estado, estão agora cada vez mais dispersos em complexas redes de agências e
instituições não-governamentais. Enquanto que as fronteiras entre o estado, a economia
e a sociedade civil têm sido sempre finas e difusas, as relações entre essas fronteiras têm
atingido um novo grau de estridência e intensidade nos últimos 30 anos (Ball e
Junemann, 2012). Neste contexto, a filantropia também está mudando. A chamada
“nova filantropia” trata as doações como investimentos, os resultados como retornos, e
deseja se envolver em decisões sobre como o dinheiro é utilizado e, consequentemente,
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“está trazendo novos participantes para o campo das políticas sociais e educacionais,
repovoando e retrabalhando as redes de políticas já existentes.” (Ball e Olmedo, 2011,
p. 83). Aqui, o moral/social e o financeiro estão intimamente interligados, e articulados
em termos das necessidades, riscos e retornos sociais, em relação a escala e
sustentabilidade. As filantropias de diversos tipos estão assumindo as responsabilidades
morais do estado articulado dentro de uma complexa arquitetura global de relações
econômicas e sociais.
Para explorar como tais redes de governança operam na prática, e para ilustrar os
processos concomitantes de “hetero-hierarquização” do estado (Jessop, 2016), neste
artigo, focaremos num caso específico. Analisamos a relação entre a coalizão
proponente dos padrões de aprendizagem, chamada de Movimento pela Base Nacional
Comum (MBNC) e o governo federal [brasileiro]. Concentramo-nos então em como o
MBNC tem se configurado como um espaço de colaboração entre a nova filantropia e o
estado, e como um espaço de políticas públicas em seu próprio direito.
Os pesquisadores têm começado a tratar do trabalho da nova filantropia na
realização de políticas públicas educacionais, bem como da reformulação conjunta do
estado e de suas formas de governança em diferentes países (Adrião et al., 2005; Au e
Ferrare, 2015; Ball e Junemann, 2012; Freitas, 2012; Hogan et al., 2015; Olmedo, 2014;
Peroni, 2013, Reckhow e Snyder, 2014; Robertson e Verger, 2014). Nós nos baseamos
nesta literatura, bem como desejamos contribuir com ela. E, para conseguir isto,
utilizamos uma etnografia de redes como o método apropriado para a identificação e
análise da construção, manutenção e evolução das redes de políticas. O propósito disso
é “abrir um leque de questões, ao invés de fornecer um relato definitivo” (Lingar et al.,
2014, p. 711).
Primeiro, introduziremos as ferramentas teóricas e metodológicas em que nos
fundamentaremos. E, para isso, discutiremos a relação entre a reformulação do estado,
de governo para a governança, bem como sua operação na forma de heterarquias, com o
método de etnografia de redes. Em segundo lugar, apresentaremos algumas informações
contextuais a respeito da administração pública da educação no Brasil, e sobre o debate
acerca do currículo neste país. Em terceiro, introduziremos o MNBC, e tratá-lo-emos de
três maneiras. Primeiramente, vamos considerar a criação do grupo, tratando do seus
ideais e do uso que ele faz de seminários, com o propósito de promover encontros de
esclarecimentos com e entre relevantes atores das políticas educacionais do governo e
da nova filantropia. Então, investigaremos o MNBC e também as autoridades federais
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da educação no Brasil entre 2015 e 16. Isto implica atentar-se para alguns dos atores-
chave na colaboração em torno desta iniciativa particular, bem como dar uma olhada
nos “prosaicos e rasteiros mundos da implementação das políticas” (Peck e Theodore,
2012, p. 24). Para concluir, discutimos como o MBNC, e também a sua relação com o
governo brasileiro, podem ser vistos como um exemplo do estado heterárquico na
prática, ilustrando como os novos espaços de políticas públicas são criados,
desenvolvidos e reconfigurados ao longo do tempo; assim também como a etnografia de
redes pode facilitar a análise de tais redes e espaços de políticas. Nossa análise indica a
natureza cambiante do trabalho realizado pelo estado, a imprecisão das fronteiras entre a
filantropia e as políticas, e a inserção, nas políticas educacionais, de novas
sensibilidades e interesses. Também chamamos a atenção para as formas pelas quais as
ideias das políticas se movem tanto nacional como internacionalmente.

2. Utilizando a etnografia de rede para estudar as redes de políticas públicas e as


heterarquias: considerações teóricas e metodológicas
Nos debates teóricos e metodológicos em estudos políticos, é possível traçar um
contraste entre o governo, realizado através de burocracias hierárquicas, e a governança,
conseguida através de redes diversas e flexíveis (Ball e Junemann, 2013; Rhodes, 1996).
E uma nova mistura entre estado, mercado e filantropia está sendo criada, pela qual
esses três elementos são também reformulados. O estado está se reformulando como um
novo fazedor de mercados, instituidor de comissões de serviços e monitorador do
desempenho. O mercado, por sua vez, está se expandindo de modo a cada vez mais
sujeitar o social e o público aos rigores do lucro. A filantropia está sendo reformulada
pelos discursos e pelas sensibilidades dos negócios, adotando, por exemplo, as práticas
de impacto, avaliação, eficiência e competição (Ball e Olmedo, 2011; Bishop e Green,
2010).
A literatura sobre a governança distingue três principais formas de coordenação
ou interdependência recíproca: a “anarquia” do mercado, a hierarquia de uma firma ou
estado, e a auto-organização da heterarquia (Jessop, 2011). Em outras palavras, uma
heterarquia é “uma forma organizacional situada em algum lugar entre a hierarquia e a
rede, que conta com diversos elos horizontais e verticais que permitem que diferentes
elementos do processo das políticas cooperem (e/ou compitam entre si)” (Ball e
Junhmann, 2012, p. 138). Nesta nova mistura de mercados, redes e hierarquias, as novas
conexões pessoais e profissionais ao longo de diferentes instituições e setores – público,
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privado e voluntário – são estabelecidas. As carreiras são forjadas em movimento entre


e através desses setores, por operadores situados nas fronteiras, pessoas que conseguem
reunir parceiros improváveis, “avançar em lugares reservados” e ver “as coisas de um
modo diferente” (Williams, 2002, p. 109). Muitos desses operadores de fronteira serão
identificados posteriormente neste texto.
Nossa resposta para, e nosso engajamento com as mudanças acima esboçadas
são postas dentro de um “amplo conjunto de desvios epistemológicos e ontológicos que
perpassam as ciências políticas, a sociologia e a geografia social, que envolvem um
decréscimo de interesse em estruturas sociais, concomitante a uma crescente ênfase nos
fluxos e nas mobilidades (de pessoas, capitais e ideias)” (Ball, 2012, p. 5). Por sua vez,
Urry (2003) refere-se a isto como a “mudança da mobilidade”. Dá-se então atenção a
novas configurações para as relações e a vida social, que são cada vez mais “conectadas
por redes” (Urry, 2003). O termo “rede” é apresentado aqui num sentido duplo: como
um aparelho conceptual que se utiliza para “representar um conjunto de mudanças
‘reais’ nas formas de governança da educação, tanto nacional quanto globalmente”, e
como um método, “uma técnica analítica para olhar para a estrutura das comunidades
das políticas e suas respectivas relações sociais” (Ball, 2012, p. 6).
A etnografia de rede é um método apropriado e responsivo que se engaja com as
“redes” em ambos os sentidos (veja Au e Ferrare, 2015; Ball e Junemann, 2012; Hogan
et al., 2015, Olmedo, 2017, Santori et al., 2015, Shiroma, 2013). A etnografia de rede é
uma montagem das técnicas e táticas de pesquisa que tratam tanto da organização
quanto dos processos das relações de rede. Por um lado, ela se baseia na análise das
redes sociais (ARS), concentrando-se nas relações sociais entre as pessoas e as
instituições, empregando dados básicos para representar tais relações (usualmente na
forma de gráficos de redes) (Preel, 2012). Neste artigo, utilizamos as redes de afiliação,
bem como a dinâmica das redes para entender a operação e o desenvolvimento da rede
do MBNC. Por outro lado, a etnografia das redes parte da ARS em sua busca pelo
sentido e pelo contexto dessas relações, que frequentemente se perdem ou não são
tratadas nas versões mais ortodoxas da ARS (Knox et al,, 2006).
Na ARS, o termo “afiliações” usualmente se refere a dados de pertencimento ou
participação, e as co-afiliações vêm a ser as “oportunidades para coisas como ideias que
fluem entre os atores”, ao passo que “os dados das afiliações consistem de um conjunto
de relações binárias entre os membros de dois conjuntos de itens” (Borgatti e Halgin,
2012, p. 417). Dessa forma, os dados são representados em dois conjuntos, que, neste
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caso, correspondem a um conjunto de pessoas e outro de instituições, com uma relação


que os conecta, no sentido aqui adotado, de “ser um membro de”. Nos gráficos de
afiliação, há somente conexões pelos conjuntos, porém não há conexões internas ao
conjunto. Dessa forma, uma pessoa pode ser conectada a várias instituições (como
“sendo um membro de” muitas instituições), porém não a outras pessoas. Similarmente,
as instituições podem se conectar a várias pessoas, porém não se conectam diretamente
a outras instituições. Aqui, os dados se referem a membros individuais associados ao
MBNC, bem como às associações às quais esses membros estão filiados por meio de
seu trabalho profissional. Tais dados foram coletados on-line, usando uma grande
variedade de websites (principalmente institucionais, bem como em currículos
disponíveis publicamente). Quanto a esse aspecto, “uma importante vantagem dos
dados de afiliação, especialmente no caso de estudos das elites, é que as afiliações
frequentemente são observáveis de uma certa distância (p. ex., por meio de registros
governamentais, ou informes de jornais), sem que se tenha que haver um acesso
especial aos atores.” (Borgatti & Halgin, 2012, p. 417).
Quando se está interessado na relação entre uma parte do conjunto, como numa
relação entre instituições – ao invés de uma relação entre pessoas e instituições –,
“podemos, de fato, construir certo tipo de elo entre os membros de um conjunto de nós,
simplesmente definindo a co-afiliação (p. ex., a presença [dos indivíduos] nos mesmos
eventos, o pertencimento às mesmas diretorias coorporativas), como um elo. Então, os
dados das afiliações fazem surgirem os dados de co-afiliação, que constituem algum
tipo de elo entre os nós, dentro de um conjunto” (Borgatti e Halgin, 2012, p. 423).
Dessa forma, neste artigo, convertemos uma rede de modo dual (pessoa por instituição)
numa rede unimodal de coafiliação (instituição por instituição), supondo que duas
instituições que possuem um membro em comum têm uma chance significativa de ter
ideias trocadas entre uma [instituição] e outra.
Identificar e categorizar essas afiliações foi algo desafiador às vezes. Isso porque
tais profissionais possuem carreiras um tanto quanto móveis, e que perpassam muitas
fronteiras (Larner e Laurie, 2010), enquanto que alguns também têm mais de uma
ocupação, e outros trocam de emprego com certa rapidez. Portanto, os gráficos
constituem uma representação estática e super-simplificada da complexa e instável rede
de relações (Ball e Junemann, 2012). As afiliações consideradas se referem ao principal
emprego de um indivíduo, porém, em alguns casos, duas afiliações para um único
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indivíduo foram incluídas, nos casos em que houve papéis significativos de produção de
políticas (como, por exemplo, fazer parte de um conselho consultivo municipal).
Complementarmente, empregamos uma combinação de mapeamento, visitas e
questionários e, conforme Marcus (1995) coloca, acompanhamento da política. Esse
acompanhamento foi tanto virtual (por meio da internet e das redes sociais), como
também face-a-face (entrevistas com os atores das redes, bem como o comparecimento
a eventos de rede). Isto envolveu acompanhar as pessoas e as “coisas”, bem como
metáforas, os planos, as vidas, conflitos e o “dinheiro” (Junemann et al., 2016); Santori
et al., 2015). Também requereu uma atenção de perto em relação a organizações e
atores dentro do campo das políticas educacionais, tanto globais quanto locais (e seus
movimentos), bem como às cadeias, caminhos e conexões que articulam esses atores, e
também às “situações” e eventos nos quais o conhecimento das políticas é mobilizado e
estruturado. Isto igualmente significa que se deve olhar para o “quem”, o “que” e o
“onde” das políticas públicas, os lugares e eventos nos quais o “passado, presente e os
possíveis futuros da educação coexistem” (McCann e Ward, 2012), p. 42). No que diz
respeito ao “onde”, conforme McCann e Ward (2012, p. 42) observam, isto significa
“acompanhar as políticas e ‘estudar por inteiro’ os sites e as situações envolvidos com
as políticas”. Já no que diz respeito a “quem”, eles explicam: “nosso trabalho procura
saber de que modo os atores envolvidos fazem as políticas circularem pelas cidades,
como eles se baseiam no conhecimento das políticas que circulam, e como e para quem
eles lançam mão de tudo isso enquanto formam as suas próprias políticas ‘locais’...” (p.
42). Tudo isso requer “uma proximidade com a prática” (McCan e Ward, 2012, p. 45).
E também significa que os etnógrafos das redes devem se tornar aquilo que Burawoy
(2000, p. 4) chama de etnógrafos globais, ou seja, “tornem-se a encarnação viva dos
processos que eles estão estudando”. Como pesquisadores de redes, nós viajamos,
presenciamos, encontramos, interagimos – de modo a pesquisar as redes. Nossa prática
é homóloga às redes que pesquisamos.
Neste caso, a etnografia de rede envolveu buscas profundas e extensas na
Internet, focadas no MBNC, em seus membros institucionais e individuais, e em
eventos correlatos. Isso também incluiu a visita a um sem-número de páginas da
internet (incluindo as de todos os membros institucionais do MBNC, do Ministério da
Educação – MEC, do Conselho Nacional de Educação – CNE, da Universidade de Yale,
etc.), currículos pessoais, jornais e notícias de redes sociais, blogs e documentos (como
as notas oficiais do MEC, do CNE e da Câmara de Deputados). O website institucional
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do MBNC foi também examinado com o apoio de um arquivo da Internet, para acessar
a lista de membros individuais do MBNC ao longo de diferentes pontos no tempo. Os
dados coletados nessas fontes forneceram informação para a elaboração dos gráficos de
redes, bem como para a seleção das instituições e pessoas a serem entrevistadas,
especificamente aquelas identificadas como altamente contectadas e influentes no
MBNC. Entrevistas foram feitas com representantes da Fundação Lemann e do Instituto
Natura – ambos fundadores e apoiadores institucionais do MBNC, com quem fizemos
contatos diretos por e-mail.
O que se oferece aqui é uma série de instantâneos fotográficos na construção e
evolução de um conjunto rapidamente cambiante de iniciativas e relações de políticas
públicas. Por sobre e contra a conceptualização das redes como dinâmicas e
envolventes, há uma luta constante contra a platitude, a “finitude” e a ordem na maneira
de analisá-las e representá-las. É preciso esforço e imaginação ao se redigir a pesquisa,
de modo a se manter um senso de “engajamento e coesão” e de trabalho das redes, bem
como de sua evolução. Tentamos capturar algo disso nos dados das séries temporais
apresentados abaixo.

3. O contexto: o currículo na federação brasileira


Antes de tratarmos do andamento do MBNC no Brasil, e de sua relação com os
servidores civis, apresentaremos um breve relato acerca do governo federal brasileiro,
bem como do atual debate referente ao currículo neste país, a fim de situarmos nossa
análise. No Brasil, em meio a um conjunto de complexas relações federais, o governo
nacional interage com 27 estados e 5570 municípios. A educação é uma
responsabilidade compartilhada entre as entidades federais, de acordo com a Lei das
Diretrizes e Bases da Educação de 1996 (LDB/96). No nível federal, a administração
educacional é representada pelo Ministério da Educação (MEC), a quem cabe criar as
orientações nacionais para todas as demais entidades, o que inclui, por exemplo, as
regulações sobre o financiamento do Plano Nacional de Educação. Ao nível federal
também cabe a principal responsabilidade pela educação superior.
Para começarmos a entender a relação de proximidade existente entre o MBNC
e o MEC, é importante notar que este último dispõe de dois principais espaços
decisórios, que vêm a ser a própria equipe do Ministro e também o Conselho Nacional
de Educação (CNE), algo que poderia ser entendido como se fosse um presidente e uma
casa de parlamentares. Por sua vez, o CNE se constitui de duas câmaras, sendo uma
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para a “educação básica” e outra, para a “educação superior”, com cada uma delas
composta de 11 membros. Na hierarquia do MEC, abaixo do Ministro e do conselho, há
6 secretarias, entre as quais, a da Educação Básica (SEB) é a mais significativa em
relação ao novo currículo. Juntamente com o governo federal, os estados são
principalmente responsáveis pelo ciclo final da educação primária e pela educação
secundária (sendo que ambas fazem parte da chamada “educação básica”). Finalmente,
os municípios são responsáveis pelo ciclo inicial do ensino fundamental, bem como pela
educação pré-primária. Os estados e os municípios dispõem de uma relativa autonomia
dentro das linhas federais, de modo a decidir sobre diferentes questões, como
financiamento, currículo, métodos de ensino, a contratação de professores e o
desenvolvimento de suas próprias politicas de parceria entre o público e o privado.
Neste cenário, o debate em torno de um currículo nacional no Brasil não é novo.
Tem havido um debate constante desde 1997, quando o processo de elaboração de um
currículo nacional começou durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. A
reforma então proposta foi chamada de Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), e o
CNE ficou a cargo de criar esses parâmetros. Numa perspectiva mais ampla, naquela
ocasião, havia um movimento internacional em direção a currículos centralizados, na
Europa, Austrália e Estados Unidos, com debates similares também se evidenciando na
América Latina e África (Macedo, 2014, p. 2016). Nessas duas últimas regiões, o Banco
Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) produziram documentos
com orientações que claramente encorajavam a centralização dos currículos e das
avaliações (Macedo, 2016). Entretanto, no Brasil, também havia críticas, bem como
uma resistência ao currículo centralizado, partindo especialmente de pesquisadores e de
sindicatos de professores. Em particular, isso ocorria porque o país estava passando por
um processo de “redemocratização” (a ditadura militar havia oficialmente terminado em
1985, e a nova constituição federal tinha sido escrita em 1988) e as políticas
decentralizadas eram percebidas como sendo mais democráticas (Arretche, 1996). O
CNE, então, desenvolveu um documento algo genérico, com orientações curriculares
que foram propostas, porém não implementadas pelas autoridades locais, o que resultou,
portanto, em que os estados e municípios conservassem a sua autonomia sobre seus
respectivos currículos (Macedo, 2016).
Entretanto, entre 2008 e 2010, o MEC, criou instruções mais detalhadas na
forma de um documento de cinco volumes, chamado “Indagações Curriculares”, muito
embora o mesmo não articulasse um currículo muito abrangente como seu próprio nome
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daria a entender (Macedo, 2016). Ao mesmo tempo, o Plano Nacional da Educação


estava sendo discutido, na forma de um documento com metas e objetivos educacionais
para os dez anos seguintes. Após um longo debate e com uma ampla participação da
sociedade civil, o plano foi assinado em 2014, com um aparente consenso acerca da
necessidade de uma base nacional comum para o currículo. “Portanto, 20 anos após a
primeira tentativa de se estabelecer um currículo nacional no Brasil, parece que a
discussão está se aproximando de um final. (...) Embora o sistema federal tenha o seu
conjunto de responsabilidades compartilhadas, o processo de uma centralização
curricular nacional parece ter se tornado hegemônico” (Macedo, 2016, p. 6).
A partir de 2014, uma vez tendo o Plano Nacional de Educação estabelecido os
Padrões Nacionais de Aprendizagem (PNA) como uma “estratégia para o melhoramento
da educação no Brasil”, o debate sobre a forma e o conteúdo dos PNA se intensificou e
atraiu mais atenção pública. Desejamos então nos concentrar em um dos mais
proeminentes participantes deste debate, que é o grupo chamado Movimento pela Base
Nacional Comum (MBNC, que também será tratado simplesmente como o
“Movimento”). O MBNC é mais um dos diversos e novos “espaços complexos,
contraditórios e férteis para a interrogação crítica” (Peck e Theodore, 2013, p. 21). Na
próxima seção, detalharemos mais o que é esse grupo, seus objetivos, como ele foi
criado e qual é a sua composição.

4. A criação do MBNC: crenças compartilhadas em novos espaços de políticas


públicas

O Movimento pela Base Nacional Comum descreve a si próprio como sendo


uma “mobilização de advocacia” com membros muito diversos, que veem os padrões de
aprendizagem padronizados como sendo um “passo crucial para se promover a equidade
educacional e alinhar os elementos dos sistemas educacionais no Brasil”. Para tal grupo,
a criação desse currículo funcionaria como “uma espinha dorsal para os direitos de
aprendizagem de cada estudante, para a formação dos professores, para os materiais
didáticos e para as avaliações externas (segundo o website institucional do MBNC). Em
termos concisos, em seus princípios, alega-se que os PNA deveriam se focar naquilo
que são conhecimentos, habilidades e valores essenciais; serem claros e objetivos;
basearem-se em “evidências de pesquisas” e serem obrigatórios para todas as escolas do
país. Por outro lado, também se alega que os PNA deveriam apresentar diversidade,
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respeito pela autonomia dos entes federais, de modo a construir seus próprios
currículos, e de tal modo que os PNA devessem ser elaborados segundo uma
colaboração entre os governos federal, estaduais e municipais (website institucional do
MBNC).
O MBNC consiste de uma rede um tanto quanto difusa de indivíduos e
organizações, que vem a ser uma comunidade de discurso focada na necessidade de
reformas educacionais, feita por empreendedores das políticas, tecnocratas em trânsito e
“líderes de pensamento”, oferecendo soluções para os “problemas” das políticas
educacionais. Os membros, de diversas formas dizem possuir certo grau de
especialização, enquanto que encenam formas particulares daquilo que Mitchell (2002)
chama de “tecno-política”, ou seja eles associam conhecimentos específicos ao poder
político em diversas e distintas formas (Larner e Laurie, 2010, p. 223). As interações e
relações de interseção e de sobreposição do MBNC são agora parte do processo de
reforma educacional no Brasil. Não obstante, trata-se de uma rede de política que está
em construção; “sempre no processo de estar sendo feito... nunca acabado; nunca
concluído” IMassey, 2005, p. 9). A rede do MBNC baseia-se em uma variedade de
relações diretas, interpessoais e sociais, bem como em elevados níveis de confiança
interpessoal, e é animada por interações face-a-face, ou seja, através de vários tipos de
encontros (Urry, 2003). Conferências, oficinas, grupos de discussão são ocasiões para a
reiteração, o revigoramento e a reafirmação do discurso e das alianças, uma linguagem
compartilhada que é emprestada/desenvolvida para se renomear o social.
Como exemplos de como os encontros e os eventos são utilizados
estrategicamente para ativar a rede, podemos salientar três seminários formativos na
criação do MBNC (em meio a uma longa série de eventos), organizados pela Fundação
Lemann. O primeiro foi realizado em abril de 2013 na Universidade de Yale, em New
Haven, EUA, e que foi mencionado pelos entrevistados como sendo o “momento de
criação” do MBNC. Intitulado “Liderando as reformas educacionais: empoderando o
Brasil para o século 21”, este evento reuniu 35 participantes, incluindo membros do
Congresso Nacional brasileiro, secretários estaduais e municipais de educação,
autoridades de fundações e de organizações da sociedade civil, e representantes de
outras partes interessadas no sistema educacional brasileiro (Yale News, 2013). O grupo
brasileiro assistiu palestras proferidas por professores de Yale, gestores educacionais,
responsáveis por políticas públicas e advogados de reformas educacionais, que haviam
tomado parte no desenvolvimento e na promoção do Currículo do Núcleo Comum nos
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Estados Unidos. Segundo o website Yale News, “durante o tempo em que passaram em
New Haven, os participantes discutiram a reforma educacional no Brasil e
desenvolveram um plano de ação que eles então implementariam ao voltar para casa”.
Em outubro de 2013, houve um evento de “acompanhamento” em Campinas,
São Paulo, Brasil. Dessa vez, o foco da conferência foi especificamente o
desenvolvimento dos padrões curriculares do núcleo comum. Naquela ocasião, foi
relatado que os participantes da conferência receberam “perspectivas internas do
desenvolvimento dos Padrões Estaduais do Núcleo Comum nos EUA através de Susan
Pimentel e de Michael Cohen [...] que compartilharam [com os presentes] lições
estratégicas” (Yale School of Medicine News, 2013). Pimentel foi a principal autora dos
padrões de letramento do Núcleo Comum, e vice-presidente do National Assessment
Governing Board, que serve como um órgão consultor para o National Assessment of
Educational Progress (NAEP), que vem a ser o teste nacional de avaliação educacional
dos EUA. Por sua vez, Michael Cohen é o presidente da Achieve Inc., uma organização
sem fins lucrativos, fundada pela Fundação Gates e pelo governo federal norte-
americano. A Achieve advogou o Currículo do Núcleo Comum e participou do processo
de redação dos padrões, além de, mais tarde, ter produzido testes padronizados e
serviços de consultoria alinhados com o Núcleo Comum. Complementarmente, já no dia
seguinte, outro seminário foi realizado em São Paulo, organizado pelo CONSED e
apoiado pela Fundação Lemann, que se realizou na Insper (uma organização de
educação superior), com a presença do pesquisador Michael Young, da Inglaterra, como
o principal palestrante.
Em março de 2015, outro seminário foi realizado em Yale, novamente
organizado pela Fundação Lemann. Intitulado “Liderando as reformas educacionais:
oportunidades e desafios pela frente”, este segundo seminário de Yale, que foi chamado
de um “programa de liderança para líderes brasileiros” no website daquela universidade
norte-americana, contou com a presença de 45 autoridades públicas brasileiras, bem
como dos líderes da Fundação Lemann e de uma equipe de organização, num seminário
de quatro dias com palestras e oficinas realizadas por “especialista em educação
internacional”. No website de Yale, o objetivo desse seminário foi definido como sendo
“criar uma compreensão de, e também um consenso sobre a importância de se
aperfeiçoar a educação entre a nova liderança política brasileira, tanto no nível nacional
quanto dos estados. Em sessões realizadas a portas fechadas, senadores, deputados,
governadores e líderes educacionais brasileiros discutiram as questões educacionais
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mais prementes no país, bem como traçaram estratégias sobre como produzir
mudanças” (World Yale News, 2015).
Esta série de eventos trouxe consigo um conjunto de representantes vindo dos
campos da nova filantropia e da academia, além de uma diversidade de funcionários
civis e políticos dos níveis federal, estadual e municipal. Os participantes foram
convidados pela Fundação Lemann, e um representante desta organização descreveu o
processo de criação do MBNC da seguinte maneira:
“O MBNC veio à tona em 2013 com o objetivo de trazer os padrões nacionais de
aprendizagem para a agenda pública do Brasil. Desde que iniciamos este processo [do
MBNC], temos organizado vários encontros. Já duas vezes formamos um grupo de
cerca de 50 pessoas para sessões de imersão de uma semana de duração na Universidade
de Yale. Ainda em 2013, que foi quando começamos, chamamos um grupo de Yale para
discutir o currículo, e assim o “movimento” foi criado. Então, no ano passado [2015],
fizemos o mesmo com as pessoas que estavam iniciando seus respectivos mandatos em
janeiro, como secretários estaduais de educação, deputados federais e estaduais,
governadores... Esses eventos foram muito comuns; [fazemos] vários encontros, várias
conversas para resolver as principais dificuldades, trocar ideias, conversar com o
MBNC, mas também conversamos com deputados, com a equipe responsável pela
redação dos padrões, conversamos com todo mundo que é importante neste debate”
(entrevista na Fundação Lemann em 2016; os itálicos são nossos).
Aqui, podemos ver uma forma pela qual a fundação faz o seu “trabalho” de
políticas públicas, e como sua equipe almeja e mobiliza os atores com os quais ela
deseja estabelecer uma relação. Esses eventos são lugares que apoiam a criação,
evolução e continuidade de uma rede dinâmica, instável e expansiva de políticas
públicas, onde a nova filantropia, os “tecnocratas” das políticas e o estado podem
interagir. Também ficam evidentes as “cadeias de esforços contínuos” (Fenwick, 2009)
– encontros, eventos, conversas, visitas, financiamento, alianças, etc., através dos quais
as relações da rede se estabelecem e são “mantidas em seus lugares”. Essas são também
algumas das “cadeias, circuitos, redes, webs, e translações no interior e através das
quais a política, bem como os discursos e ideologias a ela associados, tornam-se móveis
e mutáveis” (McCann e Ward, 2012, p. 42). O MBNC busca “ensinar” aos tomadores
de decisão acerca da importância de um currículo padronizado, e claramente aponta em
direção e “toma emprestado” do modelo do Núcleo Comum norte-americano. Esta série
de eventos tinha a intenção tanto de colher apoio de diferentes atores em diferentes
13

espaços, como de criar uma crença compartilhada sobre e a respeito da dedicação à


necessidade de um currículo nacional. Parte desse trabalho ideológico baseava-se na
autoridade invocada pela Universidade de Yale.
Além do mais, o aspecto social desses eventos e viagens não deve ser ignorado.
Eles estimulam conversações, bem como a construção de uma confiança, que são
essenciais para a coerência das redes (veja Avelar et al., 2018, para uma discussão mais
completa). E, conforme March e Smith (2000, p. 6) colocam, “as redes envolvem a
institucionalização das crenças, dos valores, culturas e formas particulares de
comportamento”. Elas então não são simplesmente relações pragmáticas, mas também
constituem comunidades morais e epistêmicas. Ao longo do tempo, os membros dessa
“comunidade” acabam por conhecerem bem uns aos outros, trabalham juntos e
compartilham os valores que informam suas escolhas e compromissos; e eles geram e
compartilham argumentos persuasivos que podem ser utilizados em contextos mais
hostis (Grek, 2012, p. 56).

5. As afiliações dos membros do MBNC

O MBNC é constituído tanto de pessoas quanto de instituições. Os “apoiadores


institucionais” do movimento incluem 12 organizações privadas de diferentes tipos,
entre as quais organizações filantrópicas (familiares e coorporativas), institutos de
pesquisa e associações civis de servidores da educação. O MBNC foi fundado pela
Fundação Lemann, pelo Instituto Natura e pelo Banco Itaú BBA. Além de ser parte do
grupo fundador do movimento, a Fundação Lemann exerce também o seu “secretariado
executivo”, com a tarefa de efetivar as decisões tomadas pelos membros. Esta fundação
foi criada em 2002 pelo empresário Jorge Paulo Lemann (que atualmente é o cidadão
mais rico do Brasil, e encontra-se entre as 25 pessoas mais ricas do mundo), e começou
com projetos locais, porém logo voltou-se para objetivos de políticas educacionais e de
grande escala. Tanto a Fundação Lemann quanto a Estudar são conhecidas por adotar
estratégias administrativas similares às que se veem nas próprias empresas do grupo
Lemann, como uma cultura de austeridade e de busca de resultados (Correa, 2013). Sua
agenda educacional gira em torno daquilo que Pasi Sahlberg (2011) chama de GERM –
o Movimento da Reforma Educacional Global, com cinco aspectos altamente inter-
relacionados: a “padronização da educação”, o “foco em disciplinas centrais”, a “busca
por formas de ensinar de baixo risco”, o “uso de modelos de administração
14

coorporativa” e as políticas de responsabilização baseadas em testes para as escolas”


(Ball et al., 2017, p. 2). A criação de um currículo padronizado trata de todos esses
cinco princípios, diretamente – nos três primeiros elementos – ou indiretamente – nos
dois últimos.

Fig. 1: Rede de ego e co-afiliação do MBNC

Enquanto que o MBNC é totalmente patrocinado e mantido por organizações


privadas, entre seus membros encontram-se representantes de todos os níveis de
governo (federal, estadual e municipal, conforme já observado). No nível federal, o que
é particularmente notável é como diversos membros do MBNC exercem ou já
exerceram cargos no Conselho Nacional de Educação, no Ministério da Educação e na
Câmara dos Deputados Federais. E, ao final de 2016, mais da metade dos membros do
MBNC encontravam-se trabalhando em instituições estaduais.
Os membros individuais desempenham um papel-chave no funcionamento do
MBNC, tanto no que diz respeito ao estabelecimento de uma agenda, quanto no
planejamento estratégico dos objetivos e estratégias do MBNC, bem como na tentativa
de se cumprir essa agenda em e através de seus diversos contextos e conexões. Em
relação ao primeiro desses tópicos, o estabelecimento da agenda, segundo um
representante da Fundação Lemann, “o grupo de membros [individuais e institucionais]
15

decide quais são as prioridades para o ano, as decisões estratégicas, e esse grupo
acompanha os desenvolvimentos ocorridos no MBNC. O Secretariado Executivo da
mobilização está em contato com essas pessoas durante todo o dia, literalmente,
trocando ideias todos os dias, pedindo suas opiniões, em busca de conselhos e
sugestões” (Entrevista com a Fundação Lemann, 2016). Segundo, no que diz respeito ao
avanço desta agenda, as conexões mantidas pelos membros são fundamentais para o
“trabalho de advocacia” do MBNC. Isto fica explícito pelo mesmo representante da
Fundação Lemann, segundo o qual:
“Cada membro da mobilização é um advogado em potencial [da causa]. Trata-se
de pessoas muito diferentes, o grupo é bastante plural, de modo que cada uma dessas
pessoas possui um conjunto diferente de ‘interlocutores’. Os membros constituem a
advocacia do grupo porque eles conversam com os interlocutores que mais lhe
interessam. Há pessoas com um maior diálogo com os movimentos sociais, há outras
com um maior diálogo com outras fundações, algumas pessoas falam com o governo,
outras são o próprio governo. Assim a mobilização é um organismo de advocacia; é
muito interessante que dizemos as mesmas coisas, às vezes com cores diferentes, mas os
princípios são os mesmos. Ao invés de termos um advogado, temos 60. Isto é muito
interessante. Acredito que um dos pontos fortes do MBNC é a sua operação como um
bloco. Mesmo que não concordemos uns com os outros em tudo, as mensagens-chave
estão sempre lá, sendo repetidas para aquelas pessoas que importam (no debate)”
(entrevista com a Fundação Lemann, 2016).
Portanto, argumentaríamos que é crucial considerar os membros individuais do
MBNC para melhor compreender como fluem os discursos do deste movimento,
atentando-se a para onde/de onde, bem como a para quem/de quem eles se movem.
Portanto, apresentamos a seguir um gráfico de rede de coafiliação dos membros
individuais do MBNC. Esse gráfico foi elaborado como uma rede de egos (a rede de
uma instituição, o MBNC), significando que todas as instituições têm pelo menos uma
conexão com o MBNC (pelo menos uma pessoa afiliada a ambas as instituições). Por
razões de clareza, ao invés de incluirmos todas as bordas, aqui organizamos os nós em
três círculos. No círculo mais externo, as instituições têm somente uma conexão com o
MBNC. No círculo do meio, elas possuem duas conexões. E, finalmente, no círculo
central, elas têm três ou mais conexões (com o número exato sendo apresentado
numericamente na borda). Quanto mais grossa for a linha, mais pessoas em comum têm
essas duas organizações. Os tamanhos dos nós variam de acordo com a maneira como a
16

instituição é conectada. Os nós são colocados segundo o seu tipo de instituição,


organizados como a seguir, no sentido horário, começando da parte superior do círculo:
universidades/instituições de pesquisa, companhias de negócios, fundações, governos
municipais, estaduais, federal e organizações internacionais.
Na Fig. 1, vemos a coafiliação de membros entre o MBNC e 52 outras
instituições. Fora dessas organizações, sete possuem mais de 3 conexões com o MBNC
(e, portanto, são mais prováveis de possuir uma significativa troca de ideias, discursos
e/ou recursos). O Todos pela Educação (TPE), uma grande e influente organização de
advocacia coorporativa (ver Martins e Krawczyk, 2016), inquestionavelmente possui a
maior coafiliação com o MBNC (20 membros), indicando a próxima relação entre esses
dois movimentos. É interessante notar que, entre as instituições mais conectadas, há três
federais: a Câmara dos Deputados, o MEC e o CNE.
Para analisar um pouco mais a relação difusa entre o público e o privado, a nova
filantropia e o governo, presentes na rede do MBNC, a seguir discutiremos a evolução
ao longo do tempo dessa parta da rede. Também consideraremos o cenário de fundo e a
afiliação de alguns desses membros, de modo a tratarmos de como o MBNC veio a
construir uma tal rede de relações próximas com as instituições públicas fundamentais,
especialmente o MEC e o CNE.

6. O MBNC e o MEC/CNE: a mudança temporal da rede

A despeito de dizer que foi criado em 2013, o MBNC somente começaria a usar
este nome em eventos e em informações públicas sobre seu trabalho (e apoiadores) no
segundo semestre de 2015. Portanto, as listagens aqui começam a partir de setembro de
2015, que foi o primeiro momento em que o MBNC publicou os nomes de seus
proponentes, e os dados foram organizados em três semestres, de acordo com as
mudanças identificadas em sua composição. Mesmo em um período de tempo tão curto
como este, é possível ver consideráveis mudanças na composição do MBNC, bem como
um número crescente de funcionários públicos. De fato, o grau de mudança ao longo
desses três semestres é um bom exemplo de como essas redes são sempre mutáveis,
instáveis e fluidas (Ball, 2012; Peck e Theodore, 2010). Na Fig. 2 abaixo, vemos as
mudanças na composição do MBNC.
Duas mudanças na composição do MBNC tornam-se visíveis na Fig. 2. A
primeira diz respeito ao crescimento geral no número de membros, algo que se torna
17

evidente pela diferença entre o segundo semestre de 2015 e o início de 2016. Neste
período, a mobilização cresceu de 40 para 70 membros. Esse crescimento foi
principalmente alcançado por meio do recrutamento de representantes de fundações: dos
30 novos membros, 24 eram afiliados a fundações. No que diz respeito aos funcionários
públicos, embora o crescimento geral não tenha sido substancial, é importante salientar
que, pelo final do ano de 2015, o MBNC recrutou 4 membros do CNE. Neste período, o
MEC tinha acabado de publicar a primeira versão da BNCC (setembro de 2015), o que
gerou um amplo debate público. O MEC, o MBNC e as autoridades locais foram
fomentando discussões por meio de vários seminários pequenos, e encontros, de modo a
coletar feedback para uma segunda versão do documento da BNCC.
Por outro lado, a segunda mudança na composição do MBNC é qualitativa. Ao
passo que, no primeiro semestre de 2016, havia 29 membros afiliados a instituições
estaduais e 41 a organizações privadas, já no semestre seguinte, tal situação se alteraria
para 37 membros nas instituições estatais e 33 nas privadas. E, o que é ainda mais
importante, a composição do MBNC mudou com a adição de membros ocupando postos
vitais no governo federal (CNE e MEC). Essa mudança teve lugar em algum tipo de
relação com a controversa mudança de governo, quando a presidente Dilma Roussef
sofreu um impeachment, dando lugar à entrada em cena de uma administração
conservadora. Dos somente 7 membros em posições federais no primeiro semestre de
2015, o MBNC alcançaria 19 na segunda metade daquele mesmo ano.
A seguir, apresentam-se as redes de afiliação entre o MBNC, o MEC e o CNE
(bem como as duas câmaras que compõem este último, conforme já se observou
anteriormente). Diferentemente do primeiro gráfico de rede ((Fig. 1), aqueles que estão
abaixo foram mantidos como gráficos de dois modos, com os dois conjuntos de nós
(instituições e pessoas). Aqui, nosso objetivo é analisar como as coafiliações do MBNC
com essas vitais instituições tomadoras de decisão de nível federal têm sido construídas
com o tempo.
O MBNC tinha duas diferentes direções de interação com os funcionários civis
dos governos. Primeiro, caminhando para o final de 2015 (veja a mudança nas figuras 3
e 4), o MBNC estava recrutando-os para a mobilização, insto é, chamando pessoas que
se encontravam no CNE, as quais então se afiliaram ao grupo. Numa entrevista com um
representante da Fundação Lemann, pudemos ver como essa criação de relações com
relevantes responsáveis pelas políticas é uma tática deliberada e planejada. Ele explica
como a Fundação Lemann e o MBNC estiveram investindo no estabelecimento de
18

relações na capital federal, Brasília: “Temos uma pessoa, contratamos alguém “super”,
que está agora fazendo lobby em Brasília. [...] Todos os dias ele tem a função de
conversar com pessoas que detêm o poder, ou com pessoas que participam do processo
de, finalmente estabelecer conectividade” (Entrevista na Fundação Lemann, 2016).
Segundo, em uma nova janela de políticas (Kingdom, 2003) – o governo em
mudança – pessoas que eram já parte do MBNC vieram a ganhar papéis na estrutura
burocrática, ocupando, com efeito, posições estratégicas dentro do CNE e do MEC,
ambos locais oficiais para a deliberação e a formação do novo currículo nacional. Os
membros do MBNC foram apontados para as seguintes posições no MEC: Secretaria
Executiva do MEC, a direção da Secretaria da Educação Básica (SEB), bem como para
duas das três subsecretarias da SEB, e para a presidência do INEP. No que diz respeito
ao CNE, enquanto que, em junho de 2016, a nomeação bianual para a presidência do
CNE estava para ser realizada, Michel Temer, o então presidente interino, alterou a lista
de nomeados de Dilma (após sua publicação, porém antes que ela fosse homologada,
mudando a metade dos 12 novos nomeados). Na nova lista do presidente interino, havia
quatro nomes afiliados a instituições privadas, incluindo Nilma Fontanive e Suely
Menezes, ambas membros do MBNC.
Em ambas as direções de interação, a relação epistêmica entre a mobilização e
os membros tem sido fundamental. Francisco Aparecido Cordão, o primeiro membro do
CNE a se associar ao MBNC, integrou a equipe de fundação do Todos pela Educação.
De modo similar, César Callegari, que fizera parte da equipe do CNE que se juntou ao
MBNC no final de 2015 (veja a Fig. 4) também faz parte da equipe governamental do
Todos pela Educação. Já na segunda mudança (veja a Fig. 5), vê-se Nilma Fontanive,
que faz parte da comissão técnica do Todos pela Educação, e Suely Menezes, que
trabalha numa grande cadeia privada de ensino superior chamada Ipiranga.
19

Fig. 2: Composição do MBNC entre 2015 e 2016

Fig. 3: O MBNC e o MEC – 2º semestre de 2015


20

Fig. 4: O MBNC e o MEC – 1º semestre de 2016

Fig. 5: O MBNC e o MEC – 2º semestre de 2016


21

Entretanto, nesta rede, provavelmente os exemplos mais significativos de atores


no limiar da fronteira [entre público e privado] são Maria Helena Guimarães de Castro e
Maria Inês Fini. Ambas se juntaram ao MBNC nos seus primeiros estágios; ambas
ocupam agora posições de alto nível no MEC, e ambas têm uma longa e complexa
história no campo das políticas educacionais brasileiras, com um vasto conjunto de
conexões tanto com o setor público quanto com o privado. Castro já trabalhou como
professora de ciências politicas na Universidade de Campinas. Também já foi presidente
do INEP durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2001), quando se
introduziram no Brasil as avaliações públicas de larga escala da educação e, em 2002,
durante o mesmo governo, ela se tornou Secretária Executiva do MEC (posição que
ocupa até o presente momento) (Souza e Oliveira, 2003). Ela também já trabalhou em
diferentes estados e secretarias, incluindo a secretaria de educação do estado de São
Paulo, quando este introduziu os seus padrões de aprendizagem. Ela então se vinculou à
fundação Educar para Crescer, tornou-se presidente da Fundação Sistema Estadual de
Análise de Dados (SEADE), e também integra o Todos pela Educação. Por sua vez,
Maria Inês Fini também trabalhou na Universidade de Campinas entre 1972 e 1996,
onde participou da criação da Faculdade de Educação. Entre 1996 e 2002, ela trabalhou
no INEP com Maria Helena de Castro onde foi uma diretora responsável pela
introdução de dois testes em larga escala. Também trabalhou em diferentes estados e
cidades, e foi uma das diretoras do PISA no Brasil. Ela então se envolveu com diversas
fundações (FEAC, Campinas pela Educação, F & F Educare, Fundação Roberto
Marinho) e instituições privadas de ensino superior (Cesgranrio, SL Mandic). Ambas
essas atrizes estão, portanto, altamente conectadas dentro e ao longo do campo
educacional no Brasil, e têm acumulado um volume significativo de capital de rede
(Williamns, 2002), havendo atuado em diferentes estados, com diferentes governos e
trabalhado tanto em organizações públicas quanto privadas. Ambas representam um
específico, coerente e agressivo projeto de reforma educacional, que valoriza a testagem
padronizada em larga escala e a participação das organizações privadas na educação
pública.
Para deixar as coisas mais claras, como frequentemente acontece nas redes de
políticas públicas, na rede do MBNC existe uma comunalidade epistêmica entre os
membros (Santori et al., 2015), e que frequentemente se manifesta por meio de
afiliações, embora também as transcenda. Os membros da rede ligam-se uns aos outros
22

por meio de uma visão compartilhada daquilo que a educação deveria ser, quais são os
problemas de políticas públicas no Brasil, e quais são as necessárias soluções políticas
para eles. Como um dos nossos entrevistados explicou: “essas organizações estão no
movimento porque elas de fato acreditam que possuir padrões comuns de aprendizagem
no Brasil é algo que pode fazer bastante diferença. E assim, elas transformam isso na
sua própria causa. Então, torna-se um trabalho natural, incorporar esse tema em
qualquer coisa ligada ao seu trabalho ou ao que elas fazem” (Entrevista na Fundação
Lemann, 2016).
Aqui, a fronteira entre o estado e a nova filantropia está se tornando cada vez
mais porosa e, de fato, poderíamos dizer que o MBNC aparece com o tempo como um
local-chave de políticas públicas e de trabalho estatal por si próprio. Também é possível
perceber o papel de um relativamente novo tipo de ator híbrido, atuante entre a
fronteira, que administra os “teatros inter-organizacionais”, conforme observa Williams
(2002, p. 104), acumulando capital de rede, à medida em que se movem entre os setores.
Ao mesmo tempo, novos tipos de carreiras, identidades e mobilidades são forjados
dentro dos processos de reforma e através do trabalho dessas redes de políticas públicas.
Esses atores móveis, ao longo das fronteiras contribuem simbólica e substantivamente
para uma “narrativa de poder” (McCann, 2008, p. 5), constituída de ideias, práticas e
sensibilidades que tratam da reforma curricular da escola brasileira. Alguns desses
atores poderiam ser por nós identificados como “móveis e sacudidores” (Williams,
2002) – ou seja, pessoas que têm a capacidade de conectar e assegurar a cooperação
dentro e por diferentes redes, através de um compartilhamento de objetivos comuns e da
combinação de recursos. As histórias e trajetórias individuais incorporam-se na rede, e
focam-se em pontos nodais particulares. Trata-se, com efeito, de mobilidades
incorporadas de políticas, visto que tais pessoas carregam consigo as sensibilidades e a
substância da reforma educacional dentro de si próprias.

7. A nova filantropia do MBNC e os funcionários civis: o estado heterárquico na


prática

O que procuramos capturar aqui são alguns aspectos de um conjunto mais geral
de mudanças nas formas e modalidades do estado brasileiro. Não se trata de mudanças
absolutas, mas sim de um conjunto de desvios na balança onde se equilibra uma mistura
de diferentes elementos governamentais – burocracia, marcados e redes. Essa nova
23

mistura, por sua vez, traz uma série fragmentada de novos jogadores, vindos do setor
empresarial e da filantropia, e que vão assim no trabalho governamental da educação,
fazendo com que haja um embaralhamento de atores burocráticos em novos locais de
políticas públicas e novos tipos de relação em e com as políticas. Para reiterar o que
temos dito, o trabalho de grupos como o MBNC não assinala de uma vez por todas as
mudanças sistemáticas no modo de se fazerem as políticas educacionais ou o estado da
educação, mas, ao invés disso, é parte de uma miríade de pequenas mexidas,
experimentos e iniciativas que podem então ser enviados para cima, e contribuem ao
longo do tempo para que se tenha um sistema mais profundo, responsável por uma
reengenharia. Longe de ser uma dramática “retirada” ou um total “esvaziamento” do
estado (Holliday, 2000), esse novo modelo emergente de governo implica uma firme,
porém não-dramática “retirada” de novas estruturas e tecnologias de governança, que
estão contribuindo para a redefinição dos papéis e responsabilidades do estado, mas, ao
mesmo tempo, recolocam o estado estrategicamente tanto em termos normativos quanto
institucionais.
Esses desvios são parte de uma transformação mais profunda da esfera política, a
“desgovernalização do estado” (Rose, 1996), no sentido em que o estado não mais atua
como o centro do poder, mas sim através de novas formas de organização política –
heterarquias – que se desenvolvem, e nas quais os governos não mais exercem um
controle monopolista sobre o trabalho do estado, mas vão se transformando em
“metagovernantes”. “Esse novo método heterárquico de governança implica uma
concepção de políticas que devem ser vistas como os esforços coletivos de um conjunto
de jogadores que competem [entre si] e formam alianças, dentro de uma arena política
ligada por uma rede cada vez maior” (Olmedo, 2014, p. 253). Isto envolve mudanças
tanto em “quem governa” e, ao mesmo tempo, em “como o poder é exercido”. Tal efeito
ocorre por meio do repovoamento e da recriação da rede, que por sua vez consiste de
outras redes já existentes de políticas e a emergência de novas redes que dão
legitimidade ao papel do mercado, das empresas e/ou da filantropia, na solução de
problemas intransigentes (como a forma e o conteúdo do currículo escolar).
Trata-se de um movimento que vai além das formas burocráticas e
mercadológicas de coordenação, e em direção a relações mais flexíveis, assimétricas e
heterárquicas, dentro das quais as responsabilidades e os processos decisórios são
compartilhados por uma mistura heterogênea de atores novos e velhos nas políticas,
24

com o efeito de reequilibrar a mistura de governança (Ball e Junemann, 2012).


Conforme Jessop (1998, p. 32) explica:
“(...) a recente expansão das redes às expensas dos mercados e hierarquias, e da
governança às expensas do governo não é apenas uma oscilação pendular em alguma
sucessão regular de modos dominantes de feitura de políticas. Ela reflete uma mudança
nas estruturas fundamentais do mundo real, e uma mudança correspondente no centro
de gravidade em torno do qual os ciclos de políticas se movem”.
O que tentamos indicar em particular aqui é tanto um novo centro de gravidade
na topografia das políticas educacionais no Brasil como uma formação concomitante de
novos tipos de atores móveis e intersticiais nas políticas, que operam ao longo e entre
aquilo que, antes, eram setores distintos.
Também evidente aqui, na formação e evolução do MBNC, é a construção
daquilo que Cook e Ward (2012) chamam de tubulações de políticas. Através dessas
tubulações de políticas transnacionais, estendendo-se dos EUA para o Brasil, e
principalmente mediadas pela Fundação Lemann, pela Universidade de Yale e pelos
empresários de políticas norte-americanos, passam tanto o conhecimento tácito quanto o
conhecimento em formas codificadas. Essa “aprendizagem adquirida por meio da
participação nas tubulações de políticas transurbanas espalha-se por meio de diferentes
grupos “locais” de práticos e de fazedores de políticas” (Cook e Ward, 2012, p. 14) –
neste caso, a ideia dos padrões nacionais de aprendizagem. Portanto, poderíamos ver o
MBNC como uma pequena parte de uma rede de políticas articulada e mais extensa, que
é uma “rede globalmente integrada” (Urry, 2003) de atores e organizações, práticas e
formas altamente interdependentes , que se relacionam uns com os outros de diversas
maneiras, no que diz respeito à reforma educacional. Isto se aproxima daquilo que Pasi
Sahlberg (2011) chama de GERM – o movimento global de reforma educacional1. Essas
relações de rede não se encontram fora, nem sobre, nem contra o local em nenhum
sentido simples, mas elas possuem múltiplas relações cambiantes para e dentro do
“local”, ou de fato, diferentes locais (nacionais, estaduais e municipais). De fato, aquilo
que é local e global é mudado/moldado pelas relações e movimentos aqui esboçados. O
trabalho da rede, no seu sentido global, produz aquilo que Lingard e Sellar (2014)
chamam de novas topologias de políticas públicas. O “espaço [da política] configura-se
através da interseção de elementos globais e situados” (Ong, 2007, p. 5). Tudo isso é

1
GERM: abreviatura em inglês da expressão “global educational reform movement”, ou “movimento
global de reforma educacional”. (NT).
25

retrabalho, ou talvez mesmo um ato de apagar as fronteiras entre estado, economia e


sociedade civil.
O caso da reforma educacional brasileira é articulado, de modo prático e
discursivo, em uma variedade de maneiras, algumas delas descritas neste relato, para
uma rede global de ideias de políticas e formas de políticas. O Brasil encontra-se em um
ponto particular sobre um continuum de mudanças que se interconecta e replica uma
mudança global na forma e nas modalidades do estado e nas concomitantes maneiras de
governar de modo diferente. Os pontos específicos de nosso relato poderiam sugerir
uma direção clara de trabalho dentro do trabalho do estado cada vez mais sendo feito
em outros lugares por outros atores – tudo o que traz à baila as relações entre políticas
públicas, o processo das políticas e as políticas democráticas. Em certos sentidos, isso
corresponde a uma despolitização da política. Vozes que não foram eleitas e, em muitos
casos, que não têm que prestar contas, estão passando a ter um peso significativo na
determinação dos métodos, conteúdos e propósitos da educação. Os membros do
MBNC e suas coortes e parceiros estão, em certos aspectos, “votando com dólares”
(Saltman, 2010). Ou seja, recursos financeiros, de reputação e sociais estão sendo
mobilizados para se mudar o panorama da educação no Brasil, bem como a experiência
da educação nas escolas brasileiras. Com essas relações tão opacas entre o público e o
privado, torna-se desafiador, para não dizer impossível, identificar com precisão o papel
desempenhado pelos diferentes atores das políticas, e fazer com que eles respondam por
isso. Por exemplo, embora concordemos com Peroni e Caeteno (2016) que a Fundação
Lemann, como a Secretária Executiva do MBNC, tem tido um papel proeminente na
mobilização e na formulação do MBNC, não é possível assegurar-se de seu papel na
condução da agenda do MBNC e na construção da rede. Neste sentido, há uma
necessidade urgente para mais pesquisa que se concentre em novos lugares, novos
atores e novos processos das políticas que vão além do próprio estado e, de fato, além
do estado-nação, como uma política educacional, ao passo que, no Brasil e em outros
lugares, geralmente se continua a focar no próprio estado e nos atores e processos
tradicionais das políticas. Concomitantemente, a pesquisa precisa desenvolver um novo
repertório de métodos e técnicas que sejam mais apropriados para o estudo dos fluxos
das políticas, ao invés das estruturas de governo.
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Referências bibliográficas
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