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rumo a uma redistribuição 'Sd porque nào há uma guerra não significa que htqa paz."
desobediente de gênero e ilistica em X-^en Apocáiypse(eoid)
anticoloníal da violência!
jota mombaça CENA 1_ QUEM PGUOA A POÜCIA
C morreu asfixiada no porta-malas de uma viatura da pdída militar de São
Fmila A narrativa oficial é a de que èia teria entradolá pm-vontade própria,na
intenção de roubar algo e acabara morta.Segundo um portal de notícias onlin^
a viatura foi reparada,limpa e voltou às ruas em poucos dias. Ninguém fin
responsabilizado »c8to C.,que morreu asfixiada e tinha o rosto roxo e as mãos
sujas de sangue quando a encontraram,na traseira de uma viatura militar,com
19 anos de idade.
Uin boletim de ocorrência foi feito contra ela.
A pdída no Brasil é a única fimção criminosa respónsávri pela investigação de
seus próprios crimes.

CENA 2.O QUE É UM CRIME?


Vera Malagutti descreve as Êmtarias absohitistas de cmitrde social da pdfiâa no
período posterior à abdiçãoformal da escravddão no Brasil para desdobrar daí
uma percepção mais aguçada do sistema dejustiça criminal boje. Ésdnretudo
no controle sistmnico do trânsito de pessoas a&icanaslivres e afri>desoentb'ntes
que a policia vai passar a operar aí,como braço do{nojeto colonial em sua
versão moderna,garantindo a segurança das rihes brancas e mestiças e o
tormr das r<nmiTn?daA»<t wmpftbwHgdas a rafialiradas. O ractsmo contra pessoas
pretas e pobres está, portanto,no DNA das polírias e das redes de contrde e
aittunufain que se articulam em torno delas. Mas não toria sido necessário ouvir
lima acadêmica branca para dar-se ccmta djssa Não é de hoje que movimcn^
políticos como Mães de ãlaio e RecQa ou Seráãlorta(o),asrim como umas^e de
vozes frwpltradafi nos atbdsmose organizações comunitárias pretas,produzem
corneódo,denxmcia e articulação para visibOizar o pq>elefetivo desses
genocfoios racistas e dassistas nas gramáticas da dominação à braaletra.

no marco do colapso da còldoia^exposta como ferida naj^tsagem das


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cidades,na densidade dos muros,cercas e fronteiras. Está exposta também na desarticulando dessa mai^ira todas as outrasficções dejustiça que poderiam vir a
coreografia das carnes,na intensidade dos cortes e ancestralidade das cicatrizes. s^conjuiadas a partir dessa afirmado.
Etudo isso está bastante evidente,ainda que mascarado; está latente em toda
emoção posshrd de forjar-se perante esse regime. Mesmo quando as máquinas Aficção cientifica é uma daslinhas de tensão entre as ficções de poder e o
de feyr desperceber conflitos e desigualdades estruturantes projetam -sempre poder visionário das ficçÕes.Se consideramos o eixo especulativo canónico,
arbitrariamente-verdades cuja promessa é a de serem neutras,justas e dHitwdidft pela literatura, pelo f^nAma e pela arte euroestadnnidense em geral,
universalmente aplicáveis,transcendentes,legais, modernas,cotoniais,sobre o majoritariamente formulado desde as posições de homem,branco,d^ênero e
que significa ser um criminoso;o que é segurança;quanto vale para este mundo heterossexual,é Ann^nm que nos voamos presas à circularidade do poder,numa
a indústria do punitivismo; que marcadores sociais desenham os gráficos do espiral distópica c^azde mover-se apenas do controle rumo ao maior contrde.
extermínio sistemático,continuado e neocolonial; por que há vidas matá\-ei^ que Autores e histórias aparoitemente críticas da sociedade disciplinar e de contrde
corpos adornam os projetos de futuro; quem são os sujeitos da histéria; o que é podem,contraditoriamente,(çerar na atualização.d(^ sistemas contra os quais
catástrafe,gcúpe,crise,extinção...? escrevem.O trabalho de revriar o maqqinárío do poder, projetando-o
no futuro ou no domínio fantástico^ coincide ai com a tarefa ingrata de
Afinal,o que é um crime,quando o próprio modo defúndonamento dajustiça se produzir máqmnagjima^naudo-as inescapáveis.O poder
frzinsqparávd de um prqeto de atuafização popétua da injustiça como fantasia insuspeitado das ficções é o de ser rínwwtn do mundo,porque,como propõem
de contnde?O queé um crime,quando tudo o que se enten^ sob o guarda-diuva pensar as co-editoras do livro Octavia^ Brood,\Nfalidah Imari.sha e adrienne
da normalidade e Iq^alidade não cessa de repeç|)nnar a presença da morte como maree brwvn,"não podemos construir o que não podemos imaginar',da niodo
aq)ectativa devida de comunidades inteiras,desmtes daqui e de toda a terra, que tudo o que está construído precisou,antes,serima^nado.E ai reside o
tnimanag o nStvJmnnanatff l^er dasficções.

CENA 3_ RCÇÕES DE PODER E O PODER DAS RCÇÕES Não é,portanto,a «íSmoncSo ficcional do poder queme interessa confrxmtar. São,
mais bem,asficções de poder especificas e osristemas de valores que operam
O poder opara por ficções,que nãosão apenastextuais,mas estão materialmente no feitio deste mundo,e seus de dominante.Nessa chave,o
engajadas na dn rmindn. Asficçgos d» poder se pmilifgram junto a seus monopâio da vio&Incia tem como premissa gnmiciar não apenas o acesso às
feitos,numa mardiafúnebre cddnada como avanço,progresso OU destino técnicas,máquinas e disporitivos com que se perfiorma a violência le^tima,mas
incontomáveis.O monopólio da vidênda é uma ficção de poder baseada na também as técnicas,tri^gmnag e dispositivos com que se escreve a vicdéncia,
promessa de que é possívd fcujar uma posição neutra desde a qual mediar os os íttníttx de sua definição Esses dois processos de controle se implicam
rnwflHng ft ckfpma dAjiistiç^j pmdnridn pÃi mentaltdadp Moderna-Cdonial mutuamoite e dão forma a uma guerra permanente contra as imaginações
rramn <g«i»gma da pnlfria, viga nmitrafear «K conflitosstyàais,administrando virionárias e divergentes — isto é:contra a habilidade de pressentir,no cativeiro,
todas as tensões nolim^de uma rede muito pequena de instituiçdes e mitos «pw aparÂncia ifimidás em que os cativeirosjá não noscomprirnem.
r^presoitados como neutros pelas narrativashegemônicas.Além de uma ficção f-t>M»inr"pftA>r ficções línmfaio tBtaWrantft daà ficções de podofé parte
da pndor^ a wtmtraTtdado dn cigttnwa dftjngtt^ — qiiP tnma truiral fl polttrrampntH um pwvwxn Haww dft rearticulação perante as violências gstêmicas. qne
plausívd O mompóEo da violência-é um mecanismo de alienação dos conflitos, requs úV» trabalho contimiado de retmaginação do nmndo e dasformas de
queisda as pessoas ndes imidicadas dos seus próprios processos de resolução conhecé-lo,e «npUca também tomar-se capaz de conceber resistências e linhas
Afrase'líamos resdverisso najustiça"está,portanto,shiada,uma vezque tiftfitga qiiflstgtm deformando as figmas do poder através do tempo.
«crv>a a fioySn do pndpr dn rfstwna dfljiiiUÍça modgrno-cnlonial,
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CENA4_0 ESTADO MOLECULAR como intrinsecamente viris — é responsávd,mima escala micropditica,pela


O estado,assim como as poiúsas,movem-se com e pdo desejo. Quando o manntan^Sn do medo couio base das experiências trans* dissidente sexual e
movimoito LGBT biasSdro luta pela críminalização da bomofi^úa,àe está feminina para com o mundo.
lutando,no limite, por esse des^.O desejo desa protegido pda pdícia
e neutralizado pélo estado nSo inqKirta a que preça Não se considera,por Acdeti\'a paraibana Eké — Candomblé Smind System',numa de suas
exenqdO)a dimensão radsta estruturante do sistema prisional,cujo maior alvo composições,relata uma experiência que habita o imaginário de bichas,
segue sendo as pessoas pretas e empobrecidas,inclusive aquelas cujas posições sapatonas,travestis e outras criaturas no espectro radical das desobediêndas
de gênao esexualidade podcaiam ser compreendidas no espectro IXSBT.A de gênero e digqdânwafi sexuais quanto à possibilidade de agressão nO espaço
aposta nessas estruturas normathas como fonte de conbarto esegurança para as púÜico.A letra diz:
mmnntHatífMt agrupadas om temo da sigla LfiW é nm sinal ax-idente da falta de
imaginaça» pnKtwa intarspreinnal dessas ativismos,que estão limitados alutar
na interior do projeto de mundo do qual temos sido rriteradamente exchudas. Praça da Alegria

O octattft tftm dimmisões imensas,mas opera através de suas moléculas. Diurante Uma bidm,oito madios
vários anos,parte dl» mc^^ynmitos feminiistas brasileiros lutaram pela Lei Maria Praça da Akgria
da Pmba,que t^fica a viâênda domésticae imj^ementa um tratamento mais
r^oroso para com aqueles que cometem esse tqio de crime.Em 2006,o prcjeto [fina bieka,oito machos
virou leL Em 2013,a taxa de crimes contra nnilberes em espaços domésticos
erajá 12,5% maior que em 2006.Alei não pôde conter a vidência porque Vbharpraeasa
fimniprgii tima sohxção transcendental para um problema imanente.Apesar de
lara i<imi»n<c>f\iwst?tiw»Mtnal, a violãneta contra as mulheres,assim como contra unhapintada
corpos desobedimíes de gênero e disadentes sexuais em geral,está enraizada skart de oncinha
numa pdbíca do desejo que opera aquém daleL For isso,ao diamar a pdícta
para intorvir em situações de vio^da sexista e/ou transfâüdca-bmnofóbica- brinco na orelha
led»16bica-etc,é comum que eles b^am em feivor do agressor, pois o que lápisnoolho
organiza as ações da polida nãoé a maso desejo—que é,nesse caso,desejo
de perpetuação desse sistema que ^rante o direito de gerir e performar a uma bicha,oito machos
victenda não apenas ao estado, mastambém ao bomemdsgênero.

Amasculittidade tóxica como^qeto de poder deve sar abordada em qualquer


discussão sobre a distribuição social da vidênda.Avidênda masculina é uma
1. Ekò - Comiombie Sotmd Svstsm e uma nssso Gnk http3-yAvvvw.youtuba.c0tn/
arma transversal de nonmdização de g^iero e controle sodaL Ela afeta não vvatch7v«cOvRDxBCI'h8&tBature«youtu.
coletiva partsibana qua trstulhs na ntstsoccâo
iqienas mulheres ds e corpos nlEo-beterossexuais e trans*, mas tandtém os Gmra mãntca. pedcmianca o design. ba. o o trabalha da colativa poda aar
préiuios bmmCTmi ci^gênetos que tem de alcançar esses graus ideais de virilidade praduzindo conteúdo critico radical desdo acompanhado otravúa desta púgma no
a fim de cumprir com aquQo que a normalidade def^neto requer. Entretanto, a poaiçfio do bichas protos noidestmaa. A rocobooK Ekú -nttp3y/www.lacabook.oom/
essa distribtd^ âedgual da vidência-que constróicmpos ds-masculinos música opui cdada poda ser encontrada at%C3*A9-2S177767849S06a/?lref»ts.
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Paulada — embora possa \"ir a ser embasada—me parece ao mesmo tempo lançar uma
pedrada cortina de fumaça sobre aquilo que a letra de Eké wa expon a mâchulênaa(um
nompg da tósica)como ficção de poden macho que bate
caco de vidro
em é o mesmo"porque a figura do macho,como ftaiAinenta de normalização
paulada social,garante às posições de homem os^nero o acesso àviolênctalegitima
tgolada
-quejá não deve ser compreendida,aqui,como vidênda legal, mas como
vidência pensável e plaushd dentro do sistema de distribuição davjolêDCia no
pedrada qual estamos metidas.
anpinra,empurra
CENA 5_ PURA VIOLÊNCIA COMO DESIGN GLOBAL
machulênda
madtulência Algumas semanas atrás,havia um vídeo sotdo compartilhado através da
minha rede do Facébodc. Nele, uma travesti sangrava no chão de um ho^tal
público depois de ter sido esfaqueada.Ela estava grilando;"porfevor,não me
Uma hicha,oito machos
deixe morrer agpra." Ningu&n a socorria.Em vez disso,uma outra mulher
(ds)a batia na cara enquanto alguém filmava tudo com inna câmera de vMeo.
repletos de ódio Espancamentos públicos,omissão médica,espetaculanzação das mortes,
contra bichas naturalização da extinção sodal,gmocfdios,processos de exclusão e violência
viadinhos
formam parte davdda diária de muitas pessoas trans*,assim como
oapafntMBjtw'bac e outtas coipas dissidentes sexuais e desobedientes de gênero^
scq>aíonas espedalmente as radalizadas e fflnpobreddas.Tbdas essas formas^violência
e brutaüzação são defato parte de um deagn global,que visa defimr o que
caminhoneiras
significa ser vidento,quem tem o poder para sê-lo,e contra que tipos de corpos
travestis a violência pode ser exerdda sem prejuízo à normalidade sociaL No marco
mulheres trans desse design global,a violência ê gerida para ser mortal para muito.s elucrativa
e/ou prazerosa para uns poucos.No marco desse design^obaL a vidênda
homens trans mmpro iim programa e opera em fevor de um projeto de poder anexado a
mulheres eis heteronormatividade,dssupremada,neocolomahsmo,radsmo,sexismo e
supremacia branca cdno regimes de exceção.
o macho que bate em nósé o mesmo
o macho que bate em nós é o mesmo Da mhdia piépria pospectiva,como uma btdia radaüzada,gorda e não binâria,
oriunda da periforia do Nordeste brasSdro,é inqxssfvd negar oimpacto dessa
distribuição da vidênda como ameaça na minha vida diária.Sinqúesmeníe
Ao oovir essa letra, pode certam^ite objetar que ela reproduz uma an«íar polag fiiag pndft «Ar um Bvento dificil quandosuas roupassão conâdcradas
imagem esseocializada do homem ds,e que isso deve ser proUmnatizado com "«naptr>pria<tag° ft «na pTi*^^>nça nwqria élidacomoofensivaapenaspélomodo
vistas aos avanços dos dol»*eg sn tomo a gênero e sexualidade. Essa critica comovocêageei " -• j—

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