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Estudo de Caso: Comportamento de Recalque Pós-

Tratamento Geotécnico CPR, na Lagoa Rodrigo de Freitas


Eduardo de Oliveira Macedo 1
Engegraut Engenharia e Geotecnia, Rio de Janeiro, Brasil, eduardo@engegraut.com.br

Joaquim Rodrigues 2
Engegraut Engenharia e Geotecnia, Rio de Janeiro, Brasil, joaquim@engegrautcom.br

RESUMO: Este trabalho exibe resultados e análises de dois anos de monitoramento de recalque em
obra de aterro sobre solo mole tratado com a técnica CPR (Consolidação Profunda Radial), na
Lagoa Rodrigo de Freitas, Rio de Janeiro-RJ. Até o ano 2011, antes do tratamento, a baixa elevação
do terreno, causada por recalques por adensamento, fazia com que alagamentos fossem frequentes,
em períodos chuvosos. O processo de adensamento ocorria desde a década de setenta, quando
houve a construção de aterros às margens da Lagoa. Pelo fato da resistência não-drenada (Su)
apresentar valores crescentes com a profundidade, o tratamento geotécnico ocorreu de forma pouco
usual, não atingindo toda espessura da camada mole. Imediatamente após o tratamento, em
janeiro/2012, foram instaladas placas de recalques que são monitoradas ate os dias atuais. Pelo fato
da solução geotécnica ter sido do tipo “flutuante”, mensalmente são mensurados a magnitude e a
velocidade de recalque. Uma estimativa teórica de recalque primário é apresentada, comparando as
curvas recalque x tempo: situações com tratamento e teórica. O objetivo é verificar a eficiência do
tratamento que ocorreu de forma peculiar. Esse estudo apresenta: i) resultados de CPT-U após o
tratamento; ii) breve descrição do tratamento geotécnico; iii) estimativa de recalque teórico; iv)
resultados de placas de recalque.

PALAVRAS-CHAVE: Solo mole, tratamento geotécnico, monitoramento recalque.

1 INTRODUÇÃO Rodrigo de Freitas. Além do monitoramento,


estimativas do recalque teórico são
É comum ocorrer em regiões brasileiras, apresentadas. São apresentados, também,
principalmente litorâneas, formação resultados de 10 placas de recalque,
geológica de depósitos de solos moles, de monitoradas por dois anos, no intuito de
grande profundidade. Estes solos avaliar o desempenho do tratamento CPR.
representam, em muitos casos, desafios a Na elaboração do projeto, o curto prazo
engenharia geotécnica como tentativa de executivo e restrições no orçamento,
impedir ou diminuir recalques. Segundo a associados à resistência não-drenada
NBR 6484, a terminologia muito mole é para crescente com a profundidade, optou-se pela
solos com SPT menor que 2 golpes/30 cm. utilização da solução do tipo “flutuante”,
Para Sandroni (2010), existem ainda os solos tratando-se apenas a metade da profundidade
"extremamente moles" com SPT menor ou do depósito mole. Com esta solução, levatou-
igual a 1 e/ou resistência não-drenada menor se recalques num período de 2 anos, razão
do que 12 kPa. pela qual elevou-se o aterro 40 cm acima do
Este estudo apresenta resultados do greide de projeto.
monitoramento do recalque um tratamento Este estudo apresenta a eficiência do
geotécnico, que teve objetivo de estabilizar tratamento na situação não usual mencionada,
recalques que ocorriam, ao longo de décadas, verificando-se a concordância entre as curvas
em área de lazer às margens da Lagoa recalque-tempo teórica e com o CPR.
2 CONSOLIDAÇÃO PROFUNDA 2.2 Abordagem teórica
RADIAL (CPR)
O CPR Grouting é uma técnica de grouting
2.1 Considerações iniciais específica para reforço de solos moles
argilosos, assim como o Compaction
O CPR tem como objetivo específico Grouting (Baker and Broadrick, 1997) é
melhorar as características geotécnicas, específica para reforçar solos arenosos e o Jet
quanto à rigidez / resistência de solos moles. Grouting (Shroff and Shah, 1999) é formador
A técnica consiste em fazer pré-furos, cravar de colunas de cimento. O Tratamento
geodrenos em malha triangular ou quadrada geotécnico com CPR utiliza expansão de
para, em seguida, executarem-se bulbos de cavidades, com a formação de bulbos de
compressão, com geogrout, via expansão de compressão, associado à geodrenos para
cavidades, com monitoramento automático do induzir excessos de poropressão, de maneira
excesso da poropressão. Os bulbos feitos com controlada, viabilizando o processo de
geogrout, possuem formato geométrico adensamento do solo mole argiloso.
diverso e são confeccionados de baixo para Como critério executivo, ao confeccionar-se
cima, a cada metro de profundidade, com cada bulbo, são monitorados o volume inserido
tensão e deformação controlados. Este e a consequente pressão, na formação de cada
processo induz o adensamento da argila ao bulbo de compressão. Este monitoramento
redor de cada bulbo de compressão. avalia o desempenho do tratamento.
Na execução, ocorre o adensamento radial, O geogrout possui slump entre 8 e 10 cm,
onde o excesso de poropressão, controlado, é em função das características do solo a ser
dissipado pelos geodrenos. tratado.
Consequentemente, aumenta-se a rigidez e
a resistência do solo, ao mesmo tempo em 2.3 Recomendações para uso do CPR
que reduz-se a magnitude e o tempo de
recalque, quando comparada à condição sem A técnica é recomendada para tratamento de
tratamento geotécnico. O solo tratado solos moles argilosos compressíveis, com
enquadra-se na condição de compósito baixo valor de SPT:
híbrido (solo/geogrout) semi-rígido, pouco
deformável. As figuras 1 a 2 mostram a Solo a ser tratado:
sequência do tratamento geotécnico. Argilas compressíveis:
. Es < 3000 kPa - módulo de elasticidade:
. Su < 25 kPa - resistência não-drenada:
. SPT < 10 golpes

Bulbos geogrout:
. 0,5 m < dc< 1.50 m - diam. do bulbo;
. 200.000 < EG < 300.000 kPa - modulo de
Figura 1. Etapa I: cravação de geodrenos. elasticidade do grouting;
. 1,5 MPa < Rc < 3,0 MPa - resistência a
compressão simples.
3 O ESTUDO DE CASO

Às margens da Lagoa Rodrigo de Freitas, na


altura do Parque Cantagalo, o desnível aterro-
lagoa era pequeno, devido ao histórico de
Figura 2. Etapa III: formação de bulbos de compressão, recalques, que causava frequentes
via expansão de cavidades. alagamentos em período chuvoso, como
mostrado na figura 3.
Figura 3.– Alagamento do aterro e rodovia às margens
da Lagoa, no trecho do Corte de Cantagalo, antes do
tratamento, http://memoriaglobo.globo.com (2010).
Figura 5. Corte esquemático do tratamento CPR
Este estudo relata resultados do realizado.
monitoramento do recalque pós tratamento
CPR. No processo executivo utilizou-se Todo o aterro construído até a década de
malha triangular, com espaçamento entre as setenta encontrava-se 90% submerso. A
verticais de tratamento igual a 4m. Sobre o figura 6 mostra, de forma esquemática, a
solo tratado com CPR, lançou-se cerca de 90 profundidade das camadas tratadas e de todo
cm de aterro, sendo 40 cm acima do greide de o depósito mole, com cerca de 20m. Foi
projeto. A figura 4 mostra os equipamentos tratado cerca de 60% do solo mole, sendo a
utilizados no processo CPR. O recalque solução do tipo “flutuante", pouco usual.
estimado, após tratamento, foi 55cm, com
90% de adensamento em 4 anos, mostrado no
item 4.2.

Figura 6. Camadas de solo após tratamento.

Ensaios CPT-U mostram que sob a camada


Figura 4. Equipamentos para execução CPR: Caminhão tratada havia Su crescente com a
betoneira, bomba mecânica para geogrout e perfuratriz. profundidade, como mostra a figura 7.

A figura 5 ilustra o perfil de tratamento


realizado.
Tabela 2. Parâmetros do solo mole antes do tratamento
Parâmetro Valor
hs 20m
CC 1,6
Cv(lab) 1,5E-8m²/s
Cv(campo) 1,6E-7m²/s
Su <15 kPa
ys 14,0 kN/m³
eo 2,65
hs – espessura de solo mole
CC – índice de compressão
Cv(lab) – coeficiente de adensamento vertical
Cv(campo) – coeficiente de adensamento vertical
Figura 7. Perfil Su crescente com a profundidade, obtido Su – resistência não-drenada
por CPT-U, Ensaios COPPE (2012). ys – peso específico do solo mole
eo – índice de vazios do solo mole
A condição de tratamento, não usual,
exigiu monitoramento do recalque para Tabela 3. Parâmetros do solo após tratamento
avaliar a eficiência do tratamento. Foram Parâmetro Valor
hs,pós (sob CPR) 11 m
instaladas dez placas de recalque, como
L 4,0 m
mostra a figura 8. AT 16,0 m²
g 1,20 m
Es 3.000 kPa
Eg 200.000 kPa
Yg 18 kN/m³
Ys 14 kN/m³
Ac = Ag / AT 0,07
yeq = yg x ac + ys x (1-ac) 14,3
yacr = yeq - ys 0,50 (aprox.)
Su(médio), sob CPR 23kPa
hs,pós (sob CPR) – espessura de solo mole sob tratamento
L – distância entre bulbos geogrout
AT – área unitária tratada
Ag – área do bulbo geogrout
g – diâmetro do geogrout
Es – módulo do solo tratado
Figura 8. Pontos de monitoramento de recalque em área Eg - módulo do bulbo geogrout
tratada. ys – peso específico da argila tratada
yg – peso específico do geogrout
yeq – peso específico do solo compósito (tratado),
As características do solo são mostradas EBGEU (2010)
nas tabelas 1 a 3: yacr – acrécimo de peso específico devido ao geogrout

Tabela 1. Camadas de aterro:


Parâmetro Valor 4 RESULTADOS
hat1 0,90m
hat2 0,70m
h’at 5,0m O recalque total foi estimado por dois
h’ar 2,0m métodos: Asaoka (1978) e pela equação
hat1 – espess. de aterro lançada após tratamento clássica de Terzaghi (1948).
hat2 – espess. de aterro existente, acima do NA, pré-
CPR.
4.1 Estimativa de recalque por Asaoka
h’at – espess. de aterro existente submerso
h’ar – espess. de areia existente, submersa, sob aterro
Foi utilizado o método de Asaoka para
estimar o recalque na camada abaixo do solo
tratado com CPR, conforme recomendações
de Almeida e Marques (2010). O recalque
total estimado foi 47,7 cm, mostrado na (2)
figura 9. Onde,
Hd = distância máxima de drenagem
Hd = 0,50hs,pós (sob CPR)
T = fator tempo

A figura 10 mostra as curvas recalque x


tempo teórica e monitorada, com boa
concordância. O recalque estimado é cerca de
55 cm, com 90% de adensamento. O recalque
monitorado, até o presente momento, atingiu
40 cm.
Figura 9. Estimativa de recalque por Asaoka.

4.2 Estimativas de recalque por Terzaghi


e o recalque monitorado

Para estimar o recalque teórico, por


adensamento primário, foi considerado como
sobrecarga:
- aterro existente, com 0,7m de espessura,
acima do N.A.
- 90 cm de espessura de aterro lançado sobre Figura 10. Curvas recalque x tempo: monitorada e
CPR. teórica.
- Acréscimo de carga devido ao CPR: 0,5
kN/m³. A velocidade de recalque também foi
- Parâmetros do solo mole, conforme tabela monitorada. Ao iniciar o tratamento, em
2. dezembro/2011, a velocidade de recalque era
Nota: 2mm/dia. Em fevereiro/2014 reduziu para
O Aterro que submergiu ao longo de décadas 0,19 mm/dia, mostrado na figura 12.
não foi considerado como sobrecarga.
Estima-se que o recalque devido esteja com
percentual de adensamento superior a 85%.

A magnitude do recalque foi estimado pela


expressão (1):

(1)
Onde,
a – tensão de pré adensamento
i – tensão efetiva geostática Figura 11. Velocidade de recalque monitorada.
f – tensão efetiva final com sobrecarga
Cr = 0,1Cc = índice de recompressão
5 ANÁLISE DE RESULTADOS
Para o tempo (t) de recalque foi utilizada a
expressão (2): A Lagoa Rodrigo de Freitas, na altura do
Corte do Cantagalo, teve diversos aterros
desde a década de setenta, de modo a REFERÊNCIAS
atenuar problemas frequentes de
alagamentos. A área tratada com CPR foi de Almeida, M. S. S. e Marques, M. E. S. (2010). Aterros
15.000m². Um percentual de 13% desta área Sobre solos moles – Projeto de Desempenho. Ed.
Oficina de Textos.
foi considerada como crítica, duas pequenas Asaoka, A. (1978). Observation Procedure of
áreas, com maior profundidade de solo Settlement Prediction, Soil and Fundation -
mole. Estas regiões apresentam recalques Japanese Society of Soil Mechanics and Fundation
dentro do previsto, conforme mostrado na Engineering – vol 18.
figura 11. Baker and Broadrick (1997) – Compaction Grouting: A
Twenty Year Update and a Vision for the 21 st
As circunstâncias ou limitações para o Century. ASCE Florida Annual Meeting.
tratamento, citadas no item 1, conduziram DNER - PRO 381. (1998)- Projeto de aterros sabre
para o tratamento do tipo “flutuante”. Os solos moles para obras viárias. Rio de Janeiro:
recalques desenvolvidos sob o CPR DNER.
apresentam boa concordância com as curvas EBGEO (2010)- Recommendation for design and
analysis of Earth structures using geosynthetic
recalque-tempo teórica (projetada). reinforcements.
Verificou-se que 87% da área, considerada Massad, F. (2009). Solos Marinhos da Baixada
não crítica, com espessura de solo mole Santista - Caracteristicas e propriedades
menor que 9,0m, sob o CPR, foi geotécnicas. Ed. São Paulo, Oficina de Textos.
Pinto, C. S. (2000). Curso básico de mecânica dos
estabilizada imediatamente após o
solos. Ed. São Paulo, Oficina de Textos.
tratamento. Sandroni, S. S. (2010). Sobre a prática da engenharia
A previsão do recalque primário total geotécnica com dois solos difíceis: os extremamente
está entre 47 cm e 55 cm. O monitoramento moles e os expansivos. Proc. XV Congresso
mostra que em fevereiro/2014 o Brasileiro de Mecânica dos Solos e Engenharia
Geotécnica, Gramado. pp. 97-187.
adensamento está em sua fase final. Pelo
Terzaghi, K. e Peck, R.B. (1948) Soil Mechanics in
método Asaoka, tem-se 40cm/47cm = 84% Engineering Practice, 2nd ed., McGraw Hill, New
de adensamento; e por Terzaghi há York, NY, USA, 685 p.
40cm/55cm = 72% de adensamento.
Estas duas pequenas áreas apresentam
velocidades decrescentes de recalque com
0,15mm/dia, ou seja, pouco significativas,
conforme curva teórica. Estas velocidades
correspondem a 75% de adensamento,
obtido a curto prazo: 2 anos.
A velocidade de recalque antes do CPR,
que era 2.5 mm/dia, em janeiro/2012, foi
reduzida para 0,15 mm/dia em
fevereiro/2014, atingindo 75% a 80% de
adensamento.
Após dois anos do tratamento, observa-se
que não há qualquer risco de alagamento
nas áreas de lazer, às margens da Lagoa
Rodrigo de Freitas.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos aos colegas de trabalho que


contribuíram para realização desse estudo.

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