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própria coleta dos dados já responde. Em outras pala- presencial, a distância (EAD),2 e virtual;3 e os usos
vras, os aspectos quantitativos sustentam os movimen- específicos, traduzidos em aplicações tópicas, na
tos analíticos que materializam a abordagem da di- medida em que centrados em determinados suportes,
mensão qualitativa do estudo. necessidades ou conteúdos.
Para explicitar o modo de construção do objeto É possível verificar que, em termos de freqüên-
no estudo aqui recortado, é oportuno o registro dos cia, as T&D analisadas tratam especialmente das TIC
seus vários movimentos: levantamento no portal da no ensino. São 186 estudos (64% do total), elabora-
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ní- dos a partir de focalizações que podem ser sintetiza-
vel Superior (CAPES); desenvolvimento de estraté- das na incorporação das TIC: à formação de profes-
gias de acesso aos textos propriamente ditos, sores (FP), nas suas mais variadas configurações:
viabilizado em mais de 90% dos casos; elaboração de inicial e continuada, presencial e a distância, como
resumos ampliados, com base no modelo da Red formação e capacitação; e às práticas desenvolvidas
Latinoamericana de Documentación e Información en nos diferentes espaços pedagógicos, seja na condição
Educación (REDUC), a partir da leitura dos textos; de ferramentas ou instrumentos, seja na perspectiva
discussão dos pontos de entrada no conjunto da pro- do redimensionamento, seja, ainda, em propostas de
dução; e identificação de elementos e de relações virtualização dos processos mesmos, privilegiando a
definidoras das tendências buscadas. aprendizagem por meios eletrônicos.
Os dois últimos movimentos não obedeceram a Em busca dos sentidos atribuídos à presença das
uma seqüência necessariamente linear no processo TIC, abrangendo desde as novas possibilidades agre-
de construção, marcado por idas e vindas, ratifica- gadas às práticas pedagógicas, à reconfiguração des-
ções e retificações. Apenas estão assim sistematiza- sas práticas e do conjunto de reflexões sobre elas, fo-
dos neste artigo visando a favorecer a sua leitura. ram assumidas duas questões inextricavelmente
Com o mesmo objetivo, é importante antecipar que relacionadas: os modos pelos quais as referidas práti-
foram buscados os seguintes elementos: tecnolo- cas são objetivadas nas T&D; e as relações entre edu-
gias privilegiadas; tipos de estudo; contextos de apli- cação e tecnologia que lhes dão sustentação.
cação; modalidades de ensino; abordagens; e refe-
rências bibliográficas. Para tentar dar conta das O recorte
relações entre eles, foram analisados: os focos
constitutivos das produções individualmente consi- Desse conjunto de 186 T&D, recortamos as 88
deradas; as referências teórico-metodológicas espe- (11 teses e 77 dissertações) centradas na incorpora-
cíficas; as palavras-chave como pontos de entrada ção das TIC na/para a formação de professores, cor-
no conjunto da produção; e os cruzamentos dos itens respondentes a 30% do total (289) e quase à metade
anteriores. (47%) dos estudos voltados para a incorporação das
Cabe ainda explicitar que os focos foram estabe- TIC às práticas pedagógicas. O elevado número de
lecidos pela aplicação de critérios sucessivos, sendo T&D acerca da FP, verificável no percentual que re-
o primeiro deles o de amplitude. Nesse primeiro mo- presentam no conjunto dos estudos em que se baseia
mento, foram identificados três blocos de teses e dis- o presente recorte, pode atestar a relevância da temá-
sertações (T&D): as discussões em nível macro, ob- tica privilegiada. Mais ainda, são os sentidos dessa
jetivando as políticas e propostas de inserção das TIC,
subdivididas em concepção de sociedade e paradigma
educacional; as várias inserções das TIC no processo 2
Designando educação a distância e ensino a distância.
de ensino-aprendizagem como um todo (denomina- 3
Em termos gerais, compreendida como aprendizagem por
das TIC no ensino), distribuídas pelas modalidades: meios eletrônicos.
representação que merecem destaque, já que se trata O que foi lido nas teses e dissertações acerca
da formação dos profissionais da educação e já que das tecnologias da informação e da
as T&D, como já foi dito, focalizam as diferentes con- comunicação na formação de professores
figurações dessa formação.
Em se tratando dos sentidos postos em circula- O lugar e as condições do dizer a respeito deste
ção nas/pelas T&D, é importante explicitar que as mapeamento das T&D que tratam das TIC na FP são
buscas assinaladas ao final da seção anterior reme- introduzidos pela sua distribuição ano a ano:
tem a uma dimensão discursiva. O conteúdo das T&D,
compreendido pelas questões nelas encaminhadas, não Gráfico 1 – Distribuição das T&D por ano
deixa de circunscrever um discurso pedagógico: das ç p
30
e sobre as práticas em que as TIC são incorporadas. 29
25
As escolhas lexicais, por exemplo, materializam, na
23
superfície lingüística, os movimentos de configura- 20
4
Datação que também pode explicar, pelo menos em parte,
o pico de 2001, considerando os prazos para a integralização dos
cursos de mestrado e doutorado.
Cabe ainda observar que essa classificação foi de ensino e pela recontextualização redutora das TIC
feita com base nas afirmações constantes das T&D. proposta pelo MEC, ao criar a SEED para dar conta
Somente nos casos em que não havia, por parte dos desse movimento. A distribuição representada anterior-
autores, identificação clara do tipo de estudo empreen- mente parece dar conta da demanda induzida referida,
dido, foi verificada a sua correspondência/pertinên- já que são 52 T&D, em um universo de 88 (cerca de
cia a um dos tipos listados. 60%), centradas nas TIC para a FP a distância. Contu-
do, também parece corroborada a tendência de superar
As referências assumidas nas/pelas T&D a identificação restritiva das TIC à EAD, igualmente
indicada na nova caracterização do PAPED,5 ainda que
Na esmagadora maioria das T&D, predominam a sua denominação original permaneça.
as referências nacionais (91%), suscitando a discus-
são de pelo menos dois aspectos, estreitamente rela- Tabela 1 – Distribuição das
cionados à dispersão caracterizada anteriormente. Por T&D na FP – 1996-2002
um lado, a existência, no Brasil, de expressiva produ-
Focos Ano 19961997 1998 19992000 2001 2002 Total
ção consolidada na área. Por outro, os fatores ligados
TV escola 0 0 0 2 4 4 3 13
à acessibilidade das produções, incluídas aí as possí-
PROINFO 0 0 0 0 2 5 4 11
veis barreiras lingüísticas. Outros
EAD – FP 1 1 2 2 2 5 1 14
As referências bibliográficas mais presentes são: programas
TIC no
Cursos
Lévy, Morin, Schaff, Castells, Piaget, Vygostky, ensino
específicos
1 1 1 2 3 5 1 14
Papert, Babin, Freire, Valente, Kenski, Pretto e Ferramentas 0 0 0 1 0 1 4 6
Presencial Redimen-
Belloni. Como é possível verificar, alguns autores ci- 0 1 1 1 3 6 2 14
sionamento
tados se caracterizam pela abordagem das TIC dentro Virtualização do ensino 1 0 1 0 3 3 8 16
e fora dos contextos educacionais. Outros, sequer Total 3 3 5 8 17 29 23 88
abordam questões relacionadas às TIC, até por im-
possibilidade histórica, como Piaget, Vygostky e Nessa mesma tabela, é possível verificar que, a
Freire. No caso, suas obras são tomadas para a anco- despeito do privilégio atribuído à EAD, está configu-
ragem das TIC na educação, tendo por base as con- rado significativo espaço do ensino presencial e que,
cepções acerca de aprender-ensinar. neste, a tendência aponta no sentido da incorporação
das TIC para o redimensionamento do processo ensi-
As focalizações que caracterizam as T&D no-aprendizagem, sugerindo superação da perspecti-
va tecnicista, centrada na concepção das TIC como
Tomando o conjunto das T&D agrupadas em TIC ferramentas e instrumentos. Nessa distribuição, o foco
no ensino, a partir da aplicação do critério de abran- mais freqüente nas T&D corresponde à incorporação
gência, foram produzidos desdobramentos que, por das TIC para o redimensionamento do processo de
sua vez, resultaram em novos subgrupos, concernen- ensino-aprendizagem, sugerindo, mais do que uma
tes às modalidades de ensino e, finalmente, aos con- simples presença favorecedora da consecução dos
textos de aplicação (EAD) e/ou aos sentidos atribuí- mesmos objetivos, a possibilidade de que sua recon-
dos à inserção das TIC (ensino presencial). textualização instaure diferenças qualitativas no pro-
Da aplicação dos novos critérios, resultou a dis- cesso de formação globalmente considerado.
tribuição ano a ano que constitui a Tabela 1.
As T&D centradas nas TIC na/para a FP eviden-
ciam a ênfase na formação a distância, que pode ser 5
Cf. <http://www.capes.gov.br/capes/portal/conteudo/10/
explicada pelo investimento maciço nessa modalidade PAPED.htm>.
12
Presencial
atualização, qualificação e treinamento, referindo-
9 Virtualização
se a cursos de formação continuada, sejam estes pre-
6
senciais ou a distância. As três primeiras remetem a
3
discussões sobre pressupostos situados na área se-
0
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 mântica da incapacidade; treinamento, por sua vez,
aponta para uma perspectiva restritiva do que seria
A partir da leitura das T&D, foram identificadas a formação.
as características definidoras do chamado ensino vir- Multiplicador, facilitador, tutor e animador são
tual, em um movimento de dupla diferenciação: (1) termos que substituem professor, redefinindo suas
da EAD pela (ao menos suposta) ruptura com a lógi- funções em perspectiva igualmente restritiva, nesse
ca distributivista; e (2) do ensino presencial pelo contexto em que a expressão trabalho docente tam-
modus operandi, tanto no que concerne à mediação bém cede lugar a tarefas e atividades docentes. Nes-
do professor, quanto aos ambientes em que pode ser ses termos, o que as formulações acerca das TIC na
desenvolvida. EAD tendem a sugerir é uma espécie de facilitação
Para chegar a essa definição, foram analisadas dos processos “formativos”.
as palavras-chave na/da leitura das T&D. No que se refere aos produtos, a palavra compe-
tência, ainda que menos freqüente, aparece como cha-
As palavras-chave na/da leitura das T&D ve importante, tendo em vista que presente como:
noção, por vezes com a reivindicação do estatuto de
No que diz respeito às palavras-chave, é preciso conceito; princípio de organização curricular; e me-
esclarecer que, do ponto de vista analítico adotado, canismo para a certificação.
não se restringem às definidas pelos autores e regis- O desenvolvimento de competências e habilida-
tradas no banco de dados da CAPES, mas incluem des está diretamente ligado a outras palavras-chave
expressões que podem esclarecer as tendências a se- presentes nas T&D: os meios e os recursos. As tecno-
rem analisadas, com base nas leituras que sustenta- logias interativas são apontadas como responsáveis
ram a produção dos resumos analíticos. por mudanças estruturais na FP. Dentre os meios e
recursos, são destacados: o rádio, a televisão, o vídeo duas tendências diretamente ligadas às modalidades
e, principalmente, o computador. Neste, merecem des- de ensino e aos contextos de aplicação das TIC: o
taque: chat, correio eletrônico, hipermídia/hipertexto, privilégio da abordagem da formação de professo-
home page, Internet, lista de discussão e videoconfe- res por meio da EAD; e a proposta da virtualização
rência, trabalhados como métodos de instrução, apoio do ensino, como movimento expresso pelas propos-
e suporte às tarefas docentes. tas verificadas na construção dos objetos de estudo
É possível observar a ausência de referências às ou, ainda, nas conclusões e recomendações dos tra-
tecnologias há muito apropriadas pela escola, a ponto balhos.
de serem ditas “educacionais”, mesmo quando as T&D
se reportam ao ensino presencial. Parece que estas A abordagem da EAD
foram simplesmente descartadas, apagadas e substi-
tuídas pela informática, pelos multimeios e pelas no- No que se refere à tendência de focalizar a FP a
vas mídias, em nome da atratividade e da interativi- distância, que soma mais da metade (55 em 88) das
dade. Em geral, as chamadas novas tecnologias são T&D, a consideração inicial é a sua vinculação à pro-
associadas a mudanças estruturais e, ao mesmo tem- posta do MEC para a incorporação das TIC, explici-
po, desvinculadas das condições materiais dos con- tada na seção anterior. A partir daí, é preciso interro-
textos educacionais, mesmo quando a EAD é defen- gar a EAD de que tratam as T&D.
dida como única alternativa de acesso às TIC. Retomando a Tabela 1, é possível verificar que
O acesso, a inserção, a implantação e, mais ra- os estudos estão centrados em programas com a chan-
ramente, a apropriação das TIC estão postos no sen- cela ministerial (TV Escola e PROINFO), em progra-
tido de inovar/modernizar os processos educacionais, mas outros, sejam eles mais ou menos relacionados
em geral, e os de formação docente, em particular. aos primeiros, e, ainda, em cursos específicos. Se esse
Na maioria das vezes, o acesso às TIC é a tônica as- é, por assim dizer, o conteúdo das T&D que tratam da
sumida nas T&D, sem o questionamento dos modos EAD na formação de professores, é preciso investi-
e dos sentidos do acesso. gar a contextualização desses programas e cursos nes-
As redes são uma metáfora-chave, especialmen- se processo.
te na abordagem das produções relacionadas à Algumas das T&D localizam programas e cur-
virtualização do ensino, na medida em que sustentam sos na formação inicial dos professores, como de-
as concepções de colaboração e cooperação, ultrapas- monstra o Gráfico 5:
sando projetos elaborados por especialistas e distri-
buídos em broadcasting (Pretto, 2002). Gráfico 5 – Relação entre modalidades
Finalmente, ambientes de aprendizagem estão de ensino e formação inicial
referidos a: laboratório de informática, laboratório de
EAD, espaço virtual, ambiente web, comunidade vir- 5
1
Uma análise de tendências
0
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
A leitura das T&D defendidas no período recor- EAD Presencial Virtualização
tado (1996-2002) permitiu identificar pelo menos
Já a grande maioria se refere ao contexto da for- cial. Em ambos os casos, sugerem que a EAD inclua
mação continuada:6 momentos presenciais.
As T&D voltadas para a EAD contemplam a aná-
Gráfico 6 – Relação entre modalidades lise de programas, mas empreendem movimentos di-
de ensino e formação continuada versos. Algumas objetivam os programas em si, des-
tacando aspectos relativos à sua concepção, incluindo
18 seus pressupostos, ao modus operandi projetado, aos
15 materiais que os sustentam etc. Outras incluem dis-
12
cussões relativas a lacunas entre o discurso moderni-
9
6 zador que justifica esses programas e a ausência de
3 condições objetivas que favoreçam a sua implemen-
0
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002
tação. Todas incluem críticas mais ou menos siste-
máticas aos programas analisados, distinguindo-se
EAD Presencial Virtualização
pela presença ou ausência de sugestões de reformula-
ção. Dito de outro modo, as T&D inscritas nessa li-
Neste ponto, vale lembrar que podem ser levan- nha tendem a enfatizar as contribuições dos progra-
tadas algumas objeções à caracterização de progra- mas de EAD para a “capacitação” de professores,
mas como o TV Escola e o PROINFO como sendo de ainda que sugiram a reformulação dos aspectos “frá-
EAD. No entanto, as T&D não as assumem. Algumas geis” detectados.
até as registram, mas seguem na direção da sua análi- É digno de nota, ainda, o movimento de funda-
se como EAD. mentar a FP, inicial ou continuada, em competências,
Assim, é importante caracterizar as trajetórias na condição de princípio de organização e critério de
empreendidas nas T&D centradas na EAD para a FP, avaliação. Em outras palavras, as T&D tendem a pen-
compreendendo pressupostos, abordagens e conclu- sar as TIC na EAD com base nas competências e habi-
sões e recomendações. Nesse sentido, é possível lidades que, somadas, apontam para (em alguns casos
mapear duas trajetórias que, no limite, demarcam pó- a idéia é a de que “garantem”) o desempenho docente
los opostos, sem deixar de reconhecer a existência de projetado.
nuanças no entremeio. A trajetória oposta parte do pressuposto de que a
A primeira dessas trajetórias parte do pressupos- EAD reduz a FP à capacitação, qualificação, atualiza-
to de que a EAD, desde que tecnicamente bem elabo- ção e ao treinamento, sendo, portanto, insatisfatória.
rada, pode sustentar o desenvolvimento de “progra- As T&D aí agrupadas, em número inferior às da traje-
mas de capacitação” economicamente mais viáveis tória anterior, tendem a apresentar argumentos políti-
do que os presenciais, permitindo o crescimento cos em nível macro, como a concepção dos programas
exponencial do número de formados, capacitados, de EAD no contexto de uma proposta de “globaliza-
qualificados, atualizados e/ou treinados. Nessa linha, ção” excludente e do atendimento às exigências do
os trabalhos geralmente concluem ou sugerem que a mercado. As conclusões que apresentam dizem respei-
EAD seja uma alternativa metodológica viável para a to ao fato de que, ante as múltiplas dimensões da FP
formação continuada e, em menor escala, para a ini- (seja inicial ou continuada), não há como reduzi-la à
EAD, explicitando que o alvo deve ser a formação pro-
priamente dita, não reduzida a uma capacitação que,
6
É de se esperar que pesquisas futuras indiquem mudança por sua vez, signifique apenas certificação.
neste quadro, considerando a atual política de disseminação da As T&D aí agrupadas sugerem maior investimen-
formação inicial a distância. to na formação inicial, destacando a qualidade impli-
cada no conceito mesmo de formação e apontando no gências que sustentaram a proposta de caracterização
sentido da superação da razão instrumental, tecnicista, e a sua denominação.
no trabalho com as TIC. Tendem a concluir pela ne- A primeira convergência diz respeito à afirma-
cessidade de fortalecimento da dimensão didático- ção do distanciamento da escola em relação às de-
pedagógica da formação, de modo que favoreça uma mais práticas sociais e à necessidade de buscar alter-
postura crítica e consciente diante das TIC, visando, nativas de aproximação. A partir desse ponto, fica
em última análise, à sua apropriação e ao conseqüen- configurada uma divergência nas T&D. Enquanto um
te redimensionamento do trabalho docente. Indicam grupo propõe a incorporação das TIC às práticas pe-
a possibilidade de diminuir o descompasso tempo/ dagógicas desenvolvidas na escola visando à possibi-
espaço entre as práticas sociais e escolares, apontan- lidade de mudanças significativas, outro grupo põe
do em direção oposta à substituição tecnológica. em xeque essa possibilidade, argumentando que es-
As recomendações presentes nesse conjunto de sas mudanças encontrariam obstáculos no sistema
T&D podem ser sintetizadas na promoção das condi- regular, representados por questões de ordem para-
ções objetivas para a apropriação visada, com base digmática e por resistências diversas.
em duas críticas: à ausência de recursos alocados na Ambos os grupos tendem a abordar questões re-
formação inicial presencial, impedindo que os pro- lativas à presença das resistências, mas o fazem par-
fessores formados tenham uma história de apropria- tindo de concepções diferentes e assumem encami-
ção das TIC e, em alguns casos, sequer de acesso a nhamentos diversos. Um primeiro grupo, reunido em
elas; e às simplificações que têm marcado a forma- torno da proposta de redimensionamento do ensino
ção a distância, quer inicial, quer continuada, em que presencial, argumenta que resistências às TIC não
a presença das TIC pode ser valorizada como um fim podem ser dissociadas do fato de que estas têm sido
em si mesma, desconsiderando os modos de acesso impostas como soluções verticais que não levam em
viabilizado. Em suma, enquanto alguns podem não consideração as condições, a complexidade, o coti-
ter sequer acesso às TIC, outros podem tê-lo em con- diano, a experiência, os saberes dos professores e alu-
dições bastante restritivas, obstaculizando o redimen- nos, a cultura da escola. Assim, esse grupo tende a
sionamento do trabalho realizado com elas. propor que as condições concretas dos contextos de
utilização das TIC sustentem todos os encaminhamen-
As relações entre ensino presencial e virtual tos nesse sentido, também como alternativa para evi-
tar que as inovações sejam encerradas em práticas
Também é importante focalizar outra tendência antigas, em movimentos de modernização conserva-
relacionada às modalidades de ensino, apontada na Fi- dora e de mistificação tecnológica. Assume o contex-
gura 4. Como é possível verificar, no final do período to escolar como locus da apropriação das TIC, e re-
contemplado por esta investigação os estudos sobre a presenta mais de 20% das produções analisadas.
EAD apresentam acentuado decréscimo, maior, inclu- Um segundo grupo, reunido em torno do ques-
sive, do que os referentes ao ensino presencial. Enquan- tionamento da possibilidade referida, argumenta que
to isso, apenas os relativos à virtualização são repre- as TIC não podem produzir mudanças significativas
sentados por curva ascendente. na educação regular, ante a orientação “instrucionista”
Portanto, a sistematização dos encaminhamen- da escola. Nesse sentido, afirma que as TIC são in-
tos concernentes às modalidades de ensino deve in- corporadas apenas como ferramentas, pois a escola,
cluir a reflexão acerca das relações entre o ensino como instituição, não dá conta dos novos regimes
presencial e o aqui chamado ensino virtual ou em pro- cognitivos, ainda que alguns avanços possam ser ob-
cesso de virtualização. Para desenvolver esta refle- servados, como a substituição da lógica cartesiana
xão, é preciso assinalar as convergências e as diver- do conhecimento em árvore pela lógica do conheci-
mento em rede. Em outras palavras, as TIC são pen- destinação expressa nas políticas oficiais,7 e também
sadas como possibilidades de ruptura que, no entan- como demanda induzida de estudos acerca da moda-
to, não “cabem” nos limites da escola instituída. Daí lidade a distância. No outro extremo está a produção
a sua localização em ambientes de aprendizagem ex- de alternativas cada vez mais plurais e sofisticadas,
tra-escolares, em diferentes propostas de educação para múltiplos fins. Entre as fronteiras, está o ensino
on-line que, somadas, chegam quase a 20% das T&D presencial, não apenas contando com novas ferramen-
recortadas. tas ou instrumentos para a realização de seqüências
Na tentativa de sistematizar as duas tendênci- de ensino-aprendizagem, mas com possibilidades de
as, é possível afirmar que a referida ao ensino redimensionamento do processo.
presencial propõe: o redimensionamento do ensino A demarcação, por sua vez, suscita questões con-
presencial, sem mencionar outro lugar ou modalida- cernentes às relações entre as modalidades de ensino
de que extrapole as instituições educativas regula- focalizadas, aos possíveis limites entre elas. Longe
res; o investimento na interação professor-aluno, seja de serem simples, esses limites são tornados mais com-
na perspectiva afetiva, seja na do compartilhamento plexos pela possibilidade de utilização de critérios di-
da objetividade social; e o fortalecimento do binômio versos. Em uma tentativa de síntese, é importante su-
ensino-aprendizagem. Em contrapartida, a tendên- blinhar critérios derivados: dos meios utilizados e dos
cia à virtualização aponta para: o deslocamento da fins da sua utilização, nas suas relações com os dis-
dimensão presencial para a virtual; uma nova rela- cursos sobre as modalidades de ensino.
ção educativa na comunidade virtual, estabelecida Portanto, esta conclusão é marcada pela retoma-
de “modo espontâneo”, rompendo com a assimetria da das relações entre as modalidades. As referentes a
presente na escola; e a quebra do binômio ensino- ensino presencial e virtual foram, à semelhança da
aprendizagem, privilegiando apenas o segundo ele- tipificação ensino presencial e a distância, assumidas
mento do par, pensado como “auto-aprendizagem”. a partir do locus da utilização. Ambiente foi a pala-
Finalmente, é possível dimensionar as diferen- vra-chave aqui assumida como definidora das pro-
ças entre as tendências por meio do deslocamento postas de virtualização do ensino, na medida da
de um mote conhecido: de não se aprende somente extrapolação do espaço físico da sala de aula e da
na escola para não se aprende na escola. Pelo me- escola, e, nesses termos, uma objeção pode ser feita.
nos não da maneira que é possível aprender fora dela, Ela refere-se ao fato de que, também na medida da
através das TIC. O que implica reconhecer que as ruptura com o espaço de lugares, em direção ao de
T&D voltadas para a proposição do ensino virtual fluxos, o ensino virtual poderia, não só mas também,
assumem uma relação peculiar entre educação e tec- ser localizado na escola. Entretanto, as T&D que pro-
nologias, que não passa exatamente pela recontex- põem a virtualização reivindicam uma outra “distân-
tualização das últimas, mas pela reconfiguração da cia” da escola: a dos padrões assimétricos de interação.
primeira. Em outras palavras, não é apenas uma questão de lu-
gar e de meios, mas de outro fim, sustentado por ou-
Da formação de professores a tra concepção de educação, centrada na “auto-apren-
distância às propostas de e-learning dizagem”.
A expressão referida parece remeter a uma espé-
Essa representação do território que compreen- cie de negação do ensino, em atitude coerente com a
de a incorporação educacional das TIC tem algumas proposta globalmente considerada. Afinal, trata-se de
fronteiras demarcáveis. Em um dos extremos, está a
alternativa produzida nos anos de 1990: a que res- 7
Cf. Plano Nacional de Educação. Disponível em: <http://
tringe as TIC a estratégias de EAD para a FP, como portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/pne.pdf>. Acesso em: 28 out. 2005.
proposta de ruptura com os padrões criticados na es- indiferenciação parece promover a necessidade da ad-
cola, da possibilidade de contar com novos dispositi- jetivação cada vez mais constante dos substantivos
vos pedagógicos, da criação de redes comunicacio- da área educacional.
nais de colaboração e cooperação, como forma de É importante verificar que a história recente da
viabilizar novas práticas. Trata-se, em outras palavras, adjetivação dos substantivos relacionados ao ensino
de paradigma educacional emergente, constituído a (presencial, a distância e virtual) parece ter sido leva-
partir da tecnologia informática como propiciadora da ao limite, até que superada pela sua supressão, em
de novos regimes cognitivos, apontando para múlti- nome da aprendizagem. Extrapolando o espaço da
plas possibilidades de aprendizagem, muitas das quais escola, em direção a novos ambientes de aprendiza-
baseadas em movimentos espontâneos que parecem gem, acaba-se por adjetivar a educação mesma: aca-
não caber no ensino, ante a intencionalidade e, por dêmica e corporativa.
conseguinte, a assimetria que o constituem. Vale destacar que toda essa modalização discur-
Quanto aos limites entre ensino virtual e ensino siva, considerando seus pressupostos e implícitos,
a distância, até podem parecer resolvidos, na medida torna cada vez mais complexa a tarefa de organizar a
em que o segundo tende a ser mais formalizado, des- produção acerca das TIC na FP. Ainda que haja ten-
tituído de caráter espontaneísta, associado a progra- dências, aproximações e distanciamentos detectáveis,
mas de estudo a serem cumpridos com disciplina, o que está em jogo são concepções diferentes de so-
perseverança e atributos afins, além de englobar pro- ciedade e de educação, paradigmas distintos, modos
gramas oficiais, alguns deles concebidos e implemen- diversos de objetivação, propostas pedagógicas
tados na esfera ministerial. Mas esses limites tornam- díspares, modalidades variadas, contextos de aplica-
se mais tênues por conta da crescente sofisticação ção específicos.
tecnológica e da sua configuração discursiva. Finalmente, a perspectiva assumida neste mapea-
Do ponto de vista discursivo, uma expressão tem mento, expressa pelo subtítulo “O que foi lido nas te-
promovido o apagamento das fronteiras aparentemen- ses e dissertações acerca das tecnologias da informa-
te nítidas: e-learning, como uma forma de aprendiza- ção e da comunicação na formação de professores”,
gem em que a mediação tecnológica é destacada. Em implica uma indagação: Que outras leituras poderiam
português, tem sido traduzida como “educação a dis- ser feitas? É uma pergunta que, ficando sem resposta,
tância via Internet” e, de novo, provoca a necessida- traz consigo um convite a outras cartografias.
de de distinguir os dois critérios em jogo: os meios
utilizados e os fins da sua utilização.
Na aplicação do critério definido a partir dos Referências bibliográficas
meios, EAD e e-learning podem-se tocar e vazar para
o entorno de uma configuração “neotecnicista”, atra- ANDRÉ, Marli E. D. Afonso de (Org.). Formação de professores
vés da articulação do que há de mais avançado nas no Brasil (1990-1998). Brasília: MEC/INEP/COMPED, 2002 (Sé-
TIC disponíveis no mercado aos preceitos dos anos rie Estado do Conhecimento, 6). Disponível em: <http://
de 1970: o privilégio dos meios em detrimento das www.inep.gov.br/download/cibec/2002/estado_do_conhecimento/
mediações, o corte dos custos, a organização a partir formacao_de professores.pdf>. Acesso em: 28 out. 2005.
das competências estabelecidas, a corrida para a atua-
BARRETO, Raquel G. Formação de professores, tecnologias e
lização constante do conhecimento, os pacotes de
linguagens: mapeando velhos e novos (des)encontros. São Paulo:
aprendizagem etc. São movimentos presentes em do-
Loyola, 2002.
cumentos oficiais e nos discursos de organismos in-
ternacionais, como a Organização Mundial do Comér- BERNSTEIN, Basil. The structuring of pedagogic discourse –
cio (OMC). Diante de possibilidades como essa, uma class, codes and control. London/New York: Routledge, 1990. v. 4.
FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Tradução discursos em confronto (4. ed. São Paulo: Cortez, 2003); TV na
Izabel Magalhães. Brasília: Editora da UnB, 2001. escola (In: BARRETO, R. G. (Org.). Tecnologias educacionais e
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FONSECA, Marília. O Banco Mundial como referência para a
Janeiro: Quartet, 2003. p. 161-177); Textos contemporâneos da
justiça social no Terceiro Mundo: evidências do caso brasileiro.
educação: a produção dos sentidos na articulação de linguagens
Revista da Faculdade de Educação, São Paulo, v. 24, n. 1, p. 37-
(In: ALVES, N.; OLIVEIRA, I. B.; BARRETO, R. G. (Orgs.). Pes-
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quisa em educação: métodos, temas e linguagens. Rio de Janeiro:
OLIVEIRA, Maria Rita Neto Sales. Do mito da tecnologia ao pa-
DP&A, 2005. p. 51-62). E-mail: gl.guimaraes@uol.com.br
radigma tecnológico; a mediação tecnológica nas práticas didáti-
co-pedagógicas. Revista Brasileira de Educação, Campinas: Au-
LIGIA KARAM CORRÊA DE MAGALHÃES, mestre em
tores Associados; Rio de Janeiro: ANPEd, n. 18, p. 101-107, set./
educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e douto-
dez. 2001.
randa em educação na Universidade do Estado do Rio de Janeiro
PRETTO, Nelson. Formação de professores exige rede. Revista
(UERJ), integra o grupo de pesquisa Educação e Comunicação,
Brasileira de Educação, n. 20, p. 121-131, maio/ago. 2002.
no qual desenvolve atualmente a pesquisa: “As tecnologias da in-
formação e da comunicação nas políticas de formação de profes-
RAQUEL GOULART BARRETO, doutora em educação pela sores: os sentidos da reconfiguração de trabalho-formação docen-
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), é professora da te”. Últimas publicações: Programa TV Escola: o dito e o visto
Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Ja- (In: BARRETO, R. G. (Org.). Tecnologias educacionais e educa-
neiro (UERJ). Coordena o grupo de pesquisa Educação e Comuni- ção a distância: avaliando políticas e práticas. 2. ed. Rio de Janei-
cação, no qual está realizando a pesquisa: “As tecnologias da infor- ro: Quartet, 2003. p. 105-119); e em parceria com Raquel Goulart
mação e da comunicação nas políticas de formação de professores: Barreto, Modos de incorporação das múltiplas linguagens na for-
os sentidos da reconfiguração de trabalho-formação docente”, fi- mação de professores (In: ALVES, N.; OLIVEIRA, I. B.;
nanciada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e BARRETO, R. G. (Orgs.). Pesquisa em educação: métodos, te-
Tecnológico (CNPq). Publicou recentemente: Formação de profes- mas e linguagens. Rio de Janeiro: DP&A, 2005. p. 131-141). E-
sores, tecnologias e linguagens: mapeando velhos e novos mail: ligiakaram@gmail.com
(des)encontros (São Paulo: Loyola, 2002); Tecnologias educacio-
nais e educação a distância: avaliando políticas e práticas (2. ed.
ELIZABETH MENEZES TEIXEIRA LEHER, doutora em
Rio de Janeiro: Quartet, 2003); Tecnologia e educação: trabalho e
educação pela Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora do
formação docente (Educação e Sociedade, n. 89, p. 1.181-1.201,
Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, da Universidade
set./dez. 2004); organização em parceira com Nilda Alves e Inês B.
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), integra o grupo de pesquisa Edu-
de Oliveira, Pesquisa em educação: métodos, temas e linguagens
cação e Comunicação. Pesquisa em desenvolvimento: “As tecnolo-
(Rio de Janeiro: DP&A, 2005). E-mail: raquel@uol.com.br
gias da informação e da comunicação nas políticas de formação de
professores: os sentidos da reconfiguração de trabalho-formação
GLAUCIA CAMPOS GUIMARÃES, mestre em educação docente”. Últimas publicações: em parceria com Raquel Goulart
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutoranda Barreto, Imagens das tecnologias: a questão do sentido hegemôni-
em educação na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), co (In: ALVES, N.; OLIVEIRA, I. B.; BARRETO, R. G. (Orgs.).
é professora assistente da UERJ, atuando na Faculdade de Forma- Pesquisa em educação: métodos, temas e linguagens. Rio de Janei-
ção de Professores, em São Gonçalo. Integra o grupo de pesquisa ro: DP&A, 2005. p. 13-22). E-mail: eleher@uol.com.br
Educação e Comunicação, no qual participa atualmente da pes-
quisa “As tecnologias da informação e da comunicação nas políti-
cas de formação de professores: os sentidos da reconfiguração de Recebido em setembro de 2005
trabalho-formação docente”. Últimas publicações: TV e escola: Aprovado em dezembro de 2005