Você está na página 1de 22

IMPLICAÇÕES GEO-ECONÓMICAS DA GUERRA

DA UCRÂNIA NA POSIÇÃO DA CHINA *

GEO-ECONOMIC IMPLICATIONS OF THE UKRAINE WAR


ON CHINA’S POSITION

Pedro Borges Graça


ISCSP-Universidade de Lisboa
Orcid: 0000-0001-7387-2131
pbgraca@gmail.com

DOI: https://doi.org/10.34628/8efe-t111
Data de submissão / Submission date: 12/04/2022
Data de aprovação / Acceptance date: 05/09/2022

* (07JUL22) Conferência “The Challenges of Asia in the Near Future and the Cooperation with
Portugal”, organizada pela Ordem dos Economistas no Grémio Literário em Lisboa.

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 133

REE_32.indd 133 21/10/2022 10:22:45


REE_32.indd 134 21/10/2022 10:22:45
Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

Resumo: A China, logo desde o início da Guerra, recusou-se a condenar


sem reservas a invasão da Ucrânia. A principal implicação geoeconómica é pois
a aproximação efectiva da Rússia à China, em detrimento da União Europeia e
de países como a Alemanha e a França, e consequentemente a estruturação pro-
gressiva de um eixo ou aliança estratégica baseada em entendimentos e parcerias
prévias como os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e o chamado
Grupo de Shangai (China, Cazaquistão, Índia, Paquistão, Quirguistão, Rússia,
Tajiquistão, Uzbequistão e muito recentemente o Irão).
Iremos portanto assistir a curto prazo a uma recomposição das áreas geoe-
conómicas correspondentes aos dois blocos político-militares (Nato e Grupo de
Shangai) que agora estão em processo de consolidação como consequência da
Guerra da Ucrânia e a que correspondem duas mundovisões antagónicas e res-
pectivos valores – a da Democracia e a da Ditadura Pós-Moderna – e portanto
dois modelos político-económicos a serem apresentados como opção de Desen-
volvimento aos restantes países do sistema internacional, principalmente aos
africanos e asiáticos.
A competitividade poderá vir a ser mais agressiva, raiando a conflitualida-
de não-armada com o aumento das acções de espionagem económica e tecno-
lógica e de ciberataques, a que corresponderá a procura intensa de soluções de
segurança da informação. Face à incerteza crescente, é vital o desenvolvimento
de uma análise estratégica dinâmica para se acompanhar a evolução desta con-
juntura tão volátil que requer correcções constantes às estratégias e correlativos
planeamentos.
Palavras-chave: Incerteza crescente; Aliança sino-russa; Análise estratégica
dinâmica.

Abstract: China, from the very beginning of the war, refused to unreser-
vedly condemn the invasion of Ukraine. The main geoeconomic implication is
therefore the effective rapprochement between Russia and China, to the detri-
ment of the European Union and countries such as Germany and France, and
consequently the progressive structuring of a strategic axis or alliance based on
previous understandings and partnerships such as the BRICS ( Brazil, Russia,
India, China and South Africa) and the so-called Shanghai Group (China, Ka-
zakhstan, India, Pakistan, Kyrgyzstan, Russia, Tajikistan, Uzbekistan and very
recently Iran).
We will therefore witness a recomposition of the geo-economic areas cor-

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 135

REE_32.indd 135 21/10/2022 10:22:45


Pedro Borges Graça

responding to the two political-military blocs (Nato and the Shanghai Group)
that are now in the process of consolidation as a result of the Ukrainian War and
which correspond to two antagonistic worldviews and respective values – that of
Democracy and that of the Post-Modern Dictatorship – and therefore two politi-
cal-economic models to be presented as a Development option to the remaining
countries of the international system, mainly to Africans and Asians.
Competitiveness may become more aggressive, bordering on unarmed con-
flict with the increase in economic and technological espionage and cyberattacks,
which will correspond to the intense demand for information security solutions.
Faced with growing uncertainty, it is vital to develop a dynamic strategic analy-
sis to monitor the evolution of this highly volatile environment that requires
constant corrections to strategies and related planning.
Keywords: Growing uncertainty; Sino-russian alliance; Dynamic strategic
analysis.

136 Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022)

REE_32.indd 136 21/10/2022 10:22:45


Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

A abordagem geopolítica

A compreensão da posição actual da China no ambiente internacional não é


possível sem um claro entendimento prévio, independente e objectivo das causas da
Guerra da Ucrânia, a qual representa o mais recente e turbulento marco de mudança
da conjuntura global, na História do Presente, na sequência do 11 de Setembro em
2001, da invasão do Iraque em 2003 e correlativa crise de 2008, e da irrupção da pan-
demia do COVID em 2020.
O conceito de risco geopolítico tem vindo assim a ganhar relevo na análise do
ambiente internacional, visando-se compreender a incerteza crescente e antecipar
a frente de potenciais factores disruptores da regularidade das relações políticas e
económicas, uma vez que está em curso uma mudança profunda no sistema interna-
cional com inevitáveis consequências nacionais.
A abordagem geopolítica, isto é, a análise da política pensada e executada sob
os condicionalismos da geografia e do acesso aos recursos, é pois imprescindível
para se captar a dinâmica da evolução da conjuntura e correlativas dimensões econó-
mica e militar, ou seja, geoeconómica e geoestratégica. Na verdade estamos perante
uma dinâmica triangular da realidade social, estrutural do ponto de vista antropos-
sociológico, que integra a gestão da segurança das nações e correspondentes espa-
ços e recursos. Na hierarquia de potências correspondente à estrutura das relações
internacionais, as fronteiras económicas dos mais fortes projectam-se para além das
suas fronteiras físicas em detrimento dos que têm menos força, menos poder militar.

Complexidade crescente, tempo tríbio e anglobalização

A análise objectiva requer pois um distanciamento inequívoco da ideologia e


da emotividade, em busca e aquisição de conhecimento que sobreponha precisa-
mente a objectividade à subjectividade na medida máxima possível. E para reforçar
essa objectividade são necessárias duas outras condições prévias de aquisição de co-
nhecimento, particularmente do ambiente internacional:
Uma é o entendimento de que existe uma lei da complexidade crescente da vida
internacional que caracteriza a globalização e a realidade tendencialmente inquantifi-
cável das relações sociais envolvendo indivíduos, grupos e instituições.1 A Globali-

1
(1996) Adriano Moreira, Teoria das Relações Internacionais, Livraria Almedina.

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 137

REE_32.indd 137 21/10/2022 10:22:45


Pedro Borges Graça

zação, a que o britânico Niall Ferguson prefere chamar Anglobalização, tem como
causa mais afastada os descobrimentos portugueses e como causa mais próxima
o sistema político e económico e de segurança com que os ingleses estruturaram
o mundo contemporâneo desde o século XVIII, renovado com a cooperação e
liderança dos americanos no século XX após a 2ª Grande Guerra civil europeia,
mundial pelos seus efeitos e alianças.2 A multiplicação de centros de decisão após
esta guerra intensificou essa complexidade na medida em que, pela interdepen-
dência, os problemas e preocupações internacionais acontecem em tempo acele-
rado e as respostas aos desafios processam-se em tempo demorado, principal-
mente com planos de contingência desenhados pelos actores principais e pelas
organizações e directórios, como o G7 por exemplo, mas muito frequentemente
com reduzida capacidade prospectiva quanto aos efeitos das soluções aplicadas e
às incertezas que estas por suas vez desencadeiam, levando por regra à adopção
de novos planos de contingência num círculo vicioso que promove a incerteza
crescente.
A outra condição prévia à aquisição de conhecimento sobre o ambiente in-
ternacional é a noção epistemológica de Tempo Tríbio.3 Este conceito permite-nos
compreender que Passado, Presente e Futuro são um só tempo integrado, e que
indivíduos, grupos e instituições são o que são no presente em função não só das
circunstâncias, e das respostas aos desafios, mas também do que têm sido desde
o passado e do que estão a projectar ser no futuro. Portanto, uma Nação no Presente
lida com as circunstâncias e desafios em função do Passado vivido até esse momento e do
Futuro que está a projectar. É pois necessário não perder de vista a realidade deste
mundo globalizado ou anglobalizado em que os interesses nacionais ainda se
sobrepõem claramente aos interesses internacionais.
Estas já longas considerações prévias metodológicas são essenciais para se
contornar a intensa propaganda que caracteriza a Guerra da Ucrânia e assim
aproximarmo-nos do conhecimento dos riscos geopolíticos que esta está a fo-
mentar.

As causas da guerra na ucrânia

O soundbite da intelligence anglo-americana de que a Guerra levada pela Rús-


sia à Ucrânia é ilegal e não provocada não corresponde inteiramente à realidade.
Não há dúvida de que a invasão da Ucrânia é ilegal mas não corresponde à ver-
dade histórica dizer que é “não provocada”. Desde logo o verbo provocar neste
contexto tem um cunho propagandístico próprio do meio da intelligence – recor-
de-se a figura do “agent provocateur” – emprestando-lhe uma tonalidade emotiva

2
(2004) Niall Ferguson, Empire: How Britain Made the Modern World, Penguin Books.
3
(2010) Pedro Borges Graça, Mundo Secreto: História do Presente e Intelligence nas Relações
Internacionais, Instituto de Informações e Segurança de Angola.

138 Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022)

REE_32.indd 138 21/10/2022 10:22:45


Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

característica da semântica para mobilizar hearts and minds. O verbo causar é antes
objectivamente o mais adequado à análise da situação, seguindo a perspectiva
enunciada por Tucídides na História da Guerra do Peloponeso, ainda actual, de
que as causas se dividem em próximas e afastadas e profundas.
As causas afastadas remontam a 2004 e ao alargamento da NATO para sete
países do leste europeu, por impulso da administração Bush, e consequente-
mente, a partir do ano seguinte, em 2005, ao movimento gerado no Congresso
Americano e liderado por Barack Obama por parte dos Democratas, antes de ser
Presidente, no sentido de se cooptar também para a NATO a Ucrânia e a Geór-
gia, objectivo frustrado na Conferência desta organização em 2008, em Bucareste,
por alemães e franceses. Este movimento induziu porém em grande medida, em
2013-2014, o golpe de estado ocorrido nas ruas de Kiev que subverteu o governo
saído de eleições democráticas reconhecidas como livres e justas pelos observa-
dores internacionais, inclusive pela delegação da Organização para a Segurança
e Cooperação na Europa liderada pelo português João Soares. Facto histórico e
simbólico da maior relevância é o Senador John McCain, ex-candidato presiden-
cial republicano, a discursar na célebre Praça Maiden em Kiev perante milhares
de ucranianos em protesto contra o governo do Presidente Yanukovych pela po-
lítica de aproximação económica à Rússia em detrimento da União Europeia,
vista como antecâmara da NATO.
Como é sabido, a Rússia aproveitou a oportunidade para levar a cabo uma
operação militar de ocupação da Crimeia – o objectivo prioritário - e de parte do
leste da Ucrânia, ao que tudo indica precedida de uma cenarização prospectiva e
correspondente planeamento estratégico meticuloso. À Ciência Histórica ficará a
tarefa de averiguar se o golpe de estado dos ucranianos não terá sido desejado e
mesmo alimentado pelos russos como pretexto para a invasão da Crimeia.
Dez anos passaram entre 2004 e 2014 e oito anos entre esta data e 2022. Nes-
tes últimos oito anos, com um governo ucraniano declaradamente anti-russo, os
americanos investiram 9 mil milhões de dólares em equipamento militar e treino
dos ucranianos, dos quais 7 mil milhões num único ano, em 2021, com a adminis-
tração Biden.4 Por seu turno, estima-se que os ingleses, menos disponíveis para
revelarem números, terão investido 3 mil milhões de libras, sobretudo a partir
de 2019, após o Brexit. Neste últimos oito anos, portanto, americanos e ingleses
investiram na estruturação de umas forças armadas ucranianas com capacidade
de interoperabilidade técnico-militar com a NATO, seguindo a estratégia de que
estas viriam a confrontar com sucesso as forças armadas russas na recuperação
das áreas ocupadas da Crimeia e do leste da Ucrânia.5 Note-se que alemães e

4
https://www.state.gov/u-s-security-cooperation-with-ukraine/
5
Veja-se também por exemplo este acção dos ingleses:” In June 2021, British destroyer HMS Defender
conducted a freedom of navigation operation in the Black Sea, close to Russian-occupied Crimea. A Russian
patrol vessel fired warning shots at HMS Defender, which was shadowed by Russian naval and air assets.
The British operation was a signal of solidarity to Ukraine which has put a spotlight on the UK’s involvement
in the Black Sea and the emerging UK–Ukraine strategic defence partnership.” (https://rusi.org/explore-

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 139

REE_32.indd 139 21/10/2022 10:22:45


Pedro Borges Graça

franceses estiveram ausentes nesta estratégia da aliança anglo-americana.


Perante esta pressão, e ironicamente aplicando um conceito desenvolvido
pelos americanos após o 11 de Setembro na renovação da sua estratégica de se-
gurança nacional, em 24 de Fevereiro deste ano (2022) os russos lançaram uma
guerra preemptiva contra os ucranianos, isto é, uma guerra por antecipação, preven-
tiva de uma possível ou mesmo provável tentativa de recuperação da Crimeia e
dos restantes territórios ocupados. Ficou assim relançada a nova guerra fria, agora
entre a Democracia e a Ditadura pós-moderna – chamemos-lhe assim – que mistura
centralismo ou autoritarismo político com economia de mercado. Mas a novidade
relevante é que no teatro de guerra está um intermediário do lado do chamado
Ocidente e do outro lado não está um intermediário mas o próprio actor prin-
cipal, com capacidade de produzir uma ameaça nuclear considerada credível,
acrescida pelo facto de vir do maior detentor mundial de ogivas nucleares ope-
racionais. Esta nova guerra fria é por isso também diferente da anterior por ser
uma guerra quase quente uma vez que o antigo “equilíbrio pelo terror”, que de
algum modo assegurava a impossibilidade de uma guerra nuclear, está agora
desequilibrado no sentido de se aceitar já a possibilidade da ocorrência dessa
guerra de destruição máxima, o que eleva a incerteza e os riscos geopolíticos para
um patamar até agora desconhecido.
Uma consequência imediata desta guerra quase quente, ao contrário da
anterior guerra fria, conforme os russos ameaçaram também desde o início, é que
as redes de abastecimento de equipamento militar do intermediário – isto é, dos
ucranianos - deixaram de estar ao abrigo da espécie de “acordo de cavalheiros”
que vigorava antigamente e que impedia que as mesmas fossem atacadas reci-
procamente pelos actores principais.
Estas duas ameaças dos russos – a nuclear e a do ataque às redes de abaste-
cimento a partir das fronteiras da Ucrânia –, juntamente com a detenção de mis-
seis de precisão e hipersónicos e a superioridade de equipamento militar pesado,
explicam em grande medida o seu sucesso no teatro de guerra e consequente-
mente também as vulnerabilidades do chamado Ocidente no domínio político e
económico.6
Ora, a Guerra é um fenómeno holístico que decorre da Política, tal como a
sua dimensão económica, e não está dependente somente da estratégia e do pla-
neamento mas também das variações e correcções e ritmos que a própria guerra

our-research/publications/commentary/uk-ukraine-security-cooperation)
O RUSI (Royal United Services Institute) é o principal think tank inglês de segurança e defesa e o
mais antigo do mundo nesta área.
6
O melhor exemplo, entre vários outros, é o ataque dos russos no início de Junho com misseis de
precisão ao túnel de Beskydy nos Montes Cárpatos, no oeste da Ucrânia, que era a principal via de
comunicação ferroviária com a Europa. (https://www.mirror.co.uk/news/world-news/russia-
strikes-ukraine-tunnel-border-27128043) Este túnel tinha sido financiado com 100 milhões de euros
dos fundos europeus e inaugurado em 2018 pelo anterior Presidente Poroshenko e representava,
também simbolicamente, o princípio da integração da Ucrânia na União Europeia.

140 Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022)

REE_32.indd 140 21/10/2022 10:22:45


Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

se impõe, para além do factor totalmente imprevisível que é o acaso. A Guerra é


o campo fértil da incerteza crescente.

A guerra económica

É neste contexto que se compreende também a Guerra Económica cuja


iniciativa tem estado do lado do chamado Ocidente com a série de pacotes de
sanções à Russia desde há 4 meses. Chegados a este ponto é possível afirmar
que essas sanções não foram tão eficazes quanto desejado pois não conseguiram
transformar-se em assimétricas e universais, condição essencial para o seu suces-
so, e consequentemente têm vindo a produzir efeitos de boomerang penalizadores
da economia global e correlativas economias dos países desenvolvidos e subde-
senvolvidos, permita-se-me esta classificação ampla e algo imprecisa.
É aqui que entra a China que, logo desde o início da Guerra, se recusou a
condenar a invasão da Ucrânia, mesmo na semântica ao seguir a caracterização
russa da situação como “operação militar”, abstendo-se na votação nas Nações
Unidas em 2 de Março, e depois votando mesmo contra quando nova votação em
7 de Abril suspendeu a Rússia do Conselho de Direitos Humanos. Se na primeira
votação a China ficou numa posição minoritária (ANEXO I – 1ª votação ONU),
o mesmo não aconteceu na segunda votação, em que votou contra, uma vez que,
não obstante a Rússia ter sido suspensa por 93 votos, a verdade é que a maioria
de 100 países não votaram contra a Rússia (somando votos contra a suspensão e
abstenções declaradas e não declaradas) (ANEXO II - 2ª Votação ONU). Note-se
que a mancha abrange a maioria dos países do Sul nos continentes americano,
africano e asiático, e que relativamente à CPLP só Portugal e Timor-Leste vota-
ram contra a Rússia.
De então para cá, a China não só tem mantido a sua posição de apoio à
Rússia como também mesmo estimulado o reforço das relações económicas recí-
procas. Com efeito, a principal implicação geoeconómica da Guerra da Ucrânia
é a aproximação efectiva da Rússia à China, em detrimento da União Europeia
e de países com a Alemanha e a França, e consequentemente a estruturação pro-
gressiva de um eixo ou aliança estratégica baseada em entendimentos e parcerias
prévias como, principalmente, os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do
Sul). Esta aliança económica, ironicamente criada a partir de uma cenarização
prospectiva da Goldman Sachs, acrescenta na verdade um directório à comple-
xidade crescente das relações internacionais, um G5 não declarado enquanto tal.
Com efeito - dados do FMI -, os cinco países abrangem no seu conjunto cerca de
27% da superfície terrestre, 42% da população mundial e 32% do produto interno
bruto global.7 Na hierarquia de poder económico relativo a este último indicador

7
https://www.poder360.com.br/europa-em-guerra/fds-brics-e-a-guerra-na-ucrania-como-fica-relacao-
com-a-russia-dw; https://www.chinadaily.com.cn/a/202206/13/WS62a68d47a310fd2b29e62429.html

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 141

REE_32.indd 141 21/10/2022 10:22:45


Pedro Borges Graça

a China tem um peso significativo de aproximadamente 18,5% por comparação


com os 6,8% da Índia, 3,1% da Rússia, 2,4% do Brasil e 0,6 % da África do Sul.
Na perspectiva dos chineses, esta hierarquia confere-lhes uma posição de
iniciativa e liderança do grupo, e este ano fez-se sentir especialmente na 14ª Con-
ferência sob a sua presidência realizada há poucos dias, no final de Junho, sob
o lema “Uma Nova Era para o Desenvolvimento Global” que corresponde às
designadas Iniciativa de Desenvolvimento Global e Iniciativa de Segurança Global com
que os chineses pretendem mobilizar os países do Sul para a sua mundovisão
de multilateralismo e relações económicas internacionais, em suma, para o seu
modelo de governança do sistema político e económico internacional. É neste
contexto que pode ser compreendido também o projecto BRICS PLUS ou BRICS
MAIS, já de certo modo ensaiado com a participação de representantes dos res-
pectivos ministérios dos negócios estrangeiros, em Maio, na reunião preparatória
desta 14ª Conferência, no sentido de alargar a aliança económica à Argentina,
Egipto, Indonésia, Kazaquistão, Nigéria, Emiratos Árabes Unidos, Arábia Saudi-
ta, Senegal e Tailândia, desafiando claramente o protagonismo do G20 mas não
o assumindo, e confrontando directamente a iniciativa americana do Indo-Pacific
Economic Framework for Prosperity.
A Declaração de Beijing é pois um manifesto claro desta estratégia de con-
solidação e projecção de Poder dos BRICS, a qual visa efectivamente mobilizar
as partes do mundo não ocidental que em grande medida vêm escapando ao ali-
nhamento com as sanções económicas do mundo ocidental contra a Rússia por
causa da invasão da Ucrânia. De destacar como exemplo, entre outros objectivos
relevantes, o fortalecimento dessa espécie de banco mundial que é o New Deve-
lopment Bank, a partir de agora com sede permanente em Shangai, liderado pelo
brasileiro Marcos Prado Troyjo, e a abertura anunciada de uma filial na Índia,
juntamente com um think tank financeiro em rede e uma task force para as parcerias
público-privadas tendo como prioridade o investimento em infraestruturas, desde
logo no âmbito da economia digital.

Crise, oportunidade e estratégia indirecta da china

Por outro lado, observe-se um conjunto de idiossincrasias próprias da cul-


tura dos chineses que nos permitem aproximarmos da compreensão da dinâmica
do seu comportamento na actual conjuntura. Precisamente, a conjuntura actual é
marcada pela crise da Guerra na Ucrânia e na língua chinesa a palavra crise, como
é sobejamente sabido, é composta por dois caracteres (wei + ji) que significam ao
mesmo tempo perigo e oportunidade, ou seja, “os momentos críticos ou perigosos
geram oportunidades”. 8 Acresce a este elemento cultural que este ano de 2022

Wang Suoying, Professora de Língua e Cultura Chinesa, nascida em Xangai mas a viver em Portugal
8

desde 1991 (https://www.dn.pt/sociedade/ano-do-tigre-de-agua-e-normalmente-considerado-

142 Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022)

REE_32.indd 142 21/10/2022 10:22:45


Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

é o Ano do Tigre, que para os chineses é o rei dos animais e símbolo de força e
coragem, e portanto este ano está a ser visto como auspicioso e poderoso.
Isto não significa contudo que a China, reforçando a aliança estratégica com
a Rússia, venha a seguir uma linha de possível confrontação armada com o cha-
mado Ocidente e particularmente com os Estados Unidos em torno de pontos de
tensão como Taiwan ou o Mar da China. Posto em termos simples, na perspecti-
va chinesa não seria bom para os negócios, para o regular funcionamento da eco-
nomia internacional, na qual está focada a sua grande estratégia de projecção de
poder nacional. No entanto é provável que, segundo a lógica estratégica de que
não existe expansão económica sem capacidade de segurança, que continuem as
“coreografias” ou exercícios militares nesses pontos, assim como a realização de
acordos de segurança na área do indo-pacífico, e em particular na Oceania, como
aconteceu recentemente com as Ilhas Salomão, ponto estratégico para defesa e
controlo marítimo e aéreo e recolha de informações, desafiando a tradicional in-
fluência e linhas de comunicação dos australianos na região e consequentemente
dos americanos.9
Com efeito, de acordo com John Keegan, uma referência dos Estudos da
Guerra, a cultura é um factor determinante do modo oriental de fazer a guerra
que se caracteriza pela “evasão, o retardamento e o combate indirecto”, distinto
do modo de guerra ocidental.10 Os chineses possuem uma teoria da estratégia
mais antiga que os ocidentais, e o famoso tratado de Sun Tzu, A Arte da Guerra,
cuja tradução mais fiel é A Arte da Estratégia, espelha isso mesmo com a ideia
central de que a maior vitória de uma guerra é a que se alcança sem fazer pro-
priamente a guerra, através da subversão e das clivagens criadas nas alianças do
inimigo. Ou seja, a melhor estratégia é a indirecta. Iniciativas como a One Belt One
Road, a do Desenvolvimento Global ou, instrumentalmente, os BRICS, parecem
corresponder a esta ideia.
A Guerra na Ucrânia causou assim a oportunidade para os chineses apro-
fundarem a estratégia indirecta que vêm pacientemente desenvolvendo no sen-
tido de consolidarem a sua influência no ambiente económico internacional, e
desde logo em África. Também neste âmbito o modo de pensar o conceito de
oportunidade é diferente dos ocidentais. Enquanto estes últimos vêem uma oca-
sião – uma janela de oportunidade – para a descontinuidade e inovação, os chi-
neses, sem rejeitarem a inovação, vêem uma ocasião para impulsionarem e me-
lhorarem projectos definidos no passado e ainda não concluídos.11

um-ano-auspicioso-14547059.html)
9
(05MAI22) Euan Graham, Assessing the Solomon Islands’ new security agreement with China (https://
www.iiss.org/blogs/analysis/2022/05/china-solomon-islands)
10
(2009) John Keegan, Uma História da Guerra, Ed. Tinta da China, p. 507.
11
(2012) Laurent Henninger e Thierry Widemann, Comprendre la Guerre. Histoire et Notions, Editions
Perrin, p. 126.

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 143

REE_32.indd 143 21/10/2022 10:22:45


Pedro Borges Graça

O perímetro de segurança geo-económica em áfrica

No que respeita especificamente a África, note-se que o primeiro grande


avanço dos chineses no continente africano após a queda do Muro de Berlim
se verificou na viragem do Século quando americanos e europeus redirecciona-
ram a sua atenção política e militar e financeira para os países do leste europeu
e muito especialmente para a guerra nos Balcãs. Neste momento repete-se de
certa forma a situação, ao que tudo indica até mais grave do ponto de vista eco-
nómico e financeiro, e a China aproveita a oportunidade para a implementação
da designada “estratégia pós-pandemia para a recuperação económica”, que inclui as
seguintes acções: o fornecimento de mil milhões de vacinas anti-Covid, das quais
600 milhões sobre a forma de donativo e 400 milhões envolvendo relações de
produção e comerciais entre empresas chinesas e africanas; o aconselhamento
de políticas macroeconómicas de acordo com o modelo da chamada Iniciativa
de Desenvolvimento Global, ou seja, o modelo político e económico chinês; a ex-
pansão da economia digital, em consonância aliás com os objectivos estratégicos
enunciados na já referida Declaração de Beijing dos BRICS, suportando o projec-
to da União Africana de criação de uma área de livre comércio continental por
meio da transferência de ciência e tecnologia como o G5 e inteligência artificial e
aplicações associadas a satélites de comunicação, e um programa de lançamento
de 100 lojas e 1000 produtos africanos em plataformas de comércio electrónico.12
Deste modo, os chineses estão a consolidar um pensamento geopolítico,
curiosamente idêntico ao que Lenine delineou em 1916 em “O Imperialismo, es-
tádio supremo do Capitalismo”, um pensamento geopolítico que cria uma es-
pécie de arco ou cinturão ou perímetro de segurança geoeconómica na África
subsaariana, no confronto com americanos e europeus nesse tipo de conflitua-
lidade não-armada que caracteriza hoje a competitividade económica. O acesso
privilegiado aos recursos africanos parece ser assim também um dos principais,
se não mesmo o principal objectivo estratégico dos chineses, no que respeita ao
retorno do investimento, embora num prazo ainda indefinido.

A aliança sino-russa

Complementarmente a esta projecção geoeconómica, a Guerra na Ucrânia


abriu também uma oportunidade que os chineses porventura não esperariam tão
cedo. Os russos estão efectivamente a afastar-se da interdependência económica
que vinha a ser dinamizada com os europeus e em especial com alemães e fran-
ceses, e já declararam que vão antes optar por parceiros “estáveis e confiáveis”,
entenda-se chineses, os quais entretanto não cederam às pressões dos america-
nos para alinharem com as sanções, mantendo com estes um discurso de duplo

12
www.chinadaily.com.cn/a/202205/30/WS62941882a310fd2b29e5fadc.html

144 Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022)

REE_32.indd 144 21/10/2022 10:22:45


Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

sentido, ambivalente, observável diariamente nos seus meios de comunicação


social: ao mesmo tempo que afirmam desejar a normalidade das relações sino-
-americanas e a cooperação no âmbito da economia global, sublinham constan-
temente, entre outros elementos de propaganda e para além da questão de Tai-
wan, a decadência da sociedade americana, a hipocrisia nas relações económicas
internacionais ao quererem manter a hegemonia à custa do sofrimento do resto
do mundo, e alimentam agressivamente o estereótipo do seu imperialismo e da
NATO, como pode ser observado por exemplo nestas caricaturas muito recentes
sobre a Guerra na Ucrânia. (ANEXO III – Caricaturas Anti-USA nos mass media
chineses)
Os efeitos na balança comercial sino-russa sentiram-se pois de imediato.
As importações chinesas - sobretudo gás, petróleo e cereais – em Abril já tinham
subido mais de 55% comparativamente a Abril de 2021.13 Como a procura é cres-
cente na China e a Guerra na Ucrânia se afigura longa, talvez passando para um
modo de guerra intermitente (como é o caso dos territórios ocupados na Palestina,
Síria e Líbano por Israel, condenado cerca de 50 vezes nas Nações Unidas), é
possível que a situação se mantenha e consequentemente as relações económicas
sino-russas venham a reforçar-se e desenvolver-se na linha apontada já pelos
BRICS. A China está também a promover a triangulação com a Índia, a qual tem
vindo igualmente a aumentar exponencialmente as importações de energia e de
cereais da Rússia. Neste momento assiste-se a uma convergência do discurso chi-
nês e indiano, de aproximação tendo por base os interesses comuns, incluindo
um novo diálogo e entendimento sobre as disputas de fronteiras e, referem am-
bos, o empenhamento na construção de confiança recíproca.
Um parêntesis relativo à posição da Índia no contexto regional e internacio-
nal: a posição é de compromisso múltiplo – à falta de melhor designação - uma vez
que pertence a todos os arranjos e organizações antagónicas: à Commonwealth,
Quad e à recentemente lançada Indo-Pacific Economic Framework for Prosperity, do
lado dos ingleses e americanos, e aos BRICS e à Shangai Cooperation Organiza-
tion ou Grupo de Shangai do lado dos chineses.
O Grupo de Shangai, originalmente constituído pela China, Rússia, Cazaquis-
tão, Quirguistão, Tajiquistão e Uzbequistão, em 2001 – note-se que em sincronia
com a expansão da China para África - a que se juntaram em 2017 os inimigos
Índia e Paquistão, e se juntará muito em breve o Irão, como já foi formalmente
anunciado, ganha especial relevo na actual conjuntura.14 É na verdade um pacto

The Economist, May 14-20, 2022


13

“The Shanghai Cooperation Organization (SCO) is an intergovernmental organization founded


14

in Shanghai on 15 June 2001. The SCO currently comprises eight Member States (China, India,
Kazakhstan, Kyrgyzstan, Russia, Pakistan, Tajikistan and Uzbekistan), four Observer States
interested in acceding to full membership (Afghanistan, Belarus, Iran, and Mongolia) and six
“Dialogue Partners” (Armenia, Azerbaijan, Cambodia, Nepal, Sri Lanka and Turkey). In 2021, the
decision was made to start the accession process of Iran to the SCO as a full member, and Egypt,
Qatar as well as Saudi Arabia became dialogue partners.” (https://dppa.un.org/en/shanghai-

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 145

REE_32.indd 145 21/10/2022 10:22:45


Pedro Borges Graça

político-militar e económico desenhado pela China como uma aliança sino-russa


tendo como objectivos prioritários a contraposição à aliança anglo-americana e
à NATO e visando a coesão da Eurásia e o correspondente acesso partilhado aos
recursos na região, desde logo na Rússia e Ásia Central. Recorde-se que a Rússia
tem o maior e mais rico subsolo do mundo, assim avaliado pelo Banco Mundial
há alguns anos em cerca de 75 triliões de dólares.15
Sob este ponto de vista, estamos pois neste momento a entrar numa conjun-
tura de choque declarado entre duas Geopolíticas antagónicas que pressionam a
reconfiguração dos respectivos espaços geoeconómicos.

As geopolíticas antagónicas

A Geopolítica anglo-americana é a mais antiga e baseia-se no pensamento


estratégico do inglês Mackinder no início do século XX que propugna a conquista
do espaço da Rússia, partindo do princípio de que quem o controla dominará o
mundo, em grande medida por causas dos recursos geradores de poder econó-
mico e militar. Spykman, holandês naturalizado americano, veio complementar
este pensamento estratégico durante a 2ª Guerra Mundial, propondo que, pelas
mesmas razões, basta cercar esse espaço controlando toda a Eurásia para se con-
ter e controlar ou mesmo anular a projecção de poder da Rússia. (ANEXO IV-
Mackinder e Spykman) Observe-se que nesta Geopolítica está explícita a ideia
de que uma aliança germano-russa representa a ameaça de que essa projecção de
poder se venha a concretizar e que portanto é contrária aos interesses ingleses e
americanos.16
A Geopolítica sino-russa está neste momento a ser concertada e afinada par-
tindo do pensamento estratégico chinês pós-guerra fria que está na origem da
projecção para África e da iniciativa One Belt One Road (OBOR) que representa
uma muralha tão sinuosa quanto ardilosa de quebra, de interferência, de disrup-
ção da Geopolítica anglo-americana. (ANEXO V – OBOR) Um parêntesis: note-
-se a estratégia chinesa para África como perímetro de segurança geoeconómica
da OBOR. Consciente do princípio de que não existe real poder económico sem
poder militar, a China aproveita agora a oportunidade de reforçar o Grupo de
Shangai com o empenho e as relações desejadamente “estáveis e fiáveis” da Rús-
sia, a maior potencia nuclear mundial. Atente-se porém no facto de que a actual
iniciativa americana do Indo-Pacific Economic Framework for Prosperity (IPEFP) cer-

cooperation-organization)
15
https://epthinktank.eu/2015/03/16/the-russian-economy-will-russia-ever-catch-up/eprs-ida-
551320-russian-natural-resources/
16
(1904) H. J. Mackinder, The Geographical Pivot of History in The Geographical Journal, Vol. XXIII,
nº 4, April, 1904 apud The Geographical Journal, Vol.170, Nº 4, December 2004, pp. 298–321, p.
313. Repare-se no facto desta republicação ocorrer um século depois da original, e também na
coincidência da data com o primeiro alargamento da NATO aos países do leste europeu.

146 Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022)

REE_32.indd 146 21/10/2022 10:22:45


Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

ca a China pelo “outro lado”, na linha aliás da pressão imaginada por Spykman
em complemento a a Mackinder (ANEXO VI – IPEFP), o que inevitavelmente
obriga os chineses a dispersarem esforços, entenda-se económicos.

Uma avaliação prospectiva

Em síntese, numa avaliação prospectiva possível mas com certeza insufi-


ciente, iremos assistir a curto prazo a uma recomposição das áreas geoeconómicas
correspondentes aos dois blocos político--militares que agora estão em processo
de consolidação como consequência da Guerra da Ucrânia e a que correspondem
duas mundovisões antagónicas e respectivos valores – a da Democracia e a da
Ditadura Pós-Moderna – e portanto dois modelos político-económicos a serem
apresentados como opção de Desenvolvimento aos restantes países do sistema
internacional, principalmente aos africanos e asiáticos. A competitividade pode-
rá vir a ser mais agressiva, raiando a conflitualidade não-armada com o aumento
das acções de espionagem económica e tecnológica e de ciberataques, a que cor-
responderá a procura intensa de soluções de segurança da informação. No que
respeita à Ásia, é possível que venha a assistir-se a uma luta intensa em torno dos
centros financeiros regionais, nomeadamente agora que Singapura desafia clara-
mente Hong Kong e Shangai, acompanhando a recomposição das duas grandes
áreas geoeconómicas.
A guerra da Ucrânia continuará envolta em grande incerteza e consequen-
temente continuará o desgaste induzido na economia global. Se os russos conti-
nuarem a avançar no terreno, caso não ocorram entretanto negociações com os
ucranianos, é provável que Odessa seja atacada e, se for conquistada, a Ucrâ-
nia ficará sem ligação ao Mar Negro nem comunicação com o território a sul da
Moldávia. A concretizar-se este cenário, as consequências sentir-se-ão nas expor-
tações ucranianas e, neste momento, são imprevisíveis quanto à evolução ime-
diatamente posterior da guerra quase quente, mas desencadearão nos mercados
percepções de riscos geopolíticos.
A maior e mais simples probabilidade a enunciar contudo neste momento
sobre a evolução da conjuntura é a de que a incerteza será crescente e de que os
planos de contingência abundarão sem noção das consequências em tempo útil,
por causa das respostas em tempo demorado aos problemas que emergem em
tempo acelerado. Sobre este cenário note-se que a tomada de decisão é tenden-
cialmente mais lenta na Democracia que na Ditadura Pós-Moderna.
Concluindo, tendo em vista pessoas, grupos e instituições face à incerteza
crescente, é vital o desenvolvimento de uma análise estratégica dinâmica para se
acompanhar a evolução desta conjuntura tão volátil que requer correcções cons-
tantes às estratégias e correlativos planeamentos. Esta difere da análise estratégica
estática tipo swot e pestl, no sentido em que não é limitativa ao retratar somente
um determinado momento, produzindo ao invés um conhecimento continuado

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 147

REE_32.indd 147 21/10/2022 10:22:45


Pedro Borges Graça

da situação e gradualmente suficiente, muito bom e excelente enquanto avaliação


prospectiva, sem a qual não existe estratégia nem planeamento estratégico efec-
tivo. Os custos da ignorância são muito superiores aos do conhecimento do que
está a acontecer e do que virá a acontecer.
A esperança - é esta a palavra - é que a actual conjuntura não cause uma
escalada de conflitualidade que empurre ambos os pactos político-militares para
a situação que Graham Allison, o reputado professor de Harvard especialista
em estudos russos e chineses e arquitecto da desnuclearização do espaço pós-
-soviético, identifica como a “armadilha de Tucídides” em que Esparta e Atenas
e respectivas alianças entraram numa guerra total.

148 Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022)

REE_32.indd 148 21/10/2022 10:22:45


Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

ANEXO I – 1ª VOTAÇÃO ONU

ANEXO II – 2ª VOTAÇÃO ONU

07ABR22 – Votação ONU para exclusão da Rússia


do Conselho de Direitos Humanos
Verde – A Favor (93)
Vermelho – Contra (24)
Amarelo – Abstenção (58) ou Abstenção Declarada
Cinzento – Não Votante (18) ou Abstenção Não-Declarada

(Note-se relativamente à CPLP que só Portugal e Timor-Leste votaram a favor)

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 149

REE_32.indd 149 21/10/2022 10:22:46


Pedro Borges Graça

ANEXO III - CARICATURAS ANTI-USA NOS MASS MEDIA CHINESES


150 Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022)

REE_32.indd 150 21/10/2022 10:22:46


Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

ANEXO IV – A GEOPOLÍTICA ANGLO-AMERICANA

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 151

REE_32.indd 151 21/10/2022 10:22:47


Pedro Borges Graça

ANEXO V – A GEOPOLÍTICA CHINESA (ONE BELT ONE ROAD)

152 Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022)

REE_32.indd 152 21/10/2022 10:22:47


Implicações geo-económicas da guerra da Ucrânia na posição da China, pp. 133-153

ANEXO VI – INDO-PACIFIC ECONOMIC FRAMEWORK FOR PROSPERITY

Lusíada. Economia & Empresa. n.º 32 (2022) 153

REE_32.indd 153 21/10/2022 10:22:47


Copyright of Lusíada. Economia & Empresa is the property of Fundacao Minerva-Cultura-
Ensino e Investigacao Cientifica and its content may not be copied or emailed to multiple
sites or posted to a listserv without the copyright holder's express written permission.
However, users may print, download, or email articles for individual use.

Você também pode gostar