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REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NO BRASIL: VELHAS E NOVAS

QUESTÕES
Maria Camila Loffredo D’Ottaviano*
Sérgio Luís Quaglia Silva**

No Brasil urbano contemporâneo, a regularização fundiária se coloca cada vez mais como questão
fundamental tanto nas grandes cidades quanto nas de pequeno e médio porte. A partir da aprovação do
Estatuto da Cidade (Lei Federal no 10.257/2001), a regularização fundiária de assentamentos preexistentes
tornou-se um objeto de trabalho dos arquitetos e urbanistas brasileiros. Com a recente aprovação da Lei
Federal no 11.977, instituindo o Programa Minha Casa, Minha Vida, a regularização de assentamentos já
consolidados tornou-se uma das metas prioritárias da política de acesso à moradia do governo federal.
A regularização fundiária passa a ser vista como uma ferramenta importante no acesso à posse legal da
moradia digna. A partir da análise da metodologia de kits judiciais desenvolvida, pretende-se discutir a
viabilidade de projetos de regularização em assentamentos de pequeno e médio porte.

Palavras-chave: Irregularidade Urbana; Regularização Fundiária; Direito à Cidade.

LAND TENURE IN BRAZIL: OLD AND NEW QUESTIONS

Nowadays, land tenure is more and more a fundamental problem for great cities and even medium and
small ones at Brazil. With the approval of the City Statute (Federal Law nº 10.257/2001), land tenure of
irregular settlements became an important job for Brazilian architects and urban planners. With the recent
approval of the Federal Law no 11.977 creating the My House, My Life Program, the regularization of the
illegal settlements is an important goal for the federal housing policy. Land tenure is now an important
tool to achieve the legal housing ownership. By analyzing the judicial kits methodology, we will discuss
the viability for land tenure projects in small and medium sized irregular settlements.

Key words: Urban Irregularity; Land Tenure; Right to the City.

REGULARIZACIÓN DE TIERRAS EN BRASIL: VIEJAS Y NUEVAS CUESTIONES

En el Brasil urbano contemporáneo, la regularización urbana está posicionada como una cuestión
trascendental en las metrópolis, ciudades pequeñas y medianas. Desde la aprobación del Estatuto de la Ciudad
(Ley Federal no 10.257/2001), la regularización de tierras de asentamientos pre-existentes se volvió un tema
de estudio recurrente para los arquitectos y urbanistas brasileños. Debido a la reciente aprobación de la Ley
Federal no 11.977, que promulgó el Programa Mi Casa, Mi Vida, la regularización fundiaria de asentamientos
consolidados se convierte en una de las metas prioritarias de la política de acceso a la vivienda del gobierno
federal. La regularización fundiaria pasó a ser considerada como una herramienta importante para lograr la

*Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP.

**Professor adjunto do Centro de Estudos Urbanos da Universidade São Francisco/Itatiba - CEUs-USF.

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tenencia de vivienda digna. A partir del análisis de la metodología de kits judiciales, se pretende debatir la
viabilidad de proyectos de regularización en asentamientos de pequeña y mediana escala.

Palabras-clave: Irregularidad Urbana; Regularización de Tierras; Derecho a la Ciudad.

RÉGULARISATION FONCIÈRE AU BRÉSIL: QUESTIONS ANCIENNES ET NOUVELLEs

Dans le Brésil contemporaine, la régularisacion foncière est une question fundamentale pour toutes les
villes, métropoles, moyennes ou petit villes. Aprés la approbation du Status de la Ville (Estatuto da Cidade
– Lói Fédérale no 10.257/2009), la régularisation du zones urbaines irregulières/ilégales est aujourd’hui un
important objet du travail des architectes et urbanistes brésilienne. Avec la approbation de la Lói Fédérale
no 11.977, que a crée le Program Ma Maison, Mon Vie, la régularisacion fonciére est actuellement une de
les objectifs priorités de la politique du logement du gouvernement federal. La régularisacion fonciére est
allors une importante instrument pour la acces a la legalisacion de la propriété et du logement appropprié.
Avec la analyse de la méthodologie développés du kits judiciaires, on va discuter la viabilité des projetes
de regularisation dans le mélanges urbain irrégulières moyennes e petites.

Mots-clés: Irrégularité Urbaine; Régularisation Foncière; Droite de la Ville.

1 PREÂMBULO
No Brasil contemporâneo, os profissionais envolvidos com a questão urbana –
planejadores, arquitetos, urbanistas, economistas, juristas etc. – têm pela frente
um duplo desafio: “consertar” os problemas superlativos das grandes cidades,
produzidos, sobretudo, na segunda metade do século passado, e “salvar” as cidades
pequenas e médias que estão em processo de explosão por todo o país.
Durante os anos 1980 e 1990, foi possível observar um intenso crescimento
urbano informal, gerado pela consolidação de novos assentamentos irregulares e pelo
adensamento dos já existentes, com a verticalização das unidades residenciais e a
ocupação de espaços antes livres, como áreas públicas ou de proteção ambiental.
Nas grandes cidades e metrópoles, o acesso à moradia pela população de mais
baixa renda, em regra, se dá através da moradia em favelas ou através da residência
autoconstruída nos loteamentos ilegais periféricos. Nas cidades pequenas e médias
esse acesso não difere muito, pois, embora o processo de favelização seja menor, a
autoconstrução nos loteamentos ilegais periféricos é cada vez mais intensa. A presença
de assentamentos irregulares é uma constante na grande maioria das cidades brasilei-
ras, sejam pequenas, médias ou grandes. Devido à falta de uma política habitacional
eficiente para a população de baixa renda, o mercado habitacional informal tem sido
decisivo na configuração das cidades brasileiras nas últimas décadas.
Os loteamentos ilegais existentes no contexto brasileiro, na maioria das vezes,
são lugares com pouca ou nenhuma infraestrutura instalada, serviços públicos de-
ficitários ou inexistentes (escolas, postos de saúde etc.) e com moradias usualmente

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autoconstruídas, com várias deficiências, principalmente em relação à iluminação


e à ventilação naturais mínimas. São também imóveis totalmente destituídos da
documentação básica para proporcionar aos seus detentores as prerrogativas que o
sistema legal oferta à propriedade legal, como o acesso a meios de financiamento e
a possibilidade do exercício pleno dos direitos sucessórios, dentre outros. Ofertam,
pois, aos seus habitantes, condições indignas e injustas de moradia.
Se a melhoria na condição de moradia nas favelas foi um grande desafio
dos anos 1980 e 1990, a moradia em loteamentos ilegais tem se mostrado um
desafio a ser enfrentado no Brasil contemporâneo. A experiência do Plano de
Regularização das Zonas Especiais de Interesse (Prezeis) em Recife, nos anos
1980, pode ser vista como pioneira em todo o processo de regularização fundiária
brasileira, porém esse tipo de experiência vem ocorrendo de forma pontual e
isolada nos diversos municípios brasileiros.
Se os processos de regularização fundiária ao longo das últimas três décadas não
foram intensificados, por outro lado, os processos de expansão e adensamento dos
assentamentos ilegais, sim. A regularização fundiária se coloca como questão funda-
mental no desenvolvimento e aplicação da política urbana brasileira contemporânea.
Tanto o Estatuto da Cidade (Lei Federal no 10.257, de 10 de julho de 2001) quanto
o recente Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV) (Lei Federal no 11.977, de
7 de julho de 2009) apontam a regularização fundiária como um dos instrumentos
de acesso à moradia digna e à cidade legal pela população de baixa renda.
O desafio de enfrentamento da irregularidade urbana brasileira ganhou, com
a edição desses dois novos diplomas legais, novos e importantes instrumentos. Porém,
questões conceituais fundamentais e as formas de aplicação desses instrumentos
ainda precisam ser discutidas.
A necessidade de se fazer regularização fundiária no Brasil tem proporcionado
várias abordagens conceituais e ideológicas, sobretudo em relação à forma e à
eficácia dos instrumentos disponíveis ou necessários para sua implementação. De
um lado, encontramos posições que defendem que a melhor forma de garantia da
posse da terra para aqueles que não a têm deve ser tratada pelo viés político e não
pela via do direito (MARCUSE, 2008). E, de outro lado, há os que defendem
o direito de propriedade como o meio útil e necessário para tal fim, mesmo que
necessite de alterações, para que possa ser utilizado de forma eficaz como meio de
garantia de acesso à posse segura da terra (ALFONSIN, 2001, 2002; ALFONSIN
et al., FERNANDES e ALFONSIN, 2004, 2006).
Este artigo pretende apresentar a metodologia dos kits judiciais desenvolvida
durante o processo de regularização fundiária do loteamento Jaguary, no muni-
cípio de Amparo, no interior do Estado de São Paulo, idealizado sob uma abor-
dagem conceitual que coloca o direito de propriedade como ferramenta útil para

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possibilitar a inclusão da população de baixa renda na cidade legal, e discutir as


novas possibilidades de atuação e encaminhamento dos processos de regularização
propiciados pela Lei no 11.977/2009, em especial aqueles para assentamentos em
áreas particulares passíveis da aplicação de usucapião.
A partir desse enfoque conceitual, entendemos que a regularização deve
ser entendida não apenas como a obtenção do título de propriedade do imóvel,
representando o corolário do direito da propriedade do imóvel em nossa socieda-
de, mas também como forma de direito à cidade e garantia do acesso à moradia
digna, acompanhada das benfeitorias urbanas (infraestrutura, serviços etc.) e
habitacionais mínimas necessárias.

2 EXPANSÃO URBANA E INFORMALIDADE NO BRASIL


De maneira geral, pode-se afirmar que o crescimento das grandes cidades brasileiras
ao longo da segunda metade do século XX se caracterizou pela configuração de
duas cidades distintas: uma cidade legal, consolidada pela implementação de
parcelamentos oficiais (legalizados) localizados, em geral, em áreas mais centrais,
destinados à moradia das classes médias e altas; e uma cidade ilegal, destinada à
moradia das classes baixas, caracterizada pela implantação de loteamentos ilegais
(ou irregulares) nas porções periféricas dos municípios e pela consolidação de
favelas em diversas áreas das regiões mais centrais.
Se, em 1960, a taxa de urbanização no Brasil era de 44,7%, a concentração
de população nas zonas urbanas cresceu paulatinamente desde então, passando
de 55,9% em 1970, para 67,6% em 1980, chegando a 75,6% em 1991. O Censo
de 2000 aponta que 81,2% da população brasileira é urbana, ou seja, vive nas
zonas urbanas de nossas cidades. Se considerarmos apenas a região Sudeste, esse
percentual é ainda mais alto, chegando a 90,12%. No Estado de São Paulo, 93,41%
da população vivem em áreas urbanas, ficando atrás apenas do Estado do Rio
de Janeiro (96,04% de população urbana). Além do crescimento vegetativo da
população e do êxodo rural, outra causa do intenso aumento da população urbana
é que mesmo a residência de trabalhadores tipicamente agrícolas localiza-se cada
vez mais em áreas urbanas (SANTOS, 2008, p. 6). A demanda por moradia,
serviços e infraestrutura urbanos tem acompanhado esse processo:

O Brasil, como os demais países da América Latina, apresentou intenso processo de urbanização, espe-
cialmente na segunda metade do século XX. Em 1940 a população urbana era de 26,3% do total. Em
2000 ela é de 81,2%. Esse crescimento se mostra mais impressionante ainda se lembrarmos os números
absolutos: em 1940 a população que residia nas cidades era de 18,8 milhões de habitantes e em 2000
ela é de aproximadamente 138 milhões. Constatamos, portanto, que em sessenta anos os assentamentos
urbanos foram ampliados de forma a abrigar mais de 120 milhões de pessoas.

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(...)Trata-se de um gigantesco movimento de construção de cidade, necessário para o assentamento


residencial dessa população bem como de suas necessidades de trabalho, abastecimento, transportes,
saúde, energia, água, etc. Ainda que o rumo tomado pelo crescimento urbano não tenha respondido
satisfatoriamente a todas essas necessidades, o território foi ocupado e foram construídas as condições
para viver nesse espaço. Bem ou mal, de algum modo, improvisado ou não, todos os 138 milhões de
habitantes moram em cidades (MARICATO, 2002, p. 16).

TABELA 1
Brasil: total e por tipo de domicílio e taxa de urbanização –1950, 1960, 1970, 1980,
1991 e 2000
População/ano 2000 1991 1980 1970 1960 1950
Total 169.799.170 146.825.475 119.011.052 93.134.846 70.992.343 51.944.397
Urbana 137.953.959 110.990.990 80.437.327 52.097.260 32.004.817 18.782.891
Rural 31.845.211 35.834.485 38.573.725 41.037.586 38.987.526 33.161.506
Urbana 81,25 75,59 67,59 55,94 45,08 36,16
Rural 18,75 24,41 32,41 44,06 54,92 63,8
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)/Censos Demográficos de 1950, 1960, 1970, 1980, 1991 e 2000.

A realidade das cidades brasileiras se assemelha muito ao contexto urbano


de outros países da América Latina: grande concentração populacional vivendo,
muitas vezes, em áreas com pouca ou nenhuma infraestrutura urbana e carente
de serviços públicos, em regiões periféricas das cidades, na maior parte das vezes
sem acesso ao mercado imobiliário formal.
Como resultado desse processo de urbanização rápida ao longo de poucas
décadas, a América Latina é hoje a região mais urbanizada do mundo em de-
senvolvimento, com 75% da população vivendo em cidades. Em que pesem as
muitas diferenças existentes entre os processos de crescimento urbano verificados
nos diversos países da região, de modo geral a urbanização tem gerado processos
renovados de exclusão social, crise habitacional, segregação espacial, violência
urbana e degradação ambiental:

(...) Como resultado: de acordo com dados recentes de diversas fontes, 26 de milhões dos brasileiros que
vivem em áreas urbanas não têm água em casa; 14 milhões não são atendidos por sistema de coleta de
lixo; 83 milhões não estão conectados ao sistema de saneamento; e 70% do esgoto coletado não são
tratados,mas despejados em estado bruto na natureza (FERNANDES, 2006, p. 3-4).

O trabalho recente divulgado pelo Ministério das Cidades sobre habitação pre-
cária aponta que no Brasil existe um total de 1.618.836 (6,65%) domicílios localizados
em setores subnormais (favelas) e 1.546.250 (6,35%) em setores precários, indicando
que 13% do total dos 24.364.375 domicílios brasileiros possuem algum tipo de
precariedade. O estudo considerou como habitações precárias aquelas localizadas em

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favelas, loteamentos clandestinos e/ou irregulares e cortiços. Além das condições físicas
da moradia, devem ser consideradas variáveis como o acesso à rede de infraestrutura e
serviços públicos, a urbanização efetiva da gleba e a titularidade do imóvel.
Bentes (2003) afirma que:
(...) em 2000, o déficit habitacional brasileiro foi estimado em 6.656.526 de novas moradias e, na atuali-
dade, a ilegalidade e a informalidade urbanas se confirmam como um problema central a ser enfrentado
no tratamento da questão habitacional. Nesse sentido, aprofundar e implementar novos instrumentos
urbanísticos e fiscais visando a efetivação da função social da propriedade constitui, hoje, um dos principais
desafios na condução da Política Urbana em nosso país.

Os loteamentos irregulares instalados nas áreas de proteção de mananciais da


Região Metropolitana (RM) de São Paulo, às margens das represas Guarapiranga
e Billings e nas encostas da Serra da Cantareira, são um exemplo paradigmático
dessa realidade de expansão da irregularidade. Nessa região também temos um
grande número de loteamentos irregulares de média e alta renda.
No Brasil, apesar do ganho populacional das metrópoles e grandes cidades,
as cidades médias e pequenas têm tido uma importância crescente no aumento
da população urbana total. Em 2000, 72% dos municípios brasileiros possuíam
menos de 20 mil habitantes. A tabela 2 mostra que no período entre 1991 e 2000,
apenas as cidades com população entre 100 mil e 500 mil habitantes tiveram
crescimento superior à média nacional.

TABELA 2

Brasil: taxa de crescimento anual dos municípios por faixa populacional – 1991-2000

População Média da taxa de crescimento anual de 1991-2000


Até 20 mil habitantes –0,07
De 20 mil a 100 mil 0,77
De 100 mil a 500 mil 1,91
Acima de 500 mil 1,41
Geral Brasil 1,63
Fonte: Ministério das Cidades, 2005.

Pode-se observar que, em geral, o acesso à moradia pela população de mais baixa
renda nas metrópoles e grandes cidades se dá através da moradia em favela ou através
da residência autoconstruída nos loteamentos irregulares periféricos. Já nas cidades
pequenas e médias esse acesso se dá quase que exclusivamente através da autoconstrução
nos loteamentos irregulares periféricos. “Hoje, cerca de 40% das cidades brasileiras
com menos de 20 mil habitantes têm loteamentos clandestinos. Isso não é um mero

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sintoma de um modelo de desenvolvimento, mas o próprio modelo. Não estamos


falando de uma exceção, mas da regra” (FERNANDES, 2006, p. 16)
Nesse momento em que o Programa Nacional de Apoio à Regularização Fun-
diária Sustentável, criado em 2003, recebeu um novo e importante impulso com a
aprovação da Lei no 11.977/2009, é necessário entender a realidade da irregularidade
urbana nas cidades pequenas e médias, e não apenas nas grandes cidades, ao mesmo
tempo em que devem ser pensadas e desenvolvidas estratégias de atuação específicas
para a realidade dos assentamentos irregulares de pequeno e médio portes.

3 ESTATUTO DA CIDADE E A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE


A moradia em um loteamento irregular, mesmo em uma casa adquirida através
da compra formal, representa, para seus moradores, a exclusão da cidade legal. A falta
de titularidade do imóvel é um dos indícios de precariedade da moradia. A falta de
infraestrutura, o serviço público precário e a ausência quase total do poder público
local reforçam a condição de exclusão dos moradores.
Os dados sobre precariedade habitacional no Brasil mostram que programas
de regularização urbanística e fundiária são necessários tanto do ponto de vista
local quanto do ponto de vista de uma política pública mais geral. Todavia, os
instrumentos disponibilizados até recentemente para combater essa realidade ainda
não eram suficientes, pois propiciavam uma abordagem que não considerava a exata
dimensão do problema, na medida em que a propriedade urbana culturalmente
tem suas raízes fundadas no direito individual. Faltavam elementos essenciais para
alterar esse enfoque tradicionalmente dado ao direito da propriedade urbana.
A aprovação do Estatuto da Cidade, em 2001, regulamentando os artigos
182 e 183 da Constituição Federal, representou um novo marco regulatório para a
política e gestão urbanas brasileiras. Uma das questões mais importantes abordada
pelo Estatuto da Cidade foi a definição dos exatos contornos sobre o que representa
o conceito da função social da propriedade. A função social da propriedade era, até
então, apenas uma ideia já prevista em várias das Constituições brasileiras e refor-
çada na Carta de 1988, que merecia regulamentação para se tornar um conceito
mais explícito e de fácil aplicabilidade, o que somente aconteceu com o Estatuto.
A sua conceituação tem proporcionado novas possibilidades de atuação técnica,
sobretudo no que diz respeito às questões relacionadas ao acesso à moradia digna
como um dos pré-requisitos do direito à cidade.

Enfim, a função social manifesta-se na própria configuração estrutural do direito de propriedade, pondo-se,
concretamente, como elemento qualificante na predeterminação dos modos de aquisição, gozo e utilização
dos bens. Por isso é que se conclui que o direito de propriedade não pode mais ser tido como um direito

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individual. A inserção do princípio da função social, sem impedir a existência da instituição, modifica a
sua natureza (SILVA, 2008, p. 77-78)

A idéia de função social da propriedade envolve a prevalência do interesse social, do bem coletivo e do
bem-estar da coletividade, bem como a persecução e consecução da regularização fundiária e a urba-
nização das áreas ocupadas por populações de baixa renda” (Estatuto, parágrafo único do artigo 1º e
inciso XIV do artigo 2º) (DALLARI e FERRAZ, 2006, p. 145).

A aprovação do Estatuto da Cidade brasileiro é visto por especialistas da área


jurídica e urbanística, tanto nacionais como estrangeiros, como um importante
avanço na regulamentação urbanística contemporânea.

O Estatuto da Cidade promoveu uma mudança estrutural do planejamento urbano brasileiro, que passa a ser
não apenas o planejamento regulatório tradicional, mas também um planejamento indutor de processos terri-
toriais e urbanísticos que tenham um impacto direto na dinâmica dos preços do mercado imobiliário. (...)

(...) De fato, a Constituição Federal e o Estatuto da Cidade plenamente reconhecem o direito dos mora-
dores em assentamentos informais consolidados em áreas urbanas públicas ou privadas a permanecerem
nessas áreas. (...)

O que se disputa hoje é um conceito de regularização, ou seja, se for entendido que a regularização é um
processo multidimensional que deve combinar uma dimensão jurídica de legalização das áreas e titulação
dos lotes com uma dimensão urbanística, ambiental e social, é crucial que medidas efetivas sejam tomadas
nesse sentido por meio de programas e políticas compreensivas de regularização. Na falta de tal resposta pelo
poder público, o caminho do reconhecimento judicial de direitos de posse e propriedade em terras privadas
e em terras de particulares continuará aberto aos ocupantes dos assentamentos informais, ainda que em
condições onde a sustentabilidade socioambiental seja inadequada (FERNANDES, 2006, p. 15-16).

O desafio, desde sua aprovação, tem sido viabilizar a aplicação dos novos
instrumentos de política urbana disponibilizados de forma a fazer valer a função
social da propriedade e o direito à cidade da população urbana brasileira. Recente-
mente, a aprovação do PMCMV (Lei Federal no 11.977), em 2009, veio se somar
aos avanços legais relativos à regularização fundiária e ao direito à cidade.

4 REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E USUCAPIÃO


Todo o processo de parcelamento urbano no Brasil é normatizado, em nível federal,
pela Lei no 6.766/ 1979, que traça de forma abrangente todas as regras aplicáveis aos
projetos de parcelamento, tais como: configuração do projeto, índices urbanísticos,
infraestrutura básica, documentação, garantias, aspectos registrários, contratuais e
penais, dentre outros. A Lei no 6.766 tinha como objetivo específico regulamentar
de maneira abrangente os novos parcelamentos urbanos no Brasil, dessa forma
foi desde sua concepção incipiente quanto a procedimentos de regularização dos
parcelamentos e assentamentos irregulares, apenas tratando do tema de forma

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superficial e impondo uma rotina bastante rígida para o enfrentamento da questão


pelo poder público. Com a aprovação da Lei no 9.785, em 1999, foram incorporadas
à Lei no 6766/1979, além de uma melhor conceituação atinente ao lote urbano
e à infraestrutura básica, novas regras relativas aos índices urbanísticos e prazos,
ofertando, ainda, importantes inovações quanto aos instrumentos legais para os
procedimentos regularizatórios de parcelamentos e assentamentos irregulares. A lei
de 1999, visando ofertar ao poder público um instrumento preliminar e eficaz até
então inexistente para a abordagem inicial do problema, autorizou a dispensa de
apresentação de título de propriedade após emissão judicial provisória do poder
municipal na posse do imóvel parcelado irregularmente, além de também facultar
a aceitação de contratos de compromisso de venda e compra e cessões de direito
como título apto para registro da titularidade no Cartório de Registro de Imóveis,
bem como declarou expressamente como sendo de interesse público as ações de
regularização desencadeadas pelo poder municipal, a quem dispensou maiores
facilidades quanto às regras impostas anteriormente. Todavia, essas regras ainda
se mostraram insuficientes para dar o impulso necessário às ações regularizatórias
dos assentamentos e loteamentos irregulares preexistentes.
Não obstante essa escassez legislativa, após 2001, com a aprovação do Estatuto
da Cidade, e mais recentemente com o PMCMV, uma série de programas e políticas
voltados para a regularização fundiária vem sendo criada e implementada, tanto
no âmbito federal quanto no estadual e municipal. Todavia, é bom não esquecer
que eles, isoladamente, não serão suficientes para a resolução da situação se não
forem acompanhados de efetivos programas de controle da paisagem urbana e
ambiental, notadamente considerando a pouca eficácia da política nacional voltada
para a habitação de interesse social.
Para a definição e desenvolvimento de projetos de regularização fundiária
devem ser consideradas não apenas as características físicas e jurídicas do assen-
tamento, mas também o caráter de irreversibilidade da ocupação, uma vez que
sua consolidação a princípio impossibilita a remoção pura e simples. A falta de
condições materiais, em especial a carência de recursos financeiros do poder local,
a inexistência de novo lugar adequado para a construção de novas moradias e mesmo
as dificuldades em conscientizar os moradores são questões importantes que devem
ser consideradas em programas de regularização. Pode-se considerar como ocupação
irreversível, consolidada, aquela em que a resultante das simulações e estudos
prévios à abordagem estatal vier a demonstrar que haverá mais dificuldades com
a eventual remoção do que com a resolução da questão no próprio local.
É importante também notar que o tamanho da ocupação não é o único
indicador do seu caráter de irreversibilidade. Se na RM de São Paulo encontramos
grandes áreas irregulares com população superior à de vários municípios brasileiros,

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existem inúmeros exemplos de assentamentos irregulares de pequeno porte, com


menos de mil moradores, e que também devem ser objeto de projetos de regula-
rização específicos.
A legalização da posse deve ser entendida como uma das condições mínimas
necessárias para a resolução integral do problema social nos assentamentos irregu-
lares. A falta de titulação dos imóveis aprofunda o imenso fosso que separa seus
moradores dos direitos inerentes ao titular de um imóvel regularmente inscrito
no Cartório de Registro de Imóveis, como, por exemplo, o acesso às fontes de
financiamento habitacional, pleno exercício do direito sucessório, valorização da
propriedade. Além disto, há que se considerar também que “através da regulari-
zação fundiária, o morador se tranqüiliza, desaparecendo o fantasma do despejo.
Trata-se de um fator desencadeante de uma série de iniciativas familiares de
melhoria da casa e iniciativas comunitárias de melhoria do ambiente do assenta-
mento” (ALFONSIN, 2001, p. 211-212).
Como já indicado pela ideia da regularização fundiária plena, todo projeto
de regularização da posse (jurídica ou administrativa) tem necessariamente que
vir acompanhada da urbanização efetiva (arruamento regular, implantação de
infraestrutura e serviços públicos) e da presença efetiva do poder local.
Uma característica importante com relação às áreas a serem regularizadas é
a identificação dos proprietários das glebas. No caso de terras privadas, uma vez
comprovado o tempo de posse dos moradores, acreditamos que o principal instru-
mento a ser utilizado é a usucapião. Para áreas públicas é necessária a utilização de
outros instrumentos, como, por exemplo, a Concessão de Direito Real de Uso.
A metodologia discutida a seguir foi desenvolvida no contexto de um assen-
tamento irregular de pequeno porte (340 famílias), consolidado em uma gleba
privada, onde a regularização deverá ser feita a partir da utilização do instituto da
usucapião, nas suas cinco modalidades distintas, conforme discutido a seguir.

4.1 A usucapião como instrumento de regularização fundiária


A usucapião é um instrumento jurídico, originário do direito romano, que possibi-
lita a regularização da posse de bens imóveis. É, portanto, uma forma de aquisição
da propriedade, produzida a partir do exercício pleno da posse, de forma contínua
e por determinado período de tempo mínimo exigido pela lei. Outras condições
mínimas, tanto objetivas como subjetivas, são exigidas pela legislação brasileira
(como justo título, boa fé etc.). A usucapião pode ser considerada uma forma
originária de aquisição da propriedade, pois o usucapiente constitui seu direito de
posse independentemente de qualquer relação fundiária preexistente com o antigo
proprietário do imóvel usucapido, sendo possível inclusive se considerar irrelevante,
no processo de regularização, a existência do proprietário anterior.

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Regularização fundiária no Brasil: velhas e novas questões 211

Originária do direito civil, a usucapião possuía, historicamente, um caráter


individualista. A Constituição de 1988 e a posterior regulamentação da política
urbana nacional (Estatuto da Cidade) ofertaram uma abrangência conceitual maior
ao princípio da função social da propriedade, especialmente em relação ao imóvel
urbano, reafirmando seu caráter socializante, de benefício coletivo.
Existem atualmente no Brasil duas espécies distintas de usucapião: judicial
(que se dá no âmbito judicial, a partir de sentença específica) e administrativo
(definida e legitimada no âmbito do Poder Executivo).
A possibilidade de utilização da usucapião como forma de regularização da
posse de um imóvel urbano foi determinada inicialmente pelo Código Civil de
1916, que previa apenas duas modalidades do instituto, extraordinária e ordinária.
Posteriormente, a Constituição de 1988, o novo Código Civil de 2002 e o Estatuto
da Cidade disponibilizaram novas modalidades de usucapião (urbana individual
ou coletiva), além de flexibilizar as modalidades previstas desde 1916 pelo Código
Civil, através da diminuição dos prazos mínimos de posse previstos.
Com a aprovação do PMCMV, em julho de 2009, é razoável admitir a
regulamentação de uma nova espécie de usucapião: a usucapião administrativa,
conforme será discutido a seguir.
A usucapião judicial possui quatro modalidades básicas e diversas passíveis
de utilização no meio urbano: a usucapião extraordinária, a usucapião ordinária,
a usucapião urbana especial individual e a usucapião urbana especial coletiva:
1) Usucapião extraordinária – o Código Civil de 1916 determinava um tempo
mínimo de posse ininterrupta declarada do imóvel de 20 anos. O novo
Código Civil (artigo 1238), de 2002, reduziu esse período de posse para
15 anos, podendo ainda ser reduzido para dez anos se o possuidor utilizar
o imóvel como residência ou nele houver realizado obras ou serviços
de caráter produtivo. Para utilização da usucapião extraordinária, não
existe a necessidade de demonstração de justo título e boa fé. Por posse
ininterrupta ou de continuidade ininterrupta da posse entende-se aquela
que não sofreu interrupção factual em relação ao possuidor que a detém,
no lapso temporal alegado.
2) Usucapião ordinária (Código Civil, de 2002 – artigo 1242) – o período
mínimo de posse do imóvel deve ser de dez anos, porém pode ser reduzido
para cinco anos se o possuidor apresentar provas de demonstração de
origem da posse e boa fé. O prazo também é diminuído para cinco anos,
se o usucapiente houver adquirido o imóvel por título oneroso, cujo regis-
tro tenha sido cassado posteriormente, e nele também tiver estabelecido
sua moradia ou dado utilização produtiva. Este é chamado de usucapião
documental ou tabular.

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3) Usucapião especial urbana ou constitucional (Estatuto da Cidade, artigo


1240 do Código Civil, e artigo 183 da Constituição) – o período mínimo
de posse do imóvel deve ser de cinco anos. Aplica-se apenas para imóveis com
área máxima de 250,00 m², utilizados necessariamente como moradia. O
possuidor deve demonstrar continuidade ininterrupta da posse, sempre em
caráter pacífico, e não possuir outro imóvel registrado em seu nome.
4) Usucapião urbana coletiva (Estatuto da Cidade) – o período mínimo de
posse do imóvel deve ser de cinco anos. Aplica-se apenas para imóveis
com área superior a 250,00 m², utilizados como moradia de mais de uma
família, de forma conjunta e pacífica, onde não seja possível individualizar
a porção de terras ocupada por cada possuidor.
O Estatuto da Cidade regulamentou a usucapião urbano coletiva, ampliando
sua abrangência para além do direito individual, conforme definido pela Constituição
de 1988, e assim confirmando a tendência constitucional de socializar o direito
à propriedade, possibilitando a sua utilização de forma coletiva nos casos em que
a individualização da posse exercida separadamente por cada cidadão se mostra
inviável. A usucapião coletiva foi criada como forma de viabilizar a regularização
das ocupações coletivas como, por exemplo, áreas faveladas.
O Estatuto inovou também as regras do processo judicial da usucapião urbana
determinando que o rito de tramitação (forma de caminhamento do processo no
Poder Judiciário) seja sumário, ou seja, deu ao procedimento judicial um ritmo
mais ágil que o anterior, denominado rito ordinário (artigo 14).
Já a usucapião administrativa é o mais novo instrumento jurídico criado
no ambiente do PMCMV, preconizado pela Lei Federal no 11.977/2009, onde a
legalização da posse é feita unicamente através de procedimentos administrativos,
utilizando os parâmetros materiais da usucapião urbana (constitucional), deter-
minando como tempo mínimo de posse cinco anos, utilização como moradia
familiar, área máxima do lote de 250,00m2 e proibição de posse ou propriedade
de outro imóvel urbano ou rural.
A Usucapião Administrativa representa mais uma forma de legitimação da
posse que, de acordo com Salles (2009), para sua concretização:

(...) prescinde, por óbvio, de qualquer intervenção judicial, incumbindo à administração pública, mediante
impulso próprio, assim como de interessados e entidades privadas (art. 50), prerrogativas para, através
da demarcação e da legitimação de posse – instrumentos voltados à outorga da titulação dominial –,
declarar o direito de propriedade privada beneficiando população de baixa renda.

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Para se chegar à outorga do título de propriedade, o ocupante deverá aguardar,


após a outorga da legitimação da sua posse, o decurso do prazo de cinco anos sem
qualquer impugnação ou contestação.
Salles (2009) aponta que, mesmo prescindindo da apreciação do Poder Judi-
ciário, que historicamente sempre deu a última palavra para decidir as demandas
envolvendo o direito de propriedade, não haverá qualquer inconstitucionalidade
na nova fórmula trazida pelo PMCMV, pois ela não traz qualquer forma de trans-
missão coercitiva do direito de propriedade, pois:

a usucapião administrativa representa uma forma para o reconhecimento do perecimento do direito de


propriedade pela inércia ou descaso de seu titular, por exigir que o proprietário seja notificado, pessoal ou fic-
tamente, quando da averbação do auto de demarcação, podendo promover impugnação. Ademais, dispõe de
cinco anos, contados do registro da legitimação de posse, para reclamar ou reivindicar sua propriedade.

É importante destacar que o reconhecimento da situação de fato que legi-


timará a posse dos lotes, não é influenciado pelas irregularidades ambientais e
urbanísticas eventualmente verificadas, uma vez que não interferem ou mesmo
não são, do ponto de vista legal, motivos impeditivos para a aquisição da proprie-
dade por aqueles que as ocupam através do instituto da usucapião. As questões
ambientais e urbanísticas deverão ser objeto de projeto específico no momento de
elaboração da regularização urbanística dos assentamentos.

5 O PMCMV
Há apenas alguns meses veio se somar aos esforços de aplicação da política ur-
bana nacional definida pelo Estatuto da Cidade a aprovação do PMCMV (Lei
no 11.977/2009). Se no Estatuto da Cidade a regularização fundiária era vista
como uma das formas de acesso ao direto à cidade, PMVMV avança no sentido
de delimitar os tipos de assentamentos a serem regularizados e, principalmente,
avança na disponibilização de novos instrumentos para a regularização consi-
derada de interesse social.
O programa pretende preencher lacunas existentes na legislação em vigor,
procurando produzir um marco legal adequado para a promoção da legalização
da posse em assentamentos irregulares no país, permitindo a aplicação definitiva
da função social da propriedade no território urbano brasileiro, em especial para
os assentamentos identificados como de interesse social.
Em seu capítulo III – Da Regularização Fundiária de Assentamentos Ur-
banos – define que:

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(...)a regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais
que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a
garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana
e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (artigo 46).

A nova legislação traz avanços importantíssimos, dando corpo mais volumoso


e, consequentemente, uma visibilidade maior ao princípio da função social da
propriedade imóvel colocando em primeiro plano o enfoque social do direito de
propriedade urbana, em detrimento do enfoque individual, ressaltando “o sentido
da função social da propriedade, que inverte as prioridades, prestigiando o interesse
coletivo em contrapartida com o interesse individual” (SALLES, 2009).
A nova lei instrumentaliza o poder público e demais legitimados com
um conjunto de práticas que resultam numa profunda revolução de métodos,
notadamente para casos de núcleos irregulares considerados como de interesse
social, voltados primariamente aos interesses dos ocupantes dos imóveis a serem
regularizados. São eles:
l a demarcação urbanística – “procedimento administrativo pelo qual o
poder público, no âmbito da regularização fundiária de interesse social, de-
marca imóvel de domínio público ou privado, definindo seus limites, área,
localização e confrontantes, com a finalidade de identificar seus ocupantes e
qualificar a natureza e o tempo das respectivas posses” (artigo 47 – III);
l a legitimação da posse – “ato do poder público destinado a conferir título
de reconhecimento de posse de imóvel objeto de demarcação urbanística,
com a identificação do ocupante e do tempo e natureza da posse”, nos
casos em que não houver questionamento quanto ao exercício da posse,
que deverá ser feita através de procedimentos administrativos, com o re-
conhecimento da posse pelo Poder Executivo municipal, exclusivamente
no âmbito dos cartórios de registro de imóveis, sem a necessidade de
procedimentos ou sentenças judiciais;
l a usucapião administrativa – procedimento administrativo de reconheci-
mento da posse de bem imóvel pelo Poder Executivo (em especial o municipal)
que consolida as fases anteriores (demarcação urbanística e legitimação
da posse) na declaração final de pleno domínio do possuidor do imóvel
regularizado com a inscrição no Cartório de Registro de Imóveis.
Para todos os casos que não se adequarem às restrições para caracterização
como interesse social, deverá ser utilizado o instrumento da Regularização Fundiária
de Interesse Específico. Neste capítulo, no entanto, o programa não traz grandes
avanços, mantendo a necessidade de aprovação de um projeto de regularização

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fundiária prévio, bem como das licenças urbanísticas e ambientais e o respeito às


restrições de ocupação das áreas de preservação permanente.
Mesmo com os grandes avanços da Lei no 11.977/2009, a regulamentação
da Regularização Fundiária de Interesse Social prevista na nova lei exclui uma
parcela considerável dos assentamentos irregulares brasileiros. A nova lei se adequa
à realidade dos grandes assentamentos irregulares (loteamentos e favelas) existentes
nas metrópoles brasileiras, mas deixa de fora parte considerável dos assentamentos
de pequeno e médio porte das demais cidades brasileiras.
O programa traz grandes e importantes avanços, mas existe ainda a neces-
sidade de se pensar em estratégias e metodologias diversas que viabilizem a regu-
larização dos diferentes tipos de assentamentos irregulares urbanos existentes em
nossas cidades. Nesse sentido, discutimos a seguir a metodologia desenvolvida como
parte do projeto de regularização fundiária do loteamento Jaguary, em Amparo.

6 A REGULARIZAÇÃO DO LOTEAMENTO JAGUARY E A METODOLOGIA DOS


KITS JUDICIAIS
Para o desenvolvimento da experiência piloto de regularização fundiária no bairro
Jaguary, no município de Amparo (interior do Estado de São Paulo), procuramos
desenvolver uma metodologia que, em primeiro lugar, fosse de fácil aplicabilidade,
com baixo custo e que permitisse processos de regularização independentes para
cada um dos lotes/moradias.

6.1 O município de Amparo


Amparo está localizado na porção leste do Estado de São Paulo, próximo a Minas
Gerais. Possui divisa com os municípios de Santo Antônio de Posse, Jaguariúna,
Pedreira, Morungaba, Tuiuti, Monte Alegre do Sul, Serra Negra e Itapira, e faz
parte da Área de Proteção Ambiental (APA) Juqueri Mirim.
Com apenas 60.404 moradores, segundo o Censo de 2000, o município é
um caso emblemático da estrutura de expansão urbana das cidades brasileiras
pequenas e médias: segundo o Plano Municipal de Habitação finalizado em
2009, Amparo possui mais de 40 loteamentos irregulares, em geral implantados
nas regiões periféricas do município.
A tabela 3 mostra a comparação entre a taxa de crescimento anual do mu-
nicípio de Amparo em relação ao país, Estado de São Paulo e a média dos demais
municípios com população total entre 20 mil e 100 mil habitantes, para o período
compreendido entre os Censos Demográficos de 1991 e 2000.
A taxa de crescimento anual do município de Amparo (1,94) no período é
pouco superior à média nacional (1,63%) e estadual (1,78%), porém mais do que

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o dobro da média de cidades do mesmo porte (0,77%). No entanto, o dado mais


relevante é o fato de que, diferentemente da realidade de praticamente todos os
municípios brasileiros, a população rural de Amparo cresceu a uma taxa (6,87%)
13 vezes maior do que a de sua população urbana (0,51). Como mostra a tabela
4, diferentemente da tendência nacional, a taxa de urbanização do município de
Amparo caiu de 81,5% em 1991 para 71,8% em 2000.

TABELA 3
Brasil, Estado de São Paulo, Amparo e municípios entre 20 mil e 100 mil habitantes:
taxa geométrica de crescimento anual – 1991-2000
  Brasil Estado de São Paulo Municípios de 20 mil a 100 mil habitantes Amparo
Total 1,63 1,78 0,77 1,94
Urbana 2,45 1,86 - 0,51
Rural 1,30 0,78 - 6,87
Fontes: IBGE/Censos de 1991 e 2000 e Ministério das Cidades. 2005, Elaboração dos autores.

TABELA 4
Amparo: população segundo situação do domicílio – 1970, 1980, 1991 e 2000

Ano

1970 1980 1991 2000

Total 31.908 100,0% 41.603 100,0% 50.797 100,0% 60.404 100,0%

Urbana 20.749 65,0% 28.740 69,1% 41.419 81,5% 43.357 71,8%

Rural 11.159 3.497,2% 12.863 30,9% 9.378 18,5% 17.047 28,2%

Fontes: IBGE/Censos de 1970, 1980, 1991 e 2000 - Elaboração dos autores.

O crescimento desproporcional da população rural não tem relação direta


com produção rural, mas sim com a consolidação e posterior adensamento
dos vários assentamentos irregulares localizados em sua área rural, porém com
características urbanas.
No momento do Censo de 2000, a maior parte dos loteamentos irregulares estava
localizada fora do perímetro urbano do município. Desde a aprovação do Plano Diretor,
todos os bairros consolidados com características urbanas localizados na zona rural
tiveram seu zoneamento mudado para Núcleo Urbano Preexistente (NUP) e, poste-
riormente, em alguns casos especiais, em Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis).
Com a mudança de classificação dessas áreas, os dados do próximo censo, em 2010,
devem apresentar um aumento expressivo da taxa de urbanização do município.
Desde 2006, o governo municipal vem tentando viabilizar a regularização
urbanística e fundiária desses loteamentos. O caso do bairro Jaguary, analisado

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neste estudo, tem sido usado como um modelo de ação municipal também para
os outros loteamentos irregulares.

6.2 O loteamento Jaguary


O Jaguary é um assentamento irregular de pequeno porte, com 342 lotes, implan-
tado em uma gleba particular, no limite sul do município, sem infraestrutura básica
instalada, com lotes e moradias heterogêneas, com tamanhos e tipologias bastante
diferentes entre si. Não difere das situações encontradas em outros parcelamentos
irregulares, no que concerne ao tempo de posse, uso do imóvel, tamanho dos lotes
e origem da posse, ou às condições pessoais de cada um dos proprietários decla-
rados dos imóveis. Ainda que se trate de um assentamento pequeno, com cerca
de 300 famílias, há uma diversidade de situações, que impedem a utilização de
somente uma das modalidades de usucapião ou mesmo a recém-regulamentada
demarcação urbanística.
O projeto, chamado de HABITAmparo, foi estruturado desde o início a
partir de três frentes distintas realizadas de forma conjunta e concomitante:
l regularização urbanística;
l regularização fundiária; e
l mobilização social.
Para a execução dessas três frentes, o trabalho realizado foi feito em alguns
momentos de forma conjunta (como, por exemplo, o levantamento cadastral) e em
outros momentos de forma independente (desenvolvimento dos kits judiciais).
Para identificação da situação da posse e embasamento das ações de usu-
capião, foram analisadas, para cada um dos lotes ou residências existentes no
bairro, as seguintes características: o tempo de posse, a origem dessa posse, a
existência de eventuais títulos legitimadores da posse, o tamanho dos lotes e a
destinação (uso) do imóvel.
Desde o início do projeto foram definidos princípios balizadores para cada
uma das frentes de trabalho:
1) Mobilização social: a população local participou, sempre que possível, de
todas as etapas do projeto. Um dos objetivos finais da mobilização social foi
a reestruturação e a regularização jurídica da associação de moradores.
2) Regularização urbanística: projeto buscou fugir de um urbanismo ideali-
zado, propondo benfeitorias e obras que não acarretassem remoções ou
desapropriações, preservando sempre que possível a área de proteção
permanente ao longo do rio Jaguary e propondo ações mitigatórias para
os danos ambientais irreversíveis.

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3) Regularização fundiária: a usucapião foi escolhida como instrumento de


regularização da posse a ser utilizado, uma vez que o assentamento está
implantado em uma gleba particular. Foi definido também que, devido
à grande variedade de situações encontradas, as ações seriam ajuizadas
de forma individualizada. Como meio de agilizar o processo de análise
da documentação e possível encaminhamento das ações, foram definidos
prazos para entrega e análise da documentação.
O projeto urbanístico original da área previa a implantação de 301 frações
ideais ou cotas, numeradas de 1 a 301, com áreas que variavam de 282,62 m²
a 651,50m². O parcelamento foi implantado sem a aprovação junto à prefeitura
municipal ou ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)
e sem qualquer tipo de benfeitoria relacionada à infraestrutura urbana (rede de
água, esgoto, iluminação pública). As primeiras documentações relativas à venda
de lotes são de 1983. Atualmente, muitas das frações ideais foram subdivididas
ou anexadas, somando um total de 342 lotes, com áreas que variam de 68,67m2
a 4.801,76 m2. As habitações também possuem uma diversidade muito grande
quanto ao tamanho e à qualidade, com áreas construídas que variam de 27,94m2 a
276,68m2. Além disso, parte das áreas originalmente destinadas a espaços de lazer
foi ocupada por residências ou simplesmente cercada por supostos proprietários.
O abastecimento de água é feito através de um poço artesiano e de uma
rede clandestina implantada e mantida pela associação de moradores. A mesma
coisa acontece com a rede elétrica e de iluminação das ruas. Em alguns trechos do
bairro, existe uma rede de esgoto implantada pelos próprios moradores de forma
precária. Porém, de maneira geral, o esgoto corre a céu aberto, diretamente para
os dois cursos d’água existentes nos seus limites.
Dos 342 imóveis levantados no bairro, 272 (80%) possuem edificação e 70
(20%) são lotes vazios. Dos 272 lotes edificados, 182 (67%) apresentaram documen-
tação comprobatória da posse, 75 (28%) se declararam proprietários, porém não
apresentaram documentação para comprovação da posse e para 15 (5%) lotes
edificados não foi identificado nenhum proprietário.
Dos 70 lotes vazios, 40 tiveram documentação comprobatória apresentada,
20 tiveram a posse solicitada, porém sem a apresentação de documentação com-
probatória, e 10 não tiveram nenhum proprietário declarado ou identificado.
Como um primeiro resultado do projeto, após o bairro ter sido considerado pelo
Plano Diretor (Lei Complementar no 01, de 6 de outubro de 2006) como NUP, em
2007 toda a área foi delimitada como uma Zeis (Lei Municipal no 3.321, de 14 de
novembro de 2007). Os padrões mínimos como largura de via, frente mínima ou
mesmo tamanho mínimo dos lotes foram definidos em função da realidade encon-
trada no bairro, a partir dos levantamentos cadastrais realizados em 2006 e 2007.

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A classificação de NUP e posteriormente de Zeis representou o reconhecimento


da existência do bairro e de sua situação de irreversibilidade, como também a intenção,
por parte da municipalidade, de prover a área de infraestrutura adequada, tendo
como diretrizes a melhoria da habitabilidade, a implementação de infraestrutura e
serviços públicos, ao mesmo tempo em que congelou padrões urbanísticos existentes,
como forma de evitar o adensamento ou a expansão futura do núcleo.
Os padrões urbanísticos definidos pela Zeis do Jaguary balizaram a elaboração do
projeto de regularização urbanística. O projeto executivo foi finalizado no primeiro
semestre de 2008 e inclui a retificação do arruamento, a implantação das redes de
água e esgoto e a construção de uma Estação Compacta de Tratamento de Esgoto.
A partir dos levantamentos foram identificados os lotes sem possuidor declarado,
que foram então demarcados como áreas públicas (áreas verdes, de lazer ou de uso
institucional). O projeto está em fase final de licenciamento, sendo que as obras serão
realizadas com verba do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).
Todo o projeto de regularização urbanística usou como base o cadastro dos
lotes e unidades habitacionais existentes elaborado a partir do levantamento de
campo. Esse mesmo cadastro, com as plantas e memoriais descritivos de cada um
dos lotes, deverá ser usado no momento do registro da regularização no cartório
de imóveis bem como documento para o encaminhamento dos processos de
regularização fundiária.
Paralelamente, para a primeira fase da regularização da posse foram iden-
tificados os imóveis construídos com documentação comprobatória consistente
apresentada. Para a identificação da posse foi considerada, além da documentação
apresentada, a cadeia sucessória comprovada da posse. Foram consideradas aptas
às quatro modalidades de usucapião jurídico (urbano, ordinário, extraordinário e
coletivo) 91 residências. Como as exigências definidas por cada uma das modalidades
de usucapião muitas vezes se sobrepõem, dos 91 imóveis selecionados para 16 deles
(18%) existe a possibilidade de uso de apenas uma modalidade de usucapião; para
52 (57%) a possibilidade de uso de duas modalidades distintas; e para 23 (25%) a
possibilidade de uso de qualquer uma das três modalidades de usucapião individual.
No total, 48 (53%), ou pouco mais da metade, se enquadram na usucapião especial
urbana (constitucional), ou seja, lotes utilizados para moradia do possuidor com
área inferior a 250,00m2 e tempo de posse superior a cinco anos.
A principal questão para o encaminhamento da regularização foi justamente
a forma de sistematização dos dados coletados para utilização posterior nas ações
judiciais e, num segundo momento, quem seriam os advogados responsáveis pelo
ajuizamento dessas ações, uma vez que grande parte dos moradores não possui
renda suficiente para contratar defensores particulares e a prefeitura também não
possui pessoal suficiente para se responsabilizar pelas ações.

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A ideia da prefeitura é viabilizar as ações através de convênios com a Defen-


soria Pública e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Porém, existe também
a possibilidade de os moradores contratarem advogados de forma independente.
Em função dessas variáveis foi desenvolvido um kit judicial contendo as
informações necessárias relativas aos imóveis, possuidores e documentação com-
probatória e que poderá ser utilizado de forma independente pelos defensores,
advogados e moradores. A concepção do kit é dos autores, mas seu conteúdo foi
definido a partir de discussões com o Poder Judiciário, a promotoria pública e o
cartório de registros local. A inovação proposta pelos kits é que o morador, após
receber seu kit individual, possa dar início ao processo de usucapião judicial.

6.3 Os kits judiciais


A concepção dos kits judiciais nasceu da necessidade de dar cumprimento aos requisitos
legais existentes para se chegar ao resultado final pretendido, bem instrumentalizando
o processo para o final reconhecimento do direito do possuidor à titularidade do
imóvel por ele ocupado através de sentença na ação de usucapião, em todos os casos
passíveis de utilização das diversas modalidades de usucapião jurídica, e, princi-
palmente, para conceder ao ocupante a prerrogativa de solicitar o reconhecimento
da posse de forma individual e independente do resto do grupo e até mesmo do
poder público municipal. Vale dizer, prioriza também a autonomia dos munícipes
para poderem escolher, dentre os meios que lhes foram proporcionados, aquele
que melhor lhe aprouver.
Cada um dos kits judiciais elaborados possui a documentação necessária para
ajuizamento de uma ação individual e independente de usucapião:
1) Caracterização do possuidor e do imóvel – ficha com dados pessoais do
possuidor (documentação, estado civil, identificação dos moradores da
residência etc.), memorial descritivo do lote e histórico da posse, relatando
toda a cadeia sucessória da posse comprovada.
2) Cópias dos documentos coletados – cópias dos documentos pessoais do
possuidor, cônjuge e moradores da residência e cópias de toda a documen-
tação comprobatória da posse.
3) Histórico do loteamento – relato do assentamento, desde seu surgimento
até o momento atual.
4) Carta de anuência da prefeitura do município de Amparo – carta de
anuência ao processo de regularização fundiária, especificando o lote e o
possuidor e assinado por responsável designado pela prefeitura municipal
(no caso do Jaguary, as cartas de anuência foram assinadas pelo secretário
de Desenvolvimento Urbano).

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5) Cartas de anuência dos confrontantes – declarações individualizadas para


cada um dos confrontes da área a ser regularizada, reconhecendo o pos-
suidor como único usucapiente do imóvel e concordando com o processo
de regularização fundiária do lote. O Kit é montado com as cartas sem
as assinaturas necessárias. Cada um dos possuidores deve coletar as assi-
naturas de seus confrontantes bem como reconhecê-las junto ao cartório
de sua preferência antes do início do processo judicial.
6) Memorial descritivo do lote – memorial descritivo do lote elaborado a
partir de levantamento planialtimétrico específico realizado anteriormente, a
ser utilizado para posterior averbação da regularização, redigido e assinado por
profissional habilitado (no caso do Jaguary, foi feito pelo arquiteto da Secretaria
Municipal de Desenvolvimento Urbano, responsável pelo projeto).
7) Planta cadastral do lote – planta individualizada do lote, realizada a partir
de levantamento planialtimétrico específico realizado anteriormente,
elaborada e assinada por profissional habilitado (no caso do Jaguary, foi
feito pelo arquiteto responsável pelo projeto da Secretaria Municipal de
Desenvolvimento Urbano).
8) Cópia da Lei Municipal no 3.321/2007 – Instituição da Zeis da NUP do
Jaguary (NUP-6A) – cópia da lei que definiu a área a ser regularizada
como Zeis a ser utilizada no ajuizamento da ação de regularização.
9) Cópia das Anotações de Responsabilidade Técnica (ARTs) dos engenheiros
agrimensores responsáveis pelo levantamento planialtimétrico realizado
na área – tanto os memoriais descritivos realizados quanto as plantas
individuais foram elaborados vinculando-os às ARTs do levantamento
planialtimétrico.
Um dos principais problemas encontrados em processos de regularização é o
congelamento da realidade existente. Os kits judiciais ajudam a estabelecer um retrato
fiel do assentamento que pode ser modificado caso a caso quando necessário.
Os kits judiciais relativos à primeira etapa do projeto foram entregues em
dezembro de 2008. Cada morador ou possuidor do Jaguary recebeu uma cópia
do seu kit judicial, ficando a outra cópia guardada na prefeitura municipal, para
efetivação do cadastro das moradias, lotes e possuidores.

7 AVANÇOS E DESAFIOS
Passado pouco mais de um ano da entrega dos primeiros kits judiciais, acreditamos
que a metodologia desenvolvida tem se mostrado eficiente tanto como forma de
sistematizar os levantamentos cadastrais realizados, como também para instigar a
participação ativa da população local nas diversas etapas do processo de regularização

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fundiária. Uma vez com o kit em mãos, o morador pode optar por participar de uma
ação coletiva organizada pelo poder público, ajuizar a ação de forma autônoma ou
mesmo a partir da associação de moradores ou outro tipo de organização coletiva.
Como o projeto foi idealizado, desde o início, como um projeto onde a re-
gularização fundiária e a regularização urbanística deveriam ser implementadas
de maneira concomitante, os resultados obtidos não se restringem unicamente à
questão fundiária.
Do ponto de vista social, a reestruturação da associação de moradores, ocor-
rida em 2007, foi essencial para a realização das diversas etapas. Após a eleição da
nova diretoria, em dezembro de 2007, a associação de moradores passou a parti-
cipar de forma efetiva de todas as atividades do projeto (reuniões, levantamentos
de campo, atividades de educação ambiental etc.). Os problemas sistemáticos
com a manutenção do poço artesiano mantido pela associação ou com a rede de
energia elétrica das vias de circulação deixaram de existir. A organização da coleta
da mensalidade e a prestação de contas sistemática geraram uma sobra mensal de
verba que vem possibilitando a execução de pequenas obras no bairro realizadas
pela própria associação (novo ponto de ônibus, calçamento da entrada do bairro
com paralelepípedos, limpeza de áreas públicas, e a contratação de máquinas de
terraplenagem para nivelamento das ruas de terra). As reuniões no bairro, que
nos dois primeiros anos do projeto aconteciam no centro de saúde, são feitas,
atualmente, sempre na sede da associação.
Uma vez que todo o conteúdo dos kits judiciais foi desenvolvido a partir de
discussões com o Poder Judiciário e a promotoria pública locais, ele representa
uma ferramenta eficiente para a elaboração e ajuizamento dos processos de regu-
larização fundiária, independentemente da modalidade de usucapião escolhida,
através da otimização dos passos processuais necessários para o sentenciamento
final da ação, objetivando uma sensível redução de trabalhos para os envolvidos
(juízes, advogados, promotores, oficiais de justiça etc.) e também do tempo de
tramitação do processo no âmbito judicial.
No entanto, apesar dessa planificação inicial, ingressadas as ações no Poder
Judiciário, verificou-se que alguns conceitos pessoais, notadamente dos juízes e do
oficial do Cartório de Registro de Imóveis, que também se manifesta nos processos
de usucapião, acabaram por imprimir dificuldades que se esperavam superadas,
além de um ritmo lento na tramitação das ações. Isto porque, apesar de toda a
parte técnica ter sido produzida pelo próprio Estado (leia-se prefeitura), o Estado-juiz
não lhe ofertou a credibilidade esperada, estando na expectativa de nomeação de
um perito judicial para conferência dos dados técnicos apresentados nos autos,
como levantamento topográfico, memorial descritivo, rol de confrontantes etc.
Além dessa situação que já se apontou na tramitação da ação, igualmente o oficial

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registrário não conseguiu atinar que o procedimento intentado, por ser oriundo
de um programa oficial de regularização fundiária, não deveria seguir as rotinas
normatizadas pela Corregedoria Geral de Justiça, que dita as regras administrativas
aos Cartórios de Registro de Imóveis. Assim, especificamente, se nas ações de
usucapião normal, essas normas de serviço exigem que os imóveis usucapidos não
contemplem identificação através de número de lote e quadra. No entanto, entendemos
que nas ações de usucapião decorrentes de processo de regularização fundiária
essas regras não deveriam ser utilizadas, na medida em que, embora tramitando
individualmente, essas ações dizem respeito à regularização de um loteamento
irregular como um todo e por isto devem guardar com ele estrita relação, não
obstante existam respeitáveis posições doutrinárias contrárias que, diferentemente,
entendem que a adoção de identificação do imóvel usucapido por número e quadra
pressupõe um parcelamento regularmente instituído e registrado no Cartório de
Registro de Imóveis, o que não é o caso da regularização fundiária.
No entanto, tais dificuldades serão superadas a partir da melhor compreensão
dos agentes estatais que, nesses casos de regularização fundiária, o Estado deve
ser visto como o agente indutor e até mesmo coordenador dos procedimentos,
que deverão ser concebidos de forma una e não sectarizada, como histórica e
ordinariamente vem sendo concebida por seus agentes, quer sejam eles juízes,
promotores, escriturários etc.
A experiência regularizatória vivenciada no loteamento Jaguary evidenciou
que, para se alcançar os objetivos inicialmente propostos, foi extremamente impor-
tante a existência de real interesse aliado à conjugação de esforços dos vários atores
envolvidos no processo. Não basta somente a vontade política do poder municipal,
que é o ente condutor de todo o processo, em realizar todos os procedimentos
pedidos pela legislação vigente. Também se faz necessário que os demais entes
públicos envolvidos (os membros do Poder Legislativo municipal, do ministério
público e, em especial, do Poder Judiciário e todo o aparato estatal a este ligado,
como os serventuários forenses e o oficialato do Cartório de Registro de Imóveis)
tenham a concepção da exata magnitude do problema e das dificuldades que os
cercam. Desse modo, dentro de suas competências funcionais, espera-se que
realizem seus misteres, quando chamados a tanto, com concepções e leituras
pessoais de conceitos e entendimentos normativos o menos possível formais. Essa
prática facilita as ações necessárias, uma vez que a regularização fundiária envolve
assuntos de caráter multidisciplinar, como urbanismo, meio ambiente, registro
público, processos e procedimentos judiciais e extrajudiciais. Cada um destes
requer enfoques normativos complexos, que, se levados às esferas da concepção
formalista, poderão, se não inviabilizar, ao menos complicar o processo com a
elevação dos prazos e custos para a sua finalização.

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Assim, não basta que o Estatuto da Cidade determine que nas ações de usu-
capião constitucional se deva seguir o rito sumário, onde as fases e procedimentos
são racionalizados, se, na prática, os juízes que presidem os processos continuam
a impor às partes procedimentos do rito ordinário. Mesmo considerando-se as
opiniões doutrinárias contrárias, não basta que a Lei no 11.977/2009 diga que o
registro das sentenças de usucapião de um lote em loteamento irregular prescinde
do registro do projeto de regularização junto ao Cartório de Registro de Imóveis,
se na prática o oficial registrário exige, preliminarmente, o registro do projeto de
regularização para posterior registro da sentença de usucapião desse lote integrante
do parcelamento irregular em vias de regularização. Este é um momento não apenas
de desenvolvimento e consolidação de práticas de atuação técnica no âmbito da
regularização fundiária, mas também de consolidação de uma nova cultura jurídica
que incorpore os avanços normativos recentes de forma objetiva e eficiente.
No caso analisado neste artigo, apesar de questões quanto ao entendimento
dos avanços procedimentais dos novos marcos legais, no geral os esforços conjuntos
dos vários atores, mesmo naqueles casos de usucapião onde o procedimento ainda
é de rito ordinário, foi possível racionalizar em muito as fases processuais. Desde
o início, várias foram as reuniões mantidas com juízes, promotores, oficiais de
cartório, vereadores etc. Nessas ocaisões foram discutidas as melhores fórmulas
para, dentro do poder discricionário de cada um deles, se racionalizar os proce-
dimentos necessários exigidos. Assim, a simples aceitação, pelos juízes e promo-
tores, das declarações de anuência dos vizinhos do imóvel usucapido e também
da prefeitura, peças que foram levadas aos autos no bojo do kit judicial, acabou
por proporcionar uma significativa economia de tempo, serviços e de verbas que
seriam despendidas se o procedimento normal fosse o adotado, posto que, para o
mesmo ato, seriam necessários vários procedimentos, tais como: oferta de cópias
do pedido inicial e de plantas e memoriais descritivos dos lotes pelos advogados,
confecção de mandados pela serventia cartorária, deslocamento de oficiais de
justiça para o local visando à citação desses confrontantes, a elaboração de certidão
dessas citações pelos oficiais, e ainda posterior juntada desses mandados nos au-
tos e certificação de que todos os confrontantes foram devidamente citados pela
serventia cartorária do juiz.
Dessa forma, pode-se perceber que, no caso concreto do Jaguary, inicial-
mente houve uma pequena mudança de postura das autoridades envolvidas. Ao
se conscientizarem da gravidade do problema fundiário da cidade, estas passaram
do papel de simples atores coadjuvantes para o de principais condutores do pro-
cesso de regularização fundiária. Mas mesmo com essas alterações de posturas
e entendimentos, foi visível a percepção de que, na maioria dessas autoridades,
o conceito de direito de propriedade ainda é muito ligado a uma concepção in-
dividualista e formal. Tal concepção ainda forma a cultura geral dos operadores

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do direito, em total contraponto aos novos contornos socializantes que o direito


de propriedade vem demonstrando desde o advento da Carta Constitucional, do
Estatuto da Cidade e do PMCMV.

O lugar do jurista nesse processo é central. Já se avançou muito em relação ao Código Civil de 1916, segundo
o qual a questão da propriedade se resumia ao “binômio desapropriação e usucapião”; com o Estatuto da
Cidade, há um marco jurídico compreensível, articulado, integrado e promissor que permite a atuação efetiva
não só do Estado, como de toda a sociedade brasileira no enfrentamento das questões urbanas.

Para isso, é preciso que entendamos que o Direito não é um sistema objetivo, fechado em si mesmo ou
neutro em relação aos processos sociais. É preciso que se reconheça que o Direito brasileiro tem um papel
central no processo de exclusão social e nos processos de segregação territorial, para que possamos
avançar no sentido de compreender como o Direito pode ser um fator e um processo de transformação
social e reforma urbana.

(...) É preciso que seja superado o discurso tradicional da ilegalidade e da inconstitucionalidade e que
sejam construídos argumentos consistentes que validem essa nova ordem jurídica e urbanística (FERNANDES,
2006, p. 22-23)

Considerando que a regularização fundiária é uma das formas de acesso à mo-


radia digna, alguns desafios importantes se colocam em nosso cenário nacional:
l viabilizar a implementação da regularização fundiária dos diversos e tão
diferentes assentamentos irregulares no Brasil;
l fazer com que a regularização fundiária realmente melhore as condições
de vida dos moradores desses assentamentos; e
l criar mecanismos que garantam a permanência da população original nos
assentamentos regularizados, em especial em áreas fortemente visadas pelo
mercado imobiliário formal.
O desafio de regularizar assentamentos em larga escala, deve ser acompa-
nhado de definições conceituais, bem como de políticas locais estruturadas e
eficientes. Ao se discutir os programas de regularização fundiária deve-se pensar,
como apontava Lefèbvre já nos anos 1960, que a propriedade da terra isoladamente
não representa ou garante o direito à cidade.
A partir da noção da função social da propriedade, a regularização fundiária
deve ser entendida como forma de acesso moradia digna, promovendo não apenas
a regularização da posse, mas também a regularização urbanística e ambiental.
A regularização fundiária deverá ser acompanhada idealmente da regularização
urbanística, como forma de prover as áreas irregulares da infraestrutura desejável
e das adequações mínimas desejáveis, como também recuperar o meio ambiente
sempre que possível, promovendo a efetiva conservação das áreas de proteção

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permanente não ocupadas. Por outro lado, deve promover ações mitigatórias para
os danos ambientais considerados irreversíveis.
A metodologia dos kits judiciais permitiu que fosse viabilizadas a regularização
sem a mobilização de muitos técnicos municipais, a partir do trabalho conjunto
da assessoria técnica contratada, da prefeitura e da participação da associação de
moradores, mas também através da participação de representantes do Poder Judi-
ciário local, do ministério público estadual, do Cartório de Registro de Imóveis de
Amparo. Esses órgãos e instituições participaram das diversas etapas do projeto,
adotando, em alguns momentos, procedimentos facilitadores e agilizadores dos
processos judiciais dos registros das sentenças.
Foi possível aferir que a metodologia dos kits judiciais contribuiu em muito
na racionalização das tarefas necessárias para poder ofertar ao morador do lote
irregular o produto final que se propôs inicialmente: os meios necessários para
a formalização da sua titularidade dominial perante o Cartório de Registro de
Imóveis sobre o imóvel por ele e sua família habitado. Dessa forma, mesmo após o
advento da Lei no 11.977/2009, que muito inovou quanto aos procedimentos para
se chegar ao mesmo ponto, a metodologia dos kits judiciais não se tornou obsoleta,
na medida em que essas facilidades operacionais somente são possíveis naqueles
imóveis com área inferior a 250 m2, o que não é a realidade de uma grande parte
de loteamentos irregulares existentes nas cidades pequenas e médias.
Por fim, é importante constatar que um elemento primordial para o sucesso do
processo regularizatório é a presença e atuação proativa dos destinatários finais dessas
ações: os moradores do loteamento Jaguary. No início dos trabalhos se fizeram
presentes de forma individual, devido à pouca representatividade da associação
de moradores. Todavia, com o incentivo à mobilização promovido pela equipe
condutora dos trabalhos de coleta de dados, algum tempo depois os moradores
compreenderam a importância e a necessidade de se fazerem representar de forma
institucional pela associação de moradores existente, mas desde que ela tivesse
legitimidade e representatividade para tanto. A equipe técnica foi responsável pela
reestruturação da associação, primeiramente com o convencimento dos moradores
para participar do processo de escolha de uma nova diretoria para a associação de
moradores. Com a reestruturação, a entidade passou também a fornecer impor-
tantíssima colaboração para os trabalhos técnicos, nas discussões dos problemas
enfrentados e na busca de soluções.
Essa primeira experiência envolvendo os kits judiciais foi feita através de asses-
soria técnica contratada pela prefeitura , mas pode ser feita no âmbito das próprias
administrações municipais e mesmo pelas próprias associações de moradores.
É importante que os programas de regularização fundiária não se restrinjam
a ter um caráter meramente curativo, sendo necessário estarem sempre associados

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a outras políticas públicas, assim como por políticas preventivas, que possibilitem
a oferta de outras formas de acesso à moradia digna que não exclusivamente pela
autoconstrução em loteamentos ilegais. A regularização fundiária apenas não
pode ser encarada como a solução da informalidade e precariedade habitacionais
brasileiras. Somente uma política habitacional que inclua a provisão de moradia
subsidiada paralelamente a projetos de regularização urbanístico-fundiária poderá
ser vista como a solução almejada para o déficit habitacional brasileiro.

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