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Economia Monetária – Henrique de Freitas Cópio 19/0014253

Entrevista de André Lara Resende


transmitida ao vivo em 12 de fev. de 2023
no Canal Livre
André Lara Resende é um dos idealizadores do Plano Real, ex-diretor do Banco Central e recém
nomeado para a Comissão de Estudos Estratégicos do BNDES. Nessa entrevista, ele aborda a
atual conjuntura econômica brasileira, destacando a atual taxa de juros, a autonomia do Banco
Central e as reformas que o Brasil precisa aprovar no Congresso Nacional.
https://www.youtube.com/watch?v=tuPETK1-9kU

Inicialmente, André Lara começa a entrevista explicando que o Banco Central não é
independente, mas sim autônomo. Ele afirma que um BC autônomo, com mandatos separados
e não coincidentes com os do poder executivo, é de extrema importância para que o país possa
ter mais previsibilidade, evitando perturbações bruscas no mercado financeiro e na economia.
Entretanto, ele afirma que, por mais que a política monetária deva estar dissociada do meio
político, ela não deixa de ser uma ciência social atrelada a diversas circunstâncias políticas.
Antigamente a economia monetária girava ao redor de agregados monetários e, hoje, ela
basicamente trabalha apenas com a taxa básica de juros e, por isso, a definição dessa taxa deve
levar em conta alguns aspectos políticos e sociais, e não apenas a parte técnica.

Segundo o economista, a taxa atual de juros de 13,75% (Essa taxa já foi reduzida para
13,25% em junho) está profundamente errada, e vai de encontro a ideia de adotar uma
condução suave da economia para não afetar demais os mercados. Atualmente, a taxa de juros
real brasileira é a maior do mundo e está por volta de 8%, mais que o dobro da segunda maior
taxa real do mundo. Essa taxa de juros altíssima provoca desemprego e um desaquecimento
muito grande e desnecessário na economia e, ao mesmo tempo, não provoca tanto impacto na
inflação. Isso ocorre pelo fato que, com a informalização do emprego e a perda de poder dos
sindicatos, o salário deixou de ser um aspecto que sinaliza a inflação. Então, na maioria dos
países, a Curva de Phillips deixou de ser válida, uma vez que o desemprego e a inflação não
possuem mais uma correlação significante.

Além disso, André Lara diz que a inflação atual não pode ser resolvida pela taxa de juros,
pois está muito mais relacionada com choques negativos de oferta causados pela desorganização
produtiva advinda da pandemia e com a guerra da ucrânia, que pressionou os preços da energia,
combustíveis e alimentos. Para Lara, os sinais negativos de desaceleração da economia causado
pela taxa básica de juros já estão aparecendo. A diminuição do consumo e do investimento fez
com que o desempenho do varejo entrasse em queda e os resultados dos bancos viessem muito
abaixo do esperado, provocando uma redução na oferta de crédito e, consequentemente, um
agravamento na contração da economia. Ou seja, claramente a atual taxa de juros não está
sendo compatível com os objetivos do Banco Central de garantir estabilidade do sistema
financeiro e pleno emprego.

Em seguida foi abordado o tema de risco fiscal, e André Lara fez questão de reforçar que
o Brasil não precisa se preocupar com isso, pois tem um bom histórico de superávits primários e
a nossa dívida pública caiu para 73%, menor patamar dos últimos 7 anos. Essa dívida é bem
menor que a de países desenvolvidos, como EUA e Japão, e está de acordo com a de países em
desenvolvimento. Segundo ele, o grande problema da dívida são os nossos juros exorbitantes,
títulos com taxas de IPCA+6% os quais não são encontrados em nenhum outro lugar do mundo
e custaram, só em 2022, cerca de 4% do PIB brasileiro. Uma redução desses juros também
provocaria uma queda no custo da dívida e diminuiria o risco de déficit e o risco fiscal. Nesse
momento, André Lara faz uma indagação interessante: Porque todos reclamam do Bolsa Família,
que possui um custo irrisório, e não se indignam com o “Bolsa Rentista”, que custa 4% do PIB
anualmente.

Na sequência, Lara foi questionado sobre o papel do Estado no desenvolvimento


econômico do Brasil. Ele explicou que, primeiramente, é preciso desmistificar a crença de que o
Estado só atrapalha e sem ele a economia capitalista funcionaria perfeitamente. O capitalismo
é, de fato, eficiente para a criação de riquezas, mas não tão eficiente assim na distribuição destas.
Logo, o Estado tem papel fundamental na política social, saúde, educação e segurança, por
exemplo. Fora que, a economia depende de regulamentação e regras provenientes do Estado
para que possa existir em equilíbrio.

Para o economista, o Brasil é um país rico e educado, mas muito desigual. A solução para
a pobreza endêmica brasileira é o verdadeiro desenvolvimento, crescimento do capital humano
em educação e saúde principalmente. As políticas assistencialistas são paliativas, não resolvem
esse problema, mas são extremamente importantes durante o caminho até a eliminação das
desigualdades. Para que o Brasil atinja esses objetivos, é necessário aderir a um programa de
investimento de longo prazo, assim como foi feito em alguns países asiáticos, como a China, que
multiplicou a sua renda per capita em 20x nos últimos 40 anos. Esses países conseguiram ter um
crescimento tão relevante graças às suas taxas de investimentos superiores a 30% do PIB. No
Brasil, a taxa de investimento é de cerca de 17% do PIB, sendo que apenas 2% são do setor
público. Esse baixo valor não é suficiente nem para manter a atual infraestrutura do país, e é
consequência do limite de gastos com o teto constitucional. Como os gastos obrigatórios
continuam crescendo, sobretudo os gastos previdenciários, os investimentos públicos ficam cada
vez mais comprimidos. Talvez fosse mais interessante substituir esse orçamento inflexível por
outro baseado em metas que permitiria ajustes de acordo com critérios coerentes com a
situação econômica do país e seus objetivos.

Chegando no final da entrevista, André Lara falou um pouco sobre a atuação do BNDES
nos próximos anos. Segundo ele, o BNDES devolveu bilhões de reais ao Tesouro, reduziu sua
capacidade de empréstimo e praticamente perdeu sua função nos últimos anos. Então a ideia é
retomar os projetos de investimento em desenvolvimento em um programa longo de 10 anos
que será revisto permanentemente. Para Lara, pensando no curto prazo, o setor de
infraestrutura física e social, como habitação e saneamento, merece mais atenção, pois possui
um retorno imediato para a população e movimenta a economia por meio da construção civil.
Além disso, o investimento em educação básica e em meio ambiente são os mais importantes
para o longo prazo, pois contribuem para o nosso capital humano e trazem credibilidade ao país.
Os recursos para esses investimentos viriam do FAT (Fundo de Apoio ao Trabalhador), mas o ideal
seria que o Tesouro capitalizasse mais o BNDES para que ele pudesse ser mais atuante. Por fim,
novamente André Lara Resende reforçou que a atual taxa de juros é incompatível com a
conjuntura econômica brasileira e impede qualquer tipo de investimento. Para ele, o BC deveria
colocar a taxa de juros acima da taxa de inflação e abaixo da taxa de crescimento potencial da
economia, isso permitiria um ganho real e não prejudicaria os investimentos.

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