Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Introdução
Gaza inicia colheita de arroz de origem chinesa, em Jornal O País, 15 de Abril 2009
1.1 Sobre a Agro-pecuária e Moçambique
Empregando mais de 80% da população rural e contribuindo com 25% do PIB do País,
a agro-pecuária é uma actividade económica importantíssima para Moçambique, um
país com 5,6 milhões de hectares de terras agrícolas, ocupadas predominantemente
por mais de 3,7 milhões de pequenas e médias propriedades.
Dos dados estatísticos que se seguem, saltam à vista os mais de dois terços de
população rural do país e os assombrosos 98.7% de extensão agrícola entregue a
essas pequenas e médias explorações – as machambas.
Distribuição da População e respectiva Densidade Populacional
31.6%
População
Urbana
68.4%
População
Rural
Fonte:
Instituto Nacional de Estatística
2010, Projecções Anuais da População
Total, Urbana e Rural 2007-2040
2013, Censo Agro-Pecuário
A zona do Regadio do Baixo Limpopo é uma área com terra arável, propícia para a
prática de agricultura, há muito caracterizada por uma dupla dualidade:
Sistema de Produção Cooperativo Vs. Sistema de Produção Empresarial/Estatal; e
Sistema de Produção Familiar Vs. Sistema de Produção Comercial.
Após a independência, algumas das zonas de drenagem ao longo das encostas
arenosas do regadio foram entregues a cooperativas agrícolas, enquanto a zona
aluvionar do Regadio viria a permanecer predominantemente entregue à exploração
empresarial/estatal e à criação de gado bovino.
Por volta do ano 2000 estes sistemas começam a sofrer algumas transformações. As
áreas outrora geridas pelas cooperativas são repartidas em pequenas explorações
de tipo familiar e organizadas em associações que, por sua vez, são aglomeradas
em Casas Agrárias. Ao mesmo tempo, as áreas exploradas pelas antigas empresas
estatais começam a ser exploradas por associações de produtores comerciais
emergentes e por empresas agro-industriais.
Após vários modelos de gestão e várias transformações estruturais, o governo cria
em 2010 o Regadio do Baixo Limpopo, Empresa Pública (RBL), a quem é então
entregue a gestão do Regadio.
Representando cerca de 80% da terra destinada à exploração agrícola do distrito, o
Regadio é fundamental para a segurança alimentar da região.
BAIRRO_UNIDADE
BUCUCHA
MACALAUENE
MABECUANE
Ü MAIVENE
MUXAXANE_ou_4o._CONGRESSO
MUCOTUENE MUXEQUETE
MUDADA
Chibuto
Î
Mapa do Regadio
Gentilmente cedido pela RBL
COMBO
R. Changane
CHIHENHE
CHALUCUANE
7_DE_SETEMBRO
COXAMBANE
MAZUACANHANE
UALAMUSA
R.
Lim
L. Lungué
po
po
EDUARDO_MONDLANE
GUAIANE
KOCA-MISSAVA MBAGANHANE
BAMBANE
ZUZA
CHIDUACHINE
CHINANGA CHICAVAN
CHEGUA
ZUZA
ZIMBA
GUEMULENE
AGOSTINHO_NETOMANIQUENIQUE
MUJONJO
LUIS_CARLOS_PRESTES
BANGO CHIRRINE
HICOLUE
L. Sacativa
ANE
E_B Muzingane
MADOCA
CONGUE
Centro de Cerviços
CHAU
IB Gumbane
MAO-TSE-TUNG
ZACANHE
CAFA
CAFA
Nhacutse
SRP
SRP
EP 1
SR
P
1
""
î
Ð
EP
CF I
AGOSTINHO_NETO "
LANGUENE E_B_Magula
NGUENHA
SR
SRP SRP P
SRP
issano
3º_DE_FEVEREIRO
EP 1
Poiombo
EP
IB Languene
1
CT 2 SG EP 1
NO_SEDE CHIPENHE SG
NGUAVA PHICHO CT 2
EP 1
SG
SG
CT 2 CT 2
EP 1
G
CT 2
EP 1
NGULELENE SG
CT 2
SG S
CT 2 CT 2 Nhocoene
CFSG
2
I
CT 2
CT
Parque de Maquinas CT 2 EP 1
2
CT SRP SRP
CT 2
P1
SG Ciaia
CF IV
SR
RP
C
SG
CT 2
MACHALUCUANE
CF IV
CT 2
Nhocoene
SG
SG
SG
CT 2 CT 2
Centro de Cerviços
SR
SG SG
P
VOZ_DA_FRELIMO MAHAGUENE BRIDGE CT 2
SG
SG
BRIDGE G
SG
SG S
CT 2
CT 2 EP
INHASP2 1
SG
Centro de Cerviços CT 2
EP 1
CT 2
TOTOE CAVELAN
SG
CT 2
EP
SG
1
CHICUNBANE SG
SG
CT 2 EP 1
BRIDGE SG
BR
SG
CT SG
E_B_Chimbonhanine 2 SG
EP
CT 2
IDG
E
Lhuvucaze
SG
Parque de Maquinas
CT
CT
SG
2
2
ZICAI CF I TUINE
SG
I
MANGUELANE EP 1
SG SG
CF
1
SG SG SG
SG
SG
EP
CF IV
SG
SG
SG
SG
CT 2
SG SG
CF IV
SG S
SG SG G SG
BRIDGE SG SG
SG
CT 2
CT
CF V
BR
SG
SG
2
PONELP2 CF V CT 2
V
IDG
SG F
E
C
SG
C
T
2
SG
CF
SG
CT 2
V
CHIRINDZENE CT 2 CF V
CT
2
SG
2 SG EP 1 Chongoene
SG CT
1
SG CF V
CF V
EP
MABANWANE SG
CT
CT 2
SG
MANGO/OMM Centro de Cerviços
2
CT 2
CHICONELA 2
CF V
CT
SG
C.
CT
CF I
CT
2
CF IV
X
C
2
F
SR
V
P
SR
IV
P
ai_
CT 2
SR
Chongoene
CF
P
SG
Xa
CT
i
2
CF V
SG
C Î MUXEXANE
IV F
CT V
La
2 CF
BRIDGE
go
SR BRIDGE CT 2 CF IV
a
P
CT 2
SG
CF V
Pa
CF I UMBAPP3 CT 2
ve
SG
SR
CF I
P
PONELP1 BRIDGE BRIDGE
Inhamissa
BRIDGE
SG
UMBAPP2
CF
SG
BR
SG
V
G
2 S
IDG
CT 2 CUMIN
GE
E
UMBAPP1 CT
2
CT
CT 2
CT 2 SG
CT 2
2
TLACULA E_B Ponela CF V
CT
BRID
SG
CF CT 2 CT 2
Centro de CerviçosCF III III
CT 2
MAHENGANE
BRIDGE I
CF V
CT 2 SG
CF ANGLUP1
CF I FIDEL_CASTRO
BR
SG
II
CF V
IDG
PIOMBO
E
CF
CF II
MBALUINE
Administrador
"
"
R. Limpopo î
Ð
Grilo
"
î
Ð
"""
NGOANIN
Portador MAPFUINE
""
î
Ð
"
CHIBILENE
ARMANDO_TIVANE
VOZ_DA_FRELIMO
CUMBANE
GUTSUINE 24_DE_JULHO
MABOIA
TIVANE(SIAIA)
MAHILANE
NHOCUENE
SALVALA/SALVADOR_ALLEND
NHACOMENE
NHAMBANGA
Î Legenda:
BUNDZULANE
MAHELENE Infraestruturas de rega Uso e Cobertura da Terra Area do Regadio Baixo Limpopo
Pontos de Tomada de água Casas Agrárias
"
M Tomada_dagua BLOCO DE PONELA Nhacutse
Habitacoes
Janeiro, 2014
1.3 Sobre a Wanbao
Segundo muitos dos camponeses afectados pelo projecto, os visados não foram
sequer devidamente informados, quanto mais consultados, durante o processo que
culminou com a usurpação das suas terras pela Wanbao. A perda da terra onde
produziam há mais de 30 anos ocorreu sem transparência e sem indemnizações, com
a agravante que na altura em que as máquinas da Wanbao “limparam” os campos,
“limparam” também culturas em fase de maturação de muitos camponeses. Este
facto é confirmado pela inexistência de uma cópia da acta da consulta comunitária
quer nos arquivos das estruturas locais, bem como nos da Direcção Provincial do
MICOA, nos da RBL e nos da Wanbao. Aliás, apesar de imprescindível para todo o
processo de licenciamento do projecto, esse documento nem consta do seu REIA.
As consultas comunitárias são extremamente importantes para evitar conflitos
futuros. Tipicamente, na consulta à comunidade discutir-se-iam as razões da
reunião, os dados do projecto proposto, a legislação de terra em relação a este
processo e os direitos da comunidade. Aos membros da comunidade seria dada
oportunidade para fazer perguntas e discutir prós, contras e demais implicações
do projecto.
A Lei de Terras estipula que os “acordos ou promessas feitas durante as consultas
à comunidade são incluídas na acta da consulta e são consideradas obrigatórias”
(Regulamento da Lei de Terras, Decreto 15/2000 de 20 de Junho, Decreto 45/2004
e o Decreto 31/2012 de 8 de Agosto).
Embora na opinião de muitos elas lamentavelmente tenham muito pouco peso no
processo legal, as consultas comunitárias não são facultativas e existem por algum
motivo.
Uma queixa recorrente dos camponeses é a violação sistemática dos seus direitos
laborais. Trabalho sem contratos, salários abaixo do tabelado, horas extras sem
remuneração, rescisão de contratos unilateralmente sem justa causa e alguns casos
de maus tratos aos trabalhadores moçambicanos.
2.4 Agrotóxicos?
Tudo leva a crer que o projecto Wanbao use agrotóxicos (químicos usados para
o controle de pragas, para prevenir doenças causadas por micro-organismos e
para impedir o crescimento de outras plantas que não sejam as do cultivo). Estas
substâncias, quando utilizadas em larga escala (como, dada a envergadura do
projecto, se supõe que seja o caso) podem causar sérios problemas ao meio ambiente.
Num ecossistema como o do Regadio do Limpopo, o risco está na contaminação de
solos e águas e consequentemente da fauna e flora da região. Um uso excessivo/
desregulado de agrotóxicos poderá, por exemplo, ameaçar seriamente a população
de várias espécies de peixes do Rio Limpopo.
De acordo com a sua tradição, várias famílias das comunidades locais enterravam
os seus mortos dentro do perímetro hoje concessionado à Wanbao. Face a isto, a
empresa custeou a exumação de parte dessas sepulturas, enquanto noutros casos,
as campas foram simplesmente removidas sem qualquer cuidado ou critério.
Importa referir que, para que também estivessem presentes na reunião, a RBL
ficara incumbida de contactar o líder da Comunidade de Chimbonhanine e um
representante do Comité dos Camponeses, no entanto, tal não aconteceu e estes
não teriam participado caso a JA não os tivesse contactado e ido buscar.
A RBL fez-se representar no encontro por dois técnicos da sua área social.
3.1 Reunião, dia 20 de Outubro de 2015
A Lei é bem explícita quando diz que “a terra é propriedade do Estado”, isto
significa que pertence ao povo moçambicano.
A obrigatoriedade de consultar as comunidades locais antes de acolher investidores
e outros interessados na terra, é considerada uma das principais inovações da Lei
de Terras (Artigo 13, número 3). Para haver ocupação de terra, o investidor (ou
o Estado), na condição de (novo) requerente, é obrigado por Lei a realizar uma
consulta comunitária com a finalidade de determinar se a área pretendida está
livre e não tem ocupantes.
Mas será que a aquisição de um Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT)
por pessoas singulares ou colectivas (nos termos da alínea c) do artigo 12 da Lei
n.º 19/97, de 1 de Outubro) se sobrepõe às demais formas de aquisição fixadas
no mesmo artigo? Nos termos do nº2 do artigo 13 do mesmo dispositivo legal, a
ausência de título não deve prejudicar o direito de uso e aproveitamento da terra
adquirido por ocupação por pessoas singulares e pelas comunidades locais, segundo
as normas e práticas costumeiras e ocupação por pessoas singulares nacionais que,
de boa-fé, estejam a utilizar a terra há pelo menos 10 anos.
Por sua vez, a Constituição da República de Moçambique (CRM) acautela que a
política económica do Estado é dirigida à construção das bases fundamentais
do desenvolvimento, à melhoria das condições de vida do povo, ao reforço da
soberania do Estado e à consolidação da unidade nacional através da participação
dos cidadãos, bem como da utilização eficiente dos recursos humanos e materiais,
sem prejuízo do desenvolvimento equilibrado. Mais, o Estado garante a distribuição
da riqueza nacional, reconhecendo e valorizando o papel das zonas produtoras,
sendo que é seu dever promover, coordenar e fiscalizar a actividade económica
agindo directa ou indirectamente para a solução dos problemas fundamentais
do povo e para a redução das desigualdades sociais e regionais. O seu papel é
impulsionar a promoção do desenvolvimento de forma equilibrada.
Tal não sucedeu neste caso.
Importa referir também que os órgãos de Administração Pública têm o dever
de responder aos pedidos de esclarecimento por parte do cidadão, bem como
de ponderar e tomar posição sobre as observações, sugestões e recomendações
feitas. (Ao abrigo do Decreto 30/2011 de 15 de Outubro e a Lei nº14/2011, de 8 de
Fevereiro).
A Lei moçambicana é clara e rigorosa, pelo desenvolvimento sustentável e
equilibrado, pela não violação dos direitos humanos dos cidadãos e pela justa
indemnização/compensação em caso de qualquer dano resultantes da actividade
económica.
Não é que o projecto agrícola da Wanbao no Regadio seja uma má iniciativa, mas
a realizar-se deveria ter por base uma relação harmoniosa com as outras partes
interessadas, bem como com a natureza, o que infelizmente, não é o caso.
Este conflito, à imagem de outros, é uma indicação de que é necessário que se
enveredem mais esforços para optimizar estes processos, para que de futuro
decorram de forma mais transparente, inclusiva e democrática. Todas as partes
deverão ser integradas nas decisões tomadas e essas decisões devem ser guiadas
por uma abordagem holística, onde todas as dimensões do pretendido (ambientais,
sociais, culturais, espirituais e económicas) sejam contempladas. Isto só pode ser
alcançado se o contributo de todas as partes envolvidas for levado em conta.
O principal objectivo deste documento é contribuir para a resolução do conflito e
trazer justiça às partes afectadas.
5. Recomendações
6. As leis do país são para respeitar e cumprir. Os Estudos de Impacto Ambiental não
são facultativos, devem ser elaborados o mais cuidadosamente possível e devem
honrados. Eles existem para nos salvaguardar;
Titulo
No Regadio do Baixo Limpopo
Autoria
Gizela Zunguze
Publicação
Justiça Ambiental – Amigos da Terra Moçambique
Coordenação e Revisão
Anabela Lemos
Daniel Ribeiro
Trabalho de Campo
Gizela Zunguze
Manuel Chaúque
Samuel Mondlane
Xavier Pene
Daniel Burgos-Nyström
Edição de Texto e Layout
Outra Perspectiva
Fotografia da Capa
Samuel Mondlane
Distribuição Gratuita
O conteúdo desta publicação é de inteira responsabilidade da Justiça Ambiental
e de nenhuma maneira reflecte a posicão ou opinião dos financiadores.