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Orientações para médicos, pais e cuidadores

1ª EDIÇÃO

AUTORA E ORGANIZADORA:
Karolyne Michele Moura Raftopoulos

AUTORES E COLABORADORES:
Ana Carolina Madureira Nunes
Ana Clara Rivetti Bitencourt de Paula
Antoine Doffémond Colares
Isabela Maria Garcia
Juliana Aguiar Cavalcante Diniz
Larissa Mansur Alves Pereira
Luiza Lins Khoury
Mariana Pertence de Sousa e Silva
Mariana Reis Di Mambro
Mateus de Carvalho Barbosa
Nayara Neves de Alcântara
Patrícia Mendes Violante
Victor Gabriel Oliveira Pessoa

BELO HORIZONTE

2021
Este ebook ou qualquer parte dele não pode ser reproduzido sem referenciar os autores. São de
responsabilidade dos autores as informações contidas nesta obra, bem como as referências
bibliográficas. Nesses casos, as referências foram ordenadas alfabeticamente.

Autora e organizadora:

Karolyne Michele Moura Raftopoulos

Autores e colaboradores:

Ana Carolina Madureira Nunes Mariana Pertence de Sousa e Silva

Ana Clara Rivetti Bitencourt de Paula Mariana Reis Di Mambro

Antoine Doffémond Colares Mateus de Carvalho Barbosa

Isabela Maria Garcia Nayara Neves de Alcântara

Juliana Aguiar Cavalcante Diniz Patrícia Mendes Violante

Larissa Mansur Alves Pereira Victor Gabriel Oliveira Pessoa

Luiza Lins Khoury

Catalogação na Publicação (CIP)

Raftopoulos, Karolyne Michele Moura


R139s A saúde de crianças e adolescentes adotados : orientações
para médicos, pais e cuidadores / Karolyne Michele Moura
Raftopoulos ... [et al]. – 1. ed. – Belo Horizonte : Páginas
Editora, 2021.
108 p.

Formato: pdf
Modo de acesso: World Wide Web
https://doi.org/10.29327/540783
ISBN 978-65-5079-060-8

1. Saúde 2. Pediatria 3. Adoção I. Título

CDD: 618.92

Bibliotecária responsável: Cleide A. Fernandes CRB6/2334

Em casos de dúvidas ou convites para palestras, mande e-mail para livrosaudeadocao@gmail.com


INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................................ 5

PRIMEIRA CONSULTA PEDIÁTRICA APÓS A ADOÇÃO: QUAIS EXAMES SÃO IMPORTANTES? ............... 8

LACTAÇÃO ADOTIVA ........................................................................................................................................................ 16

A VACINAÇÃO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO CONTEXTO DA ADOÇÃO .......................................... 21

O CRESCIMENTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: COMO ANALISAR ESSE PROCESSO DE FORMA


OBJETIVA? ............................................................................................................................................................................ 33

USO DE SUBSTÂNCIAS DURANTE A GESTAÇÃO: COMO DIAGNOSTICAR E QUAL É O IMPACTO NA


CRIANÇA? ............................................................................................................................................................................. 39

“ADOÇÃO POSITHIVA”: AS DÚVIDAS MAIS COMUNS AO ADOTAR CRIANÇAS E ADOLESCENTES HIV+


................................................................................................................................................................................................. 48

DESENVOLVIMENTO AFETIVO-EMOCIONAL E A RELAÇÃO COM O ABANDONO E A ADOÇÃO ............ 54

MARCAS DA VIOLÊNCIA: OS EVENTOS ADVERSOS VIVIDOS NA INFÂNCIA E O IMPACTO NA SAÚDE


................................................................................................................................................................................................. 61

PSIQUIATRIA E ADOÇÃO: PRINCIPAIS DIAGNÓSTICOS E COMO LIDAR COM ELES .................................. 68

VIOLÊNCIA SEXUAL NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA .......................................................................................... 77

O COMPORTAMENTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE APÓS A ADOÇÃO: ADAPTAÇÃO E


PREVENÇÃO DA DEVOLUÇÃO ...................................................................................................................................... 85

DISTÚRBIOS DO SONO EM CRIANÇAS ...................................................................................................................... 94

DENTIÇÃO E CUIDADOS BUCAIS .............................................................................................................................. 104


INTRODUÇÃO

Karolyne Michele Moura Raftopoulos

Adoção é o processo afetivo, legal e definitivo por meio do qual uma criança ou
adolescente passa a ser filho de um adulto, com relações jurídicas idênticas às que
resultam de uma filiação de sangue, possibilitando à convivência familiar e
comunitária. Essa medida excepcional só é aplicável depois de esgotados todos os
recursos para a manutenção da criança ou adolescente na sua família biológica ou
extensa (parentes maternos ou paternos), sendo indispensável a intermediação da
Vara da Infância e Juventude, tendo sempre como objetivo o melhor interesse da
criança ou adolescente a ser adotado(a).

A institucionalização (para posterior encaminhamento para família extensa ou


substituta) é necessária quando a criança ou adolescente estiver em situação de
vulnerabilidade social ou risco pessoal. É importante ressaltar que a pobreza não deve
ser, por si só, uma causa de abrigamento. O artigo 23 do Estatuto da Criança e do
Adolescente é claro ao afirmar que "a falta ou a carência de recursos materiais não
constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio poder". Dessa forma,
a necessidade de institucionalização é multifatorial, abrangendo muitas vezes a
negligência, violência física e/ou sexual, abandono, dependência química dos
genitores, envolvimento com ato criminoso, cárcere dos pais ou responsáveis,
vivência de rua, orfandade e outras situações que gerem risco para a criança ou
adolescente. Todas essas questões demonstram que por trás da adoção existe uma
história de dor e vulnerabilidade, que podem deixar marcas profundas na saúde
psíquica e física do indivíduo.

Na minoria dos casos, a institucionalização é feita logo após o nascimento, seja


por entrega voluntária (devido à falta de recursos financeiros, materiais e psicológicos
ou em situações em que não há desejo pelo exercício da maternidade, muitas vezes
associado a ausência de parceiro que assuma a paternidade) ou por uso abusivo de
drogas ilícitas pela genitora durante a gestação e o trabalho de parto. Se não houver
a indicação do genitor e se ninguém da família extensa pretender receber a guarda, o

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juiz decretará a extinção do poder familiar e determinará a colocação da criança sob
a guarda provisória de quem estiver habilitado a adotá-la ou de entidade que
desenvolva programa de acolhimento familiar ou institucional.

Além das dificuldades oriundas das relações familiares disfuncionais, muitas


crianças ao serem abrigadas se deparam com longos processos judiciais, em que sua
estadia teoricamente transitória passa a se tornar uma institucionalização prolongada.
Essa realidade pode dificultar o processo de adoção (já que a maioria dos habilitados
desejam adotar crianças mais novas) e causar mais malefícios para a saúde a para o
desenvolvimento afetivo, já que algumas instituições, por lidarem com muitas crianças
e terem recursos financeiros limitados, não conseguem oferecer as condições ideais
de atenção, individualidade e acompanhamento médico, em comparação com a
vivência em uma família substituta. Essa realidade pode levar a atrasos de
diagnósticos, tratamentos e reabilitação, sendo necessária uma abordagem
diferenciada pela equipe de saúde ao atender uma criança que vive em abrigo ou que
foi adotada. Dessa forma, esse livro foi desenvolvido com o objetivo de informar
profissionais da saúde, cuidadores e familiares sobre questões de saúde específicas
dessa população infanto-juvenil.

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REFERÊNCIAS

SILVA, Eliane Oliosi Mazim. AS CARACTERISTICAS E OS PRINCIPAIS MOTIVOS QUE LEVAM


CRIANÇAS E ADOLESCENTES AO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL NO MUNICÍPIO DE VILA
VELHA/ES. 2016. 106 f. TCC (Graduação) - Curso de Serviço Social, Centro Universitário Católico de
Vitória, Vitória, 2016.

RIO DE JANEIRO. MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO DE JANEIRO. O que se entende por


adoção? Disponível em: https://www.mprj.mp.br/documents/20184/135969/Sobre_Adocao.pdf.
Acesso em: 11 abr. 2021.

RIO DE JANEIRO. KAMILA CARRILHO CAETANO MANOELI. Cartilha – Adote Um Amor 2021.
Elaborada pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Disponível em:
https://www.mprj.mp.br/documents/20184/135969/Sobre_Adocao.pdf. Acesso em: 11 abr. 2021.

BRASIL. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do


Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,
Brasília, DF, 16 jul. 1990. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm#art266>. Acesso em: 16 dez. 2020.

VECTORE, Célia; CARVALHO, Cíntia. Um olhar sobre o abrigamento: a importância dos vínculos em
contexto de abrigo. Psicol. esc. educ., Campinas, v. 12, n. 2, p. 441-449, dez. 2008. Disponível em
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
85572008000200015&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 20 jul. 2021.

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CAPÍTULO 1 - PRIMEIRA CONSULTA PEDIÁTRICA APÓS A
ADOÇÃO: QUAIS EXAMES SÃO IMPORTANTES?

Antoine Doffémond Colares

Karolyne Michele Moura Raftopoulos

A atenção integral à saúde do seu filho/a estará garantida desde a atenção


básica até internações hospitalares, sendo o acesso universal, igualitário, integral e
gratuito por intermédio do SUS. Toda criança adotada, no processo de guarda
provisória ou ainda em tutela, também tem o direito de ser dependente do plano de
saúde de seus pais, ou responsável, sem nenhuma carência.

Em uma primeira consulta pediátrica, os pais estão com muitas dúvidas e


inseguranças. Como médico, o primeiro passo é acolher esses pais, com paciência e
sem julgamentos, já que muitos não possuem experiência prévia com a maternidade
e paternidade. Em seguida, é importante perguntar se o abrigo ou Vara da Infância e
Juventude disponibilizou o histórico médico e vacinal do indivíduo adotado, contendo
informações como alergias medicamentosas, doenças crônicas e hospitalizações.
Entretanto, não é incomum que esse histórico seja inexistente ou incompleto,
principalmente em relação ao histórico exato da gestação e parto, fatores de risco e
desenvolvimento neuropsicomotor.

As necessidades especiais do adotado devem ser identificadas, avaliadas e


tratadas. Segundo o artigo 129 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069,
de 13 de julho de 1990, e legislação correlata) nas medidas pertinentes aos pais ou
responsável é “obrigação encaminhar a criança ou adolescente à tratamentos
especializados”, dessa maneira é imprescindível a avaliação dessa criança ou
adolescente pelo pediatra, que além do exame físico deve identificar os riscos
apresentados pelas condições prévias de vida do adotado e fazer a propedêutica e
encaminhamentos adequados com as suspeitas diagnósticas, além dos rastreios
apropriados para a idade, avaliação nutricional e sorologias de infecções sexualmente
transmissíveis devido ao risco transmissão vertical, ou até mesmo abuso sexual.

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EXAMES LABORATORIAIS

Segundo o Senado, menos de 5% das crianças disponíveis para adoção tem


idade entre 0-3 anos, cerca de 18,5% com idade entre 4-9 anos e aproximadamente
77% já passaram os 10 anos de idade. A avaliação desses jovens leva em conta a
história colhida nas consultas, os achados do exame físico e também os riscos que
as condições de vida prévia desses indivíduos os expunham. De acordo com a
Academia Americana de Pediatria, os indivíduos adotados devem fazer as triagens
necessárias de acordo com sua faixa etária, receber avaliação nutricional, além do
rastreio de infecções sexualmente transmissíveis e doenças infecto-parasitárias.
Mesmo que esses exames já tenham sido feitos anteriormente, recomenda-se a
repetição, pela incerteza sobre a exatidão e interpretação destes.

Triagem Neonatal
O Teste do pezinho é uma ação preventiva que inclui o rastreamento de
doenças congênitas como anemia falciforme, hipotireoidismo congênito,
fenilcetonúria e fibrose cística. Na rede privada, é possível a “realização do teste do
pezinho ampliado”, em que mais doenças são rastreadas. A realização desses
exames permite interferir no curso das doenças, instituir tratamento específico e
precoce e reduzir ou mesmo eliminar sequelas dessas patologias nos recém-nascidos
adotados. Em caso de crianças mais velhas e adolescentes que não tenham o
histórico de realização da triagem, recomenda-se que seja avaliado a clínica do
paciente e, caso haja a suspeita de alguma dessas doenças, o exame de sangue ou
teste do suor (no caso de fibrose cística) pode ser solicitado.

Rastreamento de HIV, sífilis e hepatite B


A sífilis, o HIV e a Hepatite B são doenças infecciosas, sistêmicas e de
evolução crônica que podem apresentar períodos de latência clínica. A transmissão
acontece via sexual, transfusional ou vertical (quando a mãe passa para o bebê
durante a gravidez, parto ou amamentação). A transmissão vertical das IST possui
uma relação direta com a assistência pré-natal, parto e puerpério da mãe biológica
dessa criança, portanto independente da disponibilidade dos históricos médico e pré-
natal, deve-se realizar o rastreio dessas patologias no pós-adoção. Além dos testes
rápidos disponíveis para as três patologias, são também disponíveis no Brasil e

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geralmente utilizados inicialmente para diagnóstico, o ensaio Enzima-ligado de
imunoabsorção (ELISA) para HIV, o VDRL para a sífilis e HBsAG, anti-HBsAG, anti-
HBC para avaliar infecção e imunidade contra hepatite B.

Tuberculose
A tuberculose (TB) é um problema de saúde pública global, sendo que no Brasil
houve nos últimos anos uma tendência ao aumento na incidência em crianças abaixo
de 10 anos de idade. Dessa maneira, recomenda-se que o indivíduo adotado passe
por um rastreio de tuberculose independente de história de contato.
No SUS, as crianças menores de 10 anos podem realizar radiografia de tórax
e o teste tuberculínico (PPD) para o diagnóstico de tuberculose ativa ou latente. Os
sintomas da forma ativa nessa faixa etária são inespecíficos, como tosse, perda de
peso e falta de apetite. No sistema privado, há também para maiores de 5 anos o
teste IGRA, mais específico que o PPD para tuberculose latente. Já a partir dos 10
anos de idade, o quadro clínico é composto por tosse seca e produtiva há mais de 2
semanas, febre, sudorese, cansaço e emagrecimento, sendo necessário solicitar
baciloscopia e cultura do escarro.

Doença de Chagas
A doença de Chagas é uma parasitose causada pelo protozoário Trypanosoma
cruzi, e pode acometer o coração e órgãos do sistema digestivo.
No país, a doença representa a quarta maior causa de morte entre as doenças
infecto-parasitárias e atinge principalmente as faixas etárias acima de 45 anos; porém
a transmissão da doença pode ser vetorial, oral, transfusional e congênita, portanto,
recomenda-se um rastreio da doença em crianças adotadas provenientes de regiões
endêmicas do Brasil, em que há grande prevalência da doença e suspeita-se do risco
de infecção. O diagnóstico pode ser feito por exames parasitológicos diretos ou exame
sorológico a partir dos 9 meses de idade.

Hemograma
O hemograma é uma excelente ferramenta para avaliação de anemias,
desnutrição, bem como levantar suspeita de processos infecciosos e distúrbios

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metabólicos. Embora não seja comprovada a eficácia do rastreio de anemias em
crianças assintomáticas, a faixa etária com maior prevalência para a condição, são
as crianças entre 6 e 24 meses, o que se explica geralmente pelo rápido crescimento
em associação a uma ingesta inadequada de ferro, portanto importante também a
dosagem sérica de ferro em caso de hemoglobina baixa.

Perfil lipídico
De acordo com o caderno de atenção básica do Ministério da saúde sobre
saúde da criança, cerca de 50% das crianças com dislipidemia vão se tornar adultos
dislipidêmicos, dessa forma o diagnóstico e tratamento na infância contribui para a
redução dos níveis de lipídeos em certas populações. Recomenda-se o rastreamento
a partir do segundo ano de vida da criança e então a cada 3 a 5 anos, por meio dos
valores de colesterol total, HDL, LDL e triglicérides.

Glicemia
Esse teste tem como principal finalidade diagnosticar o diabetes, tanto a tipo 1
quanto a tipo 2, que têm crescido muito nos últimos anos nas crianças e adolescentes.
Recentemente, a American Diabetes Association (ADA) criou recomendações
específicas de rastreio para o diabetes na população infantil. Dessa forma, as crianças
acima de 10 anos ou que tenham iniciado a adolescência (o que ocorrer primeiro) com
sobrepeso ou obesidade devem ser rastreadas. Caso os testes de rastreio venham
inalterados, devem ser repetidos a cada três anos, ou mais precocemente, se houver
aumento do índice de massa corporal (IMC). Glicemia de jejum, teste de tolerância
oral à glicose e hemoglobina glicada são os testes possíveis de serem utilizados para
o diagnóstico do DM2 em crianças e adolescentes.

Disfunção tireoidiana
Avaliar a função tireoidiana da criança é de extrema importância, uma vez que
o hipotireoidismo é uma das doenças hormonais pediátricas mais frequentes. Os
quadros clínicos do hipotireoidismo dependem do grau de deficiência dos hormônios
tireoidianos e do tempo em que o déficit persiste, e podem afetar todos os tecidos em
diferentes graus de intensidade prejudicando o desenvolvimento neuropsicomotor e

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o crescimento dos indivíduos acometidos. Portanto, recomenda-se pedir TH e T4 livre
para avaliação da função da tireoide.

Exame Parasitológico de Fezes (EPF)


Segundo o caderno de atenção básica do ministério da saúde sobre saúde da
criança, não há estudo comprovando benefício na saúde da criança com a realização
rotineira de exame parasitológico de fezes (EPF) em indivíduos assintomáticos.
Porém, a realização desse exame pode ser benéfica para crianças originárias de
regiões com maior prevalência de doenças parasitárias intestinais, principalmente nos
casos de crianças adotadas.
Através desse exame é possível visualizar cistos, ovos, trofozoítos ou
estruturas adultas de parasitas, o que ajuda o médico a fazer o diagnóstico de
ancilostomose, ascaridíase, giardíase ou amebíase, por exemplo.

Urina rotina
Esse exame, basicamente, avalia a presença de infecções do trato urinário,
mas outras anormalidades também podem ser detectadas, como perda de proteína
ou a presença de glicose na urina, que vão demandar uma investigação
complementar posterior do pediatra para diagnosticar possíveis causas.

EXAME FÍSICO

O exame físico inicial da criança ou adolescente adotado é abrangente, com


atenção especial aos parâmetros de crescimento. Em primeiro lugar, o médico
examinador deve ser cuidadoso e sensível ao se aproximar da criança, já que muitas
tiveram experiências traumáticas e podem ter repulsa ao toque. Sempre inicie a
avaliação com a criança no colo dos pais, prosseguindo lentamente com o exame, de
forma que a criança se sinta segura.

Medida de altura, peso e perímetro cefálico são necessários para todas as


crianças, com análise do resultado pelas curvas da OMS de acordo com a faixa etária.
Os indivíduos adotados podem apresentar baixa estatura para a idade, o que pode
ser atribuível a nutrição inadequada bem como um resultado de vulnerabilidade. Em
contrapartida, crianças e adolescentes que vivenciaram longos anos de

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institucionalização podem ser classificados como sobrepeso ou obesidade por causa
de dietas ricas em gordura e açúcar, associado a poucas atividades físicas.

Recomenda-se que a aparência geral seja avaliada, já que qualquer sinal de


dismorfismo pode ser sugestivo de uma doença crônica, malformações congênitas ou
síndromes (especialmente a Síndrome Alcoólica Fetal). Um completo exame de pele
pode levar ao diagnóstico de uma doença infecciosa ou identificar lesões sugestivas
de abusos prévios. Caso a criança sinta-se segura e os pais autorizarem, o médico
pode fazer o exame da área genital, identificando qualquer anormalidade sugestiva
de abuso sexual anterior e definir o estágio de desenvolvimento do indivíduo.

O desenvolvimento motor e de linguagem segue marcos de normalidade


esperados para cada fase, sempre existindo um tempo máximo para cada situação
ocorrer. É importante que o pediatra conheça o desenvolvimento normal para que
identifique as crianças com desvios da normalidade ou atraso no desenvolvimento, e
oriente os pais a melhor forma de estimular seus filhos.

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Disponível em: http://www.formaes.com.br/vida-de-mae-2/marcos-desenvolvimento-seu-bebe/

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REFERÊNCIAS

BRASIL. Adele Schwartz Benzaken. Ministério da Saúde. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas
para Atenção Integral às Pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis. 2. ed. Brasília:
Assessoria de Comunicação, 2015. 122 p. Disponível em: http://www.aids.gov.br/pt-
br/pub/2015/protocolo-clinico-e-diretrizes-terapeuticas-para-atencao-integral-pessoas-com-infeccoes
Acesso em 10 fev. 2021.

BRASIL. Agda Henk. Ministério da Saúde. SAÚDE DA CRIANÇA: CRESCIMENTO E


DESENVOLVIMENTO: caderno de atenção básica no33. Brasília: Ms, 2012. 274 p. Disponível
em:
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/saude_crianca_crescimento_desenvolvimento.p
df Acesso em 20 jan. 2021.

BRASIL. Aline Coletto Sortica. Ministério da Saúde. PREVENÇÃO DA TRANSMISSÃO VERTICAL


DO HIV, SÍFILIS CONGÊNITA e HEPATITES B e C: guia para maternidades. Brasília: Ms, 2016. 33
p. Disponível em: https://www.cevs.rs.gov.br/upload/arquivos/201705/18115839-guia-para-
maternidades-prevencao-da-transmissao-vertical-do-hiv-sifilis-congenita-e-hepatites-b-e-c.pdf
Acesso em 05 mar. 2021

BRASIL. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do


Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil ,
Brasília, DF, 16 jul. 1990. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm#art266>. Acesso em: 16 dez. 2020.

Gabriela de Azevedo Soares. DIAGNÓSTICO SOBRE O SISTEMA NACIONAL DE ADOÇÃO E


ACOLHIMENTO. Brasília: Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 2020. Disponível em:
https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/05/relat_diagnosticoSNA2020_25052020.pdf. Acesso
em: 06 maio 2021.

JONES, Veronnie Faye; SCHULTE, Elaine E. Comprehensive Health Evaluation of the Newly Adopted
Child. Pediatrics, [S.L.], v. 143, n. 5, p. 1-18, 29 abr. 2019. American Academy of Pediatrics (AAP).
http://dx.doi.org/10.1542/peds.2019-0657

SETIAN, Nuvarte. Hipotireoidismo na criança: diagnóstico e tratamento. Jornal de Pediatria,


[S.L.], v. 83, n. 5, nov. 2007. UNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s0021-
75572007000700013.

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CAPÍTULO 2 - LACTAÇÃO ADOTIVA

Nayara Neves de Alcântara

O aleitamento materno é um importante meio de criar vínculo natural, afeto,


proteção e nutrição de uma criança. Além de ser a mais sensível, econômica e eficaz
intervenção na diminuição da morbimortalidade infantil.

Amamentar é muito mais do que nutrição de um bebê. É um processo que


proporciona uma relação intensa entre o binômio mãe/bebê, com repercussões tanto
nutricionais quanto na habilidade do bebê de se defender de infecções, no seu
desenvolvimento cognitivo e emocional e na sua saúde a longo prazo. Ainda contribui
também na saúde física e psíquica materna.

Diante da importância e benefícios grandiosos da amamentação pensou-se em


proporcionar um pouco disso para os bebês que são adotados, já que esses bebês
perdem além dos seus familiares, todos esses benefícios da amamentação.

A nutrição da criança é questão de relações mãe-filho, é o ato de colocar em


exercício a relação de amor entre dois seres humanos. Dessa maneira, quando a
mulher que adotou um bebê opta por amamentar, ela estará construindo vínculo
afetivo mãe-bebê, mesmo que esse bebê não tenha sido gerado por ela. E isso tem
grande benefício tanto para criança quanto para a mãe.

Pode-se observar que a imagem da amamentação envolve o mundo de muitas


mulheres enquanto símbolo representativo da maternidade, e é uma construção social
e cultural ao longo dos tempos, paradoxalmente tido como um marco biológico da
espécie. Para algumas mulheres o ato de amamentar, mesmo não tenha passado
pela gestação, representa a realização pessoal e principalmente como mãe.

A técnica de relactação tem como objetivo básico recuperar a amamentação e


a baixa produção de leite, e, como opção, utilizar para que mães adotivas amamentem
seus filhos. Mas como uma mulher poderia produzir leite sem ter estado grávida? Isso
pode ser possível através do que se chama de lactação induzida.

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A lactação é uma resposta hormonal através de uma ação física, ou seja,
simular a mamada de um bebê faz com que o corpo reconheça a necessidade de
produção de leite. E quanto maior esse estímulo, maior a quantidade de leite
produzida pelo corpo da mulher.

Algumas mulheres conseguem, após realizar a lactação induzida, amamentar


de maneira exclusiva. Porém, nos casos de não exclusividade pode-se recorrer a
complementação de bancos de leite humano e também de fórmulas infantis. É
importante destacar que mesma que essa amamentação não seja de maneira
exclusiva ela traz benefícios, pois cada gota conta.

Primeiro passo para um resultado positivo de amamentação em filhos adotivos


é a vontade e persistência materna. Apesar de ser um processo possível, é necessário
um trabalho árduo e diário. Outro ponto relevante é a idade da criança adotada,
importante que tenha poucos dias de vida a meses - preferencialmente menor que
quatro, pois o reflexo de sucção do recém-nascido é a chave do estímulo para as
mamas da mãe. Além da sucção do bebê, a mãe também pode fazer uso de bomba
de extração, associado a medicação de estímulo de produção de leite, os chamados
galactagogos, sob prescrição médica. A participação e apoio de profissionais
capacitados, como médicos, enfermeiros, fonoaudiólogos e consultores de
amamentação, é também fundamental para sucesso da amamentação.

Como então é realizado o método de relactação? Não é necessário nenhum


equipamento sofisticado. Nesse método é preciso utilizar um tubo fino (uma sonda)
com a ponta cortada, que funciona como um canudinho. Geralmente utiliza-se sonda
nasogástrica ou uretral, número quatro, ou algum tubo de polietileno. O tubo vai do
recipiente esterilizado com o leite até a boca do bebê, sendo que esse leite pode ser
fórmula ou materno adquirido em banco de leite. A ponta do tubo deve ser colocada
sobre o mamilo de maneira que o bebê consiga sugar ao mesmo tempo o mamilo e o
tubo. O bebê irá receber o leite pelo tubo e ainda estimulará a produção de leite devido
a sucção na mama da mãe.

É importante avaliar a espessura do tubo, que deve ser fina, pois se muito
grossa, o leite sairá com muita facilidade e então o bebê não sugará a mama o
suficiente para ajudar na estimulação da produção de leite da mãe. Deve-se destacar
a importância de limpar e esterilizar o tubo e o recipiente cada vez que forem

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utilizados. O mais recomendado seria sempre a troca da sonda, que tem um custo
médio de R$0,80 centavos.

Figura 1 - Relactação

Disponível em: https://soloinfantil.com/bebe/relactacao/

A sucção realizada na mama com frequência é capaz de estimular o organismo


da mulher a aumentar a produção e a quantidade de leite depois de um tempo, graças
a secreção do hormônio prolactina. E para favorecer a descida do leite a ocitocina é
a responsável. Portanto, quanto maior o estímulo maior a produção. Embora a indução
à lactação apresente ótimos resultados, é preciso ter paciência para produzir o próprio
leite. Algumas mães levam até quatro meses para alcançar esse objetivo, portanto é
necessário paciência.

Para potencializar a sucção pode-se utilizar de estratégias. Por exemplo,


quando o bebê estiver ansioso ou muito inquieto para mamar, especialistas
recomendam colocá-lo na mama de 15 a 20 minutos sem a sonda, para estimular a

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produção do leite, e, assim que ele começar a reclamar, posicione a sonda junto a
mama, no canto da boca do bebê. Outra prática seria a mãe interromper de tempos
em tempos o fluxo de leite da sonda, dobrando-a um pouco, para que o leite não vá
até a boca do bebê e ele sugue a mama por mais tempo.

A amamentação não é um ato mecanizado e para que produza o efeito


esperado é necessário que abaixe a ansiedade materna. Faça desse ato um momento
relaxante, medite, relaxe a mente, escute músicas, cante para o bebê, mentalize
coisas positivas, mentalize que o leite está saindo pelas mamas, sinta o cheiro do
bebê e encontre uma posição confortável para os dois.

Devido a privação de sono e por se tratar de um processo exaustivo, muitas


mães acabam desistindo de usar a sonda e utilizam a mamadeira. Importante deixar
claro que o uso de qualquer bico artificial, chupetas, mamadeiras, chuquinhas, bicos
intermediários, pode interferir de forma negativa em todo processo. O uso desses
utensílios, causa uma confusão de bico/fluxo, pois a musculatura que os bebês
utilizam e os movimentos que realizam na mama são diferentes, dificultando o
sucesso do processo. Além disso, podem causar alteração no desenvolvimento da
face, dos dentes e da fala.

A lactação induzida exige muita motivação por parte da mulher e apoio


profissional constante. É um esforço amplamente recompensador, ao se oferecer e
proporcionar à mãe adotiva, a grata experiência de amamentar seu filho. A adoção
tem como objetivo encontrar para criança uma família que tenha condições de
proporcioná-la um ambiente cercado de amor, cuidado e proteção para o seu
desenvolvimento. Com a possibilidade materna da amamentação do filho adotivo,
estabelece-se o fortalecimento do vínculo afetivo entre mãe e filho.

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REFERÊNCIAS

Freire F (Org.). Abandono e Adoção: contribuições para uma cultura da adoção. 20. ed. Curitiba:
Associação Brasileira Terra dos Homens, 2001.

LAGE, Suellen da Rocha; SANTOS, Inês Maria Meneses dos; NAZARETH, Isis Vanessa. Narratives of
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tambem-podem-amamentar-conheca-tecnica.htm. Acesso em: 06 jul. 2021.

20
CAPÍTULO 3 - A VACINAÇÃO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NO
CONTEXTO DA ADOÇÃO

Luiza Lins Khoury

Em 1973, o Ministério da Saúde do Brasil criou o PNI (Programa Nacional de


Imunizações) responsável pelo calendário de vacinação no Brasil e disponibilização
das principais vacinas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A SBIM (Sociedade
Brasileira de Imunizações) é uma entidade científica e sem fins lucrativos que tem
como um dos objetivos elaborar calendários e metas e desenvolver o calendário
vacinal junto ao PNI. Além disso, a SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria) elabora
estudos e orientações sobre as melhores formas de vacinação e prevenção das
principais doenças que acometem crianças e adolescentes brasileiros.

Algumas vacinas são recomendadas logo ao nascimento, outras necessitam


de mais doses para melhor eficácia. Muitas dessas vacinas são oferecidas pelo SUS
em todo território nacional e são fundamentais para prevenção de sarampo, tétano
neonatal, difteria, coqueluche, hepatite B, meningite, febre amarela, tuberculose,
rubéola, entre outras. Além disso, é importante salientar que o Brasil conseguiu
erradicar a varíola e a poliomielite (paralisia infantil) por meio da vacinação.

ATUALIZAÇÃO DO CARTÃO DE VACINA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

As tabelas 1 e 2 foram construídas de forma a simplificar a informação sobre


calendário vacinal de crianças que não foram vacinadas adequadamente ou que não
se sabe o passado vacinal. Cada vacina será detalhada em quantidade de doses e
idade mínima e máxima para ser administrada. É importante ressaltar, que casos de
crianças com comorbidades, imunocomprometidas (como portadores do HIV/Aids) ou
doenças congênitas, e adolescentes gestantes devem consultar o pediatra ou médico
de referência antes de tomar qualquer vacina.

21
Tabela 1 – Atualização do Cartão de Vacina Crianças não vacinadas ou sem
cartão de vacina (0-10 anos)

Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com SBIm (2020).

Tabela 2 – Atualização do Cartão de Vacina de Adolescentes não vacinadas


ou sem cartão de vacina (10-19 anos)

Fonte: Elaborada pelo autor de acordo com SBIm (2020)

22
BCG

A vacina BCG deve ser administrada ao nascimento ou mais precocemente


possível, de preferência antes de completar 5 anos de idade. Ela é importante, pois
previne formas graves da tuberculose, como o tipo miliar e a meningite tuberculosa.

Haemophilus influenzae b (Hib)

Previne doenças causadas pela bactéria Haemophilus influenzae tipo b,


principalmente a meningite. Pode ser encontrada isolada, Hib, ou combinada com a
tríplice bacteriana (DTPw ou DTPa). Está indicada em crianças a partir de 2 meses
até 5 anos de idade. Adolescentes e crianças maiores de 5 anos de idade poderão
tomar em situações especiais e, portanto, deve consultar o médico responsável.

Recomendação pelo PNI é que devam ser aplicadas 3 doses com 2, 4 e 6


meses de idade. Porém, a Sociedade Brasileira de Pediatria e a SBIm recomendam
uma quarta dose entre 12 e 18 meses.

Poliomielite

A vacina da poliomielite previne a paralisia infantil. Ela é encontrada de duas


formas: VIP (vacina inativada poliomielite) e VOP (vacina oral poliomielite). A vacina
oral é atenuada, ou seja, composta pela forma viva do vírus e a VIP é inativada e
contém apenas partículas do vírus.

A PNI indica que sejam aplicadas 3 doses da VIP no primeiro ano de vida a
partir dos 2 meses de idade (2, 4 e 6 meses) e a VOP no reforço (entre 15 e 18 meses)
e campanhas anuais de vacinação (entre 4 e 5 anos). Mas, segundo a SBP, deve-se
preferir a VIP em todas as doses. Além disso, está indicada em todas as crianças
menores de 5 anos.

Rotavírus

A vacina contra o rotavírus contra o rotavírus é fundamental para prevenir o


desenvolvimento de diarreia grave, pois é o microrganismo mais comumente

23
associado à essa patologia. Ela pode ser encontrada em forma de vacina oral
monovalente (VRH1) e vacina oral atenuada pentavalente (VRH5). A indicação da
SBIm é primeira dose em bebês a partir de 6 semanas até 3 meses e 15 dias e uma
segunda dose até 7 meses e 29 dias de vida com intervalo mínimo de 4 semanas
entre elas.

Porém, a VRH5 deverá ser aplicada em 3 doses a partir de 6 semanas de vida


e com intervalo mínimo de 4 semanas com última vacina antes dos 8 meses. O
esquema padrão é aos 2, 4 e 6 meses.

Pneumocócica Conjugada

A vacina Pneumocócica conjugada 10 (VPC10) e a Pneumocócica conjugada


13 valente (VPC13) previnem doenças como pneumonia, faringite, meningite, otite
média, entre outras causadas por bactérias Streptococcus pneumoniae. As duas
vacinas são inativadas, portanto não podem causar doenças ao serem aplicadas. A
VPC13 tem uma cobertura maior e previne cerca de 90% das doenças, pois abrange
13 tipos de bactérias.

A recomendação é a partir dos 2 meses até 6 anos de idade com a VPC 10 ou


VPC13. Para as crianças maiores de 6 anos ou adolescentes, recomenda-se a
aplicação da pneumocócica 13 ou VPP23 (pneumocócica polissacarídica 23-valente).

A SBP e a SBIm recomendam sempre que possível preferir a VPC13, pois


engloba mais sorotipos. Além disso, orientam a vacinação infantil de rotina com quatro
doses da vacina VPC13: aos 2, 4 e 6 meses de vida e reforço entre 12 e 15 meses. O
PNI adotou o esquema de 2 doses de VPC10 com intervalo mínimo de 2 meses no
primeiro ano de vida e 1 dose de reforço aos 12 meses.

Crianças entre 1 e 2 anos e não vacinadas, deve-se aplicar 2 doses com


intervalo mínimo de 2 meses entre elas. Para crianças entre 2 e 5 anos de idade não
vacinadas: uma dose.

24
Meningocócica Conjugada

A vacina meningocócica conjugada quadrivalente ACWY é fundamental para


prevenir doenças como meningite e infecções generalizadas causadas por
meningococos dos sorotipos A C, W e Y. É uma vacina inativada.

A recomendação é que seja aplicada em maiores de 2 meses de idade e


adolescentes. A Sociedade Brasileira de Pediatria e de Imunizações orienta a
utilização da Meningocócica C conjugada na impossibilidade de aplicação da ACWY.
Em crianças o esquema é a partir de 3 meses em 2 doses no primeiro ano de vida (3
e 5 meses) e reforços entre 12 e 15 meses, entre 5 e 6 anos e aos 11 anos.
Adolescentes que nunca forma vacinados: 2 doses com 5 anos de intervalo entre elas.

Meningocócica B

Essa vacina é importante para evitar o desenvolvimento de meningite e


infecções generalizadas causadas pelo Meningococo do tipo B. É uma vacina
inativada, portando não causa nenhuma doença.

A SBP e a SBIm recomendam 2 doses e 1 reforço aos 3 e 5 meses e entre 12


e 15 meses. Porém, o esquema sofre variações de acordo com a idade da primeira
dose da vacina. Se primeira dose:

• Entre 3 e 11 meses → 2 doses com intervalo mínimo de 2 meses


entre elas + reforço entre 12 e 15 meses;
• Entre 12 e 23 meses → 2 doses com intervalo mínimo de 2 meses
entre elas + reforço entre 12 e 23 meses da última dose;
• A partir de 24 meses → 2 doses com intervalo de 1 mês entre elas;
• Adolescentes → 2 doses com intervalo de 1 mês entre elas.

Influenza

Essa vacina pode ser encontra na forma trivalente e quadrivalente e é eficaz


na prevenção de formas graves da gripe causada pelo vírus Influenza. É vacina
inativada e não causa doença.

25
A indicação é para crianças entre 6 meses e 8 anos de idade em 2 doses na
primeira vez que forem vacinadas (primovacinação) com intervalo de 1 mês entre elas
e a partir de 9 anos apenas 1 dose. Além disso, todas crianças e adolescentes devem
manter 1 dose anual dessa vacina.

Febre Amarela

No Brasil, existem duas formas de vacinas contra a febre amarela. Uma delas
é a disponibilizada pelo SUS e a outra encontrada na rede particular. As duas são
elaboradas a partir de vírus vivo atenuado cultivado em ovo de galinha e possuem a
segurança e eficácia semelhantes.

Está indicada em maiores de 9 meses de vida e está contraindicada em


menores de 6 meses. Adolescentes gestantes, crianças imunossuprimidas (como por
exemplo portadores HIV) ou com outras comorbidades devem consultar o médico de
referência antes de tomar a vacina.

O esquema indicado no Brasil é de 2 doses aos 9 meses e aos 4 anos de vida.


Para os maiores de 4 anos de idade, ainda não tem um consenso, depende do risco
epidemiológico.

Hepatites A e B

A vacina da Hepatite A previne contra hepatite causada pelo vírus A. Está


indicada para todas as pessoas a partir de 12 meses de idade. O esquema padrão é
feito em 2 doses com intervalo de 6 meses entre elas (12 e 18 meses ou o mais
precoce possível). O PNI disponibiliza a vacina aos 15 meses de idade e antes de
completar 5 anos.

A vacina da Hepatite B evita o desenvolvimento da hepatite causada pelo vírus


B e é uma vacina inativada. O PNI oferece a vacinação no esquema de 4 doses (ao
nascimento e 3 doses aos 2, 4 e 6 meses incluídas na pentavalente). Crianças e
adolescentes não vacinados anteriormente, deverão receber 3 doses com intervalo
de 1 ou 2 meses entre a primeira e segunda dose e 6 meses entre a primeira e terceira
dose.

26
No Brasil, é possível encontrar a vacina combinada que previne contra as
Hepatites A e B concomitantemente. Além disso, essa também é uma vacina inativada
e está indicada em crianças maiores de 12 meses não vacinadas contra Hepatite A
ou B anteriormente. O esquema padrão é de 2 doses com intervalo de 6 meses entre
elas para crianças a partir de 1 ano e adolescentes com menos de 16 anos. A partir
dos 16 anos, deve-se aplicar 3 doses (segunda 1 mês após a primeira e a terceira 5
meses após a segunda).

Tríplice Viral

A tríplice viral é uma vacina que previne a contaminação de 3 doenças:


sarampo, caxumba e rubéola. É uma vacina atenuada e, portanto contem partículas
de vírus em sua constituição.

Segunda as orientações da SBIm, está protegido o indivíduo que completou 2


doses da vacina com intervalo mínimo de 3 meses entre elas a partir dos 12 meses
de idade. Porém, existem situações especiais, como por exemplo em surto de
sarampo, que poderão ser aplicadas de forma diferente e deve-se consultar o pediatra
sobre idade e doses. O esquema básico é formado por 2 doses aos 12 meses e aos
15 meses de vida (podendo ser utilizada a tríplice viral – SCR ou tetraviral SCR-V que
inclui a vacina contra varicela).

Crianças mais velhas e adolescentes não vacinados ou que não tenha certeza
do diagnóstico prévio de qualquer uma das doenças: 2 doses com intervalo de 1 a 2
meses entre elas.

Varicela

Essa é uma vacina atenuada, muito importante, pois previne o desenvolvimento


da catapora. Além disso, é indicada para todas as crianças e adolescentes a partir de
12 meses de vida que não foram vacinadas ou não tiveram catapora.

O PNI disponibiliza 1 dose de varicela aos 15 meses com a tetraviral (SCR-V)


e outra dose isolada contra a catapora aos 4 anos. Porém, a SBP e a SBIm
recomendam 2 doses da varicela aos 12 meses e entre 15 e 24 meses (podendo

27
utilizar a SCR-V). Além disso, crianças até 11 anos, o intervalo mínimo entre doses é
de três meses e para adolescentes suscetíveis (não vacinados e que não tiveram a
doença) são indicadas duas doses com intervalo de um a dois meses.

HPV

O vírus HPV é responsável por causar lesões pré-cancerosas, infecções


persistentes, câncer de colo de útero, e verrugas genitais. A vacina contém a forma
inativada do vírus e, portando não pode causar nenhuma doença.

O PNI disponibiliza vacina contra os tipos 6, 11, 16 e 18 do HPV e poderá ser


aplicada em:

• Meninas de 9 a 14 anos (e meninas de 15 anos que já tiver tomado uma


dose);
• Meninos de 11 a 14 anos;
• Homens de 9 a 26 anos e mulheres de 9 a 45 anos portadores do vírus
HIV/Aids ou em quimioterapia / radioterapia para tratamento oncológico ou
transplantados de órgãos sólidos ou medula óssea.

A vacinação de meninas e mulheres de 9 a 45 anos de idade e meninos e


jovens de 9 a 26 anos é recomendada pelas Sociedades Brasileiras de Pediatria (SBP)
e de Imunizações (SBIm) e pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia
e Obstetrícia (Febrasgo).

O esquema básico é formado por 2 doses aos meninos (11 aos 14 anos) e
meninas (9 aos 14 anos) com intervalo de 6 meses entre elas e 3 doses para maiores
de 15 anos e imunossuprimidos (intervalo de 1 a 2 meses entre primeira e segunda
dose e 6 meses após a primeira dose).

Tríplice bacteriana

A tríplice bacteriana (dTpa) é uma vacina que evita a contaminação de 3


doenças: difteria, tétano e coqueluche e é uma vacina inativada. Está indicada para
crianças maiores de 3 a 4 anos, adolescentes e adultos como reforço da DTPa ou

28
DTPw. Crianças a partir dos 3 anos de idade e adolescentes que nunca forma
vacinados, devem receber dTpa seguida de 2 ou 3 doses da dT (difteria e tétano).

Outras formulações dessa vacina:

• Vacina quíntupla acelular (DTPa-VIP/Hib) — também conhecida como “penta”,


inclui a tríplice bacteriana acelular (DTPa), a poliomielite inativada (VIP) e a
Haemophilus influenzae tipo b (Hib). Indicada para crianças maiores de 2
meses e menores de 7 anos.
• Vacina sêxtupla acelular (DTPa-VIP-HB/Hib) — também conhecida como
“hexa”, inclui a tríplice bacteriana acelular (DTPa), a poliomielite inativada (VIP),
a hepatite B (HB) e a Haemophilus influenzae tipo b (Hib). Indicada para
crianças maiores de 2 meses e menores de 7 anos.
• Vacina Tríplice Bacteriana acelular infantil (DTPa) – tríplice bacteriana acelular
indicada para menores de 7 anos. Esquema de 3 doses (2, 4 e 6 meses de
idade com reforço entre 12 e 18 meses).

Dengue

A vacina contra a dengue é mais eficiente para prevenção de formas graves da


doença e só deve ser indicada para crianças a partir de 9 anos de idade e
adolescentes que já foram infectados e são comprovadamente soropositivos (teste
positivo para imunidade contra o vírus). Deverá ser aplicada no esquema de 3 doses
com intervalo de 6 meses.

Diante o exposto sobre cada uma das vacinas recomendadas às crianças e


adolescentes de acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria, a Sociedade
Brasileira de Imunizações e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia
e Obstetrícia, pode-se concluir que é extremamente importante manter a caderneta
de vacinação sempre atualizada. O Programa Nacional de Imunizações oferece as
principais vacinais pelo Sistema Único de Saúde em Unidades Básicas de Saúde
(UBS’s) distribuídas de acordo com a necessidade da população e regiões. Além
disso, é possível complementar a vacinação, caso não seja possível adquirir pelo
SUS, em rede provada de saúde.

29
Ademais, é muito importante ressaltar que é imprescindível o acompanhamento
médico (pediátrico) por todas as crianças e adolescentes de forma a prevenir as
principais doenças, sanar dúvidas e orientar a melhor forma de atualização do cartão
de vacina infanto-juvenil. As tabelas utilizadas como referência para a construção
desse material, encontram-se disponíveis em anexo e no site da SBIm.

30
REFERÊNCIAS

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Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacina hepatite B. 2020. Disponível em:


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31
Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacina HPV4. 2020. Disponível em:
https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacina-hpv4. Acesso em: 12 fev. 2021.

Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacina meningocócica B. 2020. Disponível em:


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2021.

Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacina Meningocócica conjugada quadrivalente — ACWY.


2020. Disponível em: https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacina-meningococica-
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Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacina rotavírus. 2020. Disponível em:


https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacina-rotavirus. Acesso em: 12 fev. 2021.

Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacina tríplice bacteriana acelular do tipo adulto– dTpa.
2020. Disponível em: https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacina-triplice-bacteriana-
acelular-do-adulto-com-poliomielite-dtpa-vip. Acesso em: 12 fev. 2021.

Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacina tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola) – SCR.
2020. Disponível em: https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacina-triplice-bacteriana-
acelular-do-tipo-adulto-dtpa. Acesso em: 12 fev. 2021.

Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacina varicela (catapora). 2020. Disponível em:


https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacina-varicela-catapora. Acesso em: 12 fev.
2021.

Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacinas pneumocócicas conjugadas. 2020. Disponível em:


https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacinas-pneumococicas-conjugadas. Acesso
em: 12 fev. 2021.

Sociedade Brasileira de Imunizações. Vacinas poliomielite. 2020. Disponível em:


https://familia.sbim.org.br/vacinas/vacinas-disponiveis/vacinas-poliomielite. Acesso em: 12 fev. 2021.

32
CAPÍTULO 4 - O CRESCIMENTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE:
COMO ANALISAR ESSE PROCESSO DE FORMA OBJETIVA?

Patrícia Mendes Violante

A criança está em constante crescimento e desenvolvimento, tanto físico


quanto mentalmente. É comum que familiares confabulem em quanto seus filhos irão
crescer e se esse processo será pleno. Contudo, é necessário ter em mente que o
crescimento não é de todo previsível, pois há duas variáveis em jogo: os fatores
intrínsecos e os fatores extrínsecos.
Os fatores intrínsecos são, principalmente, a carga genética e
neuroendócrina que a criança carrega em seu DNA. Pais adotivos e tutores podem se
sentir impotentes quanto a esse aspecto na vida de seus filhos, porém evidências
científicas mostram que até 20% dos genes são influenciados pela herança genética;
os outros 80% são influenciados pelo estilo de vida, em especial a nutrição.
Como dito, os fatores extrínsecos, são os mais importantes no
crescimento das crianças, em especial a alimentação. Porém, vale salientar que os
extremos são sempre perigosos, tanto a falta quanto o excesso. A privação de
alimentos pode desencadear diversas doenças, como a anemia ferropriva e
megaloblástica, marasmo, Kwashiorkor; enquanto o excesso pode desencadear, por
exemplo, a obesidade e a diabetes. O equilíbrio é fundamental.
Objetivamente, o pediatra consegue avaliar agravos nutricionais agudos
e crônicos através do peso da criança. É importante valorizar a curva ponderal, pois
uma medida isolada não consegue ser tão fidedigna. Nos primeiros dias de vida, o
recém-nascido pode perder até 10% do peso do nascimento, que deve ser recuperado
até o 10º dia.

No 1º ano de vida, o ganho ponderal esperado é:


• 1º trimestre: 700g/ mês (cerca de 25 a 30 gramas por dia);
• 2º trimestre: 600g/mês (cerca de 20 gramas ao dia);
• 3º trimestre: 500g/mês (cerca de 15 gramas por dia);
• 4º trimestre: 300g/mês (cerca de 10 gramas por dia).

33
A avaliação do crescimento de uma criança feita por um profissional de saúde
é objetiva e leva em conta algumas variáveis, que são, principalmente o peso, a altura
e o IMC de seu paciente. Dessa forma, o médico responsável pelo caso pode interferir
precocemente na causa de algum provável distúrbio do crescimento, identificar
problemas que não podem ser curados, ou mesmo tranquilizar a família sobre a
benignidade do quadro.
Quando uma família ou um cuidador expõe a preocupação que a criança
ao qual são responsáveis não está crescendo da forma esperada, normalmente essa
queixa vem de comparações com outras crianças as quais o paciente convive. Talvez
ela seja a menor da classe, ou a menor entre seus primos ou que usa o menor
tamanho de roupa. O pediatra também faz essa comparação, mas em forma de curvas
de crescimento. Tais curvas são encontradas nas atuais versões da caderneta de
saúde da criança. Vamos, agora, expor as principais curvas e mostrar como
interpretá-las:

CURVA PESO/ IDADE


Índice que correlaciona a massa corporal e a idade cronológica da criança.
Utilizado para avaliação de seu estado nutricional e para acompanhamento do
crescimento infantil. Entretanto, esse índice reflete a situação global do paciente, ou
seja, é incapaz de distinguir o comprometimento nutricional atual com os pregressos.
A curva possui quatro pontos de corte, que são: percentil 0; percentil 1; percentil
3; percentil 10; percentil 97. A interpretação é feita da seguinte forma:

CRIANÇAS DE 0 A 10 ANOS:

• P/I abaixo do percentil 0,1: criança com peso muito baixo para a idade.
• P/I maior ou igual ao percentil 0,1 e menor que o percentil 3: criança com peso
baixo para a idade.
• P/I maior ou igual ao percentil 3 e menor que o percentil 97: criança com peso
adequado para a idade (eutrófica).
• P/I maior ou igual ao percentil 97: criança com peso elevado para idade;

34
CURVA PESO/ ALTURA
Com a ausência da variável “idade”, esse índice avalia a relação entre a massa
corporal da criança com sua altura. É capaz de identificar quadros de emagrecimento
ou excesso de peso. Portanto, a falha dessa curva seria a impossibilidade de um
diagnóstico preciso de sobrepeso ou obesidade, apenas identifica excesso de peso
de uma forma geral. A interpretação é feita da seguinte forma:

CRIANÇAS DE 0 A 5 ANOS INCOMPLETOS:

• P/A abaixo do percentil 0,1: criança com magreza acentuada;


• P/A maior ou igual ao percentil 0,1 e menor que o percentil 3: criança com
magreza;
• P/A maior ou igual ao percentil 3 e menor que o percentil 85: criança eutrófica;
• P/A maior que o percentil 85 e menor ou igual ao percentil 97: criança com risco
de sobrepeso;
• P/A maior que percentil 97 e menor ou igual ao percentil 99,9: criança com
sobrepeso;
• P/A maior que o percentil 99,9: criança com obesidade.

CURVA ALTURA/IDADE
É o índice que reflete o crescimento linear da criança e o que melhor alinha a
situação atual da criança com sua história pregressa que possa ter influenciado em
seu crescimento. Além disso, é o índice mais sensível para análise da qualidade de
vida de uma população infantil. A interpretação é feita da seguinte forma:

CRIANÇAS ENTRE 0 E 10 ANOS:

• A/I abaixo do percentil 0,1: criança com muito baixa estatura para idade;
• A/I maior ou igual ao percentil 0,1 e menor que o percentil 3: criança com baixa
estatura para idade;
• A/I maior ou igual ao percentil 3: criança com estatura adequada para a idade.

35
ADOLESCENTES ENTRE 10 A 19 ANOS:
• A/I menor que o percentil 0,1: adolescente com a estatura muito baixa para a
idade;
• A/I maior ou igual ao percentil 0,1 e menor que o percentil 3: adolescente com
baixa estatura para idade;
• A/I maior ou igual ao percentil 3: estatura adequada para a idade.

IMC PARA A IDADE


Expressa a relação entre o peso da criança e o quadrado da estatura. É
utilizado para identificar o excesso de peso entre crianças e tem a vantagem de ser
um índice que será utilizado em outras fases do curso da vida.
Para o cálculo do IMC, é utilizada a seguinte fórmula:
Peso (Kg)
IMC =
Altura (m)2

A interpretação é feita da seguinte forma:

CRIANÇAS ENTRE 0 E 5 ANOS INCOMPLETOS:

• IMC menor que o percentil 0,1: criança com magreza acentuada;


• IMC maior ou igual ao percentil 0,1 e menor que o percentil 3: criança com
magreza;
• IMC maior ou igual ao percentil 3 e menor ou igual ao percentil 85: criança
eutrófica;
• IMC maior que o percentil 85 e menor ou igual ao percentil 97: criança com
risco de sobrepeso;
• IMC maior que o percentil 97 e menor ou igual ao percentil 99,9: criança com
sobrepeso;
• IMC maior que o percentil 99,9: criança com obesidade;

CRIANÇAS ENTRE 5 A 10 ANOS INCOMPLETOS:

• IMC menor que o percentil 0,1: criança com magreza acentuada;

36
• IMC maior ou igual ao percentil 0,1 e menor que o percentil 3: criança com
magreza;
• IMC maior ou igual ao percentil 3 e menor ou igual ao percentil 85: criança
eutrófica;
• IMC maior que o percentil 85 e menor ou igual ao percentil 97: criança com
sobrepeso;
• IMC maior que o percentil 97 e menor ou igual ao percentil 99,9: criança com
obesidade;
• IMC maior que o percentil 99,9: criança com obesidade grave.

ADOLESCENTES ENTRE 10 E 19 ANOS

• IMC menor que o percentil 0,1: adolescente com magreza acentuada;


• IMC maior ou igual ao percentil 0,1 e menor que o percentil 3: adolescente com
magreza;
• IMC maior ou igual ao percentil 3 e menor que o percentil 85: adolescente
eutrófico;
• IMC maior que o percentil 85 e menor ou igual ao percentil 97: adolescente com
sobrepeso;
• IMC maior que o percentil 97 ou menor ou igual ao percentil 99,9: adolescente
com obesidade.
• IMC maior que o percentil 99,9: adolescente com obesidade grave.

37
REFERÊNCIAS

Barros-Filho AA. Crescimento e desenvolvimento. In: Moura Ribeiro MVL, Gonçalves VMG.
Neurologia do desenvolvimento da criança. Rio de Janeiro: Revinter, 2006.

BRASIL. Ministério da Saúde. Orientações para coleta e análise de dados antropométricos em


serviços de saúde: norma técnica do sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília:
Ministério da Saúde, 2011. (Série G. Estatística e Informação em Saúde)

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56.

Cole TJ, Green J. Smoothing reference centile curves: the LMS method and penalized likelihood.
Statistics in Medicine 1992; 11:1305-19.

Departamento de Atenção Básica. Indicadores de Vigilância Alimentar e Nutricional: Brasil 2006 /


Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Brasília, DF;
2009. 142 p. (Série B. Textos Básicos de Saúde)

Grant JP. A child survival and development revolution. Assignment Children 1983; 61/62: 21-31.

Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Avaliação nutricional da criança e do adolescente. Manual


de orientação. Sociedade Brasileira de Pediatria, Departamento de Nutrologia, 2009. 112p.

Weffort, Virgínia Resende Silva; Lamounier, Joel Alves. Nutrição Em Pediatria - da Neonatologia À
Adolescência - 2a Ed. Editora Manole. 2017

38
CAPÍTULO 5 - USO DE SUBSTÂNCIAS DURANTE A GESTAÇÃO:
COMO DIAGNOSTICAR E QUAL É O IMPACTO NA CRIANÇA?

Ana Carolina Madureira Nunes


Karolyne Michele Moura Raftopoulos

O uso e abuso de substâncias durante a gravidez é um problema de


saúde global e brasileiro. Em uma pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da
Universidade Federal de Minas Gerais, entre 1997 a 2012, foi constatado que 30,6%
das gestantes consumiam álcool, 52,9% eram tabagistas e mantiveram o hábito
durante a gestação, 18,8% das mulheres fizeram uso de álcool e tabaco
concomitantemente, e o uso de drogas ilícitas apresentou a frequência de 7,6%.
Portanto, é importante perceber que intervenções que possam ser realizadas no
período do pré-natal são de extrema relevância para prevenir danos devido à essas
atitudes.
Percebe-se que um dos principais desafios na contenção desse problema seria
a dificuldade de mecanismos de triagem que funcionem e adequem-se a realidade
socioambiental de cada região. Existem barreiras na revelação do uso de substâncias
pela paciente, além da dificuldade desse assunto ser abordado em muitas consultas
do dia a dia e de pré-natal. Dessa forma, nota-se a importância de um meio ambiente
adequado, um profissional informado e capacitado para lidar com essas situações e o
uso de uma linguagem corporal e oral adequada para iniciar esse tópico durante um
atendimento especializado e focado na pessoa.
O início do uso de substância pode ter influências de determinados
fatores de risco e por isso uma triagem apropriada deveria ser feita em todos os
atendimentos às pacientes grávidas. A desconfiança desse abuso de substâncias
pode ser observada em pacientes que o início do pré-natal foi realizado de forma tardia
ou em pacientes com mudanças repentinas de comportamento, além de pacientes
com história obstétrica pregressa de eventos adversos inexplicáveis em outras
gestações. A observação clínica e uma anamnese bem-feita já seria um método de
triagem eficiente.

39
Devido a isso percebe-se o papel dos profissionais de saúde como posição
fundamental no processo de triagem e diagnóstico precoce desse problema. Dessa
maneira, o tratamento pode ocorrer de maneira precoce e ser realizado em conjunto
com a paciente e a Estratégia de Saúde da Família (ESF) do local.
Em um relatório realizado por Carol Wallman et.al, identificou-se que menos de
um terço das gestantes estudadas não foram identificadas com transtorno por uso de
substâncias durante a atenção pré-natal por não ter sido realizado um método de
rastreio. Dessa maneira, aproximadamente 1/3 dessas pacientes tiveram a perda da
guarda de um filho devido ao uso de substâncias. Estudos não randomizados
demonstraram que a intervenção com políticas de educação, cuidado pré-natal e até
o tratamento adequado para esse abuso de drogas pode melhorar e prevenir certos
danos maternos e neonatais.
Existem diversas ferramentas de rastreio recomendadas pela Organização
Mundial de Saúde (OMS), entretanto nem todas foram validadas e avaliadas para a
população de gestantes. Existe a ferramenta ASSIST, por exemplo, que foi
desenvolvida pela OMS para uso em ambientes com cuidados médicos primários e
gerais (como a atenção básica). Apesar de não ter sido desenvolvida para o uso
específico durante a gestação, o questionário está disponível em vários idiomas e foi
desenvolvido para uso internacional.
Durante essa abordagem da triagem, além do uso de um método de rastreio
adequado, deve ser utilizado um modo respeitoso e sensível para a realização das
perguntas, de forma neutra e que a paciente não se sinta na defensiva ou vulnerável.
Uma abordagem seria iniciar a pergunta com o uso de substâncias lícitas (como
tabagismo, álcool), seguidas por perguntas sobre o uso não médico de substâncias
que podem ser compradas em farmácias como analgésicos, opioides, sedativos, e por
fim o uso de substâncias ilegais.

Identifiquei o uso de substâncias, qual o próximo passo?

Infelizmente, poucos estudos randomizados e acurados foram


devidamente realizados para a avaliação e manejo de gestantes com transtornos por
uso de substâncias. Dessa maneira, diversos estudos observacionais sugerem o
tratamento baseado em uma assistência pré-natal abrangente para reduzir a

40
frequência de determinadas complicações na vida materna e neonatal. Dentre esses
cuidados inclui-se:
• Instruir sobre os riscos de cada medicamento que a mãe está utilizando, de
forma didática e explicando cada efeito colateral possível.
• Estimular a pacientes a reduzir ou até mesmo interromper o uso da
substância. É importante frisar que o tratamento deve ser específico para o
tipo de substância que a mulher estiver fazendo uso, por exemplo se for
abuso de benzodiazepínicos deve passar por desintoxicação médica para
minimizar e reduzir sintomas de abstinência.
Consequentemente, a abordagem multidisciplinar da equipe de saúde da
família (ESF) torna-se fundamental, especialmente no sistema de saúde brasileiro em
que a porta de entrada para atendimento consta-se na atenção primária. Sendo assim,
durante as reuniões semanais com a equipe as Agentes Comunitárias de Saúde
(ACS), por exemplo, devem ser informadas sobre a situação e discutido caso por caso,
de forma individual, para que princípios como equidade e integralidade sejam
preservados e cumpridos. Além disso, caso necessário pode ser feita a abordagem
interdisciplinar pela psiquiatria e psicologia básica ou encaminhar para Centros de
Atenção Psicossociais de álcool e drogas (CAPS ad).

Cuidados no pré-natal de rotina dessas pacientes

Componentes de rotina do pré-natal de qualquer gestação devem ser


realizados como avaliação de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST’s) como
sífilis, gonorreia, clamídia, hepatite B e HIV. Entretanto, deve ser levado em
consideração diversos outros riscos que essas pacientes tem devido ao uso de
substâncias. Paciente que fazem abuso de álcool, por exemplo, pode ser necessário
um acompanhamento mais próximo do crescimento fetal na segunda metade da
gravidez. Apesar do risco materno-fetal do uso de substâncias, somente isso não é
indicação de monitoramento fetal com testes sem estresse e perfil biofísico fetal.

Como deve ser feita a avaliação neonatal desses bebês?

Todos os bebês expostos à substância devem ser observados por um período


de tempo após o parto para observar sinais de desregulação neurocomportamental e

41
sintomas da síndrome de abstinência neonatal.
Os médicos devem atentar-se para sinais de desregulação
neurocomportamental relacionada a exposições a substâncias. Ademais, deve-se
avaliar o bebê quanto à idade gestacional, tamanho e evidência de infecção congênita
ou malformação.
A prematuridade e a restrição do crescimento fetal (CIUR) podem estar
diretamente relacionadas a exposições específicas, como cocaína e nicotina. Além
disso, as mães com transtorno de uso de substâncias têm menor probabilidade de ter
cuidados pré-natais e maior chance de ter outras condições associadas como má
nutrição. Devido a isso, ocorre um aumento do risco de prematuridade e restrição do
crescimento fetal. A prematuridade e o CIUR aumentam a morbidade e mortalidade
em bebês afetados em comparação com bebês nascidos a termo de tamanho
apropriado para a idade gestacional (AIG).
Bebês nascidos de mães com transtornos por uso de substâncias têm maior
risco de infecções congênitas. A avaliação deve incluir a triagem e a identificação para
infecções maternas, incluindo hepatite, sífilis e vírus da imunodeficiência humana
(HIV).

SÍNDROME DA ABSTINÊNCIA NEONATAL (SAN)

A Síndrome de Abstinência Neonatal (SAN) descreve a síndrome de


abstinência em recém-nascidos que são expostos a opioides e/ou outras substâncias
no útero.
Os sinais clínicos de abstinência neonatal abrangem disfunção em quatro
domínios neurocomportamentais: regulação autonômica, capacidade de atenção e
controle do estado, respostas a estímulos sensoriais e controle motor e de tônus. As
manifestações podem incluir: choro, irritabilidade, distúrbios do sono ou da vigília,
alterações no tônus ou movimentos, dificuldades de alimentação, distúrbios
gastrointestinais e autonômicos, problemas respiratórios e deficiência de crescimento.
Embora a desregulação neurocomportamental induzida por drogas pode
acontecer com uso da maior parte de substâncias, a apresentação clínica de cada
recém-nascido depende da exposição da substância específica. Além disso, depende
também da quantidade consumida, do sexo da criança e até de fatores genéticos e
epigenéticos.

42
A avaliação da SAN deve começar no nascimento para todos os recém-
nascidos expostos às substâncias e a avaliação contínua deve ser realizada de três a
quatro horas durante toda a hospitalização do bebê.
Os principais objetivos do tratamento da SAN é promover a regulação infantil e
minimizar os sintomas do lactente, otimizando o manuseio e o ambiente e usando
apenas farmacoterapia quando necessário. Dessa forma, o cuidado não
farmacológico é o tratamento de primeira linha para todos os bebês expostos a
substâncias e é individualizado. Deve-se ter cuidados com a pele da criança, por
exemplo, para prevenir escoriações cutâneas devido ao atrito excessivo em bebês
hipertônicos e enfaixar o bebê, reduzindo assim o trauma na pele. Os cremes de
barreira tópicos usados para tratar a dermatite das fraldas devem ser aplicados
precocemente, aos primeiros sinais de irritação da pele, nas áreas afetadas para
proteger a pele e prevenir danos posteriores.
O tratamento medicamentoso da SAN deve ser iniciado para os bebês
que apesar dos cuidados não farmacológicos apresentam sinais de abstinência,
sendo relativamente graves e que comprometem o sistema autonômico, alimentação
e interação. A utilização de medicamentos depende da substância específica e deve
ser consultado e realizado da maneira correta pelo pediatra.

Cuidados pós alta

Além de todo o apoio feito durante o pré-natal e parto, é necessário um


acompanhamento contínuo do bebê após a alta. Este cuidado pediátrico é instituído
em acompanhamento com a assistência social, alertando para os casos de
necessidade de acolhimento institucional do neonato. As consultas frequentes serão
necessárias para avaliar o desenvolvimento da criança e identificar precocemente
qualquer sinal de atraso no neurodesenvolvimento.

Existem sequelas clínicas a longo prazo para esses bebês?

É relativamente difícil determinar a contribuição da exposição pré-natal à


substância em relação aos efeitos das comorbidades maternas e neonatais. A maioria
das evidências é de natureza observacional e os resultados são indefinidos e,
portanto, os efeitos diretos de longo prazo da exposição pré-natal ao uso de

43
substâncias permanecem inconclusivos. Entre os estudos longitudinais que abordam
as consequências, anomalias congênitas, déficit de atenção, problemas de
comportamento, prejuízos no desenvolvimento motor, cognitivo e de linguagem são
os acometimentos mais encontrados na infância.

SÍNDROME ALCÓOLICA FETAL

A síndrome alcoólica fetal é uma condição que pode ser consequência da


exposição ao álcool durante a gravidez, independentemente da quantidade de álcool
consumida. Esse problema pode causar danos cerebrais irreversíveis na criança e
atrasos no crescimento. Os sintomas são variáveis, podendo apresentar
malformações físicas, deficiências intelectuais ou cognitivas e dificuldades com as
atividades do dia-a-dia.

Os dismorfismos físicos podem incluir:


• Características faciais distintas, incluindo olhos pequenos, lábio superior
fino, nariz curto e uma superfície de pele lisa entre o nariz e o lábio
superior;
• Deformidades de articulações, membros e dedos;
• Crescimento físico lento;
• Dificuldades de visão ou problemas auditivos;
• Circunferência da cabeça pequena;
• Defeitos cardíacos, renais e ósseos.

Problemas com o cérebro e o sistema nervoso central podem incluir:

• Má coordenação ou equilíbrio;
• Deficiência intelectual, distúrbios de aprendizagem e atraso no
desenvolvimento;
• Memória fraca;
• Problemas com atenção e processamento de informações;
• Dificuldade de raciocínio e resolução de problemas;
• Dificuldade em identificar as consequências das escolhas;
• Poucas habilidades de julgamento;

44
• Agitação ou hiperatividade;
• Mudança rápida de humor;
• Questões sociais e comportamentais.

Problemas de funcionamento, enfrentamento e interação com outras pessoas


podem incluir:

• Dificuldade na escola;
• Dificuldade em se relacionar com os outros;
• Poucas habilidades sociais;
• Problemas para se adaptar à mudança ou alternar tarefas;
• Problemas com comportamento e controle de impulso;
• Problemas para permanecer na tarefa;
• Dificuldade em planejar ou trabalhar em direção a uma meta.

O diagnóstico precoce pode ajudar a reduzir problemas como dificuldades de


aprendizagem e problemas comportamentais. Por isso, é importante que ao atender
uma criança ou adolescente que foi adotado e possivelmente pode ter sido exposto a
álcool e drogas no útero, o médico saiba identificar os sintomas e aconselhar os pais
para um melhor acompanhamento e reabilitação.

45
REFERÊNCIAS

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em: http://www.schwartzman.com.br/php/index.php?option=com_content&view=article&id=52:sindrom
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46
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por gestantes. Rev. Bras. Saúde Mater. Infant., Recife. v. 20, n. 4, p. 1101-1107,
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2021. http://dx.doi.org/10.1590/1806-93042020000400010.

47
CAPÍTULO 6 - “ADOÇÃO POSITHIVA”: AS DÚVIDAS MAIS COMUNS
AO ADOTAR CRIANÇAS E ADOLESCENTES HIV+

Karolyne Michele Moura Raftopoulos

A MÃE É HIV+ E TEVE UM BEBÊ. A CRIANÇA IRÁ TER AIDS TAMBÉM?

Primeira questão que deve ser esclarecida: ser HIV+ não necessariamente é
ter AIDS. HIV+ significa que a pessoa é infectada por aquele vírus, mas ela pode ou
não vir a desenvolver a doença e os sintomas em si, ou seja, ter AIDS. Por exemplo,
você pode ter o vírus da gripe no seu organismo, mas não estar gripado(a)!
Durante a gestação de mulheres soropositivas, existe um protocolo
estabelecido para prevenção da transmissão do HIV da mãe para a criança usando
antirretrovirais. No momento do parto a genitora recebe um antiviral específico
chamado AZT e a criança imediatamente após o nascimento recebe AZT via oral, e a
administração deverá ser mantida durante as seis primeiras semanas de vida. Só
devido a isso diminui 70% a chance de contaminação.

O QUE SIGNIFICA QUANDO A CRIANÇA EXPOSTA AO VÍRUS HIV


“NEGATIVOU”?

O mais importante e o que define se a criança vai "negativar" (ou seja, foi
exposta, mas não infectada) são os exames de sangue que detecta carga viral e são
feitos nos primeiros messes de vida. A criança com 18 meses ou menos será
considerada infectada quando se obtiver resultado detectável em duas amostras
obtidas em momentos diferentes. E não infectada se esse resultado for não
detectável.
Aquelas que se revelarem infectadas deverão permanecer em atendimento em
unidades especializadas.
Durante os primeiros 18 meses de vida, o bebê pode ter o teste positivo, pois
ele recebeu anticorpos contra o vírus que a gestante HIV+ produziu e passaram pela
placenta, fazendo o teste ELISA ser positivo. Mas estes testes não significam que ele

48
é portador do HIV. Por isso é preciso que até os 18 meses de vida a criança faça este
teste de 3 em 3 meses. Só depois de 18 meses há o desaparecimento dos anticorpos
que a genitora passou para o bebê, e a partir daí, se o teste ELISA for positivo ele
estará contaminado, se for negativo ele não recebeu o vírus, apenas os anticorpos.

COMO É O TRATAMENTO DE UMA CRIANÇA COM HIV+?

A criança imediatamente após o nascimento recebe AZT via oral, e a


administração deverá ser mantida durante as seis primeiras semanas de vida.
Depois dos 18 meses de idade, quando a infecção é confirmada, o início do
tratamento depende de exames que vão acompanhar a capacidade imunológica e a
carga viral.
Alguns remédios, para crianças até 2 anos, são apresentados na forma de
solução oral e com dosagem específica.
Outros comprimidos são destinados a crianças entre 4 e 5 anos e são prescritos
de acordo com o peso do paciente e outros fatores. Neste tempo é muito importante
a realização periódica de exames de sangue, pra ver se o remédio continua fazendo
efeito ou se é o caso de trocar de medicamento/terapia. São vários medicamentos
disponíveis atualmente e a maioria é administrada de 12 em 12h.
As crianças que vivem com HIV no Brasil contam desde 2011 com um novo
tratamento, o primeiro antirretroviral (ARV) incorporado ao SUS exclusivamente para
esses pacientes, o Tipranavir.

QUAL SERIA O ACOMPANHAMENTO MÉDICO? QUAIS OS PROFISSIONAIS VÃO


ACOMPANHAR MINHA CRIANÇA?

O acompanhamento deve ser mensal nos primeiros 6 meses e, no mínimo,


bimestral a partir do 2º semestre de vida. Normalmente as consultas são realizadas
em unidades especializadas, com infectologistas. Além disso, na rotina “normal”, o
pediatra é importante.
Nessas primeiras consultas explora também a presença de sinais e sintomas
sugestivos, que em casos mais raros e graves (quando a mãe não faz o tratamento
durante a gestação, quando a carga viral é muito alta, etc.) pode identificar a presença

49
de manifestações neurológicas, incluindo encefalopatia, convulsões e retardo do
desenvolvimento.

O SUS FORNECE TODA A MEDICAÇÃO? CASO NÃO, QUAL A MÉDIA DE


VALOR?

Sim, todo o tratamento pode ser disponibilizado pelo SUS.

QUAL A QUALIDADE DE VIDA POSSÍVEL PARA UMA CRIANÇA HIV+ HOJE?

As diferenças pra uma criança que não é infectada com HIV pra uma que é,
são mínimas. Hoje em dia, com o tratamento necessário e crônico e o
acompanhamento médico periódico, a criança/adolescente/adulto HIV+ pode ter uma
vida normal.
Porém, a imunidade de um bebê ou uma criança que tem o HIV costuma ser
mais frágil. Por isso, principalmente quando é bebê, precisa de cuidados especiais,
pois ele pode contrair com mais facilidade que outras crianças doenças como
pneumonia, diarreia, infecção de ouvido, infecção de pele, além de dificuldade de
ganhar peso e crescer. Mas isso não é regra!

ENTRE CRIANÇAS É COMUM ACIDENTES COM PEQUENOS FERIMENTOS


(CORTES E ARRANHÕES). COMO DEVEREI PROCEDER? ELA PODERÁ
PRATICAR ESPORTES COLETIVOS, SE DESEJAR?

O contato social por brincadeiras é fundamental para o desenvolvimento. Não


se tem conhecimento de crianças que se infectaram brincando. As brincadeiras,
contatos ao beijar, tomar banho, participar do mesmo espaço são muito saudáveis e
o HIV não pega pelo ar. A criança não pega o vírus convivendo com uma pessoa
soropositiva.
Nos acidentes onde as crianças se machuquem, os cuidados já são
conhecidos: é preciso lavar bem as mãos, limpar o ferimento e proteger-se do contato
com o sangue, independente se a criança é ou não portadora do HIV. Se a criança
brincando teve um corte, isso não vai transmitir o vírus. Exemplo: duas crianças
bateram a cabeça uma na outra. O sangramento ocorre depois do atrito, não havendo

50
exposição contínua com o sangue contaminado, diferente do que acontece em um
acidente grave de carro em que uma das vítimas é soropositivo, por exemplo.

DEVO COMUNICAR À ESCOLA?

Toda criança tem direito à educação. A Constituição e o Estatuto da Criança e


do Adolescente garantem isso. O que normalmente é feito é avisar à escola sobre o
histórico de doenças do aluno, sabendo que a escola é obrigada a manter sigilo sobre
a soropositividade. É importante compartilhar por causa das possíveis faltas para
tratamento, no caso de acidentes ou a garantia que essa criança/adolescente possa
fazer uso de medicamentos no ambiente escolar. Da mesma forma, uma criança
diabética pode passar mal, ou uma hemofílica pode se cortar seriamente. É importante
a orientação dos pais como proceder em um caso desses. Professor não é médico,
mas é um imediato adulto responsável e precisa saber agir.
A desinformação da comunidade escolar, especialmente dos profissionais da
escola e os responsáveis pelos alunos, sobre as formas de transmissão do HIV, é
uma das maiores barreiras ao avanço das questões relacionadas a crianças
soropositivas e escolas. Devido ao PRECONCEITO. Ainda é preciso compreender
que uma criança sadia em contato com uma HIV+ não corre riscos por compartilhar
camisetas esportivas, compartilhar doces ou chicletes, dar um beijo, receber
arranhões produzidos durante uma brincadeira, compartilhar piscinas, banheiras ou
chuveiros, etc...

QUAL A MELHOR IDADE PARA CONTAR A ELE/ELA?

Isso é muito relativo, pois cada criança é única. Alguns especialistas dizem que
deve ser encorajada a revelação para as crianças em idade escolar. O processo de
revelação deve ser discutido e planejado com os pais ou responsáveis, e pode
requerer várias consultas para avaliar o nível de esclarecimento da criança. Nesse
momento pode-se recomendar o acompanhamento psicológico.
Aos 5 ou 6 anos de idade, as crianças se sentem incomodadas pois os pais
não explicam os motivos reais para elas precisarem de tantos remédios e tantas visitas
ao médico. Se transforma em um mistério que desperta a curiosidade da criança.
Quando a revelação é feita de uma forma planejada, processual, isso ajuda na adesão

51
aos medicamentos, no entendimento dos possíveis efeitos colaterais e da
necessidade de cuidados extras, importantes para o bom quadro clínico da criança. O
contrário, portanto, traz uma série de danos. Pacientes que recebem a notícia do
diagnóstico de forma desastrosa, em geral, são os que apresentam os piores
indicadores de saúde, depressão e outras manifestações que influenciam
negativamente na vivência com o HIV.

NA ADOLESCÊNCIA, COMO APOIAR A ELE/ELA PARA QUE NEM SE PRIVE DE


TER RELACIONAMENTOS SAUDÁVEIS NEM EXPONHA OUTRAS PESSOAS AO
RISCO DA CONTAMINAÇÃO?

A adolescência é uma fase de conflitos internos em busca de uma identidade


e de um amadurecimento para a vida adulta, e estes tendem a aumentar quando esta
fase se associa uma doença crônica, como ser portador do vírus HIV. Para os
adolescentes, é difícil aceitar a doença, especialmente quando esta interfere em suas
atividades diárias, sexualidade e no relacionamento em geral. Sem contar que nessa
faixa etária eles começam a descobrir o preconceito. Por isso, é muito importante o
apoio familiar e da equipe de saúde que acompanha, inclusive o psicólogo, de forma
a manter a adesão do tratamento e explicar a importância de se prevenir na hora das
relações sexuais (o uso da camisinha é essencial).

52
REFERÊNCIAS

GUERRA, Camila Peixoto Pessôa; SEIDL, Eliane Maria Fleury. Crianças e adolescentes com HIV/Aids:
revisão de estudos sobre revelação do diagnóstico, adesão e estigma. Paidéia (Ribeirão Preto)
[online]. 2009, v. 19, n. 42 pp. 59-65. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0103-
863X2009000100008

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HIV: pesquisa participante com profissionais e gestores. Artigo extraído da dissertação de mestrado de
autoria de Daniela Dal Forno Kinalski, defendida no ano de 2016, Programa de Pós-graduação em
Enfermagem. Universidade Federal de Santa Kinalski. Escola Anna Nery [online]. 2021, v. 25, n. 2
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MACÊDO, Thuanny Silva de et al. Qualidade de vida em crianças portadoras do Vírus da


Imunodeficiência Humana (HIV). Cadernos Saúde Coletiva [online]. 2020, v. 28, n. 2, pp. 223-230.
Disponível em: https://doi.org/10.1590/1414-462X202028020233

PACHECO, Bruna Peres et al. Dificuldades e facilidades da família para cuidar a criança com HIV/Aids.
Escola Anna Nery [online]. 2016, v. 20, n. 2, pp. 378-383. Disponível em: https://doi.org/10.5935/1414-
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ZANON, Bruna Pase; PAULA, Cristiane Cardoso; PADOIN, Stela Maris de Mello. Revelação do
diagnóstico de HIV para crianças e adolescentes: subsídios para prática assistencial. Revista Gaúcha
de Enfermagem [online]. 2016, v. 37. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1983-
1447.2016.esp.2016-0040

53
CAPÍTULO 7 – DESENVOLVIMENTO AFETIVO-EMOCIONAL E A
RELAÇÃO COM O ABANDONO E A ADOÇÃO

Mateus de Carvalho Barbosa

O presente capítulo busca explicitar as repercussões do abandono e da adoção


no desenvolvimento afetivo-emocional da criança. A princípio, entender o processo do
desenvolvimento afetivo-emocional de um indivíduo exige mais do que o presente
esboço aqui elencado, o que faz ser necessário o referido recorte. Assim, a fim de
abordar por meio de uma base teórica bem consolidada, percebe-se a notória
relevância que a Teoria do Apego (TA) circunscreve em relação aos temas do
abandono e da adoção na contemporaneidade.

DESENVOLVIMENTO AFETIVO-EMOCIONAL NA PERSPECTIVA DA TEORIA DO


APEGO

As observações em relação ao cuidado inadequado na primeira infância e às


instabilidades emocionais em frente à separação dos cuidadores fez com que o
psiquiatra e psicanalista inglês John Bowlby percebesse a relevância dessa interação
primária para o desenvolvimento afetivo-emocional. Nesse sentido, na década de
1940, Bowlby começou as primeiras hipóteses relativas à TA. É importante dizer
também que a TA, desde o seu princípio até os dias atuais, experienciou importantes
mudanças e contribuições por meio de novos discípulos e teóricos, apesar de que
suas ideias centrais ainda permanecem mais vigentes do que nunca.
A TA considera os processos do desenvolvimento normal e a sua possível
implicação psicopatológica. Sobre esta última, infere-se que a TA pode ser abordada
a fim de compreender os mecanismos psicológicos aplicados na presença de uma
perda ou um trauma e, também, na experiência de abandono ou rejeição pelas figuras
de apego. Dessa forma, essa teoria proporciona um suporte para melhor compreender
o desenvolvimento dos afetos e das emoções do indivíduo desde a sua infância.

54
Bowlby concebe que o apego é inato a todo ser humano, sendo, portanto, algo
de organização biológica, assim como a alimentação e a sexualidade. Além disso, um
dos preceitos fundamentais da TA é de que as interações da primeira infância
influenciam o modo como o apego funcionará no decurso de toda a vida do indivíduo.

MODELO INTERNO DE FUNCIONAMENTO

A teoria também conceitua o termo “modelo interno de funcionamento” para


explicar as representações das vivências da infância, juntamente com as percepções
do ambiente, do próprio self e das pessoas que estabeleceram apego. As vivências
com a primeira figura de apego vai ser uma projeção das expectativas sobre si, das
outras pessoas e do meio social, com repercussões importantes na personalidade que
se desenvolve. Assim, essa imagem interna de si própria é o alicerce para o modo
como o indivíduo estabelecerá os seus relacionamentos íntimos no futuro.

OS PADRÕES DE APEGO

Ao longo dos aprimoramentos da TA por meio do método experimental


denominado Situação Estranha, em que se analisa as reações da criança diante da
separação de seu cuidador, M. Ainsworth e futuros colaboradores originaram o
sistema de classificação do apego entre o cuidador e a criança. Os padrões foram
classificados em: seguro, ambivalente ou resistente, evitativo e desorganizado.
Assim, o padrão seguro diz respeito a uma relação entre cuidador e criança que
possui uma base segura, em que a criança pode conhecer seu ambiente de forma
estimulada e entusiasmada. Mesmo que se sentem incomodadas quando separadas
dos cuidadores, essas crianças não se abatem de modo exagerado. Ademais, pré-
escolares com apego seguro apresentam melhor identificação de emoções complexas
em outras pessoas, certamente um correlato da capacidade de relacionamento
posterior. Do mesmo modo, pré-escolares com padrões de apego seguro tendem a
ter mães que conversam com eles sobre emoções de uma forma mais elaborada, rica
e detalhada.
Em relação ao padrão resistente ou ambivalente é entendido quando, antes
mesmo de vivenciar a Situação Estranha, a criança tem condutas imaturas para sua
idade e baixo entusiasmo em explorar o ambiente. Assim, elas voltam a atenção aos

55
cuidadores de forma preocupada. Isso pode ser explicado pelo fato de que mesmo
essas crianças terem sido atendidas em suas demandas de cuidado em muitos
momentos, em alguns outros, ela não alcançou resposta, o que gerou uma possível
falta de confiança para com os cuidadores
Já o padrão evitativo se refere às crianças que brincam tranquilamente e que
interagem de modo escasso com os cuidadores, mas com estranhos já se mostram
pouco inibidas e logo se interagem com pessoas desconhecidas em brincadeiras no
momento da Situação Estranha. O motivo para esse padrão é de que as crianças
evitam procurar os cuidadores depois de terem sido rejeitadas por eles de algum
modo. Ademais, uma hipótese é de que, ao buscar o cuidado, talvez a criança foi
rejeitada, desenvolvendo esse mecanismo de ocultação dos afetos em momentos de
adversidade.
E, por último, o padrão desorganizado é constituído por indivíduos que, no
momento da Situação Estranha, revelam um comportamento conflituoso, sem
apresentar condições de sustentar uma estratégia para lidar com a adversidade. As
crianças também têm comportamentos de impulsividade e agressividade. Os teóricos
apontam que esse padrão é característico da situação de abuso, na medida em que
a criança fica realmente sem estratégia comportamental diante uma adversidade
dessa natureza, independentemente se o abusador é o próprio cuidador ou alguém
externo à relação de apego.

TEORIA DO APEGO NO CONTEXTO DO ABANDONO E DA ADOÇÃO

Como foi dito, no tocante às influências do abandono no desenvolvimento


afetivo-emocional do indivíduo, a TA pode trazer muitas contribuições para o
entendimento mais acurado sobre a forma como se desenvolvem os possíveis
processos psicopatológicos desse contexto específico que também pode ser
entendido como uma forma de perda. Assim, se as relações de apego são alinhavadas
por meio das relações primárias que serão protótipos para os futuros elos, é inegável
dizer que as rupturas desses vínculos primários por abandono ou perda têm uma forte
consequência no desenvolvimento afetivo-emocional de qualquer indivíduo, na
medida em que é estabelecido o modelo internalizado de funcionamento. Nesses
contextos, muitas vezes as rupturas de vínculos podem ser irremediáveis, mas, a

56
perspectiva de crescimento e a construção de novos elos de afetos vão depender de
como essa perda foi experimentada e elaborada.
Desse modo, muitas variáveis podem fazer com que um indivíduo consiga
superar ou, ao contrário, agravar seu estado de perda ou de abandono, o que também
leva a sustentação de que os padrões de apego são modificáveis ao longo da vida e,
sendo assim, vários fatores tendem a aumentar a probabilidade de uma mudança no
padrão de apego configurado a priori. Esses fatores incluem divórcio, perda de um
dos pais, doença com risco de vida de um pai ou filho, transtorno psiquiátrico em um
dos pais e abuso físico ou sexual por um membro da família.
Um estudo longitudinal sobre o apego entre cuidador e criança encontrou uma
variedade significativa de resultados para crianças criadas em circunstâncias
semelhantes e apontou para a importância de estressores cumulativos no resultado
do padrão de apego. O estudo diz que construções inatas de personalidade e outros
fatores geneticamente determinados podem interferir no resultado final do padrão de
apego de maneira significativa, tornando algumas crianças mais suscetíveis e outras
menos, a efeitos ambientais.
Esses estudos revelam que de um lado existem fatores externos que podem
ajudar ou agravar a construção de um apego seguro, mas de outro, existem também
fatores internos. Estes últimos fazem pensar nas possibilidades de que, mesmo no
contexto da perda - mais especificamente do abandono por parte da figura do cuidador
primário-, o indivíduo ainda pode apresentar características inatas como parte
significativa do resultado do seu apego seguro e da construção saudável do seu
desenvolvimento afetivo-emocional.
Já um outro estudo longitudinal que acompanhou 125 crianças adotadas de 1
ano até os 14 anos teve a variável “apoio sensível da mãe na primeira infância e
adolescência” como resultado notório para a continuidade do apego seguro durante
os treze anos, sendo que essa variável previu a continuidade do apego seguro de 1 a
14 anos, enquanto a variável “apoio menos sensível da mãe na primeira infância, mas
o apoio mais sensível da mãe na adolescência” previu a mudança das crianças de
padrões de apego inseguro na infância para padrões de apego seguro na
adolescência. Desse modo, o estudo concluiu que o apoio sensível dos pais, tanto no
início quanto no final, é importante para a continuidade do apego ao longo dos
primeiros 14 anos de vida. Contudo, as limitações deste estudo se referem ao contexto
socioeconômico das 125 crianças adotadas analisadas durante esses treze anos de

57
pesquisa, sendo que todas elas eram de classe média na Holanda, o que talvez não
reflita tanto a realidade em outros contextos.
Alguns estudos no campo das ciências sociais também já se debruçaram
acerca das repercussões do desenvolvimento socioemocional em crianças que
passaram os primeiros anos em circunstâncias de extrema carência. Muitos desses
estudos foram delineados de forma longitudinal com acompanhamento desde a
primeira infância até a adolescência e, sendo assim, os resultados revelaram déficits
marcantes na capacidade de apego e relacionamento e, infelizmente, essas crianças
não melhoraram esses aspectos de modo satisfatório após a adoção. Foi descoberto
também que crianças adotadas precocemente por meio de instituições de cuidados
inadequados têm menor probabilidade de apresentar sinais persistentes e nocivos do
que crianças adotadas em um momento mais posterior.
Crianças que são adotadas depois do primeiro ano de situações onde existem
profundos maus-tratos são mais favoráveis a terem sintomas crônicos, os quais
incluem padrões com algum espectro autista, hiperatividade, comprometimento
cognitivo e desorganização ou desordem do apego. Essas crianças também
costumam mostrar sinais de Transtorno de Apego Reativo (TAR), diagnóstico
psiquiátrico que é encontrado com muita frequência em crianças que sofreram maus-
tratos, envolvendo sérias dificuldades nas relações sociais. Crianças com diagnóstico
de TAR também geralmente mostram sinais de apego com o padrão desorganizado.

CONCLUSÕES

A TA tem como alicerce os processos de interação entre a criança e o cuidador


na primeira infância. Assim, essa primeira relação afeta o modo como as futuras
formas de apego serão construídas durante toda a existência de qualquer ser humano
no entremeio da cultura ocidental contemporânea. Nesse sentido, aplicado ao
contexto do abandono e da adoção, o desenvolvimento afetivo-emocional pode ser
melhor compreendido nessa perspectiva da TA.
Contudo, é relevante dizer que algumas limitações são inerentes à TA, como,
apesar de múltiplos ajustes, a controvérsia relativa às características deterministas
ainda permanece latente nessa teoria. Esse determinismo também pode ser
questionado no que se refere ao contexto do abandono e da adoção - esta, mesmo
que inconsciente, é um processo de perda da figura de apego primária - pois, como

58
foi observado, apesar de rupturas desses vínculos primários, ainda persiste no
indivíduo fatores internos como construções inatas de personalidades, fatores
geneticamente determinados e apoio sensível dos pais na adolescência, mesmo após
a ausência de apoio na primeira infância.
Assim, os estudos revelam as contribuições inerentes da TA, mas de todos
que foram analisados, os que conseguiram resultados mais satisfatórios e menos
ambíguos aplicaram a TA em pesquisas com análise quantitativa e delineamento
longitudinal.

59
REFERÊNCIAS

AINSWORTH, M. Patterns of attachment: A psychological study of the strange situation. Hillsdale:


Erlbaum. 1978.

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais:


DSM-5. 5.ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.

BEIJERSBERGEN, M. D., JUFFER, F., Bakermans-Kranenburg, M. J., & van IJzendoorn, M.


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infancy to adolescence in a longitudinal adoption study. Developmental psychology, 48(5), 1277–
1282. 2012.

BELSKY, J., PLUESS, M. The Nature (and Nurture?) of Plasticity in Early Human Development, 4
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DALBEM, Juliana Xavier; DELL'AGLIO, Débora Dalbosco. Teoria do apego: bases conceituais e
desenvolvimento dos modelos internos de funcionamento. Arq. bras. psicol., Rio de Janeiro, v. 57, n.
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MONETA C, MARÍA EUGENIA. Apego y pérdida: redescubriendo a John Bowlby. Rev. chil. pediatr.,
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WATERS, E., MERRICK, S. et al. Attachment Security in Infancy and Early Adulthood: A Twenty-Year
Longitudinal Study, 71 CHILD DEV. 684. 2000.

60
CAPÍTULO 8 - MARCAS DA VIOLÊNCIA: OS EVENTOS ADVERSOS
VIVIDOS NA INFÂNCIA E O IMPACTO NA SAÚDE

Victor Gabriel Oliveira Pessoa

Existem, atualmente, avanços consideráveis nas ciências sociais,


comportamentais, biológicas e na neurociência, os quais estão aprofundando cada
vez mais nosso conhecimento sobre a saúde física, a saúde mental e o
desenvolvimento psicomotor. Assim, surge a indagação sobre o que pode afetá-los e
sobre qual o papel exercido pelos pais e pela sociedade em relação a isso.

Sabemos que, apesar da genética representar o planejamento inicial de como


se dará o desenvolvimento humano, são as interações entre ela e o ambiente que irão
determinar se os padrões de saúde física e mental serão fortes ou fracos. Nesse
sentido, de acordo com a Associação Americana de Pediatria, para que uma
sociedade se estabeleça forte, ela depende de investimento nos primeiros anos de
vida do indivíduo, pois as reações fisiológicas e as experiências adversas vividas
nessa etapa da vida (até mesmo no período da gravidez) influenciarão em longo prazo
na saúde do indivíduo.

Dessa forma, despender esforços para caracterizar os mecanismos envolvidos


na interação entre a exposição precoce a experiências adversas e suas
consequências negativas à saúde tem se tornado um cenário emergente no meio
médico. Assim, essa relação tem sido objeto de vários estudos publicados nas mais
renomadas revistas médicas, o que nos permite ter cada vez mais subsídios ao
abordar o assunto.

O termo “experiências adversas vividas na infância” (EAI), de acordo com a


autora Bucci (2016), é um termo amplo para representar situações estressantes ou
traumáticas vivenciadas no período da infância, como: abuso (físico, mental, sexual),
negligência, problemas familiares (separação, violência sofrida pela mãe, uso de
drogas), bullying, desalojamento, discriminação, etc.

Tendo em vista isso, discutiremos nesse capítulo como os eventos e o


ambiente em que a criança vive, assim como a exposição a situações de violência

61
podem afetar a sua saúde a longo prazo. Assim, faremos isso explicando os conceitos
abordados e propondo medidas de intervenção que poderão auxiliar os pais nos
cuidados à saúde de seus filhos.

EVENTOS ADVERSOS VIVIDOS NA INFÂNCIA

O impacto das experiências adversas na infância representa um problema


central e desafiador na promoção da saúde, pois, frequentemente, elas envolvem uma
série de questões relacionadas às complexas relações familiares e ao ambiente em
que a criança vive. Adicionalmente, as crianças que sofrem com situações adversas,
como abuso e negligência, são comumente levadas a admissão institucional em
acordo com a lei 8069 de 1990, que entende que nenhuma criança será objeto de
crueldade ou violência.

Segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria em uma análise de notificações


de violência de 2009-2017, são registrados em média cerca de 233 casos de agressão
contra crianças e adolescentes menores de 19 anos diariamente, sendo cerca de 27%
por violência psicológica, 69% por agressão física e cerca de 3% por tortura. A maior
faixa etária de risco foram adolescentes entre 10 a 14 anos (com 20773 casos em
2017).

Ademais, vale ressaltar que há uma diferença étnica clara quanto a situações
precárias vividas na infância. Por exemplo, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), no período de 1992-2008 a porcentagem de crianças negras,
pardas, indígenas e amarelas representava 81% da população de crianças em
situação de trabalho infantil, contra apenas 19% de crianças brancas. Isso significa
que a cada 100 crianças vítimas do trabalho infantil, 81 eram pretas, pardas, indígenas
ou amarelas.

Essa disparidade étnica está presente em nosso país há muitos anos, onde
sabidamente a população de pessoas pretas, pardas e indígenas é a que vive em
piores condições econômicas segundo o próprio IBGE. Dessa forma, isso nos permite
entender como nossos maiores desafios além de sociais e econômicos, são também
étnicos.

62
VIOLÊNCIA E SAÚDE

Muitos estudos retrospectivos em adultos, isto é, aqueles em que adultos eram


investigados sobre eventos adversos ou violência na infância, conseguiram relacionar
seus desdobramentos na saúde. Nesse sentido, esses estudos foram fundamentais
para encontrar associações entre situações adversas e repercussões que levariam
muito tempo para se manifestarem, como, por exemplo, hábitos de vida não saudáveis
na vida adulta (tabagismo, alcoolismo).

Adicionalmente, além hábitos, os artigos científicos sugerem a alteração da


arquitetura cerebral, na qual áreas importantes para o controle de impulsos
emocionais e para o prazer teriam suas funções reduzidas. Vale ressaltar, também, o
desenvolvimento precoce de câncer e outras doenças devido à uma série de
alterações químicas que, em conjunto, levariam à redução da imunidade e a outras
repercussões metabólicas.

Tendo isso em vista, o estudo ACE (Adverse childhood experiences, que


significa Experiências Adversas na Infância) em 1998 sugeriu uma relação
proporcional entre situações de violência, abuso ou negligência e resultados negativos
à saúde. Nessa ocasião, quanto mais situações adversas, maiores foram as
repercussões, de forma que as pessoas que sofreram mais de quatro tipos de
exposição tiveram de 4 a 12 vezes mais chance de, ao envelhecer, desenvolver
alcoolismo, depressão, tabagismo e abuso de drogas.

Com isso, os estudos indicam que os principais hábitos ditos “não saudáveis”
desenvolvidos na vida adulta teriam suas raízes na infância, na qual o ambiente e o
fator de apoio parental (familiar) constituiriam ferramentas essenciais no
desenvolvimento daquele ser humano. Esses subsídios, então, auxiliariam a criança
a desenvolver mais estratégias de enfrentamento a situações ruins e sofreriam menos
os efeitos do estresse e do medo.

Nesse sentido, o Jornal médico The Lancet, em 2007 lançou uma revisão sobre
os principais fatores que afetariam o desenvolvimento na infância e, entre eles, foi
incluído a exposição a ambientes violentos. Além disso, o artigo chamou a atenção
para os países em que as crianças são expostas à conflitos como guerra e violência

63
na comunidade em que vivem, riscos os quais poderiam ser piores quando não há
uma figura de um cuidador que possa oferecer apoio.

Assim, isso indica a importância, novamente, da coesão familiar e da figura dos


pais para o desenvolvimento saudável e as repercussões a longo prazo da exposição
a quaisquer que sejam os riscos para a criança. Ademais, cabe ressaltar que a maioria
das situações exemplificadas até agora, em sua maioria, são fatores modificáveis e
que não dependem da pessoa em si, mas do meio em que ela vive e que, infelizmente,
pode exercer grande influência sobre sua saúde.

MECANISMOS DE RESPOSTA AO ESTRESSE

O mecanismo responsável por essas repercussões é conhecido e chamado de


estresse tóxico, que representa uma ativação inapropriada do nosso organismo a
situações adversas ou estressantes. Assim, sabemos que o estresse é uma resposta
natural do nosso corpo, mas quando prolongado e não contido, pode gerar
consequências disfuncionais ao indivíduo.

Quando estamos em situações de perigo (incluindo situações de estresse),


nosso organismo desencadeia uma série de sinalizações que fazem com que uma
série de hormônios sejam produzidos em sequência e, dentre eles, vale destacar o
cortisol, a adrenalina e a noradrenalina. O primeiro é produzido por nossas glândulas
suprarrenais, que são glândulas duplas que estão localizadas acima dos rins,
enquanto o segundo e o terceiro além de serem em parte produzidos nessas mesmas
glândulas, também são produzidos por gânglios nervosos espalhados por todo o
organismo.

O cortisol é responsável por fornecer energia ao nosso corpo em situações de


perigo, nas quais é produzido e tem a função de liberar glicose, fazer a quebra de
gorduras em ácidos graxos e liberar células de defesa que estavam armazenadas,
para que o organismo tenha energia e possa se defender. Contudo, apesar de ser
natural e benéfico nas situações comuns de estresse, se produzido a longo prazo
(como no estresse tóxico) pode gerar resultados ruins para o organismo, favorecendo

64
o aumento do açúcar no sangue, o aumento de gordura e a redução da nossa
imunidade.

Entretanto, o estresse (sentimento vivenciado nas situações exemplificadas


anteriormente), só passa a ser considerado tóxico para a criança quando não há a
presença de um cuidador responsável. Desse modo, é importante reforçar a presença
da família nos cuidados de saúde na infância, ao dar apoio emocional e ao oferecer
carinho e conforto que, por mais que sejam coisas básicas, têm base científica de que
são fundamentais para a criança.

COMO LIDAR?

Apesar de todos os efeitos negativos do estresse prolongado, é possível criar


subsídios e ferramentas que ajudem a criança a lidar melhor com essas situações.
Ainda, vale ressaltar que a maioria, de fato, consegue criar mecanismos que reduzem
esses efeitos nocivos da ativação de todos esses sistemas no organismo.

Nesse sentido, um estudo realizado em 2017, no Reino Unido, buscou embasar


cientificamente o papel de um adulto confiável no desenvolvimento de habilidades que
diminuiriam o impacto do estresse. Além disso, mostrou-se que, na presença desse
cuidador, a criança sentiria mais segurança de enfrentar situações traumáticas.

O estudo, semelhante ao ACE citado na seção “violência e saúde, foi feito de


maneira retrospectiva e, de forma quantitativa, mostrou que quanto mais situações
adversas e menos suporte, maior era a prevalência de comportamentos auto nocivos
na vida adulta, isso quando comparados com pessoas que não tiveram situações
traumáticas e tiveram suporte de adulto confiável.

Enquanto isso, damos o nome de resiliência, que reflete a capacidade do


indivíduo transformar o estresse tóxico em tolerável, para o conjunto de estratégias
de enfrentamento criadas pela criança. Nesse sentido, os fatores promotores de
resiliência foram exemplificados em: ligações culturais fortes, oportunidades de
desenvolver senso de autonomia, desenvolver habilidades motoras (aprender a falar
no tempo certo, aprender a andar na idade adequada) fortes e a própria relação sólida
com o cuidador.

65
Assim, a melhor forma de auxiliar a criança é através do incentivo ao
desenvolvimento, que pode ser feito junto a um médico pediatra, ao dar estímulos
positivos como leitura e atividades lúdicas. Adicionalmente, é importante o apoio
psicológico e estímulo a inteligência emocional, ao fazer com que a criança saiba lidar
com frustrações e situações adversas, pois há a necessidade de fazer com que os
estímulos positivos e as experiências ruins se equilibrem.

66
REFERÊNCIAS

AMERICAN ASSOCIATION OF PEDIATRICS. Policy Statement. Early Childhood Adversity, Toxic


Stress, and the role of the Pediatrician: Translating Developmental Science. PEDIATRICS. EUA.
10p. 2012. Disponível em: www.pediatrics.org/cgi/doi/10.1542/peds.2011-2662.

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against adverse childhood experiences. A retrospective study on adult health-harming behaviours
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issue 1, p 403-428. Ago, 2016

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Strengthen the Foundations of Resilience. National Scientific Council on the Developing Child.
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2017.

67
CAPÍTULO 9 - PSIQUIATRIA E ADOÇÃO: PRINCIPAIS
DIAGNÓSTICOS E COMO LIDAR COM ELES

Karolyne Michele Moura Raftopoulos

Em uma revisão sistemática da literatura, baseando principalmente em


pesquisas estadunidenses, os transtornos mentais mais comuns em crianças e
adolescentes adotados ou que vivem em abrigos são: depressão, Transtorno Opositor
Desafiador (TOD) e Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Alguns
estudos demonstram também a incidência de Transtorno do Apego Reativo (TAR),
principalmente em crianças mais novas.

Idade, sexo e dificuldades de aprendizagem, bem como baixo nível


socioeconômico, são preditores bem estabelecidos de problemas de saúde mental em
crianças e adolescentes em geral. Crianças adotivas também estão expostas a uma
variedade de outros fatores de risco, já que experiências adversas na infância, como
abuso psicológico e físico, negligência, e abuso de substâncias por parte dos
genitores aumentam o risco de problemas de saúde física e mental, bem como
comportamentos de risco à saúde.

TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH)

Crianças e adolescentes que vivem ou viveram em abrigos têm três vezes mais
chances de ter TDAH do que crianças fora de um abrigo, de acordo com a Academia
Americana de Pediatria. Embora preocupações tenham sido levantadas em relação
ao diagnóstico excessivo, este não é um fenômeno generalizado. Ao contrário,
existem muitas crianças com TDAH que não foram diagnosticadas ou receberam
tratamento adequado. É importante lembrar que nem todas as crianças com TDAH
são hiperativas. O TDAH também se refere à criança que simplesmente tem
dificuldade significativa com desatenção e distração. Os sintomas incluem:

Desatenção:

• Dificuldade de prestar atenção ou errar por descuido em atividades escolares;

68
• Dificuldade para manter atenção em tarefas ou atividades lúdicas;
• Parecer não escutar quando lhe dirigem a palavra;
• Não seguir instruções e não terminar tarefas escolares ou domésticas;
• Dificuldade em organizar tarefas e atividades;
• Evitar ou relutar em envolver-se em tarefas que exijam esforço mental
constante;
• Perder coisas necessárias para tarefas ou atividades;
• Ser facilmente distraído por estímulos alheios à tarefa;
• Apresentar esquecimentos em atividades diárias.

Hiperatividade:

• Agitar as mãos ou os pés ou se remexer nas cadeiras;


• Abandonar sua cadeira em sala de aula ou outras situações nas quais se
espera que permaneça sentado;
• Correr em demasia, em situações nas quais é inapropriado;
• Dificuldade em brincar ou envolver-se silenciosamente em atividades de lazer;
• Estar frequentemente "a mil" ou muitas vezes agir como se estivesse "a todo
vapor";
• Falar em demasia.

Impulsividade:

• Dar respostas precipitadas antes de as perguntas terem sido completadas;


• Dificuldade para aguardar sua vez;
• Interromper ou se meter em assuntos de outros (ex.: intromete-se em
conversas ou brincadeiras).

O TDAH é mais comumente diagnosticado nos primeiros anos do ensino


fundamental, e os professores costumam ser os primeiros a identificar as dificuldades
da criança. Embora os meninos sejam mais propensos a serem identificados como
tendo TDAH com hiperatividade, as meninas são mais propensas a serem
identificadas como tendo o "tipo desatento" do transtorno.

O diagnóstico de TDAH requer uma avaliação cuidadosa por um médico ou


psicólogo. É necessária uma avaliação diagnóstica completa, porque as crianças com
TDAH geralmente apresentam problemas adicionais de desenvolvimento, como

69
dificuldades de aprendizado, dificuldades de processamento auditivo ou transtorno do
humor. Além disso, essas mesmas condições podem realmente imitar ou ser
confundidas com o TDAH, mas cada uma exigiria uma abordagem diferente para o
tratamento.

Os três principais tipos de tratamento no TDAH são intervenções


comportamentais, intervenções educacionais e medicamentos (sendo essa a última
opção), tendo como apoio psicólogos, neurologistas e/ou psiquiatras.

Ao tentar modificar as ações de seu filho(a), comece pensando em uma


recompensa apropriada. Crianças mais novas geralmente gostam de ganhar
adesivos, mas uma criança mais velha pode responder melhor a ganhar pontos que
podem ser trocados por um privilégio especial - tempo a sós com os pais, ida ao
shopping, visita de um amigo, etc. Evite recompensas de comida, pois as crianças
podem escolher “junk food” (sanduíches, doces, etc.) que piorará a hiperatividade.

Em seguida, uma dica é escolher um comportamento que você gostaria de


trabalhar e comece por pequenas mudanças. Exemplo, talvez você queira que seu
filho fique sentado à mesa durante o jantar... primeiro, peça a seu filho que se sente
quieto por cinco minutos - use diretrizes positivas: "sente-se quieto", por exemplo, em
vez de "não se contorça". Se ele ainda estiver sentado quando o cronômetro tocar,
elogie-o e deixe-o escolher um adesivo para seu “gráfico de progresso” (pode ser um
caderno ou quadro). Se ele não conseguir atingir esse objetivo, reduza o tempo inicial
e aumente-o gradualmente.

Uma vez que o primeiro comportamento tenha melhorado significativamente


(por exemplo, a criança pode sentar-se calmamente à mesa por 10 minutos), adicione
um segundo objetivo e uma recompensa. Lembre-se, continue reforçando o primeiro
comportamento desejado (crianças pequenas devem ser reforçadas várias vezes ao
dia). Se você parar, o comportamento indesejável voltará. A chave para o sucesso é
paciência, consistência e reforço contínuos.

Com o tratamento adequado, uma criança com TDAH pode desenvolver uma
capacidade de atenção mais ampla, melhorar o desempenho escolar, ser menos
inclinada a agir impulsivamente e melhorar as interações sociais com a família e os
amigos. Quando não tratado, o TDAH pode contribuir para o fracasso escolar, conflitos
familiares e comportamentos de alto risco.

70
TRANSTORNO OPOSITOR DESAFIADOR

Todas as crianças se opõem de vez em quando, principalmente quando estão


cansadas, com fome, estressadas ou chateadas. Eles podem discutir, responder,
desobedecer e desafiar pais, professores e outros adultos. O comportamento de
oposição é uma parte normal do desenvolvimento para crianças de dois a três anos e
no início da adolescência.

No entanto, o comportamento abertamente não cooperativo e hostil torna-se


uma preocupação séria quando é tão frequente e consistente que se destaca quando
comparado com outras crianças da mesma idade e nível de desenvolvimento e
quando afeta a vida social, familiar e acadêmica da criança. Então, como saber
quando há um problema comportamental real, como o Transtorno Opositor Desafiador
(TOD)? Os sinais de podem se manifestar de maneiras diferentes e estão descritos
abaixo:

Humor raivoso/irritável:

• Com frequência perde a calma;


• Com frequência é sensível ou facilmente incomodado;
• Com frequência é raivoso e ressentido.

Comportamento questionador/desafiante:

• Frequentemente questiona figuras de autoridade, como pais e professores;


• Frequentemente desafia ou se recusa a obedecer a regras ou pedidos;
• Frequentemente incomoda outras pessoas;
• Frequentemente culpa outros por seus erros ou mau comportamento.

Índole vingativa:

• Apresenta episódios em que foi malvado ou vingativo com adultos ou outras


crianças.

A persistência e a frequência desses comportamentos devem ser utilizadas


para fazer a distinção entre um comportamento dentro dos limites normais e um
comportamento sintomático.

71
A perturbação no comportamento está associada a sofrimento para o indivíduo
ou para os outros em seu contexto social imediato (ex.: família, colegas da escola) ou
causa impactos negativos no funcionamento social, educacional ou outras áreas
importantes da vida do indivíduo.

Uma criança que apresenta sintomas de TOD deve passar por uma avaliação
abrangente. É importante procurar outros transtornos que possam estar presentes,
como transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), dificuldades de
aprendizagem, transtornos do humor (depressão, transtorno bipolar) e transtornos de
ansiedade. Pode ser difícil melhorar os sintomas de TOD sem tratar o transtorno
coexistente.

O tratamento de TDO pode incluir:

• Treinamento para ajudar os pais e outras pessoas a gerenciar o


comportamento da criança;
• Psicoterapia individual para desenvolver um gerenciamento mais eficaz da
raiva;
• Psicoterapia familiar para melhorar a comunicação e a compreensão mútua;
• Treinamento de habilidades de resolução de problemas cognitivos e terapias
para diminuir a negatividade;
• Treinamento de habilidades sociais para aumentar a flexibilidade e melhorar as
habilidades sociais e a tolerância à frustração com os colegas;
• Os medicamentos podem ser úteis para controlar alguns dos sintomas mais
angustiantes do TOD, bem como os sintomas relacionados a condições
coexistentes, como TDAH, ansiedade e transtornos de humor.

Às vezes, o TOD é o resultado de seu filho sentir que não está no controle, o
que leva ao pânico. Nessa situação, você pode aprender técnicas de redução para
ajudá-los a lidar com a situação. Pesquisas sugerem que é melhor evitar o conflito por
completo e redirecionar seu filho para outra coisa. Uma das maneiras de escapar
totalmente do conflito é criando um cronograma ou rotina para seu filho seguir. Se
uma luta continuar de qualquer maneira, você pode tentar redirecionar o foco de seu
filho para uma tarefa diferente ou objetivo / recompensa futura.

72
Além disso, os pais também podem ajudar seus filhos com TDO das seguintes
maneiras:

• Sempre desenvolva os aspectos positivos, elogie a criança e dê um reforço


positivo quando ela mostrar flexibilidade ou cooperação;
• Dê um tempo ou faça uma pausa se estiver prestes a tornar o conflito com seu
filho pior, e não melhor;
• Escolha suas batalhas. Como a criança com TOD tem dificuldade para evitar
lutas pelo poder, priorize as coisas que você quer que seu filho faça. Se você
der a seu filho uma pausa na sala por mau comportamento, não acrescente
tempo para discutir. Diga "seu horário começará quando você for para o
quarto”;
• Estabeleça limites razoáveis e apropriados para a idade com consequências
que podem ser aplicadas de forma consistente;
• Manter outros interesses além do seu filho com TOD, de modo que cuidar do
seu filho não tome todo o seu tempo e energia. Tente trabalhar e obter apoio
de outros adultos (professores, treinadores e cônjuge) que lidam com seu filho.
• Gerencie seu próprio estresse com opções de vida saudáveis, como exercícios
e relaxamento. Use cuidados de descanso e outros intervalos, conforme
necessário;

Muitas crianças com TOD responderão às técnicas parentais positivas. Os pais


podem pedir ao seu pediatra ou médico de família que os encaminhe a um psiquiatra
infantil ou outro profissional de saúde mental qualificado que possa ajudar a
diagnosticar e tratar TOD e qualquer condição psiquiátrica coexistente.

TRANSTORNO DO APEGO REATIVO

O transtorno de apego reativo (TAR) e o transtorno de engajamento social


desinibido (TESD) são distúrbios raros, mas graves, que podem afligir crianças que
não conseguiram formar vínculos normais e adequados ao desenvolvimento com um
cuidador. O TAR faz com que as crianças se tornem emocionalmente retraídas em
relação aos cuidadores adultos, e as crianças com TESD demonstram falta de inibição
quando se trata de interagir com adultos desconhecidos.

73
Geralmente, uma criança com transtorno de apego reativo foi, em algum
momento, negligenciada, abusada ou órfã. Esse transtorno pode se desenvolver
quando as necessidades básicas da criança de conforto, afeto e nutrição não são
satisfeitas e os vínculos amorosos e afetuosos com os outros nunca são
estabelecidos. Isso pode mudar permanentemente o cérebro em crescimento da
criança, prejudicando a capacidade de estabelecer relacionamentos futuros.

Os sintomas principais incluem:

• Baixo ganho de peso;


• Higiene precária;
• Atraso no desenvolvimento neuropsicomotor;
• Expressão apática;
• Perda da alegria e brilho no olhar;
• Não resposta a trocas interpessoais (ex.: não compreender linguagem corporal,
evitar contato com o olhar, recusa em contatos físicos com outras pessoas,
etc.);
• Ausência de apego mesmo em momentos estressantes para a criança;
• Dificuldade na regulação emocional e baixa resposta social ou emocional;
• Reações de medo ou irritabilidade podem estar presentes e serem
desproporcionais.

De acordo com o DSM-5, os sintomas devem ser evidentes antes dos 5 anos
de idade, mas depois que a criança atinge a idade de desenvolvimento de pelo menos
9 meses. Com os filhos adotivos mais velhos (que podem ter TAR ou TESD, mas
nunca foram diagnosticados), pode ser um pouco mais complicado porque eles fazem
o que chamamos de “lua de mel”. Essas crianças são sobreviventes e, como seu
primeiro instinto é sobreviver, elas parecem fazer a transição com muita facilidade.
Mas, semanas ou meses depois, quando os pais adotivos tentam aumentar o nível de
afeto com a criança através de um abraço ou dizendo "Eu te amo", a criança começa
a se retrair e se afastar. Essas crianças tiveram tantas conexões rompidas, tantas
interrupções no apego que simplesmente não querem fazer isso de novo.

Embora uma quantidade crescente de estudos tenha sido feita sobre TAR e
TESD nos últimos anos, ainda há muito debate na comunidade médica sobre a melhor
forma de tratamento. A maioria dos tratamentos inclui o desenvolvimento e o aumento

74
da sensação de segurança e estabilidade da criança por meio de muitos cuidados e
muita estrutura. Os tratamentos mais estabelecidos são realizados por psicoterapia
especializada, auxiliando na interação entre pais e filhos e alterando o padrão de
comunicação emocional. Uma coisa é certa: os planos de tratamento precisam ser
personalizados para cada criança e incluir ajuda tanto para a criança quanto para os
pais.

É importante que o atendimento seja feito por um psicólogo, psiquiatra ou


neuropediatra com experiência nesses transtornos, para evitar atrasos de
diagnósticos ao interpretar que é um estágio ou que a criança está apenas em
transição. Esses profissionais não entendem que somente o tempo, sem o
devido tratamento, não vai curar o que está acontecendo com a criança.

Os três ingredientes terapêuticos para uma criança desenvolver novos padrões


de apego emocional são segurança, estabilidade e sensibilidade. O cuidador principal
deve praticar extrema paciência e dar tempo suficiente para a criança expressar suas
emoções. Os limites devem ser estabelecidos, mas de uma forma amorosa e
empática. Uma rotina diária estável e repetitiva deve ser praticada para que a criança
recupere a confiança e a normalidade em sua vida. Acordar todos os dias na mesma
hora, tomar café da manhã, praticar as mesmas atividades ou ir à escola mantendo a
mesma rotina noturna e de jantar é fundamental para garantir estabilidade.

O cuidador principal deve praticar o amor e a sensibilidade, mesmo quando a


criança age de maneira estranha. É importante atender às necessidades da criança
da maneira mais sensível possível. Esse processo pode levar muito tempo, até anos,
mas manter uma base sólida desses três ingredientes terapêuticos levará a uma
transição nas emoções e no comportamento da criança.

A ludoterapia é a abordagem mais comprovada usada por terapeutas para


crianças com TAR. Essa abordagem deve ocorrer na frente dos cuidadores principais
para permitir que a criança expresse suas necessidades, ansiedades e medos por
meio do contexto da brincadeira.

75
REFERÊNCIAS

BJ Sadock, VA Sadock. Manual Conciso de Psiquiatria da Infância e da Adolescência. Porto Alegre:


Editora Artmed, 2011.

Chaffin M, et al. Report of the APSAC task force on attachment therapy, reactive attachment
disorder, and attachment problems. Child Maltreat. 2006, 11 (1): 76-89.
10.1177/1077559505283699.

Dickstein DP. Oppositional defiant disorder. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry. 2010;49(5):435-6.

Egelund T, Lausten M: Prevalence of mental health problems among children placed in out-of-home
care in Denmark. Child Fam Soc Work. 2009, 14: 156-165. 10.1111/j.1365-2206.2009.00620.x.

Glowinski AL. Reactive attachment disorder: an evolving entity. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry
2011;50(3):210-2.

Kay C, Green J: Reactive attachment disorder following early maltreatment: systematic evidence
beyond the institution. Journal of abnormal child psychology. 2013, 41: 571-581. 10.1007/s10802-
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Krull KR. Attention deficit hyperactivity disorder in children and adolescents: Clinical features
and diagnosis. Augustyn M, Torchia MM, eds. UptoDate. Waltham, MA: UptoDate Inc. (Accessed on
May 2021).

Lehmann, S., Havik, O.E., Havik, T. et al. Mental disorders in foster children: a study of prevalence,
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https://doi.org/10.1186/1753-2000-7-39

McCann JB, et al. Prevalence of psychiatric disorders in young people in the care system. BMJ: Brit
Med J. 1996, 313: 1529-10.1136/bmj.313.7071.1529

McMillen JC, et al. Prevalence of psychiatric disorders among older youths in the foster care system. J
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Raaska H, et al. Internationally adopted children in Finland: parental evaluations of symptoms of reactive
attachment disorder and learning difficulties - FINADO study. Child Care Health Dev 2011.

76
CAPÍTULO 10 - VIOLÊNCIA SEXUAL NA INFÂNCIA E
ADOLESCÊNCIA

Mariana Pertence de Sousa e Silva


Karolyne Michele Moura Raftopoulos

De acordo com a Lei 13.431/17, a Violência Sexual é definida como qualquer


conduta que constranja a pessoa a praticar ou presenciar conjunção carnal ou
qualquer outro ato libidinoso, inclusive exposição do corpo em foto ou vídeo por meio
eletrônico ou não. Essa violência também engloba a exploração sexual comercial (em
troca de remuneração ou compensação) e tráfico de pessoas.
A violência sexual (VS) é um problema grave de saúde pública contra crianças
e adolescentes reconhecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Os dados
epidemiológicos sobre a ocorrência da VS contra crianças e adolescentes são
baseados, principalmente, em casos notificados, ou seja, não abrangem a totalidade
de ocorrências, tendo em vista que existem casos não notificados. Isso pode dar a
falsa impressão de que a VS é um fenômeno raro. A Vigilância de Violências e
Acidentes (VIVA) do Ministério da Saúde divulgou dados preliminares em 2011 que
apontaram a violência sexual ocupando a segunda posição dentre as violências
cometidas contra crianças sendo que na faixa etária de 0 a 9 anos a incidência é de
35% e entre 10 e 14 anos, o percentual corresponde a 10,5%.
Essa violência pode gerar impactos sociais, físicos, emocionais, psicológicos e
cognitivos com consequências irreparáveis para a vítima ao longo de toda sua vida. É
um ato que viola os limites da intimidade pessoal do indivíduo abrange todo o núcleo
familiar, e é permeado por sensações de culpa, vergonha e inadequação para a
maioria dos envolvidos.
As situações de violência sexual aguda correspondem, em sua grande maioria,
aos “assaltos sexuais”, correlacionados intimamente com a violência urbana, e
ocorrem principalmente no espaço público. São mais frequentes nos períodos de
trânsito entre casa/escola//lazer. As ameaças à vida ou à integridade física são
bastante explícitas. Estão fortemente associadas à violência física e acometem,

77
principalmente, adolescentes e mulheres adultas. O agressor geralmente é
desconhecido, sem vinculação com a vítima. O atendimento a esse tipo de situação
deve ser realizado o mais rápido possível em serviço de urgência, pela necessidade
de avaliação imediata e tratamento de eventuais lesões físicas e pelos prazos
definidos para o início das profilaxias contra doenças sexualmente transmissíveis
(DSTs) e gestação indesejada.
Já a violência sexual crônica, são situações que ocorrem por períodos de tempo
mais extensos, de maneira progressiva, cometidas principalmente contra crianças de
ambos os sexos por pessoas próximas, que contam com a confiança das vítimas e de
suas famílias. As ameaças são geralmente mais veladas, e o uso de violência física
nem sempre está presente. Existe a possibilidade de contaminação por DSTs ou de
gestação, mas lacerações e lesões físicas graves são pouco frequentes. O
atendimento inicial a esse tipo de situação pode ser feito em serviço ambulatorial.
Segundo a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e
Adolescência, até 80% dos abusos sexuais na infância são cometidos por pessoas do
sexo masculino como pais, padrastos, avós, irmãos e outros que convivem próximos
à criança. O Mapa da Violência de 2012 registrou que os atendimentos a crianças e
adolescentes por violência sexual, via Sistema Único de Saúde (SUS), tiveram como
agressores pessoas próximas às vítimas, ficando em primeira posição os padrastos,
os pais em segundo lugar, seguido das mães e das madrastas.
É preciso lembrar que a infância é a fase de absorção de valores básicos, na
forma de conceitos morais e éticos que determinarão a formação e a estruturação
da personalidade. A violência contra a criança e adolescente, quando não
reconhecida nem tratada, deixa marcas importantes. Seus danos poderão influenciar
as reações, os impulsos e as escolhas para o resto da vida, e se perpetuarem pela
reprodução da violência na relação com as gerações futuras. As vítimas podem
desenvolver quadros de depressão, transtornos de ansiedade, transtornos
alimentares e dissociativos, perda involuntária de urina e/ou fezes, transtorno de
déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e transtorno do estresse pós-traumático
(TEPT).
Os sinais da violência se traduzem em consequências que podem ser distintas
segundo a etapa do desenvolvimento. Quanto mais precoce, intensa ou prolongada a
situação de violência, maiores e mais permanentes serão os danos para a criança e
ao adolescente. É importante saber que, em qualquer idade, nem sempre os sintomas

78
são bem definidos. O que ocorre é que eles irão se acumulando e se potencializando
na medida da progressão da violência e/ou da ausência de tratamento.
Algumas alterações comportamentais de crianças e adolescentes em situações
de violência são:
• Choros sem motivo aparente;
• Irritabilidade frequente, sem causa aparente;
• Olhar indiferente e apatia;
• Tristeza constante;
• Demonstrações de desconforto no colo;
• Distúrbios de alimentação;
• Distúrbios do sono;
• Dificuldades de socialização e tendência ao isolamento;
• Distúrbios de aprendizagem até o fracasso na escola;
• Ansiedade ou medo ligado a determinadas pessoas, sexo, objetos ou
situações;
• Pesadelos frequentes e terror noturno;
• Baixa autoestima e autoconfiança;
• Automutilação, escarificações, morte e tentativa de suicídio;
• Problemas ou déficit de atenção;
• Sintomas de hiperatividade;
• Atitudes sexuais impróprias para a idade;
• Demonstração de conhecimento sobre atividades sexuais superiores à sua
fase de desenvolvimento, através de falas, gestos ou atitudes;
• Masturbação frequente e compulsiva, independente do ambiente em que se
encontre;
• Tentativas frequentes de desvio para brincadeiras que possibilitem intimidades,
a manipulação genital, ou ainda que reproduzem as atitudes do abusador para
com ela;
• Infecções urinárias de repetição.

A notificação da ocorrência da VS mediante suspeita ou confirmação é


imediata, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente. A notificação é obrigatória
para profissionais das áreas de saúde e educação e seu descumprimento acarreta em

79
sanção administrativa. É somente por meio da notificação, que deve ser feita
preferencialmente ao Conselho Tutelar, que os devidos encaminhamentos para
atendimento médico e psicossocial serão garantidos, sendo este um direito das
vítimas.
O primeiro passo para o cuidado de crianças e adolescentes em situação de
violência é o acolhimento, atentando para o fato de que estes poderão se encontrar
com grande ansiedade e medo ou, especialmente, nos casos crônicos, desamparados
e sofrendo.
O suporte no âmbito da saúde mental às crianças, adolescentes e suas famílias
em situação de violência pode ser um importante fator de cuidado e proteção, tanto
no que diz respeito ao fortalecimento dos indivíduos e dos grupos familiares para o
rompimento da cadeia da violência, quanto para o acompanhamento de possíveis
sequelas psíquicas e emocionais resultantes das situações a que estão expostas.
Em situações que haja risco ou ocorrência de situações conflituosas no espaço
familiar, o acolhimento institucional constitui uma medida protetiva para prover a
satisfação das necessidades essenciais e a interrupção do convívio familiar, mesmo
que temporário, para assegurar proteção. Caso esgotada todas as ações que
propiciem a reinserção familiar na família de origem ou na família extensa, o poder
familiar é destituído para habilitação do acolhido à adoção.
Ao adotar uma criança ou adolescente, a Vara da Infância e Juventude irá
esclarecer se seu filho foi afastado da família de origem por abuso sexual prévio.
Porém, há casos que o acolhimento foi feito por outros motivos e existe um histórico
de abuso sexual que não foi diagnosticado previamente e muitas crianças e
adolescentes não revelam abusos anteriores até que se sintam seguras. Dessa
forma, os pais adotivos podem ser os primeiros a saber que ocorreu um abuso sexual
e, por isso, é importante que os postulantes a adoção estejam cientes dessa
possibilidade e como podem agir diante da suspeita.
Não existem regras rígidas e simples sobre o que constitui o desenvolvimento
sexual normal e quais comportamentos podem indicar abuso sexual. As crianças
apresentam uma variedade de comportamentos sexuais e curiosidade sexual em cada
nível de desenvolvimento, e sua curiosidade, interesse e experimentação podem
ocorrer gradualmente, com base em seu desenvolvimento. No entanto, crianças que
foram abusadas sexualmente podem demonstrar comportamentos incomuns,
excessivos, agressivos ou explícitos. Não há nenhum sinal ou comportamento

80
específico que possa ser considerado prova de que o abuso sexual tenha ocorrido
definitivamente, mas há uma série de sinais que sugerem abuso, como já foi descrito
previamente neste capítulo.
Todas as crianças que foram abusadas sexualmente tiveram seus limites
físicos e emocionais violados ou ultrapassados de alguma forma. Por causa disso, as
crianças podem sentir falta de confiança e segurança com os outros. As crianças que
sofreram abuso podem passar a ver o mundo como inseguro e os adultos como
manipuladores e indignos de confiança.
É muito importante que as crianças entendam que não são culpadas pelo abuso
que sofreram. A resposta imediata de sua família ao saber sobre o abuso sexual e a
aceitação contínua do que a criança disse a você desempenhará um papel crítico na
capacidade de seu filho se recuperar e levar uma vida saudável.
Alguns pais podem sentir grande preocupação quando os filhos agem
sexualmente com colegas ou crianças menores e podem questionar por que uma
criança que foi abusada e sofreu com essa experiência poderia repetir isso com outra
pessoa. As crianças que sofreram abuso sexual precisam de uma oportunidade de
processar seu próprio abuso na terapia ou com um adulto de confiança para entender
seus pensamentos e sentimentos e ter a chance de fazer perguntas e conseguir algum
tipo de encerramento. Os comportamentos de dramatização geralmente indicam que
algum impacto traumático de seu abuso ainda está ativo e sinaliza a necessidade de
atenção adicional. A lição mais importante é aprender a não reagir de forma exagerada
ou insuficiente a situações problemáticas e encontrar o equilíbrio certo entre
orientação e cuidado empático.
Se seu filho tem um histórico de abuso anterior, é importante saber que ele
pode ser vulnerável a atitudes de vítima ou vitimização. Algumas crianças podem ser
mais propensas a ser intimidadas ou exploradas, e outras podem ser agressivas. Você
pode precisar prestar atenção especial à proteção de algumas crianças enquanto
estabelece limites firmes para outras. Além disso, algumas crianças agem quando as
memórias de seu próprio abuso são desencadeadas. Os gatilhos podem acontecer
inesperadamente, por exemplo, ao ver alguém que se parece com o agressor ou em
uma situação como estar sozinho em um banheiro público, ou por uma variedade de
circunstâncias que ocorrem na vida diária. Outros gatilhos podem incluir o cheiro de
uma colônia ou xampu específico ou a textura de uma determinada peça de roupa ou
cobertor.

81
Além disso, existem diferenças culturais entre as crianças no que diz respeito
ao nível de conforto com a proximidade física, afeto físico, nudez, práticas de banho
e higiene e outros fatores que podem levar a situações problemáticas. Existem muitas
culturas nas quais os pais nunca discutem a sexualidade diretamente com seus filhos,
ou nas quais qualquer tipo de atividade sexual pode ser considerado inaceitável ou
punível. As crianças podem, portanto, carregar vergonha e culpa sobre seus corpos.
Especialistas na área de adoção e abuso sexual infantil acreditam que
algumas ações podem ajudar a construir confiança no novo ambiente familiar:
• Se seu filho falar com você sobre um abuso sexual prévio, controle sua
reação e não faça julgamentos;
• Conforte a criança, diga que você sente muito por isso, e que está
disposto(a) a ajudá-la;
• Não os trate com piedade e sim com compreensão;
• Nunca desconsidere os sentimentos da criança e/ou do adolescente;
• Esclareça que a culpa não é dela/dele;
• Tranquilize a criança, dizendo que ela está segura em sua casa;
• Privacidade: as crianças devem ser ensinadas a bater quando uma porta
está fechada e os adultos precisam fazer o mesmo;
• Toque: ninguém deve tocar outra pessoa sem permissão. As partes íntimas
de uma pessoa não devem ser tocadas, exceto durante um exame médico
ou, no caso de crianças pequenas, se precisarem de ajuda com banho ou
banheiro;
• Respeite o nível de conforto de cada membro da família com tocar, abraçar
e beijar. Incentive as crianças e os adultos a respeitarem o conforto e a
privacidade dos outros;
• Roupas: evitar trocar de roupa na frente da criança ou que ela veja os
familiares em roupas íntimas;
• Dizendo "Não": as crianças precisam aprender que é seu direito de dizer
“não” de forma assertiva quando alguém os toca de uma forma que eles não
gostam. Ajude ele(a) a praticar isso;
• Educação sexual: todas as crianças, incluindo a criança que foi abusada,
precisam de informações básicas sobre como se desenvolve sexualmente.
Palavras apropriadas para partes do corpo, como pênis, vagina, seios e

82
nádegas, dará à criança as palavras para que ela se sinta segura a
descrever o que aconteceu com ela. Linguagem sugestiva ou obscena às
vezes é um gatilho e não deve ser permitida;
• Sem "segredos": deixe claro que nenhum segredo, principalmente com
adultos, é permitido;
• "Brincar de luta" e cócegas: comportamentos infantis comuns, mas que
podem ser tingidos de conotações sexuais. Eles podem colocar a criança
em uma posição desconfortável, humilhante ou até ser um gatilho para as
lembranças do abuso, portanto fique atento a essas atividades e evite;
• Busque ajuda profissional: o tipo de terapia que será mais útil varia,
podendo ser individual ou terapia familiar. Quando uma criança está sendo
atendido na terapia individual, é importante que os pais mantenham um
contato próximo com o terapeuta, de preferência com experiência em
questões de abuso sexual e adoção.

83
REFERÊNCIAS

BARBOSA, Vanir Maria Carneiro; ANTUNES, Maria Cristina; PADILHA, Maria da Graça Saldanha. A
reinserção familiar de crianças e adolescentes vítimas de violência intrafamiliar em acolhimento
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cuidado para a atenção integral à saúde de crianças, adolescentes e suas famílias em situação
de violências: orientação para gestores e profissionais de saúde. Brasília: Ministério da Saúde,
2010. Disponível em:
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/linha_cuidado_criancas_familias_violencias.pdf. Acesso
em: 25 fev. 2021.

Sociedade Brasileira de Pediatria. Manual de atendimento às crianças e adolescentes vítimas de


violência. Coordenação: Renata Dejtiar Waksman, Mário Roberto Hirschheimer, Luci Pfeiffer. 2.ed.
Brasília, DF: Conselho Federal de Medicina, 2018.

VON HOHENDORFF, Jean; PATIAS, Naiana Dapieve. VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E
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Santa Cruz do Sul, n. 49, p. 239-257, jan. 2017.

WORLD HEALTH ORGANIZATION. (WHO). Recognizes child abuse as a major public health
problem. 1999. Disponível em: http://www.who.int/inf-pr-1999/en/pr99-20.html

84
CAPÍTULO 11 - O COMPORTAMENTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE APÓS A ADOÇÃO: ADAPTAÇÃO E PREVENÇÃO
DA DEVOLUÇÃO

Ana Clara Rivetti Bitencourt de Paula

A adoção é a atitude de receber na condição de filho, um indivíduo


desconhecido e desvinculado dos seus pais e parentes, instituindo-se laços de
afinidade e afetividade, garantindo-lhe seus direitos e deveres, incluindo o de
sucessão¹. Dessa maneira, ela não pode ser vista como uma forma de resolver os
problemas sociais de abandono e institucionalização e sim de garantir o direito de
todos terem uma família e os privilégios oferecidos por ela².
No Brasil, segundo o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), são
30.881 crianças acolhidas e 35.982 postulantes³. Sendo assim, é possível
compreender que são maiores os números de pessoas com intenção de adotar do
que crianças e adolescentes para serem adotados. Isso ocorre porque somente 5.143
estão disponíveis para adoção e, também, pela maioria delas não condizer com o
perfil esperado pelos pais3,4,5.
Ademais, são muitas as motivações dos candidatos à adoção e podem ser elas
uma das causas de dificuldade de adaptação da criança5,6. Mas há outras razões para
isso como a bagagem traga por elas como suas adversidades relacionadas à
educação, à saúde e as reações do filho adotivo, que podem ser um impasse a
adequação frente a nova família, sendo uma reação disso ou não, ocorrendo, também
isoladamente6,9,11,12. Quando dado cenário começa a prevalecer o risco da ruptura do
processo de adoção e, portanto, devolução da criança aumenta sendo, então,
necessário a preparação dos pais e filhos adotivos para evitar essa situação. À vista
disso, o objetivo deste capítulo é entendemos dada conjuntura para que os pais
possam lidar da melhor forma evitando a devolução e promovendo um lar saudável.

ADAPTAÇÃO:

Considerações gerais:

85
Como já citado, o perfil apresentado pelos postulantes à adoção não condiz
com a realidade das crianças institucionalizadas. Ou seja, o esperado por eles é de
que seja um bebê saudável, da mesma cor de pele da família, em geral, branca e do
sexo feminino8. Entretanto, a situação real é de que a maioria são meninos, pardos,
com mais de 3 anos. Sendo assim, entre as várias características que compreendem
essas diferenças está a da idade, em virtude da maioria dos futuros pais adotivos
apresentam interesse em bebês pois julgam serem mais fáceis de adaptar e moldar 8.
Em conformidade com isso, estudos demonstram que 50% dos pais adotivos
de crianças com mais idade apresentam queixas negativas, geralmente, relacionadas
aos maus tratos, abandono e negligência enquanto 89% dos adotantes de bebê não
relatam dificuldades². Todavia, há aqueles que apresentam dada ideia como ilusão já
que o filho adotivo, independentemente da idade, tem uma história pessoal pregressa
que não pode ser rejeitada ou desconsiderada8. A questão é que boa parte dos artigos
se apresentam abordando as dificuldades das adoções, principalmente as tardias.

As dificuldades frente às motivações e idealizações dos pais adotivos

São muitas as motivações que levam os postulantes à adoção. Entre os


principais, estão o desejo de ser mãe ou pai, a vontade de ter um filho adotivo, a
infertilidade ou outras condições de saúde e o interesse em dar para a criança uma
família5,6. Também, em conformidade com Riede e Sartori (2013), há outras causas,
tal qual preencher a solidão, viabilidade de escolher o sexo, fazer companhia ao filho
único e substituir um filho falecido6. É importante visualizarmos essas razões pois elas
influenciam no tipo de adoção, a posição do filho adotivo na família e o
desenvolvimento dos vínculos7,8.

Sendo assim, quando o discurso do candidato é em virtude da infertilidade e/ou


outras condições de saúde dizemos que a adoção ocorre no campo biológico. Se ela
for relacionada a valores humanitários e filantrópicos definimos como social. Por fim,
no caso de ser, por exemplo, por transmissão familiar, conceituamos como
emocional7. Dessa maneira, através do motivo e da sua classificação da adoção fica

86
mais fácil observar como esse filho será incorporado na parentalidade e seu processo
de adaptação.
Em primeiro lugar, independente da criança ou adolescente ser adotado ou
não, os pais idealizam o filho colocando suas aspirações, frustrações e renúncias o
que gera um problema6,8. Em um segundo plano, em algumas situações como o da
infertilidade, são criadas feridas narcisistas que buscam burlar a mortalidade e a dor
por meio da adoção. Contudo, a presença da criança pode ao invés de restabelecer a
ordem reforçar essa limitação, sendo uma circunstância para não formação de vínculo
e, evidentemente, dificuldade na sua adequação. Também, no caso da adoção como
uma forma altruísta pode haver uma adversidade juntamente ao narcisismo. Isso
ocorre quando o sentimento de ser salvador prevalece perante o de salvar.
Consequentemente os pais ficam à espera de que o filho demonstre gratidão gerando
expectativas idealizadoras perante ao comportamento da criança, o que nem sempre
acontece6.

A história dos filhos adotivos

Em conformidade com os estudos, tanto os fatores genéticos como o ambiental


influenciam na formação do ser humano8. Contudo, são muitos os mitos e
preconceitos, quando abordado o tema adoção, se atribuindo, mais a família de
origem, os problemas de conduta presentes como questões de saúde e
educação8,10,11. Mas, não é essa a realidade, sendo importante refletirmos sobre a
institucionalização, caracterizada pela falta de estrutura e assistência, que impede o
desenvolvimento da criança. Frente a isso, a falta de funcionários e a grande
rotatividade desses, a sobrecarga de funções e ausência de especialização são os
principais marcadores da problemática10. A questão é que diante de tudo isso, os pais
ficam receosos e a dificuldade de adaptação e vínculo da criança com eles fica
prejudicado.

Diante da saúde, há queixas sobre o padrão alimentar das crianças ou


adolescente, questões de higiene e há aqueles pais que não tem muitas informações

87
sobre o passado da criança, ou seja, não sabem como foi o parto, o histórico de
doenças na infância e os marcos importantes do desenvolvimento 4,10.
Já sobre a educação, há relato de pais, em um determinado estudo, referente
ao atraso escolar, tendo que lidar com o analfabetismo e a vontade de ingressar a
criança em uma escola particular4. Em contrapartida, um estudo realizado por Van
IJzendoorn & Juffer (2005), apresentou a comparação do QI entre crianças adotadas
e os irmãos não adotivos. Ele obteve como resultado escores semelhantes. Uma outra
pesquisa também apresentou o relato de pais satisfeitos frente o desenvolvimento
acadêmico descrevendo também a disciplina do filho e a boa relação com colegas e
professores11.
Além disso, outras dificuldades na adaptação podem ocorrer como as
comportamentais-emocionais. Há pais que relatam grande dificuldade em fazer com
que a criança siga novos hábitos e regras9. Isso ocorre, principalmente, quando a
adoção é feita de uma criança maior que já adquiriu a linguagem visto que estas se
posicionam de maneira mais complexa e explícita6.

Retorno comportamental da criança perante as ações dos pais adotivos

Diante de todo o histórico dos pais e filhos adotivos, a criança ou adolescente


pode reagir de duas maneiras: aceitação ou testagem. Quando há uma grande
idealização perante a criança ou adolescente esse pode não expressar sentimentos
avaliados negativamente, como a hostilidade e agressividade, na tentativa de suprir a
fantasia dos pais e da nova família, temendo a fragilidade do vínculo e o abandono 9.
Mas o contrário, também, pode ocorrer uma vez que a criança quer certificar o amor
dos pais para ter certeza que de não será devolvida ou abandonada.
Ademais, ela também pode apresentar uma outra maneira de testar os pais
passando por uma fase regressão e dependência absoluta. Nessa situação, a criança
ou adolescente irá voltar em seu estágio de recém-nascido, como se tivesse
desfrutado de um segundo nascimento, passando por todas as suas etapas de
desenvolvimento para comprovar de que os pais são uma referência segura sendo,
então, capaz de concretizar a adoção6. E o inverso, novamente, pode estar presente
já que a criança ou adolescente pode se mostrar extremamente independente para
sua idade10.

88
Também, uma reação da criança que foge um pouco das tratadas acima é a
relacionada a vinculação. Dado processo é apresentado pela psicanálise como
ocorrendo primeiramente pela figura paterna. Isso ocorre em virtude de a criança não
ter o genitor como referência já que esse já estava excluído no momento em que a
genitora entregou ou teve seu filho retirado, o que é mais um motivo para essa
vinculação não ocorrer em primeiro momento com a mãe15.

DEVOLUÇÃO:

Considerações gerais:

A devolução pode ser definida de várias formas e ângulos. Em conformidade


com Guirardi (2005), ela é conceituada como a interrupção dos laços afetivos entre
pais e filhos. Já do ponto de vista legal, essa é o fracasso da adoção12. Além disso,
juridicamente a restituição de uma criança ou adolescente adotado é
ilegítimo. Entretanto, infelizmente, ela é a realidade de alguns filhos e pais adotivos
uma vez que a lei não é capaz de impedir o rompimento dos vínculos afetivos bem
como manter a criança em um ambiente de rejeição em que ela pode ser vítima de
abuso e maus tratos é incabível13. Geralmente, a devolução ocorre na adolescência
e no processo de convivência com a criança ou adolescente, que dura cerca de um
ano, momento em que surgem alguns conflitos12,14. Pelo processo ainda não ter sido
reconhecido, muitos acreditam que os pais tenham o direito de devolução da criança
ou adolescente. Todavia, de acordo com Costa (2009) esse período é dado para a
avaliação, por alguns profissionais, da convivência da família para conceder ou não a
adoção14. Sendo assim, segundo Levy et al (2009), Merçon-Vargas et al (2014) e
Serqueira e Stella et al (2014), a preferência é diante das carências da criança que
precisam ser supridas e não das necessidades dos pais 9.

Orientação dos pais para adoção:

Essencialmente, é necessário ponderar que cada adoção tem suas


peculiaridades. Sendo assim, em relação a motivação dos pais é importante que o
casal reflita e trabalhe suas razões para que essas não seja uma possibilidade de

89
conflito e desvinculo a criança ou adolescente. Ademais, quando o postulante à
adoção não tiver filhos, principalmente, por alguma impossibilidade, é valoroso que
seja trabalhado as suas expectativas narcísicas, relacionadas às satisfações que o
filho adotivo irá trazer. Também, é fundamental que os pais vivam o luto da infertilidade
e perda do filho biológico. Igualmente, esse momento é importante para ajudar a
aceitação do filho adotivo frente ao filho ideal8.

Na ocasião em que o candidato à adoção já tiver filhos biológicos é fundamental


que esses passem por uma preparação uma vez que podem haver situações de
ciúmes. Além disso, em casos de adoções necessárias como de crianças com
deficiência o casal precisa saber lidar com o preconceito social que virá em dose
dupla13.
Diante de toda a bagagem da criança e consequentemente seu retorno
emocional, é imprescindível o reconhecimento do passado dela e a integração ao
presente para que essa se sinta parte da família. Em conformidade com Dugnani e
Marques (2001), a criança ou adolescente ao conhecer sobre a sua história de adoção
e a separação dos pais biológicos tende a se vincular melhor com os pais adotivos e
ter melhor acomodação familiar. Além disso, é extremamente relevante que o assunto
seja abordado pelos pais. Para finalizar, é indispensável que os pais resistam as fases
de testagem e regressão pois posteriormente a criança criará maiores laços e vínculos
afetivos9.
Por fim, é necessário que os pais tenham antes, durante e após o processo de
adoção, pelo menos, no primeiro ano, acompanhamento com certos profissionais
tanto do âmbito jurídico quanto social como pela equipe interprofissional da Justiça da
Infância e Juventude, técnicas jurídicas e peritos, assistentes sociais, cuidadores da
instituição de acolhimento, psicólogos, assistentes pedagogos, professores,
enfermeiras e médicos da criança9,12,16. Ademais, é importante a participação nas
conhecidas GAAs que são os grupos de apoio a adoção, instituições sem fins
lucrativos, geralmente, coordenados por pais adotivos, militantes da nova cultura da
adoção que tem como finalidade trocar experiências, refletir e discutir as expectativas
e motivações dos postulantes a adotar10,17. Assim como a participação dos familiares,
amigos e vizinhos como pessoas que podem auxiliar nos momentos de dificuldade 9.

90
Inserção da criança e do adolescente no processo de adoção

Primeiramente, a preparação da criança precisa estar pautada na vivência do


luto pela perda da família biológica. Ademais, faz-se necessário intervenções
relacionadas a sua passagem pelo abrigo e ao desvinculo com as pessoas da
instituição14. Em um segundo plano, trabalhar seus temores é fundamental. Também,
consiste de grande relevância abordar a concepção de pais e família que essa criança
possui. Para finalizar, deixar a criança a par do processo de adoção, sobre seu novo
lar e seus pais faz com que ela se sinta integrante da família e crie segurança12.
É imprescindível ressaltar que o acompanhamento com profissionais como
psicólogos é de extrema relevância e quando necessário pode ser feito em conjunto
com os pais9. Esse método pode tanto preparar quanto atuar em momentos de
reconstrução familiar em virtude de o meio fraterno estar repleto de construções
traumáticas. Por meio disso, ressignificar a história dessa criança ou adolescente se
torna essencial18.

Conclusão:

Portanto, após a adoção se pode esperar que haja alguns conflitos em virtude
das expectativas e motivações dos pais para a adoção, a bagagem do filho desde
seus hábitos até sua questão emocional, principalmente, seus medos que podem
gerar diversas reações. Sendo assim, é fundamental que todas as partes envolvidas
estejam preparadas para esse processo. Portanto, os pais precisam refletir sobre suas
motivações, viver o luto se necessário, frequentar grupos de apoio e procurar
assistência de diversos profissionais. Igualmente, as crianças precisam viver o luto,
mas diante da sua família biológica e ter auxílio de uma equipe de profissionais
multidisciplinar.

91
REFERÊNCIAS

1. Congresso Nacional. Estatuto da Criança e do adolescente; 1990. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069compilado.htm>

2. Ebrahim SG, Adoção tardia: uma visão comparativa. Rev Estudos de Psicologia; 2001. v.18.
n2. p. 29-40.

3. Sistema Nacional de Adoção e acolhimento. CNJ; 2020. Disponível em:


<https://paineisanalytics.cnj.jus.br/single/?appid=ccd72056-8999-4434-b913-
f74b5b5b31a2&sheet=4f1d9435-00b1-4c8c-beb7-
8ed9dba4e45a&opt=currsel&select=clearall>

4. Paulina E, Ferreira L, Bobato ST, Becker APS. Processo de vinculação afetiva de crianças
adotadas na perspectiva dos pais adotantes; 2018. Bol. Acad. Paul. de Psicol.; v.38. n. 94.

5. Araújo AISF, Faro A. Motivações, dificuldade e expectativas acerca da adoção: perspectivas


de futuros pais adotivos. Psicol. Rev; 2017. v.23. n.3. p790-810.

6. Sampaio DS, Magalhães AS, Maohado RN. Motivações para a adoção tardia: entre o filho
imaginado e a realidade. Psicol. Estud.; 2020. v.25.

7. Machado RN, Carneiro TF, Magalhães AS. Parentalidade adotiva: contextualizando a escolha.
Rev psico; 2015. v.46 n.4. p.442-451.

8. Moreli AB, Comin FS, Sanveiro TV. O lugar do filho adotivo na dinâmica parental: revisão
integrativa da literatura. Psic. Clin; 2015. v.27. n.1. p. 175-194.

9. Borges CAP; Comin FS.As adoções necessárias no contexto brasileiro: características,


desafios e visibilidade. Psico-USF; 2020. v.25. n.2 p 307-320.

10. Sampaio DS, Magalhaes AS, Carneiro TF. Pedras no caminho da adoção tardia: desafio para
o vínculo parento-filial na percepção dos pais. Temas em psicologia; 2018. v.18.

11. Fonseca PN, Palitot RM, Machado MOS, Santos JLF, Filho JFS. Percepção Parental acerca
do Filho Adotado: Uma Análise Psicoeducacional. Pensando Familia; 2018. p. 131-145.

92
12. Borel FE, Santos RB, Costa D. Evolução da legislação brasileira no tocante à adoção e a
devolução de crianças e adolescente adotados no Brasil. Revista Humanidades em
perspectivas; 2019. v.2. n.1.

13. Abrahão EB, Parrão JAO. A devolução de crianças e adolescentes no processo de


adoção: a família idealizada. Encontro de Iniciação Científica; 2019.

14. Carnaúba GS, Ferret JCF. Devolução de crianças adotadas: consequências psicológicas
causadas na criança que é devolvida durante o estágio de convivência. Rev. Uningá; 2018.
v.55.n.3. p.119-129.

15. Speck S, Queiroz EF, Mattera PM. Desafios da clínica da adoção: devolução de crianças.
Estudos de Psicanálise; 2018. n.49. p.181-186.

16. Lima CFI, Bussolo TJ, Oliveira MAM. Adoção e devolução de crianças: consequências sociais
e psicológicas. Perspectivas em psicologia; 2019. v.23. n.2. p. 103.

17. Machado LV, Ferreira RR, Seron PC. Adoção de crianças maiores: sobre aspectos legais e
construção dos vínculos afetivos. Estudos interdisciplinares em psicologia; 2015. v.6. n.1.
p.65-81.

18. Gomes IC, Levy Lidia. A Psicanálise Vincular e a preparação de crianças para a adoção: uma
proposta terapêutica e interdisciplinar. Contextos Clínicos; 2016.

93
CAPÍTULO 12 - DISTÚRBIOS DO SONO EM CRIANÇAS

Isabela Maria Garcia

Larissa Mansur Alves Pereira

Mariana Reis Di Mambro

O Sono

O sono é um estado fisiológico em que ocorre a diminuição da interação com o


meio externo, mas de elevada atividade cerebral. Nesse momento o organismo se
recupera do desgaste físico e mental, e além disso ocorrem processos essenciais para
o desenvolvimento infantil, como aprendizado, cognição, processo de memórias, entre
outros. Por isso encontra-se nele um papel primordial para a criança.

O sono é dividido em 05 fases e cada uma dessas fases tem a sua importância.

• 1ª Fase – É a fase do adormecimento, pode durar até 15 minutos, espécie de


sono de transição entre estar acordado e dormindo. Nela há uma diminuição
da tensão muscular e a respiração se torna mais suave.
• 2ª Fase – É a fase do sono mais leve. A temperatura do corpo, ritmos cardíaco
e respiratório diminuem.
• 3ª Fase - Uma fase rápida, onde o corpo começa a entrar em um sono profundo,
diminuindo as ondas cerebrais.
• 4º Fase – Sono profundo, nele o organismo se recupera do cansaço físico diário
e libera hormônios responsáveis pelo crescimento e recuperação de células e
órgãos. A pessoa fica inconsciente.
• 5ª Fase – Sono Rem, alta taxa de atividade cerebral, os músculos ficam
paralisados, as frequências cardíaca e respiratória voltam a aumentar e a
pressão arterial sobe. Nessa fase o cérebro fixa as informações importantes
captadas durante o dia e descarta os dados inúteis.

Fica evidente, assim, como é importante ter um boa noite de sono, cumprindo
tanto a qualidade quanto a quantidade ideal. Essa quantidade varia com as
necessidades de sono em função do gênero, da realização de atividade física,

94
ocupação profissional e sobretudo da idade. Observamos que quanto menor a idade
maior a necessidade de tempo de sono. Um recém-nascido pode dormir mais de 16
horas, em contrapartida um adulto necessita dormir de 6 a 8 horas. Até os 5 anos, a
necessidade de sono diurno deve ter desaparecido, sendo a soneca matinal a primeira
a desaparecer. Confira na tabela o tempo de sono ideal para cada faixa etária.

Tabela 1 - Tempo de sono por faixa etária

Faixa Etária Tempo de sono

RN - 3 meses (noite + dia) 20 Horas

3 - 11 Meses (noite + dia) 14-15 Horas

12 – 35 Meses (noite + dia) 12- 14 Horas

Pré-escolar (3 – 6 anos) 11- 13 Horas

Escolar (6 – 12 anos) 10 – 11 Horas

Adolescentes> 12 anos 9 Horas

Adultos e Idosos 6 – 8 Horas

Fonte: Elaborada pelas autoras de acordo com LOPES (2016)

Como abordado anteriormente o sono é muito importante e por isso problemas


relacionados a ele podem influenciar e gerar sérias consequências para a criança.

Os Principais Distúrbios do Sono

Distúrbios de sono estão entre as queixas mais frequentes nos consultórios


pediátricos. Acometem de 20 a 30% dos indivíduos entre a infância e a
adolescência. A maior parte dessas disfunções pode ocorrer tanto em adultos como
em crianças, com variação dos sintomas.

O sono em crianças e adolescentes é uma preocupação constante dos pais e


médicos, uma vez que hábitos que combinam a qualidade e quantidade de horas

95
desse descanso são essenciais para um bom desenvolvimento cognitivo
comportamental, emocional e físico. A maioria desses problemas advém de alterações
comportamentais e ambientais.

Os principais distúrbios do sono são:

1. Insônia
É a dificuldade de início ou manutenção do sono, despertar mais cedo
que o desejado, resistência para o início do sono, ou dificuldade em iniciar o
sono sem a intervenção dos pais ou cuidadores em um ambiente propício
(sem televisores, smartphones ou tablets sendo utilizados no horário de
dormir). Acomete 30% das crianças, sendo o distúrbio mais prevalente
durante a infância. A insônia é patológica a partir do momento que interfere
nas atividades diurnas, levando a criança a sonolência ou fadiga, alteração do
desempenho escolar, da capacidade intelectual, alterações do humor ou do
comportamento.
A insônia pode ter diversas causas, as mais comuns estão na tabela
abaixo.

Tabela 2: Causas de insônia por faixa etária

• Associações inadequadas para o início do


sono;
• Alterações gastrointestinais (refluxo
gastroesofágico, alergia alimentar, cólica do
Até 2 anos
lactente);
• Ingestão excessiva de líquidos;
• Doenças infecciosas agudas;
• Doenças crônicas;
• Associações inadequadas para o início do
sono;
• Medo ou ansiedade de separação dos pais;
2-3 anos
• Sestas de duração ou horário inapropriados;
• Doenças infecciosas agudas;
• Doenças crônicas;

96
• Falta de estabelecimento de limites;
Pré-escolar e • Medo ou pesadelos;
escolar • Doenças infecciosas agudas;
• Doenças crônicas;
• Atraso de fase;
• Problemas de higiene do sono;
• Comorbidades psiquiátricas;
• Pressão familiar e/ou escolar;
Adolescente
• Distúrbios respiratórios do sono;
• Distúrbios do movimento;
• Doenças infecciosas agudas;
• Doenças crônicas;

Fonte: Elaborada pelas autoras de acordo com EL HALAL e NUNES (2016)

2. Distúrbios respiratórios relacionados ao sono

São doenças que cursam com anormalidades da respiração e ventilação


durante o sono, como: apneia obstrutiva do sono (SAOS), síndromes de apneia
central, hipoventilação e hipoxemia relacionadas ao sono.
A apneia obstrutiva do sono é a mais prevalente e acontece devido a uma
obstrução parcial ou completa das vias aéreas superiores sendo sua principal causa
a hipertrofia adenoamigdaliana e sua consequência o esforço respiratório.
Os principais sintomas são respiração difícil ao menos 3 noites por semana (na
ausência de patologia aguda de vias aéreas superiores), perda involuntária de urina
durante o sono, hiperextensão cervical durante o sono, cefaleia matinal, sonolência
diurna ou sensação do sono não reparador, sintomas de desatenção e/ou
hiperatividade, e dificuldades de aprendizagem.

3. Hipersonias de origem central

Existem diversas classificações, a hipersonia idiopática, síndrome de Kleine-


Levin, hipersonia secundária a patologia médica, secundária a medicação ou

97
substância, hipersonia associada a patologia psiquiátrica e síndrome de sono
insuficiente e o ponto em comum entre essas patologias é a sonolência excessiva
diurna.

4. Distúrbios do ritmo circadiano de sono e vigília

Nos transtornos do ritmo circadiano, o ritmo do relógio corporal (sono-vigília) e


ciclo externo claro-escuro (dia e noite) estão desalinhados. A causa pode ser interna,
por exemplo dormir após o horário desejado ou externa por exemplo, diferença de
fuso horário causada por viagens. Como consequências apresentam dificuldade em
se levantar pela manhã, sonolência diurna e prejuízos ao rendimento escolar. Esse
distúrbio é mais comum em adolescentes.

5. Parassonias

São transtornos comportamentais que ocorrem durante o início do sono,


durante o sono propriamente dito, ou ao despertar. É um distúrbio que acontece
quando há sobreposição do estado de vigília com o de sono REM ou não REM
(NREM). Quando se relaciona a fase REM a principal parassonia é o pesadelo. E
quando relacionado ao NREM as parassonias mais comuns são: despertar
confusional, sonambulismo e terror noturno.

Tabela 3: Comparação entre as parassonias

Clínica Sonambulismo Despertar Terror Sonambulismo


Confusional noturno

Período da 1º terço 1º terço 1º terço 5ª fase


noite

Duração 1-10 5-40 1-5 Variável


(minutos)

Agitação Nenhuma ou Moderada Forte Moderada


leve

98
Sinais Nenhuma ou Moderados Fortes Leve
autonômicos leve

Incidência 40% 5-40% 1-5% 20-30%

Idade Escolar, pré- Lactente, pré-escolar Adolescência Escolar, pré-


adolescente e escolar adolescente

Amnésia Sim Sim Sim Não

Limiar Elevado Elevado Elevado Elevado


despertar

Histórico Frequente Frequente Frequente Ausente


familiar positivo

Fonte: Elaborada pelas autoras de acordo com NUNES (2002)

6. Distúrbios do movimento relacionados ao sono

Esses distúrbios incluem condições que causam movimento durante ou antes


do sono. Acomete cerca de 1 a 2% das crianças. Eles podem dificultar o início do sono
ou a continuidade do mesmo. Algumas vezes esses movimentos podem vir
acompanhados por queixas como: sonolência diurna, sono não reparador, insônia.
Dentro desse grupo são classificadas a Síndrome das pernas inquietas (SPI),
Movimento periódico de pernas (MPP), câimbras relacionadas ao sono, movimento
rítmico relacionado ao sono e o bruxismo.
Os problemas ou distúrbios do sono em crianças devem ser tratados sem
demora. Se essa disfunção ocorrer por longo prazo, problemas como perturbações de
comportamento e de humor, baixo desenvolvimento cognitivo e obesidade, podem
ocorrer.
Além desses, outras consequências negativas podem alcançar a vida familiar.
As crianças, dentro do aspecto cognitivo podem apresentar uma baixa na
concentração, na memória e no estado de alerta, irritabilidade, hiperatividade e
impulsividade, essas estão entre as alterações mais comuns. Emocionalmente,
podem protagonizar cenas violentas ou ficar mal-humoradas, além do que tange a
saúde física, pois podem apresentar maior risco de sobrepeso e até obesidade.

99
Do outro lado, os pais sofrerão com as consequências como a fadiga diurna,
que pode provocar mudanças no humor, atitudes pouco eficazes com relação aos
filhos e, não raro, problemas conjugais.

O pode ser feito?

Para a maioria dos distúrbios do sono, estratégias comportamentais pouco


complexas e rotinas de higiene do sono, são eficazes no alívio dessas patologias. Nos
casos em que outros tipos de abordagens tenham que ser preconizadas, essas
estratégias, podem ser utilizadas como adjuvantes. Vale ressaltar, que é necessária
uma investigação e avaliação sobre a etiologia dos distúrbios, bem como o
comprometimento clínico da criança.

A higiene do sono tem como objetivo promover um sono de boa qualidade por
meio de práticas diárias iniciadas durante o dia estendendo até o início do sono. A
partir disso ocorre a criação de um ambiente menos estressante para a criança
associado a um melhor comportamento das mesmas o que também reflete nos níveis
de estresse materno. Vale ressaltar que não há idade ideal para começar, a partir dos
6 meses de idade já é possível iniciar a prática da higiene do sono. Além disso é
essencial a avaliação do pediatra para estabelecer a melhor técnica em cada caso,
levando em conta a rotina de cada família.

Algumas dicas para estabelecer uma rotina de sono saudável:

• Garantir a segurança do bebê: posição em barriga para cima, superfície firme,


coberta com lençol bem ajustado, berço vazio e sem almofadas e brinquedos
para evitar sufocamento;
• Evitar extremos de temperatura, sobretudo o hiperaquecimento, que pode
ocorrer com o uso excessivo de roupas e cobertores;
• Até os 12 meses a criança deve dividir o quarto com os pais, porém não a
cama. O berço deve estar ao lado da mãe;

100
• Início do sono deve ocorrer no mesmo horário todos os dias e ter a mesma
duração;
• Para crianças menores as rotinas devem iniciar de 20 a 30 minutos, e para as
maiores de 30 a 60 minutos antes da hora de ir para cama. Esse período deve
consistir em atividades calmas;
• As rotinas devem ocorrer de forma a iniciar fora e terminar dentro do quarto da
criança, como por exemplo jantar, tomar banho e escovar os dentes e no quarto
colocar pijama, ler uma história e dormir;
• Não fazer atividades físicas ou brincadeiras que a deixem excitadas 3 horas
antes do sono;
• A cama não deve ser associada a outras atividades que não o ato de dormir;
• O sono deve iniciar na cama da criança e sem que os pais estejam deitados
junto a ela;
• Tome cuidado com as sonecas muito próximas do horário de dormir;
• Objetos de transição, como bonecos e cobertores, podem ser usados para
crianças acima de 1 ano;
• Massagem e meditação ajudam a criança a iniciar o sono;
• Para adolescentes: devem evitar jogos eletrônicos, uso de smartphone, acesso
à internet ou computador e iluminação excessiva noturna. Além disso, evitar o
tabagismo e o consumo de cafeína. Esses fatores se relacionam com dormir
mais tarde e uma menor duração de sono noturno.

Em alguns casos, apenas as dicas não serão suficientes para o manejo de


alguns distúrbios do sono. Por isso é importante procurar a ajuda de um profissional
adequado para receber as orientações sobre outras técnicas e/ou medicamentos,
quando necessário.

Abaixo estão listados alguns distúrbios do sono e seus respectivos manejos na


maioria das vezes. Lembre-se sempre de buscar ajuda profissional adequada, os
problemas relacionados ao sono são graves e merecem a nossa atenção.

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Tabela 4: Diagnóstico do distúrbio do sono com seus respectivos manejos

Diagnóstico Manejo
Insônia Higiene do sono;
Terapia comportamental;
Medicamentos;
Síndrome da apneia Perda de peso, quando necessário;
obstrutiva do sono Tratamentos ortodônticos (como expansão
maxilar);
Medicamentos;
Despertar confusional Tranquilizar os pais;
Despertares programados;
Medicamentos;
Terrores noturnos Tranquilizar os pais;
Medidas de segurança no dormitório/ domicílio
Despertares programados
Sonambulismo Tranquilizar os pais;
Medidas de segurança no dormitório/ domicílio;
Despertares programados;
Pesadelos Tranquilizar os pais;
Medicamentos;

Fonte: Elaborada pelas autoras de acordo com EL HALAL e NUNES (2016)

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REFERÊNCIAS

ALLE, Luiza et al. Sono e aprendizagem. 2009.

EL HALAL, Camila dos Santos; NUNES, Magda Lahorgue. Distúrbios do sono na infância. Residência
Pediátrica. V. 8 (supl 1), p. 86-92, 2018.

EL HALAL, Camila dos Santos; NUNES, Magda Lahorgue. Organização e higiene do sono na infância
e adolescência. Rev. Residência Pediátrica, 2018.

EL RAFIHI-FERREIRA, Renatha et al. Sono e comportamento em crianças atendidas em um serviço


de psicologia. Psicologia: teoria e prática, v. 18, n. 2, p. 159-172, 2016.

LOPES, Sandra. Estratégias para minimizar alterações do padrão de sono nas crianças dos 0
aos 3 anos. 2016. Tese de Doutorado.

MORTON, J. B. Enciclopédia sobre o desenvolvimento na primeira infância. University of Western


Ontario, Canadá, 2013.

NUNES, Magda Lahorgue. Distúrbios do sono. Jornal de Pediatria, v. 78, p. S63-S72, 2002
.
NUNES, Magda Lahorgue; BRUNI, Oliviero. Insônia na infância e adolescência: aspectos clínicos,
diagnóstico e abordagem terapêutica. Jornal de Pediatria, v. 91, n. 6, p. S26-S35, 2015.

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CAPÍTULO 13 - DENTIÇÃO E CUIDADOS BUCAIS

Juliana Aguiar Cavalcante Diniz

Os dentes decíduos, também chamados de dentes de leite, apesar de serem


temporários, exercem papel fundamental no desenvolvimento bucal da criança, pois
são estes que preparam e dão lugar aos dentes permanentes. Os dentes decíduos
são em sua totalidade 20. Eles são importantes também para a alimentação. A perda
precoce fora do tempo pode prejudicar na fala pronuncia além de poder causar algum
problema emocional já que a criança pode se sentir diferente do rupo na qual ela
convive.

5 a 6 meses de vida:

O início da erupção dental, se dá por volta do sexto mês de vida, marca um


momento muito importante da vida da criança e envolve muitas dúvidas para os que
lidam diretamente com a sua saúde: pais, dentistas e pediatras. Além dos cuidados
com a higiene oral, também exige atenção, um grande número de alterações locais
ou sistêmicas que ocorrem no mesmo período. Muitas vezes, essas alterações levam
a criança enferma aos consultórios médicos ou odontológicos.

Comumente acredita-se que a erupção dental em crianças causa inúmeros


sinais e sintomas. Dentre essas alterações, a mais observada é do tipo
comportamental sendo a irritabilidade a manifestação sistêmica mais comum. O hábito
de levar as mãos à boca e de mastigar objetos, assim como a salivação aumentada
também configura entre as alterações mais frequentemente observadas.

Diversos estudos relacionam este comportamento à tentativa de alívio de


sintomas locais como prurido ou dor. Ao mesmo tempo também vale chamar atenção
para sintomas como diarreia e febre que embora sejam descritos por pais em
consultas sabe-se que não tem correlação direta com esse momento de nascimento
dos dentes. Mas sim por fatores como gengiva traumatizada pela passagem do novo
dente e colocar a mão na boca podem servir de porta de entrada para a infecção viral.

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Para alívio dos sintomas pode utilizar com uma gaze ou fralda umedecida
envolta em um dedo limpo com soro fisiológico, realiza-se movimentos circulares
pressionando levemente a gengiva do bebê. Além disso, pode-se utilizar mordedores
resfriados e oferta de alimentos e bebidas frios ou gelados, pois o frio promove melhor
a sensação de alívio por ajudar a diminuir os sintomas locais da inflamação. Mas
sempre sob orientação medica e /ou do dentista.

10 a 12 meses de vida:

Surge o primeiro molar de leite. Os molares decíduos assumem um papel de


fundamental importância durante a dentição mista, pois ditam o posicionamento do
primeiro molar permanente. Com isso, a perda desses dentes pode acarretar uma
desarmonia no desenvolvimento da mordida correta. É recomendado ir ao dentista
para uma avaliação e orientações.

3 a 6 aos de vida:

Época na qual a criança completa todos os dentes na boca. 20 no total.

6 a 18 anos:

Após passar por todo o processo de nascimento dos dentes decíduos, é preciso
se preparar também para o momento em que eles, enfim, vão embora. É comum que
a fase da troca de dentes comece a partir dos 6 anos e se estenda até os 12 anos de
idade; e o primeiro sinal de que ela está chegando é quando os dentes começam a
ficar com um aspecto molinho. Por mais que muitos pais fiquem bastante ansiosos
com essa fase, é preciso ter em mente que esse é um processo totalmente natural e
que não costuma precisar de intervenções. Exceto se o dente estiver prejudicando a
fala ou mastigação da criança, pois neste caso vale uma visita ao odontopediatra, que
vai indicar a melhor solução. A dentição geralmente e completada em torno dos 1 anos
com um total de 32 dentes.

A escovação inicia com o surgimento dos primeiros dentes, é importante ficar


atento à escolha da escova e do creme dental. O ideal é que seja realizada com a

105
escova de cerdas macias e cabeça pequena, usando uma quantidade mínima (um
grãozinho de arroz) de pasta de dentes fluoretada contendo flúor acima de 1000 ppm
(creme dental comum utilizado pelos adultos). Os cremes dentais fluoretados, com
quantidades menores de flúor do que a indicada não são o suficiente para combater
problemas bucais. É recomendado que durante a dentição decídua faça escovação
2x por dia evitando que a criança engula. Além disso o creme dental deve ficar longe
do alcance das crianças.

O fio dental será usado quando os dentes estirem juntos uma vez ao dia. Todas
as etapas devem ser acompanhadas pelos responsáveis, afim de se evitar uma
higiene bucal inadequada.

Dicas e passo a passo da escovação:

1. A escova das crianças deve ter cerdas bem macias. Escolha o modelo de
acordo com a faixa etária do seu filho.

2. O creme dental deve ter a quantidade do tamanho de um grão de arroz já é


suficiente para realizar uma boa escovação na criança.

3. Deixe a escova paralela à linha da gengiva. Comece fazendo movimentos


circulares em grupos de quatro dentes durante aproximadamente 10 segundos
cada.

4. Deslize as cerdas da gengiva em direção à ponta dos dentes, inclusive na


superfície interna deles.

5. Passe para os dentes do fundo e escove com movimentos de vai e vem bem
suaves em todas as faces dos dentes.

6. Para finalizar a escovação, passe a escova na língua, assim diminui o número


de bactérias capazes de causar mau hálito.

7. Se necessário deixe um copo com água do lado para auxiliar a criança no


bochecho eliminando toda a espuma do creme dental.

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8. Para o fio dental, retire um pedaço com aproximadamente 45 cm, envolva a
maior parte de forma frouxa ao redor de cada dedo médio, deixando 3
centímetros no meio. Deslize com suavidade entre os dentes da criança,
formando um "C" em volta de cada dente, tomando cuidado para não forçar
sobre a gengiva.

Cárie dentária

A cárie é uma doença causada pelas bactérias que vivem na boca e utilizam o
açúcar da alimentação para produzir ácidos que destroem os dentes.

Este com certeza é um dos problemas bucais mais temidos, tanto para adultos
quanto para crianças. No entanto, é importante ressaltar que esse transtorno é mais
propício de aparecer em crianças, principalmente pelo fato de elas ainda estarem se
habituando à rotina de higiene bucal e por muitos pais não se preocuparem
devidamente com a primeira dentição, já que elas têm um “prazo de validade”.

Um fator importante que deve ser levado em consideração é que ela pode ser
prevenida, controlada ou mesmo revertida. Para prevenção, é necessário conhecer
sua etiologia e os fatores de risco para o seu desenvolvimento. O controle e a reversão
de tal doença são possíveis caso seja diagnosticada em estágio inicial, que é a
presença de mancha branca no esmalte dental, sem cavidades. Quando a situação
clínica envolve cavidades dentárias, há necessidade de tratamento curativo e
preventivo, a fim de modificar as condições que levaram ao desenvolvimento da
doença cárie. A evolução da doença é capaz de causar grande destruição dos dentes,
ou até mesmo sua perda, podendo resultar em complicações locais, sistêmicas,
psicológicas e sociais.

O sinal clínico inicial da doença cárie na infância é a presença de manchas


brancas e opaca. A evolução é o aparecimento de cavidades com perda de estrutura
dental que, se não interrompida, pode levar a destruição de toda a coroa do dente e
com processos infecciosos radiculares em decorrência da necrose pulpar. Em caso
de dúvidas sobre os cuidados com os dentes da criança deve-se procurar os
profissionais da saúde.

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REFERÊNCIAS

Barbosa, S.O. et al. Distúrbios da erupção dentaria: mito ou realidade. Arch Health Invest (2017) 6(3):
102-105.

CORRÊA, M.S.N.P.; et al. Saúde bucal do bebê ao adolescente. Guia de Orientação. São Paulo:
Santos, 2005.

Guedes-Pinto AC. Odontopediatria.7a ed. São Paulo: Livraria Santos; 2003.

Nelson-Filho N, Assed S. Cárie de mamadeira. In: Assed S, editor. Odontopediatria: bases científicas
para a prática clínica. São Paulo, SP: Artes Médicas; 2005. p. 344-8.

Simeão C. Q. et al. Erupção Dentária: Estudo de suas Manifestações Clínicas na Primeira Infância
Segundo Cuidadores e Médicos Pediatras. Pesquisa Brasileira em Odontopediatria e Clínica Integrada
maio 2006.

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