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Esta obra literária é ficção. Qualquer nome, lugares, personagens e incidentes são produto da imaginação do autor. Qualquer semelhança
com pessoas reais, vivas ou mortas, eventos ou estabelecimentos é mera coincidência.
P547d
Perry, Devney
Desejos de aniversário [recurso eletrônico]/ Devney Perry; tradução Ana Carolina Consolini. - 1. ed. -
Rio de Janeiro : Allbook, 2021.
Capa
Folha de Rosto
Créditos
Prólogo
1
Aniversário de 30 anos: Comprar um restaurante para a Poppy.
2
Vigésimo sexto aniversário: Ir a uma aula de caratê.
3
Vigésimo nono aniversário: Pular de paraquedas
4
Vigésimo sétimo aniversário: Passar um dia inteiro sem usar eletrônicos
5
Trigésimo sexto aniversário: aprender a tocar ukelele
6
Quadragésimo primeiro aniversário: dizer “sim” para tudo por um dia inteiro.
7
Trigésimo quinto aniversário: Tirar uma foto minha todos os dias durante um ano
8
Trigésimo oitavo aniversário: Ir a todos os brinquedos do parque de diversão
9
Quadragésimo terceiro aniversário: Ir a um cinema no estilo drive-in.
10
Trigésimo sétimo aniversário: restaurar minha Ford Ranger 1979
11
Quadragésimo sexto aniversário: Fazer uma tatuagem
12
Trigésimo nono aniversário: Entrar num táxi e gritar “Siga aquele carro!”
13
Trigésimo quarto aniversário: Nadar em uma piscina cheia de gelatina verde
14
Trigésimo segundo aniversário: Participar de uma luta de tinta
15
Trigésimo primeiro aniversário: Fazer trilha no Parque Nacional Glacier
16
Quadragésimo quarto aniversário: Adotar um cachorro e mantê-lo por toda a sua vida
17
Quadragésimo quinto aniversário: Acionar um alarme de incêndio
18
Trigésimo terceiro aniversário: Jogar uma bebida no rosto de alguém
19
Quadragésimo oitavo aniversário: dar um carro a um estranho
20
Vigésimo oitavo aniversário: Ser carregado por uma multidão
21
Vigésimo quinto aniversário: Escrever uma carta para mim mesmo daqui a dez anos
22
23
Quinquagésimo aniversário: Mudar a vida de alguém
Epílogo
Agradecimentos
AllBook Editora
— Poppy! — Jamie saiu correndo do escritório e foi para a cozinha.
O sorriso em seu rosto fez meu coração palpitar, como sempre, o que significava que eu estava nas
nuvens desde o dia em que o conheci, cinco anos atrás.
Nós nos encontramos no primeiro dia do nosso segundo semestre na faculdade, em Montana.
Literalmente. Eu estava correndo, vindo de uma aula de economia, os braços cheios com livros,
blocos de anotações e um cronograma de estudos. Jamie estava entrando correndo, muito ocupado
olhando por cima do ombro para uma loira cheia de curvas para me ver na porta da sala de aula.
Depois que nós dois nos recuperamos do acidente, Jamie me ajudou a levantar do chão. No
momento em que minha mão deslizou na sua, a loira curvilínea tinha sido esquecida.
Esse foi o dia em que conheci o homem dos meus sonhos.
Meu marido.
James Sawyer Maysen.
— Adivinha?
— O quê? — Eu ri quando ele me pegou e me colocou no balcão, encaixando-se entre minhas
pernas abertas.
Excitação irradiava de seu corpo, e eu não pude deixar de sorrir com a luz brilhando em seus
olhos.
— Acabei de adicionar algumas coisas à minha lista de aniversários. — Ele ergueu o punho num
sinal de vitória. — Ideias ainda melhores.
— Ah. — Meu sorriso vacilou. — Por favor, diz que essas ideias não são ilegais.
— Não. E eu te disse, o alarme de incêndio pode não ser ilegal, exatamente. Eu posso legalmente
precisar acionar um alarme de incêndio antes de completar 45 anos.
— É melhor que não sejam. Porque não tenho a menor vontade de te tirar da prisão só por você
estar determinado a riscar um item da sua lista maluca.
A “lista de aniversários” de Jamie se tornou sua última obsessão. Ele começou algumas semanas
antes, depois que teve a ideia por causa de uma série de TV, e desde então ele tem sonhado com tais
grandes ideias — embora algumas fossem mais ridículas do que grandiosas.
Essa lista era a versão de Jamie de uma lista de desejos. Exceto que em vez de uma longa lista para
cumprir durante a aposentadoria, Jamie tinha se atribuído coisas para fazer antes de cada um de seus
aniversários. Ele não queria enfrentar uma lista assustadora quando tivesse praticamente vivido sua
vida toda. Em vez disso, queria riscar os itens da lista todos os anos antes de seu aniversário. Até
agora, ele havia preenchido todos os aniversários até completar cinquenta anos.
Tínhamos nossa própria lista de desejos para casais — lugares que queríamos viajar e coisas que
queríamos fazer juntos. Aquela lista de aniversários não era para isso. Era apenas para Jamie. Estava
cheia de coisas que ele gostaria de fazer, só para ele.
E embora eu possa ter reclamado sobre alguns dos itens mais arriscados e loucos, eu o apoiei de
todo o coração.
— Então, o que você adicionou hoje?
Ele sorriu.
— Minha melhor ideia até agora. Aqui vai. — Ele ergueu os braços, alargando-os e formando
uma moldura invisível. — Antes de completar trinta e quatro anos, quero nadar em uma piscina de
gelatina verde.
— Ok. — Eu sorri, longe de estar convencida que era sua melhor ideia, mas afinal era o Jamie. —
Mas por que gelatina? E por que verde?
— Você não acha que seria legal? — Ele balançou entre minhas pernas, sorrindo ainda mais
enquanto baixava os braços. — É uma daquelas coisas que toda criança quer fazer, mas nenhum pai
permite. Pense em como seria divertido. Eu posso me contorcer dentro dela. Esmagá-la entre os
dedos das mãos e dos pés. E eu escolhi verde…
— Porque é a sua cor favorita — eu terminei, surpresa por ter feito a pergunta.
— O que você acha?
— Honestamente? Acho que vai fazer uma bagunça. Além disso, vai ficar todo manchado de
gelatina. Você será um alienígena ambulante por uma semana.
Ele encolheu os ombros.
— Estou tranquilo quanto a isso. Meus alunos vão achar que isso é incrível, e eu posso contar com
você para me ajudar a limpar.
— Sim, você pode.
Eu o ajudaria a esfregar sua pele até voltar ao bronzeado natural e depois me livraria de uma
piscina cheia de gelatina verde porque eu o amava. Alguns itens da lista de Jamie pareciam estranhos
para mim, mas se eles o deixassem feliz, eu faria o que pudesse para ajudar. Pelos próximos vinte e
cinco anos — ou pelo tempo que ele quisesse —, eu estaria ao seu lado enquanto ele completasse
cada item daqueles.
— O que mais você adicionou hoje?
Ele deslizou as mãos por minha cintura e se aproximou um pouco mais.
— Na verdade, eu adicionei um e risquei quase ao mesmo tempo. Foi no meu vigésimo quinto
aniversário. Escrevi uma carta para mim mesmo, para ler após dez anos.
— Que fofo. — Se eu tivesse uma lista de aniversários, roubaria essa ideia para mim. — Posso ler
a carta?
— Claro. — Ele sorriu. — Assim que eu fizer trinta e cinco anos. — Eu fiz uma careta, mas Jamie
a apagou com um beijo suave. — Eu preciso ir resolver algumas coisas. Você precisa de alguma coisa
da rua?
Resolver umas coisas. Seeei. Amanhã é nosso aniversário de casamento, fazemos um ano juntos, e
eu apostaria um bom dinheiro que essas “coisas” podiam ser resumidas a encontrar um presente de
última hora para mim. Ao contrário de mim, que comprei o presente dele há dois meses e o escondi
na lavanderia, Jamie sempre fazia compras na véspera do Natal ou do meu aniversário.
Mas em vez de provocá-lo sobre sua tendência a procrastinar, apenas balancei a cabeça.
— Sim, por favor. Você se importaria de ir à loja de bebidas para mim? — Programamos um
churrasco de primavera para o dia seguinte, para comemorar nosso aniversário, e a única bebida que
tínhamos em casa era a tequila favorita de Jamie.
— Amor, eu já te falei isso. Não precisamos ter drinques extravagantes. Basta pegar um pouco de
cerveja no supermercado amanhã e beber as minhas coisas.
— E, querido, eu já te falei isso, nem todo mundo gosta de virar doses de tequila.
— Claro que gosta. As doses de tequila são uma bebida clássica em festas. — Revirei os olhos e ri.
— Não vamos fazer uma festa de fraternidade amanhã. Agora somos adultos e podemos nos
permitir um pouco de variedade. No mínimo, poderíamos conseguir um pouco de mix de
margaritas.
— Tudo bem — ele resmungou. — Fez uma lista?
Eu balancei a cabeça, mas quando tentei sair do balcão, Jamie me manteve presa.
— Posso te perguntar uma coisa? — Suas sobrancelhas se juntaram enquanto o sorriso
desaparecia.
— É claro.
— Estamos casados há quase um ano. O que você mais gosta em ser casada comigo?
Minhas mãos subiram para seu rosto, afastando o cabelo loiro de onde havia caído em seus olhos
azuis. Eu nem mesmo precisei pensar na resposta.
— Eu amo poder dizer que sou sua esposa. Isso sempre me enche de orgulho. Como quando
estamos na sua escola e os pais vêm me dizer o quanto os filhos amam sua aula, fico tão orgulhosa de
poder chamá-lo de meu.
A tensão em seu rosto foi embora.
Eu não tinha certeza de onde a pergunta tinha vindo, mas era uma boa pergunta. Principalmente
nesse momento, véspera do nosso aniversário.
Jamie recuou, mas eu agarrei a gola de sua camisa e puxei-o de volta para perto.
— Espere aí. É a sua vez. O que você mais gosta em ser casado comigo?
Ele sorriu.
— Que você faz sexo comigo todos os dias.
— Jamie! — Eu golpeei seu peito enquanto ele ria. — Fala sério.
— Eu estou falando sério. Ah, e eu amo que você cozinhe e lave a roupa. Sério, baby, obrigado.
— Você está brincando comigo, né?
Ele acenou com a cabeça e sorriu ainda mais.
— Eu amo ser aquele que vê você ficar mais bonita a cada dia.
Meu coração acelerou novamente.
— Eu te amo, Jamie Maysen.
— Eu também te amo, Poppy Maysen.
Ele se inclinou para frente e roçou os lábios contra os meus, me provocando por um breve
momento com a língua antes de dar um passo para trás e me soltar.
— Vou pegar a lista da loja de bebidas. — Pulei do balcão e peguei o Post-It onde havia anotado
antes.
— Ok. Volto logo. — Jamie enfiou a lista no bolso e beijou meu cabelo antes de sair pela porta.
Três horas depois, Jamie ainda não havia retornado. Toda vez que eu ligava para o seu telefone,
tocava, e tocava, e tocava, até que o correio de voz disparasse a gravação. Eu estava fazendo o meu
melhor para ignorar o nó no estômago. Ele provavelmente estava apenas fazendo compras. A
qualquer minuto, estaria em casa, e poderíamos sair para jantar. Conhecendo Jamie, ele tinha
perdido a noção do tempo ou topado com um amigo e saído para tomar uma cerveja.
Ele está bem.
Uma hora depois, Jamie ainda não estava em casa.
— Jamie — eu disse ao correio de voz. — Onde você está? Está ficando tarde, e pensei que íamos
jantar. Você perdeu o telefone ou algo assim? Você precisa voltar para casa ou me ligar de volta.
Estou ficando preocupada.
Desliguei e comecei a andar pela cozinha. Ele está bem. Ele está bem. Uma hora depois, deixei mais
cinco mensagens de voz e já tinha roído todas as unhas.
Uma hora depois disso, deixei quinze mensagens de voz e comecei a ligar para hospitais.
Eu estava procurando o número do departamento de polícia quando a campainha tocou. Jogando
meu telefone no sofá da sala, corri em direção à porta, mas meus pés vacilaram ao ver um uniforme
através do vidro da porta.
Oh, Deus. Meu estômago revirou. Por favor, faça com que ele esteja bem.
Abri a porta e saí para a varanda.
— Polícia.
O policial se manteve de cabeça erguida, a postura perfeita, mas os olhos verdes o traíram. Ele não
queria bater na minha porta tanto quanto que eu não o queria na minha varanda.
— Senhora. Você é Poppy Maysen?
Eu sufoquei um “sim” antes que a bile subisse na garganta. A postura do policial afrouxou um
centímetro.
— Senhora Maysen, receio ter más notícias. Você gostaria de entrar e sentar?
Eu balancei a cabeça.
— É Jamie?
Ele acenou com a cabeça, e a pressão no meu peito apertou tanto, que eu não conseguia respirar.
O coração batia tão forte no peito, que as costelas doíam.
— Só… Só me diga — sussurrei.
— Você está sozinha? Gostaria que eu ligasse para alguém? — Eu balancei a cabeça novamente.
— Conte-me. Por favor.
Ele respirou fundo.
— Lamento informá-la, sra. Maysen, mas seu marido foi morto hoje mais cedo.
Jamie não estava bem.
O policial continuou falando, mas suas palavras foram abafadas pelo som do meu coração
despedaçando.
Não me lembro de muito mais daquela noite. Eu lembro do meu irmão vindo. Lembro de ele
ligar para os pais de Jamie para dizer a eles que seu filho não estava mais nesse mundo — que ele
havia sido morto em um assalto a uma loja de bebidas.
Lembro de desejar estar morta também.
E eu me lembro daquele policial sentado ao meu lado o tempo todo.
Aniversário de 30 anos:
Comprar um restaurante para a Poppy.
Poppy Maysen.
Puta merda.
Poppy Maysen estava no meu dojo.
— Oi, Sensei.
— Ei — respondi automaticamente, desviando a atenção de Poppy para cumprimentar um aluno
enquanto ele passava.
Não demorou muito para meu olhar vagar de volta para Poppy. Ela estava congelada contra a
parede, olhando para mim como se tivesse visto um fantasma.
Fazia quanto tempo? Cinco anos? A última vez em que a vi, ela estava dormindo no sofá da sala de
sua casa, tremendo com o pesadelo em forma de notícia que deixei em sua porta.
E agora ela estava ali, vestida com roupas de ginástica e esperando para fazer uma aula de caratê.
Para fazer as minhas aulas de caratê.
— Ei, Cole. — Danny, um adolescente faixa preta, deu um tapa no meu braço ao passar.
Eu estava parado bem no caminho das pessoas que iam e vinham dos vestiários, olhando para
Poppy como um idiota.
— Oi, Danny.
Eu desviei meus olhos dela novamente e me afastei para o lado.
Quando olhei para trás, ela não tinha se movido.
O que estava acontecendo em sua cabeça? Ela estava prestes a fugir? Meu rosto provavelmente
provocou um ataque de más lembranças. E eu, parado e boquiaberto, provavelmente não estava
ajudando.
Merda. Eu forcei um pé na frente do outro, dando a ela um leve aceno de cabeça enquanto
desaparecia no vestiário masculino. Se ela ainda estivesse na sala de espera quando eu saísse, ficaria
chocado, mas diria um “olá”. Talvez alguns minutos dariam a ela — e a mim — a chance de superar
a surpresa de estar na mesma sala mais uma vez.
— Oi, Sensei Cole.
— Ei, meninos — cumprimentei alguns dos garotos mais novos no vestiário enquanto eles
amarravam os sapatos. — Vocês aprenderam algo novo hoje?
As crianças começaram a tagarelar sobre os novos socos que aprenderam na aula, embora nenhum
dos dois conseguisse se lembrar dos nomes em japonês. Eu me desliguei deles, largando minha
mochila em um banco e passando a mão pelo cabelo.
Poppy Maysen.
O que ela tinha feito nos últimos cinco anos? O que aconteceu com sua vida? Eu não a monitorei
depois daquela noite terrível, mas naquele instante, eu gostaria de ter monitorado.
Ela estava tão deslumbrante naquele momento como esteve anos antes.
Ondas soltas de longos cabelos ruivos. Pele perfeita e cremosa como sorvete derretido. Para uma
ruiva, Poppy não tinha aquele típico monte de sardas — apenas algumas na ponta do nariz. E
aqueles olhos de um azul-centáurea. Ainda assustadoramente lindos, assim como estavam em sua
varanda naquele dia. Eu nunca esquecerei o momento em que o fogo neles se extinguiu.
— Tchau, Sensei!
— Tchau — respondi enquanto os meninos saíram pela porta. Esperava que eles não tivessem
dito nada importante, porque eu não registrei uma palavra do que falaram.
Porra. Poppy Maysen.
Eu encontrava pessoas do meu passado o tempo todo, mas nenhuma delas me chocou tanto. E se
eu não conseguisse controlar aquilo, ia acabar de bunda na minha própria aula.
Esfregando as mãos no rosto, tirei os óculos de sol da gola e os joguei no banco. Então abri a bolsa
e corri para trocar o jeans e a camisa polo preta pelo quimono branco. Com minha faixa preta
amarrada em volta dos quadris, respirei fundo novamente. Alguns outros caras estavam se trocando,
mas eu continuei de costas para eles, precisando de apenas um minuto para colocar a cabeça no
lugar.
Ela encontrou uma maneira de acender aquele fogo em seus olhos novamente? Eu realmente
queria descobrir. Quero dizer, se ela já não estivesse a quilômetros de distância do dojo, correndo
para nunca mais voltar.
— Vejo vocês lá fora. — Eu balancei a cabeça para os outros caras e abri a porta do vestiário.
Poppy ainda estava de pé em seu lugar contra a parede. Seus olhos transitavam rapidamente entre
as pessoas aglomeradas na área de espera. O barulho estava alto porque todos conversavam antes da
aula, então ela não percebeu que eu saí do vestiário. E apesar de seu óbvio nervosismo, Poppy
manteve um pequeno sorriso em seu rosto estoico.
Uma graciosa força.
Poppy tinha essa força envolvida em graça, pensei a mesma coisa todos aqueles anos atrás. Eu
nunca tinha visto uma pessoa tão devastada, mas ainda assim ela não gritou, chorou ou atacou
alguém. Ela apenas… se manteve inteira. Em todos os meus anos no Departamento de Polícia de
Bozeman, nunca conheci ninguém — policial ou civil — que tivesse lidado com um trauma como
ela.
Poppy não tinha me notado ainda, então deslizei por uma abertura e parei no espaço vazio na
parede ao lado dela. Inclinei-me e falei baixinho.
— Oi.
Seu rosto rapidamente se virou para o meu, então ela engoliu em seco e piscou. Enquanto eu
estava no banheiro, ela aparentemente se preparou para o nosso próximo encontro.
— Olá.
Olá. Até sua voz me afetou. Cinco anos antes, as palavras que ela havia falado eram cheias de dor.
Mas agora? Sua voz era tão clara. Não havia nada de suave ou tímido nisso. Nada cansado ou áspero.
Foi a voz mais pura que já ouvi.
Com indiferença, enxugando o suor da palma da mão, a estendi e falei:
— Eu sou Cole Goodman.
— Poppy Maysen.
Eu concordei.
— Eu lembro.
Os olhos de Poppy dispararam para a minha mão ainda estendida entre nós e de volta para o meu
rosto. Então, lentamente, seus dedos delicados se encaixaram nos meus. No minuto em que sua pele
macia roçou a minha palma calejada, um zumbido de eletricidade viajou pelo meu braço.
Enquanto eu congelava, a respiração de Poppy engatou.
Nós olhamos um para o outro, ainda com as mãos juntas, provavelmente parecendo loucos para
os outros alunos por perto, mas não me importei. Não quando a mão de Poppy ainda estava na
minha e ela não fez nenhum movimento para retirá-la.
— Cole. Tem um segundo? — Robert chamou de seu escritório.
— Sim. — Eu mantive a mão de Poppy por mais um segundo antes de a soltar e caminhar para o
escritório. Eu me ressentia de cada passo dado para longe da mulher.
Robert, meu instrutor e dono do dojo, estava sentado em sua mesa com óculos de leitura
empoleirados precariamente no nariz enquanto folheava uma pilha de mensagens. O cabelo tinha
começado a rarear no ano anterior, então ele nos chocou naquela semana ao vir para a academia com
a cabeça toda raspada. Eu estava aprendendo caratê com Robert havia quase duas décadas, desde o
ensino médio, e seu novo visual ainda me confundia.
— E aí? — Peguei a cadeira na frente de sua mesa.
— Você pode pegar a garota nova hoje à noite? Ela ligou para marcar uma aula experimental, mas
eu meio que esqueci. Eu a ensinaria, mas preciso passar algum tempo trabalhando com a turma faixa
marrom esta noite para ver quem está pronto para avançar.
— Sem problemas. — Eu esperava que não fosse muito desconfortável para ela, porque eu queria
um tempo extra com Poppy, uma chance de saber o que ela tinha feito nos últimos cinco anos. Para
ver como ela havia se recuperado daquela noite. Talvez descobrisse por que minha reação a ela foi tão
forte depois de apenas trinta segundos.
— Como está o trabalho? — Robert perguntou, tirando meus pensamentos de Poppy.
— Ocupado. Demos início à nova força-tarefa antidrogas hoje.
— Bom. Já estava na hora.
Atrasado, realmente. Como ex-policial, Robert sabia que o problema das drogas na área estava se
tornando incontrolável. Ele se aposentou do departamento do xerife do condado anos antes, fazendo
do caratê seu trabalho de tempo integral, mas o tráfico de drogas tinha aumentado mesmo quando
ele ainda estava na força.
— Aquele chefe de polícia idiota pelo menos colocou você no comando da força-tarefa?
Eu sorri.
— Colocou.
Robert sorriu de volta.
— Talvez seu pai não seja tão estúpido afinal.
Eu ri. Robert e papai nunca perderam a chance de brincar um com o outro, mesmo que um dos
dois não estivesse presente. A amizade deles foi a razão de eu ter começado o caratê aos sete anos —
papai gostava de me trazer quando se encontrava com Robert para praticar.
— Sensei Robert? Posso… — Olivia entrou no escritório vindo do saguão, mas parou
bruscamente. — Ah, hm, ei, Sensei Cole. — Ela colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha e
estudou o chão, tentando esconder as bochechas vermelhas.
— O que você precisa, Olivia? — Robert perguntou.
— Eu, hm… — Ela se mexeu por um momento, olhando entre o chão e a porta. Quando seus
olhos voltaram a encarar os meus, ela se virou e saiu.
— Caramba — Robert murmurou. — De novo, não.
Eu levantei as mãos.
— Ei, não é minha culpa.
Não pude evitar que Olivia tivesse desenvolvido uma paixão por mim no ano passado. Ela e suas
amigas de dezessete anos. Não só era estranho para caralho — eu dei aulas a algumas delas desde que
eram crianças —, também estava irritando Robert porque todas elas se amontoavam no fundo do
dojo e ficavam dando risadinhas.
— Você poderia me ajudar nessa. — Robert se levantou de sua cadeira.
— Como? Parando de vir? — Eu não posso evitar o rosto com que nasci e tenho certeza de que
não abriria mão do meu corpo só por causa de algumas adolescentes chateadas. — Eu basicamente as
ignoro. Você quer que eu seja um completo babaca e as deixe com cicatrizes pra vida toda?
— Não — ele murmurou. — Pelo menos traga Aly de vez em quando para que essas garotas
vejam que você está comprometido.
Não vai rolar.
Não era a hora de atualizar Robert, mas Aly não estaria no dojo tão cedo, pelo menos não comigo.
Eu me levantei e segui Robert para a sala de espera. Ele continuou caminhando para o dojo,
curvando-se na porta antes de entrar, mas eu parei na frente de Poppy.
— Vamos começar.
Ela assentiu e forçou um sorriso.
— Tudo bem.
— Você vai ficar comigo essa noite.
Os olhos dela se abriram um pouco mais.
— Ok.
Ela estava com medo de ficar perto de mim ou apenas ansiosa com a aula? Provavelmente ambos,
mas eu não queria a deixar ainda mais desconfortável, então pulei direto para o modo professor.
— Fazemos uma reverência antes de entrar ou sair do dojo.
— Entendi. — Ela acenou com a cabeça e desencostou da parede.
Eu assumi a liderança, demonstrando a técnica adequada antes de entrar e subir nos tatames.
Poppy me seguiu, mantendo uma distância de um metro entre nós enquanto olhava o espaço.
— Você fica daquele lado para fazer o cumprimento. — Eu apontei para a parede traseira. —
Basta seguir as instruções de Sensei Robert. Depois disso, vamos para o treino. Faça o máximo que
puder, mas não exagere. Então você e eu trabalharemos juntos pelo resto do tempo da aula. Tudo
bem?
Ela acenou com a cabeça, mas não encontrou meus olhos.
— Poppy. — Seus olhos se ergueram para os meus quando sussurrei seu nome. — Será mais
divertido se você apenas relaxar.
— Não estou aqui para me divertir, estou aqui… Eu só estou fora da minha zona de conforto. —
Enquanto falava, agitava as mãos, os pulsos girando em círculos.
Poppy Maysen falava com as mãos.
E foi a coisa mais adorável que eu já vi. Incapaz de esconder meu sorriso, entrei em seu espaço,
saboreando a forma como sua respiração ficou presa. Ela sentiu a eletricidade entre nós com tanta
força quanto eu senti.
— Se for demais, é só me dar um sinal. Talvez essa parada de girar o pulso que você acabou de
fazer. — Seus olhos se estreitaram, e eu sorri mais. — Calma aí, lutadora. Eu só estou brincando
com você.
Ela ergueu uma sobrancelha.
— Você brinca com todos os seus novos alunos?
— Talvez. — Eu sorri. — Então, o que você…?
— Em fila! — Robert chamou.
Poppy se virou e correu para a fila com os outros alunos, e eu me juntei aos instrutores na frente
quando a aula começou. O tempo todo meus olhos permaneceram fixos em Poppy. Ela estava
fazendo o possível para esconder, mas também ficava olhando para mim.
Isso até que sua atenção se tornou exclusivamente focada em tentar acompanhar o treino.
Robert voltou ao escritório e escolheu um instrutor mais jovem, Danny, para conduzir o exercício.
O pirralho levou isso como carta branca para torturar todo mundo. Eu não estava tendo dificuldade
em acompanhar — droga, mal comecei a suar —, mas Poppy e todos os outros daquele lado da sala
pareciam miseráveis.
Não havia como negar que Poppy estava em forma. Com a legging apertada e a camiseta regata,
colada como uma segunda pele, seu corpo deixava pouco para a imaginação, mas um treino de caratê
era uma coisa totalmente diferente. E Danny estava pegando pesado, mesmo para alguns dos alunos
mais antigos.
— Isso é o suficiente — eu disse a Danny quando ele pediu outra série de cinquenta flexões. Já
tínhamos feito cem.
— Está tendo problemas para acompanhar, Sensei Cole? — O merdinha estufou o peito.
— Muito bom, pessoal — falei, ignorando Danny com um olhar penetrante. — Vão em frente e
bebam água.
Poppy se levantou do chão para caminhar até o bebedouro. Seu rosto estava vermelho e a testa,
suada, mas, caramba, aquelas bochechas rosadas a deixavam ainda mais bonita. A imagem dela
deitada ao meu lado na cama com as bochechas coradas por um tipo diferente de treino surgiu na
minha cabeça.
Porra.
A última coisa que eu precisava era ficar de pau duro com o quimono. Felizmente, a parte superior
estava baixa o suficiente para esconder meu rápido ajuste enquanto todos estavam na fila para beber
água.
— Essa é uma bunda que vale a pena apertar — Danny sussurrou, com os olhos colados na
bunda de Poppy. Eu não tinha certeza se ele quis dizer aquilo em voz alta, mas eu vi vermelho. Ele
estava certo, a bunda dela era espetacular, mas ele não tinha o direito de falar em voz alta.
— Cuidado, Danny. — Eu apertei minha mão em seu ombro e o arrastei para longe da fila. —
Você foi longe demais com o treino. Não pressionamos tanto quando temos alunos novos, e você
sabe disso. Eu estava disposto a deixar passar, mas você acabou de ultrapassar o limite. Você vai ter
**
que fazer flexões e suicídios até o final da aula. Se eu vir você relaxando, ficaremos até tarde e
faremos outro treino até que você aprenda os limites. Entendido?
Seu rosto empalideceu.
— Sinto muito, Sensei.
— Tratamos as mulheres com respeito, dentro e fora deste dojo. Pense nisso. Não fale. — Eu
apontei para o outro lado da sala e assumi minha altura de um metro e noventa. — Agora, mãos à
obra.
Ele acenou com a cabeça, seus ombros caíram enquanto se afastava. Depois que todos os outros
tomaram um gole, eu bebi um pouco de água e, em seguida, acenei para Poppy se juntar a mim no
canto mais distante da sala.
Ela enxugou a testa com as costas da mão esquerda, as alianças brilhando à luz do teto.
— Está tudo bem por hoje. — Apontei para seu dedo anelar. — Mas da próxima vez, seria bom
tirá-las. Melhor deixá-las no vestiário do que presas num dedo torcido e ter que cortá-las no hospital.
— Hum… — Ela abaixou a mão e depois inspecionou o anel de noivado de esmeralda e a aliança
de ouro branco. — Eu não tiro desde que Jamie… Você sabe.
— Ah, hm, certo. — Acho que não preciso perguntar se ela se casou novamente, não se ela ainda
usava os anéis do falecido marido. — Bem, apenas pense nisso para a próxima aula. Você está bem
depois do aquecimento?
— Estou viva e não caí de cara no chão. — Ela sorriu. — Essa é uma vitória para mim esta noite.
Eu ri.
— Então vamos garantir que você passe pelos próximos trinta minutos de pé e possa considerar
isso como uma vitória também.
— Seria bom.
Passei os minutos seguintes ensinando-a sobre suas posturas e como dar os passos semicirculares
adequados. Quando ela entendeu tudo, pedi que fechasse o punho.
— Assim?
— Não exatamente. — Peguei suas mãos para ajustar seu aperto, mas quando nos tocamos,
esqueci tudo sobre caratê.
Meus olhos se encontraram com os dela quando nós dois congelamos e as outras pessoas no dojo
desapareceram. Assim como aquele aperto de mão no corredor, seu toque bloqueou o mundo e
enviou fogo ardente por minhas veias.
E direto para o meu pau.
Eu me afastei rapidamente, precisando de um momento para pensar em coisas não relacionadas a
sexo antes que as coisas ficassem realmente estranhas.
— Hum… — Eu acenei para frente. — Vá em frente e pratique mais alguns movimentos como
acabei de mostrar.
— Claro. — Sua voz musical não ajudou minha ereção crescente.
Enquanto ela dava um passo em direção aos espelhos, eu procurei em meu cérebro por imagens
nada sensuais e fiz o meu melhor para evitar olhar suas pernas torneadas. Eu encarei a careca de
Robert. O suor caindo nos tatames. Os pés peludos de Danny. Eu passei por todos eles, e quando
Poppy voltou para o meu lado, o inchaço na cueca era ao menos administrável.
— Foi bom?
— Você foi ótima. Eu vou pegar algumas almofadas de treino para nós. — Eu dei a ela um amplo
espaço enquanto caminhava para a pilha na parede oposta, mas seu cheiro de baunilha parecia me
seguir.
— Controle-se — murmurei enquanto pegava uma manopla grande e uma pequena.
— O que você disse, Sensei? — um faixa verde perguntou.
— Ah, hm, eu disse que seu kata está realmente funcionando.
— Obrigado!
Eu fiz o meu melhor para não tocar em Poppy durante o restante da aula, mas mesmo usando as
almofadas como uma barreira, nos tocávamos de vez em quando. Quando nossos trinta minutos
acabaram, eu estava desesperado por um banho frio.
— Como ela foi? — Robert perguntou, juntando-se a nós antes do fim da aula.
— Bem. — Limpei o bloqueio em minha garganta. — Ela tem jeito. É naturalmente boa.
— Há — Poppy zombou. — Mais como naturalmente desastrada. Eu chutei seus dedos mais do
que a almofada. — Seus grandes olhos azuis olharam para mim pedindo seu centésimo pedido de
desculpas. — Sinto muito.
— Como disse, estou bem. Não doeu nada.
Ela se virou para Robert e sorriu.
— Obrigada por me receber esta noite.
— Que bom que você se juntou a nós. Volte a qualquer hora.
— Agradeço a oferta e a possibilidade de tentar, mas não acho que caratê seja para mim.
Robert acenou com a cabeça.
— Justo. Não é para todos. Se você mudar de ideia, será sempre bem-vinda. — Ele apertou a mão
de Poppy e, em seguida, pediu que toda a classe se retirasse.
Sem uma palavra, Poppy correu para a porta, o cabelo balançando nas costas enquanto desaparecia
no vestiário.
A visão dela indo embora me atingiu no estômago. Poppy não voltaria ao dojo, e eu não queria
esperar mais cinco anos para vê-la novamente. Então, em vez de falar com os outros alunos, corri
para o saguão e a esperei sair do banheiro feminino.
Não demorou mais de um minuto para ela emergir no corredor com as chaves nas mãos e os tênis
calçados. No momento em que me viu, seus pés pararam.
— Ah, olá.
— Eu, hum… Eu só queria dizer que foi bom ver você.
— Obrigada. — Ela deu alguns passos em direção à porta.
— Espere — eu soltei antes que ela pudesse sair. — Posso te ver novamente? Para conversar.
Poppy parou e se virou, uma guerra sendo travada atrás de seus olhos. Ela não queria dizer sim.
Ela não queria dizer não.
— Não sei.
Foi honesto.
Honestidade, eu poderia trabalhar com isso.
— Você vai pelo menos pensar sobre isso?
— Tudo bem. — Ela começou a caminhar para a porta novamente, mas antes de tocar na
maçaneta, fez uma pausa, falando por cima do ombro. — Obrigada por ficar comigo naquela noite.
Então ela se foi antes que eu pudesse dizer qualquer coisa.
— Porra — eu resmunguei e esfreguei o rosto.
— O que foi isso? — Robert apareceu ao meu lado.
— Ah, nada. Só um dia longo. É melhor eu me trocar. — Corri para o vestiário, não querendo
conversar essa noite, e acenei um adeus antes de ir para casa.
O que eu precisava era de uma cerveja — ou três — e algum tempo sozinho para pensar.
Algo em Poppy era diferente, e não eram apenas as circunstâncias extremas em que nos
conhecemos. Nenhuma mulher jamais mexeu com meu sangue como ela fez naquela noite, nem
mesmo Aly.
Aly, cujo carro estava parado na minha garagem, bloqueando a entrada, quando estacionei na
minha casa.
— Droga. Hoje, não — Balancei a cabeça, estacionei minha caminhonete preta na rua e saí, bem
quando ela estava passando pela porta da frente com uma caixa nos braços.
— Ei — disse Aly, descendo os degraus da varanda.
Atravessei a curta calçada e a encontrei em seu carro.
— Ei.
— Desculpa. Eu estava tentando ir embora antes de você chegar em casa.
— Tudo bem. Espera, me deixa te ajudar. — Eu estendi a mão e levantei a caixa de seus braços.
— Obrigada. — Ela abriu a porta traseira do carro, e coloquei a caixa dentro. Quando me
levantei, ela estava tirando a chave da minha casa do chaveiro. — Aqui está.
Nossos dedos roçaram quando eu a tirei da sua mão, mas não tive nem o menor indício de reação.
Tocar Aly, a mulher com quem namorei por dois anos e vivi por seis meses, não era nada comparado
ao toque que senti antes com Poppy.
Isso cimentou a decisão que tomei na semana anterior. Terminar com Aly não foi fácil, mas foi o
certo.
— Cole. — Ela se aproximou, olhando para mim com olhos suplicantes. Os mesmos olhos que
usava sempre que queria que eu transasse com ela até a exaustão.
— Não, Aly. — Eu recuei. — Nós dois sabemos que isso só tornaria as coisas mais difíceis.
Seus ombros ficaram tensos quando recuou.
— Mais difícil para mim, você quer dizer? Porque você está bem. Uma semana depois de
terminarmos, e você está de volta ao seu normal. Como se os últimos dois anos juntos não
significassem nada. Enquanto isso, estou morando no quarto de hóspedes da minha irmã, chorando
até dormir todas as noites.
— Eu sinto…
— Muito. Eu sei. — Ela bateu a porta do carro e girou nos calcanhares enquanto contornava o
capô. Abriu a porta do motorista, mas parou, olhando para mim por cima do carro. Então esperou.
— Cuide-se, Aly.
Ela bufou e então entrou no carro e saiu da garagem, enxugando as lágrimas do rosto.
Esperei que seu carro desaparecesse na rua antes de entrar. De pé na minha sala de estar, eu varri
com os olhos os móveis. As almofadas tinham sumido. Aly tinha levado junto com o cobertor que
ela sempre usava quando estávamos assistindo TV.
Eu odiava ter machucado Aly. Ela era uma boa pessoa, mas não era a mulher certa para mim.
Depois de dois anos, nunca senti como se ela fosse a única. Eu nunca cogitei a pedir em casamento.
Nem uma vez. Estávamos em idas e vindas em nosso primeiro ano e meio juntos, mas então ela
ficou sem colega de quarto e foi morar comigo. Mesmo depois de seis meses e depois de Aly dizer
que me amava, nunca me senti obrigado a dizer isso de volta.
Fui até a cozinha para tomar uma cerveja, e quando abri a porta da geladeira, meu telefone tocou.
Tirei-o do bolso e pressionei-o entre a bochecha e o ombro.
— Oi, mãe.
— Oi, docinho. Como você está?
— Estou bem. — Ou pelo menos estava. A geladeira estava vazia, Aly tinha levado toda a minha
cerveja também. Droga. Quem pega a cerveja de um cara? Isso é maldade pura. Ela nem bebia cerveja
(o que eu deveria ter interpretado como um sinal).
— Eu estava ligando para ver se você e Aly poderiam vir jantar amanhã. Não vemos vocês dois há
semanas.
— Eu vejo papai quase todos os dias.
— Isso não conta. Não vejo vocês há semanas.
Respirei fundo e fechei a porta da geladeira. Mamãe ficaria chateada pelo término. Ela tinha
muitas esperanças de um casamento e netos.
— Mãe, ouça. Aly e eu terminamos.
— O quê? — Ela engasgou. — Quando?
— Semana passada — murmurei e me preparei.
— Semana passada! — ela gritou. — Por que você não ligou para me dizer? Ela está bem? Onde
ela vai morar?
— Com a irmã até que ela possa encontrar um novo lugar. Ela está magoada, mas foi o melhor.
— E como você está?
— Tudo bem, mas me sinto um babaca.
— Ah, Cole.
Suspirei.
— Eu tentei, mãe. Eu realmente tentei. Mas eu simplesmente não quero…
— Você não a ama. Eu sei. Não era difícil perceber.
Abandonei a geladeira e tirei um banquinho de baixo da ilha, caindo no assento. — Eu deveria ter
terminado antes. Não deveria ter arrastado isso por tanto tempo e ter ferido Aly ainda mais com a
situação.
— Bem — disse minha mãe —, pelo menos você não se casou com ela.
— Verdade.
Meus olhos pousaram no laptop ao meu lado, e eu o abri. Enquanto mamãe falava no meu
ouvido, meus dedos abriram o Google. Em seguida, digitaram o nome de Poppy.
A página dela no Facebook apareceu primeiro. Em vez de uma foto de perfil, havia um logotipo
para O Maysen Jar. O que seria O Maysen Jar? Cliquei na imagem para ler a legenda. Grande
inauguração amanhã!
Poppy tinha um restaurante que abriria no dia seguinte?
— Cole! — mamãe gritou ao telefone.
— Hm? Ah, desculpe. O que você disse?
— Eu perguntei se você gostaria de vir jantar amanhã.
Fechei a foto do perfil e cliquei em outra. Era de Poppy parada ao lado de fora de um restaurante.
O cabelo estava preso em um coque, e seu braço estava enrolado com o de uma morena. Ela tinha
apenas 1,60 m ou 1,65 m de altura, mas suas pernas se estendiam por quilômetros em uns jeans
apertados e saltos altos. A foto era deslumbrante, mas o que realmente me atraiu foi o sorriso.
Um sorriso que eu queria ver por mim mesmo.
— Cole. — Mamãe bufou.
— Desculpe, mãe. — Fechei o laptop. — Não posso ir jantar amanhã. Eu tenho outros planos.
** Exercício físico que foca na parte cardiovascular. Basicamente se trata de correr até uma marcação, depois voltar ao ponto inicial, então até
uma segunda marca e de novo para o começo do circuito.
Vigésimo nono aniversário:
Pular de paraquedas
— Eu amo o nome do seu restaurante. — Minha cliente me estendeu seu cartão de crédito.
Eu sorri e passei o cartão.
— Obrigada.
— Exceto que ela escreveu errado — Randall resmungou do outro lado da registradora.
Ele tinha acampado em “seu lugar” durante toda a tarde e noite, oferecendo comentários para as
pessoas quando elas vinham pagar suas contas. Falando e comendo. Randall havia entrado um pouco
antes da hora do almoço e, desde então, tinha comido duas quiches, uma salada de espinafre, um
empadão de frango, três tortas de maçã e duas tortas de pêssego.
— Mason — ele murmurou. — M-A-S-O-N. É assim que você escreve.
Minha cliente olhou para ele, prestes a vir ao meu resgate, mas eu
apenas ri.
— Ignore-o — eu disse a ela enquanto devolvia seu cartão. — Ele está rabugento só porque não
vou deixá-lo comer mais sobremesas. Já foram cinco.
Randall fez uma careta.
— Um homem adulto não consegue nem mesmo se deliciar com sobremesas hoje em dia sem
receber um sermão.
— Você vai me agradecer mais tarde, quando não estiver em coma. — Eu atirei para ele meu olhar
de “é isso” e me virei para minha cliente com um sorriso. — Obrigada por vir! Espero que tenha
gostado de tudo.
— Ah, sim, foi maravilhoso. Você tem um cardápio fantástico. E tão criativo. — Ela olhou para
Randall. — Especialmente o nome. Eu definitivamente voltarei.
— Obrigada novamente! — Acenei um adeus quando ela se virou para sair.
Quando a porta se fechou, examinei as mesas do restaurante. Pela primeira vez desde as sete da
manhã, elas estavam todas vazias.
— Uau. — Molly se juntou a mim no caixa com um pano úmido. — Isso foi uma loucura. Achei
que estaríamos ocupadas, mas nunca tão ocupadas. Já esgotamos tudo, menos um empadão e três
saladas.
— É uma boa coisa que vamos fechar — eu olhei para o meu relógio — em 27 minutos.
Não que eu fosse para casa. Eu ficava na cozinha a noite toda preparando pratos para o café da
manhã e reabastecendo o refrigerador de sobremesas.
O sol do fim da tarde de verão estava começando a se pôr, e a agitação do jantar finalmente tinha
diminuído. Quase às vinte horas, o horário de fechamento do meu pequeno café estava logo ali, e
por mais que eu não quisesse recusar clientes, esperava que minhas mesas agora vazias continuassem
assim. Eu não queria ter de explicar — de novo — por que eu tinha tão poucas opções do menu
para oferecer.
— Eu preciso ajustar os planos de estoque para esta semana, eu me senti como uma idiota
dizendo às pessoas que não sobrou quase nada.
— Não se preocupe com isso. — Molly deu um tapinha na minha mão. — As pessoas
entenderam. Você pode fazer alguns ajustes, e tudo ficará bem.
— O movimento provavelmente ficará mais lento quando não formos mais novidade, mas, até lá,
devemos nos planejar melhor.
Ela balançou a cabeça.
— Eu concordo. Já atualizei o orçamento e as projeções de vendas.
— Certifique-se de adicionar algumas tortas extras à sua conta para mim. — Randall puxou o
boné. — Eu não quero ficar sem quando estiver por aqui.
Molly revirou os olhos, mas eu apenas sorri.
— Ok, Randall. Vou me certificar de guardar algumas sobremesas.
Ele desceu do seu banquinho e agarrou a bengala.
— Vejo vocês, meninas, amanhã. — Ele me lançou um olhar penetrante. — Não fique de pé até
muito tarde.
— Prometo — falei enquanto ergui a mão em juramento.
Molly e eu esperamos que ele saísse antes de começarmos a rir. No dia anterior, pensei que minhas
chances de ver Randall James novamente eram quase nulas. Naquele dia, passei a achar que ele seria
meu cliente mais frequente.
— Hoje foi um bom dia. — Molly agarrou seu pano e começou a limpar o balcão.
— Um dia muito bom. — Com exceção de ficar com pouca comida, eu não poderia imaginar a
abertura tendo sido melhor. Os clientes ficaram felizes. Os potes foram totalmente raspados. E eu
tinha encontrado um ritmo rapidamente, equilibrando o trabalho na cozinha e o gerenciamento do
balcão com Molly.
E embora fosse um pouco rabugento, Randall tinha sido uma presença bem-vinda e
reconfortante. A qualquer momento em que eu tivesse ficado nervosa ou começado a me estressar,
encontrava seus olhos esperando por mim com um pequeno aceno de cabeça. Seu encorajamento
silencioso me salvou.
Molly terminou de limpar o balcão e começou nas mesas.
— Estou feliz que vamos arrumar um ajudante de meio período em breve. Eu não acho que posso
lidar com estar aqui das seis da manhã até depois das oito da noite diariamente. Estou morta e
esqueci de deitar.
— Eu também. — Exceto que estou aqui desde as quatro da manhã, e provavelmente ficarei até
bem depois da meia-noite.
Enquanto Molly limpava, levei um pote de talheres e guardanapos de papel preto para uma mesa
e desabei no assento. Fechando os olhos, relaxei por alguns segundos antes de voltar ao trabalho,
enrolando os talheres nos guardanapos e terminando com um anel de papel branco.
Molly terminou com as mesas e veio me ajudar com os talheres.
— Vou para casa tomar um longo banho quente e depois vou direto para a cama. Pela primeira
vez, estou feliz por Finn ficar com as crianças em sua casa para que eu possa dormir.
Finn tinha aparecido mais cedo com Kali e Max para que eles pudessem jantar. Quando Molly se
juntou a eles, tive uma onda momentânea de esperança de que os quatro pudessem desfrutar de uma
boa refeição em família, mas então Finn acabou com tudo. Ele virou a cadeira de lado, longe de
Molly, com uma distância de 60 cm entre eles para que não precisasse fazer contato visual. Ele
literalmente a deixou de lado.
— Você e Finn conversaram durante o jantar? — perguntei.
Molly balançou a cabeça.
— Não. Ele não vai falar comigo. Eu tentei por meses, mas… Você sabe. Ele nunca vai me
perdoar. — Eu dei a ela um sorriso triste. Molly havia perdido as esperanças, mas eu não. Não
quando ainda havia amor ali.
Porque Finn e Molly se amavam. Qualquer pessoa que passasse trinta segundos com eles podia
sentir isso. Mas o casamento não foi fácil. Um ano antes, os dois estavam passando por uma fase
difícil. Finn estava trabalhando muito e não passava muito tempo em casa. Quando ele aparecia,
descontava o estresse do trabalho em Molly. Eles brigaram tanto, que Finn finalmente se mudou.
Eles concordaram com uma separação e fazer terapia, mas Finn nunca encontrava tempo para se
encontrar com o terapeuta.
Então Molly cometeu um erro.
Ela estava sozinha e certa de que o casamento havia acabado. Foi a uma festa de despedida de
solteira, ficou bêbada e fez sexo com um cara qualquer do bar. Ela estragou tudo — de verdade —,
mas, para seu crédito, ela admitiu o erro. Disse a Finn a verdade e implorou por perdão. Ele disse a
ela para procurar um advogado em vez disso.
Eu tinha dificuldade em acreditar que minha amiga pudesse fazer isso com meu irmão. Eu estava
com raiva e disse algumas coisas que não queria dizer, mas depois me desculpei e a perdoei. As coisas
tinham sido tão difíceis para ela quando Finn se mudou. Molly ficou arrasada.
Então assumi meu papel como Suíça, apoiando Molly como minha melhor amiga e Finn como
meu único irmão. Enquanto isso, eles estavam infelizes. Finn estava punindo Molly por um erro.
Molly ainda estava se punindo por perder o amor de sua vida.
— Sinto muito, Molly.
Ela encolheu os ombros.
— É minha culpa. Se eu estivesse no lugar dele, se ele tivesse me traído, estaria arruinada.
Traído. Por que ela sempre dizia isso? Eu odiava essa palavra. E o jeito que disse foi pior do que
qualquer palavrão. Molly não era uma traidora. Molly era apenas humana, lidando o melhor que
podia com um coração partido.
— Vocês não estavam juntos.
— Ainda éramos casados. Eu estava... estou ainda apaixonada por ele. Eu entendo por que Finn
está magoado e com raiva. Alguns erros você simplesmente não consegue perdoar.
Ou esquecer.
Molly lamentaria esse erro pelo resto da vida.
— Chega disso. — Molly forçou um sorriso, desviando a conversa de si mesma e de Finn, como
de costume. — Como foi sua aula de caratê na noite passada?
Ao contrário do meu irmão, Molly aceitou melhor minha decisão de trabalhar com a lista de
Jamie.
— Foi… interessante.
Tão interessante, que fiquei acordada a maior parte da noite pensando sobre a aula. Minha mente
deu voltas a noite toda, mas não sobre caratê. Sobre Cole Goodman. Certamente foi um choque vê-
lo novamente, mas o mais surpreendente foi a onda de sentimentos que ele invocou.
Sentimentos — sensações, toques elétricos — que eu não tinha há muito tempo.
— Então? O que aconteceu? Você aprendeu a chutar alguns traseiros?
— Ah, sim. Eu sou uma perita em chutar bundas — disse, impassível, então ri. — Estou muito
feliz por ter sobrevivido ao treino. Para mim, isso é uma vitória.
— Você riscou isso da lista?
Eu concordei.
— Ontem à noite quando cheguei em casa.
— Você está bem?
— Eu acho que sim. Eu chorei como de costume, mas quando as lágrimas pararam, eu realmente
me senti bem.
— Estou feliz. É isso que você estava procurando, certo? Um encerramento?
Balancei a cabeça e enrolei outro lote de talheres.
— Na verdade, tenho pensado em tentar percorrer os itens da lista mais rapidamente.
A grande objeção de Finn era que passar pela lista de Jamie se arrastaria por anos, e eu entendia o
que ele queria dizer. Agora que estava começando a riscar mais itens, me sentia motivada a continuar.
— Quão rápido? — Molly perguntou.
— Um ano? Talvez menos?
Ela pensou por um momento.
— É ambicioso. Você acha que é possível?
O maior item da lista de Jamie era o restaurante. Também era o item que mais exigia dinheiro.
Para os outros, eu precisava principalmente de tempo. Felizmente, alguns itens eu já havia colocado
em ação.
— Eu acho que sim. Um ano vai ser a meta, mas se eu colocar algumas coisas como prioridade,
posso ser capaz de encerrar tudo antes do aniversário de Jamie.
Isso me daria até o dia de Ano-Novo.
— Bem, você sabe que vou ajudar no que puder.
— Obrigada.
Molly moveu seus talheres enrolados para o pote.
— Você ainda não comeu. Por que não volta para a cozinha e eu termino aqui?
Eu olhei para o meu relógio: 19:49 h.
— Nós sobrevivemos ao primeiro dia. Acho que vou voltar e fazer um sanduíche. Estou
faminta…
A porta da frente se abriu. Droga. Eu falei cedo demais. Virando-me para a porta, sorri, pronta
para cumprimentar meu cliente tardio, mas vacilei quando a porta se fechou atrás dele.
Cole Goodman estava caminhando em minha direção.
Minha barriga afundou quando o observei. Seus óculos de sol no estilo aviador estavam
empoleirados em cima do cabelo castanho-chocolate. Uma polo preta se esticava em seus ombros
largos e apertada nos braços musculosos. A calça jeans azul-claro se moldou às coxas hercúleas antes
de terminarem nas botas pretas. O cinto de couro continha um distintivo brilhante, e havia uma
arma no coldre.
Cole sorriu e fixou os olhos verde-claros nos meus enquanto cruzava a sala.
Seus dentes retos e brancos fizeram minha respiração perder o compasso — algo que aconteceu
ontem à noite mais vezes do que eu queria admitir.
Molly, que havia se virado no assento para cumprimentar nosso cliente, virou de costas para Cole.
Suas bochechas coraram quando ela sussurrou: “Uau”.
Uau, de fato.
Cole Goodman era, simplificando tudo, lindo.
Ele poderia dar a uma mulher uma multa por excesso de velocidade e receber um agradecimento
em troca. Ele inspirou mulheres a tentarem flexões em uma aula de caratê apenas pela chance de vê-
lo suar com o quimono. Cole deixava mulheres adultas corando como adolescentes e rindo nos
cantos, como aquelas garotas no dojo na noite anterior.
Além de Jamie, nunca tinha visto um homem tão bonito. E para ser honesta, Cole podia até
mesmo superar Jamie.
O rubor em minhas bochechas empalideceu quando um nó de culpa se estabeleceu no estômago.
Eu amei Jamie. Jamie tinha sido um homem lindo também. E, como sua esposa, eu não deveria me
sentir atraída por outro homem.
Meu sorriso se transformou em uma carranca quando Cole se aproximou da nossa mesa.
— Ei, Poppy.
— Oi, Cole.
Seu sorriso se desfez.
— Você não parece feliz em me ver de novo.
— De novo? — Molly perguntou.
Cole olhou para minha amiga e estendeu a mão.
— Cole Goodman. Encontrei Poppy na escola de caratê ontem à noite.
— Oh! — Ela se levantou e pegou sua mão. — Eu sou Molly Alcott. Prazer em conhecê-lo.
Poppy estava me contando sobre sua aula de caratê. — Ela se virou para mim. — Mas não me disse
que esteve se gabando sobre o restaurante.
— Eu não estava…
— Na verdade, eu soube do restaurante na internet — disse Cole. — Eu vi o nome de Poppy e
decidi dar uma olhada. — Ele olhou na minha direção. — Espero que você não se importe.
— Não. De jeito nenhum. — Eu me levantei, sacudindo meus sentimentos estranhos. Não podia
me dar ao luxo de recusar clientes, mesmo que fossem bonitos e me deixassem desconfortável.
— Eu tentei vir mais cedo, mas algo surgiu no trabalho. Suponho que você não tenha mais
comida para o jantar, certo?
— Só um pouco. Tivemos mais gente do que eu esperava e estamos reduzidos a apenas alguns
itens. Desculpe.
— Não se desculpe. É um bom problema para se ter no dia da inauguração.
— Sabe? — Molly disse, levantando-se também. — Eu acabei de falar para Poppy que ela deveria
comer. Ela está correndo como uma louca o dia todo. Por que vocês não comem juntos?
Meus olhos se voltaram para minha amiga.
— É tarde e tenho certeza que Cole só quer levar algo para…
— Gostei da ideia. — Ele sorriu para Molly.
Ela sorriu de volta.
Eu olhei de um para o outro e vice-versa e levantei um dedo para Cole.
— Você nos daria licença por um minuto?
Ele riu e puxou uma cadeira da nossa mesa, ficando confortável.
— Leve o tempo que precisar.
Agarrei o cotovelo de Molly e em seguida a puxei para longe da mesa e de volta para a cozinha.
Quando a porta se fechou, eu a soltei e plantei minhas mãos nos quadris.
— O que você pensa que está fazendo?
— Você gosta dele.
— O quê?! — eu gritei.
Minha voz estava tão alta, que deixaria os cães latindo histéricos.
— Viu? — Ela me deu um sorriso presunçoso. — Você gosta dele.
Eu balancei a cabeça.
— Não, eu não gosto. Eu não gosto dele.
— Mentirosa.
Bufei.
— É complicado. Eu o conheço.
— Sim. Do caratê.
— Não. — Eu balancei a cabeça e respirei fundo. — Eu o conhecia antes do caratê. Ele foi o
policial que veio à minha casa para me dizer sobre Jamie… — Girei o pulso em vez de terminar
minha frase.
— Ah, merda.
— Bem isso.
Molly andou de um lado para outro em frente à minha mesa de trabalho por alguns momentos,
mexendo as mãos. Quando ela parou de andar, plantou as duas mãos na mesa.
— Ok, entendo como isso seria estranho, mas a declaração ainda é verdadeira. Você gosta dele.
Dei de ombros.
— Ele é fofo. Mas eu não gosto dele.
— Fofo?
— Absolutamente lindo. Tanto faz. Nada disso importa. Não estou em condições de gostar de
um homem agora.
Molly suspirou e deixou a mesa, parando bem na minha frente. Então colocou as mãos nos meus
ombros.
— Ok. Estou guardando este discurso para um dia como hoje.
— Estou com medo agora.
— Fica quieta e só me escuta. — Ela respirou fundo e começou a recitar algo que claramente havia
praticado uma (ou doze) vezes. — Você é minha melhor amiga, e eu te amo. Eu quero que você seja
feliz e tenha mais amor em sua vida. Jamie gostaria que você fosse feliz e tivesse mais amor em sua
vida. E eu acho que é hora de você abrir o coração novamente para essa possibilidade.
— É muito cedo. — Eu balancei a cabeça. Até pensar em estar com outro homem fazia meu
coração doer. Eu não poderia fazer isso com Jamie. Ainda não. Talvez nunca.
— Poppy… — Molly sussurrou. — Em algum momento um homem iria aparecer e chamar sua
atenção. Não há nada de errado nisso. Não há nada de errado em você explorar uma possibilidade de
ter algo com aquele cara. Não é uma traição a Jamie.
O nó no fundo da minha garganta começou a crescer.
— Mas parece que é. Eu não posso fazer isso com ele.
— Eu entendo. Eu realmente entendo. Todos nós amávamos Jamie. Todos nós sentimos sua
falta. Mas já passaram cinco anos. Você está encarando a lista dele para tentar seguir em frente, certo?
Eu concordei.
— A lista é algo bom, você sabe que eu te apoio nisso. Mas apenas marcar todas as caixinhas que
Jamie deixou não vai ser suficiente. Em algum momento, você também terá que viver por você
mesma. É assim que você vai seguir em frente.
— Mas eu… — Eu queria seguir em frente, mas estava com medo de seguir em frente. Por mais
que eu quisesse ser feliz e esquecer o passado, estava com medo de perder o pedaço de Jamie que
ainda estava em meu coração.
— Mas o quê?
Respirei fundo e confessei as preocupações que me impediram de dormir na noite anterior.
— E se eu me apaixonar por outro homem e esquecer Jamie?
Ela me deu um sorriso triste.
— Você realmente acha que isso aconteceria?
— Não. — Suspirei. — Na verdade, não. Só estou com medo.
— Entendo. Mas não estou dizendo para pular na cama com Cole ou ter filhos com ele. Só estou
dizendo que você o acha fofo. Pela expressão no rosto dele, ele também te acha fofa. Vocês dois
deveriam passar algum tempo sendo fofos juntos.
— Ok. Eu oficialmente odeio a palavra “fofo”.
— Eu também. — Ela riu. — Então o que você me diz? Jante com ele. Faça isso por mim. Por
favor?
Eu gemi.
— Pare com isso. Agora você soa como Kali.
— Onde você acha que aprendi? Ela alonga tanto a expressão “por favor”, que eu sempre desisto.
Você quer que eu faça de novo? Eu faço. Pooooooor…
— Ok! Já que estou fazendo um sanduíche para mim, vou fazer um para ele também.
— Sim! — Ela aplaudiu antes de me puxar para seus braços. — Amo você, Ursinha Poppy.
Eu sorri com o apelido que Molly me deu no meu primeiro ano de faculdade.
— Também te amo, Molly-Mu.
— Que tal eu terminar lá e fechar? Então vocês podem comer aqui.
Eu a soltei
— Tudo bem. Você pode me dar um minuto antes de mandá-lo para cá?
— Te dou até dois.
Quando Molly desapareceu da cozinha, minhas mãos cobriram o rosto e eu respirei fundo
algumas vezes.
Jantar. Seria apenas um jantar.
Jantar com um conhecido em meu novo restaurante. Cole e eu podíamos bater um papo e
conversar um pouco enquanto comíamos. Então ele iria embora, e eu poderia voltar ao trabalho. O
jantar não significava nada. Eu ainda era a esposa de Jamie. Eu sempre seria a esposa de Jamie, e não
havia nada de errado em cozinhar para Cole.
É apenas um jantar.
Minhas afirmações ajudaram a aliviar a ansiedade, mas não a apagaram totalmente. Então fiz a
segunda melhor coisa para acalmar meu coração acelerado: comecei a cozinhar.
Eu deixei minhas mãos caírem e fui para a grande geladeira de aço inoxidável. Peguei os
ingredientes para os sanduíches de queijo, empilhando comida na mesa. Eu juntei todos os meus
suprimentos quando a porta se abriu e Cole entrou na cozinha.
— Molly me disse para sair do seu salão se eu ainda quisesse comida.
Eu ri.
— Ela tem jeito com os clientes.
Ele sorriu e se aproximou da mesa de preparação.
— Eu posso ir embora se isso for um saco. Eu realmente queria só dizer oi e dar uma olhada no
restaurante.
— Você está com fome. Eu estou com fome. Fazer o jantar não é um saco. Que tal meu queijo-
quente? A receita não está no menu, mas já ouvi dizer que ele não é nada mau.
— Considerando que não como nada desde as dez da manhã, comeria quase qualquer coisa.
— Dia ocupado?
Ele suspirou.
— Ano inteiro ocupado. Bozeman está crescendo tão rápido, que estamos com falta de oficiais
superiores. Eu me tornei detetive no verão passado, e tem estado agitado desde então.
— É por isso que você não precisa mais usar uniforme? — Acenei para suas roupas casuais.
Quando eu o vi cinco anos antes, estava de uniforme.
— Sim.
Eu balancei a cabeça e comecei a fatiar um tomate.
— Posso ajudar?
— Eu cuido disso. Você pode só relaxar. — Apontei para os banquinhos ao lado da mesa.
Cole se sentou e apoiou os cotovelos na mesa. Enquanto eu cortava um pedaço de queijo, seus
braços bronzeados e musculosos apareceram bem na minha linha de visão. Em um pulso estava um
relógio com um enorme mostrador de prata. Eu apostava o que fosse que meus dedos nem se
tocariam se tomassem o lugar daquele relógio.
Meus olhos vagaram de seus pulsos e antebraços para os bíceps. Os braços de Cole eram grandes,
mas não volumosos. Os músculos estavam perfeitamente definidos, mesmo sob o tecido em seu
braço. Minhas bochechas coraram quando percebi que estava olhando por um momento muito
longo.
Pisquei e olhei para a mesa, depois para o rosto de Cole.
Droga. Ele me pegou olhando. O sorriso em seus olhos era inconfundível, mas não desviei o
olhar. Seus olhos também eram… fascinantes.
Eu nunca tinha visto olhos verdes como os de Cole. A cor me lembrava sálvia seca, e seus cílios
escuros e grossos os tornavam ainda mais dramáticos. O rosto atraía meu olhar com o maxilar
esculpido e nariz reto, mas aqueles olhos eram o que te fazia ficar encarando.
Meu coração batia forte quando coloquei a faca na mesa, mas não consegui desviar os olhos de
Cole.
E ele olhou de volta.
Molly entrou de supetão pela porta da cozinha, me pregando um susto.
— Tudo limpo e trancado.
Eu me esforcei para pegar a faca, então pisquei algumas vezes antes de cortar uma fatia de pão.
— Obrigada. Você gostaria de alguma coisa para comer? Estou fazendo seu sanduíche favorito.
Fique, Molly, fique, desejei que viesse em meu resgate, sentasse no banquinho ao lado de Cole e
fosse minha protetora, mas ela manteve o ritmo em direção ao escritório.
— Não posso. Minha banheira está chamando meu nome. Vejo você de manhã. Cole, prazer em
conhecê-lo.
Ele acenou.
— Prazer em te conhecer também.
Molly desapareceu no escritório e voltou com a bolsa pendurada no ombro.
— Tchau!
— Boa noite. — No minuto em que a porta dos fundos se fechou, uma nova onda de nervosismo
me atingiu. Eu estava sozinha com um homem bonito que não era meu marido.
Minha cozinha, algo que projetei para ser grande e espaçosa, de repente ficou muito pequena. O
ar-condicionado que eu mantinha ligado a toda deve ter parado de funcionar porque meu corpo
inteiro estava pegando fogo. E eu tinha me esquecido de como fazer meu queijo-quente; a faca estava
imóvel na minha mão.
— O que você achou do caratê na noite passada? — Cole perguntou, quebrando o silêncio.
Jantar. Isso é apenas um jantar. Respire.
Eu forcei um pouco de ar nos pulmões, então deixei a mesa de preparação para ligar a grelha.
— Foi interessante, mas já estou dolorida. Principalmente meus braços. Imagino que amanhã
todo meu corpo estará de greve.
Ele deu uma risadinha.
— Sim. É um treino difícil. Tem certeza de que não vai tentar de novo?
— Tenho, sim. — Voltei para a mesa e pincelei quatro fatias de pão com um pouco de azeite,
depois espalhei uma fina camada de pesto caseiro antes de adicionar o queijo e o tomate. — Para ser
honesta, só fui mesmo para uma única aula. Espero que isso não ofenda seu instrutor.
— Nah, ele não se importa. Mas por que só uma vez? Foi um desafio ou algo assim?
— É, hum… Uma lista.
— Uma lista?
Explicar a lista de aniversários de Jamie era tão pessoal, que apenas algumas pessoas sabiam dela.
Menos pessoas ainda sabiam que eu estava cumprindo os itens que estavam nela. No entanto, por
algum motivo, eu queria contar a Cole.
— Meu marido, Jamie, ele fez uma lista de desejos de aniversários. Ele separava tudo o que queria
realizar antes de determinados aniversários. Ter aulas de caratê era algo que ele queria fazer antes de
completar vinte e seis anos.
Cole acenou com a cabeça.
— E você está cumprindo a lista dele.
— Estou. — Eu estava pronta para defender a lista e por que estava fazendo aquilo, mas seus
olhos não estavam repletos de preocupação, julgamento ou perguntas. Eles apenas… entendiam.
Cole entendeu sem que eu precisasse dizer uma palavra.
— Ideia interessante. O que mais está nesta lista, se você não se importa que eu pergunte?
— De jeito nenhum. — Retornei ao sanduíche. — Jamie colocou vinte e duas coisas na lista. A
maioria é boba, mas a cara dele. Ele acrescentou algumas coisas que encontrou na internet e que
achou que seriam legais. Outras eram coisas estúpidas que sonhou ou que não conseguia fazer
quando era criança. Nadar em gelatina verde. Participar de uma guerra de tinta. Coisas assim.
Algumas eram mais sérias, como comprar esse restaurante para mim.
Cole se inclinou para pegar três laranjas da fruteira sobre a mesa.
— Você já fez muitas coisas?
— Não, nem perto. — Eu sorri quando ele começou a fazer malabarismos com as laranjas. — Eu
fiz apenas três. O restaurante. A aula de caratê. E paraquedismo.
Cole largou uma laranja, e ela rolou pela mesa.
— Paraquedismo?
Eu ri do choque em seu rosto.
— Você não é o único surpreso por eu ter feito isso. Mas, sim. Fiz no mês passado.
Enquanto Cole pegava a laranja caída e retomava o malabarismo, levei os sanduíches para a grelha,
colocando-os no metal quente. Então corri para fora da cozinha, para o salão, onde todas as luzes
estavam apagadas e a placa na porta tinha mudado para “fechado”. Com dois jogos de talheres e
alguns pratos, voltei para a cozinha para deixar os utensílios e virar os sanduíches. Depois fui até a
geladeira e peguei um pote de salada.
— Aqui. — Entreguei o frasco para Cole. — Use esses músculos e agite isso.
Ele sorriu e colocou de volta as laranjas antes de começar a sacudir.
— Ok. De volta ao paraquedismo. Você me deixou em suspense.
Eu sorri.
— Foi o único item da lista que me assustou, então decidi acabar com ele antes que me
acovardasse.
Cole deslizou o pote de salada pela mesa. O molho que estava sob uma camada de vegetais e alface
agora estava espalhado pelo vidro.
— E o que você achou?
— Eu realmente adorei. O piloto disse algo antes de eu pular que realmente fez sentido. Ele disse:
“Se você quiser nadar, saia do barco. O mesmo vale para voar. Você tem que sair do avião”. Então eu
saí. Estava amarrada a um hippie com dreads e mau hálito, mas ele era tão legal. Toda a equipe
tornou a experiência divertida.
— Você iria de novo?
— Não. — Destaquei o “n” para enfatizar a negativa. — Foi divertido, mas uma vez foi o
suficiente. Você já tentou?
Ele balançou a cabeça.
— Não, mas agora eu quero tentar.
Eu sorri e voltei para os sanduíches, tirando-os da chapa. Então despejei metade da salada no prato
de Cole e metade no meu, entregando seu prato antes de sentar ao seu lado.
— Manda bala.
— Parece uma delícia. Obrigado por fazer isso tudo.
— De nada.
Comemos em silêncio, ambos concentrados na comida e ouvindo o zumbido dos utensílios da
minha cozinha. Mas nossa refeição não demorou muito, já que nós dois estávamos com bastante
fome.
Cole engoliu o último pedaço do seu sanduíche.
— Então. Potes?
— Potes.
— Eu gosto disso. Terei que voltar e experimentar suas sobremesas.
Eu sorri.
— Eu recomendo a torta de maçã.
Seus olhos, fixos nos meus, escureceram um pouco.
— Vou aceitar tudo que você me der.
Vigésimo sétimo aniversário:
Passar um dia inteiro sem usar eletrônicos
Duas semanas se passaram desde a noite em que estive na cozinha do restaurante de Poppy, e ela
permaneceu na minha mente o tempo todo. Uma refeição com ela, e eu estava completamente sob
seu feitiço.
Depois de terminarmos nossos sanduíches, ela colocou nossos pratos de lado e encheu a mesa
com potes e ingredientes de panificação. E eu fiquei em sua cozinha, observando-a trabalhar até uma
da manhã.
Quando perguntou se eu precisava ir para casa, eu disse que não. Quando ela me agradeceu por
ter vindo, eu disse “de nada” e mantive minha bunda naquele banco.
Poppy não me pediu para ir embora, e eu não perguntei se ela gostaria que eu fosse.
Então, enquanto ela fazia bandejas de tortas, crumbles e quiches, eu assumi o dever de lavar a louça.
Eu tinha feito o meu melhor para me concentrar na pia, em vez de focar na maneira como sua calça
jeans se esticava sobre sua bunda. Eu esfreguei panelas para ignorar o pequeno pedaço de pele em seu
abdômen que ficava exposto sempre que ela tentava alcançar a prateleira de cima na despensa. E
quando lambeu o recheio de torta de maçã de uma colher, eu esfreguei uma frigideira até que meus
dedos estivessem em carne viva para resistir à vontade de beijar sua boca rosada. Quando ela declarou
que tinha acabado o trabalho da noite, finalmente me tirando do meu sofrimento, eu a acompanhei
até a rua e fiquei perto do prédio enquanto ela entrava no carro e ia embora.
Depois fui para casa tomar banho e aliviar meu pau dolorido. Eu gozei forte na mão, pensando
em como a respiração de Poppy travava sempre que eu chegava perto.
Minha atração por ela era mais forte do que jamais havia sentido por uma mulher, e é por isso que
recuei nas duas semanas seguintes.
Por mais que eu quisesse passar todas as noites em seu restaurante, isso só iria assustá-la.
Poppy estava atraída por mim. Ela sentiu a química entre nós.
E isso a apavorou.
Se minha intuição estivesse certa — e geralmente estava —, eu era o primeiro homem por quem
ela se sentia atraída desde o marido, e se eu quisesse uma chance de ter algo com ela, não poderia
assustá-la me movendo muito rápido.
Eu não sabia onde iríamos parar. Talvez ela fosse maníaca por limpeza e me deixasse louco. Talvez
quisesse se aconchegar à noite, quando eu só quisesse um pouco de espaço. Talvez ela mastigasse
chiclete fazendo muito barulho, algo que eu não suportava. Eu não sabia.
Mas eu queria uma chance de descobrir.
— Ei, Cole.
Eu olhei para cima na minha mesa — onde eu estava sonhando acordado com Poppy e ignorando
minha papelada — e assenti para o detetive Matt Hernandez.
— Ei, Matt. O que está pegando hoje?
Ele se sentou atrás de sua mesa, ao lado da minha.
— Não muita coisa. — Ele colocou um arquivo grosso no topo de uma pilha já enorme. — Eu
tenho que encarar isso tudo hoje. Você?
— O mesmo. — Dei um tapinha na minha própria pilha de arquivos. — Eu procrastinei.
Ele deu uma risadinha.
— Sim, eu também. Passei a manhã inteira descobrindo algumas pistas sobre um caso atribuído a
Simmons, de roubo. — Olhei por cima do ombro e franzi a testa para Derek Simmons, que estava
sentado cinco mesas distante. Quando virei de volta para Matt, ele estava com uma carranca na
direção de Simmons também.
— Esse caso de roubo pode realmente ser resolvido se você estiver investigando.
Ele bufou.
— Pelo menos estou tentando.
Eu me virei e olhei para Simmons novamente. Ele estava enfiando um donut — a porra de um
donut de xarope de bordo — inteiro em sua boca. Os braços de sua cadeira estavam cravados em
suas laterais, e a bunda estava escapando pelo pequeno espaço entre o assento e o encosto.
Simmons não tinha pilhas de papelada na mesa, apenas migalhas de donut, porque ele era o único
detetive que priorizava a papelada ao trabalho de campo. Não era de se admirar que sua taxa de casos
encerrados fosse a mais baixa do departamento. Ele nunca saiu daquela mesa para realmente fazer
algumas porras de umas perguntas.
Mas ele não sofria consequências quanto a isso, não importava o quanto nós reclamássemos.
Simmons estava na força havia quase trinta anos. Ele morreria sentado naquela cadeira enquanto o
resto de nós arrebentava a bunda resolvendo nossos próprios casos e compensando aqueles
atribuídos a ele.
— Preguiçoso — eu murmurei, me virando.
— Uh-huh — Matt concordou, então apontou o queixo para os meus arquivos. — O que você
tem aí?
— Eu tenho um roubo e seis apreensões de drogas que pegamos na semana passada na força-
tarefa.
— Legal. Parece que vocês começaram bem.
— Porra, sim, começamos bem. — Eu sorri. — Eu tenho seis flagrantes, Higgins tem quatro,
Smith, cinco, e Colton, dois. Estou te dizendo, ter um ex-revendedor do nosso lado tem sido ótimo.
Agora que sabemos que tipo de coisas procurar, ficou muito mais fácil descobrir onde os negócios
estão sendo feitos.
— Foi uma jogada inteligente da sua parte; conseguir que aquele cara colaborasse conosco.
Eu concordei.
— Sem ele, estaríamos na estaca zero.
Tive sorte quando planejamos a força-tarefa antidrogas no ano passado. Nosso foco era
exclusivamente o comércio de metanfetamina em Bozeman, e eu conhecia um ex-viciado/traficante
que precisava de algum incentivo para ficar limpo. Eu fui pessoalmente atrás dele e paguei do meu
bolso sua reabilitação. Ele ficou limpo, e voltou como um novo homem.
Ele também voltou como meu professor.
Eu passei meses com ele, aprendendo tudo sobre o comércio de metanfetamina e conseguindo
nomes dos principais produtores e negociantes. Ele me ensinou a procurar as pistas. O que ficar de
olho nas redes sociais. Linguagem de rua para se atentar. Lugares comuns para trocas rápidas.
Por causa da sua ajuda, minha força-tarefa estava finalmente começando a reduzir o comércio de
metanfetamina que ficou enlouquecido em Bozeman na última década.
Meu pai estava implorando aos poderosos da política para obter um financiamento para iniciar
essa força-tarefa. Não conseguiu até que um garoto do ensino fundamental — uma droga de um
aluno da oitava série — quase teve uma overdose no ano passado, a cidade entrou em choque e papai
finalmente conseguiu algum dinheiro para nos dar o pontapé inicial.
Nosso objetivo era tirar as drogas das escolas do ensino fundamental e, depois, atacar com força o
ensino médio no ano seguinte.
— Quando abrir uma vaga na sua equipe, me avise — disse Matt. — Também estou interessado
em aderir.
— Sem problemas.
Fiz uma nota mental para pedir outro membro da equipe na reunião geral do comitê da força-
tarefa do mês seguinte. Com todo o sucesso que havíamos obtido desde o início, o conselho poderia
realmente considerar aumentar minha equipe, e Matt Hernandez estaria no topo da lista.
— Tudo bem. — Ele resmungou. — É hora de trabalhar.
Eu sorri e girei a cadeira de volta para a minha própria papelada na qual estive trabalhando o dia
todo — exceto pelo tempo em que passei pensando em Poppy.
Uma hora depois, e só consegui ler um arquivo, porque ela estava perseguindo meus pensamentos
novamente. Poppy estava no restaurante hoje? Ela se importaria se eu fosse lá almoçar? Eu estava
com fome, e era quase meio-dia. Duas semanas eram tempo suficiente para dar a ela algum espaço,
não eram?
— Olá, detetive Simmons.
Jesus. Eu estava até ouvindo sua voz.
— Olá, senhora Maysen. Como você está hoje?
Que porra é essa? Minha cabeça levantou da mesa e passou por cima do ombro em direção a
Simmons.
E ela estava lá.
Minha linda Poppy, puxando a cadeira cinza em frente à mesa de Simmons.
Eu saí da cadeira tão depressa, que ela rolou bem rápido para trás e chegou a bater na parede. Eu
atravessei o caminho pelas mesas entre nós até que estava de pé atrás da cadeira de Poppy, com as
mãos em meus quadris.
— Poppy.
Ela se virou, os olhos arregalados enquanto sua respiração perdia o compasso.
Droga, eu gostei disso.
Simmons parou de olhar para o peito dela e ergueu os olhos.
— Oi, Cole. Posso te ajudar?
Eu ignorei Simmons e foquei em Poppy.
Seu cabelo ruivo estava solto, algo que eu nunca tinha visto. Fluía pelas costas em ondas soltas,
realçadas por alguns fios dourados que emolduravam seu rosto oval.
— O que você está fazendo aqui? — perguntei. — Está tudo bem?
Ela acenou com a cabeça.
— Vim só verificar o caso de Jamie.
Minhas sobrancelhas se juntaram.
— O caso de Jamie?
— De seu, hum… assassinato. — Seus ombros caíram, e ela se voltou para Simmons.
Simmons era o responsável pelo caso do assassinato do marido de Poppy? Eu sabia que eles nunca
haviam encontrado a pessoa responsável pela morte de Jamie, mas depois de todo esse tempo, eles
deveriam ter marcado como “arquivado” e avisado à família. Ainda estava aberto?
Eu não precisei perguntar, a visita de Poppy era a resposta às minhas
perguntas.
Uma onda de raiva aqueceu meu peito. Simmons estava induzindo Poppy a acreditar que ele
poderia encontrar o assassino?
Eu olhei para meu colega de trabalho enquanto seus olhos voltaram para os seios perfeitos de
Poppy. Ela estava usando uma blusa preta simples com alças largas. Não era decotada ou indecente,
mas do jeito que Simmons estava babando, você poderia achar que ela estava de biquíni.
E aqueles seios não eram dele para que pudesse cobiçar.
— Você e eu vamos conversar. — Apontei para Simmons, então me abaixei e peguei Poppy pelo
cotovelo, puxando-a da cadeira.
— Cole! — ela protestou, mas se levantou.
— Vamos.
— Mas eu preciso de uma atualização sobre…
— Você tem alguma atualização? — eu lati para Simmons.
Ele balançou a cabeça, e sua pele manchada ficou vermelha.
— Ah, não.
— Ok. Atualização entregue. Vamos lá.
— Para onde? — ela perguntou enquanto eu a arrastava para a minha
mesa.
— Almoçar.
Eu a soltei e abri minha gaveta para pegar chaves e carteira.
— Vai sair? — Matt perguntou.
— Sim. — Fechei a gaveta e fiz as apresentações. — Poppy, este é o detetive Matt Hernandez.
Matt, esta é Poppy Maysen. Ela é dona daquele novo restaurante na Seventh Street.
Matt se levantou e estendeu a mão.
— Prazer em conhecê-la, Poppy.
Ela suavizou o olhar chocado em seu rosto e passou por mim a fim de apertar a mão de Matt.
— Minha esposa estava me dizendo que queria jantar lá esta semana — Matt continuou.
Poppy sorriu.
— Seria ótimo. Obrigada. Estou ansiosa para vê-los lá.
— Volto depois do almoço. — Peguei meus óculos de sol na mesa e os coloquei na cabeça. Então
deslizei a mão em torno do cotovelo de Poppy novamente, impulsionando-a para frente.
Seus pés acompanharam os meus.
— Cole, o que você está fazendo?
— Levando você para almoçar. Eu estou com fome. — Eu a conduzi para fora do escritório dos
detetives, em direção às escadas que levavam para fora. Quando entramos no saguão de mármore,
soltei seu cotovelo.
Ela olhou por cima do ombro antes de começarmos a descer as escadas.
— Mas eu precisava conferir algo com o detetive Simmons.
— Não se preocupe. Ele estará na mesma mesa quando voltarmos.
Era bem provável que o bastardo estivesse preso em sua cadeira. Normalmente ele pedia o almoço
e pedia a uma das recepcionistas no saguão que trouxesse para ele. O homem subia dois lances de
escada de elevador e não conseguiria passar por nosso exame físico nem para salvar sua vida.
Porra de tempo de serviço.
Cinco minutos antes, Simmons era um aborrecimento. Agora ele era a porra de um grande
problema. Eu não tinha certeza do motivo de estar enrolando Poppy, mas eu iria descobrir.
— Onde quer comer? — perguntei quando viramos a esquina, descendo um lance de escadas. —
Seu restaurante?
— Não. Eu não posso ir lá hoje.
Meus pés desaceleraram.
— Como?
— Não posso ir ao restaurante hoje. — Suas mãos tremularam no ar. — Molly é uma ditadora do
mal e está me fazendo tirar um dia de folga por mês. Como junho está quase acabando, ela declarou
que hoje é o dia.
Eu ri. Mais tarde, eu teria de agradecer a Molly por impedir Poppy de se esgotar.
— Além disso — Poppy disse enquanto pulava as escadas —, se eu entrasse lá, ficaria tentada a
verificar as vendas, e não tenho permissão para usar nada tecnológico hoje.
Meus pés desaceleraram novamente.
— Sem tecnologia? Molly também não deixa você assistir TV ou fazer ligações no seu dia de folga?
O poder a enlouqueceu.
Poppy riu.
— Não, tecnologia não sobre a Molly. É um item da lista de Jamie. Sem tecnologia por um dia.
— Ah. Isso faz mais sentido.
Chegamos ao primeiro andar, e acenei com a cabeça na direção de um corredor que levava aos
fundos da delegacia.
— Por aqui.
— Mas meu carro… — Ela apontou para o estacionamento de visitantes.
— Eu dirijo e trago você de volta.
Seu cabelo balançou nas costas enquanto ela olhava entre mim e a saída principal.
— Estamos em uma delegacia de polícia, Poppy. Tenho certeza de que seu carro ficará bem.
Eu provoquei, mas sabia que ela não estava preocupada com o carro. Poppy estava debatendo se
queria ou não ficar em um espaço pequeno comigo.
— Não é esse… — Ela ergueu as mãos e fez um pequeno círculo com o pulso. — Deixa para lá.
Vamos.
Eu sorri enquanto ela passava por mim em direção à porta. Droga, Poppy era uma coisinha
teimosa. Por mais que me esforce, eu não conseguia me lembrar por que esperei duas semanas para
vê-la novamente.
— Que tal o Colombo’s? — Eu abri a porta para ela.
— Parece uma boa. Eu não vou lá há anos. — Sua voz se acalmou. — Não desde que Jamie e eu
estávamos na faculdade.
— Se for um problema…
— Não, tudo bem.
— Você tem certeza?
Ela acenou com a cabeça e sorriu.
— Eu amo o Colombo’s.
— Ok. — Tirei meus óculos de sol da cabeça e coloquei no lugar, depois a levei para a
caminhonete.
Não devia ser fácil para ela morar em Bozeman. Aposto que era atacada por memórias do marido
em todos os lugares que ia. Era admirável que não tivesse deixado que isso a expulsasse daqui.
Poppy era uma lutadora.
Eu destravei o alarme do carro e abri a porta do passageiro. Peguei seu cotovelo e a ajudei a entrar.
Aquele zumbido familiar de eletricidade disparou pelo meu braço no momento em que minha pele
tocou a dela. Querendo testar sua reação, inclinei-me um pouco.
Poppy não se afastou, e seu queixo se ergueu alguns centímetros quando seus olhos pousaram na
minha boca.
Eu queria beijá-la. Se não estivéssemos em um estacionamento, rodeados por carros de patrulha e
o som dos motores passando zunindo, eu poderia ter cedido à tentação. Mas agora não era a hora.
Embora houvesse luxúria nos azuis profundos dos olhos de Poppy, havia medo por trás também.
— Suba.
Ela tirou os olhos dos meus lábios.
— Obrigada.
Quando estava sentada, fechei a porta e passei pela frente do carro para o outro lado. Já de cinto
no assento do motorista, recuei e direcionei a caminhonete para a estrada.
— Então, um dia sem tecnologia. O que exatamente você não pode usar?
Ela estava sorrindo na direção do para-brisa. Poppy jogou o cabelo por cima do ombro, e algumas
mechas caíram em seu braço nu. Suas mãos delicadas estavam dobradas no colo.
Esse era o assento de Poppy agora. Toda vez que olhasse para o couro, eu a imaginaria como
minha passageira.
— Estou basicamente sem poder usar telas — disse ela, lembrando-me que eu fiz uma pergunta.
— Eu considero os eletrodomésticos modernos aceitáveis porque estou tentando adiantar a lavagem
de roupas. E os eletrodomésticos de cozinha também não contam. Mas, além deles, nada mais. Sem
TV. Sem telefone. Sem rádio.
— Ah, merda. — Eu apertei o botão de desligar do rádio. — Desculpa. Eu estraguei seu dia?
Você tem que começar de novo?
Sua doce risada encheu a cabine.
— Não sei do que você está falando. Não era você cantando? Alguém já lhe disse que você se
parece muito com George Strait?
Eu sorri.
— Acho que você deve ser a primeira pessoa a dizer isso.
Poppy também era espirituosa. A mulher tinha tudo: beleza, inteligência e senso de humor.
A viagem para o Colombo’s era de apenas alguns quarteirões, mas quando parei no
estacionamento, o perfume de baunilha de Poppy já tinha se espalhado no ar. Eu pulei para fora do
veículo e bati a porta em um movimento rápido, na esperança de evitar que o cheiro escapasse.
— Este lugar não mudou muito, não é? — ela perguntou enquanto caminhávamos para a porta.
— Nem um pouco. — O que mais gostava no Colombo’s é que o local era exatamente o mesmo
da minha infância.
Colombo’s era uma tradição em Bozeman. Localizado diretamente do outro lado da Universidade
de Montana, sempre estava lotado de estudantes universitários. Quase parei de vir durante o ano
letivo, mas, no verão, era minha parada para o almoço.
Abrindo a porta, eu a deixei entrar primeiro. No minuto em que pisei atrás de Poppy, o cheiro de
cebola, alho e molho de tomate encheu meu nariz.
— Oh, Deus — ela gemeu. — Eu senti falta deste lugar. Cheira tão bem.
Esse gemido e o sorriso em seu rosto não ajudaram no problema em meus jeans.
— Você deve saber que não sou boa em dividir pizza — declarou ela. — Você vai ter que arrumar
uma só para você.
Eu ri.
— Acho que sobreviverei. Eu sou mais fanático pelos calzones de pepperoni.
Não perdemos tempo: pedimos nossas refeições no balcão e pegamos as bebidas direto das
máquinas. O filho de Colombo estava cuidando da cozinha aberta hoje, e eu acenei para ele antes de
levar Poppy para uma mesa nos fundos do restaurante estreito.
— Como vão as coisas no restaurante? — perguntei enquanto nos
sentávamos.
— Bem. — Ela sorriu. — Ocupado, mas estou pegando o jeito de quanta comida devo fazer, e até
agora, não tive nenhuma reclamação ou crítica negativa.
Como se ela fosse ter alguma. Eu duvidava que alguém encontrasse algum defeito em sua comida,
e olha que eu só tinha comido um sanduíche com salada.
— Você está conseguindo dormir um pouco ou é uma escrava da cozinha?
— Aquela primeira semana foi difícil, mas temos uma nova funcionária de meio período que
começou na semana passada, então espero que Molly e eu possamos ter uma rotina melhor e não
estar lá vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana.
— Bom. Não gosto da ideia de você entrar e sair tarde da noite sozinha. Certifique-se de sempre
estacionar na vaga ao lado da porta.
— Eu sei — ela murmurou. — Vou estacionar perto da porta. Não vou tirar o lixo depois que
escurecer. Não vou esquecer de trancar a frente assim que fecharmos.
Eu tomei um gole da minha água para esconder meu sorriso. Poppy lembrava da minha palestra
duas semanas atrás e, pelo que parecia, estava seguindo minhas instruções. Largando meu copo, me
inclinei para a frente na mesa. Por mais que eu adorasse conversar, Poppy precisava de algumas
informações antes de voltar para a central.
— Então, antes que nosso almoço chegue, eu preciso saber. O que você pretende se encontrando
com Simmons?
Ela suspirou e mexeu no papel descartado do canudo.
— Vou lá uma vez por mês, desde que Jamie foi morto, para ver se ele descobriu alguma coisa
sobre o caso. Ele nunca tem informações, mas eu só não quero que ele esqueça que o assassino de
Jamie ainda está por aí.
Porra.
Ela estava esperando por algo que provavelmente nunca teria. Um caso de cinco anos sem novas
evidências e tendo Simmons como o principal detetive? O assassino do marido dela provavelmente já
havia morrido.
Simmons filho da puta.
— Estou realmente surpresa por não ter visto você antes — ela comentou antes que eu pudesse
pensar no que dizer.
Dei de ombros.
— Eu não amo o escritório e o evito quando posso. A maioria de nós normalmente só passa
tempo lá quando estamos cuidando da papelada. — Exceto Simmons. — Todos nós começamos
nossa carreira nas ruas, fazendo patrulhas. A maioria gosta de ir fazer perguntas por aí.
Porque o trabalho de campo é como os casos são resolvidos — não sentado em uma cadeira
comendo donuts.
Os olhos de Poppy permaneceram fixos no papel amassado em seus dedos.
— Você acha que eu deveria desistir? Você acha que há uma chance de encontrar quem matou
Jamie?
Quando ela olhou para cima, parte da luz havia diminuído em seus olhos. Pela primeira vez em
duas semanas, ela parecia mais com a mulher que eu tinha visto cinco anos antes do que com aquela
que tinha vindo ao meu dojo.
— Vou ser honesto — eu disse gentilmente. — Já faz muito tempo. Cinco anos sem novas
evidências não é um bom sinal. Eu não vi o arquivo do caso, mas meu palpite é que todas as pistas
são becos sem saída.
Seus ombros caíram, e ela colocou as mãos no colo. Poppy estava encolhendo bem na minha
frente — enrolando-se em si mesma. Era isso o que acontecia com ela depois de cada uma de suas
visitas a Simmons? Porque eu faria qualquer coisa para parar isso.
— Olha só, quando voltarmos para a central, eu vou dar uma olhada no arquivo. Não sei o que
vou encontrar, mas vou verificar o caso. Ok?
— Você realmente faria isso?
— Num piscar de olhos.
— Obrigada. — Poppy suspirou. — Não me entenda mal, o detetive Simmons tem sido ótimo.
Ele se encontra comigo todos os meses e é sempre legal. Mas eu não sei. Acho que o caso não é
prioridade para ele.
Ela estava certa. A prioridade dele atualmente parecia ser fazer o mínimo
possível.
— Deixe-me ver o que posso fazer — prometi assim que nossa comida
chegou.
— Obrigada — ela me disse enquanto eu dizia o mesmo para a garçonete.
Com meu calzone e sua pizza, nós nos concentramos em comer principalmente em silêncio —
assim como o jantar em sua cozinha. Poppy não precisava preencher todos os momentos com
conversas. Aly sempre falava muito, sempre querendo atualizações e novidades enquanto comíamos.
Ficava louco quando eu dava uma mordida e ela imediatamente fazia uma pergunta. Às vezes, eu só
queria comer. Como meus pais em suas refeições. Eles conversavam, eles sabiam sobre os dias um do
outro, mas também estavam contentes em apenas estar um com o outro.
O silêncio me deu tempo para desfrutar a minha comida, e também uma chance de pensar.
A primeira coisa que eu faria quando voltasse para o trabalho seria roubar o arquivo do caso de
Jamie Maysen das mãos de Simmons. Se todas as pistas estivessem frias, eu faria o que precisava ser
feito. Eu sentaria com Poppy e diria a ela a verdade. Que o assassino de seu marido estava livre e
permaneceria assim a menos que novas evidências viessem à luz.
Mas se o arquivo tivesse algo a mais, se Simmons não tivesse vasculhado todas as pistas e revirado
todas as pedras para encontrar o assassino, eu iria pedir um favor a meu pai. Eu faria algo que nunca,
nunca fiz: usaria minha posição como filho do chefe de polícia para escolher um caso. Eu tiraria o
caso de Simmons e faria o meu melhor para levar o assassino de Jamie à justiça.
Não importaria quanto estresse isso adicionaria à minha vida, eu o faria porque era a coisa certa a
fazer.
Eu faria isso por Poppy.
Trigésimo sexto aniversário:
aprender a tocar ukelele
Duas horas depois, eu estava na varanda da frente da casa de infância de Cole com um sorriso
enorme.
O jantar foi… apenas um jantar.
Cole deve ter percebido meu conflito interno porque se concentrou principalmente nos pais
durante a refeição. Ele provocou Mia sobre sua obsessão de duas décadas com o Hospital Geral. Ele
discutiu com o pai sobre a lista de jogadores do Montana State Bobcat e suas chances de chegar aos
playoffs no outono. E me tratou como se eu tivesse jantado ali uma centena de vezes antes. Como se
eu fosse uma adição natural à mesa de jantar deles e só precisasse de uma explicação ocasional para
uma piada interna.
E seus pais foram o amortecedor perfeito para a atração entre nós.
— Obrigada por se juntar a nós. — Mia me abraçou na varanda da frente.
— De nada. Obrigada pela refeição. Faz muito tempo que não como algo tão delicioso.
Cole riu.
— Agora ela está mentindo, mãe. Você deveria comer no restaurante dela.
— Ah, faz parte dos planos — Mia declarou. — Vamos amanhã à noite. Entendeu isso, Policial?
Você estará em casa em torno das seis.
— Sim, senhora Crane — Brad concordou enquanto Mia deslizava para o lado dele.
Eu sorri com suas palavras carinhosas enquanto acenava um adeus. No jantar, eu soube que Brad
e Mia se casaram jovens, mas ela nunca pegou o sobrenome dele. Ela o chamava de “Policial” por
causa de seu trabalho, e ele a chamava de “senhora Crane”.
— Vou acompanhá-la até o seu carro — disse Cole, carregando o estojo com meu ukelele escada
abaixo.
Brad e Mia desapareceram dentro de casa enquanto Cole me conduzia pela calçada da frente em
direção ao meu carro algumas casas mais a frente.
— Sua mãe é uma ótima cozinheira.
Cole murmurou:
— Você a supera.
— Aí eu não sei, mas obrigada.
Revirei os olhos ao som da minha voz ofegante. Por que eu não conseguia encher os pulmões
quando Cole e eu estávamos sozinhos? Ele se sentou à minha frente no jantar, e eu não tive
problemas para respirar. Mas agora? Eu sentia como se tivesse acabado de correr dez quilômetros.
Respirei lentamente algumas vezes, esperando que quando falasse novamente, minha voz voltasse
ao normal.
— Você já descobriu alguma coisa sobre o caso?
— Desculpa. — Ele balançou a cabeça. — Ainda não.
Suas sobrancelhas estavam franzidas, e havia algumas linhas vincadas na testa. Havia algo que ele
não estava me dizendo, mas não pressionei. Eu estava simplesmente grata por ele estar auxiliando o
detetive Simmons.
— Então, ukelele? — ele perguntou, mudando de assunto. — Imagino que isso seja outro item da
lista.
Eu sorri.
— Você imaginou certo. Porém, eu não posso acreditar que, de todos os professores em
Bozeman, eu escolhi sua mãe. — Ou que eu entrei em seu dojo para a aula de caratê.
— Coincidência. — Ele deu uma risadinha. — Parece um tema recorrente para nós.
Sempre assim. Eu estava grata por Cole não ter mencionado todas essas coincidências para os pais.
Ele não mencionou a noite toda sobre como realmente nos conhecemos, me dando a chance de
aproveitar a conversa da noite com pessoas que não conheciam Jamie. Foi bom curtir uma noite em
que ninguém olhou para mim com pena ou preocupação com meu estado emocional.
Naquela noite, eu era apenas Poppy.
— Minha mãe está meio apaixonada por você. Espere uma ordem para ficar para jantar após cada
uma de suas aulas.
Eu também estava meio apaixonada por Mia.
— Então, na próxima semana, com certeza trarei a sobremesa.
— Sobremesa. Isso me lembra que ainda não experimentei sua famosa torta de maçã.
— Estarei no restaurante amanhã, se você quiser passar por lá. — O convite escapou da boca antes
que a cabeça pudesse interceder. E uma vez dito, não havia como pegar de volta.
Cole sorriu quando chegamos ao meu carro.
— Então encontro marcado.
Um encontro.
Um encontro com Cole Goodman.
Uma onda de excitação e um calafrio de terror percorreram minha espinha.
Quadragésimo primeiro aniversário:
dizer “sim” para tudo por um dia inteiro.
Parado na porta d’O Maysen Jar, observei enquanto Poppy ria com um homem idoso sentado
perto do caixa.
Droga, ela era linda.
Passaram-se horas de quando eu tinha originalmente planejado chegar ao restaurante. Terrell tinha
me deixado na minha caminhonete após o incidente de Quincy, e eu vim direto para cá, tão ansioso
para ver Poppy, que eu mesmo tive dificuldade em respeitar os limites de velocidade.
Mas eu estava ali, e não conseguia passar pela droga da porta.
— Desculpe.
Uma senhora estava atrás de mim, querendo passar.
— Perdão. — Eu descolei meus pés do chão e entrei, segurando a porta aberta para ela.
Quando a senhora se juntou a um amigo em uma mesa, fiquei na parede perto da porta,
assistindo a Poppy trabalhar. Seu cabelo estava para cima, amarrado em um nó preso por dois lápis.
Um avental preto estava amarrado no cós da calça jeans. Sua camiseta branca com decote em V com
o logotipo do restaurante no bolso caía perfeitamente em seus seios, sugerindo apenas um pouco de
decote, e então deslizava por sua barriga lisa.
Linda.
O sorriso era tão natural e carismático. Ela encantava os clientes, rindo e conversando enquanto
trabalhava. Ela me hipnotizou.
Então eu fiquei na parte detrás, fazendo o meu melhor para me camuflar com a parede de tijolos
enquanto observava. Eu apreciei cada segundo de seu sorriso despretensioso, porque assim que ela
me visse, estaria em alerta novamente. Ela colocou um muro entre nós, assim como fez na noite
anterior quando me viu do lado de fora do estúdio de música da mamãe.
Eu aconselhei Terrell mais cedo sobre como encontrar um equilíbrio, mas, droga, eu estava
vivendo um inferno para encontrar um com Poppy. Eu a estava pressionando muito? Indo com
muita sede ao pote, digamos assim? Não a pressionando o suficiente?
Quando eu estava por perto, ela travava uma guerra furiosa dentro da cabeça. Poppy olhava para
mim, e eu via aquela faísca de desejo atrás de seus olhos. Mas então ela a sufocava, deixando o rosto
se contorcer de culpa. Eu odiava aquele olhar. Eu odiava colocá-lo em seu rosto.
Se eu fosse um homem mais forte, teria ficado longe e dado seu tempo. Mas lá estava eu,
espreitando no fundo de seu restaurante, tão atraído por ela, que mal piscava.
Como se soubesse que eu estava pensando nela, os olhos de Poppy vasculharam o restaurante. No
segundo em que me viu, seu corpo pareceu tensionar. Ela desviou o olhar, estudando o balcão por
um momento enquanto os ombros subiam e desciam com uma respiração profunda. Mas então ela
me chocou com um sorriso lento e lindo.
Eu estava condenado para caralho.
Esse sorriso — e o aceno que o acompanhou — teria me feito balançar se não fosse a parede de
tijolos nas minhas costas.
Um cliente chamou a atenção de Poppy, e eu levei um momento para controlar os batimentos
cardíacos. Três respirações profundas, e eu estava firme novamente, caminhando pelo restaurante.
— Este assento está ocupado? — perguntei ao senhor idoso no balcão.
— Não — ele grunhiu.
— Obrigado. — Eu deslizei no banquinho, chamando a atenção de Poppy enquanto ela registrava
o pedido do cliente. — Ei.
— Oi. Me dê um segundo.
— Sem pressa. — Ela voltou ao pedido do cliente, e eu me virei para o coroa. — Se importa se eu
pegar um menu?
Ele grunhiu novamente enquanto tirava um da pilha perto da caixa registradora e o empurrava
pelo balcão.
Eu examinei o cardápio, debatendo minhas opções. Talvez um dia eu não precisasse de um menu.
Talvez eu estivesse perto o suficiente para ter todas as opções memorizadas. E talvez um dia eu
recebesse uma saudação diferente de Poppy. Eu teria permissão para ficar atrás do balcão para que
pudesse colocá-la ao meu lado e beijar seu cabelo enquanto dizia “olá”.
— Vamos torcer — murmurei.
— O que foi você disse? — o idoso perguntou.
— Ah, hm, torço para que ela tenha mais daquele macarrão com queijo. — Que desculpa patética,
Cole. Realmente patética. — Você come muito aqui?
— Todos os dias. — Seu peito inchou enquanto fazia sua declaração. — Este é o meu lugar.
— Um especialista. Legal. Alguma recomendação?
— Mé. As tortas no pote são ok.
— Tudo bem? — Poppy deu um passo na frente do velho e plantou as mãos nos quadris. —
Quieto. É por isso que você comeu quatro delas hoje? Porque elas são ok?
O homem olhou para Poppy enquanto ela fazia uma careta de volta. Foi isso que esse cara fez? Ele
entrou em seu restaurante e criticou sua comida o dia todo? Eu abri minha boca para colocar esse
velhote no lugar — ninguém mexia com Poppy —, mas o canto de sua boca se contraiu.
— Ah, pare. — Ela acenou para longe e sorriu. — Randall James, esse é Cole Goodman.
Randall se virou para me cumprimentar. Ele me olhou de cima a baixo duas vezes, a cada vez seus
olhos demoravam um pouco mais na minha arma.
Eu estendi minha mão primeiro, e ele me surpreendeu demais por realmente pegá-la.
— Prazer em conhecê-lo, Randall.
— Digo o mesmo.
— Você quer jantar? — Poppy me perguntou.
— Por favor. Surpreenda-me, mas não se esqueça da minha sobremesa
desta vez.
— No fim de semana passado, fiz uma nova torta de frutas vermelhas para comemorar o quatro
de julho. Ainda não adicionei ao cardápio, mas está disponível. Quer experimentar uma dessas ou
prefere uma torta de maçã?
— O quê? — Randall quase caiu do banco antes que eu pudesse responder. — Você disse que
essa torta de frutas vermelhas tinha acabado.
— Não, eu disse que você tinha acabado por hoje. — Ela apontou para o peito dele. — Você
conhece as regras. Cinco tortas são tudo o que você ganha num período de 24 horas.
— Não sei por que continuo vindo aqui e aceitando essa porcaria. — Randall girou no
banquinho. — Estou indo embora. Não me espere mais.
A ameaça não intimidou Poppy.
— Não se esqueça do seu café. — Ela se virou e pegou uma xícara para viagem e a encheu com o
bule que estava na parede atrás dela.
Randall grunhiu enquanto colocava o boné e preparava a bengala. Então ele pegou a xícara da mão
de Poppy e começou a se arrastar em direção à porta.
— Vejo você amanhã! — Poppy gritou para suas costas.
Randall apenas balançou a cabeça e continuou andando.
— Cara animado — eu provoquei.
Poppy riu.
— E você o pegou em um bom dia. Ontem ele ameaçou me deixar uma crítica ruim no Yelp
porque eu não fiz seis expressos para ele. Mas ele estará de volta amanhã para fazer companhia a mim
e a Molly.
— Exterior rabugento, coração de ouro? — Imaginei.
— Exatamente. — Ela sorriu. — Espere um pouco, vou buscar sua comida.
— Você quer se sentar aqui ou a uma mesa?
— Você poderia sentar…
— Poppy. — Molly saiu correndo da cozinha interrompendo meu convite para jantar, mas parou
quando me viu. — Ah, ei, Cole. Como você está?
— Bem. — Eu devolvi o sorriso. — Vim jantar.
— Hora perfeita! Poppy estava indo tirar um intervalo para jantar também. Vocês poderiam fazer
companhia um para o outro.
Acho que não precisava ter pedido a Poppy para comer comigo, afinal. Obrigado, Molly.
— Eu nunca deveria ter te contado — Poppy murmurou.
Contado a Molly o quê?
— Você vai comer com Cole? — O sorriso de Molly ficou maior quando olhei entre ela e Poppy.
— Sim ou não, Ursinha Poppy?
— Sim.
— E amanhã você vai tirar a manhã de folga? Sim ou não?
Os dentes de Poppy se cerraram.
— Sim.
— E você vai me deixar contratar outra pessoa em meio período para não se esgotar?
— Isso é ridículo.
— Responda a pergunta — Molly pressionou. — Sim ou não? Você vai me deixar contratar outra
pessoa?
— Sim — Poppy sibilou entre os dentes.
Que diabos? Eu definitivamente estava perdendo alguma coisa, mas antes que eu pudesse
perguntar, Poppy jogou as mãos no ar e voltou para a cozinha quando Molly caiu na gargalhada.
Quando recuperou o fôlego, Molly enxugou as lágrimas do canto dos olhos e encostou o quadril
no balcão.
— Ela tem que dizer sim a tudo hoje, e estou aproveitando porque é para o bem dela.
— Ah — concordei. — Deixe-me adivinhar. Outro item da lista de
aniversários?
Molly se endireitou.
— Ela te contou sobre a lista?
— Sim. Na última vez que estive aqui. — Merda. — Eu deveria ter mantido isso em segredo?
— Não, mas é interessante. — Molly me estudou por um longo momento, então sorriu. — Eu
gosto de você, Cole. Poppy também, mesmo que ela não admita. Só vá com calma, meu amigo. Vá
com calma.
— Você não mede as palavras, não é?
Ela encolheu os ombros.
— Leva muito tempo.
— Concordo. — Eu sorri, então deslizei do meu banquinho e caminhei até uma mesa vazia ao
longo da parede oposta.
O restaurante estava cheio naquela noite, mas não lotado. Todos que estavam sentados já tinham
feito suas refeições, então eu me sentei e observei as pessoas até que Poppy saiu da cozinha com uma
bandeja de comida e água. Ela colocou dois potes fumegantes cheios de macarrão com queijo.
Eu inalei o cheiro do queijo.
— Que cheiro bom.
— Obrigada. — Ela me entregou um pote de salada que ainda não tinha sido mexido. — Agite
isso, e eu já volto.
Fiz o que me foi dito, sacudindo o pote quando ela foi para trás do balcão em busca de pratos e
talheres. Ela voltou e pôs a mesa, dividindo a salada entre nós.
— Vou dividir a salada, mas é melhor você não pegar minha torta. Me prometeram sobremesa, e
eu me recuso a compartilhar.
Ela riu e fez uma continência simulada.
— Entendido, detetive.
Comemos em silêncio, cada um concentrado na salada e na massa. O zumbido suave de outras
conversas encheu o salão até Poppy quebrar o silêncio.
— Posso te perguntar uma coisa?
Eu balancei a cabeça enquanto engolia minha garfada de macarrão.
— Manda.
Ela esperou um segundo antes de falar baixinho.
— Por que você ficou naquela noite? Você se sentou comigo por horas, mesmo depois que meu
irmão chegou.
Pisquei, surpreso com a pergunta séria, então abaixei o garfo e me inclinei para mais perto.
— Eu fiquei porque não queria que você ficasse sozinha. Seu irmão estava ao telefone e lidando
com as coisas. Eu só… Eu não queria que você ficasse sozinha naquele sofá.
Ela olhou para o prato, cutucando sua salada.
— Obrigada.
— Você não tem que me agradecer. Eu estava apenas fazendo meu trabalho.
Era mais do que isso, mas meus verdadeiros motivos eram muito difíceis de explicar. Dar a notícia
da morte de James Maysen tinha sido extremo, algo que eu nunca tinha feito antes. Na época, eu
atribuí minha vigília à situação difícil. Mas agora — agora que estive perto dela novamente — eu
sabia que não eram apenas as circunstâncias que tinham me feito ficar.
Era Poppy.
Eu não fui capaz de sair do lado dela até saber que estava em boas mãos. Então sentei-me ao seu
lado até ela adormecer no sofá e seu irmão tomar meu lugar.
— O que te fez perguntar isso?
Ela encolheu os ombros e espetou um pedaço de alface.
— Só curiosidade.
Ela poderia muito bem ter dito “fim de papo”. Não que eu fosse pressioná-la, de qualquer
maneira. Eu não conseguia imaginar quão difícil seria para ela pensar sobre aquela noite, muito
menos falar sobre isso. E com um restaurante cheio de gente, aquela noite não era um momento para
lembranças.
Se ela quisesse falar sobre aquela noite, eu seria todo ouvidos. Se Poppy nunca mais quisesse falar
sobre isso, tudo bem também.
— Ouvir dizer que você está dizendo “sim” para tudo hoje? — Engoli um pouco de macarrão
com um gole d’água.
Ela assentiu, sorrindo novamente enquanto mastigava.
— Alguém pode tirar vantagem disso.
Sua mastigação parou e seus olhos azuis fixaram-se nos meus.
— Eu, por exemplo. Eu poderia usar isso para conseguir exatamente o que quero.
Eu não perdi de vista a maneira como seus olhos brilharam, e, caramba, era sexy. Se as coisas
estivessem mais adiantadas — se isso estivesse acontecendo um ano depois e estivéssemos em um
lugar diferente — eu poderia ter usado esse jogo para tê-la gemendo “sim” a noite toda. Mas não
havíamos chegado a esse ponto, e eu não era um idiota completo.
Mas eu adoro provocar.
— Poppy — eu sussurrei, inclinando-me para mais perto.
Sua respiração era superficial enquanto esperava.
— Você vai me trazer a torta de frutas vermelhas e a de maçã?
Ela piscou duas vezes, então uma mão voou sobre sua boca — ainda cheia de salada — cobrindo-
a enquanto ela ria.
— Sim.
Eu sorri, sentado na minha cadeira e remexendo minha comida.
— Talvez você possa me contar mais sobre essa lista também? Parece que toda vez que nos
encontramos, você está fazendo algo novo.
Sua mão caiu.
— Você realmente quer saber?
— Eu realmente quero saber.
Trigésimo quinto aniversário:
Tirar uma foto minha todos os dias durante um ano
O interesse de Cole pela lista de Jamie me surpreendeu. Ninguém além de mim tinha ficado
interessado na lista desde que Jamie morreu, mas Cole estava realmente curioso. E ansioso, talvez?
Fosse o que fosse, gostei do brilho que adicionou aos seus olhos.
— Ok, hum… — A melhor maneira de explicar tudo na lista era simplesmente entregando o
diário, exceto que ninguém além de mim e Jamie jamais havia tocado nele. Seria estranho deixar Cole
ler? Isso teria incomodado Jamie? Eu sorri para mim mesma. Não. Jamie tinha tanto orgulho de sua
lista, que a teria colocado em um outdoor.
— Volto logo. — Eu levantei um dedo para Cole, então saí da mesa e fui até o caixa. Inclinando-
me sobre o balcão, vasculhei minha bolsa, que escondi embaixo do espaço da registradora. Quando
meus dedos roçaram o couro, retirei o diário de Jamie, acariciando a capa uma vez antes de ficar de
pé novamente.
No segundo em que voltei para a nossa mesa, encontrei o olhar de Cole preso no lugar onde
minha bunda tinha estado. Seus olhos estavam mais escuros, a faísca por trás deles agora parecia uma
chama. Ele nem mesmo tentou esconder enquanto seu olhar traçava minha barriga e meus seios. Ele
demorou um pouco no meu peito, prolongando a inspeção, até que finalmente chegou ao meu
rosto. Quando seu olhar encontrou meus lábios, lutei contra a vontade de lambê-los. Quando
chegou a meus olhos, eu não queria piscar.
Sexy. Cole era o epítome da sensualidade. O homem mais sexy que eu já vi.
Não, não Cole. Jamie. O que estava acontecendo de errado comigo? Eu pisquei, forçando os olhos
para longe enquanto mentalmente me punia novamente. Jamie era o homem mais sexy que eu já vi.
Jamie. Meu marido.
Cole era apenas novo. É por isso que o achei tão atraente. Eu não passei anos com ele, estudando
seu rosto e encontrando falhas. Aposto que se eu olhasse para ele por tempo suficiente, perceberia
que suas orelhas eram meio pontiagudas e as sobrancelhas eram bagunçadas. E ele devia ter algumas
imperfeições por baixo da calça jeans e polo preta. Ninguém era tão perfeito — não na vida real.
Se eu passasse tempo com Cole, como passei com Jamie, perceberia que ele não era um Adônis.
Era apenas um homem. Um homem que não era Jamie.
Um homem que agora estava olhando para mim com sobrancelhas franzidas — que não eram
nem um pouco bagunçadas.
Descolei os tênis do chão e voltei para a mesa, estendendo o diário para Cole.
— Aqui. Esta era a lista de aniversários de Jamie.
Ele olhou para o diário por um momento, sem tirá-lo da minha mão
estendida.
— Tem certeza?
Eu dei a ele um sorriso triste, feliz por entender quanta confiança eu estava dando a ele.
— Vá em frente.
Cole enxugou as mãos em um guardanapo antes de pegar o diário e, em seguida, abriu a capa com
cuidado. Sentei-me novamente, me concentrando em minha refeição enquanto ele lentamente
folheava as páginas; e fiz o meu melhor para não olhar fixamente a cada virada das folhas. De vez em
quando, ele soltava uma pequena risada. Em outras páginas, eu o peguei franzindo a testa — duvido
que ele tenha gostado do aniversário com o alarme de incêndio.
Quando chegou ao fim, Cole me surpreendeu voltando ao início e começando de novo.
— Vou buscar a sobremesa.
Cole não ergueu os olhos do diário.
— Obrigado.
Retirando meu prato e o dele, voltei para a cozinha e os coloquei na pia. Em seguida, voltei para a
frente, para colocar as sobremesas de Cole no forno. Molly estava ocupada limpando algumas mesas,
então aproveitei para respirar e assistir o cronômetro do forno trabalhar.
Eu descobri uma maneira de assar parcialmente minhas tortas quando as estava preparando para
que, quando um cliente entrasse, eles só precisassem esperar por cinco minutos em vez de vinte. Elas
não eram tão boas quanto quando estavam completamente frescas, mas a única pessoa que sabia a
diferença era eu.
Então durante os cinco minutos em que as tortas de Cole assaram, fiz o meu melhor para acalmar
a ansiedade que havia crescido desde que lhe entreguei o diário.
Meus dedos bateram no balcão enquanto tentava entender meus nervos. Eu estava nervosa para
ouvir o que Cole tinha a dizer sobre a lista de Jamie? Ou nervosa que ele pensasse que completar a
lista era estúpido? Ou pior, que eu estava nervosa que Cole pensasse que as ideias de Jamie eram
estúpidas?
Dado o pouco tempo que passamos juntos, fiquei surpresa com o quanto a opinião de Cole
importava. Eu sabia que ele gostava de mim, mas queria que gostasse de Jamie também.
E a lista de aniversários era Jamie.
O cronômetro apitou, encerrando meu tempo livre, e no piloto automático tirei as tortas e as
embrulhei em guardanapos antes de adicionar um montão de sorvete em ambas. Em seguida,
carreguei-as em uma bandeja de volta à mesa, onde Cole havia fechado o diário e estava me
observando com uma seriedade que só fez minha ansiedade aumentar.
— Eles ainda estão quentes. — Deixei seus potes e sentei-me.
Eu deslizei as mãos por baixo dos joelhos saltitantes para que eu não os agitasse enquanto
conversávamos.
Cole pegou a torta de maçã primeiro, tirando um pequeno pedaço com a colher.
— Uau. Não me admira que Randall queira dez dessas por dia. — Ele deu outra mordida,
soprando de leve para esfriar a crosta. — Isso é incrível.
Eu sorri enquanto o orgulho crescia. Eu sabia que minhas sobremesas eram boas, mas a aprovação
de Cole foi incrível. Eu não ficava tão animada com as tortinhas bobas de maçã desde a primeira
noite em que as fiz para Jamie.
— Essa é uma lista e tanto. — Cole acenou com a cabeça em direção ao diário entre uma mordida
e outra.
— É, sim. — Meu sorriso vacilou com a forma como sua mandíbula
endureceu.
— Você está planejando fazer isso tudo sozinha?
— Hum, sim. — De que outra forma eu o faria?
— Isso vai demorar um pouco.
— Espero que não. — Eu suspirei. — Meu objetivo é concluí-la antes do Ano-Novo.
— O quê? — Sua colher caiu no pote, tilintando contra o vidro. — Faltam menos de seis meses.
— Eu sei. — Só de pensar em tudo que eu ainda precisava fazer, meus ombros caíram. — Achei
que conseguiria, mas com o restaurante e algumas das coisas maiores da lista, vai demorar mais. Eu
realmente esperava fazer tudo antes do aniversário de Jamie.
Isso parecia impossível naquele momento. Com o restaurante e todas as outras coisas que eu estava
adicionando à minha programação diária, acumular mais tarefas iria me desgastar. Se eu não
desistisse, meu prazo autoimposto me estressaria ao máximo.
O que significava que levaria muito mais tempo para deixar a lista para trás. Eu poderia fazer isso
se adicionasse mais um ano? Talvez dois?
Eu não precisava fazer aquilo tão cedo. Mas eu queria. Eu queria fazer por Jamie e para ter um
fechamento. A cada dia, eu estava ficando mais forte. Eu estava me recuperando. Estava começando a
viver de novo — por mim.
E até que a lista estivesse pronta, eu ainda estaria vivendo por Jamie.
— Olha. — Cole apoiou os cotovelos na mesa. — Eu não quero invadir seu espaço. Esta é uma
lista incrível, e ele teve algumas ideias legais. Se você quiser fazer isso sozinha, eu entendo. Eu
entendo que isso seja incrivelmente pessoal. Mas se você quiser, ficarei feliz em ajudá-la com alguns
itens.
— O quê? — Eu não sabia o que me fazia sorrir mais. Que ele achasse a lista de Jamie legal ou que
desejasse ajudar. Independentemente disso, eu estava radiante. — Você realmente ajudaria?
Os olhos de Cole estavam brilhando novamente.
— Num piscar de olhos.
Alguns dias depois que Cole se ofereceu para me ajudar com a lista de aniversários de Jamie, eu
estava em Lindley Park com meu telefone virado para o rosto enquanto tentava tirar uma selfie.
— O que você está fazendo? — Cole perguntou.
Deixei cair o telefone, surpresa ao ver Cole parado a alguns metros de distância. Caramba. Eu
esperava ter alguns minutos sozinha para tirar minhas fotos diárias.
— Hum, nada. Só tirando uma selfie. — Ou doze.
Ele sorriu.
— As fotos geralmente ficam melhores quando você sorri.
— Eu odeio selfies. — Fiz uma careta. — Meu nariz é muito grande para elas.
— O quê? Seu nariz não é grande.
— Tenho quase duzentas fotos para provar que você está errado.
Eu nunca pensei que meu nariz fosse grande até que comecei esse ritual das selfies. Agora eu estava
buscando acessórios — um livro, caneca de café, minha própria mão — para cobri-lo em minha foto
diária.
— Dá isso aqui. — Cole arrancou o telefone da minha mão. — Agora sente-se naquele banco e
sorria.
Eu afundei no assento de metal, franzindo o nariz para dar a Cole um sorriso exagerado e cheio de
dentes.
Ele baixou os braços e franziu a testa.
— Já vi fotos de presos melhores do que isso.
Eu ri, e assim que o fiz, ele tirou uma foto.
— Viu? Foi tão difícil?
Eu saltei do banco e caminhei para o lado dele, olhando sobre seus braços para a foto.
— Nada mal, detetive. Nada mal.
— Tirar uma foto por dia durante um ano? — Ele adivinhou.
— Isso — respondi, alongando a palavra. — Houve alguns dias, no começo, em que eu quase
esqueci, mas agora é um hábito.
Minha primeira foto foi no aniversário de Jamie. Eu fiz seu bolo de chocolate favorito e tirei uma
foto com todas as velas em cima. Desde então, tenho tentado tirar minhas selfies sem lágrimas e
olhos inchados.
A foto de hoje seria minha primeira “não-selfie” a adicionar à galeria.
— Obrigada por vir hoje. — Como o restaurante fechava depois do almoço aos domingos,
mandei uma mensagem para Cole e perguntei se ele me encontraria no parque para que pudéssemos
fazer um plano a fim de resolver alguns dos itens maiores da lista.
— É um prazer. Você quer passear por aqui ou em outro lugar?
— Uma caminhada parece uma boa. — Eu balancei o braço. — Vai na frente.
Cole passou por mim e senti o cheiro do seu perfume natural misturado com traços de Irish
Spring. Meu nariz grande agiu por conta própria e seguiu aquele cheiro, sugando tanto ar pelas
minhas narinas, que elas zuniam. Para um espectador, eu provavelmente parecia ridícula, seguindo
os movimentos de Cole com o nariz, mas ele cheirava tão bem, tão diferente, que eu precisava de
apenas mais uma inspirada.
— Alergia? — Cole perguntou por cima do ombro.
Minha mão voou para o rosto, esfregando o nariz rapidamente enquanto eu mentia.
— Não, hm, só uma coceira.
Sutil, Poppy. Muito sutil.
Descobri o nariz e corri para o lado de Cole, caminhando o mais perto possível da borda da trilha,
esperando que a distância me impedisse de aspirar outra amostra inebriante do seu perfume.
— Não me lembro da última vez que caminhei por um parque — disse Cole quando consegui
acompanhar seu ritmo. — Na faculdade, talvez.
— Você foi para a MSU?
Ele assentiu.
— Sim. Eu me formei antes de ir para a academia de polícia.
— Provavelmente frequentamos a universidade mais ou menos na mesma época. Quantos anos
você tem?
— Trinta e um. E você?
— Vinte e nove. Será que alguma vez nos cruzamos em um corredor?
Ele balançou a cabeça.
— Duvido.
— Você não ficava muito pelo campus ou algo assim?
— Não. — Ele olhou para mim e sorriu. — Duvido porque eu teria me lembrado de ter visto
você por aí.
Talvez fosse o sol forte da tarde — ou talvez porque eu estava olhando para sua boca —, mas, pela
primeira vez, percebi que Cole tinha duas pequenas covinhas quando sorria. E, caramba, não é que
elas deixavam seu sorriso ainda mais sexy.
Bem quando eu pensei que tinha aquela coisa de prender a respiração sob controle, ele me aparece
com as covinhas.
— Está muito calor hoje. — Eu abanei o rosto, esperando que ele pensasse que minha falta de ar e
bochechas coradas fossem obra do tempo.
Cole apenas riu.
— Sim, claro.
Caminhamos em silêncio por alguns minutos, e a cada passo, relaxei mais e mais na companhia de
Cole. Era sempre assim. Eu precisaria de cinco a dez minutos apenas para acalmar meu coração
acelerado — para me acalmar e respirar com facilidade novamente. É por isso que amei que Cole
nunca nos apressasse em uma conversa. Ele estabeleceu o ritmo perfeito no ponto onde eu estava
preocupada. Não muito lento. Não muito rápido.
Com calma, percorremos o caminho do parque, aproveitando a tarde de verão.
Realmente estava quente, o sol de julho brilhando alto no céu azul sem nuvens, e eu estava feliz
por ter vestido um short e uma camiseta verde antes de sair do restaurante. Meus chinelos rangiam
ao longo do caminho de cascalho que serpenteava entre as árvores. Até Cole usava chinelos; as tiras
de lona bege pareciam tão pequenas em seus pés grandes.
Aquela foi a primeira vez que vi Cole sem a camisa polo ou a outra preta do departamento de
polícia de Bozeman. Ele ainda estava usando jeans desbotados que caíam perfeitamente em seus
quadris estreitos, mas sem a arma e o distintivo presos ao cinto, ele parecia diferente. Mais jovem.
Menos sério. Mais bonito. Poucos caras podem ficar bem em uma camisa coral, e Cole era um deles.
A cor destacava as manchas verde-escuras em seus olhos e destacava o bronzeado no rosto e nos
antebraços.
Eu fiz o meu melhor para não olhar, mas roubava olhares a cada poucos passos.
— O parque de diversões chega em algumas semanas. — Cole finalmente falou quando
alcançamos uma parte da trilha sombreada por altas árvores e sempre-vivas. — Quer companhia nos
brinquedos?
Jamie sempre quis ir em todos os brinquedos na feira do condado. Em cada um deles, incluindo
as atrações para crianças. Mas, embora tenha sido uma ideia do meu marido, brinquedos no parque
definitivamente não eram minha praia.
— Você se importaria? Eu fico um pouco enjoada. Posso precisar de algum incentivo para encarar
todos eles.
Cole parou de andar.
— Você vai vomitar em mim?
— Não. — Eu ri e chutei uma pinha. — Bem, não de propósito.
Ele sorriu.
— Eu vou aceitar ir com você contanto que prometa não comer nada antes.
— Prometo.
Nós dois rimos enquanto continuávamos a andar.
— Tenho pensado muito sobre a velha caminhonete de Jamie. Liguei para alguns mecânicos na
cidade para ver quanto custaria para restaurá-la, e é uma fortuna. Por um acaso você não conhece
algum mecânico decente que faria um bom negócio comigo? — Jamie comprou uma velha
caminhonete durante o ensino médio com a esperança de restaurá-lo. Já que eu não sabia nada sobre
consertar carros, teria de pagar alguém para fazer, mas com tudo que eu tinha investido no
restaurante, não poderia gastar uma grande quantia. Definitivamente não tanto quanto me foi dito
nas últimas semanas.
Cole esfregou o queixo.
— Eu provavelmente posso resolver as coisas simples. Substituir alguns painéis. Ajustar o motor.
Coisas assim. Meu pai e eu consertamos alguns carros juntos quando eu era criança, apenas como
um hobby. Terei que ver a caminhonete para saber exatamente o que precisa ser feito, mas se eu
assumisse parte do trabalho, você economizaria algum dinheiro.
— Cole, eu não posso pedir a você para fazer tudo isso. Você já está muito ocupado.
— Eu dou um jeito. — Ele cutucou meu cotovelo com o dele. — Além disso, eu gosto de
consertar os antigos clássicos. Vai ser divertido para mim também.
Ter outra pessoa restaurando aquele veículo não era o que Jamie teria feito — ele mesmo teria
consertado —, mas eu não podia dispor desse luxo. Era pagar alguém para fazer ou deixar Cole
colocar a mão na massa.
— Não poderei ajudar. Não sei absolutamente nada sobre carros.
— Tudo bem. Eu cuido disso.
E assim Cole tornou um dos meus itens mais assustadores da lista de Jamie um pouco mais
administrável. Isso foi um grande passo, pedir a Cole para consertar a caminhonete de Jamie com
pouca ou nenhuma ajuda da minha parte. E depois disso, eu não pediria mais nada. Não tiraria
proveito da generosidade de Cole. Mas eu o deixaria assumir o projeto da caminhonete.
Uma onda de confiança me atingiu novamente. Vou terminar a lista de Jamie. Vou fazer isso pelo
meu marido.
— Obrigada por ajudar. Por olhar o caso de Jamie. Eu realmente agradeço.
Ele se aproximou.
— Farei tudo o que puder para ajudá-la. — Seu tom suave e íntimo fez meu coração palpitar, mas
a dor rapidamente afugentou essa sensação.
Meu coração só deveria palpitar por Jamie. A culpa era uma besta enorme. Caiu como um peso
morto no peito. Eu dei um passo para longe de Cole, recuando o mais longe possível dele na trilha
estreita, em uma tentativa de diminuir a carga de culpa.
Cole percebeu — a linha que desenhei entre nós — e se manteve do outro lado da trilha.
Caminhamos um pouco, novamente em silêncio, observando o local enquanto os outros
aproveitavam o dia de verão. Cachorros brincavam na grama, perseguindo bolinhas e uns aos outros.
As crianças estavam escalando por todo lado o trepa-trepa enquanto as mães assistiam de perto seu
progresso. Um jovem casal estava aninhado em um grande cobertor, a mulher lendo enquanto o
homem cochilava.
— Conte-me sobre Jamie — Cole pediu, tirando minha atenção das pessoas que estava
observando.
— Você quer saber sobre Jamie?
— Sim. Como ele era? Ele era professor, certo?
Eu concordei.
— Inglês e Estudos Sociais para o oitavo ano. Eu nunca conseguiria ser professora, mas ele
adorava. Crianças daquela idade eram suas favoritas. Mais velhos do que alunos do jardim de
infância, mas não exatamente adolescentes idiotas.
Cole deu uma risadinha.
— Eu me saio melhor com os adolescentes idiotas.
Eu sorri.
— E eu me saio melhor com os alunos do jardim de infância.
— O que mais?
Eu pensei sobre o assunto por um minuto, classificando todas as coisas maravilhosas que eu
poderia dizer sobre Jamie.
— Ele era brincalhão. Adorava fazer os outros darem risada. — Prova-
velmente por isso que ele era tão bom com os pré-adolescentes. Ele não se importava se fizesse papel
de idiota. O Jamie que você via era o Jamie real.
Mais ou menos como Cole. Ele não tentou mascarar seus sentimentos, não fingia ser outra coisa
senão quem ele era.
— Ele adorava me provocar. — Era uma das maneiras pelas quais Jamie mostrava às pessoas que
as amava. Eu sentia falta dessa provocação.
Exceto por Cole, ninguém brincou comigo ou zombou de mim desde que Jamie faleceu. Todos
ao meu redor estavam pisando em ovos. Molly brincava às vezes, mas mesmo assim ela sempre foi
cautelosa. Finn também.
Mas Cole, ele me tratou como uma pessoa normal. Não uma Poppy quebrada. Ou a Poppy triste.
Apenas Poppy.
E eu poderia provocá-lo de volta.
— Então, o que você espera do futuro, detetive Goodman? Chefe de polícia? Prefeito? A Casa
Branca?
Cole deu uma risadinha.
— Não, estou feliz apenas por ser policial. Embora meu pai tenha planos maiores.
— Ah, é? O que ele quer?
— Ele quer que eu siga seus passos, que seja o próximo chefe quando ele se aposentar. — Ele
soltou um suspiro alto. — Mas eu odeio política. Eu odeio comitês e todas as reuniões. Gosto de
estar nas ruas e trabalhar em casos.
— Eu imagino. Aposto que você sufocaria se ficasse preso dentro da delegacia o dia todo, usando
terno e gravata.
Ele olhou para mim e sorriu, suas covinhas aparecendo novamente.
— Poppy Maysen, acho que você me desvendou.
Meu coração bateu um pouco mais forte.
— Não exatamente.
— É só esperar.
Eu tentaria. Minuto a minuto.
Trigésimo oitavo aniversário:
Ir a todos os brinquedos do parque de diversão
— Alguma pergunta?
Matt fechou o arquivo que acabei de colocar em sua mesa sobre a força-tarefa.
— Não. Tudo é muito simples. Vou começar a trabalhar nisso agora.
— Obrigado. Eu realmente fico feliz por você ter se interessado em integrar a força-tarefa.
Ele sorriu.
— Estou muito feliz por fazer parte da equipe.
Eu bati em seu ombro antes de voltar para minha escrivaninha. Eu recrutei Matt para se juntar à
minha equipe antidrogas depois que tirei de Simmons o caso do assassinato de James Maysen.
Assim como eu suspeitava, o trabalho que Simmons havia feito para investigar o assassinato na loja
de bebidas era uma merda. Os depoimentos das testemunhas eram escassos, as fotos da cena do
crime não eram detalhadas, e o vídeo das câmeras de segurança da área havia sido analisado por um
novato que não estava mais na polícia. Surpreendentemente — só que não —, eles não haviam
encontrado nenhuma pista para rastrear o assassino de Jamie.
Cinco anos depois, não havia nada que eu pudesse fazer sobre os depoimentos e as fotografias,
então meu plano era usar o vídeo na esperança de encontrar alguma pista. Talvez, se eu tivesse sorte,
encontraria algo que Simmons deixou passar.
O telefone da minha mesa tocou, ecoando na sala silenciosa. Não fiquei surpreso quando o
identificador de chamadas piscou com o nome do chefe de polícia — ninguém nunca ligava para o
telefone da minha mesa, exceto papai.
— Goodman — respondi, apenas no caso de ser sua assistente.
— Tem alguns minutos para conversar? — papai perguntou.
Eu verifiquei meu relógio.
— Sim, mas eu tenho que sair daqui a quinze minutos.
Eu estava saindo mais cedo para que eu pudesse encontrar Poppy no restaurante às 14h, depois
iríamos para o parque. Isso nos daria algumas horas para ir aos brinquedos antes que a multidão de
sexta-feira à noite aumentasse, e as filas ficassem longas.
— Sem problemas. Suba.
Desligando o telefone, tirei as chaves da caminhonete e a carteira da gaveta da minha mesa.
— Convocado pelo homem lá em cima? — Matt brincou.
— História da minha vida. — Eu sorri. — Vejo você na segunda. Tenha um bom fim de semana.
— Você também.
Acenei um tchau para Matt e alguns outros caras nas baias antes de subir as escadas de dois em
dois para o quarto andar. Quando cheguei, evitei algumas pessoas que passavam pelo local. Mesmo
em uma tarde de sexta-feira, o escritório do papai estava em plena atividade. Eu não tinha ideia de
como ele conseguia fazer qualquer coisa com as pessoas sempre correndo para lá e para cá em
reuniões e mais reuniões.
Reuniões. A ideia de passar cinco dias por semana em reuniões consecutivas me arrepiava. Eu
sufocaria de terno e gravata, exatamente como Poppy tinha dito.
Fazia quase duas semanas desde nosso passeio no parque, e eu estava ansioso por este dia desde
então. Nós dois estávamos ocupados com o trabalho, e eu só a vi uma vez nas últimas semanas,
quando parei no restaurante para almoçar com Matt e outros caras da polícia. Eu acenei e a apresentei
aos caras, mas ela estava ocupada, então não fiquei muito tempo.
Mas naquela sexta, éramos apenas nós dois, e não havia como me atrasar.
Eu verifiquei o relógio novamente enquanto caminhava pelo corredor para o escritório no canto.
Papai sempre pedia apenas alguns minutos, mas eu acabava ficando lá por uma hora. Isso não
aconteceria no meu dia com Poppy. Papai tinha treze minutos e nem mais um segundo.
Quando cheguei à esquina de seu escritório, acenei para sua assistente, mas não parei para dizer olá
— de qualquer forma, ela estava ocupada falando com alguém pelo fone de ouvido. Em todos os
anos em que ela trabalhou para papai, eu provavelmente só disse vinte palavras para a mulher, então
simplesmente entrei pela porta aberta do escritório do meu pai.
— Oi.
Ele se levantou de onde estava abaixado perto do frigobar, segurando uma garrafa de água.
— Oi. Quer uma?
— Nah. Não precisa. E aí?
Ele se sentou em sua cadeira.
— Sente-se.
Merda. Isso levaria mais de treze — agora doze — minutos.
— Eu não posso ficar muito tempo. Sério, pai. Eu tenho que sair em quinze minutos, no
máximo.
Ele acenou com a cabeça enquanto engolia um gole d’água.
— Isso não vai demorar muito. Eu só quero uma atualização sobre o assassinato Maysen-
Hastings.
Eu fiz uma careta. Esta era uma das condições de papai para mexer seus pauzinhos com meu chefe
e transferir o caso de Simmons para mim no mês passado. Papai queria estar “totalmente
informado”. Eu estava aprendendo que mantê-lo totalmente informado lembrava muito com ser
microgerenciado. Mas como eu não deixaria seu escritório até que ele tivesse uma atualização, sentei
na beirada da cadeira de madeira e apoiei os cotovelos nos joelhos.
— Nenhuma mudança em minha teoria desde minha última atualização. Eu ainda acho que o
assassino se escondeu em algum lugar no complexo de lojas e, em seguida, escapou horas depois.
A loja de bebidas onde Jamie Maysen e a caixa, Kennedy Hastings, foram mortos fazia parte de
um complexo de lojas. Ou o assassino entrou em uma das lojas menores perto da loja de bebidas ou
conseguiu chegar ao supermercado por meio de uma doca de carregamento. Independentemente
disso, nenhuma das testemunhas ou câmeras o avistou depois que os tiros foram disparados, o que
significa que ele provavelmente estava se escondendo em uma área de funcionários não monitorada
por vídeo.
— Essa coisa toda me irrita — disse papai depois de mais um gole na água. — Tínhamos equipes
na cena minutos depois que os tiros foram disparados. Como o perdemos?
Dei de ombros.
— Realmente não sei, mas de alguma forma ele escapou. Eu estou supondo que se escondeu por
umas duas horas e ficou fora da vista de todos. Em seguida, ele saiu andando casualmente pelo
complexo como apenas mais um cliente. Ele provavelmente passou pela fita da cena do crime e
entrou direto em um carro.
Desgraçado escorregadio. A câmera da loja de bebidas havia captado o suspeito matando a
operadora do caixa e Jamie, mas depois nada, de acordo com o arquivo do caso de Simmons.
Ter um novato analisando os feeds de vídeo foi provavelmente o maior erro de Simmons nesse
caso. Eu estava supondo que o novato apenas revisou o período imediatamente após os assassinatos,
não horas depois.
— Então onde você está revisando as fitas? — Papai perguntou.
— Eu vi tudo o que tínhamos no depósito de evidências, mas não é muito. Ainda estou esperando
uma resposta da mercearia e de algumas outras lojas no complexo para ver se eles têm as filmagens
estendidas salvas em algum lugar. Estou de dedos cruzados que vamos conseguir alguma coisa. E eu
solicitei todas as filmagens da câmera do semáforo de toda a área também. Estão pegando nos
arquivos. Eles devem ter tudo pronto no início da próxima semana.
— Espero que ele apareça na câmera.
Eu concordei.
— Eu também, mas se não, irei para o Plano B. — O Plano B era minha
salvação.
O complexo de lojas ficava próximo a uma das ruas mais movimentadas de Bozeman. Se não
pegássemos o assassino saindo do complexo com as câmeras, o Plano B seria catalogar todos os carros
que passassem pelos semáforos da área durante um período de cinco horas após o assassinato. A
partir daí, eu começaria a combinar os carros com aqueles vistos nas filmagens das várias câmeras de
segurança das lojas. Eu esperava ser capaz de compilar uma pequena lista de carros que estiveram no
complexo e, em seguida, executar uma varredura das placas pelas câmeras do semáforo. Com as
placas, eu poderia puxar os registros dos veículos e talvez encontrar alguém que correspondesse com
a descrição do assassino.
O Plano B não era apenas uma longa tentativa, era um trabalho muito grande que me tomaria
muito tempo.
— O Plano B é um grande trabalho, Cole. — Quando eu contei sobre isso uma semana atrás, ele
se encolheu com o número de horas que eu estimei que o Plano B levaria.
— Esperemos que não chegue a esse ponto, mas se não virmos o cara na câmera, é a única outra
solução que vejo.
Papai suspirou.
— Isso é minha culpa. Eu deveria ter feito mais para acompanhar a investigação de Simmons. Eu
nunca deveria ter deixado isso ficar sem solução por tanto tempo.
— Bem, não foi só você. Todos nós ficamos ocupados e isso foi esquecido. Por todos nós. —
Todos, exceto Poppy.
— Quando você me pediu esse caso, algumas semanas atrás, eu disse que você poderia ficar com
ele, mas era no seu próprio tempo e você não estaria recebendo nenhuma ajuda.
Papai e meu chefe não queriam que o ímpeto que tínhamos com a força-tarefa antidrogas fosse
atingido porque eu estaria envolvido neste caso arquivado de um assassinato que tinha poucas
chances de ser resolvido.
Eu respeitei o pensamento deles, mas isso não tornava mais fácil encontrar tempo extra. Eu já
estava trabalhando por muitas horas na força-tarefa. Somando isso ao tempo gasto com Poppy para
ajudá-la nesta lista, eu estaria esgotado logo.
— Sim. Eu lembro. Mas vou encontrar uma maneira de encaixar tudo.
— Mudei de ideia.
Eu pisquei, surpreso.
— O que você quer dizer?
— Você ainda vai ter que espremer esse caso com o trabalho na força-tarefa, mas vou pedir outro
favor para o seu chefe e a Matt Hernandez para ajudar também. Talvez, com vocês dois, esse caso
possa ganhar mais força.
Recostei-me na cadeira, atordoado.
— Não brinca.
— Sem brincadeira. — Ele tomou outro gole d’água.
— Por quê? O que mudou seu posicionamento?
— Estou chateado por este caso não ter sido tratado corretamente e, além disso, sua mãe está
apaixonada por Poppy.
Isso faz dois de nós.
Papai afrouxou a gravata.
— Ela é o tema principal de todo assunto que ouvi desde que veio para o jantar. Jesus, nós
comemos no restaurante dela quatro vezes nos últimos dez dias.
Eu sorri.
— Típico da mamãe.
— E ela não é a única apaixonada. Não fique achando que não notei a maneira como você olhou
para ela durante o jantar também.
Droga. Quando pedi a papai para transferir o caso, não revelei exatamente meus sentimentos por
Poppy. Felizmente, se eu fosse honesto com ele agora, o caso não poderia ser tirado de mim.
— Não vou mentir e dizer que este caso não é pessoal ou dizer que não sinto algo por ela.
— E eu não vou mentir e dizer que meus sentimentos por você não são a razão de você ter este
caso em mãos, para início de conversa. O que direi é que você precisa ser inteligente. Estou dando a
você Hernandez para que ele possa assumir a liderança.
Porra, não. Esse era o meu caso.
— Pai…
— Pense nisso, Cole. — Ele ergueu a mão para me interromper. — Você quer ter um
relacionamento com essa mulher?
Eu fechei a boca.
— Então isso tem que ser feito de acordo com as regras. Não estou dizendo que você estragaria a
investigação, mas se coloque no lugar do advogado. Digamos que você realmente encontre o
assassino. Como isso vai parecer para um advogado de defesa quando o nome do namorado da viúva
estiver por todo o relatório policial? Não dê ao assassino mais chances do que ele já teve.
Suspirei e recostei-me na cadeira. Papai estava certo. Se realmente encontrássemos o assassino, eu
queria que o filho da puta fosse pego, e para que isso acontecesse, a própria investigação não poderia
ser posta em dúvida.
— Ok. Mas ainda posso participar?
— Pode — papai assentiu. — Mas fique atrás dos panos. Faça o trabalho pesado. Gaste seu
tempo vendo o vídeo, mas deixe Matt conduzir todo e qualquer interrogatório. Que ele seja o rosto
da investigação.
— Entendi.
— E não se preocupe. Mesmo que você não seja o líder, este caso pode ser importante para sua
carreira.
— Não é por esse motivo que estou fazendo isso.
— Eu sei. — Ele ergueu as mãos. — Estou apenas comentando. Pode ser o caso que garantirá a
você conseguir meu emprego quando eu me aposentar.
Eu balancei a cabeça.
— Isso não… Não temos tempo para falar sobre isso hoje.
— Você tem razão. Vamos falar sobre isso depois. — Seus olhos miraram o relógio na parede
atrás das minhas costas. — Quinze minutos. Vá embora.
Eu me levantei da cadeira.
— Obrigado, pai.
— Diga olá para Poppy por mim.
— Digo, sim.
Papai tinha sido um policial e tanto em sua época — inteligente o suficiente para saber para onde
eu estava fugindo esta tarde sem precisar ser informado.
Mas mesmo bons policiais tinham pontos cegos, e minha carreira era o dele. Não importava
quantas vezes eu dissesse a ele, simplesmente não conseguia entender por que eu nunca iria querer
seu emprego.
Algum dia, eu teria que fazê-lo enxergar. E esperava que ele não ficasse desapontado com o filho.
Quatro horas depois, eu estava colocando meu cinto de segurança quando um trabalhador do
parque nos trancou em uma gaiola. Uma gaiola que antes tinha sido branca reluzente, mas agora
estava manchada de ferrugem.
— Eu odeio o Zipper, porra — murmurei. — Você tem certeza disso?
Poppy parecia verde.
— Tenho certeza.
Mentirosa. Não havia um pingo de confiança em sua voz.
— Talvez devêssemos fazer uma pausa. Voltar e tentar de novo em uma hora, mais ou menos. —
Tínhamos deixado o Zipper para o final, porque foi o brinquedo que mais a assustou.
— Não. — Poppy apertou o cinto de segurança com as mãos trêmulas. — Esse é o último
brinquedo e então teremos completado a tarefa. Nós apenas temos que encarar mais esse e pronto.
— Ok. — Estendi a mão e agarrei a alça na lateral da gaiola. Minha mão parecia pegajosa porque
eu estava suando em bicas. Estava um calor escaldante lá fora, provavelmente por volta dos 35º C, e
não havia uma brisa para dar um alívio. Ficar preso naquele carrinho de metal não estava ajudando.
Eu precisava de água. Melhor ainda, de uma merda de uma cerveja. Eu não ia a tantos brinquedos
desde que era criança, e mesmo naquela época, mamãe e papai limitavam meus ingressos. Mas não
havia limite hoje. Eu gastei quase duzentos dólares em ingressos porque me recusei a deixar Poppy
pagar.
Esses parques itinerantes de merda estavam aumentando os preços. Cretinos. Até os brinquedos
infantis custavam cinco dólares. É uma conclusão sensata que eles poderiam pagar por um pouco de
tinta para enfeitar essas gaiolas.
— Aproveite o passeio. — Com nosso carro trancado, o controlador do brinquedo bateu na
lateral e voltou para o painel de controle.
— Oh, meu Deus — Poppy gemeu quando o carro balançou para trás, seu rosto passando de
verde para branco, combinando com os nós dos dedos na barra sobre nossos joelhos.
— Diga-me novamente: por que estamos fazendo isso? — Eu esperava que uma distração a
ajudasse no processo de entrada dos outros passageiros. E então precisaríamos apenas aguentar o
passeio de dois minutos.
— Jamie nunca teve chance de ir a muitos parques de diversão. Estava sempre engajado com o
***
pessoal do 4H , mas ele adorava coisas assim. Ele até me implorou para ir à Disney para nossa lua de
mel.
Engoli em seco, não querendo imaginar Poppy em lua de mel. Um formigamento incômodo
subiu pelo pescoço. Eu estava tentando jogar as imagens mentais de Poppy e o marido para algum
espaço distante da cabeça, colocando-as em caixas que eu não tinha planos de abrir tão cedo, mas a
droga da caixa continuava aberta.
Não ajudava quando havia lembretes em todos os lugares, como as alianças de casamento sempre
brilhando em seu dedo.
A pior parte foi quando pedi a ela que me falasse dele. E não era que eu não quisesse saber. Eu
queria. Eu queria saber tudo sobre Poppy. Eu só não imaginei como me sentiria ao ouvi-la falar
sobre Jamie e ver seu rosto suavizar.
Com ciúmes. Como um idiota, eu estava com ciúmes.
O carro balançou novamente, e Poppy engasgou, trazendo meus pensamentos de volta para a
gaiola. Minha mão livre se esticou e tirou uma das dela da barra.
Ela entrelaçou os dedos com os meus e apertou.
— Continue me distraindo.
Eu sorri, espantado novamente com quão bem essa mulher me conhecia.
— Você andava nos brinquedos quando era criança?
— Não. Isso é mais a praia do Finn.
Não me lembrava muito de Finn Alcott além de seu cabelo, que era da mesma cor do de Poppy, e
de como ele ficou ao lado da irmã há cinco anos. Depois que Poppy mandou uma mensagem, ele foi
até a casa dela e assumiu o controle, dando os telefonemas difíceis para que ela não precisasse dar a
notícia do assassinato de Jamie.
— Como ele está? — perguntei.
— Ele está bem. — O carro deu um solavanco, e Poppy agarrou minha mão com tanta força, que
meus dedos estalaram. — Ele e Molly estão lutando para se ajustar ao divórcio.
Tentei ajustar minha mão e restaurar um pouco do fluxo sanguíneo, mas Poppy não soltava,
então apenas a deixei apertar.
— Eu não sabia que eles eram casados.
— Sim. Eles se divorciaram não tem muito tempo.
Abaixo de nós, o controlador do brinquedo gritou algo que não consegui entender, e o carro
começou a balançar.
— Último brinquedo. Último brinquedo. Último brinquedo… — Poppy repetiu.
— Apenas feche os olhos. Dois minutos, e tudo isso acabará.
Ela assentiu e fechou os olhos com força.
Então nós fomos no Zipper.
Enquanto Poppy mantinha os olhos fechados o tempo todo, eu mantive os meus abertos e nossas
mãos unidas. No instante em que o tempo da atração acabou e nosso carro parou de tremer, eu
memorizei a sensação de seus dedos delicados entrelaçados com os meus.
— Poppy. — Seus olhos ainda estavam fechados quando nosso carro parou para descarregar
primeiro. — Poppy, preciso da minha mão de volta para que possamos sair.
Seus olhos se abriram, e todo o corpo relaxou.
— Nós conseguimos. — Ela respirou aliviada.
— Você conseguiu.
— Não. Nós conseguimos. — Seus olhos olharam para os meus enquanto ela sorria. — Eu não
teria feito isso sem você, Cole.
Inclinei-me mais perto, sem mais pressa para sair daquela gaiola quente. Não com seus olhos e
mão me segurando.
— Estou feliz por…
— Ei — o operador do brinquedo disparou. — Vocês vão sair?
Droga.
— Desculpa. — Poppy soltou a mão e se mexeu para soltar o cinto de segurança.
Eu também soltei o cinto, saindo para a plataforma. Minha camisa estava grudada nas costas, e me
segurei no corrimão enquanto seguia Poppy descendo as escadas até o chão.
— Não importa quais novos brinquedos surjam, o Zipper sempre parece mexer comigo como
nenhum outro.
Ela riu e ergueu os olhos para a máquina.
— Eu e você terminamos aqui, Zipper. Você venceu.
Quando seu sorriso voltou para mim, meu coração saltou em um ritmo estranho — quase como
se tivesse pulado uma batida. Eu nunca senti nada parecido antes.
— Eu poderia me beneficiar de uma cerveja. O que você acha, detetive? Posso comprar uma
gelada para você?
Minha mulher perfeita.
— Definitivamente.
*** Organização sem fins lucrativos com base nos EUA que visa o desenvolvimento de jovens ao seu máximo potencial.
Quadragésimo terceiro aniversário:
Ir a um cinema no estilo drive-in.
Trinta minutos depois que saímos do Zipper, eu estava na minha segunda cerveja e me sentindo
praticamente eufórica. A combinação do álcool e a adrenalina correndo solta pelos brinquedos do
parque colocou um sorriso no meu rosto que ficaria lá a noite toda. E para ajudar, Finn tinha
acabado de me mandar uma mensagem dizendo que tinha levado as crianças até o parque, e eu estava
ansiosa para ver seus rostinhos felizes.
— Ei, você se importaria se encontrássemos com meu irmão e as crianças?
— Claro que não. — Cole sorriu, depois terminou a cerveja.
Eu sorri e fiz o mesmo, jogando meu copo de plástico no lixo ao sair do local designado para a
venda de bebidas.
Quando passamos pelo portão, a mão de Cole veio para a parte inferior das minhas costas.
— Vá na frente.
Um formigamento viajou das pontas dos dedos ao pescoço com o gesto desconhecido. Jamie
nunca tinha feito isso por mim — me guiar enquanto caminhávamos. Ele era mais o tipo de cara que
agarra minha mão e me arrasta atrás dele.
Mas gostei disso com Cole. Eu gostava que fosse diferente. Eu gostava que fosse sutil. Eu gostava
que, em um mar de pessoas, isso nos unia. E quando sua mão deixou de me tocar, senti falta da
pressão de seus dedos enquanto caminhávamos pela multidão de sexta à noite em direção às atrações.
Ao contrário de quando chegamos ao parque, a visão de luzes brilhantes e brinquedos giratórios
não me deixava nauseada. Um peso enorme tinha sido retirado agora que tínhamos terminado com
esse item em particular. Daquele momento em diante, nunca me sentiria obrigada a fazer mais do
que andar na roda-gigante.
— Obrigada novamente por vir comigo esta noite. — Se não fosse pela ajuda de Cole, duvido que
teria sobrevivido.
— Claro. — Ele me cutucou com o cotovelo. — Obrigado por não vomitar em mim.
Eu ri e logo vi Finn parado do lado de fora do portão do pequeno trem de brinquedo com tema
de dinossauros.
— Lá estão eles. — Apontei e mudei de direção.
— Ugh — ele gemeu, olhando para os carros em formato de dinossauros.
Ele mal coube neles. Teve de se sentar sozinho no vagão porque era o único carrinho grande o
suficiente para suas longas pernas. Mesmo assim, os joelhos chegaram quase até o queixo. Mas ele
resistiu durante as quatro voltas lentas, e quando atraímos uma multidão de adultos, olhando para
ele com rostos perplexos, Cole apenas sorriu e acenou, fingindo que não era grande coisa um homem
adulto ir a um brinquedo infantil.
— Você não gostou deste? — eu provoquei. — Acho que esse foi meu brinquedo favorito do dia.
Cole zombou.
— Minha parte favorita foi quando fiquei preso tentando sair da droga do carrinho.
Eu ri. Eu tive de ajudá-lo a sair do carro segurando seu braço para que ele pudesse se equilibrar
enquanto livrava os pés.
— Eu sinto muito. Eu não deveria rir. — Tentei controlar, mas não conseguia parar de imaginar
os rostos dos pais que estavam assistindo. Eles tinham agarrado seus filhos enquanto viam Cole
praguejar contra o tricerátops.
— Você viu aquela mãe? Ela parecia estar prestes a chamar a polícia por sua causa.
— Graças a Deus ela não fez isso. — Cole balançou a cabeça. — Nunca me deixariam esquecer
disso no trabalho.
Eu sorri para ele, expressando um agradecimento silencioso. Era difícil acreditar que tive um
almoço tão horrível com os pais de Jamie antes. Cole mudou todo o meu dia ao me trazer ao parque.
Ele mudou, e fazer isso por Jamie também.
Mesmo que os pais de Jamie fossem contra o que eu estava fazendo, aquele dia reforçou minha
decisão de terminar a lista de aniversários. Não importava o quanto Debbie e Kyle se opusessem, eu
ia finalizar tudo. Um ano antes, nada teria ajudado depois de um encontro tão ruim com eles. Eu
teria deixado a situação arruinar meu dia, provavelmente uma semana inteira. Mas fazer algo
divertido, algo para Jamie, fez tudo desaparecer.
— Tia Poppy! — Kali gritou, acenando freneticamente de seu assento no trem de dinossauros.
— Kali! — Eu acenei de volta quando cheguei ao lado de Finn. Meu irmão me deu um abraço
rápido antes de me curvar para Max em seu carrinho. — Como está meu Max? — Eu beijei sua
bochecha.
— Pop, Pop. — Ele apontou para Kali. — Ó!
— Tô olhando! Legal, não é?
Ele se voltou para a irmã com uma expressão confusa, provavelmente se perguntando o que ela
estava fazendo ou desejando que fosse grande o suficiente para ir junto.
Eu sorri e o beijei novamente, então me levantei exatamente quando Cole e Finn estavam
apertando as mãos.
— Eu conheço você — disse Finn.
Cole concordou com a cabeça.
— Cole Goodman.
— Isso. — Finn olhou para mim e depois de volta para Cole, soltando sua mão. — Bem, é bom
vê-lo novamente em circunstâncias melhores.
— Digo o mesmo. Esse é seu filho?
— Este é o Max. — Dei um tapinha no carrinho e depois apontei para o trenzinho. — E Aquela é
Kali.
— A Molly em miniatura? — Cole perguntou.
Eu sorri.
— Essa mesma.
— O que vocês dois estão fazendo aqui? — Pelas sobrancelhas franzidas de Finn, ele não tinha
certeza do que achava da situação minha com Cole, mas eu explicaria a ele mais tarde.
— Bem, sua irmã passou a maior parte da tarde me arrastando em todos os brinquedos do
parque. Cada. Um. Deles. — Cole mexeu o dedo ao redor, indicando cada um dos brinquedos
infantis que nos cercavam.
— Caramba. — Finn riu. — Como você coube?
Cole e eu nos entreolhamos e depois caímos na gargalhada.
— Finn… — Eu segurei minhas costelas. — Você deveria ter visto ele tentar entrar nos pequenos
zangões voadores. Cole teve de implorar ao cara que estava operando a máquina para deixá-lo tentar.
Em seguida, eles precisaram equilibrar o peso comigo e um grupo de crianças no lado oposto. Tinha
um monte de gente ao redor olhando para Cole por ele ser um chato. Foi hilário.
Cole balançou a cabeça com minha provocação.
— Eu sabia que deveria ter tirado uma foto do seu rosto verde quando estávamos no Zipper.
— Desculpe, detetive. Você perdeu sua chance, porque isso nunca vai acontecer novamente.
— Você conseguiu fazê-la ir no Zipper? — Os olhos de Finn arregalaram. — Estou
impressionado.
Cole encolheu os ombros.
— Eu não posso levar muito crédito. Ela teria enfrentado isso comigo ou sozinha.
Ele não tinha ideia do quanto confiei nele naquela noite, mas eu não iria discutir isso na frente do
meu irmão.
— Então você é um detetive agora? — Finn perguntou a Cole.
— Sim. Fui promovido há cerca de um ano. E você? O que você faz?
— Tenho uma empresa de paisagismo aqui na cidade. Na maioria das vezes fazemos serviços em
novas construções, algumas podas aqui e ali.
— Finn está sendo modesto — eu disse a Cole. — A Alcott Paisagismos é uma das maiores
empresas do ramo no Vale Gallatin. E quando ele diz “novas construções” quer dizer que projeta o
paisagismo de algumas das maiores casas da região.
Finn apenas deu de ombros.
— Paga as contas.
Eu estava orgulhosa do sucesso de Finn, mas isso teve um preço. Na minha opinião, sua dedicação
à empresa havia aberto o fosso entre ele e Molly, para começo de conversa. Ele levava os assistentes de
design a jantares em vez da esposa. Ele se certificou de que o gramado de todos os outros fosse
aparado, mas se esqueceu do próprio, forçando Molly a fazer isso sozinha. Ele ficava até tarde da
noite com o laptop em vez de dormir na cama ao lado dela.
A Alcott Paisagismos estava acima de todo o restante, exceto das crianças. Finn pode não ter
prêmios como marido, mas era um ótimo pai. Mesmo que seus pais estivessem divorciados, Max e
Kali tinham dois pais que os amavam incondicionalmente.
— Papai! Tia Poppy! — Kali gritou quando o tempo do passeio terminou. Ela saiu do
brontossauro roxo, desceu correndo pela plataforma e passou pelo portão de saída. — Vocês me
viram? Vocês me viram? — Ela se lançou em Finn, rindo quando ele a pegou e a jogou no ar.
— Você foi incrível! Foi divertido?
Ela assentiu descontroladamente.
— Posso ir de novo?
— Claro. Você quer ir no trem dos dinossauros de novo ou quer tentar outro brinquedo? — Finn
sorriu para Cole. — Cole, amigo da tia Poppy, disse que o passeio das abelhas foi muito divertido.
Kali olhou para Cole, mas o ignorou completamente, muito mais preocupada com seus
brinquedos do que com outro adulto no nosso grupo.
— Hmmm. — Ela tamborilou os dedos no queixo. Algo que era tão maravilhosamente adorável,
que eu não pude resistir a rir. — Abelhas!
— Abelhas! — Finn e eu aplaudimos enquanto Cole murmurava.
— Abelhas.
Eu ri e peguei as alças do carrinho de Max, rumando para o outro brinquedo.
Uma hora depois, Kali já tinha passado por todos os brinquedos infantis, eu me diverti com meu
sobrinho, e Cole e Finn fizeram planos para tomar uma cerveja na próxima semana. Meu irmão
estava apaixonado por Cole. De verdade. E eu mal podia esperar para falar com ele sobre isso mais
tarde.
— Posso ir naquele, papai? Pooooor favoooor? — Kali apontou para a Xícara Maluca.
Finn balançou a cabeça.
— Você precisa ser mais alta para andar naquele, amor.
— Mas tem uma criança. — Os olhos de Kali se concentraram em uma criança não muito maior
do que ela brincando com o pai.
— Ela viu, né? — Finn murmurou e se ajoelhou para olhar para sua filha. — Você não pode ir
nesse brinquedo sozinha, e eu não comprei ingressos para mim. Eu sinto muito.
— Finn, eu tenho alguns sobrando — disse Cole. — Você pode ficar com eles ou eu posso levá-
la.
— Eba! — Kali gritou. — Posso ir? Posso ir, papai? Pooooor favooooor?
Finn balançou a cabeça e deu um tapinha no ombro de Cole.
— Ela é toda sua. Boa sorte.
Cole riu quando Kali agarrou sua mão e o arrastou para o brinquedo. Ele sorriu para mim
enquanto minha sobrinha continuava o puxando.
— Pelo menos eu caibo nesse aqui.
— Divirtam-se! — Finn e eu gritamos enquanto eles andavam.
Quando Cole e Kali tomaram seus lugares na fila, Finn se aproximou
de mim.
— Eu gosto dele.
— Não. — Eu fingi estar chocada. — Mesmo? Eu não poderia imaginar pelo jeito que você estava
praticamente montando na perna dele como um cachorrinho.
— Provoque o quanto quiser. Você também gosta dele.
Cole ainda estava segurando a mão de Kali, sorrindo para ela enquanto esperavam na fila.
— Sim. Eu gosto dele também. Ele é um bom amigo.
— Um amigo? Qual é? O que está rolando entre vocês dois?
Dei de ombros.
— Eu encontrei com Cole naquela aula de caratê que fiz no mês passado. Jantamos, e ele está me
ajudando com algumas coisas da lista de Jamie.
— E…
— E ele também está investigando o caso do assassinato.
— E…
— E… É isso. Nada mais. Eu acabei de te dizer. Ele é meu amigo.
— Poppy — Finn repreendeu.
E eu zombei de seu tom.
— Finn.
— Seja honesta.
A desvantagem de ser extremamente próxima de meu irmão é que nunca poderia mentir ou
omitir nada dele.
— Honestamente? Eu não sei.
— Justo. — Finn acenou para Kali enquanto ela sorria para ele de dentro do vagão do brinquedo.
Estava sentada ao lado de Cole, as mãos segurando a barra em seu colo. E Cole estava sorrindo para
mim.
O passeio começou, e eu acenei para os dois quando eles começaram a girar.
— Ele gosta de você também. Mais do que um amigo gostaria.
Suspirei.
— Eu sei.
Eu não queria enganar Cole. Sabia que ele sentia algo por mim, assim como eu sentia por ele. Mas
como eu não tinha certeza de como lidar com isso, era mais seguro classificá-lo como um amigo.
Finn jogou seu braço em volta dos meus ombros e me puxou para seu lado.
— Tudo bem você amar Jamie para sempre.
— Eu sempre vou. — Sempre.
— Mas talvez você também possa amar outra pessoa.
Dois anos antes, eu diria que “é claro que não”. Eu teria dito que meu amor por Jamie consumia
tudo e que eu nunca encontraria espaço em meu coração para mais ninguém. Mas eu já não tinha
mais tanta certeza. Em alguns momentos, eu queria mais para a minha vida. Uma família. Crianças.
Amor.
Então, em vez de dizer “é claro que não”, sussurrei:
— Talvez.
Finn me abraçou com mais força.
— É algo a se pensar. Já que Jamie era meu melhor amigo no mundo todo, sinto que estou
qualificado para dizer isso. Ele teria gostado de Cole também.
Finn está certo. Você teria gostado dele, Jamie.
Ficamos em silêncio enquanto observávamos Kali e Cole no brinquedo. Quando eles voltaram,
Kali havia reivindicado Cole para si, implorando para que ele a levasse a um último brinquedo.
Fizeram isso até que todos os ingressos tivessem sido usados, e em seguida passeamos pelo meio do
parque, pegamos algumas bebidas e pagamos um lanchinho para as crianças.
— Provavelmente é melhor irmos andando — Finn disse depois que os minidonuts e as
limonadas naturais acabaram.
Kali ainda estava correndo ao nosso redor em círculos — literalmente correndo em volta de nossas
pernas —, mas Max estava a cerca de trinta segundos de adormecer no carrinho. E a julgar pelos
círculos sob seus olhos, a energia de Finn estava desaparecendo rápido também. Ele provavelmente
ficou acordado a maior parte da noite anterior trabalhando.
— Você quer alguma ajuda com a hora de dormir esta noite? Eu poderia ir e ajudar com os
banhos.
O rosto de Finn se iluminou.
— Você não se importaria?
— De jeito nenhum. Você pode adiantar o trabalho.
— Eu vou aceitar a oferta. Estou um pouco atrasado, realmente.
Isso não era surpreendente. Enquanto Molly tinha mais tempo disponível desde o divórcio, Finn
estava lutando para se manter no trabalho. Eu nunca diria isso em voz alta, mas esse foi um bom
alerta para ele. Finn tinha se acomodado quanto a tudo que Molly tinha feito para gerenciar a casa e o
trabalho com as crianças. Agora ele precisava fazer tudo sozinho — ser, três dias por semana, o dono
de casa e Finn Alcott, paisagista e empresário.
Mas ele ainda era meu irmão, e eu queria ajudá-lo antes que ele se cansasse.
— Vou acompanhá-los até a saída. — Cole colocou a mão nas minhas costas enquanto todos nós
partíamos para o estacionamento, caminhando pelas britas no chão.
Tive o mesmo formigamento de antes, quando Cole me tocou nesse mesmo lugar, gostando mais
dessa segunda vez do que da primeira.
Quando chegamos ao estacionamento, Finn apontou com o queixo para uma longa fila de carros.
— Estacionei por aqui.
— Vejo você no R Bar na próxima semana. — Cole apertou sua mão.
— Estou ansioso por isso. — Finn sorriu. — Foi bom ver você de novo.
— Você também. — Cole olhou para Kali e para um Max adormecido. — Tchau, crianças.
Kali correu e abraçou seus joelhos.
— Tchau, Cole!
Com um último aceno de adeus, Cole e eu nos viramos e fomos andando pelas britas do
estacionamento até nossos veículos.
— Mais uma vez, obrigada por vir comigo. Foi divertido.
— De nada.
Chegamos ao meu carro e parei no porta-malas.
— Então, o que vem depois?
— Que tal jantar?
Eu hesitei. Quando estávamos passando um tempo juntos para resolver as coisas da lista, eu tinha
uma desculpa para ver Cole. Mas jantar? A maneira como ele perguntou parecia muito mais com um
encontro. Mas antes que eu pudesse pensar em me esquivar, Cole falou primeiro.
— É apenas um jantar, Poppy.
Apenas um jantar.
Ele estava certo. Eu estava transformando esse jantar em mais do que precisava ser.
— Certo. Qualquer noite da próxima semana que você estiver livre, é só me avisar. Podemos
comer no restaurante ou ir a outro lugar.
Ele sorriu.
— Poucos restaurantes podem se comparar ao seu. Na verdade, quase perdi meu apetite por
qualquer coisa que não seja servida em um pote.
Eu sorri.
— Então vejo você na próxima semana.
— Então temos um encontro marcado.
Assim como da última vez que ele disse essas palavras, meu coração deu um pulo.
E talvez um dia a culpa que vinha com esse salto fosse embora.
Bem. As coisas não estavam bem, porra. Mas se ela pensava que poderia me excluir, Poppy
Maysen tinha algo a aprender.
Eu não sairia de sua vida de forma alguma.
Eu sabia, ao entrar nesse relacionamento com ela, que o percurso seria difícil. Que ela tinha mais a
superar do que eu poderia imaginar. Eu precisei dar tempo a ela. Enquanto esperava que percebesse
que eu era uma nova constante em sua vida, eu estaria ali, vendo as fitas de segurança novamente.
E consertando aquele caminhão velho.
Eu tinha esquecido do quanto gostava de mexer em carros clássicos. Eu me divertia muito quando
criança trabalhando nesses motores antigos com meu pai. Além dos meus breves encontros com
Poppy, aquele caminhão tinha me dado algo pelo qual ansiar ao final de cada longo dia.
Acabei levando-o para a casa dos meus pais, porque papai tinha ferramentas melhores e uma
garagem maior. Ele ficou mais do que feliz em abrir mão do espaço da garagem, emocionado por se
jogar nesse projeto comigo. Mamãe estava feliz porque eu estive lá quase todas as noites nas últimas
duas semanas.
Todas as noites, exceto quando Poppy estava lá para as aulas de ukelele.
Naquelas noites, eu dava a ela um pouco de espaço.
— Você deveria sair dessa sala. — Matt desligou a televisão.
— Acho que vou. — Ir embora parecia uma ideia muito boa. Eu precisava de um tempo longe
daquele lugar. Algum tempo para pensar no caso. — Vejo você segunda-feira.
Matt acenou com a cabeça, e nós dois nos levantamos e voltamos para nossas mesas. Não hesitei
ao pegar minhas chaves, óculos escuros e carteira na minha escrivaninha e dar o fora da central.
No minuto em que saí do estacionamento, a dor de cabeça começou a diminuir. Pensei em ir para
casa, mas quando passei por uma loja de conveniência, tive uma ideia melhor. Com uma embalagem
de seis cervejas geladas no banco do passageiro, dirigi até a casa dos meus pais para passar a noite
trabalhando na caminhonete de Jamie Maysen.
Ainda era cedo — apenas quatro da tarde — quando cheguei à casa de mamãe e papai, o que
significava que eu tinha a garagem só para mim. Papai ainda não estava em casa, e mamãe estava
dando aulas no estúdio. Então eu entrei, tirei minha arma e meu distintivo, em seguida troquei
minha polo do departamento de polícia de Bozeman por uma camiseta branca que deixei na parte
traseira do meu caminhão. Abri uma cerveja e comecei a trabalhar, deixando o barulho das
ferramentas no metal abafarem os tiros silenciosos do vídeo do assassinato que eu assisti muitas vezes
naquele dia.
Três horas depois, eu tinha destruído completamente o interior da cabine. O banco havia sido
retirado, junto com as tábuas do assoalho. O volante e os painéis das portas haviam sumido. Eu até
removi o rádio, o porta-luvas e os medidores no painel. A única coisa que permaneceu foi o
revestimento preto, que estava em bom estado, mas precisava de uma limpeza e polimento
meticulosos.
Com o interior basicamente como uma concha vazia, comecei pelos itens menores, usando uma
chave de fenda para tirar o quebra-sol do lado do motorista. Eu tinha acabado de afrouxar um
parafuso quando o visor se abriu e uma fotografia caiu no chão.
Eu coloquei a chave de fenda de lado e limpei minhas mãos na calça jeans antes de pegar a foto.
Era de Poppy e Jamie na faculdade. Jamie estava com os braços em volta do peito de Poppy, o
queixo apoiado em seu ombro. Os dois sorriam para a câmera, parados em uma fila lotada no
estádio de futebol da MSU.
Droga. Ela parecia feliz. Feliz para caralho.
Meu coração bateu forte enquanto estudava o rosto de Poppy. Ela não mudou muito depois da
faculdade. Alguns dos traços de juventude presentes na foto se foram — e a dor havia apagado um
pouco de sua inocência —, mas ela era tão bonita agora quanto fora naquela época.
Tão bonita, mas nem de longe tão feliz.
Eu queria ver esse tipo de alegria crua em seu rosto novamente.
Eu queria ser o homem que a colocou lá.
Eu. Não Jamie.
— Ei.
Meus olhos se voltaram para a porta da garagem. Tão perdido em minha inspeção da foto, que
não tinha ouvido a própria mulher entrar. Mas lá estava ela. Minha linda Poppy. O sol a iluminou
em um halo âmbar, e meu coração deu aquela estranha batida dupla antes que eu pudesse recuperar
minha voz.
— Oi.
— Desculpe se eu te assustei. — Ela caminhou em direção à parede oposta, onde todas as caixas
de ferramentas de papai estavam alinhadas.
— Tudo bem. — Contornei o capô da caminhonete para me juntar a ela, segurando a foto. —
Toma. Acabei de encontrar isso.
Ela pegou a foto e sorriu.
— Olha como éramos jovens. Parece que foi há muito tempo. — Com um dedo, tocou o rosto
de Jamie, em seguida colocou a foto de lado em uma bancada.
Eu esperei, me perguntando quando eu poderia atravessar o muro que ela construiu entre nós,
mas ela me surpreendeu plantando as duas mãos no topo da bancada e pulando para se sentar.
Isso significava que ela estava cansada de me deixar de fora? Parou de me evitar? Porque isso
mudaria minha longa e horrível semana.
— Sabe? — ela disse. — Acho que aquela foto foi a última vez em que fui a um jogo de futebol
americano dos Bobcats. Eu meio que quero ver o estádio ampliado. Você iria a um jogo comigo
nesse outono?
— Num piscar de olhos.
Isso me deu o sorriso que eu não via há muito tempo.
Droga, eu senti a falta de Poppy nas últimas duas semanas. Aquele sorriso. A risada dela. Sua mão
gesticulando loucamente. A distância que colocou entre nós estava me matando.
Poppy apontou para a caminhonete.
— Como está indo?
Eu me virei e me inclinei contra o banco, o quadril próximo ao seu joelho.
— Bem. Acho que poderei fazer todo o interior sozinho. Consegui encomendar um novo assento
e todas as peças. Marquei com um cara para substituir o para-brisa na próxima semana e perguntei a
um amigo do meu pai se ele pode ajudar com a lataria e pintura.
— Lamento não poder ajudar. Mas você está anotando o quanto eu devo a você, não está?
— Claro.
Independentemente do preço, eu ia reduzir pela metade. De jeito nenhum ela pagaria por toda
aquela caminhonete, não importava o que dissesse. Não quando ela estava tentando administrar um
novo negócio, manter os funcionários e a si mesma.
— Acho melhor você guardar os recibos.
Eu ri. Nunca deixava de me surpreender quão bem ela podia ler meus
pensamentos.
— Quais as novidades? Está tudo bem?
— Eu estou bem. — Ela acenou com a cabeça. — Na verdade, acabei de terminar uma aula com
sua mãe e vi sua caminhonete, então vim dizer oi.
Minhas sobrancelhas se juntaram.
— Achei que suas aulas fossem às terças.
— São, mas pedi para mudar esta semana. Tirei a tarde inteira de folga para um compromisso.
Ela pegou na gola da camisa. Poppy não estava usando a camiseta que normalmente vestia no
restaurante. Em vez disso, estava com uma espécie de top esportivo com um moletom de mangas
curtas solto por cima. A gola tinha sido cortada de forma que caísse sobre um dos ombros, me
provocando com um pedaço de sua pele perfeita.
Quando ela puxou o colarinho, coloquei a mão no bolso para não ficar tentado a ver quão sedosa
era sua pele. Meu pau empurrou o zíper enquanto Poppy puxava a gola cada vez mais para baixo,
esticando-a para que seu ombro ficasse totalmente exposto.
— Viu? — Ela inclinou as costas para mim, e eu me inclinei mais perto.
— Você fez uma tatuagem hoje?
Ela assentiu e olhou por cima do ombro.
— Minha primeira e única. Aquilo doeu para burro.
Eu sorri.
— Vou acreditar na sua palavra.
— Sem tatuagens?
Eu balancei a cabeça.
— Ainda não. Eu não consigo pensar em nada que gostaria de ter gravado com tinta. — Eu
apontei para sua camisa, querendo segurá-la para que pudesse dar uma olhada mais de perto. —
Posso?
— Vá em frente.
Meus dedos substituíram os dela na gola, e eu puxei suavemente para baixo. Tive o cuidado de
não tocar em sua pele, sabendo que ficaria sensível, mas também para que meu pau não tivesse
nenhuma ideia sobre onde isso poderia ir.
Em seu ombro direito, coberto com filme plástico, havia uma longa sequência de letras delicadas
— “O restante ainda não foi escrito”.
— Gostei. — Eu esperava que qualquer tatuagem que Poppy fizesse seria relacionada a Jamie, mas
aquilo parecia mais algo só para ela. — O
que significa?
— É a letra de uma música. Algo que sempre me chamou a atenção. — Ela ajeitou a camisa por
cima do ombro enquanto eu a soltava. — Os primeiros anos após a morte de Jamie foram difíceis.
Eu não saí com nenhum de nossos velhos amigos. Mantive as coisas guardadas para mim mesma.
Trabalhei como recepcionista em um consultório dentista até comprar o restaurante, e se não estava
no trabalho, ficava em casa ou com Finn e Molly.
Eu balancei a cabeça e fiquei quieto, não querendo que ela parasse.
— Mas depois de pouco mais de três anos, comecei a sair mais. Comecei a encontrar velhos
amigos. Eles sempre conversavam comigo como nos velhos tempos, mas assim que eu me afastava,
os ouvia sussurrar “viúva”. Essa foi a primeira palavra que eles usaram para me descrever pelas costas.
Aquela pobre viúva, Poppy Maysen.
Ela olhou, sem piscar, para a caminhonete enquanto falava, enquanto a raiva brilhava em seus
olhos.
— Eu odeio essa palavra. Viúva. — Suas mãos se fecharam em punhos na bancada. — Toda vez
que ouço, tenho vontade de gritar. As pessoas dizem “viúva” como se isso significasse quem eu sou
agora. Que é esperado que eu permaneça neste estado de luto para sempre. Como se fosse inaceitável
que eu considere seguir em frente com minha vida.
Ela não precisava dizer seus nomes, mas eu sabia que estava se referindo aos pais de Jamie.
— Então. — Ela relaxou as mãos. — Foi quando comecei a pensar em fazer a lista de aniversários
de Jamie. E é esse o significado da minha tatuagem.
— Que o restante da sua vida ainda não está escrito.
Ela concordou com a cabeça e travou seu olhar azul no meu.
— Tenho pensado muito em você nas últimas semanas.
— É? — Meu peito apertou enquanto eu me preparava para Poppy destruir aquele muro. O
mesmo tempo em que esperava que me dissesse que eu não faria parte de sua vida ainda não escrita.
— Sim. — Ela olhou para o colo. — Você me assusta muito, Cole — ela sussurrou.
— É por isso que você está me evitando?
— Eu sinto muito. Eu só precisava de um tempo para pensar.
Eu queria tocá-la, levantar seu queixo para que olhasse para mim, mas mantive minhas mãos
apertadas ao meu lado.
— E o que você descobriu?
— Eu gosto de você — ela disse olhando para os dedos. — Eu gosto muito de você.
A tensão escapou pelos meus ombros, e eu soltei um suspiro. Poppy gosta de mim. Aquilo era bom.
Não, era ótimo pra caralho. Se ela estivesse realmente disposta a reconhecer os sentimentos por mim,
minha batalha morro acima poderia se tornar mais plana, mais fácil.
— Eu gosto muito de você também.
— Mas eu…
— Espere. — Meu dedo voou para seus lábios. — Deixe-me dizer algo antes que você leve
embora a melhor sensação que tive nas últimas semanas.
Ela sorriu contra minha pele.
— Não estou tentando tomar o lugar de Jamie, apagar sua memória ou fazer você esquecer que o
amava. Estou apenas tentando explorar o que há entre nós. — Eu me aproximei, descansando meu
quadril contra sua coxa.
Sua respiração engatou sob meu dedo, e eu o deixei cair, descansando minha mão do outro lado
de seu colo, prendendo-a no meu espaço.
— O que eu ia dizer era — ela disse, seus olhos seguraram os meus enquanto sorriam — que
gostaria de ir devagar e apenas ver o que acontece.
Devagar. Poppy não iria recuar ou me manter à distância. Ela só queria ir devagar. E devagar era
algo que eu definitivamente poderia lidar.
— Deus, eu quero beijar você. — Eu queria despi-la e tê-la ali mesmo, na bancada da oficina, mas
como Poppy não estava pronta, eu me contentaria com um beijo. — Isso te assusta?
Ela assentiu com a cabeça.
— Você quer que eu te beije, Poppy?
Ela não se mexeu. Apenas olhou nos meus olhos enquanto nossas respirações se misturavam.
Então, ela fez todo o meu ano me dando o menor aceno de cabeça.
Diminuí os centímetros de distância que havia entre nós até que meu nariz roçou no dela. Parei
quando Poppy ficou tensa, então esperei, sem mover um músculo. Mas quando eu estava prestes a
me afastar e dar a ela algum espaço, Poppy se inclinou em meus lábios com um toque hesitante.
— Cole! Você quer pizza?
Poppy e eu nos separamos, ambas as cabeças virando em direção à mamãe enquanto ela entrava
pela porta lateral da garagem.
— Cacete — murmurei ao mesmo tempo que Poppy choramingou.
Saí do espaço de Poppy e fiz uma careta para minha mãe. Ela não seria capaz de nos ver da porta
lateral, então eu não poderia ficar muito bravo, mas, cacete — minha mãe empatando meu beijo.
Parecia os tempos do colégio, quando ela me pegou beijando minha namorada na garagem.
— Ah, Poppy! — mamãe disse, contornando a velha caminhonete. — Eu não sabia que você
ainda estava aqui. A gente vai pedir pizza. Quer comer com a gente?
Ela sorriu.
— Claro. Obrigada, Mia.
— Cole e Brad são carnívoros, mas eu prefiro uma vegetariana. Tudo bem?
— Ótimo.
— Ok! Chamo vocês quando a pizza chegar. — Mamãe piscou para mim antes de se virar e voltar
para a porta.
Passei a mão pelo cabelo e levei alguns segundos para colocar meu pau sob controle. Ele teve a
ideia de que receberia mais do que apenas minha mão esta noite e estava pressionado contra meu
zíper, pronto para sair e brincar.
Os dedos de Poppy estavam trabalhando em desenhar círculos na bancada, o lábio inferior entre
os dentes.
— Desculpe. — Eu levantei as mãos. — Você disse para ir devagar.
Ela balançou a cabeça.
— Tudo bem. Eu estou apenas…
— Ei. — Eu recuei em direção ao banco, prendendo suas mãos entre as minhas antes que elas se
debatessem. — Vamos devagar até que você esteja pronta para aumentar o ritmo. Apenas me dê um
sinal quando estiver pronta. — Eu a soltei e imitei um dos gestos de pulso que ela sempre fazia. —
Assim. Me dê esse sinal.
Poppy riu.
— Ok.
Desci do banco até o frigobar e peguei outra cerveja.
— Quer uma?
— Sim, por favor.
Abri a garrafa e entreguei. Levando a garrafa âmbar aos lábios, Poppy tomou um longo gole. A
maneira como sua garganta sexy se movia enquanto bebia não ajudava em nada o problema no meu
jeans.
Ela largou a cerveja e deixou os olhos vagarem pela bancada de ferramentas. Demorou na minha
arma e distintivo a alguns metros de distância.
— Posso, hum…? — Ela apontou para minha arma.
Larguei a cerveja e peguei a Glock, tirando do coldre.
— Certo. Está travada, e eu a descarreguei quando cheguei aqui.
Ela a segurou com cuidado na palma da mão.
— Eu não sei muito sobre armas de fogo. Eu só usei um rifle quando ia caçar quando criança. É
pesada. — Lentamente, ela envolveu o punho com as duas mãos. — Você segura assim?
Eu balancei a cabeça e reposicionei suas mãos de forma que uma ficasse ao redor do punho e a
outra sob a base para suportar seu peso.
— Assim. Essa arma seria muito grande para você, que não tem muita prática. Tem um tremendo
recuo e é feita para mãos maiores. A maioria das policiais que conheço carregam uma versão menor
dela.
Aquela provavelmente tacaria seus braços sobre a cabeça, e a jogaria um ou dois passos para trás.
Mais ou menos como o assassino na loja de bebidas quando o recuo da arma aconteceu.
Que porra é essa?
Minha mente começou a disparar. Como eu não pensei nisso? Como algum de nós não pensou
nisso? E se o assassino de Jamie fosse uma mulher?
Passei a mão pelo rosto enquanto as coisas entravam em foco sob uma nova luz. Simmons não
tinha fodido regiamente aquele caso de assassinato. Ele apenas olhou pelo ângulo mais óbvio. Ele
estava procurando por um homem.
Todos nós estávamos procurando por um homem.
— Cole?
Eu pisquei e foquei novamente em Poppy.
— Desculpe. Eu estava pensando em algo. — Peguei a arma de suas mãos e a guardei.
— Está tudo bem? — ela perguntou, com as sobrancelhas franzidas.
Eu sorri e menti.
— Sim. Ótimo. Você quer ficar comigo enquanto eu trabalho no caminhão antes do jantar ou
você quer entrar e bater um papo com minha mãe?
— Estou bem aqui.
E ela estava. Poppy estava perfeita ali.
E ela ficaria ainda melhor se eu pudesse encontrar o assassino de Jamie.
Trigésimo nono aniversário:
Entrar num táxi e gritar “Siga aquele carro!”
— Droga, estou morto. — Papai jogou sua bolsa por cima do ombro. — Você poderia ter pegado
leve comigo hoje.
— Você aguentou bem. — Eu ri e o segui para fora do vestiário.
Papai tinha ido ao dojo lutar esta noite, algo que ele não fazia há algum tempo. E mesmo que
estivesse um pouco sem prática, ele ainda conseguiu me manter alerta. Provavelmente porque não era
o único sem ritmo. Com tudo o que estava acontecendo no trabalho, consertando a caminhonete
para Poppy e tentando arrumar o máximo de tempo que eu podia para vê-la, esta foi a primeira vez
que pratiquei caratê em quase um mês.
— Vocês querem tomar uma cerveja? — sensei Robert perguntou quando o encontramos na sala
de espera. Ele estava cheio de sorrisos porque papai e eu tínhamos ido ao dojo e isso deu a ele uma
chance de chutar nossas bundas.
— Eu gostaria de uma.
Papai concordou com a cabeça.
— Eu também. Mas um de vocês paga. É o mínimo que podem fazer por chutarem minha
bunda esta noite.
— Vou só pegar minhas coisas — disse Robert e em seguida desapareceu no vestiário.
Papai e eu saímos para a área da recepção e nos sentamos.
— Estou feliz por ter vindo esta noite.
— Eu também. Esse treino estava muito atrasado.
Treinar me deu a chance de liberar alguma frustração reprimida. Não era como eu preferia
queimar meu excesso de energia — ter Poppy na minha cama era minha primeira escolha —, mas já
que isso não rolaria tão cedo, o caratê teria de servir.
Isso e a droga da minha mão.
Já fazia uma semana desde que levei Poppy ao casamento da amiga. Uma semana desde que quase
perdi a paciência e quebrei minha promessa de ir devagar. Uma semana desde que estive prestes a
beijá-la até perder os sentidos.
Mas eu segurei para que ela pudesse ditar o ritmo.
Poppy algum dia ficaria tão desesperada por mim quanto eu estava por ela? Ou Jamie tinha
aproveitado todos os seus momentos de paixão? Ela iria me querer como eu a queria? Essa porra de
ciúme estava me atormentando. Todas as noites, eu voltava para minha casa vazia e me lembrava
indefinidamente — não é uma competição. Eu só queria que Poppy fosse feliz. Mas não importava
quantas vezes eu me lembrasse desse objetivo, o ciúme não ia embora.
— Conversei com o Secretário hoje — disse papai. — Seu nome apareceu algumas vezes como
um possível substituto para quando eu me aposentar.
Suspirei.
— Pai, não. Não acho que esse seja o trabalho para mim.
— Você diz isso agora, mas quem sabe o que vai acontecer? Ainda faltam anos, só quero que você
pense nisso. Só por via das dúvidas. Não vamos fechar a porta para essa possibilidade até que você
tenha certeza.
— Eu tenho certeza.
Ele deu de ombros, ainda sem me ouvir.
— Não há mal nenhum em manter como uma opção.
Eu fechei a boca para não dizer algo que me arrependeria mais tarde. Papai estava apenas cuidando
de mim. Ele sempre foi melhor em olhar para o futuro do que eu, e por mais que eu não quisesse
seu emprego, também não queria desapontá-lo. Felizmente ele não se aposentaria tão cedo. Não
precisávamos estragar uma noite perfeitamente boa porque eu disse a ele como realmente me sentia e
acabei o decepcionando.
Então nós simplesmente não falamos sobre isso enquanto o restante dos alunos se arrastava para
fora do dojo. Com o último deles tendo ido embora, papai e eu seguimos Robert e deixamos o local.
— Para onde querem ir? — Eu joguei minha bolsa na parte traseira da caminhonete assim que
peguei um flash vermelho com o canto do olho.
Eu conheço aquele tom de vermelho.
Eu dei uma segunda olhada quando Poppy desapareceu no prédio de apartamentos do outro lado
da rua.
— Que diabos…?
O que ela estava fazendo em um complexo de apartamentos de baixa renda? Eu fiz duas
apreensões com a força-tarefa antidrogas naquele lugar, e isso estava na lista regular de vigilância da
polícia de Bozeman. Minha Poppy não tinha nada que estar naquele prédio. Não era seguro, era o
último lugar onde a queria vagando em uma noite de segunda-feira.
— Cole. Terra para Cole. — Papai bateu no meu braço.
— Desculpe. Eu vou, hm… — Acenei para ele e comecei a correr pelo estacionamento. — Eu
falo com você mais tarde!
Eu os ouvi gritar algo de volta, mas não me virei. Eu apenas peguei ritmo, esperando pegar Poppy
antes que ela desaparecesse em um apartamento.
Atravessei a rua correndo e fui direto para a porta de vidro que ela tinha usado, abrindo-a e
ouvindo sua voz.
— É isso. — A voz de um homem veio do segundo andar. — Como eu disse a você no telefone.
Seiscentos por mês mais água, luz e coisas assim.
— Obrigada — disse ela. — Posso dar uma olhada?
Ela estava procurando um apartamento para morar aqui? Ah, nem fodendo. Eu subi as escadas de
dois em dois, chegando ao patamar do segundo andar bem a tempo de vê-la passar pela porta de um
apartamento.
— Poppy.
Ela se virou ao ouvir minha voz.
— Cole? O que você está fazendo aqui?
Atravessei o patamar, segurando seu cotovelo e puxando-a em direção às escadas e para longe da
porta.
— Vamos.
— Mas…
— Ei, você não quer ver o apartamento? — o cara chamou de dentro da unidade.
— Não — respondi por ela, ainda puxando-a para as escadas. Quando chegamos ao último
degrau, soltei seu cotovelo e deslizei minha mão por seu braço para segurar a sua.
— Cole — ela sibilou, puxando a mão livre. — O que você está fazendo? Eu queria dar uma
olhada naquele lugar, e essa é a única noite que tenho de folga esta semana.
Eu fiz uma careta e peguei sua mão novamente, desta vez com um aperto mais firme.
— Vou economizar seu tempo: você não vai dar uma olhada naquele
apartamento.
Ela resmungou alguma coisa, mas me seguiu escada abaixo, pisando um pouco duro até sairmos.
Em seguida, ela puxou a mão livre novamente e fechou o punho no quadril.
— O que foi aquilo? E o que você está fazendo aqui?
Apontei para a escola de caratê do outro lado da rua, onde minha caminhonete estava sozinha no
estacionamento.
— Eu estava saindo do dojo e vi você entrar aqui. Uma vez que este prédio definitivamente não é
seguro, vim falar com você.
— Oh — ela murmurou. — Por que esse prédio não é seguro? — Ela olhou ao redor do
complexo de três edifícios. — Parece legal.
— Confie no policial, tá? Pode parecer bom do lado de fora, mas este não é um lugar para você
ficar.
Ela me encarou por um longo momento, debatendo se deveria ou não continuar discutindo, até
que ela jogou as mãos no ar.
— Tudo bem.
— Por que você está procurando um apartamento? — Eu caminhei ao lado dela quando Poppy
começou a andar em direção ao seu carro, estacionado a alguns passos na rua.
— Eu decidi que é hora de me mudar.
— Oh… Ok — eu disse lentamente. Eu a tinha visto por duas vezes para jantares naquela
semana, e Poppy não tinha dito uma palavra sobre mudança. — Por quê?
Ela encolheu os ombros.
— Eu só acho que é hora.
Havia mais por trás de seus motivos, mas eu não insistiria. Talvez fosse muito difícil morar
naquela casa, a que dividiu com Jamie. Talvez todo esse trabalho em sua lista realmente a estivesse
ajudando a superar. E se mudar era o que Poppy precisava fazer, então eu a apoiaria cem por cento.
Contanto que não resolvesse morar num pesadelo policial.
Ou num buraco de merda.
Ou algo cheio de estudantes universitários.
Na verdade, não havia muitos lugares onde eu desejasse que ela morasse. O único lugar aceitável
que me veio à mente foi minha própria casa. Lá, ela poderia usar minha cozinha para experimentar
novas receitas. Poderia empilhar sua cerveja de menina ao lado da minha Bud Light na geladeira. Ela
poderia compartilhar minha cama comigo.
Mas… Devagar. Ela precisava que eu fosse devagar.
Então, em vez de trazê-la completamente para minha vida como eu queria, eu a ajudaria a
encontrar um lugar decente para alugar — por enquanto.
— Este é o primeiro que você olhou?
— Você quer dizer tentou olhar? — Poppy me cutucou nas costelas com o cotovelo.
Eu ri, lutando contra a vontade de puxá-la para um abraço.
— Não. — Ela suspirou. — Eu olhei dois outros lugares nessa semana. Tem ideia de como é
difícil encontrar um aluguel decente em Bozeman? Todos os bons já foram tomados por
universitários e pessoas que se mudaram para a cidade. E já que você acabou de vetar minha melhor
opção, estou de volta à estaca zero.
— Desculpe.
Ela sorriu.
— Mentiroso.
— Você tem razão. Eu não sinto muito. Que tal eu compensar você e ajudá-la a procurar os
anúncios?
— Sei. — Ela estreitou os olhos quando paramos em seu carro. — Você só quer passar pela
minha lista para filtrá-la e deixar aqueles que você considera aceitáveis.
— Culpado. — Eu sorri. — Mas minha oferta ainda está de pé. Que tal eu ir ao restaurante
amanhã para jantar e te ajudar a fazer uma lista?
Poppy me deu seu sorriso mais brilhante, fazendo todas as noites sozinho valerem a pena.
— Temos um encontro marcado.
— Agora tente esse aqui. — Poppy colocou um pote na minha frente. No fundo estava o que
parecia ser chili e, no topo, uma camada de pão de milho.
Peguei minha colher do pequeno pote de salada de quinoa, que tinha acabado de comer, e
mergulhei-a no outro pote.
— E aí? — ela perguntou enquanto eu mastigava. — Bom o suficiente para o cardápio de outono?
Eu engoli e balancei a cabeça.
— Bom. Muito bom. Pode adicionar.
Ela sorriu e tirou meu pote antes que eu pudesse dar outra garfada.
— Ei! Eu ia comer isso.
— Um segundo. — Ela ergueu um dedo e desapareceu na cozinha.
— Droga, mulher — amaldiçoei enquanto ela ria atrás da porta vai e vem.
Ela vinha me fazendo experimentar novas receitas desde que cheguei, trinta minutos antes. Agora
que setembro havia chegado, ela estava em uma missão para resolver o cardápio de outono, e eu era
sua cobaia. Exceto que a única coisa que ela realmente me deixou comer foi a porra da quinoa.
Não que não fosse bom. Assim como tudo que ela fazia, estava gostoso. Mas eu era o tipo de cara
que prefere carne com batatas. Eu queria a porra do chili com pão de milho. Ou o ensopado de
carne que ela trouxe. Ou a sopa de macarrão com galinha caipira. Não quinoa com pimentão e
abobrinha.
Quando ela voltou alguns momentos depois, tinha três novos potes.
— Se você tirar isso de mim… — Eu dei a ela minha melhor carranca. — Eu vou fazer uma
rebelião.
Poppy riu, colocando um pote do que parecia ser ziti assada. O outro tinha meu empadão de
frango favorito, e o último era recheado com cheesecake e algum tipo de calda de caramelo.
— Eu não queria que você ficasse muito cheio durante a degustação, mas agora acabou. Esses você
pode comer.
— Finalmente. — Comecei com o cheesecake, acabando com ele sem demora antes de começar a
comer o restante da minha refeição. Quando terminei, ela levou os pratos e potes de volta para a
cozinha e, em seguida, deu a volta para o meu lado do balcão, trazendo um jornal e o laptop.
— Ok. — Ela me entregou o jornal primeiro. — Estrelas verdes são os aluguéis que eu gosto. Os
vermelhos são os talvez.
Levei menos de um minuto para descartar completamente todos os vermelhos, já que estavam em
bairros de estudantes universitários e todas, exceto duas, das estrelas verdes.
— Não use aquela imobiliária — eu disse a ela, apontando para uma das estrelas verdes que havia
riscado. — Ouvi dizer que eles têm o hábito de ficar com os depósitos das pessoas e são uns idiotas
quando se trata de reformas.
Ela franziu o cenho.
— Bem, então não precisamos procurar online. Não há muito mais
para ver.
— Quão desesperada você está para se mudar?
— Não é desespero. — Poppy estudou meu rosto, seus olhos viajando pelos meus, pelo meu
nariz e pela minha boca. — Só um pouco, talvez. — Ela balançou a cabeça. — Não sei. Eu gostaria
de ter pensado nisso antes, antes de tudo ser levado pelos universitários.
— Sim. O momento não está bom para aluguel.
Era o início de setembro, e a faculdade estava de volta ao normal. Os cafés da cidade estavam
todos lotados de estudantes. O trânsito era um pesadelo se você chegasse a um quilômetro e meio da
universidade. E o espaço disponível para aluguel era inexistente.
— Sinto muito. — Cobri sua mão apoiada no balcão. Ela virou a palma da mão para cima e
entrelaçou os dedos com os meus.
— Tudo bem.
— Cole? — Uma voz estalou atrás de nós.
Ah, porra. Eu conhecia aquela voz.
Aly.
Assim como eu esperava, ela estava parada a um metro e meio de distância quando Poppy e eu
nos viramos. Seus olhos estavam fixos em nossas mãos entrelaçadas.
Eu sorri, esperando que ela fosse legal e não tornasse estranha a situação.
— Aly.
Mas não.
Ela franziu a boca e deu a Poppy um olhar mortal — o mesmo que eu costumava receber sempre
que deixava minha toalha no chão do banheiro.
Aly marchou a distância que faltava e ficou bem ao meu lado.
— Quem é?
— Poppy, conheça Aly. Aly, esta é Poppy, e este é o restaurante dela.
Poppy soltou os dedos dos meus e se levantou, estendendo a mão para Aly.
— Oi, prazer em conhecê-la. Gostaria de algo para comer ou beber?
Aly olhou para a mão de Poppy, em seguida cruzou os braços sobre o peito enquanto voltava
aquele olhar para mim.
— Não demorou muito, não é?
— Aly, não faça isso.
— Não, digo eu. — Ela descruzou os braços e apontou um dedo no meu ombro. — Você
poderia pelo menos ter esperado um pouco. Estivemos juntos por dois anos, Cole. Dois anos. Como
você já pode ter seguido em frente? Nosso relacionamento não significou nada para você?
Olhei para Poppy, esperando que ela pudesse ler o “me desculpe” em meus olhos. A última coisa
que eu queria era trazer drama para sua vida, mas conhecendo Aly, ela não tornaria a coisa fácil para
mim.
— Tudo bem. — O olhar de Poppy suavizou. — Eu vou deixar vocês conversarem. — Então ela
recuou, desaparecendo na cozinha e mandando Helen ir cuidar do balcão.
Quando ela se foi, eu me levantei, apontando para a porta.
— Vamos conversar lá fora. — Por algum milagre, Aly me seguiu sem dizer uma palavra, embora
bufasse atrás de mim enquanto caminhávamos. Quando chegamos à calçada do lado de fora, sua
raiva havia se transformado em dor.
— Eu sinto muito.
Ela acenou com a cabeça quando as lágrimas começaram a cair.
— Não chore.
Meu apelo não surtiu efeito, mas, de qualquer forma, Aly sempre foi de chorar muito. Sempre
que mamãe, minha irmã ou Poppy choravam, isso quase partia meu coração. As lágrimas de Aly, por
outro lado, pararam de me incomodar um ano antes — em parte porque ela as usava para
manipular, em parte porque ela nunca tentou lutar contra elas.
Uma das razões pelas quais eu admirava Poppy pra caralho era porque ela se esforçava muito para
não chorar. E quando ela chorava? Era porque deu merda de verdade.
Mas, ainda assim, eu não queria que Aly chorasse. Eu não queria causar dor a ela.
— Eu nunca quis te machucar.
Ela assentiu, estendendo a mão para enxugar uma lágrima.
— Certo. Se você diz.
— Nós só… Nós não teríamos dado certo. Acho que, no fundo, você sabe que isso é verdade.
— Eu sei? — Ela olhou para o restaurante e fungou. — E quanto a ela? Você acha que vocês dois
vão dar certo? Ou você vai fazer com ela o que fez comigo? Fazê-la se apaixonar por você e nem
mesmo tentar se apaixonar por ela.
— Aly — eu sussurrei. — Eu tentei. — Eu tentei por dois anos dizer “eu te amo”, mas
simplesmente não sentia que era verdade.
Seu queixo estremeceu quando ela enxugou outra lágrima.
— Desculpe. Eu só não esperava ver você esta noite. E com ela. Foi um choque.
— Não se preocupe com isso.
Ela olhou para mim com olhos úmidos e suplicantes enquanto se inclinava para mais perto.
— Eu sinto mesmo a sua falta. — Sua mão se ergueu entre nós, mas antes que ela pudesse tocar
meu peito, dei um passo para trás. — Eu não posso tocar em você agora? — A raiva brilhou em seus
olhos marejados.
— Não. — A única mulher cuja mão pertencia ao meu coração estava lá dentro.
Com uma carranca assassina, Aly girou nos calcanhares e correu para o carro, depois saiu como
um foguete do estacionamento.
— Porra… — eu murmurei, esfregando o queixo.
Com o tempo, esperava que Aly encontrasse o cara certo para ela. Que ela encontrasse um cara
que daria seu coração a ela. Mas esse cara não era eu.
Pelas janelas do restaurante, vi que Poppy havia voltado para o balcão. Ela estava tentando não
espiar, mas seus olhos continuavam vagando pela frente, procurando por Aly. Eu voltei para dentro e
fui direto para o balcão.
— Desculpe.
— Tudo bem. Ex-namorada, eu suponho?
Eu concordei.
— Sim. Aly e eu namoramos por dois anos, mas terminamos no início deste verão.
— Era sério?
— Para ela — admiti. — Moramos juntos por um tempo, mas… Não parecia certo. Eu
finalmente terminei, mas não antes que ela se machucasse. — Não antes de ela me dizer que me
amava inúmeras vezes sem que eu retribuísse.
Eu bati no jornal que estávamos olhando quando Aly entrou.
— Você quer ligar para algum destes?
— Eu não estou particularmente ansiosa por nenhum deles. Acho que vou apenas esperar mais
um tempo.
— Ok. Me diga o que posso fazer para ajudar.
— Na verdade, tem uma coisa. — Ela estava lutando sem sucesso contra um sorriso. — Eu fui a
três mercearias mais cedo e comprei cada uma de suas embalagens de gelatina verde. Todas as
panelas, potes e tigelas que pude encontrar estão atualmente na minha geladeira cheios de gelatina.
Eu não estava pegando bem a ideia.
— Que bom.
Poppy estava tentando me convencer a fazer a coisa da piscina de gelatina com ela nas últimas
semanas, mas eu odeio para caralho gelatina. A textura me fazia querer vomitar. O gosto era horrível.
A ideia de rolar em uma piscina cheia disso? Nem fodendo, a menos que ela estivesse se afogando, e
eu precisasse arrastá-la para fora.
Eu prometi ajudá-la com a lista de Jamie, mas esta era uma das duas coisas em que eu tracei uma
linha. Eu não a deixaria acionar a droga do alarme de incêndio e não iria entrar em uma poça de
gelatina verde.
— Por favor? — Poppy me encarou com seu melhor olhar de cachorrinho.
Caramba. Era apenas gelatina. Eu provavelmente poderia fazer o sacrifício. Se isso a deixasse feliz,
provavelmente eu poderia fazer. Se mantivesse meus olhos fechados e entrasse e saísse muito rápido.
Eu estava prestes a desabar quando ela murmurou:
— Tudo bem. Vou fazer isso sozinha. Esta noite, eu acho. A gelatina está pronta, e eu posso
muito bem acabar com isso de uma vez.
— Você conseguiu a piscina?
— Não, ainda não. Eu ia sair mais cedo e deixar Helen fechar para que pudesse comprar uma.
— Vou pegar a piscina para você. — Levantei e tirei minhas chaves do bolso da calça jeans. —
Você termina aqui, e eu volto para pegar você e a sua… — Eu fiz uma careta. — Gelatina. Você se
importaria se fizéssemos isso na minha casa? Está mais perto.
— Seria bom. Obrigada.
Seu rosto se inundou de alívio — uma onda enorme de alívio. Muito mais do que apenas
economizar dez minutos numa viagem de carro deveria provocar.
Era por isso que ela queria se mudar? Por não me querer em sua casa?
Eu mantive as perguntas para mim mesmo enquanto acenava um adeus e saía do restaurante, indo
para um lugar que eu odiava quase tanto quanto gelatina.
Walmart.
Algumas horas depois, comprei uma piscina infantil para ela e fiz duas idas ao restaurante para
pegar um monte de gelatina verde. Então — engasgando o tempo todo — enchi sua piscina com
aquela maldita mistura fluorescente e usei uma pá para parti-la em pequenos pedaços.
Quando Poppy terminou no restaurante e apareceu em casa, o sol estava começando a se pôr. Nós
pulamos o tour pela casa, e eu a arrastei direto para o quintal.
Ela trocou de roupa no restaurante. Eu tinha certeza de que ela ia fazer aquilo com os shorts de
corrida apertados e uma simples regata branca sobre um sutiã esportivo. Mas ela passou muito longe
do prático e chegou no sexy pra caralho.
— Você arrumou tudo mesmo odiando gelatina? — Ela sorriu para mim, e eu lutei com cada
célula do meu corpo para não a beijar. — Obrigada.
Limpei a garganta e apontei para a piscina.
— É melhor você entrar lá antes que fique muito escuro.
Ela respirou fundo e colocou um pé na gelatina.
— Oh, meu Deus, que frio.
— Não tem como voltar atrás agora. — Eu estava com meu telefone pronto. — Sorria para a foto.
Ela fez uma careta por cima do ombro — um olhar que eu capturei perfeitamente com a câmera
—, em seguida colocou o outro pé na piscina. Sibilou ao cair de joelhos e, em seguida, com um giro
gracioso, sentou-se.
Suas pernas se espalharam o suficiente para que a gelatina cobrisse as coxas.
— Isso é estranho. — Ela pegou a gelatina com os dedos antes de plantar as palmas das mãos na
base da piscina e se empurrar para cima. Em seguida, limpou os pedaços verdes de suas pernas.
— Só isso?
Ela encolheu os ombros.
— Está congelando aqui. Estou dizendo que está feito, a menos que você venha comigo.
Eu balancei a cabeça e dei um passo para trás.
— Só quando nevar no inferno.
— Tem certeza? — Um sorriso lento se espalhou pelo rosto de Poppy. Ela deu um passo, depois
outro, movendo-se para a beira da piscina e mais próxima de mim.
— Poppy — eu avisei.
Ela estendeu a mão e agarrou meu pulso.
Eu pulei para trás, mal me esquivando dos pedaços verdes que voaram de suas mãos. Ela usou
muito impulso tentando me agarrar, porque sua mão estava deslizando e seus pés começaram a
escorregar. Como um homem bêbado no gelo, seu torso girou, os braços também e suas pernas
vacilaram enquanto ela tentava manter o equilíbrio.
Eu tinha certeza de que ela iria cair, mas então, de alguma forma, Poppy conseguiu se segurar.
— Oh, meu Deus — ela ofegou, olhando para mim enquanto firmava as pernas. — Essa foi por
pouco. Eu ia sair daqui parecendo o Caco dos Muppets.
Eu ri.
— Ou o Hulk. Você pode imaginar ir para o restaurante amanhã parecendo um Bruce Banner
irritado? — Randall ganharia o dia se Poppy aparecesse com o rosto todo verde.
Eu ainda estava rindo quando Poppy plantou as mãos nos quadris.
— O Hulk? Eu te lembro do Hulk?
Minha risada morreu.
— O quê? Não! Claro que não. — Ah, merda. — Você seria como uma pequena pessoa verde.
Tipo, hm… — Pense, Cole. Que porra mais era verde? O gigante da Jolly Green. Godzilla. O
Grinch. — Yoda. — Eu estalei os dedos. — Você seria como Yoda. Exceto que não é velha. Ou
careca. Ou enrugada…
— Cole. — Eu parei de falar enquanto Poppy sorria. — Boca fechada você deve manter.
Eu concordei.
— Boa ideia.
— Ok. Estou saindo daqui.
Eu dei um passo à frente e estendi minha mão livre para ajudá-la, mas antes que Poppy pudesse
segurar minha palma, ela mudou o peso. Em um segundo ela estava de pé, no próximo ela estava
voando pelo ar.
Splash.
Gelatina verde voou por toda parte enquanto Poppy gritava. Ela meio que engasgou, meio
gargarejou quando um pedaço pousou em sua boca — eu quase tive ânsia —, então cuspiu, lutando
para se sentar. A gosma gotejava das pontas de seus dedos e do nó no cabelo. Sua blusa nunca mais
seria branca.
E eu não pude resistir. Meu telefone ainda estava na mão e o ergui para uma explosão de fotos.
— Você tá de brincadeira comigo? Agora?
Eu sorri.
— Apenas no caso de você um dia querer uma prova. — Joguei meu telefone de lado e me
abaixei, ajudando-a a se levantar. — Aqui.
Desta vez, quando ela se levantou, a gelatina a cobria da cabeça aos pés.
Não ria. Não seja um idiota. Não adiantou. Um bufo escapou, seguido por um ataque de riso
quando Poppy olhou e agarrou minha mão com toda sua força.
— Desculpe.
Eu parei de dar risada — embora meu peito ainda estivesse arfando — enquanto a ajudava a sair
da piscina.
Com um dedo verde enfiado no meu rosto, Poppy falou por entre os dentes cerrados.
— Mencione algo sobre Yoda, Muppets ou duendes e você está morto.
— Sim, senhora. Nenhuma palavra.
Ela deixou cair o olhar e soltou minha mão para que pudesse esfregar o local da bunda que havia
tomado o pior do impacto.
— Isso dói. Gelatina não é um amortecedor legal.
— Sinto muito. — Eu entreguei a toalha que havia trazido. — Quer tomar um banho?
Ela concordou com a cabeça enquanto enxugava o rosto, então disparou passando por mim em
direção à porta.
— O chuveiro está lá em cima. Última porta à direita! — eu gritei para ela.
Ela acenou e continuou correndo para dentro.
Eu sorri, balançando a cabeça enquanto examinava meu quintal.
Estava uma bagunça. Ia ser uma merda limpar aquela piscina, e eu esperava que os pedaços de
gelatina se dissolvessem na grama, mas ainda assim eu estava feliz que Poppy tinha vindo aqui para
cumprir a tarefa.
Decidindo que limparia a piscina no dia seguinte, peguei meu telefone e entrei em casa, me
jogando no sofá para olhar as fotos.
Antes de a água abrir no andar de cima, encontrei minha foto favorita.
Meu lindo duende verde, Poppy.
Eu a amava. Olhando para a foto dela no meu telefone, isso me acertou em cheio.
Eu estava apaixonado por Poppy Maysen.
A ironia da situação me atingiu em seguida.
Aly me disse que me amava inúmeras vezes, e eu nunca disse de volta. Nem uma vez. E agora eu
estava finalmente pronto para dizer essas três palavras para uma mulher que não poderia dizê-las de
volta.
Trigésimo segundo aniversário:
Participar de uma luta de tinta
Dois dias depois, o verde havia desaparecido da minha pele, e eu estava no apartamento de
Jimmy, enchendo balões biodegradáveis com tinta e um pouco de água. Tinha passado os últimos
trinta minutos criando coragem para contar a ele sobre mim e Cole, para que não ficasse surpreso
quando chegássemos ao parque no final da tarde.
— Então, hum… Eu convidei Cole para participar dessa guerra de tinta conosco.
— Sim, eu sei. — Seus dedos estavam cobertos de tinta azul enquanto fechava um balão. — Eu
me lembro quando você me disse isso há uma semana. Você está preocupada que eu esteja ficando
senil ou algo assim? Porque eu não estou. Não importa o que aquele idiota do Randall diga, minha
cabeça está tão clara como quando eu tinha sua idade, entendeu?
— Entendi. — Eu ri, amarrando meu balão vermelho e jogando-o na banheira com os outros. —
Mas eu queria te dizer outra coisa. Cole não é apenas um amigo ajudando no caminhão de Jamie.
Estamos meio que namorando.
— Você realmente acha que estou senil. — Ele deu uma risadinha. — Relaxe, Poppy. Eu já tinha
concluído isso.
— Você tinha? — Eu fiquei boquiaberta enquanto ele enchia outro balão.
Jimmy assentiu.
— Você fala muito dele. Parece que vocês passam muito tempo juntos. Molly me disse que ele vai
ao restaurante quase todas as noites. Estou velho, não cego. Eu imaginei que havia algo a mais
acontecendo entre vocês dois.
— E isso não te incomoda?
Ele balançou a cabeça, deixando cair o frasco de tinta de suas mãos para me dar toda sua atenção.
— Eu só quero que você seja feliz. E se você gosta desse cara, eu sou totalmente a favor.
— Você acha que não há problema em começar a namorar de novo?
Talvez fosse porque Jimmy e Jamie eram tão próximos, mas eu precisava da benção de Jimmy.
Seria a coisa mais próxima que eu teria de uma bênção de Jamie. Eu precisava que ele me dissesse que
estava tudo bem em namorar Cole.
Ele assentiu.
— Eu não apenas acho que está tudo bem. Acho que está na hora. Cinco anos, Poppy. É hora de
seguir em frente. E você sabe tão bem quanto eu que Jamie ia querer isso para você também.
Eu olhei para os meus dedos cobertos de tinta.
— Obrigada — eu sussurrei.
Ele não sabia quantos medos e ansiedade havia acabado de aliviar.
Sua mão azul fechou sobre a minha.
— É a verdade. — Eu olhei para ele e sorri.
— Vocês dois estão prontos para ir ou não? — Randall resmungou do corredor enquanto entrava
no quarto de Jimmy. — Eu quero acabar com isso para que eu possa voltar a tempo para o jantar.
Comecei a encher outro balão.
— Só mais alguns destes, e então podemos ir.
— Tudo bem — Randall murmurou enquanto entrava no apartamento.
Ele estava usando roupas de proteção da cabeça aos pés, e em uma de suas mãos enluvadas havia
uma touca de banho.
— Olhe para esse cara. — Jimmy revirou os olhos. — Roupas de proteção? Sério? Seu florzinha.
É só um pouco de tinta.
— Eu não vou destruir minhas roupas. Alguns de nós têm orgulho da própria aparência. — Os
olhos de Randall se estreitaram quando ele e Jimmy entraram em um de seus habituais concursos de
encarada.
Jimmy ia até O Maysen Jar com Randall quase todos os dias agora, e uma coisa que aprendi é que
eles viviam para brigar. Aqueles dois iam ao restaurante no meio da manhã e discutiam sobre
qualquer coisa até bem depois do almoço.
No início, tentei intervir — bancar a pacificadora —, mas depois da minha quinquagésima
tentativa fracassada, desisti.
Então apenas balancei a cabeça e continuei enchendo meu balão.
— Vocês podem, pelo menos, guardar essa animosidade para a guerra no parque, senhores?
— Sempre do lado dele — Randall murmurou e se virou para a sala de estar.
— Ela é minha neta! — Jimmy gritou às suas costas. — Claro que ela está do meu lado. —
Jimmy olhou para mim. — Que idiota.
— Vocês dois são piores que crianças.
Jimmy riu e acenou para que eu sussurrasse.
— Olha só.
Ele verificou novamente se Randall estava fora de vista e, em seguida, enfiou a mão em um
armário. Ele tirou um balão com dez vezes o tamanho dos minibalões que estávamos enchendo.
— Jimmy — eu assobiei.
Ele deu uma risadinha.
— De jeito nenhum aquela proteção e a touca vão salvá-lo dessa belezinha aqui.
Eu bufei, tentando engolir a risada. Então me abaixei até a banheira e comecei a abrir espaço para
seu balão monstruoso.
— Ponha isso entre os menores para que ele não veja.
Jimmy sorriu.
— Essa é minha garota.
Uma hora depois, eu estava ao redor de um monte de gente, tendo acabado de revisar as regras
para nossa luta com tinta. Sem jogar direto no rosto. Ir com calma com Max e Kali. Continuar até
que todos os balões tenham acabado.
À minha esquerda estavam Jimmy e Randall, Cole à minha direita. E na minha frente estavam
Finn, Molly e as crianças.
— Estão todos prontos?
Recebi gritos e palmas por toda a parte quando nos separamos para carregar os balões.
— Ok. Vou contar até três. Um. Dois. Três! — O pandemônio se seguiu. Balões começaram a
voar, gente começou a correr, e a tinta respingou em todos os lugares.
— Pegue a tia Poppy! — Finn gritou para Kali, que imediatamente começou a me perseguir.
— Não, Kali! Não! — Fingi correr rápido, mas deixei que ela me alcançasse e jogasse um balão
amarelo nas minhas costas. A tinta pegajosa e fria imediatamente encharcou minha camiseta branca e
cobriu a parte traseira dos meus braços. — Você me pegou!
Ela riu, então correu de volta para o balde.
— Pegue o papai! — ela gritou, apontando um balão verde para Finn. Ela saiu em disparada,
juntando-se a Molly e Max, enquanto eles perseguiam Finn e tacavam balões em sua direção.
Pela primeira vez em meses, Finn e Molly estavam sorrindo um para o outro, de verdade. Sorrisos
genuínos. Eu não tinha certeza se eles estavam se dando bem porque essa guerra de tinta era para
Jamie, ou talvez eles só estivessem fazendo caretas para mim. Independentemente disso, tornou tudo
mais divertido.
Eu estava tão perdida assistindo os sorrisos em seus rostos, que não notei Cole se esgueirando atrás
de mim. Um segundo, eu estava assistindo Kali jogar o balão verde na camiseta branca de Finn, no
próximo, tinta azul escorria pelo meu cabelo.
— Ahhh! — Eu me virei bem a tempo de ver Cole esmagar outro balão na minha cabeça, agora
com tinta laranja. — Você! — Eu apontei um dedo para seu sorriso, então corri de volta para pegar
um punhado de balões.
Tentei acertá-lo, mas Cole era muito ágil. Ele se esquivou de cada uma das minhas tentativas até
que a grama ao redor dele parecesse estar coberta de vômito de unicórnio.
— Eu desisto. — Fiz um beicinho para Cole, então voltei para pegar mais balões. Quando voltei
para a luta, escolhi um alvo diferente. — Peguei você! — eu gritei quando o balão vermelho que eu
joguei explodiu contra o peito de Randall.
Ele olhou para sua roupa e zombou.
— Você vai pagar por isso.
Eu mostrei a língua, desafiando-o a vir atrás de mim assim que Jimmy saía de seu esconderijo atrás
de uma árvore carregando aquele enorme balão que ele havia escondido quando chegamos.
Eu me preparei, esperando o inevitável, mas assim que Jimmy levantou o balão, Randall se virou.
Com agilidade que eu nunca teria esperado do velho que andava com uma bengala, ele saltou para
trás, jogando o balão que carregava no monstro de Jimmy.
A tinta rosa-choque voou por toda parte.
O cabelo curto e branco de Jimmy estava coberto. A cara dele. Seus ombros. Tudo estava
pingando tinta rosa.
— Seu filho da puta! — Ele cuspiu, enviando respingos de rosa para o chão.
— Há! — Randall riu. — Isso saiu pela culatra, não é mesmo?
Ao meu lado, Cole começou a rir. Então Finn e Molly se juntaram a nós. Tentei manter uma cara
séria, mas como a tinta rosa continuava pingando do nariz de Jimmy, perdi a batalha. Eu ri tanto e
por tanto tempo, que minha barriga começou a doer.
Eu me curvei ao meio, lutando para recuperar o fôlego enquanto as lágrimas de felicidade se
misturavam às manchas de tinta no meu rosto.
— Oh, meu Deus. Isso foi hilário.
Quando me levantei, Cole me entregou uma das toalhas que eu tinha trazido.
— Aqui.
— Obrigada. — Usei para secar meu rosto e, em seguida, entreguei a Cole para que ele pudesse
limpar as mãos. Ele foi atingido por um balão verde bem no meio do peito. A cor e o sol forte da
tarde tornavam seus olhos ferozmente brilhantes enquanto ele sorria.
Aqueles lindos olhos se mantiveram presos nos meus quando ele se aproximou, pegando a toalha
e enxugando o lado do meu rosto.
— Faltou limpar um lugar.
Sem pensar — ou me importar — com nosso público, fiquei na ponta dos pés e encostei a boca
na sua.
— Obrigada por vir hoje.
— Claro.
Eu o choquei um pouco com aquele beijo, mas estava feliz por ter feito isso. Principalmente ali, na
frente da família e dos amigos. Queria que soubessem que ele era uma pessoa especial.
Afinal, era disso que se tratava o dia. Aquele era um dia feito para me divertir com as pessoas
especiais em minha vida e homenagear alguém que foi especial, mas não estava mais conosco.
— Foi divertido. — Jimmy se aproximou, e entreguei-lhe uma toalha. — Acho que deixamos
meu neto orgulhoso.
— Também acho. — Finn disse enquanto limpava o rosto de Max.
— Concordo. — Molly concordou com a cabeça. — Jamie teria adorado isso.
Sorri para Cole e olhei para o céu azul sem nuvens.
— Sim. Ele teria.
Trigésimo primeiro aniversário:
Fazer trilha no Parque Nacional Glacier
No momento em que voltamos para o alojamento, o sol tinha começado a se pôr. Cole me
carregou montanha abaixo — ele suportou mais de seis quilômetros comigo nas costas. Quando
chegamos na parte mais fácil da trilha, eu me ofereci para andar com as meias, mas ele se recusou a
me colocar no chão, não importando o quanto eu tivesse implorado.
Finalmente, meus pés atingiram o chão quando chegamos a um banco do lado de fora do
alojamento.
— Você quer ir para o quarto ou gostaria de jantar primeiro?
Ele passou a mão no rosto.
— Eu preciso de um banho, mas eu realmente gostaria de comer primeiro para que eu possa
dormir depois do banho. Eu estou acabado.
— Jantar, então. Vou pegar os chinelos que deixei na caminhonete.
— Eu vou buscá-los.
— Cole, sente-se e faça uma pausa. — Eu apontei para o banco. — Posso andar descalça por um
estacionamento pavimentado.
Ele cedeu, tirando as chaves da caminhonete do bolso. Eu as peguei e corri em direção ao
estacionamento, olhando por cima do ombro para vê-lo relaxado no banco. Ele parecia mais exausto
do que nunca.
Tudo por minha causa.
Eu andei mais rápido, meu ritmo combinando com a velocidade dos meus pensamentos.
Eu estava exigindo muito de Cole? Ele ofereceu ajuda livremente, mas eu estava me aproveitando
disso? Primeiro ele assumiu o caso de assassinato de Jamie no trabalho. Depois a lista de aniversários
e tudo que vinha junto com ela: o caminhão, as atividades de fim de semana, a caminhada.
Eu não queria que ele se ressentisse de mim quando terminássemos a lista. Eu não queria que ele
pensasse que tudo que eu queria dele era sua ajuda.
Minhas preocupações foram colocadas em espera quando cheguei à caminhonete. Calcei os
chinelos que havia jogado no banco detrás só por garantia, e depois voltei correndo para que
pudéssemos comer algumas calorias muito necessárias e uma cerveja bem-merecida para Cole.
Uma hora depois, Cole deu um tapinha no estômago, acabando de devorar um prato de batatas
fritas rústicas e uma enorme costela.
— Isso foi bom. Não tão bom quanto a sua comida, mas ainda assim estava no ponto.
— Obrigada. — Eu sorri. — Pena que não há maneira de servir bife num pote.
Ele deu uma risadinha.
— Se alguém um dia descobrir como, com certeza vai ser você.
— Acho que vou guardar as receitas de bife para fazer em casa. Vou usá-las quando for batizar sua
cozinha.
Sua mão cobriu a minha no bar entre nós.
— Vou gostar disso.
— Eu também. — Virei minha mão para enroscar os dedos nos dele.
Não tínhamos conversado sobre o beijo que trocamos em sua cozinha e não demos outro desde
então. Eu só esperava que Cole soubesse que as lágrimas que seguiram não foram porque eu me
arrependi daquele momento.
Eu nunca poderia me arrepender daquele beijo.
— Espero que você…
— Quer outra cerveja? — A bartender, uma jovem com cabelo preto espetado, interrompeu.
Cole largou minha mão e enfiou a mão no bolso para pegar a carteira.
— Não. Apenas a conta. Obrigado.
— Sem problema. — Ela bateu em um porta-copos de papelão no balcão e caminhou até o caixa.
— Aqui. — Ele me entregou uma pilha de notas de vinte. — Eu volto já.
Ele se levantou de seu banquinho, inclinando-se para beijar minha testa, depois caminhou em
direção aos banheiros. Seus passos eram lentos e pesados. Os ombros largos esticaram o algodão
branco de sua camisa enquanto ele se curvava para frente. E do jeito que ele estava virando a cabeça,
ele devia estar com uma de suas dores de cabeça.
— Aqui está. — A bartender apoiou os braços no bar depois de colocar nossa conta. — Parece
que seu marido teve um dia difícil.
— Ah, hm… — Eu me atrapalhei com o dinheiro enquanto o entregava. — Ele não é meu
marido.
Seus olhos dispararam para minha mão esquerda, focalizando minhas alianças de casamento.
— Ceeeerto. — Ela se afastou para longe do balcão e ergueu as mãos. — Nenhum julgamento
aqui. Apenas pensei que fosse.
— Não! — Minhas mãos se agitaram enquanto eu fazia o meu melhor para explicar que não
estava tendo um caso. — Não é isso. Eu sou… Eu não sou casada. Meu marido faleceu, e eu
simplesmente não tirei as alianças.
— Sinto muito. — Seu rosto suavizou antes que ela virasse e fosse até a caixa registradora pegar o
troco.
Ok, isso foi estranho. Girei os anéis em meu dedo. Era hora de tirá-los? Se eu realmente quisesse
seguir em frente, eu não poderia continuar usando.
Antes que eu pudesse reunir coragem para puxá-los, a mão de Cole pousou no meu ombro.
— Tudo certo?
Eu concordei.
— Ela está só pegando o troco.
A bartender apareceu com o dinheiro na mão, mas Cole apenas acenou para ela.
— Fique com ele. Obrigado.
Eu pulei do meu banquinho, depois segui Cole enquanto caminhávamos para a recepção para
pegar as bolsas que deixamos lá anteriormente. Nós as pegamos com o recepcionista, então seguimos
nosso caminho para o segundo andar e descemos um longo corredor até nosso quarto.
Joguei minhas malas em uma cama enquanto Cole fazia o mesmo na outra antes de afundar na
cadeira perto da porta da varanda.
— Vá em frente. Você pode tomar banho primeiro.
— Tem certeza?
Ele acenou e apoiou a cabeça no encosto da cadeira.
— Ok. Serei rápida. — Tirei minha mala da cama e corri para o banheiro, sabendo que quanto
mais rápido eu aparecesse, mais cedo Cole poderia entrar no banheiro e dormir um pouco depois.
Liguei a água e tirei minhas roupas. As bolhas nos pés começaram a secar graças às horas de
exposição ao ar, mas, ainda assim, quando pisei na água, assobiei com a dor aguda. Felizmente, ela
desapareceu rapidamente quando tomei o banho mais rápido da minha vida.
Com o cabelo enrolado em uma toalha, saí do banheiro vestida com short de pijama marrom e
uma camiseta combinando.
— Tudo certo.
Meus pés pararam quando meus olhos pousaram em Cole.
Ele tinha adormecido na cadeira.
Seu boné estava apoiado em um joelho e o cabelo estava emaranhado. Havia sombra de barba no
pescoço e na mandíbula, e suas roupas estavam sujas e enrugadas. Ele estava uma bagunça.
Ele estava uma bagunça, e era o homem mais bonito que eu já vira.
Cole era simplesmente de tirar o fôlego.
Silenciosamente, deixei minha mochila no chão e atravessei o quarto.
— Cole. — Eu coloquei a mão em seu ombro.
Ele acordou de repente, piscando algumas vezes para afastar o sono.
— Desculpe.
— Tudo bem. Vá tomar um banho e depois vá para a cama. — Ele concordou em resposta,
levantando-se da cadeira e em seguida caminhando para o banheiro.
Tirei a toalha do cabelo, penteando-o rapidamente e deixando-o secar naturalmente. Quando o
chuveiro foi ligado, abri a porta da varanda e saí. O ar da noite estava frio e me deu arrepios, mas
ignorei e foquei na minha mão esquerda.
Cuidadosamente, tirei do dedo o anel que Jamie havia me dado no dia em que ficamos noivos.
Então tirei a aliança simples que ele me deu no dia do nosso casamento.
Sempre vou te amar, Jamie, mas é hora desses anéis deixarem meu dedo.
Eu não poderia mais usá-los.
Não quando eu estava me apaixonando por Cole.
Quadragésimo quarto aniversário:
Adotar um cachorro e mantê-lo por toda a sua vida
Na manhã seguinte, Cole e eu demoramos para começar o dia. Como eu não tinha botas, não
podíamos tirar a manhã para caminhar, como eu tinha originalmente planejado, então, em vez disso,
ficamos de preguiça na cama. Depois que ele me fez gozar — duas vezes — e tomou banho comigo,
nos forçamos a nos desgrudar e deixamos o chalé, fazendo uma parada no Lago McDonald.
— Já vi tantas fotos deste lago, mas nenhuma delas faz justiça. — Inclinada para o lado de Cole,
eu não podia acreditar que aquele lugar era real.
A água cristalina refletia as montanhas azuis no horizonte. Algumas das árvores começaram a
mudar, suas folhas amareladas e ambarinas contrastando com as verdes em volta. Mas as rochas do
lado eram minha parte preferida. Pedras redondas e lisas de todas as cores — vermelhas, verdes,
azuis e amarelas — repousavam sob a superfície da água.
— Quero voltar aqui um dia e passear de canoa pelo lago.
O braço de Cole em volta dos meus ombros me apertou um pouco mais.
— Talvez devêssemos voltar todos os anos. Este pode ser nosso local de férias.
Eu sorri.
— Eu gosto disso.
Esse parque sempre seria especial para mim, principalmente porque foi o lugar onde Cole e eu
realmente começamos nosso relacionamento. Eu voltaria feliz todos os anos para passar um fim de
semana juntos. E adorei que Cole presumisse — assim como eu — que ficaríamos juntos. Que eu
seria aquela com quem ele passaria férias todos os anos.
— Me dê seu telefone. Vou tirar uma foto sua. — Ele me soltou e estendeu a mão.
— Ok. — Eu o tirei do bolso traseiro e entreguei a ele.
Cole recuou, mas não me virei imediatamente. Eu mantive os olhos no lago e joguei os braços
para os lados, inclinando meu queixo para trás para deixar o sol aquecer meu rosto.
— Tudo bem. — Ele deu uma risadinha. — Vire-se e sorria.
Eu deixei meus braços ao lado do corpo e me virei, mas em vez de sorrir, mandei um beijo para
Cole.
Ele tirou algumas fotos e me devolveu o telefone.
— Você quer ficar mais um pouco ou devemos voltar?
Olhei por cima do ombro para o lago uma última vez.
— É melhor irmos. É uma longa viagem.
— Ok. — Cole caminhou atrás de mim enquanto voltávamos pelo caminho de terra até a
caminhonete. Ele abriu minha porta, então deu a volta até a sua. Seus movimentos estavam rígidos
hoje, as dores de nossa caminhada do dia anterior provavelmente estavam presentes, mas ele não
reclamou.
Quando entramos na rodovia, ele pegou minha mão.
— Quando voltarmos, quanto tempo você acha que vai levar para fazer suas malas para alguns
dias?
— Malas? Para onde exatamente estou indo?
— Para minha casa. — Ele sorriu. — Você está presa a mim agora.
Eu sorri para o perfil de Cole. Ele não tinha se barbeado e sua mandíbula parecia mais sexy, mais
áspera com a barba por fazer. Quando chegássemos em sua casa, minha língua ia ficar bem próxima,
num nível pessoal, daquele maxilar. Fazer uma mala pequena — ou rápida — nunca foi meu ponto
forte, mas esta noite, eu estabeleceria um recorde pessoal.
— Dez minutos. Quinze, no máximo.
E se eu esquecesse de algo, passaria em casa no dia seguinte, antes do trabalho. Eu estava mais do
que disposta a me levantar trinta minutos mais cedo, se isso significasse que eu iria dormir na
maravilhosa cama de Cole.
A única desvantagem era que eu teria que bloquear a imagem de outra mulher tendo dormido lá
primeiro.
— O quanto você gosta da sua cama?
— Minha cama? Bem, considerando que acabei de comprar, há apenas alguns meses, sou bem
apegado a ela.
Não era o que eu esperava.
— Você acabou de comprar?
— Era hora de um upgrade. Ela é nova. Por quê?
— Ah, apenas curiosidade. — Cobri a boca, fingindo bocejar, quando na verdade estava
escondendo um grande sorriso.
Casa de Cole, aqui vou eu.
Ele não sabia ainda, mas eu tinha acabado de reivindicar aquela cama: era minha.
A cozinha também.
Nós viajamos por algum tempo em silêncio, apreciando a paisagem enquanto navegávamos pelas
estradas sinuosas na saída do parque, até chegarmos à rodovia principal que nos levaria de volta a
Bozeman. Cole parou em um posto de gasolina para abastecer, e eu pulei para fora do carro,
querendo uma bebida para nosso retorno.
— Vou pegar água. Quer uma?
Ele concordou, tirando a carteira do bolso detrás e jogando-a para mim.
— Obrigado, linda.
Linda.
Eu sorri com esse novo carinho. “Linda Poppy” ainda era o meu favorito, mas “linda” estava em
segundo lugar.
Correndo para o posto, usei o banheiro e, em seguida, peguei para mim e Cole água e um pouco
de balas de alcaçuz para o restante da viagem.
Quando estava saindo, ouvi um ganido vindo do estacionamento da loja de suprimentos para
fazendas e ranchos ao lado do posto de gasolina. Procurei o som assim que o ouvi novamente. O
barulho vinha de um velho caminhão vermelho onde uma mulher estava arrumando uma placa ao
lado de um pneu.
Filhotes à venda: $ 1500. Pastor alemão de raça pura. Meus pés imediatamente mudaram de
direção. Mil e quinhentos era muito para gastar em um cachorro, mas como olhar era de graça, e eu
adorava filhotes, um olhar não faria mal.
— Oi! — Acenei para a mulher enquanto me aproximava de sua caminhonete. — Você se
importaria se eu olhasse os filhotes?
Ela sorriu.
— Claro que não. Fique à vontade.
Inclinei-me sobre a porta traseira, e cinco pares de olhos castanhos vieram até mim, caudas
balançando freneticamente enquanto lambiam a gaiola.
— Oh, meu Deus. — Agora eu sabia por que as pessoas pagariam 1500 por um cachorro. Bastou
um olhar, e eu estava apaixonada. Esta mulher poderia ficar com meu carro se uma daquelas bolas de
pelo bebê pudesse vir morar comigo.
— Pop… Ah, merda — Cole murmurou, vindo até o meu lado.
No minuto em que ele avistou os filhotes e a expressão no meu rosto, ele soube exatamente o que
eu estava planejando.
— Ir ao canil e adotar um filhote de cachorro resgatado que é bom, nada.
Eu disse a Cole que estava planejando pegar um cachorrinho do abrigo para riscar mais um item
da lista de Jamie, mas esse plano já era. Meu próximo cachorro viria do abrigo, porque naquele dia,
eu ia comprar um daqueles filhotes. Além do mais…
— Esses cachorros também precisam de bons lares, não é? — perguntei à mulher, esperando
algum apoio.
Ela apenas recuou, sem fazer contato visual com Cole carrancudo.
Covarde.
Eu esperava que ela fosse direto ao ponto e me ajudasse a explicar a Cole por que eu gastaria uma
quantidade absurda de dinheiro com um filhote.
— Cole, veja como eles são fofos. — Voltei-me para os cachorrinhos. Um deles, o mais fofo,
recuou para o fundo da gaiola, descansando enquanto os irmãos ainda lambiam a grade. — Além
disso, não importa de onde vem o filhote. A lista dizia apenas para pegar um cachorro e ficar com ele
por toda a vida.
A família de Jamie sempre teve cães de fazenda, mas ele sempre quis um animal de estimação. Um
cachorro que poderia entrar na casa ou que ele poderia levar para caminhar pela vizinhança. Ele
queria um cachorro para se tornar o melhor amigo do homem, não ser outro empregado da fazenda
Maysen. Este cachorro era exatamente o tipo que ele teria escolhido — provavelmente porque este
era exatamente o tipo de cachorro que eu teria escolhido.
Eu não tinha ideia de como faria com um filhote na minha vida, mas o pequeno lá atrás, aquele
mais interessado em observar as atividades do que estar na frente de tudo, era meu novo cachorro.
— Você aceita cartão de crédito? — Cole perguntou à mulher.
Minha atenção voou para longe dos cães quando Cole roubou sua carteira da minha mão.
A mulher sorriu.
— Com certeza aceito.
E assim, passei a ter um cachorrinho.
Uma hora depois, meu novo cachorro estava no meu colo e a parte detrás do caminhão de Cole
estava cheia de acessórios para animais de estimação que compramos na loja onde encontramos a
mulher.
— Como devemos chamá-lo? — eu murmurei enquanto a cachorrinha empoleirava as patas na
porta para olhar pela janela. — Estou pensando em… Nazboo.
— Que porra é essa? — Cole murmurou. — Não, Poppy.
— O que há de errado com Nazboo?
Ele franziu a testa.
— Não quero ficar lá fora gritando “Venha aqui, Nazboo”, “Nazboo, senta”, “Não coma isso,
Nazboo”. Escolha um nome normal.
Eu ri, mas balancei a cabeça.
— Não. Nazboo é fofo. É de um dos desenhos animados que Kali e Max assistem, e é único.
— Está vetado.
— Tudo bem. Se você é tão bom com nomes, vamos ouvir sua escolha.
— Hmm. — Cole esfregou o queixo com uma das mãos, enquanto buscava alguma ideia genial, a
outra mão presa ao volante.
Enquanto ele tentava encontrar um nome melhor, acariciei as costas de Nazboo. Ela era, de longe,
o cachorro mais precioso que eu já tinha visto. O pelo era quase todo preto, mas ela tinha a típica
coloração amarronzada de um pastor alemão, com manchas nas patas, na barriga e nas laterais do
rosto.
E agora ela era minha, e eu ia amar e cuidar dela até o fim de seus dias.
— Então? — perguntei. — Como você acha que devemos chamá-la?
Cole olhou para mim e para minha garota, então balançou a cabeça admitindo a derrota.
— Nazboo.
Quadragésimo quinto aniversário:
Acionar um alarme de incêndio
— Agradeço a presença de vocês. — Papai inclinou-se com seus antebraços sobre a mesa. —
Quando quiserem.
Matt, na cadeira ao meu lado, começou a atualizar papai sobre o caso do assassinato na loja de
bebidas.
— Analisamos o vídeo e reduzimos nossa busca a seis veículos no complexo comercial no
momento do assassinato. Todos eram dirigidos por mulheres que se encaixam em nossa descrição
básica. Não fomos capazes de obter todas as placas das filmagens das câmeras de segurança, então
verificamos as que faltavam nos números das placas com as câmeras de semáforo. Antes de virmos
para cá, enviei uma solicitação ao Departamento de Trânsito para obter os registros.
Esperançosamente, na segunda-feira, teremos nomes, e eu começarei a trazer gente para o
interrogatório.
Papai acenou com a cabeça.
— Bom. Espero que vocês dois estejam no caminho certo.
— Eu também. — Matt e eu dissemos em uníssono.
Levou quase dois meses — dois longos meses — de buscas nas filmagens para chegar até esse
ponto. Desde a noite na garagem, quando mostrei minha arma a Poppy, Matt e eu vimos o caso por
um novo ângulo. Desta vez, procuramos por uma mulher no vídeo.
Não foi fácil. Entre equilibrar meu trabalho na força-tarefa antidrogas, meu volume normal de
casos e tudo o mais que estava acontecendo na minha vida pessoal, a última coisa que eu queria fazer
na maioria das manhãs era me trancar na sala de conferência e vasculhar as filmagens das câmeras por
algumas horas antes de um dia inteiro de trabalho.
Mas se compensar o esforço — se realmente encontrássemos o assassino de Jamie Maysen —, o
trabalho valeria a pena. Valeria a pena cada minuto se pudéssemos dar a Poppy um pouco de paz.
Fazia um mês desde que ficamos juntos oficialmente em Glacier. Um mês, e não tínhamos
passado uma noite separados. Poppy se levantava cedo e ia ao restaurante. Eu levantava cedo e vinha
para a central. Mandávamos mensagens ao longo do dia e, se eu tivesse tempo livre, parava lá para
almoçar. E à noite, eu passava algumas horas trabalhando naquela velha caminhonete enquanto
esperava Poppy terminar no restaurante.
Basicamente nós dois trabalharíamos duro até que pudéssemos encerrar o dia e nos encontrar na
minha casa. Então, passaríamos o restante da noite relaxando na minha cama.
Nossa cama.
Uma coisa que aprendi no mês passado foi que Poppy pertencia à minha casa. Com ela lá, me
sentia realmente em casa.
— Onde está Nazboo? — papai perguntou.
— Eu a deixei com mamãe depois do almoço.
Papai sorriu.
— Ela adora aquela filhote.
— Sim. — Eu sorri de volta. Nazboo era um achado, mesmo que ela tivesse um nome idiota.
Um cachorro como ela deve ter um nome como Sadie ou Bailey. Em vez disso, ela foi nomeada
em homenagem a algum dragão de estimação estranho de um dos desenhos animados de Kali. Mas
eu parecia ser o único a achar que Nazboo era a porra de um nome ridículo. Todo mundo adorou,
especialmente Poppy. Então não briguei muito e comecei a chamá-la de Naz, que era mais fácil de
aceitar.
— Acho que ela é o melhor filhote que já vi — disse Matt. — Eu disse à minha esposa que
também penso em comprar um se pudesse garantir que ele se comportasse como Naz.
— Tivemos sorte, com certeza. — Naz raramente fazia besteira, ela não mordia nossos dedos e
apenas comeu um dos sapatos de Poppy. Depois disso, sempre tivemos certeza de ter ossinhos de
couro por perto, e a partir de então, Naz não destruiu mais nada. Mas era a personalidade dela que
todos nós mais amávamos. Ela era tranquila — para um cachorrinho — e doce como mel.
Naz havia se tornado minha ajudante durante o dia, vindo comigo para a central ou andando em
minha caminhonete se estivéssemos fazendo trabalho de campo. Bozeman era uma cidade boa para
cães — alguns anos antes, a central começou a permitir que oficiais superiores trouxessem seus cães
para o trabalho. Naz era agora um dos três cães que vinham regularmente, e nas vezes em que eu não
podia trazê-la comigo, ela ficava com a mamãe.
— Tudo bem. — Papai olhou para o relógio. — Tenho outra reunião em cinco minutos.
Mantenha-me informado sobre como vão suas entrevistas.
Matt acenou com a cabeça.
— Farei.
Todos nós nos levantamos, e papai apertou a mão de Matt.
— Bom trabalho, Matt.
— Obrigado, mas não posso levar todo o crédito. — Ele me deu um tapinha no ombro. — Esse
cara tem feito a maior parte do trabalho.
Eu zombei.
— Eu não sei nada sobre isso.
Fui eu quem viu a maior parte das filmagens da câmera, mas Matt não ficou parado. Ele levou a
sério seu papel de líder e fez muito trabalho de campo enquanto eu estava sentado nos bastidores. Ele
questionou todas as testemunhas originais novamente. Ele passou horas no complexo comercial,
aprendendo todos os detalhes da área para que pudéssemos nos concentrar nos pontos cegos em que
o suspeito poderia ter se escondido. Matt até passou horas examinando o caso com Simmons.
Surpreendentemente, Simmons havia memorizado muito do caso. Ele pode ter delegado muitas
coisas, e suas habilidades de documentação eram uma merda, mas o que ele não havia escrito,
guardou na cabeça. Eu ainda estava chateado com Simmons por sua preguiça nos últimos anos, mas
ele não era o culpado por deixar o assassino de Jamie Maysen livre. Ele apenas trabalhou na
investigação como o restante de nós.
Procurando por um homem.
Assassinos do sexo feminino eram raros, e mesmo que tivéssemos sido treinados para manter os
olhos abertos para qualquer possibilidade, eu não poderia culpar Simmons por gastar seu tempo
focando em um homem suspeito. A filmagem da câmera da loja de bebidas estava nos enganando. O
assassino parecia um homem.
Mas talvez estivéssemos finalmente chegando a algum lugar.
— Tem sido um esforço de equipe — disse Matt. — É melhor eu voltar ao trabalho. Tchau,
chefe.
— Tchau, pai. — Eu me virei para seguir Matt para fora, mas papai me parou.
— Cole, fique aqui mais um segundo.
Suspirei, com inveja por Matt ter escapado. Desgraçado sortudo.
— O que houve?
Papai apontou para a cadeira, então voltei a sentar.
— Decidi algo e gostaria de contar a você antes que o anúncio seja feito na semana que vem.
Os músculos dos meus ombros ficaram tensos com seu tom.
— Ok.
— Eu marquei a data da minha aposentadoria. Mais dois anos, e eu encerro por aqui.
— Uau. — Eu esperava que papai trabalhasse por pelo menos mais cinco. Talvez dez. Ele amava o
trabalho.
— Isso é… em breve.
— É, mas sua mãe e eu temos conversado muito sobre como queremos passar o restante de
nossos anos. Ambos estamos com boa saúde. Temos sido cuidadosos com nosso dinheiro. Portanto,
em vez de desperdiçar os próximos dez anos no escritório, queremos passar algum tempo juntos.
Talvez viajar. E queremos estar próximos dos nossos netos.
Netos. Essa foi a razão por trás do prazo tão curto e tão repentino. Minha irmã passou na central
duas semanas atrás e me disse que estava grávida. Eu estava incrivelmente empolgado por Evie e seu
marido, Zack. Eles tentaram engravidar durante anos, até que finalmente recorreram à fertilização in
vitro. Agora minha irmã estava mais feliz do que nunca, e os primeiros ultrassons mostraram que eles
estavam esperando trigêmeos. Fazia sentido que mamãe e papai quisessem estar por perto para ajudar
com os três netos a caminho.
— Parabéns.
— Obrigado — ele assentiu. — Mas isso significa que precisamos levar a sério os planos de
transição. Dois anos vão passar voando, e precisamos começar a prepará-lo para assumir o cargo de
chefe. Precisamos envolvê-lo em mais comitês. Eu gostaria que você participasse mais na política e…
— Espera aí. — Eu levantei as mãos. — Pai, nós conversamos sobre isso. Eu não quero ser o
próximo chefe de polícia.
— Certo. Eu sei que você ainda está pensando sobre isso. — Ele balançou a cabeça, mas não
estava me ouvindo. — Temos tempo, mas qual é o problema em aprender mais sobre o que eu faço?
Por via das dúvidas, caso você aceite.
Por via das dúvidas.
Quatro palavras que eu estava realmente cansado de ouvir.
— Olha, pai… — Meu telefone tocou no bolso antes que eu pudesse colocar bater o pé no chão e
parar com isso. — Desculpe — eu murmurei, procurando o telefone para fora do meu bolso.
— Vá em frente. Tenho outra reunião chegando.
— Ok. Conversamos depois?
— Claro.
Acenei uma despedida enquanto pressionava o telefone na orelha, caminhando pelo corredor em
direção à escada.
— Alô.
— Ei, Cole, é o Finn.
— Ei. Qual é a boa? Quer ir beber uma cerveja essa noite?
Eu encontrei o irmão de Poppy para beber umas cervejas duas vezes desde a feira. Ele era um cara
decente e fácil de conversar, mas o que eu mais gostava em Finn era como adorava a irmã mais nova.
A primeira vez em que nos encontramos, ele me disse categoricamente que se eu a machucasse, ele
ficaria feliz de cumprir perpétua pelo meu assassinato.
— Esse não é exatamente o motivo da minha ligação.
Meus pés congelaram, e minha frequência cardíaca disparou.
— É a Poppy?
— Sim. Ela está bem, mas está com alguns problemas.
— Que tipo de problema? — O que diabos estava acontecendo que ela não podia me chamar?
— Ela acabou de me ligar para pagar a fiança dela e de Jimmy.
— Puta que pariu. — O palavrão saiu através dos meus dentes. — Foi aquela porra de alarme de
incêndio, não foi?
— Isso. — Ele alongou a palavra assim como Poppy fazia. — Eu acho que ela decidiu não dar
ouvidos a nenhum de nós nisso.
— Cacete. — Corri em direção às escadas. — Eu vou cuidar disso.
Finn riu.
— Achei que você iria. Ela vai ficar chateada comigo quando descobrir que eu chamei você às
escondidas em vez de ir ajudar o traseiro dela.
Eu bufei.
— Ela tem problemas maiores com o que se preocupar agora.
— Boa sorte.
— Obrigado por avisar. — Meti o telefone de volta no bolso e desci as escadas para as baias. —
Eu preciso sair — eu disse a Matt. Ele estava de pé ao lado da mesa, conversando com alguns dos
outros caras. — Problema pessoal.
— Pessoal como a sua namorada e algum velho sendo presos por disparar um alarme de incêndio
em um antigo armazém?
— Porra. — Peguei minhas chaves da minha mesa. — A central inteira sabe?
O grupo imediatamente começou a rir.
— Vou levar isso como um sim. — Fofoqueiros de merda. Aquele lugar era pior do que um
vestiário de ensino médio. Eu ignorei meus colegas de trabalho e me virei para sair, mas um dos caras
me parou.
— Ei, Cole.
— Sim? — Olhei por cima do ombro a tempo de pegar as algemas que ele jogou em minha
direção.
— Você pode precisar disso. — Ele riu junto com os outros idiotas que já estavam rindo de mim.
Eu olhei para ele, prestes a jogá-las de volta, mas me contive. Talvez passar uma noite nua e
algemada ensinasse Poppy a ouvir os outros. Então, sem mais uma palavra, eu as empurrei no bolso
traseiro e saí furioso da minha baia.
A área das celas para prisões curtas era do outro lado do complexo da força policial de Bozeman,
então, quando explodi pela porta, virei na direção oposta do estacionamento. A curta caminhada pela
longa calçada não teve efeito em acalmar meu humor, e quando cheguei à prisão, estava furioso.
Como ela podia ser tão estúpida? Ela não sabia que esse era um crime grave? Era uma
contravenção, pelo menos, mas se ela tivesse causado qualquer dano à propriedade ou um ferimento,
ela poderia enfrentar uma acusação séria. Algo que eu disse a ela mais de uma vez.
Pela primeira vez, eu quis queimar aquela maldita lista de aniversários.
— Oi, detetive Goodman. — O policial sentado atrás da janela de acrílico sorriu, mas parou logo
que avistou meu rosto zangado.
— Estou aqui para pagar a fiança de Poppy Maysen e Jimmy Maysen.
Seus olhos arregalaram.
— Ah, hum… Certo. — Ele mexeu em alguns papéis em sua mesa. — Está fixada em
quinhentos dólares cada uma.
Minhas narinas dilataram. Mil dólares. Peguei a carteira do bolso e tirei um cartão de crédito.
— Há uma taxa extra para crédito…
Eu levantei a mão para calá-lo.
— Eu sei. Basta passar tudo aqui.
— Sim, senhor.
Apontei para a porta no canto.
— Posso ir lá?
— Você só precisa assinar uma papelada antes que eles sejam liberados.
Não brinca.
Ele se encolheu sob o meu olhar e estendeu a mão para a campainha, para me deixar passar rumo
ao bloco de celas.
A primeira cela pela qual passei estava ocupada por um bêbado que havia vomitado em si mesmo
e no chão. A próxima tinha um cara coberto de tatuagens, a maioria símbolos de gangue.
Eu não queria Poppy naquele lugar. Ela não pertencia a este inferno. E ela não estaria aqui se
tivesse apenas me ouvido, porra.
Minhas mãos estavam fechadas enquanto eu caminhava pelo corredor até sua cela, onde ela estava
conversando com Jimmy.
— Não gosto dessa ideia.
— Que pena. — Ele sibilou. — Eu levo a culpa. Como eu disse ao policial, você estava apenas
tentando me impedir.
— Mas…
— Sem desculpas. É assim que vai ser. Deixe-me fazer isso.
Limpei a garganta enquanto andava em direção às barras. De olhos arregalados, Poppy estava
esperando. Os olhos de Jimmy encaravam o chão.
Aproximei-me da porta, plantando as mãos em meus quadris, e olhei para os dois sentados na
cama de metal.
— Que tal vocês dois pararem de conversar onde qualquer um pode ouvir vocês falando?
— É o que eu tentei dizer a ela. — Jimmy levantou-se da cama. — Mas ela está um pouco
nervosa.
— Nervosa! — Poppy se levantou. — Estamos na prisão, Jimmy. — Seus olhos se voltaram para
mim. — Cole, eu posso explicar.
— Agora não. — Olhei para o corredor e vi o policial da recepção descendo com um molho de
chaves. — Vocês dois fiquem quietos até sairmos daqui. Então vocês terão sua chance de explicar.
Poppy e Jimmy ficaram quietos enquanto o policial e eu os escoltávamos do bloco de celas. Eles
não murmuraram uma palavra enquanto eu assinava os papéis da fiança e pegava o recibo do cartão
de crédito. E eles acenaram com a cabeça em silêncio enquanto o policial lhes dizia que eles tinham
de comparecer a uma audiência de acusação ou perderiam o dinheiro da fiança e teriam mandados
de prisão emitidos.
— Onde está seu carro? — perguntei a Poppy quando saímos.
— No armazém.
— Vamos.
Eu marchei de volta através do complexo com Jimmy e Poppy vindo atrás de mim como crianças
depois de serem repreendidas por um pai zangado.
Fomos direto para a minha caminhonete e entramos, com Jimmy no carona e Poppy atrás.
Quando as portas foram fechadas, respirei fundo, tentando me acalmar. Mas nem mesmo o aperto
dos meus dedos no volante, até que minhas juntas ficassem brancas, aliviou a raiva que fluía em
minhas veias, e o controle que eu mantinha em meu temperamento se despedaçou.
— Que porra você estava pensando? — eu rugi, girando em direção a Poppy no banco detrás. —
Riscar um item da lista realmente vale um registro criminal? Jesus Cristo, Poppy. Já conversamos
sobre isso. Você pode ser acusada por um crime. Um crime! Isso fica com você para sempre.
— Eu sei. — Quando o corpo de Poppy se dobrou, minha raiva diminuiu.
— Isso é minha culpa. — Jimmy veio em seu socorro. — Mas nós temos um plano.
— Um plano?
Jimmy realmente achava que poderia vencer o sistema? Se tivéssemos sorte, esses dois acabariam
acusados por contravenções.
— Estou assumindo a culpa por tudo isso — declarou Jimmy.
— Jimmy, não! — Poppy protestou. — Eu puxei o alarme. É minha responsabilidade. Eu não
vou deixar…
Eu levantei um dedo, silenciando seu discurso, e mantive meus olhos em Jimmy.
— Continue.
— Eu puxei o alarme. Poppy e eu estávamos no armazém. Fomos tomar um café na cafeteria ao
lado, peguei o recibo para provar isso, e disse a ela que queria dar uma olhada no armazém. Eu
queria ver como ele havia mudado ao longo dos anos, já que eu sabia quem era o proprietário. Nós
entramos furtivamente, e eu puxei o alarme. Por acidente.
— Um acidente — eu falei impassível. — Esse é o seu plano?
Ele assentiu.
— Sim. Eu tropecei, agarrei a parede e puxei o alarme.
Suspirei e olhei de volta para Poppy, me matou ver seus lindos olhos azuis escuro cheios de
preocupação.
— Que tal a verdade desta vez?
Ela acenou com a cabeça.
— Jimmy descobriu que o sistema de sprinklers foi desligado no armazém porque ele está sendo
preparado para uma reforma. Fomos tomar um café... Essa parte é verdade... E depois atravessamos a
rua até o armazém. Entramos sorrateiramente e eu puxei o alarme.
— Os sprinklers estavam todos desligados, mas os alarmes ainda estavam ativos. — Jimmy
balançou a cabeça. — Informações não verificadas da minha parte.
Informações não verificadas. Jimmy estava agindo como se isso fosse uma porra de uma operação
secreta e ele fosse um espião, não algo que pudesse arruinar a reputação da minha namorada como
uma cidadã modelo.
Poppy tocou meu braço.
— Achamos que fazer dessa forma não seria grande coisa. Que eu seria capaz de disparar o alarme
sem motivo e riscar o item da lista sem realmente cometer um crime. Nenhum de nós tinha ideia de
que o alarme ainda estava ativo. Eu juro, tudo isso foi um erro inocente. Nós nem corremos depois
que o alarme disparou. Nós apenas esperamos até que o corpo de bombeiros chegasse para que
pudéssemos dizer a eles que tínhamos acionado o alarme. Eles chamaram a polícia e… Você já sabe o
restante.
— Ok. — Fechei os olhos e respirei fundo, liguei a caminhonete e nos levei para fora do
estacionamento. Usei o trajeto até a Arco-Íris para pensar em como lidaríamos com isso antes da
audiência na próxima semana.
Estacionado em frente à casa de repouso, olhei para Jimmy e Poppy, dizendo a eles com minha
carranca que eu estava no comando.
— Escutem o que vamos fazer. Primeiro você vai dizer a verdade ao juiz. Tudo isso. Começando
com a lista e por que você acionou o alarme. Então você vai prometer que nunca, nunca mais
infringirá a lei e torcer para que o juiz seja um pouco sentimental e lhe dê uma multa em vez de pena
de prisão. — Meus olhos se voltaram para Jimmy. — Vamos optar pela verdade aqui. Não uma
história maluca.
Jimmy me surpreendeu quando não discutiu. Ele balançou a cabeça para mim e estendeu a mão
para dar um tapinha no joelho de Poppy.
— Eu sinto muito. Te vejo em breve.
Enquanto ele desaparecia dentro da casa de repouso, Poppy passou por cima do banco e tomou
seu lugar ao meu lado.
— Me desculpe, Cole. Eu sei que você está bravo. Eu sei que você me disse para não fazer aquilo,
mas honestamente pensamos que seria apenas puxar um interruptor que não funcionava mais.
Eu peguei sua mão.
— Eu não sabia que puxar um alarme desativado era uma opção. Achei que você gostaria que
fosse real. Se você tivesse me perguntado, eu poderia ter falado com o departamento dos bombeiros e
obtido uma lista completa de edifícios onde os alarmes não funcionam.
Ela abaixou a cabeça.
— Eu só… Você tem feito muito por mim. Eu não posso continuar pedindo tudo para você.
Huh?
— O que você está falando? E de onde vem isso?
Ela encolheu os ombros.
— Você tem estado tão ocupado ultimamente, e é minha culpa. Eu não posso continuar jogando
as coisas no seu colo. Com o caminhão, e a caminhada, e agora ainda tem Nazboo o tempo todo.
Não quero que você se ressinta de mim quando terminarmos tudo isso. Prefiro ter você do que sua
ajuda nesta lista.
— Poppy, olhe para mim. — Quando ela me olhou, deixei sua mão para correr meu polegar por
sua bochecha. — Você tem as duas coisas. A mim e minha ajuda. Eu quero consertar aquele
caminhão. Eu quero estar com Nazboo. Eu quero fazer tudo o que você precisa que eu faça. Ok?
— Eu não quero que a lista fique entre nós — ela sussurrou.
Deus, eu amo essa mulher. Eu amava seu coração. Sua dedicação para resolver as coisas. Eu amava
que Poppy estivesse tentando me colocar em primeiro lugar. E mesmo que o tiro tenha saído pela
culatra, amava que ela tivesse feito isso dessa maneira porque estava tentando aliviar minha carga.
As três pequenas palavras quase escaparam da minha boca, mas eu as engoli de volta. Talvez eu
tivesse coragem de dizê-las quando a lista acabasse — quando tudo isso tivesse ficado para trás.
Poppy não estava pronta para elas ainda.
E eu precisava saber que quando dissesse “eu te amo”, eu ouviria de volta.
Aquele não era o dia. Precisávamos de mais tempo.
— Eu amo que você seja tão dedicada à lista e estou muito orgulhoso que você faz isso por Jamie.
Mas essa lista nunca vai ficar entre nós.
Poppy relaxou, inclinando-se ainda mais em minha mão. Ela precisava ouvir essas palavras tanto
quanto eu precisava dizê-las.
A lista de Jamie não ia ficar entre a gente. Eu só precisava ter certeza de que sua memória — e
minhas próprias inseguranças — também não.
Trigésimo terceiro aniversário:
Jogar uma bebida no rosto de alguém
Não muito tempo depois de Cole voltar ao trabalho, Molly deixou o restaurante para fazer
algumas coisas antes de ir pegar Kali e Max na creche. Éramos só eu e Helen pelo restante da tarde e
da noite, então enquanto ela cuidava do balcão, eu estava na cozinha cortando legumes para minha
sopa de macarrão com frango.
Ia esfriar mais à noite, e eu pensei que a sopa seria um sucesso com a multidão do jantar. Além
disso, era um dos pratos favoritos de Cole. Ele vinha jantar, e eu queria fazer algo especial para ele,
levando em conta tudo o que ele fez para consertar a caminhonete de Jamie — que estava parada nos
fundos do restaurante.
Cole tinha levado meu carro de volta para a delegacia, para que eu pudesse levar a caminhonete de
Jamie para casa esta noite. Assim que fechássemos O Maysen Jar, eu planejava dirigir um pouco por
aí, ouvir a estação de rádio de música country favorita de Jamie e, em seguida, encontrar um lugar
para estacionar e riscar esse item da lista.
— Ei, Poppy? — Helen enfiou a cabeça na cozinha.
— E aí? — Eu não tirei os olhos das cenouras na minha tábua de corte.
— Aquela garota está de volta.
Larguei a faca e limpei as mãos no avental enquanto corria para a porta, espiando ao lado de
Helen.
Sentada na mesma cadeira que sempre sentava — aninhada no canto mais distante da sala —
estava uma jovem que vinha ao restaurante regularmente nas últimas semanas. Ela vinha sempre na
mesma hora, por volta das três da tarde, sempre com as mesmas roupas, legging preta desbotada e
um casaco verde oliva dois números maior que caía até os joelhos. Em seus pés, sapatilhas pretas
usadas.
Embora suas roupas fossem antigas e desgastadas, ela se esforçava para melhorar a aparência. Seu
rosto não precisava de muita maquiagem — a pele morena-clara era perfeita —, mas ela polvilhou as
bochechas com um pouco de rosa para combinar com a sombra que usou para destacar os grandes
olhos cor de caramelo. Seus longos cabelos caíam quase até a cintura, e ela adicionou algum produto
para domar os cachos castanho-acinzentados.
— Ela pediu alguma coisa?
Helen sacudiu a cabeça.
— Não. Ela apenas pegou um dos biscoitos grátis e pediu um copo d’água.
Eu fiz uma careta. A menina nunca pedia nada. Em vez disso, ela vinha e se sentava naquele canto,
tentando se misturar à parede enquanto lia o mesmo livro esfarrapado ou fazia os trabalhos da escola.
Eu não me importava que ela não fosse uma cliente pagante. Eu me importava que ela fosse jovem
— provavelmente apenas dezesseis anos — e parecesse estar sobrevivendo apenas com meus
biscoitos grátis. Ela tinha ficado visivelmente mais magra desde que começara a frequentar O Maysen
Jar.
Mas sempre que qualquer uma de nós se aproximava e oferecia algo, ela educadamente recusava e
deixava o restaurante. Então, ontem, Molly e eu dissemos à nossa equipe para nos contar
imediatamente na próxima vez que a garota aparecesse.
— Faça-me um favor — disse a Helen. — Vá colocar um empadão de frango e uma torta de
maçã para esquentar, depois faça um café com leite de baunilha. Vou colocar esta sopa no fogão e
depois saio.
Enquanto Helen ia preparar a comida, corri para terminar de picar e jogar os vegetais no caldo de
galinha. Com a boca do fogão ajustada no alto, lavei as mãos e desamarrei o avental. Quando eu fui
para a frente da loja, Helen tinha tudo o que pedi em uma bandeja.
— Obrigada. — Peguei a bandeja. — Me deseje sorte. — Ela cruzou os dedos e sorriu.
A garota me notou quando cheguei à metade do salão. Ela se endireitou, colocando uma folha de
papel dentro de seu livro antes de colocar os dois em uma mochila de lona.
Então, aumentei o ritmo antes que ela pudesse escapar.
— Oi. — Eu coloquei a bandeja assim que ela se levantou de sua cadeira. — Por favor, não vá.
Por favor.
Ela me olhou com cautela, mas se sentou novamente.
— Obrigada. — Peguei a cadeira em frente a ela. — Meu nome é Poppy. Este é o meu
restaurante.
A garota olhou para a comida, engolindo em seco, depois voltou para o meu rosto, mas não falou
nada.
— Eu esperava que você pudesse me fazer um favor. Fiz algumas mudanças na minha receita de
massa de torta — menti. — Talvez você pudesse experimentar essa aqui e me dar sua opinião
honesta. Me diga o que você acha.
— Ah, hum, eu não…
— Eu sei que já passou do horário do almoço e você pode não estar com fome, mas mesmo
algumas mordidas ajudariam. E é grátis, claro. Os degustadores não precisam pagar. O que você me
diz? Está a fim de me emprestar suas papilas gustativas?
Seus olhos caíram para a comida novamente, e dessa vez ela lambeu os lábios.
— Ok.
Vitória! Eu contive um sorriso e me levantei.
— Vou deixar você comer sem que eu fique por perto. Só não vá embora antes de me dizer o que
você achou.
Ela assentiu e esperou que eu recuasse antes de pegar o guardanapo e os talheres.
Eu me virei e voltei para a cozinha, resistindo à vontade de olhar por cima do ombro. Então eu
parei no meio da cozinha, contando até cem, antes de voltar para o balcão, fingindo fazer um
inventário da vitrine.
— Ela está comendo? — sussurrei para Helen.
— Sim.
Suspirei.
— Bom. Vou fazer a massa do macarrão, para que possa secar um pouco. Quando ela estiver
quase terminando, venha me chamar.
Helen acenou com a cabeça.
— Sem problemas.
Eu nunca fiz macarrão tão rápido na minha vida. Uma energia nervosa jorrou das pontas dos
meus dedos enquanto eu sovava a massa, e quando Helen voltou para me buscar na cozinha, eu já
tinha o macarrão todo enrolado e cortado.
Com uma toalha na mão, voltei para a mesa da menina e sorri. Ela comeu tudo, exceto o café com
leite de baunilha, que permaneceu intocado.
— O que você achou?
— Estava muito bom.
— Excelente! — falei e me sentei. — Vou manter essas mudanças então. Você não gostou do café?
Ela baixou os olhos para o colo.
— Eu, hum… Não posso tomar café.
— Você é alérgica?
Foi uma pergunta estúpida. No minuto em que perguntei, meus olhos voaram para sua barriga.
Seu casaco, que ela sempre mantinha fechado, agora estava desabotoado. Por baixo, ela vestia uma
camisa preta justa que se moldava à sua barriga arredondada.
— Oh! — Eu sorri mais, na esperança de esconder meu choque por essa menina tão nova estar
grávida. — Eu sinto muito. Eu não percebi. Que tal um chocolate quente?
— Não precisa.
A garota falou tão baixo, que inclinei meus braços na mesa para ouvi-la
melhor.
— Tem certeza? Eu faço a mistura de chocolate do zero. Eu ficaria feliz em fazer um para você…
Desculpe. Não guardei seu nome.
Ela apertou o casaco sobre os ombros sem uma resposta ou contato visual.
Ela estava com medo de mim? Ou ela estava preocupada de estar encrencada? Eu não queria
assustá-la e fazê-la não voltar mais, mas também não queria que fosse embora antes de obter algumas
respostas. Essa garota podia não estar pedindo, mas precisava de ajuda.
— Você não está encrencada comigo. — Eu gentilmente coloquei a mão sobre a mesa. — Você é
bem-vinda aqui a qualquer hora. Se tudo o que você quer são biscoitos e água, tudo bem. Pegue o
quanto quiser e fique o tempo que quiser. Vou até marcar essa mesa como reservada para você.
Ela ainda estava encolhida, mas pude ver um leve aceno em concordância.
— E se você não quiser conversar, tudo bem. Vou deixar você sozinha, mas gostaria de conhecer
mais sobre você. Gosto de conhecer todos os meus clientes regulares.
Eu esperei. E esperei. Mas ela ainda não se moveu. Eu estava prestes a desistir quando seu rosto se
ergueu, e ela me deu um sorriso tímido.
— Belle.
— Belle. É um nome lindo. — Eu estendi minha mão. — Eu sou Poppy Maysen.
Ela pegou minha mão e olhou ao redor da sala.
— Maysen. Como o nome do restaurante?
— Sim. — Esfreguei as mãos nos braços, fingindo estar com frio. — Está meio frio aqui. Acho
que vou fazer um daqueles chocolates quentes para mim. Espere aí, vou fazer um para você também.
Antes que ela pudesse protestar, me levantei da cadeira e peguei a bandeja, levando-a de volta para
a cozinha. Depois fui para trás do balcão e peguei o leite integral. Eu não precisava de gordura extra,
mas Belle, sim.
Helen veio para o meu lado quando comecei a vaporizar o leite.
— Como está indo?
— Fazendo progresso, eu acho. Você reparou que ela está grávida? — Ela balançou a cabeça. —
Você poderia embalar algumas coisas para viagem? Não sei se ela vai aceitar, mas posso tentar.
Escolha comidas que durem alguns dias ou que sejam fáceis de reaquecer, como ensopado e
macarrão com queijo.
— Certo. Vou colocar uma salada também, para adicionar algumas vitaminas. — Enquanto
Helen montava uma sacola para viagem, preparei dois chocolates em nossas maiores canecas. Então
eu os levei para a mesa de Belle e me sentei.
— Aqui está. Saúde!
Tomei um longo gole do meu chocolate, aliviada quando ela fez o mesmo.
— Então, Belle. Como você descobriu meu restaurante? Você mora perto?
Ela balançou a cabeça.
— Não, eu ouvi algumas garotas da escola falando sobre o restaurante.
— Você está no ensino médio aqui em Bozeman?
Ela acenou com a cabeça e tomou outro gole de chocolate quente.
— Este é o seu último ano? É por isso que você sai nesse horário?
— Não, eu estou no segundo ano. Mas meu último horário é apenas sala de estudos e o professor
não nos faz ficar se tivermos boas notas.
Segundo ano. O que significava que ela provavelmente tinha apenas dezesseis anos. Dezesseis.
Com fome. E grávida. Eu esperava que ela estivesse pelo menos recebendo algumas refeições na
escola.
— Você tem uma matéria favorita?
— Eu gosto de economia doméstica.
— Ah, para! Essa foi a minha aula favorita também! Adorava cozinhar, obviamente. Qual é a sua
parte favorita?
Ela sorriu — o primeiro sorriso genuíno que eu vi —, e era deslumbrante.
— Eu amo cozinhar também.
— Você já fez macarrão caseiro com ovos? — Ela balançou a cabeça. — Bem, estou fazendo um
pouco hoje para a sopa de macarrão com frango. Quer ajudar?
Ela quase deixou cair a caneca com a minha oferta.
— Mesmo?
— Vou mostrar a você minha parte favorita do restaurante. — Eu pisquei. — Vem comigo até a
cozinha.
Uma hora depois, tinha três vezes a quantidade de macarrão de que eu precisava para a sopa e
estava deixando Belle preparar um lote de recheio de torta de frutas. Eu falei muito na última hora,
contando a ela curiosidades sobre mim e minhas experiências culinárias, mas quando começamos
com as frutas, ela finalmente começou a se abrir.
Eu descobri que ela tinha dezesseis anos, como eu imaginei, e morava com o pai. Eu também
descobri que ela vinha aqui depois da escola nos dias em que precisava de um lugar tranquilo para
fazer os trabalhos escolares.
E que ela definitivamente estava comendo por dois.
— Você está de quanto tempo?
— Seis meses, eu acho. — Seus ombros caíram enquanto ela sussurrava. — Eu não tenho certeza.
— Você já foi ao médico?
— Eu não tenho plano de saúde.
A maioria das crianças de dezesseis anos não tem.
— E seus pais?
Ela balançou a cabeça.
Quando ela se esquivou ainda mais, eu recuei com as perguntas. Eu fiz muito progresso com Belle
naquele dia e esperava ter conquistado a confiança dela. Talvez, com o tempo, ela estivesse mais
aberta para compartilhar sobre sua vida.
— Você já fez pão de milho antes?
Ela ergueu os olhos e acenou com a cabeça.
— Uma vez na aula.
— Tudo bem. — Peguei meu cartão de receita da pilha sobre a mesa e entreguei a ela. — Me
mostra o que você sabe fazer.
Quando deu cinco horas, a preparação da refeição para os próximos dois dias estava quase
completa. Enquanto eu estava distraída — tentando obter mais informações de Belle —, ela se
concentrou completamente em cozinhar, produzindo cada cartão de receita que eu entreguei a ela
com perfeição absoluta.
— Obrigada por toda sua ajuda. — Entreguei a ela uma toalha para secar as mãos. — Você é
bem-vinda aqui a qualquer hora. Você tem um talento natural na cozinha. — Tanto que eu ia falar
com Molly sobre contratá-la em meio período. Ao menos assim poderíamos garantir que ela estivesse
alimentando a si mesma e ao bebê.
— Obrigada. Eu me diverti muito. — Belle sorriu até que olhou para o relógio acima da pia. —
Mas é melhor ir para casa. — A palavra “casa” soou como se estivesse engolindo pregos.
Enquanto ela vestia o casaco e pendurava a mochila nos ombros, fui até a porta da cozinha e
examinei o restaurante. Helen estava ajudando um cliente no caixa, algumas mesas estavam
ocupadas, mas ainda tínhamos uma hora antes da correria do jantar.
Meus olhos vagaram para as janelas da frente. Estava escurecendo, a luz do dia no inverno não
durava muito, e estaria frio para Belle andar por aí. O vento também estava aumentando.
— Belle, vou te dar uma carona para que você não congele.
Ela balançou a cabeça, puxando um par de luvas que já tinham visto dias melhores.
— Eu vou ficar bem.
— Por favor? — eu implorei. — Vou ficar preocupada com você a noite toda.
Ela passou por mim e pela porta, mas parou quando seu olhar atingiu as janelas; ela estremeceu.
Seus lindos olhos encontraram os meus.
— Tem certeza?
— Sim. — Eu sorri. — Vamos, eu estacionei nos fundos.
Eu disse a Helen que ia levar Belle para casa e a deixei encarregada do restaurante enquanto pegava
meu casaco no escritório. Quando abri a porta dos fundos, o ar frio me atingiu com força no rosto e
levou apenas alguns segundos para meu nariz e minhas orelhas começarem a doer. Eu não tinha ideia
de quão longe Belle morava, mas apenas um quarteirão com esse tempo, e ela teria se transformado
em um picolé.
— Gostei da sua caminhonete — Belle disse enquanto entrava, passando a mão pelo assento de
couro.
— Obrigada. — Eu virei a chave e liguei o aquecedor. — Então, para onde vamos?
Belle me deu instruções enquanto dirigíamos, e conforme nos aproximávamos cada vez mais de
uma parte inacabada e um pouco ruim da cidade, o nó no estômago apertou. Ela voltava para casa
todas as noites caminhando? Passando por esse bairro? Estávamos a quilômetros do restaurante.
Estávamos a quilômetros de sua escola.
No momento em que estacionei em seu trailer, tomei uma decisão. Molly não precisaria escolher
um estranho para receber um carro grátis.
Eu ia arrumar um carro para Belle.
— É o último à direita. — Ela apontou para a rua sem saída que passava pelo estacionamento de
trailers.
Os braços de Belle estavam ao redor da barriga enquanto ela se pressionava contra a porta. Ela não
queria que eu visse onde ela morava. A única razão pela qual ela estava me deixando levá-la para casa
era o seu total desespero.
Assim que o último trailer na rua apareceu, os braços de Belle se esticaram.
— Pare!
Eu pisei no freio, nos jogando para frente.
— O quê? — Eu me virei para ela, esperando uma explicação.
— Você pode estacionar aqui por um segundo?
— Hum… Certo. — Eu levei o carro ao lado da estrada.
O trailer dela estava a três outros de distância de onde estávamos paradas, perto o suficiente para
ver que o revestimento estava caindo aos pedaços e duas das janelas estavam cobertas com
compensado. Eu estava avaliando o carro preto brilhante na frente — um que era muito caro para o
dono do trailer — quando um homem entrou pela porta da frente de Belle.
O cara era alto, meio esguio e tinha um cabelo escuro perfeitamente penteado. Se não fosse pelo
cigarro na boca, eu o consideraria bonito. Esse era o pai de Belle? Se fosse, por que ela não iria querer
ir para casa antes que ele fosse embora?
— Você não quer que seu pai veja que eu te trouxe para casa?
Ela balançou a cabeça.
— Aquele não é meu pai. Aquele é seu amigo, Tommy.
A cor sumiu de seu rosto quando Tommy entrou no carro preto brilhante. Ela não precisava dizer
nada para eu saber que tinha medo dele. O ar na caminhonete esfriou com o medo.
Enquanto Tommy se afastava de sua casa, Belle cobriu a barriga e abaixou-se no banco. Só
quando Tommy passou correndo por nós e seu motor não pôde mais ser ouvido no estacionamento
ela se sentou.
— O que está acontecendo?
Ela não respondeu enquanto acariciava a barriga. Algo estava errado. Toda essa situação gritava que
algo estava errado. Os cabelos da minha nuca estavam arrepiados, me dizendo que as coisas estavam
muito piores para Belle do que eu jamais poderia ter imaginado.
E suspeitei que Tommy fosse a causa.
Eu me estiquei no banco e coloquei a mão em seu ombro.
— Quem é aquele tal de Tommy?
Ela acariciou a barriga sem resposta.
— Hum… Você tem um namorado? — Ela balançou a cabeça.
Droga. Isso significava que eu não poderia pular minha próxima pergunta.
— Belle, de quem é esse bebê?
Ela manteve os olhos baixos, e eu tinha certeza de que ela não iria responder, mas então ela olhou
para cima e endireitou os ombros.
— Meu. Este bebê é meu.
O bebê era de Tommy. Ela não precisava dizer o nome dele para eu adivinhar a verdade. E devido
ao seu medo óbvio, eu também estava supondo que o filho não havia sido concebido com seu
consentimento.
— Se algo está acontecendo com aquele cara, se ele está agredindo você, então precisamos ir à
polícia.
Ela balançou a cabeça.
— Não. Isso só vai piorar as coisas.
— Belle, você…
— Não! — Ela me cortou. — Não.
Suspirei.
— E seus pais? — Eles por um acaso sabiam que ela estava grávida?
— Eu só moro com meu pai, e ele sai muito. Ele está meio fora de si.
Passei a mão na testa. O que eu vou fazer? Eu tinha acabado de conhecer a garota, mas não
poderia viver bem comigo mesma se não fizesse nada para ajudar. Se ela estivesse sendo abusada por
um dos amigos do pai, não poderia continuar a viver naquele trailer. Ela certamente não poderia
levar um bebê para aquele trailer.
— Há mais alguém com quem você poderia ficar? — Alguém com plano de saúde para que ela
pudesse ter uma consulta com uma droga de um médico?
Ela encolheu os ombros.
— Minha avó mora em Oregon, e provavelmente eu poderia morar com ela, mas não tenho
dinheiro. Meu pai, hum… Ele geralmente precisa do dinheiro.
Se dinheiro fosse tudo que ela precisava, eu ficaria feliz em pagar sua passagem para Oregon. Ela
poderia ir de avião. Ou de ônibus.
De carro.
Um plano passou pela minha mente enquanto colocava a caminhonete de volta em marcha e nos
conduzia pelo restante do caminho até a casa dela.
Quando estacionei e desliguei a ignição, sua mão disparou novamente.
— Você não precisa entrar!
Peguei sua mão na minha e apertei.
— Será mais rápido se nós duas embalarmos suas coisas.
— O quê?
— Vamos. — Eu abri minha porta. — Você vai para Oregon.
— Grande dia hoje. Como você está se sentindo? — Jimmy perguntou a Poppy.
Ela se inclinou para o meu lado, nós dois atrás do balcão do restaurante.
— Bem. Eu só espero não congelar durante o jogo.
Jimmy tomou um gole de seu café, os olhos suavizando quando olhou para Poppy.
— Estou orgulhoso de você por ver isso até o final.
— Obrigada, Jimmy.
Meu braço ao redor de seus ombros a puxou para perto.
— Eu também estou.
Naquele dia Poppy, faria o último item da lista de aniversários de Jamie.
Eu estive preparado nas últimas semanas, observando-a de perto, enquanto me preparava para um
colapso. Mas eu deveria ter imaginado. Minha Poppy estava lidando com isso com pura graça. E eu
estava feliz que aquele fosse o dia final. Nós terminamos. Não havia mais nenhuma lista. Não mais
olhar para trás. Poppy e eu éramos livres para olhar para frente, para o que quer que surgisse em
nosso caminho.
— Vou só fazer algumas coisas na cozinha e depois podemos ir. — Ela deu um tapinha na minha
barriga, e eu a soltei.
— Sem pressa. Ainda temos mais uma hora.
— Vocês querem mais café? — ela perguntou a Jimmy e Randall, recebendo dois acenos de
cabeça.
— Eu pego. — Peguei o bule da cafeteira atrás de mim. — Você vai lá para trás.
— Obrigada. — Ela sorriu e desapareceu na cozinha.
Enchi novamente as canecas de Jimmy e Randall antes de completar a minha. Então caminhei ao
balcão, conversando com os clientes enquanto oferecia para encher suas canecas. O restaurante estava
cheio naquela manhã. Molly e Helen estavam correndo, limpando as mesas e entregando comida.
Poppy estava lá desde às quatro da manhã, garantido que haveria comida suficiente para o fim de
semana.
— Realmente está lotado — Randall resmungou quando voltei para perto deles.
— A boa e velha disputa Cat/Griz. É sempre cheio.
Os Bobcats da Universidade de Montana estavam enfrentando os Grizzlies no jogo anual de
futebol, Cat/Griz. A rivalidade — que se tornou famosa ao longo dos anos — atraía uma enorme
multidão para Bozeman quando os Cats sediavam o jogo a cada dois anos.
Como o jogo era sempre no terceiro fim de semana de novembro, na maioria das vezes era frio
para caralho. Nos últimos anos, eu escapei do caos do estádio e assisti ao jogo na casa dos meus pais
durante sua festa anual, mas este ano eu enfrentaria o frio com Poppy ao meu lado para que ela
pudesse terminar a lista de Jamie.
Naquele dia, ela seria carregada por uma multidão. Surfando por cima de todos.
— Droga, eu gostaria de ter arranjado um ingresso. — Jimmy suspirou. — Eu adoraria ir com
ela. Você acha que ela vai aparecer na televisão?
O brilho em seus olhos me fez rir.
— Vou gravar o jogo na minha casa, caso isso aconteça.
Deixando Jimmy e Randall brigarem, fui até a caixa registradora quando um cliente apareceu para
pagar. Depois de fechar a conta, eu passei pelas mesas, oferecendo mais café.
Eu estava ajudando no restaurante nos últimos tempos. Sempre que estava lá, fazia o meu melhor
para auxiliar Poppy e Molly. Eu apenas fazia coisas menores, como encher xícaras de café ou copos
de água. Recebia contas. Tudo que envolvia a comida, eu deixava para os funcionários de verdade.
Mas ajudar nas tarefas menores me fez sentir como parte d’O Maysen Jar — algo que Poppy parecia
amar tanto quanto eu.
Quando ela saiu da cozinha e me viu fazendo mais café, seu sorriso fez meu coração pular.
Por dentro e por fora, Poppy era a mulher mais magnífica do mundo. Minha vida começou
quando ela entrou no dojo e capturou minha alma.
— Obrigada. — Ela ficou na ponta dos pés, a bandeja na mão, para beijar minha bochecha.
— Sem problema.
Ela largou a bandeja e começou a arrumar os potes na vitrine.
— Você me faria um favor?
— Num piscar de olhos. — Isso sempre a fazia sorrir.
— Você experimentaria o pão de banana que acabei de fazer? Está na cozinha. Adicionei gotas de
chocolate, e não sei se gosto ou não.
— Por que ele sempre experimenta as coisas novas? — Randall reclamou. — Você não deveria
deixar algum de nós, quem realmente daria uma opinião honesta, tentar?
Poppy se levantou e colocou a mão no quadril.
— Ele me dá opiniões honestas.
Randall revirou os olhos quando Jimmy engasgou com café.
Babacas. Eles estavam tentando me arrumar confusão.
O queixo de Poppy caiu quando ela olhou para mim.
— Você tem mentido?
— De jeito nenhum. — Eu levantei as mãos. — Eu sempre digo a verdade. Eu amo sua comida.
Ela deu a Randall um sorriso maroto.
— Viu?
— Posso provar o raio do pão de banana ou não?
— Traga dois — Jimmy pediu.
Um jovem ao lado de Jimmy pigarreou.
— Desculpa interromper. — O garoto provavelmente tinha uns 20 anos, no máximo, e seus
olhos estavam fixos em mim. — Oficial Goodman, hum… Eu não acho que você se lembra de
mim.
Larguei meu café e me aproximei do balcão, oferecendo minha mão. Eu reconheci imediatamente
seu rosto, embora ele tivesse crescido, mas levei um momento para lembrar o nome. Qual era a
porra do nome dele? Adam? Eric?
— Isaac?
— Sim. — Ele sorriu. — Eu não queria me intrometer, mas eu vi você e só queria dizer um oi
antes de sair. E dizer obrigado. Sabe o que você fez por mim daquela vez? Me dando uma chance? —
Ele ergueu o dedo como eu fiz na noite em que dei a ele uma chance. — Eu nunca esqueci de você.
Levantei os ombros.
— Não foi grande coisa.
— Foi para mim. — Ele estendeu a mão novamente. — De qualquer forma, vou deixar você
voltar à sua conversa. Bom ver você de novo.
— Você também.
Ele acenou com a cabeça mais uma vez, então se virou e saiu. Os olhos de Poppy, Jimmy e
Randall estavam presos em mim, esperando uma explicação, mas eu fiquei quieto e observei Isaac
sair do restaurante.
Quando a porta se fechou atrás dele, peguei meu café.
— Então, pão de banana com gotas de chocolate? Vou pegar.
Antes que Jimmy e Randall pudessem perguntar sobre Isaac, entrei na cozinha com Poppy em
meus calcanhares.
— O que foi aquilo?
— Ah, nada de mais. Apenas uma criança que precisava de uma ajuda um tempo atrás.
— É isso que o “daquela vez” era? Uma ajuda?
— Sim — eu concordei. — Alguém me deu uma dessas um dia e, desde então, tenho tentado
fazer o mesmo.
— Oh — ela murmurou. — Você pode contar como foi?
Eu não gosto de falar sobre como quase estraguei minha vida, mas Poppy merecia saber. Então
puxei um banquinho da mesa da cozinha e me sentei, confessando algo que apenas um punhado de
pessoas sabia.
— Sempre soube que queria ser policial. Desde criança. Depois do colégio, eu queria ir direto para
a academia, mas meus pais queriam que eu fosse para a faculdade e obtivesse um diploma. Papai
disse que se eu tivesse meu bacharelado, isso me ajudaria a subir na hierarquia, então concordei e me
matriculei na MSU. Mas não levei o curso a sério. Pelo menos não no começo. Eu faltei a muitas
aulas e fui a muitas festas.
Poppy sentou-se no banquinho ao lado do meu.
— Você foi reprovado?
Eu ri.
— Não, mas eu definitivamente não era um aluno nota dez. Mas o lance das festas me colocou em
apuros. No meu primeiro ano, fui a uma festa em uma casa fora da cidade. Bebi muito, mas pensei
que se ficasse nas estradas secundárias, ficaria bem. No caminho de volta, quando desviei para não
acertar um veado, enfiei minha caminhonete dentro de uma vala e fiquei preso na neve.
Meu estômago revirou quando pensei naquela noite. Tive sorte de as coisas não terem sido piores.
De eu não ter machucado ninguém. De eu não ter me machucado. Do jeito que eu estava, tive sorte
de não ter destruído minha caminhonete.
— A policial que me encontrou poderia ter me levado direto para a prisão. Ela poderia ter me
multado por dirigir embriagado, e minha futura carreira como policial teria acabado. Mas ela não fez
isso. Ela colocou o dedo no meu rosto e disse: “Esta é a sua única chance”. Então ela me levou para
casa, não para os dormitórios, mas para a casa dos meus pais e ficou com as chaves da minha
caminhonete por um mês.
— Seus pais ficaram chateados?
— Pior… — Eu suspirei. — Eles ficaram desapontados.
E daquela noite em diante, tentei nunca mais decepcioná-los. Eu comecei a levar a faculdade a
sério. Aumentei minhas notas, me mantive longe de encrencas durante a graduação e entrei na
academia em seguida. Tudo porque eu tive uma chance.
— Então você ganhou sua chance e agora você dá essa chance a outras
pessoas.
Eu concordei.
— Se a situação exigir algo assim. Eu respeito a lei, e há um motivo para haver regras, mas nem
tudo é preto no branco. Algumas pessoas, como Isaac, merecem uma segunda chance.
A mão de Poppy veio ao meu rosto.
— Como eu tive tanta sorte de encontrar você?
— É o contrário, linda.
Poppy se inclinou para a frente, pressionando seus lábios macios nos meus quando a porta da
cozinha se abriu.
— Beijando de novo? — Molly deu uma risadinha.
— Sempre. — Passei meus braços em volta da cintura de Poppy, puxando-a de seu banquinho, a
mantendo entre as minhas pernas para tomar sua boca. Desta vez, não havia nada de gentil ou doce
em nosso beijo.
Este era quente e profundo — um beijo que deixou Poppy ofegante, Molly revirando os olhos e
meu pau duro atrás do zíper.
— É melhor você me dar o pão de banana — eu sussurrei. — Do contrário, vou encontrar outra
coisa para comer, e não vamos ao jogo de futebol.
Poppy se inclinou para falar em meu ouvido.
— Eu farei um acordo com você. Você prova o pão de banana, e depois eu farei uma degustação
eu mesma.
Eu gemi contra seus lábios. Eu amo essa mulher.
E como eu ainda não tinha certeza se deveria contar isso a ela, após o jogo eu mostraria a ela o
quanto.
— Cole — eu engasguei, arqueando contra seu peito. Eu estava de lado, com ele pressionado nas
minhas costas. Um braço estava embaixo do meu quadril, e seus dedos estavam no meu clitóris. Sua
outra mão estava no meu peito, apertando um mamilo entre os dedos. E enquanto seus lábios
estavam beijando meu pescoço, o pau estava investindo contra mim.
— Vamos, Poppy. Você está quase lá. — Ele pressionou os quadris contra minha bunda,
enfiando ainda mais o pau.
Minhas pernas tremiam enquanto ele acariciava com mais força, acertando o ponto dentro de
mim que me levaria ao limite. O trovão de seu batimento cardíaco contra minha espinha combinou
com o ritmo de seus quadris. Cada nervo do meu corpo estava vivo — Cole havia despertado todos
eles com seu toque ardente.
— Eu estou…
Meu orgasmo veio forte antes que eu pudesse dar um aviso a Cole. Todos os músculos do meu
corpo convulsionaram enquanto meus quadris se moviam a cada pulsar da minha vagina. Eu me
forcei a ficar de olhos abertos, piscando para afastar as manchas brancas e lágrimas dançando em
minha visão.
— Oh, meu Deus — eu ofeguei quando Cole deslizou para fora e me virou de costas. Quando ele
meteu de novo, quase me desfiz de novo.
Cole pressionou os quadris com força contra os meus.
— Isso é gostoso para caralho.
Eu murmurei concordando, fechando os olhos para saborear a sensação de Cole em cima de mim.
Ele encontrou um novo ritmo nessa posição. Um que nunca falhou em me levar novamente rumo a
outro orgasmo ofuscante.
— Estou quase lá, linda.
Falar era impossível, já que eu mal conseguia respirar, então apenas balancei a cabeça e me soltei.
Uma onda depois da outra percorreu meu corpo. Suspiros incoerentes escaparam dos meus lábios,
ao mesmo tempo que o rugido de Cole ecoou pelo quarto. Seu gozo quente deslizou entre nós
enquanto seus movimentos diminuíam. Quando ambos voltamos à Terra, Cole saiu de dentro de
mim e caiu ao meu lado. O edredom há muito havia caído no chão, e os lençóis estavam enrolados.
— Eu amo para caralho tirar férias.
Eu ri e rolei para o lado de Cole, jogando uma perna sobre a dele.
— Eu também.
Ele beijou meu cabelo.
— Foi bom ver seus pais, mas eu estaria mentindo se dissesse que não estou feliz por eles terem
partido. Senti sua falta.
— Também senti a sua.
Era a semana entre o Natal e o Ano-Novo, e Cole e eu estávamos finalmente de volta à sua cama.
Meus pais vieram para Bozeman por uma semana e, em vez de um hotel, se hospedaram na minha
casa. Eu não queria os deixar sozinhos, já que raramente os via, então também fiquei lá enquanto
Cole ficou em casa.
A barreira invisível em torno da minha casa nos manteve separados por sete noites, mas deixamos
meus pais no aeroporto naquela manhã e voltamos imediatamente para a casa dele. Com um rastro
de roupas atrás de nós, não perdemos tempo em compensar uma semana de noites dormindo
separados.
E agora estávamos tendo miniférias.
Nós dois tínhamos tirado dois dias extras de folga do trabalho, para passarmos juntos. Nosso
plano era nos isolar no quarto de Cole, a não ser para jantar na casa de Brad e Mia. Já que Cole tinha
passado o Natal comigo e minha família, estávamos comemorando com a família dele naquela noite.
A irmã de Cole, Evie, e seu marido, Zack, estariam lá para que todos pudéssemos desfrutar de um
bom jantar e trocar presentes.
Em seguida, voltaríamos para a cama.
— A que horas precisamos sair?
Cole olhou para seu despertador.
— Em uma hora.
— Então é melhor eu ir tomar banho.
Sua mão percorreu meu quadril para ir apertar minha bunda nua.
— Quer companhia?
Eu sorri, amando o ânimo de Cole. Já havíamos feito sexo três vezes naquele dia, mas longe de
mim negar ao meu homem um banho.
— Sim, por favor.
— Goodman.
Eu fiz uma careta quando Cole atendeu ao telefone. Era a manhã seguinte ao nosso jantar na casa
de Brad e Mia e, em tese, teríamos a sexta-feira de folga para nós dois.
Eu acordei cedo e preparei o café da manhã para nós dois — comemos na sala de jantar pela
primeira vez em muito tempo. Estávamos conversando sobre levar Nazboo para passear quando seu
telefone tocou, e como era o número da central, não podia ser ignorado.
— Sim, estarei aí em vinte minutos.
Caramba. Lá se foi nosso dia juntos.
— Desculpe. — Cole me deu um sorriso triste quando desligou o telefone. — Se eu pudesse
ficar, eu ficaria, mas eu realmente preciso ir para a delegacia.
— Ok. — Eu não poderia culpá-lo por ter a chance de fazer uma prisão em vez de ficar no sofá
comigo. — Tome cuidado.
— Vou tomar. — Ele se levantou e beijou minha testa, levando o prato para a pia.
Eu me levantei e o segui com o meu em mãos.
— Eu cuido da louça. Vá em frente.
— Eu vou compensar você. — Ele pegou o prato da minha mão, colocou-o sobre a mesa e me
levantou até o balcão.
Afastei seu cabelo escuro de sua testa enquanto Cole se colocava entre minhas pernas.
— O que você tem em mente?
— Que tal comprar comida chinesa no caminho de casa para um jantar fora de hora e assistirmos
a um filme?
— Posso escolher o que vamos ver?
Ele assentiu.
— Sim, mas tenho dois vetos.
— Um.
— Um. — Ele se inclinou e roçou seus lábios macios nos meus. — Preciso ir.
— Me mande uma mensagem quando você sair da central. Talvez vá com Nazboo até minha casa,
para começar a embalar as coisas.
— Não se esforce muito. Guarde um pouco de energia para mim. — Cole sorriu e me beijou
novamente antes de sair correndo da cozinha. Sua calça de moletom mostrava sua bunda perfeita sob
o algodão cinza.
Eu estava esperando passar muito tempo apertando aquela bunda hoje. Em vez disso, eu ia
começar a encaixotar as minhas coisas para poder me mudar oficialmente.
Suspirei e pulei do balcão, enxaguando os pratos e colocando-os na máquina de lavar. Eu estava
prestes a subir quando Cole desceu, vestido com jeans e um suéter grosso e verde. A malha fez o
verde em seus olhos se destacar mais do que com a polo preta normal.
— Eu amo você. — Passei meus braços em volta dele, respirando fundo o perfume fresco.
— Eu também te amo. — Cole me inclinou para trás para que seus lábios pudessem se moldar
aos meus. Sua língua escorregou entre meus dentes, fazendo cócegas, antes que ele se afastasse. —
Vejo você em breve. — Mais um beijo na minha testa, e ele se foi em direção à garagem.
Eu segurei Nazboo enquanto íamos até a porta da frente para acenar da varanda.
Nazboo soltou um gemido enquanto Cole saía da garagem e ia para a rua, deixando-a com seu
segundo dono favorito.
— Sinto muito… — Eu esfreguei suas orelhas. — Mas ele estará de volta em breve. Vamos.
Vamos empacotar algumas coisas antes que ele volte.
Corri para tomar meu banho, sem me preocupar em lavar o cabelo, depois vesti um jeans skinny,
uma blusa cinza de gola alta e minha sapatilha preta favorita. Nazboo foi no banco do carona
enquanto cruzávamos a cidade, e quando chegamos à minha casa, decidi começar a arrumar o
pequeno escritório.
Duas horas depois, eu estava sentada no chão, separando livros e papéis em três pilhas: guardar,
jogar fora e Jamie. A pilha “guardar” estava crescendo mais rapidamente, com a pilha “jogar fora” em
segundo lugar. A pilha “Jamie” era a menor, com alguns de seus livros antigos, que eu daria a Jimmy.
— Nazboo! — chamei, fazendo uma pausa na arrumação.
Ela tinha desaparecido há cerca de quinze minutos, e eu não estava ouvindo o barulho de suas
patas pelo chão de madeira, o que significava que ela tinha adormecido ou estava fazendo besteira.
Esperei e escutei, mas nada.
— Nazboo!
Desta vez, ouvi um barulho de corrida vindo da sala antes que ela aparecesse trotando pelo
corredor e entrando no escritório com um livro na boca.
— Não! — Eu pulei do chão. — Feiosa! — Arranquei o livro de sua boca e apontei o dedo em
seu focinho. — Feiosa, Nazboo. Não. Não. Não. Não pode mastigar livros. — Caramba. Ela não era
inteiramente culpada. Na minha pressa pela manhã, esqueci de pegar seus ossinhos de couro cru.
Saí do escritório e fui para a cozinha, pegando uma toalha de papel para limpar o livro. Assim que
secou, reconheci-o como um dos que estavam na pilha de Jamie.
— Jimmy não vai querer este agora. — A capa estava destruída, com marcas de dentes e baba,
embora o interior não estivesse tão ruim. Folheei as páginas, surpresa, quando uma carta dobrada ao
meio caiu.
Dobrada em três partes, a dobra superior tinha a inscrição “Para Jamie em seu 35° aniversário”.
— Ah, meu Deus. — Eu engasguei e cobri a boca.
Era ela. A carta que pensei ter perdido. A carta que Jamie escrevera para si mesmo em dez anos.
A carta que Jamie havia escrito no dia em que morreu.
Essa carta era uma das duas únicas coisas na lista de aniversários que Jamie fizera sozinho. Eu
procurei muito por aquela carta. Eu coloquei a casa abaixo um ano após sua morte, mas nunca
consegui encontrá-la. Mas estava ali o tempo todo, enfiada em um livro que Nazboo usara como
mordedor.
E agora eu podia finalmente ler as últimas palavras que Jamie escrevera.
Lágrimas ameaçaram cair, mas engoli a queimação na garganta e respirei fundo duas vezes. Em
seguida, fui para a minha pequena mesa de jantar e me sentei. Cuidadosamente, abri a carta,
sorrindo para a caligrafia desleixada de Jamie. Ele escreveu apenas a metade superior da folha. É claro
que sua carta não era longa — não era o seu estilo.
Respirei fundo, antes de ler suas palavras.
Meu eu mais velho,
Você está chegando lá, cara, então, antes de chegar aos
quarenta, eu queria te dar um conselho. Não tenha uma
crise de meia-idade. Não seja esse cara. É triste e patético e
realmente me irritaria. Olhe em volta. Tenho certeza de que
você ainda é legal, já que sou eu. Sua esposa é gostosa
demais. A vida é boa. Portanto, continue sendo legal e seja
bom para Poppy. Ela é a melhor coisa que já te aconteceu.
Não estrague tudo.
Meu eu mais novo.
Eu ri enquanto as lágrimas enchiam meus olhos. Isso era tão… tão Jamie. Essa carta era um
conjunto de todas as coisas maravilhosas, ridículas e doces que meu marido tinha sido.
E eu estava tão feliz por a ter encontrado. Agora eu poderia colocá-la junto com sua lista de
aniversários, onde ela pertencia.
Obrigada, Jamie. Obrigada por me ajudar a encontrá-la. Se foi Jamie ou não, eu não sabia. Eu só
estava grata por outra coincidência ter me levado à sua carta.
Essas incríveis coincidências.
E talvez fosse bobagem, mas eu estava agradecendo ao acaso por me trazer Cole.
Funguei, sorrindo novamente com os olhos embaçados enquanto relia a carta. Então dobrei-a e a
levei para minha bolsa, colocando-a no diário de Jamie. No dia seguinte, eu deixaria Jimmy ler
também. Ele ia gostar.
Depois que o diário foi guardado em segurança, me abaixei para coçar as orelhas de Nazboo.
— Acho que você não está encrencada, depois de tudo. Mas chega de tentar comer livros,
entendeu?
Ela lambeu meu rosto.
— Estou supondo que isso seja um “sim”. — Fiquei de pé e me dirigi até a garagem. — Vamos lá.
Vamos ver se conseguimos encontrar algumas caixas.
Outra hora depois, encaixotei a pilha que ia guardar e coloquei no carro. Joguei no lixo as coisas da
pilha “jogar fora” e estava olhando meu telefone para ver se Cole tinha mandado uma mensagem. Ele
não tinha, então decidi começar a arrumar a cozinha.
Uma hora depois, quando todas as gavetas foram esvaziadas e limpas, verifiquei o telefone
novamente, ainda não vendo nada de Cole.
— Ele deve estar ocupado, só isso — disse a Nazboo.
Seus olhos castanhos se abriram, mas, por outro lado, ela não se moveu de onde tinha adormecido
ao lado da geladeira.
— Vou mandar uma mensagem para ele.
Mandei um texto curto, perguntando se tinha alguma ideia de quando terminaria o trabalho na
delegacia, e então voltei a empacotar as coisas.
Os minutos passaram, e meu telefone ficou em silêncio no balcão. Meus olhos se voltavam para a
tela com tanta frequência, que perdi o foco do trabalho com as caixas. Mas não importava o quanto
tentava me concentrar em separar os pratos e eletrodomésticos da cozinha das demais coisas, eu não
conseguia parar de olhar constantemente para o telefone. E a cada momento que ficava sem uma
resposta, meu pânico aumentava.
Havia algo estranhamente familiar naquilo. Algo totalmente indesejável. Memórias atormentaram
minha mente com a última vez em que estive naquela cozinha, desesperada para ouvir o telefone
tocar.
Ele está bem. Está só trabalhando. Lembrei repetidamente que Cole estava bem. Que a pontada de
ansiedade na nuca era só porque eu estava naquela casa. Que encontrar a carta de Jamie havia trazido
de volta velhas lembranças. Isso é apenas um déjà-vu.
Apesar dos meus melhores esforços para não comparar o passado e o presente, quando a
campainha tocou, uma lança de terror cortou meu coração. Prendi a respiração quando meus pés
instáveis dobraram a esquina da entrada da cozinha.
Meus olhos vasculharam a janela da porta e, por um momento, fui levada de volta para cinco anos
antes. Levei um segundo para separar a memória da realidade, mas quando o fiz, a onda de alívio que
caiu sobre mim quase me derrubou.
O rosto bonito de Cole estava do outro lado do vidro.
Corri pelo corredor — Nazboo corria para me alcançar — e destranquei a porta.
— Oi — eu respirei, pressionando a mão no coração ainda batendo num ritmo acelerado. — Esse
foi o déjà-vu mais intenso…
Parei de falar ao ver o olhar de Cole. Ele estava cheio de dor. De pavor. Eu tinha visto essa
combinação em seus olhos antes. Era a mesma que ele tinha na noite em que esteve nesta mesma
varanda e me disse que meu marido havia sido assassinado.
— Cole?
Minha voz pareceu piorar a dor, e seu rosto inteiro se contorceu em agonia.
— Você está me assustando. O que é? Diga. — Esperei três batimentos cardíacos antes de falar
novamente. — Por favor.
Ele engoliu em seco.
— Encontramos a pessoa que matou o Jamie.
Minha mão apertou minha boca, mas um soluço ainda escapou. Nenhuma respiração profunda
conseguiu manter minhas lágrimas longe, e elas inundaram meus olhos, escorrendo pelo meu rosto.
— Você encontrou? Acabou? — Uma incrível sensação de encerramento se instalou em meu
peito. Eu ainda estava chorando, mas as lágrimas não estavam mais repletas de medo. Elas estavam
repletas de alívio. Tinha acabado.
Cole concordou com a cabeça, mas não parecia nem um pouco aliviado. Não eram boas notícias?
Um assassino estava fora das ruas. Ele encontrou o bandido. Por que ele ainda parecia querer estar
em qualquer lugar exceto na varanda da minha casa?
— Tem mais. — Sua voz falhou.
A tensão voltou correndo, preenchendo meus músculos enquanto eu ficava em silêncio, esperando
que Cole continuasse.
Quando ele olhou para os pés e depois levantou o olhar novamente, as lágrimas em seus olhos
martelaram em meu peito.
— O quê? — implorei. — O que você não quer me dizer?
Uma lágrima rolou por sua bochecha.
— É minha culpa. É minha culpa que Jamie tenha sido assassinado.
— Ei. — Entrei na área de observação ligada à sala de interrogatório. Matt estava parado perto do
espelho falso, encarando a mulher que ele chamou para o interrogatório.
— Ei. Desculpe te chamar, mas achei que você desejaria estar presente.
— Ok. — Eu me aproximei do vidro.
A mulher sentada à mesa era jovem, provavelmente com vinte e poucos anos. O cabelo era
cortado curto, como o de um homem, exceto pela massa que compunha a franja que cobria a testa e
caía completamente sobre um olho, cobrindo parte do outro. As raízes eram pretas, mas a franja era
quase branca. Seus ombros estavam curvados para a frente enquanto os cotovelos repousavam sobre
a mesa, mas mesmo com a posição curvada, você poderia dizer que ela tinha uma estrutura larga.
Muito maior do que a maioria das mulheres.
E ela era familiar. A cabeça estava inclinada para baixo, então eu não conseguia dar uma boa
olhada em seu rosto — aquele maldito cabelo estava no caminho —, mas ela era familiar. Eu
procurei na memória, mas quando nada apareceu, deixei de lado. Provavelmente só a achei familiar
porque a vi em alguma gravação de segurança.
— Quem é?
Matt me entregou uma pasta de papel pardo.
— Nina Veras. Ela é a número onze em nossa lista de possíveis suspeitos, e eu a trouxe esta manhã
para fazer algumas perguntas sobre o assassinato. Quando recebi duas respostas diferentes para a
mesma pergunta, fui ligar para você. Tenho a sensação de que descobrimos algo aqui.
Eu balancei a cabeça e abri o arquivo.
Nina Veras tinha vinte e dois anos. Ela trabalhava como barista em uma das cafeterias do centro.
Ela não tinha ficha criminal. Sem multas por excesso de velocidade. Sem multas de estacionamento.
— Eu confio no seu instinto, então se você tem um pressentimento, vou segui-lo. Mas, Matt, essa
garota está completamente limpa.
— Você tem razão. Ela está. Mas dê uma olhada nisso. — Ele me entregou outro arquivo. — Esse
é o namorado dela. Eu obtive essa informação pouco antes de você chegar aqui. Parece familiar?
A foto de um arquivo policial com um clipe de papel levantou os pelos dos meus braços. Com
olhos escuros e uma bandana vermelha amarrada sobre o cabelo preto, o homem da foto estava
usando uma camisa branca puída enquanto olhava para a câmera e segurava sua placa de
identificação. Uma pegada de cachorro estava tatuada em um de seus ombros. Na base do pescoço
estavam as letras MDS — Membro de Sangue.
Não tive dificuldade para atribuir um nome àquele rosto.
— Samuel Long é o namorado dela?
Matt acenou com a cabeça.
— Merda.
Samuel era um conhecido membro da gangue dos Membros de Sangue. Ele e alguns de seus
companheiros estavam sob vigilância da força-tarefa de gangues. Eu examinei o arquivo de Samuel,
parando após as três primeiras páginas porque eu já tinha visto o suficiente. Vandalismo. Roubo.
Tráfico de drogas.
Tudo relacionado a gangues.
Montana tinha visto um aumento na atividade de gangues nos últimos dez anos. Algumas delas
vieram da Califórnia para reivindicar seus direitos. Nosso departamento tinha sido diligente em
deixar claro que Bozeman não era lugar para eles, mas à medida que a cidade crescia e nossos recursos
se esgotavam, controlar o fluxo se tornou mais difícil.
Nina Veras não parecia uma suspeita de assassinato, mas eu aprendi ao longo dos anos a nunca
descartar a influência de uma gangue. Eles eram mestres em lavagem cerebral, prendendo crianças
com tanta força em seu círculo, que nem mesmo os pais conseguiam tirá-los de sua influência.
E se Samuel Long tinha suas garras fincadas em Nina Veras, não havia como saber o que ele pediu
que ela fizesse.
— Então, qual é o seu plano?
Matt colocou os arquivos em uma cadeira atrás de nós.
— Eu sei que você não vai gostar disso, mas gostaria que Simmons viesse e ajudasse com o
interrogatório.
— Não.
— Me ouça. — Ele me parou antes que eu pudesse protestar novamente. — Simmons é uma
merda no trabalho de campo, nós dois sabemos disso, mas ele tem mais confissões documentadas do
que qualquer outro oficial do DPB. Se vamos arrancar alguma coisa dela antes que se feche, ele é
nossa melhor aposta.
Eu soltei um suspiro irritado, esfregando o queixo enquanto considerava o ponto de Matt.
Simmons tinha um talento especial na sala de interrogatório, isso eu podia admitir. Ele era capaz de
conquistar a confiança dos suspeitos mais rápido do que qualquer outra pessoa que eu conhecia.
Talvez fosse seu físico rechonchudo — ele estava longe de ser intimidador —, mas de qualquer
forma, Matt provavelmente estava certo. Trazer Simmons para ajudar era um movimento inteligente.
— Certo.
Matt me deu um tapinha no ombro e saiu da sala de observação sem dizer outra palavra. Quinze
minutos depois, eu estava encarando o espelho quando ele entrou com Simmons em seus
calcanhares.
— Nina, este é o detetive Simmons. — Matt se sentou na cadeira em frente a ela. — Ele vai ouvir
enquanto conversamos, ok?
Ela assentiu com a cabeça, seus olhos disparando para Simmons, antes de voltar para os dedos. Ela
estava cutucando as cutículas com tanto nervosismo, que uma delas começou a sangrar.
Sentei-me em uma das cadeiras e observei Matt fazer algumas perguntas básicas. “Você se lembra do
assassinato da loja de bebidas há cinco anos? Você consegue se lembrar de onde você estava naquela época?”.
Cada pergunta foi respondida com um aceno de cabeça. Os minutos se passaram, e minhas
esperanças de conseguir que Nina nos desse alguma pista sobre seu paradeiro naquele dia diminuía
cada vez mais. Suas respostas foram as mais curtas possíveis, e ela se recusou a fazer contato visual
com Matt — que estava ficando tão frustrado quanto eu, com base nos punhos se abrindo e
fechando por baixo da mesa.
Matt voltou ao começo, repetindo uma pergunta que ele já havia feito, quando Simmons estendeu
a mão, se colocando à frente na situação.
Simmons começou a fazer perguntas a Nina que não tinham nada a ver com o caso. Ele fez isso
por uma hora. Então outra. E quando estava completando quase três horas que eu estava naquela sala
olhando a jovem, sua armadura finalmente começou a rachar. Eles conversaram sobre o trabalho dela
na cafeteria. O que ela fez no Natal na semana passada. Sobre ela apreciar a neve fresca.
Enquanto Simmons e Nina conversavam sobre um filme que ambos viram recentemente, Matt
pediu licença para sair da sala de interrogatório e se juntou a mim para observar.
Assistimos Simmons se levantar e trazer para ela um copo de papel com água do refrigerador no
canto da sala.
— Agradeço que tenha vindo nos visitar hoje. Lamento que esteja demorando tanto.
— Posso ir?
— Em breve. — Simmons voltou a se sentar. — Mas primeiro preciso fazer algumas perguntas
sobre o seu namorado.
O rosto de Nina empalideceu.
— Ok.
Passei a mão pelo cabelo.
— Onde ele quer chegar com isso, Matt?
— E eu sei lá? Mas ele chegou mais longe com ela do que eu, então tenho certeza de que ele tem
um plano.
Eu definitivamente esperava que sim. Quanto mais assistia, mais a bola em meu estômago se
torcia. Matt estava certo. Havia algo. Assim como ele, eu tinha um pressentimento sobre essa
mulher, e não podíamos permitir que Simmons estragasse tudo.
— Nina, eu sei que o detetive Hernandez explicou que você estava aqui porque tínhamos algumas
perguntas sobre um assassinato há cinco anos.
Ela acenou com a cabeça para Simmons.
— Você se lembra daquele dia?
Seus olhos dispararam para o espelho.
— Não.
Mentira. Sua linguagem corporal era óbvia. Ela com certeza se lembrava daquele dia. Apostava
minha vida nisso.
— Hmmm — Simmons murmurou. — Foi em maio. O assassinato aconteceu em uma loja de
bebidas. A loja fechou, mas costumava ficar próxima do supermercado na Twenty-Third. Você sabe
de qual estou falando?
— Sim. Eu acho.
— Bem, foi há muito tempo. Posso imaginar que você esqueceria algo depois de cinco anos. Você
teria quantos, dezessete anos?
Ela concordou.
— E seu namorado, ele teria vinte e três anos. Correto?
— Hum, vinte e dois. Ele é cinco anos mais velho que eu.
— Você tem razão. — Simmons deu uma risadinha. — Eu nunca fui bom em matemática. Que
bom que um de nós tem uma boa cabeça para números aqui.
Nina deu a ele um pequeno sorriso, mas manteve os olhos fixos na mesa.
— Escute, serei direto com você. Temos motivos para acreditar que seu namorado cometeu os
assassinatos na loja de bebidas.
Sua cabeça voou para cima, os olhos como pires enquanto ela engasgava.
— Que porra é essa? — eu murmurei, me inclinando para a borda da cadeira. O que Simmons
estava fazendo?
— Você parece uma garota legal, Nina. Mas seu namorado está envolvido em algumas coisas
ruins. Vamos trazê-lo mais tarde, hoje mesmo, e acusá-lo de dois homicídios em primeiro grau. Eu
não quero que você se envolva nisso tudo, então eu preciso que você pense. Pense de verdade. Onde
você estava na hora dos assassinatos?
Ela balançou a cabeça, os olhos se enchendo de lágrimas.
— Não. Ele não matou ninguém.
— Isso é muito importante, Nina. — Simmons pressionou mais. — O promotor quer pedir pena
de morte. Você pode ser considerada cúmplice se não pudermos confirmar seu álibi. Então pense.
Onde você estava?
Uma lágrima rolou por sua bochecha enquanto ela balançava a cabeça.
— Ele não matou ninguém.
— Nina, ele matou. Ele vai para a prisão pelo restante da vida. Se ele tiver sorte, eles vão lhe dar
duas sentenças de prisão perpétua. Ele vai passar o resto da vida na prisão, e isso se tiver a sorte de
encontrar um juiz que não ordenará a injeção letal. Samuel está acabado. Ele está morto. Não acabe
na prisão também. Diga-me, onde você estava no dia do assassinato?
Ela chorou mais, enterrando o rosto nas mãos enquanto os ombros tremiam.
Quase me senti mal pela garota. Quase. Simmons estava usando o amor pelo namorado e algumas
mentiras bem contadas para derrubar seus muros. Ele estava se aproveitando de sua juventude e o
estresse emocional de ficar presa em uma sala sem cor por horas. Simmons estava usando tudo para
levá-la ao limite.
— Nina — ele disse suavemente. — Apenas me diga o que aconteceu. Eu farei o que puder para
ajudá-la. Só… desabafa. Diga-me o que aconteceu.
Ela soluçou de novo, depois abaixou as mãos. Seus olhos imploravam a Simmons para entender.
— Samuel não os matou. Por favor, não foi ele.
Simmons esperou, esticando o silêncio até que fosse quase insuportável, até que finalmente Nina
sussurrou:
— Fui eu.
As palavras saíram de sua boca e ecoaram no ar enquanto a culpa, o alívio e a tristeza tomavam
conta do seu rosto.
Talvez ela quisesse confessar. Talvez ela estivesse cansada de se segurar. Qualquer que fosse o
motivo, não havia dúvida da verdade em sua voz.
Nina Veras matou Jamie Maysen e Kennedy Hastings.
Eu caí de volta na minha cadeira, chocado. Simmons tinha conseguido. Ele foi a chave para
resolver o caso o tempo todo.
Eu estava tendo esperança, rezando para que nos fosse concedido um milagre. Eu queria que esse
dia chegasse. Mas eu nunca pensei que isso realmente fosse acontecer. Nunca pensei em como me
sentiria neste momento.
Fiquei aliviado. Eu estava grato. Mas foi doloroso também.
Eu estava machucado. Por Jamie. Por Kennedy. E Poppy. Meu coração doía agora que tínhamos
descoberto a verdade.
Que uma garota de dezessete anos matou duas pessoas.
— Ele conseguiu — Matt sussurrou. — Puta merda, ele conseguiu.
Simmons estendeu o braço sobre a mesa e pegou a mão de Nina enquanto ela chorava.
— Ok, Nina. Diga-me o que aconteceu.
Durante os trinta minutos seguintes, Matt e eu nos sentamos e assistimos enquanto Nina Veras
fazia uma confissão completa sobre os assassinatos na loja de bebidas.
Como Matt havia suspeitado, o envolvimento dela com Samuel tinha sido o motivo. O casal tinha
acabado de se mudar de Los Angeles para Montana, onde Samuel era um membro de longa data da
gangue. Ele foi enviado para a cidade para caçar mais aliados, ganhar dinheiro e começar uma nova
unidade para a gangue.
E parte de sua unidade era uma namorada disposta a fazer tudo o que pedisse, sem perguntas.
Então Samuel mandou Nina para a loja de bebidas com uma arma e ordens claras. Pegar o
dinheiro no caixa. Se alguém se recusasse ou tentasse reagir, matar a pessoa.
Foi o seu teste.
Nina jurou por tudo que sabia que o primeiro tiro fora um acidente. Que ela não queria matar
ninguém, mas a arma disparou em suas mãos trêmulas. Talvez isso tenha sido verdade quanto ao
primeiro tiro. Mas duas vezes? Eu não acreditei. Acho que ela entrou em pânico e matou Kennedy
para se salvar — não que minha opinião importasse.
Um juiz e um júri decidiriam seu destino.
— Eu não posso acreditar em tudo isso. — Matt balançou a cabeça. — Devíamos tê-la
encontrado no banheiro.
— Sim. — eu bufei. — Nós deveríamos.
Depois que saiu correndo da loja de bebidas, Nina desapareceu atrás do complexo comercial. Ela
tirou o moletom e o boné de beisebol e, como eu suspeitava, entrou sorrateiramente na área de carga
e descarga do supermercado.
Ela se escondeu em uma cabine sob a pia do banheiro feminino — um lugar que poucos homens
caberiam, o que era o provável motivo de ninguém ter verificado. Ela ficou escondida por duas
horas, saindo apenas quando Samuel mandou uma mensagem dizendo que a polícia havia
terminado de procurar pelo supermercado.
Samuel — aquele filho da puta — estava no estacionamento o tempo todo.
Ele entrou no supermercado, pegou algumas sacolas plásticas e entrou no banheiro. Em seguida, a
dupla levou o disfarce e a arma de Nina pela porta da frente como se tivesse acabado de comprar
bifes para o jantar.
Sendo tão jovem, eu tinha dispensado Nina como suspeita quando a vi no vídeo. Assim como
todos os policiais fizeram naquele dia, enquanto observavam o jovem casal caminhar até seu carro
preto e ir embora.
Deixando vidas arruinadas em seu rastro.
— Como vou dizer tudo isso a Poppy?
— Não sei. — Matt se levantou da cadeira. — Mas é bom que você seja a pessoa a dar a notícia.
Eu segui Matt para a saída da sala de observação até o corredor, mas parei quando a porta da sala
de interrogatório se abriu. Com Simmons gesticulando para que ela andasse, Nina saiu para o
corredor. Seus olhos estavam voltados para os pés, mas quando ela nos viu, olhou para cima. Então,
com uma mão, ela escovou o cabelo para trás, segurando-o longe dos olhos.
Pela primeira vez, tive uma visão completa de seu rosto. Um rosto que eu reconheci. Um rosto
que encontrei anos antes.
Meus pés vacilaram, e meu ombro bateu na parede. O tempo diminuindo a velocidade enquanto
Nina olhava para mim, o reconhecimento surgindo em seu rosto ao mesmo tempo que no meu. Ela
sustentou meu olhar, sem piscar, até que Simmons a arrastou pelo corredor para registrar sua prisão.
Não. Não, não poderia ser ela. Nina Veras não poderia ser a garota que eu peguei seis anos antes
em uma noite de patrulha. Não poderia ser ela.
Só que era ela.
— Por favor. Por favor, oficial, por favor. — A garota se agarrou ao meu braço. — Por favor, não me
prenda. Eu prometo, eu nunca vou fazer algo assim novamente.
— Olha, garota. Eu sinto muito. Mas você e seus amigos estavam vandalizando propriedade privada.
Grafite é ilegal, mesmo que aquele prédio esteja condenado. Eu não posso deixar você ir embora. —
Especialmente porque ela foi a única do grupo que eu consegui pegar.
— Não. — Seus olhos me imploraram enquanto ela falava. — Eu juro. Eu nem estava grafitando. Veja.
— Ela ergueu os dedos, todos limpos.
— Então você não vai ter muitos problemas. Vamos. — Peguei seu cotovelo e comecei a levá-la de volta
ao meu carro.
—— Por favor. — Ela era alta, provavelmente 1,80 m, então conseguiu acompanhar meus passos
enquanto continuava implorando. — Eu tenho apenas dezesseis anos. Se você me fichar, eles me mandarão
de volta para a Califórnia. Mas eu não posso voltar. Eu não posso. O namorado da minha mãe… — Ela
parou, puxando meus braços, então eu parei também. — Por favor. Eu não posso voltar a morar com ele. —
Com a mão livre, ela ergueu o cabelo comprido e escuro da nuca, revelando um aglomerado de seis
queimaduras de cigarro brilhando sob o poste de luz.
Porra. Essa garota pode estar brincando comigo, mas as lágrimas em seus olhos e o tormento em seu rosto
pareciam verdadeiros.
— Você tem dezesseis anos?
Ela assentiu.
— Como veio parar em Montana?
— Eu vim com meu namorado. Ele tem vinte e um anos, e nos mudamos para cá juntos. Mas meu pai
mora aqui, ele só não tem a custódia oficial.
— E esse namorado era um dos meliantes que estavam pichando aquela parede?
Ela balançou a cabeça.
— Não.
Meus olhos se estreitaram com sua mentira.
— Mesmo?
— Eu não vou fazer isso de novo — ela sussurrou. — Por favor.
Eu soltei o seu braço e respirei fundo. Sem deixar vestígios nas mãos, não poderia provar que ela estava
pichando. Tudo o que eu poderia provar é que ela estava com o grupo, o que significava que provavelmente
seria solta com um tapinha na mão e uma passagem só de ida para o serviço social na Califórnia. Então, em
vez de arrastá-la para a minha viatura, coloquei um dedo em seu rosto.
— Esta é a sua chance. Sua única chance. Se eu pegar você de novo, eu mesmo vou levar seu rabo para a
Califórnia.
— Obrigada. — Ela jogou os braços em volta da minha cintura. — Obrigada. — No segundo que ela
me soltou, se virou e correu na direção oposta.
— Mantenha-se na linha! — eu gritei para ela.
— Me manterei! — Ela acenou e desapareceu na esquina.
— Cole. — Matt colocou a mão em meu ombro. — Cole, você está bem?
Eu observei Simmons escoltar Nina Veras pelo corredor. Quando eles estavam fora de vista, eu
balancei a cabeça, afundando no chão enquanto o mundo virava de cabeça para baixo.
Se não fosse por mim, Nina Veras teria voltado para a Califórnia.
Ela teria entrado no sistema. Estaria a quilômetros de distância da loja de bebidas e de Samuel
Long.
E o marido de Poppy estaria vivo.
Quinquagésimo aniversário:
Mudar a vida de alguém
O toque estridente do meu alarme fez meu crânio doer a ponto de eu não enxergar direito. Enterrei o
rosto no travesseiro enquanto batia o punho na mesa de cabeceira, errando o despertador na primeira
vez, mas esmagando-o na segunda tentativa. Então cobri a cabeça com o outro travesseiro — o
travesseiro de Poppy — e desejei que as batidas nas minhas têmporas parassem.
— Porra — eu gemi enquanto ficava pior.
Eu não podia nem reclamar. Eu mereci a ressaca. Por tudo que fiz, aquela foi apenas uma fração
da punição que eu merecia.
Três dias se passaram desde que eu fui à casa de Poppy e contei a ela as últimas notícias. Três dias
desde que me sentei ao lado dela naquele único degrau em sua varanda e expliquei tudo. Como Nina
Veras matou Jamie. Como ela enganou a polícia e escapou. Como a única razão para ela ter estado
em Montana era porque eu tinha sido muito molenga para mandar o rabo daquela garota de volta
para a Califórnia.
Como a perda do marido de Poppy foi minha culpa. Ela ficou em silêncio enquanto eu fazia a
confissão. Ela se sentou como uma estátua, olhando fixamente para o jardim da frente. O único
movimento veio de sua respiração superficial e das lágrimas escorrendo pelo rosto enquanto eu partia
seu coração. Só depois que terminei, depois de ficarmos sentados em um silêncio doloroso por uma
hora, ela finalmente me pediu para ir embora.
Dirigindo para casa naquela noite, eu sabia que a tinha perdido.
Mandei uma mensagem para ela no dia seguinte, apenas para checar como estávamos, mas não
obtive muitas respostas. “Estou bem. Apenas ocupada. Ligo em breve.”
Ocupada.
Tinha certeza de que ela esteve ocupada. Ocupada contando à sua família e à de Jamie as notícias
sobre a investigação. Ocupada me bloqueando de sua mente.
Então passei os últimos três dias trancado em casa, esperando o telefone tocar, lamentando a
melhor coisa que já tive em minha vida estar perdida.
O Bourbon que bebi na noite anterior não ajudou. Meu coração ainda estava em pedaços — a dor
no peito era apenas outro bônus do caralho para fazer companhia à dor de cabeça de rachar o crânio.
— Cole! — o grito de papai subiu as escadas.
Droga. Eu nunca deveria ter dado a ele a chave da minha casa. A última coisa que eu queria era ver
meu pai. Ver a decepção gravada em seu rosto. Eu não precisava da porra de um público enquanto
minha vida saía do controle. Eu não poderia simplesmente sofrer sozinho?
— Cole!
Eu acho que não.
Tirando o lençol das minhas pernas, eu me forcei a sentar. O quarto estava girando tão rápido
quanto meu estômago, mas engoli a vontade de vomitar e me levantei. Com os pés instáveis, eu me
arrastei para fora do quarto e pelo corredor.
— Cole! Desce aqui agora!
— Estou indo! — gritei tão alto quanto minha cabeça e minha voz rouca de sono permitiam. —
Apenas me dê um segundo, merda.
A cada passo, sentia latejar atrás dos olhos — a luz das janelas só piorava as coisas. Quando desci
as escadas, fui direto para o sofá e desabei para não vomitar ou desmaiar.
— O que você está fazendo aqui?
Papai suspirou e se sentou na mesa de centro.
— Matt Hernandez me ligou esta manhã. Ele está tentando falar com você desde a noite passada,
mas continua caindo na caixa-postal.
Merda. Onde estava meu telefone? Deve ter morrido em algum momento à noite, e eu estava
bêbado demais para reparar. Poppy tentou ligar?
— O que Matt queria?
— Só saber como você está.
— Ele…?
— Contou que vocês encontraram a assassina de Jamie Maysen na sexta-feira? Sim.
Eu grunhi. Não tinha energia para repetir a história novamente e tinha certeza de que Matt havia
dito a ele tudo sobre Nina Veras.
— Então?
— Então eu ouvi a história de Matt. — Ele fez uma pausa. — E depois fui para casa dela e
descobri o resto com Poppy.
Meus olhos se abriram quando me endireitei.
— Você a viu? Ela está bem?
Era dia do Ano-Novo — aniversário de Jamie —, e eu não conseguia imaginar que aquele seria
um dia mais fácil para ela. Eu odiei não estar ao lado dela, mas a última coisa que queria era minha
presença piorando as coisas.
— Ela está bem. Triste, como era de se esperar.
Eu afundei de volta no sofá e encarei o teto. Todo esse tempo eu estive me esforçando para fazer
Poppy feliz. Se eu soubesse que a melhor coisa que poderia ter feito por ela era ficar longe…
— Cole, olhe para mim. — Os olhos de papai suavizaram com sua voz. — Só há uma pessoa que
se possa culpar por esse assassinato. E não é você.
Eu balancei a cabeça.
— Não. Não. Isso é minha culpa.
— Porra nenhuma. — Seu rosnado me fez estremecer. — Todos nós damos avisos e chances.
Cada policial nos Estados Unidos já liberou alguém com apenas um aviso. Seja uma multa por
excesso de velocidade para uma mãe que está atrasada para pegar o filho no futebol ou um
universitário que bebeu demais. Ou até mesmo uma garota que estava pichando um velho muro que
já foi demolido. Se você é o culpado, então pode muito bem nos condenar também.
Suspirei e abaixei a cabeça.
— Poppy perdeu o marido. Eu poderia ter evitado isso.
— Eu simplesmente não acredito que isso seja verdade, e se você parasse para pensar por um
minuto, provavelmente também não. Não há garantias de que a garota teria sido mandada embora
para a Califórnia. E mesmo que ela tivesse sido mandada para longe, tudo que seria necessário seria
uma passagem de ônibus para trazê-la de volta. A única pessoa culpada por esse assassinato é ela.
Você está me ouvindo? Ela. Não você.
Minha garganta começou a fechar.
— Não importa. Tudo o que importa é Poppy, e eu a perdi.
— Então vá atrás dela.
Sem mais outra palavra, meu pai se levantou e saiu.
Ele saiu pela porta da frente, mas suas palavras permaneceram ecoando na minha sala de estar.
Então vá atrás dela.
Ela me pediu para ir. Ela não tinha ligado. Ela não ia me querer por perto. Ia? Como a pergunta
não foi respondida, eu me obriguei a sair do sofá e me arrastei para a cozinha. As palavras de papai
ainda ecoavam em meus ouvidos.
Então vá atrás dela.
Enchi um copo d’água e mandei ver nele junto com três analgésicos.
Eu queria vê-la, mas a verdade é que estava com medo. Eu não tinha me mantido longe por causa
de alguma mensagem. Eu fiquei longe por causa das minhas próprias inseguranças — meu próprio
ciúme. Eu presumi que ela ainda estava tão apaixonada por Jamie, que nunca veria nada além dessa
horrível coincidência. Que ela nunca me perdoaria.
Quando, na realidade, eu não tive fé o suficiente nela.
Poppy tinha amor suficiente por nós dois.
Então vá atrás dela.
Talvez as coisas fossem realmente mais simples.
Coloquei o copo na pia, ignorando a dor nas têmporas, e corri para as escadas. Fui direto para o
banheiro, não esperei a água esquentar antes de entrar no chuveiro. Então eu lavei a bebedeira e a
aversão por mim mesmo, saindo limpo e pronto para encontrar Poppy.
Não havia garantia de que ela me perdoaria. Sem garantia de que passaríamos por isso juntos. Mas
eu ia encontrá-la e descobrir. Eu não ia deixar meus próprios problemas me afastarem por mais nem
um minuto dela.
Eu dirigi para o restaurante primeiro, mas como o carro dela não estava lá, virei minha
caminhonete e fui na direção oposta, rumo à casa. Uma nova placa Vende-se estava no seu jardim
juntamente com uma outra escrito Vendida já colocada na frente.
Que porra era aquela? Ela já tinha vendido a casa? Eu estive aqui há três dias, e a residência não
havia sido nem anunciada.
Estacionei em frente à garagem e fui até a porta, batendo, mas sem esperar resposta. Todas as
janelas estavam escuras, e, por dentro, eu só conseguia ver cômodos vazios. Onde ela estava? Onde
estavam as coisas dela?
Minha mão mergulhou no bolso em busca do telefone.
— Merda — eu murmurei quando ela voltou vazia.
Eu não estava com meu celular. Ele estava sem bateria em algum lugar da minha casa.
Amaldiçoando-me por ficar tão bêbado na noite passada, corri de volta para minha casa,
mentalmente montando meu discurso de desculpas assim que tivesse carregado meu telefone.
Eu estacionei em casa, apertando o botão no controle remoto da garagem, mas dei uma segunda
olhada e então reparei em algo na minha varanda.
Duas cadeiras de balanço brancas — cadeiras que Poppy jurou que compraria depois de se mudar
— foram colocadas perfeitamente na frente do corrimão.
Ela esteve aqui? Eu examinei a rua, procurando o carro dela, mas não estava ali. O que significava
que havíamos nos cruzado pelo caminho. Enquanto eu estava procurando por ela, ela esteve aqui.
Mas por que ela foi embora?
Não perdendo tempo estacionando na garagem, deixei minha caminhonete na entrada e corri pelo
quintal coberto de neve, subindo os degraus da varanda de dois em dois. Mas no momento em que
meu pé pousou no patamar principal, eu congelei.
Encostados na porta da frente havia dois livros. Um que eu nunca tinha visto antes. E outro que
eu já tinha visto. Era o diário de Jamie Maysen com sua lista de aniversários. E em cima dos dois
livros havia uma carta com meu nome escrito na caligrafia elegante de Poppy.
Peguei os dois livros e a carta, sem me preocupar em entrar em casa e me proteger do frio, então
sentei em uma das cadeiras e comecei a ler a carta.
Cole,
Há exatamente um ano, decidi terminar a lista de
aniversários de Jamie. Eu estava na cozinha da minha casa
tirando uma selfie. Foi assim que tudo começou. Uma selfie
minha chorando na frente de um bolo de aniversário de
chocolate.
Eu gostaria de poder voltar àquele dia, não para apagar
este ano que passou, mas para dizer a mim mesma para
aguentar um pouco mais. Para dizer a mim mesma para
continuar respirando, porque logo alguém especial entraria
em minha vida e tornaria tudo mais fácil. Eu diria a mim
mesma para não chorar, porque ele estaria por perto para
me ajudar a terminar a lista de aniversários. Ele seguraria
minha mão quando eu precisasse pegar um pouco de sua
força emprestada. Ele me deixaria chorar em sua camisa
quando eu não conseguisse conter as lágrimas. Ele tornaria
mais fácil me apaixonar novamente.
Porque foi isso que aconteceu. Eu amo você, Cole. E eu
também posso provar. Faça-me um favor. Largue esta carta
e olhe para o livro grande junto do diário. E não apenas
folheie. Realmente pare e olhe.
Larguei a carta e abri o livro. Exceto que não era um livro — era um álbum de fotos. Poppy
imprimiu todas as suas selfies diárias e fez aquele álbum para mim.
Meu coração se torceu enquanto eu olhava para a primeira página. Ver sua primeira foto doeu.
Assim como descreveu na carta, lá estava ela — linda, mas desolada — parada ao lado de um bolo
cheio de velas acesas.
As páginas que se seguiram não eram muito melhores. Seus olhos azuis estavam opacos e seus
sorrisos eram forçados. Ela parecia um fantasma da minha Poppy.
Continuei folheando, odiando cada uma dessas fotos, até que cheguei na metade do álbum e a dor
no meu peito começou a diminuir. No meio da sequência foi quando as fotos começaram a incluir o
restaurante. Os sorrisos de Poppy realmente alcançavam seus olhos, e um punhado de páginas
depois, encontrei a foto que tirei dela no dia em que caminhamos no parque. O dia em que ela
brincou sobre ter um nariz grande.
A partir daí, reconheci todas as fotos, já que eu havia tirado a maioria delas. Folheei o restante do
álbum rapidamente, querendo voltar à carta de Poppy, mas parei na última página.
Ao contrário do meio do álbum, esta página não tinha várias, mas apenas uma foto. Era uma foto
simples, inteiramente do rosto de Poppy. Seus olhos estavam brilhantes, como sempre que eu a fazia
rir. Seu sorriso era largo, como sempre que eu dizia a ela que a amava.
A felicidade dela irradiava para fora da página, e eu absorvi isso por alguns momentos antes de
voltar à carta.
Viu?
Eu acenei.
Por que ela não marcou esse item como feito? Ela mudou muitas vidas. Tuesday Hastings.
Jimmy. Randall. Molly. Finn.
A minha.
Então por que ela deixaria esse item sem conclusão?
Confuso, voltei à carta.
Sou muito grata pela incrível equipe que me apoia em todos os livros. Agradeço à minha editora,
Elizabeth Nover, por me ensinar em todos os projetos e me incentivar a melhorar. À minha revisora,
Julie Deaton, e minha formatadora, Stacey Blake, obrigada por polir cada livro até fazê-lo brilhar.
Obrigada a Jenn, pelas horas gastas lendo no último minuto e me dando uma contribuição tão útil.
Para Kaitlyn, por sempre estar presente para ajudar, não importa o que eu precise. Agradeço à minha
designer de capa, Sarah Hansen, por criar minha linda capa. E ao meu publicitário, Dani Sanchez,
obrigada por sua orientação e conselhos incríveis. É um prazer trabalhar com todos vocês.
A todos os blogueiros e meus colegas autores que ajudaram a divulgar este livro, obrigada por seu
apoio incrível. À minha equipe ARC, obrigada pelo entusiasmo que vocês trazem a cada lançamento.
E a Jenn, Ana, Karen e todos os membros da Perry Street, obrigada por serem minha torcida.
À minha família e amigos, obrigada por todo o seu amor e incentivo. Por acreditarem em mim
quando, às vezes, eu não acredito em mim mesma.
E por último, aos meus leitores. Existem muitos livros neste mundo. Estou honrada e muito grata
por vocês terem escolhido um dos meus. Obrigada.
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