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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Instituto de Ciências Humanas, Curso de Letras

Gabriela de Oliveira Duarte

Isabela Kenia Martins Gomes

Matheus Pardini Costa

Roberta Colen Linhares

A BUSCA DA CONSCIÊNCIA PELO TRABALHADOR BRASILEIRO


NA SOCIEDADE

Belo Horizonte
2020

Gabriela de Oliveira Duarte

Isabela Kenia Martins Gomes

Matheus Pardini Costa

Roberta Colen Linhares

Trabalho apresentado à disciplina de Introdução


aos Estudos da Linguagem: linguagem e
sociedade, do Curso de Letras da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais.

Orientadores: Juliana Alves Assis e Luciano


Cortez e Silva.

Belo Horizonte
2020

1. INTRODUÇÃO

Primeiramente, consideramos importante dizer que escolhemos o texto poético


“O operário em construção”, de Vinícius de Moraes (1959), e a música “É”, de
Gonzaguinha (1988), pelo forte apelo político na construção do subjetivo e do coletivo
dos discursos, o que nos motivou investigar as condições de produção das mesmas,
bem como analisar como é representada a visão do trabalhador sobre si mesmo e
sobre o trabalho em textos de diferentes períodos da história.

Iniciamos nossa pesquisa acerca dos acontecimentos mais importantes do ano


de 1959 em que é datado o poema “O operário em construção”, a fim de descobrir
fatos relevantes no campo político à época. Consideramos importante conhecer o
contexto social da década de 1950 a 1960 no Brasil, para nos direcionar a
compreender os sujeitos discursivos e seus discursos.

Em seguida, empenhamo-nos em busca da contextualização do segundo


objeto de estudo deste trabalho, a música “É”, de Gonzaguinha composta em 1988.
Assim como na investigação acima descrita, consideramos importante conhecer o
contexto social da década de 1980 a 1990 no Brasil, para nos direcionar a
compreender os sujeitos discursivos e seus discursos na composição musical da
época. Debruçar-nos-emos também em levantar os fatos relevantes no campo político
na tentativa de revelar a interação dos interlocutores, com suas ideologias, com suas
crenças, nos seus contextos históricos e sociais, ou seja, com os discursos que os
constituem.

2. CONTEXTUALIZAÇÕES

2.1. Brasil, 1956 a 1960

O Presidente Juscelino Kubistchek governava o Brasil (1956-60) com seu


bordão “50 anos em 5”, promovendo muitas obras e mudanças importantes para o
desenvolvimento econômico do país. Sobretudo destacamos a construção da cidade
de Brasília e a criação da estatal Petrobrás, marcos do país em fase de expansão e
progresso, um contexto histórico-social que alcançou manifestações no âmbito da
literatura. Os escritores de literatura brasileira dessa época se dedicaram a retratar um
país mais urbanizado do que rural, mais capitalista do que operário, mas, sempre,
contemplando a diversidade, ainda que com poucos grupos sociais.
Da mesma forma que a produção literária, a poesia do movimento modernista
no Brasil também se caracteriza pela temática social. Na cena ficcional do poema
“Operário em Construção”, percebemos a narrativa de construção da consciência do
trabalhador, uma pista disso está no trecho da terceira estrofe: “ Que o operário faz a
coisa, E a coisa faz o operário.”

Entendemos, diante desse cenário histórico, que a construção da consciência


do trabalhador também era incipiente no Brasil no ano de 1959, quando o poema
“Operário em construção” foi escrito, e que influenciou o projeto literário desse texto.

2.2. Brasil, 1980 a 1990

A década de 1980 foi marcada por crises financeiras em todo o mundo, e não
foi diferente para o Brasil, o país começou o ano com várias dívidas externas e isso só
foi piorando. Economicamente, este período histórico ficou conhecido na América
Latina como “a década perdida”, de acordo com Gilberto Marangoni, na publicação
“Anos 1980, década perdida ou ganha?” da Revista Desafios do Desenvolvimento do
IPEA - Instituto de Pesquisa Aplicada, de 2012. Ainda segundo este estudo,
politicamente, a década foi marcada também por crises políticas e pela mobilização
social em prol do fim do regime militar no Brasil. Neste contexto, emergiu em 1980 o
Partido do Trabalhador, trabalhadores, operários, militantes unidos a favor do
socialismo democrático. Diante desta “dialética crise” como escreveu Gilberto
Marangoni, houve a redemocratização do país com José Sarney, em 1988 tivemos
uma nova Constituição Federal, e a primeira eleição para presidente com sufrágio
universal em 29 anos no ano seguinte.
A promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil foi
especialmente importante para a classe trabalhadora, uma vez que foi formalizada a
garantia de direitos da CLT – Consolidação de Leis Trabalhistas publicadas a primeira
vez em 1943. De acordo com a informação noticiada no portal do Tribunal Superior do
Trabalho do Brasil, a “Constituição de 1988 consolidou direitos dos trabalhadores”:

“Formalmente, a Constituição da República


Federativa do Brasil de 1988 relacionou, no artigo
7º, os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais e
outros que visem à melhoria de sua condição
social. No parágrafo único, listou os direitos
assegurados à categoria dos trabalhadores
domésticos. No artigo 8º, estabeleceu a liberdade
sindical; e, no artigo 9º, o direito de greve.”
(TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO, 2020)

Diante desse forte apelo político de grande parte da população brasileira, surge
a música de Gonzaguinha, “É”, reverberando a consciência de um discurso coletivo
em consonância com a participação expressiva da população com sugestões aos
deputados e senadores para elaboração das proposições de ampliação dos direitos
sociais. Este esforço conjunto que se tornou símbolo do processo de
redemocratização do Brasil, e por isso, esse documento tão importante ficou
conhecido como Constituição Cidadã.

3. LEVANTAMENTO DAS ESTRATÉGIAS DE PRODUÇÃO

3.1. POEMA: O OPERÁRIO EM CONSTRUÇÃO DE VINICIUS DE MORAES

Ao estudarmos sobre Linguagem e Dialogismo através do vídeo da disciplina


"Didática, Língua Portuguesa e Literatura" do curso de Pedagogia Univesp/Unesp ,
aprendemos que, para Bakhtin, a tensão é inerente ao dialogismo e que todo discurso
é dialógico, pois há uma busca de produção de sentidos através da linguagem. Ainda
segundo José Luiz Fiorin, em sua obra “Introdução ao pensamento de Bakhtin”: “O
dialogismo são as relações de sentido que se estabelecem entre dois enunciadores.”
(FIORIN, 2018 p. 22). Essa interação ocorre a partir de dois interlocutores, com suas
ideologias, com suas crenças, nos seus contextos históricos e sociais, ou seja, com os
discursos que os constituem.

Além disso, também temos conhecimento de que a atividade humana da


linguagem se constrói dentro dessas relações de interação, e nesse movimento, os
enunciadores recuperam fatos que já ocorreram ou foram escritos, portanto, já
enunciados. Assim estamos constituindo nosso repertório de leitura, de discursos, ou
seja, nosso discurso nunca será algo estático, ele muda, ele se amplia, ele se atualiza
pelo discurso do outro.

Nessa perspectiva, intuímos afirmar que o texto bíblico recuperado pelo


narrador antes da primeira estrofe do poema “O operário em construção” é a porta de
entrada do discurso religioso que dialoga com o discurso poético narrativo. Os
versículos foram escolhidos intencionalmente pelo fato de narrarem o momento em
que Jesus é tentado pelo Diabo, e no poema, esta mesma situação se repete através
das figuras do patrão e do operário. O Diabo é metaforizado pela voz discursiva do
empregador no excerto: “Fez-lhe esta declaração: - Dar-te-ei todo esse poder E a sua
satisfação Porque a mim me foi entregue E dou-o a quem bem quiser. Dou-te tempo
de lazer Dou-te tempo de mulher. Portanto, tudo o que vês Será teu se me
adorares E, ainda mais, se abandonares”. Enquanto Jesus é representado pelo
operário, uma vez que esse não renuncia às suas próprias vontades diante do que é
proposto pelo patrão.

O poema, composto por dezessete estrofes, narra a história de um operário e a


relação trabalhista dentro do sistema capitalista. A princípio um trabalhador alienado,
submetido a uma condição de vida miserável, aliada à cansativa rotina de trabalho,
que ao longo do dia passa por uma transformação de consciência individual e coletiva.
Termina com esse mesmo trabalhador evoluído, no sentido de ser mais questionador,
ciente do abismo social entre ele e o seu empregador e consciente das condições de
trabalho a ele oferecidas. Dessa fragilidade do homem, ele extrai também a força para
refutar e resistir às tentações oferecidas, de modo a seguir lutando por seus ideais.

Na primeira estrofe, o narrador projeta o cotidiano do trabalho de um operário,


enunciado pela seguinte escolha lexical: “Era ele que erguia casas. Onde antes só
havia chão. Como um pássaro sem asas. Ele subia com as casas. Que lhe brotavam
da mão.” Ainda na mesma estrofe, é introduzido o discurso social da alienação do
trabalhador na reprodução dos ditos: “Mas tudo desconhecia. De sua grande
missão: Não sabia, por exemplo, Que a casa de um homem é um templo. Um templo
sem religião. Como tampouco sabia, Que a casa que ele fazia, Sendo a sua liberdade,
Era a sua escravidão.” O discurso sobre a ausência de consciência do trabalho do
operário no contexto da construção civil, continua sendo narrado na segunda, terceira
e quarta estrofes. Está materializado o discurso da mais-valia de Karl Marx (1818-
1883), ele recupera a base do discurso capitalista que se constitui na desigualdade
entre o esforço do trabalhador e o valor pago pelo seu trabalho.

Porém, ao final da quarta estrofe, notamos uma mudança na entonação do


narrador, a partir da escolha das seguintes palavras: “ O operário emocionado. Olhou
sua própria mão. Sua rude mão de operário. De operário em construção. E olhando
bem para ela. Teve um segundo a impressão. De que não havia no mundo. Coisa que
fosse mais bela.” Observamos aqui a projeção de um sujeito introspectivo,
percebendo-se no contexto social em que está inserido, no momento em que ele olha
para a sua própria mão (o que no poema representa a reflexão dele sobre seu
instrumento de trabalho) e, neste momento, ele enxerga a beleza no seu esforço
individual.
Na quinta estrofe o narrador descreve um sujeito em profunda reflexão acerca
do seu valor e da grandeza do trabalho por ele realizado. Isso nos remete aos estudos
do texto “Interação Discursiva” do filósofo Valentin Volóchinov, cujo trecho
reproduzimos a seguir: “O mundo interior e o pensamento de todo indivíduo possuem
seu auditório social estável, e nesse ambiente se formam os seus argumentos
interiores, motivos interiores, avaliações etc.” (VOLÓCHINOV, 2017 p. 205) Nesse
movimento, o narrador seleciona recursos fraseológicos que revelam um processo de
transição da alienação para a epifania, a construção de sentido da importância do
trabalho na voz discursiva do operário, e este sujeito irá se projetar coletivamente na
seguinte estrofe: “E um fato novo se viu, Que a todos admirava: O que o operário
dizia, Outro operário escutava.”

A partir da sexta, sétima, oitava e nona estrofe, a voz discursiva do operário


em construção começa a participar da composição dialógica do poema, em que ele
compara a sua condição social à do seu patrão. Destacamos especialmente uma parte
da sétima estrofe do poema, pois nesse momento enxergamos a manifestação dessa
voz: “E foi assim que o operário, Do edifício em construção, Que sempre dizia sim,
Começou a dizer não.” Ele observa na estrofe seguinte: “que sua marmita Era o prato
do patrão Que sua cerveja preta Era o uísque do patrão”, realidade que é
característica da exploração da força de trabalho, e diante disso: “o operário disse:
Não! E o operário fez-se forte. Na sua resolução.”

Na décima estrofe são projetadas outras vozes discursivas, sujeitos do mesmo


contexto social, trabalhadores, mas com ideologias distintas do operário em
construção, gerando uma tensão entre os interlocutores: “Como era de se esperar, As
bocas da delação, Começaram a dizer coisas, Aos ouvidos do patrão. ” Novamente,
recorremos a Volóchinov para entender a razão desse estranhamento entre os
sujeitos discursivos e seus discursos neste trecho do poema. Segundo o estudioso:

“É claro que essa orientação social da vivência


pode possuir diferentes graus de consciência,
precisão e diferenciação, porém não pode haver
vivência sem ao menos uma orientação social
valorativa.” (VOLOCHINOV, 2017 p. 207-208)

Depreendemos, diante disto, que a obra resgata um dito social a respeito dos
níveis subjetivos de autoconstrução e de autoconsciência do operário, uma trajetória
difícil, uma vez que apenas um deles virou-se contra um sistema sólido e enraizado na
sociedade, no qual o patrão determina o que o operário deve pensar, dizer e fazer.
Entre aspas, o narrador marca a voz discursiva do patrão como um dizer coercitivo,
expressando seu poder de comando sobre todos os seus subalternos, no excerto: “-
‘Convençam-no’ do contrário.-”

Na décima primeira estrofe lemos: “Dia seguinte, o operário, ao sair da


construção, viu-se súbito cercado dos homens da delação, e sofreu por destinado sua
primeira agressão. Teve seu rosto cuspido, teve seu braço quebrado, mas quando foi
perguntado, o operário disse: Não!”. Ao criar uma nova cena em que os enunciadores
chamados de “homens da delação” são os operários manipulados pelo patrão e
enunciam sua subserviência agredindo o operário em construção, podemos inferir que
a construção da autoconfiança individual se dá a partir da percepção de valoração
externa ao sujeito, pois ela não acontece de maneira intuitiva, está atrelada à
consciência social proveniente de uma vivência coletiva. Afirmamos isto à luz dos
estudos teóricos de Volochinov que escreveu:

“A ideologia do cotidiano é o universo do discurso


interior e exterior, não ordenado nem fixado, que
concebe todo nosso ato, ação e estado
‘consciente’.” (VOLOCHINOV, 2017 p. 213)

A revolta do operário inicia-se na décima primeira e segue até a décima


segunda estrofe, ao ser agredido pelos “homens da delação”, e apesar da recorrente
violência, ele continua seu trabalho árduo na construção como podemos ler no
excerto: “Seu trabalho prosseguia, E todo o seu sofrimento, Misturava-se ao cimento,
Da construção que crescia.”

A última estrofe do poema é justamente a que confirma a ideia da construção


crítica do operário. Ele passa a reconhecer o seu trabalho e, consequentemente, é
reconhecido pela sociedade: “Uma esperança sincera cresceu no seu coração. E
dentro da tarde mansa agigantou-se a razão de um homem pobre e esquecido razão
porém que fizera, em operário construído, o operário em construção”.

3.2. MÚSICA: É DE GONZAGUINHA

A escolha do nome da canção, “É”, variação do verbo ser, não foi aleatória, e
nos chama a refletir sobre o sentido do discurso que será enunciado. “É” expressa
existir, ideia afirmada e reafirmada no decorrer da composição, explicita a voz do
enunciador, o cidadão, o seu desejo de se comunicar, sua reivindicação por espaço de
fala, a manifestação da consciência do povo brasileiro face ao sistema de governo.
Argumentamos isto diante do estudo do texto “Interação Discursiva” do filósofo
Valentin Volochinov:
“Em sua essência, a palavra é um ato bilateral. Ela é
determinada tanto por aquele de quem ela procede
quanto por aquele para quem ela se dirige.”
(VOLOCHINOV, 2017, p. 205)

A construção composicional do texto da música utiliza recursos estilísticos do


gênero poema, dividido em estrofes, explora a repetição do título e dos trechos “A
gente quer valer”, “A gente quer viver”, “A gente quer é ser”, a utilização dessa
expressão retoma a ideia de coletividade presente no texto, uma vez evoca não
somente um trabalhador específico, mas um ser genérico, uma voz que representa
toda uma classe. Vale-se também da estratégia da rima como na poesia: “amor e
humor”, “suor e melhor”, reiterando sons similares, promovendo sonoridade e ritmo.
Percebemos aqui a presença da heterogeneidade discursiva, e a respeito disso, lemos
na obra “Os gêneros do discurso”, organizada e traduzida por Paulo Bezerra sobre os
estudos de Mikhail Bakhtin (1895-1975): “A riqueza e a diversidade dos gêneros do
discurso são infinitas porque são inesgotáveis as possibilidades da multifacetada
atividade humana...” (BAKHTIN, 2016, p.12).
A linguagem simples e direta utilizada na composição é clara e compreensível,
enuncia o discurso do narrador que se expressa utilizando uma locução pronominal
com valor semântico de nós: “A gente”, e é repetida na música 34 vezes, reforçando a
voz coletiva. O recurso fraseológico “A gente quer”, replicado o mesmo número de
vezes na estrutura da canção, revela ao leitor a ideia de certeza, de que não há dúvida
a respeito do que está sendo pleiteado. Diz de um povo que sabe de suas
necessidades, que conhece seus direitos, que clama por democracia como foi
demonstrado na contextualização histórica deste trabalho.
Na construção das duas primeiras estrofes, a linguagem nos dá pistas que
estão sendo clamados o amor, humor, prazer, felicidade, o bom, o melhor, atenção,
carinho, simbolizando valores sociais comuns a todas as pessoas, necessidades
inerentes ao ser humano. “A gente quer é ter muita saúde, A gente quer viver a
liberdade”, expressam o desejo desses enunciadores de garantirem a sua liberdade de
expressão, na qual o sujeito discursivo que está enunciando a canção têm uma
consciência (coletiva) daquilo reivindica.
Na terceira estrofe, diferentemente da primeira e da segunda, o discurso do
narrador enuncia a indignação da população. Há um objetivo na escolha das palavras
“panaca e babaca”, o que reflete o forte apelo político da população civil pelo fim do
regime militar, o desejo pela redemocratização do país. As expressões “A gente não
tem cara de panaca”, “A gente não tem jeito de babaca”, salientam o discurso coletivo
da classe trabalhadora que sabe exatamente o que não quer, que não está disposto a
continuar sendo silenciada e abusada por seus governantes e empregadores. “A gente
não está com a bunda exposta na janela, pra passar mão nela”, reitera uma metáfora
utilizada no discurso popular para se referir a alguém que se expõe de maneira
excessiva e passiva, tola, alienada.
A quarta estrofe se repete ao final, ela projeta o discurso do povo, dos anseios
dos que vivem em comum unidade, comunica a reivindicação social daqueles que tem
consciência do seu papel enquanto cidadãos, do direito pleno de participação em um
governo democrático: “A gente quer viver pleno direito, A gente quer viver todo respeito,
A gente quer viver uma nação, A gente quer é ser um cidadão.” A repetição da palavra “É”
oito vezes seguidas no refrão da música, confirma a presença da voz poética do texto.
Enfim, na música "É", materializa-se a voz do trabalhador consciente, desenvolvida
ao longo da história humana, influenciado pelas regulações sociais de uma construção
ideológica. Para embasar nosso argumento, recorreremos mais uma vez aos estudos de
Volochinov em “Marxismo e Filosofia da Linguagem”:
“As relações de produção e a estrutura sociopolítica
que delas diretamente deriva determinam todas as
formas e os meios de comunicação verbal: no
trabalho, na vida política, na criação ideológica. Por
sua vez, das condições, formas e tipos da
comunicação verbal derivam tanto as formas como os
temas dos atos de fala.” (VOLOCHINOV, 2016, p. 42)

4. CONCLUSÃO

Concluímos após a análise da música “É”, de


Gonzaguinha, de 1988, e do poema narrativo de Vinícius de Moraes, “O
operário em construção”, de 1959, que o forte apelo presente em ambas
as produções permitem com que reflitamos a respeito da constituição
subjetiva e coletiva da consciência do trabalhador na sociedade.
Apesar de terem sido produzidas em tempos estéticos distintos,
as obras dialogam entre si e retomam um discurso coletivo da tomada
de consciência retratada na análise que foi construída. No poema,
notamos a construção passiva dessa consciência, ao passo que, na
música, intuímos que a consciência já está tomada.
OBJETO ESTÉTICO

Transmutação

Vinícius e Gonzaguinha
Contemporâneos na mesma nação
Poesia, partitura, caneta e música
É, É, É, o operário em construção

Bossa nova na televisão


Tom no piano, João Gilberto no violão
A ficha não caiu. Ligação a cobrar?
Não! O operário é padrão

Às cinco da madruga, o anúncio na rádio peão


O Presidente é amigo do patrão
É o progresso, 50 anos em cinco
Me vê um pingado e a telha de zinco

O operário é trabalhador, agora tá na lei


O polegar tá no contrato, o que está escrito já não sei
O retrato é 3/4, na firma está fichado
Tem horário, tem direito, tem cruzeiro, tem cruzado

Na República, a Constituição foi promulgada


A esperança foi alçada na palavra lavrada
O sonho sobe no andaime no suor de cada dia
Como disse Karl Marx: é assim a mais-valia

Leia Vinícius, ouça Gonzaguinha


O patrão não é seu amigo camarada
Sobe no palanque, acaba com essa piada
O operário está cansado de tanta ladainha

Trabalhador crie um partido, seja consciente


Ocupe Brasília, seja Presidente
Não se alie a miliciano, pega a visão
Uma nação não se constrói com armas, e sim com educação

REFERÊNCIAS

“História do Brasil – Anos 50”; Portal Educação. Disponível em:


https://siteantigo.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/biologia/historia-do-brasil-
anos-1950/48618. Acesso em 22 de setembro de 2020.

“Vida e obra”; Vinicius de Moraes. Disponível em:


http://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/vida. Acesso em 22 de setembro de 2020.

“A Mais Valia de Karl Marx” – Toda Matéria. Disponível em:


https://www.todamateria.com.br/a-mais-valia-de-karl-marx/. Acesso em 22 de
setembro de 2020.

“Constituição de 1988 consolidou direitos dos trabalhadores” - Tribunal


Superior do Trabalho do Brasil. Disponível em:
http://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/constituicao-de-1988-
consolidou-direitos-dos-trabalhadores. Acesso em 23 de setembro de 2020.

“Anos 80, a década perdida” – Nerdologia. Disponível em:


https://www.youtube.com/watch?v=NwGI0mtNRrY. Acesso em 23 de setembro de
2020.
“Anos 1980, década perdida ou ganha?” - Revista Eletrônica Desafios do
Desenvolvimento do IPEA. Disponível em:
https://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?
option=com_content&id=2759:catid=28&Itemid=23. Acesso em 25 de outubro de
2020.

“Gonzaguinha, Cantor e compositor brasileiro” – ebiografia. Disponível em:


https://www.ebiografia.com/gonzaguinha. Acesso em 23 de setembro de 2020.
Vídeo da disciplina "Didática, Língua Portuguesa e Literatura", do curso de
Pedagogia Univesp / Unesp. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?
v=KShoiF1XI3A). Acesso em 04 de outubro de 2020.

VOLOCHINOV, V. “A Interação Discursiva”. In: Marxismo e filosofia da


linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem I.
São Paulo: Editora 34, 2017 - (1ª Edição).

FIORIN, J. L. “Introdução ao pensamento de Bakhtin”. São Paulo: Editora


Contexto, 2018 (2ª Edição).

BAKHTIN, M. “Os gêneros do discurso”. São Paulo: Editora 34, 2016 - (1ª
Edição).

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