COMO ECOSSISTEMAS MULTIMODAIS Nataniel dos Santos Gomes INTRODUÇÃO ➤ Textos multimodais aqueles marcados pela presença da linguagem verbal (oral e/ou escrita) e linguagem não verbal (visual), tais como: os infográ cos, os anúncios, os cartuns, as propagandas, as tiras e as charges. ➤ Kress & Van Leeuwen (2001) postulam que nos textos ocorre uma reciprocidade de diferentes formas de construção de signi cados, em que a materialidade verbal se correlaciona com a visual, a sonora, dentre outras. Destarte, o processo de signi cação se dá de forma multimodal. fi fi fi ➤ O conceito de multimodalidade nos gêneros discursivos surgiu, no campo da linguística há cerca de duas décadas. A noção de multimodalidade foi introduzida por Kress & van Leeuwen (1996) no campo epistemológico da Semiótica Social, com vistas à compreensão de todos os modos de representação contidos no texto: “Estruturas visuais produzem signi cados assim como as estruturas linguísticas e, assim, apontam para diferentes interpretações de experiências e diferentes formas de interação social” (Kress & Van Leeuwen, 1996, p. 2). fi ➤ Nas mais diversas situações comunicativas, fazemos uso de ao menos dois modos de representação, o verbal e o visual. A multimodalidade constitui-se das múltiplas linguagens que utilizamos em práticas sociais interativas. ➤ “No passado, e em muitos contextos ainda hoje, textos multimodais (como lmes ou jornais) foram organizados como hierarquias de modos especializados integrados por um processo de edição. Além disso, eles foram produzidos dessa maneira, com diferentes especialistas hierarquicamente organizados, responsáveis pelos diferentes modos, e um processo de edição que apresentava seu trabalho em conjunto.” (Kress & Van Leeuwen, 2001, p. 2). fi OS QUADRINHOS ➤ A de nição mais comum apresenta os quadrinhos como uma forma de contar histórias por meio de imagens e texto em sequência. ➤ Nem toda HQ possui texto para contar sua história. Os chamados quadrinhos mudos contam suas histórias sem utilizar-se de balões e recordatórios. ➤ Uma Fotonovela pode ser considerada uma arte sequencial, assim como o Cinema. ➤ A simultaneidade é tão importante quanto a sequencialidade na linguagem dos quadrinhos. fi ➤ Paulo Ramos (2009) diz que igualar os quadrinhos à literatura seria uma forma de procurar rótulos socialmente aceitos ou com prestígio acadêmico para justi car os quadrinhos que foram vistos com preconceito durante muito tempo. ➤ "Quadrinhos são quadrinhos" (p. 17). ➤ Histórias em quadrinhos são um gênero próprio, e não um subgênero da literatura, mas que compartilha de muitos elementos em comum com diversos campos. fi ➤ De nir os quadrinhos é um desa o instigante e não é uma tarefa nem um pouco simples. Ela é formada por uma linguagem mista ou híbrida, o que por si só já apresenta um leque enorme de olhares na arte da narrativa sequencial e no que soa nas estruturas em seus diversos elementos complexos na formação de mídia de sintaxe. ➤ As histórias em quadrinhos são uma linguagem difícil de ser de nida por possuir diversos elementos que se imbricam formando uma mídia de sintaxe e gêneros complexos. Diversos pesquisadores procuram um conceito preciso para as histórias em quadrinhos, o que, naturalmente, resulta em opiniões convergentes e divergentes. (Pessoa, 2016, p. 11) fi fi fi QUADRINHOS COMO ECOSSISTEMA ➤ Barbieri apresenta uma grande contribuição para o entendimento da nona arte. Ele trata dos fundamentos que fazem dos quadrinhos um conjunto de linguagens que formam um todo. ➤ Durante muito tempo os estudos sobre quadrinhos, principalmente aqueles que o faziam sob o aspecto semiológico, se amparavam em outras linguagens como as artes visuais, a literatura e, principalmente, o cinema. ➤ Recorria-se a conhecimentos consolidado para se aproveitar do prestígio e da formalidade que essas linguagens irmãs conquistaram. ➤ Para Barbieri, as Linguagens se dividem em: (i) Linguagens de Imagem que são a ilustração, a pintura e fotogra a; (ii) as Linguagens de Temporalidade que são a poesia e a narrativa e; (iii) Linguagens de Imagem e Temporalidade, basicamente, teatro e cinema. ➤ Os quadrinhos se apropriaram de expressões e procedimentos como enquadramento e angulações da fotogra a, mas um quadrinista experiente consegue condensar uma sequência de momentos em uma única imagem, algo impossível de se obter numa fotogra a. fi fi fi ➤ A contribuição de outras áreas é inegável. As representações pictóricas dos quadrinhos tomam emprestadas técnicas e formas oriundas das artes visuais, de modo geral. ➤ Como linguagem híbrida, que traz elementos do texto escrito e das artes visuais, as HQs geralmente são analisadas a partir de regras que de nem essas formas de comunicação. ➤ O balão da fala já era de uso corrente em ilustrações desde a Idade Média sob a forma de lactérios. As onomatopeias eram comuns na literatura e, certamente. No entanto, ambos são recursos tão utilizados nas histórias em quadrinhos que elas os incorporaram como componentes quase indissociáveis. fi fi ➤ Os estudos sobre os quadrinhos, devido ao seu caráter multi, não poderiam trilhar caminho simplista, uma vez que seu objeto é complexo e amalgama muitas linguagens artísticas, resultando em uma abordagem geralmente interdisciplinar. ➤ Cada desenho é, assim, o resultado de uma seleção de características consideradas importantes em detrimento de outras. Para muitas características, todavia, não obstante uma escolha e não outra, o reconhecimento do objeto não é prejudicado, mas não é de forma alguma indiferente. Se temos, por exemplo, dez modos aceitáveis de representar um determinado objeto, cada um deles será também um modo de destacar aspectos diferentes desse objeto. Saber desenhar não é somente saber criar imagens que se assemelham a esse objeto: também – e sobretudo – é saber criar imagens que destaquem os aspectos do objeto que são importantes para o discurso que se quer fazer. (Barbieri, 2017, p. 31) SOBRE A LEITURA DOS QUADRINHOS ➤ O leitor tem a possibilidade de efetivar uma leitura uida na narrativa dos quadrinhos, atingindo a completude quando se eliminam as fronteiras entre a leitura verbal e não verbal, ou seja, se processa uma única leitura. Assim os quadrinhos representam uma linguagem (ou várias linguagens) autônoma, já que oferece ao leitor uma série de elementos a serem observados separadamente como tipogra a, desenhos, perspectiva, onomatopeias, narrativa, oralidade e, dependendo do gênero do quadrinhos, diferentes formas de leitura de uma mesma história (Pessoa, 2016). fl fi ➤ [...] tomarmos como base o conceito de que o leitor, no processo dialógico com o texto, realiza trocas e constrói sentido do que está escrito [...] e que esse processo de construção se dá pelo dito e pelo não dito, pelo contexto sócio histórico, podemos indicar que esta troca pode ser muito mais proveitosa na interação com os diferentes gêneros textuais propiciadora de diferentes experiências e novas respostas. Deste modo, quanto mais rico de espaços para inferências do leitor o texto se apresenta, maior a troca do leitor com o texto (Campos, 2011, p. 27). ➤ Para Rama e Vergueiro (2012), a escolha dos quadrinhos para ns didáticos deve considerar os objetivos que estão sendo buscados e o desenvolvimento intelectual dos estudantes. Os alunos precisam entender como os quadrinhos são estruturados, o que requer um tipo de letramento que passe pelo sistema narrativo entre o visual e o verbal para materializar a informação, por exemplo, da esquerda para a direita, de cima para baixo, a disposição dos personagens, a sequência temporal, guras cinéticas e metáforas visuais e assim por diante. Tudo faz com que o leitor precise acessar conhecimentos prévios para compreender os quadrinhos, sem isso, a interação com o material se torna comprometida. fi fi ➤ Para McCloud (2005), a imagem se trata de uma informação rápida que o leitor recebe e já assimila porque não exige que se tenha uma educação formal para ler a visualização da linguagem não verbal. Em contrapartida a linguagem verbal, no caso do tipográ co, é mais perceptível para o leitor, já que exige um conhecimento mais especializado para decodi car os símbolos abstratos na composição da informação. Quando as imagens forem mais isoladas (abstraídas) da “realidade”, necessitará de níveis maiores de percepção, semelhante às palavras. Também pode ocorrer o contrário com as palavras. fi fi CONTINUA NA PRÓXIMA EDIÇÃO… ➤ Simões (2019) considera que a ampliação de outras ciências. O modelo de estudo da comunicação e expressão só como objeto da linguagem verbal tem o propósito de preparar sujeitos para a leitura e para a produção de textos. Porém outros códigos e outras linguagens se interagem no ambiente dos textos. ➤ As histórias em quadrinhos enquanto arte dialogam com a literatura, o teatro, a fotogra a, a música entre outras linguagens. A depender da ênfase dada pode-se descobrir camadas de leitura e uso pedagógico muito diferentes. fi ➤ Eu comecei a ler histórias em quadrinhos antes de aprender a ler português. Meu irmão mais velho comprou “Flash Gordon no Planeta Mongo”, de Alex Raymond, um álbum de 48 x 34 cm, com a primeira aventura, publicada originalmente de 7 de janeiro a 8 de abril de 1934. Eu quei hipnotizado. Enquanto ele estava na escola, eu ia ao seu quarto e ―lia e copiava aqueles trabalhos artísticos. Então, eu deixava o álbum exatamente do jeito que ele o havia deixado, antes que retornasse da escola. Um dia, ele trouxe um amigo para nos visitar, e disse: “Meu irmão é um artista, ele desenha muito bem. Mostre a ele!” Então, eu me dei conta de que ele sabia todo o tempo o que eu desenhava muito bem. (...). Nós sabíamos que, a m de fazer quadrinhos, nós tínhamos que ler porque nós estávamos trabalhando com a escrita. (Moya, 2013, p. 30) fi fi