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BOLETIM DE FEVEREIRO DE 2023

Direito Ambiental

SUMÁRIO

ADI 5871 (17/02/2023): É constitucional lei estadual que disponha sobre o


procedimento para retirada de animais mortos de propriedades rurais e sua
adequada destinação?

ADIs 7200 e 7204 (17/02/2023) e ADI 7203 (28/02/2023): São constitucionais leis
estaduais que proíbam os órgãos policiais e ambientais de destruir e inutilizar bens
particulares apreendidos em operações e fiscalizações ambientais?

Janaína Salles Rigitano


janasalles01@gmail.com
285.834.298-98

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Direito Ambiental

ADI 5871 (17/02/2023): É constitucional lei estadual que disponha sobre o


procedimento para retirada de animais mortos de propriedades rurais e sua
adequada destinação?

Não. Por unanimidade, o Plenário do STF declarou a inconstitucionalidade dos


arts. 3º e 4º da Lei 16750/2015, do Estado de Santa Catarina, e deu ao art. 2º do
mesmo diploma legal interpretação conforme a Constituição Federal,
dispositivos esses que dispunham sobre o procedimento para retirada de
animais mortos de propriedades rurais e sobre a sua adequada destinação.

O caso

O Governador do Estado de Santa Catarina ajuizou a ADI 5871 para impugnar


a Lei nº 16.750/2015, do mesmo Estado, que dispõe sobre o procedimento para
retirada de animais mortos das propriedades rurais e define sua adequada
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Dentre outros dispositivos, o art. 4º da lei catarinense previa o seguinte: “Fica
autorizado o transporte de animais mortos, dentro dos limites do Território
catarinense, mediante comprovação, unicamente, da inscrição do remetente e
do destinatário no cadastro técnico da CIDASC”.

A justificativa da existência dessa lei é a preocupação com os riscos ambientais,


sanitários e à saúde pública que a falta de orientação, padronização e
sistematização das práticas relacionadas ao manuseio e destinação dos animais
mortos em propriedades rurais pode ocasionar.

O requerente alegou: (i) usurpação da competência privativa da União para


legislar sobre direito agrário, trânsito, transporte e comércio interestadual (art.
22, I, XI e VIII, CF), tendo em vista a existência de normas federais que atribuem
ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento o controle de produtos
destinados à alimentação animal (Lei Federal nº 6.198/74), bem como a
destinação de animais mortos (Decreto nº 9.103/2017, Lei nº 1.238/50 e
7.889/89), visando ao controle de zoonoses; (ii) violação ao princípio da

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separação dos poderes (art. 2º, da CF); (iii) interferência nas atribuições
privativas do Poder Executivo pela criação de atribuições e obrigações a órgão
da administração pública estadual por lei de inciativa parlamentar (art. 61, § 1º,
II, a e e ; 63, caput , I, 84, II e VI, “a”); (iv) afronta à vedação de aumento de
despesa sem prévia dotação orçamentária (art. 167, I, da CF).

O que decidiu o STF?

Por unanimidade, o Plenário do STF declarou a inconstitucionalidade dos arts.


3º e 4º da Lei n.º 16.750 /2015, por vício de inconstitucionalidade formal e deu
ao art. 2º da lei estadual interpretação conforme a Constituição Federal.

Segundo Luís Roberto Barroso (relator), seguido pela unanimidade dos


ministros, os arts. 3º e 4º da lei impugnada trataram de típica matéria
administrativa, própria da organização e funcionamento da administração,
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logo extrapolou as fronteiras reservadas aos legisladores estaduais e
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interferiu na disponibilidade de recursos humanos e materiais necessários
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ao atendimento de suas atribuições (nesse sentido: ARE 768.450, j. em 1º.
12.2015).

Assim, os ministros concluíram que houve burla à reserva de iniciativa do Chefe


do Poder Executivo estadual, uma vez que a lei catarinense, de iniciativa
parlamentar, dispôs sobre atribuições ou estrutura de órgãos públicos e do
regime jurídico de seus servidores, de tal modo a violar o disposto no art. 61, §
1º, II, “a” e “e”, da CF.

Também por decisão unânime, o Plenário do STF deu interpretação conforme


ao art. 2º da Lei 16.750/2015, do Estado de Santa Catarina, segundo o qual
“animais mortos retirados das propriedades rurais deverão ser destinados para
transformação em farinhas de carne e ossos, gordura ou óleo animal e
fertilizantes”.

Segundo o relator, seguido por todos os ministros, é competência concorrente


entre União e Estado/DF (Art. 24, VI e XII, CF) legislar sobre a proteção à saúde

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e ao meio ambiente e, nesse caso, a primazia para a elaboração das normas


gerais foi atribuída à União, que legisla no interesse nacional, estabelecendo
diretrizes e normas gerais a serem observadas pelos demais entes federados,
cabendo aos Estados e ao Distrito Federal suplementar a legislação nacional.

No exercício da competência para edição de normais gerais, lembrou Barroso, o


Congresso Nacional aprovou a Lei nº 8.171/1991, que dispõe sobre a Política
Agrícola Nacional, da qual se destaca o art. 6º, inciso II.

Por outro lado, também foi salientado pelo ministro os arts. 27-A, 28-A e 29-A,
da mesma norma, incluídos pela Lei nº 9.712/1998, os quais dispõem sobre a
defesa agropecuária, instituindo o Sistema Unificado de Atenção à Sanidade
Agropecuária – SUASA.

Por fim, Barroso apontou que, especificamente sobre a questão disciplinada no


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art. 2º da Lei n.º 16.750/2015, do Estado de Santa Catarina (destinação dos
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animais mortos para produção285.834.298-98
de farinha de carne e ossos), o Ministério de
Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) editou a Instrução
Normativa nº 34/2008, dispondo sobre os procedimentos básicos para fabricação
de farinhas e produtos gordurosos destinados à alimentação animal.

Dessa forma, a unanimidade dos ministros seguiu o voto de Barroso no sentido


de dar interpretação conforme ao art. 2º da Lei n.º 16.750/2015, para que a
destinação de animais mortos para a produção de farinha de carne e ossos
se dê com a observância das normas gerais da União sobre o tema, das
quais é exemplo a Instrução Normativa nº 34/2008, do MAPA.

Foi fixada a seguinte tese de julgamento: “É inconstitucional lei de iniciativa


parlamentar que cria atribuições para órgãos da administração pública, por
violação do art. 61, § 1º, II, a e e da CF/88. 2. A matéria relativa à destinação de
animais mortos se insere na competência legislativa concorrente para a proteção
da saúde e do meio ambiente (art. 24, VI e XII, CF/1988)”.

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ADIs 7200 e 7204 (17/02/2023) e ADI 7203 (28/02/2023): São constitucionais


leis estaduais que proíbam os órgãos policiais e ambientais de destruir e
inutilizar bens particulares apreendidos em operações e fiscalizações
ambientais?

Não. Por unanimidade, o Plenário do STF declarou inconstitucionais leis dos


Estados de Roraima (7200 e 7203) e Rondônia (7204) que proibiam os órgãos
ambientais de fiscalização e a Polícia Militar de destruir ou inutilizar bens particulares
apreendidos em operações ambientais nos referidos estados.

Competência para legislar sobre matéria ambiental

De acordo com o art. 24, VI, da Constituição Federal, há competência legislativa


concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre
proteção do meio ambiente e controle da poluição. Por seu turno, o art. 23, VI,
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da CF estabelece a competência político-administrativa comum dos três níveis
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federativos para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer
de suas formas.

Dessa forma, em matéria ambiental, compete à União editar normas gerais (art.
24, § 1º) e aos Estados e ao Distrito Federal editarem disciplina própria no
espaço deixado pela legislação federal, agindo em caráter complementar ou
supletivo (art. 24, §§ 2º e 3º).

Com relação aos Municípios, o STF, no julgamento do RE 586.224/SP (Tema


145), em 05.03.2015, entendeu que o município é competente para legislar sobre
o meio ambiente no limite do seu interesse local e desde que tal regramento seja
harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24,
inciso VI, c/c 30, incisos I e II, da Constituição Federal).

O caso

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Um partido político ajuizou a ADI 7200 e a Procuradoria-Geral da República ajuizou


a ADI 7204, para impugnação da Lei 1701/22 do Estado de Roraima, e a ADI7203,
para impugnar a Lei 5299/2022, de Rondônia.

O partido político (ADI 7200) sustentou que a norma de Roraima é formalmente


inconstitucional por violar a competência da união para legislar sobre a proteção ao
meio ambiente e ao patrimônio paisagístico e responsabilidade por danos ao meio
ambiente (art. 24, VI, VII e VIII, e §1º, da CF) e, também, materialmente
inconstitucional por supostamente ofender direito fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado (art. 225, CF) e configurar verdadeiro retrocesso em
normas ambientais mínimas, que evitam a destruição da flora e da fauna.

A PGR (ADI 7204), por sua vez, alegou que as medidas de destruição/inutilização
de instrumentos empregados para a prática de infrações ambientais se trata de
prerrogativa conferida aos Janaína
agentes deSalles
fiscalização, logo violaria os artigos 24 e 225
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da Constituição Federal. janasalles01@gmail.com
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De igual modo, na ADI 7203, a Procuradoria-Geral da República sustentou que
a lei estadual de Rondônia (Lei 5299/2022) violou os arts. 24, inciso VI e § 1º,
22, inciso I e 225 da Constituição Federal, em específico violou a competência
privativa da União para legislar sobre direito penal e processual penal.

O que entendeu o STF?

Por unanimidade, o Plenário do STF entendeu que as normas estaduais são


inconstitucionais e limitam a eficácia da Lei de Crimes Ambientais, já que a
manutenção de seus efeitos colocaria em risco a efetividade da fiscalização
ambiental, com potencial ocorrência de danos irreparáveis ou de difícil reparação ao
meio ambiente.

Em seu voto nas ADIs 7200 e 7204 (julgadas em conjunto), o relator, ministro Luís
Roberto Barroso, sustentou que a lei estadual de Roraima (Lei 1701/22) incorreu em
inconstitucionalidade formal ao violar a competência privativa da União para legislar

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sobre direito penal e processual penal (art. 22, I, da CF) e para editar normas gerais
de proteção ao meio ambiente (art. 24, VI, CF).

A seu ver, a lei do Estado de Roraima limitou a eficácia da lei de crimes


ambientais e, portanto, “esvaziou um importante instrumento de fiscalização
ambientais, o qual foi legitimamente disciplinado em âmbito nacional pela Lei
9.506/1998 (art. 25) e pelo decreto 6.514/2008 (arts. 101, V, 111 e 112), e
descumpriu deveres estaduais de cooperação federativa em matéria de proteção
ambiental, estabelecidos em normas gerais editadas pela União (LC 140/11; Lei
9.985/2000 e Lei 6.928/81)”.

Por sua vez, o relator da ADI 7203, ministro Gilmar Mendes, entendeu que a lei
Lei 5.299/2022, de Rondônia, também deixou de observar a competência
privativa da União para legislar sobre direito penal, pois, salvo nas hipóteses que
possuem legislação especial, os bens
Janaína apreendidos
Salles estão sujeitos a perdimento
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em favor da União, como efeito secundário extrapenal da condenação e,
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portanto, não é da competência estadual a disciplina de relações jurídicas
relativas a tais bens, dado que eles passam a integrar o patrimônio da União.

A seu ver, “ao impor a destinação a ser dada aos produtos e instrumentos
utilizados na prática infracional apreendidos em operações de fiscalização
ambiental, usurpa a competência privativa da União para legislar sobre produtos
ou instrumentos de crime, matéria de direito penal e processual penal”.

Por fim, o Plenário do STF, nos julgamentos das ADIs 7200 e 7204
(17/02/2023) e ADI 7203 (28/02/2023), considerou que a respectiva norma
estadual vulnerou o próprio direito fundamental ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado (art. 225, CF), pois acabou por permitir a prática de
novas infrações ambientais, ao impedir a plenitude do poder de polícia ambiental.

Isso porque a manutenção dos efeitos da lei coloca em risco a efetividade da


fiscalização, com potenciais danos irreparáveis ou de difícil reparação ao meio
ambiente e às populações indígenas de Roraima e Rondônia.

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Direito Ambiental

Foi fixada a seguinte tese de julgamento nas ADIs 7200 e 7204 (julgadas em
conjunto): “É inconstitucional lei estadual que proíbe os órgãos policiais e
ambientais de destruir e inutilizar bens particulares apreendidos em operações,
por violação da competência privativa da União para legislar sobre direito penal
e processual penal, para editar normas gerais de proteção ao meio ambiente
(arts. 22, I, e 24, VI e § 1º, da CF/1988) e por afronta ao direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado (art. 225, caput, da CF/1988)”.

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