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Abstract
This article discusses the changes of weather and climate in
Brazil through the analysis of climatology and spatial-
i
Endereço institucional: temporal variability of different meteorological systems,
Rua Athos da Silveira Ramos, 274 the relationships with extreme rainfall and environmental
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- Bloco G, 21941-916 - Cidade consequences and effects to society. The atmosphere has a
Universitária/Ilha do Fundão, Rio lot of complexity, due to the interactions between a variety
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ISSN 1983-3644
Climatologia e Variabilidade
Fábio Guimarães Oliva
Introdução
A atmosfera terrestre encontra-se em constante dinamismo que ocorre em
resposta aos movimentos atmosféricos em diversas escalas espaciais e temporais. A
causa básica do movimento atmosférico é a distribuição desigual da radiação liquida
nas baixas e altas latitudes do globo, onde este movimento tende a redistribuir a
energia. A Circulação Geral da Atmosfera (CGA) cumpre o papel de redistribuição de
energia por meio do movimento atmosférico global dos ventos e, de acordo com Barry
e Chorley (1976, p. 52), se constitui no movimento atmosférico ou padrão de pressão
e ventos em larga escala que se repete ao longo do ano. Alguns sistemas atmosféricos,
que aqui serão discutidos, possuem relação estreita com a CGA, como é o caso da
Zona de Convergência Intertropical do Atlântico.
Diversos sistemas atmosféricos que atuam em distintas escalas espaciais e
temporais contribuem para episódios extremos de tempo e de clima que podem
resultar em chuvas intensas, estiagens prolongadas, ventos fortes ou ondas de frio e
de calor. Os extremos climáticos e de tempo atmosférico, especialmente os de chuvas
intensas, foco deste trabalho, impactam a sociedade de diferentes formas e a
magnitude de tais impactos está condicionada à natureza do evento, às características
físico-naturais do ambiente e à infraestrutura e planejamento da área afetada. Esta
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excedentes (CAVALCANTI et al., 2009, p. 35). Assim, a ZCIT pode atuar em associação
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Região da atmosfera em que a pressão é baixa em relação às regiões circunvizinhas de mesmo nível. Na
carta sinótica, é representado pelo sistema de isóbaras paralelas que apresentam forma similar à um V (INMET,
2019).
América do Sul. Segundo Cavalcanti (1982, p. 98), LIs com mais intensidade
predominam de janeiro a março, principalmente devido ao deslocamento latitudinal
da ZCIT que está melhor definida sobre o litoral norte do Brasil entre março e abril,
próximo ao local de formação das LIs. As LIs manifestam-se com mais frequência na
costa norte e nordeste do Brasil e da América do Sul conferindo grandes volumes de
precipitação e podendo se propagar para o interior do continente. Além disso, o
período em que as LIs apresentam maior comprimento coincide com o período em
que a ZCIT está melhor definida na sua posição ao sul. Nota-se, portanto, que a ZCIT
possui um papel importante na intensificação e na extensão das LIs.
Figura 1 - Imagem do satélite GOES 13 de vapor d’água das 00Z do dia 29/06/2016 na qual a
ZCIT está indicada pelas linhas do tipo “trilhos de trem” em cor laranja e oscila em torno de 7ºN/10ºN
no Oceano Pacífico e em torno de 5ºN/8ºN no Oceano Atlântico. Fonte: CPTEC/INPE (2016).
porção norte da região Nordeste do Brasil, ora contribuindo para uma estação
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chuvosa ainda mais chuvosa quando de seu deslocamento para posições mais ao sul
de sua climatologia, ora favorecendo uma estação mais seca quando de seu
deslocamento para posições mais ao norte de sua climatologia. Assim, a permanência
da ZCIT por mais ou menos tempo em suas posições mais ao sul determinará a
qualidade da estação chuvosa (UVO, 1989, p. 69). Na região Nordeste do Brasil, os
estados do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte e os sertões da Paraíba e de
Pernambuco são os que mais recebem influência regular da ZCIT, apresentando
máximos de precipitação nos meses de março e abril, em vista da maior organização
e regularidade deste sistema neste período do ano.
relataram que o sistema da LI, em sua frente, é composto por nuvens cumulus em
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Tipos de nuvens que apresentam desenvolvimento horizontal, cobrindo grande área, de pouca
espessura e precipitação de caráter leve e contínuo (INMET, 2019). É frequente por todo o globo e responsável por
cerca de 50% da nebulosidade terrestre. Origina-se do latim stratum, que significa camada ou folha (IAG/USP,
2018).
Segundo o boletim Climanálise (1986, p. 55), as LIs que se formam nas costas
norte e nordeste da América do Sul são denominadas linhas de cumulonimbus.
Cavalcanti (1982, p. 99) observou que o desenvolvimento deste sistema, na faixa
costeira, acompanha o deslocamento sazonal da ZCIT, proporcionando também uma
variabilidade de sua posição ao longo do ano. Este sistema atmosférico pode ser
observado durante todo o ano, porém com maior frequência entre os meses de abril
e agosto, ou seja, durante o outono e o inverno do hemisfério sul (COHEN, et al.,
2009, p. 78). Em longitudes mais à leste ao longo da costa e ao sul da linha equador,
ocorre maior posicionamento das LIs durante o verão e o outono, enquanto em
longitudes mais à oeste, ao longo da costa e ao norte da linha do equador, ocorre
maior posicionamento durante o inverno e a primavera.
De acordo com os estudos de Santos Neto (2004, p. 29) sobre a intensidade e
a extensão das LIs, se constata que as LIs de forte intensidade predominam entre
janeiro e março, as de intensidade média ocorrem entre abril e agosto e as fracas são
mais comuns após o mês de setembro. Isso se deve à migração latitudinal da ZCIT
próxima ao litoral norte do Brasil que é, em média, o local de formação das LIs.
Quanto à extensão das linhas de estabilidade, estas se apresentam mais extensas entre
fevereiro e junho, com ápice em abril, período que coincide com a melhor definição
da ZCIT em sua posição mais ao sul da linha do equador.
Nota-se que não há uma correlação bem definida entre a intensidade das LIs e
os fenômenos El Niño e La Niña. Porém, em relação ao comprimento da LI, esta tende
a reduzir a sua extensão horizontal média em anos de El Niño e tende a aumentar
essa extensão em anos de La Niña (SANTOS NETO, 2004, p. 35). Para o período de
1979 a 2002, o referido autor investigou o posicionamento médio das LIs em anos de
ocorrência de El Niño, percebendo que elas se formam mais ao norte do seu local
médio de formação, atingindo a costa da Venezuela e do estado do Amapá. Já em anos
de La Niña, o sistema tende a se formar mais ao sul da média, afetando todo o litoral
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ocorridos no ano de 2009 no estado do Pará, constataram que 66% destes episódios
aconteceram na estação chuvosa do ano e estiveram relacionados à três principais
médios (Figura 3). Este é definido como um sistema de baixa pressão de escala sinótica
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formado na alta troposfera, com circulação ciclônica fechada e que possui o centro
mais frio do que a sua periferia (KOUSKY; GAN, 1981, p. 541). Possuem, ainda,
configuração quase estacionária, mas podem se deslocar, com lentidão, tanto para
oeste como para leste (FERREIRA et al., 2009, p. 47).
Nordeste e parte da região Norte do Brasil, é importante entender sua interação com
outros dois sistemas, a Alta da Bolívia e a ZCAS. O monitoramento desses três
sistemas é essencial, pois eles modulam o ciclo hidrológico, o balanço de energia e o
3 Anticiclone que ocorre na alta troposfera durante o verão sobre a América do Sul, na parte central do
continente, conjuntamente à um cavado no nordeste brasileiro associado a ele (CARVALHO, 1989).
clima em parte do Brasil. A ZCAS pode apresentar maior interação com VCANs sobre
o Nordeste do Brasil em anos de La Niña, quando situa-se mais ao norte de sua
posição climatológica. Lenters e Cook (1997, p. 656) analisaram as relações do sistema
VCAN/Alta da Bolívia concluindo que este é mantido, principalmente, pela fonte de
calor da alta troposfera tropical durante o verão.
Costa et al. (2013, p. 371) estudaram as características da atmosfera com o
objetivo de investigar os totais elevados de chuva observados na cidade de Natal/RN
no mês de junho do referido ano. Os autores verificaram a presença da Alta da Bolívia
atuando próxima à região Norte do Brasil, de maneira praticamente estacionária, o
que teria favorecido o desenvolvimento de um VCAN sobre o Nordeste do Brasil, bem
centrado, em torno de 01ºS/37ºW. Este sistema contribuiu para os totais elevados de
precipitação ocorridos na cidade, com chuvas fortes localizadas que acumularam 95,5
mm em 24 horas, segundo informações da Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio
Grande do Norte. Na periferia do vórtice, ocorre confluência em baixos níveis e
difluência em altos níveis, resultando em nebulosidade e atividade convectiva, ainda
que de forma localizada, como a que foi observada na capital potiguar. Este evento
gerou transtornos habituais como alagamento de ruas e avenidas, abertura de crateras
nos pavimentos, além de manter moradores e comércio ilhados, prejudicando a
mobilidade urbana.
inverno de 2013 (julho de 2013). Cores mais quentes (laranja e amarelo) indicam as temperaturas mais
altas presentes nas bordas do sistema. Fonte: CPTEC/INPE (2013).
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de água para a população que habita essa região podem estar relacionadas à
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variabilidade ou à distribuição das chuvas causadas pela ZCAS. Além disso, a atividade
agrícola e a pecuária também são afetadas com uma distribuição irregular de chuvas.
Neste sentido, os eventos extremos de chuva podem afetar as culturas, trazendo
relacionada com outros sistemas, tais como os sistemas frontais e a Alta da Bolívia
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(FERREIRA et al., 2004, p. 95). Estudos realizados por estes autores mostraram uma
relação entre a atividade oceânica da ZCAS e o fenômeno El Niño-Oscilação Sul
(ENOS), de modo que fases quentes do ENOS tendem a favorecer a persistência da
ZCAS oceânica mais intensa. A ZCAS, por meio de sua organização e evolução
espacial, variabilidade e consequências ambientais mostra-se um fenômeno de
grande relevância e seu melhor entendimento depende da compreensão das
interações entre regiões tropicais e extratropicais e da complexidade das relações
entre sistemas acoplados em diferentes escalas espaço-temporais.
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O termo JBN foi introduzido por Means (1952) para descrever uma zona de forte fluxo de ar de sul, que
ocorre abaixo do nível de 700 hPa (aproximadamente 3 km), observada no centro-sul dos Estados Unidos. Na
América do Sul, segundo Vera et al. (2006a) ocorre um JBN, conhecido como Jato de Baixos Níveis da América do
Sul (JBNAS), cujo mecanismo pode ser entendido como um fluxo de ar úmido dos ventos alísios do Atlântico
Tropical que, ao passar sobre a Amazônia, pode adquirir maior quantidade de umidade devido à forte
evapotranspiração desta região. Este ar úmido e quente é canalizado pelos Andes adquirindo uma aceleração da
componente meridional do vento de norte (MARENGO et al., 2004).
chuvas localizadas (SILVA DIAS et al., 2009, p. 191). Cabe ressaltar que grande parte
dos CCMs se forma em associação com os JBNs, fluxos de ar quente e úmido com
máxima velocidade e situados à cerca de 3.000 metros de altitude, oriundo da
Amazônia. Assim, contribui para elevadas precipitações sobre as regiões com CCMs
em formação (Figura 6).
Alguns autores (e.g. NIETO FERREIRA et al., 2003, p. 971) constataram que a
atividade convectiva sobre o norte da Argentina, Paraguai e regiões Sul e Sudeste do
Brasil apresenta correlação negativa com a convecção associada à ZCAS, onde em
situações em que a zona de convergência estava ausente, notava-se uma
intensificação dos JBNs e, na presença da ZCAS, a circulação de NO-SE predomina e
inibe o fornecimento de calor e umidade para os CCMs por parte dos JBNs.
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Figura 7 - Deslocamento de frente fria pelo centro-sul do Brasil com faixa de nuvens que se
estende desde o Mato Grosso do Sul até o Atlântico Sul. Imagem obtida pelo satélite GOES 13 de
24/09/2014. Fonte: CPTEC/INPE (2014).
Lucena e Oliva (2012, p. 56) analisaram o volume das chuvas intensas que
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um sistema de baixa pressão que se intensificou à leste da região Sudeste. Este sistema
teve sua formação à leste do Rio Grande Sul no próprio dia 05. O anticiclone
migratório pós-frontal, com núcleo de 1028 hPa e com características marítimas,
direcionou uma pista de ventos de sul para o Rio de Janeiro, que transportaram ar frio
e úmido provocando declínio da temperatura, muita nebulosidade e chuva. Na
história do monitoramento da chuva, realizada pela GEORIO, dos dez mais elevados
índices pluviométricos sucedidos em 24 horas, cinco ocorreram no dia 06 de abril de
2010, sendo quatro em postos do Maciço da Tijuca (Rocinha: 304,6 mm; Jardim
Botânico: 303 mm; Tijuca: 280 mm e Vidigal: 264,6 mm), confirmando a magnitude
do fenômeno meteorológico e a importância do conjunto montanhoso na cidade
(LUCENA; OLIVA, 2012, p. 60).
Considerações Finais
decisão para subsidiar ações que reduzam os impactos dos eventos extremos de chuva
sobre a sociedade.
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