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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

“Rei Édipo”
Temas Universais e Impacto Contínuo

Joana Frois (a103518)


João Oliveira (a105525)
Leonor Esteves (a103450)
Leonor Ferreira (a99315)

Licenciatura em História | Braga, 2023

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

“Rei Édipo”
Temas Universais e Impacto Contínuo

Joana Frois (a103518)


João Oliveira (a105525)
Leonor Esteves (a103450)
Leonor Ferreira (a99315)

Licenciatura em História | Braga, 2023

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

Índice

Índice de figuras ............................................................................................................... 5

Introdução ......................................................................................................................... 6

Metodologia ...................................................................................................................... 6

1. O teatro grego ............................................................................................................ 7

2. Sófocles - Vida e obra ............................................................................................... 9

3. Rei Édipo – O enredo do drama .............................................................................. 10

4. As personagens ........................................................................................................ 12

4.1. Édipo.................................................................................................................... 12

4.2. Creonte ................................................................................................................ 13

4.3. Jocasta.................................................................................................................. 13

4.4. Tirésias ................................................................................................................ 14

4.5. Coro ..................................................................................................................... 15

5. Representação do rei ............................................................................................... 16

6. Representação da morte .......................................................................................... 17

6.1. O assassinato de Laio .......................................................................................... 17

6.2. O suicídio de Jocasta ........................................................................................... 18

7. Impacto cultural da peça ......................................................................................... 18

7.1. Mundo literário .................................................................................................... 19

7.2. Complexo de Édipo ............................................................................................. 19

Conclusão ....................................................................................................................... 20

Referências Bibliográficas .............................................................................................. 21

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

Índice de figuras

Figura 1 - Planta de um teatro grego ................................................................................ 8


Figura 2 - "Oedipus Separating from Jocasta" de Alexandre Cabanel ........................... 11
Figura 3 - Édipo .............................................................................................................. 12
Figura 4 - Creonte ........................................................................................................... 13
Figura 5 - Jocasta com Antígona (ou Ismena) ................................................................ 14
Figura 6 - Tirésias ........................................................................................................... 15
Figura 7 – “Édipo em Colono” de Jean-Baptiste Hugues .............................................. 17
Figura 8 – Encenação atual de "Rei Édipo" (Alagoas, 2017) ......................................... 19

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

Introdução

A tragédia grega desempenha um papel fundamental na história do teatro e, assim


sendo, uma das obras mais influentes deste mesmo género é “Rei Édipo” do renomado
dramaturgo ateniense Sófocles.
“Rei Édipo” não apenas revela a maestria artística de Sófocles, mas também oferece
uma narrativa complexa que fascinou séculos de gerações que apreciam o teatro enquanto
arte, sendo, ainda na atualidade, uma peça prestigiada e responsável por fomentar o
desenvolvimento de diversas áreas não somente artísticas como também científicas.
Para compreender completamente o impacto de “Rei Édipo” é essencial não somente
a realização de uma análise da vida e obra de Sófocles quanto a história e evolução do
teatro grego.
O magnum opus do grande mestre da tragédia grega relata a história de um homem
cujo destino trágico é traçado pelos deuses, não se focando apenas no desenvolvimento
da personagem principal, Édipo, mas também na forma como a profecia que dita a sua
vida impacta o destino da cidade de Tebas e a vida das restantes personagens que
constituem o drama, entre elas Jocasta, Creonte e as filhas do afamado casal incestuoso,
Antígona e Ismena.
A peça explora temas profundos como o livre-arbítrio e o determinismo, a busca pela
verdade e os limites do conhecimento humano.
O impacto de “Rei Édipo” vai além do teatro grego antigo, sendo uma peça que
continua a ser encenada como também estudada devido às reflexões e questionamentos
que traz acerca da condição humana.
Deste modo, este trabalho visa a compreensão da história do teatro grego, da vida e
obra de Sófocles, bem como uma análise sobre as personagens que integram “Rei Édipo”
e o impacto cultural da peça em si, que, ainda na época presente, se revela transcendente
e responsável por moldar o entendimento do teatro e da condição humana ao longo dos
séculos.

Metodologia

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

O presente trabalho pretende analisar “Rei Édipo” enquanto uma das peças teatrais
atenienses mais influentes do século V a. C.
Desta forma, foi empreendida uma análise a partir de um estudo da evolução do teatro
grego, do desenvolvimento artístico de Sófocles e do teor teórico da peça, sendo realizada
uma avaliação do drama, das personagens que o formam e dos reflexos sociais atenienses
transferidos para o enredo.
A metodologia adotada consistiu no procedimento da leitura na íntegra de “Rei
Édipo”. Esta permitiu uma reflexão sobre a obra, o trabalho do autor e, consequentemente,
o impacto que a mesma possui. Como instrumento de estudo, de preparação e, por fim,
de formulação do trabalho, foi também recorrido à utilização de estudos publicados sobre
a obra, tanto livros, como artigos e trabalhos académicos, o que permitiu a agregação de
conhecimentos às ponderações já retiradas através da leitura da tragédia sofocliana.

1. O teatro grego

Ao longo da civilização humana encontramos em diversas culturas a existência de


formas de representação. O teatro ocidental, independente de rituais religiosos e enquanto
categoria e forma de arte, surge na Grécia no século VI a. C. Inicialmente, o teatro surge
como forma de culto e homenagem a Dionísio, sendo cantado nos festivais em honra do
deus, e posteriormente incorporando elementos homéricos nas representações, que se
subdividiam em dois géneros, tragédia e comédia. Ésquilo, cujas tragédias datam a
primeira metade do século V, sendo as obras teatrais mais antigas sobreviventes, é quem
cria a base de uma nova estética dramática que influenciou peças durante mais de 2000
anos. As convenções concebidas por Ésquilo são a adição de um segundo ator e a redução
do coro de 50 para 12 pessoas. Além disso, a tragédia deveria abordar eventos
significantes e figuras ilustres baseando-se em mitos e histórias com algum tipo de
significado religioso, moral ou político. Todo o cosmos deveria ser representado numa
estrutura vertical sendo a parte de cima o lugar dos deuses, o meio a terra, onde o coro se
apresentava, e a parte inferior estava destinada ao exílio. As convenções de Ésquilo foram
aperfeiçoadas por Sófocles, tendo este aumentado o número de pessoas no coro para 15
e o número de atores para 3 (Beer, 2004), sendo assim possível interpretar mais
personagens. Eurípides, por sua vez, trouxe realismo para a ação, reforçando o
dramatismo através da redução do papel do coro. Por outro lado, a comédia era

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

apresentada em Atenas durante o festival de inverno de Leneias. Com a morte de


Eurípides, em 406 a. C., a tragédia entra em declínio permitindo a ascensão da comédia.
Esta passa por uma mudança em relação aos assuntos abordados, estando estes
relacionados com a vida urbana, ao contrário dos anteriores que estavam ligados à
religião.
Segundo Thanos Vovolis o teatro grego (theatron) deriva do verbo theaomai que
significa ver ou contemplar. Os espetáculos eram um evento acústico-visual. Os teatros
eram geralmente construídos na encosta de uma colina, com um recesso oco que se
inclinava para baixo a um ângulo de aproximadamente 45 graus onde se escalonavam os
degraus. A escolha de lugar deu forma ao auditório que combinava quase perfeitamente
com a projeção da voz humana. O teatro situado nas colinas da acrópole ateniense data
do fim do século 6 a.C. Nos seus primórdios o teatro consistia apenas de uma orquestra e
a plateia ficava de pé na encosta da colina. Mais tarde foram adicionados bancos de
madeira e em meados do século 5 a.C. o palco foi construído (Pereira, 2017). O
desenvolvimento das melhorias da visibilidade e da acústica culminam com o Teatro de
Epidauro, construído em 320 a.C., através da construção de um palco elevado.

Figura 1 - Planta de um teatro grego

As máscaras sempre foram utilizadas no teatro grego pelos atores, independentemente


do género teatral apresentado, no entanto diferiam consoante o mesmo, sendo mais
exageradas nas comédias e permitindo a distinção automática pela plateia entre

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personagens masculinas e femininas através da atribuição de traços característicos. As


máscaras cobriam toda a cabeça do ator e deveriam ficar bem justas tendo ainda pequenas
aberturas para os olhos e para a boca. A forma das máscaras auxiliava na projeção da voz
de quem as usava. Este fenómeno acústico foi descrito pelo arquiteto romano Vitrúvio no
seu livro “De Architectura”. Apesar de não restarem vestígios físicos das máscaras, o que
revela a sua fragilidade, é possível entender a sua forma devido a pinturas feitas em
cerâmicas que remontam a este período.

2. Sófocles - Vida e obra

Sófocles nasceu em 496 a.C. em Colono e faleceu em 406 a.C. em Atenas e,


juntamente com Ésquilo e Eurípides, forma a tríade dos mais celebrados dramaturgos de
tragédias gregas.
As suas peças retratam personagens nobres e da realeza, algo que faz sentido tendo em
conta a própria realidade do autor pois este era filho de um mercador rico, Sófilo, facto
que lhe permitiu o acesso a uma educação de qualidade.
Participou em cerca de 30 concursos tendo vencido 24. Destes, destaca-se a sua
primeira vitória que data o ano de 468 a.C. onde ficou em primeiro lugar na competição
de drama ateniense, durante os Festivais Dionisíacos, ficando à frente de outro mestre do
teatro, Ésquilo.
Diferencia-se dos restantes dramaturgos pela sua atenção ao desenvolvimento das
personagens ao longo da peça, sendo a personalidade destas o fator principal da premissa
do drama, ao contrário de outros autores em que a tragédia dependia de um acontecimento
específico por estes previamente formulado. Além de inovar na escrita das peças, foi
também responsável por alterações a nível prático no teatro como o aumento do coro e a
adição de atores, assim como a criação de cenários, inovação adotada posteriormente por
outros dramaturgos.
Ao longo da sua vida escreveu cerca de 123 peças das quais apenas 7 chegaram aos
dias de hoje completas. O seu magnum opus é “Rei Édipo”, primeira peça da trilogia
tebana, constituída também por “Édipo em Colono” e “Antígona”.

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3. Rei Édipo – O enredo do drama

“Rei Édipo”, originalmente Oedipus Tyrannos, peça que se torna o «paradigma da


tragédia grega» (Fialho, 2022), não venceu a primeira competição da sua apresentação,
sendo derrotada por Fílocles. A sua primeira representação é certamente posterior a 429
a. C., pois no seu prólogo é descrita uma epidemia pestífera que devasta Tebas,
coincidente com a peste que assolou Atenas durante o período de 430 a 429 a. C. relatada
por Tucídides (Fialho, 2022).
Assim sendo, a peça inicia apresentando-nos o então rei de Tebas, Édipo. Este dirige-
se à porta do palácio onde se encontra um grupo de jovens e anciãos que «sustentam na
mão ramos de suplicantes» (Fialho, 2022), acompanhados pelo sacerdote de Zeus e os
dois conversam sobre a peste que está a assolar a cidade enquanto esperam por Creonte,
cunhado de Édipo, que havia sido enviado ao oráculo de Delfos e que entretanto chega,
trazendo notícias sobre a epidemia. Este último afirma que a peste irá acabar quando
descobrirem e exilarem o assassino do último rei, Laio.
Mais tarde, após Édipo ouvir as súplicas do Coro dos anciãos de Tebas, Tirésias, um
profeta cego, entra em cena e revela em forma de metáforas que o mal que a cidade está
a sofrer reside em Édipo devido à sua conduta e as suas escolhas anteriores. O rei, ouvindo
estas injúrias lançadas sobre ele, prossegue à expulsão de Tirésias do palácio.
Depois deste episódio, Édipo inicia uma discussão com Creonte, acreditando que o seu
cunhado teria persuadido Tirésias a conspirar contra ele com o intuito de o destronar. Isto
leva a que consequentemente Édipo acuse Creonte de ser o assassino de Laio, dando-lhe
a escolher o exílio ou a morte.
Esta discussão é interrompida por Jocasta, a sua esposa e irmã de Creonte. Creonte
acaba por se retirar da cena e Édipo explica à sua mulher a razão da sua ira para com o
seu irmão afirmando que este conspira contra ele e que, juntamente com Tirésias, acredita
que Édipo matou o último rei. Jocasta acalma o seu marido dizendo que acredita na sua
inocência e que desconsidera as «artes da adivinhação» (Fialho, 2022).
Neste momento crucial da peça, Jocasta explica a profecia feita pelo oráculo de que o
seu primeiro marido morreria às mãos de um filho nascido do seu casamento, e passa a
contar como o Laio faleceu, dizendo que foi morto em Fócida, uma região no entroncar
dos caminho de Delfos e Dáulia. Édipo fica apreensivo pois ele matou um grupo de
homens nesse mesmo lugar cuja descrição se assemelha à feita pela sua esposa.

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Édipo revela a Jocasta que, durante um banquete em Corinto, reino do qual era
oriundo, um homem teria afirmado que o rei Pólibo e a rainha Mérope, pais de Édipo, o
teriam adotado, e que este, atormentado com as palavras do desconhecido, fora a Píton
consultar Apolo que lhe teria profetizado que se tornaria o assassino do pai que o gerou e
se uniria à mãe, o que resultou na sua fuga de Corinto para evitar a concretização da
profecia. Decidem os dois chamar o único servo sobrevivente que presenciou o
assassinato de Laio para apurar a situação.
Entretanto, um mensageiro vindo de Corinto chega a Tebas e dá a notícia que Pólibo,
pai de Édipo faleceu. Além desta notícia, conta que recebeu Édipo em bebé dos braços de
um pastor. Édipo quer entender melhor esta história e chama então o pastor ao palácio,
mas a sua esposa opõe-se a tal pois já deduziu o final da história, acabando por sair da
cena.
O pastor entra em cena e explica que quem lhe entregou o bebé nos braços foi a esposa
de Laio, ou seja, Jocasta.
O rei entende então a profecia de Tirésias e toma consciência da tragédia que é a sua
vida. Jocasta, esposa-mãe de Édipo, decide, entretanto, tira a própria vida e Édipo acaba
por cegar-se e exilar-se juntamente com uma de suas filhas-irmãs, Antígona.

“O vosso pai matou o próprio pai; fecundou a mãe por quem ele próprio nasceu.”

Figura 2 - "Oedipus Separating from Jocasta" de Alexandre


Cabanel

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4. As personagens

4.1. Édipo

Édipo não é um homem perfeito pois tem um temperamento violento e irritável que
sob a ação da cólera ou do desespero profere palavras terríveis e impensadas (Fialho,
2022). Também é bastante teimoso recusando-se muitas vezes a ouvir os conselhos dos
outros, particularmente da sua esposa, Jocasta, facto que levou à descoberta da profecia
trágica que rege a sua vida.
Apesar do seu temperamento é um homem com uma capacidade de amar profunda que
depois de cego quando se prepara para o exílio a sua única preocupação é o futuro sombrio
das suas filhas. (Fialho, 2022).
Na qualidade de rei exercia a sua função perfeitamente sendo acarinhado pelo seu
povo. Mostrava bastante responsabilidade em relação ao estado do seu reino, tendo
enviado Creonte ao oráculo de Delfos para descobrir informações sobre a peste.
Já a sua cegueira, como autopunição, representa o assumir de responsabilidade do
herói (Fialho, 2022), servindo também enquanto metáfora para o estado de negação, em
relação ao assassinato de Laio, que Édipo nos apresenta durante o decorrer da peça
(Fergusson, 2007).

Figura 3 - Édipo

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4.2. Creonte

Creonte, filho de Meneceu e irmão de Jocasta, é um dos principais membros da família


real de Tebas, sendo conhecido pela sua inteligência e lealdade, insistindo durante o
decorrer da peça que não possui desejo de poder.
Creonte é representado como um defensor da justiça e da verdade, não tendo receio de
a expor mesmo quando é inconveniente. É também a personagem menos emotiva da peça
e a sua calma acaba até por exasperar Édipo.
É a imagem do governante frio, do raciocínio sutil e sofístico que nem a injusta
acusação por parte de Édipo conseguem abalar. (Fialho, 2022).
Enquanto a peça progride e o destino de Édipo é eventualmente revelado, Creonte é
reconhecido como a “voz da razão” e da estabilidade, servindo como compasso moral da
tragédia.

Figura 4 - Creonte

4.3. Jocasta

Mãe biológica de Édipo que acaba por perder o contacto com o filho depois de
acreditar na sua morte.
Após ficar viúva de Laio, assassinado pelo próprio Édipo, acaba por se casar com o
filho, desconhecendo a sua verdadeira identidade, e gerando dele quatro filhos, Polinices,
Etéocles, Antígona e Ismena.

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Figura 5 - Jocasta com Antígona


(ou Ismena)

Jocasta representa inicialmente a nobreza e atua como moderadora entre Édipo e


Creonte, com quem mantém uma relação de proximidade. A sua força, no entanto, vem
do poder de sedução que utiliza na linguagem afetiva de esposa dedicada e submissa
conseguindo assim conduzir o seu marido Édipo.
É uma mulher de razões afetivas cuja tragédia deriva do erro de amar em excesso e o
seu ceticismo em relação ao oráculo acontece devido à necessidade de proteger o seu
afeto por Édipo. (Fialho, 2022).

4.4. Tirésias

Tirésias é, segundo Webster, o «esboço do ancião cego e irritável» (Fialho, 2022).


Apesar de ser um profeta detentor da verdade divina, Tirésias não perde a sua qualidade
humana.
Quando se encontra com Édipo recusa-se a revelar que este é o responsável pelo
parricídio, no entanto, devido à crescente tensão do diálogo entre ambos acaba por lhe
revelar, não por «êxtase profético», mas pela irritação que Édipo lhe provoca. As palavras
por ele proferidas são tanto diretas como ambíguas, demonstrando superioridade em
relação aos restantes tebanos visto possuir um «saber vedado aos homens comuns»
(Fialho, 2022).

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

Figura 6 - Tirésias

Tirésias faz uso recorrente da ironia e do sarcasmo, dizendo que Édipo poderia
desconsiderá-lo, mas que, no entanto, aqueles que o geraram (referindo-se a Laio e a
Jocasta) lhe atribuíram sensatez e legitimidade e que Édipo, sendo aquele que resolveu o
enigma da Esfinge, não deveria ter qualquer dificuldade em decifrar as suas palavras
«enigmáticas e obscuras» (Fialho, 2022).
A cegueira de Tirésias, natural e literal, contrasta com a de Édipo no final da peça,
assim sendo, o profeta, apesar de cego, serve uma visão mântica da verdade.

4.5. Coro

De acordo com Aristóteles, o coro sofocliano é um personagem que possui um papel


importante na ação da peça, ao invés de apenas cantar entre as cenas como nas peças dos
outros dramaturgos.
Este coro existe como uma entidade, mas não na qualidade de um indivíduo. Ele
entende, mas a sua perceção é ao mesmo tempo maior e mais vasto do que apenas a de
um só personagem.
No desenvolvimento da ação o coro interpreta um papel tão importante como o do
protagonista visto que ele é a ponte entre o Édipo e os seus antagonistas, marca o

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progresso dos seus problemas e reafirma o tema principal e os caminhos que a peça vai
tomando após cada diálogo.
O coro consiste de doze a quinze anciões tebanos, os líderes de Tebas, representando
a sociedade e as suas normas na Grécia Antiga. O teatro é a ágora de Tebas, assim sendo
o coro representa a cidade e a sua perspetiva e, por analogia, o público ateniense
(Fergusson, 2007).

5. Representação do rei

O rei possui um papel fundamental em “Rei Édipo” sendo a personificação da


liderança e autoridade e, por conseguinte, sendo o responsável pela administração política
da cidade, neste caso a de Tebas. Assim sendo, Édipo demonstra-se preocupado pela
manutenção da ordem e pelo bem estar comum dos tebanos, contudo, devido ao poder
que o mesmo detém, denota-se uma clara influência na forma como que este se relaciona
com os restantes.
Por outro lado, o rei encarna o herói trágico, possuindo qualidades nobres, mas, ainda
sim, decaindo ao longo da história devido às falhas que vai cometendo que influenciam
diretamente o reino.
Mesmo devido às falhas que comete, o rei demonstra-se aberto a tomar
responsabilidade por aquilo que cometeu. O relacionamento que Édipo mantém com a
sua mãe, Jocasta, apesar de não consciente ou proposital, é a causa da praga que aflige
Tebas, e, mesmo consistindo algo vergonhoso, Édipo assume-o e cumpre a promessa que
realiza no início da peça, exilando-se e revelando o seu compromisso com aquilo que o
define enquanto rei em primeiro lugar, o reino.
O rei, em “Rei Édipo” serve também como elemento de representação da húbris,
através do excessivo orgulho e arrogância e as consequências que deles provém.
Por fim, o rei também é a incorporação do sacrifício, o que se denota pela autopunição
que Édipo exerce sobre si mesmo, primeiramente cegando-se e, posteriormente,
recorrendo ao exílio, entendendo o seu erro e salvando Tebas.

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

Desta forma, a figura do rei na peça representa o herói que irá salvar a população das
pragas que assombram Tebas. Também o casal real deve representar fertilidade
influenciando as culturas e a produção da sua cidade. Neste caso, como o casal é
incestuoso, e, consequentemente considerado ilícito, os campos não são agraciados com
terras férteis, logo os infortúnios tebanos são fruto das ações inconscientes dos monarcas
(Asaad).

Figura 7 – “Édipo em Colono”


de Jean-Baptiste Hugues

6. Representação da morte

Na tragédia grega, a representação da morte de uma personagem possui,


inevitavelmente, um motivo, sendo atribuídas causas e formas específicas de morrer
conforme a personagem, o que ela representa e a sua caracterização, adequadamente com
as convenções sociais atenienses. Assim sendo, a morte apresenta-se como um dos temas
centrais de “Rei Édipo”, estando presente ao longo de toda a história.

6.1. O assassinato de Laio

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

A morte de Laio, pai de Édipo, é o ponto de início do desenrolar da ação. Laio não é
uma personagem atuante pois quando a peça se inicia ele já se encontrava morto. A sua
morte ocorre numa encruzilhada e a escolha deste local representa «a centralização do
mundo» (Dias, Botton, 115) e a passagem desse mesmo mundo para outro. A morte desta
personagem mostra a impossibilidade humana de evitar o destino, visto que Laio tenta
contornar a profecia que lhe é feita ao abandonar Édipo à nascença, resultando,
inevitavelmente, no parricídio.

6.2. O suicídio de Jocasta

Além disso, a morte também é explorada na peça através do suicídio de Jocasta, uma
morte considerada «infame» e «suja » bem como não heroica, visto que esta última não
estava reservada às mulheres na tragédia grega (Dias, Botton, 117). Contudo existem
também diferenciações nas mortes reservadas às mulheres, havendo uma distinção
quando se aborda o suicídio de uma mãe, sendo mais comum «suicídio pela lâmina»
(Dias, Botton 117) visto estar relacionado com o parto, e o suicídio de uma jovem virgem,
ao qual é usualmente atribuído o enforcamento.
Desta forma, quando Jocasta se enforca, ela está a marcar uma posição. O
enforcamento associado à virgindade é observável em Antígona quando, no final da peça,
a jovem filha do casal incestuoso retira a própria vida utilizando este mesmo método.
Logo, segundo Haynes (2021), ao decidir morrer desta forma, Jocasta não está só a
colocar um fim à maldição da sua vida, mas também a mostrar o seu desejo de voltar atrás
no tempo, para uma época anterior ao seu casamento com Laio e à conceção de Édipo.

7. Impacto cultural da peça

Ainda hoje conseguimos ter acesso ao legado deixado pela obra de Sófocles, desde o
seu papel no teatro, na literatura até à sua influência fundamental na psicanálise.

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Figura 8 – Encenação atual de "Rei Édipo" (Alagoas, 2017)

7.1. Mundo literário

O impacto literário foi, talvez, um dos maiores e aquele que a influência ainda é sentida
atualmente.
A criação de arquétipos que seguem sendo utilizados no mundo da ficção seja no
cinema, na televisão ou na literatura demonstram o nível do impacto cultural que esta
peça tem no mundo artístico.
O herói trágico, a profecia inescapável e o poder do sobrenatural são instrumentos
artísticos utilizados em várias obras que hoje são consideradas clássicas, mas que são
posteriores a esta peça.
Na área da psicologia, também encontramos uma clara inspiração. Sigmund Freud
aproveitou o mito para conceber e desenvolver uma das mais famosas teorias, a do
Complexo de Édipo.

7.2. Complexo de Édipo

O Complexo de Édipo é um fenómeno para designar um certo período do


desenvolvimento infantil de uma criança, mais precisamente, quando esta começa a
desenvolver sentimentos amorosos inconscientes pelo progenitor do sexo oposto e
demonstra sentimentos de rivalidade para com o do mesmo sexo. O psicanalista inspirou-

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

se no ato inconsciente de Édipo de contração de matrimónio com a própria mãe para dar
nome à sua teoria.

Conclusão

Concluímos este trabalho com a esperança de que conseguimos apresentar e analisar


todas as complexidades da obra, Rei Édipo de Sófocles. Além da escrita de peças de
teatro, Sófocles conseguiu desenvolver o teatro grego antigo de maneira prática e visual.
Como vimos anteriormente o impacto cultural desta peça estende-se até aos dias de hoje
em áreas como a psicanálise, influenciando o pai da psicanálise, Sigmund Freud, e a
literatura inspirando dramaturgos e romancistas até aos dias de hoje.
A complexidade psicológica das personagens e o uso perpétuo destas características
por parte de outros autores revela a imensa maestria do autor em conseguir criar
arquétipos, como o herói trágico por exemplo, que seguem sendo utilizados até os dias de
hoje.
Mesmo não sendo a peça de teatro mais conhecida atualmente pelo público em geral
devido a nomes como Shakespeare e Tchékov que nos dias de hoje são imensamente mais
conhecidos é inegável a influência que toda a obra de Sófocles exerce sobre o mundo
dramatúrgico como um todo sendo merecedor o reconhecimento deste autor como um
dos cânones do teatro universal.

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“Rei Édipo” – Temas Universais e Impacto Contínuo

Referências Bibliográficas

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https://www.academia.edu/35910751/The_Role_of_the_King_in_Mythology_Oedipus_
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Botton, F. V., & Dias, L. L. (2009). Formas de Tânatos em Édipo Rei. Todas as Musas.

Fergusson, F. (2007). Oedipus Rex . New York : Infobase Publishing.

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Haynes, N. (2021). Pandora's Jar: Women in the Greek Myths. Londres: Picador .

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