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PORTUGUÊS 10º ANO

M. Rosário Luís

APOIO AO ESTUDO DE OS LUSÍADAS DE LUÍS DE CAMÕES

I DADOS BIOGRÁFICOS DE CAMÕES

 Incertezas - nasc. 1524/25; Lisboa? Setúbal? Coimbra? Santarém? Alenquer?


 Filho de Simão Vaz Camões (fidalgo de descendência galega);
 Estudos – Coimbra - Mosteiro de Santa Cruz;
 1542- Corte - frequenta os serões;
 Paixão - D. Catarina de Ataíde (Natércia);
 1545- Ceuta - soldado;
 1552- Problemas - é preso e parte para o Oriente;
 1568- Chega a Lisboa, pobre;
 1572- Publicação de Os Lusíadas - tença de 15.000;
 1580- Morre a 10 de Junho.

Nem me falta na vida honesto estudo


Com longa experiência misturado, Concilia teoria (honesto estudo), prática
Nem engenho que aqui vereis presente, (experiência), engenho (talento) e
capacidades militares (soldado)
Cousas que juntas se acham raramente.

Pera servir-vos, braço às armas feito,


Pera cantar-vos, mente às Musas dada;
O IDEAL DO HOMEM NOVO
est.154 -155, Canto X

EPOPEIA/POEMA ÉPICO/ NARRATIVA ÉPICA

Narrativas de fundo histórico em que se registam poeticamente as tradições e os ideais de um


grupo étnico sob a forma de aventuras de um ou alguns heróis.

ESTRUTURA FORMAL - clássica, de acordo com o ideal renascentista.

*Externa - estrofe - oitavas (1102); 10 Cantos


Metro - decassílabo heroico (8816)
Rima - cruzada e emparelhada.

*Interna
1. Proposição (Canto I, estrofes 1-3) o poeta propõe-se cantar os portugueses e os seus feitos
heroicos.
2. Invocação (Canto I, estrofes 4-5) o poeta invoca as ninfas do Tejo (Tágides) para que lhe deem
inspiração sublime para cantar os feitos grandiosos dos portugueses. Ao longo do poema
aparecem mais três: a Calíope (musa da poesia épica), no Canto III, estrofes 4 e 5; às ninfas do
Tejo e do Mondego, no canto VII, estrofes 78 a 82, e novamente a Calíope, no canto X, estrofe
8.

3.Dedicatória (estrofes 6-18) o poeta dedica o poema ao rei D. Sebastião que o poeta vê como
representante do povo português e garantia da sua liberdade. Esta parte, que é facultativa, não
existe em nenhuma das epopeias da Antiguidade.

4.Narração (Canto I, estrofe 19 – Canto X, estrofe 144, apresentando, apenas, algumas


interrupções pontuais)

 Presença da mitologia pagã (greco-latina) – os deuses contracenam com heróis humanos;


 Herói coletivo – povo Português;
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 Estilo grandíloquo (cf. Invocação).

NARRADORES:
CAMÕES relata-nos a viagem de Vasco da Gama desde Moçambique até à Índia e toda a viagem
de regresso [I, II, VI, VII, VIII, IX e X];
VASCO DA GAMA conta ao rei de Melinde a viagem desde Lisboa até Moçambique [V] e a História
de Portugal [III e IV];
PAULO DA GAMA relata, em Calecut, ao Catual alguns factos da nossa História e explica o
significado das vinte e três figuras representadas nas bandeiras [VIII];
FERNÃO VELOSO descreve o episódio dos Doze de Inglaterra [VI].

• A Narração d’Os Lusíadas inicia-se in media res e constrói-se através da articulação de quatro
planos fundamentais com funções específicas (os chamados planos de ação):

- Plano da Viagem (narrativo /fulcral – constitui a ação central, a narrativa da viagem de Vasco
da Gama à Índia). Tem como função conferir unidade ao poema – esqueleto do poema: narração
dos acontecimentos ocorridos durante a viagem de dois anos realizada entre Lisboa e Calecut
[todos os cantos, exceto o III]:
- partida em 8 de julho de 1497;
- peripécias da viagem;
- paragem em Melinde durante 10 dias;
- chegada a Calecut em 18 de maio de 1498;
- regresso a 29 de agosto de 1498;
- chegada a Lisboa da nau de Vasco da Gama em 29 de agosto de 1499.

- Plano dos Deuses ou Mitológico - (constitui a ação paralela, é a intervenção do sobrenatural


na história, ocupa-se da mitologia pagã). Surge continuamente articulado com o da Viagem e
paralelo a este, formando, em conjunto, a ação principal do poema. A sua função é conferir
beleza, ação e diversidade ao poema e ajudar à divinização dos Portugueses. A mitologia permite
a evolução da ação, na medida em que os deuses se assumem como adjuvantes ou como
oponentes dos Portugueses:
- Consílio dos Deuses no Olimpo [I];
- Consílio dos Deuses Marinhos [VI];
- Ilha dos Amores [IX].

- Plano da História de Portugal (narrativa de episódios da História de Portugal). Surge encaixado


no plano da Viagem (III, IV e VIII) com a função de relatar e enaltecer a História de Portugal:

- em Melinde, Vasco da Gama narra ao rei os acontecimentos de toda a nossa História, desde
Viriato até ao reinado de D. Manuel I;
- em Calecut, Paulo da Gama apresenta ao Catual episódios e personagens representados nas
bandeiras;
- a História posterior à viagem do Gama é narrada, em prolepse, através de profecias:
•Júpiter prevê, para os Portugueses, feitos ilustres no Oriente [II, 44-55];
• sonho profético de D. Manuel I [IV, 66-75];
•Adamastor prevê desgraças para quem navegar os seus mares [V, 42-48];
•Sirena (ninfa) descreve glórias futuras dos Portugueses no Oriente [X, 10-74];
•Tétis, contemplando a Máquina do Mundo, indica os lugares onde os Portugueses hão de
realizar feitos heroicos [X, 92-141].

- Plano das Considerações / Reflexões do Poeta (reflexões e intervenções diretas do poeta,


normalmente no início e no fim dos cantos. Constituído também por críticas, lamentos e
exortações).

A sua função é transmitir as posições do poeta face ao mundo, aos outros e a si mesmo.
Camões apresenta-se nas suas reflexões como um guerreiro e poeta a quem não “falta na
vida honesto estudo, / Com longa experiência misturado, / Nem engenho” (Canto X, estrofe

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154). Um poeta que, ainda que perseguido pela sorte e desprezado pelos seus contemporâneos,
assume o papel humanista de intervir, de forma pedagógica, na vida contemporânea. Por isso
critica a ignorância e o desprezo pela cultura dos homens de armas (Canto V); denuncia o
desprezo pelo bem comum, a ambição desmedida, o poder exercido com tirania, a hipocrisia dos
aduladores do rei, a exploração dos pobres (Canto VII); denuncia o poder corrupto do ouro (canto
VIII) e propõe um modelo humano ideal de “heróis esclarecidos” que terão ganho o direito de ser
na “ Ilha de Vénus recebidos” (Canto IX, estrofe 95).
Mas o poema, acima de tudo, evidencia a grandeza do passado de Portugal: um pequeno
povo que cumpriu ao longo da História a missão de dilatar a Cristandade, que abriu novos rumos
ao conhecimento, que mostrou a capacidade do Homem de concretizar o sonho.
Ao cantar a gesta heroica do passado, o poeta pretende mostrar aos seus contemporâneos
a falta de grandeza do Portugal presente, metido “No gosto da cobiça e na rudeza / Dhua austera,
apagada e vil tristeza.” (Canto X, estrofe 145) e incentivar o Rei D. Sebastião a conduzir os
portugueses para um futuro glorioso, para uma nova era de orgulho nacional.

 Refere aquilo que o homem tem de enfrentar: «os grandes e gravíssimos perigos», a
tormenta e o dano no mar, a guerra e o engano em terra [I, 105-106];
 Põe em destaque a importância das Letras e lamenta que os portugueses nem sempre
saibam aliar a força e a coragem ao saber e à eloquência [V, 92-100];
 Realça o valor das honras e da glória alcançadas por mérito próprio [VI, 95-99];
 Faz a apologia da expansão territorial para divulgar a fé cristã; critica os povos que não
seguem o exemplo do Povo Português que, com atrevimento, chegou a todos os cantos do
Mundo «e, se mais mundos houvera, lá chegara» [VII, 2-14];
 Lamenta a importância atribuída ao dinheiro, fonte de corrupções e de traições [VII, 96-
99];
 Explica o significado da Ilha dos Amores [IX, 89-92];
 Dirige-se a todos aqueles que pretendem atingir a imortalidade, dizendo-lhes que a
cobiça, a ambição e a tirania são honras vãs que não dão verdadeiro valor ao homem [IX,
93-95];
 Confessa estar cansado de «cantar a gente surda e endurecida» que não reconhece nem
incentiva as suas qualidades artísticas. Manifesta o seu patriotismo e exorta D. Sebastião
a dar continuidade à obra grandiosa do povo português [X, 145-156].

O Homem Novo é aquele que concilia «engenho» com virtude militar, teoria com prática
(«numa mão sempre a espada e noutra a pena»). Apesar de surgir como um poeta desiludido e
amargurado pelas ações do Homem («a Lira tenho / Destemperada e a voz enrouquecida / [de]
/ Cantar a gente surda e endurecida.»), Camões não deixa de confiar na Humanidade.

O ESTILO DE CAMÕES
•O estilo de Camões é elevado, sublime («grandíloco»), com enorme variedade vocabular:
linguagem corrente, técnica ou erudita.
•A riqueza de adjetivação e de tempos verbais, aliada à variedade de figuras de estilo, revelam
a influência do classicismo.

«OS LUSÍADAS» COMO POEMA DO RENASCIMENTO


Camões, como homem do Renascimento, assimilou como poucos os seus ideais e projetou-os em
Os Lusíadas. A obra é, pois, renascentista:
–pela sua estrutura;
–pelo emprego da mitologia pagã e cristã;
–pela valorização do homem e da experiência humana;
–pelo valor dado às letras e às armas;
–pelo desejo de glória;

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–pelas considerações que faz sobre o verdadeiro valor do homem – o homem vale por aquilo que
realiza.

SIGNIFICADO DE «OS LUSÍADAS»


1. Intervenção Pedagógica:
– Confrontar a Dedicatória com final da obra (X, 145-156).
– A obra intervém diretamente na vida do seu tempo de forma pedagógica:
 elogia e censura os portugueses;
 num sentido mais universalista, exorta os cristãos, criticando as divisões e incitando à
união contra o inimigo comum: o muçulmano (Cf. início do Canto VII);
 elevação do homem com exemplos, conselhos, admoestações, avisos – papel de «vate»,
aquele que vaticina (ideia clássica retomada pelos renascentistas);
 criação de um modelo humano ideal, heroico e nobre (VI, 95-99).

2.Significado Nacional:
–Glorifica os heróis nacionais;
–Espelha as virtudes da alma nacional (coragem, fidelidade, espírito de aventura, sensibilidade,
amor à liberdade);
–Evidencia a vocação para o mar e o sentimento religioso dos portugueses;
–Eleva a língua portuguesa a padrões nunca até então atingidos.

3. Interesse Universal:
–Os Descobrimentos foram um acontecimento que teve repercussões mundiais a nível cultural e
económico;
–A religião cristã expandiu-se através da ação dos portugueses;
–Os sentimentos humanos são valorizados e os defeitos humanos condenados.

CONCLUSÃO
A ação é levada a cabo por um herói coletivo: o povo português, representado por Vasco da
Gama.

 O canto X funciona como o canto-síntese pois é o mais longo (156 estrofes) e reúne os
quatro planos; demonstra que as profecias do Velho do Restelo e do Adamastor são
superadas e define um ideal de heroísmo que Camões deseja ver continuado por D.
Sebastião.
 A ideologia renascentista ressalta da oposição entre o Velho do Restelo (prudente,
conservador) e o espírito da Expansão (renascentista, aventureiro, de «dar novos mundos
ao mundo»): o Homem, com a sua tenacidade e ousadia, divinizou-se, superou os deuses.
 Também o Maravilhoso contribui para o ideal renascentista do Homem dominante: ele
supera o maravilhoso pagão, apoia-se no maravilhoso cristão (evangelização) e controla
o maravilhoso científico ou natural (conhecer a Natureza é dominá-la).

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