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D.

FERNANDO, INFANTE DE PORTUGAL

Deu-me Deus o seu gládio porque eu faça


A sua santa guerra.
Sagrou-me seu em honra e em desgraça,
Às horas em que um frio vento passa
Por sobre a fria terra.

Pôs-me as mãos sobre os ombros e doirou-me


A fronte com o olhar;
E esta febre de Além, que me consome,
E este querer grandeza são seu nome
Dentro em mim a vibrar.

E eu vou, e a luz do gládio erguido dá


Em minha face calma.
Cheio de Deus, não temo o que virá,
Pois, venha o que vier, nunca será
Maior do que a minha alma.
Vocabulário
Gládio → espada curta, de dois gumes, utilizada pelas legiões romanas.
Doirar → tornar dourado.

Referências
D.Fernando, Infante de Portugal

N→ Santarém, 29 de Setembro de 1402


M→ Nas prisões de Fez, Marrocos, 5 de Junho de 1443

Era o mais novo de oito irmãos, por isso não teve acesso a tantas riquezas como os
mais velhos, então tenta pôr-se ao serviço do papa, do imperador ou de outro soberano
europeu para ganhar algum prestígio. Fernando era bastante religioso, mas sem extremos,
contudo deixou esta vida apenas religiosa e focou as suas atenções para a luta de cruzada
em Marrocos, que lhe poderia trazer bastante fortuna. Contudo, quando foi para a guerra
em África, foi feito prisioneiro e acabara por morrer nas cárceres de Fez.
Os seus restos mortais foram transportados para o Mosteiro da Batalha, para a
Capela do Fundador.

Estrutura formal e Simbólica

Este poema pertence à Primeira Parte, à parte do Brasão, onde se relata o princípio da
nacionalidade, a formação do reino, a sua consolidação como nação graças aos primeiros
fundadores e seus antepassados.

Pertence também ‘As Quinas’, transposição heráldica das chagas de Jesus, que foram,
segundo a lenda, oferecidas por Cristo ao nosso primeiro rei, D.Afonso Henriques. As
figuras nacionais consagradas nestes 5 poemas são os heróis-mártires.

Estes heróis são reis e infantes que contribuíram com o seu sacrifício ou o seu sangue para
cimentar a mística nacional. Tornam-se figuras míticas por realização de missões que os
imortalizou e que permitiu a concretização de uma obra.

Estrutura do poema

Tem 3 estrofes,
Cada estrofe tem 5 versos, são quintilhas,
Tem metrica irregular,
Rima cruzada, emparelhada e interpolada.
Análise do poema

Podemos dividir este poema em 3 partes:

→ Primeira parte (versos 1 a 7): Consagração do Infante, relativo ao passado e com a


utilização dos verbos no pretérito perfeito;

→ Segunda parte (versos 8 a 12): A vontade de mudança e conquista, relativo ao presente


com o uso dos verbos no presente do indicativo;

→ Terceira parte (versos 13 a 15): Determinação e coragem, indicação de uma vontade


enorme de cumprir a sua missão, relativo ao futuro devido à utilização dos verbos no futuro.

‘Deu-me Deus o seu gládio porque eu faça\ A sua santa guerra.\ Sagrou-me seu em honra
e em desgraça,’ (vv1-3)

‘Pôs-me as mãos sobre os ombros e doirou-me\ A fronte com o olhar;’(vv 6-7)

Através destes versos, percebemos que é D.Fernando a relatar devido ao uso da


primeira pessoa do singular.
D.Fernando é tratado como o instrumento da vontade de Deus, pois foi escolhido por
este para levar a cabo a sua missão, o seu querer de conquista. O infante vai ser
imortalizado e tornado mito devido aos seus feitos pela nação.
O gládio nestes versos simboliza o poder com que Deus investe o herói para que ele
possa fazer cumprir o destino de Portugal.

‘E esta febre de Além, que me consome,\ E este querer grandeza são seu nome\ Dentro
em mim a vibrar.’(vv8-10)

‘E eu vou, e a luz do gládio erguido dá\ Em minha face calma.’ (vv11-12)

Nestes versos percebemos que o sujeito poético está a sentir uma imensa vontade
de conquista, de querer a grandeza e fazer progressos. Este aceita a missão de Deus e é
notória a sua vontade de a cumprir.
Podemos relacionar estes versos com o Quinto Império, ou seja, com o que este
quinto império significa. É o símbolo de inquietação necessária ao progresso assim como
o sonho: não se pode ficar sentado à espera que as coisas aconteçam, há que ser ousado,
curioso, corajoso e aventureiro, há que estar inquieto e descontente com o se tem e o que
se é.
O quinto império ou império espiritual é mesmo isto, é querer levar Portugal ainda
mais longe e louvar esta nação.
‘Cheio de Deus, não temo o que virá,\ Pois, venha o que vier, nunca será\ Maior do que a
minha alma.’ (vv13-15)

Nesta conclusão do poema e notória a enorme confiança que D.Fernando tem na


realização desta vontade de Deus, uma força extraordinária e inabalável. A sua alma é
mais forte que qualquer inimigo que se oponha, daí Deus ter escolhido o infante para ser o
instrumento da Sua vontade.

Recursos Expressivos
Hipálage - figura de linguagem caracterizada pela atribuição de uma característica de um
ser ou objeto a outro ser ou objeto que se encontra próximo ou relacionado com ele.
- minha face calma (v.12).

Paradoxo - afirmação contraditória que vai contra a lógica e o senso comum.


- Santa Guerra (v.2)

Antítese – em honra e em desgraça (v.3)

Anáfora – E esta/ E este v(8 e 9)

Opinião

Na nossa opinião considerámos este poema relativamente fácil de analisar, pois menciona
a vontade de concretização do quinto Império ou Império espiritual, tema abordado em
grande parte dos poemas de Fernando Pessoa. Também conhecemos melhor D.Fernando
e percebemos porque razão é considerado um herói para o povo lusitano.

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